direito do consumidor - felipe peixoto - 2013.pdf

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7/25/2019 DIREITO DO CONSUMIDOR - FELIPE PEIXOTO - 2013.pdf http://slidepdf.com/reader/full/direito-do-consumidor-felipe-peixoto-2013pdf 1/530 Manual de DIREITO DO CONSUMIDOR A luz da jurisprudência do STJ FELIPE PEIXOTO BRAGA NETTO CONFORME • Lei n° 12.741, de dezembro de 2012 e os três anteprojetos do Senado que atualizam o CDC INCLUI • Questòes de concursos ao tinal de cada capítulo e também ao final do livro • Resumo ao final de cada capítulo • Conteúdo dos informativos dos tribunais superiores inseridos ao longo da doutrina • Mais de 800 acórdãos dos Tribunais superiores 8a Edição revista, ampliada e atualizada

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    Manual de

    DIREITO DOCONSUMIDOR

    A luz da jurisprudncia do STJ

    FELIPE PEIXOTO BRAGA NETTO

    CONFORME

    Lei n 12.741, de dezembro de 2012 e os trs anteprojetos do Senado que atualizam o CDC

    INCLUI

    Questes de concursos ao tinal de cada captulo e tambm ao final do livro

    Resumo ao final de cada captulo Contedo dos informativos dos tribunais superiores inseridos ao longo da doutrina Mais de 800 acrdos dos Tribunais superiores

    8a Edio

    revista, ampliada e atualizada

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    dinmica a interpretao do Cdigo deDefesa do Consumidor. Seus institutos -longe de nascerem prontos com a edio dalei, h mais de vinte anos - reve lam-se empermanente processo de abertura ereformulao, renovando-se cotidianamen-

    te no trato com a sociedade e com ostribunais.

    O CDC - aprovado por unanimidade nasduas casas do Congresso - talvez seja amais importante lei da segunda metade dosculo XX, no direito privado brasileiro. Umalei feita, por assim dizer, para o futuro, quedialoga com as geraes que chegam e que

    incorpora novos conhecimentos e novassolues para problemas inditos. Pondera,a propsito, Jos Roberto de Castro Neves:

    No h dvida de que a Lei do Consumidorfoi um sucesso. Muitas vezes ela citada,com razo, como exemplo de uma lei que

    deu certo, porque, de fato, educou e regulouum setor, antes muito carente, no qual

    grassava o desrespeito ao consum idor .

    Este livro, modestamente, tenta acom pa

    nhar essa evoluo, seguindo cada mudan

    a jurisprudencial dos tribunais superiores -no STF e, particularmente, no STJ, entre

    cujas funes est a uniformizao dainterpretao da lei federal no Brasil.

    A obra est, mais uma vez, atualizada,

    com todos os julgados relevantes pertinentes ao tema. H, tambm, nesta stimaedio, as mais recentes questes deconcurso. gratificante perceber que muitasdelas trazem discusses que propusemosaqui, desde a primeira edio. E mais uma

    vez agradecemos a generosidade com que oleitor tem acolhido este livro. Para nossasurpresa, as edies tm se esgotado cada

    vez mais rpido, o que nos obriga a ter, naatualizao, a mesma preocupao desempre: a de oferecer um livro til.Saudamos - com humildade e gratido - oseitores que tornaram possvel esse dilogoe esperamos, mais uma vez, crticas esugestes. Elas tm sido verdadeiramenteimportantes no aprimoramento do livro.

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    NUAL DE DIREITODO COM

    LUZ DAJURISPRUDNCIA. DO STJ

    ; - Questesdeconcursosaofinaldecada :; captuloetambmaofinaldolivro |

    - Resumoaofinaldecadacaptuloi - Contedodosinformativosdostribunais jsuperioresinseridosaolongodadoutrina

    - Maisde800acrdosdostribunaissuperiores i- AtualizadodeacordocomaLei n.12.741, j

    dedezembrode2012eostrsanteprojetosdoSenadoqueatualizamoCDC.

    UMIDOR

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    LIVROS PUBLICADOS PELO AUTOR

    Obras individuais:

    - Teoria dos ilcitos civis.Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

    - As coisas simpticas da vida. So Paulo: Landy, 2005 (2a edio: 2008).

    - Responsabilidade Civil. So Paulo: Saraiva, 2008 (janeiro: primeira tiragem; julho, segundatiragem ).

    - Manual da Responsabilidade Civil do Estado: luz da jurisprudncia do STF e do STJ e dateoria dos direitos fundamentais. Salvador: Juspodivm, 2012.

    Obras coletivas:

    - A responsabilidade civil e a hermenutica contempornea: uma nova teoria contratual?.A

    Teoria do Contrato e o Novo Cdigo Civil.Recife: Nossa Livraria, 2003.

    - Direito Civil e Constituio: desafios e perplexidades de uma aproximao. Crise e desafios

    da Constituio,Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

    - Dom Helder Cmara, uma breve biografia. Em defesa dos direitos e garantias fundamentais.

    Belo Horizonte: ESDHCj 2010.

    - Direitos da personalidade: em busca de modos preventivos de proteo.Leituras Complementares

    de Direito de Famlia.Salvador: Juspodivm, 2009.

    - A Constituio e a Dimenso Privada do Existir. Quinzeanosde Constituio.Belo Horizonte:

    Del Rey, 2004.

    - O Dano Moral na Jurisprudncia Civil-Constitucional. Constituio e Crise Poltica. Belo

    Horizonte: Del Rey, 2006.

    - Dano moral e Imprensa. Temas de Direito Civil Contemporneo.Salvador. Juspodivm, 2009.

    - A atuao do Ministrio Pblico na Defesa do Consumidor. Temas atuais do Ministrio Pblico.

    Salvador: Juspodivm, 20 12 ,3 edio.

    Comentrios Lei de Falncias e Recuperao de Empresas (Lei n 11.101/05).Rio de Janeiro:

    Forense, 2009.

    - Ilcito civil, esse Desconhecido...Revisitando a Teoria do Fato Jurdico. Homenagem a

    Marcos Bernardes de Mello.So Paulo: Saraiva, 2010.

    - Acaba no, mundo (e outras do cronicadodia.com.br).So Paulo: Ptio, 2011.

    Ato ilcito e excludente de ilicitude. Manual de Teoria Geral de Direito Civil.Belo Horizon

    te: Del Rey, 2011.- Codificao ou interpretao? Os efeitos possveis dos ilcitos civis. Os 10 anos do Cdigo

    Civil: evoluo eperspectivas .Belo Horizonte: Frum, 2012.

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    v \ y \ - ri

    53*433 0 / 1 3

    F e l i p e F. B r a g a N e t t oMembro do Ministrio Pblico Federal (Procurador da Repblica);

    Doutorando em Direito pela PUC-RIO/ESDHC; Mestre em Direito pela UFPE;Professor da Escola Superior do Ministrio Pblico da Unio;

    Professor de Direito Civil e Consumidor da Escola Superior Dom Helder Cmara(2003/2013); Professor de Direito Civil e Consumidor da PUC-Minas (2002/2006):

    Procurador Regional Eleitoral de Minas Gerais (2010/2012)Articulista semanal do site www.domtotal.com

    Ma n u a l d e d ir e i t o

    d o Co n s u m i d o r LUZ DA JURISPRUDNCIA DO STJ

    - Questesdeconcursosaofinaldecadacaptuloetambmaofinaldolivro

    - Resumoaofinaldecadacaptulo- Contedodosinformativosdostribunais

    superioresinseridosaolongodadoutrina- Maisde800acrdosdostribunaissuperiores- AtualizadodeacordocomaLei n,12.741,

    dedezembrode2012eostrsanteprojetosdoSenadoqueatualizamoCDC.

    8a edio

    Revisada, ampliada e atualizada.

    2013

    EDITORA/msPODIVM fU

    www.editorajuspodivm.com.bri.com.br

    http://www.domtotal.com/http://www.editorajuspodivm.com.br/http://www.editorajuspodivm.com.br/http://www.editorajuspodivm.com.br/http://www.domtotal.com/
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    BS13m Braga Netto, Felipe Peixoto

    Manual de direito do consumidor: luz da jurisprudncia do

    , STJ/Felipe Peixoto Braga Netto. - Salvador: Edies Juspodivm,:

    2013.

    522p.

    Inclui legislao.

    Bibliografia.

    1 .Defesa do consum idor-Legislao . 2.Brasil.Cdigo de defesa

    do consumidor (1990). I. Ttulo.

    EDITORAJksPODIVM.

    www.editorajuspodivm.com.br

    Rua Mato Grosso, 175-Pituba, CEP: 41830-151 - Salvador-Bahia

    Tel: (71)3363-8617 /Fax: (71) 3363-5050 E-rnail: [email protected]

    Copyright: Edies/twPODIVM

    Conselho Editorial: Dirley da Cunha Jr., Leonardo de Medeiros Garcia, Fredie Didier Jr.,Jos Henrique Mouta, Jos Marcelo Vigliar, Marcos Ehrhardt Jnior, Nestor Tvora,Robrio Nunes Filho, Roberval Rocha Ferreira Filho, Rodolfo Pamplona Filho, RodrigoReis Mazzei e Rogrio Sanches Cunha.

    Capa: Rene Bueno e Daniela Jardim (www.bitenojardim.com.br)

    Diagramao: Cendi Coelho ([email protected])

    Todos os direitos desta edio reservados Edies J ksPODIVM.

    E termnantemenle proibida a reproduo total ou parcial desta obra, por qualquer meio ou

    processo , sem a ex pres sa au toriza o do au to r e da Ed iesJusPODTVM.A violao dos direitosautorais caracteriza crim e descrito na legislao em vigor, sem pre juzo das sanes civis cabveis.

    http://www.editorajuspodivm.com.br/mailto:[email protected]://www.bitenojardim.com.br/mailto:[email protected]:[email protected]://www.bitenojardim.com.br/mailto:[email protected]://www.editorajuspodivm.com.br/
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    Dedico esse livro ao meu pai,Srgio Roberto Braga Netto,

    um homem que sempresoube amar os livros.

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    Agradeo ao amigo. - Terence Trennepohl,

    que teve a idia deste livroe me incentivou a escrev-lo.

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    Su m r i o

    O te le fo n e ......................................................................................................................................

    N ota oitava ed i o ......................................................................................................................

    N ota s tim a e d i o ..................................................................................................................... 23

    Pre f cio s tim a e d i o .............................................................................................................. 25

    Pref cio se gu nda ed i o ............................................................................................................ 27

    C aptulo IC Q N T E X T U A L IZ A N D Q O C D C ....................................................................................... 35

    1 . O CDC como um m icrossistema legislat ivo............................................................... 35

    2. O que so normas de ordem pblica e interesse social?.......................................... 36

    3. Autonomia e he teron om ia.............................. ........................................................................ 37

    4 . O CDC co m o um a le i de funo so cia l .......................................................................... 39

    5. O fundamento co ns tituc iona l do C D C ............................................................................... 40

    6. Ques tes de C oncurso s............................................................................................................ 42

    7. Sintico ....................... .................................................................................................................. 44

    Captulo IIC A R A C T E R ST IC A S D O C D C ........................................................................................... 45

    1. Normas principiolgicas.......................................................................................................... 45

    2. Vocao de expanso................................................................................................................. 46

    3. Dilogo das fo ntes..................................................................................................................... 47

    4. Irrelevncia dos aspectos for m ais ................ ........................................................................ 49

    5. Sin tico.......................................................................................................................................... 50

    Captulo IH

    P R IN C P IO S D O C D C .............................................................................................................. 51

    1. Vulnerabilidade do co nsu midor ............................................................................................ 51

    2. Transparncia.............................................................................................................................. 53

    3. In fo rm a o .................................................................................................................................. 55

    4. Segurana.................................................................................................................................... 59

    5. Eq uil br io nas pres ta es ........................................................................................................ 60

    6. Reparao in te gr al.................................................................................................................... 63

    7. Sol idar iedad e............................................................................................................................. 64

    8. Interpretao mais favorvel ao consum idor(interpretao contra o estipulante)..................................................................................... 6S

    9. Boa-f obje tiva.......................................................................................................................... 70

    10. Reparao ob jetiva............................................................................................................ 73

    11. Adimplemento substancial....................... ............................................................................ 75

    12. Venire contra factum proprium ....................................................................................... 77

    13. Conservao do contrato............................... 7S

    19

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    F elipeP. B ragaN etto

    14. Modificao das prestaes desproporcionais................................................. 78

    15. Equidade......................................................................................................... gj16. Harmonia nas relaes de consumo................................................................. 8317. Acesso justia.......................................................................................

    ....... g818. Questes de Concursos........................... ................. ...................................... 9119. Sintico............................................. ......... ..................................................... 96

    Captulo IVRELAO JURDICA DE CO NSUMO ...... ............................................... 991. Os sujeitos........................................................................................................ 992. Identificando o consumidor e o fornecedor...................................................... 100

    2.1. Intenet e relaes de consumo no STJ ................................................... 1052.2. Os profissionais liberais so fornecedores de servios?.......................... 106

    3. Teorias maximalista e minimalista............................................................ 1104. Compreendendo a expresso destinatrio final............. ................................ 110

    4.1. Ampliaes jurisprudenciais do conceito do destinatrio final............. 1125. A pessoa jurdica como consumidora............................................................... 1156 . Consumidor pessoa fsica e consumidor pessoa jurdica: presunes............... 1157. Possibilidade de limitar a indenizao: consumidor pessoa jurdica................ 116

    8. Consumidor por equiparao..........................................................................

    1178.1. As trs hipteses previstas do consumidorpor equiparao (art. 2,pargrafo nico; art. 17; art. 29)....................... 117

    8.2. Os bystanders : consumidores sem contrato de consumo...................... 1209. Responsabilidade contratual e extracontratual: irrelevncia no CDC............... 121

    9.1. Exceo: juros de mora........................................................................... 1229.1.1. Responsabilidade contratual....................................................... 1239.1.2. Responsabilidade extracontratual................................................ 123

    10. Questes de Concurso...................................................................................... 12311. Sintico............... ............................................................................................ 132

    Captulo VRESPONSABILIDADE CIVIL NAS RELAES DE CONSUMO.......... 1351. Vcio do produto ou servio e fato do produto ou servio................... ........... 1362. Vcio do produto............................................................................................ 1373. Vcio do servio.................................................................................... ....... 1394. Fato do produto.......................................................................................... . 140

    5. Fato do servio....................................................... ............;.......................... 142

    6 . Perigo intrnseco........................................................................................... 1437. Prazo decadencial do vcio............................................................................. 1438. Prazo prescricional do fato............ f.............................................................. 1459. Responsabilidade objetiva do fornecedor....................................................... 14510. Ausncia do defeito: prova a cargo do fornecedor.......... ................................ 14711. Comerciante: responsabilidade subsidiria?.................................................. 148

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    Sumrio

    12. Questes de Concursos.............. ................................... ............. ................. .... 14913. Sintico............................................................................................................ 157

    Captulo VIEXCLUDENTES DE RESPONSABILIDADE ............................................. 1591. Excludentes de responsabilidade: quais so aceitas no sistema de consumo?.... 1592. Caso fortuito ou fora maior............................................................................. 160

    2.1. A anlise dos riscos assumidos pelo fornecedor........................................ 1613. Culpa exclusiva da vtima................................................................................. 1624. Fato exclusivo de terceiro.................................................................................. 1635. Culpa concorrente............................................................................................. 1636. Teoria do risco do desenvolvimento.................................................................. 165

    7. Questes de Concursos...................................................................................... 1668. Sintico..................................................... ........................................................ 169

    Captulo VIIDANOS MORAIS NAS RELAES DE CO NSUM O ................................ 1711. Breve panorama legislativo ejurisprudencial.................................................... 1722. Indenizao ressarcitria e indenizao compensatria.................................... 1743. Morte de familiar: quem poder propor

    ao contra o fornecedor de produtos ou servios?........................... ............... 1754. Quais agresses perfazem dano mora l? ............................................................ 1765. Danos no patrimoniais de alguma gravidade................................................... 1786. Se a vtima falecer antes de propor ao, os herdeiros podem faz-lo?............ 1817. A quantificao do dano moral........................................................................... 1828. O STJ pode alterar valores de dano moral?....................................................... 1849. A condio econmica do autor do dano

    e da vtima influem na fixao do valo r?.......................................................... 18610. A dplice funo do dano moral (aspecto punitivo ou pedaggico).................. 187

    11. CDC x Conveno de Varsvia: indenizao por perda de bagagem ............... 18812. O dano moral sofrido por consumidor pessoa ju- rdica.................................... 19013. Dano moral pode resultar do descumprimento

    do contrato pelo fornecedor de produtos ou servios? ................ ..................... 19114. Dano moral e dano esttico podem ser cumulados?......................................... 19215. Como se provam os fatos constitutivos do dano moral?.................................. 19416. A questo do nexo causai no dano moral.............................................. ............ 19617. Responsabilidade civil das empresas de estacionamento................................... 199

    17.1. Excludentes de responsabilidade civil...................................................... 20017.2. Irrelevncia da gratuidade........................................................................ 20117.3. Outras hipteses...................................................................................... 202

    17.3.1. Shopping centers ou supermercados............................................ 20217.3.2. Estacionamento de hospital......................................................... 20417.3.3. Estacionamento de hotel..,........................................................... 20417.3.4. Estacionamento por manobristas de restaurantes......................... 204

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    F elbpeP. BragaN etto

    17.3.5. Estacionamento de postos de combustvel........... ..................... 20518. Responsabilidade civil no transporte de pessoas........................................ ..... 206

    18.1. Contextualizao..................................................................................... 206

    18.2. Obrigao de meio ou de resultado? Clusula de incolumidade.............. 20618.3. O dano causado por terceiro: responde a empresa de transporte? ............ 207

    18.3.1. Dano conexo ao transporte.......................................................... 20718.3.2. Dano desconexo ao transporte...................................:............... 208

    18.4. Transporte gratuito ou de mera cortesia.................................................. 20818.5. Excludentes de responsabilidade............................................................. 210

    18.5.1. Culpa exclusiva da vtima.......................................................... 21018.5.2. Caso fortuito ou fora maior

    (Cdigo Civil, art. 393, pargrafo nico).................................... 21118.5.3. Culpa concorrente.................................. ..... ........... .................... 21418.6. Clusulas de irresponsabilidade ou de no indenizar.............................. 21518.7. Aplicao do CDC ao contrato de transporte........................................... 21618.8. Danos causados a terceiros (no passageiros)......................................... 216

    19. Responsabilidade civil dos mdicos...................... .......................................... 21719.1. Hospitais: responsabilidade objetiva ou subjetiva?................................ 21819.2. Dualidade das obrigaes........................................................................ 220

    19.3. Cirurgias estticas.............

    ...................

    ..............

    .....................................221

    19.3.1. Obrigaes de meio ou resultado?.............................................. 22119.3.2. Superao da dicotomia.............................................................. 222

    19.4. Danos sofridos em hospitais pblicos ensejam a aplicao do CDC? ..... 22320. Perda da chance................................................................................................ 22621. Dano moral coletivo......................................................................................... 22722. Questes de Concursos.................................................................................... 23022. Sintico............................................................................................................ 234

    Captulo VEIPRESCRIO E DECADNCIA NO CDC.................................................. 2371. Decadncia (vcio do produto ou servio)........................................................ 237

    1.1. Vcio oculto............................................................................................ 2371.1.1. Produtos durveis....................................................................... 2381.1.2. Produtos no durveis................................................................ 238

    1.2. Incio da contagem do prazona hiptese de existir garantia contratual............................................ 238

    1.3. Vcio aparente........................................................................................ 2391.4. Causas que suspendem a decadncia........... ......... .................................. 239

    2. Prescrio (fato do produto ou servio).............. ............. ........................... 2402.1. Quando se inicia a contagem do prazo prescricional?.................... ......... 243

    3. Conflito entre o CDC e CC/2002: interpretao favorvel ao consumidor...... 2444. Questes de Concursos..................."............................................................... 2475. Sintico.................................................... ................................. .................. 251

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    Sumrio

    Captulo IXDESCONSIDERAO DA PERSONALIDADE JU RD ICA ..................... 2531. Desconsiderao da personalidade jurdica............. ......................................... 253

    2. CDC: primeira lei brasileira a prev-la........................................ .................... 253

    3. Desconsiderao da personalidade jurdica sempre que esta for,de alguma forma, obstculo ao ressarcimento dos consumidores..................... 2553.1. Teoria maior e teoria menor da desconsiderao................................... 255

    3.1.1. Teoria maior................................................................................ 2553.1.2. Teoria menor............................................................................... 255

    4. Crticas ao art. 28 do CDC............................................................................... 2565. Sociedades integrantes de grupos societrios, sociedades

    controladas, sociedades consorciadas e so-ciedades coligadas.......................... 2576. O juiz pode declarar a indisponibilidade

    dos bens na prpria sentena declaratria de falncia? ...................................... 2587. A aplicao da teoria significa encerramento

    das atividades da pessoa jurdica?.......... ............................................................ 2598. Aplicao da teoria da desconsiderao pela administrao pblica .............. 2599. A questo da sociedade irregular ou de fato.................................................. . 26010. H necessidade de propositura de ao autnoma?........................................... 26011. Desconsiderao inversa................................................................................... 261

    12. Questes de Concursos.............. ....... ................................................................ 262

    13. Sintico...................................................... ....................................................... 266

    Captulo XPRTICAS COMERCIAIS................................................................................ 2671. Pessoas, determinveis ou no, expostas s prticas comerciais....................... 2672. O efeito vinculante da oferta publicitria......................................................... 2703. O dever de prestar informaes corretas e precisas............................................. 272

    4. Oferta de peas de reposio...........................................................

    ................. 2745. Venda por telefone ou reembolso postal... ...................................................... 2756. Solidariedade do fornecedor pelos atos

    dos prepostos ou representantes autnomos...................................................... 2756.1. Teoria da aparncia................................................... ................................ 276

    7. Opes para o consumidor na hiptese dofornecedor recusar cumprimento oferta publicitria....................................... 278

    8. Questes de concursos...................................................................... ................ 2799. Sintico............................................................................................................ 279

    Captulo XIA PUBLICIDADE NAS RELAES DE CONSUM O................................. 2811. A publicidade na sociedade atual............................................... ....................... 281

    1.1. Direito de identificao da mensagem como sendo publicitria............... 2811.2. Dever do fornecedor de manter dados

    tcnicos que lastreiam as informaes publicitrias........................... ..... 282

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    FelipeP. BragaN etto

    2. Publicidade enganosa........................................... ....... .................................. . 2832.1. Publicidade enganosa por omisso......................................... ................. 2842.2. Publicidade enganosa resultante de erro de terceiro................................ 286

    3. Publicidade abusiva........................................................................................ 287

    4. A fora vinculante da publicidade para o fornecedor....................................... 2885. nus da prova na comunicao publicitria............................................ ....... 2886 . A contrapropaganda......................................................................................... 2897. Princpios peculiares publicidade nas relaes de consumo.......................... 2898. Questes de Concursos.................................................................................... 2919. Sintico............................................................................................................ 296

    Captulo XIIPRTICAS ABUSIVAS.................................................................................... 2971. Venda casada ou imposio de limites quantitativos pelo fornecedor............... 2972. Recusa de contratar pelo fornecedor................................................................ 2983. Produtos enviados sem solicitao prvia.............. ......................................... 299

    4. Aproveitamentos das vulnerabilidades especficas do consumidor.................. 3005. Exigncia de vantagens excessivas.................................................................. 3006. Execuo de servio sem oramento prvio ..................................................... 3007. Repasse de informaes depreciativas relativas a consumidor............. ............ 3018. Insero no mercado produto em desacordo com as normas tcnicas............... 3029. Recusa de venda de bens ou prestao de servios........................................... 30310. Elevao sem justa causa do preo de produtos ou servios............................ 30311. Ausncia de prazo para cumprimento de obrigao pelo fornecedor............... 30412. Aplicao de frmula ou ndice de reajuste

    diverso do legal ou contratualmente estabelecido............................................ 30513. Oramento: dever de entrega, vinculao e prazo de validade......................... 30614. Produtos ou servios sujeitos ao regime de controle de preos........................ 306

    15. Cobrana de dvidas........................................................................................ 307

    15.1. Proibio de constrangimentos ouexposio do consumidor ao ridculo.................................................... 307

    15.2. Direito do consumidor cobradoindevidamente ao dobro do que houver pago......................................... 30915.2.1. Pagamento fundado em clusula contratual

    posteriormente declarada nula enseja devoluo emdobro?......... 31115.2.2. preciso provar culpa do .

    fornecedor para incidncia do art. 42? ....................................... 31116. Questes de Concursos................................................................................... 31217. Sintico.......................................................................................................... 317

    Captulo XIIIBANCO DE DADOS E CADASTROS DE CONSUMIDORES.................. 3191. Acesso do consumidor s informaes a ele relativas............................ ........ 3192. Limite temporal de consignao das informaes negativas: 05 anos.............. 320

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    Sumrio

    3. Dever de comunicao por escrito ao consumidor............................................ 3213.1. De quem o dever de comunicao?....................................................... 3213.2. E suficiente a prova do envio da comunicao?....................................... 3223.3. A comunicao ao consumidor necessria em se tratando de

    reproduo de dados existentes em banco de domnio pblico?.............. 3233.4. De quem o dever de comunicar o pagamento da dvida?...................... 323

    4. Dvida discutida em juzo pode ser inscrita?..................................................... 3245. Dano moral decorrente de indevida inscrio em cadastro negativo................. 325

    5.1. Desnecessidade da prova de prejuzo concreto ....................................... 3265.2. H dano moral se j havia inscrio anterior?.......................................... 3275.3. Valores de indenizao.............................................................................. 327

    5.4. Controvrsia restrita apenas ao valor da dvida........................................ 3285.5. Prazo prescricional................................................................................... 3286 . Bancos de dados como entidades de carter pblico......................................... 3287. Prescrio dos dbitos e cadastros negativos..................................................... 329

    7.1. Prescrio da ao de cobrana, no do ttulo executivo.......................... 3298. Bancos de dados contra maus fornecedores................. .................................. 3309. Questes de Concursos..................................................................................... 33110. Sintico.............................................................................................. ............... 335

    Captulo XIVNEGCIOS JURDICOS - PRINCPIO S CLSSICOS E ATUAIS........ 3371. Trplice escolha da vontade............................................................................... 338

    1.1. Persiste a trplice escolha?......................................................................... 3382. Igualdade formal................................................................................................ 339

    2.1. Igualdade material ou substancial............................................................. 3393. Pacta sunt servanda......................................................................................... 340

    3.1. Boa-f objetiva......................................................................................... 340

    3.1.1. Funes da boa-f objetiva........................................................... 3404. Relatividade dos contratos................................................................................ 342

    4.1. Funo social do contrato......................................................................... 3425. Autonomia da vontade...................................................................................... 343

    5.1. Repdio ao abuso de direito...................................................................... 3436. Questes de Concursos................................................................ ..................... 3437. Sintico............................................................................................................. 345

    Captulo XV

    PROTEO CONTRATUAL................................................................. ........ 3471. O contrato de consumo: distncia do modelo clssico.......................................... 3472. A funo social dos contratos........................................................................... 3473. Necessidade de prvio conhecimento

    do contedo contratual pelo consumidor.......................................................... 3474. Necessidade de redao clara e inteligvel dos contratos de consumo.............. 348

    4.1. So vlidas as limitaes contratuais de direitos do consumidor?............ 349

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    F elipeP. B raga Netto

    5. Necessidade de inteipretao favorvel ao consumidor.................................. 3515.1. Como interpretar a expresso

    danos pessoais nos contratos de seguro............................................... 3526. Escritos particulares, recibos e pr-contratos................................................... 3537. Direito de desistncia imotivada sete dias aps a concluso do contrato......... 354

    7.1. Devoluo dos valores pagos pelo consumidor....................................... 3558. Garantia contratual............................................................................. ............ 355

    8.1. Como se conta 0prazo da garantia contratual? ..................................... . 3579. Questes de Concursos........................... .............. .......................................... 35810. Sintico............................................................................................... ............. 362

    Captulo XVICLUSULAS ABUSIVAS................................................................ ................ 3631. Sistema de nulidades do CDC................................................... ..................... 3632. Anlise das clusulas abusivas do CDC...................... ....................... ;........... 3653. Clusulas de abertura: a importante funo da jurisprudncia....... .................. 375

    3.1. Ofensa aos princpios fundamentais do sistema jurdico........... ............. 3753.2. Restrio de direitos fundamentais

    ou violao do equilbrio contratual........................................................ 376

    3.3. Clusula excessivamente onerosa para0consumidor: anlise das circunstncias peculiares ao caso.................. 3794. possvel separar a clusula abusiva do restante do contrato?....................... 3815. Controle abstrato das clusulas abusivas......................................................... 3826. Contratos que envolvam outorga de crdito

    ou financiamento: dever de informao...................................... ..................... 3826.1. Sujeio das instituies financeiras ao CDC.......................................... 383

    6.1.1. Capitalizao dos juros............................................................... 3846.1.2. Comisso de permanncia.......................................................... 3846.1.3. Juros superiores a 12% ao ano.................................................... 3856.1.4. Taxa referencial......................................................................... 3866.1.5. Comisso de concesso de crdito.............................................. 3866 .1.6. O banco responde por defeito de produto

    obtido a partir de financiamento bancrio? ........... ........... ......... 3866.1.7. Cobrana indevida pela emisso de boletos bancrios................ 3876.1.8. Informaes fornecidas pelas

    instituies financeiras ao Sisbacen............................................ 387

    6.1.9. As propostas do Plano Nacional Consumo e Cidadania.............. 3877. Multas de mora: limite nos contratos de consumo............................. ............. 389

    8. Pagamento antecipado da dvida: reduo dos juros e encargos..................... 3909. Nulidade das clusulas que estabeleam a perda total das prestaes pagas ... 39110. Restituio dos valores nos contratos de consrcio............................................... 39311. Obrigatoriedade de que os valores sejam expressos em moeda nacional......... 39412. Sanes administrativas............................ ................. ........ ......... ................ 395

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    Sumrio

    13. Questes de Concursos.......................... .......................................................... 39614. Sintico............................................................................................................. 402

    Captulo XVIICONTRATOS DE ADESO............................................................................. 4051. Conceito legal................................................................................................... 4052. Interpretao contra o estipulante..................................................................... 4053. Clusula de eleio de foro em contrato de adeso............................................. 4074. Clusulas que limitam direitos dos consumidores............................................ 4085. Questes de Concursos..................................................................................... 4096. Sintico............................................................................................................. 410

    Captulo XVIIIDA DEFESA DO CONSUMIDOR EM JUZ O ................................................ 4111. Interesses ou direitos difusos............................................................................ 4122. Interesses ou direitos coletivos........................................... 4123. Interesses ou direitos individuais homogneos............................... 413

    3.1. Legitimao do Ministrio Pblico........................................................... 4143.1.1. Interesse indisponvel.................................................................... 4153.1.2. Interesse social.............................................................................. 416

    3.2. O Ministrio Pblico como substituto processual..................................... 4184. Legitimao concorrente................................................................................... 418

    4.1. Os Procons podem propor aes coletivas em prol dos consumidores?.... 4204.2. Os Procons podem figurar no plo passivo das lid es?............................. 421

    5. Estmulo efetividade: admissibilidade de todas as espcies de aes............. 4235.1. As astreintespodem ser impostas contra a fazenda pblica?.................... 4265.2. possvel que haja bloqueio de valores em contaspblicas?................... 4275.3. As astreintespodem ser determinadas de ofcio?......... ........................... 427

    5.4. A obteno do resultado prtico equivalente............................................ 4286. Aes coletivas para a defesa de interesses individuais homogneos.............. 4326.1. Execuo da sentena: direitos individuais homogneos......................... 437

    6.1.1. possvel executar no domiclio da vtima? ............................... 4386.1.2. Legitimidade do Ministrio Pblico

    para execuo da sentena coletiva.............................................. 43S6.1.3. Prescrio para a execuo individual da sentena coletiva......... 43S

    7. Aes de responsabilidade do fornecedor de produtos e servios................. 4397.1. Inverso do nus da prova........................................................................ 439

    7.2. A inverso do nus da prova regrade procedimento ou regra de julgamento?............................................... 441

    8. Da coisa julgada.................................................... . 4468.1. Os efeitos da sentena - no caso de interesses individuais

    homogneos relacionados a relaes de consumo -limitam-se competncia territorial do rgo julgador? ......................... 452

    9. Questes de Concursos................................................. 454

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    10. Sintico... . . . . . : . . . . . . .

    u st s Diversas

    Bibl iog rafia v :

    460

    463

    .:.........;..... 479

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    O TELEFONE1

    Honrado Senhor Diretor da Companhia Telefnica:

    Quem vos escreve um desses desagradveis sujeitos chamados assinantes; edo tipo mais baixo: dos que atingiram essa qualidade depois de uma longa esperana fila.

    No venho, senhor, reclamar nenhum direito. Li o vosso Regulamento e sei

    que no tenho direito a coisa alguma, a no ser a pagar a conta. Esse Regulamento,impresso na pgina 1 de vossa interessante Lista (que meu livro de cabeceira), mesmo uma leitura que recomendo a todas as almas crists que tenham, entretanto,alguma propenso para o orgulho ou soberba. Eles nos ensina a ser humildes; elesnos mostra quanto ns, assinantes, somos desprezveis e fracos.

    Aconteceu por exemplo, senhor, que outro dia um velho amigo deu-me oprazer de me fazer uma visita. Tomamos uma modesta cervej a e falamos de coisasantigas - mulheres que brilharam outrora, madrugadas dantanho, flores doutrasprimaveras. Ia a conversa quente e cordial ainda que algo melanclica, tal soemser as parolas vadias de cumpinchas velhos - quando o telefone tocou. Atendi. Eraalgum que queria falar ao meu amigo. Um assinante mais leviano teria chamadoo amigo para falar. Sou, entretanto, um severo respeitador do Regulamento; emvista do que comuniquei ao meu amigo que algum lhe queria falar, o que infelizmente eu no podia permitir; estava, entretanto, disposto a tomar e transmitirqualquer recado. Irritou-se o amigo, mas fiquei inflexvel, mostrando-lhe o artigo

    2 do Regulamento, segundo o qual o aparelho instalado em minha casa s pode serusado pelo assinante, pessoas de sua famlia, seus representantes ou empregados.

    Devo dizer que perdi o amigo, mas salvei o Respeito ao Regulamento; duralex sed lex; eu sou assim. Sei tambm (artigo 4) que se minha casa pegar fogo terei de vos pagar o valor do aparelho - mesmo que esse incndio (artigo 9) formotivado por algum circuito organizado pelo empregado da Companhia com omaterial da Companhia. Sei finalmente (artigo 11) que se, exausto de telefonar do

    botequim da esquina a essa distinta Companhia para dizer que meu aparelho nofunciona, eu vos chamar e vos disser, com lealdade e com as nicas expressesadequadas, o meu pensamento, ficarei eternamente sem telefone, pois o uso delinguagem obscena constituir motivo suficiente para a Companhia desligar eretirar o aparelho.

    1. BRAGA , Rubem. 200 crn icas escolhidas. 22 ed. Rio de Janeiro: Record, 2004, p. 221/222.

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    F elipeP. Braga N etto

    Enfim, senhor, eu sei tudo; que no tenho direito a nada, que no valho nada,no sou nada. H dois dias meu telefone no fala, nem ouve, nem toca, nem tuge,

    nem muge. Isso me trouxe, certo, um certo sossego, ao lar. Porm amo, senhor,a voz humana; sou uma dessas criaturas tristes e sonhadoras que passa a vidaesperando que de repente a Rita Hayworth me telefone para dizer que o Ali Khanmorreu e ela est ansiosa para gastar com o velho Braga o dinheiro de sua herana,pois me acha muito simptico e insinuante, e confessa que em Paris muitas vezesse escondeu em uma loja defronte do meu hotel s para me ver entrar ou sair.

    Confesso que no acho tal coisa provvel: o Ali Khan ainda moo, e Rita

    no tem o meu nmero. Mas sempre doloroso pensar que se tal coisa acontecesse eu jamais saberia -porque meu aparelho no funciona. Pensai nisso, senhor:um telefone que d sempre sinal de ocupado - cum cum cum - quando naverdade est quedo e mudo na modesta sala de jantar. Falar nisso, vou comer; sohoras. Vou comer contemplando tristemente o aparelho silencioso, essa esfinge dematria plstica; na verdade algo que supera o rdio e a televiso, pois transmiteno sons nem imagens, mas sonhos errantes no ar.

    Mas batem aporta. Levando o escuro garfo do magro bife e abro. Cus, umempregado da Companhia! Estremeo de emoo. Mas ele me estende um papel: apenas o cobrador. Volto ao bife:, curvo a cabea, mastigo devagar, como seestivesse mastigando meus pensamentos* a longa tristeza de minha humilde vida,as decepes e remorsos. O telefone continuar mudo; no importa: ao menos certo, senhor, que no vos esquecestes de mim.

    Maro de 1951

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    N o t a a o i t a v a e b i o

    Sempre frisamos o carter dinmico do direito do consumidor. Quem se derpor satisfeito com o que aprendeu h alguns anos atrs rapidamente se ver desatualizado. As inovaes so muitas - algumas excelentes, outras nem tanto. Aconsagrao - finalmente - do dano moral coletivo pelo STJ, a possibilidade deinverso do nus da prova em aes coletivas, a incidncia do CDC em relao aoscartrios, a no incidncia em relao aos advogados, a definio da inverso donus da prova como regra de procedimento, a aplicao do Cdigo Civil em matria

    prescricional para beneficiar o consumidor (dilogo das fontes), a abrangncianacional da ao coletiva (inclusive para a execuo, segundo as decises maisrecentes), uma posio mais rigorosa do STJ em relao devoluo em dobrodo valor indevidamente cobrado, a definio dos contornos da teoria finalista etc.Temos a, em carter exemplificativo, entre muitos outros exemplos, algumas dasquestes que modificam o cenrio jurisprudencial brasileiro (em pouco tempo).Da a importncia de acompanhar, sistemtica e criticamente, as decises dostribunais superiores para traar um panorama da matria e saber onde estamos epara aonde estamos indo.

    Inserimos, nesta edio, muitas questes de concurso recentes, em praticamente todos os captulos. Tambm revisamos e ampliamos os quadros sinticos,para ajust-los s modificaes e acrscimos no texto. Mais uma vez agradecemossinceramente o leitor, que tem contribudo imensamente no aperfeioamento destelivro. Continuamos a contar com as crticas e sugestes.

    Felipe Peixoto Braga Netto

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    N o t a a s t i m a e d i o

    dinmica a interpretao do Cdigo de Defesa do Consumidor. Seus institutos - longe de nascerem prontos com a edio da lei, h mais de vinte anos- revelam-se em permanente processo de abertura e reformulao, renovando-secotidianamente no trato com a sociedade e com os tribunais.

    O CDC - aprovado por unanimidade nas duas casas do Congresso - talvezseja a mais importante lei da segunda metade do sculo XX, no direito privado

    brasileiro. Uma lei feita, por assim dizer, para o futuro, que dialoga com as geraes que chegam e que incorpora novos conhecimentos e novas solues paraproblemas inditos. Pondera, a propsito, Jos Roberto de Castro Neves: No hdvida de que a Lei do Consumidor foi um sucesso. Muitas vezes ela citada, comrazo, como exemplo de uma lei que deu certo, porque, de fato, educou e regulouum setor, antes muito carente, no qual grassava o desrespeito ao consumidor.

    Este livro, modestamente, tenta acompanhar essa evoluo, seguindo cada

    mudana jurisprudencial dos tribunais superiores - no STF e, particularmente,no STJ, entre cujas funes est a uniformizao da interpretao da lei federalno Brasil.

    A obra est, mais uma vez, atualizada, com todos os julgados relevantes pertinentes ao tema. H, tambm, nesta stima edio, as mais recentes questes deconcurso. gratificante perceber que muitas delas trazem discusses que propusemos aqui, desde a primeira edio. E mais uma vez agradecemos a generosidade

    com que o leitor tem acolhido este livro. Para nossa surpresa, as edies tm seesgotado cada vez mais rpido, o que nos obriga a ter, na atualizao, a mesmapreocupao de sempre: a de oferecer um livro til. Saudamos - com humildadee gratido - os leitores que tomaram possvel esse dilogo e esperamos, maisuma vez, crticas e sugestes. Elas tm sido verdadeiramente importantes noaprimoramento do livro.

    Felipe Peixoto Braga Netto

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    F k e f c i o a s t i m a e b i o

    Conheci Felipe Peixoto Braga Netto, no ano de 2010, quando se tomou o maisjovem Procurador Regional Eleitoral em Minas Gerais.

    Antes, ouvira meno ao seu nome como Jurista, autor de diversos livros, Procurador da Repblica, Professor de Teoria Geral do Direito, de Direito Civil e deDireito do Consumidor na Escola Superior Dom Helder Cmara e na PUC/Minas.

    O primeiro contato que tive com seus textos decorreu da leitura do livroAscoisas simpticas da vida, que dele recebi, com gentil dedicatria, contendo crnicas (ou seria poesia?) que falam de nossa condio e por isso mesmo acabamem nossas mos. Agora o convite para apresentar a Tedio do seuManual de

    Direito do Consumidor luz da Jurisprudncia do STJ.

    Da leitura do livro v-se que no h como separar o escritor do jurista, poisa linguagem do autor reveladora da sua capacidade de perceber o que ocorre

    no mundo do direito, nomeadamente na rea do Direito do Consumidor, e de sesensibilizar com os conflitos individuais e sociais na busca de solues justas aenvolver uma jurisprudncia construtiva e adequada realidade de nossos tempos.

    OManualdialoga com relevantes decises do colendo Superior Tribunal deJustia, guardio do direito federal e, especialmente, do Cdigo de Defesa doConsumidor, que, na concepo do autor, caracteriza-se como um microssistema

    jurdico porque reflete, de modo inovador, uma tendncia moderna de legislar

    tendo como foco problemas de consumo e no velhas categorias do direito pblicoe do direito privado.

    O consumidor, de categoria marginal at o incio dos anos 80, com o adventoda Constituio de 1988 passou a ser expresso de luta e uma categoria de cidadania prevista no art. 5o, inciso XXXII, da Carta de Outubro, ao estabelecer queo Estado promoveria, na forma da lei, a defesa do consumidor, e no art. 48 doAto das Disposies Constitucionais Transitrias, ao determinar que o Congresso

    Nacional elaboraria o Cdigo de Defesa do Consumidor no prazo de 120 dias dapromulgao da Constituio, o que resultou na edio da Lei n. 8.078, de 11 desetembro de 1990, tendo j ultrapassado vinte anos de vigncia.

    Nesse cenrio, o direito brasileiro passou a contribuir eficazmente para a criao de um novo sujeito social, de identidade prpria, o consumidor, cuja defesase acha associada a mudanas na estrutura social, luta contra o autoritarismo e

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    FelipeP. B raga N etto

    ao fortalecimento da sociedade civil e da cidadania. O contraponto, todavia, daconstruo de uma cidadania ativa na sociedade de consumo est no desejo do

    consumidor de adquirir produtos, o que faz com que o poder aquisitivo e a exibiode bens sejam valores de sociabilidade.

    De considerar que a expanso da cidadania no domnio do direito consumeristatem ainda, no contexto brasileiro, o importante papel de impedir a colonizaodo Estado pelo sistema empresarial.

    O mundo do consumo uniformiza a vida material os desejos, fazendo comque a sociedade de consumo seja fundamentalmente igualitria ao pretender a

    transformao de todas as pessoas em consumidores. Por outro lado, a legislaogarantidora dos direitos do consumidor tem como base a desigualdade das partescontratantes, pois muitas vezes o consumidor no tem como controlar o produtoque adquire nem as condies do prprio contrato, em geral de adeso, portanto,sem negociao prvia entre as partes, devendo-se notar, a este propsito, que aconcepo de consumidor est relacionada ideia de valuefor money,ou seja, ade receber um bem que corresponda ao valor pago. Apublicidade e a propagandaforam tambm valorizadas pelo consumo. So ainda significativas, no mbitoda defesa do consumidor, algumas instituies como o Ministrio Pblico, osProcons, os Juizados Especiais, os servios de atendimento telefnico gratuitoao consumidor e as organizaes no governamentais (ONGs).

    OManual de Direito do Consumidor,deFelipe Peixoto Braga Netto, que chegaTedio, expressa todos esses temas e vicissitudes, seja nas lies tericas nelecontidas, baseadas no sistema normativo brasileiro e no dilogo das fontes, sejana jurisprudncia e nas smulas do Superior Tribunal de Justia- acompanhadas,ao final de cada captulo, de um resumo que sintetiza a matria exposta e de questes de concursos pblicos j realizados. So 18 captulos que carregam a foracriativa do autor, membro do Ministrio Pblico Federal, ocupante, desde 2002,do cargo de Procurador da Repblica, portanto, plenamente comprometido coma defesa do Estado Democrtico de Direito, da ordem jurdica e com a expansoda cidadania em nosso Pas.

    Kildare Gonalves CarvalhoD esem bargador do Tribu nal de Justia do Esta do de Minas Gerais.

    Profe ssor de D ireito Const itucio nal d a F aculd ade de Direito Milton Campos.

    Presid ente do Tribu nal R egio n al E le ito ral d e M in as G erais (0 6/0 7/2 010 a 08/02/2011).

    Autor, en tre ou tros , de D ir eito Const itucional" (17aedio , 2011).

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    P r e f c i o s e g u n d a e d i o

    1. Suipreendo-me com a relatividade do tempo. Est ainda longe de fazer umano que o Autor me disse, enquanto almovamos em nossa Casa, a Procuradoriada Repblica, em Belo Horizonte, que iria escrever um manual, em suas palavrasdespretensioso, sobre Direito do Consumidor. Ainda mais surpreso, espanto-mecom o convite (e bem por causa dele!) para prefaciar a 2a edio de um livro que,escrito h pouco, e em pouqussimo tempo, j teve esgotada a primeira.

    2.0 subttulo da obra significativo, a induzir uma reflexo acerca do aspecto reciprocamente complementar da jurisprudncia e da doutrina juriscientfica;linguagens distintas que se nutrem, ambas, do fenmeno jurdico, ao mesmotempo em que passam a integr-lo e em que se aproveitam das contribuies deuma e de outra.1

    Jurisconsultos, sejam jurisprudentes oujuriscientistas, utilizam tcnicas diferentes, porque so diversos os objetivos que buscam. Essas tcnicas podem, em

    parte, ser-lhes coincidentes, como se d com dois conjuntos que se intersecionam.Ainda quando as tcnicas da doutrina juriscientfica de nada possam servir jurisprudncia, ambas utilizam substrato terico, mesmo que sob pontos-de-vistaapartados e visando consecuo das suas distintas finalidades.

    1 Acerca dessa distino entre jurisprudncia eju ris sc ient ia, indaga o Prof. Trcio Sampaio Ferraz Jr.,

    observando a realidade romana, Por queju ri sp ru dncia e noju ris sc ie ntial, para logo responder:Deixandodelado apalavrajurisprudnciaque, mesmo em Roma, tevemais de um significado, de se notar que a

    terminologia romana evitou, em geral, a expresso cincia.E verdade qu e ela aparece na clebre definio de

    Ulpiano (Digesto 1,1 ,10 ,2) que fala de jurisprudncia com o divinarum, atque hum anaram rerum notitia,justi atque injust i sc ien tia. O uso da expresso, porm, no no s deve confundir. A expresso Cincia do

    Direito relativamente recente, tendo sido um a inveno da E scola Histrica alem, no sculo passado

    [a referncia ao sculo XIX] Esta Escola, composta sobretudo de juristas professores, empenhou-se,

    como veremos, em dar investigao do Direito um carter cientfico. Entre os romanos, porm, essapreocupao, nestes termos, no existia. As teorizaes romanas estavam muito mais ligadas prxis jurdica .

    Assim, os qualificativos que aatividade do juris ta rf/ajurisprudncia recebia-ars , disciplina, sc ientiaou notitia - no devem ser tomados muito rigorosamente do ponto de vista de uma teoria da cincia. Os romanos nunca

    levaram muito a srio a questo de saber se sua atividade era um a cincia ou uma arte. [...] E ste modo deteorizar o direito, caracterstico do pensamento jurisprudnc ia! rom ano, se verdade que se desenvolveua partir de uma experincia prpria, ditada pelo trato com os conflitos e suas solues, nem por isso deixade representar uma forma peculiar de cinciajurdica. A palavra cinciavem a entre aspas, porque no empregada no sentido da cincia moderna, mas com o significado mais amplo d esaber,saber prtico, aoqual, porm, no falta certo sendo de rigor na prpria construo de uma terminologia jurdica. N isto forammestres os.romanos, produzindo definies duradouras e critrios distintivos para as diferentes situaesem que manifestavam os conflitos jurdicos de sua prxis. (Trcio Sampaio Ferraz Jnior, A cincia dodireito - 2 3 ed. - So Paulo: Atlas, 1980, pgs. 18/19).

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    FelipeP. B ragaN etto

    Ajuris scientia dada s abstraes, prprias d criao de categorias lgicas,que procuram conferir s manifestaes do pensamento a aparncia de maior

    cientificidade.A jurisprudncia, como est a indicar o termo, exerccio de prudncia, o

    que tem sido posto em relevo pelo juriscientista Eros Grau, agora ele tambmum jurisprudente. O atual Ministro do Supremo Tribunal Federal formulou umapergunta, a interpretao(que j aplicaodo direito) uma cinciaou uma

    prudnciaV1,para em seguida respond-la junto filosofia aristotlica:

    a interpretao umaprudncia - o saber prtico, aphrnesis,a que se refere

    Aristteles, natica a Nicmaco.O homem prudente, diz o estagirita, aqueleque capaz de deliberar corretamente sobre o que bom e conveniente para si

    prprio, mas no sob um aspecto part icular (como, po r exemplo, aquelas coisas

    que so boas pa ra a sade e o vigor), porm de um modo geral, (considerando)

    aquelas coisas que conduzem vida boa em gera l[...] O homem prudente aquele

    capaz de deliberao. Mas jam ais deliberamos sobre coisas que no podem ser de

    outro modo, nem sobre coisas que no dependem de ns[...] a prudncia no pode

    ser nem uma cincia nem uma arte[...] O objeto da cincia demonstrvel. A arte

    visa gerao(produo) e aplicar-se a uma arte considerar o modo de produzir

    alguma coisa que tanto pod e ser como no ser, cujo princpio de existncia est no

    artista e no na coisa produzida. A arte no se ocupa com as coisas que so ou quese geram po r necessidade, nem com os seres naturais, que encontram em si mesmos

    seu princpio [...] a prudn cia :uma disposio (capacidade), acompanhada de

    razo, capaz de agir na esfera do que bom ou mau pa ra um ser humano [...] ,

    pois, razo intuitiva,que no discerne o exato,porm o correto- no saberpuro,

    separado do ser. [...TO intrprete autntico, aoproduzirnormas jurdicas, pratica a

    ju ris prudentia,no umaju ris scientia .3

    Vinte anos antes, observara um jurista de primeira grandeza:

    Ora, esse d iscernimento c onstante do que justo, socialmen te bom e equi-

    tativo sup e um a ampla compreenso do h omem e do m undo, irredutvel

    s habilidades do leguleio. Os romanos denominaram tal discernimento

    pruden tia , como traduo dafrn esis grega, essa sabedoria no agir que,

    como explicouA ris t te le s,n o se confund e nem com a cincia natural, cujo

    objeto so fatos necess rios, ne m tam pouco com a tcnica ou arte de fazer,

    que se subordina a quaisquer fins (tica a Nicm aco,VI, 5). 4

    Ou, conforme anlise do Prof. Trcio Sampaio Ferraz Jr.:

    2 Eros Roberto Grau; O direito posto e o direito pressuposto - So Paulo: Malheiros, 1996,pg. 154.3 Eros Grau, op. cit., loc. cit.4 Fbio Konder Comparato; discurso proferido aos 20 de maio de 1976 - Revistada Faculdade de Direito

    - Universidade de So Paulo, volume LX51, 1976, pg. 326.

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    Prefciosegundaedio

    Se insistirmos, porm, em classificar o pensamento jurisprudencial dos romanosnos quadros de uma teoria da cincia, o melhor a fazer referir-se tradio aristotlica e ao critrio da racionalidade. Aristteles prope um conceito bastante

    estrito de cincia,tida como o conhecimento da coisa como ela (An. Post. I, 2,71b): vale dizer, o conhecimento da causa, da relao e da necessidade da coisa.Nestes termos, conhecimento cientfico conhecimento universal ou conhecimento da essncia. O instrumento deste conhecimento o silogism o dedutivo e indutivo,

    que nos permite, a partir de premissas seguras, a obteno de concluses vlidas e certas. De outro lado, fala-nos ele daprudncia,como conhecimento moral, capazde sopesar, diante da mutabilidade das coisas, o valor e a utilidade delas, bemcomo a correo e justeza do comportam ento humano. A prudncia dotada de

    uma racionalidade prpria, cujo instrumento bsico a dialtica, enquanto arte das

    contradies, do exerccio escolar da palavra, do confronto das opinies. Aqui se

    enquadra a jurisprudncia romana, cuja racionalidade dialtica a toma tipicamenteum saber prudencial (fronesis).5

    Ainda que afastada do cho, a doutrina juriscientfica nunca expressar umDireito verdadeiramente puro. Como o tomo, que um dia se imaginou homogneo,a forma de expresso dos doutos carrega em si mltiplos elementos. Da histriado Direito, acompanham-na os exemplos do tempo, a evoluo dos institutos e aclivagem resultante das intempries, das euforias e dos sofrimentos das geraes

    humanas. Dentro de suas categorias de aparncia rigorosa, lado-a-lado com oeficaz efeito pedaggico dessas mesmas categorias, h muito da poeira da realidade, e h matizes invisveis a olho nu, sutis e to tnues que as classificaesmais minuciosas no poderiam comport-los.

    Se prxima ao cho e da vida a que serve, a doutrina dialoga, de modo maisperceptvel, com os exemplos da jurisprudncia, a dizer o Direito diante do casoconcreto. O dilogo entrejuris scientiaejuris prudentia - nesse caso, em que a

    conversa se d junto realidade - faz-se mais fcil, como entre seres tecidos damesma matria.

    desse dilogo que se compe a presente obra.

    3. Ainda que a jurisprudncia corresponda, nessa linha, ao saber prtico, phrnesisaristotlica, para que constitua jurisprudncia bem pesada, ou sopesada,no pode deixar de atentar ao saber juriscientfico, no que a prtica mal fundamentada to insegura como o observou o Professor Paulo Luiz Netto Lbo no

    prefcio dissertao de mestrado do Autor:

    5 Trcio Sampaio Ferraz Jnior, A cincia do d ireito,op. cit., pg. 2 0 .0 destaque do texto transcrito nose encontra assim no original.

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    FelipeP. B raga Netto

    A prtica do direito sem fundamentao terica essencial conduz a argumentaese a decises inseguras e frgeis.6

    4. Prudnciase aproxima do conceito vulgar de sabedoria,mas sabedoriaalgo distinto do que se entende por conhecimento.

    Todos ns conhecemos umas tantas pessoas simples, dotadas de ineomumbom-senso, que lidam com as dvidas humanas com simplicidade tal que o seuacerto chega a surpreender; agem com sabedoria,ouprudentemente.

    No campo jurdico, a prudncia exercida para solucionar conflitos humanos,e por isso se reveste de maior gravidade, diante dessa vital matria que lhe serve,

    ao mesmo tempo, de norte e substrato. Ao menos para os fins da presente anlise,se poderia dizer que a jurisprudncia uma prudncia qualificada.

    Bem por isso, para fazer face a essa maior seriedade de que devem revestir--se tais deliberaes prudenciais, h um mecanismo estatal de coercitividade queconfere obrigatoriedade s decises judiciais; elas no se constituem, portanto,em meros conselhos de adoo facultativa, porque os seus destinatrios no someros consulentes, mas partes envolvidas. Trata-se, como se sabe, da substitui

    o da vontade das partes que apresentam uma pretenso em juzo, no que elastenham fracassado na resoluo da questo que as aflija. Em seu lugar, dever serobservada, diante dessa .incapacidade de autocomposio, a expresso do poderdo Estado.

    Vistas, portanto, essas caractersticas funcional (composio de conflitoshumanos) e estrutural (coercitividade da deciso) da jurisprudncia, as respostasque possa oferecer sociedade somente sero satisfatrias se apresentadas dentrode uma certa previsibilidade. Essa segurana jurdica possvel relaciona-se coma funo dogmtica de proposio de pontos de partida estveis.7Da porque a

    jurisprudncia deve dialogar com a juriscincia.

    6. Paulo Luiz Ne tto Lbo , prefcio ao livro Teoria dos Ilicito s Civis,de Felipe Peixoto Braga Netto (BeloHorizonte: Del Rey Editora, 2003)

    7. Ensina Trcio Sampaio Ferraz Jr., em sua Introduo ao estudo do direito: tcnica, deciso, dominao"( 5 a edio - So Paulo: Atlas, 2007), pg. 96: A elaborao do sistema resulta, pois, de diferenciaes

    e de ligaes. Os sistemas no so construdos pela cincia dogmtica por puro gosto especulativo (porexemplo, conforme um objetivo formal de concatenar logicamente proposies, como o faz um matemtico),mas tendo em vista a decidibilidade de conflitos em geral, isto , de conflitos concretos mas de formacompatvel com conflitos que extensamente possam surgir no trato social. Po r isso, os sistemas elaborados

    pela cincia dogmtica, embora mostrem uma coerncia, no so rigorosamente lgicos, no sentido dalgica formal, como o um sistema matemtico. O que aglutina as partes ou os elementos do sistema numtodo coerente no um princpio evidente, do qual tudo se deduz, um axioma ou conjunto de.axiomas, masum problema, um a dvida perm anente para a qual existe um dogma (a lei, a deciso judicial, o contrato)que, se no acaba com a dvida, ab menos fornece um ponto de partida para que ela seja decidida.

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    Prefcio segunda edio

    Assim, uma pessoa que no seja versada na cincia do Direito, ainda quetenha incomum habilidade prudencial, no estar apta a utilizar sua prudncia noqualificado processo decisrio judicial. Em outras palavras, no poder exercer

    jurisprudncia caso no tenha os necessrios conhecimentos juriscientficos.

    5.De outro lado, a interao entre doutrina e jurisprudncia tambm ocorreem sentido inverso, pois a doutrina juriscientfica no se cansa de colher liese exemplos da experincia jurisprudencial, sobre os quais pra a refletir. Essa uma segunda vertente de anlise do tema proposto.

    O intercmbio reciprocamente enriquecedor entre jurisprudncia e doutrina

    encontra-se presente em mltiplas passagens da obra do Autor. Assim, p. ex., notpico dedicado compreenso do conceito de destinatrio final, v-se claramenteque a jurisprudncia apresenta critrios importantes para distinguir quando se estdiante d um destinatrio final que tenha adquirido ou utilizado, nessa condio,produto ou servio, i. , quando se tem, nos termos do caputdo art. 2o da Lei n.8.078/90, um consumidor.

    Para exemplificar, no sistema do cdigo brasileiro de defesa do consumidor,

    a destinao definitiva do produto ou servio, a uma pessoa fsica ou jurdica, o limite at o qual o mero beneficiador de produtos adquiridos para ulterior comercializao excludo da proteo consumerista. A, a jurisprudncia oferecebalizas menos imprecisas, como o encerramento da cadeia produtiva pertinente,ou ainda a insero do produto ou servio dentre os objetivos empresariais, se deempresa se tratar.

    No precedente STJ, Resp. 41.056, Rei. Min. Nancy Andrigui, Segunda Seo,

    j. 23/06/04, DJ 20/09/04, citado pelo Autor, p. ex., considerou-se que empresa dedistribuio de medicamentos era destinatria final do servio de pagamento pormeio de carto de crdito, justamente porque o objetivo empresarial, de distribuiode medicamentos, no era essa atividade financeira.

    Em outro acrdo, da relatoria do Min. Carlos Alberto Menezes Direito (STJ,Resp. 208.793, 3 aT., j. 18/11/99, DJ 01/08/00), tambm indicado pelo Autor,

    julgou-se que produtor agrcola que compra adubo para preparo do plantio des

    tinatrio final, uma vez que, ao utiliz-lo, o agricultor pe fim cadeia produtivado fertilizante.

    6. Paralelamente a isso, a juriscincia pode estabelecer uma distinta relaode intercmbio com a prudncia (agora no qualificada como jurisprudncia),constituindo um terceiro enfoque possvel da temtica.

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    FelipeP. B ragaN etto

    Nessa terceira vereda d abordagem proposta, preciso deixar de lado a concepo do exerccio da prudncia voltado composio de conflitos humanos,retomando aphrnesisna concepo puramente aristotlica citada mais acima,

    para dizer que, se marcada por esse aspecto original, ajuriscincia (tambm ela!)pode guiar-se por um norte. E para enontr-lo que se exerce, nesse sentidoamplo (e talvez mais profundo), atividade prudencial, deliberando-se sobre quaisvalores devem orient-la.

    Dessa forma, o juriscientepode tomar-se, ele mesmo, um prudente, ainda queno um jurisprudente.

    Nas palavras do Prof. Fbio Konder Comparato:Tenho por auto-evidente que a fimo do jurista no se esgota no exmio manejo da

    tcnica normativa, a servio de quaisquer finalidades; mas que ela s se realiza, de um

    lado, pela crtica permanente dos valores predominantes da sociedade em que atua

    e, de outro, pelo trabalho de contnua adaptao da tcnica jurdica a esses valores.

    Nos primrdios da nossa cincia, a tarefa de pensar o Direito e compor interesses

    foi algo bem diverso de uma arte normativa desbussolada, axiologicamente cega,

    como a encontramos no presente. Sob o influxo da filosofia grega, os jurisconsultos

    romanos conceberamju s c ivileeju s gentiumcom o manifestaes da naturalis ratio,ou seja, de uma ordem imanente ao mundo e sociedade dos homens, e portanto

    superior ao arbtrio de govemames, legisladores e magistrados. A racionalidade

    jurdica, para osprudentes,no se desvinculava dos valores sociais, no se reduzia

    a uma lgica de conceitos.8

    Sob esse aspecto, o Autor orienta a presente obra de acordo com os elevadosvalores da proteo ao consumidor, no mbito do microssistema normativo dedicado s relaes de consumo. O valor justia que permeia suas disposies est

    ainda na expanso dos efeitos benficos com que esse microssistema influenciao modo de circulao de riquezas, a demonstrar que as relaes humanas no sepermitem circunscrever-se em compartimentos (como seria aquele onde, imagina-riamente, pudessem estar situadas as relaes de consumo), seno relacionam-sereciprocamente, influenciando, desde as suas partes mais distantes, aquelas quemostrem mais evidenciadas.

    7. Nessa ordem de coisas, est bem o presente livro, cincia que conversa com

    a jurisprudncia do caso concreto.Em uma das passagens da obra, ressalta o Autor ser ntida no CDG uma

    preocupao com a efetividade de suas normas, jogando para um segundo plano

    8 F. KL Comparato, discurso proferido aos 20 de ma io de 1976 - Revista da Faculdade d Direito -Universidade de So Paulo, volume LXXI, 1976, pg. 326.

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    Prefciosegundaedio

    discusses puramente formais. O livro versado tem tambm uma alma, que.procuro compreender, e que parece ser, nesse mesmo sentido, a da efetividade natransmisso do significado, dizer, da idia por detrs de um texto claro e direto.

    Ilumina-o o Autor, como em composio colorida e rica, com a incomparvel foradas metforas da vidapulsante que entremeia as relaes de consumo, capturadapela jurisprudncia no exato instante do conflito social.

    Da presente obra, escrita com mos de escritor (pois tambm do Autor osimptico livro As coisas simpticas da vida,9de crnicas de suas duas terras,a de nascimento, Macei, e a do corao, que Belo Horizonte), o leitor poderaproveitar, portanto, a rara combinao da exposio doutrinria segura que a

    constitui, com a apresentao da seleo jurisprudencial glosada e sistematizadapelo Autor.

    8. Por fim, preciso dizer que s posso atribuir o honroso convite para prefaciareste livro amizade que distingue a minha convivncia com o Autor.

    Edmundo Antonio Dias Netto Junior70

    9 As Coisas Simpticas da Vida.So Paulo: Landy Editora, 2005.10 Edmundo Antonio Dias Netto Jnior, bacharel em Direito pela USP, foi Prom otor de Justia (Montes

    Claros-MG), Procurador do Estado (MG), Promotor de Justia do MPDF e Juiz Federal, sendo, atualm ente,Procurador da Repblica em Belo Horizonte.

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    C a p t u l o I

    CONTEXTUAMZANB O CBC

    Sum rio * 1 . 0 CDC como um microssistema legislativo - 2. O que so normas de ordem pblica e interesse social? - 3. Autonomia e heteronomia - 4 .0 CDC como uma lei de funo social - 5 . 0 fundamento

    constitucional do CDC - 6. Questes de Concursos - 7. Sintico

    1. O CDC COMO UM MICROSSISTEMA LEGISLATIVO

    0 que um microssistema legislativo? 0 CDC poderia ser assim considerado? So perguntas prvias para cujas respostas se impem algumas brevesexplicaes.

    Por sculos, a disciplina jurdica foi monotemtica. 0 que isso significa? Quehavia um cdigo para o direito civil, outro para o direito penal, outro para o direitoprocessual civil, outro para o direito processual penal e assim sucessivamente.No havia, ou pelo menos no deveria haver, numa mesma lei, matrias de ramos

    jurdicos distintos.

    Os diplomais legais referidos continuam a existir, naturalmente. Porm, aolado deles existem, de modo cada vez mais numeroso, leis que no obedecema essa severa diviso temtica. Leis que incluem, em um nico diploma, vriasdisciplinas jurdicas - civil, penal, administrativo, processo civil, entre outras.So os chamados microssistemas legislativos.

    Cada vez mais a experincia jurdica contempornea utiliza tal tcnica. Almdo Cdigo de Defesa do Consumidor - o mais bvio exemplo, chamado neste livrode CDC, para efeitos de facilitao de leitura-, existem vrios outros: o Estatutoda Criana e do Adolescente, o Estatuto do Idoso, a Lei das Locaes, entre outros.

    As referidas leis trazem normas de variados ramos do direito. No se importam com a diviso do direito em mltiplos ramos. Preocupam-se, sim, coma efetividade. E para atingir tal fim conglobam, em um mesmo diploma legal,normas de cores variadas.

    A segunda questo esta: o CDC um microssistema jurdico? A resposta a afirmativa, porm algumas consideraes se impem. um microssistemaporque reflete, e de modo inovador, essa tendncia de legislar tendo em focoproblemas - consumo, idosos, crianas, etc - e no as velhas categorias do direitopblico e do direito privado.

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    F elipeP. B ragaNetto

    Porm, quando se fala em microssistema pode se dar a falsa idia de algoisolado, estanque, sem rienlium comunicao com o sistema jurdico integralmenteconsiderado. ssim no , nem poderia ser. Os microssistemas tm - como de

    resto qualquer outra norma - conexo direta com a Constituio da Repblica,sendo invlidos se porventura a contrariem em algum ponto. Existem, assim, nocomo categoria parte, mas integrados ao todo normativo cujo pice se encontranas normas da Constituio.

    2. O QUE SO NORMAS DE ORDEM PBLICA E INTERESSESOCIAL?

    O art. Io do CDC estabelece: O presente cdigo estabelece normas de proteo e defesa do consumidor, de ordem pblica e interesse social, nos termos dosarts. 5o, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituio Federal e art. 48 de suasDisposies Transitrias.

    O que so normas de ordem pblica e interesse social? Ou seja, pragmati-camente falando, o que isso quer dizer? A expresso significa que estamos diantede normas cogentes, isto , normas que no toleram renncia. Normas em relao

    s quais so invlidos eventuais contratos ou acordos que busquem afastar suaincidncia. De igual modo, o juiz est autorizado a conhecer das normas do CDCde ofcio, sem que seja necessrias provocao das partes (voltaremos ao temano Captulo XVI).

    Assim ocorre com o consumidor, assim ocorre com o trabalhador. A lei os temcomo hipossuficientes, como a parte mais fraca da relao, a parte que dependeda proteo legal. E tal proteo legal de pouco ou nada valeria se tais normas

    pudessem ser objeto de renncia. Bastaria que a parte economicamente maisforte, atravs de contratos de adeso (CDC, art. 54, adiante estudado), dispusesseunilateralmente prevendo condies que lhe so favorveis, esvaziando assim asgenerosas normas do CDC.

    No sentido do que dissemos, argumenta Jos Roberto de Castro Neves: Noprimeiro captulo desse livro, das disposies gerais, a lei oferece definies,inclusive da sua natureza. O art. Io informa que ela de ordem pblica e tem

    interesse social. Com isso, a lei quis informar que seus dispositivos tm caracterstica imperativa, ou seja, no admitem ser afastados pela disposio particular(Jos Roberto de Castro Neves, O Direito do Consumidor - de onde viemos epara onde vamos, in RTDC vol. 26, abr/jun, 2006, p. 198).

    O STJ recentemente frisou: As normas de proteo e defesa do consumidortm ndole de ordem pblica e interesse social. So, portanto, indisponveis e

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    CONTEXTUALIZANDO O CDC

    inafastveis, pois resguardam valores bsicos e fundamentais da ordem jurdicado Estado Social, da a impossibilidade de o consumidor delas abrir mo exante e no atacado (STJ, REsp 586.316, Rei. Min. Herman Benjamin, 2a T.,DJ 19/03/09).

    Vejamos um exemplo concreto. Digamos que um aluno de direito, estudante de universidade particular, sofre acidente no elevador da universidade. Dadecorrem graves danos fsicos. O prazo para ingresso, nesta hiptese, da aode indenizao de cinco anos, a teor do prescrito no art. 27 do CDC, adianteestudado (acidente de consumo ou fato do servio). Pergunta-se: se, no ato damatrcula - portanto anteriormente ao acidente - o aluno houvesse assinado um

    contrato cujo teor rezava que, havendo dano, o prazo de reparao seria de trsanos - tal como ocorrem nas relaes civis, de acordo com o art. 206, 3o, V, doCdigo Civil -, tal clusula poderia ser considerada vlida?

    A resposta negativa. Seja neste prosaico exemplo, seja em casos mais complexos, a renncia, antecipada ou no, a direitos e garantias insertas no CDC hde ser tida como no-escrita, sob pena de esvaziar todo o contedo normativo deto importante lei.

    Cabe lembrar, para encerrar este tpico, que norma de ordem pblica no sinnimo de norma de direito pblico. Normas de ordem pblica so normascogentes, normas indisponveis. Tanto podem estar no direito pblico como nodireito privado. O CDC traz normas de direito pblico (penais, por exemplo)e normas de direito privado. prudente, porm, frisar que essa distino entredireito pblico e privado puramente didtica. J h cerca de dez anos atrs escrevamos que a dicotomia direito pblico e privado, como modelo terico, estclaramente envelhecida.

    3. AUTONOMIA E HETERONOMIA

    Por muito tempo o direito privado, em especial o direito civil, foi sinnimode autonomia da vontade, ou autonomia privada (Privatautonomie; autonomiadelia volont).Por intermdio dela, os particulares auto-regulavam seus prprios

    interesses, mediante contratos escritos ou verbais. Saleilles, em 1889, preconizavao princpio do respeito absoluto liberdade das convenes. Naturalmente, talautonomia reflete a filosofia, poltica ou econmica, de determinado perodohistrico, no podendo ser dele dissociada. Kant ponderou que a injustia possvelquando determinamos regras para os outros, mas impossvel que haja injustiaquando estabelecemos regras para ns mesmos.

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    FelipeP. B ragaN etto

    Atualmente, contudo, utros so os termos do problema. Est havendo, nasociedade contempornea, um decrscimo da autonomia, buscando, justamente,proteger os mais fracos, os hipossuficientes. O Cdigo Civil bem reflete essatendncia, ao dispor: Art. 421. A liberdade de contratar ser exercida em razoe nos limites da funo social do contrato. Mais adiante, no art. 2.03 5, pargrafonico, sentencia: Nenhuma conveno prevalecer se contrariar preceitos de ordem pblica, tais como os estabelecidos por este Cdigo para assegurar a funosocial da propriedade e dos contratos.

    Reduz-se, assim, a autonomia da vontade para proteger a parte mais fraca.De pouco ou nada adiantaria estabelecer normas em favor da parte mais fraca

    se tais normais pudessem ser contratualmente afastadas. A funo social doscontratos, inserindo-se no contedo dos pactos, atenua valor do pacta sunt ser-vanda(princpio da fora obrigatria dos contratos, que reza que os contratosdevem ser cumpridos a qualquer custo). Pontes de Miranda, com a antevisoque o distinguia, j no comeo do sculo passado alertava: Diante da liberdadede contratar, praticamente traduzvel em liberdade, para os fortes, de impor suavontade aos fracos.

    A renovao do direito atual - nele compreendido, naturalmente, o direitodo consumidorsignifica uma nova compreenso da autonomia da vontade. Ocontedo dos contratos, atualmente, no corresponde apenas vontade das partes,presumvel ou real. Ele composto por padres mnimos de razoabilidade, queremetem boa-f objetiva, ao equilbrio material entre as prestaes e vedaoao abuso de direito.

    Entre tantos acrdos do STJ cuja citao seria possvel, fiquemos com apenas com a Smula que considera abusiva a clusula - em contratos relativos aplanos de sade - que restringe o tempo de internao (Smula 302): E abusivaa clusula contratual de plano de sade que limita no tempo a internao hospitalar do segurado. Recentemente se reafirmou a nulidade, de pleno direito, daclusula, inserida em contratos de plano ou de seguro-sade, que limite o tempode cobertura para a internao (STJ, AgRg no REsp 535.447, Rei. Min. FernandoGonalves, 42 T., DJ 01/03/10). No razovel que se restrinja o tratamento in

    dispensvel ao paciente, mesmo porque ele no tem controle sobre isso. Almdo mais, direitos fundamentais no podem ser mutilados contratualmente.

    No direito contratual contemporneo reconhece-se a existncia de contratosrelacionais, nos quais as clusulas estabelecidas no instrumento no esgotam agama de direitos e deveres das parts (STJ, REsp 1.073.595, Rei. Min. NancyAndrighi, Segunda Seo, j. 24/02/10). Por exemplo, abusiva, e ofende o

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    CONTEXTUALIZNDO O CDC

    princpio da boa-f objetiva, a extino unilateral do contrato de seguro, vigentepor muitos anos (STJ, AgRg no Ag 1.362.420, Rei. Min. Villas Bas Cueva, 3aT.,DJ 17/08/12). Da mesma forma, entende-se, por exemplo, que a reteno integraldo salrio de correntista - ainda que expressamente ajustada em contrato - como propsito de saldar dbito deste com a instituio bancria invlida e ensejaa compensao moral (STJ, AgRg no AREsp 159.654, Rei. Min. Sidnei Beneti, 3aT.,DJ 01/06/12; REsp 1.021.578).

    Registre-se que, por outro lado, paralelamente reduo da autonomia,verifica-se um aumento da heteronomia. Autonomia, etimologicamente falando,vem do grego nomos, que significa regra, aliado ao prefixo auto, relativo a

    si prprio. , portanto, o poder de dar regras para si mesmo., J heteronomia opoder de estabelecer regras para os outros. As leis so heternomas.

    Verifica-se, na sociedade atual, uma elevao da heteronomia, seja atravsdas leis de ordem pblica (heteronomia desejvel e necessria), seja atravs doque poderamos chamar de heteronomia privada, que se traduz no poder dosgrandes complexos econmicos de ditar o contedo dos contratos para os consumidores