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ditorial

“Temos uma proposta de Universidade integrada ao projeto de sociedade que tem no trabalhador a sua referência”

O relato dos fatos deve espelhar a concretude do real, de onde pro-

vêm os elementos que possibili-tam a reflexão e a elaboração de novos passos. Nada a acrescentar

que não seja estritamente o ne-cessário à compreensão do fato que fale por si mesmo.

No século XX, com o adven-to da civilização de massas, foi introduzido o gosto pelo espe-táculo com ampla participação da multidão. Vieram também as mais variadas formas de co-municação. E o propagar, além de uma estratégia de marketing, tornou-se uma ferramenta para aqueles que detêm o poder e vastos recursos, com o objetivo de conquistar a massa para a proposta de poder como parte da manutenção do projeto so-

Universidade pública:um bem social para a liberdade e a democracia

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cial dominante. Seu objetivo é incorporar, não importa a que preço.

O projeto em voga, levado adiante pelo governo, passa pela rede do capital, articulado com o antigo liberalismo, hoje rebatizado como neoliberalis-mo. Esse dissemina-se em todo o mundo como globalização adaptada sincreticamente em todas as partes, sem perder o seu caráter central de dinâmica do capital.

Nessa linha em voga, que é ditada pelos organismos finan-ceiros internacionais, privilegia--se a quantidade, o número, o mesmo apresentado múltiplas vezes, sem a preocupação com a qualidade ou com o como re-percutirá para as gerações futu-ras. A preocupação é o sucesso do momento porque nele está a garantia da manutenção do poder.

Tomando a Educação como referência, é conhecido que, desde os anos sessenta do sé-culo XX, com os militares no poder, teve início o processo de expansão maciça do ensino privado, que hoje corresponde à maioria dos estabelecimentos de Ensino Superior no Brasil.

A Educação Superior Pú-blica manteve-se, porém, com dificuldades, resistindo às investidas dos que queriam transformá-la em domínio do privado, e, ao mesmo, tempo consolidou-se como um modelo de educação responsável pela

maior parte das pesquisas e da extensão do País. Quis mais e conseguiu ter a sua autonomia reconhecida na Constituição brasileira, firmando-se como centro de referência da educação superior. Esse trabalho deve ser tributado aos inúmeros profes-sores, técnico-administrativos e estudantes, que têm lutado pela Universidade Pública brasileira.

Nos anos seguintes, a Uni-versidade viu seus quadros de professores serem sucateados pouco a pouco, dando lugar ao grande número de professores substitutos, bem próximos da condição de trabalho preca-rizado. Além disso, direitos conquistados foram sendo po-dados na primeira reforma da previdência e na supressão de outros direitos com alterações significativas no Regime Jurí-dico Único (RJU). Ademais, foram introduzidos mecanismos de avaliação quantitativa, dando início ao processo de descarac-terização mais profunda da car-reira docente.

As ações de confronto com os componentes da Universida-de Pública e Gratuita tornaram--se mais densas na primeira década do milênio. A reestrutu-ração da universidade e o siste-ma nacional de avaliação, além de desrespeitarem a autonomia da Universidade, puseram sob suspeita o trabalho do professor e a produção da Universidade. Por um lado, os mecanismos propostos na Reforma Universi-

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tária, mesmo sem que tivessem sido formalmente aprovados, foram sendo, pouco a pouco, implantados na direção de uma Universidade gerencial, da produção a qualquer custo, da competição individual, enfim, na direção de uma Universidade de resultados.

Por outro lado, a posição de largueza e tolerância do go-verno, praticada durante anos em relação ao setor privado, expandiu-se com a propaga-ção do Educação a Distância (EAD) e, tendo como justifi-cativa a expansão de vagas, foi criado o Programa Universidade para Todos (Prouni), arsenal de sustentação de empresas educacionais com dificuldades financeiras. Como coroamento dessas ações, tomou a frente da política governamental o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), tendo como objetivo a expansão de vagas e o aumento acelerado da oferta de cursos, com o crescimento acentuado da relação aluno–professor. Reduziu-se o conceito de Uni-versidade a prestadora de servi-ços, atividade estendida também às outras entidades de ensino superior como os Institutos Fe-derais IFs. Às instituições pú-blicas pressionadas não restava outro caminho senão aderir. A outra opção seria continuar na dependência do governo para atender as suas demandas. Daí

o sacrifício da autonomia para obter os recursos que o gover-no, normalmente, está obrigado a conceder.

Essa expansão galopante, muitas vezes atabalhoada, criou uma nova realidade, de diversos campi que foram se reprodu-zindo como cogumelos, sem ter requisitos importantes para atender aos estudantes e aos professores, para favorecer o en-sino, a pesquisa e a extensão, e, em muitos casos, sem professo-res suficientes para desenvolver os cursos novos que se torna-ram mais precários ainda. Após cinco anos de Reuni, ainda está por se completar a reposição do quadro de professores, esvazia-do nos últimos trinta anos em decorrência da política governa-mental.

A renovação de quadros ini-ciada, o contato dos professores antigos e novos com essa reali-dade criada, diferente do propa-lado, o estresse dominante pela sobrecarga de trabalho, deram a dimensão do real significado do projeto governamental, um projeto de ajuste com o mer-cado. A introdução de outro fator contribuiu para salientar o significado desse momento: a reorganização da carreira do-cente nos moldes pretendido pelo governo.

A mobilização crescente dos professores culminou na maior greve do setor dos docentes das Instituições Federais de Ensino (IFE), a que se somaram, com

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seus movimentos específicos, técnico-administrativos e estu-dantes.

A paralisação, tendo como eixos centrais de reivindicações a Carreira Docente e Condições de Trabalho, durou 124 dias e reuniu sob a direção do AN-DES-SN a esmagadora maioria das instituições em greve.

A proposta do governo foi rejeitada unanimemente pelo movimento grevista. Contudo, mesmo não tendo sido alcan-çada a carreira única nem o atendimento da reivindicação de condições de trabalho, a maioria das assembleias avaliou que não havia condições de continuar a greve, optando por resguardar o acúmulo de forças, manten-do o estado de mobilização na perspectiva de continuar tra-balhando pelas reivindicações apresentadas. Ou seja, aprofun-dar o processo de retomada da dinâmica de luta pela universi-dade pública e gratuita, local e nacionalmente.

O governo, para justificar sua proposta, aliou-se a setores minoritários, sempre buscando quebrar a unidade dos professo-res em luta. Além disso, refor-çou a sua propaganda oficial no sentido de que atendeu além do que foi pedido pelos docentes e fez o máximo pela educação pública, ocultando da socie-dade que os professores estão insatisfeitos e são contrários ao tratamento que é dado à edu-cação em detrimento do rol de

vantagens concedidas a outros setores, principalmente àqueles que dizem respeito às finanças e outros interesses para angariar apoio e sustentação do poder.

O motivo da publicação des-te Dossiê Denúncia nº 3 – Pre-carização do Trabalho Docente não visa a propagandear, não temos poder nem recursos para tal. O objetivo é tão somente contar como vivem e fazem o seu trabalho, professores e pro-fessoras, das IFE. Muito menos é uma versão dos fatos. Quere-mos, simplesmente, revelar em que condições o ensino, a pes-quisa e a extensão se desenvol-vem nas IFE do nosso País.

Longe dos centros de reno-me, surgem realidades diferen-tes em que se realizam esforços sobre-humanos para formar estudantes e educar jovens para a vida, produzir conhecimento, técnica, arte e cultura. Quere-mos expor essa realidade e rea-firmar que temos uma proposta de Universidade integrada ao projeto de sociedade que tenha no trabalhador a sua referência.

É necessário que se busque no conjunto de forças sociais o apoio para que se fortaleçam as estruturas da universidade pública e gratuita. Sobretudo, para que se exerça forte pres-são sobre o governo para que cumpra a obrigação de sustentá--la, expandi-la e, efetivamente, democratizá-la como bem social fundamental para a liberdade e para a democracia.

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xpedienteDiretoria do mandato 2012-2014

Coordenação editorial: Luiz Henrique Schuch e Marinalva Silva Oliveira

Coordenação de reportagem, edição e texto final: Carla Lisboa (Registro Profissional: 1635/DF)

Reportagem: Carla Lisboa, Fábio Carvalho, Fátima Xavier, Fred Oliveira, João Negrão, Keka Werneck, Max Costa, Paulo Otávio Pinho, Rodrigo Ricardo

Projeto gráfico e diagramação: Ronaldo Alves (RP: 5103/DRT-DF)

Ilustrações: Ricardo Borges

Fotografias: Arquivo/ANDES-SN (Dossiês)

Tiragem: 30.000 exemplares

Gráfica: Coronário Editora Gráfica Ltda SIG QD 06 LOTES 2340/70 – 70610-460 – Brasília-DF Fone: (61) 3038-1012 – Fax (61) 3038-1050 [email protected] - www.coronario.com.br

Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN)Setor Comercial Sul (SCS) – Quadra 2 – Bloco C – 5º Andar – Edifício Cedro IICEP 70.302-914 – Brasília – Distrito FederalTelefone: (61) 3962-8400 – Fax: (61) 3224-9716Endereço eletrônico: [email protected]ília-DF, abril de 2013

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umário

8 Novas reitorias abrem muitas questões do período Reuni: expansão da UFPEL sob suspeita

22 Precarização dos cargos para sustentar expansão sem planejamento

35 Precariedades pra lá de físicas

40 Más condições de trabalho afastam docentes dos campi do interior

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45 ‘Penduricalhos’ disfarçam péssima remuneração dos docentes

51 Universidade Federal Fluminense, o retrato das más condições da infraestrutura

59 Reuni causou modificação negativa no ethos acadêmico

73 Programas correlatos ao Reuni acirram precarização

84 Vagas nas universidades públicas: expansão versus precarização

99 No Sul, o exemplo nacional de uma expansão improvisada

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Novas reitorias abrem muitas questões do período Reuni: expansão da UFPEL sob suspeita

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Paulo Otávio Pinho

Jornalista

Pelotas/RS

Investigar as contas da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) foi

uma das primeiras ações do reitor Mauro Del Pino, eleito em 2012 para dirigir a insti-tuição. O reitor, que tomou posse em janeiro deste ano, anunciou, numa entrevista coletiva concedida em março, um rombo de R$ 5,3 milhões no caixa da instituição. Ele disse que a descoberta desse recurso foi resultado da in-vestigação das contas da Fun-dação Simon Bolívar (FSB) e que o dinheiro, que deveria ter sido aplicado em projetos ou estar no cofre da funda-ção, desapareceu.

Encontrar esses recursos financeiros públicos e explicar

o desaparecimento é um dos desafios que a nova gestão terá de empreender para atender ao pleito da comunidade uni-versitária que o elegeu para implantar a transparência e outros requisitos constitu-cionais e administrativos. As lideranças sindicais da Asso-ciação dos Docentes da UFPel (ADUFPel) vê mais do que um desafio: “a nova reitoria tem sob sua responsabilidade a efetivação de uma nova lógi-ca de gestão”, dizem.

Há um consenso na comu-nidade universitária de que esse novo modelo de gestão terá de dar conta da elucida-ção de várias ações realizadas sem transparência, como, por exemplo, a adesão ao Progra-ma de Apoio a Planos de Res-tauração e Expansão das Uni-versidades Federais (Reuni).

Assim como outras Insti-

tuições Federais de Ensino (IFE) do País, a de Pelotas assinou o acordo de metas com um dos maiores per-centuais de compromissos de criação de vagas e, para piorar, prometeu criá-las logo nos primeiros anos do Reuni. Com esse acordo, a UFPel tornou-se um exemplo emblemático também do que ocorreu com outras IFE, que somente com a derrota da reitoria anterior conseguiram implantar gestões que desco-briram e revelaram todo tipo de irregularidades.

“Graças à chegada de uma nova equipe na reitoria que muitas irregularidades vieram à tona, muitos dos verdadeiros (des caminhos guardados nos bastidores durante o processo de inserção do Reuni”, avalia o professora da UFPel e pri-meiro vice-presidente do Sin-

Período em que vigorou o programa se tornou pauta do Conselho Universitário, objeto de investigação e motivo da luta por gestão transparente Deterioração dos equipamentos aprofunda precarização

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dicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino de Superior (ANDES-SN), Luiz Henrique Schuch.

Na instituição federal de Pelotas, a adoção do acordo abriu espaço para ampliações duvidosas e para uma série de denúncias contra o ex-reitor César Borges, que criou a FSG e assinou o acordo de metas. Suspeito de ter cometido vá-rias irregularidades, ele foi denunciado pelo Ministério Público Federal e acusado de ter comprado por R$ 12 mi-lhões um imóvel que custou R$ 700 mil à Simon Bolívar. A Fundação teria adquirido e revendido o imóvel à UFPel no mesmo dia por um preço 17 vezes superior.

Círculo vicioso Aliás, transparência, legali-

dade, impessoalidade, morali-dade, publicidade e eficiência são justamente os critérios constitucionais que faltaram nos procedimentos de elabo-ração e assinatura dos acordos de metas firmados entre as universidades e o governo fe-deral. Nem na implantação do projeto, que o governo dizia que era por livre adesão, nem sequer houve discussão com a comunidade universitária para implantação ou não do Reuni.

A UFPel, uma das mais importantes universidades fe-derais do Rio Grande do Sul, e todas as outras universidades que aderiram ao Reuni com a assinatura do acordo assumi-

ram o compromisso de atingir as metas globais do Reuni consideradas exorbitantes, ou seja, a elevação gradual da taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais para 90% e da relação de alunos de graduação em cursos pre-senciais por professor para 18 (1/18), ao final de cinco anos, a contar do início de cada pla-no” (§ 1º do art. 1º do Decre-to nº 6.096).

O acordo estabelecia tam-bém que ao MEC cabia a definição dos parâmetros de cálculo desses indicadores. A adesão ao programa era voluntária por parte de cada Instituição Federal de En-sino (IFE), por decisão do respectivo Conselho Univer-sitário. Cada IFE que assinou o acordo previu, no seu plano as ações, o cumprimento des-sas duas metas. Em contra-partida, receberia recursos adicionais condicionados ao cumprimento das metas es-tabelecidas para cada etapa, limitado a 20% do orçamento de custeio e pessoal do ano inicial de adesão e no prazo de cinco anos. Esse finan-ciamento era condicionado à capacidade orçamentária e operacional do MEC.

Contudo, as duas metas que condicionaram todos os projetos apresentados no Reuni foram consideradas, pelos docentes que elaboraram análise sobre o programa por

Estudantes sofrem com sucateamento promovido pelo ReuniA

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intermédio do ANDES-SN, incompatíveis com padrões de qualidade de ensino aceitáveis. Na época do lançamento, os professores da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Claudio Antonio Tonegutti , do Departamento de Quí-mica, e Milena Martinez, do Departamento de Ciências Sociais, realizaram um estudo sobre o decreto e afirmaram que o Reuni “ia aprofundar a precarização do trabalho docente e ferir, na sua concep-ção, a autonomia universitária ao impor padrões que são da competência acadêmica das Universidades”.

A previsão aconteceu. Na UFPel, uma das IFE que se comprometeram com uma elevação exorbitante de va-gas, a expansão tornou-se um problema e foi um dos temas da primeira Reunião do Con-selho Universitário (Consun) na gestão da nova reitoria, realizada no dia 25 de janeiro deste ano. Nessa Reunião, foram anunciadas soluções para problemas criados ou aprofundados pelo Reuni e que incomodam a comunidade acadêmica.

O que aconteceu é que na assinatura do acordo, em 2007, várias instituições foram beneficiadas pela “ne-gociação final das grandes universidades com o governo”, em que se introduziu o fator de correção relacionado à pós-

-graduação. Essa negociação, que para algumas significou uma virada porque teve en-trada de recursos financeiros, para outras, consideradas beneficiadas, não teve o mes-mo significado. É o caso de grandes instituições, como a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), que não se comprometeram com a expan-são e, todavia, receberam o dinheiro.

“Essa realidade foi deci-siva para minar a resistência das universidades a entrar no Reuni. E ainda por cima, as que não foram beneficiadas com isso e tiveram de assinar o acordo com o compromisso de instituir metas exorbi-tantes, entraram em um tal ciclo vicioso que, quando os reitores se dão conta de que é impossível responder às metas, especialmente porque faltam professores, eles, ‘es-pontaneamente’, criam outros cursos para pôr no Ministério da Educação (MEC) como justificativa para pedir mais docentes. Assim, o buraco vai aumentando”, denuncia o pro-fessor Luiz Henrique Schuch.

Nova perspectiva A UFPel tem um orça-

mento global que supera o do município que a sedia, mas não fugiu à regra nacional e trouxe à pauta as questões

controvertidas do Reuni, por meio de seus diversos seg-mentos e entidades represen-tativas. Atualmente, a UFPel vive uma nova perspectiva, a partir da eleição de um novo modelo administrativo pela comunidade acadêmica. A nova reitoria que, assumiu a universidade em janeiro de 2013 e tem como principal mote a gestão democrática, tem o compromisso de pro-mover maior transparência e participação da comunidade universitária no trato das questões do Reuni.

Há promessas de solução para todos os contratempos, obstáculos e dificuldades. A distribuição de vagas docentes e de técnico-administrativos, o fim dos contratos dos pro-fessores temporários, os tra-balhadores contratados pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a situação das fundações privadas de apoio à pesquisa foram alguns dos temas levados à primeira Reunião do Consun pela ad-ministração central, que assu-miu a instituição no dia 11 de janeiro de 2013.

Nos primeiros dias da nova gestão foi realizado um levantamento e elaboradas propostas de solução emer-gencial para os problemas mais sérios e emergenciais da universidade, como, por exemplo, a falta de critérios na distribuição de pessoal.

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Na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), há um consenso na comunidade acadêmica de que os dirigentes eleitos no ano passado terão de implantar gestão transparente

Na UFPel, novo reitor pretende abrir vagas para docentes e técnicos

O reitor Mauro Del Pino garantiu que os grandes temas serão debatidos no Consun de forma transparente e par-ticipativa e seus resultados nortearão os próximos quatro anos. Segundo ele, ao con-trário da gestão autoritária e obscura que prevaleceu até o ano passado, a nova reitoria vai propor a elaboração de um calendário mensal de Reuni-ões do Consun.

Na primeira Reunião, segundo apurado pela re-

portagem da Revista Dossiê Denúncia, foi abordado o problema das vagas docentes e apresentado um levantamento da distribuição de vagas de professores por unidade. “A ideia é construir uma matriz de vagas, tanto de docentes quan-to de técnico-administrativos”, explicou o reitor.

Apesar de um estudo reali-zado nas duas primeiras sema-nas após a posse, a nova reito-ria não conseguiu identificar os critérios de distribuição feitos

nos últimos tempos. “Não fa-remos distribuição de docentes sem critérios”, garantiu Del Pino. A informação vinda do governo federal dá conta de que não há garantia de novas vagas para 2013.

O quadro da distribuição de técnico-administrativos é ainda mais preocupante. Na UFPel, há um técnico para cada 21 estudantes, quando a meta do Reuni seria a de ter, até 2014, um para cada 15 alunos. “Prio-rizaremos esta questão nas ges-

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tões que serão apresentadas ao MEC”, disse o reitor.

Vazio funcional Os gestores da nova admi-

nistração afirmam que enfren-tam dificuldades para agilizar o trabalho em virtude da falta de pessoal em setores vitais, como, por exemplo, no próprio gabinete da reitoria e nas pró--reitorias. Apesar do compro-misso com o acordo de metas e da expansão, a administração anterior desmontou as equipes

e esvaziou setores estratégicos da reitoria.

Para isso, realizou um grande número de remoções de servidores da reitoria para uni-dades acadêmicas e também da UFPel para outras instituições, bem como afastamentos de ser-vidores. A ação criou um vazio funcional que prejudicou os primeiros dias da nova admi-nistração eleita. Para resolver o problema, o Del Pino convocou servidores de outros setores da universidade para recompor as equipes de trabalho da reitoria e avisou às direções das unida-des acadêmicas que em breve irá resolver a situação inicial das unidades para que não haja prejuízos.

TemporáriosQuanto aos docentes tempo-

rários, os levantamentos feitos revelaram também a falta de critérios na distribuição. Mas o problema mais emergencial é fim do contrato desses docen-tes, em 28 de fevereiro. Até o fechamento da edição da Revis-ta Dossiê Denúncia, os contra-tos não seriam prorrogados.

Isso somente poderia ser feito por projeto de lei ou por medida provisória. A solução emergencial da administração foi orientar as direções das unidades acadêmicas a reor-ganizarem a carga horária das disciplinas para terminarem até o dia 28. O reitor lembrou que o retardamento dos con-

cursos na UFPel agravou ainda mais a situação.

CeletistasA UFPel é a única uni-

versidade federal do País que tem trabalhadores contratados pela Consolidação das Lei de Trabalho (CLT) em unidades acadêmicas, o que é totalmente vetado pelo Tribunal de Con-tas da União(TCU). Até o fe-chamento da edição da Dossiê, estava definido que o período de atuação do pessoal celetista seria prorrogado até 28 de fe-vereiro de 2013.

Os celetistas atuam nos projetos Modernização, Pistas e Pires (Restaurante Escola) e na Agência da Lagoa Mirim. Na Reunião do Consun, ficou decidido que reitoria iria ao TCU, em Porto Alegre, para relatar os danos irreparáveis que a saída desses trabalha-dores causaria, se o prazo se cumprisse.

Dentre os prejuízos, seriam atingidas as barragens Eclusa do São Gonçalo e do Chas-queiro, o Restaurante Escola e o Núcleo de Reabilitação da Fauna Silvestre (Nurfs). A ideia era a de que os funcioná-rios ficassem até que a univer-sidade contratasse prestadoras de serviços que assumissem essas rotinas. Ao longo do ano, novos servidores, oriun-dos de concursos públicos, substituiriam os atuais traba-lhadores CLT.

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Na Universidade Federal de Pelotas (UFPel), há um consenso na comunidade acadêmica de que os dirigentes eleitos no ano passado terão de implantar gestão transparente

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A nova reitoria deverá também Reunir com os diretores de unidades acadêmicas para apresentação de dados mais detalha-dos e precisos sobre a situação da institui-ção. Um dos assuntos a serem tratados é a relação da universidade com as fundações privadas vinculadas à UFPel.

A atual gestão analisou o problema das fundações vinculadas à universidade e garantiu que a situação é preocupante. Segundo Del Pino, é uma relação marcada por graves problemas nas três entidades. “O Consun não tem o controle das funda-ções”, reclamou o reitor.

Segundo ele, a Fundação Simon Bolí-var está descredenciada e a Fundação Del-fim Mendes Silveira funciona por meio de uma liminar, que pode ser derrubada a qualquer momento. Diante do quadro de irregularidades, a orientação da reitoria foi para que todo novo projeto fosse enca-minhado à Fundação de Apoio Universi-tário (FAU).

Uma nota emitida pela diretoria do ANDES-SN, em 2009, já com os planos de reestruturação e expansão em curso nas universidades que aderiram ao programa, dava conta da preocupação dos dirigentes sindicais com a falência da execução do programa de Norte a Sul do País.

Na nota, a diretoria alertou as comuni-dades universitárias para o risco de o in-cremento indiscriminado dos índices quan-titativos – aumento do número de vagas,

ampliação de ofertas de cursos, diplomação em tempo reduzido, aumento de cursos noturnos, entre outros – representarem a “o rebaixamento adicional da qualidade socialmente referenciada que deveria carac-terizar a educação universitária”.

A discussão da qualidade da educação universitária associada aos propósitos de expansão propagados pelo Reuni abarca uma gama de questões correlatas, que tem mobilizado polêmicas em diferentes fóruns por todo o País.

Nesse sentido, têm sido recorrentes as discussões sobre a definição democrática das prioridades de investimento e gestão de recursos, as condições de trabalho e carreira docente diante da expansão de ofertas de cursos e número de matrículas, a reestruturação pedagógica vinculada aos mecanismos de expansão, dentre outros temas implicados na implantação do Reuni ao longo de sua vigência.

A chapa do atual reitor, Mauro Del Pino, vencedora da eleição no ano passado, chamava-se Reconstrução. Afinal, o cená-rio da UFPel em relação ao Reuni, implan-tado pelo ex-reitor César Borges, suscitou críticas e dúvidas internas, provocando nos diferentes segmentos universitários o des-conforto de se perceberem apartados das decisões e encaminhamentos operacionais impostos verticalmente, o que gerou im-pactos marcantes no trabalho docente e na qualidade de ensino.

Depois do Reuni, várias universidades começam a redefinir prioridades

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Adesão rápida das IFE ao programa gerou desconfianças e suspeitas

Uma das primeiras universidades a aderir ao Reuni, segundo o Relatório do Primeiro Ano (MEC / SESu / Andifes, 2009), a UFPel firmou com a União, em março de 2008, o Acordo de Me-tas nº 031, tendo como objeto a regulação de seu Plano de Reestruturação e Expansão, cujas metas, em síntese, apontam para a elevação gradual da taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais para 90% e da relação de alunos por professor para dezoito ao final de cinco anos.

Em relação ao formato e teor do Acordo de Metas da UFPel, muitas particularidades têm sido alvo de críticas no âmbito da Instituição e para além de suas unidades acadêmicas. A pri-meira insatisfação manifestada pela comunidade universitária diz respeito à própria gênese do Plano de Reestruturação e Expansão da Insti-tuição que não contou com a participação efetiva dos diferentes segmentos universitários na sua formulação, nem tampouco em seu acompanha-mento operacional.

Segundo o doutor em ciência da computação e do Departamento de Matemática e Estatística/UFPel, Carlos Campani, assessor do gabinete do novo vice-reitor, Carlos Mauch, a implanta-ção do Reuni na UFPel deu-se em meio a uma administração autoritária, que jamais discutiu nenhuma diretriz para a Universidade.

“Eu sou testemunha de Reunião feita com os Coordenadores de Cursos e os Diretores de Unidades, no momento da adesão ao projeto, em que a Reitoria deixou claro que o Reuni seria adotado de qualquer forma, e aquelas unidades acadêmicas que não entrassem no projeto não receberiam mais verbas e vagas docentes. O Pla-no de Reestruturação do Reuni nunca foi apre-sentado à comunidade universitária”.

De acordo com o professor, a reitoria da UFPel manteve-se reservada em relação aos ter-

mos do acordo de metas firmado com o MEC, ao longo de sua implementação. “Diversas vezes a Reitoria fez menção a ‘compromissos’ assumi-dos em Brasília sem jamais revelá-los claramen-te”, acrescenta. Em relação ao formato do Acor-do nº 031, no que tange às responsabilidades e obrigações, pairam, além de dúvidas em razão da ausência de publicidade interna do documento, também críticas quanto à disparidade de com-promissos entre as partes.

Segundo o vice-presidente do ANDES-SN, Luis Henrique Schuch, “os termos do texto padrão do Acordo de Metas são ‘draconianos’ para uma das partes (as universidades) e dan-do todos os poderes para o MEC, inclusive de não cumprir a contrapartida, dependendo das negociações de orçamento”, pondera. No que se refere ao conteúdo propriamente dito, chamam

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a atenção os elevados números com os quais a UFPel se compromete em um curto espaço de

tempo, conforme demonstra a tabela integrante do Acordo:

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Uma primeira evidência que emerge da tabela diz respeito à precocidade com que a UFPel se comprometeu no atendimento às metas, uma vez que a maior parcela de sua expansão de vagas era prevista para o ano de 2008, imediatamente após a assinatura do acordo.

A urgência em captar recursos indicia prelimi-narmente um planejamento pouco rigoroso, sobre-tudo no que se refere à metodologia de discussão institucional das prioridades e ao próprio manejo administrativo dos montantes dirigidos à Universi-dade. Tal evidência é corroborada pela insatisfação recorrentemente manifestada pela comunidade universitária em relação à forma antidemocrática de implementação do Reuni na UFPel.

Outro aspecto considerado preocupante na UFPel diz respeito à situação das condições de tra-balho e de ensino que podem tornarem-se dramáti-cas no curto prazo, já que o ritmo de preenchimen-to de funções docentes, em particular no de 2009, está muito abaixo da ampliação de vagas, conforme demonstra a tabela de metas do Acordo.

Pela análise do Acordo fica evidente que a Universidade Federal de Pelotas já está sendo estrangulada pelo problema, pois prometeu fa-zer considerável expansão de vagas (38%) e de matrículas (34%), já entre 2007 e 2008. Esta expansão muito alta das vagas de ingresso e das matrículas, logo no primeiro ano de vigência do Reuni, 2008, elevou, nesta IFE, a razão estu-dante de graduação por professor, para acima de 20, na sequência dos anos 2008, 2009 e 2010, estando ela ainda acima de 18 em 2012.

Chama a atenção, neste contexto, o fato de o crescimento prometido para o corpo docente ser, sempre, substancialmente inferior ao cres-cimento das matrículas, no quinquênio 2007 a 2012. Os dados extraídos do Acordo apontam claramente que o adicional de professores está muito abaixo da ampliação de matrículas, sig-nificando, necessariamente, maior carga didáti-ca para cada docente.

Segundo o posicionamento do ANDES -SN, na nota emitida em 2009, a situação do trabalho

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docente na UFPel a partir do chamado “estran-gulamento” imposto pelo acordo não foge à regra da tendência vertical e autocrática com que as reitorias gerenciaram seus Planos de Expan-são. “Os reitores, instados pelo governo federal, prometeram, em nome de seus docentes que es-tes estariam dispostos a se dedicarem às tarefas de graduação durante uma parcela maior de seu turno de trabalho ou, então, a enfrentarem clas-ses substancialmente maiores”, destaca a nota.

Ainda de acordo com o documento, “as pro-messas encaminhadas pelos reitores, tanto em relação ao aumento da carga didática média na graduação quanto ao aumento na “eficiência” quantitativa da instituição - medida pelo “ou-tput” de diplomas -, especialmente estando conjugadas, podem tornar-se problemáticas, já que consubstanciam as metas, acordadas desde a concepção do Reuni, de admitir, a médio prazo, nas IFE, uma razão média de 18 estudantes de graduação para cada docente e proporcionar uma razão de diplomação de 90%. Estas metas são

incompatíveis com a qualidade da educação su-perior, segundo comparações internacionais”.

Um dado que chama a atenção no acordo for-malizado pela UFPel é o de que houve promes-sa de triplicação do número de concluintes, com-prometida que está com uma expansão de vagas e matrículas que chega a ultrapassar o ano de 2012. Outro aspecto considerado problemático diz respeito às demandas geradas pelos cursos implantados a partir do Reuni.

Conforme relata Campani, as áreas bási-cas da universidade nunca receberam vagas e recursos suficientes para suprir estas novas de-mandas. Segundo o professor, “a aplicação dos recursos e a distribuição das vagas foram feitas seguindo critérios desconhecidos da maioria da comunidade universitária. A Reitoria estimulou a concorrência por recursos entre as Unidades Acadêmicas, avançando além de certos limites éticos e permitindo o assédio aos professores com ofertas de lotação em outras unidades em troca de algum tipo de facilidade”, denuncia.

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Em maio de 2011, as críticas disparadas pelos estudantes fi-zeram coro às observações feitas pela ADUFPel SSIND havia muito tempo. Em março daque-le ano, a entidade questionou em seu informativo a falta de condições da universidade em atender a demanda gerada pelo Reuni. E, como era previsto, os problemas apareceram. Os alunos do tradicional curso de Odontologia deflagraram na

época uma greve de vários dias. E não eram os únicos insatis-feitos. Na mesma semana em que a mobilização foi iniciada, os alunos do ICH (Instituto de Ciências Humanas) também saíram à rua para pedir melho-res condições estruturais no campus Porto, sede da Reitoria da UFPel. Até mesmo uma mo-bilização conjunta envolvendo alunos do ICH e da Odontolo-gia aconteceu

Insatisfação mobiliza comunidade contra as más condições da universidade

Greve envolveu alunos do ICH e da Odontologia

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Lotação esgotadaProblemas não resolvidos

fizeram os alunos da Faculda-de de Odontologia da UFPel deflagrarem uma greve no iní-cio de maio de 2011 por causa de problemas estruturais que afetavam o funcionamento do curso. As queixas foram desde a falta de espaço físico para atender as turmas - superlo-tadas após a implantação do Reuni - até a falta de mate-riais básicos como soro e gaze. O DCE da época e os alunos da Odontologia denunciaram os problemas ao Ministério Público

A gravidade da situação era percebida tanto nos relatos dos estudantes, quanto na pauta de reivindicações apresentada e na qual estão 19 dos 25 pontos que motivaram a greve dos aca-dêmicos. Centro de referência regional para atendimento de casos cirúrgicos de emergência e alta complexidade, a Odon-tologia da UFPel não possuía sequer um local adequado para arquivar os prontuários e exa-mes dos pacientes.

Os problemas que motiva-ram a mobilização estudantil,

todavia, eram ainda mais graves e colocavam em risco não ape-nas a formação dos alunos, mas também a saúde dos pacientes. “Não havia uma estrutura de biosegurança adequada e houve casos em alunos tiveram que sair em meio a uma cirurgia para buscar soro e gaze na farmácia da esquina”, revelou Ana Paula Martins, represen-tante do Centro Acadêmico da Odontologia na época.

A precariedade material e estrutural da faculdade afetou, diretamente, a comunidade, pois impossibilitou – entre

outras atividades – a oferta de um pronto atendimento odon-tológico.

O centro nevrálgico da crise instituída na Faculdade de Odontologia foi o despreparo da universidade para atender à demanda gerada pelo Reuni, que aumentou em 50% o nú-mero de vagas. Turmas que an-tes costumavam ter em média 45 alunos, possuíam 64 estu-dantes. Mas as salas de aulas, laboratórios e clínicas são as mesmas de 40 anos atrás, quando o prédio onde funciona o curso foi construído.

Aumento de vagas é incompatível com infraestrutura de 40 anos atrás

Despreparo da universidade para atender à demanda gerada pelo Reuni foi o motivo central da greve estudantil

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Milena MartinezProfessora Universidade Federal do Paraná

O Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), instituído por decreto presidencial,

6096 de 25 de abil de 2007, foi recebido pela comunidade acadêmica com um misto de desconfiança e indignação.

O Reuni, mudou a concepção de Universidade, estabeleceu um novo paradigma para o ensino superior que modifica em sua essência o conceito de universidade pública, ressignifica suas funções sociais,altera a estruturação dos cursos de graduação e o trabalho docente desenvolvido nas instituições federais de ensino superior.

A expansão foi feita por meio de um contrato de gestão que obrigou a toda universidade ter metas em relação à expansão do número de estudantes no número de turmas, no número de alunos por sala de aula, na relação professor e aluno, e no número de cursos, Ficou firmado neste contrato que o financiamento para obras e a abertura de vagas para concurso público para professor estão condicionados à ampliação do número das vagas de discentes.

Essa condição levou várias universidades a aumentar muito as vagas para alunos nem sempre recebendo a contrapartida, seja no número de vagas de docentes ou seja em infraestrutura piorando em muito as condições de trabalho de docentes,discentes e técnico administrativos.

O campus de Palotina da UFPR é um caso emblemático desta realidade. Em 2008, aderiu ao Reuni com uma proposta de criação de cinco novos

cursos, passando de 300 alunos para 2200 alunos até o final de 2015.

Em contrapartida a UFPR deveria construir 13.500m2, até o final de 2011 e reformar mais 3.480m, além de garantir os recursos para equipar essa nova área construída, também se comprometeu a contratar docentes e servidores técnico-administrativos suficientes para a implementação dos novos cursos .Hoje, estudantes, docentes e técnicos sofrem diversos problemas em relação a falta de estrutura física, material e de pessoal devido aos recursos que ainda não chegaram.

Como o governo federal teve como único objetivo em seu programa de expansão da universidade o aumento do número de alunos e a construção de prédios para abrigá-los, a pesquisa a extensão a e a valorização do professor foram relegados a segundo plano.

A política de pós-graduação e pesquisa que vem sendo implementada obedece uma lógica ordenada pelos editais. Desde então,a universidade deixou de oferecer as condições para o professor realizar pesquisa, os professores para desenvolverem sua pesquisa dentro da universidade precisam concorrer aos editais das fundações de amparo à pesquisa ou do CNPq.

Se os projetos forem aprovados eles recebem os recursos para a pesquisa, mas como não há verba para todos esta lógica torna-se bastante perversa,pois estimula a concorrência entre professores que não receberam os recursos, interferindo diretamente na qualidade do trabalho desenvolvido.

Com esta nova lógica já estabelecida que desconsidera a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão e que ainda não respeita a autonomia universitária nos resta perguntar: A quem serve o Reuni?

Reuni: um projeto de desconstrução

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Precarização dos cargos para sustentar expansão sem planejamento

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Fred Oliveira

Jornalista

Campina Grande/PB

Até o início da década de 2000, o Brasil não conseguia ofertar va-

gas na educação superior nem sequer para 30% dos jovens entre 18 e 24 anos e o sistema de acesso a esse nível de ensi-no era considerado elitista e instrumento de exclusão social dos trabalhadores das classes média e baixa.

Essa situação resultou no crescimento da pressão política e social pela expansão do aces-so ao ensino superior nas déca-das de 80 e 90 do século XX. Quando o Partido dos Traba-lhadores (PT) e seus aliados chegaram à Presidência da República, em 2002, o governo federal passou a adotar inicia-tivas para estender o direito à universidade pública à classe trabalhadora e para viabilizar o crescimento do número de va-gas a fim de atender à demanda reprimida.

Uma das justificativas para a expansão de vagas foi a de atender ao que determinava o

Plano Nacional de Educação (PNE – Lei nº 10.172/2001), que estabeleceu 2010 como o ano limite para o País ter 30% dos jovens entre 18 e 24 anos incluídos na educação superior. A expansão do ensino superior público federal estava, dessa forma, social e politicamente justificada.

Entre 2003 e 2007, o go-verno federal promoveu uma expansão do número de campus e universidades federais. A principal meta desse processo foi o de interiorizar o ensino público federal, que, naquele período, tinha 45 universida-des e 148 campus instalados. Isso resultou em 30.691 novas vagas e mais 50.817 novas ma-trículas no ensino presencial.

As iniciativas dos governan-tes, contudo, não foram sufi-cientes. Dirigentes do Sindica-

to Nacional dos Docentes de Instituições de Ensino Supe-rior (ANDES-SN) lembram--se de que por meio de resolu-ções dos congressos nacionais e Conselhos do Andes (Conads), tomadas inicialmente a partir da análise dos documentos oficiais, eles identificaram an-tecipadamente as dificuldades que certamente surgiriam do meio das decisões apressadas, tomadas pelas reitorias.

Lideranças sindicais do ANDES-SN afirmam que, na época, muitas universidades se comprometeram com picos de expansão de vagas, em 2009, sem que a contratação de docentes e servidores técnico--administrativos, assim como a construção de salas de aula, laboratórios e outras condi-ções de infraestrutura tives-sem sido efetivadas, no curto

Problemas extrapolam a infraestrutura e avançam sobre os direitos trabalhistas

Universidade Federal de Campina Grande se comprometeu com picos de expansão

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espaço de menos de um ano, decorrido desde a assinatura dos acordos de meta, mesmo supondo que os recursos não tenham faltado.

Relatório do MEC expõe inconsistência do ReuniO movimento docente lide-

rado pelo ANDES-SN sempre defendeu a expansão do ensino superior, todavia, no entendi-mento dos integrantes desse movimento, essa expansão de-veria ocorrer amparada em cri-térios de qualidade socialmente referenciados, com o respeito à autonomia das instituições e realizada de forma democráti-ca, ou seja, com um mínimo de discussão com as instituições interessadas em construir uma educação pública e gratuita.

Mas o fato é que não foi assim que a expansão da uni-

versidade pública, entre 2007 e 2012, ocorreu. Em vez de expandir com formulação democrática e socialmente referenciada dos procedimen-tos, conceitos e paradigmas, o governo Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2010) baixou o Decreto nº 6.096, em 24 de abril de 2007, para acelerar e efetivar o crescimento de um sistema historicamente exclu-dente e advindo de décadas de franco sucateamento em ape-nas cinco anos.

Inspirado em outros pro-cessos históricos do Brasil em que presidentes da República ergueram obras faraônicas em apenas cinco anos e à custa de endividamento externo, o go-verno Lula usou o decreto para lançar o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades

Federais (Reuni). E convocou as universidades para assinar acordos de metas em cerimônia particular no Palácio do Pla-nalto, em Brasília.

O programa apresentava metas tão elevadas para serem cumpridas em um período de tempo tão curto, de 2007 a 2012, que foram consideradas inviáveis pelos vários segmen-tos da comunidade universitá-ria – professores, estudantes e servidores. Entre as obrigações para as universidades que ade-rissem estavam o combate à evasão com a elevação da taxa de conclusão média nos cursos para 90% e o crescimento do número de alunos por profes-sor, nos cursos presenciais para um por dezoito.

Mas a proposta do governo fracassou e um dos principais fatores que levaram ao malo-gro federal foi o agravamento da chamada precarização do trabalho desenvolvido pelos professores, sobretudo pela quantidade insuficiente de do-centes contratados para atender à demanda nas instituições.

Segundo dados do relatório final de uma comissão insti-tuída pelo Ministério da Edu-cação para analisar a expansão das universidades entre 2003 e 2012, divulgado em 2012, enquanto o número de vagas ofertadas pelas universidades federais cresceu 111% entre 2003 e 2011, a quantidade de novos professores cresceu ape-Na Universidade Federal de Ouro Preto, anteparo improvisa proteção contra chuvas

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nas 44% até 2012.O número de docentes efe-

tivos nas universidades federais cresceu, no período, de 40.523 para 67.635, enquanto o núme-ro de matrículas na graduação e na pós-graduação passou de 579.719 para 941.900. Entre os servidores técnico-admi-nistrativos a desproporção de novas contratações foi ainda maior. Esse segmento aumen-tou apenas 16%, passando de 85.343 para 93.364.

Números revelam aumento da precarização do trabalhoSe para uma parcela da

sociedade os números acima podem não ser impactantes, no cotidiano de trabalho dos professores eles disseminam em todo o País os seus efei-tos negativos, tais como carga horária excessiva de trabalho, queda da qualidade do ensi-no e prejuízos para a saúde

dos docentes. Os números do Reuni são proporcionais ao aumento do nível de precari-zação do trabalho docente.

No ensino fundamental e médio uma relação, como a prevista no Reuni, de um docente para cada grupo de dezoito alunos é considerada reduzida. Mas no ensino su-perior essa relação é elevada e resultou em muitos prejuízos

para a universidade pública brasileira porque promoveu a queda da qualidade de ensino, da pesquisa científica e das ati-vidades de extensão.

A educação superior pública está apoiada em três pilares que compõem, por sua vez, a condição contratual de tra-balho do docente: o ensino, a pesquisa e a extensão. Ou seja, o docente da educação superior não só exerce o magistério, como também tem como obri-gação contratual com o Estado, a produção de pesquisa cientí-fica e de conhecimento novo, bem como a promoção desse conteúdo na sociedade, por meio da extensão.

Soma-se a isso o fato de os docentes das universidades enfrentarem sobrecarga de tra-balho por causa das exigências das entidades de fomento à pesquisa que exigem cada vez

Basílio estima que, para 2013, seriam necessários 400 professores

No Cefet-MG, metade da carga horária está sob a responsabilidade de 117 substitutos e 300 temporários

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mais a qualificação, a produ-ção de artigos, a realização de pesquisas, a orientação de tra-balhos de conclusão de curso na graduação, de dissertações no mestrado e de teses no dou-torado, além da realização de trabalhos de extensão e de ma-gistério se quiserem progredir na carreira.

Dossiês confirmam precarização do trabalho docenteEm algumas universidades,

como na Universidade Federal de Alagoas (Ufal), dados de um dossiê elaborado pelo Comando de Greve dos Docentes, no ano de 2012, dão conta de que, en-tre 2005 e 2010, a instituição expandiu suas matrículas em 129%, enquanto a contratação de professores e de técnicos não acompanhou aquele movimento, tendo crescido apenas 33% e 5,5%, respectivamente.

A reportagem da Revista Dossiê Precarização tentou várias vezes ouvir o reitor da Ufal, Eurico de Barros, mas não conseguiu. Na última tentativa, a chefia de seu gabinete infor-mou que não concederia entre-vista por telefone.

Na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), o Comando de Greve também apurou que o número de matrículas cresceu

de 12.997, em 2007, para 19 mil alunos. A relação aluno–professor passou de 1/15 para 1/28. Esse número é contesta-do pela reitoria da instituição, que estima que a relação, na média, esteja abaixo de 1/20 e, acima disto, somente em algumas áreas específicas da universidade.

O reitor eleito recentemen-te para dirigir a Universidade

Estudantes em sala de aula na Universidade Federal de Campina Grande/PB

Campus de Leopoldina. Insuficiência de cargos necessários e de mão de obra docente contribui para o sucateamento

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Federal de Campina Grande (UFCG) no quadriênio 2013-2016, Edílson Amorim, diz que se for considerada apenas a dimensão do ensino, a UFCG tem “gargalos em algumas áreas”, como entre os professo-res de disciplinas comuns do básico das engenharias, como matemática e física.

Amorim informa que a UFCG tem, atualmente, 60 docentes temporários e 80 substitutos e que,do início da expansão pré-Reuni até o mo-mento, contratou cerca de 500 professores efetivos, mas ainda necessita de outros 360 para suprir suas demandas.

Na Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), a Rei-tora Maria Lucia Cavalli Neder garante não existir precarização do trabalho docente. Argumenta que a relação professor por aluno é de 11,60, o que está abaixo da meta do Reuni, de 1/18.

No entanto, admite que a instituição tem hoje 268 docentes, 114 substitutos e 154 temporários, todos em situação precária, pois não detém os mesmos direitos trabalhistas dos 1.558 profes-sores efetivos. Ela informou que está em curso a realização de concursos públicos para as vagas dos temporários.

Uma das instituições que tem hoje graves problemas resultantes dos processos de expansão e que também inte-gra a base do ANDES-SN é

o Centro Federal de Educação Tecnológica (Cefet) de Minas Gerais. Lá, segundo estimativa do diretor, Márcio Silva Ba-sílio, metade da carga horária da instituição está sob a res-ponsabilidade de docentes com contrários precários. São 117 substitutos e 300 temporários.

Ele estima que, neste ano de 2013,seriam necessários novos 400 professores efetivos para suprir a demanda da expansão

realizada nos últimos anos. Basílio revela que o campus de Contagem, inaugurado em 2012, começou a funcionar com apenas professores tempo-rários, mesmo que o MEC te-nha se comprometido a liberar vagas para concursos de profes-sores efetivos.

Ele explica que é difícil ava-liar como o Cefet chegou nesse nível de precarização do tra-balho docente, mas argumenta

Salas lotadas na UFCG

Em Divinópolis, Campus V, do Cefet-MG

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Substitutos e temporários sem direitos trabalhistas e falta espaço para os estudantes

que a não criação de um banco de professores equivalentes, como existe nas universidades federais, contribuiu para essa situação. “A intenção era boa e o planejamento indicava a existência de condições para a expansão”, avalia o professor.

“Operação Tapa-Buraco”Para suprir a demanda de

professores necessários às universidades, institutos, cen-tros e também aos Colégios de Aplicação federais, bem como para tentar atingir as metas do Reuni, o governo federal lançou mão de estra-tégias de contratação de pes-soal que aprofundaram a pre-carização do trabalho docente e resultaram em prejuízos para a qualidade do ensino.

O aumento da precarização aconteceu porque substitutos e temporários foram usados

como instrumentos do Minis-tério da Educação na tarefa de expansão. Todavia, não têm os direitos trabalhistas dos pro-fessores efetivos porque estão fora do Regime Jurídico Único (RJU) e da carreira de magis-tério superior.

São contratados por tempo no máximo dois anos e com um salário sempre menor, apesar da carga horária e da titulação iguais. Os substitutos e temporários estão excluídos das atividades de pesquisa e de extensão. São contratados ape-nas para dar aulas.

Relatório comprova opção do governo pela falta de qualidadeDados do governo federal

no documento “Análise sobre a Expansão nas Universida-des Federais 2003 a 2012” comprovam a estratégia. Du-

rante todo período em análise no documento é registrada a existência de professores substitutos e ressaltado que, durante a implantação do Reuni, entre 2007 e 2012, houve a contratação de 21.786 novos docentes, redu-zindo o numero de substitu-tos em 64%.

Campus do Cefet-MG em Araxá sem condições básicas de funcionamento

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O crescimento dos docentes substitutos nas universidades foi também facilitado com a alteração da Lei nº 8.745/1993, que limitava o número de professores a 10% do total do quadro dos docentes de cada instituição. Em junho de 2011, o governo conseguiu aprovar, no Congresso Nacional, a Lei nº 12.245, que ampliou esse limite para 20%.

Ao perceber que nem isso seria suficiente para suprir as carências geradas pela expansão do Reuni, o governo federal costurou a aprovação, na mes-ma lei, da ilegalidade trabalhis-ta em vigor nas instituições de ensino superior com a qual foi permitida a admissão de pro-fessores temporários para aten-der às demandas da expansão, sem limites de quantitativos.

A Portaria nº 22, de 23 de fevereiro de 2011, do Minis-tério da Educação e do Plane-

jamento, Orçamento e Gestão, autorizou a contratação de 3.591 professores temporários, a serem distribuídos nas uni-versidades de acordo com as suas necessidades e o previsto nos acordos de metas assina-dos pelas instituições federais de ensino com Ministério da Educação.

Para ampliar as alternativas de suprir a carência de profes-sores nas universidades, o go-verno federal passou a explorar, também de forma ilegal, a mão de obra de alunos de pós-gradu-ação. Com o argumento de que necessitava disciplinar a conces-são de bolsas de pós-graduação previstas no Reuni, o Ministé-rio da Educação baixou a Por-taria nº 582/2008, incluindo como obrigação dos estudantes beneficiados “o desenvolvimen-to de atividades acadêmicas na graduação por meio do auxílio à docência, em colaboração com professores efetivos titulares das disciplinas”.

Como a carência de bolsas para a pós-graduação no País se acumula há décadas, os estu-dantes passaram a submeter-se a essa obrigação e a desempenhar o magistério nas graduações. Muitos professores dos progra-mas de pós-graduação “usam” seus orientandos que recebem as Bolsas Reuni de Assistência ao Ensino para aliviar sua eleva-da carga horária de trabalho nos cursos de graduação.

Em 2012, ano do encerra-mento do Reuni na maioria das universidades, o governo federal aprovou, no Congresso Nacional, a Lei nº 12.677, de 25 de julho, que criou 19.569 cargos de professor de terceiro grau, 24.306 cargos efetivos de professor de ensino básico, técnico e tecnológico, e 27.714 cargos de técnico-administra-tivos do Plano de Carreira dos Cargos Técnico-Administrati-vos em Educação.

Todavia, a Lei nº 12.677/12 não garante que

Substitutos e temporários sem direitos trabalhistas e falta espaço para os estudantes

No Campus de Curvelo, professores assumem até sete disciplinas e mais coordenação de curso

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essas vagas sejam destinadas a suprir a demanda das universi-dades, dos institutos federais e centros federais de educação e dos colégios de aplicação que realizaram expansões nos últimos anos. Isso porque a lei também abre a possibilidade das novas vagas e funções gra-tificadas sejam também usadas na criação novas instituições.

Evasiva e falta de informaçõessQuestionado pela reporta-

gem da Revista Dossiê Precariza-ção sobre as razões para o sur-gimento das várias estratégias usadas nos últimos anos pelo governo federal para atender às demandas da expansão do Reuni sem contratar novos professores, como a criação dos docentes temporários, am-pliação do número de substi-tutos e uso de mão de obra de alunos de pós-graduação para aulas na graduação, o Ministé-rio da Educação foi superficial e evasivo.

Também não respondeu sobre as consequências nega-tivas da precarização do tra-balho docente para o ensino, a pesquisa e a extensão e que soluções pretende empregar para revolver estes problemas. Na mensagem eletrônica à re-portagem da Revista Dossiê Preca-rização, a assessoria de imprensa do ministério informou que “algumas das questões levanta-das por sua pauta estão sendo tratadas pelo MEC diretamen-te com as universidades e não temos como adiantar propostas que passam por processo de negociação”.

A resposta enviada ressalta apenas o processo de negocia-ção com o ANDES-SN e ou-tras entidades representantes dos servidores da educação pública federal, ocorrido em 2012, e que resultou na nova carreira docente, por meio da Lei nº 12.677/12, a qual foi rejeitada pela maioria da ca-tegoria durante a sua última greve.

Professores já sentem os efeitos da precarizaçãoSe a precarização do traba-

lho docente é facilmente com-provada com os números e as estratégias usadas pelo governo federal para realizar a expan-são, é nos depoimentos dos professores que se percebe, sem nenhum esforço, a face huma-na dos problemas vividos por aqueles que são responsáveis pela formação dos estudantes brasileiros.

O professor da Unidade Acadêmica de História da Uni-versidade Federal de Campina Grande (UFCG), na graduação e na pós-graduação, Luciano Mendonça, acompanhou o crescimento do seu curso de bacharelado da década de 1980 até a expansão do Reuni.

Ele garante que hoje existem menos professores do que na-quele período. “Antes era raro uma turma em história com 30 alunos. Hoje existem disciplinas com 80. Estamos no meio do semestre e até agora não existem professores para várias discipli-nas”, denunciou o professor.

Mendonça reclamou do ritmo e afirmou que “é tão in-tenso que os docentes estão no limite da exaustão física, men-tal e emocional” e classifica a precarização do trabalho como hiperexploração: “é uma forma que mistura taylorismo com toyotismo”, explicou.

O presidente da ADUFCG,

Na UFPR, laboratórios foram instalados dentro de banheiros

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professor da Unidade Acadê-mica de Ciências Sociais na graduação e na pós-graduação, Gonzalo Rojas, ressalta que a grande quantidade de aulas que os docentes da pós-graduação ministram na graduação, alia-das ao produtivismo acadêmico imposto pelas agências de fo-mento contribuem para a pre-carização do trabalho.

Em muitas instituições que realizaram expansões, quer via Reuni ou não, como o CEFET de Minas gerais, a carga de tra-balho dos professores é muito elevada.

O presidente do Sindcefet e docente do Campus de Curvelo, Antonio Arapiraca, explica que muitos docentes da instituição acumulam uma carga de aulas

de 14 a 18 horas. “Teve profes-sor que já assumiu até sete dis-ciplinas e mais a coordenação de seu curso”.

Mesmo com a atuação de 117 docentes substitutos e 300 tem-porários no CEFET, seus pro-fessores efetivos enfrentam gran-des dificuldades para conseguir liberação para pós-graduação.

É o que acontece com o

Luciano Mendonça (UFCG)

Bartolomeu de Souza (UFMT)

Ivaldo Brito (UFCG)

Gonzalo Rojas (ADUFCG)

Márcio Basílio (Cefet-MG)

Edmilson Amorim (UFCG)

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professor Leonardo Gabriel, do Campus de Timotéo que está fazendo seu doutorado traba-lhando, porque a coordenação onde ele está lotado não tem autorização para contratar um substituto e os existentes es-tão trabalhando “no limite”. A professora do Curso de Serviço Social da Universidade Fede-ral de Mato Grosso, Marluce Souza, garante que a elevada carga de trabalho, imposta pela carência de docentes no curso está também resultando na queda da qualidade do ensino. “Estamos fingindo de orientar os trabalhos de final de curso e fingindo de acompanhar está-gios”, revela.

Ela explica que a grande carga de trabalho prejudica aqueles que tentam realizar pesquisas e atividades de extensão, pois até mesmo a resolução da UFMT que deter-mina 10 horas para cada uma destas atividades não está sen-do respeitada. Hoje, o curso de Serviço Social necessitaria de

11 novos professores efetivos para atender as suas demandas.

Outro docente que ratifica a existência de uma excessiva carga horária de trabalho na UFMT é o professor do De-partamento de Ensino e Or-ganização Escolar do Instituto de Educação, Bartolomeu José Ribeiro de Sousa. Ele diz que “sente na pele” a precarização do trabalho docente, pois já chegou a ensinar turmas com

até 80 alunos. “Meu Plano In-dividual de Atividades tem 40 horas, mas na verdade elas che-gam a 80 por semana”, explica.

Bartolomeu ressalta que, além da grande precarização do trabalho, a expansão do Reuni não trouxe aumento dos re-cursos financeiros necessários para a melhoria da qualidade do ensino. “Faltam servidores para cuidar das salas, recursos para as atividades de pesquisa e até cópias só tenho direito a 50 por mês”, desabafa.

Até mesmo quando um curso não adere ao Reuni, seus professores não conseguem escapar das conseqüências da expansão. Um exemplo aconte-ce com o professor da Unidade Acadêmica de Engenharia de Produção da UFCG, Lívio Silva. Ele explica que o profes-sor das universidades federais depois do Reuni não tem mais

Sede do campus da Universidade Federal de Campina Grande

Salas de aula superlotadas

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tempo para o atendimento e o acompanhamento dos alunos.

Lívio hoje está limitando suas turmas a no máximo 30 estudantes, quando o ideal seria 20 alunos. Garante que se liberar vagas para atender as necessidades do curso e de outros da área das tecnologias “muitos teriam que assistir aula em pé ou fora da sala”. Ele foi coordenador da unidade Acadêmica de Engenharia de Produção em 2008 e 2009 e afirma que não existe possibi-

lidade da universidade manter um ensino de qualidade com a rotatividade dos substitutos e temporários.

Professor aposentado e hoje atuando como substituto numa das unidades Acadêmicas mais demandadas da UFCG, a de matemática, o professor Ivaldo Maciel de Brito sempre tenta conversar e acompanhar os alu-nos com dificuldades para que eles superem as dificuldades que trazem do ensino médio.

Ele revela que antes da im-

plantação do Reuni as turmas de cálculo e álgebra tinham no máximo 50 alunos e hoje che-gam com facilidade a 70, 80 estudantes. “Antes eu conhecia os alunos pelo nome. Hoje não dá. Tem professor que está aplicando quatro tipos de pro-va para o mesmo assunto para evitar a cola, devido a grande quantidade de alunos numa mesma sala”.

Se em muitas universidades a precariedade acontece pela grande quantidade de alunos por professor, em outras a precarização acontece pela falta quase total de condições de trabalho. No Campus de Santana do Ipanema, sertão de Alagoas, os professores dos Cursos de Economia e Admi-nistração aguardam desde de 2010 a conclusão do campus.

Segundo o coordenador ge-ral da unidade, Acurcio Castelo David, eles já passaram por uma escola cedida pela Prefeitura e hoje dividem com os alunos de uma escola particular o único prédio com condições de abri-gar provisoriamente o campus. Junte-se aos problemas o redu-zido número de funcionários, pois muitos se transferem para outros campus ou abandonam o emprego pela distância do local e o reduzido salário.

“O ritmo é tão intenso que os docentes estão no limite da exaustão física”, diz professor Mendonça

Professor de história diz que “Plano Individual de Atividades tem 40 horas, mas chega a 80 por semana”

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Antônio Lisboa Leitão de SouzaProfessor

Universidade Federal de Campina Grande

A precarização do trabalho docente tem sido uma das principais decorrências da política educacional levada a cabo pelos sucessivos governos brasileiros,

especialmente desde os anos 1990. Dentre suas diferentes formas de expressão, destacam-se as relativas às condições contratuais de trabalho, observadas e identificadas nos diferentes níveis de atuação docente, tanto na Educação Básica quanto na Superior, nas esferas pública e privada.

Por mais amplas e diversificadas tenham sido as denúcias sindicais, os debates e a produção crítico-leterária nacional e internacionalmente, continua sendo ‘comum’ encontrarmos nas instituições escolares condições contratuais de trabalho docente rebaixadas em relações a outras áreas profissionais. Por um lado, elas estão aquém dos padrões normativos vigentes no âmbito das relações trabalhistas e que deveriam ser respeitados pelas instituições, ainda que admitamos o grau de flexibilização no arcabouço legal, particularmente suscitado pela contrarreforma da legislação trabalhista brasileira. Por outro, são ‘contratos’ de trabalho bem abaixo das expectativas profissionais do próprio trabalhador docente, o qual, por força das condições sócio-econômicas em que se encontra, acaba se submetendo à essas condições, seja pela falta de alternativa imediata, pela generalizada e semelhante realidade da área educacional nos setores público e privado, ou mesmo pela esperança que tem na efetiva mudança desse quadro político-institucional.

São exemplos dessa realidade os docentes contratados como substitutos, temporários, horistas ou até mesmo como estagiários, sem que a precariedade do seu contrato repercuta em forma de diminuição das

responsabilidades, da jornada, da carga didático-pedagógica, do número de alunos ou das demandas burocrático-institucionais. Ao contrário, esses docentes enfrentam as mesmas cobranças e avaliações feitas aos demais colegas que se encontram em condições contratuais menos precárias, estáveis ou mais condizentes com o esperado.

Além disso, ainda existem os paliativos administrativos, adotados sobretudo nas instituições públicas de ensino, que consistem na submissão de alunos de graduação e ou de pós-graduação ao exercício de atividades docentes, sob a justificativa da condição de bolsistas [são várias as modalidades de bolsas: monitoria, estudo, trabalho, iniciação à docência, apoio acadêmico, iniciação científica, dentre outras]. Apesar de muitas vezes esses alunos carecerem do devido preparo e acompanhamento didático-pedagógico e ou acadêmico, sua atuação contribui institucionalmente para a diminuição da defasagem do quadro de pessoal e para a assistência às turmas-disciplinas sem docentes definidos, o que pode levar à percepção social de ‘normalidade’ no funcionamento da instituição.

Em qualquer das situações, essa precarização das condições contratuais de trabalho interfere direta e negativamente na qualidade do trabalho realizado pelo docente, da formação oferecida aos alunos e, por conseguinte, na realização dos fins da educação escolar, tanto básica quanto superior, qual seja, assegurar a todos o direito à uma educação de qualidade, socialmente referenciada. Ocorre que, para se alcançar tal fim, é imprescindível se assegurar condições de trabalho docente condizentes, compatíveis com as elevadas e crescentes demandas sociais de formação inicial e continuada, de criação e inovação didático-pedagógica, artístico-cultural e científico-tecnológica, além das cobranças e expectativas de compreensão e de intervenção psico-social e política que recaem ou se apresentam diuturnamente ao trabalhador docente.

Precarização da docência

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Precariedades pra lá de físicas

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Faltam professores efetivos nos Colégios de Aplicação federais

Rodrigo Ricardo

Jornalista

Rio de Janeiro/RJ

Os Colégios de Aplica-ção federais sempre foram bem avaliados

pelos órgãos oficiais medidores do desempenho de instituições de ensino. Mas essa tradição vem sendo demolida a cada re-forma da educação. Atualmen-te, a boa qualidade dos colégios está abalada pela ausência do imprescindível para a existência de qualquer escola: o professor.

Na ausência do docente, os dirigentes dos CAps têm apelado aos substitutos ou aos monitores para suprir a falta desse personagem principal e indispensável à educação. “Re-corremos aos alunos de pós--graduação que ganham uma bolsa de R$ 600,00 para uma carga de 12 horas. É a precari-zação das nossas condições de trabalho”, assegura a presidente da Associação dos Professores da Universidade de Viçosa – Seção Sindical do ANDES--SN (Aspuv-SSind.), Márcia Fontes Almeida.

A dirigente atua no Co-légio de Aplicação Conluni (CAp-Conluni) desde 2005

e, preocupada com o futuro da instituição em virtude dos sinais de decadência da quali-dade do ensino em evidência, ela informa que a unidade mineira atende a 480 alunos do ensino médio e revela que “entre as escolas públicas, o Conluni ficou em primeiro lugar no Exame Nacional de Ensino Médio (Enem).”

“Mas até quando? O que nos falta são professores efeti-vos. Eles estão se aposentando, e não há reposição”, constata Márcia, e classifica de “míope” a política governamental sobre os CAPs. “Para eles, somos uma escola cara e apenas de ensino básico, esquecem que trabalhamos com formação do-cente”, declara.

Política do arrocho Em março de 2011, a Se-

cretaria de Ensino Superior (Sesu/MEC) redigiu uma minuta que pretendia apartar os CAps das universidades. A versão do documento, vazada dos gabinetes, foi vista com repúdio pela comunidade aca-dêmica e também revelou os desejos tecnocratas.

“Abre brechas à desfederali-zação por autorizar convênios da unidade com os governos municipais e estaduais. To-davia, isso não ocorrerá por decreto. O que vai ocorrer é que vão deixar os colégios à míngua, sem condições de contratar ninguém e forçados

a fazer parcerias”, analisa Márcia. Ela cita como exem-plo dessa política da míngua a carência de aproximadamente nove professores efetivos no CAp Conluni.

No Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CAp/UFRJ), segundo a professora Ana Lú-cia Soutto Mayor, a defasagem é de 29 professores efetivos. “Essa situação é ameaçadora. Precisaríamos deste número para dar conta do trabalho atu-al. Há esse estrangulamento de vaga docente, que não acompa-nha a real demanda da escola”, constata a professora.

Ela leciona no colégio des-de 1989 e reclama também da

Docentes, estudantes e técnicos abraçam o prédio do CAp em manifestação por melhores condições

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estrutura física. “A gente não tem auditório, refeitório, uma sala para cada departamento. A supervisão dos 400 licen-ciandos, por exemplo, é feita no pátio. Não temos lugar para atendê-los”, afirma.

O atual prédio do CAp/UFRJ, que recebe 760 alunos do ensino fundamental ao mé-dio, pertence ao Município do Rio e já não comporta o colé-gio. “Não há espaço”, resume a diretora da Associação de Docentes da UFRJ (Adufrj--SSind), Maria Coelho.

Segundo ela, a unidade é o principal campo de estágio para os futuros professores. “A solução não passa pela simples migração de carreira EBTT

(Ensino Básico Técnico e Tec-nológico) para MS (Magistério Superior), que também está com as condições de trabalho degradadas”, pondera a dirigen-te, que defende a proposta de carreira única.

Ataque à carreiraA diretora do CAp/UFRJ,

Celina Maria de Souza Costa, reconhece as limitações do prédio, embora ressalve que os recursos para a manutenção vêm sendo aplicados. “Sofre-mos com a estrutura elétrica e esbarramos na morosidade dos processos licitatórios”, justifi-ca. E aponta, no próprio gabi-nete, o improvisado ar-condi-cionado de 10 mil BTUs (sigla

em inglês de British Thermal Unit – Unidade Térmica Britâ-nica) para refrigerar três salas ao longo do verão carioca.

Segundo Celina, o diferen-cial do CAp sempre se deveu a seus recursos humanos, agora comprometidos pelo elevado número de professores subs-titutos, mais de um terço da força de trabalho. “Pela regra só podem ficar por dois anos. Essa rotatividade precariza o projeto pedagógico. A carreira está sob ataque porque o MEC não nos vê como professor uni-versitário e vem nos enxugan-do. O próximo concurso para repor 14 aposentadorias terá sete vagas”, contabiliza.

Ela recorda que o colégio, desde a fundação (1946), nun-ca teve o quadro de docentes modificado. “Desde que ele existe são 100 vagas. Neste período, passamos ao ensino médio, atendemos à ampliação do ensino fundamental e nos adequamos à Lei de Diretrizes e Base (LDB). O MEC, por sua vez, não abriu nem uma vaga sequer. Pelo contrário, o que fez foi estabelecer uma Re-lação Aluno–Professor (RAP) de 1/20 e ignorou a diversida-de de disciplinas oferecidas e as pesquisas que realizamos”, afirma a diretora.

Segunda ela, os CAps de Goiás e da Universidade Esta-dual do Rio de Janeiro (Uerj) – único fora do âmbito fede-ral – pertencem ao magistério

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superior e que, nos núcleos de educação infantil do Rio Gran-de do Norte e de Minas Gerais, há a convivência das duas carrei-ras (EBTT e MS). “A sobrevi-vência da instituição passa por uma mudança radical na estru-tura da carreira, que permita recompor o quadro docente”.

Os dados oficiaisEm resposta à reportagem

da Revista Dossiê Precarização, a reitoria da UFRJ explicou que vem se esforçando para repor o quadro docente. Admitiu que o atual número de professores está longe do ideal. Em nota, explicou que tem atuado na de-fesa do colégio perante o gover-no federal para que o CAp não seja tratado como um colégio comum. “É preciso que o MEC reconheça essa natureza distinta dos CAps em relação aos de-mais colégios de ensino básico.

A reitoria reconhece que “a principal função do CAp é ser um laboratório para a prática de ensino dos licenciandos. O CAp UFRJ é uma unidade pri-mordial para a formação indis-pensável de professores”. Diz ainda que a localização ideal para a unidade seria na Cidade Universitária e que o projeto básico para a construção de um prédio no campus está sendo elaborado. “A presença do CAp perto dos diversos cursos de li-cenciatura presentes na Cidade Universitária traria mais quali-dade ao colégio, integrando-o,

de fato, à vida da UFRJ”.O Ministério da Educação

limitou-se a tratar de forma burocrática os questionamentos da reportagem, contudo, ainda assim as respostas confirmam o temor dos entrevistados. “A solicitação para contratação de novos professores é feita pela autoridade máxima da uni-versidade e a autorização é do Ministério do Planejamento, após análise e encaminhamento do MEC. No momento, está em discussão a proposta para estabelecer a relação aluno pro-fessor visando o ajuste do qua-dro de professores dos CAps vinculados às universidades. O último concurso foi realizado em 2010 e ainda não há previ-são de um próximo concurso”, avisa o governo federal.

Celina Costa, do CAp/UFRJ, considera que carreira está sob ataque

Direção do CAp apela para substitutos. Desde 1946, não há mudança no quadro de docentes

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Educação fast delivery e os CAps

Cristina MirandaProfessora

Universidade Federal do Rio de Janeiro

A inflexibilidade do governo federal na grande greve de 2012 e a desestruturação da carreira docente imposta pela Lei nº 12.772, de

dezembro de 2012, são ingredientes essenciais do projeto dos governos Lula e Dilma para a educação federal.

Em conformidade com os interesses do capital, o MEC está comprometido com a massificação da formação de recursos humanos para processos de trabalho simples e de baixa sofisticação técnico-científica, adaptando, para o Brasil, o modelo estadunidense dos Community Colleges.

A massificação da educação terciária se dá pela combinação de cursos aligeirados, forte ampliação das matrículas (inchaço expresso na Relação Aluno–Professor – RAP –pretendida) e redução relativa dos investimentos, intensificando o trabalho dos professores e técnicos, superutilizando as precárias instalações existentes e ofertando o que somente pode ser uma formação simplificada.

Esta concepção está presente no Reuni, na Universidade Aberta do Brasil (UAB), nos mestrados profissionais fast delivery diploma e na formação aligeirada de docentes, o que afeta diretamente os CAp.

De fato, nessas unidades há uma aberta colisão entre o que os seus docentes, estudantes e técnicos e administrativos desejam, a formação

de professores e a experimentação de novas metodologias de ensino baseadas no tripé ensino-pesquisa-extensão, e o que está sendo imposto como reestruturação pelo MEC.

O exemplo do CAp-UFRJ é ilustrativo com o número de professores efetivos muito aquém do necessário. A ampliação do Ensino Fundamental para 9 anos, a inclusão de novas disciplinas como sociologia e filosofia e as vacâncias oriundas de aposentadorias nos últimos 15 anos não foram supridas pelos parcos concursos. Em 2011 60% dos docentes eram substitutos.

Os 24 mil cargos para os EBTT previstos na Lei 12.677, estão longe de resolver a questão. Mais de 50% das vagas estão destinadas ao Pronatec e à expansão dos Institutos Federais. De fato, até agora, somente 532 vagas foram autorizadas (P.I. N. 25 de 5/2/13) entre Cefets, CPII e escolas técnicas e colégios vinculados às universidades.

A nova Carreira, coerente com a formação minimalista pretendida pelo MEC, obstaculiza a qualificação dos docentes da EBTT, incentivando a equivalência entre titulação de mestrado e doutorado com a denominada ‘certificação de conhecimentos’ por meio do “Reconhecimento de Saberes e Competências – RSC”.

A luta em toda rede federal é a mesma. Retomar o projeto de universidade defendido pelo ANDES-SN e pelos movimentos, organizar a luta para enfrentar a (contra) reforma, agregando o conjunto dos trabalhadores da educação, como parte da luta da classe trabalhadora contra a ofensiva destruidora do capital.

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Falta de política de fixação recrudesce precarização. Pará é o retrato do que acontece no País

Más condições de trabalho afastam docentes dos campi do interior

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Max Costa

Jornalista

Belém/PA

Se não fosse o nome da instituição pintado em um muro mal acabado,

quem passa pela Rodovia PA-242, no município de Capa-nema, no nordeste paraense, jamais imaginaria que no local funciona um campus da Univer-sidade Federal do Pará (UFPA). Com apenas um pavilhão de salas, prédios em construção e o mato tomando conta do es-paço, o campus de Capanema é o retrato da política de expansão da educação superior do governo federal na Amazônia.

A poucos quilômetros dali, no município de Bragança, professores são obrigados a mi-nistrarem aulas em escolas pú-

blicas, enquanto equipamentos se amontoam nos corredores do campus universitário, a espera da conclusão de obras do Reuni em atraso. Na Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), cria-da em 2009, em Santarém, as aulas ocorrem em salas impró-prias alugadas e de forma impro-visada em um hotel da cidade.

A situação dos campi do Pará e das relações com docen-tes, técnico-administrativos e estudantes ilustra a realidade de todas as universidades que assinaram o acordo de metas para adesão ao Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reu-ni): além da falta de espaço para desenvolverem suas ativi-dades de ensino, pesquisa e ex-tensão, os professores convivem com uma sobrecarga de traba-

lho ainda maior e com poucos programas de pós-graduação, que limitam a qualificação e o avanço na carreira.

Adoecimento e êxodoUm dos resultados dessa

precarização provocada pelas más condições de trabalho é a intensificação do adoecimen-to da categoria docente. Esse resultado tem também levado muitos professores a abando-narem a carreira docente ou a pedirem transferência para universidades localizadas nos grandes centros urbanos.

É o caso da professora do campus da UFPA no município de Breves, na Ilha do Marajó, Elen Carvalho, 42, que briga para conseguir sua transferên-cia definitiva para Belém. Com ansiedade depressiva, síndrome

Passados cinco anos, os prédios da expansão, na Universidade Federal do Pará (UFPA), não estão disponíveis

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do pânico, diabetes e hiper-tensão, a docente conseguiu uma remoção por seis meses para a capital do Pará a fim de fazer um acompanhamento psiquiátrico. “Antes de entrar na universidade, eu era forte, corajosa e hoje tenho medo de quase tudo”, desabafa Ellen, emocionada.

Durante quase dois anos, Ellen acumulou a direção da faculdade e atividades de sala de aula, em que tinha 48 ho-ras semanais. Os primeiros sintomas do adoecimento manifestaram-se quando a do-cente foi obrigada a se afastar da família, que mudou para

Belém para acompanhar um tratamento de saúde da filha, que não era garantido no mu-nicípio de Breves. “Comecei a ficar tensa, neurótica e passei a desenvolver a síndrome do medo, morando sozinha. Eu fiquei em pânico, larguei tudo e vim me tratar. Não tenho condições psicológicas para voltar”, conta.

Para a professora, o governo federal expandiu a educação superior sem planejamento. “Os professores que vão mi-nistrar aulas nos campi do in-terior não são bichos, são seres humanos. Não merecemos isso. Não temos nada que nos

motive a ir trabalhar lá”, avisa a professora.

Política de fixaçãoNa avaliação do professor

Jacob Paiva, da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), para garantir que os docentes permanecessem em seus campi de origem, o governo federal deveria criar um programa de fixação, com auxílio-localidade diferen-ciado, formação continuada e política de assistência à saúde.

“No caso da Amazônia, por causa das especificidades regionais, o custo de vida e o de deslocamento são muito grandes, pois estamos isola-dos, o que gera dificuldades de manutenção dos professores”, garante Jacob Paiva.

O docente lembra que até no governo FHC (1995-2002) – quando houve a mais radical retirada de recursos financeiros do orçamento da União das universidades públicas, federais e gratuitas na história do Brasil – os professores que trabalha-vam em áreas fronteiriças ti-nham uma alínea específica no contracheque relativa ao paga-mento de auxílio-localidade.

“Se fôssemos tratados como carreira prioritária, tal como é feito nas carreiras dos poli-ciais quando vão para áreas de fronteira, teríamos condições de interiorizar a educação su-perior com qualidade e manter os professores nesses locais”, argumenta Paiva.

Carvalho, do campus de Breves, acumulou 48 horas semanais

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Expansão das IFE e a precarização

Vera Lúcia Jacob ChavesProfessora

Universidade Federal do Pará

A expansão acelerada das Instituições Federais de Ensino Superior do Brasil, em especial a partir de 2007,

com a implantação do Reuni, é parte da contrarreforma da educação superior brasileira, no contexto de crise estrutural do capitalismo, que têm nas agências multilaterais de financiamento, as principais agentes das reformas implantadas. As diretrizes emanadas por essas agências, em especial o Banco Mundial, têm como eixo central a ampliação da oferta desse nível de ensino por meio da redução de seu custo, do aprofundamento da privatização, da flexibilização das instituições e do aumento da intensificação e precarização do trabalho docente. Trata-se, de fato, da implantação de um Estado economicista e empresarial-gerencialista onde a satisfação das demandas do mercado e de sua lógica de competição ocupam lugar de destaque. Nesse contexto a política de expansão do ensino superior instituiu um novo modelo de organização e gestão nas universidades públicas fundamentado no paradigma gerencialista de administração via contratos de gestão, com vistas a ajustar essas instituições à lógica produtivista de privatização e mercantilização de bens e serviços acadêmicos. Assim, princípios como flexibilidade, racionalidade, produtividade e competitividade foram adotados no interior

das IFE com vistas à expansão da oferta do ensino, com contenção dos gastos públicos. Esse processo tem promovido a expansão desse nível de ensino com a transformação da função social das universidades públicas mediante a quebra da indissociabilidade do ensino, pesquisa e extensão e, ao mesmo tempo, criado as condições objetivas para o aumento da precarização e intensificação do trabalho docente tanto pela submissão a critérios de produtividade, como pelas formas de contratação, as péssimas condições de trabalho e o aumento da relação aluno-professor na sala de aula. A maioria expressiva dos novos docentes das IFE é contratada para atuar no interior dos estados e enfrentam dificuldades de adaptação nas cidades interioranas que, em geral, são muito distante das capitais e não oferecem condições de infraestrutura adequada, em especial as cidades do interior da região Amazônica. Acrescenta-se, ainda, as condições precárias para o desenvolvimento das atividades docentes, que se concentra no ensino de diferentes disciplinas, com uma extensa carga horária de trabalho em salas de aula (algumas improvisadas), sem incentivo a pesquisa, o que provoca desgaste físico e/ou mental com impactos na saúde desses trabalhadores. Como consequência dessa política o conjunto de IFE está paulatinamente sendo transformado em escolas de terceiro grau de caráter mercantil. É preciso reagir com urgência para evitar a destruição completa da Universidade pública e que todos os cidadãos brasileiros possam ter acesso ao ensino público gratuito e de qualidade socialmente referenciado.

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Apesar da retribuição por titulação e outros adicionais, professores recebem o pior salário entre os servidores públicos federais

‘Penduricalhos’ disfarçam péssima remuneração dos docentes

João Negrão

Jornalista

Brasília/DF

Penduricalhos. No di-cionário essa palavra significa “coisa que fica

pendurada, que pende como enfeite ou adorno”. Para a ca-tegoria profissional do quadro de servidores federais que tem a pior remuneração no Brasil, o termo significa exatamente isto mesmo: os enfeites que o governo federal pendurou em seus contracheques para masca-

rar os baixos salários que paga aos professores das Instituições Federais de Ensino (IFE).

O salário básico de um professor das universidades públicas brasileiras em início de carreira (professor auxiliar) é de R$ 1.914,58 para 20 horas semanais de trabalho. Esse va-lor só está em vigor se for con-siderado o Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal, instituído pela Lei nº 12.772, de 28 de dezembro de 2012, que começará a valer a partir de 1º de março, a lei que institui o

Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal (PCCMF).

A média de salários básicos para início de carreiras nas demais carreiras do serviço pú-blico federal está em torno de R$ 6.500,00. Mas os salários na esfera da União costumam ter patamares maiores para algumas categorias. Um agente da Agência Brasileira de Inte-ligência (Abin), por exemplo, ganha, em início de carreira, R$ 11.941,08.

Na mesma condição de início de carreira recebem: R$

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13.600,00, um auditor federal; R$ 12.960,77, um pesquisador do Instituto de Pesquisa Eco-nômica Aplicada (Ipea); R$ 13.368,68 um delegado e R$ 7.514,33 um agente da Polícia Federal; e R$ 10.300,00 um pesquisador do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT).

No atual quadro, para alcan-çar uma remuneração próxima ao condizente, um professor universitário com doutorado, no topo da carreira, tem de agregar a sua remuneração a adicionais que vão contabilizar, em média, um total de R$ 10.500,00. Com a nova lei que instituiu o

PCCMF, a remuneração de um docente com mesmo perfil e em regime de 40 horas semanais terá um total de R$ 7.111,84, sendo R$ 4.355,79 de salário básico e R$ 2.756,08 de retri-buição por titulação. Ou seja, no topo da carreira um pro-fessor está recebendo quase a metade de um auditor federal, de um delegado federal e de um pesquisador do Ipea.

O presidente da Seção Sin-dical dos Docentes da Univer-sidade Federal do Tocantins (UFT), Fábio Duarte, explica que os valores demonstram o

achata-mento dos salários da catego-ria e revelam que os “adornos” como a retribuição por titu-lação cria uma instabilidade, uma vez que não será compu-tada para efeito de cálculo de aposentadoria, por exemplo. “Trata-se de um percentual não contabilizado e reforça o achatamento salarial. Mesmo com a promessa do governo de que a retribuição não vai ser retirada, há uma instabilidade, porque não é salário real”, ob-serva ele.

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Dedicação exclusivaMesmo para o professor-

-doutor com dedicação exclu-siva a situação não é muito diferente. Ele perceberá, de acordo com o novo Plano, um total de R$ 14.431,80 – R$ 6.684,00 de salário básico, mais R$ 7.747,80 de retri-buição por titulação. Ainda assim, este professor irá receber bem menos do que outros profissionais fede-rais igualmente em topo de carreira: agente da Abin, R$ 18.400,00; auditor federal, R$ 19.451,00; pesquisador do Ipea, R$ 18.478,45; delegado da PF, R$ 19.699,82.

Esses valores demons-tram que os docentes das universidades federais, pú-blicas e gratuitas, além das más condições de trabalho impostas pelas sucessivas políticas de sucateamen-to e privatização, como o Programa de Expansão das Universidades Federais (Reuni), ao longo dos últi-mos anos, não conquistaram reajustes salarias da mesma forma que outras categorias similares, como, por exemplo, os pesquisadores do Ipea e do Ministério da Ciência e Tec-nologia.

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(JN)

Sem uma remuneração con-dizente e um plano de salários, cargos e carreira que garanta a sua valorização salarial e profissional dentro das IFE, o professor do en-sino superior vê-se forçado a buscar outras formas de remuneração para aumentar seus ganhos. Eles buscam programas, como o Plano Nacional de Formação de Professores de Educação Básica (Parfor), bolsas de produção científica e iniciativa privada e outros artifícios para au-mentar seus ganhos.

A outra saída é a busca por bolsas de produção científica e, por fim, o ingresso na iniciativa privada, muitas vezes, usando a instituição e os recursos públicos para execução de trabalhos des-tinados à iniciativa privada. Com a atual política salarial, a desva-lorização do docente superior e a piora das condições de trabalho, o governo federal estimula o êxodo da mão de obra docente, formada e aperfeiçoada pelas universidades públicas, para as universidades privadas.

O ParforPrograma de investimento

na formação do professor da educação básica, o Parfor é admi-nistrado pelas IFE no âmbito de suas jurisdições. Para executá-lo recruta no seu quadro docente os professores dos alunos do pró-prio Parfor. “O professor não é obrigado a lecionar no programa, mas como a remuneração é bai-xa, ele enxerga ali uma forma de ampliar seus ganhos”, observa o presidente da Seção Sindical dos Docentes da Universidade Federal

Artifícios para assegurar um ganho maior no fim do mês

A situação é resultado de vários fatores, como esse o descaso proposital do go-verno federal com a educa-ção pública de nível básico e médio e com o ensino público superior cujo objetivo é a privatização. Mas também há que se ressaltar que a situação tem relação como o bai-xo nível de mobilização da categoria, agravado por uma divisão no mo-vimento patrocinado por forças aliadas do governo que criaram sindicatos paralelos

para dividir a categoria docente e fragilizar seus movimentos reivindicatórios.

“A própria Lei nº 12.772/2012, que instituiu o Plano de Carreiras e Cargos de Magistério Federal, foi fru-to de uma negociação entre o governo e uma entidade para-lela, dos seus aliados”, denun-cia o professor da Universida-de Federal de Mato Grosso e presidente da Associação dos Docentes da Universidade Fe-deral de Mato Grosso – Seção Sindical do Sindicato Nacio-nal dos Docentes das Insti-tuições de Ensino Superior

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do Tocantins (UFT-S.Sind.) do ANDES-SN, Fábio Duarte.

A UFT é uma das universida-des federais mais envolvidas no Parfor e seus professores costu-mam percorrer os sete campi da instituição espalhados pelo Esta-do de Tocantins para participar da formação dos professores de educação básica dos 115 municí-pios desta unidade da Federação. As modalidades do Parfor são presencial, semipresencial e à distância. Ao aderir ao progra-ma, mais uma vez o docente não

despenderá de tempo para se dedicar melhor à suas atividades originais na instituição federal. Resultado: menos qualidade no ensino.

A produção científica, situação que deveria pertencer natural-mente à atuação dos docentes nas universidades para que seja aten-dido o tripé ensino, extensão e pesquisa, tornou-se, simplesmen-te, mais uma forma de aumentar ganhos financeiros de professores por causa da baixa remuneração. Dessa forma, nem sempre o crité-

rio da pesquisa está relacionado à necessidade do trabalho científico desenvolvido pelo docente, e sim, tão somente, a busca por ganhos salariais.

“A falta de uma política de valorização de fato do magistério federal acaba com a perspectiva de construção da universidade brasileira com base na indisso-ciabilidade do ensino, pesquisa e extensão, como preceitua a Cons-tituição federal em seu artigo 207”, assevera o professor Carlos Roberto Sanches.

(Adufmat-S.Sind.). O acordo não foi negociado com o mo-vimento grevista que ocorreu em 2012, protagonizado pelo ANDES-SN.

Na direção de uma das mais fortes greves realizadas pelo movimento docente, os dirigentes do ANDES-SN esforçaram-se, com suas seções sindicais nos estados, para pa-ralisar quase que totalmente as universidades e os institutos federais. Contudo, segundo o dirigente da Adufmat-S.Sind., a ação das lideranças ligadas aos sindicatos oposicionistas acabou por minar o movimento

do ANDES-SN e não permi-tiu a obtenção da real valoriza-ção da categoria.

O novo PCCMF, além de não acabar com os penduri-calhos, agrega muito pouco o salário básico e não aponta perspectiva de valorização da carreira do magistério federal. A não-reposição da inflação desde 1998 é uma realidade. Hoje (2013) o salário básico do professor das IFE é 2,8% inferior ao de 1998. Isso sig-nifica que o salário de profes-sor adjunto um é, hoje, 86% do que o salário que recebia há 15 anos.

PrecarizaçãoNos últimos dez anos,

especialmente nos cinco últi-mos, o governo federal pouco avançou no sentido de corrigir as injustiças salariais do setor público. A implantação do Pro-grama de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reu-ni), em vez de resolver agravou a ainda mais a situação salarial. Os investimentos na reestrutu-ração e expansão das IFE sem a contrapartida da valorização dos profissionais pioraram ain-da mais a precarização das con-dições de trabalho docente.

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Neila SouzaProfessora

Universidade Federal do Tocantins

Nos últimos anos, sobretudo, após os 8 anos do governo Lula e a continuidade da desestruturação do ensino superior no governo Dilma, tem criado um

fosso entre o que deve ser a educação pública brasileira e o que se apresenta na realidade. Observa-se que, sobretudo, que o professor está doente e desmotivado para as funções acadêmicas, constituindo-se como um mero cumpridor de tarefas.

As pesquisas na grande maioria das vezes só se tornam exequíveis a partir da concorrência em editais para que, financeiramente, possa viabilizar seu trabalho acadêmico. Ele precisa encontrar formas de captar recursos para garantir o funcionamento da universidade. Isso se aprofunda quando se trata de universidades novas, multi-campi que precisam se consolidar. Mas a expansão não veio acompanhada de recursos financeiros.

Perante essa situação, quando o assunto é o contracheque dos docentes, o quadro se torna gritante e desolador. O professor que ingressou na universidade até 2003, por exemplo, tinha direito à aposentadoria integral. Mas os que ingressaram a partir de 2004 estão incluídos nas regras implantadas pela reforma da previdência de 2003: vão receber aposentadoria proporcional. Grande parte dos docentes nem sequer sabe disso e acredita que a universidade é o “oásis” do emprego público.

Os docentes lutam por uma única linha no contracheque há anos e que, ao longo desse tempo, os sucessivos governos vêm fazendo das diversas gratificações uma forma de limitar o salário. As formas de gratificações, sob a forma de valorização

da qualificação, impõem restrições ao salário, principalmente no achatamento após a aposentadoria, e não atualizam o salário, na medida em que houve uma perda de 60% no poder aquisitivo.

A forma como está o salário do docente é uma das razões da não atração pela carreira. Além disso, o retalhamento do salário traz insegurança, visto que não há garantia de que qualquer governo, sob o discurso de gastos e problemas de arrecadação, de não reduzir o de retirar as gratificações.

No “projeto de expansão” das universidades propagou-se a questão estrutural, com construções de prédios, expansão física, e isso não foi atendido e muito menos o elemento humano fundamental, o professor, foi atendido nos seus pleitos salariais. Com remuneração baixa, recorre e atende ao que está a mão para complementar sua renda por meio de criação de cursos de especialização pagos e da obtenção de uma renda extra, via fundações privadas de apoio.

Outro problema detectado na complementação de renda do professor é o programa do governo Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (Parfor). Trata-se de um programa de formação de professores que, na verdade, é um curso de graduação que oferece uma espécie de caça-níquel que corre por fora dos seus vencimentos. O governo envolve universidades federais, estaduais e municipais nesse programa.

Para ministrar as aulas nesses cursos de graduação de 1ª ou 2ª licenciatura, só poderão participar professores efetivos da rede federal, que sacrificam suas férias em nome do aumento da renda mensal. É um compromisso assumido via contrato em que apenas uma parcela de docentes é convidada a participar. Importante enfatizar que essa remuneração extra não aparece no contracheque e é temporária.

O sistema de gratificações

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Estudante de jornalismo, Andrew Costa, revela, em ensaio fotográfico apresentado como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), o que ele viu nos canteiros de obras da UFF. Nas imagens, a marca do abandono e do descumprimento dos prazos do Reuni

Universidade Federal Fluminense, o retrato das más condições da infraestrutura

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Estudante de jornalismo, Andrew Costa, revela, em ensaio fotográfico apresentado como Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), o que ele viu nos canteiros de obras da UFF. Nas imagens, a marca do abandono e do descumprimento dos prazos do Reuni

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Reuni causou modificação negativa no ethos acadêmico

Nova concepção fundamenta-se na inserção do direito fundamental à educação ao ambiente do mercado

Carla Lisboa

Jornalista

Brasília/DF

O Programa de Apoio a Planos de Reestrutu-ração e Expansão das

Universidades Federais (Reu-ni) foi uma forma de o governo federal consolidar a precariza-ção do trabalho docente. A ava-liação do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES--SN) é a de que os números do programa refletem essa realida-de que os docentes passaram a enfrentar no seu cotidiano.

Essa compreensão sobre o programa, segundo o ANDES--SN, extrapola a visão econo-micista de que as mazelas do projeto do governo se deveu ao

baixo investimento de recursos financeiros e, por causa disso, o não-cumprimento das metas foi uma consequência gene-ralizada em todo o País. Eles entendem que a expansão via Reuni foi mais prejudicial do que o que se lê nos números.

Mais do que negligenciar a

infraestrutura e precarizar as condições de trabalho, a mu-dança afetou de forma negativa o ethos da educação superior brasileira como que a preparar o terreno para transformar esse direito social em mercadoria. “O ANDES-SN sempre de-fendeu e defende a expansão

Manifestação na Esplanada dos Ministérios contra o Reuni, em 2007A

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do ensino superior público até o atendimento universal das necessidades brasileiras”, lembra o professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e primeiro vice-presidente do ANDES-SN, Luiz Henrique Schuch.

Todavia, não apoia uma ex-pansão feita pela via privada que suprime a possibilidade de im-plantar no País uma educação pública, gratuita, laica e social-mente referenciada. Segundo ele, “a crítica à expansão pela via privada, que ocorre desde o regime militar, fundamenta-se na inserção do direito funda-mental à educação ao ambiente do mercado, da compra e da venda de um produto que é o acúmulo cultural produzido em toda a história da humanidade com objetivo de lucro, como o “filet mignon” de um negócio do setor de serviços no mesmo

padrão da internacionalização oligopolizada da compra e da venda de hambúrgueres, por exemplo. A educação de um povo não pode ser reduzida à condição de insumo para determinado modelo de desen-volvimento econômico e muito menos a uma fatia de mercado”, explica o vice-presidente.

As lideranças sindicais do ANDES-SN reconhecem que os números finais do programa indicam o fracasso deste mode-lo de expansão. Por este enten-dimento, os números revelam o resultado da falta de discussão com os setores organizados da sociedade e da imposição de novos conceitos cujo objetivo é simplesmente enfraquecer ainda mais o setor da educação pública. “A essa razão concei-tual acumulam-se elementos concretos, muitos dos quais são expressão objetiva da abor-

dagem que submete educação e pesquisa à posição subalterna na relação império–colônia”, argumenta o professor.

Dentre esses elementos de submissão, Luiz Henrique Schuch destaca “o paradigma curricular (significado huma-no e da qualidade socialmente referenciada de cada diploma de nível superior) versus a mas-sificação da oferta de diplomas vazios (resultantes de cursos aligeirados e superficiais) e o paradigma do trabalho docente (estímulo para que os profes-sores concentrem dedicação integral a projetos acadêmicos de fôlego, que exigem formação continuada, empenho de traba-lho do tipo artesanal e longos prazos de maturação versus intensificação mediante exigên-cias de curto prazo, precariza-ção das condições de trabalho, instabilidade nas relações)”, diz o professor.

Ele esclarece que nesses as-pectos a rede de universidades federais, e de alguns estados, detinha o papel de referência em busca do que se é comumen-te chamado de padrão unitário de qualidade, no qual a edu-cação superior é tratada como um processo de construção do conhecimento indissociável en-tre ensino, pesquisa e extensão, além da dedicação integral de toda a vida profissional dos professores a projetos acadêmi-cos de fôlego em seus diversos campos de atuação.Manifestação na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, em 2012

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Para os docentes, o enfra-quecimento do padrão unitário de qualidade da educação su-perior brasileira faz parte de um projeto de privatização que, por sua vez, integra um cenário econômico maior, definido há várias décadas pela Organi-zação Mundial do Comércio (OMC) e pela Área Livre par ao Comércio entre as Amé-ricas (Alca), principalmente por meio de acordos, como o Acordo Geral sobre Comércio e Serviço (AGCS), firmado no

fim do século XX, em que se preconizou a mudança de con-cepção da relações comerciais no mercado mundial.

Em um artigo intitulado “A educação superior é merca-doria ou direito no âmbito da Organização Mundial do Co-mércio?”, os professores João dos Reis Silva Junior, da Uni-versidade de Sorocaba, e Carlos Lima, da Universidade de Bra-sília (UnB), explicam que essa “lógica orientadora da OMC é a Extended Order (funda-

mento central do economista austríaco e Prêmio Nobel de Economia, Frederick August Von Hayek), segundo a qual todas as atividades humanas deveriam ser por ela [OMC] organizada, que serviu de base para a produção do ultralibe-ralismo econômico que se de-senvolveu no mundo a partir da década de 1970”.

Na artigo, os pesquisadores alertaram para o fato de “que a educação, fundamento da ideo-logia libera, com as discussões

Mudança enfraquece o padrão unitário de qualidade

Na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, comunidade estimula a retomada do movimento estudantil combativo

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em curso na OMC, poderá de direito social transformar-se em uma mercadoria no setor de serviços”. Junior e Lima expli-cam que o setor de serviços é formado pelo “terciário do go-verno, pelas empresas terciárias e pelo terciário das empresas e que a transferência de deter-minada atividade exercida pelo terciário do governo para em-presas terciárias provoca uma profunda mutação nas relações socioeconômicas”.

Essa mutação vem ocor-rendo no Brasil em vários setores da economia consi-derados como direito social, como a educação – com o programa de expansão via

Reuni – e na saúde – com a instituição da Empresa Brasi-leira de Serviços Hospitalares (Ebseh), um mecanismo de privatização dos hospitais universitários. “Não se pode saudar como democrático o que vem ocorrendo no Brasil que alterna períodos em que a esfera pública é praticamente congelada e a ampliação da oferta de vagas em institui-ções privadas é estimulada (já respondem por mais de 80%) com outros períodos nos quais a ampliação de vagas nas universidades públicas é feita por fórmulas tais que resultam no enfraquecimento do seu papel de referência em

busca do padrão unitário de qualidade”, explica Luiz Hen-rique Schuch

Ele esclarece que com esse enfraquecimento, reduz-se, “muitos campi, unidades e cursos da expansão das IFE, e seus professores, ao padrão indesejável que, anteriormente, era exemplo para critica à falta de qualidade de algumas das piores unidades do ensino su-perior privado”. Segundo ele, “a desproporção entre os meios disponibilizados para que fos-sem cumpridas as exigências de expansão imposta pelos go-vernos, com exorbitantes metas pré-definidas, combinada com a indução ao rebaixamento dos

Os prédios incompletos da Ufam são o exemplo da falta de compromisso com a educação

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padrões curriculares, do tipo bacharelato interdisciplinar, foi a característica mais marcante do que se sucedeu a partir de 1998, em decorrência do cha-mado Acordo MEC/Andifes”

Schuch acrescenta que, pos-teriormente, a partir de 2005, essa característica foi reforçada “em decorrência dos Termos de Metas do programa de governo denominado Reuni, imposto de cima para baixo em meio a ampla campanha propagandís-tica e ladeado por duas medi-das de estímulo com recursos públicos à expansão do ensino superior privado: a expansão do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o Progra-ma Universidade para Todos (Prouni), um dos maiores pa-cotes de isenção fiscal do qual se tem notícias, imediatamente abocanhado pelos chamados ‘tubarões’ do ensino”

Segundo ele, quando o Reuni foi lançado, era marcan-te o grave passivo de docentes, técnico-administrativos, espaço físico, laboratórios, bibliotecas, depois de muitos anos sem recursos para investimentos e, incluindo aí, acúmulo de dívidas relacionadas com as despesas de manutenção das instituições. “Muitos aspectos dessas carências se agravaram e, em alguns casos, foi sendo aberto um fosso entre unidades e campi de uma mesma IFE, não como algo transicional, e sim estrutural”.

Cursos tradicionais com uma base curricular sólida, ra-zoável número de professores, geralmente organizados em de-partamentos, com laboratórios, linhas de pesquisa e programas de pós-graduação consolidados foram “espremidos” em suas necessidades pela expansão de novos cursos e campi criados em situação de grave insufici-ência de professores e técnico--administrativos, quase todos contratados recentemente e cumprindo estágio probatório, sem estrutura departamental, “portanto, expostos a todos os tipos de pressão e de assédio moral para que assumam um grande número de turmas, muitas vezes em leque temático que excede, em muito, as obri-gações de todo o seu regime de trabalho e a área para a qual prestaram concurso”, afirma Schuch.

Dessa forma, segundo ele, “é impossível combinar os compromissos em sala de aula com pesquisa e extensão, ou mesmo obter afastamento para pós-graduação”. Nessas circunstâncias, a alteração do paradigma curricular em dire-ção a cursos de formação ali-geirada, aparece até como uma solução para resolver o dilema dos cursos criados sem o ne-cessário quadro de professores. Além do mais, muitos dos no-vos cursos, particularmente da chamada interiorização, foram instalados em salas cedidas de

antigos colégios, sem infraes-trutura para pesquisa, quando não, em rústicos containers, totalmente impróprios e cujo aluguel é altíssimo, como é o caso de Rio das Ostras.

De acordo como vice-pre-sidente do ANDES-SN, so-mente anos depois de funcio-namento os investimentos em prédios próprios começam a aparecer e com eles, em muitos casos, a comprovação de que a concepção original pressupõe o abandono ao compromisso com o padrão unitário de qualidade. Em geral são blocos de salas de aula muito grandes, para mais de 150 alunos, e os blocos des-tinados a laboratórios são bem mais parecidos com aqueles espaços demonstrativos chama-dos de laboratórios nos antigos bons colégios de segundo grau: laboratório de música, labora-tório de química, laboratório de física, laboratório de biolo-gia, lado a lado, todos juntos como salas demonstrativas, sem as condições necessárias aos verdadeiros laboratórios de investigação científica.

“Isto sem falar na falta de condições adequadas à per-manência dos docentes em regime integral, carência quase absoluta de pessoal de apoio da própria instituição e descui-do generalizado dos projetos quanto a exigências de acessibi-lidade, urbanismo e economia de recursos naturais”, informa o professor da UFPel.

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Em termos de investimento financeiro, as IFE receberam muito aquém do que o gover-no prometeu e, com isso, não conseguiu cumprir os acordos de metas assinados em 2007. Na Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR), por exemplo, a previsão era a de que, entre 2009 e 2012, seriam aplicados R$ 223,5 milhões. Mas, ao todo, o inves-timento foi R$ 101,7 milhões, menos da metade do previsto. Na Universidade federal do Paraná (UFPR), a diferença foi maior: dos R$ 226,7 mi-lhões previstos, apenas R$ 38,3 milhões foram liberados, segundo dados do Portal da Transparência.

Desde que o Reuni foi instituído, as análises do movi-mento docente filiado ao AN-

DES-SN previa o não cumpri-mento dos acordos não só por causa das metas exorbitantes, mas também em virtude do baixo investimento. Na época, o Grupo de Trabalho de Po-líticas Educacionais (GTPE) analisou os poucos acordos de metas que vieram a público, classificou-os de draconianos e constatou que, ao final do pe-ríodo em que seria executado, dezembro de 2012, as universi-dades não os cumpririam.

Dito e feito. Quatro meses depois do fim do período de execução do programa, em abril de 2013, o secretário de Educação Profissional e Tecno-lógica do MEC, Marco Anto-nio de Oliveira, reconheceu que houve um “descompasso” entre a expansão dos institutos fede-rais e a contratação de pessoal.

As IFE não receberam nem a metade dos recursos financei-ros prometidos pelo governo e nem conseguiram materializar boa parte das ações prevista pelo MEC.

A prova dessa situação está nas precárias condições dos campi, sobretudo os do interior. Um quadro de abandono e im-provisações foi registrado em 34 dossiês elaborados por várias seções sindicais para subsidiar o ANDES-SN a elaborar a pauta de reivindicações para a campa-nha salarial de 2012. Nos do-cumentos, lideranças sindicais demonstraram, com imagens e depoimentos, uma situação que revelou a piora desse sucatea-mento que já ocorria na educa-ção superior e nas condições do trabalho docente desde antes do instituto do Reuni.

Governo não repassou os recursos financeiros prometidos

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Na Rural do Rio, faixas e cartazes do movimento docente declaram o descontentamento geral

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A atual situação das universi-dades levaram os dirigentes sindi-cais do ANDES-SN a perceber que há problemas orçamentários no Reuni, que o crescimento das vagas é meramente quantitativo e que as metas de expansão estão comprometidas. Luiz Henrique Schuch disse que eles perceberam essa situação ao verem que as IFE vinham acumulando deficiências por mais de uma década.

Segundo ele, antes do Reuni havia contingenciamento de va-gas docentes (quase dez mil va-gas no final da década de 1990, conforme estimativa da Associa-ção Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior – Andifes – à época) e de técnico-administrativos, or-çamentos decrescentes em valor real, ausência de investimentos, dívidas com os serviços de ma-nutenção e os impasses sendo contornados pela via transversa das fundações privadas, contra-tação irregular de professores substitutos e terceirizações.

“Esse era o quadro quando o governo anunciou o programa Reuni dizendo que seu objetivo seria ampliar o desempenho da capacidade instalada e trazendo duas cláusulas pétreas: ampliar a relação alunos–docente de 1/9 para 1/18 e ampliar a relação estudantes ingressantes–es-tudantes formados para 90%.

Tudo isso reduzido a fórmulas elaboradas pelo Mec que exigiam a que algumas IFE dobrassem o número de vagas por cursos em cinco anos”, informa.

O professor da UFPel afir-ma que as metas registradas nas cláusulas pétreas exorbitam em muito da experiência interna-cional no ensino superior de boa qualidade e as exigências de expansão foram despropor-cionalmente maiores do que os meios sinalizados, especialmente vagas de pessoal e recursos para manutenção.

“A discrepância era tanta que algumas das grandes IFE reagiram logo no inicio e esta foi o motivo do governo mudar a equação. Ao inflar a pontua-ção relacionada com os cursos existentes de pós-graduação, nitidamente concentrado nes-sas universidades, as exigências de ampliação de vaga para elas caíram muitíssimo tornando a adesão mais razoável. A grande maioria das IFE, no entanto, não teve essa atenuação”, declara.

Mas o fracasso da expansão do tipo Reuni é uma informa-ção refutada pelos gestores do programa no MEC que, por intermédio da Assessoria de Comunicação (Ascom), afirmam que o foi um sucesso. A equipe do MEC nega até mesmo os da-dos do Portal da Transparência

e informa que, em termos de recursos financeiros, o governo federal repassou mais do que o previsto nos acordos. “Investiu quase R$ 10 bilhões na expansão e na reestruturação das univer-sidades federais desde 2003 até 2012”, garantem os assessores de imprensa por meio de nota à reportagem da Revista Dossiê Precarização.

De acordo com a nota, “de 2003 até 2011, as vagas anuais de ingresso na graduação mais do que dobraram nas federais, passando de cerca de 110 mil, em 2003, para mais de 230 mil, em 2011” e que o aumento das vagas de ingresso impactou no número total de matrículas em instituições federais, passando de 596.219 para mais de um milhão, nesse período. “Com o Reuni, foram criados 2.428 no-vos cursos”, enumera.

Diz ainda que, “no processo de expansão da rede, 42.099 va-gas de trabalho foram abertas por meio de concurso, sendo 21.421 para docentes e 20.678 para téc-nicos administrativos. Do total de 3.885 obras, 2.417 já estão concluídas (62%) e 1.022 (26%) estão em execução. A previsão é que até 2014 o Brasil tenha um total de 63 universidades fede-rais, com 321 câmpus distribuí-dos em 272 municípios”, informa a Ascom/MEC.

MEC refuta a análise e mantém o jogo dos números

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O programa de expansão, na avaliação do ANDES-SN é resultado de um desvio de dire-cionamento e de uma sucessão de equívocos. O mapa do Reu-ni traduz-se para os docentes como um roteiro de problemas, precarizações, rebaixamento da qualidade de ensino e um ins-trumento de desqualificação e repassa para o aluno a ideia de que, com o diploma universitá-rio, ele terá um emprego e não

uma formação cidadã, profis-sional e humana.

O professor da Universida-de Federal de Goiás (UFG), Nelson Cardoso Amaral, ana-lisou a expansão do Reuni com base em indicadores obtidos na Execução Orçamentária do governo federal e no Censo da Educação Superior do Institu-to Nacional de Estudos e Pes-quisa Educacionais Anísio Tei-xeira (Inep) e, segundo ele, a

falta de investimento é o dado que causa preocupação.

“O indicador que verifica o volume de recursos aplicados por vaga oferecida mostra ape-nas uma pequena elevação em relação ao período 1995-2002 (governo Fernando Henrique Cardoso) para, depois, voltar a cair nos anos de 2009 e 2010 (governo Lula)”, diz o profes-sor. Segundo ele, o aumento do número de professores doutores, no quantitativo de campi instalados, no grande aumento de infraestrutura ins-talada nas capitais e no interior tem exigido rápidas ações de complementação de quadro de professores, servidores técnico--administrativos, bibliotecas, restaurante, estrutura de fun-ções, recursos financeiros para outras despesas correntes, den-tre outras.

“Só para exemplificar, a estruturação de novos cursos com quadro de professores construído de 100% de dou-tores já apresentam demandas para abertura de pós-graduação stricto sensu, instalação de laboratórios para realização de pesquisa, ampliação das ins-talações físicas para abrigar as atividades do curso de gradu-ação, para promoção de inter-câmbios nacionais e internacio-nais, etc.”, afirma o professor.

Baixo investimento e carência de quadros docentes

Obras inacabadas na Universidade Federal do Amazonas

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Os 34 dossiês apresentados ao ANDES-SN por várias seções sindicais comprovam a falta dos meios materiais e humanos para executar a expansão com qualidade das instituições federais de ensino. Falta de tudo na expansão. De estrutura física para atender ao novo número de estudantes até a privação de recursos financei-ros para ampliação infraestru-tural e para reverter a carência de docente e de técnicos para garantir a função científica e pedagógica da universidade pública. Os sintomas e os re-

flexos da desproporção entre as reais necessidades e os investi-mentos de recursos financeiros são generalizados em todo o País e afetam inclusive a saúde dos trabalhadores.

Já se vê, por exemplo, entre docentes, os efeitos da inten-sificação do trabalho, como o adoecimento. Veem-se também outros efeitos do Reuni que complementam o processo de mudança do padrão da educa-ção superior, como a retirada de direitos, o abandono do projeto de produção do conhe-cimento (indissociabilidade), a

degradação da autonomia e da democracia e da desestrutura-ção dos planos de carreira.

Quanto à infraestrutura interna das universidades, as imagens fotográficas nos dos-siês denunciam as condições de trabalho e os depoimentos elencam uma lista de situa-ções que agravam o cenário da educação superior, como pro-blema do passivo em relação a docentes e técnico-adminis-trativos; a situação dos novos modelos da expansão e dos novos campi que, além da falta de infraestrutura, enfrentam

Dossiês registram aumento do sucateamento e más condições de trabalho

Prédio na Ufam. Fotos dos 34 dossiês do ANDES-SN comprovam falta de meios materiais e humanos para expansão

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a ausência de recursos finan-ceiros e humanos; a ação das agencias de financiamento que pressionam para o pro-dutivismo; gestores que pas-sam a agir como gerentes de contas a “apagar incêndios”; a inserção de 6.380 professores temporários e a contratação de terceirizados.

Dentre as análises da si-tuação, os representantes do Sindicato Nacional percebem que até mesmo a forma com que as novas tecnologias de comunicação vêm sendo usadas promovem a inten-sificação do trabalho e a sensação de frustração entre os docentes. É que a grande quantidade de informação/cobrança em tempo real, in-dependentemente se é horário de expediente, dia ou noite, fim de semana ou período de férias, associada à pressão das agências de fomento pelo

produtivismo de cunho pri-vatista, provoca uma sensação intrínseca de frustração e de dívida, uma sensação de que está sempre devendo.

Efeitos como o que tem provocado a diminuição de di-reitos, como o da assistência/permanência, que é um direito social oriundo do caráter pú-blico da universidade, dentre outros, também fazem parte do rol de problemas que têm intensificado a precarização do trabalho dos professores. Aspectos subjetivos também colaboram para o agravamento dessa situação. Um exemplo é a violência simbólica mate-rializada pela discriminação e a punição de quem diverge das concepções de universida-de em curso. Atualmente, as divergências de opinião são criminalizadas.

Assim, esse quadro geral da situação, com os efeitos do

processo de mudança conceitu-al, as imagens e os depoimen-tos nos dossiês demonstram que a facilidade de acesso e a interiorização do ensino supe-rior do País que o governo pro-metia deixaram de ser um so-nho para se tornar, em muitos casos, um pesadelo na vida de estudantes e na dos professores de Norte a Sul do País. O que eles enfrentam diariamente é uma ausência de quase tudo do que se precisa para desenvolver o magistério, a pesquisa e a extensão.

A grande maioria das uni-versidades que se desdobraram em vários campi e em muitas vagas para a graduação a fim de cumprir as metas do Reuni está com problemas de infra-estrutura, de condições de tra-balho, de ocupação das vagas previstas e não consegue finali-zar o acordo de metas definido em 2007.

Embora a Ascom do MEC informe que houve concurso para suprimir a falta de mão de obra, o que se viu foi um remendo por meio de uma Medida Provisória (MP) a uma ilegalidade trabalhista.

A presidente da República, Dilma Rousseff, baixou a MP 525, em fevereiro de 2011, para criar o cargo e a função de “professor temporário” sem cargos públicos corresponden-tes criados por Lei.

Os dirigentes do ANDES--SN entendem que “a medida institucionaliza a precarização do trabalho docente e do ensi-no superior público e de qua-lidade: além de salários meno-res, é vetado o direito a férias

Governo “legaliza” irregularidade trabalhista para prosseguir com o Reuni

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e o acesso ao plano de carreira a estes trabalhadores”, afirma o primeiro vice-presidente do Sindicato Nacional, Luiz Henrique Schuch.

Os delegados do ANDES--SN, presentes no 30º Con-gresso do Sindicato Nacional, aprovaram uma moção de repúdio à MP 525/2011, por considerar que “Tal iniciativa

reflete opção política contrá-ria ao padrão de qualidade da educação, a indissociabi-lidade entre ensino, pesquisa e extensão definida constitu-cionalmente e agrava a preca-rização do trabalho docente nas Instituições Federais de Ensino”.

De acordo com o texto da Exposição de Motivos

(EM) MP/MEC-EM nº 00008/2011/MP/MEC, da MP 525/2011, a mudança na lei foi justificada em razão da necessidade de implantação do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni), cuja demanda total de docentes é de 15.755 pro-fessores de terceiro grau.

Estudantes de medicina da UFRJ/Macaé em manifestação por causa das más condições do curso

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O documento da Andifes intitulado “Relatório de acom-panhamento do Programa de Apoio a Planos de Reestrutura-ção e Expansão das Universida-des Federais, lançado em 2010, dá conta de que o programa de expansão do MEC teve a proposta de abrir, entre 2007 e 2012, 93.319 novas vagas e 1.285 novos cursos de gradua-ção em cinco anos.

Desses números gerais, havia uma subdivisão em que se pretendia abrir 696 cur-sos noturnos; 331 cursos de licenciatura; 640, de mestra-do; e, 428, de doutorado. O governo pretendia incluir 1,1 milhão de alunos na educação superior do Brasil. De acordo com dados do site do MEC, depois do Reuni, o número de universidades federais pas-sou de 114, em 2003, para 237, em 2011.

A proposta do Reuni, no entanto, não mencionava o au-mento do corpo docente que garantisse a qualidade dos cur-sos e nem as vagas efetivamente ocupadas do início ao fim de cada um dos cursos criados. O documento do governo tratava

da duplicação da Relação Alu-no–Professor (RAP), à época, de um por nove (1/9) para um por 18 (1/18). Ou seja, pro-pôs uma expansão focada na ampliação do RAP e na propa-ganda da inclusão dos egressos do ensino médio das escolas públicas.

Desde o início da expan-são foram criadas 14 novas universidades e mais de 100 novos campi que, de acordo com informações do site do MEC, “possibilitaram a ampliação de vagas e a criação de novos cur-

sos de graduação”. Uma breve análise do Mapa do Reuni, publicado no site do ministério mostra a inegável mudança na configuração da educação su-perior brasileira.

O problema é que justa-mente no ano passado, último ano da expansão de vagas via Reuni, o quadro pintado pelo governo e divulgado por meio de um Mapa da Expansão na página eletrônica destoa das imagens fotográficas expostas em dossiês enviados ao Sindi-cato Nacional dos Docentes de

Os misteriosos números do governo

Assembleia: a luta dos estudantes da UFPel pela elevação da qualidade

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O resultado é que, sem resolver os velhos problemas de sucateamento introduzidos na universidade pública por meio da falta de investimentos financeiros de governos ante-riores, sobretudo, durante o período Fernando Henrique Cardoso, o governo Lula em-preendeu uma expansão sem planejamento. Um dos pro-pósitos do governo com essa expansão era alcançar um nú-mero qualquer que pudesse ser usado como Índice de Desen-volvimento Humano (IDH).

Tal número, fabricado à custa do sacrifício das condi-ções e das relações de trabalho dos professores e da divulga-ção de dados fictícios, susten-tou o discurso de prosperi-dade e vendeu a ilusão de que um diploma de nível superior seria uma das garantias de elevação da qualidade de vida dos brasileiros advindos de classes sociais historicamente excluídas das graduações e pós-graduações.

Em vez de construir uma situação favorável, com base nos parâmetros preconizados pelo Plano Nacional de Edu-cação – Proposta da Socieda-de Brasileira, de 1997, o go-verno criou uma situação que

conduziu o setor da educação superior a uma mina proble-mas. De acordo com os dossi-ês produzidos, em todo o País o quadro é de improvisação, falta de infraestrutura física, aprofundamento das situações anteriores de sucateamento e surgimento de problemas no-vos infraestruturais, pedagógi-cos, acadêmicos e trabalhistas.

O PNE da Sociedade Brasileira é “um documento--referência que contempla dimensões e problemas so-ciais, culturais, políticos e educacionais brasileiros”. Esse documento, segundo sua própria Apresentação, é a “síntese do esforço coletivo da sociedade civil viabilizado em mesas-redondas, conferências, apresentação de trabalhos e comunicações e embasado nas experiências, lutas e proposi-ções dos setores que defendem uma sociedade mais justa e igualitária e, por conseguin-te, uma educação pública, gratuita, democrática, laica e de qualidade, para todos, em todos os níveis para uma rea-lidade inclusiva”, consolidado em novembro de 1997, duran-te o II Congresso Nacional de Educação (II Coned), realiza-do em Belo Horizonte.

O mapa do Reuni é uma mina de problemas

Instituições de Ensino Supe-rior (ANDES-SN).

Segundo o projeto do mi-nistério, a marca principal do Reuni foi a interiorização da educação superior. Mas os dos-siês, elaborados por professores e lideranças sindicais dos do-centes em todo o País para des-crever as condições de trabalho durante a campanha salarial e greve realizada em 2012, de-nunciam a precarização com intensificação do trabalho do-cente como a principal marca dessa expansão.

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Luiz Henrique SchuchProfessor

Universidade Federal de Pelotas

A ilustração que surgiu para representar o Reuni, logo que o governo começou a divulgar suas premissas, foi o diploma-espantalho aludindo à figura do Espantalho do Mágico de Óz , expressivo drama de existir sem cérebro, sem conteúdo de saber.

Inchaço, massificação, seria melhor qualificativo do que expansão, considerando seus objetivos de dobrar a relação aluno/professor e o percentual de concluintes “pelo melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades federais”, estrutura esta totalmente defasada em decorrência de um passivo de mais de uma década em que orçamentos e quadros de pessoal foram sendo sistematicamente reduzidos apesar das Instituições Federais de Ensino terem cumprido a sua parte ao expandir em mais de 40% as vagas na esteira do chamado acordo Mec/Andifes, firmado com o ministro Paulo Renato, em 1997.

Quando as universidades tradicionais, mais influentes, reagiram a proposta original e provocaram a introdução de coeficiente, na fórmula do Reuni, relacionados com a pós-graduação, que lhes logrou um saldo positivo da relação compromissos de expansão frente à alocação de meios necessários para cumpri-los. Só então aconteceu a reação em cadeia de adesões, com pouquíssimo debate na comunidade acadêmica e desconhecimento geral do conteúdo dos Acordos de Metas assinados pelos reitores.

Depois de muito esforço, de promessas não cumpridas pelo Mec e pelas reitorias, somente seis Termos de Acordos de Metas foram publicizados. Analise produzida pelo grupo de trabalho de política educacional do ANDES-SN, em 2009, dos elementos contidos nestes seis documentos demonstrou que a contrapartida governamental de cargos docentes e recursos financeiros por vaga criada expressava discrepância enorme entre instituições e, em todos os casos, eram inferiores as necessidades considerando padrões internacionais para situações semelhantes.

O quadro resultante na linha do tempo é que os valores aplicados atualmente para o pagamento de pessoal e encargos sociais nas IFE como percentual do PIB não se alteraram significativamente no período, as IFE tem hoje menos dez mil servidores técnico-administrativos do que em 1995 em números absolutos e os valores financeiros totais aplicados por vaga estudantil oferecida é consideravelmente menor do que era em 1995. O impacto se acentua ao levar-se em consideração o aumento acentuado dos compromissos com a pós-graduação. O resultado desse quadro é o aprofundamento da estratificação entre e intra instituições, marcada pela precarização, improvisação e quebra forçada do padrão unitário de qualidade da educação superior, na margem dos diploma-espantalho agora com o carimbo de universidades públicas federais.

Expansão ou inchaço?Ampliação das desigualdades trabalhistas

Um exemplo de proble-ma trabalhista criado pelo governo federal para susten-tar o Reuni é o Projeto de Lei nº 4.368, do ano pas-sado, transformado na Lei Ordinária nº 12.772/2012, que, segundo o professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e vice-pre-sidente do ANDES-SN, Luiz Henrique Schuch, em vez de organizar o trabalho acadêmico para o futuro, agride a autonomia universi-tária e desorganiza criando uma falsa hierarquização verticalizada desprovida de critérios e conceitos neces-sários a estabilização de di-reitos dos professores.

Outra prova da fragiliza-ção que está sendo imposta ao sistema é a crescente delegação de responsabili-dades do magistério, que a Constituição Federal delega a detentores de cargos públicos, para vários tipos de contratos precarizados, com os tem-porários, e até para bolsistas. Isso, além de refletir descaso com a qualidade, resulta em diversos tipos de exploração de mão de obra barata.

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Programas correlatos ao Reuni acirramprecarização

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Enem, Fies, Prouni e outros subterfúgios para expandir sem qualidade e privatizar a educação

Keka Werneck

Jornalista

Cuiabá/MT

Maio de 2009. A comunidade acadê-mica da Universi-

dade Federal de Mato Grosso (UFMT) foi informada de que a instituição adotaria o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) como porta única de ingresso e que isso traria uma série de benefícios para todos e, principalmente, significaria a democratização do acesso ao ensino superior.

Na época, docentes, estu-dantes e técnico-administra-tivos questionaram a medida abrupta e pediram, publica-mente, mais diálogo. Queriam entender os possíveis e reais impactos dessa mudança. A rei-tora Maria Lúcia Cavalli Neder ignorou os apelos. Ocupações da reitoria e atos no campus de Cuiabá denunciaram a impo-sição, mas não evitaram a sur-preendente canetada de adesão ao Enem, que teve o apoio da União Brasileira dos Estudan-tes Secundaristas (Ubes).

Fora da Universidade, na sede da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional de Mato

Grosso (OAB-MT), a reito-ra agiu como se o País ainda estivesse sob a administração

Movimento estudantil em defesa do movimento docente

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da ditadura militar e, ad refe-rendum, diante da imprensa, ela tomou uma decisão unilateral e, em junho de 2009, a adesão foi homologada pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Consepe) da UFMT.

Lógica expansionistaA adesão ao Enem ocorreu

sem nenhum tipo de debate entre os setores e organizações sociais que representam a co-munidade universitária. Criado em 1998, durante o governo do ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso (FHC) para avaliar estudantes no final da educação básica e com a pretensão de melhorar a qualidade desse nível de es-colaridade, tornou-se um dos instrumentos correlatos ao Reuni para expandir vagas na educação superior pública.

A fórmula para materializar essa ampliação por meio do Enem foi, a partir de 2009, usá-lo como instrumento de seleção para o ingresso no ensi-no superior. Para isso, o gover-no promoveu algumas mudan-ças no formato do exame com a alegação de que seriam para democratizar oportunidades de acesso às Instituições Federais de Ensino (IFE), para garantir a mobilidade acadêmica e para induzir a reestruturação dos currículos do ensino médio.

Ao fazer a prova do Enem, o estudante do nível médio passa automaticamente a inte-

grar um cadastro nacional cha-mado Sistema de Seleção Uni-ficada (SiSU) – um sistema informatizado do MEC para as instituições públicas de educa-ção superior oferecerem vagas a candidatos a curso superior.

Até este ano, a expansão via Enem/SiSU não favoreceu à elevação da qualidade da edu-cação fundamental e média, severamente debilitada em virtude das reformas e privati-zações sofridas entre os anos 1960 e 2000. Na avaliação do movimento docente ligado ao ANDES-SN, até agora o Enem/SiSU tem servido ba-sicamente para aprofundar a mercantilização da educação pública, a precarização do trabalho docente e a desqua-lificação do ensino superior como que para enfraquece-lo e nivelá-lo às precariedades do ensino fundamental.

O erro de cálculoQuatro anos depois de

adotado pelas instituições de ensino superior, os problemas da expansão via Enem/SiSU generalizaram-se no País. Um deles é o número elevado de vagas excedentes e a luta dos dirigentes universitários para preenchê-las.

Em 2012, por exemplo, dos 108 mil selecionados para as vagas em universidades públi-cas por meio do Sisu, apenas 46 mil efetuaram matrícula. Isso significa que 57% das ca-

deiras não foram preenchidas. As vagas foram redistribuídas e oferecidas em lista de espera.

De acordo com a assessoria de imprensa do Ministério da Educação (MEC), em 2012, o ministério ofereceu 30.548 vagas, distribuídas em 95 ins-tituições, e concorreram a elas 642.878 alunos. Houve sobra de vagas que, segundo informa-ções dos jornalistas do MEC, foram todas aproveitadas em segundas chamadas e ofereci-das a estudantes que estão em listas de espera.

Neste ano de 2013, o go-verno federal ofereceu 129.319 vagas para 1,9 milhão de es-tudantes (especificamente, 1.949.958 de estudantes) dis-tribuídas em 101 instituições participantes. Novo recorde de vagas não preenchidas em várias instituições que usaram o SiSU como mecanismo de ingresso estudantil.

As vagas remanescentes revelam que até a expansão via Enem/Sisu tem gerado proble-mas. Em 2012, embora o MEC não tenha divulgado o número de vagas preenchidas dentre as 30.548 oferecidas, a maior parte delas não foi ocupada na primeira fase de matrículas. De acordo com dados da imprensa, na segunda fase, as universi-dades chamaram alunos para preencher entre 70% e 85% das vagas oferecidas.

Na Universidade Federal do Ceará (UFC), por exemplo, a

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segunda com maior número de inscritos no SiSU do meio de ano (com 108.574 inscritos), ao final das chamadas, apenas 28% dos candidatos havia feito suas inscrições. A instituição ofereceu 1.637 vagas, mas ape-nas 450 realizaram matrícula. O índice é inferior ao registra-do na primeira seleção do ano, quando quase 60% das vagas foram ocupadas na primeira chamada.

Em 2012, o percentual foi semelhante em instituições com menos inscritos e menos vagas, como a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab), que ofereceu 292 va-gas e preencheu 68. Restaram 76%. Na Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa) o percentual total foi ainda mais alto: das 1.190 vagas oferecidas, 187 foram preen-chidas. A segunda chamada convocou 1.003 candidatos, 85% do total.

A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que teve o maior número de inscri-tos (152.196), em 2012, e não divulgou o número de vagas que preenchidas, constatou--se uma tendência: o curso de medicina, tradicionalmente dos mais disputados, convocou 62 estudantes na segunda chama-da. Isso significa que apenas 34 se matricularam para a tur-ma de 96 alunos, o que corres-ponde a 35%. O de engenharia

civil ofereceu 60 vagas, mas apenas nove candidatos se ma-tricularam (15%).

As sobras de 2013Neste ano de 2013, o MEC

também não revelou o número de vagas excedentes. Por meio da assessoria de imprensa, limitou-se a informar que para a primeira edição do SiSU de 2013, “os estudantes que não foram selecionados nas duas

primeiras convocações, em ja-neiro e fevereiro, puderam ade-rir à lista de espera”.

Esclareceu que as institui-ções de ensino participantes do Sisu usam a lista para convocar candidatos a vagas remanes-centes. “Neste procedimento, caso ainda haja vaga no curso de primeira opção, o candidato será convocado diretamente pela instituição. Portanto, eventuais convocações de lista

Na UFPR, até corredor é usado como depósito

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de espera são efetuadas dire-tamente pelas instituições de ensino superior participantes do sistema”, diz a nota do MEC em resposta à solicitação de números da reportagem da Revista Dossiê Precarização.

O fato é que sobram muitas vagas e em algumas universida-des esse excedente ultrapassa os 50%. Na Universidade Fe-deral de Pelotas (UFPel), que assinou um dos mais rigorosos

acordos de metas para implan-tação do Reuni, a Diretoria de Registros Acadêmicos (DRA) tinha a expectativa que neste ano de 2013 houvesse uma de-manda alta tanto na primeira como na segunda chamada. Todavia, segundo informações da própria reitoria da UFPel, o resultado ficou aquém do espe-rado. “Tínhamos a expectativa já que as vagas existem e a bus-ca por informações foi grande”,

diz a diretora de Registros Acadêmicos (DRA), Ediane Acunha.

Na UFPel, o curso mais procurado na manhã do pri-meiro dia foi o de agronomia; à tarde, foi o de medicina veteri-nária. Até o fechamento desta revista, os números da segunda etapa ainda não haviam sido fe-chados. Contudo, na primeira chamada do processo seletivo o registro também foi baixo.

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Das 3.346 vagas ofertadas pela UFPel pelo Sistema de Seleção Unificada (SiSU), apenas 848 a – cerca de 25% – foram pre-enchidas.

A intenção da reitoria era a de preencher as mais de duas mil vagas ainda dispo-níveis para os 75 cursos de graduação. Mas cursos da Música, como Ciências Mu-sicais, Canto e Piano – que ao total ofereceram 24 vagas – não tiveram procura. A di-retora de Registros Acadêmi-cos justifica a baixa procura pelos cursos superiores com a hipótese de que essa sobra de vagas seja resultado do fato de os candidatos optarem por cursos mais próximos de suas residências. Na UFPel, a se-gunda etapa de chamadas de 2013 foi realizada via oral. A sobra insistente foi destina-das aos alunos em três moda-lidades: reopção, reingresso e transferência.

Na UFMT, segundo dados da Secretaria de Tecnologia da Informação (STI-UFMT), neste ano de 2013, foram ofertadas 5.123 e, na primeira chamada, foram preenchidas 1.556. Na segunda chamada, foram preenchidas 821 vagas. Houve três chamadas da lista de espera e há 2.358 matri-culados. Ainda há 388 vagas disponíveis para novas chama-das. Em 2012, foram oferta-das 5.145 vagas e ingressaram 5.145 alunos.

Ações paralelas para favorecer a privatizaçãoAssim como no Enem,

em nome da democratização do ensino superior, os dois últimos governos federais apostaram em diversas ações correlatas e paralelas ao Reuni para garantir a proposta de am-pliação das vagas. Uma delas é o programa correlato ao Reuni, o Programa Universidade para Todos (ProUni).

À revelia da Constitui-ção Federal que, consagrou a educação em todos os níveis como um dos direitos sociais do povo brasileiro, o governo Lula instituiu e o de Dilma chancelou a política de transfe-rência de recursos públicos da educação para o setor privado. O ProUni é o programa do governo de transferência de recursos financeiros públicos às empresas de ensino privado para que recebam os alunos de baixa renda. Na primeira edi-ção de 2013, o ProUni ofere-ceu 162.329 bolsas, incluindo aí as instituições reprovadas no Exame Nacional de Desempe-nho dos Estudantes (Enade).

Além dos incentivos e das concessões fiscais que esse se-tor recebe do Estado, o progra-ma não teve como única mo-tivação a promoção do acesso de jovens ao ensino superior, mas também, e principalmente, prestar auxílio econômico a instituições de ensino superior privadas com fins lucrativos,

que passavam por grave crise financeira na época. Essa in-formação foi revelada numa pesquisa de doutorado sobre o ProUni, do sociólogo Wilson Mesquita de Almeida.

Com a tese intitulada “Am-pliação do acesso ao ensino su-perior privado lucrativo brasilei-ro: um estudo sociológico com bolsistas do Prouni na cidade de São Paulo”, desenvolvida no Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFL-CH) da Universidade de São Paulo (USP), durante quatro

Com Enem e outros mecanismos de expansão, governo transforma as salas de aula das universidades em escolões

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anos, Almeida constatou que conceitos como democratização do acesso e mobilidade social devem ser relativizados e sepa-rados. “De fato o acesso foi am-pliado, mas o mais importante é nos perguntarmos qual é a qualidade do ensino ofertado”, argumenta.

A necessidade de lucro leva a grande maioria das faculda-des particulares a reduzir gas-tos com infraestrutura e pesso-al, o que reflete diretamente na sua qualidade. “No fundo, as instituições de ensino superior privadas lucrativas são verda-

deiras fábricas de diplomas”, afirma o sociólogo. Segundo ele, a formação dos alunos é precária e a relevância do título acadêmico de uma universidade de qualidade questionável no mercado de trabalho é mínima e empecilho para o sonho de ascensão social dos estudantes economicamente menos favo-recidos.

Além do Enem, os governos Lula e Dilma mantiveram ou-tra herança do governo FHC. Trata-se do Programa de Fi-nanciamento Estudantil (Fies), criado em 1999. O governo fe-

deral vê ainda como via parale-la de formação o ensino à dis-tância, por meio do Programa Universidade Aberta do Brasil (UAB), desde 2006. Além do Programa Emergencial de For-mação de Professores (Parfor), instituído em 2009 para capa-citar docentes que já estão em exercício, porém, sem ter feito uma faculdade.

A transformação de direitos sociais em mercadoriaAo estudar os objetivos

desses programas, nota-se uma

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afobação dos quatro últimos governos por melhorar rapida-mente os índices negativos que o Brasil ostenta em várias áreas do desenvolvimento humano, sobretudo, no da educação superior. É que esse tipo de programa institucionaliza uma mudança de paradigma mun-dial que transforma direitos sociais, como a educação, so-bretudo na educação superior, em mercadoria, num processo simultâneo de mundialização sob a hegemonia dos Estados Unidos da América.

Em um texto apresentado no “III Seminário Nacional – Educação e Poder: tensões de um país em mudança”, em 2003, a pesquisadora Ângela Siqueira revelou várias mudan-ças de paradigmas impostas pela Organização Mundial do Comércio (OMC) para superar o fracasso do pensamento úni-co e da eliminação da história para a manutenção do capita-lismo, dentre elas a transfor-mação das não-mercadorias agrupadas no departamento III em mercadorias.

O Acordo Geral sobre Co-mércio de Serviços (AGCS), assinado em janeiro de 1995, teve como objetivo a liberali-zação progressiva dos serviços com uma perspectiva de con-clusão das negociações em um prazo de 10 anos. “Nos pro-cessos de negociação os países deveriam, inicialmente, apre-sentar propostas para a libe-

ralização dos diversos setores de serviços, e, posteriormente, prosseguir com apresentação, de forma bilateral, de deman-das específicas (o que deveria ocorrer até junho de 2002) e seguir ofertas (o que deveria ocorrer até 2003), havendo também Reuniões ministeriais periódicas, como a última de Doha, no Quatar”, afirma a pesquisadora.

Esse acordo, realizado durante o governo FHC, es-tabelece o cronograma e as obrigações dos países para re-gulamentação do princípio da “ordem estendida do mercado” referente ao setor de serviços. Vários estudos em economia desenvolvidos em universidades brasileiras anunciavam a crise que rebaixaria vários direitos sociais conquistados a duras lutas em mercadoria. Na obra “A crise completa – a econo-mia política do não”, de 2001, o economista e professor da Universidade de Brasília, Lau-ro Campos, mencionava essa transformação como uma mu-dança de paradigma.

“O desenvolvimento do departamento III, que ficava sob os cuidados do Estado, no momento em que o mundo das não-mercadorias entra em crise, ou seja, quando a econo-mia tridepartamental entra em colapso, quer dizer, quando as não-mercadorias estão sendo negadas, temos a consequente transformação da educação

superior em mercadoria, como de forma draconiana reza o GATT, com a força política da OMC, por meio da concre-tização do AGCS”, previu o economista.

Equação para esconder os índices negativosAo estudar os objetivos des-

ses programas, constata-se uma movimentação desordenada para melhorar rapidamente os índices historicamente nega-tivos que o Brasil ostenta em todos os níveis da educação, incluindo aí o ensino superior.

Dentre as muitas pesquisas internacionais que sentenciam o fracasso da educação no Brasil, uma delas, feita pela consultoria britânica Economist Intelli-gence Unit (EIU), classifica o País como o penúltimo lugar no ranking global de qualidade da educação. A educação brasileira, segundo o estudo da EIU, fica na frente apenas da Indonésia, país do sudeste asiático que fi-gura em última posição.

“O Brasil é o país com a menor taxa de diploma em ensino superior da América do Sul e é o país em que o sistema privado de ensino oferece o maior número de vagas (80% delas)”, destaca o professor da Universidade Federal de Pelo-tas (UFPel) e vice-presidente do Sindicato Nacional dos Do-centes das Instituições de En-sino Superior (ANDES-SN), Luiz Henrique Schuch.

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Na avaliação da professora do Departamento de Serviço Social da UFMT e doutora em Política Social pela Universida-de de Brasília (UnB), Marluce Souza Silva, “o Brasil é uma economia em expansão, mas permanece subdesenvolvido. Dados do Índice de Desenvol-vimento Humano (IDH) con-tradizem os números do gover-no que apresentam um Brasil de economia forte, e, para mascarar tal realidade, o MEC busca dados, por meio do Reu-ni, ainda que quantitativos, para resolver essa equação”.

“Um país que vai mal na educação pode encontrar saídas para o desenvolvimento e se manter no páreo da disputa de posição internacional? Como inserir o Brasil entre os países mais fortes economicamente do mundo com esses pífios ín-dices?”, indaga a professora da UFMT. A resposta é do vice--presidente do ANDES-SN, Luiz Henrique Schuch.

Ele afirma que o movimen-to de expansão das universi-dades está associado à avidez desenvolvimentista. “As uni-versidades servem também a esse movimento cada vez mais e perde sua importância como instituição socialmente referen-ciada. Boa parte dos projetos universitários atende ao capital e não à sociedade”, assegura o dirigente sindical.

“Achar que o problema na educação será resolvido no alto

da pirâmide educacional, ou seja, nas universidades, é dar um tiro no pé”, sustenta o pre-sidente da Associação dos Do-centes da Universidade Federal de Mato Grosso (Adufmat-S.Sind.), Carlos Roberto San-ches. Ele diz que o foco deveria ser o ensino básico e o médio, que estão à deriva e com alto índice de evasão.

Com a entrada desenfreada de alunos para reverter esse cenário estatístico, as universi-dades tornaram-se escolões de terceiro grau e, concomitante-mente, perdem força na pes-quisa e extensão, o que com-prometeu o tripé estrutural da universidade pública e gratuita brasileira. O vice-presidente do ANDES-SN explica que, no Brasil, o professor é aloja-do, na maior parte do tempo, em sala de aula, e, ao mesmo tempo, é pressionado a acu-mular disciplinas.

Ao mesmo tempo, passam a valer novos paradigmas cur-riculares e de trabalho, como a pressa e a prática de atender às metas, o que, em cascata, fomenta a prática do assédio moral. “E esse cenário é total-mente favorável à precarização do trabalho docente”, alerta Luiz Henrique Schuch.

Enem é uma incógnita Quase quatro anos depois

da conturbada adesão ao Exa-me Nacional do Ensino Médio (Enem) na UFMT, as dúvidas

sobre se o método democrati-zou de fato o ingresso ainda é uma incógnita entre os inte-grantes dos movimentos do-cente e estudantil. Na avaliação geral dos dois grupos, a intro-dução do método por si só já foi antidemocrática e imposta.

Um dos benefícios imedia-tos do Enem, dentre os pro-pagados pelo governo federal, seria facilitar o acesso de alunos oriundos de escolas públicas. “Politicamente isso está sendo trabalhado pelo governo como um processo de alta democra-tização, mas digo que, apesar de estarmos em um terceiro momento do Enem, ainda não temos uma avaliação objetiva e clara sobre os alunos que chega-ram na instituição. Apenas tra-balhando em sala de aula não há condições de avaliar se o perfil alterou”, pondera Sanches.

“A universidade não dá res-postas para a gente”, confirma o professor do Departamento de Letras da UFMT, Roberto Boaventura. Ele assegura que o Enem é um método de sele-ção repleto de fraudes que se tornaram corriqueiras e vistas como política de democratiza-ção do ensino superior.

Exame não impede a evasãoO professor do Departa-

mento de Física da Univer-sidade de São Paulo (USP), Otaviano Helene, por sua vez, desconstrói a ideia de que se

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trata de uma incógnita e afir-ma que, sobre o Enem, não há dúvida nenhuma. Segundo ele, o exame não muda nada no cenário das Instituições de En-sino Superior (IES), no sen-tido de democratizar o acesso, “porque é um vestibular como outro qualquer, a disputa é a mesma”, assevera.

Na avaliação de Helene, não aconteceu e nem vai acontecer um método mais democrático de acesso. “Isso é uma grande bobagem que não aconteceu e nem vai acontecer”. Ex-presi-dente do Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa (Inep) e ex--diretor do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES--SN), Helene afirma que o risco é dos impactos do Enem serem, na verdade, o contrário disso, ou seja, antidemocráti-cos, porque na dança das vagas virtuais, quem tem pai rico consegue pleitear vagas longe de casa em cursos considerados nobres, como medicina.

Ele afirma que, por um lado, “a consequência disso é que a universidade deixa de cumprir uma de suas funções que é a de formar quadros locais”. Por ou-tro, os alunos de classe média e baixa que se aventuram a sair de casa para outras cidades ou até estados, costumam não dar con-ta de se sustentar, o que provoca evasão.

O professor da UFMT, Roberto Boaventura , diz que

a evasão dos estudantes que entram via Enem é consequ-ência da falta de condições fi-nanceiras para se manter longe de casa e falta de identificação com o curso escolhido. “É que na disputa de vagas muitas vezes ele opta, não necessa-riamente, pelo que tem mais afinidade, e sim pelo que vai conseguir aprova-lo”, observa Boaventura.

Segundo ele, as políticas expansionistas jogam com uma pressão sobre a juventude, como se todo mundo tivesse de entrar na universidade. “Isso não é assim, essa perspectiva gera o caos”.

Outra preocupação de Boaventura é que, nesse “em-purra-empurra” para entrar na universidade de qualquer jeito, o governo perde o foco do problema principal que é o fracasso do ensino público bra-sileiro. “Com exceção de algu-mas escolas técnicas, em geral, é tudo muito ruim. Por isso, tem aluno chegando na univer-sidade analfabeto. E ninguém supera nada da noite para o dia, não tem nada disso, isso é mentira. As pessoas aprendem ao longo da vida, aos poucos, amadurecendo o conhecimento. Desse jeito, em vez de ensino superior, estamos oferecendo ensino inferior”, satiriza.

Um rio de dinheiro para as particularesAs várias políticas de su-

cateamento para privatizar o ensino público do País transformou a universidade em um balcão de negócios. A afirmação é da coordenadora do Diretório Central dos Es-tudantes (DCE) da UFMT, Viviane Motta. Ela diz isso para se referir aos programas correlatos Fundo de Finan-ciamento Estudantil (Fies) e Programa Universidade para Todos (ProUni). “São pro-grama elaborados para dar dinheiro aos tubarões do ensi-no”, diz a estudante.

Na defesa desses progra-mas, representantes do governo federal no Ministério da Edu-cação (MEC) realiza elabora-das propagandas na televisão com destaque para um lado da informação que transformam esses programas em receita fácil para a vida de estudantes que não conseguem aprovação em vestibulares e avalições de ingresso em instituições fede-rais públicas e gratuitas.

“Por que alguns estudantes conseguem e outros não conse-guem ingressar na universidade federal pública e gratuita? Os programas são para “facilitar” a vida de estudantes trabalha-dores que não têm horário de manhã e de tarde e, por isso, cursam faculdade de noite?”, indaga a coordenadora do DCE.

Na avaliação da estudante não vale sacrificar a quali-dade da educação brasileira para garantir facilidades para

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Claudio Antonio ToneguttiProfessor

Universidade Federal do Paraná

A opção política da expansão do ensino superior pelo setor privado por parte do governo federal nos últimos 40 anos tem como resultado, segundo o Censo da Educação Superior 2011

MEC/INEP, que, no Brasil, dos 6,7 milhões de estudantes de graduação, 75% (5,0 milhões) encontram-se matriculados em instituições privadas. Nesse cenário, e com a realidade social e econômica do País, o FIES e o PROUNI são programas importantes para sustentar a manutenção da expansão privada. Embora ambos financiados por dinheiro público, eles possuem conceitos distintos.

O FIES é uma forma direta de fazer valer a visão liberal de que o ensino superior deve ser pago pelo cidadão diretamente beneficiário (o estudante), confrontando, então, com o princípio da Educação como direito de todos e dever do Estado (artigo 205 da Constituição Federal). Além do mais, penaliza o estudante com a insegurança de poder, ou não, honrar o pagamento do empréstimo na dependência do ingresso no mercado de trabalho, que, no fundo, é diretamente dependente da situação econômica do país.

O PROUNI surge com o discurso de justiça social para um público alvo de estudantes de classes econômico-sociais menos favorecidas, concedendo financiamento a fundo perdido (na forma de bolsas). Mas não dá uma garantia da qualidade de ensino para as vagas ofertadas, no que atribui ao estudante o possível ônus de uma formação insuficiente, com evidente reflexo na sua inserção profissional. Também, o PROUNI é um incentivo ao “mercado da educação”, por beneficiar em maior medida as instituições de ensino superior privadas com fins lucrativos, já que estas, com a adesão ao programa, ficam livres de recolher quase todos os tributos federais a que estariam sujeitas.

FIES e PROUNI: dinheiro público financia a privatização

estudantes que não tiveram a oportunidade de cursar um ensino básico e médio de qualidade na rede pública ou mesmo na rede privada. “Não justifica e nem reduz o fato de que tais programas consolidam o setor financeiro da Educação e enfraquecem a educação pública. São apenas farsas para injetar dinheiro em escolas particulares”, afirma a coordenadora do DCE.

O professor da Univer-sidade Federal do Paraná (UFPR), integrante do Grupo de Trabalho (GT) de Polí-ticas Educacionais e terceiro tesoureiro do ANDES-SN, Francisco Ricardo Kastner Negral, afirma que essas po-líticas correlatas é a maneira que o governo federal encon-trou para desobrigar o Estado de oferecer educação pública, gratuita, de qualidade, laica e socialmente referenciada. “E também de se desobrigar dos serviços público de saúde e hospitais universitários, uma vez que essa visão privatista está empurrando a gestão dos hospitais-escola para a Em-presa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebser)”, argu-menta o professor João Ne-grão. A resposta que a reitoria da UFMT e o Ministério da Educação enviou à reportagem da Revista Dossiê Denúncia se limita a afirmar, sem maiores explicações, que “a Ebserh é pública”.

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Vagas nas universidades públicas: expansão versus precarização

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Fátima Xavier

Jornalista

Brasília/DF

“É inegável que o sistema de ensino superior no Brasil

precisava de mudanças, mas nada para ser feito em tão pou-co tempo. O resultado foi uma grande bagunça”. Esta é a ava-liação que a professora Lighia Brigitta Matsushigue faz, hoje, sobre Programa de Apoio a Pla-nos de Reestruturação e Expan-são das Universidades Federais (Reuni).

Foi ela quem coordenou o Grupo de Trabalho de Política Educacional do ANDES-SN (GTPE) sobre o Programa, em 2007. O número de vagas para novos alunos, os novos cursos e os novos campi são expressi-vos, mas não se pode afirmar o mesmo quanto à qualidade de ensino, às condições de trabalho do corpo docente e à infraes-trutura necessária para garantir o processo de expansão. A rees-truturação do setor deveria ser concluída até 2012 e o que se pôde observar até agora é que o Reuni trouxe novos problemas sem solucionar os problemas já existentes, agravando-os.

O Reuni foi criado por decreto em abril de 2007. A adesão das universidades ao programa, teoricamente, não era obrigatória, mas, na opinião de docentes, foi-lhes imposto porque o governo não ofereceu

Revista Andes Especial Abril de 201385

alternativa. As universidades federais vinham acumulando demandas. Desde o governo Fernando Henrique Cardoso (FHC) não havia contratação de professores nem mesmo para o preenchimento de vagas dei-xadas por aqueles que se apo-sentaram ou morreram.

As universidades lutam tam-

bém, até hoje, para contratar técnicos de nível médio, nível superior e de laboratório. O Reuni acenava com a recom-posição do quadro, criação de novos cursos, novos campi, pro-moção de inovações pedagógicas e um aumento de vagas signifi-cativo para novos alunos. Tudo isso com a promessa de recursos

financeiros correspondentes à nova situação.

Não é bem assim o que vem acontecendo nos últimos cinco anos. Como é possível observar na Universidade de Brasília (UnB), de Goiânia (UFG), no campus de Catalão da mesma UFG, e em Tocantins, algumas imposições do programa são

Expansão da Universidade Federal de Goiás (UFG) para o interior não ultrapassa os pilotis

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até hoje questionadas ainda que eventualmente adotadas em situações-limite.

É o caso do banco de professores-equivalentes. Troca--se a vaga de um professor com dedicação exclusiva por três vagas para professor-equivalente (ou “substituto”), em regime de 20 horas. Difícil ainda de

assimilar é a relação imposta de 18 alunos por professor. “Não é possível estabelecer essa rela-ção sem levar em consideração a especificidade de cada curso, as diversidades de área por área, o espaço físico, os laboratórios”, disse a professora Cristina Brandão, coordenadora do cur-so de Engenharia Ambiental

da UnB, criado pelo próprio Reuni.

Cristina lembrou que o go-verno compromete o trabalho dos docentes quando não reco-nhece, no Programa, que profes-sor com dedicação exclusiva não atua apenas na graduação, mas também na pós-graduação e no desenvolvimento de pesquisas.

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O município goiano de Ca-talão está localizado a pouco mais de 300 km ao sul de Bra-sília e é uma das localidades mapeadas pelo governo para abrigar um dos cinco campi da Universidade Federal de Goiás (UFG) e como mais um nú-mero na política de interioriza-ção do ensino superior.

Talvez seja o exemplo mais contundente da precariza-ção provocada pela expansão quantitativa das universidades

federais, iniciada no governo Lula. Catalão triplicou o nú-mero de cursos, de sete passou a oferecer 21, com o Reuni. De 210 alunos ingressantes, tem hoje 980 por ano, chegando a aproximadamente quatro mil estudantes na comunidade aca-dêmica, considerando a abertu-ra de 50 vagas por curso.

O número de professores também cresceu, hoje são 213 professores federais e 22 municipais, remanescentes do

quadro municipal, cujas vagas foram cedidas pela prefeitura quando o campus foi criado, há 30 anos.

Cerca de 90% dos docentes têm dedicação exclusiva, ou melhor, ganham por dedicação exclusiva, pois um número con-siderável mora fora da cidade, geralmente, em Uberlândia, em Goiânia ou em Brasília, e tra-balham apenas dois, três dias por semana em Catalão. Pelo menos um curso tem todos os seus professores nesta situação.

De acordo com o professor do curso de psicologia, Fernan-do Paulino, presidente da Se-ção Sindical do ANDES-SN, não é possível afirmar que o Reuni foi um retrocesso para Catalão: “Para um campus loca-lizado no meio do cerrado, que tinha sete cursos e estava aban-donado, houve, em parte, uma melhora”. O problema agora é trabalhar sem infraestrutura.

O novo Prédio Multi-Fun-cional, há quatro anos, tem apenas as colunas e o alicerce coberto de mato. O prédio do restaurante universitário está pronto há um ano, mas não funciona simplesmente porque “esqueceram” de fazer a rede de esgoto. O acesso às edifi-cações é precário, sem acessi-bilidade, sem calçada, como o Bloco K. Um aluno com dificuldade de locomoção não tem como chegar ao local. Com chuva, o acesso é impossível.

Assistir às aulas é outro sa-

UFG e o campus de Catalão

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crifício nas novas dependências porque as salas são apertadas e não têm ventiladores ou ares--condicionados. O projeto não previu qualquer tipo de ven-tilação numa cidade que bate recordes de calor. De todos os laboratórios de psicologia, somente um tem um aparelho de ar-condicionado, porém, não funciona porque não tem tomada de energia.

Contam com poucos data shows que “quando tem cabo, não tem extensão”, desabafa Paulino. O acesso à internet nos laboratórios do mesmo Bloco K não existe porque as tomadas estão lá como meros itens de decoração: também não funcionam. É verdade que falta também o computador.

Em Catalão, houve erro de construção civil até na instalação das tomadas

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De acordo o Reuni, o número de professores no Campus de Catalão até parece satisfatório -- o déficit seria de apenas 15 professores, mas, em se considerando a especificidade de cada curso, esse número pode passar de 86 docentes.

Não é possível dizer o mesmo sobre os técnico--administrativos e de labora-tório. “O campus conta com apenas 65 técnicos de nível médio quando, para atender à demanda, precisamos de 160”, informa o professor.

O déficit é de 100 pro-fissionais. Para contornar o problema, a universidade faz

“arranjos” internos, entre os departamentos. O laborató-rio de psicologia experimen-tal que precisa de um psicó-logo, conta com um técnico administrativo de outro de-partamento que, formado em psicologia, se ofereceu para colaborar com Paulino e con-seguiu a transferência. Uma técnica administrativa do quadro da universidade, que é bióloga e tem mestrado, é outro exemplo de “arranjo” no laboratório de biologia.

O campus sobrevive com o repasse de apenas R$ 780 mil, feito pela UFG de Goi-ânia, para ser repartido entre os 22 cursos de graduação e

cinco programas de mestra-do. O recurso não dá nem sequer para suprir a falta de giz e de papel higiênico. Se é tudo o que Catalão tem di-reito, Paulino não sabe infor-mar porque os recursos do programa são encaminhados para Goiânia e não direta-mente para o campus.

Um grupo de trabalho multidisciplinar elaborou um mapeamento para resol-ver os problemas a curto e médio prazo. Ele defende a tese de que, se não for para promover a expansão das universidades federais com qualidade, é melhor que se reveja todo o programa.

Arranjos para corrigir falhas

Único ar-condicionado do campus, em uma cidade com verões escaldantes, não funciona por falta de tomada

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Na Universidade Fede-ral de Tocantins (UFT), o Reuni foi assinado em 2008. A UFT foi a primeira insti-tuição a assinar o acordo de metas com o governo federal referente a esse “programa”. Dos sete campi, apenas três aderiram ao programa de expansão: Palmas (sede), Ara-guaína e Gurupi.

Foram criados 14 novos cursos: enfermagem, farmá-cia, engenharias elétricas e

civil, licenciaturas em artes e em filosofia. Em Araguaína, foram criados os cursos de licenciaturas em química, fí-sica e biologia; tecnologia em turismo, em logística e em co-operativismo. Gurupi recebeu os cursos de engenharia de biotecnologia e bioprocessos; química ambiental.

De acordo com o professor de filosofia, Fábio Duarte, a peculiaridade é que os cursos da mesma área têm disciplinas

em comum ao longo de três semestres. Assim, os alunos de artes e de filosofia, numa turma que entra com 80 alu-nos, 40 de cada curso, têm disciplinas em comum até o terceiro período, naquele que é chamado de Ciclo Básico. “E é justamente esse modelo de pedagógico um dos principais inconvenientes do programa e que tem provocado problemas graves”.

No acordo de metas assi-

Campus de Palmas reúne todos os tipos de problemas

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Em Tocantins, a falta de equipamentos para execução do trabalho docente

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nado pela UFT, estava estabe-lecido que seriam contratados para os cursos um total de 210 professores efetivos dis-tribuídos entre os cursos. Mas após a Medida Provisória (MP 525), de 14 de fevereiro de 2011, que instituiu a figura ilegal do professor temporá-rio, que seria o substituto dos cursos no Reuni, ocorreu em janeiro de 2013, o concurso com as últimas vagas. Nem to-das, ao longo desses três anos, foram preenchidas. E cursos com problemas de número su-

ficiente de docentes para dar conta da carga horária.

Além disso, havia também a perspectiva de concurso para 140 técnico-administrativos, sendo 80 de nível superior e 60 de nível médio.Havia ainda, segundo informações da seção sindical do ANDES-SN da UFT, a perspectiva de cons-trução de espaço físico, am-pliação do acervo bibliográfico, consolidação da taxa de 90% de conclusão de curso e de ga-rantia da relação de 18/1 entre aluno–docente.

Quanto às construções, se-gundo o professor de filosofia, elas ocorreram em vários campi, dando a falsa impressão de crescimento da universidade. Mas o cronograma de execução das obras tiveram problemas, principalmente, quanto aos laboratórios.

“Em Palmas, as primei-ras turmas não terão acesso aos laboratórios durante o curso, pois eles ainda estão em construção e enfrentam dificuldades”, informa Fábio Duarte. Além disso, dos seis prometidos, apenas três estão

“As construções, que ocorrem em vários campi, dão a falsa impressão de crescimento da universidade”, diz Duarte

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no cronograma, visto que os recursos do Reuni não foram suficientes e os que chegaram foram diluídos no orçamento geral do campus e aplicados em outras obras.

Duas coisas merecem ser registradas, observa o profes-sor: “O Reuni sob o símbolo da democratização do acesso e de ampliação de vagas, na verdade, é um programa de massificação, em que o que se ressalta são números com o chavão de que o ensino público superior deixará de ser privilégio”.

E acrescente: “Mas não se conta alguns pontos como a não-atração de docentes para o ensino superior em virtude do baixo salário, os recursos inferiores aos que deveriam ser aplicados em uma verda-deira expansão e a manutenção das construções ao longo dos anos, após o boom dos recurso para a expansão, que terminou em 2012”.

Outro ponto a que o pro-fessor se refere é o modo como o Reuni foi imposto às universidades, principalmente as novas, sem nenhum debate

mais qualificado. “Os recur-sos foram destinados a quem disse “amém” às diretrizes do governo. Muitos dirigentes acolheram o discurso de que o governo Lula trouxe recursos para a universidade; coisa que o governo FHC não havia fei-to. Mas não se discutiu de que maneira esses recursos foram ‘destinados’ às Instituições Federais de Ensino (IFE). Não houve democratização no debate sobre objetivos, estra-tégias para esse programa de reestruturação e expansão das universidades”, avalia Duarte.

“Não houve democratização no debate sobre objetivos, estratégias para esse programa de reestruturação e expansão”, avalia Duarte

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Kátia LimaProfessora

Universidade Federal Fluminense

O Programa Reuni foi apresentado pelo Decreto presidencial (6096/07) com os seguintes objetivos: aumentar o número de estudantes de graduação nas

universidades federais e a relação de estudantes por professor na graduação; diversificar as modalidades dos cursos de graduação, por meio da flexibilização dos currículos, da educação à distância, da criação de cursos de curta duração, dos ciclos (básico e profissional) e/ou bacharelados interdisciplinares; incentivar a criação de um novo sistema de títulos; elevar a taxa de conclusão dos cursos de graduação para 90% e estimular a mobilidade estudantil entre as instituições de ensino (públicas e/ou privadas).

Apesar das análises críticas e ações políticas do movimento sindical organizado no ANDES-SN e de setores não governistas da Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-Administrativos em Instituições Federais de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra) e do movimento estudantil de oposição à União Nacional dos Estudantes (UNE), o Reuni foi saudado pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes) como uma das mais relevantes iniciativas da política de expansão do MEC. Uma importante referência desse partilhamento de concepções e ações pode ser encontrada no “Relatório de Acompanhamento do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão – Reuni” – elaborado e divulgado pela Andifes, em 2010.

O documento apresenta o ano de 2006 (ano do Programa Expansão para o Interior do governo federal) como referência dos dados da ampliação da oferta de vagas discentes na graduação presencial. Em 2006 eram ofertadas 122.003 vagas nos cursos de graduação presencial das universidades federais. Em

2010 foram ofertadas 199.282, demonstrando que houve um aumento de 77.279 vagas, correspondendo a 63% no período de 2006 a 2010. Na região Norte, a universidade com maior número de vagas discentes foi a UFT (76%), enquanto a universidade com menor índice foi a UFPA (26%).

Tabela 01 Aumento do número de vagas discentes nas universidades federais da região Norte 2006/2010

Universidade Federal/Norte

Aumento do número de vagas

UFAC

(Universidade Federal do

Acre)

52%

UFAM

(Universidade Federal da

Amazônia)

36%

UFPA

(Universidade Federal do

Pará)

26%

UFRA

(Universidade Federal

Rural da Amazônia)

73%

UFRR

(Universidade Federal

de Roraima)

38%

UFT

(Universidade Federal do

Tocantins)

76%

UNIFAP

(Universidade Federal do

Amapá)

28%

UNIR

(Universidade Federal de

Rondônia)

65%

Aumento de vagas docentes não cobre expansão

Revista Andes Especial Abril de 201394

O mesmo processo desigual de aumento de vagas discentes pode ser verificado na região Nordeste, como fica evidente na tabela a seguir.

Tabela 02 Aumento do número de vagas discentes nas universidades federais da região Nordeste 2006/2010

Universidade Federal/Nordeste

Aumento do número de vagas

UFAL (Universidade

Federal de Alagoas)44%

UFBA (Universidade

Federal da Bahia)86%

UFC (Universidade

Federal do Ceará)37%

UFCG (Universidade

Federal de Campina

Grande)

170%

UFERSA (Universidade

Federal Rural do Semi-

Árido)

253%

UFMA (Universidade

Federal do Maranhão)54%

UFPB (Universidade

Federal da Paraíba)96%

UFPE (Universidade

Federal de Pernambuco)27%

UFPI (Universidade

Federal do Piauí)100%

UFRB (Universidade

Federal do Recôncavo da

Bahia)

277%

UFRN (Universidade

Federal do Rio Grande do

Norte)

65%

UFRPE (Universidade

Federal Rural de

Pernambuco)

68%

UFS (Universidade

Federal de Sergipe)68%

UNIVASF (Universidade

Federal do Vale do São

Francisco)

55%

A tabela abaixo apresenta os dados da expansão do número de vagas discentes na região Centro-Oeste.

Tabela 03 Aumento do número de vagas discentes nas universidades federais da região Centro-Oeste 2006/2010

Universidade Federal/Centro-Oeste

Aumento do número de vagas

UFG (Universidade

Federal de Goiás)73%

UFGD (Universidade

Federal da Grande

Dourados)

89%

UFMS (Universidade

Federal do Mato Grosso

do Sul)

35%

UFMT (Universidade

Federal do Mato Grosso)67%

UnB (Universidade de

Brasília)86%

A tabela 04 revela o processo desigual de vagas discentes nas universidades federais da região Su.

Tabela 04 Aumento do número de vagas discentes nas universidades federais da região Sul 2006/2010

Universidade Federal/Sul

Aumento do número de vagas

FURG (Universidade

Federal do Rio Grande)85%

UFCSPA (Universidade

Federal de Ciências da

Saúde de Porto Alegre)

167%

UFPEL (Universidade

Federal de Pelotas)106%

UFPR (Universidade

Federal do Paraná)40%

Revista Andes Especial Abril de 201395

UFRGS (Universidade

Federal do Rio Grande

do Sul)

18%

UFSC (Universidade

Federal de Santa

Catarina)

54%

UFSM (Universidade

Federal de Santa Maria)59%

UTFPR (Universidade

Tecnológica Federal do

Paraná)

601%

A tabela 05 revela como o processo de ampliação de vagas discentes ocorre nas universidades federais da região: na UNIFESP essa ampliação foi de 324%, enquanto na UFRJ a ampliação foi de 25%.

Tabela 05 Aumento do número de vagas discentes nas universidades federais da região sudeste 2006/2010

Universidades Federais na Região Sudeste

Aumento do número de vagas discentes

UFES (Universidade

Federal do Espírito

Santo)

68%

UFF (Universidade

Federal Fluminense)63%

UFJF (Universidade

Federal de Juiz de Fora)52%

UFLA (Universidade

Federal de Lavras)155%

UFMG (Universidade

Federal de Minas Gerais)43%

UFOP (Universidade

Federal de Ouro Preto)143%

UFRJ (Universidade

Federal do Rio de

Janeiro)

25%

UFRRJ (Universidade

Federal Rural do Rio de

Janeiro)

43%

UFSCAR (Universidade

Federal de São Carlos)87%

UFSJ (Universidade

Federal de São João Del-

Rei)

223%

UFTM (Universidade

Federal do Triângulo

Mineiro)

313%

UFU (Universidade

Federal de Uberlândia)92%

UFV (Universidade

Federal de Viçosa)79%

UFVJM (Universidade

Federal dos Vales do

Jequitinhonha e Mucuri)

169%

UNIFAL-MG (Universidade

Federal de Alfenas)194%

UNIFEI (Universidade

Federal de Itajubá)169%

UNIFESP (Universidade

Federal de São Paulo)324%

UNIRIO (Universidade

Federal do Estado do Rio

de Janeiro)

75%

Se estes dados podem revelar o aprofundamento da diversificação/ hierarquização das universidades federais brasileiras, a análise da relação entre oferta de vagas discentes e vagas docentes no processo de expansão realizado pelo Reuni também é bastante reveladora. Se tomarmos como referência a Universidade Federal Fluminense (UFF), percebemos que, segundo dados da Andifes, a universidade realizou uma ampliação de 63% do número de vagas no período 2006-2010, a segunda maior ampliação no Estado do Rio de Janeiro. Em que medida o aumento do número de vagas docentes corresponde ao aumento de vagas discentes nesta universidade? É possível afirmar que a não correspondência entre vagas docentes e vagas discentes revela uma das faces da intensificação do trabalho docente operada pelo Reuni?

A análise da evolução do quadro de pessoal docente da UFF no período 1995-2010 indica o aumento de

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nomeações de professores, especialmente nos anos de 2009 e 2010. Esse aumento, entretanto, não corresponde às necessidades da universidade para responder a expansão de vagas discentes e do número de cursos de graduação no período anterior ao Reuni (1995-2006) e, muito menos, no período de implantação do referido Programa. De 1995 a 2005 foram nomeados 429 professores na UFF. De 2006 a 2010 foram nomeados 1.216 professores, totalizando no período de 1995 a 2010: 1.645 professores.

A grandiosidade desse número desaparece quando contabilizamos o número de aposentadorias e de vacâncias geradas por exonerações, falecimentos e posse em outro cargo inacumulável nos mesmos períodos acima indicados: de 1995 a 2005 foram 847 aposentadorias e 196 vacâncias e de 2006 a 2010 foram 264 aposentadorias e 147 vacâncias. Ou seja, no período de 1995 a 2010 foram 1.454 professores excluídos do quadro de pessoal da UFF (aposentadorias e vacâncias).

Estes dados demonstram que no período de 1995 a 2010 ingressaram na UFF 1.645 professores, mas 1.454 professores foram desligados de suas atividades por aposentadoria e vacância, o que significa que temos um saldo positivo de apenas 191 professores nestes 15 anos analisados. Neste mesmo período (1995-2010) tivemos um crescimento bastante significativo no número de matrículas nos cursos de graduação da UFF: 15.967 em 1995 e 36.103 em 2010. Se em 1995 éramos 2.572 professores e em 2010 éramos 2.920, registramos um aumento de 13,53% de professores, enquanto registramos um aumento de 126, 11% de matrículas na graduação da UFF, no mesmo período.

Com a sucessão do presidente Lula da Silva pela presidenta Dilma Roussef, já nos deparamos com novas situações para a universidade pública brasileira. Cerca de 148 vagas docentes previstas para o Reuni 2011 foram canceladas (das quais 85 seriam para os pólos do interior) e em contrapartida o governo editou a MP nº 525 de 14/02/2011 que altera a Lei nº 8.745/93 (posteriormente transformada na Lei nº 12.425 de 17/06/2011), criando a figura do professor temporário (professor substituto sem a necessidade de

afastamentos ou vacâncias) e a Portaria MEC nº 196 de 24/02/2011, publicada no D.O.U. de 25/02/2011, liberando a contratação de professores temporários para as IFE “cumprirem sua demanda” para o Reuni no exercício 2011, dentre as quais, 80 vagas foram destinadas à UFF e não foram preenchidas até o mês de junho de 2011. Além disso, o Decreto nº 7.485 de 18/05/2011 ampliou as possibilidades de contratação de professores substitutos em todos os tipos de afastamentos obrigatórios dos professores efetivos, intensificando ainda mais o trabalho docente na universidade.

Mais recentemente (25 de Junho de 2012) foi sancionada a Lei nº 12.677/12 que dispõe sobre a criação de cargos efetivos no âmbito do MEC, destinados às IFE. Essa Lei cria dezenove mil, quinhentos e sessenta e nove cargos de professor do 3º. Grau, integrantes da carreira do Magistério Superior; 24.306 cargos efetivos de Professor do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico, integrantes do Plano de Carreira e Cargos de Magistério do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico e vinte e sete mil, setecentos e quatorze cargos de técnicos-administrativos do Plano de Carreira dos Cargos Técnico-Administrativos (TA) em Educação.

Apesar da possibilidade de aumento do número de vagas docentes e de TA, a lei apresenta várias fragilidades. A autorização para o provimento dos cargos está condicionada ao cumprimento das metas pactuadas entre o MEC e a instituição de ensino, especialmente quanto à relação de alunos e professor. O que significa que a política de expansão do número de matrículas discentes permanece como prioridade para o governo federal. Em segundo lugar, a Lei cria vagas para TA de nível médio, extinguindo vagas de TA de nível operacional. Por fim, como a Lei trata da ampliação de vagas docentes e de TA para todas as IFE, resta questionar em que medida essas vagas respondem efetivamente a demanda das instituições, diante das aposentadorias e de vacâncias geradas por exonerações, falecimentos e posse em outro cargo inacumulável que ocorreram no período anterior a implantação do Reuni e, especialmente, no período de 2008 a 2012.

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Fábio Carvalho

Jornalista

Porto Alegre/RS

A improvisação foi a marca do Programa de Apoio a Planos de

Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni). Em todo o País há exemplos desse dessa falta de planejamento e da falta de compromisso com a qualidade da educação superior pública. Uma das situações ilustrativas desse formato de expansão é a Universidade Federal do Pam-pa (Unipampa) que, criada em 2008, espalha-se por dez cam-pi na fronteira oeste gaúcha com 63 cursos de graduação.

Ela é um exemplo nacional das dificuldades estruturais, corpo docente por vezes des-motivado, equipamentos e livros encaixotados, evasão discente altíssima em alguns casos. Se a perspectiva é saldar demandas que a urgência exi-ge, o horizonte é lúgubre.

A ideia original é excelente: promover desenvolvimento equitativo na metade sul do estado. Mas a notícia das va-gas criadas dista muito mais do que os mil quilômetros que separam Jaguarão e São Borja, cidades nos extremos geográ-ficos da região.

Há consensos entre pro-fessores entrevistados. “O campus de Itaqui representou um marco importante para o

No Sul, o exemplo nacional de uma expansão improvisada

Revista Andes Especial Abril de 201399

desenvolvimento do municí-pio”, assevera a Karla Beatriz Vivian Silveira. “A Unipampa tem importância estratégica”, acrescenta César Beras, de São Borja.

O presidente da seção sindical do ANDES-SN em Bagé, Hélvio Rech, mantém o tom. “Temos uma demanda histórica por uma universi-dade pública na metade sul do estado”. A Unipampa tem ainda endereços em Dom Pe-drito, Caçapava do Sul, São

Gabriel, Alegrete, Uruguaiana e Santana do Livramento.

Problemas estruturaisAs demandas dos campi

revelam uma face perversa do Reuni. O programa federal de expansão do ensino superior público ocupou-se da criação de vagas - seja para exibir números, seja para postular projeção junto a organismos internacionais. Mas foi menos atento a condições de traba-lho, o que prejudica a qualida-de da atividade acadêmica.

Exemplo de mau planeja-mento dá-se em Uruguaiana. Apesar de problemas ambien-tais previamente conhecidos, foi erguido um edifício de 1,5 mil m2 onde um curtume desativado deixou dejetos tó-xicos. Autoridades ambientais e o Ministério Público mani-festaram-se contra a instalação da universidade.

Restou um elefante bran-co cujo aproveitamento ainda é “objeto de tratativas da Unipampa com outras insti-

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tuições”, conforme explica a Reitoria. A solução foi adqui-rir o prédio da PUC/RS (esta deverá encerrar atividades em Uruguaiana em 2013).

Em São Borja, o estúdio de TV é uma novela de anos. Persistem hoje a falta de iso-lamento acústico e outras de-mandas. Os alunos viajam se-manalmente 300 quilômetros e a Unipampa compromete R$ 10 mil com a locação de palia-tivo em outra cidade, além do transporte.

“A biblioteca em São Bor-ja tem excelente acervo, mas falta lugar para os livros, para estantes e para a equipe da biblioteca trabalhar”, acusa César Beras. Os livros encai-xotados repetem-se em outros campi, como em Itaqui.

Ainda sem moradia estu-dantil, o restaurante univer-sitário está concluído em São Borja. Mas não tem quem forneça alimentação. “Temos outro prédio pronto, mas esqueceram de prover uma su-bestação de energia. É um car-ro sem motor”, compara Beras. Em Itaqui, construíram uma cantina, mas houve desenten-dimento com a empreiteira; o campus não previu acesso para cadeirantes, frisa Karla Silveira.

Equipamentos se amonto-am nos corredores de São Ga-briel, alguns já com prazos de garantia vencidos. Em Itaqui, não há profissional devida-mente qualificado para con-duzir o trator, tampouco local

para acomodar maquinários agrícolas.

O acesso ao campus é pro-blema sério em São Gabriel. “É crônica anunciada de aci-dentes”, diz Jefferson Marçal da Rocha, em provocativa lembrança de García Márquez, o Gabriel colombiano. O cam-pus está a oito quilômetros do núcleo urbano, à margem de uma rodovia muito movi-mentada, mas não há trevo e a iluminação é precária. Quan-do chove, a área interna fica intransitável.

Em diversos campi, há pré-dios com rachaduras, portas avariadas e paredes mofadas. Faltam condicionadores de ar. O reboco do teto já está esbo-roado e o piso de madeira se solta em salas de Itaqui.

Atividades acadêmicasOs professores elogiam a

qualidade do elenco de cole-gas e sublinham a expressiva titulação do corpo docente da jovem universidade. Mas

Manifestação dos docentes da Unipampa por melhores condições de trabalho e instalações adequadas

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há quem defenda a retomada do movimento grevista de 2012 para exigir solução de problemas.

Existe preocupação para que a carga horária e a relação professor/aluno não compro-metam a qualidade do ensino, bem como para manter a pro-dução científica. Aponta-se o esforço individual para que pesquisas sejam mantidas, às vezes custeadas com o pró-prio salário.

“Há problemas de cômputo de carga horária de orienta-ções de mestrado, estágio e TCC. Não se considera hora--aula em cursos lato sensu, desmotivando a oferta destas disciplinas”, reclama Jefferson Marçal da Rocha. A modalida-de temporária de contratação é alvo de reclamações. “Quando o colega se acostuma à insti-tuição, tem que sair. Precisa-mos de professores efetivos”, afirma César Beras.

De Itaqui, Carlos Alexan-dre Oelke defende incentivos para a permanência de pro-fissionais em regiões que, historicamente, têm atraso de desenvolvimento. César Beras, agudo crítico do plano de carreira atual, também aposta na gratificação para fixar professores na fronteira oeste.

Os alunos percebem defi-ciências. Não querem estudar em uma universidade com

Até o lanche é vendido de forma improvisada

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tantos problemas. Quando podem, migram para institui-ções que gozam de mais repu-tação. Isso também acontece com professores. Em Itaqui, deveria haver mil alunos, mas, no 2º semestre de 2012, havia apenas 678. “É triste consta-tar evasão discente de 32,2%”, lamenta Karla Silveira. “Nos últimos 12 meses, pelo menos 11 professores deixaram o campus de Itaqui”, finaliza Carlos Oelke.

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Cesar Beras disse que “a biblioteca em São Borja tem excelente acervo, mas falta lugar para os livros”

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A Reitoria da Unipampa afiança boa qualidade do en-sino, incluída a pós-graduação e pesquisa. A maior parte dos cursos avaliados teve nota 4 e dois receberam pontuação má-xima (5) do MEC. No Índice Geral de Cursos de 2011, a Unipampa teve nota 3,66. Foi a quarta universidade gaúcha com melhor avaliação, ocu-pando o 44º lugar no ranking nacional.

Desde sua criação, R$ 7 milhões foram investidos em livros e o acervo soma hoje quase 150 mil obras. “Em alguns campi, há livros tem-porariamente encaixotados porque os exemplares chegam em uma velocidade maior do que se consegue imprimir na catalogação”.

Equipamentos “ficam em suas embalagens originais até sua instalação”. A Reitoria alega que, por ser uma insti-tuição nova, houve “atrasos e imprevistos em obras”, pre-judicando cronogramas. Mas afirma ser prioridade equa-cionar problemas de infraes-trutura. “Percebe-se o esforço do MEC para atender estas demandas”.

O estúdio de TV em São Borja estará em funcionamento no primeiro semestre de 2013. A previsão é de que os dez campi tenham restaurantes em funcionamento até o final de 2014. Existe auxílio para estu-dantes carentes. A Unipampa vai investir R$ 5 milhões na assistência estudantil em 2013.

O acesso ao perigoso cam-

pus de São Gabriel “já recebeu visita de técnicos” para elabo-ração de projeto. O prefeito da cidade obteve “sinalização positiva de recursos junto ao Ministério dos Transportes”. Não foi informado prazo para solução.

Sobre a evasão docente, a Reitoria entende ser questão complexa, relacionada à região do pampa, além de motivações pessoais. Acerca da gratifica-ção de fronteira, diz defender “qualquer iniciativa para fixar servidores nas cidades”. A eva-são discente deve ser combati-da. Embora sem refutar índice informado por professores de Itaqui (32,2%), a Reitoria diz que a evasão de estudantes foi, na média, de 8% no primeiro semestre de 2012.

Equipamento encaixotado e fora de uso

O que diz a reitoriaA

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