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    Expedio CaravelasDescobrindo o Brasil

    Por: Michael Bertram

    Introduo

    Esta uma viagem de descobrimento pelos confins do nosso Brasil. Pretendo no me limitar a

    somente dissertar sobre moto ou atraes tursticas. Quero mostrar tambm o lado humano das experincias

    vividas, as trapalhadas, as dificuldades, os dilemas, a hospitalidade das pessoas por onde passei.

    Um dia destes lendo relatos de outros motociclistas viajantes e escritores, cruzei com a seguinte

    citao do grande aventureiro Raphael Karan, que tenta explicar um pouco da fora inexplicvel que move

    todo motociclista:

    Viajar de moto no se limita ao transporte, mas receber o mundo por meio dos cinco sentidos. A

    temperatura, umidade, os cheiros, as cores, os rudos nos chegam sem filtros, diretamente nos rgos

    dos sentidos. Viajantes so diferentes, calculam o tempo em outra dimenso, aprendem a se despedir

    com a mesma naturalidade de quem acaba de chegar.

    NascimentoInciodo pProjeto: Expedio CaravelasDescobrindo o Brasil

    Quero primeiramente avisar aos queridos leitores que persistirem nesta aventura verdica

    protagonizada por mim, que este relato foi concebido de maneira totalmente amadora e despretensiosa. J

    explicarei. Quando iniciei a viagem no tinha em mente relat-la. Quando finalmente regressei a minha famlia,

    minha casa, minha cidade, depois das experincias desafiadoras que se sucederam, de muitos dias, das

    dificuldades, da descoberta de sentimentos novos e principalmente lugares fantsticos que tive a imensa

    oportunidade de conhecer, nem que seja s um pouquinho, mas o suficiente para poder bradar a plenos

    pulmes: - Nosso pas, nosso Brasil lindo!!! -, eu sentia que precisava fazer algo para primeiramente

    eternizar estas memrias para mim mesmo, e por que talvez no para outros aventureiros ou para aqueles que

    ainda no deram o primeiro passo em busca daquilo que lhes fascina. Resolvi relatar de forma detalhada,

    entusiasmada, tentando sempre buscar o lado humano e fugindo das colocaes automticas. P ara mim o

    relato teria que principalmente no florear ou tentar contar vantagem. Anseio que ao fim tenha conseguido

    transmitir a histria originale autntica , nem que seja s um pouquinho disso, nas linhas adiantes. Espero um

    dia olhar pra trs e lembrar disto tudo com alegria, e no ter vergonha se os olhos se encherem de lgrimas e

    soluos chorosos vierem tona.

    Pois bem, j h muito tempo eu vinha com uma imensa vontade de viajar pelo Brasil, desbravar um

    pouco mais dessa minha ptria que guarda lugares incrveis. Desde muito jovem, o mundo dos viajantes de

    moto sempre me deslumbrou. Qualquer reportagem, foto num lugar inspito, eu olhava vrias vezes para

    tentar no perder um detalhe sequer e tentava imaginar o que se passava na cabea daquele ser no momento.

    E naturalmente adquiri minha primeira moto para ir ao trabalho e depois outras se sucederam, at chegar

    nesta que tenho hoje. J tenho esta h quase 3 anos e venho usando tanto para trabalho, quanto para lazer,

    esta sempre me pareceu ser a que mais poderia proporcionar experincias e realizaes. J tive a oportunidadede conhecer um pouquinho do sul do Brasil, nesses ltimos 3 anos que estou realizando viagens pequenas

    desde um final de semana a at 4 ou 5 dias. E sempre alimentava o sonho de um dia conhecer um pouco de

    vrios lugares, comeando por Bonito/MS, o Pantanal/MS, a Chapada dos Guimares/MT, a capital nacional

    Braslia/DF, o Deserto do Jalapo/TO, as capitais do Nordeste Belm/PA, Fortaleza/CE, Natal/RN, Salvador/BA e

    suas lindas praias, Os Lenis Maranhense/MA, a Chapada Diamantina/BA, o Rio de Janeiro/RJ e a regio

    histrica de Minas Gerais. No seria eu o primeiro nem o ltimo a empreender uma viagem dessas de

    desbravar nossa ptria de extenso continental chamada Brasil. Muitos e h muito tempo atrs j fizeram

    quando a estrutura, as estradas, os meios de informao, tudo era bem mais difcil e atualmente no raro

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    encontrar outros com o mesmo propsito. Conversando com algumas pessoas que j viajaram bastante no s

    no Brasil, mas pela Amrica toda, sobre duas rodas, pessoas estas que estimo, admiro e respeito, muitos

    afirmavam que viajar pelo Brasil, era algo que talvez no me acrescentaria muito. Eu iria rodar e rodar e

    poderia no ver nada daquilo que esperava, custaria muito caro e dependendo do lugar onde passaria poderia

    ser assaltado ou quem sabe coisa pior. Enfim, geralmente me sugeriam uma contraproposta, porque voc novai viajar pelos pases vizinhos, para a Argentina, Chile, Peru, etc., l sim voc ir ficar boquiaberto, extasiado

    com o que ir encontrar, e viajar muito mais seguro e por estradas timas, aproveita que o peso argentino e

    chileno t baixo e por ai vai. Apresentavam inmeros argumentos, porm, no para que eu desistisse de viajar

    pelo Brasil, mas sim para que eu pudesse pesar as informaes e refletir sobre continuar ou no com um

    possvel projeto de desbravamento do Brasil, seja agora ou no futuro.

    No incio do ano de 2013 comecei a acompanhar um grupo no facebook chamado VMAS - Viagem de

    Moto pela Amrica do Sul., agradeo ao meu amigo Valdecir Ciquelero de Herval DOeste/SC por ter me

    apresentado e adicionado ao grupo. Eu ficava maravilhado com as postagens de fotos incrveis, relatos de

    viagem, troca de ideias sobre manuteno de motos, assunto no faltava, em fim o grupo formado por

    pessoas excelentes, sempre dispostas a ajudar e partilhar suas experincias. Como de praxe, no feriado de

    Corpus Christi de 30/05/13 a 02/06/13, foi realizado o 5 encontro anual em Canania/SP, e tive o grande

    prazer de conhecer e estar, mais do que com motociclistas, mas com inmeras pessoas com histrias que me

    cativaram e fascinaram, ficamos horas noite adentro conversando, na verdade eu ficava s ouvindohipnotizado de boca aberta. Na troca de ideias sobre este meu desejo vido de conhecer um pouco mais do

    Brasil, alguns me falaram o seguinte: faa o que voc tem vontade, planeje, se prepare, estude o roteiro, encha

    o tanque da moto e v em frente. Em momento algum desprezei ou esqueci o que j tinha ouvido de muitos

    outros, mas eu sentia que talvez no estivesse pronto para as viagens internacionais, e uma deste nvel em solo

    brasileiro poderia servir de grande aprendizado em todos os aspectos e iria realizar um antigo desejo incontido.

    Depois do encontro do VMAS, continuei com meus passeios aqui pelo sul, mas novamente inspirado e

    motivado a dar sequncia nos planos de descobrir um pouco mais do Brasil. Pra quem morra na regio Sul,

    costuma dizer subir o Brasil. E assim sempre que via algum lugar que prendia minha ateno, seja na TV,

    revista, internet, fui acrescentando a uma lista de pontos a visitar, sem me preocupar ainda com o roteiro em

    si.

    E assim permaneci nesta rotina at incio deste ano, quando minhas frias estavam se aproximando,

    sendo que deveria sair de frias at maio. Ento comecei a planejar a rota e abrir mais pesquisas sobre pontos

    tursticos relevantes de cada regio. Eu no me importava com condies climticas adversas como frio, calorou chuva, queria saber de viajar, e num pas continental como o nosso, por mais que se procurasse uma data

    mais propcia, naturalmente eu encararia quase todas estas adversidades, menos provavelmente frio, porque

    sairia do sul indo cada vez mais para regies quentes. Uma coisa devo confessar que sempre me deixava muito

    apreensivo, o fato de viajar sozinho, mas de certa forma eu sentia que podia ser uma experincia nova e

    preparadora para desafios maiores. Joo Guimares Rosa j dizia: Viver perigoso. Pensava que qualquer

    coisa que acontecesse seja comigo ou com a moto seria no mnimo ingnuo, irresponsvel se no aceitasse

    que tal coisa poderia acontecerao menos estaria em terras onde conseguiria me comunicar com as pessoas,

    coisa que se fosse em outro pas, se est tudo bem j difcil, imagine com problemas ento. Mas no

    descartei a possibilidade de ter parceria. Procurei por um bom tempo para ver se dava certo uma parceria com

    algum amigo aqui, ou mesmo algum dos camaradas do VMAS que esto espalhados pelo Brasil todo, mesmo

    que fosse s pra viajarmos juntos por uma determinada regio pois quanto maior e longa a viagem, mais

    dispendiosa se torna tanto em tempo como financeiramente. Cheguei at a pensar em encurtar a viagem indo

    s at Braslia e voltar por Minas, mas um dia quando fosse visitar o que ficou para trs agora, a metade daviagem j no seria to surpresa assim, sem contar o custo dobrado, coisa que pesa em todas as decises que

    so tomadas. O candidato que estava muito afim de encarar meu amigo Marlon Oliveira de Ponta Grossa/PR,

    que j rodou um bocado aqui no sul, centro-oeste e sudeste, mas infelizmente lhe aconteceram algumas coisas

    no ltimo ms que antecedeu a viagem e no foi possvel desta vez, mas no desisti, continuei com o plano

    original e viajaria nem que fosse sozinho, sozinho no, com Deus, com minha famlia e muitos amigos dando

    apoio remoto.

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    A preparao

    As ltimas semanas que antecederam a viagem foram bem puxadas. Continuei trabalhando

    normalmente, e de noite e nos finais de semana ajustava as ltimas coisas. Vivia ziguezagueando entre roteiro

    e algumas preparaes na moto, podendo dividir em alguns pontos:

    a) O roteiro, uma das etapas mais trabalhosas foi a verificao dos trechos sem abastecimento, masestamos bem servidos de postos. O nico lugar que se faria necessrio combustvel sobressalente

    no Deserto do Jalapo no Tocantins, que ser visto mais frente, para tanto providenciei dois

    gales de 5 litros. Na etapa final do planejamento do roteiro, devo confessar que estive muito

    apreensivo finalizando-o. Ser que vai dar tempo? Vou conseguir chegar em tal cidade tal dia?

    Estou com uma margem de folga caso precise ficar um dia parado por defeito na moto, ou eu no

    estar bem, ou alguma outra coisa? Olhava o roteiro e respondia pra mim mesmo: Vai dar tudo

    certo. Havia planejado viajar 28 dias, teria 32 dias de frias, sobrando 4 dias de margem de

    segurana. Quando finalmente cheguei num ponto e falei pra mim mesmo: Terminei, este omeu roteiro, fiquei mais tranquilo.

    b) Apesar do farol da Black Angel ser excelente, achei necessrio faris auxiliares caso precisasserodar at tarde da noite, com chuva, neblina para chegar em determinado lugar ou mesmo sair

    bem cedo, de madrugada ainda, para cobrir um certo trecho.

    c) Tambm adaptei uma tomada 12V para carregar as baterias dos eletrnicos a bordo como GPS,cmera fotogrfica, celular, tablet e bomba para colcho inflvel. Isso mesmo, iria levar barraca,

    colcho inflvel e saco de dormir. A ideia era tentar sempre que ficasse duas noites no mesmo

    lugar, montar acampamento, para de certa forma diminuir os custos da trip, alm de voc se

    sentir muito mais livre e autnomo. Acampar todo dia era ruim por causa do tempo que demora

    para montar e desmontar a barraca e todos os apetrechos, e tudo deve ser embalado direitinho

    de novo em sacos estanques para que no molhe e acomodado certinho na moto, e se estiver

    chovendo na hora de desmontar acampamento, ai fica difcil sair com tudo seco!

    d) E veio a parte deveras importante, uma reviso de praxe executada pela Rui Center Motos naBlack Angel - daqui pra frente a chamarei assim, este o nome de guerra da minha moto, uma

    Honda NX4 Falcon 400 cilindradas Ano 2008 cor preta. Agora que voltei so e salvo a bordo da

    minha guerreira, posso fazer uma propaganda para o meu amigo mecnico Rui, o cara fera, no

    escapou nada sob seus olhos vidos que pudesse me deixar na mo na estrada, ou melhor quase

    nada, brincadeira Rui, j falamos sobre isso risos, e da Black, sem palavras, uma mquina quase

    perfeita, muito robusta, s Deus sabe os perrengues pelos quais a fiz passar. No tinha muito que

    fazer, no ano passado precisei fazer uma manuteno grande no corao dela, no motor, j com a

    inteno de em breve encarar uma grande aventura. Desta vez foram somente aAlgumas coisas

    bsicas, como troca de pneus e kit de relao na guerreira e reviso geral dos demais

    componentes. Nos pneus foram instaladas cmaras de ar reforadas, parede de 4 mm de

    espessura e aplicado vacina auto reparadora de furos.

    e) Comprei novo trio para campingbarraca, colcho e saco de dormir os que tinha j estavambem surrados e tambm investi um pouco numa cmera fotogrfica semiprofissional FujiFilm pois

    minha velha compacta Panasonic Lumix estava querendo se aposentar as vezes, uma hora

    funcionava outras no, mas ela foi boa enquanto durou.

    f) A certa altura quase ia me esquecendo que a viagem precisava de um nome, que foi sugerido pelaminha amiga, e parceira de algumas viagens, Mari Silva de Jaragu do Sul/SCfundadora do Free

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    Angels Mototurismo, para o qual me designou como um dos seus guias oficiais , fiquei

    extremamente lisonjeado com o convite -. Adorei o nome proposto por ela: Expedio

    Caravelas. O nome caiu nas mos do meu amigo Juliano Alvesde Curitiba/PR - e ele j fez a arte

    do adesivo da trip em dois tempos, gostei muito, inclusive enfeitou um pouco mais o nome,

    ficando assim: Expedio Caravelas Descobrindo o Brasilpor Michael Bertram.

    g) Tambm fui juntando algumas ferramentas e itens essenciais para manuteno na Black Angel.Alm do jogo de chaves original de fbrica, estava levando um kit de chaves intercambiveis tipo

    estrela, fenda, Philips e allen. Tambm levaria duas cmaras de ar - do pneu dianteiro e traseiro -,

    esptulas para troca de cmara, bomba para encher pneu, um spray reparador de furos de pneu

    aplicado aps furar, vela de ignio, manete de embreagem, pedal troca-marchas, corrente de

    transmisso com emenda e uma corda de 20 metros... caso surgisse alguma dificuldade e ...

    precisasse terminar a viagem de maneira no planejada.... opsssOpsss.... brincadeiraBrincadeira...

    pra ser rebocado mesmo!risos.

    h) Para navegao, iria com o GPS Orange G360M que j me guia h bastante tempo e ainda doisback-ups: as rotas dirias impressas do Google Maps e salvas em formato de imagem no celular.

    i) Muitos me perguntaram quanta roupa eu levaria para quase um ms de estrada, minha respostaera: 2 calas jeans, 1 cala de tactel, 3 camisas de malha, 2 camisas de polister, 1 camisa manga

    longa, 1 short jeans, 1 calo de banho, 5 cuecas e 5 pares de meia. Tem muitos aventureiros

    adeptos da tecnologia slimque vo com menos ainda - cortar pela metade o cabo da escova de

    dentes para levar menos peso e volume o mnimo para eles. O segredo ir lavando sempre que

    d. Uma ttica j comum pra mim e que funciona muito bem para as peas ntimas lavar, torcer

    bem numa toalha e estender sobre a TV quando em hospedagem com tal regalia. Na verdade esta

    foi a maior utilidade da TV em todos os lugares que fiquei. As demais peas, as vezes se consegue

    sec-las assim e as vezes no, tudo depende da temperatura e do tempo que ficar secando. Mas

    mesmo um pouco midas, se estiver um dia ensolarado, d para usar e secam rapidamente nos

    primeiros quilmetros quando em movimento com a moto.

    j) No mais a expectativa do dia de partida chegando mexia comigo, tanto que esqueci deconfeccionar os adesivos da trip para espalhar por ai, me desculpa ai meu caro Juliano!

    E assim chegou o dia 9 de abril de 2014. O ltimo dia que dormiria em casa, o ltimo dia de trabalho, o

    dia de despedida dos familiares e amigos pois iramos nos separar por praticamente um ms e apesar de

    ningum ter coragem para falar, existia muita coisa em jogo, por mais cuidadoso que fosse, que no tnhamos

    controle total de nada, e poderia inclusive ser este o ltimo adeus.... Mas quando pensava em coisas deste

    tipo, eu enchia os pulmes e respirava fundo e falava pra dentro de mim : : Cara, vai dar tudo certo, Deus

    estar comigo.

    Nesta ltima noite demorei-me um pouco demais ajeitando e amarrando as bagagens com cuidado,

    pois iriam me acompanhar numa longa jornada e perder alguma coisa no caminho iria gerar transtornos com

    certeza. Aps uma voltinha pelo bairro para verificar a acomodao das bagagens, em torno das 23h deitei a

    cabea no travesseiro e pensei somente em coisas boas, nas maravilhas que encontraria, pensei em como seria

    estar andando por uma longa estrada com belas paisagens me acompanhando e apaguei.

    No relato a seguir, irei suprimir coisas banais como dizer que parei para abastecer, comer, parada paraxixi, engraxar corrente, fotos de placas de praxe, pegar dinheiro no banco, ligar ou mandar mensagem pro

    pessoal em casa, ou coisas corriqueiras que no precisam constar no relato, so automticas, a no ser quando

    algum fato relacionado for relevante.

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    Dirio de Bordo

    1 Dia - Ser que o Marlon no vai mesmo?

    2 Dia - Dois sustos e uma deciso

    3 Dia - No bonito, lindo!

    4 Dia - Sentindo na pele os efeitos de viajar

    5 Dia - Cad a chapada?

    6 Dia - Um longo tiro at a capital

    7 Dia - Passeando em Braslia

    8 Dia - Amadurecendo lies

    9 Dia - Jalapo, quanto mais difcil, mais doce o sabor da vitria

    10 Dia - Saindo do Jalapo, um prmio logo cedo

    11 Dia - Muito bom fazer amigos em terras distantes

    12 Dia - Muitos perigos, um deles quase ps fim a trip

    13 Dia - Belm, o marco divisrio da primeira metade da trip. 14 Dia -

    Maranho, terra sem lei, ser?

    15 Dia - Relaxando nos surreais Lenis Maranhenses

    16 Dia - Um pequeno desvio

    17 Dia - As belezas no convencionais de Jericoacoara

    18 Dia - Minha guerreira provando capim amargo

    19 Dia - Uma volta tima por Natal

    20 Dia - Um personagem de extrema nobreza

    21 Dia - Quebrando tudo!

    22 Dia - Desafiado pela espetacular Chapada Diamantina

    23 Dia - Voltinha pela anci Salvador

    24 Dia - Um problema, um grande aprendizado

    25 Dia - Primeira lio: Jamais deixars um irmo na estrada

    26 Dia - Os encantos de Vila Velha

    27 Dia - Passagem relmpago pelo Rio de Janeiro

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    28 Dia - A ltima prova: Rastro da Serpente

    Estatsticas da trip

    Projeto 5 Continentes Uma viagem de descobertas pelos confins da Terra. um relato sensvel e

    abrangente da histria de um homem que sonhou conhecer o mundo e conheceu. A narrativa no se limita a

    uma viagem de moto, nem a roteiros tursticos, nem a um mapa de paisagens. So experincias vividas durante

    oito anos com aborgenes australianos, hospitaleiros iranianos, msticos sadhus indianos, despossudos

    africanos subsaarianos, sem deixar de mencionar as causas e os efeitos das muitas intervenes estrangeiras

    na vida desses povos. O humor e as trapalhadas do autor, que aprendeu a rir de si mesmo, esto presentes no

    livro.

    Viajar de moto no se limita ao transporte, mas receber o mundo por meio dos cinco sentidos. Atemperatura, umidade, os cheiros, as cores, os rudos nos chegam sem filtros, diretamente nos rgos dos

    sentidos. Viajantes so diferentes, calculam o tempo em outra dimenso, aprendem a se despedir com a

    mesma naturalidade de quem acaba de chegar.

    Ser que o Marlon no vai mesmo?

    1 Dia10/abril/2014

    Distncia percorrida: 701 kms de Benedito Novo/SC a Mandaguari/PR

    As 06:00h o celular me despertou. Primeira olhada pela janela anunciou um dia nublado pela frente.

    Caf tomado e bora pegar estrada. Minha me acompanhou a preparao e toda hora perguntava se eu estava

    levando isso ou aquilo, tentando a todo custo talvez me superproteger, impedir que faltasse algo. Despedidas

    feitas, eu estava feliz porque tinha chegado a hora de partir e esperava que em 28 dias a Black Angel me

    trouxesse de volta para colocar o p no mesmo lugar. Antes de sair, armei o trip e coloquei a cmera e minha

    me para filmar minha sada. Pronto agora oficialmente tinha dado incio a viagem. A empolgao foi tanta que

    andei mais de um quilmetro, s ento me lembrei de voltar para pegar a cmera e trip.

    Sa sereno, tranquilo e uns 21 kms depois em Timb/SC, lembrei de fazer a tradicional foto do

    hodmetro do painel marcando a quilometragem de incio da trip. Marcava 54313 kms, descontando os 21 que

    j tinha rodado, sa de casa com 54292 kms. Na serra de Corup/SC, tomei a primeira chuva, meio tmida, da

    viagem. Pensei que seria passageira, mas mesmo depois de terminar os 30kms de subida da serra, j chegandoem Rio Negrinho/SC, no dava trgua, exigindo uma parada para vestir a roupa de chuva por cima da de

    cordura e troca da bota de couro pela impermevel. A chuva me acompanhou por curtos, talvez, 3 kms e deu

    lugar ao sol, o destino j me pregando a primeira pearisos.

    Em torno das 13:00h, cheguei na oficina de moto do pai do meu amigo Marlon Oliveira em Ponta

    Grossa/PR. At ento eu no tinha certeza se o sujeito no me pregaria uma pea. Achava que realmente ao

    me ver chegar ali, estaria pronto me esperando para embarcar nessa trip comigo, pois em momento algum ele

    deixou claro que no daria para ir nessa. No fundo tinha um pouco de esperana de que faramos esta longa

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    aventura juntos. Logo o Marlon apareceucom nada preparado, imagine a minha frustrao.Mpara me levouar

    pra casa dele e saborear um delicioso almoo, e entrega da bandeira do VMAS. O Marlon j pendurou a

    bandeira na minha moto e foi logo convocando, a simptica e boa cozinheira, a me dele para tirar fotos de ns

    com a Black Angel. Recebi a bandeira do VMAS para me acompanhar e sair junto nas fotos nos pontos altos da

    trip. No sabamos que depois destas fotos que fizemos no quintal da casa dele, ela seria esquecida por 28 diasno fundo do meu bauleto traseiro, em baixo da minha mala pessoal, j me desculpei com o Marlon sobre o

    ocorrido - risos. Senti no Marlon uma imensa tristeza, uma vontade enorme de estar nessa comigo, mas

    infelizmente no deu. Teve que servir de consolo alguns quilmetros que ele me acompanhou at a sada de

    sua cidade. Nesta passagem relmpago por Ponta Grossa, inclusive comentei com o Marlon, que cidade

    perfumada aquela. Fazia questo de andar com a viseira do capacete aberta para sentir o aroma delicioso

    seja de algum restaurante, de perfumedas moas elegantes que circulavam pelas caladas - tudo misturado,

    diversas combinaes que pairavam no ar e agradabilssimas ao olfato, aquilo me chamou a ateno.

    A tarde prosseguiu tranquila. J escuro em torno das 19:00h, entrei na cidade de Mandaguari/PR para

    procurar pouso. Logo de cara contornei uma rtula na contramo e levei uma buzinada de advertncia de um

    motorista. Procurei placas para me certificar que estava errado e nada vi. Parei imediatamente na sada da

    rtula em frente de uma lanchonete mvel, precisava lanchar e depois procurar pouso. Fiz um timo lanche na

    Ander Burg. O garom falou que a rtula era nova e que ainda no tinha sinalizao, era comum o pessoal de

    fora entrar na contramo, ufah... eu no tinha sido o nico a levar buzinada, me consolou. Os transeuntesnuma grande praa em frente me distraram enquanto lanchava. Tinha um monumento no centro da praa e

    fui ver. Era uma homenagem aos pioneiros da cafeicultura na cidade na dcada de 40. Sa a p nos arredores

    para ver os preos de algumas pousadas e me surpreendi, todos caros, meu o que que tem nesta cidade?

    Numa delas fui informado de uma outra na beira da BR mais em conta. Voltei, montei na moto e fui pra BR de

    novo seguindo viagem praparaver se encontrava a tal pousada, Amazonas se chamava. Achei fcil e o preo foi

    justo e com tudo que era necessrio, chuveiro quente, cama boa, caf da manh e estacionamento fechado.

    Como iria sair em torno das 05:30h, no teria caf da manh ainda, pedi uma fruta apenas ao recepcionista,

    mas ele veio com 6 laranjasmeio verdes ainda, mas estava valendo - pra mim, obah o caf e lanchinho das 9

    j estava garantido. ltima atividade, engraxar a corrente de transmisso pro dia seguinte e depois juntar os

    olhos.

    Dois sustos e uma deciso

    2 Dia11/abril/2014

    Distncia percorrida: 812 kms de Mandaguari/PR a Bonito/MS

    Acordei as 05:00h, matei duas laranjas. As 05:30h j estava na estrada e o dia comeando a clarear.

    Pelas 8 da manh, primeira parada para abastecimento. Uma das poucas vezes que fiquei contente por ter

    entrado bastante gasolina no tanque, foram R$ 36,00 me dando direito a cada R$ 30,00 um bilhete para

    concorrer a um Camaro amarelo que estava em exposio na frente do posto. Seria um belo prmio e bom

    jeito para voltar pra casarisos.

    Fui seguindo o GPS at chegar numa cidadezinha chamada Porto So Jos/PR. L tinha uma balsa pratravessia do rio Paran, mas j tinha sado de l pra outra margem e voltaria em duas horas. Avaliei e voltei uns

    15 kms, indo por Nova Londrina e Diamante do Norte, para passar pela represa Rosana e Usina Porto

    Primavera que tinha ponte pra travessia do rio. A apareceu a primeira placa de divisa de estados de So Paulo

    com Mato Grosso do Sul bem no meio da ponte, e apesar das placas de advertncia para no parar na ponte,

    como estava com pouco trnsito, parei prapara clicar assim mesmo. A rodovia passa no p da barragem

    aterrada, so 5 kms de um reto e de um lado o paredo inclinado da barragem e de outro o leito do rio.

    E fui motocando por asfalto razovel, poucos buracos, mas de moto desviava com facilidade. Aqui a

    primeira novidade, por um bom trecho em Anaurilndia/MS as pastagens do lado direito da rodovia estavam

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    cobertaos de formigueirosgigantes - ou cupinzeiros, no consegui descobrir ao certo - giganteschegando fcil

    a mais de 1 metro de altura. Haviam muitos, parecia uma fazendade criao de formigas, o estranho era que

    um lado da via estava infestado daquelas estranhas formaese formigueirose do outro nada, nenhum sequer.

    Paradinha para clicar este estranho fenmeno. E assim fui rodando. Poucos quilmetros depois, tomei um

    susto daqueles de ter que parar prapararespirar. Foi o seguinte: tinha um baita reto, vi que l bem longe emsentido contrrio vinha um nibus e uma carreta ultrapassando o mesmo. A carreta concluiu a ultrapassagem e

    vinha em boa velocidade, j fui bem pro lado, quase no acostamento, da pista para dar mais espao e no

    sentir tanto a pancada do vento quando ela passasse, como de praxe. Quando a carreta chega uns 10 metros

    antes de passar por mim, ouo um grande estouro vindo do pneu de trao do cavalo mecnico, levantou uma

    poeira branca que encobriu um pouco a viso da pista, mas vi o pneu se despedaando. No tinha para onde ir,

    acostamento estreito e estava rpido demais para frear, instintivamente segurei firme no guido j esperando

    talvez atropelar um pedao da banda, e de repente um grando destes passou voando pela minha esquerda,

    alguns pedaos menores foram desviados pela bolha. Foi to rpido, o baque do estouro e o pedao que

    passou voando que perdi momentaneamente o equilbrio, a pulsao entrou em disparada, reduzi velocidade e

    fui pro acostamento, dei uma olhada no retrovisor e vi o pneu da carreta rodando todo esfarrapado e saindo

    fascas dos arames em contato com o asfalto, mas o motorista nem a, foi embora no mesmo pique. Agradeci a

    Deus ter me protegido de algo que poderia ter sido bem grave. O motorista do nibus viu a cena de longe,

    parou para ver se estava tudo bem. Minutos depois, recuperei o flego e fui voltando ao ritmo de viagem. E

    novo susto frente. Alguns quilmetros adiante, j me arriscando a desgrudar os olhos da estrada e dar uma

    olhada nos arredores, vi um bando grande, acho que uns 10 talvez, de urubus no meio do meu lado da pista

    saboreando a refeio do dia. Estava vindo em boa velocidade, reduzi um pouco e fui pra pista contrria para

    dar mais folga caso algum decida vir inconscientemente pra cima. J vim buzinando, praparaespantar e fazer

    sa-los de l, mas um ficou l saboreando o animal. Achei que ficaria l, mas quando ia passando, ele levantou

    voo e veio pra cima de mim. No deu tempo de fazer nada, ele pegou de raspo na bolha que o jogou um

    pouco pra cima, mas ainda pegou na lateral esquerda do meu capacete, foi uma cacetada que me desnorteou

    novamente. Senti a catinga ftida do animal que nem vi onde parou. Achei que tinha quebrado a viseira do

    capacete, parei logo para ver, mas estava s desencaixada. Agora estava diante de um dilema. Poxa duas vezes

    seguidas tomar um susto desses, o Mato Grosso do Sul s faltava me receber a pedradas agora e pedir para dar

    meia volta e voltar pra casa. E era apenas o segundo dia de viagem, o que mais me esperava em tantos dias

    pela frente? Pensei inclusive, ser que no um sinal divino pedindo para desistir da trip, voltar pra casa, coisa

    que tinha ouvido diversas vezes antes de sair. Quantas vezes um raio cai duas vezes no mesmo lugar? Difcil

    resposta, pesei os acontecidos. No primeiro eu no tinha o que fazer, uma fatalidade, mas no segundo eupoderia ter evitado se tivesse reduzido mais, parado se fosse o caso, tinha sido uma falha minha, negligenciei a

    devida importncia da circunstncia que se apresentou. Pensei que apesar dos sustos enormes e ter sado ileso

    por um triz, esta tenha sido uma maneira de a divina providncia me chamar a ateno, de me mostrar que

    somente eu era responsvel pelos meus atos. Decidi continuar, mas em alerta total, mais ligado do que nunca.

    Depois disso, a tarde transcorreu normalmente, sendo a maior ateno o desvio de alguns poucos

    buracos na pista. No fim de tarde no ltimo trecho de uns 50 kms antes de Bonito/MS, um belo presente,

    asfalto novo bem sinalizado e um pr-do-sol diferente. Bem prximo da linha do horizonte, entre duas nuvens

    havia um crculo meio ovalado e por vezes a estrada se alinhava perfeitamente com este crculo e tendia a

    sumir entre as nuvens. Fui andando maravilhado e distrado com o efeito. Quando me dei conta de que devia

    clicar o fenmeno, a vista j no era mais a mesma. Fui tocando devagar e esperando para ver se voltava, logo

    vi que tinha perdido o melhor momento, mas parei e fiz a foto assim mesmo como deu.

    Pelas 20:00h cheguei em Bonito/MS. Parada para abastecimento no primeiro posto e conforme dica

    do meu amigo Marlon, pedi como chegar no Albergue Hostel International ou simplesmente Hi. Poucasquadras depois, aps atravessar a avenida central bem limpa, iluminada, muitas pessoas caminhando,

    barzinhos com gente conversando e bebendo alegres, umas espcies de troncos de madeira formavam um arco

    sobre a avenida a cada intervalo regular, cheguei no Hi. Como planejado peguei camping. O recepcionista foi

    muito atencioso, me mostrou as instalaes, at piscina tinha, apesar de eu nem ter usado. Para minha

    surpresa, eu era o nico habitante do camping naquela sexta-feira, mas no mais muitos hspedes pelas reas

    comuns. A moto devia ficar no estacionamento segundo normas do Hi, mas insisti que precisava encher o

    colcho com a bomba eltrica ligada na moto. O recepcionista acabou liberando a entrada da moto no

    camping, j que no tinha ningum mais l que poderia se incomodar com isso. De acampamento montado e

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    banho tomado, fui comer algo na lanchonete dentro do albergue. Uma placa dizia que fechava as 22:00h, mas

    j passava disso segundo meu celular, descobri que estava com sorte, a mudana de fuso horrio no Mato

    Grosso do Sul - uma hora a menos de Braslia - me deu uma hora a mais. Estava quase lotada. Me chamou

    ateno um grupo de meninas argentinas uniformizadas que conversavam animadas numa mesa de canto.

    Eram de alguma espcie de faculdade nacional pelo que diziam suas camisas. Do lado da lanchonete tinha umaagncia de turismo e j reservei meus passeios para o dia seguinte, o nico que ficaria na cidade. Queria fazer

    a flutuao no Rio Sucuri e Rio da Prata, mas vaga s na segunda-feira, devia ter reservado antecipadamente.

    Aceitei ento a flutuao no Aqurio Natural R$ 150,00 -me garantiram que era bom tambm e ainda

    visitao as Grutas de So Miguel e do Lago Azul R$ 45,00 cada uma - esta ltima um dos cartes postais

    mais belos da cidade. Com estes passeios fechava o dia. Ficariam muitos passeios especficos de trilhas,

    cachoeiras, contato com animais da regio de fora, mas a flutuao em qualquer um dos rios liberados para tal

    e as grutas eram imperdveis. Fui informado que se tivesse sorte, poderia ver alguns bichos pelas trilhas que

    levavam as atraes que eu acabei optando, me servindo de consolo. Em torno das 23:00h, comecei a testar o

    equipamento de camping novo, barraca, colcho e saco de dormir. Nem imaginava que usaria a barraca pela

    nica e ltima vez...

    No bonito, lindo!

    3 Dia12/abril/2014

    Distncia percorrida: 66 kms porPasseando emBonito/MS

    Ouvi o som do toque do celular me acordando. Abri o zper da barraca e um dia nublado se anunciava.

    Tomei caf no albergue e pelas 7:00h estava na estrada para a primeira atrao do dia, as Grutas de So

    Miguel. Percorri talvez 1 km de asfalto at a sada da cidade e mais uns 15 kms de cho em bom estado. No

    caminho algumas paradas para fotos de placas e portais das demais atraes que iam aparecendo. Notei que

    todas as atraes e ruas laterais estavam bem sinalizadas quanto as atraes e distncias.

    As 7:50h cheguei na recepo. Meu passeio estava marcado para sair as 8:00h. A recepo era bem

    aconchegante, construda em estilo rural. Em frente um enorme e bem cuidado jardim dava as boas-vindas aos

    visitantes. Logo descobri uma rvore muito alta ao lado e algumas araras bem no topo. Queria registrar suas

    cores intensas, mas o contraste com o cu claro ao fundo no permitia bons resultados. Pensei em como seria

    bom estar l em cima perto delas para poder tirar uma foto boa. As 8:00h voltei para iniciar o passeio, mas

    faltava vir um grupo ainda. Me distra caminhando nos arredores e procurando coisas a fotografar. Eram 8:30h

    quando chegou a van com mais turistas, quase todos deviam estar na casa ou acima dos cinquenta. Fomos

    conduzidos ao segundo piso da recepo e aps avisos de segurana, informou o guia que o passeio demoraria

    uma hora e meia. Me preocupei porque tinha outro passeio marcado para as 10:00 e ficaria apertado de

    tempo. O guia me tranquilizou que de l at a Gruta do Lago Azul eram 10 minutos de carro e no retorno do

    passeio pela trilha eu poderia voltar sozinho e mais rpido que o restante do grupo, dando em torno de 1 hora

    o passeio. Assistimos um documentrio da Gruta, alguns receberam lanternas, outros guarda-chuvas e subimos

    mais um piso dentro daquela construo rstica. Desde que cheguei, no tinha reparado na altura da

    construo e muito menos que iriamos sair dela por cima numa passarela suspensa entre as rvores. O terceiro

    piso era um mirante e agora eu pude fotografar as araras bem de perto, tinha conseguido a foto que queria.

    Seguimos em frente, parando algumas vezes para esperar o reagrupamento do grupo devido aos mais lentos,

    mas foi boa a lentido, assim consegui clicar com calma mais algumas araras, uma cutia, um macaco bugio, um

    cervo e at um jacar. Este jacar foi o primeiro que vi solto na natureza. Estava instalado num alagadiodebaixo de uma passagem suspensa que atravessaramos mais adiante. Continuamos na trilha por uns 300

    metros ainda sobre passarelas e depois mais uns 500 metros de trilha de terra. Para entrar na gruta descemos

    uma ladeira de uns 50 metros bem ngremes. A escurido ia sendo quebrada com dificuldade pelas velhas

    lanternas com lmpadas convencionais que o grupo portava. Dica: leve sua prpria lanterna Tinha trazido um

    dos meus faris auxiliares da moto que era uma lanterna policial das mais potentes. Adaptei-a para uso na

    moto e uso porttil. Quando acendi um claro se abriu e muitos agradeceram a gentileza. No interior logo um

    fato curioso. Vimos prolas oriundas de um pequeno gro de arreia que cai numa pequena poa de gua que

    alimentada por gotas que caem nela com frequncia. Cada gota que cai, cria um constante movimento de

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    rotao na gua e ao mesmo tempo traz consigo mais sais que vo aderindo ao minsculo ncleo da prola

    que, devido rotao, cresce com estrutura esfrica. A prola que vimos era levemente roseada e tamanho de

    uma pequena bola de gude. A maioria dos exemplares da gruta j havia sido extraviada, no pelo valor

    comercial, apenas pela beleza encantadora e por servir de lembrana de visita da gruta, por isso encontrar uma

    dessas algo bem raro num lugar aberto ao pblico. Cada vez que cai um pingo de gua, o gro d uma giradaat chegar num ponto em que o peso dgua caindoem cima no consegue mais gir-lo, aos poucos a gua

    evapora e ficam somente os sais que vo aderindo ao grozinho, grudando a prola formada no cho e

    posteriormente originando uma estalactite. Passarmos por uma fenda estreita, chegamos numa nave muito

    alta, talvez uns vinte metros de altura e vi alguns morcegos dependurados no teto. Tentei fotografar, inclusive

    usei minha lanterna para dar mais luz, mas a foto no ficou boa, estavam muito longe e a iluminao era

    insuficiente. Vimos muitas formaes de estalactites e estalagmites geralmente monocromticas, mas poucas

    haviam se unido formando colunas, denotando que a gruta no era to velha assim, apenas alguns milhes de

    anos. Aps uma meia hora rastejandono interior da gruta, chegamos na sada. Para mim a maior descoberta

    neste passeio foi ter uma pacincia tremenda para acompanhar o grupo que tropeava as vezes na prpria

    sombra, em parte por culpa das ineficientes lanternas que portavam e dos guarda chuvas bem sovados que

    teimavam em abrir devido a ausncia daquela cordinha para mant-los fechados. Uma subida muito ngreme

    surgiu a nossa frente. Uma senhora escorregou, mas nosso guia que estava ao lado, muito ligeiro e com

    extrema destreza a segurou pelo brao, impedindo sua queda. De l fui dispensado pelo guia e voltei sozinho

    apressadamente at a recepo.

    Embarquei na Black Angel e fomos adiante uns 8 kms at a Gruta do Lago Azul. Eram 10:05h conforme

    me informou um motorista dos muitos nibus no estacionamento. Entreguei o ingresso a recepcionista e fui

    encaminhado um grupo bem diversificado de uns quinze visitantes. Recebemos capacetes e iniciamos a

    caminhada na trilha totalmente plana com um chuvisco leve brigando com o sol as vezes. O guia um sujeito

    bem simptico e que tentava as vezes arranhar algumas piadas curtas - foi nos distraindo contando um pouco

    da histria do local. Rapidamente acabou a trilha plana e chegamos na boca da gruta. Para entrar nela, uma

    descida de 80 metros bem acentuados nos aguardava. Fomos orientados a descer de lado e sempre manter um

    p bem firme caso o outro escorregue devido as pedras estarem molhadas. Paramos algumas vezes e o guia fez

    questo de fotografar os grupos, casais ou sozinhos mesmos que ali estavam. Na metade da descida, entrando

    na gruta, fomos cobertos pelo enorme paredo inclinado e recheado de centenas de estalactites apontando

    para nossas cabeas. O chuvisco que teimava em procurar a lente da cmera deu adeus. J podamos avistar o

    lago escuro l embaixo, porm o famoso tom azulado que esperava, no dava sinal ainda. Continuamos a

    descida e lentamente a gua escura estava adquirindo um azul totalmente translcido. Nos ltimos degraus, a

    imagem a nossa frente era simplesmente fantstica. Suas guas comeavam quase transparentes na margem e

    a medida que sumiam entre as paredes da caverna o azul se transformava at escurecer por completo. O guia

    contou que o efeito azul dependia da luz solar que causava uma reao luminescente com uma espcie nica e

    rara de microrganismos presentes na gua, ento quanto mais luz, mais azul. Naquele dia o sol estava um

    pouco tmido l em cima, mas o espetculo fora suficiente para ns. O ecossistema muito frgil e a

    interveno humana desenfreada poderia rapidamente acabar com aquela maravilha. O guia nos fez meditar

    um pouco, pedindo um minuto de silncio absoluto para contemplarmos, ouvirmos o som da gua sumindo

    entre as fendas, sentirmos o friozinho da gruta e fixamos aquela imagem azulada em nossa mente. Depois

    ficamos ainda uns vinte minutos tentando descobrir qual posio renderia as mais belas fotos. Me pareceu que

    uma das jovens visitantes tinha descoberto um bom lugar onde os poucos raios de sol que vinham iluminavam

    a face das pessoas e o lago azul logo atrs. Pedi para tirar uma foto minha e fui gentilmente atendido. O sol nos

    recebeu na subida de volta que foi tranquila e sem pressa. No retorno da trilha, a jovem que tirou minha

    melhor foto no lago azul e eu comeamos a conversar. Uma gacha que estava a trabalho em Campo Grandecapital do Mato Grosso do Sul que dista 260 kms de Bonito - e tinha vindo aproveitar o seu fim de semana para

    explorar a cidade. Ela estava sozinha e para se deslocar entre os passeios dependia de txi ou uma carona de

    algum. Concordamos que eu poderia oferecer-lhe uma carona, mas no de onde estvamos porque no tinha

    como arrumar um capacete ali. Trocamos os telefones e ela retornou, nem me lembro como, para a cidade. Ela

    tentaria marcar o passeio dela para as 15:00h no Aqurio Natural junto comigo. gatha era seu nome. Era hora

    do almoo e fiz um lanchinho leve na cantina, enquanto presumia que jamais aquela moa simptica me

    retornaria. Logo um senhor de meia idade, Lauro, acompanhado da esposa se aproximou. Disse que me

    acompanhou por pelo menos uma centena de kms no dia anterior at chegar ali na cidade, era pelo colete que

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    me reconheceu. Viajava numa Blazer e estava vindo com o piloto automtico ligado e brincou perguntando se

    eu tambm tinha tal aparato na minha moto pois eu estava andando exatamente na mesma velocidade que ele

    a apenas algumas centenas de metros frente. Verdade, tinha visto a caminhonete no retrovisor l longe. Por

    uns instantes pensei que logo me ultrapassaria, mas isso no ocorreu, e logo acabei me esquecendo dela. At

    se ofereceram para dar uma carona nos demais passeios caso quisesse descansar um pouco da moto. Elesestavam acomodados numa pousada de um amigo pouco antes da cidade. Iriam passar a semana toda

    desbravando a regio e depois voltariam a Curitiba/PR. Nosso passeio da tarde no coincidiu e como iria

    embora no dia seguinte, agradeci a gentileza do convite.

    De volta para a cidade, precisava achar uma oficina de moto para comprar umas bisnagas de graxa

    para a corrente de transmisso que comeava a ranger, minha j tinha acabado. Pedi informaes num ponto

    de moto-txi. Me falaram que como era sbado de tarde, no encontraria nenhuma oficina aberta, mas um

    rapaz disse que tinha algumas bisnagas em casa e poderia me vender. Acertei um preo justo e ele saiu para

    buscar ali perto. Liguei o celular para verificar as horas e obtive uma surpresa, a moa tinha respondido que

    conseguiu marcar o passeio, s faltava arranjar um capacete que acabei conseguindo rapidamente com o

    mesmo rapaz da graxa. J eram 13:45h, e combinamos que eu pegaria ela dali a pouco.

    Apressei-me de volta ao albergue que ficava a poucas quadras dali para pegar meu protetor solar, no

    sabia bem o que me esperava na flutuao logo mais. Sa rpido e encontrei a gatha. Tinha me informado j

    com os moto-taxistas onde ficava o tal lugar e segui sem pressa. Pouco depois do centro antes para quem

    vem cidadesamos esquerda e andamos uns 4 kms de estrada de terra sob acompanhados pelo sol - sem

    novidades, exceto pela agradvel companhia que eu dispunha - at chegar na Reserva Ecolgica Baa Bonita, ou

    simplesmente Aqurio Natural como conhecido. Esperamos um pouco at iniciar nosso passeio, cujo grupo

    tinha uns dez visitantes. Colocamos a roupa de neoprene, colete salva-vidas, mscara e snorkel para a

    flutuao e passamos por uma fase de adaptao do equipamento por uns 15 minutos em piscina. Para mim foi

    novidade aquilo tudo, primeira vez. Mas acreditava ter me adaptado bem a vida de peixe, tendo que respirar

    pela boca, mas que era estranho, ah isso era. A sensao de poder enxergar nitidamente nem tanto pois me

    aconselharam a deixar o culos de grau de lado pois o mesmo iria embaar, atrapalhando mais do que

    ajudando o fundo azul da piscina me surpreendeu. Demoramos um pouco mais devido um senhor estar

    tendo problemas com a mscara, estava entrando gua devido a barba longa dificultar a vedao. Dica: pra

    quem for fazer flutuao, sempre bom estar com a barba bem feita para no ter problemas na vedao da

    mscara. Seguimos por uns 15 minutos numa passarela pouco elevada do cho e construda com ripas de

    madeira enfileiradas, estavam bem gastas denotando uso constante. O sol deu lugar a uma leve chuva, quepedia apenas proteo da mquina fotogrfica que me acompanhava, estava com uma sacolinha junto e a

    embalei nela. Paramos num deck em frente uma grande nascente de gua cristalina aberta numa clareira entre

    a bem densa mata. Parecia uma lagoa talvez com um metro e meio de profundidade. Ali iniciamos a flutuao

    no rio Baa Bonita, rio que d nome reserva. Acompanhava o nosso grupo um fotgrafo da reserva com

    cmera subaqutica que registraria nosso passeio. Nossas roupas eram bem grossas, mas mesmo assim senti a

    gua ligeiramente fria. A sensao era nica, excelente visibilidade embaixo dgua, uma liberdade total. Podia

    se ver a gua jorrando entre as arreias brancas e os corais coloridos do leito. Inmeras piraputangas com

    tamanho mdio de uns 20 centmetros nos rodeavam o tempo todo, eis a espcie que mais vimos neste

    passeio. Apesar da orientao para no tocar em nada, como os demais visitantes, no resisti e tentei encostar

    o dedo nelas, mas as bichinhas esto com a defensiva bem treinada, qualquer toque elas saem em disparada.

    Vimos tambm alguns poucos dourados bem grandinhos, talvez uns 40 centmetros, entre outros peixes bem

    menores. Rodeamos algumas vezes aquela nascente lagoa e depois de inmeras poses para fotos, fomos

    orientados a seguir o guia em fila indiana pelas guas pouco caudalosas. Um canosta nos acompanhou de

    perto para qualquer eventualidade. Logo em frente presenciei a maior prova de que aquele ecossistema estem equilbrio com a presena humana. Bem perto de mim um dourado abocanhou sem a menor cerimnia

    uma piraputanga que era metade do seu tamanho. Devia ser o almoo atrasado visto o tamanho da sua fome.

    Torci para que a cena inesperada tivesse sido captada pelo fotgrafo. No mais, era s deixar a leve correnteza

    nos levar e observar os peixes entre as formaes e plantas subaquticas de um colorido intenso. Flutuamos

    em torno de uma hora e percorremos uns 900 metros rio abaixo segundo o guia. Sa da gua com muito,

    opsss... pouco frio ... o queixo ameaava tiritar, mas segurei firme, e para piorar, no chovia mais, mas a chuva

    refrescou bem o fim de tarde que ia embora. O retorno foi por uma trilha no mesmo estilo da vinda. Eu no

    conseguia prestar ateno em mais nada, a no ser na bexiga me apertando horrores, no dava para tirar a

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    roupa de neoprene ali. Torcia para chegar logo. A gatha que caminhava logo em frente tinha sido mais

    esperta, no parava de conversar com uma outra visitante, deduzi que tinha ocupado a mente para esquecer

    da bexiga lhe apertando tambm, mas eu estava incapacitado de tal faanha. Na recepo, um grande alvio

    esvaziar a bexiga! Nosso grupo era o ltimo e acho que apenas eu e a gatha adquirimos, de meia, o DVD com

    as fotos e vdeos do passeio. Samos de l j no escuro e eu com certo frio. Tinha chovido e os demais visitantesnos deixaram uma estrada cheia de lama, o jeito foi tocar devagar. Deixei a gatha na pousada dela e

    combinamos que seria bom nos encontrarmos mais tarde, ela tinha algum passeio a ver ainda pro dia seguinte,

    no lembro bem.

    Cheguei no meu albergue sedento para tomar uma ducha quente, mas a nica das trs que funcionava

    estava em uso. Tive que esperar longos e interminveis dois minutos at liberar. Devidamente reconfortado,

    ajeitei umas tralhas e estava revendo as belas fotos do dia. Esperava que os prximos tambm fossem timos.

    Logo recebi uma mensagem e fui encontrar a gatha para descobrirmos a vida noturna de Bonito.

    Caminhamos pela avenida principal at uma grande praa com um lago, cujo centro era ocupado por dois

    monumentos enormes de peixes, cobertos por potentes jatos dgua, no consegui precisar de quais eram,

    provavelmente dourados ou piraputangas peixes smbolos da regio. Encontramos muitas lojas vendendo

    lembrancinhas e artesanatos de todos os tipos e preos, adentramos em algumas, mas nem me lembro porque

    no comprei nada. Demos uma pesquisada despretensiosa pelas opes gastronmicas, at pararmos num

    restaurante bem movimentado. Nos instalamos numa mesa externa. Papo vai, papo vem, experimentamos o

    que acabou ficando de cortesia da casa, o tal terer, que basicamente chimarro gelado - neste vai uma erva

    que dizem ser mais grossa e pode ser acompanhado por um toque de hortel, limo, o que der vontade

    gostei muito desse, principalmente por este no correr o risco de queimar a lngua risos. Tentei ensinar

    falando como fazer uma caipirinha de vinho ao garom, por l no era conhecida, e quando trouxe at que

    estava razovel. Perguntamos por um prato com carne de jacar, mas estava em falta na cidade toda.

    Acabamos saboreando um prato com peixe tpico da regio escolhido pela gatha, no consigo lembrar que

    peixe era, talvez dourado ou pacu ao molho urucum. Estava delicioso, tentamos raspar as tigelas, mas no

    conseguimos, a poro era enorme, comeriam bem trs pessoas. O garom que nos atendeu era um sujeito

    bem simptico, e no sei como entramos no assunto, nos contou da sua maior aventura sobre rodas, mas essa

    era especial e no to comum, uma aventura romntica. Ficamos curiosos. L pelos anos de 1990 morava em

    Maca no Rio de Janeiro e conheceu uma garota de Campo Grande, no me lembro como. Ela disse que se ele

    viesse visit-la casaria com ele. Foi o que bastou para ele embarcar na sua Honda CG Today 125 cc e ir ao

    encontro dela. Aps 1600 kms e 25 horas seguidas na estrada, j de noite bateu na casa da moa. Ela mesmaatendeu, no aguentou a surpresa e desmaiou em seguida. E realmente a moa cumpriu a palavra, se casaram,

    tiveram 4 filhos e viveram juntos por nove anos, hoje esto separados mas se do muito bem contou o

    garom com a voz carregada de emoo confirmando toda a histria. Por um momento pensei na pequins e

    na grandeza do ser humano que por vezes faz coisas impensveis num momento de loucura e no final tem uma

    bela histria para contar, achei aquilo o mximo.

    Aps um belo jantar, fomos ao muito frequentado Taboa Bar. O lugar mistura madeiras, tijolos e

    palhas na sua construo, nos colocando num ambiente rstico e aconchegante. O local serve a tradicional

    cachaa Taboa fabricada por eles - mistura de cachaa, mel, canela, guaran em p e ervas naturais, mas o

    principal atrativo as pessoas se reunirem para saborear algum prato entre as diversas opes que oferecem

    ou para apreciar uma cerveja somente. Outra curiosidade deste lugar num primeiro momento parece pichao,

    mas ai voc comea a ver os registros em todas as paredes, mesas, cadeiras, o piso, em todo lugar esto

    autografados e datados nomes, mensagens, assinaturas de pessoas, inclusive personalidade nacionais, de

    todos os cantos do Brasil e do mundo. Sentamos numa das mesas pichadas. O sistema de som tocava hitsantigos, Raul Seixas no momento. Umas duas ou trs cervejas sorvidas sem pressa acompanharam nossa prosa

    sobre os mais variados assuntos que poderia bem durar a noite toda. Quase amos nos esquecendo de registrar

    nossa passagem por l. Escolhemos dois tijolos velhos e gastos num cantinho do piso. Eu f iquei l e a gatha foi

    escrever uma mensagem na parede de entrada do banheiro masculino. Foi por ali prximo que um cara de

    passagem esbarrou derramando um pouco de cerveja nela, fiquei sabendo quando cheguei junto. A noite

    estava tima tanto quanto eu estava comeando a lutar contra o sono pelo longo dia e pela tima cerveja.

    Algumas quadras depois deixei minha mais nova e simptica amiga na porta de sua pousada. Tinha adorado a

    companhia dela e das boas conversas que desenrolamos, j me bateu uma saudade grande de um dia voltar a

    encontr-la. Quem sabe numa prxima viagem o destino nos ponha frente a frente novamente. Se estiver

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    lendo isso minha querida gatha, sinal de que consegui concluir a viagem e est tudo bem, boa sorte nos teus

    planos futuros, um abrao e beijo carinhoso no corao e at qualquer hora linda!

    Andei at a Black Angel, e pela primeira vez fiquei na dvida se subia nela ou no, mas o incerto sim

    falou mais alto. Uma vez em cima e comeando a andar, descobri no estar to entorpecido como achava e a

    Black Angel me conduziu at meu albergue. Ainda mandei uma mensagem pra gatha dizendo que tinha

    chegado, isso foi as 02:45h, era domingo j. Tentei relembrar o longo e maravilhoso dia, mas fui derrotado por

    um piscar de olhos.

    Sentindo na pele os efeitos de viajar

    4 Dia13/abril/2014

    Distncia percorrida: 692 kms de Bonito/MS a Sonora/MS

    No tinha colocado o celular para despertar, mas ele manteve as configuraes do dia anterior e me

    acordou as 06:30h. Uma espiada fora da barraca, ainda um pouco escuro, e eis uma coisa que eu no gostava,

    desmontar acampamento com uma garoa leve caindo. Mas mos obra, embalei tudo que estava dentro dabarraca, j me vesti com a roupa de viagem e de chuva por cima. Desmontei e embalei o resto na maior

    rapidez. Tinha chegado tarde de noite e no consegui pegar a chave para abrir o porto grande do camping - a

    recepo do albergue fecha as 23:00h - e ento havia deixado a moto no estacionamento. Carreguei as

    bagagens at l. Comeou a chover mais, dei um jeito de colocar a moto embaixo de um beiral de telhado para

    acomodar as bagagens. Tomei um caf demorado, um casal puxava assunto comigo, acertei as despesas e sa

    debaixo de muita chuva.

    Segui pelas desertas MS 178 e 339 que cortam parte do Parque Nacional Serra da Bodoquena. Muitos

    trechos de neblina intensa e peguei alguns buracos inevitveis devido chuva t-los encobertos. Neste trecho

    se o tempo tivesse ajudado teria visto alguns animais selvagens e aves nos belos campos segundo meu amigo

    Marlon, mas vi algo que me deixou pensativo. L a frente numa longa reta ia um viajante solitrio de bicicleta

    equipada com algumas malas na garupa. Vestia camiseta e bermuda, pedalava a todaestava nem a com a

    chuva. Baixei a velocidade e buzinei saudosamente. As bandeirolas hasteadas em ambos alforjes traseiros

    diziam que era chileno. Tentei mentalmente calcular a que distncia aquele aventureiro e robusto homem

    estaria de casa, talvez mil, dois mil kms e tinha chegado ali de bicicleta! Imaginei quantos dias de viagem,

    quantas dificuldades foram superadas e mais aquela ali na chuva, eu estava protegido dentro da minha

    armadura, mas ele estava encarando tudo isso de peito aberto, - senti meus olhos umedecerem -, tive uma

    vontade imensa de parar e conversar com o cidado, oferecer-lhe qualquer ajuda, mas julguei que seria quase

    intil devido as diferenas de idioma. Continuei em frente e depois me arrependi, podia ter dado algum

    dinheiro, estava no Brasil e seria bem-vindo com certeza. Me confortei pedindo que Nosso Senhor o

    acompanhasse e lhe suprisse tudo que fosse necessrio. E a chuva no dava trgua, aquele fato me deixou

    pensativo, eu achava que eu estava saindo da zona de conforto ao empreender esta viagem, mas aquele

    sujeito de bicicleta estava bem alm disso, uma demonstrao mista de fora e coragem, queria saber qual era

    seu objetivo, iria at onde no Brasil? Iria at a Amrica Central? Ou Alaska? Meus pensamentos foram

    interrompidos por algo frio no meu p direito. Estava entrando gua rapidamente na bota, mas por onde, a

    sola no poderia ter furado, ser que a cala subiu e escapou da aba da bota, dei uma olhada por cima e nada

    disso, havia uma pequena fenda prximo ao calcanhar. A meia, o p todo j estava molhado. No havia o que

    fazer a no ser continuar e num lugar ao abrigo da chuva parar e ver se teria algum concerto ou vestir umasacola no p e colocar dentro da bota. Foi o que fiz em Miranda na prxima parada para abastecimento, isso

    resolveu o problema.

    Finalmente o asfalto ruim e tambm a chuva tinham ficado para trs, estava agora na tima e bem

    sinalizada BR 262. Tinha 200 kms pela frente at Campo Grande/MS. Algumas montanhas em forma de

    chapada nos arredores de Aquidauana/MS me distraram um pouco, o mais legal era ver elas passando. Campo

    Grande/MS me recebeu com um friozinho no esperado, os termmetros de rua marcavam 16C. Uma olhada

    no GPS indicava altitude de 550 metros, tpica de uma cidade quase serrana. Passei tranquilamente pela

    cidade, pouco trnsito devido ser domingo de tarde. A cidade me pareceu bem organizada, ruas largas, prdios

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    altos e bonitos, bem urbanizada. Me chamou ateno que os poucos carros circulavam com pressa nenhuma

    no arranque perante o verde dos semforos, estava acostumado a ver todo mundo arrancar bruscamente at

    ento. No tinha reservado nada para aquela cidade, mas era passar por ela, ou pegar um trecho de 200 kms

    de estrada de terra certamente enlameadas dentro de fazendas sentido Cuiab/MT, onde tombos e atoleiros

    eram certos, encarar aquela estrada sozinho era muita imprudncia. Estava com o p pela primeira vez nalendria e gigante BR 163 3400 kms de norte a sul que tem um mega trecho nico de 1000 kms de vias de

    terra quase intransitveis - que me acompanharia por 700 kms, por asfalto, at Cuiab/MT.

    Pouco adiante parada para abastecimento. Ouvi o sotaque sul mato-grossense bem acentuado do

    frentista quando me pediu se era para completahh o tanque. Eles puxam a letra r demais onde ela

    aparece sozinha no meio ou fim da palavra. Na hora de pagar me pediu se era cahhtoou dinheiro. Falei

    que era carto, logo trouxe a mquina e pediu pra digitahh a senha. No tem com escrever a pronncia

    deles, mas tem som nenhum de r. Neste trecho na BR 163, j de tarde tima tocada, algumas curvas, poucas

    subidas e descidas, movimento pequeno e o sol j cobrindo o horizonte de laranja.

    Na ltima parada para abastecimento do dia em Coxim/MS e um lanchinho, na hora de pagar a

    simptica senhora do caixa me pediu de que lugar de Santa Catarina eu era, estranhei por ela acertar assim de

    cara, ento ela disse que morou 30 anos em Brusque/SCcidade a 60 kms da minha , tinha filha casada l,

    fazia 5 longos anos que no se viam, me reconheceu pelo sotaque da regio. Ainda rodei uns 100 kms quase de

    pura reta j de noite no escuro at em torno das 20:00h chegar em Sonora/MS. Achei fcil hospedagem no

    Hotel Sonora, recomendo, a dona bem atenciosa e preo justo. Uma sada a p para jantar numa

    lanchonete a poucas quadras dali e depois dormir, estava morto devido as poucas horas de sono da noite

    anterior. Nesse dia no coloquei despertador, me daria um descanso necessrio.

    Cad a chapada?

    5 Dia14/abril/2014

    Distncia percorrida: 628 kms de Sonora/MS a Primavera do Leste/MT

    Acordei pelo cantar de um galo nas proximidades do hotel. Tomei um caf excelente e bora pegar a BR

    163 novamente. Era segunda-feira e trnsito intenso de caminhes, mas o tempo estava bom, permitindo

    visibilidade para ultrapassagens constantes. O objetivo do dia era a Chapada dos Guimares no Mato Grosso.

    Pouco adiante, primeira parada para foto da placa de divisa de estados Mato Grosso do Sul com Mato Grossoprxima duma extensa ponte sobre o largo Rio Correntes. Passagem na movimentada Rondonpolis/MT, nunca

    vi tantos caminhes andando e parados em todo lugar. O asfalto era s barro vermelho. Os acostamentos da

    pista prximos da cidade, quando no asfaltados, eram um lamaal contnuo e convite certo para atolar

    qualquer caminho.

    Mais uma boa pegada e aps vencer a pequena serra de Cuiab, - a primeira depois da serra de

    Corup/SC da viagem que me lembro -, chego em Cuiab/MT e com objetivo de trocar leo da Black Angel, j

    estava com 2500 kms rodados. O trnsito estava catico, buzinadas por todo lado, cheio de congestionamentos

    e desvios devido obras de um estdio e metr para a copa. Fui perguntando e depois de quase uma hora

    cheguei numa concessionria Honda, mas no vendiam mais o leo Mobil Super Moto 4T 20W50, apenas o

    genuno 10W30, - que num teste bem controlado que fiz um dia, a Black Angel no aceitou o leo e queimou

    quase um litro dos dois que vo no reservatrio, detalhe ... em mil kms. Me passaram o endereo de uma boa

    oficina paralela, mais uma longa meia hora at tentar chegar l devido ao complicado e lento trnsito, mas no

    a achei e parei em outra. O servio foi rpido, troquei o leo e pedi tambm uma lubrificada nos manetes defreio e embreagem, estavam comeando a pesar. Tudo certo de novo, e mais uma hora para sair da cidade

    sentido Chapada. A sada da cidade foi complicada. Sa na contramo de uma pista duplicada que era mo

    nica, depois de uma rtula devido falta de sinalizao, e justamente num raro momento no tinha mais

    nenhum carro para me dar referncias, at que vieram alguns carros em sentido contrrio piscando a luz que

    nem doidos, percebi o equvoco.

    Que alvio sair daquele caos, s acelerar por 70 kms at a Chapada dos Guimares pela MT 251. No

    caminho algumas paradas para fotos dos paredes rochosos de cor avermelhada quase desnudos de mata que

    beiravam a estrada e alguns mais imponentes no horizonte. Uma neblina intensa e mida acompanhada de

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    muito frio comeou a encobrir a bela vista a medida que ia subindo. Pelas 17:15h cheguei na cidade de

    Chapada dos Guimares/MT sob um breu branco muito denso que molhava tudo, e at ventos moderados,

    visibilidade de uns 20 metros no mximo, o GPS indicava 760 metros de altitude, ouvi entre um grupinho que

    estava de carro algum dizer que faziam 13C. Parada para abastecimento, traguei dois obrigatrios cafs

    quentinhos e pedi informaes onde ficava o mirante principal para contemplao da chapada e que tambmera o ponto equidistante entre o oceano Atlntico e Pacfico - o centro geodsico da Amrica do Sul. Me

    falaram que no veria nada l naqueles dias, a chapada j estava encoberta assim havia dois dias e ficaria mais

    trs pelas previses. Para chegar no mirante eram 7kms numa estrada de terra quase trilha que s carro 4x4

    passava, muita lama e trechos com muita gua cobrindo a estrada. Acreditei haver um certo exagero nisso de

    trilha pro mirante, pois era um lugar muito divulgado em todas minhas pesquisas. Segui em frente. Aqui

    comeou uma das etapas mais desafiadoras at o momento. A neblina estava mais intensa ainda e foi piorada

    pela chuva, no passava da segunda marcha a 20 km/h com visibilidade nenhuma, talvez 3 metros. Mais

    frente vi - no sei como consegui - a placa indicando o caminho pro mirante direita. Desci do asfalto, e logo

    de cara estrada de terra muito escorregadia e j uns 200 metros pra frente numa pequena baixada, primeiro

    desafio, uma enorme poa de gua barrenta fechava a estrada e adentrava no mato em ambas laterais.

    Restava saber a profundidade antes de enfiar a moto ali. Parei a moto e entrei a p. Uns 2 metros adentro a

    gua quase entrando na bota j, porm estava longe do meio. Quebrei o maior galho de uma rvore e fui

    tatear novamente o mais longe que pude, a medida bateu na minha cintura. No tinha como atravessar, a

    Black Angel teria seu motor afogado e todas as bagagens dos bauleto laterais seriam lavadasnaquele lodo.

    Reconheci que o frentista do posto tinha toda razo, havia lhe subestimado. Esta visita no mirante teve que

    ficar para uma prxima. Com muito custo, a estrada estava muito lisa de lama, dei meia volta e voltei ao asfalto

    e segui andando a passos de tartaruga, duelando com aquele tempo fechado e frio, e se no bastasse

    comeava a escurecer.

    Uma hora depois j perto de Campo Verde/MT, venci o difcil duelo com a neblina, mas a chuva ficou e

    a escurido da noite tomava conta. Pretendia chegar em Primavera do Leste/MT a 100 kms ainda. Como a BR

    070 estava excelente e bem sinalizada para tocada noturna, ainda mais com meus novos faris auxiliares que

    faziam um trabalho estupendo, segui em frente debaixo de muita chuva. Pelas 20:30h, na quarta tentativa

    achei uma pousada com estacionamento fechado em Primavera do Leste/MT. Uns espetinhos feitos na brasa

    de uma lanchonete em frente me convidaram a sabore-los. Aqueles quase 100 kms de tocada na neblina, frio

    e chuva na chapada tinham me deixado exausto e sem vontade at para reclamar do chuveiro da pousada que

    no esquentava. Tomei banho frio mesmo e capotei.

    Um longo tiro at a capital

    6 Dia15/abril/2014

    Distncia percorrida: 869 kms de Primavera do Leste/MT a Braslia/DF

    Acordei as 05:00h, pois neste dia tinha um longo trecho pela frente at Braslia/DF. Tomei caf na

    padaria do lado. Uma leve neblina cobria a cidade, mas logo foi sendo dispersada pelo nascer do sol sobre a

    imensa plancie. Tocada tranquila pela excelente BR 070, pouco trnsito, muitas retas e algumas curvas de alta,

    perfeitas para quebrar a monotonia, no mais curtindo a viagem. certa altura numa longa reta, olhando de

    longe, quase pensei encontrar novamente um ciclista viajante, pois o vulto se movia devagar. Seria o mesmo

    que tinha visto a dias atrs? No podia ser, como teria andando tanto? Logo vi que no pois este tinha uma luz

    vermelha na traseira. Ao chegar mais perto vi que era um cara numa motoneta velha e desconhecida pra mim -

    devia estar dando tudo que tinha no motorzinho pois berrava muito. Carregava uma pequena mala no bancotraseiro, no era viajante pelo visto, uma buzinada saudosa, pois no deixava de merecer meu respeito, foi

    retribuda por um aceno, afinal nunca se sabe se mais adiante voc no ficar na estrada e aquele cara humilde

    que voc cumprimentou l atrs possa te ajudar, e segui adiantesem novidades.

    A longa monotonia era quebrada as vezes por redutores de velocidade em trechos de aldeamento

    indgena segundo as placas, mas no vi nada, nem mesmo algum deles vendendo seus artesanatos ou frutas na

    beira da rodovia. Mais adiante comecei a perceber um nibus no retrovisor e se aproximava rapidamente. At

    achei que eu tinha perdido ritmo, mas estava mantendo 120 km/h constantes, uma velocidade que eu e a Black

    Angel nos adaptamos bem quando a via assim o permitia. Logo veio uma longa subida, mas leve, e pensei que

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    agora o nibus ficaria pra trs, at acelerei mais mantendo os mesmos 120 km/h, mas os faris ligados

    continuaram a crescer rpidos nos meus retrovisores. Aconteceu algo que me surpreendeu, estava a 120km/h

    subindo e veio aquele nibus e me passou silenciosamente e muito rpido, calculei que ele devia estar nuns

    150 km/h. No acreditava nisso, e ainda por ser um daqueles antigos com as lanternas traseiras redondas

    sobrepostas lataria. As janelas todas escuras contrastavam com o claro da lataria cheia de vincos que pareciaser de alumnio polido. E to rpido como passou, sumiu e no mais o vi. Voltei no meu ritmo normal e tentei

    imaginar que potente motor tinha aquilo.

    Mais adiante parada em Barra do Garas/MT para foto da placa divisa de estados Mato Grosso e

    Gois. Era quase meio dia e tinha muito cho ainda, 650 kms, que foram vencidos em torno das 20:00h. A

    minha chegada em Braslia/DF se deu por uma rodovia elevada e a cidade fica l embaixo. As muitas luzes da

    capital comearam a ser vistas, acompanhadas de um friozinho tpico de cidade elevada, Braslia fica a 1100

    metros de altitude. Segui pela avenida principal e observava as placas para achar alguma pousada ou camping,

    mas andei uns 10 kms e vi que na geral seria difcil. As placas de trnsito eram s letras e nmeros no

    entendia nada daquilo, at pensei que eram algum tipo de coordenada geogrfica - risos. Peguei uma via

    paralela e fui parar em vielas estreitas e mal iluminadas, ningum na rua a no ser eu. Sentia uma sensao

    nada boa e decidi voltar para avenida e parei num posto de combustvel para abastecer e pegar informaes. O

    frentista me explicou um caminho muito enrolado. Um taxista que estava abastecendo do lado se ofereceu

    para me levar num hotel bom e barato. Andamos alguns kms at chegar no dito cujo, mas de barato no tinhanada, R$ 250,00 a diria! J vi que estava sendo enrolado e perdendo tempo com aquele taxista, mas sem ele

    era pior. E fomos adiante no plano B do sujeito. Cogitei inclusive que aquele poderia ser um mau taxista, assim

    que desconfiasse de algum caminho paralelo e escuro, deixaria de segui-lo. Logo mais comecei a ver algumas

    placas de camping e estvamos seguindo todas, diminuindo a suspeita sobre o taxista. Sem querer, chegamos

    no Hostel International, da rede Hi, mesma rede de albergues que eu tinha ficado em Bonito/MS. Dei uma

    conversada rpida na recepo, e voltei para pagar o taxista. Foi um espanto o absurdo valor da corrida: R$

    65,00. Dei uma olhada em quanto andamos, meu hodmetro parcial que zerei na ltima abastecida indicava 11

    kms rodados. O taxista disse que o preo era justo e todos os txis da cidade cobravam esse valor, era

    tabelado. No diminu minha indignao, acabei chorando um pouco, mas no adiantou muito e lhe paguei

    ainda exorbitantes R$ 50,00. Na minha opinio, 15 a 20 reais bastavam pela corrida. Apesar de tudo, pelo

    menos estava num lugar seguro e com boas referncias. Logo este conceito mudou.

    O preo do camping no era convidativo, custava o que j tinha pago por um aconchegante quarto nas

    noites anteriores, mais uma vez um absurdo. O antiptico recepcionista estava irredutvel. Porm paraacampar estava bem frio e o mais importante, no tinha chuveiro quente, um despreparo total. Pelo dobro do

    valor aceitei um quarto coletivo. Acabei conhecendo ali na recepo meu colega de quarto, um sujeito de Treze

    Tlias/SC, quase um conterrneo. Estava na cidade para prestar algum concurso que no entendi, estava difcil

    de entender o que o cara falava atiradamente atravs de tiques nervosos e da lngua presa. Ele ficou ali numa

    mesa da recepo debruado sobre um notebook e uma pilha de grossos livros, seus olhos corriam de um lado

    a outro freneticamente, me pareceu um tipo meio nerd.

    Subi ao quarto. Ao abrir a porta fui recebido por um soco nas narinas de chul horrvel. Fui adiante,

    meias espalhadas no cho, um tnis velho e sujo no p da cama que achei ser a do meu colega de quarto,

    roupas espalhadas e uma toalha de banho molhada em cima da cama que deveria ser minha pois s tinha mais

    essa no quarto. Tratei de empurrar com o p as meias catinguentas num canto e joguei um tapete dos que

    tinha ali em cima para abafar. Joguei a toalha molhada do sujeito na cama dele. Abri a janela para dar uma

    ventilada, se bem que a ausncia de uma vidraa j quase o fazia. Me instalei e nova surpresa no banheiro,

    cueca usada pendurada no gancho da toalha de banho. Peguei aquilo com um pedao de papel higinico ejoguei na cama do sujeito. Ao entrar no chuveiro, levo um baita escorrego, piso extremamente liso devido

    uma camada de uma papa branca ... opss cah... nada disso! J explico! O nvel do piso era irregular, mais alto

    no lado do ralo e sempre ficava uma lmina de gua com sabonete acumulada, devia estar um ano sem

    ningum limpar aquela joa para estar daquele jeito. Achei isso meio nojento, mas j estava despido e encarrei.

    No quarto tem armrios individuais para guardar os pertences quando sair, mas quem diz que algum dos 4

    armrios tinha chave para trancar, alm disso dois estavam sem portas e os outros estavam com as portas

    caindo, ter chave no mudava nada. Caramba, como aquele sujeito havia aceitado aquele quarto? Bom, pra

    quem faz uma baguna daquela sabendo que o quarto coletivo, no devia ter bom senso para discernir uma

    coisa da outra. O que mais faltava acontecer? Azarado que s eu, dormir com um sujeito do lado que ronca e

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    solta gases era quase certo, decidi no arriscar e chamei o recepcionista, que a contragosto e com uma

    carranca feia concordou em me trocar de quarto.

    O outro estava melhor, no tinha ningum, apesar da dificuldade para abrir a porta emperrada, sem

    vidraa quebrada, sem gua parada no piso do chuveiro, e pelo menos um armrio tinha condies de ser

    usado, ao menos pra mim, se viesse mais algum, era problema alheio. Reinstalado, voltei a recepo

    procurando comida. Pedi um lanche atravs de um disk-lanche, estava cansado demais para sair e explorar a

    cidade de noite, deixaria para o outro dia, afinal passaria mais uma noite na cidade alm desta. Enquanto

    esperei o lanche, lubrifiquei a corrente e dei uma inspecionada geral na Black Angel, tudo em ordem. Logo veio

    o lanche e o devorei rpido. Na recepo haviam diversos banners afixados na parede falando de algumas

    atraes e consegui o ltimo mapa turstico da cidade que tinham. Voltei pro quarto e dei uma estudada no

    tour a fazer no dia seguinte, alis j estava no dia seguinte, era 1:00h da madrugada j. Tentei usar o tablet

    para acessar e-mail, verificar conta em banco e tentar postar umas fotos no facebook, porm a bateria - ou sei

    l o que era aquele smbolo estranho na tela - estava fraca demais, nem ligou mais, coloquei ns dois para

    recarregar as baterias.

    Passeando em Braslia

    7 Dia16/abril/2014

    Distncia percorrida: 126 kms passeandopor emBraslia/DF

    Acordei as 7:00h. Tomei um caf bem simples no Hi e com ajuda da recepcionista ruiva da manh, essa

    sim muito simptica, apagou o cara da noite, localizei uma lavanderia para levar uma trouxa de roupas para

    dar um trato. O Hi disponibiliza lavanderia, mas a secagem no tempo, como o dia estava bem nublado e frio

    no sabia se secaria at o dia seguinte, e precisava das roupas.

    Munido de mapa da cidade e da trouxa de roupas sa pra cidade com a Black Angel. Logo perto deixei a

    trouxa para lavar e pegar no fim do dia. Comecei a entender aquelas siglas, no mapa tinha uma legenda, por

    exemplo CLN era Comrcio Local Norte, onde ficava a lavanderia.

    Eu estava maravilhado com os enormes e bonitos prdios de bancos, empreiteiras, hotis, nas

    redondezas, cabea olhando pra todos os lados e para cima. Passava em frente dos pontos de nibus, os

    pedestres me olhavam como se fosse de outro mundo, um cara do interior na cidade grande pela primeira vez,

    e no deixavam de ter razorisos. Primeira parada no Estdio Nacional de Braslia Man Garrincha, no sou

    aficionado por futebol, mas o que me atrai o tamanho e arquitetura da obra em si. No pude entrar, estava

    tendo um evento l somente para cadastrados, sem problemas fiz umas fotos externas que me contentaram.

    Em seguida fui para Torre de TV, esta prometia ser a melhor atrao de Braslia pois possui um mirante

    panormico a 75 metros de altura, proporcionando uma vista area espetacular da cidade, porm descobri

    estar fechada devido reformas. Segui para a Catedral Metropolitana de Braslia, o monumento mais antigo de

    Braslia, data de 1958 sua fundao. Bonita por fora com sua coroa gigante e linda por dentro pelos enormes

    vitrais que compe o teto, alm das belas esculturas de trs anjos pendurados na nave. Prxima parada no

    Palcio Itamaraty, ouMinistrio das Relaes Exteriores do Brasil.Era possvel fazer um tour pelo interior, mas

    somente a partir das 14:00h, fiz algumas fotos externas defronte o espelho dgua que d um charme especial

    ao lugar. Segui para a Praa dos Trs Poderes, onde fica oPalcio do Planalto (Executivo), oSupremo Tribunal

    Federal (Judicirio) e o Congresso Nacional (Legislativo). Este ltimo o carto postal mais conhecido de

    Braslia por conta das duas torres de 100 metros de altura com suas duas cpulas invertidas ao lado. A praa

    estava tomada por patrulhas de policiais federais e muitos turistas. Muitas fotos pela praa e dos prdios nosarredores, todos obras de Oscar Niemeyer.

    Depois sa do centro e segui um pouco mais longe para o Palcio da Alvorada, residncia oficial dos

    presidentes do Brasil. Cheguei por volta das 13:00h, a visita s sairia as 15:00h. Precisava lanchar, mas l no

    tinha nada. Voltei por outro caminho beirando o Lago Parano de longe, os inmeros hotis enormes e

    luxuosos que recebiam as celebridades que vinham a Braslia, me impediam de chegar perto. Parei logo num

    posto, comprei umas bolachas e um suco e voltei para recepo do Palcio, disseram que tinham limite de 300

    pessoas por dia, quis garantir minha vaga. Enquanto lanchava chegaram mais turistas e logo tambm o Peloto

    de Policiais de Motos da Fora Nacional. Rodearam o Palcio e na volta pararam do outro lado no

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    http://pt.wikipedia.org/wiki/Minist%C3%A9rio_das_Rela%C3%A7%C3%B5es_Exteriores_do_Brasilhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Pal%C3%A1cio_do_Planaltohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Executivohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Supremo_Tribunal_Federalhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Supremo_Tribunal_Federalhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Judici%C3%A1riohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Congresso_Nacional_do_Brasilhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Legislativohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Legislativohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Congresso_Nacional_do_Brasilhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Judici%C3%A1riohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Supremo_Tribunal_Federalhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Supremo_Tribunal_Federalhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Poder_Executivohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Pal%C3%A1cio_do_Planaltohttp://pt.wikipedia.org/wiki/Minist%C3%A9rio_das_Rela%C3%A7%C3%B5es_Exteriores_do_Brasil
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    estacionamento. Notei a extrema desenvoltura e percia daqueles policiais na pilotagem das Harley Davidson

    1600 cc naqueles espaos reduzidos. Me aproximei e pedi permisso para tirar uma foto do grupo, eles foram

    alm, me puxaram para junto deles enquanto um tirou a foto. Depois da foto, o soldado Batista veio falar

    comigo, queria ver minha moto e saber mais da viagem. Conversa fluindo, quando vi, os demais soldados do

    peloto tambm j estavam juntos no papo. Outros turistas se aproximaram para tirar foto com o peloto,como eles estavam ali nos rodeando, a Black Angel saiu junto nas fotos, ganhando seus inusitados, mas

    merecidos com certeza, 15 segundos de fama risos. Me esquivei discretamente dos turistas e dos policiais, e

    fui terminar meu lanche. O peloto logo se foi com suas motos barulhentas.

    As 15:00h, por sorte, estava no primeiro grupo a visitar o Palcio da Alvorada. Aps checagem corporal

    com detector de metais, ainda uma revista minuciosa. As mulheres tiveram que abrir suas bolsas e despejar

    tudo em cima de uma mesa, revelando um pouco da sua intimidade, achei que poderia haver uma maneira

    mais discreta de fazerem isso pois houve quem mostrasse certo constrangimento por tal atitude. Embarquei

    num micro-nibus que nos levou por uns 700 metros at a entrada do palcio. De um modo geral, no

    encontrei a suntuosidade que esperava, mas mesmo assim a decorao, os mveis, a arquitetura sbria e

    agrada at os mais exigentes. Vimos apenas a rea comum, os aposentos reais no so abertos visitao. Em

    frente ao palcio, sempre achei ser uma piscina, mas na verdade bem raso 60 centmetroscom a nica

    funo de nos dias de calor, ajudar a umidificar e abaixar a temperatura do ar. O grande espao dos sales

    ocupado raras vezes no decorrer do ano para receber algumas personalidades em pequenos eventos. Nofundo, uma grande piscina, um bosque, e um lago disposio mais dos zeladores do que dos moradores da

    casa. Tudo bem limpo e organizado, realmente algo bem projetado.

    Na sequncia, passagem de ida e volta pela tambm obrigatria Ponte Juscelino Kubitschek sobre o

    Lago Parano, nico momento do dia em que o trnsito da capital se arrastou. No fim da ponte, apesar de

    placas proibitivas, parei para alguns cliques da bela vista. Acredito que a Black Angel foi flagrada por um

    paparazzi eletrniconum poste atrs de mim, devido estacionamento exclusivo para veculos de emergncia,

    alguns dias depois saberei, pensei, o importante era no perder a oportunidade. Encarei a lentido de novo na

    volta e se tinha como ficar pior, ficou. Apesar do bom planejamento, Braslia tambm apresenta, como

    qualquer cidade grande, deficincias no trnsito exemplo da situao que eu me encontrava. O pior do

    trnsito lento e parado a sensao horrvel de poder ser abordado a qualquer momento, fui muito alertado

    sobre isso, apenas os lugares tursticos contam com patrulhamento ostensivo contnuo.

    Na volta, se chegasse l literalmente segundos mais tarde tinha pego a lavanderia fechada, cheguei

    com ela fechando para pegar as roupas deixadas de manh. Devia ter pego as roupas antes da ponte JK. Esseapuro me atrasaria bastante, teria que voltar as 8:00h do dia seguinte. Prximo destino Braslia Shopping,

    necessariamente numa lan-house - o tablet no funcionou de manh mesmo aps carregar a noite toda e

    lanchonete. Pelas 21:00h deixei o shopping ,shopping, era a oportunidade para captar o cenrio noturno

    iluminado da cidade. Mais uma volta para cliques rpidos mas muito bonitos praticamente pela mesma rota da

    manh e retorno para pernoite no Hi, porm no foi to fcil. Sa de manh e no havia marcado o endereo

    do albergue, e agora como voltaria? Que trapalhada atrs da outra meu! Tentei lembrar por onde tinha vindo.

    Rodei um bocado at desistir, - teimosia tpica de alemo - a noite era tudo diferente. Parei num posto e a

    moa do caixa gentilmente pesquisou o endereo do Hi na net pra mim, salvando o dia. Tinha andado em

    direo oposta coisa pouca, 19 kms s! Cheguei no albergue aliviado e sedento por uma boa cama. Ainda

    uma tentativa frustrada de fazer o tablet funcionar, mas pelas 23:30h fui derrotado e preguei os olhos.

    Amadurecendo lies

    8 Dia17/abril/2014

    Distncia percorrida: 697 kms De Braslia/DF a Dianpolis/TO

    Bem cedo ainda, por sorte consegui uma ma com o novamente antiptico recepcionista e pelas

    05:30h estava na estrada e o breu da noite dava lugar a um dia bem ensolarado. Comecei a perceber que eu

    teria que comear a dormir mais cedo de noite para acordar antes de manh, tinha diferena de pelo menos

    uma hora o dia, precisava me habituar a esta rotina para aproveitar melhor o perodo claro. Pouco adiante

    Formatted:Font: Bold

  • 5/24/2018 Diario de Bordo Expedio Caravelas - Por Michael Bertram.docx

    19/61

    cruzando fronteiras estaduais pela sexta vez, do Distrito Federal para Gois. Muito a frente, algumas

    montanhas e chapadas que a dias no via mais, me fizerem clic-las.

    No mais tocada serena at a cidade de Posse/GO, onde encontro trnsito parado. Uns sem-terra

    bloquearam a pista com uma barreira de pneus e entulho em chamas. A polcia j havia dispersado os

    manifestantes e os bombeiros faziam a remoo dos entulhos e resfriamento da pista. Enquanto aguardava no

    acostamento a liberao da via, chegaram trs caras, cada um com sua moto. Eles iniciaram a conversa.

    Tambm iriam passear disseram, saram de l de Posse mesmo e o destino era Correntina/BA, uns 200 kms

    adiante. Mal falei de onde era, nosso papo foi cortado pela liberao da pista. Os trs saram em disparada

    louca, deviam estar muito querendo passear. Meio no impulso, inconscientemente, quis acompanh-los, e ao

    arrancar do acostamento para subir na pista, o desnvel das vias e ainda por cima molhado pela gua dos

    bombeiros me fez dar uma baita derrapada perdendo a dianteira, deitei a moto de lado no asfalto, estava a o

    primeiro tomboinauguralda trip!risos. Nenhum dano, apenas arranhes no bauleto da esquerda, levantei

    a moto e segui viagem com mais cautela. Ao contrrio da sada brusca, o trio andava mal 70km/h. Tentei

    acompanhar, mas meu ritmo era bem mais forte e aps umas buzinadas saudosas os deixei para trs.

    Um pequeno trecho a frente, umas chapadas muito bonitas me fizeram parar. Demorei-me um pouco

    aotrocar carto de memria da mquina fotogrfica que estava cheio, quando o primeiro do trio num scooter

    daqueles novos Honda PCX, parou a minha frente pensando que eu tinha problemas. Ele voltou a pista e logo

    os outros dois tambm passaram. Fiz minhas fotos e poucas curvas frente, acabei alcanando o ltimo do trio

    que estava numa Virago 250. Estava andando devagar demais e pelo acostamento. Senti um cheiro forte de

    gasolina, devia estar afogada pensei. Parei na frente dele. O cara no tinha sentid