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R. bras. Est. Pop., São Paulo, v. 23, n. 1, p. 87-107, jan./jun. 2006 Introdução Embora o Mato Grosso tenha uma história de ocupação complexa, pode-se dizer que este Estado começa a despontar no cenário brasileiro a partir do avanço da frente pioneira paulista, em meados do século 20. Em um primeiro momento, este avanço provocou a ocupação no norte do Paraná, expandindo-se, posteriormente, Palavras-chave: Migração interna. Fronteira agrícola. Distribuição da População. Condicionantes da migração. Mato Grosso. Uma das últimas áreas de fronteira do país, o Estado de Mato Grosso é ainda hoje uma possibilidade para a população que busca alternativas para a migração. Paralelamente ao processo de “urbanização da fronteira”, assiste-se em Mato Grosso outras iniciativas com impactos importantes, que dão novas especificidades ao reordenamento da população no território e também às perspectivas de continuidade de ocupação demográfica do Estado, como os assentamentos agrícolas e novas frentes pioneiras. Após ter apresentado um forte processo de ocupação até meados dos anos 80, Mato Grosso experimenta um visível arrefecimento do seu crescimento demográfico, contudo mantendo áreas ainda com relativo dinamismo. Ancorado na análise de dados dos Censos Demográficos e Agropecuários e em entrevistas realizadas no Estado, este artigo centra-se na análise das tendências migratórias e seus impactos no processo de ocupação do espaço matogrossense nos últimos vintes anos, com ênfase no comportamento de algumas áreas representativas dos principais processos em curso, buscando situá-las no contexto mais amplo de mudanças nos padrões de ocupação econômica. As análises mostram, por um lado, uma forte associação entre ambos os fenômenos, a partir do impacto das atividades extensivas (pecuária, soja, algodão) na redução das possibilidades de absorção dos migrantes no meio rural, e, por outro, os efeitos “compensadores” dos assentamentos de reforma agrária. Dinâmica migratória e o processo de ocupação do Centro-Oeste brasileiro: o caso de Mato Grosso José Marcos Pinto da Cunha * para o sul do antigo Estado de Mato Grosso, com a pecuária de corte. Em seguida, nos anos 60, houve a entrada de gaúchos e paranaenses que se dedicavam à cultura do trigo e da soja (IPEA e FJN, 1997). A dinâmica socioeconômica e a con- figuração espacial observadas no caso de Mato Grosso assemelham-se bastante a “fases” já verificadas em outros Estados da região Centro-Oeste – como Goiás ou Mato * Demógrafo, professor do Departamento de Demografia (IFCH) e pesquisador do Nepo, ambos da Unicamp. O autor agradece a inestimável colaboração das assistentes de pesquisa Gisele Maira Ribeiro de Almeida, Fernanda Raquel e Pollyana Carvalho. Este estudo contou com o apoio do CNPq e do Programa Pronex/CNPq.

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Page 1: Dinâmica migratória e o processo de ocupação do Centro-Oeste

R. bras. Est. Pop., São Paulo, v. 23, n. 1, p. 87-107, jan./jun. 2006

Introdução

Embora o Mato Grosso tenha umahistória de ocupação complexa, pode-sedizer que este Estado começa a despontarno cenário brasileiro a partir do avanço dafrente pioneira paulista, em meados doséculo 20. Em um primeiro momento, esteavanço provocou a ocupação no norte doParaná, expandindo-se, posteriormente,

Palavras-chave: Migração interna. Fronteira agrícola. Distribuição da População.Condicionantes da migração. Mato Grosso.

Uma das últimas áreas de fronteira do país, o Estado de Mato Grosso éainda hoje uma possibilidade para a população que busca alternativas para amigração. Paralelamente ao processo de “urbanização da fronteira”, assiste-seem Mato Grosso outras iniciativas com impactos importantes, que dão novasespecificidades ao reordenamento da população no território e também àsperspectivas de continuidade de ocupação demográfica do Estado, como osassentamentos agrícolas e novas frentes pioneiras. Após ter apresentado umforte processo de ocupação até meados dos anos 80, Mato Grosso experimentaum visível arrefecimento do seu crescimento demográfico, contudo mantendoáreas ainda com relativo dinamismo. Ancorado na análise de dados dos CensosDemográficos e Agropecuários e em entrevistas realizadas no Estado, esteartigo centra-se na análise das tendências migratórias e seus impactos noprocesso de ocupação do espaço matogrossense nos últimos vintes anos, comênfase no comportamento de algumas áreas representativas dos principaisprocessos em curso, buscando situá-las no contexto mais amplo de mudançasnos padrões de ocupação econômica. As análises mostram, por um lado, umaforte associação entre ambos os fenômenos, a partir do impacto das atividadesextensivas (pecuária, soja, algodão) na redução das possibilidades de absorçãodos migrantes no meio rural, e, por outro, os efeitos “compensadores” dosassentamentos de reforma agrária.

Dinâmica migratória e o processo deocupação do Centro-Oeste brasileiro:

o caso de Mato Grosso

José Marcos Pinto da Cunha*

para o sul do antigo Estado de Mato Grosso,com a pecuária de corte. Em seguida, nosanos 60, houve a entrada de gaúchos eparanaenses que se dedicavam à culturado trigo e da soja (IPEA e FJN, 1997).

A dinâmica socioeconômica e a con-figuração espacial observadas no caso deMato Grosso assemelham-se bastante a“fases” já verificadas em outros Estados daregião Centro-Oeste – como Goiás ou Mato

* Demógrafo, professor do Departamento de Demografia (IFCH) e pesquisador do Nepo, ambos da Unicamp.O autor agradece a inestimável colaboração das assistentes de pesquisa Gisele Maira Ribeiro de Almeida, Fernanda Raquel ePollyana Carvalho. Este estudo contou com o apoio do CNPq e do Programa Pronex/CNPq.

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Grosso do Sul –, que tiveram a ocupaçãode seus territórios anteriormente. No entan-to, para o Estado de Mato Grosso, evidencia-se uma maior intensificação do processode ocupação demográfica e econômica re-cente, acarretando, de forma muito maisprecoce, os impactos de grandes transfor-mações na estrutura produtiva e fundiáriaregional, o que teve importantes implica-ções sobre sua dinâmica migratória.

Tais impactos podem ser percebidosatravés de dois aspectos principais: a redu-ção significativa dos fluxos migratórios paraa área, nas últimas décadas (80 e 90); e ascaracterísticas e formas de inserção pro-dutiva do migrante.

Do mesmo modo, este processo detransformação pode ser percebido no âmbi-to intra-estadual, com relação ao comporta-mento demográfico dos vários subespaçosdo Estado, cujas trajetórias refletem asdiferenças regionais e as peculiaridadesdas diversas microrregiões, seja em termosdo processo de ocupação econômica, sejaatravés dos momentos de ocupação dafronteira agrícola. Fica claro nas análisesque a forma como tradicionalmente o MatoGrosso foi ocupado vem se esvaindogradativamente, principalmente à medidaque a inserção dos migrantes torna-se cadavez mais difícil, considerando-se as novase mais vigorosas formas de ocupaçãoeconômica do território.

Além dessa redução da intensidade edo volume da imigração para Mato Grosso,evidencia-se também um incremento daemigração para fora do Estado. As infor-mações analisadas a este respeito mostramduas características distintas: por um lado,boa parte desta emigração (54% do totalnos anos 90) refere-se, na verdade, a umretorno de grandes contingentes de pesso-as que haviam procurado o Estado comouma alternativa para suas reproduçõessociais; por outro, verifica-se que outra partesignificativa desta emigração correspondea um movimento que, ao longo da pesquisa,se rotulou de “caminho ou trilha da fronteira”

(CUNHA, 2002; CUNHA, ALMEIDA eRAQUEL, 2002; CUNHA e SILVEIRA, 1999),ou seja, não se trata propriamente de umprocesso de evasão demográfica de nativosou moradores mais antigos, mas sim deuma redistribuição espacial da populaçãomigrante, que, em função de fatores demudança, para utilizar a terminologia deSinger (1980), se vê obrigada a procurarnovos lugares para o possível assentamento“definitivo”.1

Em suma, o que se percebe em MatoGrosso é que este Estado, hoje, particular-mente em termos migratórios, está muitoaquém daquilo que foi na década de 70 eparte dos anos 80, fruto do progressivodesaparecimento de um dos fatores quemais contribuíram para a sua ocupação: aexpansão e/ou manutenção das áreas defronteira agrícola. Não é por acaso que oEstado, atualmente, apresenta elevadograu de urbanização, onde os centros urba-nos tornaram-se as últimas opções para apermanência dos migrantes ali chegados,situação que se agrava quando se consi-dera o reduzido potencial de absorção de-mográfica da maioria deles.

Mato Grosso: uma breve contextuali-zação do seu processo de ocupaçãoterritorial

A região Centro-Oeste e, particular-mente, o Mato Grosso possuem uma eco-nomia com caráter essencialmente agrícolae urbanização crescente, mas ainda comextensas áreas de matas e florestas. Estascaracterísticas formam o retrato da suadiversidade demográfica e ambiental, quesão capazes de explicar seu grandedinamismo econômico nos últimos anos.

Na década de 60, a Região Centro-Oeste iniciou um processo de modificaçãode sua estrutura produtiva, impulsionadapela ação estatal através dos programasde incentivo à modernização agropecuáriae integração da região aos outros merca-dos, elementos que tiveram importantes

1 Em trabalho anterior (CUNHA, 2001), utilizou-se a expressão “conto sem fim” para a situação de muitos colonos ou pequenosproprietários que, na trilha da fronteira, se vêem periodicamente forçados a se deslocarem para outras áreas, em geral, maisdistantes e inóspitas.

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conseqüências em sua dinâmica demo-gráfica e no processo de redistribuiçãoespacial da população.

Esta ação estatal explicita-se atravésda preocupação de integração nacional doregime militar, o que justifica os represen-tativos investimentos em grandes projetosagropecuários. “Enquanto a sociedadebrasileira era duramente reprimida pelosgovernos militares que sucederam no podernesse período, o Araguaia, o Mato Grossoe a Amazônia foram invadidos pelosgrandes grupos econômicos através dosprojetos agropecuários” (OLIVEIRA, 1997,p. 290).

Esta intervenção do governo foi realiza-da, principalmente, através do Prodoeste(Programa de Desenvolvimento do Centro-Oeste), efetivado pela ação da Sudam (Su-perintendência do Desenvolvimento daAmazônia), no qual muitos grupos em-presariais beneficiaram-se em diversosaspectos do processo de ocupação dafronteira amazônica. Vale lembrar quevários projetos aprovados, alguns megalo-maníacos, nunca efetivamente entraram emfuncionamento, o que gerou uma série deescândalos pelo uso indevido de dinheiropúblico. Os autores ainda sugerem que adécada de 70 foi fundamental para com-preender a estrutura produtiva e a urbani-zação do Centro-Oeste, já que a região foiamplamente beneficiada pela “marchamodernizadora do oeste”, provocando umintenso direcionamento dos fluxos migra-tórios para áreas mais promissoras.

Posteriormente, ocorreu uma articula-ção entre Estado e detentores de represen-tativos volumes de capital, realizando incen-tivos para que estes pequenos produtoresse engajassem em projetos de colonização,característicos da década de 80, em substi-tuição aos grandes projetos agropecuáriosda de 70. Diante disto, pode-se observarque os anos 80 caracterizaram-se pelarealização destes projetos de colonização,baseados em assentamentos de famílias empequenas propriedades e executados porempresas públicas e privadas. Porém, estesprojetos acabaram limitados e tiveram suaschances de sucesso reduzidas por diversoselementos, tais como: características

qualitativas da terra; dificuldade de acessoao crédito por parte dos pequenosagricultores; e condições de isolamento damaioria das áreas colonizadas (emparticular no caso do norte de Mato Grosso).Neste contexto, a abertura dos grandeseixos rodoviários, especialmente a BR-163Cuiabá-Santarém (1971-1976), foi ummarco representativo da efetiva implan-tação dos projetos de colonização.

Como conseqüência desta “coloni-zação acelerada”, ocorreu a multiplicaçãode diversos novos municípios nas áreas defronteira, como é o caso do norte de MatoGrosso, os quais sofrem até hoje com aausência de infra-estrutura e serviços. Sãocidades pequenas, na maioria das vezescom população variando entre 20 e 50 milhabitantes, distantes geograficamente umasdas outras.

Diante desta forma de ocupaçãopopulacional, surgiu um novo tipo deatividade agrícola, isto é, a agriculturaaltamente capitalizada e mecanizada, cujaforma mais difundida em Mato Grosso é acultura da soja. Segundo Becker (2000), asoja chega a ser uma opção viável noscerrados ou para recuperar áreas compastagens, principalmente quando seconsidera a melhoria genética dassementes, conseguida através depesquisas financiadas pela iniciativaprivada com apoio estatal, apresentandoassim efeitos positivos. No entanto, a autorateme pelo aumento do desmatamento queesta cultura pode gerar se avançar muitoao norte do Estado, aumentando, portanto,a tendência à destruição do meio ambiente.

Outra atividade econômica importantenestas áreas de fronteira é a pecuária, quevem penetrando cada vez mais nas áreasflorestais. Este aspecto é ressaltado porCláudio Egler (2000), que mostra como ocapital financeiro tem investido naconstituição de uma forte economiaagropastoril no Estado de Mato Grosso (o4º rebanho nacional). Além disso, existemainda outros aspectos que devem serconsiderados quando se pretende com-preender o processo de ocupação de MatoGrosso: a questão indígena, o meio am-biente e a prática do garimpo.

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Embora tais questões não sejamtratadas neste artigo, não se pode negar aexistência, no Estado, de diversos proble-mas inerentes a elas, como, por exemplo, odesrespeito às terras indígenas, a de-vastação ambiental e o efeito predatório dosgarimpos. Estes aspectos constituem ele-mentos importantes que estão relacionadosao processo de ocupação e expansãoda fronteira agrícola no Estado do MatoGrosso.

Estas características do processo deocupação territorial, aliadas à expansão domodelo agrário convencional, foram extre-mamente prejudiciais para o produtorfamiliar e causaram ainda fortes impactossocioambientais, como mostram os dadosdo Inpe (Instituto Nacional de PesquisasEspaciais): até agosto de 1998, 10% dasflorestas já estavam desmatadas. Provavel-mente a demanda por madeira é a granderesponsável por essa situação crítica, já queMato Grosso e Pará são os maiores produ-tores de madeira em tora do país. Alémdisso, depois da realização das queimadas,a pecuária acaba sendo a alternativa maisimediata para a valorização da terra.

Este cenário acaba gerando grandesfocos de “tensão social” em territórios ma-

togrossenses. Todas estas característicastiveram forte impacto no processo migratórioexperimentado pelo Estado de Mato Gros-so, sendo que tais elementos exprimem-setanto em termos das tendências do fenô-meno ao longo do tempo, como no que tangeao perfil desta mobilidade populacional.

A dinâmica demográfica em nívelregional

Os dados sobre o crescimento popula-cional e o processo de urbanização de MatoGrosso não deixam dúvida quanto ao fatode que, nos anos 90 (mais precisamenteno segundo qüinqüênio da década de 802),o Estado passou por uma importanteinflexão no seu crescimento demográfico,resultante das significativas transformaçõesno seu processo de desenvolvimento eco-nômico e estrutura produtiva, entre outrosfatores (Tabela 1).

O crescimento demográfico no Estado,que durante vários períodos registrou altastaxas – superior a 5% ao ano nas décadasde 70 e parte da de 80 –, reduziu-seabruptamente nos anos 90, atingindo cercade 2,4% a.a., embora ainda tenha sido bemsuperior à média nacional e ao desempenho

2 Em estudo anterior pôde-se mostrar que os dados analisados levavam a crer que, de fato, a inflexão do processo de ocupaçãomatogrossense parece ter mesmo ocorrido a partir de meados dos anos 80. Vale lembrar que neste mesmo período houve ainterrupção dos incentivos governamentais fartamente oferecidos para projetos de colonização e expansão da fronteira agrícola(MARTINE, 1994). Para maiores detalhes sobre estas tendências, ver Cunha (2001, 2002) e Cunha e Silveira (1999).

TABELA 1População total, taxa de crescimento médio e grau de urbanização

Região Centro-Oeste Ampliada – 1970-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970, 1980, 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

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de outros Estados do Centro-Oeste, em par-ticular do Mato Grosso do Sul (Tabela 1).

Ao mesmo tempo em que ocorriaredução do crescimento demográfico, MatoGrosso também se urbanizava a passoslargos. Segundo o Censo de 2000, nadamenos que 80% de sua população vivia nascidades; uma taxa alta mesmo consi-derando-se que o grau de urbanização doterritório matogrossense possa estarsuperestimado, devido à forma como ainformação é captada pelo IBGE, que, comoargumenta Veiga (2002), tende a con-siderar “cidades” espaços claramentesem as condições mínimas para tal. Valelembrar, para efeitos deste estudo, quesomente cerca de 20% da população deMato Grosso ainda residia realmente naszonas rurais.

Para um Estado que foi ocupado ecolonizado com base em programas deassentamentos rurais, não é difícil perceberque existe uma aparente contradição:possui uma estrutura econômica nitida-mente baseada na agropecuária, mas compouquíssima população residindo naszonas rurais, o que reflete as conseqüênciasdo estilo de desenvolvimento adotado.

Assim, Mato Grosso caracteriza-se nãoapenas pela predominância de grandeslatifúndios, mas também por uma produçãoprimária baseada na monocultura e/oupecuária extensiva. No primeiro caso, aprodução agrícola é altamente tecnificadae, portanto, utiliza pouca mão-de-obra narealização destas atividades. Os dadosapresentados a seguir demonstram váriosaspectos evidenciados neste processopeculiar de desenvolvimento.

Tal redução das intensidades do cresci-mento demográfico espelha, em grandemedida, o arrefecimento da migração. Defato, os dados censitários mostram que a

imigração proveniente de outros Estadosreduziu-se em quase 23% entre as décadasde 80 e 90, embora ainda tenha atingidovolumes superiores aos fluxos referentesaos anos 70.3 Contudo, o impacto destesfluxos migratórios sobre a população doEstado claramente vem perdendo força, umavez que esta taxa diminuiu de 0,94% a.a.no primeiro período analisado para 0,58%a.a. nos anos 90, ou seja, para quase ametade do que ocorria há 20 anos.

Em termos dos fluxos migratórios maissignificativos, a Tabela 2 mostra que, aliadaà redução da imigração, ocorreu uma mu-dança significativa no perfil dos movimentosquanto à última residência dos migrantes.Enquanto no auge da ocupação as pessoasprovenientes do Paraná representavamcerca de 35%, respondendo, juntamentecom outras origens como Goiás (14%), SãoPaulo (13%) e Mato Grosso do Sul (11%),por quase 3/4 da imigração registrada, nosanos 90 o quadro modifica-se bastante.Percebe-se uma brusca redução naparticipação relativa do Paraná (19%), o queacaba permitindo um aumento naquela deoutras origens, como é o caso de Rondônia.

No entanto, em algumas áreas, comona microrregião de Colíder, os nordestinosocupam também lugar de destaque nosanos 80, seduzidos principalmente peloenriquecimento fácil que o garimpoprometia. Justamente foi essa microrregiãoa que recebeu maior volume de imigraçãoentre as três áreas do norte de Mato Grosso.Esta situação mostra as diferençasexistentes entre os vários tipos de migraçãodestinados para o Estado, sendo, em geral,distintas as motivações e principalmente anatureza destes movimentos caso se tratede nordestinos ou de sulistas.4

O arrefecimento de imigração, relacio-nado à indiscutível diminuição dos atrativos

3 Cabe uma explicação de caráter metodológico. Os Censos de 1991 e 2000 permitem que se capte, em âmbito estadual, omigrante tanto em termos de sua “última residência” (última etapa), quanto com relação à sua “residência 5 anos antes” (datafixa) do recenseamento. Porém, no Censo de 80, a informação sobre “data fixa” não é recolhida. Embora cada um dos tipos de“definição” de migrante tenha suas vantagens e desvantagens (CARVALHO e MACHADO, 1992), existe por parte deste estudouma preferência pela “última etapa”, por refletir os movimentos mais recentemente ocorridos e permitir uma maior abrangênciatemporal. Assim, os volumes derivados de ambas as formas de identificação dos migrantes, além de intervalos de tempo diferentes,são também de naturezas distintas, sendo comparáveis apenas em situações particulares que não vêm ao caso explicitar nestemomento.4 Para uma discussão sobre as diferenças da migração de nordestinos e sulistas, ver Cunha e Azevedo (2001).

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para os migrantes, especialmente paraaqueles interessados na “promessa” dasfronteiras agrícolas para se estabeleceremcomo pequenos proprietários e desenvol-verem uma agricultura ou pecuária em basefamiliar, não foi o único fator demográficoresponsável pela redução do crescimentopopulacional matogrossense. Houvetambém intensificação da emigração parafora de Mato Grosso, a partir dos anos 80,registrando inclusive aumento absoluto nadécada de 90 da ordem de 100% secomparada à de 70.

De qualquer modo, é importante notarque a emigração praticamente estabilizou-se entre os anos 80 e 90 e, como con-seqüência, sofreu uma redução de suaintensidade (0,39% a.a. e 0,34% a.a.,respectivamente). Esta certa estabilizaçãodas perdas populacionais evidencia, por umlado, que o maior impacto das grandestransformações produtivas no Estadoparece já ter ocorrido entre meados dosanos 80 e começo dos 90 e, por outro, aredução significativa de imigração já de-

monstrada anteriormente. De fato, à medidaque passam a ingressar menos migrantesno Estado, seria natural esperar umaredução também do volume de saídas.

Além disso, outro elemento deve serconsiderado ao se analisar a emigração deMato Grosso: o retorno de muitos dos mi-grantes para suas zonas de origem, emparticular durante a década de 90. Comose nota no Gráfico 1, do total daqueles quedeixaram o Estado, mais de 54% retornarampara suas Unidades da Federação denascimento, valor bem superior àqueleobservado na década anterior (pouco maisde 21%).

Tal fato permite considerar que estaemigração configura-se, na verdade, comoum processo não de expulsão destes mi-grantes de Mato Grosso, mas sim de retornoà origem, decorrente da constatação dasdificuldades de fixação e/ou insucessos,favorecidos pela interação de diversos ele-mentos, tais como: inexistência de terrasadequadas em função do alto grau deconcentração fundiária; políticas pouco

TABELA 2Imigrantes e emigrantes com menos de 10 anos de residência nos Estados de domicílio atual

Estado de Mato Grosso – 1980-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970, 1980, 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.(1) Este volume considera a distribuição “pro-rata” feita para os migrantes sem declaração de UF de residência anterior.(2) Para efeito da manutenção da comparabilidade para 1991 e 2000, os volumes de Goiás foram somados aos de Tocantins.

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eficazes de assentamentos; falta de al-ternativas produtivas que permitissem areprodução social; etc.

No entanto, percebe-se que, nos anos80, a baixa taxa de retorno atingia nãoapenas os sulistas, que tradicionalmentequase não retornam (CUNHA e AZEVEDO,2001 e CUNHA, 2004), mas todos os demaismigrantes, independentemente da proce-dência, inclusive os próprios nordestinos.Este fato conduz à avaliação da hipótesede que, naquele período, a abertura deoutras fronteiras ainda era uma realidade,o que permitia aos migrantes a busca deoutras possibilidades antes da volta paraos Estados de origem. Esta hipótese é for-talecida quando se observa que, nos anos90, até mesmo os sulistas apresentaramvolume e proporção significativos de mi-grantes retornados.

As características migratórias de MatoGrosso podem ser mais bem percebidas einterpretadas a partir da desagregação daanálise em termos regionais,5 tendo em vistaa heterogeneidade do território estadual, no

que diz respeito tanto ao comportamentodemográfico quanto às especificidades doprocesso de ocupação (aí incluindo os dife-rentes momentos históricos: transforma-ções econômicas, estrutura fundiária, uso,ocupação, cobertura do solo, etc.).

Até a década de 80, o Estado poderiaser dividido, grosso modo, em duas por-ções: o norte, compondo uma área de maiordinamismo demográfico nas duas últimasdécadas; e o sul, formando uma área maisconsolidada e com menores taxas deincremento demográfico. De fato, enquantolocalidades no extremo norte, como AltaFloresta, Colíder e Alto Teles Pires, cres-ceram a taxas elevadíssimas nos anos 80,nas regiões mais ao sul isso não ocorreu,com exceção de Cuiabá e Rondonópolis,que, mesmo nos anos 90, apresentavamalgum “fôlego”, crescendo a taxas superi-ores a 2% ao ano. Na verdade, nestes doiscasos, trata-se de microrregiões onde lo-calizam-se importantes centros urbanos –as principais cidades do Estado –, que con-tam com maior diversificação econômica,

GRÁFICO 1Emigrantes, por condição de naturalidade, segundo região de destino

Estado de Mato Grosso – 1991-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

5 Dada a falta de comparabilidade entre os Censos no que se refere às informações sobre migração intermunicipal, para a análiseda dinâmica intra-estadual utilizou-se a informação referente à residência cinco anos antes, para os Censos 1991 e 2000, e últimaresidência para os migrantes maiores de cinco anos de idade e com menos de cinco anos de residência, para o Censo de 1980.

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sem considerar o fato de a primeira concen-trar praticamente todo o aparato administra-tivo estadual como capital de Mato Grosso(Tabela 3).

Já nos anos 90, observam-se até trêssituações diferentes: maior urbanização edinamismo nas microrregiões de Cuiabá,Rondonópolis e Alto Pantanal, onde as ativi-dades industriais e o setor de serviços sãobastante desenvolvidos; um processo deocupação um tanto diferente na regiãocentral do Estado – a maior parte do Cerrado–, abarcando as microrregiões de Parecis,Primavera do Leste, Alto Teles Pires eCanarana, com presença muito forte da soja– o principal produto agrícola –, aliada àcultura do algodão e do milho; e intensoritmo de crescimento demográfico no nortedo Estado (ou “nortão”, como é conhecido),até o final da década de 80, devido à

expansão da fronteira agrícola e, princi-palmente, à atividade garimpeira, em claraqueda nos anos 90.

No chamado “nortão” do Estado,enquanto as regiões mais ao norte, comoAlta Floresta e Colíder, reduziram drasti-camente seu crescimento, na década de 90,outras áreas da porção ocidental, comoParecis, Alto Guaporé, Alto Teles Pires eAripuanã, ainda que em menor ritmo, manti-veram significativo dinamismo demográfico(Mapa 1). O mesmo pode-se dizer de áreasno nordeste do Estado, em particular amicrorregião do Norte Araguaia. Enquantoem Alta Floresta e Colíder a quase erra-dicação da atividade garimpeira explicariaboa parte do processo, nas outras áreasnovos projetos de assentamentos (emparticular em Aripuanã, ao noroeste, e NorteAraguaia, no nordeste) e, principalmente, a

TABELA 3População e taxa de crescimento demográfico, segundo microrregiões

Estado de Mato Grosso – 1970-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos de 1970, 1980, 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

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entrada da soja (nas demais regiões) pode-riam ser os elementos que justificariam talcomportamento.

De fato, como mostra a Tabela 4, váriasregiões mencionadas anteriormente figu-ram entre aquelas que mais receberam estetipo de projeto, inclusive em termos do nú-mero de famílias envolvidas,6 como são oscasos das microrregiões Norte Araguaia eAripuanã.

Em termos de volumes migratóriosapresentados por cada uma das microrre-giões de Mato Grosso, a Tabela 5 explicitaas situações e momentos distintos pelosquais passaram estas áreas ao longo doperíodo estudado. Enquanto as localidadesmais urbanizadas e dinâmicas do Estadoreduziram o volume de imigração interesta-dual, outras, como as do norte e noroeste

do Estado, bem como aquelas com influên-cia mais recente da soja, registraramincremento do contingente de pessoas quelá chegaram.

Embora o Mato Grosso tenha se urbani-zado em ritmo bastante intenso nas últimasdécadas, particularmente em função dasgrandes transformações pelas quaispassaram as suas áreas rurais, a migraçãocom destino a estes locais ainda é signifi-cativa em várias regiões.

Por um lado, observa-se que, para ototal do Estado, a migração com destino ruralreduziu-se tanto em volume (de 128 mil em1986/91, para 51,8 mil em 1995/00) quantoem porcentual (de 55% para menos de 21%7).Por outro lado, microrregiões como NorteAraguaia, Alto Guaporé e Rosário do Oeste,ainda nos anos 90, apresentaram 40% dos

MAPA 1Taxa média anual de crescimento, segundo microrregiões

Estado de Mato Grosso – 1991/2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

6 Deve-se considerar que os projetos de assentamentos são bastante heterogêneos em termos das áreas e número de famíliasenvolvidas.7 Claro que o total do Estado está influenciado pelo peso de Cuiabá e Rondonópolis, onde se concentra boa parte dos migrantesque são, desde os anos 70, predominantemente de destino urbano (ver Tabela 5).

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TABELA 4Distribuição dos assentamentos rurais, segundo microrregiões

Estado de Mato Grosso – 1991/2000

Fonte: Incra – MT, Superintendência Regional de Mato Grosso – SR-13/MT. Tabulações especias Nepo/Unicamp.Nota: Incluem-se os municípios com projetos administrados pelo Intermat e municípios com "projetos casulo" de assentamentos.

TABELA 5Imigração interestadual de última etapa, segundo microrregiões

Estado de Mato Grosso – 1970-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970, 1980, 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

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migrantes se dirigindo para suas áreasrurais. Não menos significativos foram osporcentuais das micros do chamado“Nortão” – Aripuanã, Colíder e Alta Floresta–, que, no mesmo período, atingiramproporções em torno de 30% (Tabela 6).

É bem verdade que, na última década,na esteira dos custos sociais desse padrãode desenvolvimento, que repercutiram naconcentração de terras e significativaredução do emprego agrícola (MATTEI,1998), as políticas públicas nacionais volta-ram-se um pouco mais para a questão daReforma Agrária, que, não obstante suasvárias deficiências,8 teve como conseqüên-cia um aumento do número de assentamen-tos no país. Nota-se, por exemplo, o boom

TABELA 6Migrantes interestaduais, por área de destino, segundo microrregiões

Estado de Mato Grosso – 1970-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos 1970, 1980, 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

que o Estado de Mato Grosso teve nesteperíodo: segundo dados levantados juntoao Incra em Mato Grosso,9 enquanto noperíodo 1986/91 foram criados em todo oEstado apenas 25 assentamentos, estenúmero salta para 262 na década de 90.

As características da migração emMato Grosso: os reflexos da forma deocupação e as mudanças econômicas

O principal intuito desta seção é de-monstrar que as características dosmigrantes mostram-se perfeitamente coe-rentes com a estrutura de condicionantesque este estudo identifica como funda-mentais para justificar as tendências

8 Foge do escopo deste trabalho discorrer sobre os vários problemas que cercam a Reforma Agrária no país e sua real eficácia parase configurar numa verdadeira saída para a população que ainda subsiste no campo. Alguns dos desafios encontrados referem-se a: regularização das terras ocupadas; viabilização econômica dos assentamentos (o que envolve mecanismos de crédito); faltade assistência técnica e infra-estrutura, particularmente viária; terras desgastadas e de má qualidade para fins agrícolas, ou lotesem áreas de mata fechada; constrangimentos das leis ambientais; etc. É importante salientar que todos estes problemas foramreiteradamente levantados nas entrevistas realizadas nas várias regiões do Estado de Mato Grosso. Sobre estes temas ver Leite(1998), Gomes (2000), Ferreira, Fernández e Silva (s.d.).

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migratórias observadas no período emquestão.

Além disso, enfatiza-se o fato de quetais migrantes apresentam certa seletivi-dade que tende a se dissipar, à medida queo processo de ocupação da fronteira tam-bém vai se esvaindo ao longo do tempo.Em outras palavras, o perfil dos migrantes,ao mesmo tempo em que se transforma aolongo das décadas analisadas, também vaise “moldando” para uma realidade maisurbana, na proporção em que o destino ruraltorna-se cada vez menos predominante einviável, em função da forma como o Estadose estrutura em termos econômicos efundiários.

Quanto à dimensão demográfica, umdos primeiros elementos que merece desta-que refere-se à composição etária, por sexoe familiar dos migrantes. Estudos como ode Sydenstricker (1992), para Machadinhoem Rondônia, que tratam da ocupação dafronteira, observam que mesmo quando ochefe da família migrava previamentesozinho ou com os filhos homens maisvelhos, visando preparar o lote, o caráterfamiliar desse tipo de deslocamento era in-contestável. Os resultados de Diniz (2002)também mostram, para o caso de Roraima,que existe uma clara predominância de pes-soas casadas, em particular nas fronteiraspioneiras.10

Na verdade, dada a especificidade dos“atrativos” da região para a migração comouma área de fronteira agrícola, em particularnas décadas passadas, seria de se suporque a migração tivesse um predomínio defamílias,11 a não ser em casos bem específi-cos, como regiões de garimpo, por exemplo.

Em termos demográficos, isso se refle-tiria, por um lado, na forma das pirâmidesetárias e, por outro, no perfil da migraçãosegundo os distintos tipos de arranjosdomésticos, entre os quais aqueles relativos

às “famílias nucleares”, que acabariam porapresentar maior peso relativo. Nessesentido, os dados apresentados a seguirmostram claramente esse comportamento.Como se percebe pelas distribuições etáriasapresentadas (Gráficos 2, 3, 4), há clarasevidências de que a migração interestadualdo tipo familiar realmente predominou emMato Grosso, em particular nos períodos emque o fenômeno foi mais intenso, como asdécada de 70 e 80. Este fato se traduz naforma piramidal dos gráficos, muito emborafique claro que a participação de criançasmenores de cinco anos de idade não é muitogrande, guardando certa lógica com o queisso poderia implicar em termos dosconstrangimentos para uma migração paraáreas inóspitas, como são as regiões ruraisde Mato Grosso.

De qualquer forma, é interessante notarque, já nos anos 90, o perfil etário dosmigrantes sofreu significativa modificação,uma vez que se observa maior concen-tração de indivíduos nas idades produtivas,sugerindo, portanto, uma redução, aindaque pequena, da importância da migraçãodo tipo familiar. Como se verá mais adiante,este fenômeno, de fato, foi verificado, o queaponta para uma mudança, ainda que lentae gradativa, do perfil do migrante que sedestina para Mato Grosso.

Na verdade, em 2000, quando a mi-gração típica de “fronteira” certamente nãotinha a mesma importância, a distribuiçãoetária dos migrantes já mostrava uma maiorseletividade com relação à população “não-migrante” (Gráfico 5),12 em especial nasidades entre 20 e 35 anos. As observaçõessuscitadas pelas pirâmides são plenamentecorroboradas pela distribuição dos tipos dasfamílias de chefes migrantes interestaduais.Assim, a Tabela 7, ao mesmo tempo em queconfirma a predominância de migração dotipo familiar para o Estado, também indica

9 Incra – MT, Superintendência Regional de Mato Grosso – SR-13/MT.10 O autor desenvolve uma tipologia muito interessante sobre “a trajetória evolutiva das fronteiras” (p.3), criando as categoriaspioneira, transitória, consolidada e urbanizada. Muito embora tal classificação pudesse ser útil para a presente análise, os dadosdisponíveis não permitem esta diferenciação. Para maior detalhamento sobre a classificação, ver Diniz (2002 e 2003).11 Vale ressaltar mais uma vez que o Censo apenas capta o arranjo doméstico no momento da coleta da informação, o que,portanto, não assegura totalmente que este valia no momento da migração.12 Nesse estudo são considerados “não-migrantes” todos os indivíduos naturais de Mato Grosso que nunca migraram ou aquelescom mais de dez anos de residência no Estado.

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Fonte: IBGE. Censo Demográfico de 1980. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

GRÁFICO 2Pirâmide etária de imigrantes interestaduais, por sexo

Estado de Mato Grosso – 1980

Fonte: IBGE. Censo Demográfico de 1991. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

GRÁFICO 3Pirâmide etária de imigrantes interestaduais, por sexo

Estado de Mato Grosso – 1991

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GRÁFICO 5Pirâmide etária dos não-migrantes

Estado de Mato Grosso, 2000

GRÁFICO 4Pirâmide etária de imigrantes interestaduais, por sexo

Estado de Mato Grosso – 2000

Fonte: IBGE. Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

Fonte: IBGE. Censo Demográfico de 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

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Cunha, J.M

.P. da

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Fonte: IBGE. Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

TABELA 7Distribuição das famílias de chefes migrantes interestaduais, por tipo, segundo microrregiões

Estado de Mato Grosso – 1970-1996

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redução da participação desta categoria dearranjo doméstico em favor, particularmente,do tipo “individual”.

Do ponto de vista do comportamentodas microrregiões, o que se percebe é quea relação entre o perfil dos arranjos domés-ticos e os momentos de cada área noprocesso de ocupação demográfica e dafronteira de Mato Grosso é bastante clara.Os dados para as regiões do norte e noroes-te matogrossense (Alta Floresta, Aripuanã,Colíder, Arinos, etc.) mostram que, nestasáreas, mesmo em 2000, a proporção defamílias nucleares era a mais significativaentre os migrantes. A predominância defamílias não se repete no caso das micror-regiões com maior dinamismo urbano, comoCuiabá, Rondonópolis e até mesmo Parecis,que, como já se comentou, apresentamgrande crescimento demográfico e rápidaurbanização, muito provavelmente emfunção dos efeitos da expansão da soja.

Outro elemento que permite melhorsituar a problemática migratória no Estadode Mato Grosso refere-se à forma deinserção produtiva dos chefes migrantes.13

A partir desta análise foi possível identificaro progressivo “desmonte” a que foi subme-tido o Estado no que se refere às suasformas tradicionais de ocupação e em ter-mos demográficos e econômicos.

Entre as principais alterações ocorridasno perfil da migração, nos trinta anos anali-sados, a que permite maiores inferênciasquanto aos condicionantes da redução damigração para o Estado é a forte reduçãoda participação relativa da categoria “autô-nomo ou conta-própria na agropecuária”,14

no conjunto dos migrantes. Na verdade,

associado ao arrefecimento da migração aolongo do período, percebe-se que, enquan-to na década de 70 esta categoria absorviaprodutivamente 31,4% dos chefes de famíliamigrantes economicamente ativos, esteporcentual reduz-se para algo em torno de12,9% em 1991 e 9,6% em 2000.15

Na verdade, o impacto das transforma-ções produtivas em Mato Grosso fica aindamais claro quando estes dados são anali-sados segundo as microrregiões, uma vezque tal procedimento revela reduçõesainda mais dramáticas desta categoria dechefes migrantes, como em Aripuanã (de39,7% em 1980 para 25,2% em 2000),Colíder (de 67,7% para 24,5%), Paranatinga(de 51,3% para 10,6%), Jauru (de 54,4%para 16,2%) e Tangará da Serra (de 41,3%para 3,0%). Um caso interessante a ser tam-bém destacado é o de Norte Araguaia, que,nos anos 80, experimentou um incrementodestes migrantes ligados à agriculturafamiliar, atingindo 40% do total, sendo que,na década seguinte, este porcentual redu-ziu-se para 29%. Nesse caso específico,sabe-se que a área entra com mais forçacomo “rota” da fronteira apenas na décadade 80 (Gráfico 6).

É interessante ainda notar que, no Es-tado de Mato Grosso, a tendência apontadapara os migrantes também se observa paraos “não-migrantes”. Como se percebe noGráfico 7, estes últimos também reduziramsua participação na categoria “autônomosou conta-própria na agropecuária”, indi-cando que o ocorrido com os migrantes nãorepresenta uma situação peculiar, mas simuma tendência de um Estado que se urba-niza a passos largos e que, portanto, oferece

13 Esta variável foi construída de maneira a espelhar as condições de inserção dos migrantes na estrutura social dos locais dedestino. Embora não tenham a pretensão de ser uma proposta de estrutura socioocupacional, as categorias construídas a partirdo cruzamento entre o “setor da atividade” e “posição na ocupação” pretendem, de maneira aproximada, revelar a forma comoo migrante se insere na estrutura social do Estado, particularmente no que tange ao seu vínculo com as atividades agrícolas eurbanas. Além disso, pode haver um problema de comparabilidade com o Censo de 2000, o qual modificou a forma de captaçãoda população economicamente ativa, embora a informação gerada tenha tentado ficar mais próxima das definições usadas em1991 e 1980.14 Nesse caso particular, acredita-se que, entre as possibilidades oferecidas pelo Censo Demográfico, esta categoria seria a quemais se aproxima da identificação do pequeno proprietário familiar.15 É importante alertar para o fato de que, no Censo de 2000, existe uma possibilidade de que na categoria “conta-própria naagropecuária” estejam também contabilizados os parceiros e meeiros, cuja condição não foi levantada no referido censo. Assim,em comparação com os censos anteriores, os porcentuais apresentados podem estar até sobre estimados, muito embora o pesode parceiros e meeiros historicamente tenha sido pouco representativo no Estado.

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GRÁFICO 7Trabalhadores "autônomos ou conta-própria na agropecuária", segundo condição migratória

Estado de Mato Grosso – 1980-2000

GRÁFICO 6Participação dos "autônomos ou conta-propria na agropecuária" na PEA, segundo microrregiões selecionadas

Estado de Mato Grosso – 1970-2000

Fonte: IBGE. Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

Fonte: IBGE. Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000. Tabulações especiais Nepo/Unicamp.

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poucas alternativas aos seus habitantes,em particular aqueles ligados ao meio rural.

Entre estas alternativas, destacam-seos assentamentos de trabalhadores ruraisligados à Reforma Agrária, que, juntamentecom ocupações espontâneas – em geral depioneiros – têm viabilizado, ou mantido emalgum grau, a agricultura familiar no Estado.

Vale destacar ainda o caso de Sinop,onde a atividade industrial (leia-se madei-reiras) absorvia, em 1991, mais de 40% dosmigrantes, situação que denota a força dessetipo de atividade nesta área. Porém, na visitaa campo, os discursos de políticos da regiãojá sugerem sinais de fraqueza dessa in-dústria, devido, sobretudo, ao esgotamentodas reservas florestais mais próximas.Assim, os investimentos estão se destinandoao desenvolvimento de atividades maisdiversificadas, como indústrias de móveis eampliação do setor de serviços, além da in-trodução da agricultura capitalizada, princi-palmente de soja e arroz.

A despeito da importância da pecuáriano Estado, o porcentual de migrantes quetrabalham nesta atividade é relativamentepequeno, chegando em 1991, a pouco maisde 4% e aumentando para quase 11% em2000. Na verdade, verifica-se que, nas duasúltimas décadas, a maior parte dos chefesmigrantes estava vinculada a atividadestipicamente urbanas – “Comércio e Serviços”e “Indústria” –, que geravam trabalho a 23,4%e 27,7% dos chefes migrantes em 1991 e2000, respectivamente, contra apenas16,3% no começo do período em estudo.

Tais dados mostram sinais de que o“potencial atrativo” de Mato Grosso comoárea de fronteira não consolidada, progres-sivamente, vai se esgotando, fato que sereflete nas formas possíveis de inserção dosmigrantes, em geral trabalhadores rurais,pequenos produtores e descapitalizados,a quem restam poucas alternativas nos cen-tros urbanos ou nos assentamentos ligadosà Reforma Agrária.

Conclusões

Como uma das últimas áreas defronteira agrícola no país e, portanto, comouma das poucas alternativas para a

migração de pessoas ligadas ao campo, oEstado de Mato Grosso, até meados dosanos 80, cumpriu um papel importante noprocesso de redistribuição espacial da po-pulação brasileira. Contudo, sua trajetórianessa condição foi uma das mais curtas emrelação aos Estados do Centro-Oeste, emfunção de uma rápida e intensa transforma-ção produtiva e do conseqüente acirramentodo processo de concentração fundiária, aoqual foi exposto nas décadas de 80 e 90.

Em um misto de desenvolvimento eco-nômico em ritmo intenso e progressivo “fe-chamento” das fronteiras agrícolas pioneiras,o Estado de Mato Grosso, em menos de 20anos, deixa de ser um palco de possibi-lidades para milhares de brasileiros embusca de alternativas de reprodução socialno meio rural, para se converter paulatina-mente em uma alternativa de grandespossibilidades econômicas.

Os dados analisados neste estudomostram não apenas a redução do ímpetomigratório para o Estado, como também asrelações entre este comportamento e asmudanças nas formas de inserção dosmigrantes, que espelham o processo de“urbanização da fronteira” e a grandedesarticulação das formas de ocupação quepossibilitaram o “desbravamento” de boaparte de seu território.

Mesmo existindo poucas possibili-dades concretas para a manutenção deMato Grosso como uma área de atraçãomigratória, ainda há muitas regiões doEstado que se configuram como grandesalternativas para a absorção do grandecontingente de pessoas que exercematividades ligadas à terra. Hoje em dia,regiões do noroeste do Estado, por exemplo,são aquelas que mais crescem em termosdemográficos e boa parte deste crescimentose deve a novos núcleos rurais que surgem.Entretanto, pode-se perceber que propor-ção significativa do crescimento demográ-fico estadual acontece nos centros urbanos,em especial nos maiores, como Cuiabá,Rondonópolis e Sinop.

A alternativa dos assentamentos ruraistem sido uma possibilidade concreta dereverter parte desse processo de “urbani-zação forçada” de grandes parcelas de

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migrantes, e até mesmo de nativos e resi-dentes mais antigos do Estado. Na verdade,pode-se afirmar que o processo de ocupaçãodemográfica de Mato Grosso, particular-mente no que diz respeito ao papel daspequenas propriedades baseadas na agri-cultura familiar, provavelmente teria sidoainda mais desarticulado caso não existis-sem os programas de assentamentos rurais.

Estes projetos podem ser encontradosem praticamente todos os municípios deMato Grosso. No entanto, é fundamental quea forma de implantação e o gerenciamentodestes projetos sejam repensados demaneira a torná-los uma saída “real” paraaqueles que pretendem viver no e do rural.

As atividades econômicas hegemô-nicas (pecuária e soja) deixam suas marcasem praticamente todas as áreas existentes,via de regra, implicando considerável desru-ralização e inchamento urbano, que, namaior parte do território matogrossense, nãopossui condições de reter o excedentepopulacional. Este contínuo “movimento dafronteira” é percebido pela avaliação dastendências demográficas das várias micror-regiões do Estado.

Não se trata aqui de fazer qualquerapologia a possíveis efeitos negativos daexpansão capitalista da agricultura, atéporque ela é uma realidade e um dos gran-des pilares do desenvolvimento econômiconacional. Na verdade, como se tentoumostrar neste estudo, em algumas áreasde Mato Grosso o efeito da soja até se deude maneira contrária, ou seja, viabilizandoe dinamizando a ocupação demográfica. Noentanto, não há como negar que a formacomo se dá a apropriação da riqueza geradapor esta nova atividade não tem garantidouma distribuição da renda adequada enem, por conseqüência, implicado uma me-lhoria das condições de vida da população,em particular daquelas pessoas ou famíliasque desejariam garantir sua reproduçãosocial fora dos centros urbanos.

No entanto, considerando a trajetóriaeconômica e demográfica mais recente doMato Grosso, fica claro que esta atividade,combinada com a grande hegemonia, emtermos espaciais, da pecuária, deixa poucasalternativas viáveis para a continuidade do

intenso processo de ocupação, como foraobservado nas décadas passadas. Alémdisso, não se pode perder de vista que partedeste processo deveu-se à atividadegarimpeira, que, embora não esgotadatotalmente no Estado, hoje se desenvolvepreponderantemente a partir de grandesempresas mineradoras, não mais movimen-tando consideráveis volumes de migrantes.

Resta, portanto, pensar na força dosmaiores centros urbanos, como Cuiabá,Rondonópolis e talvez Sinop, que, no en-tanto, não parecem possuir uma estruturaprodutiva tão diversificada para forneceralternativas suficientes para a atração demigrantes interestaduais. Até porque estesúltimos, certamente, são precedidos pelosmigrantes intra-estaduais “deslocados” emvolumes cada vez maiores das áreas rurais,até então ocupadas no âmbito da expansãoda fronteira.

Diante deste quadro, considera-se queo Estado de Mato Grosso caminha progres-sivamente para o esgotamento de suacondição de fronteira agrícola, deixando deser uma alternativa para os migrantes. Tal-vez projetos concretos, como a pavimen-tação do trecho da Belém-Brasília no Pará– que facilitaria o escoamento da produção–, ou ainda aqueles mais distantes darealidade atual, como o desmembramentode Mato Grosso, pudessem no futuro darnovos rumos à dinâmica demográfica doEstado. Entretanto, nesse momento é difícilimaginar sequer a manutenção do poderatrativo dos anos 80 e, conseqüentemente,um desempenho migratório muito alémdaquele possibilitado por alguns centrosurbanos.

As análises realizadas permitem, por-tanto, vislumbrar algumas alternativas parao processo de ocupação demográfica deMato Grosso. Deve-se reconhecer que esteprocesso encontra-se em franca modificaçãoe, certamente, será influenciado por opçõesdos governos estadual e federal com relaçãoa questões bastante complexas, e por vezescontraditórias, para um país capitalistadependente como é o Brasil: conciliar odesenvolvimento econômico com o desen-volvimento humano e ainda a conservaçãoambiental.

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Dinâmica migratória e o processo de ocupação do Centro-Oeste brasileiroCunha, J.M.P. da

R. bras. Est. Pop., São Paulo, v. 23, n. 1, p. 87-107, jan./jun. 2006

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Abstract

Migratory dynamics and the occupation process in central-western Brazil: The case of theState of Mato Grosso

The State of Mato Grosso is one of the last frontier areas in Brazil, and still shows somepotential for populations that continue to seek alternatives for migration. Concurrently with theprocess of “urbanization of the frontier,” one can see other phenomena in the state that arehaving strong impacts on the opening up of new possibilities for realigning the population inthe territory, such as small farm settlements and new pioneering projects, which would havepositive impacts for the continued demographic occupation of the state. After having gonethrough an intense process of occupation until the mid-1980s, Mato Grosso’s demographicgrowth slowed down considerably. At the same time, however, it also continued to show relativedynamism in general. The present article is based on analyses of data from the Demographicand Agricultural Censuses and from interviews held in Mato Grosso, and analyzes migratorytrends in the state and their impacts on the process of occupation of the state in recent years.Special emphasis is given to the behavior of several areas that are representative of the mostimportant processes now underway. The author also seeks to locate these processes of changein the patterns of economic occupation. The analyses show strong association between thetwo phenomena, namely, on the one hand, the impact of extensive land-use activities such ascattle raising, soybeans, and cotton in reducing the possibilities for absorbing migrants in therural areas and, on the other, the “compensating” effects of land reform settlements.

Key words: Internal migration. Agricultural frontier. Determinants of migration. State of MatoGrosso.

Recebido para publicação em 16/11/2005.Aceito para publicação em 17/03/2006.

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