directora: hÁlia costa santos esta

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esta JORNAL À espera das eleições O palácio do Pelourinho, na Golegã, onde foi instalada a Secretaria de Estado da Agricultura e Alimentação, “estará disponível enquanto o Go- verno quiser”. A garantia é dada pelo presidente da Câmara, José Veiga Maltez. Mas só o futuro Governo decidirá se este departamento conti- nuará perto dos agricultores. Também do novo Governo depende a introdução de portagens nas scut. O ainda ministro das Obras Públicas, António Mexia, explicou ao Esta Jornal que se a medida não for para a frente outros projectos serão “inevitavelmente adiados” JORNAL LABORATÓRIO DA ESCOLA SUPERIOR DE TECNOLOGIA DE ABRANTES - E.S.T.A. www.esta.ipt.pt DIRECTORA: HÁLIA COSTA SANTOS N.º 5 . ANO 3 . SEXTA-FEIRA, 28 DE JANEIRO DE 2005 O Jornal Laboratório ESTADES- PORTO nasceu no ano passado, na cadeira de Jornalismo Desportivo. Os alunos finalistas, deste ano, continu- aram o projecto, e quiseram marcar a diferença. Adelino Gomes ENTREVISTAS Pacheco Pereira Críticas ao Governo e à televisão O normal é tirar um curso e depois iniciar a vida fami- liar. Mas como não há regra sem excepção, na Escola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA) há quatro alunas que, para além dos estudos, são mães a tempo inteiro. No último ano nasceram dois be- bés, filhos de duas alunas. Outras duas estudantes, quando iniciaram o curso, já eram mães. As responsa- bilidades a dobrar são compensadas pelas alegrias da maternidade. Ou da paternidade, porque na ESTA também há pai. ESTUDAR E SER MÃE OS CABO- -ABRANTINOS O grande repórter fala sobre a sua carreira, sobre o jornalismo e apresen- ta o livro “As flores nascem na prisão”, sobre o primeiro ano da independên- dia de Timor. MAUS ACESSOS EM ABRANTES RETOMA ECONÓMICA? SUPLEMENTOS Scut e Secretaria de Estado da Agricultura na Golegã dependem dos resultados São já 20 os alunos oriundos de Cabo-Verde que, ao abrigo de protocolos, estão a estudar na ESTA. Para além de procurarem um futuro melhor, os jovens, que já são conhecidos como “cabo-abrantinos”, convivem entre si e integram-se no novo meio. A música e a comida cabo-verdiana são os dois principais elementos desta convivência. Para um futuro próximo está prevista a criação de um núcleo que desen- volva um intercâmbio cultural entre estudantes de Cabo-Verde e alunos portugueses. Para além das inclinações pró- prias da cidade, Abrantes apre- senta um conjunto de problemas para quem tem dificuldades de mo- bilidade. Os idosos e os deficientes são os mais afectados. Os edifícios públicos são de difícil acesso e, para além disso, surgem outros entraves diários, como os carros mal estacio- nados. Um sinal de alerta é lançado por quem todos os dias sente as di- ficuldades causadas por estas bar- reiras. A autarquia está atenta mas reconhece que este é “um problema difícil de resolver”. Paulo Ferreira acredita que “é possível falar de retoma”, embo- ra lenta. Este docente da ESTA, con- sidera que o problema português, em termos económicos, é um problema de fundo que não tem propriamente a ver com a instabilidade política. Mesmo assim, em Abrantes, há duas empresas que não são afectadas pela alegada crise. Entre a população, há quem sofra com o desemprego e quem consiga continuar a vida apenas introduzindo pequenas alte- rações na gestão diária do dinheiro que entra e que sai. p. 15 p. 16 p. 4 a 6 p. 12 p. 21 p. 20 p. 10 e 11 RICARDO TRIÃES Vistas do 4º é um Suplemento desenvolvido no âmbito da cadeira de Atelier II, coordenado por Carlos Pinto Coelho.

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Page 1: DIRECTORA: HÁLIA COSTA SANTOS esta

estaJ O R N A L

À espera das eleiçõesO palácio do Pelourinho, na Golegã, onde foi

instalada a Secretaria de Estado da Agricultura e Alimentação, “estará disponível enquanto o Go-verno quiser”. A garantia é dada pelo presidente

da Câmara, José Veiga Maltez. Mas só o futuro Governo decidirá se este departamento conti-nuará perto dos agricultores. Também do novo Governo depende a introdução de portagens

nas scut. O ainda ministro das Obras Públicas, António Mexia, explicou ao Esta Jornal que se a medida não for para a frente outros projectos serão “inevitavelmente adiados”

J O R N A L L A B O R AT Ó R I O DA E S C O L A S U P E R I O R D E T E C N O L O G I A D E A B R A N T E S - E . S . T. A .

www.esta.ipt.ptD I R E C T O R A : H Á L I A C O S TA S A N TO S

N.º 5 . A N O 3 . S E X TA - F E I R A, 28 D E J A N E I R O D E 2005

O Jornal Laboratório ESTADES-PORTO nasceu no ano passado, na cadeira de Jornalismo Desportivo. Os alunos finalistas, deste ano, continu-aram o projecto, e quiseram marcar a diferença.

Adelino Gomes

E N T R E V I S T A S

Pacheco Pereira Críticas ao Governo

e à televisão

O normal é tirar um curso e depois iniciar a vida fami-

liar. Mas como não há regra sem excepção, na Escola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA) há quatro alunas que, para além dos estudos, são mães a tempo inteiro. No último ano nasceram dois be-bés, filhos de duas alunas. Outras duas estudantes, quando iniciaram o curso, já eram mães. As responsa-bilidades a dobrar são compensadas pelas alegrias da maternidade. Ou da paternidade, porque na ESTA também há pai.

ESTUDARE SER MÃE

OS CABO--ABRANTINOS

O grande repórter fala sobre a sua carreira, sobre o jornalismo e apresen-ta o livro “As flores nascem na prisão”, sobre o primeiro ano da independên-dia de Timor.

MAUS ACESSOS EM ABRANTES

RETOMAECONÓMICA?

S U P L E M E N T O S

Scut e Secretaria de Estado da Agricultura na Golegã dependem dos resultados

São já 20 os alunos oriundos de Cabo-Verde que, ao abrigo

de protocolos, estão a estudar na ESTA. Para além de procurarem um futuro melhor, os jovens, que já são conhecidos como “cabo-abrantinos”, convivem entre si e integram-se no novo meio. A música e a comida cabo-verdiana são os dois principais elementos desta convivência. Para um futuro próximo está prevista a criação de um núcleo que desen-volva um intercâmbio cultural entre estudantes de Cabo-Verde e alunos portugueses.

Para além das inclinações pró-prias da cidade, Abrantes apre-

senta um conjunto de problemas para quem tem dificuldades de mo-bilidade. Os idosos e os deficientes são os mais afectados. Os edifícios públicos são de difícil acesso e, para além disso, surgem outros entraves diários, como os carros mal estacio-nados. Um sinal de alerta é lançado por quem todos os dias sente as di-ficuldades causadas por estas bar-reiras. A autarquia está atenta mas reconhece que este é “um problema difícil de resolver”.

Paulo Ferreira acredita que “é possível falar de retoma”, embo-

ra lenta. Este docente da ESTA, con-sidera que o problema português, em termos económicos, é um problema de fundo que não tem propriamente a ver com a instabilidade política. Mesmo assim, em Abrantes, há duas empresas que não são afectadas pela alegada crise. Entre a população, há quem sofra com o desemprego e quem consiga continuar a vida apenas introduzindo pequenas alte-rações na gestão diária do dinheiro que entra e que sai.

p. 15

p. 16

p. 4 a 6p. 12p. 21p. 20

p. 10 e 11RICARDO TRIÃES

Vistas do 4º é um Suplemento desenvolvido no âmbito da cadeira de Atelier II,

coordenado por Carlos Pinto Coelho.

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2 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005

Estes são os primeiros trabalhos jornalís-ticos “a sério” que os alunos deste 3º ano de Comunicação Social, da ESTA, fazem. A reportagem e a entrevista são os géneros cla-ramente preferidos. Aqui se tratam assuntos que, durante o último semestre, marcaram a vida social, económica e política do país. E o panorama dos media não podia passar despercebido, sobretudo num jornal feito por estudantes desta área, num momento de debates acesos sobre questões polémicas rela-cionadas com a comunicação social. O “caso” Marcelo teria que marcar presença nesta edição do ESTA Jornal. A melhor forma de o trazer à discussão, numa publicação como esta, é precisamente através de alguém que é conhecido por lançar polémica. Pacheco Pereira veio à ESTA e foi entrevistado por dois alunos. As palavras que deixa merecem

reflexão. Assim como merecem uma atenção especial as ideias de Adelino Gomes, uma figura incontornável no jornalismo portu-guês. A propósito do seu livro “As flores que nascem na prisão”, o repórter falou a uma aluna da sua experiência profissional. E deixa um conselho aos candidatos a jornalistas, que importa valorizar: “Enquanto forem estu-dantes não percam um dia sem aprenderem coisas, porque depois vão ter de aprender todos os dias”. Que aprendam sempre. Que perguntem muito. Que encarem a profissão com seriedade. Sobretudo numa altura em que as questões essenciais do jornalismo parecem um pouco esquecidas, por alguns. Que nunca sejam esquecidas, especialmente por quem agora começa. Seria como matar o filho desejado à nascença.

Hália Costa Santos

ESTATUTOEDITORIAL

• O ESTA é um jornal de Escola, de pen-dor assumidamente regional, mas que nem por isso abdica da dimensão de um órgão de grande informação ou da ambição de conquistar o público para além do meio universitário.

• O ESTA Jornal adopta como lema e nor-ma critérios de rigor, de absoluta inde-pendência e de pluralismo dos pontos de vista a que dá expressão.

• O ESTA Jornal aposta, por isso, numa informação plural e diversificada, procu-rando abordar os mais diversos campos de actividade numa atitude de criativi-dade e de abertura perante a sociedade e o Mundo.

• O ESTA Jornal considera como parte da sua missão contribuir para a forma-ção de uma opinião pública informada, emancipada e interveniente - condição fundamental da democracia e de uma sociedade aberta e tolerante.

• A democracia participativa e entendida para além da sua dimensão meramente institucional, o pluralismo, a abertura e a tolerância são os valores primaciais em que se alicerça a atitude do ESTA Jornal perante o Mundo.

• O ESTA Jornal considera-se responsável única e exclusivamente perante a ambi-ção e a exigência dos seus redactores, alunos do Curso de Comunicação Social da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes e perante o público a que se dirige.

O ESTA Jornal está por isso plenamente disponível e empenhado com os leitores, comprometendo-se a manter canais de co-municação abertos com quantos connosco queriam partilhar as suas ideias e inquie-tações.

ESTA JORNAL ERROU

Para além da reduzida qualidade de algumas ima-gens, no último número do Esta Jornal algumas das fotografias não saíram com os respectivos créditos e outras vieram com assinaturas trocadas. Uma outra troca, desta vez, de assinaturas, aconteceu na página 4: a entrevista a Maria Romana, a propósito dos pri-meiros licenciados da ESTA, foi, de facto, realizada por Carla Leitão, Conceição Pita e Eduardo Silva. Por outro lado, o artigo publicado na página 6, intitulado “Alunos brasileiros em Abrantes ficaram surpreen-didos pela Tuna da ESTA”, de Miguel Geraldes, saiu com uma entrada que não dizia respeito ao texto. Finalmente, no cabeçalho do jornal surge a indica-ção de que se trata do Ano I, quando, na realidade, já corria o Ano II do Esta Jornal. A todos os visados por estes erros, o nosso pedido de desculpas.

Que perguntem muito

EDITORIAL

JOSÉ RICARDO

FUNDADO A 13 DE JANEIRO DE 2003

PROPRIEDADE DA ESCOLA SUPERIOR

DE TECNOLOGIA DE ABRANTES

M O R A DA : RUA 17 DE AGOSTO DE 1808

2200-370 ABRANTES

T E L E F O N E : 241361169

FA X : 241361175

E - M A I L : [email protected]

D I R E C TO R A : HÁLIA COSTA SANTOS

R E DACÇ ÃO : ÁGUEDA VARELA, ANA CALDELAS, ANA COUTINHO, ANA LIA GOMES, ANA RICARDO, BRUNO RAMALHO,

CATARINA LOPES, CÁTIA PEREIRA, DANIELA COSTA, ÉLIO BATISTA, ELIZABETE SIMÕES, FÁTIMA ALMEIDA SANTOS,

FLORBELA ROCHA, HÉLDER ANTUNES, HERLANDER SANTOS, JOÃO PEDRO LOBATO, INÊS SANTOS, ISABEL DELGADO,

LAETITIA FERNANDES, L IL IANA COELHO, LILIANO PUCARINHO, LÚCIA BASTOS, MARISA SILVA, PATRÍCIA CALHAU,

PATRÍCIA DOMINGUES, RITA PIMENTEL, RUI CID, RUI RODRIGUES, SANDRA FERNANDES, SÓNIA PACHECO, SÓNIA

PEREIRA, SUSANA ABREU, TÂNIA COSTA, TIAGO GODINHO, VÂNIA TAVARES, VERA CATARINO E VERA CAR VALHO

CO L A B O R A D O R E S : ALEXANDRA REIS, HÉLDER PESTANA, JOSÉ ALVES JANA, JOSÉ RICARDO, JORGE MARTINS, PATRÍCIA

MARQUES, RAFAEL WERKEMA, RICARDO TRIÃES E SUSANA BERJANO

R E V I S ÃO D E T E X TO : MARIA ROMANA, RAQUEL BOTELHO E SANDRA BARATA

P R O J E C TO G R Á F I CO : JOÃO PEREIRA

I M P R E S S ÃO / G R Á F I C A : GRÁFICA ALMONDINA, TORRES NOVAS

T I R AG E M : 500 EXEMPLARES

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ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 3

Sinceramente, não sei se o país está melhor agora, com um Governo demissionário, do que com os quatro meses de governação da coligação Santana Lopes e Paulo Portas. Sinceramente, não sei. Mas, parece existir uma sensação de que o Presidente da República (PR) tomou a melhor decisão, pecando por ser tardia. E parece ser uma sensação generalizada de todos os portugueses.

Mas o que levou Jorge Sampaio a dissolver a Assembleia da República?

Embora, os dois partidos da coligação digam que o PR não apresentou nenhuma justificação convincente para essa mesma dissolução, o que é certo, é que foi este Governo, em primeiro lugar,

que deu razões a Jorge Sampaio, para a tomada de tal decisão. E, talvez, tudo tenha começado, no início, na própria tomada de posse do Governo liderado por Santana Lopes.

No dia da tomada de posse, Jorge Sampaio espe-rou mais duma hora, devido à confusão de Santana Lopes. Teresa Caeiro, que inicialmente estava pre-vista para a Secretaria de Estado da Defesa, passou para a de Artes e Espectáculos, e o próprio Paulo Portas se viu também transformado em Ministro dos Assuntos do Mar. E depois veio o “caso Marce-lo”. Talvez, o primeiro grande caso deste Governo de Santana Lopes. Pelo menos, o mais mediático. Depois, as declarações do Morais Sarmento sobre a liberdade de informação na RTP, que acima de tudo foram infelizes e que punham em causa a

relação entre o poder político e a independência dos media, neste caso, a própria estação pública de televisão. Foi a segunda trapalhada.

Veio o incêndio na Galp, em Leixões, e a troca de acusações por parte de dois ministros, Nobre Guedes, ministro do Ambiente, e Álvaro Barreto, ministro da Economia.

Seguiu-se o Orçamento de Estado. E, também este, foi duramente criticado por todos os sectores económicos da sociedade portuguesa. Não esque-cendo as constantes trocas de afirmações entre Bagão Félix e o próprio chefe do Executivo. Ora era o ministro das Finanças a desmentir Santana Lopes, ora era Santana a desmentir Bagão Félix.

Por fim, a demissão de Henrique Chaves, que numa carta demasiado feia, onde acusa Santana

Lopes de traição, revelou que não é mais possível saber onde começa a verdade e terminam as mentiras, os enganos e as omissões nas mensagens que Santana vai transmitindo ao ritmo crescente de um furacão.

Possivelmente, a maioria não contava com a “bomba atómica” vinda de Belém, ou seja, a dissolução da Assembleia. Mas os sinais estavam lá. Foram as confusões na coligação, as trocas de cadeiras, as críticas dos empresários, e, para finalizar, a crescente onda de indignação a este governo, foi o grito de Cavaco Silva, num artigo publicado no Expresso.

O “copo de água” do PR encheu de vez e, por ironia, foi o próprio Santana Lopes que anunciou ao país, a intenção de Jorge Sampaio de dissolver o Parlamento e marcar novas eleições.

Ao fim de quatro meses, a coligação caiu e os portugueses parece que até ficaram satisfeitos.

Estava escrito nas estrelas.

Alguém consegue explicar por que está este país literalmente de pernas às avessas?

Será que já ninguém aprende com os erros do passado e vê que o silenciar de uma voz, que alguns afirmam ser do povo, ou violentar estudantes, quando estes manifestam a sua indignação, não leva este país a bom porto e só fomenta a revolta popular?

Mas não nos ficamos por aí, porque 2004, o ano agora tran-sacto, foi um fartote de actos idiotas e de indignações. Um ano marcado, sem dúvida, do princípio ao fim, pela pedofilia, nos Açores e na Casa Pia, acabando nas auditorias à Casa do Gaiato, mas também por várias desmantelamentos de redes e abertura de mega processos judiciários na política, no futebol (apito dourado) e até, na educação.

Mas que país de caos é este, onde ninguém se entende, onde só há contra-sensos, e até os professores já viram assessores de justiça?

Mas alguém com o mínimo de tino compreende como é que se consegue evolução quando só há confusão? E quando nem os governantes se entendem e se desculpam com falhas informáticas?

Está na hora de acordar e deixarmos de brincar com a vida dos outros!

Foi um ano em que o país parou, por várias vezes, por causa de um jogo de futebol, por causa de mais um novidade no mega processo Casa Pia, por causa de um crime hediondo como o da pequena Joana, por causa das avozinhas traficantes ou, até, para ver o que andava a fazer o Sr. José Manuel Barroso lá em Bruxelas. Mas ninguém se apercebeu que isto não mexe a turbina que faz mover o país.

Para onde foi o espírito de união, força, fé e convicção? Dissi-pou-se com o adeus ao Euro 2004 e o fim da alegria contagiante do Rock‘n Rio?

Meus senhores, vamos é colocar a mão na consciência, re-flectir sobre o que não fizemos durante estes últimos 365 dias e tentar mudar o rumo destes 365 que agora surgem. Porque se as coisas continuam neste rumo de mediatismo sarcástico, de fait-divers, de contra-sensos e silêncios forçados, então os esforços dos soldados de Abril foram em vão, e já não há pátria pela qual lutar, lutar!

E por falar em lutas, não nos podíamos esquecer do Women in Waves, proibido de entrar em Portugal, um episódio que fomentou polémicas e debates e que demonstrou que o povo lusitano ao pé do mar plantado já nada manda.

OPINIÃO

| Sandra Fernandes |

País do Caos

Muita polémica se ouviu no início do ano escolar do Ensino Superior, e tudo porquê? Uma vez mais, pelos valores exorbitan-tes das propinas, estipulados em cada escola. Contudo, parece que se vai tornando um hábito, pois no início de cada ano escolar é sempre a mesma coisa: greves, manifestações, concentrações de alunos, e este ano ainda tivemos uma novidade: um aluno detido! Mas, não vale de nada aos estudantes, pois o valor das propinas não desce, muito pelo contrário tem sempre tendência a aumentar!

Mas o grande problema é que as propinas, assim como tudo o resto, aumentam, enquanto que os salários se mantêm!

O poder de compra dos portugueses está cada vez mais pelas ruas da amargura, senão vejamos: dois anos de congelamento dos salários da função pública, em contraposição com os aumentos significativos dos preços dos combustíveis, energia, transportes, alimentação, habitação, vestuário, medicina... Para agravar, ainda mais, a situação, o desemprego não pára de aumentar em Portugal. Ao todo existem 467.809 pessoas inscritas no centro de emprego.

Agora, imaginemos uma família em que os dois progenitores trabalham na mesma empresa, e esta abre falência. Ambos vão para o desemprego, ficando a receber um valor, que, neste caso, não é nada mais nada menos que 356.60 euros. Agora ques-tiono-me: para que é que dá, este montan-te, numa família que tenha encargos com a casa (que infelizmente não são tão poucos quanto isso), filhos e todos os encargos inerentes a um agregado familiar? Será que conseguem ter um filho a estudar no ensino superior? Claro que não!!!

A verdade é que o valor médio das bol-sas, no último ano, aumentou 20 euros, enquanto que o valor das propinas levou um acréscimo que se aproximou dos 500 euros!!! Será que não está desproporcio-nal??!!

Pois é, mas, infelizmente, de entre os países europeus, que têm propinas para a frequência do ensino superior, Portugal é o que apresenta os salários mínimos e médios mais baixos, sendo, no entanto, o quarto a escala, no que respeita ao valor elevado das propinas!

Convém ainda referir que países como a Dinamarca, França, Luxemburgo, Finlândia, Grécia, Irlanda e Suécia, em que o nível de vida e poder de compra é muito superior ao de Portugal, não têm propinas!!!! Desta forma, não admira que a taxa de licenciados no nosso país se resuma a 9,8%, bem longe da média europeia de 21,2%, e a milhas dos países como a Finlândia e a Bélgica que possuem taxas de 32,4% e 27,1%, respectivamente, de licenciados.

Penso que o Estado deveria dedicar um pouco mais de aten-ção à educação, sobretudo ao ensino superior, visto que, como vimos, o valor das propinas, e não só, está desproporcional aos salários médios nacionais e, infelizmente, existem muitas pessoas com dificuldades no nosso País.

Desta forma, o Governo vai acabar por pôr em risco a for-mação superior dos portugueses….

O valor das propinase os salários nacionais

Este é o mote de uma campanha antidrogas, que foi lançada em 17 bairros de Londres, com a duração prevista de três semanas. Esta campanha mostra de forma impressionante imagens da degradação física de três mulheres que dependem da heroína e do crack.

Não há dúvida que são imagens chocantes que bem mostram os efeitos destruidores da droga. Contudo, os especialistas e a polícia não acreditam que esta campanha seja eficaz, mas a divisão de antinarcóticos, da Scotland Yard, acredita pelo menos conseguir com que a população denuncie anonimamente a presença de traficantes nas proximidades dos bairros. Porém, será que conseguem isso?

Lembro-me, assim de repente, de pelo menos três rapazes que já traficaram droga. Um deles cumpriu pena, outro teve a consciência de que não estava a agir bem, e deixou-se disso, o ter-ceiro esteve preso preventivamente por outros crimes, livrou-se de ser condenado e agora, não sei se não continuou no tráfico.

É verdade que é condenável o facto de os traficantes se aproveitarem da fraqueza das pessoas para ganharem dinheiro. Ganham dinheiro a destruir a vida das pessoas e das res-pectivas famílias, mas será que eu ou qualquer pessoa que os conheça, os denunciaria? Quem são esses traficantes?

São apenas rapazes de vinte e tal anos que têm casas para sustentar, que não conseguem arranjar um trabalho digno e, por isso, seguem vias duvi-dosas para arranjar muito dinheiro e depressa para

pagarem as dívidas, ou para, simplesmente, terem o mesmo que os outros. São rapazes que vivem nos bairros onde, eles próprios, traficam e ajudam a destruir. São rapazes que convivem e jogam à bola com os que lhe compram a droga. Na realidade, é tudo entre amigos. É que nem todos os traficantes são os mauzões que vemos nos filmes. Se eu tivesse a certeza que alguma dessas pessoas continuava a traficar será que eu os denunciaria por ver estas imagens? Certamente que não. Porquê? Porque os conheço, porque não passam de rapazes que não sabem o que querem da vida, porque são da minha idade e cinco anos na prisão, na minha idade, é muito tempo, porque um deles até tem uma filha para criar. E, mesmo se não os conhecesse, será que os denunciaria? Será que me preocuparia? Talvez só se me atingisse directamente. Será que não sentiria receio? Falam eles em anonimato? Num bairro

sabe-se sempre quem é que denunciou quem. Esta questão de droga é delicada demais para se

resolver com imagens chocantes, que fazem efeito na altura, mas que, depois, se esquecem. Mesmo para aqueles que ainda não entraram no mundo da droga não serão estas imagens que impedirão de o fazer, pois já se sabe quais são efeitos da droga e as pessoas continuam a entrar nesse mundo. Não se pode olhar para este problema procuran-do saber quem são as vítimas, e os maus da fita, porque acaba tudo por se misturar. O problema da droga nunca acabará se não se identificar as razões que levam uma pessoa consumir droga e a vender. E, claro que são razões relacionadas com as condições de vida e problemas do dia-a-dia. Não se trata de apanhar o lobo mau para salvar o capuchinho, mas de um problema social que tem de ser resolvido na sua base.

“Não deixe que traficantes mudem a cara do seu bairro”

Estava escrito nas estrelas

| Florbela Rocha |

| Bruno Ramalho |

| Vera Carvalho |

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4 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005T

EM

A

CRISE ECONÓMICA“É possível falar de retoma”

Tendo em conta a existência de eleições antecipadas, qual seria o melhor caminho: aprovar o Or-çamento de Estado ou viver em duodécimos durante três meses?

Penso que o melhor era vivermos em duodécimos. Este é um Gover-no com uma morte anunciada, e o Orçamento de Estado é para qual-quer Governo o documento mais importante onde estão reflectidas as políticas desse executivo. Se há um Governo que cai e há uma críti-ca do Presidente da República à sua política e à forma como este gere o país, não faz sentido que depois de cair continue um fantasma desse Go-verno a pairar sobre Portugal. Era mais transparente e mais coerente, em termos da decisão do Presiden-te, o país ir para duodécimos e viver assim durante três ou quatro meses. Não é drama nenhum. Acontece de vez em quando. Por exemplo, quando o engenheiro Guterres se demitiu, aconteceu o mesmo.

Esta crise mais que política, é uma crise económica. Quais as consequências económicas mais visíveis de um país em sinal inter-mitente?

Há, sobretudo, adiamento de deci-sões. Eu acredito que esta crise política não vai agravar muito a crise econó-mica, ou não vai afectar demasiado a retoma da economia. Estamos num processo de retoma, retoma lenta, mas há de facto alguma travagem de decisões, da parte dos empresários, das famílias, dos consumidores. As pessoas adiam decisões. Não fazem hoje aquilo que estavam a pensar fazer, esperam para ver como evolui a situ-ação. Depois, há uma área, que tem a ver com o Governo, que obviamente pára. Por exemplo, as obras públicas, os projectos que dependem do Esta-do e também uma série de medidas que estavam a ser tomadas: a lei de arrendamento, a possível introdução de portagens nas SCUT’s. O problema português em termos económicos é um problema mais de fundo, de longo prazo, e não tem a ver, propriamen-te, com esta crise económica ou com esta instabilidade política. Portanto, mesmo que tivéssemos o Governo a cumprir mandato até ao fim, sem crise política, estaríamos sempre metidos numa grande “embrulhada” econó-mica. É assim que estamos.

É possível concluir que esta crise não vem comprometer o optimismo económico, anteriormente profe-tizado por alguns políticos que fa-lavam de uma eventual retoma da economia?

Sim, é possível falar de uma re-toma. O ano mau, o ano negro, foi

Paulo Ferreira, docente da ESTA e director-adjunto do Jornal de Negócios, defende que o Governo demissionário não dava garantias de “uma estabilidade em termos de horizontes” porque a sua política económica e orçamental “deitou para o caixote

do lixo muito da anterior”. Numa análise à situação do país, João Paulo Ferreira acredita que a actual crise política “não vai agravar muito a crise económica” nem vai afectar demasiado a retoma da economia. Em entrevista ao ESTA Jornal, diz que é

possível falar de uma recuperação, mas que ainda não é suficiente.

Ana Lia Gomese Marisa Silva

| ENTREVISTA | PAULO FERREIRA, DOCENTE DA ESTA E DIRECTOR-ADJUNTO DO JORNAL DE NEGÓCIOS

MARISA SILVA

Paulo Ferreira. “O problema português em termos económicos é um problema mais de fundo”

o de 2003. Foi um ano terrível em termos económicos para Portugal. A economia caiu 1,2 %, o que quer dizer que em 2003 o país, como um todo, produziu menos 1,3% do que tinha produzido em 2002. Este ano já se prevê que o país produza cerca de 1% mais do que o ano passado, portanto, já se iniciou uma retoma. As coisas estão menos más hoje do que estavam o ano passado. O pro-blema é que Portugal deveria cres-cer 5, 6 e 7%. É um país que tem de se aproximar da média europeia, e só se aproxima se crescer acima des-sa média. Eles estão a correr mais

rápido do que nós, nós estamos a ficar para trás. O grande proble-ma de Portugal mesmo havendo retoma, porque há, é que essa reto-ma é fraca. Parece que já está tudo muito satisfeito e que passaram os problemas. Não passaram. O país continua com problemas estruturais de crescimento.

Este momento político é, de al-guma forma, um mal necessário?

É um mal necessário. O conceito de estabilidade é um conceito com-plicado. Havendo um Governo há estabilidade? Não necessariamente. Este Governo já não dava garantias

de estabilidade. Por uma série de acontecimentos que têm a ver, so-bretudo, com o próprio Governo e com a própria área de governação em termos partidários, na área do PSD e do PP. Não havia uma esta-bilidade em termos de horizontes porque a política económica e orça-mental deste Governo deitou para o caixote do lixo muito da anterior. Logo aí houve uma “alfinetada” na estabilidade. Aquilo que para a po-lítica de Manuela Ferreira Leite era estabilidade orçamental, consolida-ção orçamental, melhorar as contas públicas, para este Governo passou para terceira ou quarta prioridade. Trouxe uma tentativa de baixar os impostos que é muito simpático para as pessoas. Mas o país não está em condições de suportar isso, não tem dinheiro. Abandonou-se o modelo de crescimento que era muito baseado no aumento das exportações para aumentar a competitividade das empresas. Não existiam condições de estabilidade, pois dentro do mesmo Governo podem tomar-se decisões contra-ditórias, como se tomou. Havia declarações confusas e distintas entre o ministro das Finanças e o primeiro-ministro, ou seja, não havia condições de estabilidade.Penso que a decisão do Presidente da República é acertada.

Quem lucra com eleições anteci-padas e quem está melhor colocado para tirar partido delas?

Eu acho que as sondagens dão a resposta (risos). Quem lucra é o partido que está na oposição, que é o Partido Socialista. Quando há asneira de um Governo quem ga-nha é sempre a alternativa. Há uma velha máxima em política que diz que não é a oposição que ganha eleições, são os governos que as perdem. Acho que este é um caso clássico deste tipo. Portanto, se há aqui “um vencedor” antecipado, tanto quanto se pode prever, é o PS, certamente. Não sei é se o país em termos de médio e longo prazo ganhará. Isso depende da forma como o vencedor, seja ele qual for, venha a fazer a sua campanha eleitoral e o seu programa de Go-verno. Entrar já numa deriva, mais uma vez, de populismo, de tentar prometer às pessoas aquilo que o país não pode dar, isso é péssimo para Portugal. A ideia de que ‘o pior da crise já passou, agora va-mos todos alargar o cinto, já não há austeridade, agora já podemos voltar a gastar’ é uma ideia errada. Os problemas do país continuam por resolver. Se as eleições forem ganhas com base num programa eleitoralista, o país a médio e lon-go prazo fica a perder. Disso não tenho a mínima dúvida.

“Mesmo com o Governo a cumprir mandato até ao fim,

sem crise política, estaríamos sempre

metidos numa gran-de “embrulhada”

económica”

Page 5: DIRECTORA: HÁLIA COSTA SANTOS esta

ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 5

A vida para além da crise

Foi num ambiente de alguma contenção que Nuno Carola, actualmente a frequentar o curso de Comunicação Social, em Abrantes, afirmou que o seu tempo livre se resume à difícil ta-refa de procurar uma ocupação profissional. “O tempo livre que agora tenho é passado a ler os classificados dos jornais à pro-cura de um novo emprego”.

Natural de Alvega, Nuno Ca-rola tem 24 anos e trabalhava há três como auxiliar de apoio de vigilância num hospital. Agora é um dos muitos casos de desem-prego em Portugal. A viver em casa dos pais, demonstra alguma ansiedade em rapidamente vol-tar ao mundo do trabalho.

Conciliar o estudo com o emprego nunca tinha sido um problema para Nuno Carola. Até ao momento da renovação de contrato, que acabou por não se verificar. A explicação reside num alegado “absentismo”. De forma incrédula explica: “Tinha seis horas por semana para ir às aulas, como diz a lei, e eu au-sentava-me uma ou duas horas por dia do serviço precisamente para ir às aulas. No entanto, en-

tenderam que eram faltas e não renovaram o contrato”.

Face à actual situação, é ne-cessário pensar no futuro e “a poupança tem que estar cada vez mais presente”, sublinha. A dife-rença entre o subsídio de desem-prego e o ordenado que recebia quando estava empregado não é significativa. Mas as diferenças no dia-a-dia existem. Ainda que não fossem regulares, as despe-sas da casa eram repartidas por igual entre ele e os pais. Agora a disponibilidade financeira já não é a mesma e a vida passa a ser encarada de maneira diferente. Evitar pequenos vícios diários passa a estar na ordem do dia e a ser uma consequência directa de um espírito de sacrifício. “Vendo o panorama nacional político e económico só posso dizer: pa-lavras para quê se o Governo é português” – desabafa Nuno Carola em tom irónico.

Críticas ao GovernoA economia do país encon-

tra-se em acentuado decrésci-mo, as dificuldades financeiras sentem-se um pouco por todo o país e o que é certo é que re-toma económica parece ser só em teoria. Pelo menos esta é a convicção de um outro cidadão português, desempregado, de

32 anos de idade, que opta pe-lo anonimato. Indirectamente, critica o Governo português por uma atitude passiva: “Eles falam, falam, mas nós que es-tamos a viver a situação nada vemos”. Trabalhava como pin-tor de automóveis numa firma em Maiorca, terra onde vive com a esposa e filho. Quando a firma mudou de instalações para Lisboa, decidiu terminar o contrato e, consequentemente, mandar para o desemprego o pai de uma criança com três anos de idade.

Apesar da sua actual situa-ção, a preocupação no imediato parece ainda não ensombrar es-ta família que vive actualmente do subsídio de desemprego e de um extra da “senhora da casa”, que é costureira e que vai tendo algum trabalho. “Por enquanto ainda não tivemos dificulda-des, pois ainda só passaram dois meses. Com o subsídio de desemprego, até agora, ainda nos estamos a aguentar”. Mas se o presente ainda não é uma preocupação, o futuro assus-ta e é encarado com alguma apreensão. “Ainda não tentei encontrar outro emprego, mas não vai ser fácil, é muita gente na mesma situação”.

C R I S E E C O N Ó M I C A

Portugal é um dos países da União Europeia com maior taxa de desemprego. Um panorama que acaba por se traduzir num cenário de crise que afecta muitas famílias portuguesas. Contratos que não são renovados. Empresas que mudam de localidade e que arrastam pessoas para o desemprego. Estas são apenas duas situações que ilustram vidas com dificuldades.

Maria das Necessidades Faria Lopes e José Nunes Bal-tasar estão casados há cerca de 10 anos e residem numa simpática moradia na Vila Nova da Barquinha, com os seus dois filhos, Catarina e José. Iguais a tantos outros casais, Maria e José apenas desejam ver a sua família flo-rescer. Poderão os conturba-dos tempos actuais ameaçar o seu sucesso?

Ainda é de manhã e o sol só muito timidamente se faz notar no horizonte. São apenas 7h30 e o ritual diário começou para Maria Lopes, de 36 anos. Rapidamente se levanta, ao som do estridente alarme despertador, arranja--se, come e um pouco mais tarde vai acordar o filho, José Pedro, de sete anos, e a sua irmã, Catarina de três anos. Veste-os, prepara-lhes o pe-queno-almoço e arrancam de carro até ao jardim-escola João de Deus, localizado no Entroncamento, onde têm de estar o mais tardar até às 9h30.

Maria Lopes segue para o seu local de trabalho habitual no Registo Civil de Torres Novas, onde desempenha funções como conservadora. Trata do “registo das pesso-as e tudo o que se relaciona com elas”, englobando os casamentos, divórcios, nas-cimentos e óbitos. Maria Lo-pes sabe que Catarina e José estão a ser bem cuidados no

jardim-escola João de Deus, pois esta instituição privada fornece, para além das acti-vidades curriculares normais, inúmeras outras actividades extra, tais como a ginástica, música e até mesmo iniciação ao inglês. Na escola passam a maior parte do seu tempo, têm aulas ou, no caso dos meninos mais novos, estão no infantário. Almoçam lá e também fazem neste espaço os trabalhos de casa, se os houver, num horário bem preenchido e sem tempo pa-ra monotonias, que termina às 17h30.

De segunda a quinta-feira José está também ocupado com actividades fora do âmbito escolar, típicas de qualquer rapaz da sua ida-de, como são a catequese e a natação, que o fazem chegar a casa por volta das 19h00. Depois é ver os olhos cris-talinos azuis de Catarina e os olhos cor de amêndoa do irmão brilharem com mais intensidade quando, final-mente, chega a sexta-feira e é o pai a ir buscá-los à escola. O marido de Maria Lopes, José Baltasar, tem 38 anos e é major no Exército Portu-guês. Está a frequentar um curso de “Estado-Maior”, em Lisboa, e normalmente só regressa a casa no final da semana. São, portanto, muito especiais estes dias no lar da família Baltasar, onde é o pai a executar a maior

parte dos ritos quotidianos, brincando com os filhos de-pois da escola, dando-lhes banho, fazendo ele mesmo o jantar, ou contando-lhes a já esperada história antes de adormecerem.

Apesar da alegria não se esgotar facilmente no seu lar na Vila Nova da Barquinha, o casal admite que os tempos actuais não estão favoráveis. Maria explica que “o ordena-do é o mesmo e as despesas são muitas”. A opção por este ramo específico do Direito teve a ver tanto com o seu gosto pessoal pela área, co-mo pela “segurança e estabi-lidade” que um emprego na função pública acarreta. Só que, nos últimos anos, não houve, de facto, aumentos na função pública, afectando de forma directa esta família: as despesas são sempre fixas e a prestação da casa, do carro, da escola e as despesas cor-rentes inerentes a dois filhos levam Maria Lopes a dizer que é necessário aplicar uma ligeira contenção nos gastos. Apesar das contrariedades do panorama económico, o vencimento deste lar permi-te-lhes claramente conduzir uma vida desafogada e tran-quila com tudo aquilo que uma típica família da classe média possui: um bom carro, uma casa condigna e as con-dições ideais para a Catarina e o José crescerem felizes. H.A. e R.C.

Uma família tranquilaNum cenário de crise, há quem consiga fazer uma vida desafogada, apenas limitada por uma ligeira contenção nos gastos. O retrato de uma família da classe média, que consegue ter os filhos numa escola privada. Só a inexistência de aumentos na função pública, nos últimos anos, fez alguma diferença na vida financeira desta família tranquila.

Hélder Antunes e Rui Cid

Certeza. “A poupança tem que estar cada vez mais presente”

HÉLDER ANTUNES

RUI CID

Dificuldades. “O ordenado é o mesmo e as despesas são muitas”

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C R I S E E C O N Ó M I C A

Quem vê de fora, não perce-be muito bem a empresa que funciona no interior. A Avi-ludo, em Abrantes, existe há cerca de seis anos dedicando--se à distribuição de produtos alimentares de todo o género e de diversas marcas. Com um leque de clientes bastante alar-gado, esta empresa abrantina tem superado todas as crises, querendo inclusivamente alar-gar o seu espaço.

O responsável, Domingos Miranda, aconselha a cria-ção de empresas nesta zona, lamentando apenas os lentos processos burocráticos: “Devia haver mais acesso à legaliza-ção do espaço e das empresas.” Apesar deste contratempo, a Aviludo já conta com 45 tra-balhadores, sendo 80% deles efectivos. Em relação à con-tratação de pessoal, a direcção deste empresa tem um lema: “Não faz sentido estarmos a demitir pessoas e a readmiti-las passado algum tempo, não está no nosso plano.”

Vendendo produtos de pri-meira necessidade, Domingos Miranda alega que a Aviludo não se tem ressentido com a crise, pois além de apostar na venda directa ao estabelecimen-to, lembra que esta é uma área

essencial: “Ninguém sobrevive sem alimentação!”

Há cerca de três anos que os responsáveis pela Aviludo têm em mãos um projecto de alar-gamento do próprio edifício, planeando que mal a situação burocrática seja resolvida mais postos de trabalho venham a ser criados.

Um exemplo de sucesso abrantino que se justifica em discurso directo: “Não temos parado de crescer, porque pre-cisamente não tencionamos parar.”

Efectivos e formaçãoA Central Termoeléctrica

do Pego (Pegop), a funcio-nar em Abrantes há 10 anos, é uma das maiores empresas da região de Santarém, cotada com um volume de negócios de 245.562.880,00 de euros. A Central é propriedade de três grandes accionistas e produto-res mundiais de electricidade: a EDF de França; ENDESA de Espanha e a International Po-wer do Reino Unido.

O poderio industrial é vi-sível a muitos quilómetros. O vapor de água libertado pelas imponentes chaminés traduz--se numa imagem que não pas-sa despercebida aos olhos dos abrantinos, que a apelidaram de central nuclear, pela óbvia semelhança. Na verdade, a Pe-gop é uma das produtoras de

electricidade portuguesa, que aproveita o caudal do rio Tejo como recurso.

A empresa criou mais de 200 postos de trabalho distribuídos por vários serviços, internos ou de acção externa. José Vieira, director da Comissão Finan-ceira e dos Recursos Humanos, revela que foi o “presidente da Câmara que trouxe a Central para Abrantes contra ventos e marés”. E acrescenta que “na altura havia muita gente que estava contra o projecto”.

Actualmente a Pegop conta com 112 trabalhadores, todos em regime de efectividade, ain-da que existam actividades para as quais foi necessária uma sub-contratação. A maior parte das empresas, na opinião do director de Recursos Humanos da Pegop, não faz contratos de efectividade porque “necessitam disso para sobreviver”. Com um aumento da procura de 5,5% por ano, a Pegop não parece atingida pela crise económica do país.

O 12º ano de escolaridade é o requisito mínimo de admissão na Central. José Vieira explica que um dos valores altos é o de “não regatear um tostão a nível de formação profissional” pois acredita numa formação a ní-vel contínuo. A A23 parece um factor importante para chamar novas empresas para que “em Abrantes se fixem outros tipos de actividades” – remata.

Laetitia Fernandese Liliano Pucarinho

QUANDO A CRISE PASSA AO LADO

A Aviludo e a Pegop são duas empresas

de Abrantes que têm passado ao lado das

dificuldades económicas, assegurando a

estabilidade do pessoal. Uma e outra apostam na contratação em regime

de efectividade. A Aviludo comercializa produtos alimentares e a Pegop produz electricidade.

Santana Lopes, o primeiro-ministro demissionário, herdou uma pesada herança. O défice orçamental superior a 3% não lhe deixou muita margem para manobras. As previsões feitas pelo Banco de Por-tugal dão conta de uma retoma já para este ano, pois o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) ameaça impor-se. O Boletim Económico de Dezembro de 2003 no-ticia que o PIB português está condicionado pela economia internacional e que deverá manter-se nos 0,75%. Na realidade, inverte-se a tendência de 2003 (descida de 1%), mas confirma-se uma melhoria lenta, já que o crescimento do PIB não ultrapassará os 1,75% no próximo ano.Segundo Joaquín Almunia, comissário dos Assun-tos Económicos, “Portugal vai violar o Pacto de Estabilidade e Crescimento (PEC) em toda a linha em 2005, uma vez que o défice orçamental ficará acima dos 3% do produto, a dívida será superior a 60% do PIB e o défice estrutural, défice corrigido dos efeitos do ciclo económico, não terá uma correcção de 0,5 pontos percentuais do produto”. Portugal foi o primeiro país da Zona Euro a que-brar o PEC, no que diz respeito ao cumprimento do critério do défice público, no ano de 2001, pelo que a imagem e credibilidade internacional do país já deixava muito a desejar. “Os problemas essenciais da economia portugue-sa não estão resolvidos. São mais os governos que prometem medidas do que os que efectivamente as tomam” – sublinha o economista Nogueira Leite.

Retoma pouco económicaLiliano Pucarinho

A Nersant, Associação Em-presarial da Região de Santarém, realizou, em Novembro, a 10ª Feira Empresarial de Abrantes, que teve lugar nos pavilhões da Quimigal.

No que diz respeito à função da Nersant, João Mendes, téc-nico da “Isa Confor”, diz que “é útil fazer parte da associação na medida em que se faz uma di-

vulgação mais pormenorizada e correcta”. Fernando Gonçalves, engenheiro, acrescenta que es-pera da Nersant “a continuação de um bom desempenho para a indústria”.

A Escola Superior de Tecno-logia de Abrantes (ESTA) apre-sentou-se a um concurso de pro-jectos de inovação tecnológica, promovido no âmbito da Feira.

Um dos projectos, o Robot RO-AMER, permite que as crianças adquiram e desenvolvam com-petências ao nível do raciocínio lógico-matemático, cálculo de ângulos, noções de lateralidade e medida.

A ESTA apresentou um outro projecto, através do docente Car-los Coelho e do aluno, finalista de Engenharia Mecânica, Luís Sou-

sa. Financiado pelo IFEP (Centro de Emprego de Abrantes), no âmbito de um curso da FOR-DESQ (Formação para Activos Qualificados), consiste na sensi-bilização e prevenção rodoviária e em noções para o contacto com a natureza.

Finalmente a ESTA apresen-tou o projecto do carro aerodinâ-mico. O objectivo era “percorrer

o máximo de distância com o mínimo de combustível possível”, segundo explicou Carlos Coelho. Este foi “um projecto aliciante, pois permitiu colocar em prática matéria de algumas disciplinas na base de estudo do carro”.

O Robot ROAMER arreca-dou o prémio do 3º melhor Projecto Educativo e o Pórtico Dinâmico ganhou o 2º prémio.

O vencedor do concurso foi o Projecto Visita Virtual à Casa de Esqueletos de Coninbriga, da Escola Superior de Tecno-logia e Gestão de Leiria.

A 10ª Feira empresarial de Abrantes contou ainda com a presença da ESTATUNA que brindou os participantes e vi-sitantes com uma alegre actu-ação. H.S.

Pegop. Com aumento de procura de 5,5% por ano, e com 112 trabalhadores em regime de efectividade, esta empresa não parece atingida pela crise económica que afecta o país

Análise

Em estudos realizados no passado mês de Novem-bro, pela Marktest, para o DN e TSF, concluía-se que 47% dos portugueses não se encontram satisfeitos economicamente, denotando-se uma onda de pessimismo em relação à situação actual do país. Um quinto (21,2%) é mais optimista. As preocupações com maior prioridade passam pela saúde e pelo desemprego – publica o Diário Digital.A economia portuguesa está na mó de baixo e sofreu, no terceiro trimestre do ano anterior, um abrandamento. A produção portuguesa caiu para 1,2% em relação ao trimestre anterior, de acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE). Esta situação fica a dever-se a uma quebra no investimento, nas exportações e no consumo privado.A Unidade de Investigação Económica, do grupo britânico Economist, realizou recentemente um estudo, englobando 190 países de todo o mundo. Portugal é o décimo nono país a contar do fim da lista, revela o arquivo da SIC do mês de Dezembro. No grupo que engloba os 20 países com maior possibilidade de crescimento, em 2005, estão dois países africanos de língua portuguesa: Angola (sétimo, com um crescimento previsto de 11,6%) e Moçambique (décimo oitavo, um acréscimo de 7,1% do produto). Baseado nos estudos da Organização para o Co-mércio e Desenvolvimento Económico (OCDE ), em conjunto com a SIC, prevê-se um aumento de 1,5% já para este ano, com uma melhoria no que toca à procura interna. Mas a taxa de desemprego deverá continuar a aumentar para os 6,6%.

Fontes: Diário Digital; INE ; Arquivo SIC ; EUI (Unidade de Investigação Económica) ; Marktest ; DN ; Público; OCDE .

Feira Empresarial promove projectos de inovação tecnológica

LILIANO PUCARINHO

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ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 7E S C O L A S

Muitos foram os alunos, pais e professores que ficaram prejudica-dos pelo novo processo de coloca-ção de professores no ano lectivo de 2004/2005. Em causa estava a situação profissional de milhares de docentes. Com a intenção de minimizar a burocracia, acabou por se tornar o sistema mais moroso, provocando o atraso generalizado do início de ano lectivo. Falta de informação e problemas informá-ticos terão estado na origem do problema.

Até ao ano lectivo passado, o pro-cesso de colocação de professores era feito através de um sistema no qual os docentes preenchiam um boletim que entregavam num pra-zo de dez dias. Com o novo pro-cesso, os professores tiveram que concorrer através de um sistema informático, no qual preencheram vários boletins. Com uma candi-datura “online” e em tempo real, pretendia-se que o processo fosse mais rápido. Por ser a única for-ma de candidatura, e em resultado do elevado número de professores que concorreram simultaneamen-te, o sistema informático acabou por bloquear. A solução foi adiar o prazo de candidatura.

A nova forma de ordenação e co-locação dos professores dos ensinos básico e secundário foi uma aposta do Governo PSD/CDS, que acabou por sair penalizada por uma alegada precipitação e por uma mudança de equipa ministerial a meio do processo.

Às novidades introduzidas pelo processo informático adiciona-ram-se alterações legislativas. Uma

impedia os recém-licenciados em cursos da área de ensino a concorrer no próprio ano e a outra obrigava os docentes com vários anos de car-reira a também se candidatarem, mesmo que já estivessem em qua-dro escolar.

Para complicar o novo sistema, o Ministério da Educação (ME) não esclareceu devidamente os profes-sores em relação às mudanças que ocorreram na lei. Como tal, muitos professores enganaram-se a preen-

cher os boletins, o que gerou uma confusão ainda maior.

Apesar das polémicas que na al-tura vieram a público, há factores que não foram revelados. Segundo a Federação Nacional dos Sindicatos da Educação (FNE), o problema nem foi verdadeiramente o sistema mas a for-ma precipitada como ele entrou em vigor. Assim como o facto de nunca ter sido testado. O único teste feito foi o colapso das colocações de docentes que todo o país presenciou. Para além

do bloqueio do sistema informático, as listas de colocação dos professores foram divulgadas e retiradas, uma vez que continham erros. Professores excluídos sem razão e outros ultra-passados por colegas com graduação menor foram apenas alguns dos pro-blemas identificados.

Todos estes factores levaram a sucessivos adiamentos da abertura do ano escolar, prejudicando todo o sistema de ensino, assim como a vida de todos os que directa ou indi-rectamente a ele estão ligados.

Na opinião de João Dias da Silva, secretário-geral da FNE, “o Minis-tério da Educação não foi capaz de pôr em prática com competência este modelo e o resultado está à vista”, acrescentando ainda que a equipa ministerial “tem a obrigação de tudo fazer para impor a concre-tização da tarefa”.

Após tantas polémicas levantadas pelas variadas controvérsias deste pro-cesso, o ME admitiu que este sistema não funcionava e responsabilizou a empresa Compta, que implementou o sistema informático, pela falibilidade do mesmo, recorrendo de novo ao sis-tema manual para não comprometer mais o arranque do ano lectivo. Por sua vez, a empresa desresponsabili-zou-se, apesar de ter sido instaurado um inquérito para apuramento de responsabilidades.

O regresso ao sistema anterior originou indignação por parte da Federação Nacional dos Sindicatos dos Professores (Fenprof). Um dos seus dirigentes chegou a adjectivar o sucedido como uma “anedota mun-dial”, ironizando: “Como é que em pleno século XXI o ministério da Educação passa de um sistema in-formático para um manual?”.

*Com Lusa

Liliana Coelho e Lúcia Bastos*

O arranque do ano lectivo de 2004/2005 foi um dos mais conturbados dos últimos tempos. A máquina do Ministério da Educação que todos os anos ordena e coloca milhares de professores, que se candidatam a uma vaga, sofreu alterações. A ideia era agilizar o processo mas um sistema informático que não foi previamente testado acabou por bloquear e por produzir erros. O resultado foi o regresso a um processo manual.

Escolas. Candidatura informática dos professores deixa alunos à espera das aulas

LÚCIA BASTOS

Falta de informação, enganos e atrasos provocam confusão nas escolas

Novo processo de colocação de professores perturba início do ano lectivo

O regresso ao sistema anterior de colocação originou

indignação por parte dos sindicatos,

que falam em incompetência

Em Janeiro de 2005 foram divulgados os relatórios da au-ditoria da Inspecção-Geral de Finanças (IGF) ao concurso de professores de 2004/2005, so-licitada pelo anterior ministro da Educação, David Justino. Esta auditoria detectou ano-malias na base de dados, que tornam questionável a colo-cação de docentes nas esco-las. Ao longo de 50 páginas, é analisado ao pormenor todo o processo, são apontadas várias falhas processuais e referidos procedimentos que levaram ao aumento de custos.

A IGF chega mesmo a ques-tionar os custos do processo e refere que a aquisição de

serviços e de software deveria ter sido alvo de concurso in-ternacional e não de concur-so público. Os custos directos totais, até Setembro de 2004, associados à concretização do sistema ascenderam, segundo a IGF, a 1.800.898 euros. “Numa perspectiva da boa gestão dos dinheiros públicos, são de ques-tionar, em termos de economia e eficácia, os custos associados a todo este processo, tendo em atenção, sobretudo, que uma solução informática que pre-via a comunicação electrónica entre os intervenientes tenha gerado gastos de desmateriali-zação de formulários em papel, cujas despesas representam 66

por cento do total dispendido”, refere o relatório.

A contratação e a execução dos pagamentos feitos à empre-sa (Compta - responsável pelo sistema informático), refere o documento, “são da responsa-bilidade da Directora Geral dos Recursos Humanos do Ministé-rio da Educação, Joana Orvalho, e quem deveria ter assegurado as condições para dar resposta aos pressupostos de concreti-zação seria a engenheira Idália Silva, enquanto responsável pela Direcção de Serviços de Recru-tamento de Pessoal Docente”. Diz ainda a IGF que foram feitos pedidos à Compta, com custos para o processo, sem que a en-

tidade competente tenha auto-rizado o tipo de procedimento e a realização da despesa. A IGF imputa à Direcção Geral dos Re-cursos Humanos de Educação (DGRHE) a responsabilidade pela indefinição das regras e diz que houve falta de comunica-ção entre a equipa da Compta e a DGRHE nas várias fases do processo, particularmente até 30 de Abril.

No capítulo VII, relativo às conclusões quanto à arquitec-tura global do sistema de apoio ao concurso, a IGF refere, por exemplo, que o formulário de candidatura estava mal conce-bido, sofrendo 14 alterações, o que acabou por ser crítico para

todo o processo do concurso. É também indicado no relatório que não houve equipa formal-mente designada para a tarefa com uma coordenação efectiva que “teria ajudado a encontrar a forma adequada de comuni-cação à empresa das regras de negócio e a acompanhar mais de perto todo o projecto”.

Foi, também, detectada pela IGF a existência de indícios de que, em todas as fases do concurso, se verificou muita intervenção manual de inser-ção de novas candidaturas fo-ra dos prazos e de eliminação de outras, sem deixar rasto. Também por motivo de erro na importação dos formulários

para a base de dados foram importadas erroneamente as classificações académicas de todos os candidatos, sendo ar-redondados para a unidade, o que motivou alterações na graduação.

No capítulo VIII, relativo às conclusões sobre a contra-tação de bens e serviços para apoio ao concurso de docentes e respectiva execução material e financeira, a IGF imputa à DGRHE a responsabilidade pela indefinição das regras e diz que houve falta de comuni-cação entre a equipa da Compta e a DGRHE nas várias fases do processo, particularmente até 30 de Abril. Lusa

Auditoria da Inspecção-Geral de Finançasdetecta diversas anomalias no concurso

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8 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 E S C O L A S

O entusiasmo de estar colocado no público ou no privadoNuno Tavares, Miguel Brites e Cláudia Silva. São professores, no ensino público e no ensino privado. Contam as suas angústias e falam também das coisas boas. Dão a conhecer as suas situações relativamente ao início deste ano lectivo. No ensino público, “foi sufocante, foi triste, toda esta situação de incertezas e controvérsias”. A experiência do privado é diferente.

Ana Lia Gomes e Marisa Silva

“Teacher, live the kids alone!” (Professor, deixe as crianças em paz!). Foi com a letra da música, dos Pink Floyd, que Nuno Tavares, professor de Educação Física, ilus-trou a situação vivida por centenas de professores no início do corren-te ano lectivo. No entanto, numa gargalhada, alertou que, este ano, a letra foi ligeiramente modificada, passando a ser: “Professores, não deixem as crianças em paz e venham dar aulas!”

Este é o sexto ano em que Nuno Tavares, natural de Aveiro, lecciona. A sua primeira experiência profis-sional foi no ensino privado. Actual-mente encontra-se no ensino público e afirma que “a transição não foi uma mudança para algo desconhe-cido”. Confessa, no entanto, que lhe “custou muito”, pois passou “a estar numa cidade que não era a sua e num ambiente que era completamente desconhecido”.

Entre gestos e passadas de fumo, o docente esclarece que foi com “entu-siasmo” que recebeu a notícia da sua colocação na Escola Secundária de Pinhal do Rei, na cidade da Marinha Grande, “que fica a 130 quilómetros de Aveiro”. Este entusiasmo cedo se dissipou quando constatou que apenas “tinha ficado colocado com um horário de 16 horas semanais”. “Mas a sorte parecia estar do meu lado” – diz Nuno com uma calma

contagiante. O “horário foi comple-tado, estando agora com o horário de 22 horas semanais”. Ou seja, horário completo.

Nuno sabe que para o ano irá tra-var uma batalha difícil, devido ao facto de ter leccionado no privado. A nova lei de concursos, aprovada no decorrer do ano lectivo transac-to, “prejudica os professores que estão no ensino privado mais que um ano lectivo”. Como esse é o seu caso, remata dizendo que no próxi-mo concurso vai concorrer “numa prioridade abaixo”.

Optimista, como se encara, Nuno Tavares quer acreditar que “para o ano tudo será diferente e que a letra da música dos Pink Floyd voltará à origem”.

Preocupado com o futuroMiguel Brites, licenciado no ano

lectivo 2003/2004, no curso de pro-fessores do Ensino Básico, variante Educação Física, afirma que “o ac-tual estado em que os professores podem concorrer” o deixa “muito preocupado com o futuro”. Esta pre-ocupação é provocada pela extinção dos mini-concursos, pois “quem se licenciou este ano não teve hipó-tese de concorrer”, acrescentando, com alguma tristeza, que “para o ano concorre em desvantagem”. No entanto, esperançado, Miguel atesta que “podia ter sido pior”. Através de um empresa ligada à Educação, encontra-se “a dar Educação Física, quer em várias escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico, quer em diver-

sos Jardins de Infância”. Cansado, por ter terminado mais um dia de aulas, “o professor Brites”, como é conhecido pelos colegas, pede uma pausa para um café, alegando que sem este não conseguirá raciocinar “depois de uma jornada de gritos e cambalhotas”.

Face aos atrasos no processo de colocação de professores, Miguel, indignado, diz que “foi sufocante, foi triste, toda esta situação de incer-tezas e controvérsias”. Justificando que “em casos mais drásticos, esses atrasos provocaram mesmo uma incerteza de vida no seio de certas

famílias”, o que não considera grave, “mas sim muito grave”. Ressalva, no entanto, que “os professores devem ter mais consciência, quando optam por esta profissão, uma vez que já é do seu conhecimento as dificulda-des em obter colocação”. Realista, Miguel Brites acha que “já não se deve escolher um curso por sonho, mas sim por sobrevivência na esfera profissional”.

“Não foi assim tão atribulado”A Matemática foi sempre uma

disciplina que gostou. Agarrou essa paixão, com garra, e fez dela a sua profissão. Cláudia Silva, professora numa instituição privada, confessa que a situação das colocações não teve “qualquer influência” na sua vida profissional, uma vez que “já tinha renovado contrato no Colégio em que anteriormente leccionava”. Entusiasmada, diz que “tem sido uma experiência muito interessante, embora trabalhosa”. “É um Colégio pequeno, onde todos se conhecem, desde alunos, professores e auxiliares da acção educativa, o que faz com que o ambiente de trabalho seja bas-tante agradável”. Acrescenta ainda para ressalvar bem a ideia anterior-mente defendida que “todos coope-ram nas diversas actividades”.

No que diz respeito ao início de aulas, e em comparação com o en-sino público, Cláudia Silva diz que este “não foi tão atribulado, porque a maioria dos professores já estava contratada”. Para perceber melhor como se processam as colocações no

ensino privado, Cláudia explica que, “após o envio do currículo, é reali-zada uma entrevista com o Director Pedagógico e/ou, entidade patronal”. Posteriormente, “é feita uma selec-ção, em que os mesmos vão contratar o docente que melhor se enquadra nos requisitos pretendidos”.

A leccionar em Aveiro, longe da sua terra natal - a cidade do Porto – Cláudia afirma que se adaptou “muito bem” ao novo ambiente, uma vez que “a Veneza de Portugal, como é conhecida Aveiro”, lhe trouxe “uma tranquilidade apaziguadora”. As grandes diferenças foram mais no-tórias a nível gastronómico e a nível do “stress quotidiano dos transportes públicos”, dizendo a sorrir: “As tripas foram substituídas por ovos moles e as buzinadelas constantes do trânsito da Invicta, pelo som das famosas ‘bugas’, bicicletas características” da sua nova cidade.

Deixando, na sua voz, transpa-recer confiança, fala, sem rodeios, das vantagens e desvantagens de trabalhar no ensino privado. “Uma das vantagens de estar no ensino privado é saber que no próximo ano não tenho que começar de novo. Vou continuar, relativamente, perto de casa, da família e dos amigos”. No entanto, realça que a maior vanta-gem é o facto de ter uma “relação com os alunos muito próxima e de ser possível ter com eles uma rela-ção de amizade”. As desvantagens, no seu entender, passam apenas “pela progressão na carreira do-cente”.

Histórias de três professores que querem leccionar com estabilidade

O presidente Sindicato Nacional dos Professores Licenciados pelos Politécnicos e Universidades, de Abrantes, Rui André, afirmou ao ESTA Jornal que o que falhou no processo de colocação dos professores foi o facto do sistema não ter sido testado com antecedência pelo Ministério da Educação. Um outro entrave ao bom funcionamento do processo foi que houve “um caos na Internet” e como tal as listas a nível informático não saíram como se esperava: “O sistema manual tinha al-gumas falhas, mas nunca causou tantos problemas como este novo sistema informático.” Como consequência, o processo foi-se arrastando.

A mudança radical da lei e a falta da respectiva ex-plicação por parte do Ministério de Educação também fizeram com que muitos professores com mais anos de carreira se enganassem ao preencher a folha de candida-tura. Rui André admite que o facto de muitos professores

não saberem preencher a folha de candidatura fez, tam-bém deles, os responsáveis pelo fracasso do processo. A falta de informação foi uma dificuldade acrescida para os docentes: “As pessoas ficaram baralhadas, sem saber aonde iam concorrer”.

No que diz respeito a Abrantes, Rui André explica que se deram os mesmos problemas verificados a nível nacional, mas apenas nas escolas secundárias, dado que as escolas do 1º ciclo têm um quadro mais estável. Como consequência dos atrasos do referido processo, as escolas de Abrantes iniciaram o ano escolar muito depois da data prevista. De tal forma que em meados de Outubro algumas das escolas ainda não tinham metade dos professores necessários. Apesar das dificuldades do processo e das angústias causadas nos docentes, Rui André adianta que estão a ser negociadas alterações para minimizar os problemas do próximo ano. L.C. e L.B. Rui André. Responsabilidades para o ministério e para os professores

LÚCIA BASTOS

“Uma das vantagens de

estar no ensino privado é saber que no próximo

ano não tenho que começar de novo. Vou continuar,

relativamente, perto de casa, da família e

dos amigos”

Rui André, sindicalista de Abrantes, lembra que o sistema manual de colocação de professores tinha algumas falhas, mas nunca causou tantos problemas como este novo sistema informático.

As listas a nível informático não saíram como se esperava

Os motivos do fracasso segundo um representante dos professores

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ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 9

Apesar da “confusão” com a colo-cação de professores que, no início do ano lectivo, se instalou no país, a Escola Secundária Dr. Manuel Fer-nandes, em Abrantes, “não teve con-sequências graves”, afirma Alcinio Hermínio, presidente do Conselho Executivo. As aulas começaram na data prevista, embora faltando 16 docentes. Alguns alunos ficaram algum tempo sem aulas. Durante este impasse, sem grande impacto, a escola nada pôde fazer, visto não ter condições para ocupar os alunos quando não têm professores. Ape-nas tem ao dispor da comunidade escolar serviços como a biblioteca, a ludoteca ou a sala de convívio. Os pais mostravam alguma preocupa-ção, mas nada em grande escala, pois, também não havia nenhuma turma com um número significativo de professores em falta.

Apesar dos cerca de 300 alunos que ficaram prejudicados em al-gumas disciplinas pela tardia co-locação de professores, também a Escola Secundária Dr. Solano de Abreu, em Abrantes, abriu as suas portas na data prevista. Durante esta longa espera a escola garantiu, às turmas do 7º ano, algumas activi-dades extracurriculares para manter os alunos ocupados e, ao mesmo tempo, proporcionar-lhes outras aprendizagens necessárias e úteis. Segundo Jorge Costa, presidente do Conselho Executivo, o problema resultante é o facto de “em algumas disciplinas, o tempo para cumprir o programa curricular ter ficado mais curto, pelo que a abordagem dos conteúdos programáticos terá de ser feita em menos tempo de que seria desejável”.

Não só os alunos, mas também os professores foram vítimas deste sistema errático. Maura Ferreira é um exemplo de quem conseguiu colocação apenas na última fase do concurso. Efectiva em Vila Velha de Ródão, pediu destacamento, sendo colocada na Escola Secundária Dr. Solano de Abreu, a sua 16ª opção. A professora de Educação Física mostra-se indignada com o facto de alguns colegas lhe passarem à frente de forma que considera injusta. Esta docente afirma que o sistema ante-rior era mais justo no que respeita aos destacamentos.

Colocado a 28 de Setembro na Escola Secundária Dr. Manuel Fer-nandes, António Almeida já “nem contava ficar em outro lado”, pois lecciona nesta escola desde 1995. Mas, como professor de Quadro de Zona Pedagógica , é obrigado a con-correr todos os anos “para arranjar lugar numa escola”. Considera que o novo sistema tem muitos problemas. No entanto, poderá vir a funcionar bem depois de serem efectuados alguns ajustes, como por exemplo, nas colocações via Internet. “Ca-da um tinha uma password, e essa password dava um tempo limite na introdução dos códigos. Se se ultrapassasse esse tempo a ligação

E S C O L A S

Os alunos foram os mais afectados

Atraso. Os aulas das escolas do Agrupamento do Oeste começaram tarde e os alunos não tiveram actividades

SÓNIA PACHECO

Ana Caldelas e Sónia Pacheco

ESCOLAS E ALUNOS

Agrupamento de Escolas Abrantes OesteEB1 Abrantes nº2 - 160 AlunosEB1 e JI Encosta da Barata1º Ciclo – 142 alunosPré-escolar – 85 alunosEB1 e JI Abrançalha de Baixo1º Ciclo – 12 alunosPré-escolar – 16 alunosEB1 Abrançalha de Cima1º Ciclo – 7 alunos EB1 e JI Amoreira1º Ciclo – 11 alunosPré-escolar – 13 alunos

EB1 e JI Martinchel1º Ciclo – 20 alunosPré-escolar- 18 alunosEB1 e JI Ribeira da Pucariça1º Ciclo – 4 alunosPré-escolar – 11 alunosEB1 e JI Rio de Moinhos1º Ciclo – 20 alunosPré-escolar – 17 alunosNúmero total de alunos - 536Número total de professores – 50Número total de professores do quadro de escola – 5 (Três professores de 1º ciclo e duas educadoras)

Escola Secundária Dr. Manuel FernandesNúmero total de alunos – 1015Número total de professores – 116Número total de professores do quadro de escola – 94

Escola Secundária Dr. Solano de AbreuNúmero total de alunos – 968Número total de professores – 110Número total de professores do quadro de escola – 88

No Agrupamento de Escolas do Oeste, em Abrantes, o ano lectivo começou tarde para todos os alunos. A responsável por este conjunto de estabelecimentos de ensino coloca uma questão de fundo: “Se as escolas param, os meninos não têm ninguém com quem ficar”. Já as escolas secundárias começaram as aulas na data prevista, mas com professores em falta. Nessas disciplinas, os programas vão ter que ser dados em menos tempo do que o desejável.

O início do ano escolar nas escolas de Abrantes, afectadas pelos atrasos na colocação de professores

terminava. Era necessário voltar a entrar e, algumas vezes, o sistema nem sequer permitia a conclusão”. O professor revela que a própria Escola Dr. Manuel Fernandes serviu como centro de colocação, onde havia três computadores para que qualquer professor pudesse concorrer.

Apesar de tudo, onde se regis-tou maior impacto, no concelho de Abrantes, relativamente a toda esta problemática, foi no Agrupamento de Escolas do Oeste, onde todos os alu-nos foram afectados. Em três Jardins de Infância (Abrançalha de Baixo, Ri-beira da Pucariça e Martinchel), que na altura tinham educadora efectiva de quadro, as aulas começaram no dia 21 de Setembro. As restantes escolas começaram a sua actividade lectiva no dia 6 de Outubro. Mesmo assim, a turma de pré-escolar na Escola da Encosta da Barata começou ainda depois desse dia.

Este estabelecimento de ensino, tal como os outros, também não tem qualquer autonomia relativamente à ocupação dos tempos livres destas crianças. Lurdes Batista, presidente do Conselho Executivo do Agrupa-mento de Escolas do Oeste, sublinha que esta problemática veio pôr a nu uma falha da nossa sociedade: “Se as escolas param, os meninos não têm ninguém com quem ficar”. Esta responsável considera que a questão dos tempos livres, nestas situações, tem que ser resolvida pela autarquia em articulação com as escolas que cedem o seu espaço. Esta situação “penalizou os professores, mas, em última instância, penalizou as crian-ças”. De facto, até elas comentavam a situação. A presidente do Conselho Executivo conta que “um pequenito dizia que já tinha a mochila e os li-vros e queria saber da professora”. As crianças “percebem perfeitamente que durante um mês ninguém sabia o que é que lhes havia de fazer”.

Lurdes Batista revela que foram muitas as reacções desagradáveis por parte dos pais, porque nem todos compreendem que a escola não pode fazer nada. Afirma que foram momentos muito difíceis e condena a acção do Ministério da Educação. “Tínhamos os pais de um lado a reclamarem com toda a razão, tínhamos os professores de outro a reclamarem com toda a razão e tínhamos um Ministério que não nos dava resposta nenhuma”.

Relativamente ao novo sistema, Lurdes Batista considera ser um passo importante a existência de um único concurso para os docentes, embora necessite de alguns ajus-tes: “Espero que o nosso Governo consiga atempadamente resolver todos os problemas e que este caos não volte a acontecer”. Jorge Cos-ta espera que, no próximo ano, se evitem erros e que o processo de-corra sem problemas. Para Alcinio Hermínio, a actual legislação e a forma como é implementada cria injustiças na colocação de profes-sores. “É de lamentar que se tenha deixado chegar Setembro com um problema destes por resolver”. “A nível da Europa devemos ter feito um papel muito feio”.

Excepção. A Escola Secundária Dr. Manuel Fernandes iniciou o ano lectivo com relativa normalidade

ANA CALDELAS

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10 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 S C U T S

Utilizadores querem estradas alternativasPatrícia Calhau

Os argumentos para contestar o pagamento de portagens nas scut vão desde as ideias que es-tiveram na origem deste tipo de estradas até à falta de alternati-vas, passando por desvantagens para o desenvolvimento, por dificuldades económicas e até por questões sociais. Quando se questionam os automobilistas, o que se encontra é um coro de protestos contra a possibilidade de a utilização destas estradas vir a ser paga.

Maria Eugénia Charneca é pe-

remptória: “Não se devia pagar, porque o dinheiro veio da co-munidade europeia, não é para pagarmos portagens”. Para além da questão económica, esta co-merciante vê implicações sociais na possibilidade de se introduzir o conceito de utilizador-pagador nas scut: “A vida económica fica mais sobrecarregada e menos tempo se dá à família.”

Manuel Coutinho, gerente comercial, lembra que “quando se construíram as estradas, não foi com a intenção de se pagar portagens.” Por uma questão de coerência, defende que esta me-dida anunciada pelo Governo da

coligação PSD-CDS não deve ir para a frente. Por outro lado, Ricardo Neto, técnico informáti-co, acrescenta outro argumento: “Não será benéfico para o desen-volvimento do país, em especial do interior, porque a maioria das pessoas depende dessas vias para ir para o trabalho.”

Ricardo Neto acredita que aqueles que fazem uso diário das scut “continuarão a utilizar o seu transporte, porque as al-ternativas que possam existir não permitem uma melhor deslocação, por ser ineficaz e deficitária. A rede de transportes não satisfaz as necessidades das

populações locais”. Um estudan-te, de 21 anos, que utiliza a A23 para se deslocar entre a casa e o estabelecimento de ensino, garante que se esta via passasse a ter portagens teria que “optar pelas estradas nacionais ou até mesmo transportes alternativos”. Por isso sugere a construção de “estradas alternativas em condi-ções para as pessoas se desloca-rem com segurança”.

Manuel Moura, funcionário público, também diz que a intro-dução de portagens nas scut te-ria de ser contrabalançada com alternativas. E se o pagamento vier a ser uma realidade, ironiza

que só lhe resta uma solução: “Com o dinheiro gasto em com-bustível, somado ao dinheiro pago nas portagens, e partindo do princípio que para o Governo a matemática ainda é uma ciên-cia exacta, reformava-me, pois a trabalhar perdia dinheiro. Esta é a verdade neste país....”

As reacções adversas vêm de todos os lados. Para Fran-cisco Assis, da Associação de Comerciantes de Abrantes, Constância e Sardoal, é ine-vitável que com portagens “todo o comércio e indústria” venham a sofrer ainda mais as consequências da interio-

ridade. O mesmo responsá-vel considera que “com mais uma verba a despender dia-riamente ou semanalmente”, as famílias terão ainda mais dificuldades do que aquelas que já têm. Da mesma opinião comunga Albano Santos, da Comissão de Utentes Contra o Pagamento de Portagens, que se mostra céptico: “Nem o Governo sabe muito bem como é que estas coisas das portagens se podem fazer, no-meadamente na A23. Em ter-mos técnicos ainda ninguém percebeu muito bem como é que isso se pode fazer.”

A introdução de portagens nas scut foi uma das medidas anunciadas pelo Governo de coligação PSD/CDS, que entretanto se demitiu. A ideia depende agora do resultado das legislativas. Embora em ritmo mais brando, a contestação mantém-se. A Associação de Comerciantes de Abrantes, Constância e Sardoal diz que, a ser levada a cabo, a medida prejudicará o comércio e a indústria. Utilizadores da A23 falam na necessidade de alternativas viáveis. Autarcas de Abrantes e de Mação não concordam com as portagens, mas há uma voz distinta: vem de Tomar.

Élio Batista

A proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2005 prevê o aumento dos salários dos funcio-nários públicos e das pensões, o aumento do investimento público, o corte de benefícios fiscais de fa-mílias e empresas e a introdução de portagens nas concessões scut (sem custos para o utilizador). Estas são as linhas orientadoras do documento aprovado no dia 6 de Dezembro, pela actual maioria, com os votos contra da oposição.

Apesar de ainda não se saber quem vai gerir este OE, com estas reformas, o Governo demissio-nário promete manter o défice

público controlado, abaixo dos 3% do Produto Interno Bruto.

Sobre as auto-estradas conces-sionadas, assunto que tanta tinta tem feito correr, os 914 quilóme-tros contratualizados em regime Scut vão absorver cerca de 500 mi-lhões de euros do próximo OE.

O Governo de gestão não quer que estes 914 quilómetros de as-falto possam pôr em causa outros investimentos, reparações e ma-nutenções do que já está constru-ído. Segundo este princípio, o que está em causa é a necessidade de evitar a ruptura do Plano Nacio-nal Rodoviário de 2000. O minis-tro das Obras Públicas, António Mexia, explicou ao ESTA Jornal que a não aplicação desta medida

teria implicações: o projecto da ligação das capitais de distrito por uma rede de auto-estradas e a criação de viáveis estradas secun-dárias “seriam inevitavelmente adiados”.

Até Março, o estudo de mobi-lidade deverá estar concluído, e em função deste documento, irão ser definidos critérios objectivos para a isenção do pagamento de portagens. António Mexia garan-tiu ainda ao ESTA Jornal que a isenção dos locais “é um dos prin-cípios básicos para a aplicação” desta medida.

Apesar da resolução do Con-selho de Ministros ter sido pu-blicada em Diário da República no passado dia 5 de Novembro,

as linhas orientadoras da recon-versão do modelo de financia-mento das Scut, que implicam a alteração jurídica dos contratos de concessão, devem ficar pelo papel, uma vez que os estudos de impacto económico e de mo-bilidade pedidos pelo gabinete de António Mexia só estarão prontos em Março próximo. Por outro lado, o cumprimento das Grandes Opções do Plano para 2005 está dependente das legislativas, marcadas para 20 de Fevereiro. Resta também saber se o próximo titular da pasta im-plementará portagens nas auto-estradas concessionadas. Até lá, os automobilistas continuarão a circular nas scut sem pagar.

Reacções

“TODA A CONSTESTAÇÃO”

O presidente da Câmara Municipal de Abrantes, Nelson Carvalho, eleito pe-lo PS, defende que “a A23 é um instrumento estratégico fundamental para a promo-ção da sustentabilidade de coesão da região”, e por isso o pagamento de portagens na

auto-estrada da Beira Interior “merece toda a contes-tação”. O autarca abrantino considera que, ao tomar esta decisão, o Governo “mostra claramente uma ausência absoluta de um sentido estratégico para os investimentos que o Estado faz”.

“FRONTALMENTE CONTRA”

Para o presidente da Câma-ra Municipal de Constância, António Mendes, o que está em causa, são as expectativas que foram criadas às pessoas de que havia traçados rodovi-ários com perfil de auto-es-trada que não eram pagos, e que agora são anunciados

como sendo pagos. O edil de Constância diz-se, por isso, “frontalmente contra”. O autarca eleito pela CDU considera ainda mais grave a cobrança de qualquer portagem “num traçado que foi concebido como auto-estrada, em que a mobilidade inter-hospitalar Torres Novas – Abrantes – Tomar se faz por esta via”.

“É ACEITÁVEL”

O presidente da Câmara Mu-nicipal de Tomar, António Paiva, tem opinião contrária. O social-democrata, na edição de 23 de Outubro de 2004 do Jornal de Notícias, defende que “se a conclusão do Plano Rodoviário está em causa, a aplicação de portagens como

regra nacional é aceitável”. O autarca disse que sentiu no seu município “a falta de construção por falta de verbas, nos últimos anos”. Quanto ao troço A1-Abrantes, António Paiva entende “que é uma ligação interurbana que não deve ser paga”.

Portagens nas scut à espera das eleiçõesGoverno demissionário não quer que 914 quilómetros de asfalto ponham em causa outros investimentos

RICARDO TRIÃES

Espera. O estudo de mobilidade deverá estar concluído até Março e nele serão definidos critérios objectivos para a isenção do pagamento

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ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 11G E R A L

Como encarou a vinda da Secre-taria de Estado da Agricultura para a Golegã ?

Eu só lancei o repto ao Governo após saber que Santarém tinha refe-rido que não via uma mais valia que a secretaria fosse para Santarém, mo-tivo pelo qual nos perfilámos para que a Golegã recebesse a Secretaria de Estado da Agricultura. Em primeiro lugar a Golegã foi sempre referência da agricultura nacional. Está praticamen-te no centro geográfico do país com as acessibilidades invejáveis que tem. Está a uma hora de Lisboa, a uma hora de Coimbra, a uma hora da fronteira espanhola. Pensámos que a Secretaria de Estado da Agricultura deveria ficar na lezíria. Porque a lezíria é uma das maiores expressões agrárias. É uma agricultura de vanguarda, praticada de uma forma científica, com gran-des introduções e grandes inovações testadas nesta zona.

A vinda para a Golegã da Secreta-ria de Estado da Agricultura tinha, sobretudo, algo que nos parecia im-portante: era que estivesse perto das angústias e dos anseios dos agricul-tores e também das suas vitórias e dos seus sucessos. Penso na vinda da Secretaria de Estado da Agricultura para a Golegã como uma mais valia também para a própria Secretaria, para o próprio Ministério da Agricul-tura porque está junto da realidade e está perto do mundo que serve.

Entende que os agricultores fica-ram a ganhar?

Sem dúvida, porque têm perto de si quem na realidade pode encontrar

a melhor solução para os seus proble-mas. E por outro lado, aqui na Gole-gã, estão sedeadas associações muito fortes em termo de peso da agricultura

nacional. O diálogo é mais fácil, é um diálogo mais constante e estou certo que é um benefício para as duas partes. Para a Golegã, como é evidente, é um benefício. A Golegã, nestes últimos sete anos, tem-se tornado muito me-diática, muito competitiva.

Transpareceu nos jornais alguma tensão entre a Câmara da Golegã e a Câmara de Santarém. O que é que se passou?

Eu penso que primeiro houve a ideia de que a deslocalização ou descentra-lização era estéril. Em segundo lugar, penso que Santarém não fez esforço para corroborar essa ideia da desloca-lização e, portanto, Santarém não pode ter ficado incomodada por algo pelo qual não lutou. O meu relacionamento actual com o presidente da Câmara de Santarém é perfeitamente normal, não há sequela nenhuma. É cada autarca a lutar pela melhoria da sua terra. Pen-so que não há cicatrizes porque nem sequer houve ferida. Houve um repto da parte da Golegã e, talvez Santarém achasse que, por direito, por ser capital de distrito, tinha este departamento governamental. Também se podia referir algumas cidades do distrito de Santarém. Não se referiram cidades nenhumas porque ela foi colocada numa vila e, portanto, não há guerra entre cidades.

Trazer a Secretaria de Estado da Agricultura para a Golegã foi um encargo elevado?

Foi um encargo pequeno em relação à instalação de uma estrutura como esta porque, no fundo, nós já tínhamos

que reabilitar o palácio do Pelourinho, que é um património municipal que tem vindo a ser recuperado. Há pouco tempo tinha sido reparado o telhado e reparadas algumas estruturas. Porque é que não foi oneroso? Por uma simples razão, porque o que se fez foi uma divi-são com tábuas no interior. O edifício tinha funcionado como Museu Martins Soraia e tinha quatro grandes salas de exposição, que foram divididas. Toda a parte de instalação, como computado-res, linhas telefónicas, cablagens, é tudo da Secretaria de Estado da Agricultura. As instalações estão disponíveis en-quanto o Governo quiser. Não há limite de tempo quanto à estadia.

Quem é que teve a ideia do desfile com carro de cavalos para receber a Secretaria de Estado da Agricul-tura?

Desde que eu sou presidente da Câmara que qualquer entidade go-vernamental que venha à Golegã é transportada por cavalos. Por exem-plo, na feira de S.Martinho o ministro da Agricultura deslocou-se sempre em carro de cavalos. Faço questão de o fazer envergando o meu traje próprio, que é o traje da lavoura portuguesa. Também tenho lavoura, sou criador de cavalos, sinto-me bem nessa pele e portanto faço o que é normal, de uma forma natural. É uma forma de carac-terizar. O desfile foi com campinos meus, são meus particulares que vêm ao lado, que me acompanham, como uma escolta de guarda de honra. São os homens que trabalham o dia a dia na minha casa.

“Perto das angústias e dos anseios dos agricultores”Eleito duas vezes, José Veiga Maltez é presidente da Câmara da Golegã desde 1996. O autarca, que é também médico e criador de cavalos, encara a instalação da Secretaria de Estado da Agricultura na vila como uma mais valia. Antes da queda do Governo, Maltez explicou ao ESTA Jornal os alegados desencontros entre Santarém e Golegã: “É cada autarca a lutar pela melhoria da sua terra”. Embora defenda que o encargo foi pequeno, toda a aposta que aqui se relata fica agora como um capítulo da história política do país.

Rui Rodrigues

Com a demissão do Gover-no de Santana Lopes e com eleições legislativas marcadas para 20 de Fevereiro, há algu-ma incerteza quanto à perma-nência da Secretaria de Estado da Agricultura e Alimentação na Golegã. Na altura da sua instalação, a 31 de Agosto de 2004, foi bem recebida pela população.

A Secretaria de Estado da Agricultura e Alimentação fi-cou instalada no palacete do Pelourinho, um edifício do século XVIII, cedido pela Câ-mara da Golegã e situado no centro da vila. Entre a popula-ção, há quem pense que a esta-dia da Secretaria de Estado da Agricultura trouxe muitas van-tagens para a vila. É o caso de André Mendes, bombeiro, que lembra “o movimento” que a vila passou a ter. José Gouveia, técnico de farmácia, acrescenta que este departamento do Go-verno trouxe “mais afluência de pessoas para tratarem de assuntos”.

Para Bernardim Raposo, relações públicas da feira na-

| ENTREVISTA | JOSÉ VEIGA MALTEZ, PRESIDENTE DA CÂMARA DA GOLEGÃ, A PROPÓSITO DA INSTALAÇÃO DA SECRETARIA DE ESTADO DA AGRICULTURA

Uma incógnita quanto ao futuro

cional do cavalo, a principal vantagem de a Golegã ter a Secretaria de Estado, passa pela economia: “Evita-se ir para Lisboa perder tempo e pagar auto-estradas”. No mes-mo sentido vai a opinião de

um taxista, que explica que deixou de ser necessário ir a Santarém “tratar os assuntos da agricultura”.

E se a população da Golegã recebeu bem a Secretaria de Estado, os funcionários que

com ela se deslocaram tam-bém só têm aspectos positivos a apontar. Carlos Rodrigues, chefe de gabinete do Secretá-rio de Estado da Agricultura e Alimentação, conta como foi a recepção: “As próprias

A Secretaria de Estado que tem levado mais gente à Golegã

pessoas, no dia a dia, quando nos deslocamos a um café ou a um restaurante vêem-nos com simpatia e manifestam essa simpatia. Para nós tam-bém é agradável”. Tudo isto se passa num ambiente de “calma muito grande”, relati-vamente ao que a equipa es-tava “habituada em Lisboa”. A vila “tem vários restaurantes e vários cafés”, proporcionando “o mínimo que uma cidade pode ter”. Carlos Rodrigues defende ainda que o problema das distâncias não se coloca. A Golegã é relativamente aces-sível “quer de comboio quer de carro”. Por outro lado, as comunicações são fáceis e “os telefones móveis resolvem a maior parte dos problemas”.

Carlos Rodrigues lembra que o Ministério da Agricultu-ra terá sido um dos primeiros “que se regionalizou ou que pe-lo menos se desconcentrou em termos de direcções regionais”. Há sete direcções regionais, o que faz com que o país este-ja “coberto ao pormenor em termos de zonas agrárias” e

que tenha “departamentos que fazem o apoio directo ao agri-cultor na própria região”. Por essa razão, o chefe de Gabinete diz que o Governo “está mais próximo dos seus cidadãos, dos seus clientes cidadãos”, apesar de a Secretaria de Esta-do ser um “órgão de definição de políticas” e não tanto de atendimento ao público.

Por tudo isto, Paulo Fonse-ca, deputado do PSD, refere que havendo continuidade po-lítica, a Secretaria de Estado da Agricultura e Alimentação deverá continuar na Golegã. Mas com a possibilidade de alteração política, a situação fi-cará dependente da agenda do Governo que sair das eleições. Da mesma opinião é o presi-dente da Câmara da Golegã que diz não haver razão para a Secretaria de Estado sair. Paulo Fonseca, director da Federação de Santarém do PS, a continu-ação ou não também depende-rá da agenda política do novo Governo, em particular das políticas do futuro ministro da Agricultura. R. R.

Vantagens. População satisfeita por poder tratar dos problemas da própria terra

O MIRANTE

Veiga Maltez. “Houve a ideia de que a descentralização era estéril“

O MIRANTE

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12 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005

Inquérito

G E R A L

Um entrave para aqueles que são diferentes“Um problema difícil de resolver”. É assim que Pina da Costa, vereador da Câmara de Abrantes, se refere às barreiras que existem para quem tem dificuldades em se deslocar na cidade. Os deficientes e os idosos são os mais afectados. Passeios altos e escadas como único acesso a edifícios públicos são alguns dos problemas.

Vânia Tavares

As barreiras arquitectóni-cas são o principal problema que dificulta a vida dos defi-cientes motores, invisuais e idosos. Esta é uma realidade bem visível não só em Abran-tes, como em todo o país e até mesmo na Europa. A União Europeia estabeleceu um prazo de sete anos para que todos os países membros aca-bassem com as barreiras ar-quitectónicas que dificultam a mobilidade dos deficientes, prazo esse que terminou no passado mês de Setembro. No entanto, as barreiras ar-quitectónicas persistem e os deficientes continuam pri-vados de aceder livremente a edifícios públicos e de se deslocarem em grande parte das vias públicas.

Percorrendo as ruas de Abrantes, tomamos cons-ciência do quanto é difícil a um deficiente motor circular livremente: os bancos e mul-tibancos, as farmácias, os es-tabelecimentos comerciais, a biblioteca municipal e até própria Câmara Municipal são de difícil acesso. Confronta-do com esta realidade, Pina da Costa, vereador do urba-nismo, afirma que “este é um problema difícil de resolver, na medida em que não é pos-sível alterar toda a estrutura da cidade”. Existem projectos de apoio a pessoas cuja mobili-dade é afectada pelas barreiras arquitectónicas. Contudo, esta é uma solução que, segundo o vereador, não é posta em prá-tica pela autarquia.

Victor Ferreira tem 19 anos e é paraplégico de nascença. Estuda na Escola Secundária Dr. Manuel Fernandes, em Abrantes, na qual tiveram de ser construídos acessos para que Victor pudesse lá estudar. Não tem qualquer apoio das

entidades governamentais, o que lhe traz grandes encargos, e até mesmo o transporte é fa-cultado a título pessoal. Dada a sua condição física, Victor sente, diariamente, inúmeras dificuldades: “Os passeios altos, as ruas com bastante

inclinação, os multibancos a que não consigo chegar, os passeios que muitas vezes são ocupados por viaturas ou que têm postes que me impossibi-litam a passagem, e os inúme-ros edifícios que apenas têm escadas de acesso”. A tudo isto

acresce ainda os olhares de pena que todos os dias tem que enfrentar.

Idalina Lopes tem 38 anos, é funcionária da Biblioteca Municipal António Botto e é invisual. As grandes difi-culdades que enfrenta no seu

Histórias de pessoas que têm dificuldades de mobilidade em Abrantes

Ana Paula Marques29 anosFuncionária Pública

1 – Completamente, porque Abrantes é uma cidade com fortes inclinações, com pouca acessibilidade para pessoas com deficiências, e não há acessos fáceis para chegar a deter-minados sítios, como a bancos e a outras instituições às quais temos que nos deslocar no dia-a-dia. 2 – Eu penso que no geral é tudo...3 – Acho que sim, ainda que aqui na nossa cidade é um pouco

difícil dada a estrutura da cidade, mas de qualquer forma deveria haver mais acessibili-dades para deficientes…4 – Seria necessário arranjar formas de acesso mais fácil para que as pessoas com defici-ências possam chegar onde pretendem.

Elisabete Pedro28 anosProfessora

1 – Penso que aqui no centro não, mas à volta sim. Vir para o centro é muito difícil.2 – Sim, os bancos, por exemplo.3 – Sim, deveria haver uma maior preocupação com esta situação.4 - Penso que deveria haver uma maior atenção para que em cada edifício houvesse rampas de acesso para deficientes.

João Carvalho20 anos Estudante

1 – Considero sim, porque, tendo Abrantes esta estrutura ar-quitectónica, torna-se difícil a livre deslocação de pessoas com deficiências motoras ou invisuais.2 – Sim, a Escola Superior de Tecnologia de Abrantes.3 – Claro que sim, penso que deveria haver uma maior sensi-bilização e até respeito pelos deficientes motores, invisuais e idosos.

4 – Acho que devia haver uma maior preocupação com este problema e, neste sentido, proceder-se à construção de acessibilidades em todos os edifícios públicos.

Armando Nunes de Oliveira69 anosComerciante

1 – Considero sim, porque há muitas entradas com escadas que dificultam o acesso a deficientes.2 – Sim, os correios, por exemplo.3 - Penso que sim, deveria haver uma maior atenção nas ques-tões urbanas para deficientes, pois eles, como todos, também têm o direito de andar livremente na rua.4 – É preciso ir-se recuperando certas vias e edifícios para

poder dar acesso a pessoas deficientes ou idosas, mas uma coisa com tempo, e não começarem-se as obras e depois deixá-las a meio.

Câmara. Para além da estrutura da cidade, a própria autarquia é difícil acesso

PATRÍCIA MARQUES

dia-a-dia são “os carros mal estacionados, os postes no meio dos passeios, os cantei-ros no meio das praças sem sinalização para invisuais”.

Os idosos com dificuldades de mobilidade sofrem tam-bém a dura realidade das bar-reiras arquitectónicas. Maria José Redondeiro, directora da Santa Casa da Misericórdia de Abrantes, afirma que os gran-des entraves de mobilidade para os idosos são “os solos acidentados, o piso escorrega-dio e as escadas que dão acesso à maior parte dos edifícios pú-blicos”. A instituição tem cerca de 45 idosos em apoio domi-ciliário, a sua grande maioria paraplégicos ou com graves deficiências motoras, aos quais também faculta o transporte. Esta instituição pretende au-xiliar aqueles que se sentem discriminados pelas barreiras arquitectónicas e que, por isso, se vêem impossibilitados de realizar a sua vida normal e livremente.

Grande parte destes proble-mas devem-se aos arquitectos, afirma Maria José Redondei-ro: “Deveria haver uma maior sensibilização por parte dos arquitectos que, na sua grande maioria, não pensam nos aces-sos para os deficientes quan-do projectam os edifícios. O próprio edifício da Santa Casa da Misericórdia foi construí-do, inicialmente, sem rampas de acesso para as cadeiras de rodas. Nos dois anos seguin-tes à sua construção tiveram que se proceder a obras para a construção de acessos, já que o arquitecto responsável não pensou no destino de um edi-fício como este”.

1 – CONSIDERA QUE O URBANISMO DA CIDADE DE ABRANTES CONSTITUI UM ENTRAVE À DESLOCAÇÃO DIÁRIA DE UM DEFICIENTE MOTOR, VISUAL OU OUTROS?

2 – TEM CONHECIMENTO DE ALGUMA BARREIRA ARQUITECTÓNICA FLAGRANTE NA CIDADE DE ABRANTES?

3 – TENDO EM CONTA ESTA REALIDADE, PENSA QUE DEVERIA HAVER UMA MAIOR SENSIBILIZAÇÃO PARA ESTE TIPO DE PROBLEMAS?

4 – NA SUA OPINIÃO, QUE INICIATIVAS PODERÃO SER TOMADAS NO SENTIDO DE SOLUCIONAR ESTE PROBLEMA?

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ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 13G E R A L

Antecipar as situações de riscoTorna-se cada vez mais importante nos dias de hoje prevenir as crianças e jovens das situações de risco a que estão expostas, como a delinquência e a toxicodependência, através de um trabalho de parceria entre pais, escola e instituições sociais. Ideia defendida ao longo de dois dias de trabalhos que reuniram diversos técnicos.

A necessidade de trabalhar em parceria, dialogar e pro-mover uma maior abertura e colaboração de todos foi o centro do debate das II Jor-nadas Sociais do concelho de Abrantes. Durante dois dias estiveram presentes nesta ini-ciativa da Câmara Municipal de Abrantes diversas indivi-dualidades representantes de várias entidades sociais.

A “Intervenção Precoce em Situação de Risco na Infância e Juventude” foi um dos qua-tro painéis destas Jornadas. Em debate estiveram os pro-blemas da delinquência e da toxicodepência, o abandono e o absentismo escolar como

principais situações de ris-co para as crianças e jovens. Apesar dos direitos legais que os protegem, ficou claro que cabe à família e à escola o principal papel de diminuir os factores de risco e impedir que se tornem delinquentes. Compete à escola o papel de encontrar a solução do pro-blema, e não de o provocar, porque a existência de uma Comissão de Protecção de Crianças e Jovens em risco não chega a todos.

“Os jovens necessitam de aprender tarefas tão simples como fazer a cama, dizer bom dia ou dizer obrigado”, afirmou Ismael Margarido,

coordenador da equipa de Abrantes do Instituto de Rein-serção Social. Por seu turno, Paulo Macedo, da Comissão Nacional de Protecção de Crianças e Jovens (CNPCJ), salientou que é necessário “dar voz às crianças”, assim como preocuparmo-nos com elas e estar atentos a “situações que ponham em causa a saúde da criança, porque ela põe-se em perigo a si própria”. Ten-do em conta que hoje em dia “vivemos numa sociedade de risco”, a CNPCJ tenta anteci-par a situação de risco “tendo os pais como parceiros”.

“Para que as crianças es-tejam bem, os pais têm que

estar bem”, afirmou Júlia Tavares, presidente da As-sociação Portuguesa de Pais Intervenientes na Prevenção, abordando o papel da famí-lia. Na opinião desta especia-lista, a prevenção passa tanto pelo apoio à família como às crianças e jovens. No entanto, “os factores de risco estão em vantagem comparados com os factores de protecção”.

O painel “Desenvolvimento Local como Factor de Inclu-são” mostrou uma realidade ainda muito carenciada: falta de disponibilidade dos cida-dãos para a participação, fal-ta de equipamentos de apoio social dos Serviços da Segu-

rança Social, falta de famílias de acolhimento de idosos e uma necessidade de um forte investimento no combate à pobreza e à exclusão social.

Do último painel, “Soli-dariedade e Cooperação”, retirou--se a importância fundamental das Instituições Particulares de Solidariedade Social que constituem hoje em dia um meio indispen-sável à sociedade, com cerca de 70% da acção social a ser exercida através delas, mas com a necessidade de ter o Estado como seu parceiro.

A anteceder a sessão de encerramento destas II Jor-nadas Sociais, realizadas em

Outubro, Humberto Lopes, membro da direcção do Cen-tro de Recuperação Infan-til de Abrantes, procedeu à apresentação das conclusões, onde se destacou que “em parceria é mais fácil vencer o desafio para o século XXI”. Concluiu-se também que “as parcerias devem ser encara-das como uma oportunidade para estimular as pessoas”, sendo necessário “uma rede de informação para evitar a duplicação de projectos” e para possibilitar “a poupança de meios humanos e finan-ceiros que podem ser cana-lizados para outras acções”. A.C. E A.R.

Até que ponto o concelho de Abrantes necessita deste tipo de divulgação?

O concelho de Abrantes é um con-celho como todos os outros. Em todos os países existem carências sociais que têm que ser resolvidas. Estas Jornadas são uma aposta do concelho. Não é que Abrantes tenha mais problemas que os outros concelhos, temos os mesmos problemas que terão os nossos vizinhos. Problemas ligados à terceira idade, às crianças e jovens em risco, problemas de toxicodependência. Talvez aqui te-nhamos mais problemas que Constância ou Sardoal, porque somos mais. Mas a problemática social é hoje uma proble-mática que está na ordem do dia.

Há 10 anos realizaram-se as pri-meiras Jornadas Sociais do Conce-lho de Abrantes. Porquê dez anos de intervalo entre as duas Jornadas?

Há uns tempos atrás andava a dar uma volta nos jornais antigos que tinha lá em casa e dei-me conta que tinha havido umas primeiras jornadas sociais há dez anos. E depois pensei que era bom fazer um balanço daquilo que foi feito, porque até coincide mais ou menos com o fim deste ciclo da Câmara Municipal. Embora eu esteja aqui só neste mandato, o Presidente da Câmara está aqui há dez anos, e pensei que ao fim deste percurso fosse bom fazer um balanço.

Desde as primeiras Jornadas hou-ve alterações?

Houve alterações significativas nos equipamentos que temos no conce-lho, que dão apoio à terceira idade, à

Ana Coutinho e Ana Ricardo

ANA COUTINHO

Isilda Jana. “Há dez anos não havia nenhuma técnica social a trabalhar a tempo inteiro na área social”

“A problemática social é tão complexaque precisa do apoio dos outros”As instituições precisam de trabalhar em parceria. “Não podemos resolver os nossos problemas sociais apenas com a nossa instituição”. Este era o grande desafio, na perspectiva de Isilda Jana, Presidente do Conselho Local de Acção Social, para as

II Jornadas de Sociais do Concelho de Abrantes.

| ENTREVISTA | ISILDA JANA, PRESIDENTE DO CONSELHO LOCAL DE ACÇÃO SOCIAL

II Jornadas Sociais do Concelho de Abrantes – Um Desafio para o Século XXI

infância e à juventude. Grande parte destes equipamentos é sobretudo destes últimos dez anos. Por exemplo, nós hoje temos uma Comissão de Protecção de Menores, que funciona com um con-junto de parceiros que acompanham a problemática de crianças em risco no concelho. Há dez anos não se falava da problemática social, este percurso foi muito significativo, não só no concelho de Abrantes, mas a nível nacional.

Esta iniciativa é uma maneira de consciencializar as pessoas de que os problemas sociais existem?

Exacto. Podemos pensar que há uns anos atrás estes problemas existiam, só que não se sabia deles. Não havia Comissões de Protecção, as coisas es-tavam um pouco encobertas. Hoje em dia aparecem com muita frequência na comunicação social. Não há dúvida que nos últimos anos essa problemática tendeu a suscitar um maior interesse e é necessário por parte da sociedade um maior investimento nas pessoas. Há dez anos não havia nenhuma técnica social a trabalhar a tempo inteiro na área social. Da maneira como as coisas se alteram, as instituições vão sendo obrigadas a dar resposta a determinadas situações.

Quais os principais objectivos destas II Jornadas?

Pegámos no balanço das I Jornadas realizadas em Mação, que tinham co-mo conclusão a necessidade de traba-lhar em parceria, e pusemo-la como título – Redes e Parcerias. Queremos dar a ideia de que não podemos resol-ver os problemas sociais apenas com a nossa instituição, a problemática social é tão complexa que precisa do apoio dos outros. Daí a importância das redes sociais, e é este o desafio destas II Jornadas.

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14 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 G E R A L

É possível acreditar num ensi-no totalmente gratuito, onde as crianças possam aprender mes-mo sem terem possibilidades fi-nanceiras para tal? Não se trata de uma ideia futurista, muito menos de uma utopia, mas sim de uma realidade posta em prática pela Escola Básica 2/3 de Canedo, dis-trito de Santa Maria da Feira. Em vez de se dar poucos livros aos alunos carenciados, empresta-se muitos livros a todos e, no ano seguinte, são reutilizados.

À primeira vista uma escola igual a tantas outras. Como é sexta-feira à tarde, está tudo

bastante calmo, sem a correria e o ruído habitual num estabe-lecimento de ensino. Mas esta aparente calma termina quando se transpõe a porta da sala do Conselho Executivo. Apesar do fim-de-semana estar à espreita, ainda há muito trabalho a fazer. Com uma simpatia contagiante, um dos membros deste órgão de direcção disponibiliza-se imediatamente para explicar o projecto adoptado, que tem sido um sucesso.

No início do ano lectivo são entregues aos alunos que bene-ficiam de apoio da Segurança Social os livros devidamente encadernados, como também o restante material necessário

para todo ano. Mas como? “Os livros são emprestados. No fim do ano, se estiverem danificados ou se quiserem ficar com eles, pagam apenas 20%”, adianta a professora Quieta Ferreira, im-pulsionadora deste projecto.

A ideia do desperdício e da falta de rigor no controlo de quem realmente beneficia de apoio social atormentavam a responsável por esta iniciativa. Após a saída de um despacho do Governo, eis que a ideia inicial de uma educação a custo zero poderia ser posta em prática. Anteriormente eram dados aos alunos três a quatro livros. Neste momento dão-se todos aos alunos mais carenciados. De

uma forma bastante expressiva e com um sorriso rasgado, Quieta Ferreira explica: “Agarrei com unhas e dentes este projecto”.

No primeiro dia de aulas os alunos beneficiados levam um saco devidamente identificado com o material atribuído. Assim, os alunos do chamado escalão A têm direito à totalidade dos livros bem como a todo o ma-terial, os de escalão B levam dois dos quatro livros pretendidos. No final do ano, os livros são todos entregues e assim servirão para os alunos que virão a seguir. Em alternativa estarão expostos na biblioteca ao dispor de todos. “Se um professor quiser dar algum tema do ano anterior, ao aluno

basta ir à biblioteca e requisitar o livro”, esclarece a docente.

Determinados pais não per-cebiam bem como era possível a escola conseguir dar tanto mate-rial, quando nos anos anteriores o processo era diferente. De uma forma simples: os livros, ao se-rem entregues no final do ano, servirão para outros alunos e aqueles que os quiserem com-prar podem-no fazer por um valor simbólico. Anteriormente os alunos beneficiados que não transitavam de ano voltavam a ter livros novos. Assumindo que “estamos numa sociedade de desperdício”, a responsável explica que desta forma isso não acontece, tal como se começa a

conceber a ideia de responsabi-lidade. Como os livros são em-prestados, os alunos têm muito mais cuidado pois sabem até que se reprovarem terão os mesmos: “Aprenderam que o livro é um bem precioso”.

O projecto tem sido um su-cesso e dele têm nascido muitos frutos, dando-se a certeza que por pouco tempo todos os alu-nos da escola terão a totalidade do material e não pagarão nada. A partir do próximo ano esta iniciativa irá ser posta em prática por todas as escolas a nível na-cional. A escola de Canedo foi a pioneira e transformou o sonho inicial de uma educação gratuita numa forte realidade.

Ensino gratuito, uma realidadeLaetitia Fernandes

Luís Filipe Pereira, mi-nistro da Saúde, inaugurou, no dia 24 de Novembro, no Hospital de Abrantes, a nova maternidade do Cen-tro Hospitalar Médio Tejo (CHMT). Dimensionada e preparada para servir os 240 mil habitantes da região, a nova maternidade tem capa-cidade para acolher as cerca de 2200 mulheres que, anu-almente, dão à luz na área de influência do Médio Tejo, assim como, em Vila de Rei e Ponte Sôr.

A nova maternidade está equipada com 30 camas de elevada qualidade e cinco sa-las individuais que permitem que o marido da parturiente a acompanhe. Outra novidade é a existência de circuitos orga-nizados para permitir maior privacidade. No serviço foi instalada uma moderna cen-tral de monitorização do tra-balho de parto que permite o acompanhamento e vigilância

contínua das parturientes e bebés. A maternidade conta ainda com um bloco cirúrgico para a realização de cesarianas e com excelentes condições técnicas de reanimação, ven-tilação e transporte de recém nascidos. Para breve prevê- -se a progressiva introdução de analgesia do trabalho de parto.

Joaquim Esperancinha, presidente da direcção do CHMT, explica que este novo serviço “visa garantir, a to-da a população, as melhores condições de acolhimento e

atendimento, quer seja em ambulatório, quer seja em internamento”.

Segundo Luís Filipe Perei-ra, a maternidade apresenta excelentes condições e me-lhor qualidade para as par-turientes, sendo detentora de tudo aquilo que é necessário em termos de actividade.

Representando um esforço financeiro de 2.078.947,96€, cujo financiamento foi de 25% por parte do PIDDAC e 75% por parte do FEDER, a nova maternidade constitui uma forte aposta que con-tribui para a harmonização da qualidade das infra-estru-turas nas três unidades do CHMT.

Joaquim Esperancinha revela ainda alguns indica-dores relativos ao CHMT respeitantes ao ano de 2004, afirmando que os resultados são animadores: “Acima de tudo, por traduzirem maior e melhor satisfação das ne-cessidades das populações, mas também, porque foram obtidos a partir da melhoria da utilização de recursos”.

Nova maternidade em AbrantesSónia Pacheco

Depois de 16 anos à espera de uma sala de espectáculos, a população do Sardoal dis-põe agora do Centro Cultural Gil Vicente. Este equipamento foi inaugurado no dia em que também abriu a Piscina Co-berta para Aprendizagem. A inauguração dos dois equipa-mentos contou com a presença de Henriques Chaves, então ministro-adjunto do primei-ro-ministro, e de José Cesário, Secretário de Estado da Admi-nistração Local.

Na comitiva estava ainda o governador civil de Santarém, Mário Albuquerque, e o presi-dente da Câmara do Sardoal, Fernando Moleirinho.

O dia da inauguração re-presenta “o fim de um sonho que foi passando através de gerações sardoalenses, que souberam sempre manter viva a chama da esperança”, frisa Fernando Moleirinho. O presidente da Câmara recorda o velho cine-teatro Gil Vicente, que foi demolido: “Cremos que com o demolir daquelas pa-redes, muitas lágrimas foram derramadas, muito talento foi

soterrado por aquelas pedras”. Assim, este novo equipamen-to apresenta-se com o intuito de avivar a arte e a cultura do Sardoal, tal como de dar opor-tunidade aos vários grupos artísticos de se exprimirem. Para os sardoalenses é a possi-bilidade de voltarem a assistir a um espectáculo em espaço fechado, o que não acontece desde 1988.

Fernando Moleirinho evi-dencia ainda a importância de se usar cada vez melhor o dinheiro dos contribuintes, na certeza de que a cultura é um pólo de enriquecimento. O Centro Cultural Gil Vicente encontra-se actualmente em funcionamento. No entanto, até Dezembro de 2004 ainda espe-rava a inspecção das Artes e Es-pectáculos. Assim, só depois de toda a burocracia estar comple-ta é que se dará início à explora-ção do espaço. Até então foram realizados 10 espectáculos de música, dança e teatro com entrada livre, assim como três exposições, registando-se uma forte adesão da população. Este equipamento representa um

investimento final de 2.500.000 euros, sendo 25% encargo da Câmara Municipal de Sardoal e o restante teve a participação de 40% do FEDER e 35% do Poder Local.

A Piscina Coberta para Aprendizagem, para além de acolher desporto escolar, estará aberta à população em geral, em especial, às dezenas de idosos do concelho que até agora tinham de se deslocar ao vizinho concelho de Ferreira do Zêzere. Funcionará através da Escola Municipal de Nata-ção, estando ao dispor várias modalidades de ensino. Exis-tirá também um horário para utilização livre. Mas, apesar de já existirem mais de 100 inscri-tos, as Piscinas, até Dezembro de 2004, ainda não tinham entrado em funcionamento. Esperava-se que a qualquer momento a EDP viesse “dar à luz”. A Piscina Coberta para Aprendizagem representa um esforço financeiro de 600.000 euros, 10% dos quais suporta-dos pela Câmara Municipal, 65% pelo FEDER e 25% pelo Poder Central. S.P.

Sardoal inaugura Centro Cultural e Piscina Coberta

O trabalho desenvolvido pela Escola Superior de Tec-nologia de Abrantes (ESTA), durante os seus cinco anos de existência, foi reconhecido com a atribuição do prémio Educação na II Gala da Rá-dio Antena Livre. Esta é uma iniciativa que visa contemplar personalidades e instituições da região de Abrantes com os troféus António Botto.

O responsável pela ESTA, Eugénio de Almeida, ao re-ceber o prémio na categoria Educação, fez questão de frisar que esta foi uma ho-menagem à instituição. Um prémio que pertence a todos os funcionários, docentes e principalmente aos alunos, “a

principal razão de existência da ESTA”.

Foram ainda atribuídos Troféus António Botto nas categorias Cultura, Empresa, Ciência, Desporto, Música, Carreira, Comunicação Social e Personalidade.

José Alberto Marques, um poeta da região com 50 anos de carreira, recebeu o prémio Cultura. O prémio empresa foi entregue ao Sistemas e Téc-nicas Industriais, LDA(STI). O centro Ciência Viva, em Constância, foi homenagea-do na categoria Ciência e, no desporto, o Abrantes Futebol Clube foi a instituição galar-doada.

Joana Amendoeira, uma jovem fadista, viu reconhe-cido o talento da sua voz ao receber o troféu na categoria

ESTA homenageadana categoria EducaçãoRita Pimentel Música. O Galardão Carreira

foi recebido pela esposa do ex-coordenador de gestão documental do Arquivo Mu-nicipal de Abrantes, Eduardo Tavares Campos, falecido em Novembro do ano passado, e agora homenageado pelo que fez em vida. A categoria de Comunicação Social teve co-mo representante o abrantino Orlando Dias Agudo, do “Do-mingo Desportivo”. O último troféu foi entregue a Eduardo Catroga, ex-ministro das Fi-nanças, que foi distinguido pela sua personalidade.

A II Gala Antena Livre, Troféus António Botto, ter-minou com um espectáculo musical na voz de Vera Man-tero, nas cordas de Pedro Pinto e nas letras de Caetano Veloso. Piscina. Um equipamento que vai servir toda a população

Luís Filipe Pereira

SÓNIA PACHECO

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Considera-se um crítico da te-levisão portuguesa actual. Hoje, o que é notícia? Será que existe hoje uma lógica de interesse do público que se sobrepõe à lógica do interesse público?

Hoje o que acontece essencialmen-te nas notícias é o espectáculo. Há uma espectacularização da vida pú-blica. Se uma televisão tiver imagens fortes, seja sobre um crime, seja sobre um acidente, seja sobre incêndios, seja sobre pancadaria no futebol, é isso que abre um telejornal. É muito mais a lógica da força das imagens do que propriamente a relevância da notícia. Os nossos noticiários são todos iguais. As diferentes televisões começam quase sempre todas com as mesmas notícias, fazem todas os mesmos directos, mesmo não tendo lá qualquer conteúdo informativo. Isso mostra que nós temos uma tele-visão ainda muito débil do ponto de vista informativo.

Sendo há muito um defensor de que o Estado não deveria deter qual-quer tipo de meio de comunicação social, como reage à alegada inten-ção do Governo de Santana Lopes de controlar os media?

Eu acho que este Governo mostrou desde início uma grande atenção às matérias de comunicação social, ao ponto de ter atitudes um pouco ridí-culas, como fazer comunicados sobre a sesta ou não sesta do primeiro-mi-nistro. Deu sempre muita atenção à imagem, ao modo como passava

nos órgãos de comunicação social. E infelizmente, na questão do professor Marcelo Rebelo de Sousa, mostrou uma apetência para calar uma voz crítica, coisa que conseguiu. E isso é preocupante. Tudo isto foi feito com grande confusão, com muita trapa-lhada, com alguma incompetência e eu acho que apesar de tudo seria bom que o Governo compreendesse que numa sociedade democrática moderna não se controla meios de comunicação social.

Acredita que com a compra por parte de grandes grupos económi-cos de diversos meios de comunica-ção social os seus critérios editoriais poderão ser prejudicados?

O problema que se passa hoje não é tanto que a imprensa privatizada faça parte de grupos económicos, é que esses grupos económicos depen-dem demasiado do Estado para todas as decisões fundamentais dos seus negócios. Isso dá ao Estado maneira de pressionar esses grupos econó-micos. É essa relação entre o poder do Estado e a fragilidade dos meios de comunicação social que eu pen-so que é preocupante na sociedade portuguesa.

Considera censura a saída do professor Marcelo Rebelo de Sousa da TVI?

Considero.Por parte da estação ou por parte

do Governo?Em primeiro lugar, é difícil apurar

responsabilidades, não da estação, mas dos donos da estação ou do Governo. A verdade é que há uma pressão pública e essa pressão teve efeito.

G E R A L

Bruno Ramalho e Tiago Godinho

“Nós vivemos numa socieda-de fechada e ainda se torna mais fechada quando o Estado inter-vém” – defendeu Pacheco Pereira, em Abrantes, numa palestra or-ganizada pela Escola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA). Com esta palestra inaugurou-se o segundo ciclo de conferências “Comunicar a Direito”.

Perante uma numerosa plateia de estudantes do curso de Comu-nicação Social, o ex-deputado de-fendeu que “o Estado mantém uma excessiva presença nos meios de comunicação social em Portugal”. Mesmo ressalvando o facto de a TVI ser uma estação privada, Pa-checo Pereira apresentou o “caso” do professor Marcelo Rebelo de

Sousa como exemplo dessa “ex-cessiva presença”.

O agora professor alertou para o facto de os media se depararem com três grandes problemas, desta-cando o último problema, que diz respeito às novas tecnologias. Se-gundo Pacheco Pereira, “as tecno-logias afectam a nossa sociedade”. O ex-deputado considera mesmo que o telemóvel é o instrumento que mais mudou a nossa socieda-de, de tal forma que “hoje não é socialmente admissível não estar sempre disponível para atender o telemóvel”. E deu como exemplo a nova geração de telemóveis que são equipados com sistema GPS, que nos vigia e observa onde quer que nos encontremos.

Outro grande problema da ac-tualidade portuguesa, aos olhos do comentador, prende-se com o facto de a maioria da população do nosso país atribuir muito pouca importância à leitura de jornais e estar habituada a ver má tele-visão. Para Pacheco Pereira, hoje em dia, a escola do 1º ciclo devia ensinar a ler, escrever, contar e ver televisão.

Em destaque na palestra esteve também a ideia de que, hoje em dia, “as notícias mais importantes passam em rodapé e não com ima-gens”. Pacheco Pereira acrescenta que a posição de destaque nos no-ticiários passou a ser da “situação engraçada” e da “frase assassina”. B. R. e T. G.

“O Estado mantém uma excessiva presença nos meios de comunicação”

| ENTREVISTA | PACHECO PEREIRA, PROFESSOR E EX-DEPUTADO

Na televisão portuguesa, “o que acontece essencialmente nas notícias é o espectáculo”. Quem o diz é Pacheco Pereira, o social-democrata que

também critica o ainda Governo de Santana Lopes. O ex-deputado e agora professor diz que “tudo tem sido feito com grande confusão”. Em relação ao “caso Marcelo Rebelo de Sousa”, Pacheco Pereira considera que a

saída do ex-comentador da TVI foi uma forma de “censura”, afirmando ainda ter havido pressões por parte do Governo.

Pacheco Pereira. “A escola do 1º ciclo devia ensinar a ver televisão”

“Os grupos económicos

dependem demasiado do

Estado para todas as decisões fundamentais dos

seus negócios”TIAGO GODINHO

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“Temos uma televisão ainda muito débil do ponto de vista informativo”

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16 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005

O seu mais recente livro tem co-mo temática o processo de inde-pendência timorense ocorrido em 1999. Por que é que só agora lança um livro?

Porque eu acompanhei a indepen-dência. Ela ocorreu de 19 para 20 de Maio de 1999 e eu permaneci lá os 30 dias que se seguiram. Voltei lá ao fim de um ano, permanecendo 40 dias. Terminei o livro em Dezembro de 2003 e, por razões da programação das editoras, o livro saiu em Abril de 2004, na Editorial Notícias, e em Maio, no Círculo de Leitores. O livro é acerca do primeiro ano da indepen-dência de Timor, e não só sobre o dia da independência.

Quais foram as razões que o levaram a escrever sobre a causa timorense?

Imagine que tinha a possibilidade de presenciar e acompanhar em 1143 o primeiro da independência de Por-tugal, é uma experiência única. No século XXI já não são assim tantos os países que acedem à independência, e este foi o primeiro país do século XXI. E é o primeiro que sai de uma longa e sangrenta luta. Há ali alguma coisa… Ainda mais com este mistério de 15 mil quilómetros de distância, há toda uma ligação a Portugal. Há um conjunto de componentes que me entusiasmam há já muitos anos, e que me levaram a achar que, nem que seja daqui a 850 anos, alguém que queira saber como é que se viveu o primeiro dia de independência de um país desses, é capaz de ser interessante registar esse momento.

O título do livro é algo curioso e que só o entende quem lê o livro. Porquê “As flores nascem na pri-são”?

O título é uma das histórias que vêm contadas no livro, e é uma histó-ria muito tocante e que eu considerei que é uma metáfora à situação timo-rense porque os antigos presos po-líticos constituíram uma associação e andavam à procura de uma sede. Decidiram fazer da antiga prisão, que já era prisão no tempo colonial português, sede. Essa sede foi re-construída com dinheiro japonês e reconstruída de tal maneira que mantiveram os sinais das diferentes camadas de presos que passaram por ali: os presos do tempo colonial português, os primeiros presos de-pois da independência, os que foram presos mais tarde, os próprios presos indonésios militares. É uma espé-cie de templo do sofrimento. E na primeira reunião que houve desses presos nessa cadeia, eles acharam que ali poderia ser talvez também a sede da Comissão de Reconciliação, Acolhimento e Verdade, que é uma instituição de reconciliação entre todos, vítimas, carrascos e outros. Nessa reunião um padre que lá este-

ve a dar assistência afirmou: “Depois, quando nós formos independentes, até as flores vão nascer na prisão.” E no dia em que me contaram essa história eu estava na sede dessa ins-tituição e vi um ibisco muito bonito e perguntei quem é que havia plan-tado ali aquela flor. Contaram-me que quem cuidava daquele jardim era uma rapariga hoje com 20 anos que tinha estado presa com a mãe, quando tinha quatro ou cinco anos. Foi obrigada, num dos momentos mais terríveis do sofrimento, a tor-turar a própria mãe. Depois da inde-pendência essa rapariga tornou-se membro da polícia numa unidade de luta contra a violência domés-tica. Achei isto muito interessante, porque tem a ver com esta tentativa de superação de um povo de todos os traumas colectivos.

O livro é uma obra literária ou jornalística?

O livro é uma reportagem e a re-portagem às vezes tem um pouco de literatura. Tem todos os géneros jornalísticos, crónicas, entrevistas e o diário. É uma escrita que não está limitada a um espaço como é próprio no jornalismo. No jornalismo estamos sempre limitados, tanto pela urgência da escrita, quer por um espaço. Aqui posso escrever mais e dedicar-me a ter preocupações da ordem “ literá-ria,” mas não é literatura.

Descobriu o jornalismo aos 22 anos na rádio, mas destaca-se pelo trabalho elaborado na imprensa nacional. Como ocorreu essa pas-sagem, qual o seu percurso?

Para mim há somente jornalismo

e este pode ser exercido na rádio, na televisão, nos jornais, numa agência, mas o que há é jornalismo, trabalha-mos sobre notícias. Eu comecei na rádio e antes de começar tirei um pequeno curso. Na altura não havia cursos universitários em Portugal de jornalismo, e o primeiro curso que houve em Portugal, em 1966, foi no Diário Popular. Foi um curso de três meses para pessoas que queriam ser jornalistas. Comecei por estagiar num jornal e depois fui para a rádio, porque gostava muito da rádio e tra-balhei lá durante muitos anos. Mas escrevi sempre alguma coisa, nunca estive fora da imprensa. Mas depois,

em 1969, voltei a tirar um curso, nes-sa altura de um ano, de jornalismo escrito. Em 1975 fui para a televisão e depois voltei para a rádio. Gosto muito de estar na imprensa escrita, onde estou há 15 anos, fazendo só uma pequena pausa de dois anos para voltar à rádio. Eu sempre fui jornalista.

Sempre acompanhou climas de tensão, primeiro o 25 Abril, depois a Indonésia, agora a causa timorense. O clima de tensão atrai-o?

Sim, mas também é verdade que são muito importantes as primeiras coisas que fazemos. Logo nos anos 60 e princípios de 70 comecei a fa-zer reportagens fora de Portugal e é natural que goste de grandes repor-tagens. Gosto da reportagem onde se passa verdadeiramente alguma coisa. E depois sempre tive oportu-nidade de fazer isso. Primeiro na fase do 25 de Abril, depois fui para Angola (porque estava na televisão), depois fui para Timor. É natural que depois fique ligado a Timor, mas podia fazer outras coisas.

Como foi a experiência como director?

Fui, logo após o 25 Abril, director da informação na RDP, e depois di-rector adjunto do Público, mas nunca me dei bem com nenhuma dessas funções. Eu sinto-me melhor como jornalista de base .

Como vê o jornalismo antes e após o 25 de Abril?

Verdadeiramente não havia jor-nalismo antes do 25 de Abril, havia actividade jornalística. A existência de censura era a negação burocrática

G E R A L

“Ser jornalista é ter o privilégio de estar onde as outras pessoas não estão”Adelino Gomes é uma das referências do jornalismo nacional uma vez que testemunhou o 25 de Abril, o início da guerra civil em Angola e a independência de Timor. Foi a ligação à terra do sol nascente que trouxe o repórter a Abrantes. Veio lançar o seu livro “As flores que nascem na prisão”. Uma obra que junta as técnicas jornalísticas às histórias únicas de quem assistiu

ao “nascimento do primeiro país livre do século XXI”, Timor Lorosae.

Sandra Fernandes PerfilAdelino Clemente Gomes nasceu a 10 de Agosto de1944, é casado e tem dois filhos.É jornalista redactor-principal no diário Público, de que foi director-adjunto entre Setembro de 1998 e Junho de 2000. Trabalhou du-rante mais de duas décadas em noticiários e programas da RDP (de que foi director de informação entre Dezembro de 1995 e Julho de 1997). Entre 1966 e 1975 esteve no Rádio Clube Português, onde desempenhou funções de chefe de redacção.Prémios e distinçõesUma dezena e meia de prémios jor-nalísticos individuais e colectivos, entre os quais oito por reportagens feitas em Portugal, Israel/Palestina, Guerra do Golfo e Haiti, o prémio Bordallo para Rádio da Casa da Im-prensa (1998), e os prémios “Carrei-ra” do Clube de Imprensa (1997) e “Manuel Pinto de Azevedo Jr - 2001” de “O 1º de Janeiro”. Comenda da Ordem do Infante, distinção rece-bida durante o segundo mandato presidencial de Mário Soares.

Adelino Gomes. “Não percam um dia. Aprender é aprender na universidade e na universidade da vida”

política anti-jornalismo. Fazia-se um jornalismo, mas era um jornalismo sob vigilância. Éramos jornalistas vigiados e não só pela censura oficial, porque esta não era a única forma de condicionamento. Mas era a mais terrível. Para a minha geração, pa-ra a geração que tinha 30 anos (eu tinha 29), o 25 de Abril represen-tou a aprendizagem da profissão em liberdade política. Foram momen-tos exaltantes. Antes havia também grandes jornalistas, mas estavam condicionados exteriormente por esse constrangimento legal .

Qual é o conselho que dá a essa nova camada de profissionais do jornalismo?

Enquanto forem estudantes não percam um dia sem aprenderem coisas, porque depois vão ter que aprender todos os dias. É uma pro-fissão absolutamente exigente em que mesmo depois que se faça o doutora-mento tem que se continuar a estudar, porque todos os dias tem que se estu-dar actualidade. Não percam um dia. Aprender é aprender na universidade e aprender na universidade da vida. Pensem que por mais competentes que sejam do ponto de vista cultural, a outra questão é a responsabilidade da profissão. Ser jornalista é ter o pri-vilégio, que é dado pela sociedade, de estar onde as outras pessoas não es-tão, ver e relatar o que se passou. Essa responsabilidade deve transformar-se numa devolução nas melhores con-dições daquilo que nos foi dado a ver e, portanto, há aí deveres éticos. Deve haver um enorme esforço de honesti-dade e de decência profissional.

FOTÓGRAFO

| ENTREVISTA | ADELINO GOMES, REDACTOR-PRINCIPAL DO PÚBLICO E AUTOR DE “AS FLORES NASCEM NA PRISÃO“

O livro é uma reportagem e a reportagem às vezes tem um

pouco de literatura.Tem todos os géneros

jornalísticos, crónicas,

entrevistase o diário

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ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 17

Quais os objectivos do novo cur-so?

Os objectivos do novo curso pre-tendem vir preencher uma lacuna que existe na área das tecnologias de in-formação e formar profissionais neste campo, fazendo uma ponte sobre o que são tecnologias, o que é informação e o que significa comunicação.

Está a haver muita divulgação do novo curso?

A grande divulgação do curso vai ser dada com um conjunto de seminários no qual já estamos a avançar. Também vai haver divulgação por parte dos alu-nos e pensamos ir às escolas, mas é algo que ainda está um pouco parado. Não está a haver muita divulgação, mas sim a necessária.

O número de alunos que entrou corresponde às expectativas?

As expectativas são sempre de preen-cher as vagas. Estão um pouco abaixo, esperava-se uns 15 alunos e vieram menos, mas isto deve-se ao atraso que houve na aprovação do curso e penso que os alunos ainda não sabem o que significa Tecnologias de Informação e Comunicação. É o que pretendemos com o curso.

Deram-se muitas alterações na es-cola devido à abertura do TIC?

Neste momento não, mas vão haver al-gumas alterações porque vão ser criados laboratórios, sendo necessário um espaço novo que ainda não é possível, mas julga-mos que para o ano já o teremos.

Foi necessário recrutar novos pro-fessores?

Sim, vieram dois professores. Um para as disciplinas de Programação e outro para a disciplina de Arquitectura de Computadores.

Por que motivos estão a decorrer aulas no edifício Pirâmide?

O que estamos a prever no edifício Pirâmide são os seminários, às sextas-

feiras, porque a Pirâmide, em Abrantes, é um centro de divulgação das novas tecnologias. Como o curso é desta área a intenção é criar uma sinergia com a própria cidade e o edifício ser, através dos seminários, uma zona de trans-missão das tecnologias de informação e comunicação.

Para criar o TIC inspiraram-se em algum curso?

Inspirámo-nos no que o merca-do necessita. Mas é normal que, em função de outro tipo de situações, que se inspirem noutros cursos e em Portugal há poucas escolas com este curso. Porém, em algumas discipli-nas, devido ao que queremos atingir, podemos ir a outros cursos, mas o “grosso” do curso não foi inspirado em nada.

“Inspirámo-nos no que o mercado necessita”Ao fim de cinco anos a Escola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA) criou um novo curso,

Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), com o objectivo de relacionar as novas tecnologias com o mundo da informação. Apesar da pouca divulgação e das dificuldades para a aprovação do curso, já há um número significativo de alunos. Joaquim Pombo, responsável pelo curso, explica as

características de uma formação com carácter inovador.

Catarina Lopes e Vera Catarino

“OS ALUNOS NÃO SE DEVEMDEIXAR ENVERGONHAR”

“Todas as artes são afinal diferentes formas de imitar a natureza”. Foi com esta afir-mação que Aníbal Pinto de Castro, catedrático na Facul-dade de Letras da Universida-de de Coimbra, iniciou o seu discurso. O professor foi con-vidado a proferir a Oração de Sapiência que se realizou no âmbito da Abertura Solene do ano lectivo 2004/2005 do Instituto Politécnico de To-mar (IPT), no passado dia 17 de Novembro.

A cerimónia iniciou-se com o habitual cortejo acadé-mico, seguindo-se o discurso de José Bayolo Pacheco de Amorim, presidente do IPT, que começou por agradecer a presença das autoridades mi-litares e religiosas, bem como a presença de Aníbal Pinto de Castro. O presidente prosse-guiu dizendo que o campo do IPT “é o do ensino e da educação”, ideia que esteve na base do discurso de elogio feito aos alunos que deixam a instituição para seguirem para o mercado de traba-lho. Segundo as palavras de Pacheco de Amorim, “saem bons profissionais”. Depois de fazer uma breve alusão à História da Humanidade e à situação em que nos en-contramos, terminou o seu discurso com uma promessa: “Apesar das dificuldades, o IPT está disposto a continuar a assegurar as necessidades do todos os alunos”.

Como representante dos alunos discursou João Mo-reira, presidente da Associa-ção Académica do IPT, que deixou um alerta: “Os alunos formados neste instituto não se devem deixar envergonhar, uma vez que são tão bons ou melhores que os formados em outras Universidades”.

Aníbal Pinto de Castro co-meçou por agradecer o con-vite de Pacheco de Amorim, justificando aos presentes que tal se deveu à grande fi-delidade e amizade que liga o professor de Coimbra ao presidente do IPT. Apesar de considerar que as Orações de Sapiência se destinam a lou-var uma ciência, Aníbal Pinto de Castro fez algumas refle-xões sobre a relação da Lite-ratura com as Artes Plásticas ao longo do século, concluin-do que “todas as artes eram, afinal, formas diferentes de imitar a Natureza” e que as “Artes Plásticas secundam fielmente a Literatura”.

A Abertura Solene do ano lectivo terminou com um lanche oferecido pelo IPT a todos os convidados, que contou com a animação da Tuna Templária, a tuna mas-culina do Instituto Politécni-co de Tomar.

Cátia Pereira e Patrícia Domingues

| ENTREVISTA | JOAQUIM POMBO, RESPONSÁVEL PELO CURSO DE TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO

Joaquim Pombo. “A intenção do curso é criar uma sinergia com a própria cidade”

CATARINA LOPES

Ano Lectivo

Para os alunos do TIC, que ingres-saram pela primeira vez no ensino superior, o novo curso corresponde às suas expectativas. Contudo, os alunos que vieram por transferência, apesar da sua satisfação, consideram haver falta de material. Ricardo António, um aluno que veio de Tomar, con-cretiza: “Devíamos ter computadores onde pudéssemos ‘brincar’ um bocadinho”. Apesar disso, “o TIC é um curso agradável e interessante”. Por isso pediu transferência para Abrantes. Os “caloiros” João Serrão e João Carreira aludiram para a parte prática do curso, sendo melhor do que outros cursos comparados com o T.I.C. Segundo os alunos, a divulgação do curso foi escassa, pois a informação que obtiveram foi através da Internet. “Tive as informações que estavam disponíveis na Internet no site da escola” – referiu Dinis Pedro. Mesmo com algumas carências que o curso ainda apresenta, por estar em crescimento, professores e alunos esperam que o TIC obtenha o valor me-recido do esforço que tantos tiveram para conseguir trazer este curso para a ESTA.

E S T A

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18 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 E S T A

“Já não estamosno ensino secundário”O sistema de avaliação em vigor na Escola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA) tem causado muitas dores de cabeça aos alunos. Perguntas como “O que é?” ou “Em que consiste?” têm sido uma constante nos corredores, bem como se é realmente novo ou simplesmente uma remodelação. O que é certo é que a discussão está lançada, tanto nos alunos como nos professores.

Daniela Costa e Isabel Delgado

“Se as aulas existem são pa-ra ser dadas e para os alunos participarem” – defende Li-liana Rocha, aluna do 4º ano de Jornalismo, em relação ao regime de faltas e ao sistema de avaliação. Acrescenta ainda que “para sairmos daqui bem preparados temos que partici-par nas aulas, principalmente em jornalismo, em que é pre-ciso saber bem o que se está a fazer”.

Tânia Matos, aluna do 5º ano de Comunicação Empre-sarial, não partilha a mesma opinião: “É muito mau estar-mos a ser fiscalizados a nível de assiduidade porque já somos adultos para termos sentido de responsabilidade”. Explica que não considera justa a pe-nalização pelas faltas às aulas teóricas, mas acrescenta que “nas práticas tem toda a lógica”. Ana Catarina Brandão, aluna do 2º ano de Comunicação Social, discorda neste ponto: “Nas práticas não se devia apli-car o regime de faltas, porque temos de ter consciência que precisamos destas para o nosso mercado de trabalho, optando se queremos ficar bem prepa-rados ou não”.

Este tema tem sido muito discutido desde o início do ano, altura em que o departa-mento de Comunicação Social decidiu fazer uma análise do sistema de avaliação, em vigor nos últimos cinco anos. “Tam-bém nós, no departamento,

definimos que era altura de reflectirmos sobre os aspectos positivos e os aspectos negati-vos que o curso tinha” – afirma Eugénio de Almeida, director da ESTA e do departamento de Comunicação Social, con-siderando ainda que havia “aspectos relacionados com os conteúdos programáticos de algumas disciplinas que ti-nham de ser mais adaptados, melhorados; outros que esta-vam um bocadinho exagera-dos e não faziam sentido”.

Eugénio de Almeida expli-ca que sendo este um curso de Comunicação Social, uma das componentes que tem ne-cessariamente de ser avaliada é a participação. “Os alunos acham que são avaliados pelo

facto de virem ou não virem às aulas, e nós não andamos a ver isso” – sublinha o director do departamento. Conclui-se que o objectivo não é o de fiscalizar a assiduidade dos alunos, mas sim dar-lhes a oportunidade de poderem participar na sua própria formação, ao mesmo tempo que desempenham o seu papel de estudante.

O que é certo é que numa disciplina essencialmente prática, a participação é fun-damental para adquirir os conhecimentos necessários para a futura vida profissional. “Nas cadeiras práticas é fun-damental a presença do aluno na aula”, reconhece Eduardo Pinhão, professor de Tecno-logias de Comunicação II e

de Atelier, elogiando o curso pelo facto de ter uma compo-nente essencialmente prática. José Alves Jana, professor de Psicossociologia, partilha a mesma opinião, acrescentando que o aluno nas aulas adquire o conhecimento necessário pa-ra melhor desempenhar o seu papel, tanto a nível profissional como a nível pessoal.

A componente prática do curso é uma mais valia para os alunos, que encerram a vi-da estudantil de uma forma mais preparada e consciente. A avaliação existe para bene-ficiar e não para prejudicar. Apesar de toda a discórdia, num ponto todos estão de acordo: “Já não estamos no ensino secundário…”

ISABEL DELGADO

Alunos. O objectivo do novo sistema de avaliação da ESTA não é o de fiscalizar a assiduidade

Porquê este novo sistema de avalia-ção?

Este sistema não é novo, foram intro-duzidas algumas alterações em relação ao sistema que existia. Era altura de reflectir sobre os aspectos positivos e negativos. O que se está a quantificar é o facto do aluno participar e ter um certo empenho. Isso tem de ser valorizado. Foi uma decisão do departamento: nas disciplinas mais práticas, os professores entenderam que se os alunos não participam nas aulas têm de ser penalizados; nas teóricas, entenderam que não fazia sentido.

Em que consiste este sistema de ava-liação?

Esta metodologia resulta do que foi pedido pela Declaração de Bolonha. Toda

a avaliação deixa de ser presencial. Tem que haver uma componente de trabalho e de participação do aluno na sua própria

formação. O que está a ser fiscalizado é se o aluno se desenvolve do ponto de vista da sua formação. Em alguns casos essa avaliação pode cair sobre a assiduidade.

É uma mais valia?Eu penso que sim. É preciso ter cons-

ciência de que este ano os alunos do 5º ano começaram a sentir o que é real-mente terminar um curso e ir para o mercado de trabalho. Lá fora a vida é completamente distinta, por muito que nós tentemos simular a realidade, para que o choque não seja tão grande. Te-mos dois objectivos: por um lado, dotar as pessoas de mais competências face a potenciais concorrentes; por outro, forçar a trabalhar porque vão ter de trabalhar muito. D.C. E I.D.

“Tem que haver uma componente de participação do aluno na sua formação”

O ensino superior é um espaço de formação, onde só está quem, efectivamente, quer. Sendo a escola uma instituição feita para os alunos, ao não ha-ver um sistema de faltas que imponha a presença nas aulas, corre-se o risco de se perder es-ta lógica. Levantam-se algumas questões: será que os alunos não devem assumir a respon-sabilidade de pessoas que se estão a preparar para entrar no mercado de trabalho? Os alu-nos que vêm às aulas devem, ou não, ter o direito de ser benefi-ciados em relação àqueles que não assistem às aulas? Será que este sistema não passa de uma estratégia para tornar a ESTA (Escola Superior de Tecnologia de Abrantes) numa instituição credível de ensino superior? Já que se quer levar esse sistema à risca, será que a Escola não deve criar condições para que os alu-nos possam assistir às cadeiras em atraso?

Estas foram algumas das li-nhas de orientação que susci-taram o debate em torno desta matéria. A última questão é aquela que provocou maior controvérsia.

Sendo a assiduidade obriga-tória, tanto por imposição do Regulamento Académico (artº 7º), no caso das aulas práticas, ou por opção dos docentes, no que respeita às teórico-práti-cas (artº 6º), como podem os alunos cumprir se os horários das disciplinas se sobrepõem? Se por um lado é permitido ao aluno reprovar a cinco módu-los semestrais, por outro não lhe é dada a possibilidade de fazê-los no ano seguinte, dada a incompatibilidade de horá-rios, não apresentando, o Re-gulamento, nenhuma solução para o problema.

Contudo, as soluções pode-riam passar por uma redução

da carga horária, bem como por uma adequação dos horá-rios a turnos, ou seja, adoptar um sistema em que as aulas decorressem apenas num perí-odo, manhã ou tarde, de forma a permitir uma maior flexibi-lidade ao aluno para assistir às aulas dos diferentes anos.

Também, poder-se-ia, igualmente, aplicar o regime de presença obrigatória apenas às aulas práticas, tal como está previsto no Regulamento.

No âmbito dessa discussão foram esclarecidas diferentes posições. Assim, para quem defende o actual sistema de faltas há que assumir a res-ponsabilidade de assistir às aulas. Estes argumentam que apenas se encontra no ensino superior quem quer e nesta medida, uma vez assumido o compromisso com uma ins-tituição – efectivado através da matrícula – há que assistir às aulas. Esta mesa sustenta, ainda, que a presença nas au-las facilita a aprendizagem e implica um esforço de estudo menor. De acordo com estes, existe uma relação entre faltas e aproveitamento.

Por outro lado, quem é con-tra o sistema de faltas, diz que cada um deve ser responsável por si próprio. Desde modo, o aluno é livre na decisão de presenciar ou não as aulas. A mesa do contra refere ainda que o facto de se impor aos alunos a obrigatoriedade de ter que assistir às aulas, não faz com que estes tenham melhor rendimento, uma vez que se encontram lá contrariados e não por vontade própria. As-sim, suportam que não deve haver uma relação entre faltas e aproveitamento.

Apesar das posições sobre a matéria serem claras, o sistema de faltas continua a ser um as-sunto bastante discutido, mas sem uma base sustentada que permita o esclarecimento de alunos e docentes.

A responsabilidade de estar presenteA obrigatoriedade de ter de assistir a um mínimo de dois terços das aulas suscitou um debate no seio do quinto ano de Comunicação Social. A questão passa essencialmente pela responsabilidade: para quem defende o regime há que assumir a responsabilidade de assistir às aulas; quem se mostra contra o mesmo advoga que cada um é responsável por si próprio e só assiste às aulas quem quer.

Alexandra Reis e Jorge Martins

Sistema de avaliação causa controvérsia na ESTA

| ENTREVISTA | EUGÉNIO DE ALMEIDA, DIRECTOR DO DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL

Eugénio de Almeida

Regime de faltas na ESTA

Assiduidade. Como podem os alunos cumprir horários?

DR

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ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 19

“Um estagiário é uma pessoa que chega para incomodar”Ana Clara no Jornal “A Capital”, Tânia Matos na Agência de Comunicação Empresarial e Relações Públicas Emirec, Carina Vieira na Rádio Hertz, Sofia Ascenso no Canal 6 da Pluricanal e Luís Sousa na Mitsubishi Fuso Trucks Europe. Alguns dos alunos da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA) que no final do ano lectivo 2003/2004 tiveram oportunidade de “ensaiar” uma entrada no mundo de trabalho. Para alguns deles o que começou por ser um estágio, passou a ser o seu emprego.

“Quando comecei o está-gio achava que ao fim dos três meses me vinha embora”. No entanto, a jovem jornalista Ana Clara, recém-licenciada na Es-cola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA), conseguiu evidenciar-se na redacção da “A Capital”. Confiando sempre no seu trabalho propôs maté-rias e aceitou ir para a secção de política, que não é das mais simples. No final foi-lhe dado o voto de confiança. Agora faz parte da equipa permanente do jornal.

Apesar da sua experiência positiva, Ana Clara conside-ra que “um estagiário numa redacção é um incómodo, é uma pessoa que chega para incomodar, uma pessoa que normalmente chega da facul-dade, não tem experiência, precisa de apoio, de acompa-nhamento”.

Os alunos finalistas de Comunicação Social foram colocados pelo Gabinete de Estágios em função das notas, como exigia o PRODEP (Pro-grama de Desenvolvimento Educativo para Portugal) que financiou uma parte dos está-gios. Consoante as vagas dispo-níveis, os alunos que tiveram a média mais alta escolheram o local onde queriam estagiar. Este grupo teve oportunidade de escolher a área que mais lhe agradava.

Alguns alunos, nomea-damente os que ainda não tinham terminado o curso, entraram em contacto com as empresas por iniciativa pró-pria. Este foi o caso de Sofia

Ascenso: “Fui eu que arranjei o estágio, a escola só entrou na parte do protocolo”. Ainda a dois anos de terminar o curso, achou que seria uma mais valia ter esta experiência “que não se agarra todos os dias”.

Na opinião desta aluna, para alguns dos alunos o estágio é a diferença entre a teoria que a escola oferece e a prática que tiveram que aplicar.

Para Ana Clara e para So-fia Ascenso a teoria, que está em maioria nas disciplinas do curso de Comunicação Social na ESTA, é fundamental e ab-solutamente necessária. No en-tanto, tendo em conta o local onde estagiaram, Tânia Matos e Carina Vieira não sentiram tanto a sua utilidade.

Carina recorda que quando chegou à Rádio Hertz ,em To-

mar, apenas sabia que gostava de rádio e que gostava de se ouvir. Tudo o que sabe agora aprendeu com a prática. Esta é uma situação que resulta do facto de só este ano lectivo ter sido possível à ESTA equipar um estúdio de rádio.

No final do ano lectivo pas-sado o departamento de En-genharia Mecânica também proporcionou estágios aos seus alunos. Um deles foi Luís Sou-sa, que reconhece ter sentido a responsabilidade que o mundo do trabalho obriga. “A maior dificuldade é o primeiro dia de trabalho”, obstáculo que já fintou.

Hália Costa Santos, docente da ESTA e uma das responsá-veis pelo Gabinete de Estágios de Comunicação Social, en-tende que, apesar das dificul-

dades, esta é uma experiência que prepara os alunos para o mercado de trabalho. “Houve alunos que não se adaptaram ao ambiente. Houve outros que estavam à espera de ter mui-to trabalho e tiveram pouco, e outros ainda que estavam à espera de pouco e tiveram muito”. Mas as dificuldades, como sustenta a docente, tam-bém dependem do carácter do aluno e da instituição para onde vão.

Para Tânia Matos a principal dificuldade foi ter de falar ao telefone: “Qualquer falha mi-nha podia pôr em risco a ima-gem da empresa, podia perder um cliente por causa de uma gaffe”. No entanto, o maior obstáculo apontado pelos esta-giários tem a ver com questões financeiras. Os estágios de Co-

municação Social foram na sua maioria em Lisboa e no Porto, o que obrigou os alunos a te-rem gastos com alojamento, alimentação e transporte. Mas, como salienta Hália Costa San-tos, “são os alunos e as famílias que têm de fazer a opção entre ter um estágio e gastar mais algum dinheiro ou não ter o estágio” e perder as vantagens da experiência.

Tanto Tânia como Luís sen-tiram que lhes foi depositada toda a confiança em relação ao desempenho dos seus tra-balhos. O mito de que os es-tagiários fazem tudo menos o trabalho em concreto, para Tânia, não faz sentido: “Sem-pre me senti como parte da equipa e não há aquela coisa de estagiários a tirar café”. Lu-ís é da mesma opinião e faz questão de realçar que fez “ exactamente aquilo que os que lá trabalham fazem”.

No jornal “A Capital” ou na Rádio “Hertz”, o que é real-mente importante é fazer um trabalho rigoroso e credível. Depois disso vem a confian-ça, como aconteceu com Ana Clara ou com Carina Vieira. A frequentar o 5º ano de Co-municação Social, esta aluna conta, com orgulho, que con-tinua a fazer trabalhos para a rádio: “Quando precisam de alguma coisa, contactam-me e isso é sinal que gostaram e que têm confiança em mim”. Esta aluna diz ter encontrado aquilo que realmente quer fazer. Para Sofia, a televisão não é a prioridade. No en-tanto, considera que foi “uma oportunidade rara na área da Comunicação Social” que lhe deu bagagem para viajar mais longe.

Sofia Ascenso. O estágio é uma experiência “que não se agarra todos os dias“

O dinheiro disponibilizado para o pagamento de bolsas dos alunos do Instituto Politécnico de Tomar (IPT) no ano de 2004 não foi suficiente. Um proble-ma que se arrasta há anos e que resultara no não pagamento em 2004 aos alunos bolseiros, da maior parte das bolsas de No-vembro e a totalidade das bolsas de Dezembro, e nalguns casos a totalidade das bolsas de Outubro a Dezembro, nomeadamente dos alunos do do primeiro ano e dos que tiveram a bolsa sus-

pensa por estarem em avaliação. Uma informação adiantada ao ESTA Jornal pelo responsável pelos Serviços da Acção Social (SAS), José Júlio Filipe.

Para além dos atrasos e das faltas de pagamento das bolsas, verifica-se algum descontenta-mento pelo facto de existir uma redução nos valores das bolsas, devido à alteração das regras técnicas, com base nas quais é calculada a quantia atribuída a cada estudante. Essa alteração abrangeu principalmente os alunos cujo agregado familiar tem rendimentos de trabalho independente, ou de socieda-des comerciais, “onde se verifica

mais facilmente fuga ao fisco”.Em entrevista ao ESTA Jor-

nal, o representante do SAS do IPT, José Júlio Filipe, manifestou ser da convicção geral a falta de credibilidade do que consta nas declarações do IRS de trabalho independente, em empresas que sucessivamente, ano após ano, dão prejuízo, e em pessoas com empregos independentes com rendimentos considerados uma perfeita ridicularia, pelo que houve a necessidade de esta-belecer plafonds de rendimentos mínimos a considerar.

A verba atribuída pelo orça-mento de Estado para o finan-ciamento das bolsas, nos anos

anteriores, não era suficiente para fazer face aos valores dis-pendidos e a gestão orçamental era escassa. Em parte, porque os valores orçamentados são di-vididos em 12 meses, quando na realidade apenas se pagam dez meses. Mas esta situação era ultrapassada com desvios de excepção, que permitiam contorná-la, da forma mais conveniente, em termos de te-souraria.

O problema surgiu quando a verba disponibilizada não foi suficiente para pagar os anos económicos anteriores e os valores transitam para os anos seguintes. Em 2004 não

existiam fundos suficientes para pagar os últimos dois meses. “Não temos dinheiro para pagar mais nada” – re-conhece José Júlio Filipe. A solução estava dependente de um reforço, de cerca de 310 mil euros, a atribuir pelo Fundo de Acção Social, um organismo dependente da Direcção Geral de Ensino Superior.

Até à data da publicação deste jornal, o reforço ainda não tinha sido atribuído, possivelmente, devido à queda do Governo e às consequentes eleições ante-cipadas. O panorama em 2004 era o seguinte: “Aos alunos do primeiro ano, cujo processo de

“Não temos dinheiro para pagar mais nada”Susana Abreu e Tânia Costa

Em que consistiu o estágio dos alunos da ESTA na Plu-ricanal?O trabalho que os estagiários re-alizaram foi sobretudo de jorna-lismo. Preparavam reportagens no exterior. No estúdio faziam o trabalho de alinhamento da peça. Quais as maiores dificuldades que os estagiários tiveram?As maiores dificuldades são sempre relacionadas não com a integração, mas com a adap-tação. Por vezes chegámos à conclusão que as bases que os alunos têm não são de todo suficientes para serem autó-nomos. Precisam de um largo período de acompanhamento e de adaptação. Considera que há diferença entre a teoria facultada pela escola e a prática que o tra-balho exige?Embora ache que as escolas ca-minham no sentido de atenuar essa diferença, na maior parte dos cursos a teoria aprendida não se concretiza na prática. Os conteúdos não estão propria-mente actualizados em relação à realidade. Na Pluricanal os estagiários desempenham as mesmas funções que os profissio-nais?No início um estagiário come-ça por receber alguma teoria, no dia seguinte começam logo a praticar. Existem funções de maior responsabilidade que exi-gem mais experiência e essas nunca chegam a desempenhá-las pelo facto do estágio só du-rar três meses. I.S. e R.P.

RUI DIAS, DIRECTOR DO CANAL 6 DA PLURICANAL, ACEITOU ALUNOS DA ESTA PARA ESTAGIAR NA ESTAÇÃO

RITA PIMENTEL

Três meses de estágio, uma experiência para a vida

Serviços da Acção Social do IPT não conseguem assegurar bolsas de estudo

Inês Santos e Rita Pimentel

Entrevista

E S T A

atribuição de bolsas está quase a terminar, e a alguns alunos que ainda estão em época de avalia-ção, e portanto têm o processo suspenso, não vamos ter dinhei-ro para lhes pagar as bolsas”. O representante admite que esta “é uma situação muito complicada para os alunos bolseiros, infeliz-mente há muitos que dependem quase da bolsa”.

Apesar das dificuldades, nas férias do Natal os alunos rece-beram 17% do valor da bolsa de Novembro e o restante foi pago na segunda semana de 2005, o que só foi possível por os Servi-ços Centrais do IPT terem feito um empréstimo aos SAS do IPT no valor de 120.000,00 euros, substituindo-se assim ao Fundo de Acção Social. A transferên-cia do mês de Dezembro estava prevista até ao final do mês de Janeiro.

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20 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005

“Os meus filhos são a minha força, fonte de viver, são tudo”Quatro jovens mães, estudantes do Curso de Comunicação Social da Escola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA), têm a felicidade estampada no rosto, mesmo tendo de conciliar a vida académica com o ambiente familiar. Com maiores ou menores dificuldades, nenhuma se arrepende das escolhas tomadas. Sentem-se duplamente realizadas.

A “comunidade” cabo- -verdiana preparou-se para acolher a filha de Dayana, aluna do 2º ano do Curso de Comunicação Social da Es-cola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA). Quando faltavam poucas semanas para o nascimento da criança, já os amigos estavam prontos para acarinhar e cuidar da pequena Mayara. “Os meus amigos são de cursos diferentes e ficam a cuidar do bebé quando tenho aulas, já organizámos tudo” – explicava a mamã ainda an-tes do parto.

A ansiedade de Dayana era muita: “Sinto-me bem, feliz, contente e desejosa de ver a minha filha.” No entanto, ao descobrir que estava grávida, a jovem ficou bastante assus-tada e chegou a pensar no pior: “Pensei em tirar o bebé e sabia de um lugar seguro para o fazer.” Ela e o namo-rado foram à ginecologista, que lhe deu forças para não o fazer, alertando para o agrava-mento do seu estado de saú-de. A nova realidade da sua vida amedrontou a jovem. Só aos cinco meses de gravidez decidiu contar aos pais, que vivem em Cabo Verde. Fê-lo através de um telefonema. “A minha mãe ficou triste, chate-ada, mas o meu pai ficou mais tranquilo.” Depois de o medo desaparecer, Dayana passou a preocupar-se com a prepa-ração para o parto. Aulas de respiração, hidroginástica e ioga passaram a fazer parte da sua rotina.

Ana Luísa, aluna do 3º ano de Comunicação Social, mãe do pequeno Diogo, nascido antes do Verão, pode contar com a ajuda dos pais e do na-morado, sempre dispostos a

“ampará-la”. Apesar de não ser uma gravidez planeada, Luísa não teve outra solução a não ser ganhar força para enfren-tar as dificuldades surgidas ao longo do tempo: “Não tive

tempo para me preparar para ser mãe. Passei toda a minha gravidez em casa dos meus sogros e sempre fui tratada com muito carinho, mas isso impediu-me de preparar tudo

como sempre idealizei.”Para Ana Luísa, a dificulda-

de não está na gravidez: “O di-fícil é conciliar um filho com os estudos. Ao querer estudar, transmito-lhe agitação, e isso,

por vezes, deixa-o nervoso.” A proximidade com Diogo impede o rápido regresso de Luísa aos estudos: “Vou tentar encaixar tudo no tempo que tenho, mas agora ainda não me encontro capaz de regres-sar à escola, assusta-me muito ter de me separar dele e ainda não consigo pensar nisso.”

A situação de Madalena, apesar de complicada, difere das duas anteriores. Ao en-trar para o ensino superior já era casada há 10 anos e mãe de três filhos. A Leonor tem apenas dois anos e foi quem mais “apelou” aos cuidados da mãe, visto que ainda era amamentada na altura em que a mãe decidiu reiniciar os estudos: “Foi um bocado complicado porque tinha de controlar as horas, dava uma fugida ao infantário, dava de mamar e depois vinha nova-mente para as aulas.” O Rui, o filho mais velho, tem 13 anos e ajuda a mãe em algumas ta-refas. Já o Francisco, o filho do meio, exige uma atenção constante de Madalena: “Tem muitos problemas de saúde e com cinco anos nunca dormiu uma noite.”

Sendo uma mãe super dedicada e atenciosa, está sempre pronta para ser pai e mãe, uma vez que o mari-do trabalha muito e não tem muito tempo para os filhos: “Eu sou sempre a mãe que estou para tudo porque em relação ao pai há uma certa distância.” Madalena tem de planear bem as tarefas, quase nem tem tempo para dormir, pois a sua vida é uma autênti-ca correria: “Durmo a correr, tenho alturas que durmo duas horas e ando completamente esgotada. Tenho de fazer pla-nos durante a semana para a alimentação dos meus filhos, o que vão vestir, o que vão al-

Sónia PereiraHERLANDER SANTOS

Dayana. Depois do medo, a felicidade de ter uma filha nos braços

E S T A

Jovens mães de volta à escola moçar, o que vão levar para o lanche.”

A agitação de Madalena é muita e as dificuldades surgi-das ao entrar novamente para a escola também não foram poucas. O marido mostrou-se um pouco descontente, uma vez que o tempo para a família iria diminuir e a situação iria ser muito complicada em ter-mos financeiros. Além disso, teria de adaptar-se aos novos métodos de estudo e já tinha deixado a escola há 15 anos: “ Sentia-me horrível, tinha quase o dobro da idade dos meus colegas, iria ser difícil acompanhá-los. Apesar de serem mais novos, tinham uma mentalidade bem mais avançada.” Madalena tinha medo de escrever, de falar e tudo lhe parecia demasiado difícil: “Eu lembro-me que na altura eu nem sabia o que era a Internet, tinha vergonha e não sabia como perguntar.”

Fátima, mãe de André, de 11 anos, e de Simão, de sete anos, nunca parou de estudar. Tirou uma série de cursos técnicos até tomar a decisão de reiniciar no ensino superior. Tinha 34 anos. Os colegas apoiaram-na e sempre a viram como uma boa companheira, mas o marido foi o seu maior apoiante: “Foi a pessoa que mais força me deu para tirar o curso porque eu estava a trabalhar e deixei de o fazer.” Apesar das responsa-bilidades aumentarem, Fátima não se mostra arrependida da decisão que tomou: “Fui repre-sentante de turma até ao 3º ano e depois passei a ser presidente da Associação de Estudantes. Tudo isso junto com a minha vida pessoal, é uma grande tra-balheira, mas que me dá muito prazer.” Mesmo assim, conse-gue articular os estudos com a família: “Consigo conciliar a minha vida doméstica com a minha vida pessoal, os meus filhos, o meu marido e os estu-dos com muito esforço.” Neste momento, durante a semana, Fátima vive apenas com o seu filho Simão: “O meu filho mais novo está comigo, o mais ve-lho optou por ir para o colégio militar, por isso, à sexta-feira à noite estou à espera dele.”

Assim se consegue compre-ender que a alegria de ser mãe supera todas as contingências da vida quotidiana. Com algu-mas dificuldades, mas muita força para as vencer, todas as mães se mostram felizes com os seus rebentos.

Na ESTA também há pai!

Herlander, estudante de Comuni-cação Social, é pai de Heliandra, uma menina de ano e meio, que reside com a mãe em Cabo Verde. Com calma e alguns sorrisos pe-lo meio, pai-aluno afirmou, que mesmo não contando com a vin-da de um filho, se sentiu muito feliz e sempre pronto para apoiar a mãe da criança. Apesar de só ter visto a filha uma vez, Herlander mata as sauda-des através das fotografias e das pequenas palavras que ouve ao telefone: “De vez em quando ouço qualquer coisa. Ela já diz umas palavras.” Quem reagiu muito bem ao sucedido foram os pais de Herlander, que ajudam financeiramente a mãe de Helian-

dra. No entanto, o pai da menina considera que estando a estudar

está a contribuir para um melhor futuro da filha: “Já é uma grande ajuda, posso ter mais hipóteses na vida.” A avó materna da criança tam-bém reagiu muito bem ao nasci-mento de Heliandra e mostrou-se sempre disponível para ajudar a cuidar da criança. “É excelente, foi mais do que boa para mim” - re-vela Herlander. O jovem sintetiza: “Tenho de dar graças a Deus por ser ela a cuidar da minha filha.” A dona Rute está sempre perto da criança e é ela quem mais contri-bui para a sua educação. É com brilho nos olhos que o jo-vem estudante remata: “A situa-ção de ter um filho é uma coisa do outro mundo.” S.P.

Simão aprende com a mãe

Simão, de sete anos, é um menino simpático e acolhedor. Sentado no canto do sofá, o meni-no loiro com um ar doce estende os braços e ga-rante: “Gosto que a mãe vá para a escola porque aprende muitas coisas”. Mas acrescenta que “os colegas não acham gra-ça”. A mãe costuma aju-dá-lo nos trabalhos de casa, nomeadamente em Matemática e Lín-gua Portuguesa. Isto porque Fátima “nem por isso anda ocupada” e tem muito tempo para o pequeno. Brincam muitas vezes juntos e costumam passear no fim-de-

semana. O que mais gosta de fazer com a mãe “é ver televisão” porque assim tem companhia. Tam-bém gosta muito de conversar, mas o que lhe dá mais gozo é dormir até ao meio--dia. Só às vezes Simão gosta de par-ticipar nos jantares que a mãe faz com as colegas de curso porque muitas vezes não percebe as con-versas. Outras vezes,

alegra-se por participar. “Gosto de falar com as amigas da mãe” - explica o pe-queno com brilho nos olhos. S.P.

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ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 21

A Escola Superior de Tec-nologia de Abrantes (ESTA) acabou de receber mais um grupo de estudantes brasilei-ros que vêm para Portugal em intercâmbio (ver última pági-na), no âmbito dos protoco-los de cooperação existentes entre o Instituto Politécnico de Tomar (IPT) e as univer-sidades da FUMEC (Belo Horizonte) e da UNISC( Rio Grande do Sul). Este género de permuta ocorre pela se-gunda vez na ESTA. Os cerca de 15 alunos brasileiros che-garam a Abrantes no dia 3 de Janeiro e foram recebidos pelos alunos da ESTA que estiveram no Brasil, no final do ano lectivo anterior.

O objectivo destes inter-câmbios é a troca de experi-ências e o engrandecimento dos alunos. Nesse sentido foi delineado um plano de acti-vidades a desenvolver pelos alunos estrangeiros. Estes irão, durante a sua estadia em terras lusas, conhecer toda a região ribatejana através de várias visitas às cidades de Abrantes, Tomar e Santarém. Mas como o aspecto essen-cial destas iniciativas passa pelos alunos se inteirarem e apreenderem novas formas de comunicação não ensi-nadas no seu país de origem, irão ter formação em varia-dos ‘workshops’, seminários e sessões de formação, em particular nas áreas de rá-dio, televisão, direito e ética da comunicação. As línguas estrangeiras também fazem

parte desta formação, entre outras actividades.

As formações aos alunos visitantes serão dadas por do-centes da ESTA. Por outro lado, a docente Zahira Souki, da FUMEC, que acompanha os alunos brasileiros, tam-bém deu uma palestra aos alunos da ESTA, subordinada ao tema da História da Arte Brasileira.

Para além das universida-des da FUMEC, UNIVALE e da UNISC, celebrou-se, em Novembro de 2004, mais um protocolo entre o IPT e uma universidade brasileira, o Centro Universitário Nil-ton Lins, situado na cidade de Manaus, na Amazónia. O convénio, assinado em Tomar, visa enriquecer e preparar os alunos não só a nível curricular, mas também

a nível de experiências a fim de promulgar um intercâm-bio fundamental para futu-ros profissionais da área da comunicação.

Na opinião de Giselle Lins, reitora dessa universidade brasileira, o protocolo estabe-lecido é uma forma de enri-quecer os alunos. “Os lugares, as situações são totalmente diferentes. O centro universi-tário fica na zona amazónica, onde existe a maior bacia hidrográfica do planeta, rios, selva e aqui os alunos têm toda uma questão histórica e cultural, essencial para en-riquecer o conhecimento, as vivências, a cultura o conhe-cimento de um novo povo. Agora é dado ao aluno a pos-sibilidade de ele poder ver vários panoramas e crescer além do plano curricular”.

Forte aposta no intercâmbio

E S T A

Sandra Fernandes

Estudantes africanos querem deixar um “pedaço” da sua terra

Os “Cabo-Abrantinos”A ESTA conta já com 20 estudantes de Cabo-Verde. Fruto de protocolos entre instituições de ensino superior e de acordos entre governos, Abrantes tem agora uma nova comunidade: os “Cabo-Abrantinos”. A convivência entre alunos oriundos daquelas ilhas africanas acaba por ajudar a matar as saudades de casa.

Herlander Santos

À procura de um novo ho-rizonte, de uma nova perspec-tiva de vida. Sem alienar Cabo Verde, muito pelo contrário. É com esse sentimento que qua-se todos os estudantes cabo-verdianos deixam aqueles dez “grãozinhos de terra” rumo a Portugal. Muitas vezes deixan-do para trás um bem muito precioso: a família.

Pelas nostálgicas, mas ex-pressivas palavras de Jeffer-son Gomes, estudante de Co-municação Social na Escola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA), percebe-se que essa inevitável situação é ultrapassada “principalmente através da convivência com conterrâneos cabo-verdianos”. De certa forma, “a convivên-cia vai ajudando a minimizar essas saudades”. É que, apesar da família “ser insubstituível, há uma missão a cumprir e resta esperar que tudo corra bem com a família em Cabo Verde”.

É certo que Jeff, como é co-nhecido, não se sente “acultu-rado porque a cultura cabo-verdiana está sempre presente”. Mas acrescenta que “é sempre bom ter outro tipo de conhe-cimentos, de conhecer outra realidade”. E “é uma forma de conhecer melhor o povo por-tuguês”.

Oriundo de ilhas onde to-dos são “vizinhos”, chegar a Portugal, mais propriamente a Abrantes, significa encon-trar uma realidade completa-mente diferente. A adaptação é dificultada por questões a nível climático, a nível social,

mas, mormente, pela situação de estudante. E assim sendo, e por terem os mesmos há-bitos e costumes, mas princi-palmente por se sentirem em “casa”, mesmo estando a cerca de 2.800 quilómetros de Cabo Verde, os cabo-verdianos em Abrantes preferem partilhar a mesma residência. E já agora, a mesma música e a mesma “Catchupa”, prato tradicional de Cabo Verde.

Sheila Oliveira, aluna do curso de Engenharia e Gestão Industrial da ESTA, recorda que “o primeiro contacto com a cidade de Abrantes foi razoavel-mente simples pelo facto de já ter estudado longe de casa”, mas salienta que “foi uma situação nova pelo facto de nunca ter sa-

ído do país de origem para estu-dar”. Em relação à proximidade entre professores e alunos, de-vido ao espaço físico da escola, Sheila Oliveira é bastante clara, frisando que há duas vertentes. Por um lado, “há uma relação entre professores e alunos que

pode desencadear coisas boas, como ter mais conhecimento, sentir-se mais à vontade pa-ra opinar”. Mas não deixa de acrescentar que “essa relação pode conter um certo exagero por parte dos alunos, que po-dem confundir liberdade com libertinagem”.

Do país de origem, Cabo Verde, à terra de Camões há ainda muito oceano a per-correr e, embora países geo-graficamente distantes, têm muito em comum. O tempo dita a história e a de Portugal passou necessariamente por Cabo Verde, e vice-versa. Hoje em dia esse aspecto reflecte-se em quase todos os níveis de cooperação e a Educação não é excepção.

A ESTA, que pertence ao Instituto Politécnico de Tomar (IPT), conta já com 20 estudan-tes cabo-verdianos e noutras instituições do IPT estão mais 64 alunos de Cabo Verde, dis-tribuídos pela Escola Superior de Tecnologia de Tomar e pela Escola Superior de Gestão de Tomar. Estas vagas resultam de protocolos estabelecidos entre o IPT, outras Instituições de Ensi-no Superior e diversas Câmaras Municipais do arquipélago, as-sim como acordos estabelecidos entre o Governo de Portugal o Governo de Cabo Verde.

Com o intuito de “dar a real imagem de Cabo Verde”, os es-tudantes deste país pretendem criar um núcleo, cujos objec-tivos primordiais passam por fazer um intercâmbio cultu-ral, que inclui a divulgação da música, literatura e desporto do país de origem, deixando assim um “pedaço” das suas ilhas ao povo abrantino.

DR

Costumes. A música e a comida cabo-verdianas ajudam no processo de integração

Os estudantes cabo-verdianos

pretendem criar um

núcleo, com o objectivo de fazer um intercâmbio

cultural

DR

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22 | ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005

“São muito fixes! Gostei muito!” – é assim que Rita, “caloira” da ES-TA, adjectiva as praxes deste ano em Abrantes. As opiniões gerais de quem já foi praxado não fogem à regra: “Diverti-me. Ri-me. Não é para esquecer”. Mas a ideia assente em todos eles é que ela funciona também, e principalmente, como forma de integração dos novos alunos no mundo académico em que vão entrar. “Faz sentido num ambiente pequeno. As pessoas conhecem-se todas” – uma ideia que é vinculada por João Vieira, estudante do 4º ano.

Mas nem tudo é um mar de ro-sas. Quem não se lembra dos casos de abusos de praxes em Macedo de Cavaleiros e Santarém entre 2002 e 2003? Casos que puseram na agenda mediática esta tradição, pondo-a em causa como elemento pedagógico e de integração, como é defendido por muitos alunos. As queixas de vítimas de praxe que chegaram ao Ministério da Ciên-cia e do Ensino Superior, levaram o titular da pasta na altura, Pedro Lynce, a afirmar que levaria até “às últimas consequências” a inves-

tigação dos excessos cometidos durante as praxes académicas. É nessa mesma altura que se descobre que, desde 1997, tinha havido nove casos de denúncias de abusos. Con-tudo, todos foram arquivados sem lhes ter sido dado qualquer tipo de importância.

Em reacção a estes acontecimen-tos, Pedro Lynce procurou que fosse redigido o Estatuto do Estudante do Ensino Superior, documento que já tinha sido pensado ao abrigo da Lei da Autonomia (das instituições), em vigor desde 1988, mas que nunca vira a luz do dia. Dois anos depois, e passado o mediatismo em redor da prática das praxes, o documento continua na gaveta, esperando a aprovação da nova Lei da Autonomia.

Contudo, segundo o Antípodas (Movimento anti-tradições aca-démicas, sedeado no Porto), “este Estatuto nunca refere as praxes. A praxe foi só um pretexto para o criar”. Um responsável por este movimento defende que “a solução não passa por criar mais leis, mas sim por fazer com que as leis que existem sejam aplicadas”.

Este tipo de excessos é algo que preocupa, todos os anos, os novos alunos e as autoridades escolares, que não sabem o que esperar no

início do ano lectivo. Mas será a praxe algo mesmo imprescindível? Para Ana Patrício, também caloira da ESTA, a praxe “é fundamen-tal para a integração dos alunos”. No entanto, acrescenta: “Acho que certas coisas deveriam ser evitadas. Uma coisa é brincar e integrar, ou-tra coisa é humilhar as pessoas”. Já o movimento Antípodas é contra a sua prática, porque “veicula valores retrógrados e conservadores”. “O que nós pomos em causa são os valores que estão na sua base”. O Movimento defende igualmente que “em vez da praxe pode-se optar pela realização de jantares, festas ou até viagens que não envolvam todos estes princípios”.

Segundo Daniela Costa, membro da Comissão de Praxe da ESTA, o Código de Praxe permite que um aluno se declare anti-praxe, e assim sendo “simplesmente não é pra-xado”. Mas esta opção tem as suas contra-partidas: “Nunca mais pode usar o traje académico, ir a jantares académicos e deixa de poder parti-cipar nas praxes”. A aluna não con-corda com estas penalizações, mas defende o seu cumprimento: “Não fui eu que fiz as regras. Isso já vem de há muitos anos e ninguém sabe como começou. A regra está feita e nós só temos que a fazer cumprir”.

Já Daniel Cruz e Pedro César, estudantes do 5º ano, têm uma vi-são um pouco mais crítica daquilo que é esta tradição. Para Daniel, e no que se refere a Abrantes, “as praxes académicas têm um funcio-namento bom e saudável. A praxe, enquanto actividade de repressão, nunca é bem-vinda. Como modo de integração, sim”. Para ele, quem é anti-praxe “não tem de ficar à parte”, sublinhando ainda que “o Código de Praxe não é uma lei, mas sim um código pelo qual as pes-soas se regem para se divertirem. Acima deste código está a lei civil”. Pedro, por sua vez, admite ter sido “mais firme pela não realização de praxes”. Declarando que, enquanto festividade académica, gosta que se realizem, não concorda que “certas pessoas” tentem fazer da praxe uma lei: “Não aceito como argumento que quem não respeite o Código de Praxe não possa trajar”. Refere ainda que “a utilização do traje e o acesso a outras festividades são valores superiores à própria ac-tividade da praxe. Deveriam ser tradições à parte”. No geral, o que estes dois amigos partilham é que a praxe deve ser uma festa, “desde que depois não se exceda os limites do bom senso e que as pessoas quei-ram participar livremente”. As praxes existem e ganharam força como

tradição. Eis um facto que não pode ser tornea-do. O que era de início uma prática académica, exclusivamente coimbrã, transformou-se, em cerca de duas décadas, numa tradição a nível nacional. A razão parece estar no aparecimento e proliferação de cada vez mais universidades e politécnicos, ao longo de todo o mapa de Portugal, ou – na opinião dos mais acérrimos defensores do seu fim – no atraso cultural e social que reina na nossa lusa pátria. Eis-nos, assim, perante uma nova tradição. Resta saber se será boa ou má. As opiniões dividem-se, havendo quem veja nela a festa e o convívio, mas quem, também, veja o “urro” de prazer do elitismo no ensino superior, ou o triunfo sombrio do rebaixamento e da humilhação humana. Uma coisa é certa: como todas as tradições perdurará por muito tempo.

É necessário é que reine o bom senso durante o tempo que ela durar (que pode até ser para sempre). Que existem abusos nas praxes, isso todos sabemos, mas também é verdade que em quase todas as práticas humanas sucede o mesmo: desde o amor, passando pela guerra até à política. Como em tudo, é preciso que prevaleça o bom senso, porque a praxe é feita por pessoas, para pessoas. Há quem goste e quem não goste, mas só com respeito mútuo, e com o passar do tempo, é que se pode chegar à conclusão geral, se a praxe vale ou não a pena. Faz parte da teoria da evolução, que o que não é necessário, supérfluo, acaba por se extinguir. Enquanto não se sabe se a praxe é o é ou não, usemos o bom senso que nunca se extinguirá no homem.

Ao que tudo indica a praxe é uma tortura! Ou será que está na moda aparecer na comu-nicação social a dizer que a praxe isto, e a praxe aquilo? Acho estranho uma pessoa insurgir-se contra os colegas, alegando “praxe violenta”! Afinal de contas, a praxe é uma opção. Só é “praxado” quem quer. A todos os novos alunos é dada a opção de aceitar a praxe ou declarar-se anti-praxe.

Quando um estudante é aceite numa escola superior, a primeira coisa em que se pensa é o facto de estar longe de casa, numa cidade diferente, numa escola diferente, longe dos amigos e da família. A praxe consegue atenuar o vazio que essa mudança causa.

Por detrás daquelas malandrices que se fazem na altura da praxe, podemos reparar que, por momentos, as saudades de casa de-saparecem! Através da praxe, não só se fazem novos amigos, mas também se transmitem as tradições da academia em que se está inserido, conhecem-se todos os “cantinhos” da cidade que, até então, era desconhecida. Constroem- -se condições de integração num mundo novo, onde sozinho é impossível sobreviver, criam-se as bases onde vamos passar os anos seguintes. A praxe não é importante?

Sempre que se ouve falar da praxe é sempre porque alguém foi “torturado” ou “humilhado”! RIDÍCULO! Será que essas pessoas não se recordam que, a qualquer momento, podiam renegar a praxe? Mais engraçado ainda é quan-do essas “humilhações” são puras preparações para a vida futura! Um dos casos que está na moda é o da aluna que teve de esfregar excre-mentos animais na cara e nos braços. Essa alu-na frequentava uma escola agrária, num curso onde, mais cedo ou mais tarde, teria de mexer com esses excrementos. Será que foi tortura ou será que a tão empenhada aluna em denunciar sete colegas estava no curso errado?

E S T A

“Uma coisa é brincar e integrar, outra coisa é humilhar”Quem defende a praxe académica fala de integração. Quem a contesta fala em práticas retrógradas. As queixas de vítimas de praxe têm marcado presença na actualidade mediática em cada início de ano lectivo. As opiniões dividem-se.

João Pedro Lobato

Diversão. “As praxes têm um funcionamento bom e saudável”, apesar de alguns excessos reconhecidos pelos alunos

Viva a Praxe! Viva o Espírito Académico!

Que impereo bom senso!

| Tiago Godinho |

Opinião

| João Pedro Lobato |

Os que gostam da praxe académica e os que contestam a sua existência

ARQUIVO

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ESTA JORNAL • 28 de Janeiro de 2005 | 23

“Isto é uma comédia simples, sem qualquer pretensão, com enganos, desenganos, entradas e saídas.” A sala não estava cheia, mas sentia-se uma grande ex-pectativa no ar, momentos antes de se iniciar a peça de teatro da companhia profissional teatro azul, “Três na mesma cama”.

Esta peça conta a história da vida de dois jovens que se divor-ciaram recentemente, e que têm em casa um morto e um ladrão. A peça é protagonizada por Dio-go Morgado, Rui Pires, Gustavo

Santos e Nuno Miguel Henri-ques, sendo este último também autor e encenador.

No fim de um espectáculo bem conseguido, que contou com a alegria do público e até com algumas graças dos mais jovens, foi tempo de começar a desmontar o cenário e partir para outras paragens, levando o teatro no bolso.

Diogo Morgado, ainda conta-giado com a dinâmica da peça, começa por explicar o que está por detrás do sucesso: “O segredo é a boa vontade”. Nuno Miguel Henriques acrescenta que tudo se deve à produção que “está sempre bem-disposta”. No entender do autor, esta é uma peça simples e a simplicidade também a levou ao sucesso. E é por isso que cita Amália Rodrigues: “Complicar é fácil, o difícil é fazer simples”.

Comparando o teatro que se fazia antes com o que se faz hoje em Portugal, Nuno Miguel Henriques defende que “o de há 40 anos é pior”. Nas razões encon-tradas para tal, o encenador não tem dúvidas, a diferença está no “brio”: “Um actor tem que saber respirar, tem que saber estar, tem que ser profissional, ter humil-dade para consigo, para com o trabalho, para com os colegas e para com público.”

Como é que nasceu a ideia para uma história assim?

Sou o autor dentro da companhia e ence-nador do espectáculo. Esta peça foi escrita em cerca de três horas e depois foi uma questão de limpar e mudar algumas coisas. É uma comédia simples sem qualquer pre-tensão de ser um grande espectáculo. Tem de divertir e ser uma crítica social. Tudo isto é uma paródia às situações da realidade, mas as pessoas acabam por se identificar, porque há aqui muita crítica actualizada. É uma peça que dá para o pequeno, para o grande, para o médio, para o intelectual, para o povo. É para todos.

Qual é a mensagem principal? Divertir e levar a reflectir sobre o que

pode acontecer hoje em dia, porque as coisas são tão confusas, nas casas, nas pes-soas, na vida, nos divórcios. Há uma crítica muito social.

Fundou a Companhia Profissional do Teatro Azul com o intuito de descentra-lizar o teatro. Sente que esse objectivo está em vias de ser conseguido ou ainda há muita coisa a fazer?

Já estamos a conseguir descentralizar há uns anos. A peça tem sido representada em sítios onde nunca houve teatro. Esta-mos a conseguir o objectivo sem qualquer dúvida.

São os jovens que mais assistem a es-ta peça. As novas gerações vão mais ao teatro?

Não tenho dúvidas. Há uns anos atrás havia muito público no teatro, até 1971-79, depois decresceu. Estamos outra vez em crescendo, mas já tivemos mais público do que agora.

É difícil tirar um curso de teatro em Portugal?

Hoje não! Tem é de distinguir-se o tri-go do joio. Há muitos cursos que andam a enganar as pessoas. Os Municípios, as Juntas de Freguesia deviam ter essas preo-cupações, não é só ter preocupações com edifícios. O dinheiro foi gasto em obras, mas não é dinheiro da cultura, é obra pú-blica. Podem ser para teatros, ou para ci-nemas, ou para auditórios, mas isso é obra pública, porque o edifício valoriza, não é dinheiro da cultura. Que importa terem

salas enormes, se depois não têm dinheiro para as actividades? Na América todo o estudante universitário tem a disciplina de teatro. Não há jornalista que não parta de uma disciplina de teatro. Em Direito é obrigatório. Eles vão fazer teatro? Não! Vão é fazer teatralidade, vão é ter de representar com a sua máscara profissional. Á.V. E F.R.

PerfilTeresa Soares nasceu em Abran-tes a 9 de Agosto de 1942. Es-tudou no Colégio das Irmãs Doroteias e frequentou aulas de pintura da Irmã Gabriela, no Colégio de Abrantes. Licenciou--se em Filologia Germânica pela Faculdade de Letras de Coim-bra. Trabalhou como tradutora numa Instituição Europeia e foi jornalista. Leccionou Português e Inglês no ensino oficial. É pós- -graduada em Ciências Literárias na Universidade Nova de Lis-boa e em “Guião para Cinema” na Universidade de Bruxelas. Estudou na Academie Royale Des Beaux Arts Du Midi, em Bruxelas. Reconstruiu um velho celeiro, a que chamou “Casa do Capítulo”, em Praia do Ribatejo, sendo ate-lier, oficina e refúgio.

História de dois divorciados

C U L T U R A

“Tudo isto é uma paródia às situações da realidade” Águeda Varela

e Florbela Rocha

Numa noite de Outubro, as cortinas do cine-teatro S. Pedro, em Abrantes, abriram--se para mostrar “Três na mesma cama”, uma peça que correu o interior do país. Nuno Miguel Henriques, fundador da Companhia Profissional do Teatro Azul, explica como esta companhia está a atingir os seus objectivos.

“Envelopes” como forma de arte

A Biblioteca António Botto, em Abrantes, foi palco da expo-sição das telas de Teresa Soares, que decorreu de 6 a 28 de Ou-tubro. O ambiente pintou-se de bege, areia, rosa e azul, tons que a pintora usa desde 1997. Para a pintora, estes tons são agora “pouco apelativos”. Está “no início de uma nova fase, pas-sando para cores mais fortes”. A exposição apanhou-a “no meio dessa nova fase que ainda não está terminada”.

Nos seus quadros encon-tram-se vários envelopes pin-tados, característica comum a todas as obras expostas. Nes-ses envelopes, a pintora guarda “sempre algo de secreto, muito importante e bonito”. Para Tere-sa Soares, “os envelopes ficam”. Ainda hoje, para os amigos, continua a escrever. Cultora da epistemografia, Teresa Soares considera a escrita, que tam-bém pratica, “uma necessidade total”, a melhor forma de colo-car as ideias. “Notei isso desde pequenina” – sublinha a pinto-ra. E é nos seus livros que expõe as suas questões. Desenhar é mais lúdico, desenhar e pintar são uma forma mais de evasão. Nesta paixão pela escrita e pela pintura “existe uma parte de

Elisabete Simões e Fátima Almeida Santos

Teresa Soares expõe “ao correr da pena”

| ENTREVISTA | NUNO MIGUEL HENRIQUES, FUNDADOR DA COMPANHIA TEATRO AZUL

hereditário e congénito”. Desde a infância que gostava de fazer rimar palavras umas com as ou-tras. Numa breve retrospectiva, recorda que se recolhia “em de-terminadas fases da estação do ano, nomeadamente no princí-pio do Outono”, altura em que começava a escrever.

Hoje, ao verificar que o tem-po passou, Teresa Soares olha para o seu trabalho, que con-sidera “extraordinariamente gratificante”. Diz que não pinta por razões económicas, mas pelo prazer que tira daí. Para a artista, “a pintura é uma co-municação”.

Teresa Soares foi estudar para Bruxelas e com “o bichi-nho da pintura” frequentou a Academia de Belas Artes. A pintora explica que na capital belga existe “uma longa tradi-ção, mesmo a nível de escolas particulares”. Em comparação com as escolas portuguesas, Teresa Soares afirma que em Bruxelas “qualquer pessoa, seja de que bolsa for, pode frequen-tar uma escola particular”. No estrangeiro “valorizam mais os artistas do que cá em Portu-gal”. Considera que as escolas portuguesas são “boas até certo ponto”. O facto de os nossos pintores não terem por hábito viajar, torna-os “mais repetiti-vos”. Acredita que “viajar alarga muito os horizontes”. Do ponto

de vista artístico, defende que o país está “muito bem”: “Temos excelentes pintores. Nota-se, no entanto, aqueles que não saíram do nosso país”. Em Bruxelas “qualquer pintor seja de que idade for, viaja com um saco cama às costas”, vai em busca de fontes de inspiração. O que tor-na o lado artístico “extraordina-riamente desenvolvido”. Para Teresa Soares, “é uma questão de mentalidade”.

Teresa Soares. A pintora está “no início de uma nova fase, passando para cores mais fortes“

FÁTIMA ALMEIDA SANTOS

ÁGUEDA VARELA

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“Comunicar: Como?” é o tema genérico do IV Encontro de Comunicação organizado pela Escola Superior de Tecno-logia de Abrantes (ESTA). Du-rante quatro dias, entre 7 e 10 de Março, convidados da área da comunicação e da política abordarão temas da actualida-de, formulados num tom de alguma provocação: “Media: Censurados ou Independen-tes?”, “Jornalistas e Assessores: Relações Ambíguas?”, “Humor: Um Género Sério?”, “Sensacio-nalismo: Uma Tendência para o Futuro?” e “Blogues: Credibili-dade ou Farsa?”.

Os temas dos painéis resul-tam de um apanhado das von-tades dos alunos. Foram eles que apresentaram ideias sobre os assuntos que gostariam de ver debatidos e foram também eles que, divididos por equipas, contactaram os oradores. Aliás, todas as tarefas relativas à orga-nização do evento (nomeada-mente a procura de patrocínios, a organização dos workshops, a divulgação e a produção cartaz) estão a cargo dos alunos.

No momento do fecho desta edição, vários convidados ti-nham já assegurado a sua pre-sença, dando garantias de um encontro de qualidade. Entre

eles, Inês Serra Lopes, Manso Preto, Óscar Mascarenhas, Francisco José Oliveira, João Marcelino, Eduardo Prado Co-elho, Júlio Magalhães, Miguel Gaspar, Luís Fontes, Luís San-tos, António Colaço, Pinheiro Torres e Rui Baptista. A sessão de encerramento contará com a presença de Jorge Wemans, director de comunicação da Fundação Gulbenkian.

As noites da semana da comunicação serão também preenchidas com outro tipo de actividades. “À conversa com…” será um momento de reflexão e de diálogo protagonizado por Carlos Pinto Coelho, docente da ESTA, e um dos seus convi-dados. Noutros momentos do encontro, os próprios alunos e ex-alunos contarão as suas ex-periências. No “Café com ex-periências” o tema será o dos estágios. No “ESTA sem fron-teiras” o assunto da conversa passará pelas experiências que os estudantes tiverem em países estrangeiros.

O IV Encontro de Comuni-cação da ESTA conta ainda com workhops sobre matérias que vão desde a Paginação à Comu-nicação de Crise, passando pelas Técnicas de Rádio e Técnicas de Televisão.

“Expandir os horizontes e am-pliar nossa visão do mundo”. São com essas palavras que Zahira Souki, professora de Filosofia e História da Arte da Univer-sidade Fumec (Belo Horizonte - Brasil), define a proposta do intercâmbio que acontece há três anos entre estudantes e professo-res brasileiros e portugueses do curso de Comunicação Social.

Em apenas duas semanas no território luso, os alunos brasi-leiros já tiveram a oportunidade de explorar e conhecer parte da riqueza cultural e histórica de Portugal, dentro e fora da sala de aula. Além das visitas a castelos, mosteiros e abadias que fazem parte da história mundial, os estudantes assistem a discipli-nas do curso de Comunicação Social da ESTA.

Para Mariana Hilbert, estu-dante do 7º período de Jorna-

lismo da Fumec, a experiência adquirida no intercâmbio é sempre positiva, pois aumenta o conhecimento geral dos alunos. “O intercâmbio é fundamental para mostrar as diferentes for-mas de enxergar a prática e o aprimoramento da nossa futura profissão”, opina Mariana.

Já segundo Andréa Buss, estudante do 7º período de Publicidade e Propaganda da Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), o convênio entre as universidades brasileiras e a ES-TA é fundamental para o cur-rículo do futuro profissional. “Estudar Comunicação Social em Portugal, é, sem dúvida, um diferencial no meu currículo em relação aos meus colegas que não tiveram essa oportuni-dade”, afirma a estudante.

Receptividade abrantinaUma das coisas que chamou a

atenção dos estudantes brasilei-ros ao chegarem em Abrantes é

a receptividade dos abrantinos. Segundo Simone Pereira Bar-rios, aluna do 9º período Publi-cidade e Propaganda da Unisc, a ESTA e os portugueses abriram os braços para o Brasil. “A ESTA nos recebeu muito bem. Foi tu-do muito organizado e pensado com carinho para nós”.

Essa também é a opinião de Daiane Nervo, do 9º período de Jornalismo da Unisc. Se-gundo ela, todos foram bastan-te atenciosos com o grupo de brasileiros. “Quando fazemos as visitas históricas, somos sempre acompanhados por um professor”, relata.

Os brasileiros ficam em Abrantes até o dia 28 de Janeiro, data marcada para o término dos cursos oferecidos pela ES-TA para o intercâmbio.

*Estudante do 8º período de Jor-nalismo/Comunicação Social da Universidade Fumec – Belo Horizonte – Brasil

Intercâmbio é sinônimo de integração acadêmica e culturalRafael Werkema*

Positivo. Alunos brasileiros consideram importante conhecer a realidade portuguesa

JOSÉ ALVES JANA

ESTA aposta nas parcerias

Numa altura de afirmação para a Es-cola Superior de Tecnologia de Abrantes (ESTA), a instituição aposta em confe-rências e protocolos para a confirmação do seu sucesso, ao longo de cinco anos. A ESTA assinou protocolos com o jornal “O Mirante”, com a Câmara Municipal de Abrantes e com a Fundação para a Di-vulgação das Tecnologias de Informação e Comunicação no concelho de Abrantes e, ainda, com a Alcatel.

O objectivo do protocolo com o jor-nal “O Mirante” é o de complementar a formação dos alunos finalistas do curso de Comunicação Social. Os estudantes do 5ºano contribuirão com artigos para o semanário regional, podendo também fazer estágios profissionais. O acordo entre as duas entidades terá a duração de três anos, sendo depois decidido se continua ou não. Para assinar o protocolo estiveram presentes António Pires da Silva, vice-pre-sidente do IPT e Joaquim Emídio, director de “O Mirante”.

Mais um protocolo foi assinado pela ES-TA, mas agora com a Câmara Municipal de Abrantes e com a Fundação para a Divul-gação das Tecnologias de Informação e Co-municação no concelho de Abrantes. Este acordo foi feito com o objectivo de criar um espaço de investigação e informação, aper-feiçoar ferramentas tecnológicas, de forma a proporcionar uma melhor utilização por parte da população abrantina, assim como, melhores acessos à Internet.

Com a intenção de colocar Internet sem fios em alguns locais da cidade, nomea-damente, na Praça Raimundo Soares, na Praça Barão da Batalha e no Jardim da República, a ESTA acordou com a Alcatel uma cooperação tecnológica, proporcio-nando aos alunos uma formação na área de redes de comunicação.

Não se limitando apenas à assinatura de protocolos, a ESTA organiza também conferências para os alunos. Desta feita

foi uma conferência dedicada às línguas na comunicação. Três jornalistas estran-geiros, correspondentes no nosso país, partilharam as suas experiências. Uma das principais ideias que defenderam foi a importância de se conhecer diversas línguas e culturas.

A ESTA aposta também na ciência.

Concretizando essa aposta, a escola abriu as portas à Semana da Ciência e da Tec-nologia, que teve como objectivo atrair a comunidade para o mundo da ciência e da tecnologia. Quem visitou as exposições e os laboratórios da escola pôde perceber como diversos materiais se podem trans-formar em objectos comuns.

Susana Berjano

Cartaz. Cooperação tecnológica entre a Alcatel e a ESTA para a rede sem fios

Quatro dias recheadosde propostas

ÚLTIMA Sexta-feira, 28 de Janeiro de 2005