deus ou mamom - tolstoi

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    Deus ou Mamom (1895)

    Liev Tolstoi

    "Nenhum servo pode servir a dois senhores; pois odiar um e amar outro, ou sededicar a um e desprezar outro. Vocs no podem servir a Deus e a Mamom". Lucas16:13

    "Aquele que no est comigo est contra mim; e aquele que comigo no ajuntaespalha". Mateus 12:30

    ENORMES extenses das melhores terras pelas quais milhes de famlias agoraatingidas pela pobreza poderiam ser sustentadas so dedicadas a tabaco, videiras,

    cevada, cnhamo, e especialmente centeio e batatas, empregados na produo debebidas alcolicas: vinho, cerveja, e principalmente conhaque.

    Milhes de trabalhadores que poderia estar fazendo coisas teis para os homensesto ocupados na produo dessas coisas. Na Inglaterra estimado que um dcimo detodos os trabalhadores esteja ocupado na produo de conhaque e cerveja.[1]

    Quais so as consequncias da produo e consumo de tabaco, vinho, vodka,cerveja?

    Existe uma histria terrvel sobre um monge que fez uma aposta com o demniode que ele no o admitiria dentro da sua cela; se ele admitisse, ele concordava em fazero que quer que o demnio o ordenasse. A histria conta como o demnio tomou a formade um corvo ferido arrastando sua asa sangrenta e lamentavelmente pulou sobre a portada cela do monge. O monge teve pena do corvo e o levou para dentro de sua cela; eento o demnio, tendo obtido a entrada, deu ao monge a escolha entre trs crimes:assassinato, fornicao ou embriaguez. O monge escolheu embriaguez, pensando que seele ficasse intoxicado ele prejudicaria s a si mesmo. Mas quando a bebida o venceu,ele perdeu o controle da sua razo, foi at a aldeia e ali, caindo na tentao de umamulher, ele cometeu adultrio com ela, e ento cometeu assassinato defendendo-se domarido, que voltou e atacou-o.

    Assim so retratadas as consequncias da embriaguez na antiga histria, e demodo nenhum so diferentes na vida real as consequncias do uso de bebidas alcolicas. anormal um ladro ou assassino que comete seu crime enquanto sbrio. De acordocom os relatrios dos tribunais parece que nove dcimos das contravenes sorealizados quando as pessoas esto embriagadas. A prova mais convincente de quegrande nmero de contravenes devido ao lcool oferecida pelo fato de que emalguns estados da Amrica, onde o vinho e a produo e comrcio de bebidas so

    proibidos, os crimes quase cessaram. No h roubos, ou furtos, ou assassinatos, e asprises esto vazias.

    Tal uma consequncia do uso de bebidas alcolicas.

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    Outra consequncia a influncia nociva produzida pelas bebidas na sade daspessoas. Alm do fato de que do uso de bebidas alcolicas surgem vrias enfermidadesdolorosas peculiares a alcolatras, muitos dos quais morrem devido a elas, de se notarque homens que bebem recuperam-se de doenas comuns com dificuldade maior queoutros, de modo que em seguros de vida, as companhias de seguro sempre preferem os

    riscos naqueles que no fazem uso de bebidas.

    Essa a segunda consequncia do uso bebidas alcolicas.

    A terceira e mais horrvel consequncia das bebidas que elas obscurecem ointelecto e a conscincia dos homens; com o uso do lcool os homens ficam maisgrosseiros, estpidos, e maldosos.

    Qual vantagem h do uso de bebidas alcolicas?

    Nenhuma!

    Os advogados da vodka, vinho, cerveja, asseguram-se com antecedncia que essasbebidas aumentam a sade e a fora, que elas aquecem e alegram. Mas agora estindiscutivelmente provado que isso no verdade. Bebidas alcolicas no melhoram asade, porque contm um violento veneno, lcool, e o uso de um veneno no podedeixar de ser prejudicial.

    Que vinho no aumenta a fora foi provado muitas vezes, e pelo fato de quequando so comparados o trabalho de um mecnico embriagado e o de um que no

    bebe, durante o curso de meses e anos, sempre provado que o que no bebe produzmais trabalho e melhor trabalho que o outro; e pelo fato de que naquelas companhias desoldados que usam vodka em campanhas h sempre mais incapacitados e maisretardatrios que naquelas onde no usada vodka.

    Exatamente da mesma forma foi provado que o lcool no esquenta, e que o calorsentido aps beber lcool no resiste por muito tempo, e que o homem, aps o breveaumento em temperatura, logo ficam mais frios que nunca, de forma que um homemembriagado sempre acha mais difcil suportar o frio prolongado que aquele que no

    bebe. As pessoas que congelam at a morte todo ano se congelam, em maior parte,porque elas se esquentam com lcool.

    No necessrio provar tambm que a alegria que vem do vinho no real e no uma alegria feliz. Todo mundo sabe que tipo de coisa essa alegria embriagada. Tudoo que preciso olhar o que feito nas cidades nos feriados, nos bares, e nos distritosrurais; o que feitos em feriados ou em casamentos e batizados. Essa alegriaembriagada sempre termina insultos, brigas, ferimentos, todo tipo de crimes, e perda dadignidade humana.

    Vinho no conduz sade ou fora, ou ao aquecimento ou alegria, mas apenastraz grandes prejuzos aos homens. E alm disso parece ser o caminho sbio para todohomem racional e decente, no somente no usar bebidas alcolicas e no coloc-lasdiante de outros, mas tambm tentar com todas suas foras parar o uso comum desse

    veneno intil e prejudicial.

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    Mas infelizmente isso no acontece em todos os casos. Os homens so toapegados a velhos hbitos e costumes, e acham to difcil livrar-se deles, que existemem nossos dias muitssimos homens bons, amveis e racionais que no s no renegamo uso de bebidas e o entretenimento dos outros com elas, mas ainda o defendem comtoda sua habilidade. "O vinho", dizem, "no tem culpa, mas a embriaguez que deve ser

    condenada. O rei Davi disse, 'Vinho alegra o corao do homem'. Cristo santificou ovinho em Can da Galileia. Se no fosse pelo hbito de beber o governo seria privadode sua principal receita. impossvel celebrar um feriado, realizar um casamento, ouum batizado, sem vinho. preciso beber algo concluso de um negcio ou umavenda, ou ao encontro com um amigo querido".

    "Em nossa pobreza e nosso trabalho ns precisamos beber", diz o trabalhadorpobre.

    "Se bebemos s ocasionalmente e moderadamente, no prejudicamos ningum",dizem as pessoas ricas.

    "A alegria da Rssia est em beber", disse o Prncipe Vladmir.

    "Ao bebermos no prejudicamos ningum alm de ns mesmos. E seprejudicamos s ns mesmos ento o problema nosso; no queremos ensinar ningume no queremos ser ensinados por ningum; ns no comeamos com isso e noseremos ns que daremos um fim a isso", dizem as pessoas frvolas.

    Assim falam homens que bebem de vrias condies e idades, tentando sejustificar. Mas essas justificaes, que valiam algumas dcadas atrs, agora no valemmais. Foi suficiente dizer isso quando todos homens pensavam que o uso de bebidas eraum prazer inofensivo, que bebidas aumentavam a sade e a fora do homem; quandoeles no sabiam, ainda, que o vinho contm um veneno sempre prejudicial sade dohomem; quando no percebiam, ainda, as terrveis consequncias da embriaguez, queagora so patentes a todos os olhos.

    Era possvel dizer isso quando no havia, ainda, essas centenas e milhares dehomens morrendo prematuramente em cruis tormentos simplesmente porque elesaprenderam a tomar bebidas alcolicas, e no podiam, ainda, se abster de us-las.Estava bem dizer que o vinho um prazer inofensivo antes de vermos essas centenas emilhares de mulheres e crianas pobres e atormentadas porque seus maridos e pais

    aprenderam a beber vinho.Era suficiente dizer isso antes de testemunharmos essas centenas e milhares de

    criminosos enchendo as prises; as mulheres exiladas, condenados a trabalhos foradose arruinadas, que caram nessa condio devido ao vinho.

    Era suficiente dizer isso antes de sabermos que centenas de milhares de homens,que podiam ter vivido suas vidas com prazer para si mesmos e para os outros,arruinaram suas energias e seus intelectos e suas almas simplesmente porque as bebidasalcolicas existem e eles foram tentados por elas.

    E portanto no mais possvel, em nossos tempos, dizer que beber ou no vinho um assunto pessoal, que no consideramos o uso moderado de vinho prejudicial a ns

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    mesmos, e que no desejamos ensinar ningum ou ser ensinados por ningum, que nocomeamos com isso e no seremos ns que acabaremos com isso. impossvel dizerisso agora, o uso de vinho ou sua abstinncia , em nossos dias, no um assunto

    privado, mas um assunto pblico.

    Agora todos os homens igualmente, queiram ou no, esto divididos em doislados: aqueles de um lado esto lutando contra o emprego de bebidas inteis evenenosas por palavras e aes, no usando vinho e no o oferecendo a outros; aquelesdo lado oposto apoiam por palavras e, mais poderosamente do que nunca, pela fora doexemplo o uso desse veneno, e essa competio est acontecendo no presente momentoem todas as naes, e agora por vinte anos na Rssia com especial violncia.

    "Enquanto vocs no sabiam estavam sem pecado", disse Cristo. Mas agora quesabemos o que estamos fazendo e quem estamos servindo quando usamos vinho e ooferecemos a outros, e por conseguinte, se ns, que conhecemos o pecado de usar vinho,continuarmos bebendo e oferecendo a outros, ento no temos justificativa.

    E no se deixe dizerem que impossvel evitar beber e oferecer vinho emocasies especiais em feriados e em casamentos e ocasies similares; que todos fazemisso, que ns pais e avs fizeram isso, e portanto impossvel para ns sozinhos nosdestacarmos contra todo o resto.

    Isso falso; nossos pais e avs afastaram essas prticas ms e prejudiciais, osefeitos nocivos comearam a se manifestar a eles; da mesma maneira ns tambmsomos obrigados e afastar o mal que comeou a se manifestar em nossos dias. E o fatode que o vinho tornou-se um mal terrvel em nossos dias fora de dvida.

    Como, ento, se sei que o uso de bebidas um mal, destruindo centenas demilhares de homens, posso eu oferecer esse mal aos meus amigos que vm minha casa

    para uma festa, um batizado, ou um casamento?

    Nem sempre tudo foi assim com agora, mas tudo mudou do pior ao melhor; e amudana aconteceu, no por si mesma, mas por pessoas cumprindo o que foi exigidodelas pela razo e pela conscincia. E agora nossa razo e nossa conscincia exigem dens da maneira mais real que deixemos de beber vinho e de oferec-lo aos outros.

    Como algo geral os homens consideram digno de censura e desprezo aqueles

    alcolatra que vo a tavernas e bares, e bebem tanto que perdem a razo, e tornam toviciados ao vinho que no conseguem se controlar, e bebem tudo o que possuem. Osprprios homens que compram vinho para uso domstico bebem todo dia e emmoderao, e oferecem vinho aos seus visitantes em circunstncias em que ele usado etais homens so considerados bons e honrados e como se no causassem nenhum dano.E no entanto essas mesmas pessoas so mais dignas de censura que os alcolatras. Osalcolatras tornaram-se alcolatra simplesmente porque aqueles que no eramalcolatras, aqueles que no causaram nenhum dano a si prprios, ensinaram eles a

    beber vinho, tentaram-nos pelo seu exemplo.

    Alcolatras jamais teriam se tornado alcolatras se no tivessem visto homens

    honrados, homens respeitados por todos, bebendo vinho e o oferecendo aos outros. Umjovem que nunca tomou vinho conhecer o gosto e o efeito do vinho em festas, em

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    casamentos, nas casas dessas pessoas honradas que no so elas prprias alcolatras,mas que bebem e servem bebidas diante de seus visitantes em certas ocasies.

    E assim ele que bebe vinho, no importa quo moderadamente, ou o oferece emquaisquer circunstncias especiais, comete um grande pecado. Ele tenta aqueles a quem

    ele no ordenado a tentar, de quem se disse, Ai daquele que tenta um destespequeninos.

    dito, "Ns no comeamos com isso, no seremos ns que iremos terminar."

    nossa tarefa acabar com isso se ns apenas entendermos que para cada um dens beber ou no beber vinho no um assunto de indiferena; que com cada garrafa devinho comprada, cada copo de vinho bebido, estamos servindo aquela terrvel aodiablica pela qual a melhor fora humana desperdiada; mas, por outro lado,abstendo-se de vinho, e suprimindo o costume sem sentido de usar vinho em festivais,casamentos e batizados, estamos realizando um trabalho de extrema importncia, o

    trabalho de nossa alma, o trabalho de Deus. To logo tivermos entendido isso, aembriaguez ser parada por ns.

    E, portanto, meu leitor, quer voc seja um jovem recm entrando na vida, ou umadulto que j estabeleceu sua vida, o chefe de uma casa ou uma dona de casa, ou umancio, para quem agora est perto o tempo de prestar contas pelas aes que fez, quervoc seja rico ou pobre, famoso ou desconhecido, quem quer que voc seja, impossvel para voc ficar entre esses dois lados; voc precisa infalivelmente escolherum dos dois: opor-se a embriaguez ou colaborar com ela, servir a Deus ou a mamom.

    Se voc um jovem que nunca at agora tomou lcool, nunca at agora foienvenenado pelo veneno do vinho, considere como tesouro sua inocncia e liberdade datentao. Se voc provar, a tentao ser mais difcil de superar. E no acredite que ovinho aumentar sua alegria. Na sua idade a alegria uma alegria natural, genuna, boa;e o vinho s torna sua alegria verdadeira e inocente numa alegria embriagada, semsentido e viciosa.

    Acima de tudo, cuidado com o vinho, porque na sua idade ser difcil resistir aoutras tentaes; o vinho enfraquece em voc a fora da razo, que mais necessria emsua idade para ajud-lo a resistir s tentaes. Depois de ter bebido voc far o que no

    pensaria em fazer quando sbrio. Por que submeter-se a um risco to terrvel? Se voc

    um adulto que j adentrou o hbito de usar bebidas alcolicas, ou que est recmcomeando a formar esse hbito, tenha pressa enquanto ainda h tempo de sair dessehbito terrvel, ou ento antes que olhe ao seu redor ele ter controle sobre voc, e voc

    pode tornar-se como aquele que so irremediavelmente alcolatras, que pereceram emrazo do vinho. Todos eles comearam igual a voc. Mesmo que voc tenha ahabilidade de usar bebidas em moderao por toda sua vida, e possa no se tornar umalcolatra, no entanto, se voc continuar a beber vinho e servi-lo em sua mesa, voc

    pode talvez fazer seu irmo mais novo, sua mulher e seus filhos serem alcolatras,porque eles podem no ter a fora como voc de limitar-se a um uso moderado dovinho.

    E acima de tudo entenda que em voc como um homem, que atingiu o auge davida, como o dono da casa, como o controlador do destino dos outros, repousa a

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    responsabilidade de guiar as vidas de sua famlia. E, portanto, se voc sabe que o vinhono traz nenhuma vantagem, mas causa grande mal aos homens, ento voc no apenasno obrigado a fazer cegamente como seus pais e avs faziam, a usar vinho, a compr-lo e servi-lo aos outros, mas , ao contrrio, voc obrigado a evitar esse hbito e aguard-lo dos outros.

    E no se preocupe que a mudana no costume de beber vinho em festas, batizadose casamentos possa humilhar ou incomodar as pessoas muito profundamente. Emmuitos lugares j comearam a fazer isso, substituindo o vinho com iguarias apetitosas e

    bebidas sem lcool, e as pessoas s no comeo, e as mais estpidas, se espantam, masrapidamente se acostumam e o aprovam.

    Se voc um ancio, numa idade em que muito em breve ser chamado a prestarsuas contas a Deus, sobre como serviu a Ele, e em vez de alertar os jovens einexperientes sobre o vinho, o terrvel mal que voc deve ter visto ao curso de sua vida,voc tentou seu vizinho com seu prprio exemplo, bebendo vinho e o oferecendo aos

    outros, voc cometeu um forte pecado.

    Ai do mundo por causa dos escndalos! Os escndalos precisam vir ao mundo,mas ai daquele por quem vm os escndalos.

    Apenas deixe-nos entender que em matria de usar vinho no h meio caminho, equer desejemos ou no precisamos escolher entre dois rumos, servir a Deus ou servir amamom. "Aquele que no est comigo est contra mim; e aquele que comigo no ajuntaespalha". Mateus 12:30

    Notas

    1. De acordo com as estatsticas publicadas pelo Imperial Bureau, oconsumo de cerveja na Alemanha durante o ano 1897-1898 foi de 1.383.700.000 litros,enquanto foi de 1.237.000.000 litros nos Estados Unidos, 1.192.000.000 litros na Gr-Bretanha, 463.500.000 litros na Autria-Hungria, 279.000.000 litros na Blgica,180.000.000 na Frana, e um pouco mais de 90.000.000 litros na Rssia. O consumo de

    cerveja per capita da populao estimado em 36 litros na Blgica, 32 na Gr-Bretanha, 25 na Alemanha, 21 na Dinamarca, 12 na Sua, 10 nos Estado Unidos, 9 naAutria-Hungria, 9 na Holanda, 5 na Frana, 3 na Noruega, 2 na Sucia, e 1 na Rssia.ED.