dispositivo infovis: interfaces entre visualização da informação, infografia e interatividade em...

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Júlia Rabetti Giannella Dispositivo infovis: interfaces entre visualização da informação, infografia e interatividade em sítios jornalísticos Dissertação apresentada à Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo para obtenção do título de Mestre em Ciências da Comunicação Área de Concentração: Estudos dos Meios e da Produção Mediática. Linha de Pesquisa: Consumo e Usos Midiáticos nas Práticas Sociais. Orientadora: Prof a Dr a Sandra Maria Ribeiro de Souza São Paulo 2014

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  • Jlia Rabetti Giannella

    Dispositivo infovis: interfaces entre visualizao da informao,

    infografia e interatividade em stios jornalsticos

    Dissertao apresentada Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Mestre em Cincias da Comunicao rea de Concentrao: Estudos dos Meios e da Produo Meditica. Linha de Pesquisa: Consumo e Usos Miditicos nas Prticas Sociais. Orientadora: Profa Dra Sandra Maria Ribeiro de Souza

    So Paulo 2014

  • Autorizo a reproduo e divulgao total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrnico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.

  • Folha de aprovao

    Jlia Rabetti Giannella Dispositivo infovis: interfaces entre visualizao da informao, infografia e interatividade em stios jornalsticos

    Dissertao apresentada Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Mestre em Cincias da Comunicao.

    Aprovado em: Banca examinadora Prof. Dr.: Julgamento: Instituio: Assinatura: Prof. Dr.: Julgamento: Instituio: Assinatura: Prof. Dr.: Julgamento: Instituio: Assinatura:

  • Agradecimentos

    Professora Dra Sandra Maria Ribeiro de Souza, pela orientao e pelo apoio sempre presentes. Secretaria de Ps-Graduao e biblioteca da Escola de Comunicaes e Artes, pela assistncia acadmica. Capes, pela concesso de bolsa de mestrado para a realizao da pesquisa . minha famlia, namorado e amigos, pelo suporte incondicional e por compreenderem as ausncias dos ltimos tempos.

  • Resumo

    GIANNELLA, J. R. Dispositivo infovis: interfaces entre visualizao da informao, infografia e interatividade em stios jornalsticos. 2014. 189 f. Dissertao (Mestrado) Escola de Comunicaes e Artes, Universidade de So Paulo, 2014. A pesquisa busca alcanar novos aportes para estudos em infografia jornalstica medida que investiga qualidades, atividades profissionais e tecnologias envolvidas na produo de uma modalidade infogrfica emergente, o infovis, contextualizada pelas potencialidades do meio digital e on-line, e sintonizada com prticas comunicacionais contemporneas, que supera, em determinados aspectos, modelos infogrficos anteriores. Com vistas a atingir nosso objetivo investigativo adotamos metodologia de pesquisa em duas etapas: 1) reviso conceitual de trs referncias tericas fundamentais visualizao da informao, infografia jornalstica e interatividade; e 2) proposta de anlise de infovis com base na tcnica de pesquisa de anlise de contedo. Assim, o corpus emprico constitudo por 270 infovis de contedo temtico poltico, sobretudo eleitoral, de quatro stios jornalsticos The New York Times, The Guardian, Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo veiculados entre jan. 2010 e dez. 2013. A partir de sistemtico procedimento de anlise elaborado segundo unidades e subunidades analticas orientadas pelas trs dimenses tericas do dispositivo infovis (input, interface e output), obtivemos respostas codificadas para todas as peas do corpus. A leitura do formulrio de anlise preenchido gerou resultados e inferncias sobre nossa amostra que apontam para aspectos produtivos pioneiros em infografia, como maior abertura comunicacional audincia, emprego de ferramentas on-line e gratuitas para produo de infovis e utilizao de tecnologia de atualizao contnua dos dados visualizados. Palavras-chave: Jornalismo on-line. Design da informao. Infografia. Infovis. Visualizao da informao. Interatividade. Base de dados.

  • Abstract

    GIANNELLA, J. R. Infovis device: interfaces between information visualization, infographics and interactivity on journalistic websites. 2014. 189 f. Dissertation (Masters degree) Escola de Comunicaes e Artes, Universidade de So Paulo, 2014. The research seeks to offer new contributions for studies on journalistic infographics by investigating the qualities, professional activities, and technologies involved in the production of an emerging form of infographics, the infovis, within the context of the potential of online environments, in synch with contemporary communications practices, and which overcomes, in certain aspects, previous infographics models. In order to meet our research objective, we employed a two-stage method: 1) conceptual review of three fundamental theoretical subjects information visualization, journalistic infographics, and interactivity; and 2) a proposal for the analysis of infovis based on the technique of content analysis research. Thus, the empirical corpus is made up of 270 examples of infovis with political thematic content, mainly electoral, from four journalistic websites - The New York Times, The Guardian, Folha de S. Paulo and O Estado de S. Paulo published between January 2010 and December 2013. Based on a systematic procedure for analysis, organized by analytical units and subunits, as well as by the three theoretical facets of the infovis device (input, interface and output), we obtained codified responses for all pieces within the corpus. From the reading of the completed analysis form, results and inferences were generated for our sample, which point to pioneering productive features in infographics, such as greater communicative openness with the audience, use of free online tools for the production of infovis, and use of real-time technology for on-screen data. Keywords: Online journalism. Information design. Infographics. Infovis. Information visualization. Interactivity. Database.

  • Observaes iniciais aos leitores

    Com exceo dos termos design e designer, as demais palavras estrangeiras so apresentadas nesta dissertao em itlico. O termo stio utilizado em detrimento de sua verso estrangeira site. As citaes de textos em idioma estrangeiro foram traduzidas por ns. Este trabalho acompanhado de CD contendo a verso digital da dissertao e o anexo para o formulrio de anlise de contedo preenchido. O formulrio de anlise tambm est disponvel na web no seguinte endereo: Por motivo de limitao de espao, no apresentamos imagens de todos os 270 infovis analisados no corpus da dissertao impressa. Contudo, quatro galerias virtuais foram criadas pela autora contendo imagens e hyperlinks para as peas constituintes da amostra, a saber: The New York Times

    ;

    The Guardian ;

    Folha de S. Paulo e

    O Estado de S. Paulo .

  • Lista de figuras

    Figura 1 DIKW model ...................................... p. 23 Figura 2 Livro One Million ............................ p. 29 Figura 3 Cdula eleitoral da cidade

    de Palm Beach ................................... p. 32

    Figura 4 Linha do tempo da visualizao da informao ....................................

    p. 34

    Figura 5 Modos de implantao e variveis visuais ............................

    p. 47

    Figura 6 The best stats youve ever seen ........ p. 51 Figura 7 Pesquisa Eyetracking ...................... p. 62 Figura 8 Mr. Blights House ........................... p. 64 Figura 9 A navegao Brasileira ................... p. 65 Figura 10 Infogrfico vencedor do Malofiej

    Awards em 2014 .............................. p. 68

    Figura 11 Etapas da anlise de contedo ....... p. 87 Figura 12 Galeria de infovis da

    Folha de S. Paulo ............................. p. 103

    Figura 13 Esquema representativo das dimenses e unidades de anlise da seo caracterizao ...................

    p. 106

    Figura 14 Etapas de codificao e reduo ..... p. 119 Figura 15 Voter apathy 1964-2010:

    Whats changed? .............................. p. 124

    Figura 16 Local elections 2013: results mapped .................................

    p. 125

    Figura 17 Veja quem mais popular: Dilma ou o governador ...................

    p. 126

    Figura 18 A evoluo do custo dos partidos para os cofres pblicos .....................

    p. 127

    Figura 19 Cartograma ...................................... p. 129 Figura 20

    Quatro infovis com qualidade de atualizao contnua ..................

    p. 134

  • Lista de figuras

    Figura 21 At the Democratic Convention,

    the Words Being Used ..................... p. 140

    Figura 22 Obamas 2011 Budget Proposal ..... p. 141

    Figura 23 The Electoral Map ........................... p. 142

    Figura 24 Over the Decades, How States Have Shifted .......................................

    p. 143

    Figura 25 The Election Will Be Tweeted (and Retweeted) ...............................

    p. 145

    Figura 26 Estado de Dados ............................ p. 150

    Figura 27 Abordagens comunicacionais ....... p. 156

    Figura 28 Estrutura copo de Martini .............. p. 158

    Figura 29 Corruption index 2010 ...................... p. 159

    Figura 30 Estrutura slideshow interativo ....... p. 160

    Figura 31 Diferentes configuraes visuais para The Electoral Map ...................

    p. 162

    Figura 32 Estrutura de profundidade ............. p. 163

    Figura 33 Basmetro ......................................... p. 164

    Figura 34 Gay Marriage bill: how did your MP vote? ..................................

    p. 168

    Figura 35 Flickr da seo Datablog ................. p. 169

    Figura 36 You decide the 2012 US presidential election .........................

    p. 174

    Figura 37 Do you think Scotland should become independent? .......................

    p. 175

    Figura 38 What One Word Describes Your Current State of Mind? .....................

    p. 176

  • Lista de grficos

    Grfico 1 Aumento da produo infogrfica

    no suporte on-line ............................. p. 75

    Grfico 2 Atualizao contnua cruzada com temtica ....................................

    p. 134

    Grfico 3 Distribuio de infovis por natureza de hibridizao e por veculo comunicativo ......................

    p. 138

    Grfico 4 Distribuio de infovis por veculo comunicativo e por editoria ...........

    p. 149

    Grfico 5 Mdia do gradiente de mediao e do gradiente de interatividade, por veculo comunicativo ...............

    p. 152

    Grfico 6 Guia para interpretar o modelo comunicacional do dispositivo infovis ......................

    p. 157

    Grfico 7 Distribuio de infovis por veculo comunicativo e por ao participativa .....................

    p. 172

  • Lista de quadros

    Quadro 1 Inflao de dados ........................... p. 25 Quadro 2 Escala de Iconicidade

    Decrescente ..................................... p. 36

    Quadro 3 Hierarquia de definies de trabalho relacionadas visualizao da informao .........

    p. 40

    Quadro 4 Atividades, tecnologias e objetivos da visualizao de dados .........................................

    p. 42

    Quadro 5 Taxonomia de tipos de representao grfica da visualizao ..............................

    p. 43

    Quadro 6 Relaes entre os dados observados por diferentes autores ............................................

    p. 45

    Quadro 7 Geraes e produtos do jornalismo on-line ..........................

    p. 58

    Quadro 8 Definies e extenses de uso da infografia ..................................

    p. 69

    Quadro 9 Geraes da infografia no suporte on-line .........................

    p. 77

    Quadro 10 Aes participativas ..................... p. 85 Quadro 11 Relao da amostra de infovis

    do The New York Times ............... p. 94

    Quadro 12 Relao da amostra de infovis do The Guardian ...........................

    p. 97

    Quadro 13 Relao da amostra de infovis da Folha de S. Paulo .....................

    p. 99

    Quadro 14 Relao da amostra de infovis de O Estado de S. Paulo ...............

    p. 100

    Quadro 15 Distribuio das unidades e subunidades de anlise ..............

    p. 107

    Quadro 16 Recursos do gradiente de mediao ...................................

    p. 111

    Quadro 17 Recursos do gradiente de interatividade ............................

    p. 114

  • Lista de tabelas

    Tabela 1 Distribuio de infovis analisados

    por veculo de comunicao ......... p. 102

    Tabela 2 Resultados da dimenso input de anlise ..........................................

    p. 121

    Tabela 3 Resultados da dimenso interface de anlise ..........................

    p. 136

    Tabela 4 Resultados da dimenso output de anlise ..............................

    p. 151

    Tabela 5 Mdia de gradientes de mediao e de gradiente de interatividade por veculo comunicativo ..............

    p. 153

    Tabela 6 Codificao dos gradientes de Corruption index 2010 ................

    p. 159

    Tabela 7 Codificao dos gradientes de The Electoral Map ........................

    p. 161

    Tabela 8 Codificao dos gradientes do Basmetro ...................................

    p. 164

  • Sumrio

    INTRODUO ........................................................................................................................... p. 14 1. INFORMAO NO CONTEXTO DO DESIGN ......................................................................... p. 19

    1.1 DO DADO SABEDORIA ................................................................................. p. 22 1.2 COMUNICAO NA ERA DA INFORMAO EXCEDENTE ........................ p. 25 1.3 VISUALIZAO DA INFORMAO ................................................................. p. 34

    1.3.1 Reviso terminolgica e conceitual ..................................................... p. 34 1.3.2 Classificao da representao grfica .............................................. p. 43 1.3.3 Tornando a realidade visvel e tangvel ............................................... p. 48

    2. JORNALISMO ON-LINE E REPRESENTAO VISUAL ........................................................ p. 53 2.1 ESTILO JORNALSTICO .................................................................................... p. 53

    2.1.1 Caractersticas do jornalismo on-line .................................................. p. 55 2.2 REPRESENTAO VISUAL NO JORNALISMO ............................................. p. 60

    2.2.1 Infografia jornalstica ........................................................................... p. 62 2.2.2 Infografia: um breve apanhado histrico ............................................. p. 63 2.2.3 Divergncias de terminologia, conceito e extenso de uso ................ p. 66 2.2.4 Infografia no suporte digital e on-line .................................................. p. 75

    2.2.5 Infovis como dispositivo interacional .................................................. p. 80 3. PROPOSTA DE ANLISE DE INFOVIS ................................................................................. p. 86

    3.1 AMOSTRAGEM .................................................................................................. p. 88 3.1.1 Escolha dos stios jornalsticos ........................................................... p. 88 3.1.2 Escolha do perodo de anlise ............................................................ p. 90 3.1.3 Escolha da categoria de contedo analisada ..................................... p. 90 3.1.4. Delimitao do corpus ................................................................. p. 92

    3.2 UNITIZAO ...................................................................................................... p. 104 3.2.1 Dimenso de input do dispositivo ....................................................... p. 108 3.2.1.1 Unidade tecnologia ............................................................ p. 108 3.2.2 Dimenso de interface do dispositivo ................................................. p. 110

    3.2.2.1 Unidade design ................................................................... p. 110 3.2.2.2 Unidade tratamento jornalstico .......................................... p. 111

    3.2.3 Dimenso de output do dispositivo .................................................... p. 114 3.2.3.1 Unidade interatividade ......................................................... p. 114 3.2.3.2 Unidade participao .......................................................... p. 116

    3.3 CODIFICAO E REDUO ............................................................................ p. 119 4. INTERPRETAO DOS DADOS ........................................................................................... p. 121

    4.1 DIMENSO INPUT ............................................................................................. p. 121 4.1.1 Ferramenta de produo ..................................................................... p. 122 4.1.2 Atualizao contnua ........................................................................... p. 132 4.2 DIMENSO INTERFACE ................................................................................... p. 136 4.2.1 Modo de organizao da informao ................................................. p. 137

    4.2.2 Temtica .............................................................................................. p. 146 4.3 DIMENSO OUPUT ........................................................................................... p. 151

    4.3.1 Gradiente de mediao versus gradiente de interatividade ............... p. 152 4.3.1.1 Abordagens direcionadas pelo autor e pelo usurio ................. p. 155

    4.3.1.2 Extrao de dados ................................................................ p. 166 4.3.2 Contedo gerado pelo usurio ............................................................ p. 172

    CONSIDERAES FINAIS ........................................................................................................ p. 178 REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ............................................................................................ p. 182

  • Introduo

    14

    Introduo

    A presente pesquisa de mestrado resultado do entrelaamento de trs

    referncias tericas e prticas abordadas por quem transita entre reas da

    Comunicao Social e do Design: visualizao da informao, infografia jornalstica e

    interatividade. Da interligao entre esses trs eixos emerge o infovis, neologismo

    assumido por ns para designar objeto de estudo emergente e pioneiro,

    contextualizado pelo fenmeno do Big Data,1 que inaugura prticas pioneiras em

    jornalismo de dados, e pelas tecnologias e potencialidades do meio digital e on-line,

    que proporcionam o desenvolvimento de produtos miditicos com novas qualidades.

    A definio do tema origina-se de percurso investigativo construdo desde a

    defesa da monografia de graduao, em 2010, quando se optou por estudar e

    desenvolver infogrficos jornalsticos impressos sobre a Copa do Mundo de Futebol,

    realizada na frica do Sul. A trajetria profissional tambm contribui com

    desdobramentos sobre o assunto da pesquisa: a passagem da funo de diagramadora

    no jornal impresso O Globo (2009-2011) ao posto de designer de interface para tablets

    na Editora Abril (2011-2012) suscitou uma srie de reflexes sobre a transio dos

    produtos miditicos impressos para plataforma digital e on-line, sobretudo acerca dos

    novos formatos para infogrficos com base em dados e suas possibilidades interativas.

    Finalmente, o encontro desses interesses investigativos com a superviso de uma

    orientadora inserida na linha de pesquisa Consumo e Usos Miditicos nas Prticas

    Sociais, com tradio de estudo em Design da Informao, possibilitou a realizao da

    presente dissertao.

    O exerccio intelectual atividade, muitas vezes, no linear, apoiada em

    flexes e reflexes, descobertas e retornos. Por configurar-se como produto

    miditico interdisciplinar, extremamente atual, em transformao e sintonizado

    com prticas comunicacionais contemporneas, a proposta de estudo sobre o objeto

    infovis tarefa desafiadora. como falar sobre algo que comea a ser discutido por

    1 Big Data expresso usada para descrever o acelerado crescimento de dados. Em 2001, o Grupo Gartner, Centro de Pesquisa em Tecnologia da Informao, estabelecido em Connecticut, Estados Unidos, definiu desafios e oportunidade do crescimento vertiginoso de dados por meio da avalio de trs parmetros: volume crescente (quantidade de dados), velocidade (entrada e sada de dados) e variedade (tipos e fontes de dados).

  • Introduo

    15

    vrias reas do conhecimento, possui diferentes denominaes, abordagens e

    extenses de uso, e, portanto, carece de referncias tericas e prticas integradas e

    consolidadas. nesse sentido que o projeto original foi reformulado ao longo de

    dois anos e meio de pesquisa, tornando-se cada vez mais claro e coerente quanto a

    seus propsitos, acompanhando, sempre que possvel, discusses acadmicas e

    profissionais a respeito do tema to logo divulgadas. Partindo destas observaes, a

    dissertao estrutura-se, em captulos e subcaptulos, de forma a, primeiramente,

    apresentar definies e contextos de cada referncia fundamental da pesquisa

    visualizao da informao, infografia jornalstica e interatividade , para, a partir

    de suas interaes, propor objetivos investigativos e procedimentos metodolgicos

    para um objeto comunicacional em emergncia o infovis,2 que, em definio inicial,

    constitui-se como um infogrfico interativo baseado no cruzamento de dados.

    Assim, o primeiro captulo tem como pano de fundo a transformao dos

    processos comunicacionais diante da saturao de dados gerados e disponibilizados

    de forma gratuita e acessvel por meio de um modelo circulatrio e multidirecional

    em rede, que denominamos web. Nesse cenrio, o controle sobre a coleta de dados

    brutos e suas transformaes em informaes significativas, realizadas em grande

    parte pelos mediadores, constitui grande desafio e desejo para os mais diversos

    setores da denominada Sociedade da Informao, entre os quais empresas de

    comunicao. nesse sentido que abordamos a visualizao da informao

    modalidade de organizao e apresentao visual da informao que pertence ao

    universo maior constitudo pelo Design da Informao como alternativa para

    manipular dados e proporcionar fluxos comunicativos dialgicos. A visualizao da

    informao proporciona sociedade novos usos da informao bem como modos

    alternativos de aquisio e produo de conhecimento, facilitando a compreenso de

    grande quantidade de dados uma vez que evidencia suas relaes quantitativas,

    geogrficas, temporais, grupais e conectivas em processo tanto dirigido pela

    mediao dos comunicadores como orientado por atividades de sense-making3

    realizadas pelo polo receptor.

    2 Infovis, reiteramos, neologismo assumido por ns para designar o objeto estudado na presente dissertao caracterizado pela convergncia da visualizao da informao, da infografia jornalstica e da interatividade. 3 A expresso sense-making utilizada para designar um processo comunicacional e bidirecional no qual interagentes, individual ou coletivamente, participam das atividades de produo de sentido (DERVIN, 2000).

  • Introduo

    16

    O segundo captulo traa breve panorama do jornalismo on-line, apontando

    caractersticas do suporte em rede que significam adaptao e desenvolvimento de

    atividades e produtos jornalsticos orientados para a emergente conjuntura

    tecnolgica-social. Diante de novas possibilidades produtivas e novas dinmicas de

    trabalho, o infogrfico jornalstico uma manifestao do jornalismo visual ancorada,

    tradicionalmente, na unio de imagem, texto e elementos esquemticos com

    finalidade informativa se renova e sinaliza a necessidade de incluir, na discusso

    acerca da disciplina infografia, aspectos como anlise e cruzamento de dados,

    interatividade e participao do usurio. nesse contexto que evidenciamos o

    surgimento de uma precursora modalidade infogrfica, o infovis, que introduz novos

    formatos e dinmicas de apresentao e narrativa jornalsticas, considerando a

    natureza heterognea dos dados e a complexidade informativa contempornea.

    Assim, o infovis compreende dispositivo miditico que conjuga, em sua interface,

    modalidades e organizaes visuais oriundas da visualizao da informao para

    representar e comunicar contedos jornalsticos baseados em dados, ao mesmo tempo

    em que oferece recursos interativos que permitem aos usurios tornar-se mais ativos

    no processo comunicacional, explorando e, em alguns casos, ressignificando

    contedos visualizados.

    Uma vez situado nosso objeto de estudo, definimos que a questo central dessa

    pesquisa seria compreender aspectos do dispositivo infovis que o diferenciam de

    outras modalidades infogrficas e que o sintonizam com prticas comunicacionais

    contemporneas. Dessa forma, delineia-se cenrio investigativo marcado por duas

    abordagens comunicacionais com nfases diferentes, mas no excludentes: modelo

    direcionado pelo autor, que representa infovis mais explanatrios, com nfase na

    linearidade, mediao e tratamento narrativo-jornalstico e modelo direcionado pelo

    usurio, que representa infovis marcados pelo grau relativamente maior de autonomia

    que cada usurio tem de participar de seus percursos informacionais e buscar

    significaes por meio de recursos interativos de explorao do contedo e aes

    participativas. Em torno dessa questo central, estabelecemos os seguintes objetivos de

    pesquisa abordados no terceiro captulo:

  • Introduo

    17

    1. desenvolver um protocolo de anlise orientado pelas dimenses que caracterizam o

    infovis como um dispositivo interacional no jornalismo on-line: tecnologia de

    produo (input), mediao comunicacional (interface) e interatividade (output);

    2. delimitar um corpus de anlise que possa ser submetido ao protocolo de anlise,

    gerando resultados especficos e inferncias estendidas;

    3. a partir da interpretao dos dados codificados segundo o protocolo de anlise,

    gerar resultados e inferncias sobre o panorama atual e futuro para a produo de

    infovis em stios jornalsticos.

    O terceiro captulo apresenta, em detalhes, a metodologia de pesquisa adotada

    para responder aos objetivos levantados. De modo geral, estudos consultados sobre

    infogrficos, impressos ou digitais, apresentam dois caminhos para delimitao do

    corpus: 1) exemplos ilustrativos dentro de determinada proposta de anlise e 2)

    oposio entre boas e ms solues, em termos sintticos e pragmticos. No entanto,

    diante do fato de nosso objeto ser pouco discutido e sistematizado, consideramos mais

    interessante, do ponto de vista investigativo, adotar procedimento metodolgico por

    amostragem, selecionando infovis com diversos nveis de complexidade de produo.

    Dessa forma, nosso corpus composto por uma variedade de peas, desde as premiadas

    em concursos de infografia quelas que passam despercebidas dos olhares de estudiosos

    e especialistas. Para delimitao do corpus, apresentamos proposta de anlise de infovis

    de contedo poltico, sobretudo eleitoral, por meio da tcnica de pesquisa anlise de

    contedo. Segundo procedimentos criteriosos, a anlise de contedo compreende uma

    importante e dispendiosa etapa da nossa pesquisa, a elaborao dos dados, que

    desdobrada em quatro subetapas. Na primeira subetapa, unitizao, so elaboradas

    unidades e subunidades de anlise orientadas pelas trs dimenses tericas do

    dispositivo infovis (input, interface e output); na segunda, amostragem, delimitado um

    corpus de anlise contendo 270 infovis de recorte temtico poltico, publicados em

    perodo de quatro anos (jan. 2010 a dez. 2013) e procedentes de quatro stios

    jornalsticos (The New York Times, The Guardian, Folha de S. Paulo e O Estado de S.

    Paulo); na terceira, codificao, realiza-se preenchimento do formulrio de anlise

    segundo operaes previstas na unitizao; finalmente, durante a reduo, so

    realizados procedimentos de depurao do protocolo de anlise.

  • Introduo

    18

    A interpretao dos dados, apresentada no quarto captulo, resultado de

    leitura sistemtica realizada ora por meio de operaes de mdia absoluta da

    ocorrncia das respostas de cada subunidade de anlise, ora por meio de cruzamentos

    entre respostas de determinadas subunidades a fim de buscarem-se relaes entre elas.

    Resultados especficos para o corpus, assim como inferncias que podem expandir-se

    para outros infovis e possveis encaminhamentos para produo infogrfica realizada

    no ambiente on-line, so discutidos e confrontados com referncias tericas

    exploradas e com os objetivos de anlise propostos.

    Nas Consideraes Finais, retomamos inferncias e resultados discutidos,

    enfatizando que eles no esgotam possibilidades de interpretao dos dados da

    anlise, mas constituem aspectos que consideramos mais relevantes para delimitar

    potencialidades, cenrios futuros e desafios para o infovis que, em ltima anlise,

    repercutem na ampliao investigativa sobre o estado da arte da disciplina infografia.

    De modo geral, as concluses da anlise sobre infovis encaminham-se para duas

    principais reflexes. Primeiramente, a polarizao entre dois modelos

    comunicacionais dirigido pelo autor e dirigido pelo usurio desdobra-se no

    conflito entre procedimentos de controle versus aes de abertura estabelecidos pelos

    veculos jornalsticos e seus produtos miditicos. Em segundo lugar, o exerccio

    interdisciplinar e as inovaes tecnolgicas, aos quais se submetem a disciplina

    infografia e as atividades profissionais a ela relacionadas, repercutem em questes

    como democratizao de tecnologias de produo infogrfica, tenses e articulaes

    entre especialistas e no especialistas em design e renovao do processo produtivo

    jornalstico nas fases de apurao, produo e circulao do contedo.

  • Informao no contexto do Design

    19

    1. Informao no contexto do Design

    O Design da Informao pode ser compreendido como disciplina que atua no processo comunicacional facilitando a compreenso de uma mensagem ou

    como atividade que exerce aes em torno da organizao, planificao e

    apresentao de determinada informao. Como disciplina ou atividade

    profissional, a fundamentao terica do Design da Informao escassa, e isso

    ocorre por dois principais motivos: 1) embora alguns autores reconheam a prtica

    do Design da Informao desde as primordiais pinturas das cavernas do homem

    pr-histrico,1 o exerccio intelectual e acadmico a seu respeito recente e pouco

    sistematizado e 2) sua prtica extremamente dependente do contexto em que ela

    se realiza, o que dificulta uma metodologia que possa ser replicada na anlise e

    avaliao de seus objetos. Todavia, se no h receitas para o Design da Informao,

    existem aspectos fundamentais que devem ser considerados durante seu processo,

    a saber: a definio dos objetivos (por qu?; para qu?); a quem nos dirigimos

    (para quem?), a definio do contexto (onde e quando?) e a estrutura da

    informao (por quais meios?).

    Horn (2000), ao defender que o Design da Informao uma das mais

    recentes manifestaes da Comunicao, o definiu como [...] a arte ou a cincia de

    preparar a informao de maneira que ela possa ser usada pelos indivduos com mais

    eficincia e efetividade (HORN, 2000, p. 15). O autor identifica trs objetivos para o

    Design da Informao:

    1. desenvolver documentos compreensveis para assimilao rpida e precisa, e que

    sejam facilmente convertidos em aes efetivas;

    1 Existem divergncias a respeito do incio das atividades constituintes bsicas do Design da Informao. Horn (2000, p. 17) identifica a origem e histria do Design de Informao a partir de invenes de unidades comunicativas especficas (grfico de barras e linhas do tempo, por exemplo), o que s teria ocorrido no sculo XVIII. J Meggs e Purvis (2009, p. 18-19) reconhecem nas pinturas rupestres nas marcas, smbolos, figuras e letras traadas ou escritas sobre uma superfcie formas naturais de comunicar ideias, de registrar e transmitir informao.

  • Informao no contexto do Design

    20

    2. projetar interaes fceis, naturais e prazerosas para interfaces homem-

    computador;

    3. auxiliar pessoas a encontrar caminhos em espaos tridimensionais com conforto e

    facilidade, especialmente em ambientes urbanos, mas tambm em espaos

    virtuais.

    Esses trs objetivos podem ser encaminhados para finalidade mais geral e

    ampla: [...] assegurar a efetividade da comunicao mediante a facilitao dos

    processos de percepo, leitura, compreenso, memorizao e uso da informao

    apresentada (FRASCARA, 2011 p. 11). Com essas palavras, Frascara sugere que a

    essncia do Design de Informao necessariamente centrada no usurio e em suas

    necessidades, o que faz com que o objetivo primordial de sua atividade se desloque da

    produo de objetos em si para a produo de sentidos para e pelo pblico:

    A noo do design centrado no usurio parte do pressuposto de que o objetivo do design no a produo de objetos, mas a gerao de reaes desejadas nas pessoas. O problema central do designer de informao a criao de meios que sirvam para as pessoas aprenderem, recordarem, aturarem, interagirem (com objetos, pessoas e informaes), realizarem seus desejos e satisfazerem suas necessidades (FRASCARA, 2000, p. 23).

    Justamente porque so produzidos para ser usados o que estabelece sua

    intencionalidade pragmtica os produtos do Design da Informao, sem as excluir,

    afastam-se de certas faculdades do Design Grfico e das Belas Artes: aspectos

    estilsticos e estticos devem ser secundrios em relao aos princpios de claridade,

    preciso, legibilidade, compreensibilidade e simplicidade (HORN, 2000, p. 25), que

    operam para que a informao se torne acessvel, apropriada, atrativa, confivel,

    concisa, completa, relevante, oportuna e compreensvel (FRASCARA, 2011 p. 10). O

    Design da Informao no substitui as capacidades do Design Grfico e de outras

    disciplinas visuais, mas estabelece a estrutura pela qual elas so expressas

    (SHEDROFF, 2000, p. 270). O exemplo a seguir evidencia essa diferena:

    [...] capas de discos. Um mesmo objeto mostra a diferena entre o Design Grfico (na capa) e o Design da Informao (na contracapa). Na frente, pode-se passar qualquer

  • Informao no contexto do Design

    21

    mensagem, pode-se at contrariar a mensagem do artista, se ele, e/ou o produtor, assim o quiser, ou concordar, naquele momento, naquele lanamento. s vezes no necessrio nem escrever o nome do artista, na frente. Mas, do outro lado, eu, como usurio, quero saber rapidamente sem esforo [...] alm do nome do artista, quais so as msicas, os autores, os msicos [...]. Tudo em tipo de letra no menor que Corpo 9 (REDIG, 2004, p. 49).

    O processo do Design da Informao ocorre em dois momentos distintos: a

    organizao da informao (o contedo e suas unidades de sentido, textos e imagens)

    e a codificao e implementao de sua apresentao visual. Essas tarefas requerem

    habilidades e conhecimentos interdisciplinares para processar, organizar e apresentar

    a informao em formas lingusticas (escrita) e no lingusticas (a imagem em seu

    sentido mais amplo), e resultam em uma multiplicidade de sistemas texto-visuais

    como, por exemplo, projeto grfico de livros, sinalizao de ambientes, design

    instrucional de materiais didticos e, finalmente, visualizao de informaes, que

    ser explorada mais densamente nesta dissertao. A visualizao da informao um

    produto do Design da Informao que no tem fim em si mesmo e pode ser

    compreendido como potencial modalidade comunicacional.

    Tentativas de teorizao sobre a disciplina estabelecem perspectivas

    interessantes sobre o Design da Informao: no h nada de natural na informao.

    Ela sempre construda (DERVIN, 2000, p. 36). A autora assim prope o conceito de

    sense-making, isto , um processo comunicacional e bidirecional no qual indivduos,

    individual ou coletivamente, participam dos processos de produo de sentido. Como

    consequncia, [...] o design da informao , de fato, metadesign: design sobre design,

    design para ajudar indivduos a fazer e desfazer suas prprias informaes, seus

    prprios sentidos (DERVIN, 2000, p. 43). Essa abordagem do Design da informao,

    embora possa ser problematizada em determinados discursos de efeito informacional,

    sobretudo no Jornalismo, aproxima-se da forma como pretendemos tratar a

    visualizao da informao, em seu sentido estrito, um processo comunicacional de

    representao visual de dados que, ao mesmo tempo em que transmite e explana

    ideias segundo um ponto de vista, possibilita a explorao do contedo por meio de

    dilogo interativo com o receptor e, consequentemente, estimula formulao de

    pensamento e gerao de sentidos. A perspectiva de Dervin encontra eco na defesa de

    Frascara (2011) de que mensagens produzidas pelo Design da Informao no so

  • Informao no contexto do Design

    22

    apenas recebidas, mas sim interpretadas pelas pessoas (FRASCARA, 2011, p. 9). Para

    o autor trata-se, sobretudo, de um processo comunicacional bidirecional emissorinterpretante, e que atualizaremos, dentro de nossos propsitos, para produtorusurio, no qual este ltimo interagente busca estabelecer significaes mediante

    processo interativo que amplifica sua cognio. Nessa mesma linha de pensamento,

    dois conceitos interligados nas atividades relacionadas ao Design da Informao so

    distinguidos: edificao e comutatividade (JACOBSON, 2000, p. 2). Enquanto o

    primeiro termo se refere ao processo de iluminao estabelecido no sentido

    emissor>receptor, o segundo destaca a ao mtua entre produtor e usurio envolvida

    no processo de significao. Embora as duas lgicas, muitas vezes, coexistam nos

    produtos derivados do Design da Informao, nossa nfase ser na segunda, pois ela

    reconhece e utiliza a natureza interativa e relacional da Comunicao.

    Por produtos de Design da Informao compreendemos: design editorial

    (livros, revistas, etc.); tabelas alfanumricas (horrios e diversos tipos de tabelas);

    representaes grficas como grficos, diagramas e infogrficos; material didtico;

    documentos administrativos (formulrios, boletos, etc.); instrues visuais (manuais,

    regras de jogos, bulas de remdios, etc.); sistemas de sinalizao; catlogos, programas,

    prospectos de exposies; interfaces para meios eletrnicos (FRASCARA, 2011).

    Dentro desse amplo e difuso conjunto de possibilidades, nos concentramos em uma

    modalidade especfica de infogrficos que, no jornalismo on-line, se configura como

    um dispositivo comunicacional que articula trs dimenses em seu processo

    produtivo: 1) input (tecnologia), interface (mediao de designers e jornalistas) e

    output (recursos interativos de explorao do contedo e aes participativas).

    1.1 DO DADO SABEDORIA O aumento da quantidade de informao disponvel e acessvel requer ampliao

    do campo da arquitetura da informao, saber focado na combinao de princpios do

    design e da arquitetura em espaos digitais, para que os dados possam ser organizados e

    gerar sentido (WURMAN, 1991). Diante desse cenrio, o autor sugere que o grande

  • Informao no contexto do Design

    23

    desafio da era da informao evitar a ansiedade da informao,2 isto , evitar o buraco

    negro entre dado e conhecimento.

    Figura 1 DIKW model. Fonte: Shedroff, 2000, p. 271.

    Essa lacuna evidenciada na Figura 1, o DIKW model3 (data, information,

    knowledge, wisdom), esquema proposto por Shedroff (2000, p. 271) no qual os dois

    extremos da mxima de Wurman (dado e conhecimento) so apresentados. No modelo,

    quatro conceitos, frequentemente associados ao tratamento visual de mensagens

    comunicativas, dado > informao > conhecimento > sabedoria, so evidenciados de

    forma contnua. Ao propor o esquema, Shedroff atualizou esses quatro conceitos para o

    contexto contemporneo das mdias digitais, tornando-o conhecido entre os que

    estudam ou trabalham com Design e Arquitetura da Informao.

    Dados (data) so produtos de pesquisa, criao, coleta ou descoberta.

    Constituem o material bruto utilizado na construo de mensagens comunicativas. Para

    ser entregues aos consumidores, precisam transformar-se e organizar-se em

    2 Ansiedade da informao a traduo da expresso information anxiety, cunhada por Wurman e que intitulou seu livro. 3 DIKW model um modelo amplamente estudado no campo da arquitetura da informao. Diversos autores estudaram e reformularam o modelo, sendo que o que apresentamos no presente trabalho oportuno para nossos propsitos.

  • Informao no contexto do Design

    24

    informao (information), de maneira a revelar contedos e relaes significativas. Essa

    transformao abrange, no mnimo, dois momentos do Design da Informao: 1) uma

    organizao lgica dos dados e 2) uma apresentao apropriada da estrutura.

    exatamente nessa transformao (dados > informao) que os comunicadores assumem

    suas funes mediadoras, e a visualizao da informao torna possvel a construo do

    conhecimento ao revelar padres subjacentes aos dados (DRSTELER, 2000, p. 24). O

    conceito de informao ontologicamente relacionado ideia de causalidade

    (PASQUALL, 2005). Para o autor, o termo informao pode ser rastreado desde a era

    clssica [...] denotando a interpenetrao ou imposio de uma forma, ideia ou

    princpio, com ou em matria, que assim se tornava in-formada ou formada

    (PASQUALL, 2005, p. 25). Informar conota a mensagem transmitida

    unidirecionalmente a um receptor passivo que ter seu comportamento direta e

    imediatamente afetado. Em contraponto ideia de Comunicao, informao expressa

    um relacionamento comunicativo menos equilibrado e [...] tende a produzir mais

    verticalidade do que igualdade, mais subordinao do que reciprocidade [...]

    (PASQUALL, 2005, p. 25). No toa, o uso do termo informao foi, durante dcadas,

    quase monopolizado por jornalistas. Conhecimento (knowledge) e sabedoria (wisdom)

    so etapas pertencentes esfera dos consumidores da informao e correspondem a

    graus diferentes de compreenso das informaes apresentadas, processadas e

    internalizadas por meio de experincias pessoais e intransferveis. O conhecimento a

    compreenso alcanada via a experincia do usurio e implica a construo de

    interaes com indivduos ou com ferramentas de modo que os padres e significados

    em suas informaes possam ser percebidos e aprendidos pelos usurios em contexto

    local. A sabedoria a compreenso profunda do conhecimento adquirido, sendo

    extremamente pessoal e abstrata. No podemos criar sabedoria assim como coletamos

    dados e os transformamos em informaes, nem podemos compartilh-la como

    fazemos com o conhecimento. Finalmente, a sabedoria constitui um nvel de

    compreenso que s pode ser obtido individualmente.

    A partir dessas definies, percebemos o modelo proposto por Shedroff (2000)

    como um processo contnuo que comea nos dados e termina na sabedoria, passando

    pela informao e pelo conhecimento.

  • Informao no contexto do Design

    25

    A apresentao clara e efetiva da informao objetivo dos processos e

    produtos do Design da Informao, particularmente a infografia jornalstica constitui-

    se, por esse modelo, na base do processo de aquisio de conhecimento.

    1.2 COMUNICAO NA ERA DA INFORMAO EXCEDENTE Uma edio do The New York Times em um dia da semana contm mais

    informao do que o comum dos mortais poderia receber durante toda uma vida na

    Inglaterra do sculo XVIII (WURMAN, 1991, p. 36). Com essa afirmao, publicada

    originalmente em 1989, Wurman alerta-nos para a velocidade da produo de

    informao que j se institua na sociedade h trs dcadas e que hoje nomeamos como o

    fenmeno do Big Data. A preocupao do autor dirigia-se ao fato de que o aumento

    gradativo de dados, fatos e nmeros no gera, necessariamente, conhecimento, pois entre

    os dois nveis do DIKW model (dados e conhecimento) preciso haver a transformao

    clara e significativa de dados em informao.

    A revista inglesa The Economist publicou, no incio de 2010, a previso do

    International Data Corp (IDC), empresa especializada em pesquisa de mercado, de

    que a quantidade de dados digitais gerados naquele ano atingiria 1.200 exabytes,

    sendo um exabyte equivalente a 10 bilhes de cpias de uma publicao (Quadro 1).

    verdade que grande parte dos bytes gerados produto de processos automticos

    somente entre computadores e outros dispositivos e, a princpio, no servem para

    gerar conhecimento efetivo para os leitores; ainda assim, grande o desafio de

    manipular e apresentar a massa de dados para que esses possam ser estruturados em

    informaes significativas e gerar sentidos.

    Quadro 1 Inflao de dados

    Unidade Tamanho O que significa

    Bit (b) 1 ou 0 Abreviao para binary digit (dgito binrio), cdigo binrio (1 ou 0) utilizado pelos computadores para armazenar e processar dados.

    Byte (B) 8 bits Informao suficiente para criar uma letra ou nmero no cdigo computacional. a unidade bsica da computao.

  • Informao no contexto do Design

    26

    Kilobyte (KB) 1.000 ou 210 bytes De mil em grego. Uma pgina de texto corrido equivale a 2KB.

    Megabyte (MB)

    1.000 KB ou 220 bytes De grande em grego. A obra completa de Shakespeare totaliza 5 MB. Uma tpica msica pop tem cerca de 4MB.

    Gigabyte (GB) 1.000 MB ou 230 bytes De gigante em grego. Um filme de duas horas pode ser comprimido em 1-2GB.

    Terabyte (TB) 1.000 GB ou 240 bytes De monstro em grego. Todos os livros catalogados da Biblioteca do Congresso (Washington, D.C., Estados Unidos) totalizam 15TB.

    Petabyte (PB) 1.000 TB ou 250 bytes Todas as cartas entregues pelos correios americanos este ano alcanaro cerca de 5PB. O Google processa cerca de 1PB por hora.

    Exabyte (EB) 1.000 PB ou 260 bytes Equivale a 10 bilhes de cpias do The Economist.

    Zettabyte (ZB) 1.000 EB ou 270 bytes 1.2ZB a quantidade total de informao existente prevista para ser alcanada este ano.

    Yottabyte (YB)

    1.000 ZB ou 280 bytes Demasiadamente grande para se imaginar.

    Nota: Os prefixos foram estabelecidos pelo grupo internacional de padronizao The International Bureau of Weights and Measures. Yotta (YB) e Zetta (ZB) foram adicionados em 1991. Termos para quantificao de medidas maiores ainda no existem.

    Fonte: The Economist, 2010. 4

    Trs atividades podem ser associadas difuso da informao no processo

    comunicacional: armazenamento, transmisso e compreenso (WURMAN, 1991, p.

    54). O modelo transmissionista (emissor>mensagem>canal>receptor), que por muito

    tempo vigorou como modelo tradicional de comunicao de massa, atualmente

    renova-se para paradigmas mais dialgicos, nos quais: 1) transmisso atualiza-se em

    circulao (FAUSTO NETO, 2010); 2) o papel de receptor se torna complexo na

    atuao do usurio ou interagente e 3) as relaes comunicativas, com base na ideia de

    causa e efeito, evoluem para uma concepo mais consensual, ainda que a lgica

    distribucionista continue presente em muitos contextos comunicacionais. Feita essa

    colocao, Wurman aponta que, enquanto as atividades de armazenamento e

    transmisso so diretamente otimizadas e desenvolvidas no contexto das tecnologias

    digitais (computador, hardware, software, base de dados, etc.) e pelo modelo

    4 Disponvel em: . Acesso em jun. 2013.

  • Informao no contexto do Design

    27

    multimdia e multilinear que a web constitui, acompanhando a crescente produo de

    dados, existe um enfraquecimento da terceira atividade, a compreenso, sem a qual

    no existe Comunicao. Para o autor, profissionais dedicados atividade de

    compreenso, responsveis por ajudar pessoas a extrair significados dos mais diversos

    contedos, so aqueles a quem se recorreria:

    [...] para tornar inteligvel o censo dos Estados Unidos, obter um relatrio anual com informao concreta em lugar de brilharescos (sic); preencher formulrios de seguro e solicitaes de emprstimos em linguagem inteligvel. Redes de TV e jornais poderiam recorrer a elas para tornar as notcias internacionais compreensveis para o pblico. Reparties governamentais poderiam consult-las para garantir que a informao de interesse pblico realmente se tornasse pblica. Os consumidores teriam a quem apelar quando no estivessem entendendo suas contas de telefone e de energia (WURMAN, 1991, p. 55, grifo nosso).

    O tratamento lgico e mediado da informao precede seu tratamento grfico-

    visual e , em regra, o resultado da interveno poltico-criativa do ser humano ao

    delimitar, escolher e priorizar (e, consequentemente, reduzir) determinado domnio

    informativo em um nmero finito de dados relacionveis entre si. A reduo lgica da

    informao o meio pelo qual o homem pode aplicar ao maior conjunto possvel de

    observaes o nmero limitado de instantes de percepo que dispe no curso de sua

    existncia (BERTIN, 1970, p. 178).

    As possibilidades de atuao do Design da Informao, assim como de outras

    atividades da Comunicao, so claramente ampliadas no contexto de excesso de

    dados e da valorizao do tempo e da informao evidente em nossa sociedade. Dessa

    forma, o Design da Informao pode tornar-se um caminho decisivo para controlar a

    chamada exploso da (no) informao e contribuir para sua gesto, tornando-se

    disciplina de considervel relevncia social. Diante do aumento vertiginoso de coleta e

    armazenamento de dados por meio do computador e outros sistemas digitais,

    viabilizam-se o cruzamento e relacionamento desses dados por intermdio de listas,

    planilhas, tabelas, frmulas, etc. Uma planilha Excel um exemplo de base de dados

    que cumpre o primeiro momento do processo de Design da Informao: alm de

    coletar e armazenar os dados, a planilha capaz de organiz-los (arranjar, elencar

    prioridades, selecionar, excluir, comparar, etc.). No entanto, a base de dados, por si s,

  • Informao no contexto do Design

    28

    no realiza o segundo momento do Design da Informao, sem o qual leitores

    poderiam sentir-se perdidos diante de tanta informao: a etapa de codificao e

    implementao da apresentao visual.

    A combinao de escrita, imagens e nmeros constitui, para Wurman (1991,

    p. 62), o acesso ao mundo compreensvel. Enquanto imagens tm alta densidade

    informativa, palavras e nmeros tm maior poder descritivo e de diferenciao, e

    por isso que mesmo apresentaes predominantemente visuais utilizam recursos

    lingusticos para representar determinadas unidades informativas. Voltemos, porm,

    nossa ateno para a Comunicao Visual. Se os nmeros, por um lado, por seu

    carter absoluto e incontestvel, so considerados cdigos fceis para transmisso e

    assimilao da informao, por outro, sua exatido perde referncia quando seus

    valores so muito altos. Qual a diferena entre um milho e um bilho?

    O projeto One Million (Figura 2) reflete as potencialidades da visualidade no

    discurso comunicativo. Alm da alta densidade informativa, certas modalidades de

    apresentao visual favorecem a compreenso de contedos gerados pelo grande

    fluxo e cruzamento de dados, pois elas possibilitam a visualizao de conceitos

    abstratos, ou seja, conceitos mentais, como, por exemplo, comparaes, propores,

    organizaes, conexes e hierarquias (FRASCARA, 2011, p. 43). A ideia

    fundamental do projeto One Million, de Hendrik Hertzberg que motivou a

    publicao, em 1970, do livro de ttulo homnimo , tornar um nmero grande e

    abstrato, no caso um milho, um valor mais tangvel e contextualizado para os

    leitores. Para tanto, Hertzberg projetou um livro em que cada uma de suas 200

    pginas rene 5.000 pontos, totalizando um milho de pontos. Em cada pgina,

    alguns pontos, organizados numericamente, so destacados, seus valores so

    apresentados por escrito, e algumas informaes estatsticas relevantes e

    contextualizadas a respeito dos mesmos so anotadas.

  • Informao no contexto do Design

    29

    Figura 2 Livro One Million. Fonte: Design Notes, 2010.5

    Como observado na Figura 1 (p. 22), o DIKW model apresenta um modelo do processo comunicacional a partir da possvel continuidade entre as unidades dado e

    sabedoria. Dois agentes so retratados nesse modelo: produtores que dentro de nossa

    perspectiva seriam os comunicadores e consumidores que seriam, em contrapartida, os

    usurios da informao. A interao entre esses dois agentes acontece no nvel da

    informao que, por sua vez, se constitui, para o comunicador, na etapa de transformao

    de dados brutos em informaes significativas, por meio de sua organizao e apresentao

    e, para o usurio, no acesso traduzido e manipulado de dados para que, mediante suas

    experincias6 individuais e/ou coletivas, os significados possam ser assimilados:

    O designer da informao mediador entre os dados abstratos, que integram uma informao em seu estado bruto, e suas apresentaes em informaes visualmente significativas, compreensveis para o leitor (COSTA, 1998, p. 34).

    5 Disponvel em: . Acesso em fev. 2013. 6 Experincias podem ser passivas ou interativas. De um lado, temos experincias como, por exemplo, ler um livro ou assistir a um programa de televiso. Embora alguns possam argumentar que essas atividades j implicam certo grau de interao entre dispositivo e mente, ns as consideramos experincias passivas. De outro lado, temos experincias como, por exemplo, conversar, pintar, jogar. Essas atividades envolvem escolhas, controle, produo e criatividade e, por isso, as consideramos interativas (SHEDROFF, 2000, p. 283).

  • Informao no contexto do Design

    30

    Exatamente no ponto de transformao dados>informao, comunicadores

    atuam ao aplicar sua expertise na reduo da complexidade cognitiva e na

    apresentao da informao por meio de uma interface que conjugue as fontes, as

    informaes e os leitores (BONSIEPE, 2000, p. 6). No entanto, embora os

    produtores do contedo s alcancem, diretamente, o nvel da informao, suas

    posturas devem projetar a produo de conhecimento para usurios. Essa

    abordagem prope a superao de uma viso funcionalista sobre os produtos

    comunicativos a ser reconfigurados em uma perspectiva que integra contexto,

    interesses e prticas sociais dos consumidores. O Design da Informao pode ser

    compreendido, por um lado, como atividade que, para alm da organizao de

    informaes complexas em uma configurao visual que facilite sua apreenso,

    tambm organiza e produz significados; em outras palavras, [...] seu objetivo

    facilitar o metabolismo cognitivo e a assimilao de conhecimento (BONSIEPE,

    2000, p. 6). Por outro lado, o Design da Informao deve considerar a natureza

    interativa, dialgica e de sense-making da Comunicao, a ao mtua entre

    produtor e usurio envolvida no processo de significao.

    A ideia de mediao corresponde percepo de que no h conhecimento

    direto da realidade e de que o acesso ao real sempre intermediado por um ponto

    de vista (BRAGA, 2012a, p. 32). Tal perspectiva compartilhada por Dervin em

    afirmativa segundo a qual a realidade sempre construda a partir dos produtores da

    informao (DERVIN, 2000, p. 36). No entanto, sua proposta do sense-making

    aplicado ao Design de Informao, que se traduz em uma abordagem comunicativa

    frente informao, compe um contraponto ao conceito de mediao ao incorporar

    os consumidores da informao nos processos de significao da mensagem.

    Mediao e sense-making, como buscaremos demonstrar neste trabalho, compem

    abordagens comunicacionais distintas, mas que podem integrar, simultaneamente e

    segundo diferentes gradientes, os dispositivos miditicos.

    A atividade de aplicar design informao , por vezes, chamada de

    Arquitetura da Informao ou Engenharia do Conhecimento. Adotamos a expresso

    Design da Informao em detrimento de Arquitetura da Informao, pois, a nosso

    ver, enquanto a ltima contempla, essencialmente, questes relativas organizao

    dos dados e dos seus caminhos de acesso (navegao, usabilidade, etc.), a primeira

  • Informao no contexto do Design

    31

    enfatiza, alm da organizao das informaes, as relaes entre contedo,

    apresentao visual e usurio. O Design da Informao responsvel por "[...]

    delinear a forma [visual e interativa7] na qual o usurio encontra as informaes,

    realiza sua leitura, estabelece a relao entre os seus elementos, interage com a

    interface e compreende essa experincia" (PASSOS; MOURA, 2007, p. 22). Nesse

    sentido, estabelece-se a responsabilidade tica e social que o Design deve expressar

    frente aos produtos gerados para a comunicao. A falta de considerao quanto a

    prticas e contextos de usos da informao (includas situaes de risco, insegurana,

    despreparo, nervosismo e tenso) pode significar descompromisso com o contedo e

    com a sociedade.

    Redig (2004, p. 50) ao recompor uma notcia veiculada no jornal Folha de S.

    Paulo, em 13 de novembro de 2001, a respeito da repercusso das eleies

    presidenciais norte-americanas realizadas em 2000, demonstra como um problema de

    Design da Informao prejudicou a compreenso de milhares de usurios, afetando o

    resultado final da eleio. Na ocasio do pleito, a cidade de Palm Beach, Flrida, optou

    por aumentar o corpo tipogrfico da fonte utilizada no painel de votao (Figura 3) o

    que acarretou diagramao da listagem de candidatos em duas colunas. Na

    contabilizao dos votos, percebeu-se que, em muitos casos, Pat Buchanan

    candidato reformista, cuja inteno de voto em Palm Beach representava apenas

    algumas centenas e Al Gore receberam votos simultaneamente em uma mesma

    cdula, indcio de que os eleitores se confundiram quanto posio do crculo

    perfurvel correspondente a cada candidato (crculos posicionados na faixa amarela).

    Especula-se que grande parte dos votos anulados era intencionada a Al Gore, o que

    lhe garantiria a preferncia do Colgio Eleitoral da Flrida e os votos dos respectivos

    25 delegados que o elegeriam como o 43o presidente dos EUA.

    7 Reiteramos que o Design da Informao responsvel pelas estruturas visuais e interativas de um projeto. A interatividade, no entanto, diferentemente dos aspectos visuais, no atributo inerente ao Design. Tornou-se uma de suas qualidades aps o Design convergir, tambm, para as mdias digitais. No suporte digital, interatividade e representao visual, muitas vezes, se complementam na organizao da informao, resultando, por exemplo, na criao de elementos (textos e cones) com funes de hyperlinks que sofrem modificaes em cor, tamanho, orientao, etc. ao ser clicados ou sofrer outro tipo de interao.

  • Informao no contexto do Design

    32

    Figura 3 Cdula eleitoral da cidade de Palm Beach. Fonte: Gauge, 2013.8

    H, no atual cenrio de excesso de dados, a possibilidade de os produtores da

    informao atuarem como mediadores do processo comunicativo, reduzindo a

    complexidade informativa gerada pelo fluxo e cruzamento de dados, ao retratar a

    realidade sobre um ponto de vista. Paralelamente, observamos a emergncia de prticas

    de comunicao alternativas, multilineares e descentralizadas, permitidas pelo modelo

    circulatrio que a web constitui e pelos recursos interativos de explorao do contedo,

    que possibilitam ao usurio refletir ressignificaes e usos sociais sobre a informao que

    consome. Podemos, portanto, problematizar os produtos comunicacionais em torno de

    duas abordagens que atuam sobre eles: 1) a narrativa mediada, que constri uma

    hierarquizao dos enunciados com objetivo de facilitar o acesso a um fato ou fenmeno

    e 2) o sense-making que engaja o receptor-usurio no processo de significao e de

    construo de seu conhecimento. Soma-se, a essas duas abordagens, a dimenso

    tecnolgica do processo de criao dos produtos miditicos nos meios digitais.

    Contedos gerados nesses contextos, no entanto, no podem ser concebidos sem a

    capacidade criadora e mediadora dos comunicadores, ao transformar dados em

    informaes visualmente significativas. Dessa forma, compreendemos que, embora

    necessrios, progressos em tecnologias, que possibilitam coleta, armazenamento e

    circulao de dados, assim como desenvolvimento de softwares e gadgets habilidosos

    8 Disponvel em: . Acesso em mar. 2013.

  • Informao no contexto do Design

    33

    (MANOVICH, 2001), que aprimoram e enriquecem a interface visual-interativa, no

    devam subjugar a ferramenta mais primria, mais essencial, mais capaz de converter

    dados em informaes significativas e teis: o crebro humano:

    Computadores no podem dar sentidos aos dados; s os homens podem. Mais precisamente, somente pessoas que possuem as habilidades para analisar dados podem. Computadores nos servem para fazer mais eficiente e acuradamente o que j sabemos fazer (FEW, 2009, p. 2).

    Longe de estabelecer um determinismo, compreendemos que os progressos

    tecnolgicos e o impacto das novas mdias podem condicionar uma reorientao da

    sociedade e de suas prticas frente s informaes, estabelecendo um processo que

    permite novas formas de produzi-las, circul-las e consumi-las, de sentir, ver e interpretar

    o mundo. Contudo, se computadores, por um lado, avanam em termos de capacidade de

    memria, so potentes e geis coletores, armazenadores e organizadores de informao,

    por outro lado, so limitados em termos de pensamento, imaginao e criatividade. A

    constatao de Wurman de que das trs atividades associadas difuso da informao

    transmisso, armazenamento e compreenso (WURMAN, 1991, p. 54) a ltima mais

    renegada trata justamente dessa questo. Enquanto nos concentramos apenas em

    tecnologias, esquecemos que, sem a habilidade daquele que manipula e analisa dados, no

    podemos gerar sentido sobre eles. Softwares inteligentes devem reforar olhos e mentes

    dos comunicadores de modo a contribuir com suas habilidades tcnicas para organizao

    e apresentao do contedo. Esse processo, contudo, no intuitivo, nem pr-

    programado (embora possa ser agilizado por uso de templates9). Precisa ser estudado caso

    a caso, levando em conta natureza dos dados e objetivo da mensagem, tarefas que s o

    crebro humano pode realizar.

    Esta pesquisa enfoca aspectos e potencialidades de uma modalidade especfica de

    representao texto-visual que favorece a comunicao, por parte dos comunicadores, e

    explorao, por parte dos usurios, de contedos jornalsticos baseados em dados e

    apresentados na plataforma on-line: a visualizao da informao.

    9 Template o modelo inicial de documento utilizado para criar novos projetos.

  • Informao no contexto do Design

    34

    1.3 VISUALIZAO DA INFORMAO 1.3.1 Reviso terminolgica e conceitual

    A visualizao da informao corresponde a uma modalidade de organizao e

    apresentao visual da informao e pertence ao universo maior constitudo pelo

    Design da Informao. Em sentido lato, designa processo cujo objetivo facilitar a

    compreenso de grande quantidade de dados e suas relaes de semelhana, ordem e

    proporcionalidade. Constitui-se em campo interdisciplinar com base em saberes

    especficos do Design da Informao, do Design de Interao, da Percepo Visual e

    da Comunicao Social, entre outros com potencial de proporcionar sociedade

    novos usos da informao, bem como modos alternativos de aquisio e produo de

    conhecimento em diversas reas, como economia, sade, meio ambiente, educao,

    poltica, etc. Assim como o Design da Informao, a pesquisa acadmica sobre

    visualizao da informao recente e pouco sistematizada. Few (2009, p. 14), no

    entanto, reconstitui breve histrico das principais manifestaes dessa modalidade de

    representao texto-visual que proporcionaram o desenvolvimento de pesquisas

    cientficas a seu respeito:

    Figura 4 Linha do tempo da visualizao da informao. Fonte: elaborao prpria adaptada de Few, 2009, p. 14.

  • Informao no contexto do Design

    35

    A Figura 4 reconstitui, em ordem cronolgica, algumas das principais

    referncias histricas da pesquisa em visualizao da informao, com base nas

    contribuies de Few (2009, p. 13-17) e Cairo (2008, p. 38-61).10 A linha do tempo

    destaca oito eventos que consideramos importantes para compreender a trajetria da

    visualizao da informao at seu encontro com os infogrficos, no campo jornalstico,

    e a introduo de aspectos interativos permitidos pelas mdias digitais: 1) inveno da

    tabela (sculo II); 2) ilustraes cientficas renascentistas, principalmente de Leonardo

    da Vinci e Andrea Vesalius (sculos XV e XVI); 3) criao do grfico cartesiano por

    Ren Descartes (sculo XVII); 4) grficos desenvolvidos por William Playfair (1759-

    1823), particularmente os que compuseram os livros The Commercial and Political

    Atlas (1786) e Statistical Breviary (1801); 5) mapa da epidemia da clera, criado pelo

    mdico John Snow (1854); 6) mapa da campanha do exrcito Napolenico na Rssia, de

    Charles Joseph Minard (1869); 7) estudos cientficos e obras acadmicas (sculo XX);11 e

    8) popularizao dos computadores domsticos (1984).

    Terminologias e conceituaes a respeito da visualizao da informao no

    so convergentes, o que pode ser atribudo ao fato de serem desenvolvidas por

    disciplinas distintas, a saber, Engenharia, Estatstica, Cincias da Computao, Design

    da Informao e Comunicao. Destacamos termos que, independentemente das

    reas em que foram formulados, nos ajudam a caracterizar e analisar questes

    relativas s estruturas visuais e interativas dessa modalidade de representao:

    visualizao da informao (CAIRO, 2008; 2013; CARD; MACKINLAY;

    SHNEIDERMAN, 1999; DRSTELER, 2003; FEW, 2009; KOSARA, 2007;

    MANOVICH, 2011), visualizao esquemtica (COSTA, 1998), visualizao narrativa

    (CIUCCARELLI, 2012; SEGEL; HEER, 2010), grficos da informao (BERTIN, 1986;

    2010), diagrama (FRASCARA, 2011), grficos de dados (CLEVELAND, 1994;

    TUFTE, 1983), representao grfica (ENGELHARDT, 2002).

    No obstante as diferenas terminolgicas, a abstrao elemento essencial e

    10 Para aprofundamento sobre eventos que marcaram a histria da visualizao da informao, interessante conferir o projeto Milestones, desenvolvido pelos pesquisadores Michael Friendly e Daniel J. Denis, que oferece cronologia sobre cartografia temtica, grficos estatsticos e visualizao de dados e est disponvel em: . Acesso em: jun. 2013. 11 Destacamos, em ordem de publicao, cinco obras acadmicas fundamentais acerca da visualizao da informao: 1) Semiology of Graphics, de Jacques Bertin (1967); 2) Exploratory Data Analysis, de John Tukey (1977); 3) The Visual Display of Quantitative Information, de Edward Tufte (1983); 4) The Elements of Graphing Data, de William Cleveland (1985) e 5) Readings in Information Visualization: Using Vision to Think, de Card, Mackinlay e Shneiderman (1999).

  • Informao no contexto do Design

    36

    comum extenso conceitual de todos os termos. A abstrao consiste, em

    contraponto figurao, em representaes visuais de baixo nvel de iconicidade, isto

    , menor ou nula relao indicial com seu respectivo referente. Para melhor

    compreender e avaliar a abstrao de uma representao visual, Costa (1998, p. 104)

    apresenta a Escala de Iconicidade Decrescente desenvolvida por Abraham Moles, em

    1970, que veio a se tornar uma das ferramentas mais completas em termos de estudo

    da iconografia, iconologia e esquematizao. A abstrao e esquematizao

    constituem o fio condutor da escala, que situa, em 12 pontos (Quadro 2), os diferentes

    graus de abstrao progressiva:

    No incio encontra-se a figurao ou iconicidade total: o objeto autorrepresentado. A abstrao mxima, pelo contrrio, seria a designao algbrica em que a imagem do objeto se dissolve na evocao mental constituda pelo signo arbitrrio (COSTA, 1998, p. 104).

    Quadro 2 Escala de Iconicidade Decrescente

    Classe Definio Critrio Exemplos

    12 O prprio objeto Objeto e imagem coincidem, mas existe uma relao de representao

    Objetos na vitrine

    11 Modelo bi ou tridimensional em escala

    Cores e materiais escolhidos segundo critrios arbitrrios

    Maquetes, esculturas

    10 Esquema bi ou tridimensio-nal, reduzido ou aumentado

    Cores ou materiais escolhidos segundo critrios lgicos

    Mapas geolgicos, globo terrestre

    9 Fotografia ou projeo realista sobre um plano

    Projeo e perspectiva rigorosas, uso de semitons e sombras

    Fotografias, cartazes, catlogos ilustrados

    8 Desenho ou fotografia de contorno; perfis

    A imagem mantm relao correta com a realidade atravs de critrios de similaridade, contorno de formas, silhueta

    Catlogos, prospectos e fotografias tcnicas

    7 Esquemas anatmicos ou de construo

    A imagem simplifica-se e pode mostrar coisas que no se veem primeira vista; representam-se o que se v e o que se sabe

    Corte anatmico, corte de um motor mostrando seus componentes internos

    6 Imagem fragmentada Disposio perspectivada das peas conforme suas relaes de vizinhana topolgica

    Elementos tcnicos em manuais de instruo

    5 Esquema de princpios (eletricidade e eletrnica)

    Substituio dos elementos por smbolos normalizados, passagem da topografia tipologia; geometrizao

    Plano esquematizado do metr; plano dos cabos de um receptor de TV

  • Informao no contexto do Design

    37

    4 Organograma ou esquema Desaparecem todas as caractersticas sensveis, e os elementos so quadros reunidos por conexes lgicas, hierrquicas

    Organograma de empresa, de stios da web

    3 Esquema de formulao Relao lgica e no topolgica, em espao no geomtrico, entre elementos abstratos; as ligaes so simblicas; todos os elementos so visveis

    Frmulas qumicas

    2 Esquemas em espaos complexos

    Combinao, em um espao de representao, de elementos esquemticos (flechas, retas, plano, objeto) pertencentes a sistemas diferentes

    Diagramas de foras

    1 Esquema de vetores em espaos abstratos

    Representao da relao entre grandezas vetoriais grficas em um espao mtrico abstrato

    Grficos vetoriais

    0 Descrio em palavras normalizadas ou em frmulas algbricas

    Signos puramente abstratos sem relao imaginvel com o significante

    Palavras, textos, equaes, frmulas

    Fonte: Costa, 1998, p. 105.

    O universo da visualizao esquemtica inicia-se no nvel sete da escala e cresce

    em termos de abstrao at atingir o nvel zero (COSTA, 1998, p. 104). Para o autor,

    correspondem a esquematizaes, portanto, visualizaes da informao de baixa

    iconicidade como, por exemplo, planos, desenhos tcnicos, visualizaes cientficas,

    etc. e visualizaes da informao de nula iconicidade ou no figurativas como, por

    exemplo, mapas de dados, diagramas, grficos e esquemas.

    Os tericos pioneiros que, a partir de enfoque predominantemente visual,

    sistematizaram uma teoria sobre visualizaes de nula iconicidade foram Bertin, na

    dcada de 1960, que as denominou grficos da informao (1986, 2010), e Tufte

    (1983), que as chamou de grficos de dados. Para compreender as propriedades da

    linguagem grfica e visual e o modo como atuam no desenvolvimento de um discurso

    comunicativo, Bertin (1986, 2010). desenvolveu pesquisas sobre a Neogrfica, ou

    Semiologia Grfica. Em seu estudo, o autor sistematizou um conjunto monossmico

    de cdigos para a construo de grficos que poderiam ser classificados em

  • Informao no contexto do Design

    38

    diagramas,12 redes e mapas. Para relacionar os elementos grficos, Bertin reconheceu:

    1) seis variveis visuais (tamanho, valor, cor, forma, orientao e textura); 2) trs

    modalidades de implementao (pontos, linhas e reas) e 3) quatro nveis de

    organizao dos componentes (seletivo, ordinal, quantitativo e geogrfico). A ideia

    principal dessa sistematizao que a informao significativa no reside nos dados

    isolados, mas sim nas relaes de todo o conjunto. O tratamento grfico oferece uma

    estratgia para revelar informaes e relaes contidas nos dados brutos, facilitando a

    compreenso e a produo de conhecimento.

    As contribuies de Tufte (1983) enfatizam sobretudo princpios para

    representao de dados quantitativos (grficos de dados) que conjugam eficincia da

    representao, revelao de informaes complexas, simplicidade e excelncia grfica:

    Em ltima instncia, grficos so instrumentos para raciocinar sobre informaes quantitativas. Normalmente, o modo mais efetivo de descrever, explorar e resumir um conjunto de dados mesmo um grande conjunto visualizar imagens desses nmeros (TUFTE, 1983, p. 9).

    A fim de sistematizar princpios para uma teoria sobre representao dos dados

    e avanar nos estudos comunicativos por meio da apresentao simultnea de palavras,

    nmeros e imagens, Tufte reuniu saberes e habilidades especficos dos campos visual-

    artstico e estatstico-matemtico. Dessa forma, concluiu que a excelncia grfica

    ilustrada por meio de quatro classes de apresentaes grficas fundamentais: mapas de

    dados (Data maps), linhas do tempo (Time-series), narrativas espaotemporais (Space-

    time narrative) e grficos relacionais (Relational graphs). Essas apresentaes grficas

    servem s diversas possibilidades semnticas, sintticas e pragmticas dos dados, e

    compem um sistema coeso que possibilita o desenvolvimento de uma teoria sobre

    grficos de dados.

    Seguindo uma linha de pensamento prxima, Cleveland (1994) desenvolve

    pesquisa sobre visualizao de dados na cincia e na tecnologia. Segundo o autor,

    mtodos e princpios grficos so poderosas ferramentas para evidenciar e explorar

    dados (CLEVELAND, 1994, p. 1). Nesse sentido, Cleveland atribui dupla funo aos 12 Frascara (2001, p. 42) ao optar pelo termo diagrama para referir-se s representaes no figurativas, o fez considerando o repertrio terico de Tufte (1983) e Bertin (2010). Embora o autor constate que [...] os diagramas servem para visualizar comparaes, propores, evolues, conexes e hierarquias (Ibidem), entendemos que tal qualidade no pertence somente aos diagramas, j que esses, a nosso ver, correspondem a uma modalidade de esquematizao que faz parte de universo maior, o da visualizao da informao.

  • Informao no contexto do Design

    39

    grficos de dados: 1) anlise dos dados, quando o objetivo estudar e investigar a

    natureza e as relaes dos dados por meio de grficos; e 2) comunicao dos dados,

    quando o objetivo explanar para determinado pblico, por meio de grficos, a

    natureza e as relaes dos dados.

    Quando um grfico de dados concebido, relaes quantitativas e categricas

    so encodadas por mtodos de apresentao. Logo, para mensagens significativas

    serem apreendidas, informaes precisam ser visualmente decodificadas. No

    importa o quo pertinente e interessante seja o contedo, nem o quo

    tecnologicamente impressionante seja a codificao: a visualizao falha se a

    decodificao falhar (CLEVELAND, 1994, p. 1). S por meio do estudo cientfico da

    Percepo Visual e de mtodos de apresentao visual podem ser concebidas

    eficientes e acuradas codificaes visuais.

    Nos estudos que se seguiram, sobretudo a partir da segunda metade dos anos 90,

    podemos observar adensamentos em torno da visualizao da informao, assim como

    avanos tericos da especialidade, alm dos aspectos visuais de esquematizao. Fatores

    como surgimento do computador e expanso da internet salientaram questes ligadas

    possibilidade de uso de bases de dados, uso de softwares para a manipulao desses dados,

    representaes visuais multidimensionais (com muitas variveis informativas) e uso de

    suportes digitais para produo, circulao e apresentao do contedo. Nessa linha de

    pensamento, as contribuies de Cairo (2008; 2013), Card, Mackinlay, Shneiderman.

    (1999), Few (2009), Kosara (2007) e Manovich (2011) so fundamentais.

    A visualizao da informao, para esses autores, configura-se em um sentido

    mais estrito, no qual a interatividade se faz presente, e que adotaremos neste trabalho

    como recorte metodolgico para nosso objeto, o infovis 13 , como o [...] uso de

    representaes visuais interativas de dados abstratos, auxiliado por um computador, para

    ampliar a cognio (CARD, MACKINLAY, SHNEIDERMAN, 1999, p. 6-7). Para chegar

    a esse conceito, Card, Mackinlay e Shneiderman desenvolveram uma hierarquia de

    definies de trabalho, do termo mais geral ao mais especfico, para todos os conceitos

    relacionados visualizao da informao (Quadro 3).

    13 Infovis um neologismo assumido por ns para designar o objeto estudado na presente dissertao que situa-se nas interfaces de trs principais referncias tericas e prticas: visualizao da informao, infografia jornalstica e interatividade. Para distinguir nosso objeto infovis de outras acepes e contextos de uso que o termo assume (ver p. 73, Captulo 2.), utilizaremos o termo grafado em itlico, ao longo da dissertao.

  • Informao no contexto do Design

    40

    Quadro 3 Hierarquia de definies de trabalho relacionadas visualizao da informao

    Cognio externa Design da Informao Grfico de dados Visualizao Visualizao cientfica Visualizao da informao

    Fonte: Card, Mackinlay, Shneiderman, 1999, p. 7.

    Das definies (CARD, MACKINLAY, SHNEIDERMAN, 1999, p. 7)

    Cognio externa: uso do mundo externo para alcanar cognio;

    Design da Informao: Design de representaes externas para ampliar a

    cognio;

    Grfico de dados: uso de representaes visuais de dados abstratos para ampliar a

    cognio;

    Visualizao: uso de representaes visuais interativas, auxiliado por um

    computador, para ampliar a cognio;

    Visualizao cientfica: uso de representaes visuais interativas de dados

    cientficos normalmente baseados em aspectos fsicos auxiliado por um

    computador, para amplificar a cognio;

    Visualizao da informao: uso de representaes visuais interativas de dados

    abstratos, auxiliado por um computador, para ampliar a cognio.

    Para esses autores, o termo visualizao no deve ser aplicado s configuraes

    apresentadas e acessveis em interfaces impressas, como o papel, por exemplo. A

    representao visual de dados em suportes no auxiliados por um computador se

    configuraria como grfico de dados (data graphics). J a subdiviso da categoria

    visualizao em visualizao cientfica e visualizao da informao ocorre em termos

    da natureza dos dados. Para a primeira, necessrio haver espaos fsicos ou dados

    fsicos (corpo humano, Terra, molculas, ou seja, informaes visveis). Para a segunda,

    necessrio haver informaes no fsicas, como dados financeiros, dados de negcios,

    coleo de documentos, conceitos abstratos, etc. (CARD, MACKINLAY,

    SHNEIDERMAN, 1999, p. 6-7). Essa diferena conceitual partilhada por Costa (1998,

    p. 62-81), que associa visualizao cientfica aos fenmenos invisveis a olho nu, mas

  • Informao no contexto do Design

    41

    que, pela mediao de instrumentos como microscpios, scanners, etc. podem ser

    revelados e compreendidos. No entanto, diferentemente de Card, Mackinlay e

    Shneiderman (1999), o autor no inclui o computador como requisito fundamental

    visualizao informativa, enfatizando apenas a necessidade de [...] critrios de sntese e

    inteligibilidade com fins comunicacionais (COSTA, 1998, p. 113).

    Kosara (2007) reitera a importncia da abstrao para diferenciar uma

    visualizao da informao de outras formas de representaes visuais, mas utiliza

    outra expresso para designar essa qualidade: dados abstratos so, para o autor, dados

    no visuais. E conclui: [...] visualizao no processamento de imagem, nem

    fotografia; se a fonte dos dados uma imagem e ela representada como imagem no

    resultado final, ento ela no est sendo visualizada (KOSARA, 2007, p. 632). J

    Manovich (2011) menciona os termos abstrao e no visual, embora defina

    visualizao da informao como [...] mapeamento entres dados discretos e uma

    representao visual (MANOVICH, 2011, p. 3, destaque nosso).

    Para o dicionrio Aurlio visualizar 1) Tornar visvel, mediante manobra ou

    procedimento; 2) Formar ou conceber uma imagem visual mental de (algo que no se

    tem ante os olhos no momento). Dessa forma, tambm pela perspectiva terminolgica

    possvel deduzir que, em seu sentido mais amplo, a visualizao da informao apoia-

    se fundamentalmente na capacidade humana de produzir e apreender informaes por

    meio de abstraes visuais, e que seu objetivo maior ampliar a cognio. Assim

    tambm o compreende Drsteler (2003) que, aps identificar e reunir definies sobre

    visualizao da informao e passar por questes ligadas ao computador e

    interatividade, retorna ao sentido mais lato do termo ao defini-lo como [...] processo

    de interiorizao do conhecimento mediante a percepo da informao ou, se assim se

    preferir, mediante a elaborao dos dados (DRSTELER, 2003, p. 22). Concordamos

    com a compreenso de que o uso de computadores no estabelece condio

    determinante para que haja visualizao da informao, pois sua justificativa maior,

    dentro da abordagem comunicacional, facilitar a compreenso, o que pode ser

    alcanado dentro das limitaes e potencialidades de qualquer suporte. Como objetivo

    de pesquisa, entretanto, pretendemos verificar de que modo aspectos interativos de

    explorao do contedo auxiliam nos processos de significao, e, portanto, a produo

    por meio de computadores faz-se necessria para que a interatividade ocorra.

  • Informao no contexto do Design

    42

    Few (2009, p. 12) utiliza a expresso visualizao de dados como termo guarda-

    chuva que cobre tanto a visualizao da informao como a visualizao cientfica,

    compreendidas a partir das definies de Card, Mackinlay e Schneiderman (1999).

    Assim como estes ltimos, Few desmembra e define termos envolvidos na conceituao

    de visualizao da informao conforme descrito no Quadro 4:

    Quadro 4 Atividades, tecnologias e objetivos da visualizao de dados

    Visualizao de dados

    Atividades Explorao Sense-making Comunicao

    Tecnologias Visualizao da informao Visualizao cientfica Representao grfica

    Objetivos imediatos Compreenso

    Objetivos finais Boas decises14

    Fonte: Few, 2009, p. 12.

    Embora prefiramos assumir a visualizao da informao como processo, e no

    como tecnologia, o Quadro 4 ajuda-nos a compreender que sua atividade comunicativa

    alcanada mediante a explorao do contedo ou sense-making, tarefas realizadas nas

    etapas tanto de produo como de consumo da mensagem visualizada. A visualizao,

    portanto, tanto o meio pelo qual jornalistas e designers analisam e investigam relaes

    entre dados para, ento, os transformar em informaes significativas e visualmente

    estruturadas, como o produto miditico final, no qual o usurio busca interpretar um

    conjunto de dados:

    Visualizao pode ser descrita como o mapeamento de dados em formatos visuais que favorecem a interao humana em um ambiente de trabalho para o sense-making visual (CARD; MACKINLAY; SHNEIDERMAN, 1999, p. 17).

    Alm disso, o Quadro 4 reitera nossa perspectiva de que os objetivos da

    visualizao da informao no incluem a produo de produtos com fins em si

    mesmos, mas antes, por meio deles, estabelecer processos de significao

    14 Provocar decises fundamentadas, nos usurios da informao, constitui o grau mximo de afetao que um produto do Design pode alcanar. Entretanto, qualificar boas decises tarefa que no nos cabe nesta dissertao, de modo que nos ateremos compreenso como objetivo final de uma visualizao da informao.

    v

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  • Informao no contexto do Design

    43

    intermediados, por um lado, pelo tratamento editorial-grfico dos comunicadores e,

    por outro, pelos percursos de explorao de contedo dos usurios.

    1.3.2 Classificao da representao grfica

    Muitas propostas de classificao para representaes grficas podem ser

    encontradas na literatura acadmica. Algumas foram desenvolvidas especificamente

    para aplicao na infografia jornalstica Peltzer (1992), Moraes (1998), Leturia

    (1998), De Pablos (1999), Sancho (2001), Nichani e Rajamanickam (2003) , outras

    especificamente para aplicao nas modalidades de visualizao esquemtica

    Shneiderman (1996), Lengler e Eppler (2007), Heer, Bostock e Ogievetsky (2010).

    Tambm possvel encontrar autores que propem uma classificao para as

    representaes grficas de forma mais ampla, sem delimitar campo de aplicao e

    suporte (impresso ou digital). So eles Tufte (1983), Richards (1984), Wurman (1991),

    Holmes (1993), Engelhardt (2002), Roam, (2008) e Bertin (2010).

    Destacamos, neste momento, classificaes desenvolvidas especificamente

    para a modalidade de visualizao da informao (Quadro 5). Nosso objetivo

    ilustrar mtodos e tcnicas de representao que vm sendo considerados, pela

    academia, prprios da visualizao da informao, sedimentando, dessa forma, uma

    modalidade especfica e diferenciada de representao visual. Taxonomias so

    importantes instrumentos de reflexo sobre determinados objetos. No entanto, so

    simplificaes que buscam sistematizar produtos e processos e, dificilmente, abarcam,

    na rea da Comunicao Visual, todas as possibilidades criativas e de hibridizao.

    Quadro 5 Taxonomia de tipos de representao grfica da visualizao

    Autor(es) Taxonomia

    Shneiderman (1996)

    O autor prope uma taxonomia para visualizao da informao em sete classes definidas pelo