do valor probatÓrio do inquÉrito policial para o …siaibib01.univali.br/pdf/waldemar...
TRANSCRIPT
-
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
DO VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL PARA O PROCESSO PENAL
WALDEMAR MACIEL
Itajaí, 2007
-
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS E SOCIAIS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
DO VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL PARA O PROCESSO PENAL
WALDEMAR MACIEL
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial a obtenção do grau de Bacharel em Direito.
Orientador: Professor Esp. Fabiano Oldoni
Itajaí, 2007
-
AGRADECIMENTO
Agradeço a minha querida esposa “Lú”, como é conhecida; um agradecimento em especial, pois
sem ela esse desafio acadêmico não teria se quer iniciado; obrigado por ser tão especial, e trazer a
paz e o amor que um homem necessita para conseguir vencer obstáculos tão difíceis na vida, TE AMO! A minha querida mãezinha, Terezinha, pelo amor, incentivo e confiança depositado em
mim desde meu nascimento até os dias de hoje. Meus filhos Ruan, Amanda e Mariah, por trazerem tanta alegria em meu mundo. A minha família em
geral, Salete, José, Fabíola e Marcelo, responsáveis por um incentivo que vem desde a inscrição no Vestibular. As irmãs Márcia, Selma,
Solange e Sandra, pelo respeito, ajuda e amizade. Aos meus companheiros de serviço
(Ferreira, Mário, Bonotto, Luis, Almiron, Mateus, Aníbal, etc...) que sempre demonstraram apoio e
incentivo a esse desafio. Ao meu orientador Fabiano Oldoni, com minha admiração e especial
gratidão, assim como todo corpo docente do Curso de Direito da Univali. Aos meus amigos da
Universidade (Daniela, Cristhian, Izabel, João, Kelli, Mário, Gisele, Lídia, etc...) que convivi
durante cinco anos de minha vida e que compartilharam momentos de angústia e alegria
durante o curso. E finalmente a Deus, por ter colocado todos esses seres maravilhosos em
minha vida, obrigado Senhor!
-
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho, a memória de meu pai Ramiro, que ao partir durante minha jornada
acadêmica, deixou em meu coração o entendimento de que foi um ser humano por
muitas vezes não compreendido, mas que tinha um grande valor, dentro de uma família que o
admirava pela figura humana que era. Que pena pai querido, que não possa dividir este momento
tão especial em minha vida, SAUDADES...
-
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, 2007
Waldemar Maciel Graduando
-
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Waldemar Maciel, sob o título Do
Valor Probatório do Inquérito Policial para o Processo Penal, foi submetida
em 04 de Junho de 2007 à banca examinadora composta pelos seguintes
professores: Professor Esp. Fabiano Oldoni: Presidente da Banca
Examinadora; Professora MSc. Solange Lúcia Heck Kool: Examinadora;
Professor Esp. Júlio Cezar Kuss: Examinador, e aprovada com a nota: 9,25
(nove e vinte e cinco).
Itajaí , 2007
Professor Esp. Fabiano Oldoni Orientador e Presidente da Banca
Professor Esp. Fabiano Oldoni Coordenação da Monografia
-
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
art. Artigo
ACrim Apelação Criminal
atual. Atualizada
CPP Código de Processo Penal Brasileiro
CF Constituição Federal
CP Código Penal Brasileiro
c/c Combinado com
Des. Desembargador
ed. Edição
HC Habeas Corpus
MP Ministério Público
Min. Ministro
n. Número
p. Página
RJ Revista Jurídica
RT Revista dos Tribunais
RTJ Revista Trimestral de Jurisprudência
s. Seguinte
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal Justiça
TSE Tribunal Superior Eleitoral
RCrim Recuso criminal
RECrim Recurso Extraordinário Criminal
v. Volume
-
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Ação
“É o direito de invocar o Poder Judiciário para aplicação do direito objetivo a
determinado caso concreto. 1
Circunscrição
“Indica o território dentro do qual as autoridades policiais têm atribuições para
desempenhar suas atividades, de natureza eminentemente administrativas”.2
Competência
“[...] a porção de capacidade jurisdicional que a organização judiciária atribui a
cada órgão jurisdicional, a cada juiz. ” 3
Crime
“Fato típico, antijurídico e culpável [...] crime é um todo indivisível”.4
Garantias Constitucionais
“[...] instrumentos de refreamento do poder estatal em face da liberdade individual
[...] as mínimas condições para a estruturação de um devido processo legal.”5
1 SALLES JÚNIOR, Romeu de Almeida. Inquérito policial e ação penal: indagações, doutrina,
jurisprudência e prática. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 157 2 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 73. 3 ESPÍNDOLA FILHO, Eduardo. Código de processo penal anotado. 5 ed. Rio de Janeiro:
Revan, 2001. p. 51 4JUNIOR, Edmundo José Bastos. Código Penal em Exemplos Práticos: Parte Geral. 4 ed.
Revista e Atualizada. Florianópolis: OAB/SC, 2003. p. 38. 5 CHOUKE, Fauzi Hassan. Garantias constitucionais na investigação criminal. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1995. p. 73.
-
Indiciamento
É a imputação a alguém, no inquérito policial, da prática do ilícito penal, sempre
que houver razoáveis indícios de sua autoria. 6
Jurisdição
“[...] a atividade por meio da qual o Estado, em substituição às partes, declara
preexistente vontade da lei ao caso concreto”. 7
Processo
“[...] a reunião de todos os atos, que se iniciam necessários e assinalados em lei,
para que se investigue, para que se esclareça a controvérsia e, afinal, para que
se solucione a pendência.”8
6 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 92. 7 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 73. 8 SALLES JÚNIOR, Romeu de Almeida. Inquérito policial e ação penal: indagações, doutrina,
jurisprudência e prática. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 157/ 158.
-
SUMÁRIO
RESUMO........................................................................................... XI
INTRODUÇÃO ................................................................................... 1
CAPÍTULO 1 ...................................................................................... 3
INQUÉRITO POLICIAL ...................................................................... 3 1.1 CONCEITO .......................................................................................................3 1.2 POLÍCIA JUDICIÁRIA ......................................................................................7 1.3 COMPETÊNCIA..............................................................................................10 1.4 PROCEDIMENTOS ........................................................................................18 1.5 INÍCIO DO INQUÉRITO POLICIAL ................................................................25 1.5.1 NOTITIA CRIMINIS ...........................................................................................25 1.5.2 INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO NOS CRIMES DE AÇÃO PENAL PÚBLICA INCONDICIONADA.....................................................................................................27 1.5.3 INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO NOS CRIMES DE AÇÃO PENAL PÚBLICA CONDICIONADA. ......................................................................................................28 1.5.4 INSTAURAÇÃO DO INQUÉRITO NO CASO DE CRIMES DE AÇÃO PENAL PRIVADA. ..30 1.6 VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL .....................................31
CAPÍTULO 2 .....................................................................................36
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS NO PROCESSO PENAL............36 2.1 INTRODUÇÃO................................................................................................36 2.2 PRINCÍPIO DA IGUALDADE .........................................................................39 2.3 PRINCÍPIO DO ESTADO DE INOCÊNCIA.....................................................40 2.4 PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL ..............................................43 2.5 PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA..........................44 2.6 PRINCÍPIO DA VERDADE REAL ..................................................................49
CAPÍTULO 3 .....................................................................................53
O EXERCÍCIO DO DIREITO DE DEFESA NO INQUÉRITO POLICIAL..........................................................................................................53
3.1 IMPORTÂNCIA DO DIREITO DE DEFESA NO INQUÉRITO POLICIAL.......53 3.2 A DEFESA COMO DIREITO E GARANTIA INDIVIDUAL..............................58 3.3 INQUÉRITO POLICIAL COMO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO ........61 3.4 PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO COMO ALVO DAS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS.............................................................................................64 3.5 INVESTIGADO COMO SUJEITO DE DIREITOS ...........................................70 3.6 CONTRADITÓRIO NO INQUÉRITO POLICIAL .............................................76 3.7 AMPLA DEFESA NO INQUÉRITO POLICIAL ...............................................77
-
CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................81
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ...........................................85
-
RESUMO
Versa a presente pesquisa sobre o verdadeiro valor do
inquérito policial para com o processo penal. Num primeiro momento é descrito
um breve estudo do órgão competente de tal investigação, qual seja a Polícia
Judiciária, conceituando e desdobrando competências. Logo após, é esclarecido
sobre os procedimentos adotados neste tão polêmico poder investigatório, como
também formas de instauração do inquérito e seu valor probatório. Finalizar-se-á,
apresentando uma triagem de determinadas garantias constitucionais, que
constituem um duelo ao referido procedimento administrativo, uma vez que tais
princípios possuem valor fundamental durante o processo, valendo-se de
profunda análise para comprovar de que forma vão intervir no procedimento pré-
processual. Isto posto busca-se concluir qual o verdadeiro valor para com o
processo penal, seja para a propositura da ação penal, ou para um
convencimento do juiz na sentença.
-
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto informar as noções
basilares que norteiam o inquérito policial para então buscar o verdadeiro valor de
tal procedimento perante o processo crime.
O seu objetivo é esmiuçar esse caráter fundamentador do
Jus Puniendi estatal, para então trazer o ponto de importância desta fonte de
investigação pré-processual.
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1, tratando de uma
formação de conceito do processo administrativo investigatório desenvolvido pela
polícia judiciária para apuração de delitos, um aprofundamento no tocante a
instituição Policia Judiciária, uma breve análise do que significa, qual seu objetivo
perante o Estado, quem a exerce e referidas competências, como também qual
sua verdadeira atividade. Os procedimentos realizados comparados a amparos
constitucionais que possui o acusado, rematando com a definição do verdadeiro
valor probatório.
No Capítulo 2, será discorrido sobre os princípios
constitucionais dentro do processo penal como também suas características
principais.
No Capítulo 3, procurar-se-á demonstrar a aplicação do
exercício do direito de defesa dentro desse sistema, em especial na
representação pelo defensor técnico na assistência ao investigado, como também
demonstrar os diversos procedimentos administrativos de instrução provisória que
servirá ao titular da ação penal, como também as formas em que esses
procedimentos são alvos de garantias constitucionais.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre o valor probatório do inquérito policial para o processo penal.
-
2
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
�� Avaliando as garantias individuais contidas na Constituição Federal, não existe restrição a defesa técnica do acusado.
�� Os princípios constitucionais informados no processo penal são utilizados no inquérito policial.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados
o Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
-
CAPÍTULO 1
INQUÉRITO POLICIAL
1.1 CONCEITO
O inquérito policial tem por escopo a apuração dos fatos,
suas circunstâncias e definição da autoria do delito, com vistas a servir de base à
Ação Penal e às providências cautelares.9
No Brasil, com essa denominação surgiu em 20 de setembro
de 1871, pela Lei nº 2.033, regulamentada pelo Decreto-lei nº 2.824 em seu art.
42: "O inquérito policial consiste em todas as diligências necessárias para o
descobrimento dos fatos criminosos, de suas circunstâncias e dos seus autores e
cúmplices".10
Mas Mehmeri mostra que “desde a remota Antiguidade,
sempre houve o processo investigatório para apuração dos delitos, suas
circunstâncias e seus autores”, e que “havia lei disciplinando os trabalhos de
investigação policial dos crimes, suas circunstâncias e seus autores".
De fato a Lei nº. 261, de 03 de dezembro de 1841 em seu
art. 4º., § 9º, determinava que as autoridades policiais deveriam "remeter, quando
julgarem conveniente, todos os dados, provas e esclarecimentos que houverem
9 SILVA, José Geraldo. O Inquérito Policial e a Polícia Judiciária. 2 ed. São Paulo: Editora De
Direito, 1996. 10 MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. São Paulo: Saraiva, 1992. p.3.
-
4
obtido sobre um delito, com uma exposição do caso e das circunstâncias, aos
juízes competentes, a fim de formarem a culpa.11
Hoje está previsto no Código de Processo Penal de 1941,
sendo “um procedimento investigatório prévio, constituído por uma série de
diligências, cuja finalidade é a obtenção de provas para que o titular da ação
penal possa propô-la contra o autor da infração penal (CPP, art. 4º).”12
O primeiro instituto de processo penal, referido no CPP, a
partir do art. 4º, é o inquérito policial. Não apenas pela sua topografia, o inquérito
policial é a gênese de qualquer procedimento de investigação e destina-se à
apuração de infrações penais e sua autoria. 13
Capez, citado por Gonçalves descreve:
É instaurado pela autoridade policial que tem como destinatários imediatos o Ministério Público, titular exclusivo da ação penal pública (CF, art.129, inciso I), e o querelante, titular da ação penal privada (CPP, art. 30); como destinatário mediato tem o juiz, que se utilizará dos elementos de informação nele constantes, para o recebimento da peça inicial e para formação do seu convencimento quanto à necessidade de decretação de medidas cautelares. 14
Conforme Tourinho Filho:
O inquérito policial é peça meramente informativa. Nele se apuram a infração penal com todas as suas circunstâncias e a respectiva autoria. Tais informações têm por finalidade permitir que o titular da ação penal, seja o Ministério Público, seja o ofendido, possa exercer o jus persequendi in judicio, isto é, possa iniciar a ação penal. Se essa é a finalidade do inquérito, desde que o titular da ação penal (Ministério Público ou ofendido) tenham em mãos as
11 MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 3. 12 ARAÚJO REIS, Alexandre Cebrian e RIOS GONÇALVES, Victor Eduardo. Sinopses Jurídicas
– processo penal – parte geral, vol.14ª, Saraiva, 1999. p.5. 13CARNEIRO GOMES, Rodrigo. Mandado de busca e apreensão - uma postura crítica da
atividade jurídica do advogado, da toga e do trabalho policial. Brasília: Justilex. 2005. 14 ARAÚJO REIS, Alexandre Cebrian e RIOS GONÇALVES, Victor Eduardo. Sinopses Jurídicas
– processo penal – parte geral. p. 64.
-
5
informações necessárias, isto é, os elementos imprescindíveis ao oferecimento de denúncia ou queixa, é evidente que o inquérito será perfeitamente dispensável. 15
A jurisprudência tem por entendimento:
O inquérito policial é mera peça informativa destinada à formação da opinio delicti do Parquet, simples investigação criminal, de natureza inquisitiva, sem natureza de processo judicial, e, mesmo que existisse irregularidade nos inquéritos policiais, tais falhas não contaminariam a ação penal. Tal entendimento é pacífico e tão evidente que se torna até mesmo difícil decote. 16
Para Borges da Rosa:
Inquérito policial é o conjunto dos atos praticados pela Polícia acerca de fato reputado criminoso e dos responsáveis pela prática do mesmo. O inquérito policial se destina a instruir a propositura da ação penal. Deve preceder ou servir de base ao processo repressivo. O inquérito policial é um processo meramente administrativo, que não está adstrito as fórmulas do Processo em geral; pois tem existência à parte, assim como está a cargo de funcionários especiais. 17
Normalmente, é com base nas informações contidas no
inquérito policial que o Ministério Público oferece a denúncia, pois é através dele
que se tem provado a justa causa, como descreve a Constituição Federal:
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;
[...]
VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; [...] (destacou-se).
15 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 18 ed., v. 1, São Paulo: Saraiva,
1997. p.196. 16 STJ, 6ª T., rel. Min. Pedro Acioli, DJU, 18 abr. 1994, p.8525. 17 BORGES DA ROSA, Inocêncio. Processo Penal Brasileiro. Porto Alegre: Globo, 1942. p. 110.
-
6
Capez, ainda apresenta como destinatário mediato do
inquérito policial o Juiz, que, mediante a análise deste, receberá a peça inicial e
formará seu convencimento quanto a necessidade de decretação de medidas
cautelares. Tal entendimento encontra acolhida no artigo 12 do CPP. 18
Assevera Lopes Jr.:
A função de filtro processual contra acusações infundadas incumbe, especialmente, à chamada fase intermediária, que serve como elo de ligação entre a investigação preliminar e o processo ou o não-processo. Sem embargo, esse é apenas um momento procedimental em que se realiza um juízo de valor, mais especificamente, de pré-admissibilidade da acusação, com base na atividade desenvolvida anteriormente e no material recolhido. É inegável que o êxito da fase intermediária depende inteiramente da atividade preliminar, de modo que transferimos a ela o verdadeiro papel de evitar as acusações infundadas. 19
Ele tem uma visão do caráter inquisitivo e o réu é colocado
no foco administrativo, podendo a autoridade policial conduzir as investigações de
maneira sigilosa, descrito no Código de Processo Penal, em seu artigo 20: “A
autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou
exigido pelo interesse da sociedade”.
Morais ostenta a seguinte estatística:
É um procedimento básico para a ação penal, pois, tratando-se de peça que carreira os elementos suficientes para a denúncia, não pode o Ministério Público dele prescindir para tal mister (embora alguns "doutrinadores", desavisados, procurem argumentar ao contrário, com exceções, quando a realidade jurídico-forense mostra que mais de 95% (noventa e cinco) dos processos
18 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p.70. 19 LOPES JR., Aury Celso. Sistemas de investigação preliminar no processo penal. Rio de
Janeiro: Lúmen Júris. 2002. p.46.
-
7
criminais nasceram de inquéritos bem feitos, número que só veio a diminuir recentemente, com a Lei 9.099/95 (art. 77, § 1º)20.
Conclui-se então, que o inquérito policial, disciplinado entre
os arts. 4º e 23 do Código de Processo Penal é um procedimento preliminar,
extrajudicial e preparatório para a ação penal, sendo por isso instaurado pela
polícia judiciária e tem como finalidade a apuração de infração penal e de sua
respectiva autoria, sendo considerado como a primeira fase da persecutio
criminis, que se completa com a fase em juízo.
1.2 POLÍCIA JUDICIÁRIA
Segundo Tourinho Filho “o vocábulo polícia, do grego
politéia – de pólis (cidade) – significou, a princípio, o ordenamento jurídico do
Estado, governo da cidade e, até mesmo, a arte de governar”. 21
O ensinamento do respeitado doutrinador continua:
A Polícia, com o sentido que hoje se lhe empresta-órgão do Estado incumbido de manter a ordem e a tranqüilidade pública, surgiu, ao que parece, na velha Roma. [...] Ao tempo do Império, quando se desenvolveu a cognitio extra ordinem, havia, em Roma, funcionários incumbidos de levar as primeiras informações sobre a infração penal aos Magistrados. Eram os curiosi, os irenarche, os stationarii, os nuntiatores, os digiti duri, que desempenham papel semelhante ao da nossa Polícia Judiciária.22
Pelo fato da Constituição Federal atribuir a Polícia Civil as
funções da Polícia Judiciária e apuração das infrações penais, costuma-se
20 MORAES, Bismael. O Inquérito é o vilão no direito brasileiro. Revista Brasileira de Ciências
Criminais. São Paulo, n. 28, 1999. p.259. 21 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p.
189. 22TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, 2005. p. 190.
-
8
confundir a nomenclatura da Polícia Civil, chamando-a de Polícia Judiciária, o que
se afigura apenas como uma de suas funções. 23
Conforme MIRABETE, "a polícia é uma instituição de direito
público destinada a manter a paz pública e a segurança individual,"24 o que é
dever do Estado, direito e responsabilidade de todos.
Complementando, ensina CAPEZ que a “Polícia Judiciária
tem caráter repressivo, atuando quando os fatos que a Polícia de Segurança
visava prevenir não puderam ser evitados, ou ainda, quando, sequer foram
imaginados por esta.”25
A polícia judiciária só é exercida por autoridades policiais
(art. 4º, parágrafo único do CPP), o que não exclui a atuação de outras
autoridades, que são nominadas como "administrativas". A autoridade policial
para fins de exercício da polícia judiciária é o delegado de polícia de carreira (art.
144, § 4º da C.F.-88).26
Ainda quanto a Polícia Judiciária, cumpre analisar a Lei 9043
de 09 de maio de 1995, que assim dispõe: “A Polícia Judiciária será exercida
pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá
por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.”
Normalmente os indícios são colhidos pela Polícia Judiciária,
encarregada das investigações preliminares, conforme determina o artigo 6º do
CPP. Estes indícios, somente poderão resultar no indiciamento técnico, para,
posteriormente, prosseguir-se no processo, com a denúncia.
A prova indiciaria está prevista na legislação pátria,
especificamente no Código de Processo Penal, em seu artigo 239: “Considera-se
23 MIRABETE, Julio Fabbrini, Código de Processo Penal Comentado. 9 ed. São Paulo: Atlas,
2002. p.88. 24 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de Processo Penal interpretado. 2 ed. São Paulo: Atlas,
1994. p.35. 25 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal, 2002. p. 70/71. 26GOMES, Luiz Flávio. RT Mini códigos: Código Penal Código de Processo Penal
Constituição Federal. 3 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
-
9
indício a circunstância conhecida e provada, que, tendo relação com o fato,
autorize, por indução, concluir-se a existência de outra ou outras circunstâncias.”
O doutrinador PINTO afirma que a Polícia Judiciária tem por
objetivo a busca da verdade real, expondo:
Tal busca não pode estar obstaculizada, sendo uma rocha a contrapor a investigação, dentre outras, a implantação, na forma vista no processo judicial, do contraditório e da ampla defesa na fase inicial da persecutio criminis. O inquisitivo há de predominar nesse primeiro momento. 27
Conforme MEHMERI, visto a extensão do território,
dificuldades de acesso, entre outros, dentro da “Sistemática do Direito Brasileiro,
sem a Polícia Judiciária realizando os inquéritos, raríssimas seriam as ocasiões
em que os infratores penais prestariam contas à justiça criminal.”28
Ensina Lopes Jr.:
É a Polícia que praticará, ela mesma, as provas técnicas que julgar necessárias, decidindo também quem, como e quando será ouvido.
É importante destacar que neste sistema a polícia não é um mero auxiliar, senão o titular (verdadeiro diretor da instrução preliminar), com autonomia para dizer as formas e os meios empregados na investigação e, inclusive, não se pode afirmar que exista uma subordinação funcional em relação aos juízes e promotores.
Referido doutrinador ainda tem por ensinamento:
Em teoria, a atividade policial é mais célere, não só porque a polícia chega mais rápido no local do delito (está em todos os lugares), senão também porque, ao estar "mais próxima do povo", conduz a investigação de forma mais dinâmica. Além do mais, manter Juízes ou Promotores como titulares da
27 PINTO, Adilson José Vieira Pinto. O Inquérito Policial à Luz dos Direitos e Garantias Individuais
da Constituição Federal de 1988. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo, n. 27. 1999. p.255.
28 MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p.20.
-
10
investigação, necessariamente, teria-se que manter um efetivo policial, pois, nenhum dos dois pode desenvolver a atividade investigatória sem o auxílio policial. 29
De caráter preventivo a polícia pode ser administrativa,
garantindo a ordem pública e impedindo atos danosos aos bens individuais e
coletivos. E pode ser ainda judiciária, de caráter repressivo, cabendo a ela
conseguir no primeiro momento da atividade repressiva do Estado, a colheita dos
elementos que possam elucidar o delito que já foi consumado.
1.3 COMPETÊNCIA
Cabe, por princípio, analisar o que descreve a Constituição
Federal:
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
[...]
§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido pela União e estruturado em carreira, destina-se a:
I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;
[...]
29 LOPES JR., Aury Celso. Sistemas de investigação preliminar no processo penal. p.57 - 59.
-
11
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia
judiciária da União.
[...]
§ 4º - às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares.
[...] (destacou-se).
A competência para presidir o inquérito policial é deferida
pela Constituição Federal, aos delegados de polícia de carreira, de acordo com as
normas de organização policial dos Estados. Weingartner, citado por Freyesleben
posiciona-se contrariamente a exclusividade policial judiciária atribuída, pela
Constituição, à Polícia Federal, afirmando que "não se nega o sentido técnico da
exclusividade conferida, porém ela não subsiste sem que sofra reparos da
moderação, através da interpretação".30
O Constituinte só reservou a exclusividade quanto a função
de polícia judiciária, e não quanto a apuração de crimes. Em relação à Polícia
Civil, se percebe pela leitura do § 4.º do art. 144 da Constituição Federal. A
Polícia Federal é reservada, com exclusividade, a função de polícia judiciária da
União.
Lima faz algumas considerações importantes que merecem
ser citada:
Exceto o caso da Polícia Federal, quanto à Polícia Judiciária da União, o princípio que rege a atividade policial é o da não-exclusividade, ou seja, admite-se que mais de um órgão apure infrações penais, o que, ademais, é de interesse público. 31
30 FREYESLEBEN, Márcio Luis Chila. O Ministério público e a polícia judiciária: controle
externo da atividade policial. Belo Horizonte: Del Rey, 1993. p.135. 31 LIMA, Marcellus Polastri. O MP e a persecução criminal. Rio de Janeiro: Lumem Juris, 1997.
p. 55.
-
12
Acosta comenta a competência de autoridades
administrativas para o inquérito:
A competência da polícia para o inquérito não exclui a de autoridades administrativas às quais a lei cometa a mesma função (art. 4º, parágrafo. Único). Por outro lado, para apuração de crimes contra a economia popular, contra a saúde pública, ou crimes funcionais, há autoridades administrativas incumbidas de proceder a inquérito; assim também ocorre com as autoridades militares, mesmo quando seus subordinados cometerem crime comum. Qualquer desses inquéritos terá efeito semelhante ao policial, pois servirá de lastro à ação penal. 32
Tourinho Filho parte desse pressuposto:
Conclui-se que Constituição não deu a exclusividade a uma Instituição na apuração de infrações penais; observe-se que um outro artigo da mesma Carta (art. 58, § 3º.), dá poderes à Comissão Parlamentar de Inquérito para investigação própria [...].
Complementando Tornaghi, sobre demais competências:
A competência dada a Policia Judiciária não exclui a de autoridades administrativas às quais, por lei, seja cometida a mesma função. Se, por exemplo, uma lei atribuir às autoridades alfandegárias o poder de investigar contrabandos ou descaminhos, elas poderão fazer inquéritos. Se outra lei cometer às do Serviço de Fiscalização à Medicina a função de investigar os crimes contra a saúde pública, elas terão também esse poder. 33
Lima, seguindo esse entendimento relata que "obviamente,
não sendo a Polícia Judiciária detentora de exclusividade na apuração de
infrações penais, deflui que nada obsta que o Ministério Público promova
diretamente investigações próprias para elucidação de delitos”. 34
32 ACOSTA, Walter P. O processo penal. 20 ed. Rio de Janeiro: Coleção Jurídica da Editora do
Autor, 1990. p. 35. 33 TORNAGHI, Hélio. Curso de processo penal. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 1987. p. 29. 34 LIMA, Marcellus Polastri. O MP e a persecução criminal. p.84.
-
13
Todavia, tendo o Ministério Público competência para
investigar, encontra na realidade, dificuldades, como se manifesta Armenta Deu,
citada por Lopes Jr.:
O promotor investiga muito pouco pessoalmente e, na prática, não pode modificar substancialmente o resultado da atuação policial, pois esta já chega concluída – caráter inibitório.[...] é uma prática habitual que a investigação recaia, quase que exclusivamente, na polícia, limitando-se o promotor a uma mera revisão formal posterior.35
Mesmo entendimento tem Costa, relatando ainda que
mesmo presidindo o inquérito, na atual realidade, o Ministério Público precisa da
polícia:
Há atividades tipicamente policiais e muitas vezes imprescindíveis à apuração do crime e da autoria, que não constam das atribuições do MP. Seus membros não foram e não são preparados para elas, não se submetem a provas físicas para ingressar na carreira, não recebem aulas para utilização de armas de fogo. O MP tem poder de requisição, previsto na Constituição e nas leis. Pode investigar, até mesmo em função da titularidade da ação penal de iniciativa pública. Mas precisa da polícia quando necessário abandonar a compreensão intelectual do delito, para alcançar o corpo de delito verificado na realidade. 36
Tourinho Filho reforça que a distribuição, quanto à
competência para dirigir o inquérito policial, seja a seguinte:
Excluída a ressalva feita pelo parágrafo único do art.4º do CPP, e deixando de lado os inquéritos extrapoliciais (militar, judicial, parlamentar), a competência para a realização de inquéritos policiais é distribuída a autoridades próprias, de acordo com as normas de organização policial dos Estados. Essas autoridades são em geral Delegados ou Comissários que dirigem as Delegacias de Polícia, e, em se tratando de infrações da alçada
35 LOPES JR., Aury Celso. Sistemas de investigação preliminar no processo penal. p. 88. 36 COSTA, Paula Bajer Fernandes Martins da. Sobre a posição da polícia judiciária na estrutura do
direito processual penal brasileiro na atualidade. Revista Brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: n 26, p. 213-320, 1999. p. 218.
-
14
da Justiça Comum Federal, a competência é dos Delegados de Polícia Federal, nos termos do art. 144, § 1º, I, da CF. 37
Contudo, há posicionamento contrário, sendo que Fragoso
registra a impossibilidade do parquet em acumular funções:
Não é possível, [...] permitir que o Ministério Público possa acumular as funções de investigador (que a ninguém presta contas), e de instituição encarregada de promover a persecução criminal. Trata-se de um acúmulo perigoso de atribuições, que, sobre ser ilegal e inconstitucional, é absolutamente inconveniente, pois dá lugar, pelo excesso de poder, a abusos intoleráveis. 38
Reale Júnior e Reale Ferrari entendem que o parquet tem
competência apenas para requisitar a instauração do inquérito:
Tal distinção é reproduzida expressamente na Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, Lei nº 8.625, de 12 de fevereiro de 1993, em seu artigo 26, inciso IV – a atuação do Ministério Público no inquérito policial foi tratada em dispositivo legal específico onde fica autorizado ao Parquet somente requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial e de inquérito policial militar, observado o disposto no artigo 129, VIII, da Constituição Federal, podendo acompanhá-los. A expedição de notificações para oitiva de testemunhas e a requisição de documentos fica limitada ao inquérito civil, conforme dispõe o inciso I do mesmo artigo. 39
O Supremo Tribunal Federal, em decisão no RHC 81.326-7,
deixou claro e evidente a total impossibilidade do Ministério Público de realizar e
presidir inquérito policial, consoante se observa na referida decisão transcrita:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. MINISTÉRIO PÚBLICO. INQUÉRITO ADMINISTRATIVO. NÚCLEO DE
37 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, 2005. p. 197. 38 FRAGOSO, José Carlos. São ilegais os procedimentos investigatórios realizados pelo ministério
público federal. In Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo: RT, v. 10, nº 37, p. 244, jan/ mar 2002.
39 REALE JUNIOR, Miguel e FERRARI, Eduardo Reale. Parecer elaborado em face dos Atos Normativos nº 314-PGJ/ CPJ, de 27/6/2003, e 324-PGJ/ CGMP/ CPJ, de 29/8/2003, editados pelo Ministério Público do estado de São Paulo. São Paulo, 21/10/2003. p.6.
-
15
INVESTIGAÇÃO CRIMINAL E CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL/DF. PORTARIA. PUBLICIDADE. ATOS DE INVESTIGAÇÃO. INQUIRIÇÃO. ILEGITIMIDADE.[...] A Constituição Federal dotou o Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de Inquérito policial (CF, art. 129, VIII). A norma constitucional não contemplou a possibilidade do parquet realizar e presidir inquérito policial.Não cabe, portanto, aos seus membros inquirir diretamente pessoas suspeitas de autoria de crime.Mas requisitar diligência nesse sentido à autoridade policial .(STF - RHC 81.326-7 - Relator Ministro Nelson Jobim – D.J. 01.08.2003).40
Em seu voto, o ministro Jobim demonstra que,
historicamente, no direito processual penal brasileiro, as atribuições para realizar
as investigações preparatórias da ação penal têm sido da polícia, pelas mais
diversas razões, as quais têm prevalecido a ponto de todas as iniciativas no
sentido de mudar as regras nessa matéria terem sido repelidas, desde a proposta
de instituir juizados de instrução feita pelo então ministro da Justiça, Vicente Ráo,
em 1935, passando pela elaboração da Constituição de 1988, pela feitura da lei
complementar relativa ao Ministério Público, em 1993, até propostas de emendas
constitucionais em 1995 e 1999, com o objetivo de dar atribuições investigatórias
ao parquet. 41
Desse modo, o ministro Jobim, que foi parlamentar
constituinte, afirma, que a mens legis das normas em vigor é, seguramente, na
direção de manter as investigações criminais como atribuição exclusiva da polícia
judiciária.
Ainda, segundo entendimento, os legisladores constituintes
e ordinários sempre rejeitaram a idéia de transformar o Ministério Público em
“Grande Inquisidor”, reservando a ele o papel superior de controlador/ fiscalizador
das investigações policiais.
40Supremoitribunalifederal.Disponível:http://www.stf.gov.br/Jurisprudencia/It/FrameDown.asp?cla
sse=RHC&Cod_Classe=419&Ementa=2117&Processo=81326&tipo_colecao=EMENTARIO. Acesso em 26-08-06.
41Supremoitribunalifederal.Disponível:http://www.stf.gov.br/Jurisprudencia/It/FrameDown.asp?classe=RHC&Cod_Classe=419&Ementa=2117&Processo=81326&tipo_colecao=EMENTARIO. Acesso em 26-08-06.
-
16
Quanto a competência territorial Acosta atribui que:
A competência para o inquérito é territorial, isto é, resulta do local onde ocorreu à infração, se bem possam existir critérios inerentes à natureza do fato, como nos centros populosos, onde a organização policial prorroga o raio de ação de certos delegados para a repressão de determinados ilícitos penais. 42
Mirabete reforça o ensinamento:
Essa atribuição é distribuída, de modo geral, de acordo com o lugar onde se consumou a infração (ratione loci), em obediência à lei processual que se refere ao “território” das diversas “circunscrições. Embora o Código se refira aos atos da Policia Judiciária em suas respectivas “circunscrições”, não se impede que a autoridade policial investigue uma infração penal cometida em outra, desde que repercuta em sua competência, já que os atos inquisitórios não estão sob a égide do art.5º, LIII, da CF, que se refere apenas ao processo pela autoridade “judiciária” competente. 43
O Código de Processo Penal, em seus artigos 290 e 308,
descrevem que a atribuição para a lavratura do auto de prisão em flagrante é da
autoridade do lugar em que se efetivou a prisão, devendo os atos subseqüentes
ser praticados pela autoridade do local em que o crime se consumou.
No entanto, Lopes Jr., sustenta posicionamento final:
Os atos praticados pela autoridade policial fora de sua circunscrição não são inválidos, mas com espeque em diferente argumento, qual seja, o de que um ato não é nulo, na medida que este não resulte em prejuízo para a acusação ou para a defesa (CPP, art. 563, princípio do prejuízo) ou não influencie na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa (CPP, art. 566), pois se o ato for praticado de outra forma, mas tiver
42 ACOSTA, Walter P.O processo penal. p. 30. 43 MIRABETE, Julio Fabrini. Código de processo penal interpretado. 3 ed. Rio de Janeiro: Atlas,
1995. p.36.
-
17
atingido o fim pretendido pela norma, a irregularidade estará sanada (CPP, art. 572, II; Lei nº 9.099/95, art.65, caput e § 1º).44
A respeito da incompetência relativa, Mirabete relata que “O
Código possibilita, inclusive, diligências da autoridade policial em outra
circunscrição (art.22). De qualquer forma, a incompetência ratione loci é apenas
relativa, não dando margem a nulidade do inquérito policial.”45
Quanto a competência em razão do território, assim entende
o Supremo Tribunal Federal:
Ao expressar que a Polícia Judiciária é exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas jurisdições (rectius: circunscrição), o art. 4º do Código de Processo Penal não impede que a autoridade policial de uma circunscrição (Estado ou Município) investigue os fatos criminosos que, praticados em outra, hajam repercutido na de sua competência [...].46
O Tribunal Superior Eleitoral resolveu que “faltando
autoridade policial federal no distrito da culpa, pode a autoridade policial estadual,
ex-ofício, se couber, autuar em flagrante e conceder fiança, por crime eleitoral,
respeitadas as mesmas restrições, impostas a Polícia Federal.”47
O Supremo Tribunal Federal entendeu, inclusive, que a
autoridade de uma circunscrição é competente para investigar fatos criminosos
praticados em outra, desde que hajam repercutido na de sua competência. 48
Quanto à distribuição de competência por lugar assim
entende Tourinho Filho:
A distribuição da competência, grosso modo, é feita ratione loci, isto é, levando-se em consideração o lugar onde se consumou a
44 LOPES JR., Aury Celso. Sistemas de investigação preliminar no processo penal. Lúmen
Júris. Rio de Janeiro, 2002. 45 MIRABETE, Julio Fabrini. Código de processo penal interpretado, 1995. p. 36. 46 RTJ, 82/118 (STF). 47 Resolução do TSE nº 11,494, de 8-10-82, Rel Min.Carlos Madeira, publicada no Boletim
Eleitoral nº 368, fev./83, ano XXXII, p.76. 48 RTJ 82/118 e RT 584/376 (STF).
-
18
infração. Sabemos que os Estados, para efeito de administração, são divididos em pequenas áreas territoriais denominadas municípios e distritos. Em cada município e até mesmo distrito (dependendo da importância deste) há uma Autoridade Policial para proceder as investigações a respeito de infração penal e sua autoria. 49
Tem-se assim um entendimento de que o inquérito seja
desenvolvido pela Polícia Judiciária, sendo atribuído a Polícia Federal
exclusividade constitucional como Polícia Judiciária. Já com relação a
circunscrição, nada impede que se investigue uma infração penal cometida em
outra, desde que repercuta em sua competência, já que os atos inquisitórios não
estão sob a égide do art. 5º, LIII, da CF, que se refere apenas ao processo pela
autoridade “judiciária” competente.
1.4 PROCEDIMENTOS
As diligências policiais serão, em regra, determinadas pela
autoridade policial, porque as diligências requisitadas pelo Ministério Público e
pelo Juiz são ordens as quais deve aquela autoridade obrigatoriamente cumprir,
conforme estabelece o artigo 13, do Código de Processo Penal “Incumbirá ainda
à autoridade policial [...] II - realizar as diligências requisitadas pelo juiz ou pelo
Ministério Público;” salvo quando forem frontalmente contra a lei, em obediência a
Constituição Federal de 1988, em seu artigo 129: “São funções institucionais do
Ministério Público: [...] VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração
de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações
processuais; [...]”.
As diligências realizadas pela autoridade policial limitam-se
as previstas expressamente em lei e que não ofendam as garantias fundamentais
da pessoa humana consagradas na Constituição Federal e não expressas como
abuso de poder previstas na Lei nº 4.898/65.
49 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, 2005. p. 198.
-
19
Pode a autoridade policial, conforme o art. 240 até o art. 250
do Código de Processo Penal, também determinar ou requerer a busca e
apreensão, que conforme o caso, pode ser: a) No local do crime; b) Domiciliar,
somente possível com autorização judicial, velando-se pelo art. 5º, XI da CRFB.
Entende Mirabete, que “Salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para
prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”50; c) Pessoal,
conforme o art. 244 do CPP, podendo ser realizado com ou sem mandado,
quando a própria autoridade judiciária ou policial realizar a diligência, conforme
Mirabete:
O mandado de busca pessoal deve conter os requisitos já mencionados, mas poderá ela ser efetuada independentemente da ordem escrita nas hipóteses mencionadas no art. 244: no caso de prisão; quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito; ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar. 51
Outras diligências que podem ser empreendidas pela
autoridade policial são: a) Fornecimento às autoridades judiciárias das
informações necessárias a instrução e julgamento do processo com base no art.
13, I do CPP; b) Cumprimento dos mandados de prisão expedidos pela
autoridade judiciária, visto o art. 13, III do CPP; c) A prisão em flagrante, adotado
o art. 301 do CPP; d) A representação junto a autoridade judiciária pela prisão
preventiva conforme os arts. 13, IV e 311 do CPP; e) A representação junto a
autoridade judiciária pela prisão temporária, de acordo com a situação do
indiciado, (Lei nº 7.960/89, art. 2º, caput).
No caso de prisão em flagrante, conforme a Lei 11.113/
2005 inserida no Código de Processo Penal, o preso será apresentado a
autoridade policial competente, que ouvirá este, o condutor colhendo assinatura.
Em seguida procederá a oitiva das testemunhas que o acompanharem e ao
50 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado, 14 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 321. 51 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. p. 323.
-
20
interrogatório do acusado sobre a imputação que lhe é feita, lavrando a
autoridade, ao final, o auto.
De acordo com o disposto no artigo 6º do Código de
Processo Penal, prestada a notícia crime e instaurado o inquérito pela autoridade
policial, esta deverá, empreender as diligências necessárias para demonstrar a
materialidade e a autoria do delito, providência essa que corresponde as
enunciadas na Lei 5970/ 1973.
No que se refere ao objeto, a investigação preliminar deve
ser sumária, limitada qualitativamente e também quantitativamente. O segredo
externo deve ser regra geral, pois assegura o êxito da investigação e preserva o
sujeito passivo da estigmatização social prévia ao processo penal. 52
O art. 175 do CPP confirma que os instrumentos
empregados na prática da infração deverão ser periciados a fim de se lhes
verificar a natureza e a eficiência. Assim é possível determinar ou não a absoluta
impropriedade do objeto, ou seja, se há ou não, no caso, a figura do crime
impossível, disposto segundo a Lei 7209 de 11 de julho de 1984.
Segundo entendimento de Mirabete:
Observados os direitos e garantias individuais previstos na Constituição e nas leis ordinárias, a autoridade policial poderá desenvolver qualquer diligência, incluindo-se evidentemente, a de intimar testemunha, vítima ou suspeito para prestar declarações no inquérito. [...] Por analogia, aplica-se às testemunhas do inquérito policial o disposto nos artigos 202 a 221 do CPP, inclusive a condução coercitiva daquela que deixar de comparecer sem motivo justificado (art.218). 53
Alguns dispositivos do Código de Processo Penal não foram
recepcionados pela Constituição em vigor, pois o ordenamento jurídico vigente
não exige que a pessoa produza provas contra si, em nome dos princípios da
52 LOPES JR., Aury. Sistemas de investigação preliminar no processo penal. p. 333. 53 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. p. 87
-
21
plenitude defesa, consagrado na Constituição Federal, entendendo assim
Mirabete:
O indiciado no inquérito também pode ser conduzido coercitivamente para ser interrogado. Não está, entretanto, obrigado a responder às perguntas que lhe forem feitas, pois é um direito individual assegurado na Constituição Federal vigente o de permanecer calado (art.5º,LXII).54
Para Silva e Duarte:
O silêncio do acusado não pode ser considerado como prova de responsabilidade penal, pois a Constituição Federal deu a todos os acusados o direito de permanecerem calados. A confissão possui valor como mais um elemento no conjunto da prova; isoladamente é um mero indício. 55
Segundo a legislação processual penal brasileira o auto do
interrogatório será subscrito pelo escrivão e assinado pela autoridade policial,
pelo indiciado e por duas testemunhas que tenham apenas ouvido a leitura do
interrogatório, não havendo necessidade de que estas estejam presentes durante
o desenrolar do interrogatório.
Salles Júnior advoga:
Especificamente, no ato do interrogatório policial, tem o preso direito à identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório (LXIV). É evidente que a norma constitucional dirige-se a prevenir prisões arbitrárias, bem como interrogatórios com emprego de métodos condenáveis, como a tortura. Em última análise, fica garantida a identificação daquele que procedeu ao interrogatório ou à prisão, para o caso de eventual apuração de ilícito nessa prática. 56
54 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. p. 89. 55 SILVA, Ayres Luiz Ferreira da, DUARTE, Beatriz Ely. Estudo programado de processo penal.
2 ed. Porto Alegre: Sagra-DC Luzzato, 1994. p. 129. 56 SALLES JÚNIOR, Romeu de Almeida. Inquérito policial e ação penal: indagações, doutrina,
jurisprudência e prática. 7 ed. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 61.
-
22
O Código de Processo Penal, em seu artigo 6º, inciso VI,
dispõe que poderá “proceder a reconhecimento de pessoas e coisas e a
acareações”. No que diz respeito ao reconhecimento de coisas e pessoas, a
autoridade policial, se entender por bem realizá-lo, deverá obedecer ao que está
disposto nos artigos 226 a 228 do Código de Processo Penal, entendendo assim
Mirabete:
O reconhecimento é a identificação de pessoa ou coisa feita na presença da autoridade, estando disciplinado nos artigos 226 a 228 do CPP. A simples referência a identificação ocorrida longe da vista da autoridade deve ser computada como testemunho e como tal regulada. A acareação deve ser realizada quando houver divergências relevantes entre as declarações prestadas no interrogatório, depoimento das testemunhas, declarações da vítima etc., e está disciplinada nos artigos 229 e 230. 57
De acordo com a redação dada pela Lei 10.268 de 28 de
agosto de 2001, havendo acareação entre duas testemunhas, e somente nesse
caso, a autoridade policial deverá advertir as mesmas da possível consumação do
delito de falso testemunho.
Toda vez que a infração deixar vestígios, a autoridade
policial deverá determinar a realização do exame de corpo de delito, atendendo o
disposto no artigo 6º, inciso VII, do CPP. Nesse caso, segundo Mirabete, “deverá
determiná-la consoante o disposto nos artigos 158 usque 184 do Código de
Processo Penal, não podendo tal exame ser suprido pela confissão do indiciado
(CPP, art. 158)”. 58
O exame é de tal importância que segundo Tourinho Filho “A
lei guindou o exame de corpo de delito à categoria de pressuposto processual de
validade, ao salientar, no art. 564, III, b, do CPP, que haverá nulidade se não for
57 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal Comentado. p. 88. 58 MIRABETE, Julio Fabbrini. Código de processo Penal anotado. Atlas, São Paulo, 2000. p.
271.
-
23
feito o exame de corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvada a
hipótese do art. 167”. 59
Todas as perícias sejam ou não relativas ao exame do corpo
do delito, deverão ser obrigatoriamente realizadas por 02 (dois) peritos, sejam
oficiais ou não, isso em conformidade com a Lei 8862 de 28 de março de 1994.
Destacando ainda o parágrafo 2º do artigo mencionado que “os primeiros não
prestam compromisso de bem e fielmente desempenhar a tarefa que lhes tenha
sido atribuída, mesmo porque, quando assumiram o cargo público de perito, já o
prestaram. ” 60
Outro procedimento utilizado no inquérito policial é ordenar a
identificação do indiciado pelo processo datiloscópico, se possível, e fazer juntar
aos autos sua folha de antecedentes, é o que consta no artigo 6º, inciso VII, do
CPP.
É o entendimento do STF: "A identificação criminal não
constitui constrangimento ilegal, ainda que o indiciado já tenha sido identificado
civilmente."
A esse respeito foi editada a Lei nº 10.054/ 2000,
determinando que:
O civilmente identificado por documento original não será submetido a identificação criminal exceto quando:
I - estiver indiciado ou acusado pela prática de homicídio doloso; crimes contra o patrimônio praticados mediante violência ou grave ameaça; receptação qualificada; crimes contra a liberdade sexual ou crime de falsificação de documento público.
II - houver fundada suspeita de falsificação ou adulteração do documento de identidade.
59 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, 2005. p. 250. 60 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, 2005. p. 251.
-
24
III - o estado de conservação ou a distância temporal da expedição de documento apresentado impossibilite a completa identificação dos caracteres essenciais.
IV - constar de registros policiais o uso de outros nomes ou diferentes qualificações.
V - houver registro de extravio do documento de identidade.
VI - o indicado ou acusado não comprovar, em quarenta e oito horas, sua identificação civil.
Outro procedimento é a averiguação acerca da vida
pregressa do indiciado, sob o ponto de vista individual, familiar e social, além de
sua condição econômica, sua atitude e estado de ânimo antes e depois do crime
e durante ele, bem como acerca de qualquer outro elemento que contribua para
definir o caráter e temperamento deste, conforme exposto no artigo 6º, inciso IX,
do CPP.
Queiroz entende que tal dispositivo ofende direitos
constitucionais:
[...] posto que o fato considerado como atinente à vida pregressa do indiciado, ou denotativo de seu caráter, pode não ser assim entendido, se examinado por outra autoridade e, por fim, e pelo mais importante dos motivos, por ofender o princípio constitucional penal da culpabilidade do fato, vez que o presente dispositivo se prende, desnecessária e desproporcionalmente, ao agente e a sua personalidade, em vez de se ater, única e exclusivamente, ao fato punível. Vale dizer, o Direito Penal, auxiliado pelo Direito Processual Penal, deve apurar e punir o fato criminoso e não o agente, pela só circunstância de ser ele quem é (teoria do etiquetamento ou da rotulação).61
Tourinho filho entende que tal procedimento é de suma
importância:
61 QUEIROZ, Paulo de Souza. Do Caráter subsidiário do direito penal. Belo Horizonte: Del Rey,
1998. p. 27/28.
-
25
Tal documento apresenta relevante valor, pois, por meio dele, como vimos, constata-se se o criminoso é ou não reincidente, circunstância relevantíssima para a aplicação da pena, como se pode verificar pelos arts. 61, I e 77, I, todos do CP. 62
Por fim tem-se o artigo 7º, do Código de Processo Penal,
que determina que a autoridade policial possa proceder a reprodução simulada
dos fatos para verificar a possibilidade da infração ter sido praticada de
determinado modo, conforme comentário de Noronha:
Para verificar a possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não contrarie a moralidade ou a ordem pública (art. 7º). É ótimo elemento de convicção para o julgado e garantia de serenidade de quem dirige o inquérito, pois, cercado o ato quase sempre de certa publicidade, demonstra a espontaneidade do indiciado63
Através dos procedimentos, normalmente os indícios são
colhidos pela Polícia Judiciária, encarregada das investigações preliminares.
1.5 INÍCIO DO INQUÉRITO POLICIAL
1.5.1 Notitia Criminis
É com a notitia criminis que a Autoridade Policial dá inicio as
investigações. Assim, tomado ciência de prática infracional, a Autoridade Policial
iniciará a investigação.
De acordo com Mirabete a Notitia criminis é o conhecimento,
espontâneo ou provocado, pela autoridade policial de um fato aparentemente
62 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, 2005. p. 264. 63 NORONHA, E. Magalhães. Curso de direito processual penal. 19 ed. São Paulo: Saraiva,
1989. p.25.
-
26
criminoso. A doutrina, em razão de motivos didáticos, estabelece a seguinte
classificação das notícias crimes:
É espontânea: aquela em que o conhecimento da infração penal pelo destinatário da notitia criminis ocorre direta e imediatamente, quando se encontra a autoridade pública no exercício de sua atividade funcional. [...], pode ocorrer por conhecimento direto ou comunicação não formal (cognição imediata).
Provocada é a notícia do crime a esta transmitida pelas diversas formas previstas na legislação processual penal, consubstanciando-se, portanto, num ato jurídico.[...], por comunicação formal da vítima ou de qualquer do povo, por representação, por requisição judicial ou do Ministério Público etc. (cognição mediata).
Pode também a notícia do crime estar revestida de forma coercitiva, hipótese de prisão em flagrante delito por funcionário público no exercício de suas funções ou por particular.64
Os delitos considerados de menor potencial ofensivo
obedecem ao procedimento determinado no parágrafo único, do artigo 69, da Lei
nº 9.099/95.
Art. 69. A autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência lavrará termo circunstanciado e o encaminhará imediatamente ao Juizado, com o autor do fato e a vítima, providenciando-se as requisições dos exames periciais necessários.
Parágrafo único. Ao autor do fato que, após a lavratura do termo, for imediatamente encaminhado ao juizado ou assumir o compromisso de a ele comparecer, não se imporá prisão em flagrante, nem se exigirá fiança. Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima.
O art. 5º do CPP dispõe:
64 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. p. 81.
-
27
Nos crimes de ação pública, o inquérito policial será iniciado:
I – de ofício;
II – mediante requisição da autoridade judiciária ou do Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo.
Tourinho filho ensina que, se a Autoridade Policial que tiver
o conhecimento da infração, logo examinará se se trata de ação pública ou
privada, sendo pública incondicionada, terá o dever de instaurar o inquérito, de
oficio.
1.5.2 Instauração do Inquérito nos Crimes de Ação Penal Pública
Incondicionada.
Segundo Mirabete, o Inquérito policial no crime de ação
penal pública incondicionada pode ser iniciado de ofício, mediante requisição,
requerimento, ou delação e por auto de prisão em flagrante delito.65
Tourinho Filho entende que:
Autoridade Policial terá o dever jurídico de instaurar o inquérito, isto é, de determinar sejam feitas investigações para se apurar o fato infringente da norma e sua autoria, e isso por iniciativa própria, sem necessidade de qualquer solicitação nesse sentido, vale dizer, de ofício.66
Também pode ser instaurado o inquérito por meio de
requisição (ordem) da autoridade judiciária ou do Ministério público (art. 5º, II,
primeira parte).
65 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. p. 83. 66 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, 2005. p. 214.
-
28
Efetivamente, o art. 5º, inciso II, do CPP, dispõe que nos
crimes de ação pública o inquérito será iniciado mediante “requerimento do
ofendido ou de quem tiver qualidade para representá-lo”.
Pode o inquérito ser instaurado, ainda, pela prisão em
flagrante delito, quando, então, o respectivo auto será a primeira peça do
procedimento.67
Já se sabe que a Autoridade Policial só deverá iniciar o
inquérito “de oficio” nos crimes de ação pública incondicionada. É verdade que o
art. 5º do CPP, fala simplesmente de “crimes de ação pública”, Adiante, no § 4º do
mesmo artigo, dispôs que, se a ação penal depender de representação, sem esta
o inquérito não poderá ser iniciado.
No que concerne a delação anônima, essa “não deve ser
repelida de plano, sendo incorreto considerá-la sempre inválida; contudo, requer
cautela redobrada por parte da autoridade policial, ainda segundo o autor, a qual
deverá, antes de tudo, investigar a verossimilhança das informações.” 68
Convém assinalar, ainda, que, além do ofendido, qualquer
do povo, ao tomar conhecimento da prática de alguma infração penal em que
caiba ação pública incondicionada, poderá comunicá-la verbalmente ou por
escrito, à autoridade policial, e esta, verificando a procedência das informações,
mandará instaurar o inquérito (art. 5º, § 3º, CPP).69
1.5.3 Instauração do Inquérito nos Crimes de Ação Penal Pública
Condicionada.
A instauração do inquérito policial, no presente caso, pode
se dar por uma das formas a seguir aduzidas: 67 MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. São Paulo: Forense,
2002. p. 140. 68 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 85/ 86. 69 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. p. 81.
-
29
Mediante representação do ofendido ou de seu representante legal – de acordo com o artigo 5º, § 4º do Código de Processo Penal, se o crime for de ação pública condicionada à representação do ofendido ou do se representante legal (CPP, art. 24), o inquérito não poderá ser instaurado senão com o oferecimento desta. É a manifestação do princípio da oportunidade, que informa a ação penal pública condicionada até o momento do oferecimento da denúncia (CPP, art. 25). Neste caso, o Ministério Público só poderá requisitar à autoridade policial a instauração de inquérito, se esta estiver acompanhada da representação. 70
Na outra situação, Mirabete esclarece alguns casos em que
a ação penal pública é condicionada, porém depende de requisição do Ministro da
Justiça para sua instauração:
Há casos em que a instauração do inquérito policial depende de requisição do Ministro da Justiça. São as hipóteses de crime cometido por estrangeiro contra brasileiro fora do Brasil (art. 7º, § 3º, b, do CP), de crimes contra a honra do Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro (art. 145, parágrafo único, do CP) ou contra esta e outras autoridades quando praticados através da Imprensa (art. 23, I, c.c. o art. 40, I, a, da Lei de Imprensa).71
Conforme o art. 38, caput, CPP, a representação deverá ser
feita dentro de 6 (seis) meses a partir da data em que a pessoa que estiver
investida do direito de representação vier a saber quem foi o autor do crime.
Pode ser feita pelo ofendido, por procurador com poderes
especiais (art. 39, caput, CPP), e pelas pessoas elencadas pelo art. 31 do CPP,
quais sejam, o cônjuge, ascendentes, descendentes e irmãos, em razão das
normas do parágrafo primeiro, do artigo 24 e do parágrafo único, do artigo 38,
ambos do Código de Processo Penal.
Nesse sentido, é a redação da súmula nº. 594 do Supremo
Tribunal Federal (STF), que estabelece que "os direitos de queixa e de 70 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 2006. p. 86. 71 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. p. 85.
-
30
representação podem ser exercidos, com independência, pelo ofendido ou por
seu representante legal".
A representação configura-se como uma “simples
manifestação de vontade da vítima, ou de quem legalmente a representa, no
sentido de autorizar a persecução penal.”72
1.5.4 Instauração do Inquérito no Caso de Crimes de Ação Penal Privada.
Conforme o disposto no artigo 5º, § 5º, do Código de
Processo Penal, tratando-se de crime de iniciativa privada, a instauração do
inquérito policial pela autoridade pública depende de requerimento escrito ou
verbal, reduzido a termo neste último caso, do ofendido ou de seu representante
legal, isto é, da pessoa que detenha a titularidade da respectiva ação penal (CPP,
art. 30 e 31). Neste caso, nem o Ministério Público, nem a autoridade judiciária
poderão requisitar a instauração da investigação.
Conforme entendimento de Tourinho Filho:
Se o ofendido menor de 18 anos, ou mesmo maior, mas mentalmente enfermo, ou retardado mental, caberá ao seu representante legal requerer a instauração de inquérito e promover posteriormente a queixa, ou, se tiver em mãos elementos que o habilitem a promover a ação penal, poderá ingressar em juízo com a queixa.73
Quanto ao prazo para se requerer a instauração do
inquérito, não possui disposição expressa, porém “o inquérito policial deve ser
instaurado em um prazo que permita a sua conclusão e o oferecimento da queixa
72 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 2006. p.86. 73 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal, 2005. p. 235
-
31
antes do prazo decadencial do art. 38 do Código de Processo Penal,”74 sendo o
prazo estabelecido pelo artigo supra citado de 06 (seis) meses.
Pode o ofendido ou seu representante legal dispensar o
inquérito e ingressar logo em juízo com a queixa. Todavia, para que isso
aconteça, é indispensável possua ele elementos necessários para instruir a ação
penal.75
Já o encerramento do inquérito policial, nos casos de ação
penal privada, é feito da seguinte forma, conforme Mirabete:
Encerrado o inquérito policial, os autos poderão ser entregues ao requerente, se o pedir, mediante translado, ou se não o fizer, deverão ser remetidos ao juízo competente, onde aguardarão a iniciativa do ofendido ou de seu representante legal (art. 19).76
Portanto, na ação penal privada, o inquérito não pode ser
instaurado sem a solicitação de quem tenha qualidade para intentá-la, conforme o
art. 5º, § 5º, do Código de Processo Penal.
1.6 VALOR PROBATÓRIO DO INQUÉRITO POLICIAL
Como instrução provisória, de caráter inquisitivo, o inquérito
policial tem valor informativo para a instauração da competente ação penal.77
A autoridade policial tem por função apenas indicar as
provas ao Juiz-Instrutor, a quem compete colhê-las ouvindo testemunhas e
suspeitos.78
Capez ajuda no entendimento: 74 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 2006.p. 87/ 88. 75 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 2005. p.236. 76 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. p. 86. 77 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. p. 79. 78 MEDEIROS, Flávio Meirelles. Do inquérito policial. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1994.
p. 17.
-
32
O inquérito policial tem conteúdo informativo, tendo por finalidade fornecer ao Ministério Publico ou ao ofendido, conforme a natureza da infração, os elementos necessários para a propositura da ação penal. No entanto, tem valor probatório, embora relativo, haja vista que os elementos de informação não são colhidos sob a égide do contraditório e da ampla defesa, nem tampouco na presença do juiz de direito.79
Reforça o doutrinador que, “se houver uma confissão
extrajudicial, a sua validade como elemento de convicção do juiz só será
observada, caso seja confirmada por outros elementos da instrução processual.”80
Seguindo com o entendimento jurisprudencial:
O inquérito policial é mera peça informativa destinada a formação da opinio delicti do Parquet, simples investigação criminal, de natureza inquisitiva, sem natureza de processo judicial, e, mesmo que existisse irregularidade nos inquéritos policiais, tais falhas não contaminariam a ação penal. Tal entendimento é pacífico e tão evidente que se torna até mesmo difícil discutí-lo.81
Garcia demonstra que há duas correntes doutrinárias a
respeito do verdadeiro valor probatório do inquérito policial:
A primeira defende o ponto de vista de que ele é uma peça meramente informativa, que põe o Ministério Público a par do fato delituoso, não tendo qualquer valor probatório; na formação da opnio delicti encerra sua finalidade. A Segunda corrente admite a possibilidade de o juiz basear o seu livre convencimento em peças do inquérito. Tratando-se de um inquérito bem elaborado, com os atos investigatórios realizados de maneira legal, sem falhas e omissões, o juiz poderá basear-se em peças procedimentais da fase policial, desde que estas não estejam em frontal contradição com as provas colhidas na instrução.82
79 CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 2006. p. 80. 80 CAPEZ, Fernando, Curso de Processo Penal. 2002. p.76. 81 STJ, 6ª T., rel. Min. Pedro Acioli, DJU, 18 abr. 1994, p.8525. 82 GARCIA, Ismar Estulano. Procedimento policial: inquérito. 9. ed. Goiânia: AB, 2002. p.11.
-
33
Mister se faz não esquecer que o inquérito não é um
instrumento de acusação e, sim, uma investigação destinada ao descobrimento
da verdade.83
Cogan, citado por Mirabete, explica qual a influência do
inquérito policial no convencimento do juiz:
O conteúdo do inquérito, tendo por finalidade fornecer ao Ministério Público os elementos necessários para a propositura da ação penal, não poderá deixar de influir no espírito do juiz na formação de seu livre convencimento para o julgamento da causa.84
É preciso, pois, que o juiz tenha confiança na sinceridade
dos funcionários policiais, em seu amor à verdade, para que possa crer na
exatidão das observações que, não podendo constar dos autos, constam do
relatório.85
De acordo com o princípio do livre convencimento que
informa o sistema processual penal, as circunstâncias indicadas nas informações
da polícia podem constituir elementos válidos para a formação do convencimento
do magistrado.
Aranha, porém, alerta para uma eventual fundamentação
exclusiva na investigação preliminar:
Certamente, o inquérito serve para colheita de dados circunstanciais que podem ser comprovados ou corroborados pela prova judicial e de elementos subsidiários para reforçar o que for apurado em juízo. Não se pode, porém, fundamentar uma decisão condenatória apoiada exclusivamente no inquérito policial, o que contraria o princípio constitucional do contraditório.86
83 ESPINDOLA FILHO Eduardo. Código de processo penal brasileiro anotado. Rio de Janeiro:
Borosi, 1965. p. 265/ 266. 84 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado.p. 79/ 80. 85 MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 22. 86ARANHA, Adalberto José Q.T. de Camargo. Da prova no processo penal. 2 ed. São Paulo:
Saraiva, 1987. p. 184.
-
34
Esse é o posicionamento espelhado pelo Supremo Tribunal
Federal:
Não se justifica decisão condenatória apoiada exclusivamente em inquérito policial, pois se viola o princípio constitucional do contraditório.87
Eventuais vícios concernentes ao inquérito policial não têm o condão de infirmar a validade jurídica do subseqüente processo penal condenatório. As nulidades processuais concernem, tão-somente, aos efeitos de ordem jurídica que afetam os atos praticados ao longo da ação penal condenatória.88
Todavia, Nogueira citado por Mehmeri, entende que “não se
pode ser extremista, negando validade ao inquérito policial só porque o acusado
retratou em juízo sua confissão, ou porque alguma testemunha deixou de
confirmar suas declarações policiais.”89
Boshi faz uma apreciação do valor das provas no inquérito
policial:
O inquérito policial, efetivamente, não pode ser considerado a priori destituído de qualquer valor. Basta lembrar, em apoio ao que ora afirmamos, que em seu interior são produzidas as chamadas provas “pré constituídas” (perícias) contém em si maior dose de veracidade, visto que nelas preponderam fatores de ordem técnica, que, além de mais difíceis de serem deturpadas, oferecem campo para uma apreciação objetiva e segura de suas conclusões”.90
87 STF - RTJ 59/786 88 STF, 1ª T., rel. Min. Celso de Mello, DJU, 4out. 1996, p. 37100. 89 MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 23. 90BOSHI, José Antonio Paganella. Persecução penal; inquérito policial, ação penal e
ministério público. Rio de Janeiro: Aide, 1987. p. 124.
-
35
Nogueira citado por Mehmeri, expõe que “o inquérito policial
é, assim, uma peça de relativo valor, que deve ser examinado no seu todo, em
face ao conjunto probatório, e não apenas com referência a determinada prova.”91
O inquérito policial termina por transformar-se em peça de
dois pesos e duas medidas: tem valor nas provas periciais, fornece base para o
oferecimento da denúncia e orienta esta na fixação do tipo penal aplicável.92
Ademais, segundo as estatísticas, constata-se que 99,9%
dos condenados pelo Poder Judiciário, em todo o Brasil, tiveram o início pela
information delict, oferecida pelo Inquérito Policial. A veracidade de tal assertiva
poderá ser constatada em qualquer fórum do país.93
Conforme análise, tem-se que o Inquérito policial é um
procedimento administrativo informativo, possui um valor probatório relativo, o que
decorre do fato de as informações não serem obtidas com a garantia do
contraditório, da ampla defesa, publicidade, nem diante de autoridade judicial, ou
seja, não se pode fundamentar uma decisão condenatória apoiada
exclusivamente no inquérito policial, senão restariam contrariados os princípios do
contraditório e da ampla defesa.
91 MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 23. 92 MEHMERI, Adilson. Inquérito policial: dinâmica. p. 22. 93 BERNARDO, Moacir Fermino, SANTANA, Alonir Santana. Perigo do Quarto Poder. Porto
Alegre: Sagra DC Luzzatto, 1994. p.86.
-
36
CAPÍTULO 2
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS NO PROCESSO PENAL
2.1 INTRODUÇÃO
Inicialmente o referente capítulo busca exatamente esmiuçar
esse caráter que fundamenta o jus puniendi estatal, qual seja os princípios
constitucionais no processo penal.
Conjuntamente é apresentado a conceituação e o objetivo
que tais princípios apresentam, correlacionados com a instrução investigatória,
ressaltando seus caracteres básicos e seu valor probante.
Segundo Valdéz, os princípios podem ser definidos como a
base, o fundamento, a origem, a razão fundamental sobre a qual se discorre
sobre qualquer matéria. Trata-se de proposições mais abstratas que dão razão ou
servem de base e fundamento ao Direito. Trata-se de um enunciado amplo, que
permite solucionar um problema e orienta um comportamento resolvido num
esquema abstrato através de um procedimento de redução a uma unidade da
multiplicidade de fatos que oferece a vida real.94
O capítulo procurará mostrar que o Inquérito Policial integra
a fase extraprocessual, porém não deixa de seguir ritos constitucionais, por
exemplo, os princípios da igualdade, do estado de inocência, do devido processo
legal, do contraditório e ampla defesa, da verdade real, e tantos outros,
positivados, também no Código Instrumental.
94BECHARA, Fábio Ramazzini; CAMPOS, Pedro Franco de. Princípios constitucionais do
processo penal: questões polêmicas. Escritório Online, São Paulo, 06 mar. 2005. Disponível em: . Acesso em:16 set. 2006.
-
37
Harmonizada com a onda democrática que fez navegar os
trabalhos do Congresso Constituinte de 1987/1988, a base acusatória do
processo penal instaurada pelo texto político pode ser encontrada em vários
momentos.95
É significativa a posição de que não há de se falar em
devido processo legal no inquérito, justamente por ser um procedimento
inquisitivo e ainda não existir um efetivo processo penal, senão veja-se:
A Constituição de 1988 traz em seu bojo, sobretudo no art. 5º, um rol considerável de instrumentos de refreamento do poder estatal em face da liberdade individual, conjunto de garantias que podem ser genericamente entendidas como as mínimas condições para a estruturação de um devido processo legal.96
Para o exercício da ação penal pública estão presentes os
princípios da obrigatoriedade e da indisponibilidade, mas apenas a disponibilidade
está em sede constitucional, com a previsão da transação penal ( art. 98, I, da
Constituição), estando a obrigatoriedade expressamente prevista apenas no
Código de Processo Penal.97
Segundo as formas com que se apresentam e os princípios
que os informam são três os sistemas processuais utilizados na evolução histórica
do direito: o inquisitivo, o acusatório e o misto.98
Salas, citado por Choukr, faz uma distinção cerca dos
sistemas processuais utilizados:
Compreende-se a distinção entre os modelos inquisitivo e o acusatório do processo penal, como a separação nítida de papéis entre acusador, julgador e defensor, além de conferir ao acusado
95 CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo penal à luz da constituição. Bauru: Edipro, 1999. p. 18. 96 CHOUKE, Fauzi Hassan. Garantias constitucionais na investigação criminal. p. 73. 97 CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo penal à luz da constituição. p. 20. 98 MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo penal comentado. 14 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p 40.
-
38
um status diferenciado, como titular de direito e não objeto da persecução.99
A idéia neste texto é de oferecer elementos para a melhor
compreensão de princípios constitucionais implicando assim no entendimento
ponto chave da questão, qual seja, a interpretação constitucional encontrada na
fase policial.
Segundo Bechara, as características dos princípios
constitucionais podem ser resumidas em:
a) idéias cardinais que constituem a origem ou o fundamento do Direito;
b) estão dotadas de um alto grau de generalidade;
c) gozam de grande compreensão no âmbito jurídico;
d) pertencem as mais amplas formulações do Direito;
e) não requerem necessariamente formulações, mas, se estiverem formuladas, seu lugar mais lógico são as proposições normativas mais abstratas do ordenamento.100
Pode-se observar que a Constituição não se preocupou com
a criação de uma ordem para os princípios, espalhando-os de forma aleatória,
principalmente ao longo do art. 5º.
Nessa perspectiva, inserem-se os princípios constitucionais,
inclusive, em relação a sua incidência no Processo Penal, determinando suas
premissas básicas e condicionando seus autores a consecução dos seus fins.
99 CHOUKR, Fauzi Hassan. Processo penal à luz da constituição. p. 62. 100 BECHARA, Fábio Ramazzini; CAMPOS, Pedro Franco de. Princípios constitucionais do
processo penal: questões polêmicas. Escritório Online, São Paulo, 06 mar. 2005. Disponível em: . Acesso em:16 set. 2006.
-
39
2.2 PRINCÍPIO DA IGUALDADE
Este princípio, sem dúvida é um dos mais importantes para
uma nação que vislumbra justiça, ensinando Capez que é o desdobramento do
princípio consignado na Constituição Federal, em seu artigo de maior importância,
qual seja o art. 5º, caput, informando que todas as pessoas são iguais perante a
lei.”101
Já, no Processo Penal as expressões legais de tal
prevalência são os textos dos artigos 386, VI, 607, 609, parágrafo único, e 621 e
seguintes.
Como forma de assegurar a todo e qualquer indivíduo o
direito de um processo justo e isonômico que também encontrou, o due process
of law, guarida na Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, tendo
como redação que toda pessoa tem direito, em condições de plena igualdade, de
ser ouvida publicamente e com justiça por um tribunal independente e imparcial,
para a determinação de seus direitos e obrigações ou para o exame de qualquer
acusação contra ela em matéria penal.
No processo, as partes, embora figurem em pólos opostos,
situam-se no mesmo plano, com iguais direitos, ônus, obrigações e faculdades. É
uma conseqüê