diÁrio da professora e do aluno da educaÇÃo infantil ... · educação infantil, sua percepção...

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DIÁRIO DA PROFESSORA E DO ALUNO DA EDUCAÇÃO INFANTIL: INSTRUMENTOS DE ANÁLISE NA AÇÃO EDUCATIVA PORTILHO, Evelise Maria Labatut- PUCPR [email protected] CRUZ, Juliana Boff Aramayo - PUCPR [email protected] AFONSO, Maria Gabriela Zgôda Cordeiro- PUCPR [email protected] SILVA, Thalita Folmann da- PUCPR [email protected] Eixo Temático: Educação Infantil Agência Financiadora: Não contou com financiamento Resumo A pesquisa “Aprendizagem e Conhecimento na Ação Educativa” iniciou uma nova etapa em 2009, focando o papel profissional da professora da Educação Infantil e sua percepção pessoal enquanto educadora na construção do conhecimento, para transformar, qualitativamente, a relação educativa entre professora/aluno. Na Educação Infantil a criança inicia a sistematização do conhecimento e, portanto, necessita de um profissional habilitado a potencializar a sua capacidade de aprendizagem e desenvolvimento. O objetivo desse artigo é apresentar o Diário de Aula como instrumento de pesquisa de professoras e alunos da Educação Infantil. Zabalza (2004), Claxton (2005), Cerisara (1999), Barbosa (2009) são alguns dos autores que fundamentam a investigação. Os participantes da pesquisa foram 3 professoras e 50 alunos entre 3 e 6 anos, de duas escolas particulares da cidade de Curitiba. Os resultados indicaram a necessidade de realinhar os instrumentos, com destaque ao local do registro da professora no diário do aluno; o tempo e o número de vezes em que o diário do aluno deve ser aplicado; a formatação e o espaço da folha do diário do aluno; e a definição das consignas. Foi possível constatar a eficiência e efetividade dos diários, tanto do aluno quanto da professora, como instrumentos que permitem expressar e refletir o processo de aprender, além de oportunizar à docente de Educação Infantil, sentir-se pesquisadora de sua realidade. Palavras-chave: Aprendizagem. Diários de aula. Professora de Educação Infantil. Professor Pesquisador. Contextualização da Pesquisa

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DIÁRIO DA PROFESSORA E DO ALUNO DA EDUCAÇÃO INFANTI L:

INSTRUMENTOS DE ANÁLISE NA AÇÃO EDUCATIVA

PORTILHO, Evelise Maria Labatut- PUCPR [email protected]

CRUZ, Juliana Boff Aramayo - PUCPR

[email protected]

AFONSO, Maria Gabriela Zgôda Cordeiro- PUCPR [email protected]

SILVA, Thalita Folmann da- PUCPR

[email protected]

Eixo Temático: Educação Infantil Agência Financiadora: Não contou com financiamento

Resumo A pesquisa “Aprendizagem e Conhecimento na Ação Educativa” iniciou uma nova etapa em 2009, focando o papel profissional da professora da Educação Infantil e sua percepção pessoal enquanto educadora na construção do conhecimento, para transformar, qualitativamente, a relação educativa entre professora/aluno. Na Educação Infantil a criança inicia a sistematização do conhecimento e, portanto, necessita de um profissional habilitado a potencializar a sua capacidade de aprendizagem e desenvolvimento. O objetivo desse artigo é apresentar o Diário de Aula como instrumento de pesquisa de professoras e alunos da Educação Infantil. Zabalza (2004), Claxton (2005), Cerisara (1999), Barbosa (2009) são alguns dos autores que fundamentam a investigação. Os participantes da pesquisa foram 3 professoras e 50 alunos entre 3 e 6 anos, de duas escolas particulares da cidade de Curitiba. Os resultados indicaram a necessidade de realinhar os instrumentos, com destaque ao local do registro da professora no diário do aluno; o tempo e o número de vezes em que o diário do aluno deve ser aplicado; a formatação e o espaço da folha do diário do aluno; e a definição das consignas. Foi possível constatar a eficiência e efetividade dos diários, tanto do aluno quanto da professora, como instrumentos que permitem expressar e refletir o processo de aprender, além de oportunizar à docente de Educação Infantil, sentir-se pesquisadora de sua realidade. Palavras-chave: Aprendizagem. Diários de aula. Professora de Educação Infantil. Professor Pesquisador.

Contextualização da Pesquisa

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Com o objetivo de conhecer as estratégias de aprendizagem da criança em processo de

alfabetização, iniciou-se em 2005 uma pesquisa denominada “Aprendizagem e Conhecimento

na Formação Docente” 1, que tinha como metas: a) diferenciar as modalidades de

aprendizagem das crianças de 1ª etapa do ciclo I com históricos escolares distintos; b)

conhecer os diferentes estilos de ensinar das professoras alfabetizadoras e relacioná-los com

os estilos de aprendizagem dos alunos; c) observar o ambiente escolar, especificamente a sala

de aula.

Ao analisar o histórico escolar das crianças pesquisadas observou-se que a maioria já

havia frequentado creches, CEMEIS (Centro Municipal de Educação Infantil), centros e

escolas de Educação Infantil, como demonstra o gráfico 1:

Histórico escolar dos alunos da 1ª série do Ensino Fundamental

13%

17%

11%

18%

27%

14%

A. Sem escolaridadeAnterior

B: CMEI + etapa inicialna escola

C: (c) CMEI + Jardim IIIno CMEI

D: Esducação InfantilParticular

E: Etapa Inicial naEscola

Sem dados

Gráfico 1 – Histórico escolar dos alunos da 1ª série do Ensino Fundamental

Fonte: Dados da Pesquisa Aprendizagem e Conhecimento na Formação Docente.

Das 403 crianças, 13% não possuíam escolaridade anterior. Dito de outra forma, a

maioria das crianças que cursavam a 1ª Etapa do Ciclo I do Ensino Fundamental, tinha

frequentado a Educação Infantil. No entanto, não foi identificada diferença significativa na

utilização de estratégias de aprendizagem entre as crianças que cursaram a Educação Infantil e

as que estavam na escola pela primeira vez.

A partir deste dado, surgem as questões: por que as crianças que frequentaram a

Educação Infantil não apresentaram diferença nas estratégias de aprendizagem no processo de

alfabetização em comparação com aquelas que ingressaram direto no Ensino Fundamental?

Qual tem sido a prioridade na Educação Infantil: cuidar e/ou sistematizar o conhecimento?

Qual o papel da professora de Educação Infantil na aprendizagem das crianças?

1 Publicação no prelo. O resumo pode ser encontrado no site do CNPQ-Plataforma Lattes.

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Foi então que, a partir desses questionamentos, surgiu no final de 2008, o interesse do

grupo em desenvolver uma nova etapa da pesquisa com enfoque na Educação Infantil, seus

alunos, professores e o movimento de ensino/aprendizagem que ocorre nesse segmento.

As escolas selecionadas pertencem a um município do Estado do Paraná, sendo duas

da rede privada e duas da rede pública. Nestas escolas os participantes são as professoras que

atuam com crianças de três a seis anos, bem como seus respectivos alunos e a comunidade

escolar: pais e funcionários.

A pesquisa tem como objetivo identificar o papel profissional e social da professora de

Educação Infantil, sua percepção pessoal como educadora na construção do conhecimento e a

representação social que a comunidade escolar faz de seu trabalho e ela faz de si mesma.

Como instrumentos de investigação foram selecionados questionários, entrevistas

semi-estruturadas, observação do ambiente educativo e diários de aula.

Este artigo relata a elaboração dos diários das professoras e dos alunos, suas

contribuições, dificuldades e alterações necessárias para a utilização do instrumento na

pesquisa.

Como questões norteadoras desta fase da pesquisa, destacam-se: os diários de aula são

instrumentos adequados a uma investigação científica no âmbito da Educação Infantil? O

desenho utilizado no diário dos alunos é um meio eficaz de verificação da aprendizagem?

Quais critérios de análise podem ser identificados com a aplicação dos diários de aula?

Professor da Educação Infantil

O professor de Educação Infantil necessita mais do que nunca ressignificar seu papel

frente à sociedade acadêmica, desmistificando a velha máxima que professora de

crianças de zero a seis anos são meras cuidadoras e que o papel de ensinar destina-se aos

demais professores.

Em face das transformações que a Educação Infantil vem sofrendo, principalmente a

partir da década de 1970, quando aumentou o número de estudos e pesquisas nessa área, de

acordo com Sousa (1996), sabe-se que há inúmeras discussões a respeito da dimensão do

educar e cuidar na Educação Infantil.

Para atender as necessidades infantis, essas duas dimensões precisam aliar-se, como

relatado por Bujes no documento organizado pelo Movimento Interfóruns de Educação

Infantil do Brasil (2002)

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a educação da criança pequena envolve simultaneamente dois processos complementares e indissociáveis: educar e cuidar. As crianças desta faixa etária, como sabemos têm necessidades de atenção, carinho, segurança, sem as quais elas dificilmente poderiam sobreviver. Simultaneamente, nesta etapa, as crianças tomam contato com o mundo que as cerca, através das experiências diretas com as pessoas e as coisas deste mundo e com as formas de expressão que nele ocorrem. Esta inserção das crianças no mundo não seria possível sem que atividades voltadas simultaneamente para cuidar e educar estivessem presentes. O que se tem verificado, na prática, é que tanto os cuidados como a educação têm sido entendidos de forma muito estreita (p. 115).

Percebe-se na Educação Infantil, um caráter “assistencialista”, muitas vezes restrito ao

cuidado em relação às necessidades básicas da criança, como higiene e alimentação. É

necessário aliar os aspectos educacionais e assistenciais, ou seja, aliar o educar e o cuidar.

Cerisara (1999) afirma que toda instituição social cumpre a tarefa de educar. As

instituições de Educação Infantil têm o desafio de educar e cuidar, sem dicotomizar esses dois

aspectos, uma vez que a formação da identidade e personalidade da criança nos primeiros seis

anos de vida torna a Educação Infantil relevante para a aprendizagem das crianças.

E, se a Educação Infantil, interfere e fundamenta a aprendizagem e a educação de cada

ser humano, pergunta-se: que tipo de profissional é necessário para promover situações de

aprendizagem sistemáticas e fundamentais para a formação do sujeito?

Faz-se mister repensar o papel do profissional que atua com crianças da Educação

Infantil, pois estes, como afirma Nicolau (1990) podem “estimular ou bloquear as buscas

infantis”, bem como podem considerar “as tentativas infantis como erros ou como parte de

um processo construtivo” (p.209). Dessa forma, a competência do professor é condição

essencial para a qualidade educativa na Educação Infantil. Portanto, este professor, para que

possa criar situações adequadas de trabalho, além de conhecer as etapas do desenvolvimento

da criança, necessita ter noções de como esta constrói o conhecimento, precisa ser um

pesquisador em contínuo processo de atualização, conforme afirma Sousa (1999).

O desenho da criança como forma de registro na Educação Infantil

A Educação Infantil é o segmento da educação básica destinada a atender crianças de

zero a seis anos de idade. As instituições que atendem essa faixa etária são instituições que

atuam de uma forma diferente dos demais centros educacionais, uma vez que seus alunos

estão aprendendo a conhecer, experimentar, lidar com suas emoções, sentimentos, frustrações,

ou seja, estão aprendendo a formar suas opiniões acerca do mundo que os rodeiam. Essa

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instituição tem também a função de desenvolver os aspectos físico, psicológico, intelectual e

social, complementando a ação da família e da comunidade.

Neste segmento de ensino, o aprender ocorre de forma lúdica que, segundo Weiss

(2002), significa: “(...) processo de jogar, brincar, representar e dramatizar como condutas

semelhantes na vida infantil” (p.71). Essas atividades lúdicas ocorrem na Educação Infantil

por meio das brincadeiras direcionadas e também das brincadeiras livres. Segundo Barbosa no

livro organizado por Parolin (2009),

Principalmente na Educação Infantil e nas séries iniciais do Ensino Fundamental, a brincadeira precisa ser verdadeiramente brincadeira, pois auxilia na formação da imaginação e no repertório simbólico, tão importante para aprendizagens futuras, como a linguagem escrita e tantas outras linguagens existentes em nosso mundo (p. 111).

Na Educação Infantil, as crianças se convertem em sujeitos ativos do processo de

aprendizagem quando despertadas para o prazer e a responsabilidade de aprender. Essa atitude

participativa é o ponto de partida indispensável para a capacidade de pensar, discriminar,

cooperar e ter a habilidade de se adaptar às novas exigências do grupo e do meio.

Por acreditar em tais afirmações, buscou-se criar para a criança um instrumento que

respeitasse essas características das fases de aprendizagem e também que possibilitasse a cada

uma delas registrar seus conhecimentos de forma espontânea. Por esse motivo o registro no

diário do aluno será realizado por meio de desenhos, uma vez que esse recurso é o início do

processo de registro escrito, no qual a criança exprime suas aprendizagens e apresenta algo

significativo desse momento de descobertas.

Na testagem prévia com 50 crianças de Educação Infantil, escolhidas aleatoriamente

em duas escolas, pode-se perceber desenhos desde a fase da garatuja até o desenho

estruturado que indica diferentes fases do desenvolvimento infantil, conforme as imagens

abaixo:

Criança de 3 anos

Criança de 4 anos

Criança de 5 anos

Ilustração 1 - Diário dos Alunos (crianças de 3, 4 e 5 anos) Fonte: Imagens obtidas do diário das crianças.

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Esse desenvolvimento progressivo do desenho implica mudanças significativas desde

a passagem dos rabiscos iniciais, ou seja, da garatuja (a ação sobre a superfície do papel,

podendo ser desordenada ou ordenada) para construções cada vez mais elaboradas dos

primeiros símbolos que podem ser formas definidas que apresentam maior ordenação e

podem estar se referindo a situações de aprendizagem concretas em sala de aula.

Diário da professora e do aluno

Em diferentes escolas de Educação Infantil é possível encontrar professores que

realizam um registro diário das atividades, bem como do desenvolvimento dos alunos nas

situações propostas. Esses registros possibilitam ao professor refletir sobre sua prática

pedagógica, sobre a aprendizagem dos alunos, avaliá-los e autoavaliar-se.

Zabalza (2004) desenvolveu uma pesquisa em que os professores foram convidados a

registrarem o cotidiano escolar. Ao analisar os registros nos diários, ele caracterizou os

diferentes relatos, observou a relevância desse instrumento para o desenvolvimento de

pesquisas educacionais, sugerindo que o Diário de Aula seja aplicado com os alunos, entre

outros aspectos.

O registro da ação docente e discente nos diários contribui para promover a

participação reflexiva da professora de Educação Infantil enquanto agente produtor de

conhecimento e pesquisadora; conhecer o seu processo de aprendizagem; reconhecer a

importância da formação e atuação reflexiva para a formação de um aluno com autoria de

pensamento.

Segundo Zabalza (2004), o registro no Diário é um instrumento de pesquisa

importante, pois

escrever sobre o que estamos fazendo como profissional (em aula ou em outros contextos) é um procedimento excelente para nos conscientizarmos de nossos padrões de trabalho. É uma forma de “distanciamento” reflexivo que nos permite ver em perspectiva nosso modo particular de atuar. É, além disso, uma forma de aprender (p. 10).

Numa nova cultura de aprendizagem, o professor não mais ensina. Ele é quem ensina

e quem aprende. O uso do Diário de Aula como instrumento de pesquisa cria uma

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oportunidade do professor tornar-se um sujeito reflexivo, um pesquisador de sua prática. Ao

registrar e analisar o diário, a professora tem a possibilidade de rever sua ação em sala de

aula, bem como perceber, por meio do diário do aluno, se o tema trabalhado foi significativo e

propiciou uma aprendizagem significativa para a criança.

Desta forma, o professor tem a oportunidade de tomar consciência de sua ação,

observar, a partir do relato feito no seu diário, a presença de aspectos como: atitudes dos

alunos, atividades desenvolvidas, desafios encontrados, conquistas realizadas, entre outras

possibilidades.

Aplicação dos diários

Para que fosse possível observar a consistência e adequação do diário como

instrumento de pesquisa, foram selecionadas duas escolas particulares, 3 professoras e 50

alunos de 3 a 6 anos.

Ao final de um dia de atividades, cada criança foi convidada a registrar no Diário do

Aluno, por meio de desenho, o que a professora ensinou durante o período de aula e o que ele

aprendeu. Quando necessário, as crianças participavam oralmente, com os relatos sobre seus

desenhos. O comentário de cada criança foi registrado pela professora.

Além da professora oportunizar um momento para a aplicação do Diário do Aluno,

também sua participação foi importante quando registrou seu cotidiano. Ao relatar sua

vivência no Diário, envolveu-se como pesquisadora e não somente como sujeito pesquisado.

No diário, a professora relatou as atividades desenvolvidas, o encaminhamento das

mesmas, o desenvolvimento das crianças, entre outros aspectos que julgou importante

abordar. As professoras elencaram os elementos relevantes de sua prática e os organizaram

com autonomia, sem intervenção ou sugestão.

Na primeira escola, durante a semana em que foram aplicados os diários, as crianças

estavam envolvidas num projeto bimestral que tinha como tema a “Era dos Dinossauros”.

Abaixo podemos observar o relato descrito no Diário da Professora da turma:

A aula sobre os dinossauros foi iniciada com uma conversa para perceber quais conhecimentos as crianças já possuíam sobre o assunto. Para então aprofundar. Tínhamos por objetivos levar os alunos a perceberem as teorias sobre a extinção, o habitat, a alimentação, tamanho, como era o planeta na época dos dinossauros e como eles viviam. Para isso utilizamos diferentes recursos e estratégias, tais como: vídeos, cartazes, livros, revistas, modelagem com argila e jornal.

Professora de crianças de 5 e 6 anos

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O depoimento acima vem de encontro com alguns dos pontos salientados no

Documento Introdutório do Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998),

tais como

para que as aprendizagens infantis ocorram com sucesso, é preciso que o professor considere, na organização do trabalho educativo os conhecimentos prévios de qualquer natureza, que as crianças já possuem sobre o assunto, já que elas aprendem por meio de uma construção interna ao relacionar suas idéias com as novas informações de que dispõem e com as interações que estabelece (p.30).

O referendado acima se relaciona com a proposta da professora, quando a mesma parte

dos conhecimentos prévios das crianças acerca do tema, para iniciar o trabalho.

Claxton (2005) cita estudos realizados com crianças desde o nascimento até os nove

anos, examinando a relação entre as primeiras experiências e suas posteriores disposições ou

competências para aprendizagem. O aspecto de melhor prognóstico foi a qualidade das

interações que tiveram com os pais, e mais fortemente com seus cuidadores e professores de

pré-escola. Assim, enfatiza-se a relevância da atuação do professor nessa etapa da

escolarização, bem como a importância do seu papel de pesquisador contínuo.

Quando as crianças fizeram o registro no Diário do Aluno foi visível o interesse

demonstrado ao aprenderem sobre as teorias que abordam a extinção dos dinossauros. Os

comentários das crianças e os desenhos justificaram que o momento foi significativo,

provocou os aprendizes e permitiu a aquisição de novos conhecimentos, num clima de

descontração, conforme observado no desenho retirado do diário dos alunos de 5 e 6 anos.

Quadro 1

Quadro 2

Quadro 3

Quadro 4

Quadro 5

Quadro 6

Ilustração 2 - Diário dos Alunos (crianças de 5 e 6 anos) Fonte: Imagens obtidas no teste do Diário do Aluno.

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Além de registrar os conhecimentos adquiridos sobre os dinossauros, as crianças

conseguiram registrar, ordenar e sistematizar os conhecimentos que foram mais significativos

na sua aprendizagem, possibilitando à professora uma constatação das aprendizagens

ocorridas ao longo do desenvolvimento do projeto.

A esse respeito, a professora de sala comentou em uma conversa informal com uma

das pesquisadoras

O interesse das crianças pelo tema dinossauros me possibilitou trabalhar com assuntos atuais, como por exemplo: a extinção dos dinossauros é um fato, mas o perigo que alguns animais do tempo deles correm em se tornarem instintos está despertando um novo tema que é a preservação da natureza, a responsabilidade que cada um deles tem para com o planeta Terra. Ainda pode agregar os trabalhos às disciplinas de matemática, linguagem, natureza e sociedade.

Professora de crianças de 5 e 6 anos

Em outra escola, com crianças de 4 e 5 anos, a aplicação dos diários ocorreu durante a

realização do projeto “Ruas e Quadras”, além de outros temas abordados. Na Ilustração 2, é

possível observar a relação entre o projeto desenvolvido na semana e os demais conteúdos

trabalhados.

Quadro 01

Quadro 02

Quadro 03

Quadro 04

Ilustração 3 - Diário dos Alunos (crianças de 4 e 5 anos) Fonte: Imagens obtidas no teste do diário das crianças.

Segundo o relato da professora em seu diário:

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Neste projeto “ruas e quadras”, pretendo delimitar o que é quadra e os “tipos” de quadras existentes. O que é uma rua? Como devemos atravessar? Quais são os sinais de trânsito que encontramos? Quem pode trafegar na rua? Em relação à quadra, o que será uma quadra? Na quadra existe o quê? Quadras com lojas, shopping e vendas são comerciais. Quadras com casas e prédios são residenciais. A partir da conversa com os alunos fui ampliando as questões acima, a partir das ideias que eles tinham a esse respeito. Após os questionamentos e colocações das crianças e da professora, na própria sala foi feito com fita crepe no chão uma simulação de ruas e quadras. Cada criança recebeu uma caixa de sabonete e determinou o significado dela (carros, prédios, hospitais, farmácias...), em seguida cada um falou o que havia imaginado e colocou no esquema localizado no chão. Voltamos à conversa, e então determinamos se era uma quadra comercial, residencial.... Por último fizemos uma atividade no papel, na qual os alunos tinham um desenho de ruas e quadras e deveriam pintar somente as quadras com lápis de cor.

Professora de crianças de 4 e 5 anos

O relato proferido pela professora remete a aspectos da aprendizagem construtiva

abordada por diferentes autores, dentre eles, Pozo (2002), que descreve a importância do

conhecimento prévio do aprendiz.

Ainda em conversa informal de uma pesquisadora com a professora, esta comenta que

O trabalho com as vogais iniciou em abril e as crianças fazem diariamente atividades sensoriais, passando o dedo indicador na lixa que tem a forma de cada letra cursiva; fazem uma atividade denominada “análise do som”, na qual a criança procura em revistas figuras que tenha em seu nome o som da vogal trabalhada por cada aluno e trabalham a escrita da vogal cursiva no quadro de giz. Os alunos ficam muito entusiasmados, e como estão iniciando o processo de identificação das vogais nas palavras, normalmente, para identificar se tem ou não a vogal que procuram na palavra, pronunciam os sons de forma bem definida, como exemplo: co-mi-dAAA.

Professora de crianças de 4 e 5 anos

Em diversos diários, entre os desenhos, apareceu a escrita de algumas vogais. Percebe-

se assim que a aprendizagem das vogais está muito presente nos registros das crianças,

apresentando-se como conteúdo relevante que vem sendo trabalhado desde o início do ano e

permanece como foco da aprendizagem.

Nessa etapa da pesquisa foi possível constatar a eficiência e efetividade dos diários,

tanto do aluno quanto da professora, como instrumento para obtenção de dados a respeito da

aprendizagem de alunos e a reflexão do trabalho desenvolvido pela professora de Educação

Infantil, tornando-se pesquisadora de sua realidade. A este respeito Zabalza (2004, p. 26)

aponta “não menos importante nesse uso do diário como recurso de pesquisa é o próprio fato

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de que torna os que o escrevem (professores, alunos, colaboradores, estagiários, etc.) em

pesquisadores”.

O uso deste instrumento transforma os sujeitos participantes em investigadores da

realidade em que estão inseridos e possibilita que a pesquisa científica contribua para a

aprendizagem dos envolvidos, sejam eles pesquisadores, professores ou alunos. A reflexão

oportunizada pelo instrumento favorece uma aprendizagem significativa, bem como oferece

subsídios para possíveis transformações na prática pedagógica.

Conclusão

A aplicação dos Diários da Professora e dos Alunos possibilitou ao grupo de

pesquisadores algumas reflexões. Ao aplicar o diário com crianças de três anos, percebeu-se

que os desenhos, na sua maioria, encontravam-se na fase de garatuja, necessitando de um

registro escrito da professora, sinalizando a representação do desenho do aluno. Dessa forma,

ficou definido que as anotações da professora acerca do desenho infantil devem ocorrer no

verso da folha para não interferir na produção do aluno.

Também, foi decidido que a aplicação do instrumento deve acontecer em três

momentos distintos: início, meio e término de um novo conteúdo. A aplicação em períodos

diferenciados permite acompanhar a aprendizagem das crianças e da professora, valorizar a

aprendizagem como processo e não apenas resultado de um único momento.

Outra alteração realizada no Diário do Aluno refere-se à disposição do papel durante

as três aplicações, ou seja, na primeira a folha deve estar na vertical e os quadros para

desenhos dispostos na horizontal. Na segunda aplicação a folha deve estar posicionada na

horizontal e os quadros para o desenho, na vertical. Na última etapa da aplicação as crianças

recebem duas folhas em branco, nas quais devem realizar os desenhos com o papel disposto

da maneira que preferirem. As diferentes posições do papel têm como objetivo observar como

as crianças fazem seus registros nessas situações, em espaços diferenciados, e assim verificar

se este aspecto interfere de alguma forma nas representações gráficas da criança.

Na aplicação dos instrumentos, é importante a utilização de uma consigna única,

ficando estabelecido que, nos Diários dos Alunos, os títulos dos registros serão: “O que a

professora me ensinou” e “O que eu aprendi”.

O diário da professora permanece sem nenhuma alteração, visto que responde à sua

finalidade. Desta forma, verifica-se que a ferramenta do diário permite a quem registra, seja

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aluno ou professora, apresentar o que lhe é significativo, bem como expressar e refletir o seu

processo de aprender.

A reflexão oportunizada pela aplicação dos Diários de Aula contribuiu para a

reestruturação dos instrumentos e revisão dos objetivos e procedimentos da pesquisa, que terá

uma nova etapa no segundo semestre de 2009.

REFERÊNCIAS

CERISARA, Ana Beatriz. (1999) Educar e cuidar: por onde anda a educação infantil? Perspectiva. Revista do Centro de Ciências da Educação. Florianópolis: UFSC, v.17, n. Especial. CLAXTON, G.; tradução LOPES, M. F. O desafio de aprender ao longo da vida. Porto Alegre: Artmed, 2005. Educação Infantil: construindo o presente. Movimento Interfóruns de Educação Infantil do Brasil. Campo Grande: UFMS, 2002. KRAMER, Sonia. Criança e legislação – a educação de 0 a 6 anos”. Em Aberto. Brasília: INEP/MEC, ano 7, n. 38, p. 33-38, abril/junho 1998. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO, SECRETARIA DE EDUCAÇAO FUNDAMENTAL. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: MEC/SEF, 1998. NICOLAU, M.L.M. Textos básicos de Educação Pré-escolar. São Paulo: Ática, 1990. PAROLIN, Isabel (org). Sou Professor!: a formação do professor formador. Curitiba: Ed. Positivo, 2009. POZO, Juan Ignácio. Aprendizes e mestres. Porto Alegre: Artmed, 2002. SOUSA, A. M. C. de. Educação infantil: Uma proposta de gestão municipal. Campinas: Papirus, 1996. WEISS, M. L. Psicopedagogia clínica: uma visão dos problemas de aprendizagem escolar. Rio de Janeiro: DP&A, 2002. ZABALZA, M. A.; trad. ROSA, E. Diários de Aula: um instrumento de pesquisa e desenvolvimento profissional. Porto Alegre: Artmed, 2004.