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Gramado – RS De 29 de setembro a 2 de outubro de 2014 DIRETRIZES PARA O DESIGN DE INTERIORES DE UNIDADES DE PRONTO ATENDIMENTO BASEADAS NA PERCEPÇÃO E COMPORTAMENTO DOS USUÁRIOS Patrícia Biasi Cavalcanti Universidade Federal de Santa Catarina [email protected] Vera Helena Moro Bins Ely Universidade Federal de Santa Catarina [email protected] Marina Freitas Klein Universidade Federal de Santa Catarina [email protected] Karine Zenita Cordeiro Universidade Federal de Santa Catarina [email protected] Ana Luiza Cruz Universidade Federal de Santa Catarina [email protected] Resumo: As Unidades de Pronto Atendimento são responsáveis por uma atenção imediata ou rápida à pacientes em situações de urgência ou emergência. A implementação destas Unidades no sistema público de saúde brasileiro é recente, e, portanto, são raras as pesquisas que avaliam as unidades existentes de forma a orientar o planejamento e o design de interiores de unidades futuras. Busca-se com o presente trabalho, por meio da apresentação de diretrizes projetuais, contribuir para o design de interiores de dois ambientes fundamentais destas unidades: o posto de enfermagem e a sala de observação. A definição das diretrizes considerou aspectos principais do espaço, como o layout, o mobiliário, a humanização e distrações positivas, o conforto ambiental e os materiais de acabamento. O trabalho tem abordagem qualitativa e baseia-se no estudo da percepção e comportamento de seus usuários. Para tanto, foi desenvolvida uma revisão crítica de literatura sobre o tema, visitas exploratórias a UPAs da região da grande Florianópolis, além do estudo de caso de uma destas unidades. No estudo de caso foram aplicados os seguintes métodos: Observação Direta e Sistemática do Comportamento, Poema dos Desejos e

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Gramado – RS

De 29 de setembro a 2 de outubro de 2014

DIRETRIZES PARA O DESIGN DE INTERIORES DE UNIDADES DE PRONTO ATENDIMENTO BASEADAS NA PERCEPÇÃO E COMPORTAMENTO DOS

USUÁRIOS

Patrícia Biasi Cavalcanti

Universidade Federal de Santa Catarina

[email protected]

Vera Helena Moro Bins Ely

Universidade Federal de Santa Catarina

[email protected]

Marina Freitas Klein

Universidade Federal de Santa Catarina

[email protected]

Karine Zenita Cordeiro

Universidade Federal de Santa Catarina

[email protected]

Ana Luiza Cruz

Universidade Federal de Santa Catarina

[email protected]

Resumo: As Unidades de Pronto Atendimento são responsáveis por uma

atenção imediata ou rápida à pacientes em situações de urgência ou emergência. A implementação destas Unidades no sistema público de saúde brasileiro é recente, e, portanto, são raras as pesquisas que avaliam as unidades existentes de forma a orientar o planejamento e o design de interiores de unidades futuras. Busca-se com o presente trabalho, por meio da apresentação de diretrizes projetuais, contribuir para o design de interiores de dois ambientes fundamentais destas unidades: o posto de enfermagem e a sala de observação. A definição das diretrizes considerou aspectos principais do espaço, como o layout, o mobiliário, a humanização e distrações positivas, o conforto ambiental e os materiais de acabamento. O trabalho tem abordagem qualitativa e baseia-se no estudo da percepção e comportamento de seus usuários. Para tanto, foi desenvolvida uma revisão crítica de literatura sobre o tema, visitas exploratórias a UPAs da região da grande Florianópolis, além do estudo de caso de uma destas unidades. No estudo de caso foram aplicados os seguintes métodos: Observação Direta e Sistemática do Comportamento, Poema dos Desejos e

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Entrevistas. Espera-se, deste modo, contribuir para a atuação profissional no planejamento desses dois ambientes, de forma que os mesmos sejam mais responsivos às necessidades e anseios de seus futuros usuários. Palavras-chave: design de interiores, diretrizes projetuais, Unidades de Pronto Atendimento, Psicologia Ambiental, humanização.

Abstract: The Emergency Care Units are responsible for an immediate or

fast attention to patients in urgent or emergent situations. These units implementation in the Brazilian Public Health System (SUS) is recent, therefore the researches which evaluate the existing units are rare, making it difficult to orientate the interiors design and the planning of future units. The present work aims to contribute to Emergency Care Units interior design, throughout project guidelines presentation, for planning two of these units’ fundamental environments: observation room and nurse station. The work has qualitative approach and it is based on the study of users’ perception and behavior. Therefore, a magazine on critic literature regarding the theme and exploratory visits to ECUs from the great Florianópolis were developed, as well as these units’ study case. In the study case the following methods were applied: Behavior Direct and Systematic Observation, Wish Poems and Interviews. In the present article, a summary of the recommendations for planning these two environments in five main aspects are presented: layout, furniture, humanization and positive distractions, environment comfort, and refinishing-type materials. It is expected to contribute to professional practice when planning these environments, so they can better attend the wishes and needs of their future users. Key-words: interior design, Project guidelines, Emergency Care Units, Environmental Psychology, humanization.

1. INTRODUÇÃO Após a criação da Política Nacional de Urgências e Emergências em 2003, várias

Unidades de Pronto Atendimento – UPAs – vem sendo construídas no Brasil. A implantação de UPAs objetiva descentralizar o atendimento à saúde e aliviar a problemática da superlotação nas emergências hospitalares. Há, portanto, uma hierarquização do sistema de saúde, no qual as UPAs são classificadas como unidades intermediárias da rede municipal, onde é realizado o atendimento de urgência e emergência, e encaminhado para um hospital apenas os pacientes que realmente assim o necessitam. Deste modo, elas direcionam-se ao atendimento de pessoas em condições críticas de saúde, relacionadas principalmente à algum acidente ou à manifestação aguda de uma patologia.

Nestas circunstâncias, é comum que os pacientes se encontrem em um estado fisiológico e psicológico delicado, e que seus acompanhantes também vivenciem estresse emocional. Além disso, é corriqueiro que o corpo médico e de enfermagem destas unidades vivencie situações de estresse e pressão psicológica devido ao tipo de atendimento prestado, ao estado crítico de saúde de alguns pacientes, e às

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dificuldades existentes no sistema público de saúde, como a superlotação ou problemas relativos à infraestrutura.

Deste modo, o planejamento de interiores de UPAs deve ser cuidadosamente pensado para assegurar condições favoráveis à realização das atividades de atendimento médico e de enfermagem, contribuir para uma experiência mais positiva do ambiente e aliviar o estresse emocional de seus usuários. A despeito de sua importância e da complexidade inerente aos ambientes de saúde, há poucas publicações que orientem seu planejamento ou que evidenciem o ponto de vista dos usuários em relação ao ambiente.

Buscando contribuir para a discussão do tema, foi desenvolvida uma pesquisa pelo Programa de Educação Tutorial de Arquitetura da Universidade Federal de Santa Catarina (PET/ARQ UFSC) com o objetivo de definir critérios projetuais para o design de interiores de dois ambientes específicos e centrais das Unidades de Pronto Atendimento: o Posto de Enfermagem e a Sala de Observação. A pesquisa tem seus fundamentos teóricos e metodológicos na área de Psicologia Ambiental, Design e Arquitetura Hospitalar. O estudo centra-se na compreensão da percepção e do comportamento dos usuários para definir os atributos ambientais desejáveis para seu planejamento.

A pesquisa baseia-se em visitas exploratórias a várias Unidades de Pronto-Atendimento da região da Grande Florianópolis, revisão crítica de literatura e no desenvolvimento de um estudo de caso. No presente artigo optou-se por apresentar parte da fundamentação teórica e as diretrizes projetuais desenvolvidas para estes dois ambientes, as quais se baseiam nos resultados obtidos de todos os métodos aplicados, especialmente no estudo de caso. Espera-se com as diretrizes projetuais auxiliar designers e arquitetos a planejar ambientes centrados nas necessidades, expectativas e anseios de seus usuários.

2. MÉTODOS

A pesquisa tem abordagem qualitativa, exploratória e multi-métodos. A partir da metodologia adotada buscou-se aprofundar o conhecimento sobre humanização em ambientes hospitalares e sobre o planejamento de unidades de atendimento de urgência e emergência. Dada a escassez de bibliografia específica sobre o assunto, que reflita o contexto nacional, optou-se por realizar visitas exploratórias a diversas UPAS da região da grande Florianópolis e pela realização de um estudo de caso.

O trabalho segue as orientações do Conselho Nacional de Saúde e da Resolução CNS 196/96. Buscando-se preservar o anonimato de todos os participantes, optou-se por não identificar a instituição de saúde estudada.

No estudo de caso foram aplicados os seguintes métodos: Observação Direta e Sistemática do Comportamento, Poema dos Desejos e Entrevistas. Os métodos são descritos resumidamente a seguir.

2.1. Observação Direta e Sistematizada do Comportamento

A partir da observação direta e sistemática do comportamento dos usuários procurou-se: compreender as atividades que integram as rotinas de funcionários, pacientes e acompanhantes; verificar a adequação do ambiente à sua realização; identificar fluxos, posturas e perfil dos usuários.

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Foi adotada a postura de observador do tipo reconhecido e foi realizada a observação centrada no ambiente. Os registros foram feitos junto à planta-baixa do local, na forma de mapeamento comportamental, e também por meio de descrições detalhadas. As observações foram realizadas durante períodos de 20 minutos cada, ao longo de pelo menos um dia inteiro de utilização para cada um dos dois ambientes estudados, com pausas de 10 minutos (LEE, 1977; SOMMER, 1997; BECHTEL et al., 1987). O tratamento dos resultados foi qualitativo, e permitiu compreender e descrever a configuração ambiental, o perfil de usuários, suas rotinas e constrangimentos na utilização do local.

2.2. Poema dos Desejos (Wish Poems)

O método, desenvolvido por Sanoff (1990), foi aplicado com o intuito de compreender que aspectos do ambiente são importantes na percepção dos usuários, esclarecendo algumas de suas necessidades, expectativas e preferências.

Seu emprego consiste na introdução de um formulário predominantemente em branco contendo a seguinte frase “Eu gostaria que o ambiente (fosse ou tivesse)...”. Deste modo, proporciona-se aos usuários ampla liberdade de expressão, por meio de desenhos ou textos, para que expressem seus anseios em relação ao local. Foram consultados pacientes, acompanhantes e funcionários, objetivando compreender a percepção de cada um destes grupos usuários sobre que características seriam desejáveis para os ambientes estudados em projetos futuros.

O tratamento dos resultados foi qualitativo, categorizando as respostas e agrupando informações similares por meio de Análise de Conteúdo. Essa categorização foi feita separadamente para cada uma das salas, respeitando suas especificidades.

2.3. Entrevistas

As entrevistas foram o último método a ser aplicado, buscando sanar dúvidas remanescentes após aplicação dos outros métodos e aprofundar os dados investigados. Foram realizadas com funcionários, pacientes e acompanhantes questionando-os sobre suas preferências em relação a aspectos do projeto de interiores como: formas, cores, iluminação, materiais de acabamento, mobiliário, objetos artísticos e decorativos, distrações positivas, etc.

Foi adotado um roteiro semiestruturado, possibilitando aprofundar itens que se mostravam mais relevantes durante a aplicação das entrevistas. Os resultados foram tratados quantitativamente para as perguntas fechadas e com análise de conteúdo para as perguntas abertas

3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Dos anos 80 em diante, a humanização de ambientes de saúde tem sido um tema central nas pesquisas e projetos desenvolvidos na área. Muito se tem refletido sobre como qualificar estes ambientes para que deem suporte a uma experiência mais agradável e satisfatória para seus usuários, contribuindo para seu bem-estar e para a prestação dos serviços de atendimento médico e de enfermagem.

Pesquisas recentes mostram que diferentes estímulos ambientais podem afetar o humor (DIJKSTRA et al., 2008), o comportamento (DIJKSTRA et al., 2008) e a saúde (MONTI et al., 2012). Observa-se ainda que os efeitos do ambiente sobre os usuários tem particular importância em estabelecimentos assistenciais de saúde, onde boa

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parte das pessoas já vivência situações de estresse, por motivos relacionados à doença ou ao tratamento, ou ainda por tratar-se de locais complexos com os quais temos pouca familiaridade e controle (WHITEHOUSE et al., 2001). O estresse ocasionado por características do ambiente físico pode acentuar o estresse já vivenciado pelos usuários dos espaços de saúde e prejudicar o processo de recuperação dos pacientes, ocasionando até mesmo impacto fisiológico ou psicológico (WHITEHOUSE et al., 2001). O estresse ambiental pode ainda comprometer o bem-estar de funcionários e acompanhantes.

Por outro lado, inúmeros estudos têm evidenciado os efeitos positivos de ambientes de saúde cuidadosamente planejados. Ulrich (1995) afirma que a qualidade do ambiente pode contribuir para o processo de recuperação da saúde, complementando os efeitos dos procedimentos médicos e de remédios. Por exemplo, uma de suas pesquisas (ULRICH, 1984) comprovou que quando os quartos de internação pós-cirúrgica estão voltados para áreas arborizadas, em comparação a quartos sem contato visual com a natureza, verificam-se uma recuperação e alta mais rápida, redução da pressão sanguínea, menos queixas relativas à percepção de dor pelos pacientes e menor ingestão de analgésicos. Neste caso, a natureza atua como uma distração positiva (ULRICH et al., 2008), o que corresponde a estímulos agradáveis do ambiente que desviam a atenção do paciente em relação a doença e ao processo de tratamento, diminuindo a percepção da dor. Outros trabalhos demonstram que mesmo intervenções pictóricas, como gravuras com imagens da natureza, também podem reduzir a ansiedade de pacientes em tratamento médico e contribuir para uma percepção ambiental mais positiva pelos usuários (MONTI et al., 2012). Há também evidências sobre os efeitos de distrações positivas sonoras, além da visual, como os sons da natureza (MONTI et al., 2012).

Além das distrações positivas, vários outros aspectos do ambiente de saúde tem se mostrado determinantes para assegurar sua qualidade e proporcionar bem-estar. Mourshed e Zhao (2012) desenvolveram um estudo que sintetiza e organiza alguns dos trabalhos de maior relevância que abordam os benefícios da humanização de ambientes de saúde. Neste estudo, os atributos ambientais que influem na humanização incluem: questões relativas ao conforto ambiental (térmico, lumínico e acústico), a ambiência (configuração espacial, layout, cores, presença de obras de arte), a integração interior-exterior (contato físico ou visual com a natureza) e ainda aspectos ligados à assepsia e à manutenção. Outros trabalhos científicos abordaram aspectos específicos da humanização como: a configuração dos quartos de internação (BOBROW; THOMAS, 2000; GALLANT; LANNING, 2001; SOLOVY, 2002; BACON, 1920; CABRERA; LEE, 2000; TATE, 1980; CARPMAN; GRANT, 1993); a configuração de salas de espera (ZIMRING et al., 1987; ARNEILL; DEVLIN, 2002); a disponibilidade de visuais para a natureza; e ainda iluminação e sons (VERDERBER; FINE, 2000; MONTI et al., 2012).

A diversidade de fatores ambientais que influem na humanização confirma a complexidade que é inerente ao planejamento de ambientes de saúde. Além disso, verifica-se que não há um único caminho ou fórmula a ser seguido por projetistas para que seja assegurada a qualidade desejável aos ambientes. Há evidências de que vários aspectos relativos à qualidade e à vivência do ambiente vão impactar na percepção ambiental e no comportamento de seus usuários. Em se tratando de uma UPA, verifica-se uma escassez de bibliografia específica que trate de aspectos relativos à sua humanização. Acredita-se que o desenvolvimento de pesquisas aplicadas e ajustadas

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ao contexto local pode auxiliar na compreensão da percepção e comportamento ambiental de seus usuários, e deste modo contribuir para a atuação profissional no planejamento destes ambientes.

4. DIRETRIZES PROJETUAIS

Com base na realização de visitas exploratórias a UPAs da região da Grande Florianópolis, na revisão de literatura e nos resultados obtidos com o estudo de caso foram desenvolvidas as diretrizes projetuais para o planejamento de interiores de alguns ambientes que compõe uma UPA.

É apresentada neste artigo uma síntese das diretrizes projetuais desenvolvidas relativas à sala de enfermagem e à sala de observação. Buscou-se redigi-las de forma conceitual, para que dêem subsídios ao planejamento do local sem ser demasiadamente específicas ou restritivas, o que poderia limitar a liberdade criativa necessária ao processo projetual.

4.1. Sala ou Posto de Enfermagem

As salas ou postos de enfermagem de uma UPA são ambientes de uso quase exclusivo dos profissionais de saúde, e nos quais os mesmos permanecem por longos períodos, potencializando um vínculo consistente entre eles e o local. São atividades fundamentais destes ambientes: a observação dos pacientes que se encontram nas salas de medicação e observação, o preparo de insumos utilizados no atendimento, e o acompanhamento e preenchimento de registros médicos.

Destaca-se a importância do layout do mobiliário no sentido de facilitar as atividades ali realizadas, principalmente a observação dos pacientes acamados. O contato visual entre enfermeiros e pacientes deve ser favorecido, o que torna fundamental o posicionamento estratégico do posto de enfermagem em relação aos leitos ou poltronas de atendimento. Uma solução muito comum é a do posto de enfermagem centralizado nas salas de medicação e observação, em formato de ilha, facilitando o contato visual e físico entre pacientes e enfermeiros. É possível, no entanto, que o posto de enfermagem seja um ambiente a parte, localizado ao lado das salas de medicação e observação, e integrado visualmente por meio de panos de vidro (Figura 1). Quando o posto de enfermagem é um ambiente a parte, pode reduzir-se a facilidade de contato visual e físico, porém tem-se como vantagem proporcionar maior privacidade acústica para a equipe de enfermagem em situações como discutir casos clínicos ou atender a ligações telefônicas. O número de postos de enfermagem varia com o número de pacientes a serem atendidos e observados, e segundo a RDC 50 (ANVISA, 2002) deve ser previsto um posto de enfermagem para cada 12 leitos.

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Figura 1 – Ilustração de um Posto de Enfermagem hipotético anexo às salas de observação. Destaque para as diretrizes apresentadas.

Fonte: Elaborado pelos autores, com base na pesquisa realizada.

Outro aspecto importante do layout a ser considerado é evitar cruzamento indesejável de fluxos dentro do ambiente. Por exemplo, recomenda-se reduzir a distância entre a bancada de preparo de medicamentos e o acesso às salas de observação e de medicação, já que este fluxo é bastante frequente. Recomenda-se ainda aproximar a bancada na qual são preparados os medicamentos em relação a pia de higienização de materiais e utensílios, bem como em relação a pia de higienização das mãos dos profissionais de saúde, de forma a favorecer a assepsia e o uso.

Entre os equipamentos e o mobiliário essenciais para uma sala ou posto de enfermagem encontram-se: uma pia para o preparo de medicamentos, cuja torneira deve ter acionamento que dispense o toque das mãos (por pedal, sensor ou pressão); lavatório para as mãos dos profissionais de saúde com acionamento similar ao anterior; refrigerador para armazenagem de medicação; bancadas para preparo de medicação, preenchimento de formulários, e apoio de material; área de armazenamento dos equipamentos e insumos utilizados, que podem ser nichos, prateleiras, armários, portas ou gavetas; recipientes para separação de lixo comum e contaminado; mesa com computador; telefone; painel de avisos; cadeiras ou bancos; e porta-prancheta.

Também o design específico do mobiliário deve levar em consideração os requisitos antropométricos, favorecendo a adequação às dimensões, movimentos e posturas dos funcionários, visto que estes permanecem no espaço por um longo período. O planejamento dos móveis deve facilitar as atividades mais frequentes. Por exemplo, os insumos mais utilizados no preparo das medicações deveriam estar localizados prioritariamente no alcance de um funcionário em pé ou sentado em uma banqueta alta, com o uso de nichos, prateleiras, portas ou gavetas fáceis de manusear. Considerando-se a longa permanência dos funcionários no local, sugere-se o uso de cadeiras reguláveis, com encosto para as costas e apoio para os braços, com altura adequada à utilização das bancadas e à visualização dos pacientes. É fundamental que o ambiente ou posto de enfermagem esteja dimensionado para o número máximo de

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pessoas que ali trabalham, prevendo assentos para todos, uma vez que os profissionais permanecem por longos períodos no local. Além disso, ao planejar o mobiliário, deve-se levar em consideração o espaço de utilização das bancadas e cadeiras, ou seja, o espaço de evolução necessário para que as atividades sejam realizadas sem constrangimentos.

Quanto à humanização, os participantes da pesquisa sugeriram com maior frequência dispor de quadros e gravuras que contribuam para a ambientação do local. No entanto, eles também alertaram que a escolha destes elementos deve considerar a facilidade de assepsia. As gravuras devem ser fáceis de higienizar, como quando estão protegidas por molduras com vidro. Foi também sugerido pelos usuários que se buscasse proporcionar algum contato visual com o exterior, preferencialmente com áreas tratadas paisagisticamente. Para os momentos de descanso dos funcionários, algumas outras distrações positivas foram sugeridas, as quais deveriam ser preferencialmente silenciosas de forma a não atrapalhar os demais usuários, como a leitura de revistas e livros. Além disso, foi recomendado planejar dentro da UPA, um ou mais ambientes que sejam exclusivos de suporte social para a equipe de saúde, possibilitando: a realização de lanches, descanso, convivência, estudo e distrações positivas em geral. Normalmente, este ambiente é denominado de Sala de Conforto, e pode conter copa, sofá, cama, computador, televisão, entre outros.

As recomendações relativas aos materiais de acabamento levam em consideração a legislação vigente no país - RDC 50 (ANVISA, 2002) - a qual orienta que todas as superfícies sejam lisas, laváveis, impermeáveis (absorção menor que 4%) e resistentes aos processos de desinfecção. Preferencialmente, as superfícies de pisos, paredes e forros devem ser monolíticas, apresentando o mínimo possível de frestas e ranhuras, tendo em vista as condições ideais para sua assepsia. Tais recomendações se aplicam aos dois ambientes aqui apresentados, e por isso não serão repetidas para. Cabe, no entanto, observar que a sala de espera é um dos locais da UPA que proporcionaria maior liberdade na escolha dos acabamentos, por ser um ambiente no qual não ocorrem atividades de atendimento médico ou de enfermagem.

Quanto ao conforto ambiental, tendo em vista a longa permanência dos usuários, se mostra significativo assegurar o seu bem-estar em relação aos aspectos acústicos, lumínicos e térmicos, como ventilação natural e temperatura ambiente adequada. O conforto lumínico centra-se na necessidade de assegurar as condições adequadas de acuidade visual para as atividades ali desenvolvidas como o preparo das medicações. Caso o ambiente tenha grandes dimensões, além da iluminação geral artificial, sugere-se dispor de iluminação específica direcionada para a bancada de trabalho dando suporte as atividades de maior acuidade visual como preparar medicações, preencher formulários, ler ou usar o computador.

4.2. Sala de Observação

A Sala de Observação é um ambiente para o qual os pacientes são encaminhados após atendimento prévio nos consultórios da UPA e no qual permanecem ao receber tratamento – infusão de medicação, inalação, entre outros – que necessite algum período de observação pelo corpo de enfermagem antes da alta médica. No caso de salas de observação pediátricas, nas quais os pacientes incluem crianças e adolescentes, é costume que os mesmos estejam acompanhados de seus

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pais ou familiares. O período de permanência no local varia conforme a prescrição médica, podendo estender-se por, no máximo, 24 horas.

Uma diretriz básica é que a sala de observação deve ser ampla, possibilitando um espaço razoável entre os leitos para a realização de atividades dos funcionários, permanência de acompanhantes, circulação de todos os usuários e, também para dispor de um espaço físico que possa acomodar demandas futuras como novos equipamentos (TOLEDO; FERRER, 2004). Considerando a diversidade de usuários e a eventual necessidade de circular com as macas, o projeto deve garantir portas e corredores largos, além de seguir os princípios de Desenho Universal.

Conforme mencionado anteriormente, o posto de enfermagem deve ter contato visual assegurado a toda a sala, e em especial, a todos os leitos onde se localizam os pacientes em medicação ou observação. Outro ponto que deve ser considerado no projeto é a privacidade dos pacientes. Recomenda-se a utilização de divisórias como biombos retráteis ou cortinas hospitalares entre leitos de atendimento. Estes elementos são pouco frequentes nos estabelecimentos públicos do país, porém permitem a pacientes e funcionários ajustar as condições de privacidade do box de atendimento conforme as suas necessidades ou atividades a serem realizadas.

O mobiliário deve ser ergonômico, adequar-se às medidas antropométricas, e proporcionar segurança e conforto aos usuários em geral, especialmente se considerarmos a possibilidade de uma permanência prolongada no local. São móveis fundamentais nesses ambientes (ver Figura 2): as macas nas quais permanecem os pacientes, as cadeiras ou poltronas para acompanhantes, e os balcões e equipamentos utilizados pelos funcionários para estocar material ou preparar insumos para o atendimento. Soluções simples como uma pequena escada que garanta o acesso às macas de forma autônoma pelas crianças, em ambientes pediátricos, podem agilizar o processo de atendimento e reduzir a fadiga dos enfermeiros quando o estado de saúde da criança não é crítico. E visando evitar acidentes, sugere-se que a localização da lixeira para resíduos infectantes seja de difícil acesso aos pacientes. Ela pode ser alocada suspensa do chão, em altura adequada ao uso por enfermeiros e funcionários de limpeza.

Figura 2 – Ilustração de um box individual dentro de uma sala de observação. Fonte: Elaborado pelos autores, com base na pesquisa realizada.

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No que se refere à humanização do ambiente, os participantes da pesquisa evidenciaram ser desejável: o uso de cores ou adesivos decorativos nas paredes; móbiles e brinquedos para uma ambientação adequada ao público infantil em locais de atendimento pediátrico; e dispor de distrações positivas para pacientes e acompanhantes. Durante a aplicação de entrevistas, alguns usuários comentaram que distrações como aparelho televisor e música ambiente podem causar desconforto, tendo em vista o caráter coletivo da sala e a impossibilidade de cada indivíduo decidir a programação ou regular o volume. Assim, foram sugeridos passatempos silenciosos como: revistas, livros, contemplação da natureza e de obras de arte que retratem ambientes naturais.

Também é fundamental assegurar o conforto térmico, acústico e lumínico, dando suporte às atividades realizadas durante todo o dia. Sugere-se dispor de uma iluminação geral para o ambiente e iluminação direcionada para os leitos permitindo o exame visual dos pacientes, e a realização de atividades de maior acuidade visual como leituras por pacientes e acompanhantes. A disponibilidade de iluminação em cada box de atendimento, também favorece o controle e regulagem dos níveis luminosos pelos pacientes e acompanhantes. Recomenda-se ainda dispor de iluminação direcionada para as bancadas de trabalho dos funcionários, dando suporte ao preparo de medicações e insumos. É fundamental assegurar as condições adequadas de ventilação natural e climatização artificial visando o conforto térmico e a redução do risco de disseminação de doenças infecciosas. Dispor de aberturas para o exterior contribui para a renovação do ar e o conforto térmico, além de potencializar o contato visual com a paisagem do entorno e a natureza. Além disso, estudos afirmam que os níveis de estresse diminuem de acordo com o aumento da exposição à luz natural (ALIMOGLU; DONMEZ, 2005), confirmando sua importância.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo apresentou diretrizes projetuais para o planejamento de interiores de dois ambientes distintos de Unidades de Pronto Atendimento. Acredita-se que a abordagem qualitativa, por meio de métodos oriundos da Psicologia Ambiental, favoreceu a compreensão da natureza de cada um dos ambientes estudados e dos aspectos que são essenciais para seu planejamento, os quais nem sempre são contemplados nas normativas por sua especificidade e escala.

Na sala ou posto de enfermagem destacou-se o fato de que as distrações positivas e outros aspectos relativos à humanização foram menos destacados pelos participantes do que em outros ambientes estudados na pesquisa. As diretrizes para o planejamento deste ambiente e de seu mobiliário centram-se, sobretudo nos aspectos funcionais e ergonômicos, de modo a facilitar a atuação da equipe de enfermagem na observação e no atendimento aos pacientes.

Já na sala de observação, convergiu uma diversidade maior de aspectos no seu planejamento. Apresentaram-se como demandas significativas dos usuários: a facilidade de contato físico e visual com os profissionais de saúde, a privacidade do paciente nos boxes de atendimento, a ambientação adequada do local, a possibilidade de acomodar confortavelmente os acompanhantes e a disponibilidade de distrações positivas.

Assim, o posto de enfermagem por ser um local de uso quase que exclusivo da equipe de enfermagem evidenciou a importância de atributos funcionais que dêem

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suporte a realização das atividades de atendimento ao paciente. Já na sala de observação, com distintos grupos usuários – profissionais de saúde, pacientes e acompanhantes – uma variedade maior de atividades, anseios e expectativas foram constatadas.

Dentre as dificuldades verificadas na realização do trabalho, destaca-se o fato de que boa parte dos pacientes e acompanhantes consultados não concordaram em participar da pesquisa, devido ao estado de saúde ou ao estresse que experienciavam. Como havia um tempo pré-determinado para a aplicação dos métodos, foi desafiador para a equipe e pesquisa alcançar uma amostra que proporcionasse recorrência significativa nos resultados e confiabilidade.

Uma limitação do estudo foi o fato de que não se conseguiu estudar a sala de reanimação, a qual se pretendia inicialmente investigar. Não foi possível estudar este ambiente, pois em nenhum dos dias de realização do trabalho de campo se verificou atividade no local. Acredita-se, no entanto, que o estudo das salas de reanimação é sim muito importante e ainda pode ser explorado em pesquisas futuras, tendo em vista o fato de que as atividades ali realizadas são críticas, refletindo a importância do planejamento adequado do local.

Espera-se com o presente trabalho ter contribuído para o planejamento destas unidades, evidenciando alguns aspectos gerais do ambiente que são significativos para funcionários, pacientes e acompanhantes, e para dar suporte às atividades lá realizadas. Acredita-se que deste modo, será possível desenvolver projetos centrados nos usuários, resultando em ambientes de saúde cada vez mais qualificados e humanizados.

REFERÊNCIAS

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