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Revista de Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001.

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Revista de

Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001.

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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃOUNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO

ReitorProf. Dr. Paulo Speller

Vice ReitorProf. Dr. José Eduardo Aguilar S. do Nascimento

Pró-Reitora AdministrativaTec. Adm. Esp. Adriana Rigon Weska

Pró-Reitor de Ensino e GraduaçãoProfa. Dra. Maria Lúcia Cavalli Neder

Pró-Reitor de PlanejamentoProf. Dr. José Manoel Henriques de Jesus

Pró-Reitora de Ensino de Pós-GraduaçãoProfa. Dra. Flávia Maria de Barros Nogueira

Pró-Reitor de PesquisaProf. Dr. Paulo Teixeira de Souza Júnior

Pró-Reitora de Vivência Acadêmica e SocialProfª. MSc. Marilda Esteves Calháo Matsubara

EDITORA UNIVERSITÁRIACoordenador

Prof. Dr. Hugo José Scheuer Werle

IMPRESSÃO: Gráfica Universitária/UFMTGerente: Pedro Brites Filho

UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSOAv. Fernando Corrêa da Costa, s/n Campus Universitário – Coxipó da PonteCEP 78060-900 – Cuiabá – MTTel.: (0**65) 615-8322, Fax (0**65) 615-8325e-mail: [email protected]

INSTITUTO DE EDUCAÇÃO

DiretoraJorcelina Elizabeth Fernandes

Curso de Mestrado e Doutorado em EducaçãoCoordenadorManoel Francisco de Vasconcelos Motta

Chefe do Departamento de Ensino e Organização e EscolarOzerina Victor Oliveira

Chefe do Departamento de PsicologiaJosé Dirceu Cauduro

Chefe do Departamento de Teoria e Fundamentos da EducaçãoAntônio Luiz do Nascimento

Coordenadora de Ensino de Graduação em Pedagogia (Campus Central)Sandra Regina Geiss Lorensini

Coordenadora Pedagógica de Licenciaturas Parceladas (Interiorização)Genésio Marques

Coordenadora do Núcleo de Educação Aberta e a Distância (NEAD)Kátia Morosov Alonso

Chefe da Secretaria GeralManoel Messias de Souza

2

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Consultores ad hoc

Prof. Dr. Walter GarciaPNUD

Prof. Dr. Sérgio ScalaUNIC – Universidade de Cuiabá

Prof. Dr. Nicanor Palhares SáUFMT – Univ. Federal de Mato Grosso

Prof. Dr. Luiz Augusto PassosUFMT – Univ. Federal de Mato Grosso

Editores científicos

Prof.ª Dr.ª Izumi Nozaki Discurso e prática pedagógica

Prof. Dr. Edinaldo Castro e Silva Educação ambiental

Prof.ª Dr.ª Artemis TorresProf. Dr. Edson Pacheco de Almeida Educação, poder e cidadania

Prof. Dr. Peter BüttnerFilosofia na educação

Prof. Dr. Nicanor Palhares Sá História e educação

Prof.ª Dr.ª Eugênia Coelho Paredes Psicologia social e educacional

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Revista de Educação Pública

Publicação do Programa de Pós-Graduação em Educação daUniversidade Federal de Mato Grosso.

Cuiabá, Editora da UFMT, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001. 175p.

ISSN 0104-5962

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EditorNicanor Palhares Sá

Consultora EditorialMatilde A. Crudo (MTPS 10.784)

Revisão e EditoraçãoLeslie de Almeida Claudio

Conselho editorial

Ana Antônia de Assis PETERSONUFMT - Cuiabá/MTBernadete A. GATTIFund. Carlos Chagas – São Paulo/SPCelso de Rui BEISIEGELUSP - São Paulo/SPChristian ANGLADEUniversity of Essex - InglaterraErmelinda M. De-Lamonica FREIREUFMT - Cuiabá/MTFlorestan FERNANDES(in memoriam)Francisco FERNÁNDEZ BUEYUniversitat Pompeu Fabra - EspanhaGermano GUARIM NETOUFMT - Cuiabá/MTJean HÉBETTEUFPA - Belém/PA Maria Inês Pagliarini COXUFMT - Cuiabá/MTMaria de Lourdes BANDEIRAUFMT - Cuiabá/MTMartin COYUniv. Tübingen - Alemanha

Miguel Pedro Lorena de MORAESUFMT – Cuiabá/MTMoacir GADOTTIUSP - São Paulo/SPNicanor Palhares SÁUFMT - Cuiabá/MTPaolo NOSELLAUFSCar - São Paulo/SPPaulo SPELLERUFMT - Cuiabá/MTSérgio Roberto de PAULOUFMT - Cuiabá/MTWalter E. GARCIACNPq - Brasília/DF

Correspondência para envio de artigos, assinaturas e permutas:Nicanor Palhares SáEditor da Rev. de Educ. PúblicaInstituto de Educação/UFMTAv. Fernando Corrêa da Costa, s/n78060-900 - Cuiabá - Mato GrossoFax: (065) 615-8440E-mail: [email protected]: http//www.ufmt.br/revista/revista.html

Conta corrente para depósito:Banco do BrasilAgência: 3602-1Conta corrente: 170.500-8Depósito identificador: 15 40 45 15 26 20 10 – 7Valor de número avulso: R$ 10,00Assinatura: R$ 20,00

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Discurso e prática pedagógica

Sumário

Carta do Editor...................................................................................... 9Apresentação........................................................................................ 11

Artigos

Discurso e prática pedagógicaDeterminación empirica y clasificación de las relaciones directasentre las distintas asignaturas del Plan de Estudio de la Carrera de Economia (perfil empresarial), vigente en la Universidad dePinar del Rio – Cuba.............................................................................

Alberto Mazón Almora Isel Cardentey Acosta

13

Educação ambientalO Lixo Urbano de Cuiabá e a Conservação do Meio Ambiente...........

José Aparecido Thenquini Ermelinda M. De-Lamônica-Freire

25

Educação, poder e cidadaniaA incidência de pré-vestibulares populares: o caso do PRÉUnB................................................................................................

Francisco Gilson Rebouças Porto Júnior39

“Mostrações” do cotidiano de uma escola pública de periferia urbana situada em Diamantino-MT (período 1997/1999) ................................

Elni Elisa Willms63

Filosofia na educaçãoComunidade de investigação filosófica em nível superior....................

Raquel Martins Fernandes79

A construção do conhecimento e a interdisciplinaridade: o conceito e a dialética do pensamento..................................................

Maria Therezinha de Lima Monteiro93

Subjetividade: a dimensão subsumida da formação do(a)professor(a) ..........................................................................................

Maria Neide Sobral da Silva109

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Uma nova educação: por quê, para quê, como....................................Peter Büttner

121

História da educaçãoA Situação da Pesquisa Histórica sobre as InstituiçõesEducacionais Brasileiras.......................................................................

Décio Gatti Júnior133

A Escola Estadual de Uberlândia: histórico e representaçõessociais...................................................................................................

Giseli Cristina do Vale Gatti141

Psicologia social e educacionalTransferência, educação e o banquete de Platão................................

Maria Augusta Rondas Speller153

DocumentosDocumento: Artigo da revista A Violeta................................................

Gisleine Crepaldi Silva167

Documento: Jornal “A Cruz”, artigo “Na Época”...................................Marize Bueno de Souza Soares

169

Informes da pesquisa e da pós-graduaçãoDissertações defendidas (2000)........................................................... 173

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Carta do editor

O ano de 2001 está sendo o primeiro ano da nova administração – Universidade Viva. Tudo indica que será tão dramático como os demais da última administração: não tem recursos. Um grande esforço tem sido realizado para o pagamento da dívida de mais de quatro milhões, deixada pela administração anterior. Os recursos destinados, atualmente, às universidades brasileiras são irrisórios. Tal circunstância é agravada pelo pagamento das dívidas acumuladas, resultando em imobilismo das atividades fundamentais.O financiamento de um periódico não entra no orçamento da universidade como atividade prioritária e essencial. É, em verdade, a primeira atividade a ser postergada. No momento, será possível a garantia da periodicidade se a Revista tiver uma forma de financiamento externo, o que não tem sido muito fácil assegurar.

A nossa expectativa é de que esse quadro se modifique e a Revista de Educação Pública possa ser editada com os recursos próprios da Instituição. Atualmente, ela tem mantido sua periodicidade apenas no meio eletrônico. Contudo, sua produção em papel é indispensável, pois é ainda o meio pelo qual a permuta se realiza.

Os números do ano 2001, este e o próximo, excepcionalmente, estão sendo organizados pela Professora Doutora Artemis Torres a partir das matérias produzidas no Seminário Educação 2000, que coordenou. A Revista, no passado, utilizou freqüentemente esse fórum de debates como fonte de suas matérias. Ambas - Seminário Educação e Revista - têm sido fundamentais para o intercâmbio científico. Na medida em que o Seminário Educação se transforma em um evento de caráter nacional, tem-se tornado inevitável o aproveitamento da sua produção.

Nicanor Palhares SáEditor

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APRESENTAÇÃO

A Revista de Educação Pública pretendeu ser, desde o seu surgimento, um espaço de divulgação da produção científica regional. Quase contemporâneas, a Revista, o Seminário Educação e o Programa de Pós-Graduação em Educação mantiveram tradicionalmente um vínculo de mútua colaboração, como era de se esperar. Nesse sentido, uma análise retrospectiva de seus 16 números irá mostrar a presença forte das produções do Seminário e do Programa, na Revista. Assim como Seminário e Programa passaram por reformas, a fim de adaptar-se às novas demandas e interesses, também a Revista, a partir deste número, se apresenta renovada, em sua estrutura.

A linha editorial passa a contar com três novas seções, ao lado das seções de Artigos. O conteúdo destas, submetido a consultores ad hoc, destina-se à divulgação de resultados parciais ou finais de pesquisa, abrindo-se exceção para ensaios cujo conteúdo seja relevante para o Programa. A nova seção Documentos presta-se à divulgação de material diverso, de valor histórico [leis, cartas abertas, fotos, relatórios etc.]. Outra seção, intitulada Notas de Leitura/Resumos/Resenhas, destina-se à divulgação de textos informativos e/ou críticos sobre publicações da área. Finalmente, a seção Informes da Pesquisa e da Pós-graduação abre-se para a divulgação das dissertações concluídas no semestre e, ainda, para entrevistas com coordenadores de grupos de pesquisa do Programa, notícias sobre a pós-graduação etc.

Apesar de nunca ter constituído uma fonte exclusiva das matérias aqui publicadas, o Seminário Educação, na medida em que adquire projeção nacional, tem conseguido assegurar seu lugar, na Revista. Assim sendo, neste número – e, também, no próximo – as seções de Artigos, abrem espaço exclusivamente para trabalhos apresentados no Seminário Educação 2000 cujos autores atenderam ao convite para publicação. Trinta e cinco trabalhos foram encaminhados, tendo sido aceitos 22. Para este número 17, especificamente, foram selecionados 11 trabalhos, que se encontram distribuídos em seis seções de Artigos, devendo os outros 11 ser publicados no próximo número. São majoritariamente relatos de pesquisa que, em sua diversidade temática, permitem ao leitor revisitar temas clássicos e, ainda, outros que entraram em moda, devido à sua oportunidade conjuntural.

Mazon & Cardentey refletem sobre o planejamento curricular do curso de Economia, com base em ferramentas da análise estrutural e estatística e em opiniões de especialistas.

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Thenquini & De Lamônica contribuem com a educação ambiental, focalizando diretamente a discussão sobre a coleta seletiva de lixo e as ações educativas a ela relacionadas.

Porto Junior recupera a história do surgimento de pré-vestibulares populares, focalizando o caso do Pré-UnB. Tomando como referências Maffesoli, Durand e Morin, Willms mostra o complexo cotidiano de uma escola pública, chamando atenção para a necessidade de uma visão mais ampliada e cuidadosa por parte dos educadores.

Fernandes reflete sobre a comunidade de investigação, de Matthew Lipman, apresentando a experiência de sua aplicação em instituição de ensino superior. Monteiro contribui com um estudo sobre a construção do conhecimento, evocando o debate teórico que ele tem suscitado e salientando as contribuições de Piaget. Baseando-se em uma abordagem multirreferencial, Silva faz uma reflexão sobre a necessidade de não se perder de vista, na formação docente, a dimensão subjetiva. Büttner propõe a mutação paradigmática da educação, afirmando a possibilidade da autonomia cognitivo-criativa, sob inspiração da filosofia lipmaniana.

Refletindo sobre as contribuições da renovação teórico-metodológica da pesquisa histórica ao campo da educação, Gatti Junior destaca a ampliação do campo temático, mencionando a pesquisa sobre as instituições educacionais. Gatti apresenta resultados de pesquisa sobre antiga escola estadual formadora da elite, destacando as representações sociais que foram geradas em torno dela.

Speller traz do campo da Psicanálise o conceito de transferência, lembrando que, mesmo estando presente nas relações professor-aluno, nem sempre é conhecido ou suscita o interesse dos educadores.

Na seção Documentos, o leitor terá oportunidade de conhecer ou re-visitar duas preciosas matérias divulgadas em periódicos e revistas do início do século XX.

A seção Informes da pesquisa e da pós-graduação apresenta as dissertações defendidas no Programa de Pós-Graduação em Educação, no período de janeiro a junho do presente ano.

Em sua nova estrutura de seções, estou convencida de que a Revista amplia as possibilidades de divulgação do rico e variado acervo da produção científica existente na área.

Artemis Torres

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Discurso e prática pedagógica

Determinación Empirica y Clasificación de las Relaciones Directas entre las Distintas Asignaturas del Plan de Estudio de la Carrera de Economia (Perfil Empresarial), vigente en la Universidad de Pinar Del Rio - Cuba

Alberto Mazón Almora1

Isel Cardentey Acosta2

RESUMEN: A través de las opiniones de los profesores como expertos y las herramientas del análisis estructural y estadístico, se construyeron matrices a partir de las asignaturas de la carrera de Economía. En el interior de estas matrices y mediante un criterio cuantitativo se determina si existe o no relación directa entre un par cualquiera de asignaturas, así como la dirección de esta relación. A partir de aquí se logra un indicador de motricidad y otro de dependencia para cada asignatura, lo cual permite ubicarlas y clasificarlas en un plano de motricidad-dependencia como base para un ulterior análisis y perfeccionamiento del sistema Plan de Estudio.

Palabras-clave: Enseñanza Superior; Economia; Plan de Estudio

ABSTRACT: Through the professors' opinions as experiencers and the tools of the statistical and structural analysis, it was possible to build matrixes from each of the subjects in the study of economics. Inside these matrixes and through a quantitative criterion we determine if these exist or not a direct relation between a pain of any of the subjects, as well as the direction of this relation. From this, it is possible to achieve a motricity indicator and another of dependency for each subject, which permit to place and classify them in a plane of motricity-dependency as the basis for the further analysis and improvement of Graduate Program System.

Keywords: Higher Education; Economy; Teaching Program

1 Professor Doutor, Departamento de Economia, Universidad de Pinar Del Rio (Cuba).2 Licenciada, Universidad de Pinar Del Rio (Cuba).

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 10 n. 17 Jan.-jun. 2001 p. 13-24

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Discurso e prática pedagógica

INTRODUCCION

En la actualidad, la Carrera de Economía, no obstante haber transitado por distintas fases de perfeccionamiento dista, según nuestra opinión, de un ordenamiento e integración de contenidos suficientemente satisfactorio, donde cada parcela de conocimiento (asignatura) esté ubicada en el lugar que le corresponde y reconozca su interacción con las demás del sistema Plan de Estudio. Por tanto, una de las vertientes del trabajo metodológico de la carrera debe estar orientada a la investigación y solución de esta problemática que, por otra parte, contribuirá de manera importante al fortalecimiento de la integración intra e interdisciplinaria.

Un punto de partida importante para el logro de este propósito, como premisa fundamental en la dirección eficiente del trabajo metodológico, lo constituye la determinación empírica de las relaciones directas existentes entre las distintas asignaturas, a partir de la opinión del docente. Conocer su número y dirección es una información de interés en el proceso lógico de ordenamiento e integración de los contenidos, ya que se pueden establecer, en base a algún criterio, clasificaciones que agrupen las asignaturas e informen del rol que juegan dentro del sistema.

Nuestra intención, con este trabajo, consistió precisamente en arribar a dicha clasificación de la manera como la ve el claustro de profesores, a fin de que sirva de base a ulteriores confrontaciones con el punto de vista teórico-metodológico del fenómeno bajo estudio. Esto permitirá determinar la magnitud y carácter de la brecha existente entre lo que plantea la teoría y la realización práctica, clarificando la orientación del trabajo metodológico destinado a resolver las diferencias.

Para la realización de este trabajo nos valimos del Análisis Estructural y Estadístico, y la información proporcionada por el claustro de profesores de la Facultad de Economía de la UPR.

DESARROLLO

La obtención del material fáctico se logró mediante entrevistas individuales a los profesores, a los cuales se les formulaban las siguientes preguntas:

a.- ¿Cuáles asignaturas dependen de la suya?b.- ¿De cuáles asignaturas depende la suya?La información obtenida de cada pregunta fue vaciada en sendas

matrices o tablas de doble entrada, asignando el valor 1 (uno) si había

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relación y el valor 0 (cero) si no la había. En cada matriz, las filas corresponden a las asignaturas que aportan y las columnas a las asignaturas que reciben. La primera matriz se elaboró por filas, recogiendo resultados de la primera pregunta. La segunda matriz se elaboró por columnas, recogiendo los resultados de la segunda pregunta.

Posteriormente, ambas matrices se superpusieron para identificar y corregir las diferencias asumiendo el criterio “por exceso” (al llegar a este punto se comprobó que la segunda matriz era más exhaustiva, lo que nos induce a pensar que el profesor está más preparado para responder sobre las necesidades que su asignatura tiene de otras, que para lo contrario), quedando una tercera matriz (Anexo #1) como el consolidado de las dos anteriores. Las sumas por filas y por columnas de esta matriz (Anexo #2) son la expresión cuantitativa dos indicadores que caracterizan a cada asignatura, a saber:

- INDICADOR DE MOTRICIDAD (Suma por fila): representa el número de asignaturas sobre las que influye una asignatura particular. La motricidad se expresa como una medida de la independencia de una asignatura en el contexto del Plan de Estudio y, a la vez, se presenta como fuerza impulsora de las demás. Este indicador lo representaremos por la variable “X“ y resume los resultados de la pregunta uno.

- INDICADOR DE DEPENDENCIA (Suma por columna): representa el número de asignaturas que influyen sobre una asignatura particular. Establece la dependencia de una asignatura con respecto a las demás del Plan de Estudio. Este indicador lo representaremos por la variable “Y” y resume los resultados de la pregunta dos.

Hasta aquí tenemos dos criterios iniciales de clasificación que nos permiten investigar de manera absoluta el comportamiento de cada asignatura. No obstante, se hace necesario un agrupamiento a partir de ciertas categorías a manera de homogeneización del grupo total, de forma que no sólo éste sea más manejable sino que caracterice a cada asignatura por su posición con respecto a las demás. En este sentido convinimos en subdividir los valores de cada indicador en bajo, medio y alto. Así tendremos:

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Baja

Motricidad Media

Alta

Indicador

Baja

Dependencia Media

Alta

Como cada asignatura lleva aparejado los dos indicadores nos saldrán 3x3=9 combinaciones de motricidad-dependencia, que a los intereses de nuestro análisis reunimos en cinco clasificaciones:

I.- Asignaturas poco motrices y poco dependientes, que incluye la combinación:

- baja motricidad y baja dependencia,II.- Asignaturas hasta medianamente motrices y/o media-namente

dependientes, que incluye las combinaciones:- dependencia media y motricidad baja,- motricidad media y dependencia media,- motricidad media y dependencia baja,III.- Asignaturas muy motrices, que incluye las combinaciones:- motricidad alta y dependencia baja,- motricidad alta y dependencia media,IV.- Asignaturas muy dependientes, que incluye las

combinaciones:- dependencia alta y motricidad baja,- dependencia alta y motricidad media

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V.- Asignaturas muy motrices y muy dependientes, que incluye la combinación:

- motricidad alta y dependencia alta.

Para cuantificar lo anterior, ordenamos lo datos de cada indicador y obtuvimos las cuartilas, decidiendo como “bajos” los valores hasta la primera cuartila inclusive, como “medios“ los valores por encima de la primera cuartila hasta la tercera inclusive, y como “altos” los valores por encima de la segunda cuartila (la mediana), excluyendo por supuesto, aquellos que se solapan con la zona baja y media ya definida. De esta forma nos queda cinco combinaciones de motricidad-dependencia:

GRUPO MOTRICIDAD DEPENDENCIA

I Baja X 7 Baja Y 5

II Media 7< X 18 Media 5 Y 17,5

III Alta 18 < X Baja-Media Y 11

IV Baja-Media X 10,5 Alta 17,5 < Y

V Alta 0,5 < X Alta 11 < Y

El lector interesado puede con relativa facilidad determina las asignaturas que caen en cada grupo, a partir de la información del Anexo 2. Nosotros sólo lo ilustraremos a través de una gráfica llamada Plano de Motricidad-dependencia Directa (Anexo 3), donde aparece una nube de puntos que representa los valores de los pares (X, Y) correspondientes a cada asignatura. El plano se subdivide en cinco sectores, donde cada sector representa un grupo. Para su construcción se tuvo en cuenta la cuantificación anterior, excluyendo de los sectores III, IV y V los solapamientos con el sector III, como ya se indicó.

Para verificar la estabilidad del sistema con que estamos trabajando, se construyó un gráfico (Anexo 4), donde la figura dibujada en el mismo arroja estabilidad relativa del sistema, en el sentido de que las

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asignaturas, en lo fundamental, tienen una tendencia bien a ser motrices o bien a ser dependientes. Esta diferenciación facilita el tratamiento metodológico de las mismas.

Una vez aplicado el método, que dentro del sentido común es susceptible de variaciones, y obtenidos los resultados, se hace necesario discutir al menos aquellas cuestiones que estimamos más sobresalientes. Comencemos por el Sector I. Las asignaturas que caen dentro del mismo manifiestan una relativa autonomía: Dan poco y reciben poco. Si atendemos a la definición de Sistema, entonces las asignaturas que caen aquí tienen poco que hacer en el Sistema Plan de Estudio. En este sector se ubican las asignaturas Matemática II, Ingles IV, Informática III, Métodos Cuantitativos I y Métodos cuantitativos II. En el caso de Ingles IV, si lo obtenido se corresponde con la realidad, quizá sería conveniente sacarlo del sistema, ya que su contribución al mismo es nula (Puede ser útil, pero no para el sistema). En caso contrario, los profesores de Ingles IV no conocen a qué asignaturas les puede brindar servicio la suya; o los profesores de las demás asignaturas no conocen el ingles suficiente o no poseen la bibliografía adecuada en idioma ingles. En el caso de las restantes del grupo, evidentemente hay falta de gestión por los profesores que las imparten, y desconocimiento por parte de los profesores de las otras asignaturas, de estas herramientas de indudable aplicación en la solución de problemas económicos.

Las asignaturas del Sector II tienen una localización media, aportan y reciben medianamente del sistema. Son las del “pelotón”. Su desarrollo proviene del propio sector y de los sectores III y V. Este es el sector más complejo, por una parte porque incluye a la mayoría de las asignaturas, por otra, porque una investigación más profunda o un criterio menos selectivo en las clasificaciones puede hacer saltar asignaturas de este sector hacia otros.

El Sector III incluye las asignaturas que se destacan por su motricidad. Sirven de base al resto del sistema, condicionando en buena medida la calidad de los resultados futuros. Se consideran determinantes del éxito. Aquí los resultados obtenidos son bastante consistentes con lo que teóricamente se pudiera esperar. Sin embargo, las asignaturas de corte matemático brillan por su ausencia. También la Teoría Económica tiene una floja representación.

El Sector IV plantea una situación opuesta al anterior. El mismo recoge las asignaturas que se caracterizan por una alta dependencia, son asignaturas resultantes, muy susceptibles a la motricidad. Por tanto, su

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evolución se explica, en términos generales, por las asignaturas de los sectores III y V.

Los resultados obtenidos para este sector son altamente consistentes con lo esperado, ya que la mayoría de las asignaturas incluidas corresponden a los años superiores.

El Sector V incluye asignaturas a la vez muy motrices y muy dependientes. Estas aportan mucho, pero también reciben mucho. Su pequeña cantidad le confiere relativa estabilidad al sistema.

CONCLUSIONES

Se logra una clasificación empírica de las asignaturas del Plan de Estudio, según era nuestra intención.

La clasificación que obtiene una asignatura permite valorar si su posición es consistente atendiendo a criterios teórico-metodológicos o no.Para ciertas asignaturas es manifiesta la incongruencia entre la posición que sugiere el docente y la que indica la lógica más elemental.

La relativa estabilidad del sistema es condición favorable para su reordenamiento a través del trabajo metodológico en sus distintos niveles estructurales.

RECOMENDACIONES

Elaborar un modelo teórico del Sistema Plan de Estudio y contrastar el mismo con los resultados alcanzados en este trabajo.

Dirigir el trabajo metodológico de la Carrera a la solución de las diferencias observadas entre teoría y práctica.

BIBLIOGRAFIA

CANSADO, E. Curso de Estadística General. Edición Revolucionaria. La Habana, 1966.

Documento Plan de Estudio de la Carrera de Economía, 1996.

GODET, M. De la Anticipación a la acción ”Manual de Prospectiva y Estrategia”. Editorial Marcambo. S. ª Barcelona, España, 1993.

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Anexo #1

Resultado parcial de la matriz de Motricidad-dependencia directa

Asignatura i\j … 16 17 18 … 56 57 58 … Suma… … … ... … … … … … … … …

EPO III 16 … \ 0 1 … 1 1 1 … 29Est. Mat. I 17 … 0 \ 0 … 1 1 1 … 12Hist. Econ. Cuba 18 … 1 0 \ … 1 1 0 … 18

… … … … … … … … … … … …Industrialización 56 … 1 0 0 … \ 1 0 … 10Econ. Eco Amb. 57 … 1 0 1 … 1 \ 0 … 31Direc. Estrat. 58 … 1 0 0 … 0 1 \ … 6

… … … … … … … … … … … …Suma … … 34 8 10 … 28 37 32 … 738

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Discurso e prática pedagógica

Anexo #2

Índices de motricidad-dependencia

Variables Motric. X Depend. Y1 Informática I 27 32 Ingles I 23 23 Matemática I 14 24 Filosofía 23 15 Economía Política I 37 36 Contabilidad General 23 57 Introd. A la Economía 21 68 Algebra Lineal 8 09 Informática II 18 3

10 Hist. Econ. Mundial 20 511 Ingles II 11 312 Matemática II 6 413 Economía Política II 31 2314 Estadística Económica 21 1015 Ingles III 10 2516 Economía Politica III 29 3417 Estadistica Matemática I 12 618 Hist Ecnómicade Cuba 18 1019 Pensamiento Econ. Universal 18 1120 Microeconomía 16 1621 Mat Financiera 13 1122 Ingles IV 1 023 Pensamiento Econ. Cub. 18 1224 Economía de Empresa 26 1425 Macroeconomía 16 2026 Investig. De Operaciones 9 1227 Estadistica Matemática II 13 628 Introd. A la Dirección 15 729 Informática III 3 530 Estadistica Matemática III 8 7

(continua)

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Discurso e prática pedagógica

(continuacion)Variables Motric. X Depend. Y

31 Métodos Cuantitativos I 3 332 Informática IV 3 633 Contabilidad Financiera 9 1434 Marketing I 15 1635 Introd al Derecho 9 436 Prepar del país para defensa 12 1737 Admón Financiera I 16 1038 Contabilidad de Gestión 12 1139 Metodos Cuantitativos II 3 340 Marketing II 11 1541 Derecho Financiero 7 842 Teoría Sociopolítica 5 1343 Servicio Estrateg de Calid 8 744 Investigación de Mercado 9 1845 Economía Internacional 7 2046 Administración Financiera II 8 1547 Dir. de Recursos Humanos 11 2148 Econm Agropecuaria 7 2149 Metodologia de la Investigación 8 750 Administración de Operaciones 7 1551 Administración financ. III 5 1652 Negociación 7 1153 Economía Regional 8 2454 Dirección 10 2055 Economía Cubana 5 2556 Industrialización 10 2857 Econ. Ecol. y Ambiental 31 3758 Dirección Estratégica 6 3259 Gestión de PYME 3 2260 Derecho Mercantil 2 13

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Anexo #3

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Anexo #4

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O Lixo Urbano de Cuiabá e a Conservação do Meio Ambiente

José Aparecido Thenquini1Ermelinda M. De-Lamônica-Freire2

RESUMO: A metodologia utilizada baseou-se em entrevistas e observação do tipo qualitativa. Coletaram-se dados através de análise documental da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos e da Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar – PNDA, do IBGE, relativos a 1997, que versava sobre a coleta do lixo e sua disposição final. Procurou-se conhecer como a coleta do lixo é realizada no município e no país, quais as dificuldades existentes e a destinação final do mesmo. Ainda, se eram feitos trabalhos educacionais para sensibilização dos atores sociais no que diz respeito à coleta seletiva de lixo e aos males causados pelos resíduos. Os resultados obtidos demonstraram que o lixo é coletado, entretanto, a maior dificuldade relaciona-se à sua disposição final e ausência de sensibilidade dos atores sociais que contribuem para a deposição do lixo em qualquer lugar, sem a preocupação com o ambiente.

Palavras-chave: lixo, meio ambiente, coletas coletivas, educação e reciclagem.

ABSTRACT: The used methodology is based on interviews and observation of the qualitative type. It was collected data through documental analysis of the Municipal General Office of Urban Services and of the National Research of Home Sampling–PNDA, of IBGE, relative to 1997, which turned about the collection of the garbage and its final disposition. It was investigated how the collection of the garbage is accomplished in the municipal district and in the country, the existent difficulties and the final destination of the same. Still, if there were any education works in order to sensibilize the social actors about the selective collection of garbage and the evils caused by the residues. The obtained results demonstrated that the garbage is collected, however, the largest difficulty links at its final disposal and absence of the social actors' sensibility that contribute to the deposition of the garbage anywhere, without the concern with the atmosphere.

Keywords: rubbish, environment, collective collections, education and recycling.

I – INTRODUÇÃO

1 Licenciado em Estudos Sociais, Geografia e Direito. Professor da Faculdade de Direito, UFMT. Mestrando em Educação, IE/UFMT.2 Professora Doutora do Programa de Pós-Graduação em Educação, IE/UFMT. Coordenadora do Curso de Mestrado em Ciências da Saúde da Universidade de Cuiabá (UNIC).

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Educação ambiental

Os lixos produzidos pelos seres humanos nas mais variadas atividades existentes na sociedade são um dos graves problemas enfrentados por todos os atores sociais e políticos, devido ao intenso consumo que ocorre na sociedade contemporânea, bem como as doenças que são transmitidas pelos vetores existentes no lixo.

Em face desse consumo, o problema se dá com relação à disposição final desses resíduos. Em sua maioria, o lixo produzido pelos moradores dos mais de cinco mil municípios existentes no País não recebe tratamento adequado, sendo depositados em locais abertos e inapropriados chamados popularmente de lixão.2

Para Calderoni (1998, p. 25),“O lixo é um material mal amado (...) Vive-se, em conseqüência, uma imensa crise. Ao mesmo tempo em que cresce o volume de lixo produzido, resultante do aumento desvairado do consumo, são cada vez mais caras, mais raras e mais distantes as alternativas tradicionais de disposição do lixo em aterros”.

Esta afirmação serve para ilustrar o que vem ocorrendo nas cidades, o tipo de tratamento que se dá ao lixo, “o material mal amado” pela grande maioria da população, é simplesmente depositado em locais abertos, gerando mais um problema ambiental, tendo em vista a poluição dos lençóis freáticos pelo chorume, e ainda, por ser fonte de recolha de materiais recicláveis e de alimentos para inúmeras pessoas que sobrevivem no anonimato destes lixões, expostos a graves problemas de saúde.

Segundo pesquisa coordenada pelo UNICEF em 1997, em 88% das cidades do País, o lixo é despejado em locais abertos.

Ainda, de acordo com dados do IBGE de 1991, 76% do lixo urbano vai para o lixão, 13% para aterros controlados e 10% para aterros sanitários. Deste total, 99% do lixo é colocado diretamente no solo, 0,9% vai para compostagem e 0,1% é incinerado.

O poder público municipal é o responsável pela coleta dos resíduos sólidos urbanos e rurais, quer sejam eles provenientes de fontes geradoras das áreas domésticas, comerciais, industriais ou da saúde, pois cobra dos munícipes a taxa de limpeza urbana, inclusa no IPTU – Imposto Predial Territorial Urbano.

São interessantes os dados fornecidos pelo IBGE, referentes à problemática do lixo em nível nacional. A pesquisa foi realizada em 1997,

2 Lixão: Local onde o lixo urbano ou industrial é depositado de forma rústica, a céu aberto, sem qualquer tratamento.

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sobre a existência de alguns serviços existentes em domicílios permanentes no Brasil.

Para compreender os dados obtidos, faz-se necessário citar a terminologia usada na pesquisa referentes a deposição do lixo. Para o IBGE (1997, p. 30-31), destino do lixo é:

“O lixo proveniente dos domicílios particulares permanentes foi classificado de acordo com os seguintes destinos: Coletado – Quando o lixo domiciliar fosse coletado diretamente por serviço ou empresa de limpeza, pública ou privada, que atendia ao logradouro onde se situava o domicílio, ou fosse depositado em caçamba, tanque ou depósito de serviço ou empresa de limpeza, pública ou privada, que posteriormente recolhia; ou Outro – Quando o lixo domiciliar fosse queimado ou enterrado na propriedade, jogado em terreno baldio, logradouro, rio lago ou mar ou tivesse outro destino que não se enquadrasse nos anteriormente descritos”.

Assim, o quadro abaixo mostra os dados referentes à pesquisa: destinação do lixo total e os percentuais da área urbana e rural, realizada pelo IBGE nos domicílios brasileiros.

Distribuição dos domicílios particulares permanentes:Destino do Lixo em Percentual.

TOTAL URBANA RURAL

Coletados Outros Coletados Outros Coletados Outros

76,3 23,7 90,7 9,3 14,5 85,5

Fonte: IBGE 1997.

Percebe-se, a partir desses dados que 76,3% do lixo no Brasil é recolhido pelo poder público ou por empresas particulares que realizam os serviços mediante licitação municipal, e que 23,7%, tem outra destinação como, por exemplo, são incinerados pelos moradores ou simplesmente jogados nos rios e mares.

Comparando os dados referentes à área urbana com a rural, percebe-se que a coleta do lixo na área urbana é bem expressiva 90,7% contra 9,3% que tem outra destinação. Na área rural 85,5% é de outras formas de destinação do lixo e coleta-se apenas 14,5% do lixo produzido por essa população.

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Não resta dúvida que o lixo no Brasil é coletado. O problema maior é com relação à destinação final do mesmo, devido as conseqüências estéticas e de saúde nefastas para os moradores.

Face ao exposto, vê-se que embora o poder público cobre dos moradores a taxa de limpeza urbana e realize a coleta, o problema ainda persiste com relação a deposição final do lixo.

Ademais, deve-se buscar soluções de forma integrada com outros setores do conhecimento, utilizando-se a Educação Ambiental como meio de sensibilizar os cidadãos da importância de se conservar o meio ambiente.

Logo, com relação ao lixo, as iniciativas deverão ser a busca de implementação da coleta seletiva, promover o fomento de cooperativas de catadores de materiais recicláveis, objetivando a reciclagem e o esclarecimento dos moradores dos perigos advindos da má disposição final do lixo.

Para atingir estas metas, deverão ser utilizados todos os recursos materiais e humanos disponíveis, envolvendo as mais diversificadas entidades existentes nos locais, tais como: igrejas, escolas, associações de moradores, clubes de mães, empresários locais, o poder público, dentre outros, servindo-se da educação ambiental e de outros educadores com suas disciplinas respectivas, para atingirem as metas educativas de esclarecerem os moradores a respeito da problemática ambiental.

Assim, o inicio do trabalho de sensibilização com relação ao meio ambiente, poderá ocorrer através da coleta seletiva do lixo nos municípios, pois segundo o UNICEF 1999, ainda são poucos municípios que implementaram a coleta seletiva do lixo, “apenas 100 dos mais de 5,5 mil municípios brasileiros têm coleta seletiva do lixo”.

II - METODOLOGIA

A pesquisa foi desenvolvida junto à Secretaria Municipal de Serviços Urbanos de Cuiabá, Mato Grosso e no IBGE de Mato Grosso, através de visitas e entrevistas nos meses de abril a julho de 1999.

A metodologia utilizada na pesquisa foi a entrevista qualitativa, que, segundo Triviños (1995, p. 124), “nesta abordagem os dados obtidos na entrevista são descritivos, pois houve a participação direta do pesquisador com a situação estudada”.

Bogdan e Biklen (1982), apud Lüdke e André (1988, p. 11), dizem que “a pesquisa qualitativa supõe o contato direto e prolongado do

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pesquisador com o ambiente e a situação que está sendo investigada, via de regra através do trabalho intensivo de campo”.

Assim, a utilização deste instrumental foi importante, pois possibilitou a interação do pesquisador com a realidade estudada, de modo a obter um conhecimento mais aprofundado da temática atinente aos resíduos sólidos.

O objetivo da pesquisa foi compreender a participação do poder público na coleta do lixo, através dos materiais informativos existentes, bem como identificar e analisar os dados existentes sobre a coleta do lixo.

Em Cuiabá, a coleta do lixo é realizada de forma regular atendendo os 115 bairros existentes no Município, através de empresas terceirizadas.

O problema da coleta do lixo na Capital mato-grossense pode ser considerado grave, haja vista o grande manancial de rios, córregos e nascente existentes na região, pois, os moradores ainda depositam seus lixos em terrenos baldios, às margens das rodovias e avenidas de vários bairros da capital, causando sérios prejuízos ambientais e de saúde pública aos moradores.

O lixo coletado de forma sistemática no município, há mais de 15 anos, era todo depositado num lixão sem os devidos tratamentos, na área localizada na Rodovia Emanuel Pinheiro, que liga Cuiabá ao Parque Nacional da Chapada dos Guimarães. Entretanto, no ano de 1997, foi criada a Central de Destinação Final de Lixo, localizada em Várzea do Quilombo, região Norte de Cuiabá. A central possui capacidade para 140 tonelada/dia de lixo, sendo utilizado modernos equipamentos no tratamento dos resíduos, bem como se faz a reciclagem de vários produtos tais como: papelão, garrafas Pet, lata de refrigerantes e cervejas, plásticos, ferros entre outros que representam 15% do lixo triado, sendo que o restante do lixo orgânico, é compostado e levado para o aterro sanitário, bem como são depositados em áreas que foram degradadas em face de seu rico conteúdo de nutrientes.

Assim, na opinião da Engenheira Sanitária Senhora Kátia Cristina de Souza Lopes, Assessora Técnica da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos a Usina de Reciclagem do município diz que:

“A usina de Cuiabá é um complexo de destinação final de resíduos, recebendo diariamente cerca de 300 ton/dia de resíduos, sendo que aproximadamente 50% dela vai para a usina e os outros 50% vai para o aterro sanitário, existindo hoje uma seleção a nível de qualidade de lixo, tendo em vista a experiência adquirida

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desde 1997, pois existe a sensibilidade dos operadores em reconhecer qual o melhor lixo para a reciclagem.

É um sistema perfeito, pois dos 50% destinado à Usina 15% é reciclado, isto é o teórico, na verdade nunca se chega a isso, e 55% matéria orgânica que vai ser compostado, mais 30% que são rejeitos que nós também mandamos para o aterro sanitário. Então é um manejo integrado de resíduos, não tendo nada se perdendo, o que está se perdendo, está sendo confinada numa menor área que é a técnica do aterro sanitário, que nós temos lá”.

Vê-se, pelo depoimento, que a usina não opera com a sua capacidade total em termos da reciclagem do lixo, isto se deve ao fato de não haver uma coleta seletiva de lixo em todos os bairros da cidade.

Há coleta seletiva do lixo somente na área central e nos bairros mais nobres onde o lixo é considerado mais rico, havendo a possibilidade de selecionar os materiais recicláveis na usina, sendo que os demais lixos oriundos dos bairros pobres - compostos em sua maioria de lixo orgânico-, são destinados para o aterro sanitário.

O descaso com o lixo da periferia deve-se ao fato de ser um lixo pobre em materiais recicláveis, possuindo em sua totalidade matéria orgânica composta de resto de alimentos, papel higiênico e folhagem entre outros, haja vista que os moradores da periferia não possuem o mesmo poder aquisitivo que os moradores dos bairros nobres da cidade. A desigualdade de riquezas reflete-se no poder de consumo de cada um, embora todos sejam alvos das campanhas publicitárias, os cidadãos que moram nos bairros mais pobres adquirem o essencial para a sua sobrevivência, enquanto os que possuem maiores rendas consomem muitos bens supérfluos, este fato é reflexo de uma realidade mais ampla que envolve questões de ordem política, social e econômica que em seu conjunto excluem milhões de seres humanos da riqueza produzida na sociedade. Portanto, não deveria haver discriminação na coleta e triagem do lixo, pois os munícipes pagam a taxa de limpeza urbana inclusa no IPTU, e, deveriam receber o mesmo tratamento pelo poder público.

Destarte, todos os moradores deveriam ter a sua coleta realizada conforme cronograma municipal. Não se pode olvidar que a higienização é um direito de todos e dever do poder público municipal, servindo também como ponto de referência para a educação dos atores sociais sobre os problemas causados pelo lixo, bem como ponto de partida para discussões mais ampla sobre a problemática ambiental.

Segundo os responsáveis pela Secretaria Municipal de Serviços Urbano do Município o órgão não possui um departamento exclusivo de

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educação, encarregado de promover a educação ambiental junto a comunidade.

Entretanto, reconhecem a deficiência e estão dispostos a buscarem parcerias juntos a outro setores do governo e da sociedade civil, no sentido de implementarem a implantação da educação ambiental, pois sabem que é imprescindível no atual contexto, a inclusão da educação ambiental em sua prática, para poderem sensibilizar os moradores da capital para que separem e acondicionem em embalagens separadas o lixo orgânico do lixo inorgânico.

Para que estas metas sejam atingidas, torna-se necessário um suporte teórico embasado na educação formal, não formal3 inclusive informal, objetivando a sensibilização dos atores sociais e políticos com relação à problemática ambiental.

É interessante o depoimento do Diretor da Secretaria Municipal de Serviços Urbano, Senhor Ivan Pimentel. Quando perguntado se havia algum projeto em EA no órgão, o mesmo asseverou que:

“Nós começamos 97, sabe nós temos uma fartura bastante grande, farta tudo! Começamos 97 bem animado, nós tinha um rapaz que fazia um teatrinho, nós conseguimos uma parceria com as empresas de ônibus, que dou para nós 4.500 lixeiras, nós instalamos 3.000, já arrancaram 2.000, sumiram 2.000 (...) nós tivemos coisas absurdas em termos da lixeirinha. Um dia tinha passado 7 horas da noite, eu passei com o carro, eu vi o cara que estava parado na lixeirinha, pensei será que ele está dormindo na lixeirinha, por incrível que pareça ele estava defecando dentro da lixeirinha, ele tirou a calça no meio da avenida encostou e ficou. Nós encontra dentro daquela lixeirinha, gato morto, cachorro morto. Se vê, um dia nós tivemos que arrancar a lixeirinha, o cara botou o cachorro tão grande que tivemos que arrancar. Então isso ai o que é; pra mim, é educação. Você não educa uma pessoa adulta, tamos pedindo para todas as escolas, pessoal de universidades, tenha essa visão na criança”. (sic).

Percebe-se da afirmativa do Sr. Ivan, que é notório o vandalismo por parte de uma parcela pequena da comunidade, pois ainda se destrói os bens públicos em vez de protegê-los.

Entretanto com relação à educação, denota-se o equívoco do dirigente, quando assevera que a educação deve ser centrada na criança, o grande desafio é justamente educarmos adultos e jovens, pois não podemos excluir uma parcela significativa da sociedade que é responsável pela produção dos resíduos sobre o pretexto de que não

3 Segundo Maria da Glória Gohn (p. 100), se define a educação não formal por uma ausência, em comparação ao que há na escola (algo que seria não intencional, não planejado, não estruturado), tomando como único paradigma a educação formal.

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mais adianta educá-los. Isso ocorre porque esses adultos não se encontram sensibilizados com relação à problemática ambiental.

Destarte, a educação é imprescindível para educarmos esse contigente enorme da população que está fora do ambiente escolar formal, devendo para tanto, utilizar a educação continuada, centrada na utilização dos métodos da educação não formal e informal.

Todavia, a Secretaria Municipal de Serviços Urbano da capital possui folhetos educativos de boa qualidade tais como: folders, cartazes, adesivos, cartilhas dentre outros, atinentes a coleta seletiva do lixo, que são distribuídos nas escolas, em condomínios e, na comunidade em geral, por ocasião das campanhas de conscientização.

Na maioria das vezes a utilização desses materiais não surte o efeito esperado, por não ser uma campanha continuada, envolvendo outros segmentos da comunidade que compartilham dos mesmos princípios, relativos à problemática ambiental.

Segundo a Senhora Kátia, existe uma dificuldade por parte da população em assimilar os valores relativos à coleta seletiva do lixo.

É elucidativa a sua experiência, no ano de 1997, quando num determinado bairro da capital, foram instalados coletores coloridos para coleta seletiva. Houve campanha durante o dia todo, com distribuição de folders, adesivos, cartazes e carro de som entre outros, conclamando os moradores a participarem da reunião no centro comunitário do bairro, onde estaria o Secretário de Limpeza Urbana e outras pessoas para falarem sobre a importância do meio ambiente e da coleta seletiva do lixo que iria ser implantado no bairro.

Para a surpresa dos organizadores, na reunião à noite, compareceu somente o presidente do bairro, sua esposa e filho. E a maior surpresa foi no dia seguinte, o primeiro dia da coleta seletiva, onde somente um cidadão apareceu com uma sacola de lixo.

Percebe-se do exposto, que não bastam campanhas vultosas, se não há comprometimento da comunidade. O fracasso se deve ao fato de não ter sido realizado junto a comunidade um trabalho de aproximação, para se detectar qual ou quais os problemas que afligem os moradores, bem como suas prioridades.

Assim, para que o trabalho seja eficaz, deverá ser meticulosamente planejado, montando estratégias com a participação da comunidade e outros segmentos da sociedade que possuem os mesmos objetivos relativos à questão ambiental, para que juntos o trabalho possa ser eficiente e obter os resultados esperados por todos.

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“As estratégias que adotam o uso intensivo de cartilhas, cartazes, folders e outros recursos do gênero têm sido protagonistas de desperdício de recursos financeiros, freqüentemente públicos, e de fracassos lamentáveis. A Fonte de erros tem sido a mesma: planeja-se sem o conhecimento devido do perfil ambiental das comunidades a serem envolvidas e do seu respectivo metabolismo”. (DIAS, 1993, p. 130).

III - RESULTADOS

Segundo dados de 1998 da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos, a produção de resíduos sólidos no município é de 262,16 toneladas/dia para os resíduos coletados nos domicílios e no comércio, sendo de 3,48 tonelada/dia para os resíduos de Serviço de Saúde, mais 2,64 tonelada/dia de resíduos provenientes da varrição da área central, incluindo aí, os lixos das lixeiras espalhadas pela cidade, perfazendo um total de 268,28 ton/dia, se considerarmos os 101,36 m3/dia de entulho, que também são resíduos coletados em Cuiabá, teremos um total de 369,64 ton/dia.

Percebe-se que a geração de resíduos na capital é expressivo, o que justifica a instalação da Usina de Compostagem para efetuar a reciclagem de materiais.

Ademais, que sejam ampliados os aterros sanitários, criados programas de coleta seletiva e, que seja investido na educação dos moradores, sensibilizando-os para que contribuam na separação do lixo em suas residências, separando o lixo orgânico do inorgânico.

Nos primeiros seis meses do ano de 1999, em Cuiabá foram coletados, conforme se vê no quadro abaixo, lixo urbano e comercial os seguintes valores:

LIXO URBANO/COMERCIAL COLETADO NO 1º SEMESTRE DE 1999 EM CUIABÁ

Meses Jan. Fev. Mar. Abr. Maio Jun.

Ton. 8.140,02 7.160,07 8.281,56 7.542,52 7.331,48 7.559,77

Fonte: Secretaria de Limpeza Urbana

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Com base nos dados acima, a média do semestre de geração de resíduos sólidos em Cuiabá por mês é de 7.669,23 ton. Foi coletado em média no município 319,55 ton. de lixo por dia.

Considerando que a população de Cuiabá encontra-se conforme dados do IBGE/96 em 433.355 mil, temos uma produção per capita diária de lixo por habitante na ordem de 737,38 gramas por pessoas. O que confirma a média nacional exposta por Minc (1997, p. 55) que “os 150 milhões de brasileiros, em 1995, geram 700 gramas de lixo diário per capita”...

Assim, para minimizar o problema do lixo da Capital foram colocados em algumas áreas centrais e bairros, PEV’s (Postos de Entregas Voluntárias). Porém, todos já foram desativados, um que localizava-se ao lado da Lojas Riachuelo e o outro na Praça Alencastro, ambos na área central da cidade.

Segundo a senhora Kátia, os PEV’s são para os lojistas colocarem os resíduos secos, como papelão, papéis e plásticos. Sendo que, por ocasião da instalação dos PEV’s, foi distribuído folder explicativo dirigido aos comerciantes do centro da Capital, contendo informações sobre a correta utilização dos PEV’s, como separar o lixo ‘seco’ do orgânico, o horário da coleta, bem como a advertência que o não cumprimento desses procedimentos acarretaria a aplicação de multa no valor de R$ 43,86 (45,85) UFIR, por ser uma infração prevista no artigo 486 da lei complementar 003 de 24.12.92, que dispõe sobre o Plano Diretor de desenvolvimento de Cuiabá, podendo em casos de reincidência, ser cassado o Alvará de funcionamento do estabelecimento.

É ilustrativa a mensagem contida no folder que diz:“Os esforços despendidos melhoraram a imagem de Cuiabá, que hoje é uma cidade limpa, para orgulho de todos nós. O lixo comercial mal embalado e exposto para coleta fora do horário estabelecido, causa transtornos e denigre a própria imagem do estabelecimento comercial. Participe efetivamente desta campanha, fazendo sua parte. Cuiabá agradece”. Roberto França Auad – Prefeito Municipal.

Vê-se que o texto contém algumas inverdades, pois a limpeza e a coleta de lixo é realizada de forma mais intensa e eficaz na área central da capital. Entretanto, nos bairros periféricos, a diferença pode ser percebida em face dos resíduos espalhados por terrenos baldios, ruas e alamedas que não recebem o mesmo tratamento, dada á área central.

Ocorre que, os comerciantes da área central - particularmente os donos de restaurantes, lanchonetes e bares -, depositavam nos PEV’s, o lixo orgânico, misturando com os demais resíduos, descumprindo a lei e

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demonstrando que não foram sensibilizado para a problemática ambiental relativo ao lixo.

Outrossim, outra dificuldade era que os mendigos, moradores de ruas, retiravam os plásticos e o papelão para fazerem abrigo para dormirem, bem como, defecavam, urinavam, vomitavam nos resíduos, dificultando o manuseio na hora da separação pelos funcionários da Usina de Compostagem.

Embora o esforço desenvolvido pela Secretaria de Limpeza Urbana, no que se refere à coleta do lixo na área central e nos demais bairros, ser considerado um serviço de qualidade pela pesquisa desenvolvida - conforme publicação no Diário de Cuiabá de 18/04/99 -, o que se vê são pequenos depósitos de lixos espalhados nas periferias e grandes avenidas que circundam Cuiabá.

Denota-se com esta constatação, que os moradores não estão suficientemente esclarecidos dos perigos causados pela má disposição do lixo. Suas condutas, não corresponde com a expectativa esperada pela sociedade, que é de ver a cidade adequadamente higienizada, proporcionando o bem estar de toda a coletividade.

Percebe-se que a solução para o lixo produzido pelos seres humanos transcende a ótica do consumo, envolvendo outras questões de ordem cultural, política, educacional e ambiental, na busca de soluções para a deposição final do lixo, pois é um problema planetário.

Logo, o esforço para resolução do problema relativo ao lixo urbano e rural, deverá englobar um bloco de segmentos que estejam dispostos a enfrentar o desafio de educar os atores sociais de forma continuada, através da educação formal, não formal e informal, para que possamos ter uma qualidade de vida digna, vivendo em sociedade.

IV - CONSIDERAÇÕES FINAIS

O meio ambiente neste fim de século e do milênio ganhou notoriedade, porque os seres humanos perceberam a necessidade de cuidarmos melhor do planeta sob pena de todos perecerem.

Somos sabedores que existem vários problemas na sociedade. São problemas complexos, onde as soluções exigem investimentos materiais e pecuniários significativos para sua solução.

O poder público é responsável pela atual situação de descrédito, onde milhões de pessoas estão desempregadas, não tem acesso a saúde, escola, transporte, segurança, moradia, lazer dentre outros.

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Educação ambiental

Os políticos, salvo raríssimas exceções, não estão preocupados em buscar soluções a curto, médio e longo prazo, para resolverem os problemas.

Navegamos na onda das privatizações e, no entanto, a situação dos cidadãos não mudou, pois os interesses defendidos no parlamento não são os interesses da maioria e sim da minoria que domina o poder.

Desse modo, a busca de um ambiente saudável - onde a qualidade de vida dos moradores seja adequada - implica uma mobilização de vários setores da sociedade civil organizada ou não, para que possamos juntos promover trabalhos educativos e formativos de cidadania, que visem a mudança de comportamentos, hábitos de consumo, para que tenhamos um meio ambiente em condições de habitabilidade.

Conforme Minc (1997, p. 54), “O melhor critério para se aferir o padrão de qualidade de uma sociedade é avaliar a forma como ela trata as crianças, os velhos e os doentes mentais, como distribui a renda, como se alimenta e como trata seus rejeitos”.

Enfim, a discussão sobre o lixo é um ponto de partida para aqueles que estão envolvidos com a problemática ambiental ou não, pois todos nós somos responsáveis, conforme as nossas condutas pela deterioração da condição de vida do planeta.

Portanto, “as necessidades do planeta são as necessidades das pessoas (...) os direitos das pessoas são os direitos do planeta”. (ROSZAK apud CAPRA, 1999, p. 387).

V - BIBLIOGRAFIA

ANDRÉ, Marli E. D. A. e Lüdke Menga. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo, EPU, 1986.

CALDERONI, Sabetai. Os bilhões perdidos no lixo. 2ª ed. São Paulo, Humanitas, 1998.

CAPRA, Fritjof. O ponto de mutação. São Paulo, Cultrix, 1999.

DIAS, A. Genebaldo Freire. Educação ambiental: princípios e práticas. 2º ed. rev. e ampl. São Paulo. Gaia, 1993.

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Anuário estatístico do Brasil, 1997.

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Educação ambiental

IPDU – Instituto de Pesquisa e desenvolvimento Urbano – Súmula de Informações Município de Cuiabá, 1999.

MINC, Carlos. Ecologia e cidadania. São Paulo, Moderna, 1997.

SMSU - Secretaria Municipal de Serviços Urbanos. Dados estatísticos, (mimeo), 1999.

SMSU - Secretaria Municipal de Serviços Urbanos, SMADU - Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, PMC -Prefeitura Municipal de Cuiabá. Folder "Jogue Limpo com Cuiabá". s.d.

TRIVIÑOS, Augusto N. Silva. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa qualitativa em educação. São Paulo, Atlas, 1987.

UNICEF - Fundo das Nações Unidas para Infância – Jornal Em Ação, Rio de Janeiro, maio, nº 16, 1999.

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A Incidência de Pré-Vestibulares Populares: o caso do PRÉUnB

Francisco Gilson Rebouças Porto Júnior1

RESUMO: O presente artigo contém uma análise sobre a temática dos pré-vestibulares populares, considerando os resultados obtidos em uma das iniciativas: o Pré-UnB, mantido pela AABR-UnB. Aspectos da história dos pré-vestibulares e do próprio concurso vestibular são trazidos à tona, bem como das seis propostas existentes estudadas.

Palavras-Chaves: Pré-UnB, Concurso Vestibular, Pré-Vestibulares Populares

ABSTRACT: The present article contains an analysis on the thematic one of the popular daily pay-vestibular contests, considering the results gotten in one of the initiatives: Pré-UnB, kept for the AABR-UnB. Aspects of the history of the daily pay-vestibular contests and the proper competition initial are brought to tona, as well as of the six studied existing proposals.

Key-Words: Pré-UnB, Competition Initial, Pré-Vestibulares

1 Professor da Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB).

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 10 n. 17 Jan.-jun. 2001 p. 39-61

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INTRODUÇÃO

O trabalho em tela tem a finalidade de analisar a proposta social do pré-vestibular popular PRÉUnB, mantido e gerenciado pela Associação dos Alunos de Baixa Renda da Universidade de Brasília – AABR-UnB, bem como a aplicação da mesma na prática educacional. Tenta-se dessa forma, identificar os possíveis fatores que contribuem para sua oferta.

Para um maior esclarecimento da temática abordada, faz-se necessário uma abordagem histórica acerca dos concursos vestibulares, buscando com isso resgatar, dentro do contexto sócio-econômico, as circunstâncias que acarretaram a sua criação e, conseqüentemente a criação dos cursos preparatórios denominados pré-vestibulares.

Sabe-se que a oferta dos cursos pré-vestibulares é feita, em sua grande maioria, em função dos lucros. Essa afirmação se baseia no fato dessas instituições particulares de educação terem tornado-se verdadeiras indústrias do vestibular, principalmente quando ligadas a instituições de ensino médio particulares.

Por outro lado, temos a escola pública que não tem atendido as necessidades educacionais do alunado no ensino médio. Estes, já excluídos do processo pelas dificuldades educacionais surgidas, vão à procura de subsídios para sua ascensão social. Porém, deparam-se com alguns obstáculos como: o preço e a própria ideologia que são transmitidas nestas verdadeiras indústrias do vestibular.

O preço é categorizado como obstáculo, pois a maioria das instituições que oferecem esses serviços cobra um valor exacerbado, excluindo assim, os alunos da escola pública que, em sua maioria possuem baixo poder aquisitivo.

Já a ideologia que perpassa por essas instituições visa reunir os melhores alunos, ou melhor, reunir aqueles alunos que estudaram em escolas privadas e, que podem pagar pelos seus serviços. Estes são treinados – adestrados – nas técnicas que possivelmente garantirão uma aprovação na prova. Dessa forma, aprovados o maior número de alunos ‘adestrados’, estes pré-vestibulares obterão fama e mais alunos, conseqüentemente, aumentando sua margem de lucros.

Pré-Vestibulares Populares tem surgido em todo o Brasil com o objetivo de quebrar com o círculo vicioso que o lucro fácil tem gerado. Preços baixos, qualidade no ensino, consciência participativa e politizada tem sido o chamariz para uma clientela menos favorecida economicamente.

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Um pouco de história do Concurso Vestibular

A questão do acesso à Universidade constitui uma das principais problemáticas enfrentadas pelo sistema educacional brasileiro. Isto se deve ao fato de, primeiramente, haver uma procura de vagas maior do que a oferta e do concurso vestibular funcionar como um mecanismo de seletividade social.

O vestibular é um concurso classificatório para o ingresso nos cursos regulares de graduação das instituições de ensino superior. Sua criação se deu em 1911, com a Lei Orgânica do Ensino Superior, redigida por Rivadávia Correa, então Ministro do Estado da Justiça e Negócios Interiores, pelo decreto n º 8661.

No período do seu surgimento foi denominado exame de admissão, tendo como objetivo a avaliação do desenvolvimento intelectual do candidato, bem como sua maturidade e capacidade de se integrar no ensino superior. As provas que constituíam o concurso não eram classificatórias, passa a ser após algumas mudanças ocorridas na sociedade, que buscou com mais freqüência às universidades na década de 60.

Em 1915 foi realizada uma reorganização no ensino secundário e superior. Esta promoveu reformas profundas no âmbito educacional, porém, nada fora alterado no que diz respeito aos exames de admissão, a não ser o fato de tais exames serem denominados, pela primeira vez, de vestibulares.

Observa-se, na década de 50, um aumento da demanda que passou a procurar as instituições de ensino superior. Como conseqüência, tem-se um crescimento no número de candidatos por vaga. Este aumento deve-se em parte ao processo de desenvolvimento industrial iniciado no primeiro governo de Getúlio Vargas e, posteriormente, incrementado por este no período de 1950 a 1955. Seu sucessor eleito, Juscelino Kubitschek continua impelindo a ideologia desenvolvimentista, reforçado pelo projeto desenvolvimentista de cunho extremamente nacionalista2.

Nesse período, houve uma supervalorização da educação enfatizando o seu poder de transformação social. Com o aumento

2 Ver CARDOSO, Miriam Limoeiro. Ideologia do Desenvolvimento Brasil: JK-JQ. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977. Contribui também na contextualização BENEVIDES, Maria Victoria de Mesquita. O Governo Kubitschek: Desenvolvimento Econômico e Estabilidade Política 1956-1961. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.

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populacional e crescente industrialização precisa-se cada vez mais de profissionais capacitados, Cardoso 1977 esclarece:

“É na formação dos recursos humanos que entra o papel da escola, um papel novo e eminentemente voltado para o conhecimento técnico. ... O desenvolvimento em geral, e especificamente o desenvolvimento industrial, cria uma demanda de especialistas, formando um mercado de trabalho em potencial. Vemos que já se delineia, com razoável clareza, a perspectiva da educação para o trabalho: a existência de um mercado de trabalho, que vai sendo moldado pela industrialização, passando a ser ponto básico de referência para a formação daqueles que passam pela escola”. 3

Cabe salientar que o vestibular estava, como ainda está, inserido na política educacional do Estado. Sendo assim, este teria inúmeras ressonâncias nos diferentes graus de ensino, principalmente o secundário que teve toda sua estrutura curricular alterada para preparar, ou treinar a pequena parcela dos alunos que teriam acesso à educação superior pelo concurso vestibular.

Porém, os conteúdos cobrados nas provas do vestibular não estavam inseridos na realidade do ensino secundário, ficando este incapaz de preparar seus alunos para obterem êxito nestas provas. Como decorrência dessa carência no ensino secundário, surgem os cursinhos preparatórios para o vestibular que forneceriam aos candidatos um acúmulo de conhecimentos e informações científicas cuja finalidade seria a aprovação no concurso e não a formação científica e crítica.

É relevante destacar que desde a criação e, até mesmo antes dos vestibulares, os candidatos que conseguiriam ingressar nas universidades são aqueles que detinham um alto poder aquisitivo, pois, possuem melhor formação educacional, visto que as oportunidades que estes tinham de freqüentar às escolas particulares e cursinhos preparatórios eram maiores, devido ao preço elevado dos mesmos. Assim sendo, o vestibular funciona como selecionador dos já selecionados socialmente.

No início da década de 60, os vestibulares se restringiram à verificações de conhecimento de determinadas disciplinas consideradas “básicas” para o ingresso em um curso superior. As comissões examinadoras eram constituídas às vésperas do concurso e o critério de correção era estabelecido pelos próprios examinadores, sofrendo, assim, a influência da subjetividade de julgamento.

3 CARDOSO, Miriam Limoeiro. Ideologia do Desenvolvimento Brasil: JK-JQ. Op. Cit., pp.179.

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Com o término das provas escritas, o vestibular prosseguiu com a realização dos exames orais ou práticas que duravam vários dias. Não era mantida uma uniformidade nas questões elaboradas para cada candidato, muito menos no julgamento dos examinadores, infringindo assim, o princípio de igualdade de condições para todos os candidatos.

Quando todas as notas eram computadas, os resultados eram divulgados, e se as instituições não tivessem o número de vagas preenchido repetiam o vestibular para os mesmos candidatos, reduzindo o grau de dificuldade das provas. Tal fato acontecia porque para ser aprovado era necessário atingir uma determinada pontuação.

No decorrer dos anos 60 a demanda quantitativa de candidatos ao ensino superior aumenta. As universidades então existentes não podiam absorver esse crescente contingente de candidatos porque a oferta de vagas era insuficiente. Por isso, o vestibular se transforma em um instrumento para ‘descartar’ os candidatos e não ‘selecioná-los’. Isto porque grande parte dos candidatos atingia a pontuação exigida para a aprovação no vestibular e, conseqüentemente teriam o direito de ingressar na Universidade, porém sendo o número de vagas pequeno em relação à demanda existente, parte dos candidatos, embora aprovados ficariam de fora da universidade.

As universidades haviam de enfrentar tal problemática caracterizada como ‘excedente’, que crescia numericamente a cada ano. As pressões e insatisfações da camada social envolvida forçaram a criação de um exame classificatório que eliminava, de certa forma, a figura do excedente. Embora previsto pela Reforma Universitária, foi a decreto nº 68.908/71 que determinou o vestibular classificatório pela qual os candidatos passariam4.

O novo critério para a avaliação dos candidatos ao nível superior, considerava aprovado aquele que conseguisse classificar-se para o preenchimento de um número limitado de vagas e não os que alcançavam uma nota mínima estipulada. Mesmo diante desta solução, a problemática do vestibular continuou latente frente aos inúmeros protestos.

Percebe-se que o melhor caminho para se contornar a problemática do vestibular seria a unificação dos diferentes concursos vestibulares. Esta foi determinada pela Lei nº 5540/68, que estipulou o vestibular idêntico em todos os seus conteúdos para qualquer curso.

4 Para mais detalhes, ver FRANCO, Maria Aparecida Ciavatta. O Vestibular e o Acesso a Universidade Pública: Um problema de seleção ou de autonomia? In: VELLOSO, Jacques. Universidade Pública: Política, Desempenho, Perspectivas. Campinas, SP: Papirus, 1991.

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Entretanto, a unificação não esgotou os problemas atrelados ao vestibular. Pretendia-se ao unificar, avaliar a formação recebida pelos candidatos na escola e a aptidão intelectual que estes possuíam para o ensino superior. Entretanto, a escola pública foi acusada de fracassar em provê aos seus alunos o necessário ‘pacote’ de informações. Neste aspecto, Charlot 1997 esclarece:

“... estritamente falando, não existe fracasso escolar. Existem, é claro, alunos que não conseguem acompanhar o ensino que lhes é dispensado, que não adquirem os saberes que supostamente deveriam adquirir, que não constroem certas competências, que não são orientados para a habilitação que desejariam, alunos que naufragam e reagem com condutas de retração, desordem, agressão”.3

Que habilidades não ensinaram a escola pública? Que conhecimentos não foram ‘compartimentalizados’ da forma que criaria condições para esses alunos desenvolverem melhor habilidades? Por que não se viu isto há mais tempo? São questões importantes que merecem respostas. O que continuamos a perceber é que a maioria que ingressa nas universidades continua sendo aqueles que possuem um alto poder aquisitivo, tendo uma oportunidade educacional melhor do que o segmento menos favorecido da sociedade que depende das redes públicas de ensino que, na sua maioria, não atende às necessidades dos candidatos ao concurso vestibular.

Teixeira 1964, em artigo intitulado Educar para Produzir, dizia:“À medida que o povo começa, assim a absorve-la [a da transformação gradual da escola primária em escola secundária em uma escola para todos], terá ela de se ir transformando. Agora mesmo já se está registrando um movimento de ‘simplifica-la’, para lhe reduzir o programa fantástico. São os primórdios da transformação da escola de elite em escola popular”.4

Neste sentido, movimentos populares, sindicais e estudantis também pensam em transformar a ‘escola elitista’ que hoje vigora, em uma escola para todos. Iniciam esta jornada, pensando na educação superior como possibilidade de realizar seus sonhos. Investem sua força e vontade em ajudar alguns que poderão retornar às comunidades, após a devida qualificação, para agirem como agentes de mudança e é neste contexto, que surgem os primeiros pré-vestibulares de cunho popular.

Um passeio pelos Pré-Vestibulares Populares

3 CHARLOT, Bernard. Da Relação com o Saber: Elementos para uma Teoria. Porto Alegre: Art Médicas Sul, 1997.4 TEIXEIRA, Anísio. Educar para Produzir. Rio de Janeiro: arquivos do CPDOC, 1964.

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Apesar das dificuldades geradas pelo surgimento do comércio livre na educação e da indústria do vestibular, surgirão também iniciativas populares. Dentre as dezenas que estão ativas no país podemos mapear algumas:

Curso Pré-vestibular UFSCar: As atividades do curso pré-vestibular da Universidade Federal de São Carlos principiaram em 1999 como iniciativa de um grupo de alunos dessa instituição, consolidada através do trabalho das Pró-Reitorias de Graduação e de Extensão, sob a coordenação do Núcleo de Extensão UFSCar—Escola – no contexto do estudo e implementação de alternativas de democratização do acesso ao ensino de graduação na UFSCar previstas no planejamento estratégico da atual gestão da universidade. O principal objetivo do projeto é propiciar a estudantes oriundos de famílias de baixa renda a oportunidade de participarem de um processo de preparação para o exame vestibular, buscando suas chances de ingresso em universidades públicas. São também seus objetivos: contribuir para a formação dos alunos de graduação e pós-graduação por meio de ações concretas na comunidade e propiciar um espaço para outras atividades de extensão e pesquisa. O projeto prevê a cobrança de uma taxa de inscrição de R$ 5,00 para o processo seletivo e uma taxa mensal no valor de R$ 10,00. Prevê também o pagamento de bolsas aos alunos da UFSCar que atuam como professores e monitores.Em 2000 o corpo docente é formado por 23 professores e 24 monitores. Como a Universidade Federal de São Carlos não dispõe de recursos suficientes para a manutenção de um projeto que envolve altos custos (material didático e grande número de bolsistas), buscou-se parceria junto às empresas da região para o seu financiamento, bem como junto ao Ministério da Justiça (Secretaria de Direitos Humanos).

O trabalho no curso pré-vestibular da UFSCar é estruturado em ações de ensino e ações administrativas. Este trabalho, sob a coordenação dos docentes da UFSCar, é executado por alunos da graduação e pós-graduação desta Universidade. O curso desenvolve-se no período noturno de segunda à sexta-feira e aos sábados (manhã e tarde), com carga horária de 25 horas semanais. A seleção do corpo discente é realizada mediante a análise de documentação que comprove a situação sócio-econômica do candidato, entrevista e avaliação das habilidades básicas de interpretação de textos e operações matemáticas. No ano de 1999, dos 1200 alunos inscritos, 120 foram selecionados para participar do curso. Do total de alunos que permaneceram no projeto até

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o final de 1999, 23% conseguiram aprovação em universidades públicas. Neste ano de 2000, dos 511 alunos inscritos no processo seletivo, 210 foram selecionados.

Das dificuldades apontadas pelos coordenadores do projeto, pode-se ver claramente que é necessário aprimorar o sistema de coleta de dados para a caracterização sócio-econômica dos candidatos, a fim de traçar um perfil mais fiel do público que realmente necessita dos serviços prestados pela UFSCar. Outro aspecto relevante é a evasão. Segundo Roberto T. Lima, membro da atual coordenação do cursinho, “dos 120 que iniciaram em julho de 1999, somente 60 terminaram”.

Curso Pré-Vestibular Zumbi dos Palmares: O curso pré-vestibular Zumbi dos Palmares é formado por diversas pessoas que pretendem ser sujeitos da transformação social, que vêem na educação seu lugar de atuação.É construído de maneira coletiva por alunos de universidades públicas e particulares, profissionais formados e por todos que desejam atuar.Foi fundado em Niterói, Rio de Janeiro, no segundo semestre de 1995. Segundo o atual Coordenador Cícero Silva, doutorando em Física Nuclear,

“a idéia de se criar um curso para ajudar os mais necessitados a entrar para uma universidade pública e de qualidade partiu de diversas pessoas, com formação e experiências das mais diversas e, de certa forma com perspectivas também diferentes. Na Universidade Federal Fluminense, alguns alunos que se conheciam, participavam de idéias de uma sociedade mais igualitária, mas com práticas diferentes reuniram-se em torno de um forte ponto em comum: a constatação de que a universidade não possui acesso universal. Na tentativa de modificar esta situação, individualmente cada um já tinha alguma experiência a partilhar... Um jovem vindo do Amazonas para estudar história na UFF já tinha trabalhado na construção coletiva de um pré-vestibular popular, que começou com alguns amigos que formaram um grupo de estudo para se ajudarem a passar na universidade. Aqueles que conseguiram entrar ajudaram outros colegas. A experiência se estendeu à outros jovens da comunidade, com apoio das Comunidades Eclesiais de Base (CEB) e do movimento jovem da Igreja Católica. Houve a adição do grupo de um casal de estudantes da UFF que trabalhavam com o movimento negro; de um estudante do curso de física residente na casa do estudante e de dois estudantes de história atuantes no Diretório Acadêmico. Como as práticas eram distintas, as pessoas que começaram a pensar o Zumbi, muitas vezes divergiam na maneira de implementar as idéias. O Zumbi, por definição, deveria ser independente de quaisquer movimentos sociais, partidos políticos e qualquer instituição pública ou privada, governamental ou não. Embora parcerias e trabalhos em conjunto fossem incentivados, desde que mantida a independência e autonomia do curso.”

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É objetivo do curso fazer com que as pessoas oriundas de camadas populares menos favorecidas cheguem às Universidades Públicas e que tenham uma visão mais crítica da Sociedade em que vivem. A seleção de alunos se dá por meio de questionário sócio-econômico, tentando-se conhecer a realidade do aluno. Já os professores são selecionados por sua atuação em movimentos estudantis e segundo o Manifesto de Fundação do Curso Pré-Vestibular Popular Zumbi dos Palmares, “não será permitido trabalho remunerado dentro do projeto...”. O material didático é confeccionado pelos professores. O financiamento é feito pelos próprios alunos que contribuem voluntariamente para a sua manutenção, não havendo taxa estabelecida. O número de alunos em 1999 foi de 90, sendo que 10% destes passaram nas instituições de ensino superior públicas. A grande conquista deste curso pré-vestibular, segundo o atual coordenador Cícero Silva é que “alguns alunos tem chegado à Universidade pública e alguns têm retornado para nos ajudar, mas outros estão atuando nos movimentos sociais, como o MST, DCE e Diretórios Acadêmicos”.

APROVE – Associação de Professores para o Vestibular : A APROVE é uma entidade sem fins lucrativos, criada em 1992 em São Paulo com o propósito de “ministrar cursos pré-vestibulares com alunos de baixa renda, que não tem como arcar com os altos custos desse tipo de curso e, conseqüentemente garantir acesso de todos ao Ensino Superior, principalmente em universidades públicas”. Quando surgiu, no segundo semestre de 1992, contavam com 35 alunos em uma sala cedida aos sábados na EEPSG Emídio de Barros no Jardim Bonfiglioli, em São Paulo. Em 1993, acrescentou-se a EEPSG Padre Francisco em Interlagos, que permitiu a APROVE crescer para 500 alunos. Em 1994 mudaram para instalações próprias no Butantã. Em 1998 a APROVE inaugurou sua segunda unidade em Tiradentes, no centro velho de São Paulo, com um acréscimo de mais 450 vagas. Em 1999, inaugurou-se mais uma nova unidade no Butantã, com 400 vagas.Em 2000, a APROVE iniciou o projeto “Aluno da Escola Pública em Faculdade Pública”, criando 650 vagas de reforço escolar a um custo de 25% de salário mínimo.

O público alvo da APROVE vem, via de regra, das escolas públicas de todos os bairros da Capital e das cidades da Grande São Paulo. São alunos do ensino regular ou supletivo, que terminaram o 3º ano do ensino médio ou ainda estão cursando ou mesmo que já saíram dele há muitos anos. A entrada do aluno no cursinho se dá por meio de

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concurso: pondera-se com peso 3 os conhecimentos gerais (exame com 40 questões de múltipla escolha) e com peso 7 sua situação financeira.

As despesas geradas com material didático, folha de pagamento dos professores e funcionários, aluguéis e manutenção dos prédios são cobertas por uma taxa paga pelos alunos que vai de 25% a 50% do salário mínimo. Um das preocupações do curso da APROVE é com a qualidade. Sua infra-estrutura conta com Plantão de Dúvidas, Laboratório de Redação, Orientação Vocacional e Profissional, Cine APROVE, Aprovest (informações sobre os melhores cursos e cópias de provas dos vestibulares dos vestibulares no país), Aprovest II (visitas monitoradas ao campus da USP), Biblioteca, Simulados, Semana Cultural, Eventos de Confraternização, Salas de aula climatizadas, Lousa panorâmica com tela de projeção e retroprojetores em cada sala.(Mais detalhes sobre cada aspecto, vide anexo).

Segundo Fábio Mendes, Coordenador de Marketing, falando sobre o futuro da APROVE, aponta: “somos pretensiosos! Nosso ideal é custo zero! Para isso, necessitamos de apoio de entidades governamentais e/ou privadas, instituições financeiras, órgãos de classe e da sociedade como um todo, no sentido de ajudar na divulgação dos concursos, obtendo patrocínios e parcerias que ajudem a otimizar recursos e reduzir custos”.

Pré-Vestibular da Cidadania: O Pré-Vestibular da Cidadania surgiu em 1995, em Florianópolis, Santa Catarina, a partir do contato dos professores do Colégio Catarinense com o presidente do Centro de Educação e Evangelização Popular (CEDEP) da Igreja Católica. Foi formado, a partir daí, um comitê de professores interessados na devolução à sociedade do conhecimento que ela tem direito. São objetivos do Pré-Vestibular da Cidadania: Atender à massa jovem que está nas comunidades mais carentes de Florianópolis; Formar técnica e solidariamente, desenvolvendo nos alunos uma consciência crítica e uma capacidade de trabalho coletivo; Trabalhar comunitariamente uma saída alternativa para o ingresso nas universidades das comunidades carentes.

A seleção dos alunos que participaram em cada edição do cursinho segue os critérios de análise sócio-econômica, trabalho comunitário desenvolvido pelo candidato, vir de escola pública e ter terminado o ensino médio. Os professores são selecionados por sua

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compreensão do que significa cidadania e por sua experiência pedagógica. Os monitores são selecionados por sua participação nos movimentos sociais. O material didático é emprestado do Colégio Catarinense e outros que são compilados, bem como palestras visitantes. O financiamento da infra-estrutura como giz, xerox e sala de aula é feita pelo Colégio Catarinense, tendo todos os professores e monitores como voluntários. Estes participaram da construção de um projeto político pedagógico para o cursinho junto com o Centro de Educação e Evangelização Popular (CEDEP) da Igreja Católica.

Em 2000 contam com 120 alunos e 20 professores. Em balanço feito pelo Coordenador do projeto, nos cinco anos de existência conseguiram colocar 64 alunos na Universidade Federal de Santa Catarina. “Fundamentalmente é um projeto das classes trabalhadoras para se dividir o ‘solo’ da produção nas várias dimensões”, reforça o coordenador.

Pré-Vestibular para Negros e Carentes – PVNC: O Pré-Vestibular para Negros e Carentes surgiu na Baixada Fluminense em 1993, em função do descontentamento dos educadores com as dificuldades de acesso dos estudantes de grupos populares e discriminados ao ensino superior. O PVNC também surgiu visando a articulação de setores excluídos da sociedade para uma luta mais ampla pela democratização da educação e contra a discriminação racial.

Este pré-vestibular surgiu da idéia e das discussões de pessoas ligadas ao movimento negro, principalmente de pastorais negras. Porém, com o aumento do número de núcleos, houve um gradativo aumento de pessoas de outras organizações sociais, tais como sindicatos, movimentos estudantis, igrejas, partidos políticos, etc. Apesar desta abrangência, nenhum destes grupos é a ‘mola’de sustentação do PVNC, já que existe uma dinâmica de organização própria e uma carta de princípios, que é o documento referencial com todas as diretrizes para os núcleos.

O PVNC teve por influências outras iniciativas populares, principalmente as surgidas no Rio de Janeiro em 1986, como o pré-vestibular da Associação dos Funcionários da UFRJ e em 1992, do Curso Mangueira Vestibulares, destinado aos estudantes da comunidade do Morro da Mangueira; também tendo a influência do curso surgido na Bahia em 1992, que tinha o objetivo de apoiar e articular a juventude negra da periferia de Salvador, conhecida como Cooperativa Steve Biko.

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A proposta inicial na Baixada Fluminense baseou-se em duas constatações:1. A péssima qualidade do ensino médio na Baixada Fluminense, que praticamente elimina as possibilidades do acesso do estudante ao ensino superior; e2. A verificação do baixo percentual de estudantes negros nas universidades (menos de 2% dos estudantes em 1993), apesar da população negra brasileira corresponder, segundo o IBGE, 44% do total e à UNESCO 52%.

Inicialmente pensado com 4 coordenadores e 10 professores das várias matérias do vestibular, conseguiram duas salas de aula no Colégio Fluminense, em São João do Meriti. Para o primeiro curso foram feitas cerca de 200 inscrições. Dos inscritos, 100 alunos começaram a estudar em duas turmas. Muitos alunos evadiram e outros entraram durante o período de realização do curso (de julho a novembro).

A Carta de Princípios trata de questões pedagógicas, políticas e de organização do PVNC, tais como: Enfoque na camada da população menos favorecida economicamente, tendo como vertente a questão social; Afirmação da posição a-partidária do coletivo dos núcleos; Estabelecimento da norma de não aceitação de auxílio financeiro externo de instituições privadas, de nenhum grupo (ONGs, Associações, Partidos, Sindicatos, etc.) e de pessoa física; Estabelecimento da contribuição mensal do alunado em no mínimo 5% e no máximo 10% do valor do salário mínimo, ao mesmo tempo em que o núcleo se responsabiliza em repassar 10% da arrecadação total das mensalidades para a Tesouraria Geral, que é a responsável pelo ressarcimento dos gastos do coletivo do PVNC.

PVNC é o nome coletivo do movimento de pré-vestibulares comunitários. Cada ‘pré’ recebe o nome de núcleo. Estes núcleos, atualmente 64, organizam-se no estado do Rio de Janeiro através de Reuniões de Conselho e Assembléias Gerais. Em 2000 o número de alunos é de 2150 e 430 atuam como professores. Um diferencial entre os outros pré-vestibulares é que o PVNC está também preocupado com a aprovação em universidades particulares com bolsas de estudo. Cerca de 35% foram aprovados pelo PVNC nas universidades públicas e privadas do Rio de Janeiro.

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Cursinho da Poli: O Cursinho da Poli foi criado em 1987, a partir da sugestão e da iniciativa do então diretor da Escola Politécnica da USP, Décio Leal de Zagótis. É mantido pelo Grêmio da Poli, fundado em 1903. Mas as iniciativas do Grêmio estudantil em defesa da educação pública não se iniciaram aí: em 1903, um deputado apresentou projeto que criava taxas de matrícula para estudantes secundaristas e a aumentava de forma ainda mais absurda para o ensino superior. O Grêmio, que tinha, em 1903, como presidente Alexandre Albuquerque, decidiu lutar contra. Aglutinou os estudantes que, em passeata pelas ruas centrais de São Paulo, ainda dominada pelos barões do café, realizou um ato que representava o ‘enterro’ do deputado ‘inimigo’. O movimento culminou com o ‘corpo’ do edil sendo atirado no Rio Tamanduateí. As taxas não foram cobradas.

Em 23 de março de 1918, o Grêmio da Poli fundou uma escola noturna para alfabetização de adultos que resultou na famosa campanha Paula Souza de alfabetização. A experiência efetiva do Grêmio com cursos pré-vestibulares começava na década de 50 com a criação do Curso Politécnico, com fins lucrativos e inicialmente oferecido só para quem desejava prestar exame na Poli. Destacou-se como um dos melhores cursos pré-vestibulares da cidade de São Paulo, tendo sede própria e material produzido por seus professores. Funcionou até 1984 quando foi fechado.

Em 1987, devido ao processo de redemocratização que o país passava desde o movimento ‘Diretas Já’, a participação era um desejo que a juventude sentia, pensando nos deveres com o novo momento político. A direção da Escola Politécnica junto ao Grêmio criam um novo cursinho com objetivos diferentes do Curso Politécnico que havia sido fechado. Os compromissos do cursinho eram oferecer um curso pré-vestibular eficiente e sem fins lucrativos para a população carente. No primeiro ano funcionou com duas classes de trinta alunos. As aulas eram ministradas dentro da Poli, em salas do prédio da Engenharia Civil.

Em 1995 deu-se um rompimento com a nova direção da Politécnica, tendo aquela conseguido ficar até início de 1996, após manifestações da comunidade da USP. Em 1996 alugou-se um espaço na Rua Alvarenga e passou a ter 250 alunos nas turmas da semana e 200 nos finais de semana, totalizando 450 alunos. Durante o período que permaneceu na Rua Alvarenga começaram a ser realizados todos os ajustes administrativos, financeiros e pedagógicos. O Grêmio alugou um prédio na Rua MMDC e a capacidade de atendimento passou de 450 para 850 alunos. Ao mesmo tempo em que isso acontecia, o professor

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Antonio Marcos de Aguirra Massola assumia a direção da Escola Politécnica e mudava a relação com o projeto, o que levou as aulas de fim de semana a retornarem à Poli.

Ao abrir as portas em 2000, oportunizaram 8000 vagas, tornando-se o maior projeto liderado pelo movimento estudantil na América Latina. A nova sede conta com 4500 metros quadrados, onze salas, amplo auditório e ainda cineclube, livraria, biblioteca e videoteca. Foram feitas parcerias com o Sindicato dos Bancários, Febem Fundação Estadual para o Bem-Estar do Menor e Funap Fundação de Amparo ao Preso.

O material didático é fruto de um cuidadoso trabalho desenvolvido por professores do cursinho em 99 e contou com a dedicação de professores da Universidade de São Paulo, tais como: Prof. Dr. Francisco Capuano Scarlato Autor dos Parâmetros Nacionais de Geografia para o Ensino Fundamental, Claudemir Belintane Professor de Metodologia do Ensino de Língua Portuguesa da Faculdade de Educação da USP, Profa. Dra. Maria Cristina Bonomi Barufi Instituto de Matemática e Estatística da USP, Maria Inez de Castro Cerullo Professora de Matemática da Escola da Villa, Joel Arnaldo Pontim Co-autor do material de Química e autor de A Energia para o Século XXI, entre outros livros e Maria Aparecida de Aquino Professora de História Contemporânea e Presidente da Comissão de Graduação de História da USP.

O concurso de seleção do Cursinho da Poli é composto de duas fases. A primeira fase consiste numa prova de conhecimentos gerais com 80 questões. A segunda é uma avaliação sócio-econômica. É cobrada uma taxa de inscrição de R$ 45,00. Em 2000 foram disponibilizadas 2300 vagas no Extensivo Matutino, 1100 no Extensivo Vespertino, 2300 no Extensivo Noturno e 2300 no Extensivo de Final de Semana.

É a partir da taxa de material didático que se sustenta a qualidade do Cursinho da Poli. Os preços dos materiais são para o período da manhã de R$ 100,00; à tarde de R$ 80,00 e no final de semana de R$ 75,00. São oito parcelas ao todo, que é paga ao se receber o material.

O PRÉUnB: Um caso de Educação Popular no DF

Como uma criança que dá seus primeiros passos, o PRÉUnB tem caminhado apesar das muitas incertezas que o cercam na atualidade. Reconstituir um pouco dessa história é reconstruir o caminhar de muitos alunos que se esforçaram para tornar sólido uma proposta ainda nova no Distrito Federal.

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O PRÉUnB5 é mantido e gerenciado pela Associação dos Alunos de Baixa Renda da Universidade de Brasília. A AABR-UnB é uma entidade estudantil, não nos moldes do movimento estudantil radical, mas a seu próprio modo de ver, tendo uma responsabilidade moral com a sociedade civil e com os estudantes carentes que ajudaram em sua criação no segundo semestre de 1998. Conta, segundo o recadastramento feito em Maio/2000, com 1984 alunos selecionados pelo estudo sócio-econômico na UnB como carentes (Grupo I) e semi-carentes Grupo II.

Durante a primeira gestão administrativa da Diretoria da AABR-UnB, pensou-se a criação de um cursinho pré-vestibular. Porém desacordos internos e falta de fundamentação teórica suficiente privaram a população acadêmica deste projeto logo no início das atividades da AABR-UnB. Porém, com as mudanças ocorridas na Diretoria (diversos membros afastaram-se), o então Presidente Alexandre Crispi Siqueira resolveu iniciar o projeto, apesar da falta de fundamentação teórica necessária. Reuniu um grupo de alunos e pensaram o cursinho nos moldes estudantis.

Segundo o Regimento do PRÉUnB, criado por estes, são objetivos do PRÉUnB:

1. Dar oportunidade de experiência profissional e social aos alunos de baixa renda da Universidade de Brasília;2. Estimular a participação de alunos de baixa renda em movimentos sociais, representativos e de cooperação, que visem ao melhoramento de suas condições sócio-econômicas e de permanência na UnB;3. Preparar, com a máxima eficiência, os estudantes de baixa renda da rede pública do Distrito Federal(DF) , que estão no último semestre do 2º grau ou já o concluíram, à fim de propiciar-lhes condições de igualdade, face aos concorrentes das instituições privadas, no ingresso à UnB;4. Estimular a auto-estima, a consciência político-social e a capacidade de auto-aprendizagem dos vestibulandos, afastadas quaisquer intenções de ordem político-partidárias;

5 O PRÉUnB surgiu a partir das necessidades apontadas pelos alunos em estudo intitulado A Opinião dos Estudantes Carentes Sobre a Assistência Estudantil na Universidade de Brasília, encomendada a SOCIUS – Consultoria Jr. em Sociologia , como uma alternativa de unir a solução apontada pelos alunos para manterem-se na universidade e a extensão a comunidade que a Associação desejava empreender. Na pesquisa, 23% dos associados apontam a oferta de mais bolsas/programas assistenciais aos alunos carentes como uma solução.

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5. Aumentar a percentagem de alunos de baixa renda aprovados nos vestibulares da UnB, revelando-se o papel social desta universidade e dos cidadãos do DF;6. Dar oportunidade de participação, nesta iniciativa, a qualquer segmento da sociedade disposto a contribuir ou patrocinar pela amenização das desigualdades sociais, no acesso à universidade pública, através do PRÉUnB;7. Mediante a cobrança de pequenas taxas e de seu contínuo processo de expansão, promover concorrência entre os pré-vestibulares do DF e a conseqüente redução de suas mensalidades, propiciando-se a democratização no acesso aos mesmos, tal como ocorreu nas experiências bem sucedidas dos pré-vestibulares dos alunos da UFMG, UNICAMP, UFOP, UFG e UFRN;8. Priorizar a concessão de bolsas de trabalho aos alunos que participaram ou participam de trabalhos coletivos e de cooperação nas causas sociais da UnB, sobretudo no que se refere à promoção do bem geral dos alunos de baixa renda desta universidade6.

Para que estes objetivos fossem atingidos, foi engendrada uma estrutura administrativa composta por: Coordenadoria Administrativa, Coordenadoria Pedagógica e Corpo Docente. Foram previstos órgãos fiscalizadores: um Conselho Fiscal composto por 5 alunos voluntários da AABR-UnB e as Diretorias da AABR-UnB, representadas por seus diretores e/ou suplentes. Um Conselho Geral foi elaborado, que teria como competências: elaborar contratos e termos de compromisso para os integrantes da Equipe, determinar a metodologia de seleção dos candidatos ao pré-vestibular, gerir os recursos financeiros, controlar a freqüência dos membros da Equipe, destituir da função qualquer membro da Equipe ou do Conselho Fiscal.7 Seria composto por representantes voluntários: um do Corpo Docente; um da Coordenadoria Administrativa; uma da Coordenadoria Pedagógica; um dos espaços físicos utilizados pelo PRÉUnB, quando houver; um do Diretório Central dos Estudantes da UnB e quatro da Diretoria da AABR-UnB.

6 Conforme Artigo 2º do Regimento do PRÉUnB da Associação dos Alunos de Baixa Renda da Universidade de Brasília, de 12 de outubro de 1999 e registrado no Cartório Civil das Pessoas Jurídicas, sob microfilme nº 00034157. 7 Conforme Artigo 8º do Regimento do PRÉUnB da Associação dos Alunos de Baixa Renda da Universidade de Brasília, op. Cit.

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No Projeto do Pré-Vestibular da AABR-UnB PRÉUnB,8 o corpo docente seria formado apenas por alunos de baixa renda, selecionados por uma prova realizada sob responsabilidade da Diretoria da AABR-UnB. A jornada de trabalho seria de 10 horas semanais, distribuídas em 4 quatro horas como professor em regência, 2 duas horas como monitor e 4 quatro horas em planejamento.

A seleção dos candidatos dar-se-ia somente para aqueles que já concluíram o Ensino Médio, que deveria ter sido cursado totalmente ou parcialmente em escolas públicas da rede pública9 e, por meio de uma prova elaborada pelo Conselho Geral do PRÉUnB.

O projeto também prevê uma jornada de estudo a ser seguida pelos candidatos selecionados para cada edição:

“A carga horária será de 24 horas semanais distribuídas em 6 dias, sendo de segunda a sexta com aulas expositivas e exercícios a aos sábados com simulados e/ou provas. Também estará à disposição a monitoria. O período letivo será de aproximadamente 5 meses. ... O PRÉUnB primará pela eficiência, disciplina e constância. Neste sentido, serão emitidas, diariamente, listas de exercícios com o grau de dificuldade proporcional a concorrência do curso almejado, com o intuito de assegurar o acompanhamento às aulas e o bom rendimento. O não cumprimento das listas e/ou faltas às aulas implicará em encaminhamento à coordenação pedagógica, que, em caso de reincidência, poderá sugerir o desligamento do aluno por falta de rendimento.”10

Foi também pensado um acompanhamento do candidato selecionado até a sua entrada na Universidade de Brasília:

“Haverá duas categorias de alunos: na primeira, estarão os alunos que assistirão as aulas, receberão as listas de exercícios, utilizarão monitorias, farão provas e simulados. Tudo com o intuito de abranger todo o conteúdo do programa do vestibular e, principalmente, em caso de não ser aprovado ao fim do cursinho, ter desenvolvido a habilidade de estudar sozinho, independente de professorescomo grande parte dos atuais alunos de baixa renda da UnB fizeram. Na segunda categoria, estarão os alunos que já passaram pela primeira, contudo ainda não foram aprovados no vestibular. Estes não assistirão mais as aulas, pois será dado a oportunidade a outros; porém, continuarão tendo acesso as provas, simulados e monitoria, sendo acompanhados até que sejam aprovados.”11

Com a mudança da Diretoria da AABR-UnB, mudou-se também a forma de conceber a proposta de trabalho. Para a primeira edição de

8 Ver Projeto do Pré-Vestibular da AABR-UnB PRÉUnB, constante dos arquivos da Associação, p. 4.9 Ibidem, p.4.10 Ibidem, p. 4.11 Ibidem, p. 5.

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2000, formulou-se um Projeto Político-Pedagógico, resultado da participação de Administração, Coordenação Pedagógica e Diretoria da AABR-UnB. Este projeto reflete a visão que o curso PRÉUnB passaria a ter sobre a sua relação com os futuros candidatos:

“Este curso pré-vestibular explica-se pela exclusão cansativa e repetitiva em nossa terra, que afasta milhares de jovens de ‘sonhos’para um amanhecer mais doce e mais rico. Sendo assim este projeto rejeita categoricamente o conformismo e a mera retórica estéril e vazia, tão comumente vista nos meios acadêmicos atuais.

A idéia do PRÉUnB parte de um princípio básico: a solidariedade e o dever moral que os estudantes de baixa renda da Universidade de BrasíliaUnB, juntamente com outros que constroem a história desta instituição, detêm em relação com a grande parcela da sociedade que sustenta o Ensino Superior sem dele fazer parte. ... O PRÉUnB da Associação dos Alunos de Baixa Renda da Universidade de Brasília tem como objetivo principal romper com as barreiras do academicismo e colocar em prática a visão de indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão, transformando o espaço em lugar de construção e interação com os segmentos sociais locais. A meta principal é possibilitar o acesso destes segmentos sociais menos favorecidos economicamente a uma cultura elaborada e, em conseqüência, a aprovação no exame vestibular, para que possam intervir de uma maneira social mais consciente.” 12

Que concepção de educação passam a ter estes jovens universitários que adotam uma postura mais solidária? O Projeto Pedagógico esclarece:

“Partimos do entendimento de que a educação deve preocupar-se com a elevação da cultura e da capacidade de entendimento crítico e político, pois como indica Demo:

“Um povo politicamente pobre, por exemplo, é aquele que não conquistou ainda seu espaço próprio de autodeterminação e que, por isso, sobrevive na dependência, com periferia de um grande centro... que não passa de massa de manobra nas mãos do Estado e das oligarquias. ... É pobreza política lancinante não reivindicar direitos, mas os pedir, os suplicar, os esperar passivamente. ... É politicamente pobre o cidadão que somente reclama, mas não se organiza para reagir, não se associa para reivindicar, não se agrega para influir.” DEMO, Pedro. Pobreza Política. São Paulo: Cortez e Autores Associados, 1988 .13

Os objetivos também sofreram uma redução e uma mudança na forma de conceber a realidade. Foram retirados termos como preparar, com a máxima eficiência, que na visão da nova administração reduzia a

12 Ver Projeto Pedagógico Curso PRÉUnB da AABR-UnB, Brasília, 2000, p.3.13 Ibidem, p. 4.

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educação e, principalmente o que planejavam fazer, a uma simples visão economicista.

Ampliaram-se os critérios que seriam utilizados para a seleção dos candidatos ao PRÉUnB, a saber:

“ - Ter cursado o Ensino Fundamental e/ou Ensino Médio em escola pública, salvo escola particular em caso de bolsa de estudos integral ou parcial;

- Ser candidato trabalhadora ou filhoa de trabalhadora, salvo o aluno que estiver desempregado ou seu responsável, onde poderá, após análise sócio-econômica e através do resultado das provas de seleção, para o seu ingresso no PRÉUnB, receber uma bolsa parcial ou até mesmo total. Durante o curso, se o aluno tiver um excelente desempenho e comportamento e, por algum motivo de cunho econômico, mostrar dificuldades para efetuar o pagamento das mensalidades, será concedido a esse, após uma análise sócio-econômica uma bolsa parcial ou total.

Não possuir condições financeiras de custear um curso tradicional particular.

A objetividade, o desejo de querer entrar na Universidade de Brasília.

Ter trazido a documentação solicitada.

A construção de um pequeno texto onde são analisados a coesão, coerência e senso crítico, não havendo preocupação demasiada com a ortografia. A caligrafia deverá ser legível.

Levar-se-á em conta se oa candidatoa é de terceira idade ou está a muito tempo sem estudar.

Caso persista dúvida na seleção, poderão ser feitas visitas ao candidato como

parte do processo seletivo.” 14

A primeira edição do PRÉUnB, no 2º semestre de 1999, contava com 320 alunos, que eram divididos em três sedes: uma no plano piloto, Av. L2 Norte Igreja do Nazareno, duas em Taguatingua: uma na EIT e outra no CEAB. Dos 320 alunos que iniciaram os estudos em agosto/99, apenas 120 concluíram. Foram aprovados na UnB, em primeira chamada sete 7 alunos em cursos diversos, incluindo Administração e Mecatrônica. Em segunda chamada foram mais cinco 5. O índice de aprovação durante esta primeira edição foi de 10%. Também foram

14 Ibidem, p.8, 9.

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aprovados, em outras universidades particulares e públicas fora do DF, um total de 18 alunos.

Em sua segunda edição, no primeiro semestre de 2000, o PRÉUnB iniciou suas atividades com 650 alunos, em duas sedes, sendo uma no Setor Comercial Sul e outra em Taguatinga Sul, no Colégio Certo. Destes, 450 terminaram o curso preparatório, sendo que 36 foram aprovados na UnB.

Conclusões

Preço baixo, qualidade no ensino, consciência participativa e politizada são os chamarizes dos cursinhos pré-vestibulares de cunho popular. O PRÉUnB, mantido e gerenciado pela Associação dos Alunos de Baixa Renda da Universidade de Brasília – AABR-UnB, tem desempenhado um papel de reforço ao movimento de pré-vestibulares populares que ocorre em nosso país, através das diversas iniciativas.

Sua clientela constitui-se de 90 % de alunos provenientes da escola pública, sendo 40 % dos seus alunos com renda familiar inferior a R$ 600,00. É significativo que, mesmo tendo uma proposta de ser direcionado ao alunado carente do Distrito Federal e Entorno, o PRÉUnB manteve entre seus alunos, segundo os dados coletados, 40 % de alunos que tinham renda familiar acima de R$ 600,00. Segundo análise de tais dados, existiam 11 % de alunos que tinham renda familiar acima de R$ 1.500,00. Se levarmos em consideração que toda a administração e gerenciamento é realizado por alunos, sem qualquer apoio financeiro e administrativo da Universidade de Brasília, estes dados levam a mostrar um certo receio quanto à administração dos recursos financeiros escassos, que vão tornando-se ainda menores ao ponto em que a evasão escolar aumenta.

Custos baixos nas mensalidades são um chamariz muito significativo. Observando o gráfico abaixo, podemos verificar porque:

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Gráfico 1

Tendo como custo total o valor de R$ 360,00 o PRÉUnB chega a ser 8 vezes mais barato do que o curso F, conforme visto no gráfico acima. Isto tem chamado a atenção tanto das camadas carentes como também das camadas mais privilegiadas que passam a ver que os preços cobrados pelos cursos pré-vestibulares convencionais estão muito acima do PRÉUnB, e que seus serviços oferecidos pouco diferem deste.

A taxa de aprovação também é por demais significativa: em sua primeira edição, dos 120 alunos que terminaram o curso, 12 conseguiram aprovação no vestibular realizado, um percentual de 10 % de aprovação; em sua segunda edição, dos 450 alunos que terminaram o curso, 36 conseguiram aprovação. Um número significativo em comparação com outros cursos preparatórios com tradição em aprovação no vestibular da UnB.

Tendo seus objetivos fundados na solidariedade e inclusão de valores, o PRÉUnB incluí-se no rol das experiências dos pré-vestibulares populares analisados neste trabalho. Demonstra claramente a tentativa dos movimentos sociais para romper com a ‘marginalização’ e a exclusão social dentro dos espaços educativos.

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“Mostrações” do Cotidiano de uma Escola Pública de Periferia Urbana situada em Diamantino-MT (período 1997/1999)

Elni Elisa Willms1

RESUMO: Pesquisa realizada numa escola pública de periferia urbana, no município de Diamantino/MT, período de 1997-1999. Ancorada nos estudos de Michel Maffesoli, sobre o cotidiano, de Gilbert Durand, sobre o imaginário, os relatos colhidos através de observação participante, pesquisa estruturada junto aos alunos e histórias de vida de servidores, são apresentados sob a forma de narrativa, revelando aspectos minúsculos e de sombra do social em que alunos, professores e servidores daquela escola se deixam “mostrar”. A complexidade vista aqui sob a ótica de Edgar Morin, é “mostrada” na forma de um cotidiano sempre polissêmico e em recursividade com o imaginário, sugerindo uma visão ampliada da educação, tal como propõe José Carlos de Paula Carvalho e Maria Cecília Sanchez Teixeira.

Palavras-chave: Cotidiano; Imaginário; Educação

ABSTRACT This research study was carried out in a state school in the outskirts of Diamantino, Mato Grosso, from 1997 to 1999. Its theoretical framework is based on Michel Maffesoli’s studies about daily life and on Gilbert Durand’s studies about the imaginary. The reports were collected through participant observation, structured interviews of students and life stories of members of the school staff. These reports are presented as narratives and reveal micro aspects and social shadows as shown by the students, the teachers and staff of that school. This complexity, seen from Edgar Morin’s view, is shown through images of the participant’s daily life, which is always polissemic and recurrent to the imaginary. It also suggests an enlarged view of education, as proposed by José Carlos de Paula Carvalho and Maria Cecília Sanchez Teixeira.

Keywords: Daily Life; The Imaginary; Education

1 Mestre em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação, UFMT. Professora das Faculdades Integradas de Diamantino. Orientadora Acadêmica do NEAD/UFMT.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 10 n. 17 Jan.-jun. 2001 p. 63-78

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“Aquele que se deixa ver é, bem ou mal, aceito para o melhor e para o pior” (MAFFESOLI, 1996, p. 192).

“Que me seja permitido abandonar aqui o ‘nós’ convencional do autor para comunicar o sentimento que se fortaleceu em mim no decurso desta investigação. A plena consciência da incerteza, do acaso, da tragédia, em todas as coisas humanas está longe de me ter levado ao desespero. Pelo contrário, é saudável trocar a segurança mental pelo risco visto que também se ganha a sorte. As verdades polifônicas da complexidade exaltam, como me compreenderão aqueles que, como eu, asfixiam no pensamento fechado, na ciência fechada, nas verdades limitadas, amputadas, arrogantes. É saudável uma pessoa arrancar-se para sempre à palavra mestra que explica tudo, à litania que pretende resolver tudo. Por fim, é saudável considerar o mundo, a vida, o homem, o conhecimento, a ação, como sistemas abertos. A abertura, brecha sobre o insondável e o nada, ferida original do nosso espírito e da nossa vida, também é a boca sequiosa e esfomeada pela qual o nosso espírito e a nossa vida desejam, respiram, se dessedentam, comem, beijam” (MORIN, 1973:213).

A complexidade cultural com que nos deparamos todos os dias nas mais variadas situações, especificamente neste caso, das práticas sociais de construção do conhecimento escolar, levou-me a buscar outros olhares para apreender outros sentidos para a educação. O presente texto busca compreender a escola e seus profissionais na sua diferença, enquanto indivíduos que possuem historicidade e visões de mundo, escalas de valores, sentimentos e emoções, desejos e projetos, com lógicas de comportamentos que lhe são próprios (DAYRELL, 1996, p. 140), exigindo, por conseguinte, que nos coloquemos em atitude de escuta diante dessas realidades.

Nesse sentido, realizar uma pesquisa como parte dos requisitos do curso de mestrado foi uma oportunidade ímpar para reavaliar o que sabia sobre educação. Imersa pelas teorias sobre novos olhares para e na educação, pude re-conhecer o cotidiano e o imaginário naquela que parecia ser uma instância familiar de trabalho, re-desenhando todo um cenário de vida e atuação profissional.

“O que chamamos de vida cotidiana é constituída de microatitudes, de criações minúsculas, de situações pontuais e totalmente efêmeras. É, stricto sensu, uma trama feita de minúsculos fios estreitamente tecidos, onde cada um, em particular, é totalmente insignificante. (...) Os poderes e os impérios aumentam e declinam alternadamente, instituições de todo tipo estabelecem-se e desaparecem sem deixar traços e, ao lado desse processo linear tão monótono, há as horas e os dias por nós vividos que refazem com obstinação, muitas vezes no tédio ou na efervescência, todas as situações de dor e alegria, ou de serenidade anódina, que asseguram o que chamamos de permanência do social. (...) O simulacro que rege

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nossa vida social é imperturbável porque não tem sentido. Ou, (...) a concretude da existência escapa ao ‘sentido’ e à verdade lógica” (MAFFESOLI, 1984, p. 146).

Mais do que uma demonstração do que é o cotidiano, pretendo fazer uma “mostração” (MAFFESOLI, 1984, p. 152) que deixa “ser”/ver aquilo mesmo que tento apreender: as cores, os gostos, os sons, as falas e percepções, os ruídos simples mas estranhos que constituem o patrimônio daquela escola. Atitude que valoriza o lábil, o eternamente em movimento: “Assim esse presente banal e talvez monótono não é vazio e homogêneo, mas, ao contrário, é carregado de intensidade que jorra da própria textura do que constitui o cotidiano” (op. cit. p. 153).

A “Escola Pública de Educação Infantil e Ensino Fundamental Prefeito João Batista de Almeida”, local onde se realizou a pesquisa e aqui denominada apenas Escola João Batista, situa-se em Diamantino/ MT, no Bairro Pé Branco, que por sua vez abriga zonas e pontos de prostituição da cidade. Convergem para a escola, além dos alunos moradores do bairro, alunos que vêm de diferentes pontos da zona rural: sítios, fazendas, glebas de assentados, além de pequenas localidades como postos e bares de beira de estrada. Nesse espaço multifacetado se desenrolou a pesquisa.

Não pretendi analisar a escola visto não ser essa a aura que permeou a pesquisa. Seria como descascar uma cebola a fim de achar a cebola. Mas que pelas vozes dos que aqui falarem fique evidenciada uma fisionomia daquele contexto e das pessoas que o compõem remetendo a reflexões sobre o que é a educação, o cotidiano e o imaginário, revelando algo daquele mundo e sua simbólica, amplificando o fenômeno, pois, “...é o espaço imaginário que reconstitui livremente e imediatamente em cada instante o horizonte e a esperança do Ser na sua perenidade.” (DURAND, 1989, p. 296).

“Finalmente, nós mesmos, apoiando-nos (...) no balanço antropológico, chegamos a estabelecer que a função da imaginação é, antes de mais nada, uma função de eufemização, porém, não simplesmente ópio negativo, máscara que a consciência veste diante da horrível figura da morte, mas ao contrário, dinamismo prospectivo que, através de todas as estruturas do projeto imaginário, tenta melhorar a situação do homem no mundo” (DURAND, 1988, p. 101).

Rastreando o que emergiu do observado, via pedagogia da escuta (PAULA CARVALHO, 1990, p. 26), procurei revelar o “outro” que habita cada um, para os tantos outros que compartilham tal espaço/tempo, numa tentativa de resgatar a sensibilidade para com o fenômeno pesquisado, buscando, nesse sentido, a elisão dos

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etnocentrismos rumo a uma visão ampliada do cotidiano, do imaginário e da educação.

Mundos Pesquisados, histórias “mostradas”

“... vou esquecer tudo o que li. Limpar minha cabeça, me soltar e me permitir o processo de sentir, cheirar, escutar. Vou usar também minha intuição e meu desejo, pois não é o imaginário o vetor do desejo? E é só” (TANUS, 1992, p. 69).

A imersão nas teorias, os procedimentos escolhidos, não ao acaso, o grande mergulho via pesquisa da escola, na vida de algumas pessoas que lá trabalham e estudam, essa grande configuração de saberes acolhidos, recolhidos, digeridos internamente em todo meu ser, é uma experiência difícil de ser descrita. Estive envolta por grandes forças: sentimentos, afetos, saberes racionais e racionalizados, crenças, percepções, intuições, medos, esperanças e, sobretudo muita coragem. A fé, qual âncora d’alma, sustentou-me. Fé de que o caminho percorrido e a percorrer era esse. Fiz-me forte na batalha por querer compreender o que se passava, não só dentro de mim, mas o que se passava ao meu redor, no meu trabalho, na pesquisa, nas teorias: buscava as ilações entre o cotidiano, a educação, o imaginário, a antropologia, a sociologia...

Significando, significava-me. Fui sendo..., sendo-me... Fui desvelando a escola, a educação... Aos poucos, as escamas que encobriam meus olhos foram caindo... Consegui significar algumas ‘coisas’, situações, vidas. Tantas outras ficarão por ser desveladas, ao infinito.

Aproximei-me, espreitei, senti, vi, vivi, observei, constatei, experimentei, questionei, esperei... Sofri as demoras. Muitas ações. Muitas esperas.

Estes parágrafos contam, um pouco, a minha história. A da pesquisa também. Eu vivi esta pesquisa. Em nenhum momento foi uma tarefa fácil, porém enfrentei-a com convicção e comprometimento. Tudo o mais veio junto.

Sobretudo, olhei com respeito aquela realidade que se me apresentava diante de todos meus sentidos. Pedi licença para chegar, para olhar, para ficar. Não invadi a individualidade de ninguém, espero. Respeitei os silêncios, as evasivas.

Conversei com quem se permitiu com-versar. Ouvi os alunos e alunas, atentamente: quanto aprendizado! Brinquei com quem se permitiu brincar. Trabalhei com quem me permitiu trabalhar. Lavei louça, varri a quadra junto com todos. Chorei minha vida com uma das professoras.

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Chorei a vida dela. Conheci um lar num assentamento... Escutei a história de uma prostituta... Ficaria contando ao infinito tudo o que vivi. É preciso reticências...

Lá estive e não permaneci. Aproveitei momentos. Valorizei. Signifiquei. Ao me afastar, sofri. Sofri para compreender que somente quando se dá a compreender é que vem a compreensão.

Assim, enterrando antigas concepções, preparei a terra, com meu próprio adubo, para o nascimento de outras perspectivas, para que outras sementes compreensivas, de outras dimensões, pudessem germinar, crescer e frutificar, tendo como propósito, como compromisso, perceber o que é uma escola, o imaginário, o cotidiano e a educação em seu sentido mais amplo.

De maneira algo tortuosa fui aproximando-me, primeiramente do bairro, por alto. Gradativamente, entretanto, meu foco principal passa a ser a escola, seus professores, alunos e demais pessoas que lá trabalham.

Ao transcrever as falas dos depoentes, respeitei a forma como falaram, inclusive com os erros gramaticais e ortográficos, como uma forma de dar som às suas referências orais. É impossível transcrever para a escrita a sonoridade melodiosa do belo sotaque mato-grossense. Porém, a maneira de se articular oralmente no mundo é também algo revelador dessas pessoas.

À medida que permanecia na escola fui construindo o diário de campo, constituindo, mais tarde, em fonte de dados para a construção da dissertação.

Numa tarde, ao passar por uma sala de aula, sou chamada pela professora. Mostra-me seus alunos, seu trabalho. Sala de CBAI2, alunos de seis anos, copiam uma lista de palavras do quadro, em letras bastão. Não estão em fila, nem em grupo, mas dispersos na sala. Aproximo-me de um aluno e pergunto-lhe seu nome: “Pinda!” Estranho e questiono se aquele não é seu apelido e insisto em querer saber seu nome e ele, insiste também, dizendo: “Meu nome é Pinda”. Olho os colegas como a perguntar o nome dele, e depois de algum tempo a professora diz que o nome dele “... qual?... esse aí, ah! ... é Daniel...” E o menino insiste, dizendo que Daniel é seu apelido e que seu nome é Pinda! Muito bem, digo Pinda... E que mais direi?

2 CBAI é a sigla de Ciclo Básico de Aprendizagem Inicial. No ano de 1998 implanta-se o ensino através de ciclos nas séries iniciais da rede pública de Diamantino-MT.

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No dia oito de maio realiza-se uma reunião de pais para entrega de notas do primeiro bimestre, ocasião em que também se faz comunicados gerais sobre uniforme e, comportamento das crianças na escola. A supervisora exorta os pais, na verdade mães, a assumir a educação de seus filhos. Mostra, então, um pequeno punhalzinho retirado de um aluno da terceira série, sendo que o menino só o entregou depois de muita insistência e após ter xingado a professora com vários palavrões. Pede-se cuidado em relação ao que se faz e se fala em casa, pois segundo a supervisora, tem momentos que as crianças comportam-se como se fossem verdadeiros animais: rolam no chão, empurram-se, brigam com os colegas...

Nos fundos da sala, próxima a algumas mães, escuto trocarem idéias a respeito do que era comentado pela supervisora. Diziam que as crianças não respeitavam ninguém na escola porque, no entender deles, aquela era uma escola “barrela”3, escola de cachorro. Como a diretora já havia escutado algo semelhante, retomou a palavra e disse que a escola era boa e quem fazia a cara dela eram as pessoas que estavam nela, seja professores ou alunos.

Noutro dia, ao chegar na escola, vejo a P.S. encostada no portal de sua sala. Sigo em sua direção e pergunto como estão “as coisas”. Responde que está tudo bem, que com a Graça de Deus, os alunos estão mais calmos. De repente um menino vem até a porta e, ao me ver sai assustado. Sorrindo ela diz:

“Eles têm medo de você, porque é grandona, altona... Pensam que você é delegada, por causa da pasta preta... Eu falei que se eles não se comportassem seria chamada uma delegada...” (P.S.).

E assim, vão tomando contato com minha presença: assusto, sou um elemento novo naquele ambiente... Fazem imagens de mim... Nem sempre corresponde à verdade. Preciso permanecer mais para que possam conhecer-me melhor.

Noutro dia, estando na sala dos professores, entra a professora da 2ª série, da Caeté4 e pergunta se sei reconhecer bicho-de-pé, pois diz

3 Segundo FERREIRA (1999:273), Barrela: (2) ficar com a reputação enodoada, maculada; desonrar-se.4 Caeté é o nome de uma gleba de assentados localizada a cerca de 20 km da escola, de onde vêm vários alunos, de ônibus, para estudar na Escola João Batista. Dois depoentes da pesquisa também são dessa gleba: S L, pai de aluno e esposo de D.A., mãe de aluno e cozinheira.

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ter vários alunos com os pés machucados, sendo que um está com a unha bastante inchada, parecendo ser bicho-de-pé. Procura remédio na “farmacinha” e encontra álcool iodado, água oxigenada e algodão. Acompanho a professora lavando o pé do menino, na sala, com os remédios. Observo de perto. Está muito sujo, com uma carapaça de barro envolvendo as unhas.

Chama-se então, P.H., pois na escola é a professora que sabe lidar com esse tipo de situação. P.H. leva o menino, Carlos Cézar, para lavar o pé no tanque. Pega a caixa de sabão-em-pó, uma escova e começa a limpeza. Enfim, as unhas revelam cor de unha. Não é bicho de pé. O menino tropeçou e a unha está quase solta e purgando. Com ajuda de uma tesoura, P.H. vai cortando as unhas do menino e limpando os cantinhos.

Pergunto ao menino se toma banho no rio. Ele diz que sim, mas depois, percebendo que perguntava sobre o banho de todos os dias, corrige, dizendo que toma banho “num cano”. Recomendamos o uso de uma bucha ou a própria escova de lavar roupa, para lavar bem os pés e toda vez que se machucar.

Quando a professora termina a limpeza do pé esquerdo, com a unha inflamada, pede o pé direito para lavar e nesse, na sola, perto do calcanhar, outro corte grande, já quase cicatrizado, porém com um couro meio solto a encobrir o ferimento, tendo por baixo desse couro um pouco de terra. Após lavar esse pé, com a ajuda da tesoura, P.H. vai limpando a sujeira e cortando aquele couro seco. Enfim surgem pés limpos. Vamos para a sala colocar álcool e água oxigenada, pois são os remédios que temos.Nesse dia, após o recreio, digo à diretora que ficarei o ano todo, fazendo descrição da escola e que, a princípio, não havia intenção de “solucionar” os problemas da escola, até porque fugiam de minhas capacidades. Então ela responde:

“Ah, professora, pensei que a senhora ia nos ajudar...” (DIR)

Explico que a intenção é compreender o que é uma escola como aquela, para a partir daí, saber lidar melhor com o que se apresenta.

Essa fala da diretora talvez signifique o distanciamento que percebo dos professores em relação à minha presença naquele momento. Em geral, não só nessa escola, as pessoas querem soluções imediatas para problemas que escapam ao nosso poder de intervenção. Dizer a elas, da forma como disse, pode ter criado certo desânimo, pois depositavam confiança de que poderia “mudar a escola”. Mais tarde, em

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setembro de 1999, retorno à escola e contando esse episódio, em conversa marcada previamente com as professoras na sala dos professores, das 10 às 11 horas, pudemos perceber o equívoco, ou seja, a crença de que uma pesquisadora pudesse transformar uma realidade como aquela e elas mesmas, ao relatar como procediam em anos anteriores, visitando o bairro com mais freqüência, visitando os alunos nas casas, quando agiam dessa forma, eram mais aceitas tanto pelos alunos como pelas famílias. Reconheceram que se distanciaram do bairro e, talvez, por isso sentem que os problemas são maiores, atualmente.

E assim, deixava-me ir à escola. Escutava, sentia, via, observava, conversava... O que ali se via, se veria, talvez, em qualquer escola de bairro. E assim, seguia escrevendo, recolhendo essas observações em meu diário de campo.

Doía em mim, naquele momento, ver aqueles pés, mal cuidados, aquelas vidas descuidadas... Doía ver as roupas maltrapilhas, os cabelos secos que não viram xampu... Meus valores não são os deles e é por isso que os vejo como diferentes. No entanto, eles são o que são e como alguém que trabalha com eles, aceitá-los como são é o primeiro passo para inaugurar uma relação verdadeira. Vou pensando nesses fenômenos...

Noutro dia em que estou na sala dos professores juntamente coma diretora e supervisora, chega uma mãe e quer saber o porquê de seu filho ter sido transferido de sala. Explica-se que é por causa do comportamento do menino, que já teriam esgotado as alternativas de conversas e conselhos e que iriam colocá-lo na sala da Caeté. Então a mãe desabafa:

“... sala da Caeté ele não qué ficá... Ele é daqui do bairro e não qué si misturá com o povo da gleba...”.

Não há acordo. Nenhuma das partes faz concessão e fica claro que o menino será retirado da escola para trabalhar, ajudar no sustento da família que se mudará para uma fazenda, noutro município. Evidencia-se a discriminação para com o outro, com outras formas de ser e viver além de revelar a condição de migrantes dessas pessoas que na luta pela sobrevivência mudam-se à procura de trabalho. Os filhos acompanham a faina dos pais.

Por outro lado, o que a mãe na verdade quer dizer quando afirma que o menino não quer se "misturar" com o "povo" da gleba? Em que implicaria misturar-se com o outro que é diferente (e ao mesmo tempo igual porque humano, diferindo quanto à construção de significados

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simbólicos)? Haveria algum perigo em entrar em contato com outros? Quanto as pessoas se privam de conhecer e se dar a conhecer apenas porque antecipam julgamentos nem sempre fundados em bases verdadeiras! À medida em que se possibilita adiar o julgamento sobre os outros, ao mesmo tempo em que se permite conviver com eles, passa-se a ver nesses outros possibilidades para as quais não se tinha atentado. Essa pelo menos foi uma marca forte dessa experiência de campo na Escola João Batista.

Ao conhecer a gleba Caeté, seus alunos, alguns pais; ao conhecer a realidade do bairro Pé Branco, seus alunos, alguns "casos" familiares; após ter conversado com pessoas moradoras desses contextos diversos, pude constatar que a diversidade não precisa ser geradora de desigualdade. Basta que saibamos dialogar respeitosamente com cada um desses contextos culturais em atitude de abertura para o outro.

Já no mês de junho de 1998, a diretora conta sua incursão à casa de um aluno que estava faltando há alguns dias. Haviam dito que a mãe do menino teria morrido, mas, não morreu. Estava em casa. Estava com o rosto todo inchado de chorar e com um corte ainda fresco na sobrancelha do olho direito, além de ter a boca inchada. Havia apanhado do marido, naquela noite: “...é bebida demais...”, diz, quase conformada. A mulher aparenta juventude, porém tem um corpo maltratado, sofrido, além da boca que só traz um dente. Ao perguntar a idade, a mulher diz ter 24 anos, aparentando muito mais... Enquanto isso, o menino que a diretora fora procurar, está sentado, lá fora, num cantinho. Ao perguntar pelo marido, a mulher responde que está ali dentro, de casa. Com receio, a diretora sai.

A irmã dessa mesma mulher, conta a diretora, também tem um filho na escola que falta muito. Diz que já procurou assistente social, que já tentaram "colocar" essas crianças com outras famílias, mais “estruturadas”5, porém nas famílias dessas crianças os relacionamentos são assim: mulheres e homens que bebem... Conta-se que até as crianças vêm para a escola cheirando bebida; que já viu um desses

5 ARIÈS, Philippe. História social da criança e da família. Rio de Janeiro: LTC, 1981. Nessa obra, com ampla visão histórica, o autor mostra as diferentes maneiras de se conceber e tratar a infância, conforme os costumes e tendências ao longo dos tempos. O que teríamos, no caso acima, seriam famílias ampliadas, em que o convívio não se restringe ao núcleo pai, mãe, filhos, porém, acrescido de tios, sobrinhos, primos convivendo no mesmo espaço. Além disso, o jornal Folha de São Paulo de 20/09/98, no Caderno Especial, revela resultados de ampla pesquisa realizada com as famílias brasileiras das gerações 50 a 90 em que se confirma essa tese.

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meninos com uma lata de extrato de tomate, daquelas pequenas, cheia de farinha e o menino a comer aquela farinha...

Essa mulher que a diretora foi “visitar” está doente: com “hemorróides”, os pés inchados. Diz, também, que está com hanseníase, que está em tratamento há muitos anos, que as formigas mordem seu pé e que não sente, só vai ver quando está “comida”... No entanto, essa mulher cheira álcool, pinga mesmo, diz a diretora. Muitas vezes o menino não vem para a escola para ficar em casa cuidando da mãe, bêbada, para que não caia num poço que há nos fundos da casa.

Ficamos conversando sobre esse entorno que influencia diretamente a escola e sobre o qual não se vislumbra perspectiva de como lutar, barganhar, negociar... Todas nós nos sentimos despreparadas, desarmadas, enredadas, sem saber o que fazer diante de um cenário como o descrito acima... Desafios...

À medida que me “soltei” mais na escola, com as professoras, com os alunos, aos poucos fomos nos tornando mais receptivos... O Tempo agiu enquanto lá estive, nos fazendo conhecer melhor. Não tive a ilusão de ser da escola. Entre uma conversa e outra fomos nos tornando mais próximos uns dos outros, conversando sobre banalidades: os filhos, o problema da pensão das mães que criam os filhos sozinhas, os problemas com os alunos, com o conteúdo e disciplina, a greve do Estado... Esses pequenos nadas, nos ligaram, nos ligam... Os momentos em que conversamos sempre foram escassos: o recreio, uma conversa furtiva na porta da sala enquanto os alunos copiavam alguma coisa do quadro, o encontro na hora do lanche das crianças... Nesses instantes, procurei atualizar o presente dessas pessoas.

Com o objetivo de conhecer a realidade sócio-econômica dos alunos, elaborei um questionário fechado com perguntas a respeito de dados pessoais seus e de seus familiares. No entanto, o que emergiu das respostas é tanto ou mais significativo que os números recolhidos. Na verdade, são dados que se complementam, recursivamente. Limito-me, nesse breve recorte, a uma breve “mostração” sobre as respostas recebidas à pergunta “com quem você mora?”:

“Tô ficando com o pai... eu vô morá co’a mãe...” (2ª C).

“Sobrinho, mulher que cuida de nóis, marido dela, amigo, uma menina, eu, minha irmã...” (3ª A).

“Mora eu, pai, mãe, tio, vô, mininha que a mãe foi embora...” (3ª A).

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“Irmã, a outra, o Zenildo, eu, irmã... A mãe não mora cum nóis. Ela manda as coisa pra nóis” (2ª A).

A percepção que as crianças têm daqueles que moram consigo fica evidenciada pelas suas falas. Algumas pessoas são o nome, não referenciando parentesco ou amizade. Outros sabem que não estão com a mãe, mas que ela os ajuda. Aliás, esse fato é uma estratégia entre as mães que “trabalham na noite”. Não tendo condições de ficar com as crianças nesse período, devido precisar sair para fazer programas, deixam as mesmas aos cuidados de uma terceira pessoa6 que tanto pode ser um familiar ou outra pessoa. É a provisoriedade da vida cotidiana, “mostrada” pelas falas dessas crianças.

O indivíduo em sua relação com o social pressupõe o contato com a alteridade e esse fenômeno dá visibilidade à diversidade de estilos de ser e existir. No contato com o outro, muitas vezes, emerge a possibilidade de se re-significar construções solidamente arraigadas em nossa socialização. É preciso lembrar aqui que há forte tendência de nos colocarmos, enquanto grupo social, como centro do universo, atribuindo valor inferior a outras formas sociais. Essa é a atitude etnocêntrica (ROCHA, 1994, p. 7). O referente dialético a esse postulado é o relativismo: atitude que busca a compreensão das culturas para o diálogo, para o respeito e a defesa do outro como uma das tantas formas possíveis de existir. Como aborda Bandeira (2000, p. 27):

“No sentido antropológico, relativizar é desencantar o outro, vendo nele a própria imagem refletida; eu e o outro somos o mesmo, embora diferentes... A diferença é uma dimensão do real, mas não pode ser atribuída a nenhum dos grupos em contato, pois não é característica dessa ou daquela cultura. Toda cultura explica-se em termos de sua própria lógica. As soluções culturais (símbolos e significados) que uma sociedade criou ao longo da sua história são compreensíveis quando referidas à lógica do próprio sistema que as produziu”.

Dessa forma, como pesquisadora e profissional da educação, lentamente fui libertando-me das minhas limitações de visão de mundo à medida que recebia e acolhia os tantos outros com quem me defrontei. Assumindo postura dialógica cultural (MORIN, 1991, p. 27/8) construí e re-signifiquei muitos conhecimentos. Por outro lado, exercitei aquilo que Erny (1982, p. 20) indicara:

6 A prática de abandonar recém nascidos ou de deixar os filhos com terceiros é reconhecida pela história desde a época colonial. Cf: PRIORE, Mary Del (org.); BASSANEZI, Carla (Coord. de textos). – História das mulheres no Brasil. 2.ed. São Paulo: Contexto, 1997, especialmente os capítulos “Mulheres nas Minas Gerais” e “Maternidade Negada”.

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“... é necessário ao etnólogo ter uma verdadeira experiência de campo que o transforme interiormente tanto quanto uma cura psicanalítica, a fim de viver no seu espírito e até na sua carne o que significa ser confrontado com a alteridade, não aquela do seu próprio inconsciente, mas aquela de homens que vivem e pensam de outra forma, e dever lutar com ela para estabelecer comunicação e provar assim que esta é possível”.

O depoimento de D.S., pessoa que faz a merenda na escola revela o que representa esse lugar em sua vida:

“Professora! Eu gosto mais do culejo que da minha casa! Ali é onde eu trabalho para dar de comer meus filho; minha vida é lá, é lá! Ali tem gente que as vez briga, xinga, eu não, porque ali... eu como e bebo daquele culejo... Ali... porque ali é que eu trabalho, meu marido também. Eu morro se me tirá aquele culejo. Às vezes a diretora, a secretária não anda assim muito bem com a gente, mas eu assim, nem ligo pra vida... E ponho a cabeça no chão, tô correndo atrais da felicidade, tô rindo... nem que aqui por dentro tá morrendo, mas se eu ficar triste é pior ainda...” (D.S.)

Diante das dificuldades, cada um vai construindo suas significações, estratégias de sobrevivência. Então pergunto sobre a relação da escola com o bairro, como ela percebe:

“Professora! Lá embaixo, no Pé Branco, as criança, perto daquelas casas, as pessoas tudo assim, eles não importa, acho que as mãe não importa com a vida... Mas se fosse por um acaso os alunos daqui de cima se fosse estudar naquele culejo eles já acha diferença. Muitas mães daqui de cima fala assim pra mim: ‘D S a senhora trabalha lá perto do Cabaré?’ Trabalho minha filha, trabalho mas eu nunca vi (risos) nunca fui lá, não tem nada a ver. Aí, quanta veiz as criança fala assim: ‘A senhora conhece aquela minina ali?’ Ah, aquela ali? Estuda aqui no culejo? E aí elas fala: ‘É filha de fulana de tal’ Aí eu falo assim: É gente igual vocês minha filha, a minininha não tem nada a ver por causa que ela é filha de mãe solteira, essas coisas assim. Aqui é a escola, é a educação, é pra todo mundo aprendê.” (D.S.)

E assim, além de merendeira, D.S. vai exercendo o papel de grande educadora, também, pois as crianças conversam, perguntam, vêm ao seu encontro. Todos na escola, uns mais, outros menos, uns num setor, outros noutro, vão ligando-se, exercendo papéis, diferentes e complementares, pois são as relações sociais que verdadeiramente educam (DAYRELL, 1996, p. 142).

Aqueles alunos, naquela escola, são únicos. Não se repetem noutra circunstância. Assim os professores e servidores. Diferenciam-se nas individualidades, se assemelham nas suas humanidades, na teima em existir, lutar, sobreviver, fazer frente às dificuldades inerentes ao viver de cada um. O que parece ser algo simplório, não o é, não o foi para a pesquisadora. Subsidiada pelas leituras, pude compreender a

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humanidade de cada pessoa que conhecia e pesquisava. Algo mudou em mim. E esse algo se deve, sem dúvida, ao contato mais próximo com o ser humano, tão diverso e tão mesmo, ao mesmo tempo.

As vidas que compartilhei durante o pequeno espaço de tempo em que lá permaneci fizeram-me re-significar o que é a educação, a escola, justamente porque alarguei o horizonte do que é ser assentado, homem ou mulher, prostituta, professora, supervisora, diretora, o que é ser criança e o que são as famílias no atual momento histórico e nessa faina defrontei-me com intimações da realidade para as quais não se tem respostas: há que construí-las a partir das demandas do momento e por vezes só resta o silêncio diante da precariedade da vida. Provisoriedades.

As pessoas são múltiplas porque se integram em variadas cenas e situações (TEIXEIRA, 1988, p. 198 e ss.), correspondendo a uma ambiência comunitária, mutável, intercambiável em papéis e funções. Essas pessoas só existem na relação com o outro, porque são participantes daquela comunidade escolar: partilham emoções, afetos, tristezas e alegrias onde não há uma ordem, uma organização para essas vivências, mas elas existem e cimentam, à moda de energia, o ser-estar-junto: a socialidade. Essa ambiência não é transparente para quem chega. É preciso permanecer naquele território e imiscuir-se cotidianamente nas fainas vividas para apreender lampejos de atitudes, sorrisos e palavras que iluminem esses aspectos. É preciso com-viver para ter o privilégio de ver e sentir essa socialidade. São “mostrações” minúsculas, contrabandeadas das e nas relações com o outro que transfiguram esses momentos de perduração do social, apesar da pretensa absolutização burocrática e normativa. A pulsão social é uma força maior que o instituído. E essa força, de certa forma contrária às regras é que permite a existência e resistência da comunidade enquanto tal. Assim no bairro que circunda a escola, assim no assentamento, assim na própria escola, percebe-se essas modulações do que Maffesoli chama de socialidade.

E o imaginário, à maneira de sutura epistemológica perimetra todo esse cenário: o que se vê, revela mais do que deixa ver; o que se fala, revela mais do que se quer dizer; o que se vive e se conta, revela mais do que é possível escutar, ver, sentir. O fantástico permeia essas vidas. Não é algo que se possa pegar, mas é uma energia que circula por entre as pessoas e que de alguma forma as constitui, influencia e, quiçá, sofre influências...

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Não só o que emerge de fantástico nos relatos e depoimentos, mas as significações e representações do cabedal de conhecimentos que trazem das mais diferentes procedências, são reveladores de uma certa paisagem mental daquela comunidade.

E nesse contexto que venho traçando, em pontilhado, os paradoxos abundam e desafiam o pensamento puramente racional e linear: é preciso abrir-se às indeterminações, às complementaridades compreensivas e explicativas desse real tão mais desafiador quanto mais nos aproximamos dele. Como pesquisadora fui desafiada a pensar e repensar o que escutava, percebia, interpretava, compreendia naquela escola e seu cotidiano. Não me furtei ao drama de sentir-me completamente sem terreno para pisar: tantas vezes o real é desafiador, ousado, vindo como a provar nossa têmpera em decifrá-lo, para que não nos devore.

Que grau de compreensão pude atingir? Não saberia precisar, nem sei se é possível tal empreitada. A experiência de ter entrado em contato com as vidas de todas as pessoas que contribuíram para a realização deste trabalho é algo que modificou-me enquanto ser humano e profissional da educação. Jamais serei a mesma depois de ter compartilhado esses momentos com essas pessoas. E se fossem outras histórias, outras vidas... Sempre a teima em existir. Dar vozes a essas vidas foi, está sendo meu viver e reviver. Escutá-las e dar a essas linguagens contornos de cientificidade, foi, está sendo, minha contribuição à educação.

Após o período em que estive mais freqüentemente na escola, ela passou por reformas: arrumou-se o telhado, as salas e corredores ganharam pintura nova, consertou-se a rede elétrica e fez-se reforma na cozinha ficando totalmente azulejada, com armários novos; os alunos agora fazem a refeição em pratos de colorex (antes faziam-na em cumbucas usando colheres de plástico já bastante velhas), usam colher de inox; por fora também se fez pintura e na parede da frente pintou-se figuras de personagens de uma revista nacional em quadrinhos; a quadra ganhou consertos e pintura, possibilitando uma diversão mais segura; na secretaria da escola, ar condicionado e computador com acesso à Internet compõem o ambiente físico que pontuam o acesso às tecnologias de ponta proporcionadas pela rede pública municipal de Diamantino.

Em que medida as reformas físicas agradam ou estimulam um trabalho educacional diferenciado é algo para uma futura pesquisa – De que forma a escola esconde sob caiação festiva a miséria efetiva? Como

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pesquisadora, espero ter dado a conhecer naquilo que me foi possível, o que é uma escola pública de periferia urbana situada em Diamantino, interior de Mato Grosso: seu cotidiano, imaginário e educação. Não fecharei o parêntese nem colocarei ponto final

“A única realidade que nos é acessível é co-produzida pelo espírito humano, com a ajuda do imaginário. O real e o imaginário estão co-tecidos e formam o complexus de nossos seres e de nossas vidas.” (MORIN, 1997: 261).

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Filosofia na educação

Comunidade de Investigação Filosófica em Nível Superior

Raquel Martins Fernandes1

RESUMO: O presente trabalho trata do relato de experiências realizadas na Universidade Federal do Mato Grosso e no Centro Universitário de Várzea Grande, que efetivam uma comunidade de investigação em nível superior, objetivou-se aplicar a metodologia proposta por Matthew Lipman para o ensino de filosofia. O nível das turmas é diferenciado ocasionando resultados diferentes, contudo satisfatório, comprovando a eficiência da comunidade de investigação para um encontro efetivo dos alunos com os novos conceitos e conteúdos propostos. Pretende-se apresentar as experiências realizadas em Poconé/MT, bem como os fundamentos epistemológicos e metodológicos da proposta.

Palavras-chave: Filosofia; Educação; Ensino Superior

ABSTRACT: Community of Philosophical Investigation at Higher Educational Level. This research reports experiences done at the Federal University of Mato Grosso and at the University Center of Várzea Grande which constitute a community of investigation at a high education level. The objective was to apply the methodology proposed by Mathew Lipman for the teaching of philosophy. Differences in the level of students brought different results that are, nonetheless, satisfactory, confirming the effectiveness of the community of investigation for a profitable meeting between students and new concepts and contents. The results are to be presented, along with the epistemological and methodological base of the proposal, in Poconé.

Keywords: Philosophy; Education; Higher Education

1 Professora do Departamento de Filosofia, Universidade Federal de Mato Grosso. Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação, IE/UFMT.

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O trabalho que aqui apresenta-se é fruto de experiências recentes e incipientes, constituindo-se um objeto de pesquisa atual. Possui como premissa básica: a perspectiva de indissociabilidade entre teoria e prática, onde as duas esferas se compõem de forma una. Isso significa que estando em salas de aula de instituições de nível superior pensa-se a experiência mesma como fonte e referencial teórico e os estudos realizados como constituintes da própria práxis. Pretende-se, portanto, apresentar em linhas gerais os referenciais prático-teóricos das atividades realizadas e posteriormente caracterizar o caso a ser relatado: a disciplina filosofia da educação ministrada para o curso de Pedagogia do Centro Universitário de Várzea Grande (UNIVAG) em Poconé/MT.

A comunidade de investigação filosófica em nível superior torna-se no contexto atual, algo de legítima defesa, visto transformações substanciais. Dada a complexidade de informações do mundo globalizado, novas habilidades tornam-se necessárias não só como forma de compreensão desse contexto como também meio de torná-lo cada vez mais ético e extensivo, no sentido de uma globalização da vida plena, como defende o professor Dr. Peter Büttner em seu livro Mutação no Educar:

“Três grandes necessidades da humanidade, que englobam muitas outras, são apresentadas como prioritárias: a responsabilidade, confiança e solidariedade na sociedade; a constituição da paz universal e a globalização holística. (...) Tudo isso requer uma educação eficiente. Proponho a comunidade de investigação como elemento gerador duma educação holística, orientada pelo pensar inteligente. Importa aclarar, então, a necessidade de abertura, por parte dos educadores, principalmente, para a comunidade de investigação como processo educacional eficiente e gerador indispensável da construção da globalidade, com cuidados e vivências éticas, bem assim ecológicas. (...) O novo paradigma educacional deve ser eficiente no capacitar a reconhecer as necessidades da sociedade e reagir correspondentemente, antes de a humanidade chegar tarde demais e ser punida pela vida.” (BÜTTNER, 1999, p. 6-7).

Torna-se clara, a necessidade de transformar a sala de aula do nível superior em um fórum aberto de debate e problematização sobre os problemas ecológico-sociais contemporâneos, resgatando valores e reflexões éticas, dimensões criativa e afetiva, bem como áreas filosóficas, por vezes esquecidas, tais como: filosofia política, da educação, da história, ontologia e antropologia filosófica. A filosofia possibilita essa transformação devido às suas raízes holística e interdisciplinar, sendo ponte (e conteúdo) de um diálogo autêntico.

Em um primeiro momento é importante salientar os referenciais do próprio conceito de comunidade de investigação, advindo de

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pensadores pragmatistas, como Peirce e Dewey, e reformulado na perspectiva da investigação filosófica por Matthew Lipman, filósofo norte-americano que na década de 1960, criou uma metodologia de inserção da filosofia em níveis fundamental e médio, que pode ser utilizada em nível superior com devidas adaptações.

Dos referenciais prático-teóricos gerais

OBJETIVO GERALIncentivar a atitude e reflexão filosófica, através de uma

educação para o pensar de cunho praxiológico, ou seja, procura-se trabalhar as temáticas filosóficas, com vistas a um pensar cada vez melhor e mais autônomo que em seu fazer teórico se torne ação. Objetivo este também de todo o Programa de Filosofia para Crianças, sendo que no nível superior a reflexão sobre o pensamento filosófico, dentro de uma perspectiva histórica e de leitura dos próprios autores, torna-se fundamental, como forma de identificar a origem de determinadas questões filosóficas e de alguns sensos, até por vezes comuns, que permeiam o ambiente da cultura ocidental.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS Contribuir para que os estudantes efetivem-se enquanto sujeitos ativos e sociais, comunicativos e dialógicos, capazes de pensar e investigar por si mesmos com consistência, coerência e conseqüência.

Desenvolver um ambiente filosófico propício – a comunidade de investigação – capaz de uma construção ativa, criteriosa e participativa do conhecimento, através de temas/ problemas filosóficos, partindo da realidade circundante.

Permitir a construção de novos significados em um encontro efetivo com conceitos e conteúdos, novos e diversos.

Fazer com que a formação de novos conceitos não seja uma aculturação ou desvinculada das necessidades reais do indivíduo, permitindo uma troca de saberes que resulte em construção cultural.

Trabalhar ensino-pesquisa-extensão de maneira indissociável - para desenvolver um tripé natural de inter-relações e não dissociar teoria e prática.

Desenvolver um pensar complexo de dimensões trifásicas: crítica-cuidadosa-criativa.

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Para o momento convém trabalhar os dois últimos itens desses objetivos, para mostrar sua co-relação. Lipman considera que o nosso pensar não se restringe à dimensão criteriosa, mas engloba também as afetiva e criativa. Essas três dimensões se bem articuladas permite-nos pensar melhor, considerando não tão somente os critérios como também os valores e o contexto dos julgamentos, um pensar que o autor classifica como: pensar de ordem superior. Para tal baseia-se na classificação que Buchler (1951) faz dos modos de julgar correspondentes ao fazer, produzir e o dizer, denominados respectivamente juízo ativo, mostrativo e assertivo, que segundo Kohan em Fundamentos para compreender e pensar a tentativa de M. Lipman:

“Essa distinção proposta por Lipman, entre três modos, formas ou dimensões do pensar de ordem superior é paralela à classificação funcional dos juízos de Buchler: o modo crítico do pensar corresponde ao modo assertivo do julgar; o modo criativo do pensar, ao modo mostrativo do julgar, e o modo do cuidado ao modo ativo do julgar.” (KOHAN, 1998, p. 112)

O que podemos associar, embora não de maneira unilateral, pois mesmo Lipman admite que essas dimensões nos processos cognitivos se intercruzam, é o ensino ao modo correspondente ao dizer, a pesquisa ao fazer e a extensão ao mostrar; permitindo pensar a própria universidade como um todo integrado e interligado à sociedade da qual faz parte. Podemos didaticamente classificar nossos modos de julgar, pensar e de organização institucional, mas não devemos distanciar o que em sua constituição está inter-ligado, ou ainda, que fazem parte de um único processo. Para Euclides Marchi não há uma indissociabilidade das funções entre pesquisa-ensino-extensão, e a “superação da tríade ocorrerá quando ensino/pesquisa/ extensão deixarem de ter existência isolada e quando não houver mais necessidade de reafirmar sua indissociabilidade.” (MARCHI, 1994, p. 42).

A Filosofia e o Diálogo

Reconhecidamente a filosofia enquanto atitude intelectual centra-se nas perguntas, estas, por sua vez, exigem uma resposta reconstruída e recursiva, balizada por razões (critérios) e aberta a novos questionamentos.

“Em seu pequeno e brilhante livro ‘Introdução à Filosofia’, Jaspers insiste na idéia de que a essência da filosofia é a procura do saber e não a sua posse. Todavia, ela se trai a si mesma quando degenera em dogmatismo, isto é num saber posto em fórmula, definitivo, completo. Fazer filosofia é estar a caminho; as perguntas em filosofia são mais essenciais que as respostas, e cada resposta transforma-se

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numa nova pergunta. Há, então, na perspectiva filosófica uma humildade autêntica que se opõe ao orgulhoso dogmatismo do fanático: o fanático está certo de possuir a verdade. Assim sendo, ele não tem mais necessidade de pesquisar e sucumbe à tentação de impor sua verdade a outros. Acreditando estar com a verdade, ele não tem mais o cuidado de se tornar verdadeiro; a verdade é seu bem, sua propriedade, enquanto para o filósofo é uma exigência. No caso do fanático, a busca da verdade degradou-se na ilusão da posse de uma certeza.”(HUISMAN et al., 1966, p. 24)

Esse modo de ser da filosofia, precisa ser considerado ao pretender-se ensiná-la, como afirma-nos Kant:

“O método peculiar do ensino na Filosofia é zetético, como lhe chamavam os antigos, isto é, investigante, e só se torna dogmático, isto é, decidido, no caso de uma razão mais exercitada em diferentes questões.” (KANT. Lições de Inverno de 1765-1766.)

Zetético, enquanto questiona as verdades dadas, perguntando pelo que deve ser, em procedimentos abertos. Com isso, percebe-se que um diálogo aberto, cooperativo e investigativo é o núcleo da práxis filosófica em educação, abrindo possibilidades para um novo pensar, para um romper barreiras (dogmas) para o desprendimento do lugar-comum em busca de melhores relacionamentos.

A Filosofia e o Desvelamento do Senso Comum

Tirar o véu, por à mostra, despir de uma roupagem ideológica, aprofundar o superficial e quotidianamente sacralizado e ir além...

Muitas vezes deixamo-nos conduzir pelo fluir das coisas comuns, repetimos gestos, ações e reflexões; esquecendo de estar efetivamente no mundo e apenas reproduzimos, até mesmo, o obviamente destrutivo (como a manutenção de uma exploração degradante da natureza que põe em risco nossa própria vida).

“Sim, mas aí mesmo é que está a dificuldade: o senso comum de hoje é o escândalo filosófico (ou científico, ou moral) de ontem. O senso comum, pode-se dizer com um pequeno exagero, é a cesta de papéis da história do pensamento. Nós não queremos que o senso comum vença. Nós queremos que ele seja interpretado e, se necessário for, substituído. (...) O professor de filosofia ajudará seus estudantes a explorar seus próprios interesses e oferecerá às questões deles respostas alternativas àquelas que eles imaginaram ou podem imaginar. Mas papel do professor – e proeminentemente do professor de filosofia – é muito mais importante: ele oferece perguntas alternativas, desenvolve interesses alternativos, inimagináveis aos estudantes, E, para esse fim, os estudantes terão de ser tirados fora da caverna. A filosofia se ocupa de fazer perguntas que ninguém ousou perguntar, indo mais além dos modos de pensar da comunidade. Neste sentido a filosofia é libertadora. Ela nos libera da pior das tiranias: a tirania

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daquilo que, por ser comumente aceito, passa por verdadeiro.” (SCOLNICOV, 1999, p. 96)

Como exemplo de senso comum escandaloso de ontem podemos considerar a polêmica do geocentrismo X heliocentrismo da Idade Moderna, ontem o primeiro era comum; hoje, com as comprovações científicas, o segundo passou a ser verdadeiro e comum. Verdade hoje, escândalo de ontem; o que não nos enobrece ou aponta um progresso, só nos mostra a necessidade de se precaver quanto ao comum, pois nem tudo que assim o for, o será. É preciso, então, principalmente em se tratando do ambiente de pesquisa, que o comum seja revisto continuamente, que haja a abertura para novos questionamentos, que se descubra novas verdades, que estas se tornem comum (pois a universidade que é-com a sociedade tem seus conhecimentos ‘estendidos’) e que novamente venham a ser questionadas. Se o professor universitário é modelo de dogmatismo (se não consegue nem dialogar com seus colegas de outros ‘ismos’) os universitários poderão se espelhar nesses modelos e continuaremos com meias verdades dominando-nos. Vejamos no caso o que a mídia tem feito nesse sentido e como tem produzido sensos comuns e na grande maioria com incoerências gritantes.

A Filosofia e as Reações Ulteriores

A comunidade de investigação abre caminhos ou pelo menos tem estes como objetivos para transcender-se como Lipman enfatiza em sua obra Natasha, diálogos vygotskianos:

“Estimular reações ulteriores:

Provocar reações ulteriores (sob a forma de relato ou redação de histórias, poesia, pintura, desenho, e outras formas de expressão cognitiva).

Reconhecer a síntese do crítico e do criativo com o individual e o coletivo.

Comemorar o senso aprofundado do significado que vem com o julgamento fortalecido.” (LIPMAN, 1997, p. 36)

Como já dito, busca-se uma autonomia do indivíduo, o fortalecimento do seu julgamento e o aprofundamento do senso comum. E desta colocação de Lipman resulta duas reações importantes: - a concretização da intersubjetividade, e – a re-significação de conceitos e conteúdos dados.

Do primeiro desdobramento é preciso perceber, como pressuposto, um ambiente acadêmico de cooperação e diálogo, o que do

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contrário (competição e mesquinhez) não permite reconhecer a própria dinâmica inter-subjetiva do conhecimento humano:

“(o conhecimento) é empreendimento de caráter supra-individual, é uma simples e grosseira falácia falar e propor uma universidade competitiva (...) A universidade competitiva hoje é o aspecto aparente e enviesado que subtrai, especificamente nas áreas desfavorecidas em recursos e prestígio, ou seja, que estão na contra-mão das áreas predominantes, a importância da cooperação na produção teórica, técnica, etc.” (CHASIN, 1999, p. 22)

“Não há um ‘penso’, mas um ‘pensamos’ que estabelece o ‘penso’ e não o contrário. Esta co-participação dos sujeitos no ato de pensar se dá na comunicação. (...) O que caracteriza a comunicação enquanto este comunicar comunicando-se é que ela é diálogo, assim como o diálogo é comunicativo. (...) Equivocada também está a concepção segundo a qual o que fazer educativo é um ato de transmissão ou de extensão sistemática de um saber (...) Por isso é que a tarefa do educador não é a de quem se põe como sujeito diante de um objeto cognoscível, para, depois de conhecê-lo, falar dele discursivamente a seus educandos, cujo papel seria o de arquivadores de seus comunicados. A educação é comunicação, é diálogo, na medida em que não é a transferência de saber, mas um encontro de sujeitos que buscam a significação de significados.” (FREIRE, 1995)

Desta contraposição extensão X comunicação, pode-se perceber que, se a base da educação for a segunda, o fazer do professor universitário torna indissociável: ensino-pesquisa-extensão, esses três elementos tornam-se um mesmo ato, onde teoria e prática realizam-se mutuamente, e a universidade reconhece seu papel enquanto locus do conhecer, dentro e fora de si mesma. Não na ironia de muitos cursos tapa-buracos de extensão, mas na realização efetiva de uma comunicação contínua.

Não se trata de uma universidade dona-do-saber que estende seus tentáculos aos incultos. É preciso reconhecer nos ambientes inter-subjetivos das comunidades de investigação a diversidade cultural e não aniquilá-la, e sim, produzir conhecimentos genuínos e legitimados pelos sujeitos que com eles se identificam e re-significam o mundo. Com esta fala final nota-se o que se pretende com a ‘significação de significados’ ou re-significação; não uma opressão cultural, mas um rever conceitos e conteúdos entre os sujeitos participantes da comunidade, promovendo uma inter-relação contextualizada de significados. O que permite uma proximidade real professor aluno e uma internalização efetiva dos conceitos e valores, que passam a ter novo significado, aprofundado, revisado e aberto. Como afirma Lipman:

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“ ... a comunidade de investigação na sala de aula – incluindo o professor – deve proporcionar um amortecedor entre a cultura e a criança, e não apenas o professor sozinho. Claro que a comunidade não deve servir apenas como amortecedor; pode também preencher o papel tradicional de funcionar como um instrumento de aculturação.” (LIPMAN, 1997, p. 61)

E é exatamente a aculturação que pretende-se que seja evitada.

O Filosofar: Elementos Metodológicos Básicos

Se considerarmos que não se ensina filosofia, mas se ensina a filosofar, como diria Kant, a comunidade de investigação em qualquer nível terá alguns elementos metodológicos básicos, dentre eles o eixo: diálogo investigativo. O professor é um condutor e cooperador no diálogo e os alunos investigam sem medo de errar. Como se trata de uma investigação filosófica a mesma centra-se nos problemas e não nas soluções. O debate é motivado com um pretexto (texto, figuras, fotos, música...) e percorre o caminho que a comunidade desejar, porém de forma organizada e cuidadosa, de modo que todos possam falar e dar opiniões, podendo o debate dar origem a novos debates, a produções textuais e artísticas.

No caso da comunidade de investigação em nível superior, outras necessidades tornam-se de importância fundamental, o que não significa que estas não sejam importantes nas comunidades de outros níveis. É importante que o aluno tenha contato como os textos filosóficos dos autores trabalhados diretamente e que sejam privilegiados temas pertinentes a formação profissional dos alunos, também o contexto histórico-filosófico em que os autores se encontram deve ser considerado, sendo pertinente organizar os temas filosóficos conforme a ocorrência das respostas dadas pelos filósofos ao longo da história, permeando áreas e correntes filosóficas diversas. Cabe ao professor evitar o anacronismo - possíveis interpretações dos autores conforme referenciais atuais, uma interpretação descontextualizada - e fazer com que as discussões avancem para além dos limites do senso comum.

Porém de nada adianta um bom programa com eixos temáticos interessantes organizados historicamente se não for dada a oportunidade aos universitários de internalizarem os problemas filosóficos em questão e debaterem as respostas, tendo-as entendido. Para isso sugere-se, com base em Izuzquira, citado por Manuel Maria Carrilho, que a sala de aula seja transformada em um laboratório conceptual, com problemas determinados, uma metodologia específica, um operador preciso produzindo uma simulação gnoseológica. Por simulação

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gnoseológica entenda-se: “imitação, não mecânica, da atividade intelectual do filósofo, tal como essa atividade aparece nos grandes modelos da história do pensamento ocidental” (CARRILHO. 1987), fazendo com que os alunos vivenciem cognitivamente o que o autor vivenciou em suas obras, de modo a pensar como o autor e poder além de entendê-lo, discuti-lo, e não apenas acumular dados. “Só assim se abre caminho para a realização de experiências conceptuais, que consistem essencialmente em construir uma determinada situação para pôr à prova um certo tipo de comportamento conceptual, tratar uma série de problemas e poder por outros.”(Idem) Esse processo teria por objetivos orientar a aprendizagem filosófica para a prática da filosofia e estimular a articulação da filosofia com outras formas de pensar e manifestações culturais.

Avaliar como Eixo do Pensar (Julgar)

A avaliação entendida como um ato do pensar, como a possibilidade de desenvolver a capacidade de julgar em sala de aula, só é possível se os sujeitos da comunidade forem tratados como sujeitos avaliadores e não tão somente como sujeitos avaliados. É entender a avaliação como parte constituinte da emancipação humana e da autonomia do indivíduo.

“Pensar, na significação etimológica do termo, quer dizer sopesar, pôr na balança para avaliar o peso de alguma coisa. O pensamento quando faz filosofia usa ao máximo seus recursos para aprender a avaliar: quer tornar-se avaliador justo. (Arcângelo Buzzi) A palavra ‘avaliação’ significa etimologicamente determinar o valor. Valor diz respeito ao que faz contrapeso - pesa e equilibra ao mesmo tempo.” (SÁTIRO, 1998, p. 172)

Neste artigo, Angélica Sátiro mostra um histórico da avaliação no Brasil e suas dimensões, apontando possíveis mudanças e dizendo que os

“modelos de avaliação são coerentes com modelos de ensino e de aprendizagem e com modelos de relações sociais vividas, uns refletem os outros. (...) Pensamos a avaliação como uma atividade política, cognitiva, afetiva, que precisa estar aberta ao convívio, gerar sensibilidade para entender as questões surgidas e investigá-las continuamente.” (Idem, p. 175)

Ou seja, pensar a avaliação como parte do processo de aprendizagem e não como um métron para classificar alunos, todos na comunidade avaliam diversas dimensões (além das já citadas: dos conteúdos, metacognitiva, social/grupal, mostrativa, assertiva, ativa, dentre outras possíveis) dentro do processo de investigação e este

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avaliar contribui para construção e aprofundamento da própria investigação.

Assim o avaliar é um exercício da capacidade de julgar com base em critérios, no contexto e nos valores e avaliam-se todas as atividades realizadas, com objetivos e critérios bem definidos, previamente e de preferência em conjunto. Utilizam-se instrumentos de avaliação variados e permite-se a variação dos agentes avaliativos.

Do caso a relatar

DADOSDisciplina lecionada através do Centro Universitário de Várzea

Grande para o curso de Pedagogia no Campus Poconé, em Mato Grosso, Filosofia da Educação é uma disciplina de 144 horas, ministrada para duas turmas em um trabalho conjunto dos professores Antônio Crisóstomo do Prado e Raquel Martins Fernandes.CARACTERÍSTICAS PECULIARES

Ao realizar um trabalho fora da sede deve-se levar em conta algumas peculiaridades, como o fato das disciplinas serem realizadas por módulos e os alunos estarem imbuídos das características da cultura regional. No caso em questão os estudantes são professores, dentre outros profissionais, alguns sem o hábito do estudo continuado, apresentando diversas dificuldades metodológicas, que nem diziam respeito a disciplina. Um curso modular possui algumas dificuldades, tais como tornar complexa a tarefa da formação interdisciplinar e a assimilação dos conteúdos; possuindo porém algumas vantagens: a dedicação exclusiva dos alunos e o bom encadeamento do curso, pelo fato de estar condensado e a seqüência do programa ficar mais clara e dinâmica.PROGRAMA

O programa foi organizado em unidades temáticas trabalhadas historicamente, utilizou-se uma apostila com textos básicos para a compreensão dos temas e foi recomendada a pesquisa de aprofundamento segundo os temas do seminário. Aqui apresenta-se somente as unidades, sem suas divisões:

UNIDADE I: Filosofia, Ciência, Ideologia e Filosofia da Educação: noções.

UNIDADE II: Abordagens histórico-filosóficas das correntes educacionais.

UNIDADE III : Filosofando sobre o Educar

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001.88

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UNIDADE IV: Perspectivas e Problemáticas Atuais em EducaçãoAVALIAÇÃO

As atividades realizadas possuíram os objetivos já explicitados, sendo diversas e processuais: trabalhos em grupo, exercícios orais e escritos (em sala), leitura e resumo de textos diversos, seminário (e pesquisa) e produção individual - auto-avaliação e ensaio filosófico.

1) Oralidade Exercícios e DebatesQuestões filosóficas após aquecimentos com recursos diversosRoteiro de filmes e debateQuadros gnoseológicosAlvos FilosóficosProduções estéticas

2) Do ler/escrever ao dizer - Seminários e pesquisaAcompanhamento à leitura, pesquisa, preparação e apresentaçãoApresentação e avaliação conjunta Três eixos temáticos: Educação liberal, Educação progressista e

Educação, trabalho e poder.

3) Leitura e Escrita – Do fichamento ao ensaioLeitura de textos selecionadosElaboração de fichas de leituraInterpretação escrita e oral dos textosComentário e discussão críticaProdução de ensaio filosóficoAcompanhamento e retorno conceptual e literário sobre as

produções

4) Avaliação do cursoA avaliação que os alunos fizeram do curso realizou-se mediante

formulário com os itens descritos abaixo, sendo a média das notas atribuídas 9, 5:

a) Avaliação do professor: metodologia, recursos didáticos, domínio de conteúdo, relacionamento professor-aluno, clareza dos objetivos propostos, clareza na exposição teórica, clareza ao avaliar.

b) Avaliação Geral: alcançamos uma comunidade de investigação?, grau de dificuldade dos textos, aprofundamento teórico, satisfação em relação ao curso.

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Além dos itens o formulário contou com espaço para justificativas e sugestões.

Os professores também avaliaram o curso de forma satisfatória, considerando que, com todas as dificuldades e soluções, os objetivos foram alcançados.

Por concluir

Por concluir, porque o trabalho não acabou e não se tem conclusões definitivas. Continua-se tentando em cada sala de aula construir uma comunidade de investigação. Sabe-se com estas poucas experiências, que é possível construir esse ambiente, mas que é necessário uma vigilância total, ou seja, as dificuldades metodológicas, a educação já recebida pelos alunos em outros tempos e o mundo competitivo em que vivemos, comprometem uma comunidade cooperativa, mas não a transformam em um sonho impossível: as experiências (e os próprios alunos) comprovam.

Textos referenciais

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BUCHLER, J. Nature and Judgment. New York: Columbia University Press, 1955.

BUCHLER, J. The Philosophy of Peirce: Selected Writings. New York: Harcourt Brace, 1940.

BUCHLER, J. Toward a general theory of human judgment. New York: Columbia University Press, 1951.

BUCHLER, J. What is a discussion?. In: Journal of General Education, outubro, 1954.

BÜTTNER, Peter. Mutação no Educar: uma questão de sobrevivência e da globalização de vida plena – o óbvio não compreendido. Cuiabá: EdUFMT, 1999.

CHASIN, J. Abertura. Revista Ad Hominen. N 1. Tomo I, Marxismo. São Paulo: Estudos e Edições Ad Hominem, 1999.

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001.90

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Filosofia na educação

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SILVA, Maria das Graças Martins da. Extensão: a face social da universidade? Cuiabá: UFMT-Instituto de Educação, 1999. Orientador: Paulo SPELLER. (dissertação)

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A Construção do Conhecimento e a Interdisciplinaridade: o conceito e a dialética do pensamento

Maria Therezinha de Lima Monteiro1

RESUMO: A construção do conceito apresenta longa história ligada à Filosofia e à psicologia experimental. Neste processo construtivo, os processos de classificação passam por estágios, desde as coleções figurais, coleções não figurais, até as classes com a coordenação entre extensão e compreensão. Perante a Epistemologia Genética, a Didática perde sua significação normativa como método de ensino para assumir a forma de um saber teórico, fruto da prova experimental, que parte de princípios psicogenéticos, com práticas contextualizadas em campos conceituais específicos.

Palavras-chave: Conhecimento, Interdisciplinaridade, Epistemologia Genética

ABSTRACT: The Construction of Knowledge and the Interdisciplinarity: Concept and Dialetics of Thinking. The construction of concept shows a long history linked to Philosophy and to the experimental psychology. In this constructive process, the classification processes go through stages, since the figural collections, non-figural collections, up to the classes with the coordination between extension and comprehension. As far as the Genetic Epistemology is concerned, Didactics looses its normative meaning as a teaching method to assume the form of a theoretical knowledge, result of the experimental proof that starts from psychogenetics principles with contextual practices in specific conceptual fields.

Keywords: Knowledge; Interdisciplinarity; Genetic Epistemology

1 Doutorado em Psicologia Educacional (Geórgia State University & Emory University, USA) e Curso de Doutor em Psicologia Escolar pela Universidade de São Paulo. Professora de Epistemologia Genética nos Cursos de Mestrado em Educação e Mestrado em Psicologia, da Universidade Católica de Brasília, de 1993 à data atual.

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INTRODUÇÃO

Os problemas envolvidos na construção do conceito têm longa história ligada à investigação da psicologia experimental, mas não escaparam da velha tradição filosófica.

No início do século XX, o trabalho experimental começou com o termo “abstração” e a tarefa do sujeito seria o que agora se denomina “discriminação” na aprendizagem. O termo “abstração” foi utilizado no sentido etimológico do termo de “abstrahere”, separar, já utilizado por Aristóteles. De 1920 a 1930, Hull e seguidores demonstraram, experimentalmente, a aplicabilidade das teorias behavioristas na exploração da abstração na formação de conceitos. Piaget entra em cena ao redor de 1920 e procurou construir uma teoria genética do conhecimento e seus esforços levaram-no a investigar a emergência de conceitos na criança, como: causalidade, espaço, objeto, tempo, número, etc., em uma série de estudos de Epistemologia Genética. Nos últimos cinqüenta anos, psicólogos apoiando ou reagindo à Piaget, dedicaram-se à tarefa de descrever o desenvolvimento da vida conceitual na criança (STEVENSON, 1972, p. 308). De acordo com Piaget, a formação do conceito não ocorre em nível de mera discriminação, no sentido de separar coisas, mas envolve processamento mais extenso ligado à lógica. A função de classificação é encontrada em todos os níveis de organização das estruturas cognitivas, com semelhanças remarcáveis entre as organizações cognitivas e as biológicas (PIAGET, 1967a, p. 190). A construção do conceito é explicada em diferentes níveis reconstrutivos de organização, por dois tipos de abstração: reflexiva ou lógico-matemática e física ou empírica. Muitos autores mostraram-se insatisfeitos com a sinonímia entre abstração e formação de conceitos. Alguns discutiram o problema em termos de relações primárias e secundárias, descritas como relações entre percepção e pensamento conceitual, como Wohwill e Erisksen (PIKAS, 1966, p. 103). Segundo Pikas, abstração e conceituação possuem significação equivalente, mas não possuem definição operacional entre os estudiosos behavioristas. Outros autores fizeram distinção entre aquisição e formação de conceito, tomada no sentido da utilização de respostas comuns a estímulos parcialmente diferentes (KENDLER, 1961, p. 44). Bruner, Goodenow e Austin (1956, pp. 232, 233) também distinguiram formação e aquisição de conceitos, bem como categorização perceptual e conceitual, com a percepção sendo o primeiro passo na aprendizagem de conceitos. Para Piaget (1973, p. 4), a percepção desempenha papel essencial na

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construção do conhecimento, mas depende da ação espontânea da criança de reunir e de separar. Distingue percepção da atividade perceptiva: a percepção como estado ocorre em cada momento e a atividade perceptiva, como processo de aprendizagem. Não separa percepção da conceituação, pois o sujeito é um operante em ativa interação com o meio e a percepção é constantemente informada por processos intelectuais superiores. O sujeito já possui uma organização funcional endógena (reflexos associados às necessidades básicas do organismo), com futuras estruturas construídas por atividades, que prolongam e aumentam as adaptações elementares. Trata-se de uma construção concebida como uma contínua assimilação de novas adaptações às estruturas precedentes, onde o sistema superior envolve o inferior como um caso particular (CELLERIER et al., 1968, pp. 28-49). No sentido de desenvolvimento, as estruturas sensório-motoras são básicas em termos de movimentos que se coordenam, tornando-se parte do conteúdo das atividades subjetivas e mentalmente representadas do próximo nível intuitivo simbólico. Este processo de reconstrução continua até o nível formal na adolescência. Assim, a criança que começa a falar e representar objetos ausentes de seu campo perceptivo imediato, apresenta nível cognitivo mais extenso em relação ao nível anterior, mas continua a utiliza-lo em seus processos de relações e de construções.

O Papel do Erro na Construção do Conceito

A construção de conceitos envolve o problema do erro, tema bastante contraditório entre as diferentes abordagens teóricas. A linha behaviorista faz distinção entre a aprendizagem com erro e aprendizagem sem erro (TERRACE, 1963). A generalização do estímulo está relacionada aos resultados de como estímulos diferentes exercem controle sobre o ato de responder. Quatro posições teóricas se propuseram a explicar a aprendizagem de discriminação: Spence (Teoria Contínua), Krechvisky (posição Não-Contínua), Harlow (teoria do Fator de Erro) e Skinner (reforçamento Operante). Para Spence (1936), com sua teoria contínua, a formação de discriminação resulta da interação entre extinção e condicionamento. Estudos experimentais na aprendizagem de ratos objetivaram que a tendência excitativa do estímulo reforçador (S+) é aumentada cumulativamente em cada reforçamento, enquanto que o estímulo não reforçador (S-) é cumulativamente enfraquecido em cada fracasso. Uma abordagem alternativa, a posição Não-Contínua de Krechesvsky (1938), mantém que a discriminação é formada à medida que o organismo propõe uma série de hipóteses, rejeitando as

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irrelevantes e, eventualmente, adotando as relevantes. Nesta posição, a extinção do erro não é vista como condição necessária para a aprendizagem, mas a base para abandono de hipóteses incorretas. Segundo Friedrichs (1972), desde que o erro oferece as bases para o abandono de hipóteses inapropriadas, ele passa a ser considerado fundamental para o processo de aprendizagem. A teoria de Harlow (“Error Factor Theory”) também tem como base a eliminação de respostas incorretas e suas investigações traçaram e identificaram o curso de várias classes distintas de erros cometidos por macacos, em treinamento sucessivo, sobre uma série de problemas (HARLOW, 1950, p.36) Na realidade, todas as três teorias enfatizaram a eliminação de tendências de respostas incorretas (FRIEDRICHS, 1972). Uma quarta posição, baseada em estudos experimentais de laboratório e de campo, veio gerar dúvidas sobre a necessidade de extinção de respostas inapropriadas. Ao redor de 1938, Skinner questionou a idéia de extinção como pré-requisito de aprendizagem, acentuando os efeitos deletérios da resposta incorreta no curso da aquisição da discriminação. Para Piaget, o erro é importante na medida que permite a análise das dificuldades da criança, mas “não é” condição de manifestações de respostas incorretas existentes no repertório do sujeito (PIAGET, 1967a). A noção de regulação cibernética na construção dos esquemas, inicialmente com erros e depois sem erros, baseia-se na antecipação de soluções (inferências) pelo sujeito, enquanto interage ativamente com o meio. Ora, ao interagir com o meio, o sujeito desenvolve operações por retroalimentação circular e soluções adequadas para o problema específico. As operações constituem o termo limite das regulações sobre o erro, chegando a um nível de pré-correção e de evitação do erro, que marca a chegada ao equilíbrio dedutivo e à necessidade” (PIAGET, 1967a, p. 359). Nesta perspectiva, a assimilação envolve organização do comportamento em esquemas aplicados a diferentes situações, configurando a assimilação generalizadora. Não há controle do estímulo sobre as respostas, mas processo de equilibração nos processos de interação do sujeito com o meio e não ação unilateral do estímulo (meio). Neste contexto interacionista ocorrerá generalização de estímulos (objetos), que são incluídos em classes lógicas e de respostas, organizadas em esquemas de assimilação. A exploração do estímulo é sempre realizada pelas atividades organizadas em esquemas, fruto de relações implicativas, em contínuo processo de interação com o meio, resultando relações explicativas (causalidade, espaço e tempo). Nestas interações, os dois processos de abstração ocorrem de modo

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concomitante por interações circulares por retroalimentação:um a partir da coordenação de ações do sujeito, resultante das atividades exploratórias do sujeito sobre o objeto (abstração lógico-matemática); outro, a partir das características intrínsecas do objeto (abstração física). Os estudos experimentais de Skinner e outros, na linha neo-behaviorista, demonstraram os efeitos do reforçamento extrínseco sobre a freqüência da resposta. Já os estudos psicogenéticos de Piaget demonstraram que o comportamento se reorganiza em esquemas, por meio da variação de respostas às diferentes dimensões do objeto (estímulo), ativamente exploradas por retroalimentação. Assim, ambos, Piaget e Skinner discutem o problema da construção do conhecimento, mas enquanto o primeiro discute relações, o segundo aborda a associação como elo de ligação entre estímulos e respostas, sem considerar a organização dos padrões comportamentais ou esquemas de assimilação. Assim, Piaget acentua a organização dos “algoritmos” ou procedimentos, desenvolvidos pelo sujeito em interação com o meio por um processo de equilibração entre assimilação (ação do sujeito sobre o objeto) e acomodação (ajustamentos às formas do objeto); Skinner aborda a retroalimentação como um processo circular que leva ao aumento de freqüência da resposta, mediante a manipulação do comportamento do sujeito por meio de estímulos reforçadores extrínsecos. Piaget acentua o processamento interno através de relações levando à assimilação, processo mais extenso do que a simples associação, considerando afetividade como o elemento regulador das interações do sujeito com o objeto, com as operações apresentando-se como o termo limite da regulação sobre o erro, ao passo que para o behaviorismo, o erro está sempre presente numa aprendizagem por tentativas, de onde o controle do estímulo. Skinner fala de reforçamento positivo, negativo (esquiva) e extinção por falta de reforçamento. Piaget procura a satisfação intrínseca (reforçamento intrínseco) através do processo de conscientização da construção da resposta. Em outras palavras, enquanto Piaget focaliza a organização dos procedimentos levando à resposta, Skinner focaliza a resposta pronta repetida e associada a um elemento reforçador extrínseco.O Ciclo Epistêmico

Segundo Piaget e Inhelder (!979), um organismo, ao interagir com o meio físico e social, efetua transformações de dois tipos: (a) de um lado, o organismo assimila o meio agindo sobre ele, conservando formas de organização dos deslocamentos espaciais, que irão garantir a continuidade das trocas com o meio exterior; (b) de outro, o meio oferece

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resistências e é transformado pelo organismo. Configura-se, assim, um ciclo epistêmico, regulado pelas operações e energizado pela afetividade, podendo-se falar na existência de um sujeito epistêmico e de um sujeito psicológico, intimamente integrados na constituição do sujeito cognoscente. As funções cognitivas esquematizadas ou organizadas provocam duas distinções úteis, que caracterizam funções da memória (conservação) e da inteligência (solução de novas situações). A primeira refere-se à oposição entre funções operativas e figurativas e a segunda, a distinção entre significante e significado. As funções operativas ligam-se às ações, das mais elementares às operações superiores, que através de deslocamentos espaciais práticos e representativos exploram e transformam o objeto e se transformam também. Essas ações, exercidas sobre os objetos, são organizadas em esquemas móveis, desde o nível sensório-motor ao da representação mental, através da abstração reflexiva ou construtiva. Tais organizações apresentam-se como a origem das futuras operações ou estruturas lógico-matemáticas. Ocorre, assim, uma construção crescente dos significados, intimamente relacionados aos significantes, que expressam o significado de modo parcial, dificilmente esgotando-o. O ciclo epistêmico envolve interação por retroalimentação entre significantes e significados, cujos processos de conscientização e expressão ocorrem sob várias formas (oral, escrita, pictórica, plástica, etc.). Uma vez que a expressão do significado (uma rede de relações de implicação) se faz de modo parcial, por diferentes significantes, a interdisciplinaridade situa-se justamente nas várias possibilidades de sua expressão. Ao lado da organização dos esquemas ligados aos significados, a imagem mental, em seu aspecto figurativo, essencial à memória de vocação e resultado final da imitação interiorizada, apresenta-se sob forma de significante. De início a imagem mental é imediata, mas a seguir assume formas diversas em nível de representação mental (formas interiorizadas), de onde o novo instrumento figurativo intimamente relacionado ao operativo. Tal como a imagem, o jogo, o desenho (imagem gráfica), a modelagem, a cartonagem, etc. constituem instrumentos figurativos nascidos da imitação. Esta distinção, entre aspectos figurativos e operativos na construção do conhecimento, está, portanto, intimamente ligada à diferenciação entre significantes e significados. Entre os significantes, com suas funções figurativas, cabe distinguir os índices, os símbolos e os signos. Os índices são os mais elementares na ordem do desenvolvimento. São partes do objeto ou um de seus aspectos, ou ainda um resultado causal (rastro, mancha, pegada, etc.). Uma percepção é dita significativa quando o significante é

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constituído pelos índices perceptivos, enquanto que seu significado é formado pelos esquemas que ultrapassam os dados sensoriais em termos de identificação, de estabelecimento de relações, etc. inerentes aos esquemas sensório-motores, aos esquemas de ações e aos esquemas conceituais. Logo, o contacto direto da criança com o objeto do conhecimento vem garantir o reconhecimento posterior de seus índices perceptivos, com sua conseqüente reconstrução. O segundo patamar de significantes forma-se no decorrer do segundo ano de vida com o aparecimento da função semiótica. São os símbolos, instrumentos figurativos e simbólicos. A imitação, ao ultrapassar o nível sensório-motor, interioriza-se, torna-se diferenciada. Neste nível a criança traduz suas ações em palavras. A função semiótica ou simbólica é justamente a utilização dos símbolos e signos destacados de seus significados, de seus contextos, dos objetos que passam a serem trabalhados oralmente ou por outras formas de expressão, mas com base na representação mental. A interação social é condição essencial para a construção do símbolo, em grande parte fruto da reprodução viesada da realidade. Daí ser considerado individual e motivado. O terceiro patamar de significantes é constituído pelo sistema de signos da linguagem, de caráter coletivo e convencional. No processo de desenvolvimento e construção do conhecimento, entre os índices e os signos intervém o símbolo (imagem, desenho, modelagem, dramatização etc.), todo um processo de expressão oral, escrita, pictórica, plástica e cênica, que deforma a realidade, permitindo tanto um processo de socialização menos árduo para criança, como todo um processo de expressão artística. Logo, o terceiro patamar de significantes é, portanto, constituído pela linguagem ou sistema de signos diferenciados e coletivos, arbitrários ou convencionais, enquanto coletivos. Nos processos interativos entre o sujeito e o meio, o elemento regulador das trocas é a afetividade, energia levando à coordenação de ações. Mediante clima emocional positivo, a criança desenvolverá comportamento de aproximação e bom rendimento na aprendizagem, mas mediante clima emocional negativo, haverá o comportamento de fuga, com bloqueios e mau rendimento escolar. Isto vem confirmar os aspectos inseparáveis entre sujeito epistêmico e sujeito psicológico na integração do sujeito do conhecimento ou sujeito cognoscente (INHELDER/CELLERIER, 1996, p. 8). Estes aspectos, intimamente ligados, estão presentes em todos os processos de trocas entre o sujeito e o meio físico e social, constituindo-se no baluarte da própria socialização da criança, tal como a socialização apresenta-se como condição necessária do desenvolvimento da cognição e da própria

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afetividade. Assim, cognição, afetividade e socialização são três variáveis responsáveis pelo maior ou menor rendimento bem como pelo desenvolvimento. O paralelismo entre motivação e organização das estruturas cognitivas desenvolvidas em um contexto social pode ser explicado pela noção de reforço, segundo Piaget (PIAGET/GRÉCO, 1974): uma reação é reforçada na medida em que atinge um sucesso, com redução ou satisfação de uma necessidade. No caso de fracasso ocorrerá inibição ou substituição da reação. Nos parâmetros do behaviorismo operante, o comportamento ou resposta reforçada aumenta de freqüência; no caso de fracasso, o comportamento de fuga ocorrerá ou ainda, no caso de ausência de reforçamento negativo ou positivo, a extinção da resposta seria o resultado. Piaget acentua a necessidade de se distinguir os efeitos do reforçamento extrínseco e intrínseco. O reforço extrínseco liga-se a uma sanção exterior ou aprovação social; um sucesso, um acerto ou uma confirmação de hipótese está ligado a uma resposta acabada, ligada a um resultado. Já o reforço intrínseco ou interno liga-se a um prazer funcional, a uma convicção resultante da atividade do sujeito, que atingiu uma compreensão daquilo que acontece entre o estímulo e a resposta, com sentimento de vitória. Assim, o reforçamento extrínseco liga-se mais ao resultado, à resposta, estando mais ligado às adaptações cognitivas inferiores, aos mecanismos sensório-motores, às atividades habituais e a todo processo de aprovação social. Nestas circunstâncias, o reforçamento extrínseco desempenha papel importante na aprendizagem de animais, crianças jovens ou com problemas de comportamento e de aprendizagem. Contudo, a aprovação social é importante em todo o processo de socialização, principalmente no desenvolvimento do juízo moral. Não se pode ignorar que o reforçamento intrínseco, ligado à programação de atividades da criança nas aprendizagens complexas ligadas à construção das operações e dos conceitos em geral, considerados como formas superiores de pensamento, necessitam também da aprovação social que, de certa forma, realiza o fechamento dos processos de satisfação do sujeito vitorioso na construção do conhecimento. Na realidade, entre as adaptações cognitivas, inferiores e superiores, existe uma continuidade funcional e o prazer na situação de ensino e aprendizagem deve advir tanto do sucesso intrínseco quanto da ratificação deste sucesso por outrem, no caso o meio social imediato. Neste longo processo construtivo, o conhecimento e a inteligência, em geral, constituem um ponto provisório de chegada, sendo que em suas fontes confundem-se com as adaptações sensório-motoras e biológicas. Os processos de

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desenvolvimento, biológico e cognitivo, envolvem processos de diferenciação (discriminação) e de integração (organização), aspectos abordados pela psicogenética em termos de conhecimento físico ou empírico e lógico-matemático, intimamente relacionados, com independência relativa nas fases finais do desenvolvimento.

A Gênese do Conceito no Período Sensório-Motor

Piaget acentua períodos no desenvolvimento, que ao lado da programação hereditária, com a organização dos reflexos, o exercício apresenta efeitos cumulativos no processo de desenvolvimento, considerando-se também a aprendizagem e a maturação intimamente relacionadas.

Os períodos de desenvolvimento são: sensório motor (zero a dois anos), pré-operatório (dois a sete anos), operatório concreto (sete a onze ou doze anos) e operatório formal (doze a quinze ou dezesseis anos), em um processo circular de reconstrução e ressignificação, nos diferentes níveis. O período sensório-motor ou da inteligência prática apresenta características importantes para se compreender as futuras reconstruções cognitivas. Assim, na fase reflexa, de zero a um mês, a sucção é o principal instrumento de comunicação, funcionalmente endógena, mas estruturada em esquema pela aprendizagem desenvolvida pelo contacto com os objetos sugados. Já nestes primeiros dias a criança, em estado de fome, reconhece e classifica os objeto em sugáveis e não sugáveis, através de um tríplice processo de assimilação: funcional, recognitiva e generalizadora. A tendência primitiva de repetição de um comportamento espontâneo, carregado de significação para o bebê, é traço importante na construção do significado do esquema de assimilação, futuro conceito. O esquema de assimilação, como sucção, visão, preensão, etc., apresenta traços semelhantes aos do conceito, dotado de compreensão e de extensão. A compreensão do esquema liga-se à tendência da criança repetir uma ação com significado, como sugar, olhar, segurar, etc. Já a extensão refere-se ao número de objetos aos quais o esquema é aplicado. Por exemplo, o esquema de olhar é mais extenso do que o de sugar. A impossibilidade de se aplicar um esquema a determinada situação, com limitações de generalização, apresenta-se como origem da negação, ou seja, origem do esquema complementar da futura classe lógica. A informação relativa às qualidades do objeto (conteúdos do conhecimento) constitui o conhecimento empírico, base de estruturação dos predicados.

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Assim, a organização do comportamento em esquemas, base do conhecimento lógico matemático, é condição do futuro conhecimento físico dos objetos (conhecimento ligado às qualidades dos objetos).Na fase das reações circulares primárias, ao redor de um a quatro meses, ocorre a construção dos primeiros hábitos, com a integração do esquema reflexo em um esquema superior, o hábito. Com as reações circulares secundárias, ao redor de quatro a oito meses, inicia-se a interação da criança com o meio. A criança percebe resultados de sua ação, que são repetidos por retroalimentação, cuja intencionalidade ocorre após a percepção do resultado interessante. Trata-se de uma intencionalidade sem previsão, “a posteriori”, com início da diferenciação entre meios e fins, início da inferência, futuro raciocínio. É uma fase de transição entre a pré-inteligência e a inteligência propriamente dita. Os gestos significativos se estruturam como futuras palavras (significantes). Perante a percepção de um índice, a criança é capaz de prever um evento, graças ao condicionamento de sinais e de índices específicos, como um guardanapo no peito indicando a refeição.

Na fase de coordenação dos esquemas secundários (ao redor de oito a doze meses), a criança passa a estabelecer relações entre meios e fins “a priori”, ocorrendo o desenvolvimento das implicações, futuras inferências. Na remoção de um obstáculo para apreender um objeto desejado , o esquema de afastar é diferenciado do esquema final (pegar). A coordenação de esquemas secundários e sua aplicação a novas situações caracterizam o comportamento propriamente inteligente. A assimilação recíproca entre esquemas origina várias operações, como inclusão, implicação, negação, etc. As relações entre objetos originam relações temporais, causais e espaciais; já as relações entre esquemas originam implicações de caráter formal ou lógico-matemático. A origem das proposições afirmativas e negativas ocorre nesta fase. Por exemplo, ao afastar um obstáculo expressa uma negação e ao apreender um objeto, uma afirmação. Assim, as semelhanças entre o esquema e o conceito se objetivam: (a) a coordenação entre esquemas envolve a implicação (inferência), fruto das relações entre meios e fins; (b) o esquema móvel funciona ativamente por meio da assimilação, equivalendo ao juízo; (c) a origem do valor e do ideal, com os esquemas usados na exploração do objeto valorizado, em função de objetivos mais distantes.

Nas reações circulares terciárias (ao redor de doze a dezoito meses), dá-se a construção de meios por experimentação ativa, com variação de meios em função de resultados desejados, com acomodação

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intencional; nascem a associatividade e a criatividade. Os comportamentos inteligentes usam intermediários como o suporte, o barbante e a vara, para aproximar ou afastar objetos. Os esquemas terciários apresentam semelhanças com juízos e raciocínios. O juízo apresenta-se como a assimilação de um dado ao esquema.

Qualitativamente, os juízos são afirmativos e negativos, expressos por proposições. Os raciocínios, funcionalmente, são aplicações de meios conhecidos a novas situações e invenção de novos meios. Na fase do esquema simbólico (ao redor de dezoito a vinte e quatro meses), ocorre a invenção por dedução e combinação mental. Invenção e representação são aspectos interdependentes da inteligência sistemática: inventar é combinar esquemas mentais ou representativos.

Representação e invenção interagem e podem ser esclarecidas pela teoria dos signos. A imagem mental é uma forma de simbolismo com função significante. A invenção é uma reconstrução com significação propriamente dita. Graças à linguagem, a inteligência prática torna-se representativa e evolui para a inteligência reflexiva ou verbal com o auxílio do grupo social.

A Classificação e seus Estágios:

Na construção do conceito, a criança passa por estágios bem definidos no período pré-operatório e operatório. De 2 a 4 anos, as classificações infantis apresentam-se sob a forma de coleções figurais, na base das aproximações espaciais, da definição pelo uso e da conveniência. As coleções assumem a forma de alinhamentos, de objetos complexos, com indiferenciação entre estruturas lógicas e infra-lógicas2, com falta de coordenação entre compreensão e extensão da classe. Uma classe é definida por sua compreensão pelo gênero e pela diferença específica, exigindo manipulação em extensão, com base nas relações de inclusão, que supõe o uso adequado dos quantificadores intensivos “todos”, “alguns”, “nenhum” e “um”. A “compreensão” de uma classe é caracterizada pelo conjunto de qualidades comuns aos indivíduos da classe. Tanto as operações de classificação quanto de seriação procedem dos esquemas sensório-motores.

Outro tipo de coleção é “a não-figural (de quatro a sete anos), com aparecimento paralelo ao da “coleção figural” e com desenvolvimento posterior. Enquanto a classe figural” liga-se mais à

2 Estruturas lógicas referem-se ás organizações desenvolvidas sobre objetos contáveis; estruturas infra-lógicas, sobre os objetos contínuos.

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extensão da classe, a “não figural” traduz a compreensão da coleção. As coleções “não figurais” envolvem a diferenciação entre estruturas lógicas e infra-lógicas, mas ignoram as inclusões hierárquicas, que exigem a utilização dos quantificadores intensivos. O processo de classificação ocorre através de uma dialética entre processos ascendentes (composição da coleção) e descendente (justificação com subdivisões).

A hipótese de Piaget é que a inclusão de classe está ligada a um esquema antecipatório, que implica o domínio da operação inversa. A inclusão da classe exige coordenação entre compreensão e extensão. A classe concatenante B (mais extensa) engloba as classes concatenadas (A e A´) e tem sua extensão caracterizada pelos quantificadores eintensivos “todos” e “alguns”. O “todos” expressa a extensão da classe concatenante e o “alguns”, das classes concatenadas. Na fase das coleções não-figurais não há quantificação do predicado e nem ajustamento recíproco entre a compreensão e a extensão. Por exemplo, perante um conjunto de rodelas azuis, quadrados vermelhos e azuis, ela não será capaz de compreender que o azul é parte da coleção mais extensa composta de quadrados e de rodelas azuis. A operação completa de inclusão envolve a operação direta B=A+A´e a inversa A=B-A´. Para a criança comparar A com B é preciso fazer dissociação entre A e seu complementar A´ e, ao mesmo tempo, conservar B mentalmente. Logo, a relação A<B implica a operação inversa A=B-A´, com o B subsistindo como totalidade. A partir de oito anos a extensão ajusta-se à compreensão, mas com limitações. Coleções de animais, aves não são compreendidas porque não há um animal específico com nome de ave ou de animal. Conceitos como “animais”, “aves”, “répteis”, etc. estão longe do seu mundo das operações concretas, em sua fase inicial. Na fase das coleções não figurais, ocorreram semi-antecipações, no decorrer das tentativas de inclusão, método já superior ao das coleções figurais por aproximações sucessivas. Retroações e antecipações (ações de vaivém), vêm determinar as condições de interiorização, que se apresentam sob forma de conservação coerente, que se inicia na fase II. A ação de vaivém, necessária à comparação de conjuntos, permite a compreensão de uma regulagem, que anuncia a reversibilidade própria das operações da fase III (período formal). Retroações e antecipações envolvem dois métodos de sentidos opostos: reunião de coleções menores em maiores (método ascendente); partindo das qualidades genéricas de grandes agrupamentos, subdividindo-os em sub-coleções (método descendente). Observa-se todas as combinações possíveis entre os dois métodos durante o processo de desenvolvimento. A criança do nível II não atinge

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completa coordenação entre os dois métodos: coordenação e diferenciação entre compreensão e extensão não se completam ainda.

A regulação do “todos” e do “alguns”, exigida pelo esquema de inclusão, tem como base a coordenação do processo ascendente A+A`=B (operação direta) com o descendente B-A=A´(operação inversa). A síntese entre os métodos ascendentes e descendentes adquire estabilidade na fase III através de um processo de compensação por reversibilidade: toda transformação no sentido ascendente corresponde a outra no sentido descendente.

Na ordem ascendente de composição, a dialética conduz das assimilações elementares (ou diretas) às coordenações inferenciais dos esquemas (assimilações recíprocas) mentalmente representadas.

Na ordem descendente há justificações e multiplicações de possibilidades ao mesmo tempo. Antes da linguagem, as inferências em jogo não se baseavam em enunciados verbais, mas nas significações inerentes ao puro “saber fazer”, já presente em comportamentos animais, anterior à compreensão conceitual.

O círculo dialético no plano conceitual é um caso mais geral que engloba o sensório-motor e o representativo: trata-se de círculo fundamental das significações e de suas implicações. A conexão lógica, em sentido amplo, engloba conceitos e julgamentos em todos os níveis. Na ordem ascendente, os instrumentos do conhecimento apresentam-se sob a forma de (a) conceitos como amalgamas de predicados; (b) Julgamentos como relações entre conceitos; (c) inferências como uma composição de julgamentos. Na ordem descendente de justificação, todo julgamento repousa sobre inferências, como por exemplo,“isto é um pinho” (julgamento), porque tem pinhas e folhas de pinho. O emprego do conceito exige julgamentos. Predicados são frutos das comparações de vários aspectos. Por exemplo, “verde” significa da “mesma cor da relva”, etc., constituindo uma relação “co-verde”. A lei de composição que conduz dos predicados às inferências será: predicados aglomerados objetos conceituais; reunião de objetos conceituaisconceitos baseados em julgamentos; coordenação desses julgamentos inferências (fonte dos encaixes superiores ou intersecções). O predicado não constitui qualidade única isolável, mas propriedade comum a vários objetos conhecidos.

O problema da dialética em lógica apresenta-se como o mais geral do conhecimento: construção de interdependências entre subsistemas encaixados, que se conservam sem oposição. Contudo, na

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dialética da matemática, os subsistemas são de direções diferentes: adições e subtrações.

Implicações Pedagógicas e Conclusões

Diante dos estudos da Epistemologia Genética, a Didática perde sua significação normativa concebida como método de ensino. A melhora do ensino e da aprendizagem passa ser subordinada à elaboração de um saber teórico resultante de sua colocação à prova experimental, partindo-se de princípios psicogenéticos com as práticas contextualizadas em campos conceituais específicos (VERGNAUD, 1991). A teoria didática não fornecerá ao professor(a) um inovação para ser aplicada, mas deve permitir-lhe compreender os fenômenos de sala de aula sob a luz de sólidos conhecimentos de Epistemologia Genética. Por exemplo, pesquisas sobre numeração denotam que há o problema da inclusão, da seqüência dos números, da conservação, da manipulação dos signos, da composição e decomposição do todo em diferentes formas.

Além destes aspectos, nossos estudos sobre a construção das operações têm considerado a numeração posicional, mantendo sempre presente que há uma relação entre significante e significado. Assim, o problema é considerado em termos de sistemas de significantes, pois um significante exprime somente parte do significado. Por exemplo, na construção das operações, as ordens direta e inversa são consideradas, bem como as diferentes formas de expressão dos significados. Por exemplo, na ordem direta, a multiplicação 2X3=6, pode ser expressa pela soma (3+3=6); por uma contagem crescente em números cardinais e ordinais (0, 3, 6; 0, 3º, 6º); por um relatório ou por um problema. Na ordem inversa: divisão (62=3), subtração (6-3=3; 3-3=0), contagem decrescente de três em três em números cardinais e ordinais (6, 3, 0; 6º, 3º, 0), relatório ou problema (MONTEIRO, 1991, 1996, 1998).

A verbalização reconstrói e ressignifica o esquema prático, segundo Piaget e Vergnaud (1991, p. 278). Ao abordar a situação problema e a situação didática, Piaget evoca as escolas “ativas”, que se esforçaram por criar situações, que por si mesmas não são “espontâneas”, mas que provocam uma elaboração espontânea da parte da criança.

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Subjetividade: a dimensão subsumida da formação do(a) professor(a)

Maria Neide Sobral da Silva1

RESUMO: Este estudo foi estruturado a partir de nossa prática docente, possibilitando uma reflexão sobre a dimensão subjetiva do(a) professor(a), que é geralmente subsumida durante a sua formação. Tomando a escola como lugar de vida, enquanto é espaço privilegiado para o desenvolvimento multidimensional do ser, no qual relações se determinam, se minimizam e se transformam, procuramos realizar um estudo de caráter bibliográfico, apoiando-nos em uma abordagem multirreferencial (Ardoino e Barbier, entre outros), por tratar da subjetividade do(a) professor(a), como parte de um conjunto de inter-relações construídas ao longo de sua formação.

Palavras-chave: Subjetividade; Prática docente; Professores-Formação

ABSTRACT: This paper has been structured based on teaching practice, allowing a reflection over the subjective dimension of the teacher, usually underestimated during formative years. Taking school as life environment - a privileged place for multidimensional development of being, in which relationships take place, are minimized and go through changes -, this is a bibliographical study supported by a multirreferential approach (Ardoino and Barbier, among others). It considers the subjectivity of teacher as part of a series of inter- relationships developed throughout the academic trajectory of the professional.

Keywords: Subjectivity; Teaching practice; Teachers-Education

1 Professora da Universidade Federal de Sergipe.

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Uma Possível Trilha

Os avanços da ciência e da tecnologia na atualidade vêm provocando, além de mudanças substanciais na sociedade, a desconstrução e, ao mesmo tempo, a reconstrução do conteúdo e da forma de produzir e entender o conhecimento científico. As fronteiras entre objeto e sujeito estão sucumbindo diante do redimensionamento dos novos paradigmas de pensar a realidade. As ciências, até então caolhas, mecanicistas e reducionistas, abrem-se, mesmo que ainda de modo embrionário, ao diálogo entre elas e com os saberes desvalorizados, aqueles que são locais, singulares e prescritos (FOUCAULT, 1979). E, mais, contrapõem-se às concepções que pressupunham a Ciência como uma "explicação e uma interpretação verdadeira da realidade, tal como esta é em si mesma" (CHAUÍ, 1999, p. 252).

É a partir da mudança paradigmática que muitos cientistas procuram entender a Ciência como entendimento aproximativo da realidade não só na lógica racional e no empirismo, mas também em outras formas de conhecimento como, a exemplo, as da intuição e dos processos meditativos. A intuição, enquanto um meio de perceber a realidade sem a mediação do raciocínio, traz à tona realidades interiores do indivíduo, quer seja através de processos introspectivos, quer seja por construções de imagens simbólicas como as dos sonhos, que seja, também, por ‘insights’ pessoais, repentinos e involuntários. Mesmo sendo o caminho mais usado pelos místicos para chegar à “verdade", muitas das observações e deduções científicas tiveram suas origens nesses processos.

Neste sentido, as crenças, as atitudes e outros processos mentais e emocionais podem levar o pesquisador a outras verdades, nem sempre previstas. Também as expectativas, os preconceitos e autoritarismos do pesquisador favorecem a percepção do mundo, do outro e de si mesmo, evidenciando o comprometimento, consciente ou inconsciente, das leituras que realiza dos fenômenos sociais.

Por conseguinte, concordamos com os multirreferencialistas (ARDOINO e outros, 1998), quando afirmam que as práticas sociais devem ser lidas de forma plural, partindo-se de vários referenciais, não redutíveis uns aos outros (heterogêneos), que possibilitam o entendimento multidimensional de um objeto. Seria como subir a um mirante e, do alto, olhar o mundo de todos os lados, tanto na vertical quanto na horizontal, vendo-o por uma multiplicidade de perspectivas ou,

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como afirma Morin (1986), um ‘metaponto’ de vista. O conhecimento, nesta perspectiva, deve servir ao investigador tanto para conhecer os objetos, como a si mesmo.

Nas ciências, uma dimensão subsumida foi sempre a subjetividade que, limitada aos estudos de psicólogos ou escondida nas dimensões ideológicas, econômicas e políticas, era desprezada quanto à sua essencialidade como motriz da existência. Por isso, é preciso construir uma outra trilha, na qual a investigação científica não se reduza ao aspecto cognitivo, mas, principalmente, se volte à dimensão simbólica da subjetividade, aquela que está "abaixo do limiar da consciência" (JUNG, 1998, p. 23), religando a dimensão ontológica do ser ao seu sentido transcendental.

Apoiando-nos em uma literatura de perspectiva neomarxista para a da complexidade, discutiremos a questão da subjetividade a partir de uma leitura plural e transversal para, em seguida, verificar de que forma a sua dimensão, subsumida nos cursos de formação do(a) professor(a), pode ser considerada. Apresentaremos alguns eixos teórico-metodológicos que possibilitem uma reflexão/ação para a formação dos/as professores (as), considerando, em particular, o magistério como profissão eminentemente feminina.

A Trilha a Ser Percorrida

A subjetividade, em termos teóricos, pode ser explicada, de modo restrito, como conteúdo identificador do ser, ou como uma totalidade dinâmica, biológica, psicológica, social, cultural, cósmica e indissociável, conforme ressalta Barbier (1996), que transcende tanto as explicações neomarxistas como as cognitivistas.

No primeiro caso, o recorde da subjetividade é expresso na construção do EU, sendo,

"pois, a relação de interdependência entre a subjetividade (interação dos ‘drives’ com a vida cotidiana) e a objetividade (interação do cotidiano de todos os homens na suma inelutável relação consigo mesmo, com os outros homens e com a natureza no processo histórico)" (MONTEIRO, 1995, p. 267).

Nessa visão de subjetividade, considera-se que ela é decorrente da atividade cotidiana humana, efetivada através da produção da vida, das emoções, dos sentimentos, dos valores, dos pensamentos e dos meios culturais. Todos esses elementos são subjetivados a partir da realidade objetiva. Homens e mulheres, sujeitos de uma dada realidade, assumem a construção do processo histórico através de suas

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experiências (THOMPSON, 1981). Neste caso, o sujeito é, a partir da intersecção com o outro e com o mundo, o que o indivíduo pensa e faz, conformando-se ao seu contexto ou transformando-o. O intelecto é cultivado, o coração exilado sem ser desconstruído. A luta pelo social, na busca de emancipação política e econômica, torna fecunda a tomada de consciência do sujeito histórico. Vislumbra-se, deste modo, uma perspectiva paradisíaca na terra, a de um mundo de iguais condições de sobrevivência material e cultural.

O segundo caso não subsume integralmente o primeiro, mas desloca-se para uma outra compreensão que emerge como de uma plenitude cósmica, um todo no mundo que se resguarda apenas como singularidade. Neste caso, segue-se a linha da incerteza e da incompletude em busca de um novo realinhamento, de uma nova regulação que nos permite pensar numa outra interpretação da subjetividade, a de uma ética em que o ‘eu’ e o ‘outro’ se fazem tanto no mundo como com ele.

Nesta trilha, a subjetividade ativa uma nova discussão no deslocamento para a nossa condição de professor/a e de sujeito aprendiz. Partimos da idéia de Khun (1978), a de que a transição de um paradigma em crise para um novo não é um processo cumulativo, mas, sobretudo, de reconstrução. Assim, uma reconstrução da área de estudos em função de novos princípios leva-nos a trilha da complexidade que comporta os sentidos da incompletude e da incerteza.

Morin (1996) ressalta a sua noção de sujeito chamada de ‘biológica’, a da lógica própria do ser vivo em que se sustenta a visão mecanicista e determinista da Ciência clássica. Esse sujeito detém a autonomia compreendida como auto-organização, porém há "uma profunda dependência energética, informativa e organizativa a respeito do mundo exterior” (Idem, 1996). A essa noção de sujeito, Morin acresce a de indivíduo, colocando-o também no plano biológico, como produto e produtor das interações. Ele afirma que a sociedade é uma organização que tem qualidades próprias, como, em particular, a linguagem e a cultura. Assim, o sujeito implica, necessariamente, uma relação de dependência e de autonomia, enquanto organização viva que se ‘auto-eco-organiza’. Como vivente, o sujeito é um ‘eu computo’: isto é, um ‘eu’ que se ocupa da informação para tratar tanto o mundo interno como o externo. Nesse movimento, ele descobre a finalidade de si mesmo, se autoconstitui em sua própria identidade. Essa autoconstituição é complexa. Nela, o sujeito passa a referir-se a si mesmo, diferenciando-se

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do outro, num processo de ‘auto-eco-referência’. Para referi-se a si mesmo, ele tem que, necessariamente, referir-se ao mundo exterior.

Neste sentido, Morin define o sujeito como um "entrelaçamento de múltiplos componentes", um sujeito vivendo num “universo onde existe o acaso, a incerteza, o perigo e a morte (...), trazendo em si a fragilidade e a incerteza da existência, desde o nascimento até a morte” (Idem, p. 52). É preciso compreender a noção de sujeito como uma estrutura organizadora, associando noções antagônicas, “a exclusão e a inclusão, o seu, o ele e o se" (Idem, p. 55), através de “um pensamento chamado complexo, ou seja, um pensamento capaz de unir conceitos que se rechaçam entre si e que são suprimidos e catalogados em comportamentos fechados" (Idem).

É preciso ir mais adiante, buscando em Jung um outro quê desta subjetividade, o desvelamento do lado das sombras do homem, daquelas facetas escondidas de sua presumida consciência, o inconsciente individual e o inconsciente coletivo. No primeiro caso, Jung aponta o conteúdo reprimido e, no segundo, os arquétipos, ou seja, as imagens, os símbolos e conteúdos de caráter universal expressos em formas mitológicas.

Jung faz uma reflexão sobre o homem moderno, afirmando que este, apesar de ter excluído muitas das ações dos primitivos (batuques e orações), em troca do seu “querer é poder", no qual une racionalidade e eficiência, como sua nova superstição, ainda conserva as forças que fogem ao seu controle, seus deuses e seus demônios. Elas se manifestam, por exemplo, na inquietação, nas apreensões vagas, nas sensações de vazio, nos problemas psicológicos, nas neuroses, o que significa que, mesmo civilizada a nossa consciência, a nossa índole primitiva e os nossos instintos básicos não desapareceram. Afirma também que o homem acredita no Estado de Providência, na paz universal, nos eternos direitos humanos, na justiça, na verdade, no reino de Deus, quando, na verdade, a vida do homem é um complexo de fatores antagônicos, é uma batalha que tem que ser travada cotidianamente, na qual o sofrimento o leva a retomar os significados mais amplos da existência, que não se reduzem simplesmente ao ‘ganhar e gastar’. Sem eles, o homem se sente infeliz e perdido. O processo de individuação, ainda segundo Jung, significa “tornar-se um ser único, na medida em que por individualidade entendemos nossa singularidade mais íntima, única e incomparável, significando também que nos tornamos o nosso próprio si-mesmo" (1978, p. 49).

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Na medida em que vai construindo a sua ‘persona’ (máscara, segmento da psiquê coletiva), fazendo concessões ao mundo exterior, o indivíduo faz um auto-sacrifício em que força o seu ‘eu’ a identificar-se com a ‘persona’, acreditando que ele é o que imagina ser. Quando o indivíduo aprende a distinguir entre o que ele parece ser para ele mesmo e o que é para os outros, através do trabalho sobre si mesmo, segue a trilha de Barbier (1996), autorizando-se em suas escolhas com o corpo, com a imaginação, com a razão e a afetividade em constante interação.

A compreensão da subjetividade permite-nos seguir a trilha, buscando um entrecruzamento, a explicação de como o sujeito assume determinadas condutas sociais, de que forma ele agencia, em si mesmo, o sentido do outro e em que medida ele se constrói nas organizações sociais. Em se tratando do(a) professor(a), como este(a) se dispõe a qualificar alguém para qualificar outrem?

Na perspectiva de uma abordagem multirreferencial, a instituição escolar goza de autoridade e legitimidade, sendo o ‘locus’ de um fazer social-histórico, envolvendo a produção de atores e seus imaginários, motivações, crenças e vida inconsciente. É, portanto, lugar de vida em que relações são estabelecidas entre pessoas e grupos que se confrontam, entram em conflito, transformam-se, minimizam-se, dominam-se e determinam-se. É neste espaço que ocorrem práticas educativas sobre as quais é preciso debruçar vários olhares para melhor compreender o que elas são, como se realizam, a quem beneficiam, quem as faz e por que as fazem.

Neste sentido, cremos na possibilidade de tratar da subjetividade do(a) professor(a) como parte de um conjunto de inter-relações construídas no seu curso de formação profissional. Mesmo que se pretenda esta subjetividade limitada às fronteiras do desenvolvimento da chamada razão lógica, estende-se ela, inexoravelmente, a outras dimensões de seu ser. Assim, através da busca das interfaces que compõem a subjetividade como ‘auto-eco-organização’, efetivadas em mundos conscientes e inconscientes, volta-se às dimensões da formação do/a professor(a) até então marginalizadas.

Possíveis Pistas para a Construção de sua Subjetividade

Ao destacarmos o papel da escola de formação do(a) professor(a), não podemos escapar aos entendimentos de Freire (1996), sobre o que lhe deve ser feito e o que deve ele ser. É referente ao desenvolvimento de sua capacidade de ensinar com a rigorosidade metódica, da capacidade crítica e autocrítica, da capacidade de investigar

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a sua prática, respeitando sempre os saberes dos educandos, os adquiridos ou construídos na vida comunitária. Isto, segundo Freire, só é possível se o professor assumir-se como ser social e histórico, consciente de sua incompletude e daquilo que ensina. Desta forma, esclarece que o(a) professor(a) deve aprender a ensinar num misto de tolerância, alegria, esperança, fé na mudança, segurança, competência profissional e diálogo. Estes princípios apontados por Freire são relevantes, porém insuficientes para nos levar à trilha que propomos. É ainda uma construção exterior de um fazer e um agir que não considera um mundo interior.

Nóvoa (em FONSECA, 1997) acredita que, no processo de formação do(a) professor(a), por trás de uma lógica (uma razão) há sempre uma fila (um sentimento); por isso, torna-se importante mobilizar as dimensões pessoais nos espaços institucionais através de uma abordagem (auto)biográfica. Argumenta ele que, mesmo diante de diferentes momentos, mesmo diante da racionalização e da uniformização, cada um(a) produz em seu íntimo uma maneira de ser professor(a). Este ser professor(a) se traduz no espaço institucional da escola, da escola (in)visível) e (não)oculta, como concebe Elzirik & Carmelato (1995), que produz poder e subjetividades. Por isso, é preciso pensar na formação do(a) educadora(a) também a partir da ‘diferença’, tanto do ponto de vista social quanto psíquico. Caso contrário, este profissional poderá, no embaralhamento da escola, no encontro com o outro, o ‘diferente’ (por exemplo, o aluno ‘indisciplinado’ ou o que ‘não aprende’), frustrar-se e ter comprometida, assim, a imagem que faz do(a) ‘bom’ (boa) professor(a) em prejuízo, não raramente grave, de sua própria identidade. Neste percurso, emerge dentro do(a) professor(a) "a luta, a solidão, a negação do outro que contradiz" (Idem, p. 106-107), enquanto ele(a) nega e contradiz a si próprio(a), pondo em cheque aquilo que é como professor(a).

Assim, a prática educativa de formar o(a) professor(a) deve compreender os aspectos que ousamos delinear a seguir:

o de permitir ao (à) professor(a) desenvolver-se como eterno sujeito-aprendiz, na perspectiva de que ele, indo muito além do ‘ensinar’ o saber, ensine a aprender a aprender;

o de habilitá-lo(a) para sair da condição assemelhada à de uma ‘lagarta em seu casulo’ para transformar-se em ‘borboleta’ (como lagartas, muitos(as) ‘morrem no casulo’) e investir-se na condição de

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professor(a) que rompe o fechamento e a rigidez da ‘verdade absoluta’, abrindo-se para o imprevisto, para o aleatório e a desordem, sempre em busca do novo e do genuíno;

o de capacitá-lo para a autocrítica e autonomia perante os desdobramentos políticos e econômicos da prática educativa, de forma que se habilite na resistência a tudo que entenda como desumano, destrutivo, limitante à construção da personalidade e violador do ato de ser;

o desenvolvimento de sua capacidade para auto-autorizar-se frente às complexidades das limitações e imposições da ordem social, política e econômica;

o de compreender que todo conhecimento tem que, necessariamente, ajudá-lo a erguer-se no mundo e de que ele, o conhecimento, não é monopólio de quem diz que ‘sabe’ – como afirmam os sábios, aquele que sabe apenas é;

o de que o conhecimento acerca de si, do outro e do mundo se desenvolva em uma espécie de inteligência coletiva, concretizando-se uma sociedade que aprenda a aprender, a sonhar e a construir projetos menos sectários, corporativistas e individualistas;

o do desenvolvimento da ‘escuta sensível’ (BARBIER) e da auto-observação para que o(a) professor(a) seja capaz de empenhar-se com o seu coração e para ele;

o de aprender a trabalhar com o 'diferente’ dentro e fora da sala-de-aula.

Pensar na formação de professor é pensar em uma profissão feminina. É pensar na mulher que, historicamente, tem assumido a função de educar a sua prole e também as gerações do mundo, sempre voltada à segurança, à proteção, à conservação, assumindo então o papel de ensinar ‘coisas’ na escola, que é o privado estendido ao público, o mundo dos homens, o perigo, o confronto, a liberdade. Mas é, sobretudo, o pensar numa profissão desprestigiada que carreou profissionais também desprestigiados, as mulheres, que percebem salários cada vez mais baixos.

Por isso, perguntamo-nos: qual é o papel que esta ‘mulher-professora’ deve assumir, para, de um lado, continuar resistindo às imposições de regras que ainda são ditadas pelos homens e, de outro,

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construir ‘novos valores’ que a permitam integrar-se assumida e plenamente à profissão?

Não se pode perder de vista que o curso de formação de professor é ainda constituído por uma maioria de mulheres. São elas que, muitas vezes, conformam valores de submissão, de inferioridade e de continuidade. Valores que depõem contra elas mesmas. São elas também que têm feito rupturas, avançando no espaço social, ‘desconstruindo’ os espaços restritos aos machos e caminhando nas interfaces dos poderes que sustentam a sociedade. São as mulheres que, a despeito do que são e do que fazem, possuem a linguagem da sensibilidade, da intuição, da solidariedade e da mediação (LOURO, 1997).

Retorno ao Começo

Percorremos a trilha, como estivéssemos seguindo percurso de um rio. Mesmo que este rio tenha num movimento ondular, sujeito às turbulências causadas pelas rochas e pelas descidas de terra, batendo nos solos tépidos, acariciando a vegetação rasteira às vezes frondosa, cortando florestas e regiões insólitas e outras descoloridas, acaba desaguando sempre em outro leito ou no mar. Deste modo, um tanto sem forma, fomos delineando a nossa maneira de pensar sobre como a escola pode contribuir para a construção do ser professor(a).

No encontro das águas doces de um rio com as de um oceano, marcado pela salinidade, há uma transmutação, uma colisão de sabores diferenciados, uma perda de originalidades iniciais, mesmo que haja a predominância do sal. Pelo menos naquele ponto de encontro, de mutação, algo de novo torna-se possível, pois, mesmo que a salinidade prevaleça ao deguste, não se pode perder da perspectiva da existência de elementos da água doce do rio.

Com esta metáfora, podemos marcar, neste texto, o encontro entre os ‘diferentes’ (ciências e autores), verificando a correlação de forças que engendram a dinâmica social, sendo ela exercida por um coletivo composto por "personas" que lhe imprimem suas marcas, resistindo, reagindo, delineando, delimitando, limitando, abrindo, falando, fazendo, omitindo, caminhando, aprendendo, permitindo, facilitando, motivando, desconstruíndo etc. É nestas pessoas que a educação deve centrar as suas matrizes teóricas e práticas, ‘de olho na água doce do rio’ que, mesmo em pleno mar, não deixa de existir.

Cabe à escola de formação do(a) professor(a) aprender mais com aqueles que acolhe, para ensinar-lhes a aprender a aprender e

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aprender a auto-autorizar-se. Caso contrário, teremos professores(as) cingidos(as), disjuntivos(as), fechados(as), envoltos(as) na tarefa hercúlea de transmitir saberes que o avanço das tecnologias e das ciências vem produzindo com um rapidez, a ponto de não lhes permitir uma atualização adequada. Neste sentido, não podemos perder de vista que, a despeito de ser o magistério uma profissão eminentemente feminina, homens e mulheres devem estar comprometidos com uma prática educativa, na qual as relações (intersubjetividades) são re-significadas a partir de uma nova ética em que o ‘eu’ e o ‘outro’ se fazem no mundo e com o mundo.

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Uma Nova Educação: por quê, para quê, como.

Peter Büttner1

RESUMO: A educação superada pela derrota do paradigma determinista necessita mutação paradigmática, porque a evolução evidencia o homem livre de programas instintivos automáticos, sobrevivendo somente pela autonomia cognitivo-criativa. Portanto, educar para desenvolver as habilidades dum pensar crítico-criativo-cuidadoso, dialógico-democrático é exigência da vida plena do cidadão gerador duma sociedade ética e ecológica que garante a vida, a paz e a felicidade de todos. Mas como? Superando a pseudo-educação decadente, passiva, alienante, autoritária, apenas instrutiva, fazendo sobrevir a educação interativa e dialógico-democrática do potencial humano pleno, da autonomia crítico-criativo-cuidadosa, orientada pelo metaparadigma filosófico-pedagógico lipmaniano, capaz de fundamentar uma vida de qualidade e dignidade.

PALAVRAS-CHAVE: Mutação educacional; Educação crítica; Cidadania

ABSTRACT: The education, surpassed by the defeat of the determinist paradigm, needs paradigmatic mutation, because the evolution evidences the man free from automatic instinctive pro-grams, only surviving with cognitive-creative autonomy. Therefore, the Education to develop abilities of critical-creative-careful and dialogical-democratic thinking, is a demand of citizen's full life with the intention to generate an ethical and ecological society that guarantees the life, the peace and the happiness of everybody. But how? Overcoming the decadent, passive, alienating, authoritarian and only instructive pseudo-education, ma-king to happen the interactive and dialogical-democratic education of the full human potential, of the critical-creative-careful autonomy, guided by the philosophical-pedagogical meta-paradigm from M. Lipman, capable to base a life with quality and dignity.

Keywords: Educational mutation; Critical education; Citizenship

1 Doutor, Professor do Departamento de Filosofia, ICHS/UFMT, e da Pós-Graduação em Educação, IE/UFMT, Grupo de Pesquisa Filosofia na Educação.

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Emergiu um novo paradigma de educação no processo da derrota do paradigma determinista e na corroboração da visão científica de sistemas abertos. Novas concepções contribuem para uma nova relação homem-natureza e homem-homem.

Surgiu a bioética, uma civilização ecológica, um cultivo das múltiplas inteligências e do pensar inteligente, junto com a globalização da economia que exige uma globalização de iniciativas que promovem o diálogo, a sociedade de responsabilidade e confiança, a denuncia do abuso do poder, a prática da solidariedade e cooperação e o movimento ecumênico e da construção da paz. A nova visão, o novo paradigma, se fundamentam sobre a nova realidade e procuram corresponder a esta.

Mais ainda: Conhecimentos científicos recentes evidenciam que no processo da evolução enquanto espécies não humanas adquirem e conservam a transmissão genética de programas instintivos automáticos, seguros e suficientes para a sobrevivência, a espécie humana se torna livre desses programas e desenvolve um potencial genético de autonomia do pensar e criar, do querer e agir. Essa autonomia obriga o ser humano a pensar e fazer por si mesmo

Por essa razão, tal capacidade, ao mesmo tempo livre e necessária, não nascendo pronta para construir soluções vivenciais eficientes e seguras, deve ser educada adequadamente para desenvolver as habilidades cognitivas dum pensar crítico-criativo-cuidadoso, dialógico e democrático. Exercitar esta qualidade do pensar é condição para uma vida plena e digna do cidadão construtor duma sociedade global de comportamentos ético-ecológicos que garantem a vida, a paz e a felicidade de todos. O atual paradigma educacional decadente – passivo, alienante, autoritário, quase exclusivamente instrutivo – nem objetiva, nem realiza isso.

O como educar do novo paradigma pode-se caracterizar pela ação pedagógico-filosófica da Filosofia para Crianças – Educação para o Pensar de Matthew Lipman, que instiga o desenvolvimento do potencial humano da autonomia da inteligência crítico-criativo-cuidadosa – constituindo-se metaparadigma duma educação holística que atende a dignidade e as necessidades humanas de maneira interativa, participativa e comunitária, dialógica e democrática, pelo método gerador “comunidade-de-investigação”. A mentalidade e habilidade cognitivas e dialógicas, democráticas e transformadoras, que se desenvolvem em comunidade-de-investigação nas salas de aula, aos poucos adquirem efeito de onda sobre a escola, o bairro, a cidade, a sociedade global. Exemplos comprovam a teoria.

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Como podemos entender a Filosofia para Crianças – Educação para o Pensar no sentido dum metaparadigma para uma educação holística (megaparadigma)?

A Filosofia para Crianças pode ser considerada um paradigma da Educação para o Pensar. A prática e a experiência de trinta anos revelaram que tanto sua men-talidade e sua ação pedagógicas, quanto sua didática e seus objetivos, extrapolam a área desta disciplina, dado que seus elementos educacionais são necessários para a educação como um todo, ou melhor, para a vida humana em sua plenitude. Evidentemente esta disciplina não pode constituir, ou substituir, um currículo. São seus elementos paradigmáticas que servem de modelo, isto é, que se tornam metaparadigma para o modelo maior e abrangente da educação que, depois de concebido e construído seria o megaparadigma que precisamos.

Entre outros objetivos desse metaparadigma o principal é educar para o pensar com qualidade filosófica. “Não se ensina Filosofia,“ diz Kant, “ensina-se a filosofar.“ Trata-se de uma atitude, de um fazer filosofia e do desenvolvimento das habilidades correspondentes a esta tarefa do pensar. Entretanto, o pensar que deve ser desenvolvido nos alunos de filosofia não é um pensar qualquer. O objetivo é educar para um pensar de qualidade. Para identificar e compreender esta, torna-se necessário esclarecer diversas modalidades do pensar, as quais, em seu conjunto, constituem o pensar inteligente e razoável, que é conceitualmente rico, coerentemente organizado e persistentemente investigativo (LIPMAN, 1995, p. 37) visando à busca sem fim da verdade e aproximação a esta pela atitude de investigar, questionar, construí-la e reconstruí-la sistematicamente, em vez da posse definitiva. Somente este pensar tem as características do filosofar.

Evidente que, no “Ensino de Filosofia”, não se pode tratar prioritariamente dum pensamento de certo conteúdo, mas de habilidades e do caráter da atitude do pensar, do filosofar que se constituiu atitude de todos os seres humanos. Não pertence, portanto, apenas aos filósofos, como o calcular não é exclusivo aos matemáticos. Todos concordam, no entanto, que calcular precisa ser aprendido, assim como ler e escrever. Como, então, julgar que não se precisa aprender a filosofar? Além do mais, ele está, ou deveria estar, nas demais atitudes humanas e, de certo modo, sempre está, mesmo que de maneira fraca, errada e insuficiente.

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Nas páginas seguintes, procurarei evidenciar, num primeiro momento, algumas características genéricas do filosofar. Posteriormente, acentuarei o que seja o pensar crítico, o pensar criativo, o pensar cuidadoso, que juntos constituem uma tríade inseparável.

O que é filosofar ?

A procura da verdade e a humildade, como elementos fundamentais do filosofar, merecem aqui um destaque. A essência da filosofia é a procura do saber e não a sua posse. Não é dogmatismo, isto é, saber posto em fórmula, definitivo, completo. Fazer filosofia é estar a caminho; as perguntas em filosofia são mais essenciais que as respostas, e cada resposta transforma-se numa nova pergunta. Há, então, na perspectiva filosófica uma humildade autêntica que se opõe ao orgulhoso dogmatismo do fanático: o fanático está certo de possuir a verdade. Assim sendo, ele não tem mais necessidade de pesquisar e sucumbe à tentação de impor sua verdade a outrem. Acreditando estar com a verdade, ele não tem mais o cuidado de se tonar verdadeiro; a verdade é seu bem, sua propriedade, enquanto para o filósofo é uma exigência. No caso do fanático, a busca da verdade degradou-se na ilusão da posse de uma certeza... A humildade filosófica consiste em dizer que a verdade não pertence mais a mim que a ti, mas que ela está diante de nós. Assim, a consciência filosófica não é uma consciência satisfeita com a posse de um saber absoluto, nem uma consciência infeliz, presa das torturas de um ceticismo irremediável. Ela é uma consciência inquieta, insatisfeita com o que possui, mas à procura de uma verdade para a qual se sente talhada. (citação livre dum trecho da p. 24 em: HUISMAN, DENIS E VERGEZ, A ação. 2ª ed. São Paulo, Freitas Bastos, 1966. v. 1)

Atitudes básicas do filosofar são, sem dúvida, o questionamento crítico de princípios universais e de causas e efeitos das coisas e dos fenômenos, tanto como discernir o falso ou parecido do verdadeiro, o não válido do válido, o incoerente do coerente. É característico para a mentalidade filosófica de julgar e de tirar conclusões somente depois de investigar a realidade critica- e rigorosamente em seu contexto e em suas interrelações. Unicamente os resultados desta investigação permitem julgar criteriosamente (criticar) a realidade que se apresenta, seja esta de situações, crenças, opiniões, experiências cotidianas, conhecimentos e procedimentos científicos, ou ainda, outra coisa qualquer. O processo do filosofar, para atingir resultados válidos, mesmo que não definitivos, exige sistematizar criteriosamente o saber, com precisão e rigor.

Pelo exercício do filosofar se desenvolvem cada vez mais as habilidades cognitivas e criativas e, se for realizado em comunidade com outras pessoas, também as dialógicas. Os critérios de julgamento se aguçam e tornam mais prontas e disponíveis. O poder de decisão se aperfeiçoa no sentido de qualidade e rapidez, e o espírito criativo

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desabrocha incrivelmente ao ponto de encontrar respostas novas, pioneiras e eficientes, mesmo em situações imprevisíveis e de apuro. Aos poucos, o iniciado no filosofar se torna convicto de que o senso comum não é suficiente para uma visão adequada do mundo, para o agir no cotidiano e para a sobrevivência e uma vida feliz da humanidade.

O filosofar deve ser entendido, portanto, como um questionamento aberto e dialógico-interativo que se confronta com a realidade como sistema aberto, indo de horizonte em horizonte, tentando esclarecê-la. Deve ele ser conduzido de tal maneira que construa conhecimentos intersubjetivos (objetivos), necessários e relevantes. Não pode-se originar somente da experiência e nem se sustenta só por esta, pois a consistência do saber filosófico e científico está na teoria construída por reflexões, deduções e conclusões racionais a respeito do experimentado. Bem assim, deve proporcionar uma visão unitária e complementar do mundo, valorizando e promovendo a sobrevivência e a convivência social, também em termos éticos e ecológicos.

O filosofar, principalmente em comunidade de investigação, habilita para a descoberta, a escolha e a construção de valores, assim como para a distinção de valores e conhecimentos, tanto subjetivos quanto intersubjetivos (objetivos), e para a situação correta da validade deles.

Em relação ao “Ensino da Filosofia” como Educação para o Pensar, temos de nos ocupar agora com alguns aspectos fundamentais do filosofar.

O Pensar Crítico

O filosofar é um pensar de criticidade. Esta palavra vem de krinein que inicialmente em grego significava cortar. Onde há um corte, há uma divisão. Há coisas que não podem ser divididas de qualquer jeito, por exemplo o pano para roupa, as terras de herança. Portanto, impõem-se critérios, palavra que justamente vem da raiz kri do verbo krinein, que passou para o significado de julgar e ponderar onde, como, quando e de que tamanho o corte deve ser feito. Para isso, deve-se distinguir entre diversas coisas. Assim, o verbo krinein adquiriu todos estes significados, já na Grécia antiga. O juiz foi chamado de krítes, pois ele tinha de discernir e julgar com critérios. Os filósofos entenderam o filosofar deste jeito. Não julgaram porém réus, mas a realidade, a natureza (fisis), o caminho que leva a sua compreensão (met´-hodos), o ser (on), o homem (ánthropos), a sociedade (pólis), o dever e o dever-ser (éthos, areté), como ainda outras problemáticas e mesmo os próprios critérios para

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chegar à verdade (aléteia). Com o discernir entre o errado e o verdadeiro, entre o belo e o feio, entre a necessidade (anánke) e o desnecessário, nasce a criticidade que tem, no discernimento, o seu mais profundo significado. O específico do pensar crítico, Matthew Lipman explicitou no seu livro O Pensar na Educação. Procuro aqui sintetizar suas principais idéias para facilitar-lhe a compreensão e fundamentar o diálogo sobre o assunto.

A experiência passada nem sempre é uma orientação segura. Por isso devemos recorrer a julgamentos de possibilidades. O grande perigo nesta situação são conclusões precipitadas, generalizações radicais, nossos preconceitos e predisposições e nossa compreensão lógica falível. Somos constantemente solicitados a fazer julgamentos para os quais nem nossa razão, nem nossa experiência nos prepararam.

Hoje estamos bastante conscientes do profundo abismo que separa o pensamento que as escolas nos prepararam a fazer, e as decisões que somos solicitados a tomar. O perigo apercebido da maneira acrítica dos nossos conhecimentos provocou uma virada na educação em direção ao pensar crítico que facilita o julgamento, se fundamenta em critérios, é autocorretivo, e é sensível ao contexto. (LIPMAN, 1995, p. 172)

É um pensar responsável, um julgamento inteligente, excelente e temperado pela experiência. Existem julgamentos práticos, produtivos e teóricos, como diria Aristóteles. Desde que façamos estes julgamentos bem, pode-se dizer que nos comportamos de maneira sábia...Um julgamento é, portanto, uma determinação do pensamento, da fala, da ação ou da criação... Estes terão a probabilidade de ser bons julgamentos se forem produtos de atos habilmente desempenhados, orientados ou facilitados por instrumentos e procedimentos adequados. (LIPMAN, 1995, p. 172)

Ao contrário do pensar arbitrário e superficial, ele constitui pensamento bem fundamentado, estruturado e reforçado. Isto significa que ele está sustentado por razões. Também quando existem assuntos sobre os quais preferimos não refletir publicamente, o traçar linhas divisórias deve partir da nossa escolha e iniciativa. (LIPMAN, 1995, p. 176). Este ato de preferir não refletir implica também boas razões e, com certeza, um critério, seja qual for.

Confiar em critérios bem fundamentados é uma maneira de depositar nossos pensamentos sobre uma fundação sólida. E mais: através da lógica podemos estender de maneira válida nosso pensamento. Através de razões como critérios, podemos justificá-lo e

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defendê-lo. A melhoria da qualidade do pensamento e seu sucesso dependem da capacidade de identificar e citar boas razões, relacionadas com a opinião vertente e ainda mais fortes, mais convincentes, como esta. O pensar crítico, ao contrário dum julgamento intuitivo, implica responsabilidade cognitiva, o que quer dizer pensar por nós mesmos, sentindo a obrigação de fornecer razões para as nossas declarações expressas.

Se os critérios são fatores de orientação em nossas vidas, precisamos saber mais sobre eles (LIPMAN, 1995, p. 187). Quase nada existe no sistema do ensino tradicional e atual que pudesse dar conta desta tarefa de capacitar nossas crianças neste campo. Assim, pode-se constatar que os alunos, que não são instruídos a utilizar critérios de maneira sensível ao contexto – com visão da totalidade e do relacionamento de suas diversas partes – e ao mesmo tempo autocorretiva, não estão aprendendo a pensar criticamente. No processo da aprendizagem do pensar por si mesmo se conquista, portanto, no mesmo ato, responsabilidade e autonomia no pensar. O uso freqüente de boas razões aumenta a racionalidade, a capacidade de construir pensamentos razoáveis.

O Pensar Criativo

Agora, certificados de que o pensar crítico possui uma preocupação primordial pela verdade, e ainda, apresenta um interesse genuíno em evitar o erro e a falsidade, compreendendo, deste modo, seu controle como autocorretivo, procura-mos internalizar que o pensar criativo, mais voltado para a invenção e a totalidade, controla-se através do objetivo de ir além de si mesmo, transcendendo-se, assim como através do objetivo de alcançar a integridade. (LIPMAN, 1995, p. 279).

O pensar criativo não é acrítico nem irracional. Não é insensível a considerações analíticas e a critérios. Ainda que assim, a ênfase do seu objetivo é avançar no espaço desconhecido, transcender que já existe, criando o novo. As três maneiras do pensar devem ser orientadas pela situação específica da investigação, em que são utilizadas, e devem ser sensíveis ao perfil e à configuração daquela situação.

Enquanto o pensar crítico realiza isto pela busca de critérios e conceitos, e orienta o rumo da investigação por meio deles, a sensibilidade do pensar criativo se preocupa com a maneira como a qualidade universal incorpora valores e significados, deixando-se orientar por esta ou aquela direção. Talvez seja suficiente observar, que uma parte do pensamento é orientada por critérios e a outra é orientada por

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valores que tomam conta de todo o contexto no qual o pensamento ocorre (LIPMAN, 1995, p. 282-283).

Podemos concluir, daí, que o pensar de ordem superior requer interpenetração de todas as modalidades diferentes no mesmo eixo de comportamento mental da investigação que realizamos: a racional, a criativa e, como veremos, a cuidadosa. Juntas não produzem resultado meramente aditivo, mas multiplicativo e qualitativo, pois possibilitam tramar uma variedade de combinações, das quais podemos inferir: ... tanto a racionalidade quanto a criatividade partilham de uma mesma ordem, da qual os extremos são, por um lado, intensificar a racionalidade e diminuir a criatividade e, do outro lado, intensificar a criatividade e diminuir a racionalidade. No centro, é claro, está a área de equilíbrio, a da racionalidade criativa. Há um germe de racionalidade em toda criatividade e um germe de criatividade em toda racionalidade, assim como o cognitivo sempre desempenha um papel naquilo que é predominantemente afetivo, e o afetivo sempre desempenha um papel naquilo que é predominantemente cognitivo (LIPMAN, 1995, p. 284).

Mas, o que origina a criatividade? São principalmente os fatos fora de comum, os imprevistos, as injustiças, o desespero, o medo, a necessidade, o fantástico, que exigem reflexão e conseqüentemente inferências. Estas, então, apontam novos caminhos, justamente porque ninguém havia pensado previamente sobre a possibilidade do imprevisto. Por outro lado, diz Lipman, cada possibilidade especulativa que uma criança menciona, pode ser baseada em uma série de suposições preexistentes. A fase inicial da investigação compreende: 1) a invenção imaginativa. A fase subseqüente compreende 2) a revelação daquilo que estava sendo suposto ou desprezado, implicando, portanto, 3) a descoberta.“ (LIPMAN, 1995, p. 285-286).

A criatividade nasce também da percepção do incompleto e implica simplesmente a amplificação dum pensamento, duma idéia, dum plano, duma invenção.

A imaginação, elemento da criatividade, pode ser concebida como uma vasta indústria cognitiva, porém semidissociada, na qual os esquemas autônomos fabricam e fazem um estoque de materiais imaginativos semelhantes à nossa experiência consolidada. A riqueza e a importância dessas matérias imaginativas não se manifestam somente nas artes, nem apenas em jogos, brincadeiras e piadas, mas mesmo na construção de hipóteses científicas e construtos semelhantes e em nossa comunicação e vivência de cada dia, podendo dar-lhes sabor, originalidade e alegria.

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Cultivar o mundo da imaginação e da criatividade da criança, obviamente, não significa negligenciar o desenvolvimento de sua capacidade de pensar por si mesma. Pensar por si mesmo é de cheio uma criatividade e esta um pensar por si mesmo.

O pensar criativo é também uma forma de investigação. Não se pode afirmar que ele eqüivale a toda a criatividade. Ele representa somente um aspecto dela.

O Pensar Cuidadoso - Caring as Thinking.

O filosofar, já pela raiz fil presente neste verbo, implica a atitude de atenção, de cuidado, de carinho. Como entender essa atenção?

Quando pensamos criticamente, estamos aplicando ao nosso pensar regras, critérios, normas, razões e prescrições que são racionais e adequados para este fim. Quando pensamos criativamente, estamos inventando caminhos para expressar a nós mesmos ou o mundo ao nosso redor; estamos tentando ultrapassar os caminhos que pensamos no passado; estamos imaginando detalhes de mundos possíveis e pro-pondo inovações não precedidas. Quando pensamos cuidadosamente, somos aten-ciosos com o que achamos importante, com que temos sentimentos afetivos com aquilo que nos exige, requer ou necessita para pensar sobre ele. (LIPMAN, s/d).

Pensar sobre aquilo que pode ser feito no mundo, significa ter em conta o impacto circunstancial daquilo que é para fazer. Lipman exemplifica: pensar sobre os avôs ou sobre as crianças, que não podem cuidar de si mesmos, exige a séria consideração de como devem ser atendidos e da prioridade que deve ser dada a este pensar por causa de sua relevância. O pensar cuidadoso, portanto, não se esgota em classificar; ele tem de calcular e ordenar, determinar prioridades e daí inferir o mais urgente. Isto demonstra que os três tipos do pensar não estão hermeticamente fechados em si, mas, ao contrário, se entrelaçam, atuam com qualidades iguais ou semelhantes, direcionadas a necessidades e campos de atenção diferentes. Certas circunstâncias complicam tanto a reflexão que, para torná-la crítica, precisa ser criativo. Em outros casos, o pensar criativo exige organização precisa e racional de modo que apresente as características da criticidade e da criatividade. Pode haver, ainda, situações do pensar cuidadoso que demonstram alta compreensão crítica e idéias inovadoras. É próprio de sua natureza apagar distinções e hierarquias quando se tornam odiosas e, com isso, perderam sua utilidade.

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Como principais características do pensar cuidadoso, Lipman coloca o pensar valorativo, o pensar afetivo, o pensar ativo e o pensar normativo.

Avaliar quer dizer prestar atenção naquilo que é significativo e relevante. As pessoas dão atenção àquilo que lhes significa algo: médicos à saúde, artistas à arte etc. Esta atenção, seja valorativa, afetiva, ativa, seja ainda normativa, não é meramente emocional, mas carregada de valores cognitivos genuínos.

Um tipo do pensar ativo é, p. ex., o pensamento protetor e conservador que as pessoas usam quando protegem e preservam seus valores, sejam eles ideais ou materiais, quando conservam sua aparência, sua juventude, etc. Quando esta atenção se dirige a outras pessoas, este pensar pode ser também afetivo, dependendo da intenção.

Algumas situações requerem comportamentos meramente mecânicos, outras, contudo, julgamentos criativos. Aos comportamentos correspondentes às últimas, Lipman chama de atividades cognitivas. Cada julgamento expressa algo da pessoa que o faz e é característico para o mundo dela. Cada ato é um meio que contribui para a revelação das circunstâncias de seu autor. O significado das ações e atitudes está relacionado aos projetos e esquemas que as concebem e operacionalizam, como o sentido das palavras está em sua conexão nas sentenças que as unem num corpo. Seus significados também podem ser encontrados quando relacionadas com as conseqüências que emanam delas, tanto como do seu relacionamento contextual.

O pensar ativo, por sua vez, consiste na interação de atividades, julgamentos e buscas de significados, diferentes das ações meramente mecânicas. Seu objetivo é operacionalizar inteligentemente e cuidadosamente as ações.

O pensar normativo é uma cooperação do pensar sobre aquilo que é com o pensar sobre aquilo que a rigor deveria ser. Este tipo de pensar é a maneira da educação moral no lar e na escola. A conjunção e cooperação da reflexão sobre a situação atual com a atitude normativa intensificam o componente reflexivo de ambos: da ação e da atenção. Uma pessoa atenciosa está sempre preocupada com as possibilidades ideais do comportamento cuidadoso, de maneira que a reflexão sobre o ideal se torna parte e peça da atenção prestada àquilo que atualmente acontece. Como o elemento normativo é sempre cognitivo, sua inseparabilidade de outros aspetos do comportamento atencioso simplesmente reforça a pretensão de qualidade cognitiva destes.

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Dado que as crianças são capazes de compreender o mundo como é, deve-se ajudar-lhes a pensar o mundo no qual querem viver e o tipo de mundo no qual de fato querem viver. Isto é o objetivo geral do pensar normativo.

Concluímos com o próprio texto de Lipman:1) pensar cuidadoso possui um amplo credencial de empreendimento cognitivo, mesmo que consista sobretudo em atividades mentais de baixa visibilidade como proteger, escolher, aferir, pesar, do que em atividades de alta visibilidade como inferir e definir. O cognitivo, contudo, não está restrito somente a atos de visibilidade alta. Igualmente como os órgãos vitais do corpo não são exclusivamente só aqueles que são encarregados de dramaticamente tocar a bomba como o coração e o pulmão. O fígado e os rins também são órgãos vitais.

2) Sem o pensar cuidadoso, o pensar de ordem superior estaria desprovido dum componente avaliativo. Quando o pensar de ordem superior não contém avaliação e valoração, corre perigo de tratar os assuntos a si confiados apática, indiferente e descuidadamente, e isto significa que este pensar seria prejudicado até mesmo na sua própria investigação. (LIPMAN, 1995, p. 22)

(...) nós sentimos emoções quando temos de fazer escolhas e divisões, e estas escolhas e decisões são balizas orientadoras de julgamentos. De fato, o papel da emoção no pensamento, o de contribuir na construção de julgamentos, é muito importante... Realmente, sejam as emoções indistinquíveis, sejam idênticas no que toca ao julgamento, em todo caso faz sentido perfeito dizer que a emoção é a escolha, ela é a decisão, ela é o julgamento. E isso é o tipo de pensar que merecidamente pode-mos chamar de pensar cuidadoso (caring thinking), se for comprometido com assuntos a respeito da importância. (LIPMAN, 1995, p. 23)

Com esta tríade do pensar crítico-criativo-cuidadoso, Lipman objetiva uma maior qualidade em toda a educação. A importância dessa qualidade pode ser con-cluída do fato de que a sobrevivência da humanidade depende dos discernimentos e dos respectivos critérios que os homens usam e irão usar para suas determinações, decisões e ações, sejam elas de natureza prático-cotidiana, científico-tecnológica, ou ética, sejam elas no campo socio-econômico ou na política. A situação da evolução do nosso telencéfalo humano nos condena a isso. A maior aspiração do ser humano não é, contudo, somente a sobrevivência, mas a vida com qualidade, dignidade e felicidade. Educar para um pensar de qualidade significa nada mais do que fundamentar tanto uma educação, quanto uma vida de qualidade e dignidade.

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Filosofia na educação

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História da educação

A Situação da Pesquisa Histórica sobre as Instituições Educacionais Brasileiras

Décio Gatti Júnior1

RESUMO: Trata-se da comunicação das reflexões teóricas realizadas a partir do percurso traçado em investigação coletiva no âmbito da História da Educação, especificamente, na área das História das Instituições Educacionais, no período de 1994 a 1998. A pesquisa desenvolveu-se a partir do trabalho de levantamento de fontes de interesse para a História da Educação nas cidades de Araguari, Uberaba e Uberlândia. Após conclusão desse levantamento o grupo de pesquisa optou pelo trabalho em duas frentes distintas, mas complementares: a construção de interpretações acerca da História dos colégios mais antigos dessas três cidades e a observação do ciclo de vida de periódicos educacionais antigos e das notícias sobre educação veiculadas na imprensa geral. Há uma série de procedimentos historiográficos que vêm se tornando comuns no trato das instituições, estabelecendo, dessa forma, um paradigma interpretativo que tem influenciado os jovens pesquisadores que se lançam em pesquisas dessa natureza.

Palavras-chave: História; Educação; Instituições

ABSTRACT: The Situation of Historical Research about Brazilian Educational Institutions. This paper relates the theoretical reflections undertaken following the course drawn in collective investigation in the field of History of Education, specifically, in the area of History of Educational Institutions, in the period of 1994 to 1998. Research was developed from the work of determination of sources of interest to History of Education in the cities of Araguari, Uberaba and Uberlandia. After concluding this determination, the research group chose to work in two distinct but complementary fronts: the construction of interpretations regarding the History of the oldest secondary schools of these three cities, and the observation of the life cycle of old educational periodicals and the news about education conveyed by the general press. There are a series of historiographical procedures that have become common in the treatment of institutions, establishing in this way an interpretative paradigm which has influenced young researchers that enter into research of this nature.

Keywords: History; Education; Institutions

1 Doutor em História e Filosofia da Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Professor de História da Educação do Centro Universitário do Triângulo e da Universidade Federal de Uberlândia.

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História da educação

Trata-se da comunicação das reflexões teóricas realizadas a partir do percurso traçado em investigação coletiva no âmbito da História da Educação, especificamente, na área da História das Instituições Educacionais, no período de 1994 a 2000, acerca dos processos de constituição e desenvolvimento das Instituições de Educação primária e secundária, na região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, no período de 1880 a 1960.

O recorte espacial restringiu o âmbito da investigação, inicialmente, as cidades de Uberlândia, Uberaba e Araguari, motivado tanto pelas dificuldades do grupo de pesquisa em manter sua atuação investigativa em cidades mais distantes de Uberlândia como pela centralidade que estas cidades possuem nesta região. Ficaram de fora, por enquanto, cidades importantes como Araxá, Patos de Minas, Patrocínio, etc.

Quanto a delimitação temporal, optou-se por iniciar em 1880, época do surgimento das primeiras escolas nestas cidades e mesmo na região e finalizar em 1960, época do boom quantitativo do número de escolas e da explosão do número de alunos nas escolas já existentes, dada as dificuldades de trabalhar com um leque tão ampliado de instituições novas que, nesse momento, interessam menos que o estudo sobre aquelas fundadas no final do séc. XIX.

Desse modo, é reforçado nosso objetivo geral de, por meio da análise particular das instituições de ensino mais antigas destas cidades, aprender o complexo processo de constituição do ensino escolar na região e, sobretudo das representações sociais construídas em torno desse processo de escolarização.

Nas últimas décadas, a pesquisa histórica passou por um intenso processo de renovação teórico-metodológico, no qual vem sendo valorizada a utilização tanto dos aportes teóricos oriundos do campo da História quanto das evidências, sendo que estas não se limitam mais aos documentos escritos, mas abarcam fontes orais, iconográficas, etc.

Nesse sentido, o processo de construção de interpretação acerca da vida das Instituições Educacionais beneficia-se, sobretudo dos avanços significativos dos estudos sobre representações sociais, cultura escolar, elite, trabalho, grupos e classe sociais, bem como da constituição de tradições historiográficas mais sólidas no campos da História Oral, História da Imprensa, História do Pensamento Educacional, História das Idéias, etc.

Para a elaboração dessa reflexão teórica foram consultadas diversas fontes de informação, tais como: a ainda pequena bibliografia

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nacional e internacional sobre o assunto, seja por meio da leitura de textos mais teóricos ou mesmo resultados de investigações sobre a temática instituições educacionais publicados em forma de livro. Além disso, é importante ressaltar que foram utilizados os resultados já alcançados em pesquisa nesse campo temático provenientes das investigações realizadas pelo Núcleo de Estudos e Pesquisas em História e Historiografia da Educação do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia, que é coordenado por cinco doutores da área de História da Educação, com a inclusão de diversos bolsistas de iniciação científica, aperfeiçoamento e mestrandos, ao longo dos últimos seis anos.

As inovações paradigmáticas, leia-se, de procedimentos investigativos no campo da História, impactaram sobre a produção da História da Educação, que se desvencilhou, nos últimos anos, da influência abstrato-filosófica, dos clérigos que ocupavam a cena acadêmica desta área de conhecimento e da influência macro-estrutural, operada pela Sociologia de base economiscista.

A História da Educação que, no Brasil, nasceu de "mãos dadas" com a Pedagogia, finalmente, posiciona-se, pelo menos, do ponto de vista paradigmático, na órbita da História e não mais da Educação. Sinal desse processo de mudança é o fato da Associação Nacional de História, em 1997, ter aprovado a criação de um Grupo de Trabalho dedicado à temática, mesmo que um grupo de trabalho da mesma natureza já exista há muitos anos entre os educadores em sua principal reunião anual, na ANPEd.

De certo modo, há um afastamento da produção proveniente do campo História da Educação do caráter prescritivo e justificador de antes e um redirecionamento no caminho da elaboração de interpretações sobre o passado educacional brasileiro em sua concretude, mediante consulta a uma série enorme de fontes primárias e secundárias que não mais apenas a legislação educacional.

Há um duplo movimento que tem beneficiado esse processo de inovação paradigmático e conseqüentemente temático no âmbito da História da Educação. De um lado o afluxo de pesquisadores qualificados (entre os quais estão muitos historiadores) para as diversas regiões brasileiras, que não estavam interessados em desenvolver pesquisas ancoradas nos grandes centros, mas sim, estudos voltados para à temática regional.

Por outro lado, estes mesmos pesquisadores - historiadores ou não - estavam sob o impacto das novas tendências da pesquisa histórica,

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nas quais as especificidades e singularidades regionais, ou mesmo, locais, passaram a ser consideradas como importantes objetos de estudo e, mais, são pesquisadores que promovem suas investigações sobre o passado apropriando-se de um corte eminentemente histórico, abandonando, deste modo, as imposições advindas, primeiro, do campo filosófico, em que prevalecia a concepção de que o pensamento educacional se sobrepunha à própria realidade da educação e, em segundo, do campo sociológico, já caracterizado acima.

A orientação teórica presente atualmente defende que o processo de construção de interpretações sobre o passado se faz no diálogo necessário entre nossas idéias e concepções e os indícios que conseguimos agrupar para corroborar nossas assertivas.

Nesse sentido, a História das Instituições Educacionais almeja dar conta dos vários atores envolvidos no processo educativo, investigando aquilo que se passa no interior das escolas, gerando um conhecimento mais aprofundado destes espaços sociais destinados aos processos de ensino e de aprendizagem. Parece-nos que a ênfase dada às análises mais sistêmicas cedeu lugar às análises que privilegiam uma visão mais profunda dos espaços sociais destinados aos processos de ensino-aprendizagem.

Nesse sentido, Justino Magalhães defende queCompreender e explicar a existência histórica de uma instituição educativa é, sem deixar de integrá-la na realidade mais ampla que é o sistema educativo, contextualizá-la, implicando-a no quadro de evolução de uma comunidade e de uma região, é por fim sistematizar e (re)escrever-lhe o itinerário de vida na sua multidimensionalidade, conferindo um sentido histórico. 2

De fato, o que convencionamos chamar de História das Instituições Educacionais, tem ocupado cada vez mais espaço no cenário da pesquisa histórico-educacional, envolvendo uma série de pesquisadores.

No Brasil, ainda que com diversas dificuldades, devido à inexistência de repertórios de fontes organizados, alguns historiadores e educadores têm-se lançado à tarefa de historiar a educação escolar brasileira, através da construção de interpretações acerca das principais instituições educativas espalhadas pelas diversas regiões brasileiras.3

2 MAGALHÃES, J. Contributo para a História das Instituições Educativas - entre a memória e o arquivo. Universidade do Minho (mimeo.), p. 2.3 Dentre os principais autores brasileiros podemos destacar: Ester BUFFA e Paolo NOSELLA. Scholla Mater: A Antiga Escola Normal - São Carlos, 1911-1933 e Industrialização e Educação: A Escola Profissional de São Carlos, 1932 - 1971,

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De modo geral, tanto as interpretações construídas por pesquisadores estrangeiros, quanto por brasileiros, têm seguido um roteiro de pesquisa bastante similar, em que se destacam preocupações com:

os processos de criação e de desenvolvimento (ciclo de vida) das instituições educativas;

a configuração e as mudanças ocorridas na arquitetura do prédio escolar;

os processos de conservação e mudança do perfil dos docentes;

os processos de conservação e mudança do perfil dos alunos;

as formas de configuração e transformação do saber veiculado nestas instituições de ensino, etc.

Desta forma, busca-se a apreensão daqueles elementos que conferem identidade à instituição educacional, ou seja, daquilo que lhe confere um sentido único no cenário social do qual fez ou ainda faz parte, mesmo que ela tenha se transformado no decorrer dos tempos.

Em um texto sobre historiografia brasileira o historiador Carlos Guilherme Mota entende que, enquanto a História do Brasil caminhava, nos anos setenta, em direção a constituir-se enquanto Ciência da História, a História da Educação tomava o caminho inverso, o de converter-se em uma disciplina de caráter utilitário e atendendo a objetivos de interpretar e explicar os processos históricos objetivos, visando obter justificativas para o presente.4 Se levarmos em conta a data do referido escrito poderemos aquilatar a gravidade da afirmação.

A professora Mirian Jorge Warde, depois de proceder uma avaliação parcial dos trabalhos de pós-graduação na área de Educação, afirma que parcela considerável destes escritos dedicava espaço à História da Educação através da utilização de fontes secundárias, com a

Universidade Federal de São Carlos (ambos no prelo). E numa perspectiva um pouco diferente podemos citar também o texto de Gilberto Luiz ALVES. O Pensamento Burguês no Seminário de Olinda - 1800-1836. Ibitinga, SP. Humanidades. 1993. Há que se mencionar também a pesquisa de Elizete Silva Passos, A Educação das Virgens: um estudo do cotidiano do Colégio Nossa Senhora das Mercês, da cidade de Salvador, BA, noticiada pela Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Brasília, 75 (179-180-181):301-306, jan./dez. 1994.4 Carlos Guilherme MOTA. A historiografia brasileira nos últimos quarenta anos: tentativa de avaliação crítica. Debate e Crítica. 5: 11-26. São Paulo. Mar. 1975.

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predominância dos estudos antecedentes, isto é, a História é chamada para justificar algo.

Segundo ela, os pesquisadores recuavam para períodos históricos passados com o objetivo de mostrar que o presente tem o contorno atual devido ao fato de o passado ter sido o que foi. Em período mais recente, um pequeno número de trabalhos de pós-graduação (8%) dedica-se integralmente ao estudo histórico da Educação Brasileira. Estes debruçam-se sobre temas estruturais e desencadeiam uma crítica corrosiva de conceitos, categorias, personalidades. Coincide a emergência desses trabalhos com a incidência de menor número de títulos referidos à História da Educação.5

Dermeval Saviani, em artigo publicado nos anos 70, entende que a Educação ficaria subsumida no termo História (em História da Educação), enfatizando que essa História não estaria melhor caracterizada uma vez que seria uma mescla de acontecimentos gerais com desfiar de doutrinas pedagógicas descontextualizadas e seu programa (enquanto disciplina curricular) traria um ecletismo de tal ordem que trata desde as instituições educacionais e doutrinas pedagógicas do período clássico até a época contemporânea. Propunha, o referido autor, uma saída para o impasse: os docentes deveriam propor seminários e grupos de estudos que permitissem superar a mesmice até então vigente.6

A produção de textos de História da Educação nos anos 1980 parece ter sido influenciada pelos textos acima referidos, em que pese ter diminuído em quantidade, em termos qualitativos houve ganhos substantivos.

Os anos noventa parecem apontar para a necessidade dos pesquisadores, se não abandonar, ao menos minimizar, as análises de fontes secundárias para centrar a pesquisa diretamente sobre as fontes primárias, na descoberta ou mesmo geração de documentos e de objetos para a História da Educação.

Assim sendo, a criação de núcleos dedicados à atividade de “garimpar” a matéria-prima da pesquisa num locus privilegiado por ser onde ocorre o fenômeno educativo, qual seja, as instituições educacionais, parece-nos muito promissora.

5 Mirian Jorge WARDE. Contribuição da história para a Educação. Em Aberto.. 9 (47): 3-11, Brasília. jul.-set. 1990. p. 9-10.6 Dermeval SAVIANI. Função do Ensino de Filosofia da Educação e de História da Educação. In: Educação: do senso comum à consciência filosófica. 5ª Ed. São Paulo. Cortez. 1985.

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Percebe-se, por fim, que a pesquisa histórico-educacional beneficiou-se muito da renovação historiográfica recente, sofisticando suas ferramentas de trabalho e ampliando seu leque temático. Neste sentido, há uma série de procedimentos historiográficos que vem se tornando comuns no trato das instituições educacionais, estabelecendo, dessa forma, condições mais favoráveis para o entendimento dos processos de escolarização vivenciados no país.

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História da educação

A Escola Estadual de Uberlândia: histórico e representações sociais

Giseli Cristina do Vale Gatti1

RESUMO: Esta comunicação dedica-se a noticiar resultado de investigação sobre a Escola Estadual de Uberlândia. Esta pesquisa está verificando e analisando as representações sociais construídas e veiculadas por meio da imprensa, da política e dos cidadãos da cidade. A partir do exame da literatura referente à História das Instituições Educacionais, sobre a História da Educação no período enfocado e sobre representações sociais, pode ser traçado o conjunto de questões a serem respondidas no exame das fontes de pesquisa, incluindo, documentos da escola, notícias da escola veiculadas na imprensa e depoimentos de ex-professores e ex-alunos da mesma. De modo preliminar, pode-se afirmar que as representações sociais construídas em torno da Escola Estadual Uberlândia, consolidaram e legitimaram, no período de 1929 a 1950, que seus egressos deveriam ser os responsáveis pela gestão pública e privada na cidade, dada a qualidade do processo educacional que freqüentaram e as representações sociais construídas sobre a Escola na cidade e na região.

Palavras-chave: História; Educação; Escola

ABSTRACT: This paper is dedicated to reporting the result of investigation regarding the State School of Uberlandia (Escola Estadual de Uberlândia). This research checks and analyzes the social representations constructed and conveyed through the press, the politics and the citizens of the city. From the examination of literature referring to the History of Educational Institutions, about the History of Education in the highlighted period, and about social representations, the set of questions to be answered in the examination of research sources can be drawn up. Research sources include school documents, school news conveyed by the press, and testimony of former teachers and students of the school. In a preliminary way, it can be affirmed that the social representations constructed around the State School of Uberlandia consolidated and legitimated, in the period of 1929 to 1950, that its alumni should be responsible for public and private management in the city, given the quality of the educational process in which they participated and the social representations constructed around the School in the city and in the region.

Key Words: History; Education; School

1 Graduada em Letras e Mestranda em Educação da Universidade Federal de Uberlândia.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 10 n. 17 Jan.-jun. 2001 p. 141-151

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História da educação

Trata-se da comunicação dos resultados parciais do desenvolvimento de uma investigação no campo da Educação, na sub-área da História da Educação, especificamente relacionada a História das Instituições Educacionais.

A instituição em exame é a Escola Estadual de Uberlândia, sediada em Uberlândia, Estado de Minas Gerias. As preocupações da pesquisa referem-se, sobretudo, a verificação e análise das representações sociais construídas e veiculadas por meio da imprensa, da política e dos cidadãos da cidade.

Neste sentido, a abrangência espacial da investigação está restrita a cidade de Uberlândia, no período de 1929 (época de estadualização da instituição escolar) a 1950 (década anterior à expansão quantitativa da instrução secundária no Brasil). É importante ressaltar, porém, a importância do exame da legislação e da contextualização histórica das políticas educacionais sobre a instrução pública no país, o que, evidentemente, levou a investigação a transpor a esfera local.

Cabe lembrar, ainda, que esta investigação vincula-se a linha de pesquisa História e Historiografia da Educação do Curso de Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia.

A temática presente no desenvolvimento dessa investigação está inserida no campo da História da Educação. Porém, não mais a uma vertente um tanto lacunar das análises macro estruturais. Ao invés disso, esta investigação se consubstancia como sendo um esforço de conjugar à análise da singularidade de uma instituição educacional de Uberlândia ao estabelecimento de suas relações com as determinações mais estruturais presentes em Minas Gerais e no País.

Nesse sentido, a educação escolar, quando tematizada, tem, em suas instituições, o local onde se desenvolvem, de fato o cotidiano do ensino e da aprendizagem sistematizada. Essas instituições que, inevitavelmente , reforçam as estruturas de classe existentes nas localidades brasileiras exerceram papéis extremamente diferenciados no que diz respeito a formação de sua clientela.

A Escola Estadual de Uberlândia, nesse sentido, parece ser um exemplo de instituição pública que, por algumas décadas ocupou-se da tarefa da formação de elites dirigentes da cidade.

Para o desenvolvimento dessa investigação foram analisadas diversas fontes de informação, incluindo: bibliografia nacional e internacional sobre o assunto, seja por meio da leitura de textos mais

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teóricos ou mesmo resultados de investigações sobre a temática instituições educacionais publicados em forma de livro.

Além disso, foram consultados diversos documentos do acervo da escola; jornais de época encontrados no Arquivo Público Municipal; fotografias de diversas épocas da escola, provenientes dos arquivos do Centro de Documentação e Pesquisa em História da Universidade Federal de Uberlândia.

Representações Sociais

Em termos conceituais a investigação vincula-se aos estudos sobre representações sociais. Representação, do latim repraesentatio, é um termo carregado de significado e é de suma importância para o desenvolvimento atual das Ciências Humanas. Uma das acepções presentes no Dicionário Aurélio conceitua representação como: conteúdo concreto apreendido pelos sentidos, pela imaginação, pela memória ou pelo pensamento. Na Filosofia significa:

Operação pela qual a mente tem presente em si mesma uma imagem mental, uma idéia ou um conceito correspondendo a um objeto externo. A função de representação é exatamente a de tornar presente à consciência a realidade externa, tornando-a um objeto da consciência, estabelecendo assim a relação entre a consciência e o real. A noção de representação geralmente defini-se por analogia com a visão e com o ato de formar um imagem de algo, tratando-se no caso de um imagem não-sensível, não visual. Esta noção tem um papel central no pensamento moderno, sobretudo no racionalismo cartesiano e na filosofia da consciência. Sob vários aspectos, entretanto, a relação de representação parece problemática, sendo por vezes entendida como uma relação causal entre o objeto externo e a consciência, por vezes como uma relação de correspondência ou semelhança. A principal dificuldade parece ser o pressuposto de que a consciência seria incapaz de apreender diretamente o objeto externo.2

É importante ressaltar que o termo representação é visto, em praticamente todas as acepções teóricas, complementado pelo termo social, ainda que sua manifestação seja realizada no mais das vezes no plano individual.

Nas Ciências Sociais representação é definida como sendo categorias que expressam a realidade, explicam-na, justificando-a ou questionando-a.3 Durkheim é o primeiro a utilizar o conceito, com o designativo de representações coletivas. Pare ele:

2 Hilton JAPIASSU e Danilo MARCONDES. Dicionário Básico de Filosofia. p. 213-4.3 Maria Cecília de Souza MINAYO. O Conceito de Representações dentro da Sociologia Clássica. p. 89.

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As Representações Coletivas traduzem a maneira como o grupo se pensa nas suas relações com os objetos que o afetam. Para compreender como a sociedade se representa a si própria e ao mundo que a rodeia, precisamos considerar a natureza da sociedade e não a dos indivíduos. Os símbolos com que ela se pensa mudam de acordo com a sua natureza.4

Nessa concepção, há um posicionamento no qual o indivíduo é totalmente determinado pelas estruturas ideológicas da sociedade. Além disso, há uma proposição de que essas idéias encontraram no capitalismo sua última e verdadeira forma de expressão, não ocorrendo a possibilidade do conflito ideológico e por conseguinte do conflito social.

Há, porém, um conteúdo válido nas considerações de base estrutural-positivista. Maria Cecília de S. Minayo afirma que Marcel Mauss defende a idéia de que:

[...] A sociedade se exprime simbolicamente em seus costumes e instituições através da linguagem, da arte, da ciência, da religião, assim com através das regras familiares, das relações econômicas e políticas. Portanto [...] é objeto das ciências sociais tanto a coisa, o fato, como a sua representação. O autor, no entanto, chama atenção para esses dois níveis considerando o risco de se reduzir a realidade à concepção que os homens fazem dela. 5

Max Weber ao tratar das questões relacionadas com representações sociais o fez em oposição as idéias de Durkheim, pois defendeu a existência de uma relação de adequação entre idéias e base material. Para Weber, as representações e idéias têm uma dinâmica própria e podem ter tanta importância quanto a base material.6

A concepção weberiana está distante do pensamento positivista e, em certo sentido, é contrária ao chamado marxismo vulgar - economiscista e excessivamente determinista. Por outro lado, aproxima-se da tradição marxista mais recente, que, nesse aspecto particular, confere importância na explicação histórica para outros campos da vida social que não somente à esfera econômica, mas, também, às esferas da política, da cultura e mesmo da religião. São diversos os autores marxistas que, desde os anos 50, compreendem o ser social como sendo, simultaneamente, determinado e determinante dos processos de permanência e mudança. O próprio Karl Marx, em 1846, exprimia-se nesse sentido ao afirmar que:

4 Idem, p. 90.5 Ibid, p. 92.6 Ibid, p. 107.

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A História não é senão a sucessão das diferentes gerações, cada uma das quais explora os materiais, os capitais, as forças produtivas que lhes são transmitidas pelas gerações precedentes; assim sendo, cada geração, por um lado, continua o modo de atividade que lhe é transmitido, mas em circunstâncias radicalmente transformadas, e, por outro lado, ela modifica as antigas circunstâncias entregando-se a uma atividade radicalmente diferente [...].7

De comum pode-se perceber que em praticamente todas as formas de abordagem da questão das representações está o fato de que a linguagem, a palavra é a principal portadora dos conteúdos representacionais. Nesse sentido, ganham relevo, na pesquisa sobre representações, os testemunhos, os registros escritos institucionais, a imprensa, entre outros suportes materiais da palavra, das idéias.

Segundo Roger Chartier, a História Cultural[...] tem como objeto principal identificar a forma como em diferentes lugares e momentos uma realidade social é construída, pensada, dada a ler. [...] Desta forma pode-se pensar a história cultural do social tomando por objeto a compreensão das formas e dos motivos, isto é, partindo das representações do mundo social, na qual os atores que dela fazem parte, possam traduzir as suas posições e interesses de forma objetiva, e que de forma paralela, descrevem a sociedade tal como pensam que ela seja, ou como gostariam que fosse.8

Segundo Roger Chartier, não é possível entender uma História Cultural desconectada de uma História Social, posto que suas representações são produzidas a partir de papéis sociais. Ele afirma seu entendimento de que não há real oposição entre mundo real e mundo imaginário. O discurso e a imagem, mais do que meros reflexos estáticos da realidade social, podem vir a ser instrumentos de constituição de poder e transformação da realidade. Desta forma, a representação do real, o imaginário, é em si, um elemento de transformação do real e de atribuição de sentido ao mundo.9

As representações coletivas são consideradas ao mesmo tempo matriz e efeito das práticas construtoras do mundo social. O imaginário tido como um sistema de idéias-imagens de representações coletivas, é considerado o outro lado do real.

Representações Sociais das Instituições Educacionais

A educação constitui uma área temática em que os estudos sobre representações sociais têm tido importante destaque. Nesse contexto, as

7 Karl MARX. A Ideologia Alemã. p. 47.8 Roger CHARTIER. A História Cultural: entre práticas e representações. p. 16-9.9 Roger CHARTIER. O Mundo como Representação. p.107-24.

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instituições escolares tem sido bastante privilegiadas, uma vez que, tal como as pessoas, essas instituições são portadoras de memórias, uma memória gerada por contraposição com outras memórias, que corre ao ritmo do tempo, das pessoas e das gerações.

Essa memória gira em torno do fabuloso e do heróico, sendo também colocada como uma memória ritualista e comemorativa. Este é um fato que não se deve ignorar. As instituições consideradas como transmissoras de cultura, a cultura escolar, também não deixam de produzir a mesma, uma vez que elas são consideradas organismos vivos que tanto ontem como hoje, integram-se de forma mais ou menos convergente numa política educativa, em uma estrutura educacional e não deixaram de fazê-lo de maneira crítica e adaptativa.

Dentro das instituições educativas, a clientela é sem dúvida o seu núcleo principal, pois sua existência está diretamente ligada as atividades associadas de seus integrantes, que nada mais são que alunos e professores.10

Nesse contexto, o recrutamento de alunos é considerado uma propriedade fundamental da instituição escolar, uma marca que tende a conferir-lhe poder autonômico nos quadros regional e local. Isto porque esses alunos são colocados como atores principais no desenvolvimento da escola e, ao se estudar o passado de uma instituição escolar, muitas vezes esses alunos são tidos como peças importantes e imprescindíveis para a busca de uma interpretação a respeito de tal instituição.

Tal fato acontece quando os documentos relacionados com a História da Instituição Escolar se mostram ineficazes na busca de uma análise de seu passado ou porque esses documentos se perderam com o tempo ou porque não estão disponíveis ao acesso público.

Segundo o Dicionário Básico de Filosofia, o conceito de memória diz o seguinte:

Capacidade de reter um dado da experiência ou um conhecimento adquirido e trazê-lo à mente, considerada essencial para a constituição da experiência e do conhecimento científico. A memória pode ser entendida como a capacidade de relacionar um evento atual com um evento passado do mesmo tipo, portanto como uma capacidade de evocar o passado através do presente. Segundo Aristóteles, "É da memória que os homens derivam a experiência, pois as recordações repetidas da mesma coisa produzem o efeito duma única experiência"(Metafísica, I,1).11

10 Luiz PEREIRA e Marialice M. FORACCHI. Educação e Sociedade, p. 105.11 Hilton JAPIASSU e Danilo MARCONDES. Dicionário Básico de Filosofia, p. 164

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É nesse quadro que os alunos, professores e até mesmo funcionários que fizeram parte da história da escola se tornam tão importantes. A memória tanto individual como coletiva, torna-se uma via metodológica muito importante para o pesquisador. A memória estimula e desafia a busca da hermenêutica, seja no plano da compreensão e da representação da realidade. Mas quando se trabalha com a memória ela deve ser criteriosamente contraposta a um discurso científico, pois a memória não se colhe apenas na informação oral. A memória desafia o pesquisador para a explicação das relações hierárquicas e valorativas, que entre as coisas, quer entre as pessoas. A memória de uma instituição, é considerada um somatório de memórias e de olhares individuais ou grupais.

Relacionado à História das Instituições Escolares, a memória pode ser descrita a partir de relatos escritos, de natureza biográfica e monográfica e a partir da tradição oral. A tradição oral (discurso) é certamente uma via de informação estimulante para o debate e para o alargamento das problemáticas, na interface direta com a questão das representações anteriormente trabalhadas, mas que necessita de comprovação e de análise crítica apurada.

A representação, enquanto discurso é, sem dúvida, uma expressão ideológica, se entendermos ideologia no sentido atribuído por Gramsci, como uma visão ou concepção de mundo que perpassa e dá sentido às relações concretas dos grupos e classes sociais.

As representações coletivas, que são formas de organização do conhecimento da realidade, embora essa realidade, seja também uma construção social, fornecem sistemas de valores indispensáveis para a vida dos grupos sociais na medida em que regulam a organização simbólica e inconsciente da realidade para todos os indivíduos de uma comunidade determinada.

A esse respeito Chartier enfatiza que:As representações do mundo social assim construídas, embora aspirem à universalidade de um diagnóstico fundado na razão, são sempre determinadas pelos interesses de grupo que as forjam. Daí, para cada caso, o necessário relacionamento dos discursos proferidos com a posição de quem as utiliza.12

Através da análise dos discursos de agentes de ensino, patronos de instituições, professores e alunos é possível identificar boa parte do cotidiano de uma instituição escolar e seu percurso histórico. Por meio

12 Roger CHARTIER. op. cit. p. 16.

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das falas desses atores é possível perceber então a representatividade da instituição escolar tanto no âmbito local como regional.

Através do estudo das representações, procura-se compreender como a realidade é construída e como o discurso contém em si estratégias de interesses determinados. No caso das instituições escolares, o estudo do discurso é muito importante, pois na maioria das instituições antigas, grande parte da documentação já se perdeu, por isso o recurso da História Oral torna-se imprescindível, pois é por meio dela que se encontra a possibilidade de construir interpretações sobre o itinerário histórico das instituições escolares, conferindo-lhe assim uma identidade cultural e educacional.

A Escola Estadual Uberlândia

A Escola Estadual de Uberlândia, foi e ainda é considerada uma das mais importantes escolas da cidade, principalmente, por ter formado parcela significativa da elite local e regional. Um dos fatores que propiciou esta classificação de "escola elitista", é que a mesma foi fundada por personalidades tradicionais da região, cuja influência política era um traço marcante, com a presença de uma clientela que se tornaria a elite local.

Em 1912, começou a funcionar o Ginásio de Uberabinha, como instituição particular sob a direção do Sr. Antonio Luiz da Silveira. O nome do ginásio foi escolhido para homenagear a cidade que estava em constante expansão. Funcionou, durante mais de uma década em espaço precário, até que foi construído um prédio adequado e capaz de abrigar milhares de estudantes, durante várias gerações. O prédio da escola foi construído em uma região central da cidade e possui estilo neoclássico. Em 1918, por meio da união e financiamento de personagens como: Arlindo Teixeira e seu filho, Tito Teixeira; José Nonato Ribeiro; Antonio Rezende; Custódio Pereira; Carmo Gifoni e Clarimundo Carneiro, teve inicio a construção do prédio e, em 1921, a obra estava concluída. De 1921 a 1929, o ginásio funcionou como instituição privada, no sistema de internato, semi-internato e externato. Em 1930 começou a funcionar como instituição pública com o nome de Ginásio Mineiro de Uberabinha.

Na época, a clientela da escola era formada por jovens provenientes da classe média-alta da região do Triângulo Mineiro e de regiões próximas, como as cidades de Goiás e Ribeirão Preto. Com o passar dos anos a escola teve aumentado o número de alunos que a freqüentavam, chegando, em 1950, a possuir cerca de um mil e quinhentos alunos. Entre os ex-alunos dessa escola encontramos,

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atualmente, membros da elite econômica e política da cidade, da região e mesmo do País.

De modo preliminar, pode-se afirmar que as representações sociais construídas em torno da Escola Estadual Uberlândia, consolidaram e legitimaram, no período de 1929 a 1950, que seus egressos deveriam ser os responsáveis pelo gestão pública e provada na cidade, dada a qualidade do processo educacional que freqüentaram e as representações sociais construídas sobre a Escola na cidade e na região.

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Psicologia social e educacional

Transferência, Educação e o Banquete de Platão

Maria Augusta Rondas Speller1

RESUMO: No presente trabalho aborda-se a transferência, conceito fundamental em Psicanálise que não a inventou, - posto que permeia todas as relações humanas não estando, portanto, presente somente no setting clínico -, mas tenta desvendá-la, utilizando-a em seu trabalho. O artigo foi escrito pelas indagações e elaborações suscitadas na autora com a leitura feita do Banquete de Platão por Lacan quem tece considerações sobre o amor, outro nome para transferência. Presente nas relações professor-aluno, é de suma importância que esse conceito seja apreendido pela educação, sobretudo para que educadores pensem nos limites e possibilidades de sua atuação.

Palavras-chaves: Psicanálise, Educação, Transferência

ABSTRACT: The present article is about transfer, basic concept in Psychoanalysis which did not invent it but uses it as a important tool in analysis. Transfer operates in all relationships including those established between teacher and pupil, for this reason it is very relevant that teachers try and understand the concept which will help them to better evaluate the limits and possibilities of their profession.

Keywords: Psychoanalysis, Education, Transfer

1 Psicóloga, psicanalista, professora do Departamento de Psicologia, Instituto de Educação, Universidade Federal de Mato Grosso. Doutoranda em Educação da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.

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Psicologia social e educacional

“É aí [no Banquete de Platão] que se vai esclarecer, da maneira mais profunda, não tanto a questão da natureza do amor, e sim a questão que nos interessa aqui, a saber, a de sua relação com a transferência”. (LACAN, 1992, p. 34)

Não terá sido à toa que Lacan tardou dez anos para abordar a transferência em seus seminários. O conceito não é dos mais fáceis de elaborar e compreender dado que a transparência não é uma virtude presente no campo das relações humanas, - inclusive as estabelecidas entre professores e alunos -, regidas pelo simbólico e pelo imaginário que tentam dar conta do real da existência. Nesse campo, mais bem é a opacidade que marca presença, presença que não pode ser negligenciada pelos professores.

Logo na introdução do Seminário 8 sobre a transferência, Lacan nos recorda que a Psicanálise começou de um encontro entre um homem e uma mulher: Joseph Breuer e Anna O., esta última batizando o encontro e o que aí ocorria de ‘talking cure’, cura pela fala, ou ‘chimney sweeping’, limpeza de chaminé. Breuer não conseguiu sustentar o que esses encontros acarretaram para ambos, deixando “o caso” em mãos de Freud que talvez não tenha se assustado tanto com o que Anna lhe transferia, enquanto limpava sua chaminé.

Esse caso é relatado nos Estudos sobre a Histeria (FREUD, 1895), onde aparece, por primeira vez, nas Obras Completas, a palavra transferência, übertragung em alemão: über movimento em direção a, e trag/en, voltar-se. É nessa obra que a transferência assume a acepção que tem até hoje, a do envolvimento do analista pelo amor que se volta (tragen) a ele. Em 1888, num artigo sobre histeria que Freud escrevera para o dicionário Villaret, transferência é utilizada para designar o movimento do sintoma histérico de um lado para outro do corpo. Mais tarde, a transferência mesma será tomada como sintoma e será chamada de neurose de transferência que, segundo Freud (1917, p. 2400) permite afirmar o caráter libidinal dos sintomas que se constituem em satisfações substitutivas.

Freud pouco a pouco elaborará o conceito: na Interpretação dos Sonhos (1900, p. 450-459 e 468-469) falará que o sonho, manifestação do inconsciente, apodera-se de restos diurnos, dotando-os de uma significação diferente. Os elementos, funcionando como formas, formas como letras, são esvaziados do sentido prévio, e dotados de novas significações, havendo aí transferência de sentido através dos processos primários de deslocamento e condensação. Lacan lerá tudo isso, mais

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tarde, com a ajuda de seus conceitos de significante, de metonímia e metáfora. Freud fala também de transferência de uma representação inconsciente à uma consciente.

A transferência, como o sonho que lhe dará sustentação teórica, é uma manifestação do inconsciente. Ela não foi criada pela Psicanálise, dado que também existe em situações não analíticas, - sempre que haja um suposto saber e as armadilhas e encantos do imaginário, condições sempre presentes também na Educação - mas será a Psicanálise que irá desvendá-la, trabalhando através dela. Creio ser extremamente relevante que os educadores leiam e reflitam sobre o que esta área de conhecimento traz de perturbador de nossas certezas tão ferreamente construídas. Se este artigo lograr este efeito, dar-me-ei por contente.

Paradoxalmente, a transferência ao mesmo tempo em que é condição da análise, é o que pode emperrá-la, limitá-la. O mesmo acontece nas relações transferenciais tecidas dentro do processo de ensinar-aprender, a transferência podendo facilitar ou dificultar a aprendizagem. O emperramento seria, em grande parte, por um mau manejo da transferência, no sentido da cristalização dos seus aspectos imaginários, na busca narcísica de plenitude, comparável ao estabelecimento de uma paixão, cega, surda e muda à incompletude, nossa verdade humana. No manejo adequado, caminha-se da tentativa de negação da falta, na paixão, para o amor que reconhece a alteridade, os limites, as falhas, em poucas palavras, para o mergulho do coração no simbólico.

Em um de seus casos clínicos mais famosos, caso Dora, descrito em Análise Fragmentário de uma Histeria, Freud (1905) descobre a importância do manejo da transferência na clínica, a partir do fracasso da análise de sua paciente, fracasso que exemplifica, a meu ver, as palavras de Lacan quem afirmava ser do analista a resistência. Podemos questionar se alguns casos de dificuldade de aprendizagem não surgem ou são reforçados pela ´resistência` dos professores aos limites de seu poder, resistência a aceitar o aluno como ele é, diferente do ideal que o professor possa ter do que um aluno deveria ser para confirmar o mestre no ideal que ele tenha de si mesmo e de sua profissão.

E por falar em Dora... pensar o amor ajuda a pensar a transferência, por isso Lacan estuda O Banquete de Platão, obra onde se fala do amor. O trabalho da análise, como diz Freud (1915, p. 1689 e 1692) em seu artigo Observações sobre o amor de Transferência, é desvendar as escolhas infantis do analisante e as fantasias tecidas ao redor delas. Nesse artigo, onde se constata seu talento de romancista,

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talvez pelo tema propício, Freud compara a análise, quando surge o amor de transferência, a um teatro, a uma comédia:

“La escena cambia totalmente, como si una súbita realidad hubiese venido a interrumpir el desarrollo de una comedia, como cuando em medio de una representación teatral surge la voz de ‘fuego’.”2

Quando fala do amor de transferência, Freud usa a palavra fogo... mais adiante (p.1696), no mesmo artigo, diz que o analista lida com “forças explosivas”, com as quais deve ser muito cuidadoso já que (p.1692) “contra las pasiones, nada se consigue con razonamientos, por elocuentes que sean”3, paixões que estão, com freqüência, a serviço da resistência. Como nos adverte Lacan (1992, p. 21), apesar de que o analista deva reconhecer os movimentos de amor e de ódio em si, é justamente de suas armadilhas que o analista deve fugir, sendo a análise: “(...) a única praxis na qual o encanto é um inconveniente. Quebraria o encanto. Quem já ouviu falar de um analista encantador?”

O professor também deve estar atento aos movimentos de ódio e amor em si ativados pelas crianças com as quais lida: a criança frente a ele, a criança que ele gostaria que seu aluno fosse, a criança que o professor foi um dia, a criança que o professor gostaria de ter sido.

Freud, em diversos momentos de sua teoria, vai elaborando o conceito de transferência identificando-a como repetição, como resistência e como sugestão. Lacan tratará de definir o conceito, articulando todas essas concepções. Para este autor, o fato da fala se manter já implica que há transferência que é permeável à ação da fala. Ao falar, na situação analítica, a pessoa construirá algo, falando não para um outro, o semelhante, mas para o Outro, Sujeito Suposto Saber, lugar do terceiro, da linguagem, conseqüência da própria estrutura da situação analítica:

“Tudo o que sabemos sobre o inconsciente, desde o início a partir do sonho, nos indica que existem fenômenos psíquicos que se produzem, se desenvolvem, se constroem para serem ouvidos, portanto, justamente para este Outro que está ali, mesmo que não se o saiba. (...) parece-me impossível eliminar do fenômeno da transferência o fato de que ela se manifesta na relação com alguém a quem se fala. Este fato é constitutivo”. (LACAN, 1992, p. 177)

2 “A cena muda totalmente, como se uma súbita realidade viesse a interromper o desenvolvimento de uma comédia, como quando em meio de uma representação teatral surge a voz de ‘fogo.” 3 “contra as paixões, nada se consegue com racionalizações, por eloqüentes que sejam.”

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O analisante procura o saber no Outro, sujeito suposto saber, SSS, efeito constituinte, estruturador da transferência, seu pivô4, que a articula como fundamento simbólico. Quem é suposto saber é o Outro, é a linguagem, o terceiro, não o analista. O SSS enquanto fundamento da transferência, é distinto de seus efeitos fenomênicos -repetição, resistência, sugestão-; é a partir desse conceito que Lacan diferenciará transferência na sua dimensão imaginária, com seus efeitos de amor e de ódio, da repetição, como repetição do significante. Lacan ajudou a entender a transferência distinguindo seu plano imaginário do simbólico.

Freud (1914) dizia que a transferência é reatualização, repetição do passado, mesmo que reeditado, modificado. Com Más Allá del Princípio del Plazer, Freud (1920) percebe a repetição como independente do princípio de prazer o que Lacan interpretará como compulsão do simbólico: o que se repete são significantes.

Com seu conceito de suposto saber e o de temporalidade, après-coup, freudiano, Lacan dará uma nova definição à repetição: na análise, o passado é falado no presente, inscrevendo, no Outro, as palavras com seus equívocos e suas associações. Isto é a repetição, característica da relação do sujeito com a linguagem. Nesse sentido, o que é capturado pelo analisante na transferência, não é a pessoa do analista, mas, traduziria Lacan, um significante nele que entra numa série para o analisante. O analista, como significante, passa a fazer parte da economia psíquica do analisante, a transferência sendo testemunha do inconsciente. Na análise cria-se a neurose de transferência que tem caráter de sintoma, de substituição, de metáfora; o que se explicita no sintoma, explicita-se na transferência.

A Psicanálise tem um caráter de impostura não só pelo semblante que o analista deverá fazer de objeto a, objeto de desejo, como também porque o analista ao dizer, [ô! Lacan (1992, p. 50) hilário]: “vamos lá, diga qualquer coisa, vai ser maravilhoso”, insinua ao analisante que há um, suposto saber ele, o analisante, apesar de que sabemos que

“(...) nós somos supostos saber não grandes coisas. (...) E a transferência se funda nisto –há um cara que me diz, a mim, grande babaca, que me comporte como se soubesse de que se trata. Posso dizer seja lá o que for, e isso sempre

4 Pivô pode designar pedaço de madeira ou de metal sobre o qual gira algo, indicando, em sentido figurado, a sustentação principal de alguma coisa. O SSS, sujeito suposto saber, seria o pivô sobre o qual giram as expressões fenomênicas da transferência, seus três aspectos: repetição, resistência e sugestão.

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vai dar em alguma coisa. Isto não lhes acontece todos os dias. Há bons motivos para causar a transferência”.

É importante sublinhar que é justamente a impostura que possibilitará o surgimento da verdade do desejo, inconsciente, do sujeito. É nesse sentido que a transferência se situa entre o desejo e o amor, ambos regidos pela falta.

A clínica psicanalítica é a clínica da transferência ou do Outro, definido por Lacan (1992, p. 172), como:

“(...) o lugar da fala, esse lugar sempre evocado desde que há fala, esse lugar terceiro que existe sempre nas relações com o outro, a, desde que há articulação significante. (...) Outro perpetuamente evanescente e que, por isso mesmo, nos coloca numa posição perpetuamente evanescente”.

Como a experiência humana é tragi-cômica, o lado cômico/irônico lacaniano é necessário para se entender a transferência e a nossa sujeição à linguagem, nossa subordinação ao significante, mas o lado poético também o é: “As palavras me antecedem e ultrapassam, elas me tentam e me modificam (...)”. (LISPECTOR, 1999, p. 12)

A resistência, na transferência, seria o momento em que o analisante acredita, pelo amor transferencial, que o analista sabe ou tem o que a ele, analisante, falta, colocando-o no lugar do Outro ao qual supostamente nada falta. Na cena analítica, delata-se a natureza do amor: amamos numa outra pessoa o que nos falta e pensamos que o Outro, supostamente completo, tem.

Mas, afinal, o quê o amor tem a ver com a transferência? Lacan (1992, p. 71), concordando com Freud, diz que muito:

“Alguma coisa que se assemelhe ao amor, é assim que se pode, numa primeira aproximação, definir a transferência (...) a transferência é algo que põe em causa o amor, que o põe em causa muito profundamente no que se refere à reflexão analítica por ter introduzido nela, como uma dimensão essencial, aquilo a que se chama a sua ambivalência (...). Essa estreita ligação entre o amor e o ódio (...)”.

No Banquete, obra de Platão estudada por Lacan no Seminário 8, Sócrates pouco fala, em seu nome, sobre o amor, fazendo falar, em seu lugar, à Diotima, uma mulher, estrangeira, dizendo dela ter aprendido o que sabia sobre Eros. Logo Sócrates que dizia nada saber, exceto as coisas do amor! Sócrates, ao invocar uma mulher para falar do amor, parece Freud (1907) que ao analisar a Gradiva de Jensen disse que uma mulher está em posição de vantagem em relação ao analista para conseguir o que quer, através do amor: que o homem cresça, deixando

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satisfações e fixações infantis e aprenda a amar. Lembremos que foram mulheres que possibilitaram a criação da Psicanálise.

Na cena analítica há um leito de amor, o divã, e duas pessoas isoladas que vão falar da falta, da carência constitutiva do ser humano. No final da análise deve-se lidar com ela de maneira diferente à que se fazia previamente. As palavras de Lacan (1992, p. 23) expressam contundentemente o que é a experiência analítica: “(...) o que lhe falta, ele [o analisante] vai aprender amando.” Talvez possamos generalizar as palavras de Lacan à educação: só através do amor podemos aprender, professores e alunos, o que nos falta.

As histéricas de Freud confirmam as palavras de Lacan, ensinando que só se podem curar pelo amor, a um Freud (1917, p. 2397) confessadamente assombrado e sem poder acreditar na sua ‘distração’: “Tal confesión de las pacientes nos produce extraordinario asombro (...). Será posible que hayamos dejado pasar inadvertido hasta ahora un hecho de tan enorme importância?”5

Penso que Spairini-Aulagnier (1992, p. 67-111) também fornece pistas interessantes para entender por que Sócrates passa a palavra à Diotima, ao nos informar que em Platão era um procedimento comum ligar uma doutrina importante - no caso que nos toca, doutrina sobre o amor - à inspiração profética. Diotima era maga, sacerdotisa, estrangeira, de Mantinéia. Havia afastado a peste de Atenas por anos, o que nos faz vislumbrar, diz Lacan (1992, p. 124), o poder, a estatura de quem vai falar do amor.

Assim, às mulheres cabiam o desvendamento dos mistérios, os textos sagrados. O estranho, como diz Spairini-Aulagnier, é que O Banquete é um texto de homens, então por que invocar uma mulher? Estaria Sócrates fazendo falar a mulher nele, como sugere Lacan (1992, p. 123), ao lançar mão do mito, que tenta abordar o inextricável real? Como diz Lacan (1992, p. 169), o amor é a mais profunda, radical e misteriosa relação entre os sujeitos.

Spairini diz que a feminidade é, antes de mais nada, uma invenção dos homens. O amor também, eu diria; e o quê não é? Para mantê-lo, talvez, só velando-o – entendendo velamento como forma, estilo de apresentação e não só ocultamento. Os véus não seriam enganadores, mas possibilitadores do amor, oferendas, dons. Afinal, não é através da transferência que uma análise se possibilita? Não é quando

5 “Tal confissão das pacientes nos produz um assombro extraordinário (...) Será possível que tenhamos passar inadvertido, até agora, um fato de tão enorme importância?”

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o analista se cala, que algo pode ocorrer na cena analítica? Não terá isso algo a ver com o jogo do amor, jogo de esconde-esconde, que ora mostra, ora encobre, num engano que permite ao humano desfrutar dos desfrutes possíveis, nesse mundo de ficção que é o mundo fálico? Será que saber amar é saber “(...) usar as coisas com a graça gratuita do em vão (...)”, vão porque o amor seria “(...) uma das raras formas de estabilidade: a estabilidade do desejo irrealizável. A estabilidade do ideal inatingível”? (LISPECTOR, 1999, p. 75 e 73)

A meu ver, Couso (1996), em sua palestra sobre o humor, esclarece algo sobre o amor, ao falar do mundo em que vivemos, segundo Lispector (1999, p. 34), mundo “dos viciados”, “mundo já criado”. Couso diz que uma das conseqüências da eficácia da função paterna é a de introduzir-nos no mundo das ficções que não devem ser consideradas como opostas à realidade nem submetidas à prova da verdade, posto que criação arbitrária, montagem eficaz que determina efeitos no sujeito e dá sentido a seu mundo.

Lacan (1992, p. 47) diz que o amor é um significante e, enquanto tal, é uma metáfora enquanto substituição. Nesse sentido, o mundo todo é metafórico. Volto a Couso (1996), que me parece esclarecer algo sobre o amor, e, por conseqüência, sobre a transferência, ao falar do mundo de ficção que é o nosso, regido pelo fantasma e pelas leis do significante:

“As coisas do mundo são ditas, colocadas em cena, de acordo com as lei do significante, (...) o que vivemos diariamente não é naturalmente dado, mas uma estrutura organizada pelo significante. Para o ser falante, o mundo da realidade é o fantasma, (...) [que] tem eficácia e consequências reais: uma vez que ¨o mundo subiu à cena¨, o mundo real do primeiro tempo fica como o mito de um real suposto antes do significante, e como tal, perdido... e desde então vive-se numa ficção, cada um portando suas máscaras para passar pela cena do mundo. (...). (...) toda cena, como no teatro, contém a idéia de uma certa inautenticidade, de que ¨parece¨, mas ¨não é¨ totalmente... e mesmo assim, ¨fazemos de conta que é (...)”. [tradução minha, do espanhol]

Apesar de que o amor traga a ilusão de que não somos estranhos uns aos outros (LACAN, 1992, p. 111-112), toda mulher é estrangeira ao homem (lembrar que Diotima era estrangeira a Sócrates). Em Psicanálise o feminino é uma das figuras do estrangeiro. Penso que para manter o amor é necessário que homens e mulheres mantenham-se estrangeiros uns aos outros, no que estrangeiro possa significar diferença, alteridade, novidade, novos sentidos, outra lógica, atiçadora de nossa curiosidade, mantenedora de nosso desejo.

Sócrates, ao passar a palavra a Diotima, talvez estivesse invocando, como disse Lacan, a mulher nele, a estrangeira, nele. O

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analista também é estrangeiro ao analisante a quem se oferece como objeto do desejo, como agalma, como amado, como érôménos, para que o analisante se manifeste como érastès, amante. O professor também é estrangeiro ao aluno, e como estrangeiro deve estar atento ao que o aluno fala (ou silencia) para com ele também aprender.

O analista deve também nada saber. Mas que relação há entre saber e amor? Aqui, outro mito acerca-nos do inextricável real: o mito do nascimento do amor, mito que só existe em Platão, contado através da boca de Diotima, a sacerdotisa. Lacan (1992, p. 125 e 346) fala de tal mito, em que a mãe do amor é a pobreza, a miséria, Penia, caracterizada no texto como Aporia, que é um impasse, aquilo frente ao qual não temos recursos, entregamos os pontos. Poros, pai do amor, é Expediente, o que tem recurso, ao contrário de Penia. Aporia não tem nada a oferecer, fica por fora da festa de Afrodite onde Poros está. Ele, embriagado, adormece, o que permite que Aporia faça-se prenhar por ele. É no momento em que Poros dorme, em que não sabe mais nada, que se produz o encontro que gera o amor. Assim o amor como resposta implica não-saber.

Aporia terá um filho ao que chamará de amor, concebido no aniversário de Afrodite, a deusa da beleza. Por isso, segundo Lacan, o amor sempre terá uma relação obscura com o belo, relação da qual nos falará Diotima. Entendemos também aqui porque Lacan (1992, p. 41 e 345) diz que “amar é dar o que não se tem, dar o que se tem é a festa, não é o amor”: Aporia só tem, para dar, a sua falta. Lispector (1999, p. 51) parece concordar com Lacan, quando diz: “(..) amor é finalmente a pobreza. Amor é não ter.”

Como haver um encontro entre pessoas que têm tudo? Por isso Lacan dizia que os ricos não sabem amar ou são inanalisáveis. Nelson Rodrigues (1992), creio, concordava com Lacan, a julgar por um de seus contos escrito num livro adequadamente intitulado: “A Vida como ela é”: um homem muito rico queria levar para cama uma certa mulher, coisa que conseguia com todas. Em vão com essa uma a quem tudo ofereceu, até que um dia, desesperado pelas negativas, pergunta o que deveria fazer para ganhar seu amor, ao que ela lhe respondeu que só o amaria quando fosse pobre, de tudo se destituindo. E assim acontece. Um dia, ao encontrá-lo mendigo, sem nada, pelas ruas, ela, por fim, lhe declara seu amor...

O amor é demoníaco (daïmonion), intermediário entre deuses e humanos, entre imortais e mortais. O amor é um dos demônios através dos Quais os deuses dão a escutar suas mensagens aos mortais, “...quer

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estejam adormecidos ou acordados...”. Lacan nos informa, ironicamente, creio, que no texto grego não fica claro quem estão adormecidos: os homens ou os deuses.

Diotima, mulher, do lado do ser e não do ter masculino, esclarece sobre o belo, dizendo que ele não se relaciona com o ter, mas com o ser, mortal. Seu discurso:

“(...) articula a função da beleza como sendo inicialmente uma ilusão, uma miragem fundamental, pela Qual o ser perecível e frágil é sustentado em sua busca da perenidade, que é sua aspiração essencial”. (LACAN, 1992, p. 129-130)

Lacan (1992, p. 114) diz mais coisas enigmáticas sobre o amor: “o amor é um sentimento cômico”, “não basta, para falar de amor, ser poeta trágico, mas é preciso também ser um poeta cômico” . O que queria ele dizer com essas afirmações? A propósito, Freud (1914, p. 1689) refere-se ao surgimento do amor na análise como algo “com um lado cômico e com um lado sério”. Como Lacan bem observa, no Banquete, é de Agatão, poeta trágico, que vem o único discurso claramente de escárnio. Claramente porque, segundo Lacan (1992, p. 80), Platão adotou a via da comédia para tratar do amor, no Banquete, e que há que suspeitar sempre da presença da comicidade no texto, mesmo quando não explícito. Lembrar, a propósito, as idéias de Freud (1905) no seu artigo “El Chiste y su relación com lo Inconsciente”, onde ele fala do simbólico que se estende sobre o mundo como uma rede, de significantes, mas como redes têm furos, algo sempre escapa, nem tudo sendo simbolizável. O humor seria uma maneira de apresentar, velando, o que escapa à fala, de uma maneira diferente do cômico, que arregaça o real, mostrando-o sem véu (Couso, 1991). O cômico, nesse sentido, seria obsceno? Couso (1991) pergunta se não seria através do humor, que fala de limites, que transmitimos que o simbólico está furado.

O amor, no que vela, revela. Seria, nisso, equivalente ao humor, no que denuncia os limites do simbólico? Afinal não é o amor a mais misteriosa e inexplicável das coisas humanas?

Penso que tudo isso tem relação com o que escrevemos nos parágrafos anteriores sobre o velamento - do inexistente, da falta- e com a impossibilidade do desejo satisfazer-se: o outro jamais terá o que procuro. Nisto reside o trágico do amor. No entanto, - e aí o lado cômico- nos iludimos, e continuamos sempre a jogar o tão indispensável jogo do amor, jogo de faz de conta que a falta não existe, faz de conta que você me completa, faz de conta que o impossível é possível... Jogos cômicos, marcados pelo falo pois, como diz Lacan (1992, p. 99), o essencial do

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mecanismo do cômico é que sempre se refere ao falo. Como neuróticos, estamos inscritos no reino do falo, reino da mentira. Por isso creio que Lacan diz que só os mentirosos sabem amar. Eu diria que só os bons mentirosos sabem amar - venhamos e convenhamos, há talento para tudo, e há alguns neuróticos que são especialistas na arte de amar, na arte da ficção. As palavras de Lacan parecem confirmar essas suposições:

“A questão é saber se aquilo que ele [o amado] possui tem relação, diria mesmo uma relação qualquer, com aquilo que ao outro [o amante], o sujeito do desejo, falta (...) da conjunção do desejo com seu objeto enquanto inadequado, deve surgir essa significação que se chama o amor. (...) O que falta a um não é o que existe, escondido, no outro. Aí está todo o problema do amor. Quer se o saiba ou não, isso não tem importância alguma. No fenômeno encontra-se a cada passo o dilaceramento, a discordância. (...) basta amar para ser presa desta hiância, dessa discórdia.” (LACAN, 1992, p. 42, 46)

Mas, nos ‘finalmentes’, não importa o talento do outro pois na vida, seja numa análise, seja no amor, o encontro marcado é sempre conosco mesmo, enfim, com a carência. As palavras de Meireles (1985, p. 109) parecem-me descrever o que é uma análise e sua relação com o saber:

“Mas, nesta aventura do sonho exposto à correnteza, só recolho o gosto infinito das respostas que não se encontram. Virei-me sobre a minha própria experiência, e contemplei-a – Minha aventura era essa errância por mares contraditórios (...)”.

O campo da educação não é, como os demais campos na vida, um campo de errância onde vagamos pedindo, em última análise, sob máscaras as mais variadas, que nos amem?

Escrevi sobre TRANSFERÊNCIA agora para, como diz Deleuze (1988, p. 18), “não suprir a ignorância, TRANSFERINDO a escrita para depois, tornando-a impossível” dado que, parafraseando-o, ao escrever sobre aquilo que não sabemos ou sabemos mal, no ponto que imaginAMOs ter algo a dizer, “(...) escrevemos na extremidade de nosso próprio saber, nessa ponta extrema que separa nosso saber e nossa ignorância e que transforma um no outro (...).”

Referências Bibliográficas

COUSO, Osvaldo M.- Humor y Psicoanálisis. Charla en el Centro de Extensión Psicanalítica (Centro Cultural General San Martín). Buenos

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_____________- El Delírio y los Sueños en “La Gradiva”, de W. Jensen.(1907). In: Obras Completas. Madri: Biblioteca Nueva, vol. II, 1981.

_____________- Recuerdo, Repetición y Elaboración (1914). In: Obras Completas. Madri: Biblioteca Nueva, vol. II, 1981.

_____________- Observaciones sobre el “Amor de Transferencia”. (1915). In: Obras Completas. Madri: Biblioteca Nueva, vol. II, 1981.

_____________- Lecciones Introductorias al Psicoanálisis. XXVII Lição- La Transferencia. (1917). In: Obras Completas. Madri: Biblioteca Nueva, vol. II, 1981.

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Documentos

Documento: Artigo da revista A Violeta

Gisleine Crepaldi Silva*

A circulação da revista A Violeta (1916 – 1950 (?)), em Mato Grosso, proporcionou a reivindicação de um espaço educacional feminino que reintegrasse a necessidade da emancipação social da mulher. As colaboradoras do periódico redefiniram, de maneira sutil, o perfil daquela que havia sido condicionada ao papel de mãe e esposa. Através da publicação de inúmeros artigos que valorizavam a reflexão sobre o quadro histórico-social configurou-se alternativas para a reorganização política e econômica vigente.

Segue, na íntegra, um artigo que demonstra a proporção social alcançada pelas colaboradoras do periódico.

Sobre o Feminismo

O pedestal de honra da mulher foi e será sempre o lar. Infelizmente esse direito sagrado, de erguer as gerações futuras, tem trazido ao bello sexo as mais cruéis desillusões, tem sido para muitas um calvário amargo. De uma natureza sensível ao extremo, é com grande tristeza que observa em seu companheiro a indifferença que elle faz seguir á doce amizade que causa a união inicial.

O homem, completamente dominado pelo instinto, procura sempre um prazer novo, esquecendo se de seus deveres de lealdade e dedicação. Não nascemos para enganar, mistificar, o homem faz assim a sua própria infelicidade, viemos ao mundo para o embellezar com sentimentos nobres e vidas sem mácula.

* Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação, IE/UFMT.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 10 n. 17 Jan.-jun. 2001 p. 167-168

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Sentindo-se ludibriada, observando no companheiro um ser que age geralmente de ma fé, volta-se a mulher na actualidade para o trabalho.

É na labuta pelo pão quotidiano que encontra o prazer de viver. Por isso na época que atravessamos o feminismo alastra-se com intensa rapidez. E o que é o feminismo? Quer a mulher na vida tudo o que usufrue o homem? Não. A mulher na era actual deseja apenas o direito de trabalhar, para viver honesta e independentemente dos caprichos do homem. Por essa razão vão as mulheres aos poucos conquistando todos os postos dedicando se a uma vida trabalhosa, mas productiva.

Os representantes do sexo forte sempre julgaram-se victimas da sorte e principalmente do matrimônio, por que tem que pelejar pela companheira. Pois esta “corvée” lhes será aos poucos alliviada, então, o que lhes parece castigo apparecerá sob novo prisma de sedução. O homem é o protetor natural da mulher, por isso Deus o fez mais forte physicamente.

(BASTOS. Elizabeth. Revista A Violeta. A 0103. nº 252. Maio de 1939)

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001.168

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Documento: Jornal “A Cruz”, artigo “Na Época”

Marize Bueno de Souza Soares*

“Na Época”

Esperamos com verdadeira ansiedade a revista cientifica-literária de há tempos anunciada.

Havia de ser ela na imprensa indígena um órgão sério e bem orientado, um farol para dirigir a nova geração das nossas escolas nos trilhos da ciência e da literatura.

A aparição do nº 1. da “ A Nova Época” foi uma cruel desilusão.

Em o nosso fraco modelo de vermos francamente- não foi atingido a alvo colimado.

O nº 1 da “A Nova Época” é pura e simplesmente um pandemônio de paradoxos sociais e filosóficos.

Nós bem sabemos que audácia é própria dos jovens talentos... porém, os verdadeiros talentos não ultrapassam os limites das doutrinas sãs e não podem desprezar os elementares princípios de filosofia , sob pena de tornar-se simples pedantes ôcos e bombásticos.

Querem trabalhar “em bem da instrução, em bem da educação... em prol de desenvolvimento... do Estado de Mato Grosso”.

Pois bem; será capaz o soneto ”a alma e o tempo” com o “Spleen (sic) que distila prantos” e o negro pessimismo que apregoa, de fazer alguma coisa em prol da instrução e da educação em nosso

* Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação, Instituto de Educação, Universidade Federal de Mato Grosso.

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 10 n. 17 Jan.-jun. 2001 p. 169-172

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Estado? O pessimismo é verme gerado pelas decadências, precipitando-as.

Da mesma pecha e eivado “o soneto“ da pag. 17. Este embate “o ideal”. Ideal risonho puro não há, esfusia o vento da dúvida, a noite cai do Desengano ”e lá vai naufragando “nos penedos da Descrença”.

Fosse águia a mocidade mato-grossense e tivesse aza, ... para ajuda-la a voar o grande educador autor do “Soneto”, lhas quebraria.

Sistema ideal!!!...

O Sr. Bryenne canta e diviniza a matéria... tudo e nada... eterna como Deus, como ele bela e pura ora nobre, ora imunda...

Materialismo, panteísmo e cacofonia poemeto escolar e “para Teixeira Campos”!! Valha-nos Deus!

Não diremos nada do artigo “ Coeducação”. O próprio autor confessa que são linhas arriscadas... declarando se satisfeito por não ver em “nosso Estado, felizmente, adversário ferozes”!!!

Francisco Azzi imaginou Mato Grosso todo ser uma tribo de Canibais, veio,viu, desconfiou... e deitou a correr.

Enfim chegamos ao ponto de resistência: A CONFERENCIAS PEDAGÓGICAS. Indigestas, sem nexo, em estilo cafral... precisa mesmo usar para com elas do método analítico. Abrimos hoje uma local especial para esse fim.

As mais produção são dignas da revista.

Útil e bom o artigo do notável clinico Dr. Marinho Rego.

Bela, no seu gênero, a poesia de Dr. Octavio Cunha, somente lhe apontaremos um erro insignificante: as andorinha não edificam ninho entre as folhagens da vinha.

Bem bom o “baladas e poemas” de J. Siqueira.

Luiz Terencio aplaude tudo o que é para “o bem da sociedade, para o progresso produzido pelas sabias e conscienciosas inovações.

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001.170

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Porque não ouviam os seus conselhos Sr. Terencio? Em vez de tanto criticar teríamos somente aplaudido “A Nova Época”.

Stik

O artigo intitulado “Na Época”, publicado pelo jornal “A Cruz” no dia 24 de março de 1912, é o documento que abre espaço para uma série de artigos intitulados “Conferências Pedagógicas”, que obedece uma seqüência numérica com a numeração romana de I,II,III,IV,V,VI, e VII e que tinha a finalidade de analisar as conferências, escritas por Gustavo Kuhlmann, publicadas na revista “ A Nova Época”

O jornal “A Cruz“, “Órgão da Liga Católica”, fundado no dia 15 de maio de 1910 e dirigido pelo Frei Ambrósio Daydé, da Ordem de São Francisco, no período de 1910 a 1924, que deixou de circular de 23 de novembro até o dia 6 de setembro, retorna sob a direção do Arcebispo D. Aquino e do Desembargador José de Mesquita, de 1925 a 1945. No dia 15 de maio de 1910, ao inaugurar o número 1 do jornal “A Cruz”.

Depois da proclamação da República, no governo de Pedro Celestino, foi implantada a Reforma da Instrução Pública Primária, que constituiu-se num marco referencial para a História da Educação em Mato Grosso.

Para cumprir o que determinava a Lei nº533, foram trazidos de São Paulo , três jovens pedagogos. Esses jovens foram os primeiros normalistas contratados pelo presidente Pedro celestino, para efetivar e organizar a Instrução Pública. A chegada dos jovens professores para organização da Instrução Pública , vai produzir na sociedade cuiabana, alguns conflitos ou polêmicas por parte de alguns segmentos.

A Igreja Católica, com suas instituições escolares, chegaram em Mato Grosso em 1894, convidada pelo governo do Estado para a catequeses dos índios, mas devido a falta de escolas para a sociedade mato-grossense, a Igreja rapidamente expande suas atividades da Congregação ligadas a educação, ocupando os espaços necessários a consolidação e a implantação do ensino, sem perder de vista seus dogmas e suas doutrinas.

A Instituição Católica de educação chegou em Mato grosso como promotora da ordem, da disciplina, da moral e principalmente com métodos modernizador, com projetos educativos bem definidos, Com aporte técnico-metodológico modernos.

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001. 171

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Entretanto, a chegada dos jovens professores, veio de certa forma, levar a Igreja a ter uma reação, contra as “Conferências Pedagógicas” publicadas na Revista, que foi um instrumento utilizado para que os normalistas paulistas, pudessem divulgar seus ideais republicanos e pedagógicos mediante as transcrições de suas palestras.

A Igreja, a partir desse artigo começa um movimento de reação contra as “Conferências Pedagógicas” e contra os seus escritores, as causas e os motivos só poderão ser conhecidos mediante uma analise detalhada dos documentos para saber qual era o real motivo dessa pendenga ou conflito?

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001.172

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Informes da pesquisa e da pós-graduação

Apresentação

A partir deste número, a Revista de Educação Pública passa a publicar os resumos das dissertações defendidas no Programa de Pós Graduação em Educação da UFMT. Esta iniciativa representa a abertura de mais um espaço de divulgação do que vem sendo produzido no Programa. Ao longo de sua história este Programa tem contribuído, efetivamente, para o desenvolvimento da pesquisa em educação no Estado de Mato Grosso. Recém saído de um amplo processo de reorganização no qual procurou-se estabelecer uma nova estrutura que permite confirmar sua identidade e estabelecer horizontes de desenvolvimento. È necessário ressaltar que não tem sido fácil a transformação do antigo Curso de Mestrado em Educação Publica em Programa de Pós Graduação em Educação. Estas mudanças refletindo-se, inclusive, na dinâmica de elaboração das dissertações.

O resultado do que foi produzido confirma o impacto positivo que esses processos de mudança vêm tendo no Programa. Foram trinta e sete dissertações defendidas. Todas elas indicando a existência de uma amadurecida articulação entre o desenvolvimento das linhas de pesquisa e a produção da dissertação. São trabalhos de reconhecida qualidade que esperamos recebam o reconhecimento de estudiosos e pesquisadores da educação. Informo que todas as dissertações defendidas no PPGE estão à disposição do público no CETEDE do Instituto de Educação.

Manoel Francisco de Vasconcelos MottaCoordenador do Programa

Rev. Educ. Pública Cuiabá v. 10 n. 17 Jan.-jun. 2001 p. 173-175

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Informes da pesquisa e da pós-graduação

Defesas de Mestrado Realizadas em 2000

Ordem Nome Orientador Data1. Luciane Cleonice Durante Edinaldo de Castro e Silva 15/02/002. Eliane Maria de Barros Abido Michael Otte 23/03/00

3. Demilson Benedito do Nascimento Michael Otte 24/03/00

4. Raul Angel Carlos de Oliveira Michael Otte 29/03/00

5. Gesele Dal Pogeto de Deus Cardoso Sérgio Roberto de Paulo 03/04/00

6. Maria Isabel Werner Moreira Edinaldo de Castro e Silva 10/04/007. Mara Rosa Gil Hernandes Suíse Monteiro L Bordest 14/04/008. Ruy Ferreira Sérgio Roberto de Paulo 24/04/00

9. Leiva Coleta Santiago Matias Nagib Saddi 02/06/00

10. Carmem de Figueiredo Pinho Miramy Macedo 09/06/00

11. Carlos Américo Bertolini Nicanor Palhares Sá 30/06/00

12. Jair Reck Maria Aparecida Morgado 04/08/00

13. Danie Marcelo de Jesus Ana Antônia de A. Peterson

10/08/00

14. Julia Calvo Dorfman Maria de L. B. de L. Freire 28/08/00

15. Claudirene Andrade Ribeiro Suíse Monteiro L Bordest 30/08/00

16. Waléria Martins de Araújo Manoel Francisco V. Motta 31/08/00

17. Claudia Graziano Paes de Barros Maria Inês Pagliarini Cox 01/09/00

18. Maria Laura Correia Lima de Faria Maria Ignes Joffre Tanus 05/09/00

19. Mauro Mendes da Silva Maria Inês Pagliarini Cox 06/09/00

20. Márcia Maria Miranda Bretas Nicanor Palhares Sá 14/09/00

21. Elizabeth Figueiredo de Sá Poubel e Silva

Nicanor Palhares Sá 15/09/00

22. Edinéia Tavares Lopes Mauricéa Nunes 18/09/00

23. Jocenaide Maria Rosseto Silva Maria Aparecida Morgado 18/09/00

24. Antônio Vieira Mauricéa Nunes 19/09/00

25. Ermerita Luiza Saldoval Tedesco José Adolfo R. Rodriguez 27/09/00

26. Vitérico Jabur Maluf José Adolfo R. Rodriguez 27/09/00

27. Emília Darci de Souza Cuyabano Maria Ignes Joffre Tanus 28/09/00

28. Elni Elisa Willms Maria Ignes Joffre Tanus 05/10/00(continua)

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001.174

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Informes da pesquisa e da pós-graduação

(continuação)Ordem Nome Orientador Data29. Lúcia Shiguemi Izawa Kawahara Eugênia Coelho Paredes 14/10/00

30. Roseméry Celeste Petter Paulo Speller 18/10/00

31. Arilson Aparecido Martins Elizabeth Madureira Siqueira 20/10/00

32. Sandra Pavoeiro Tavares Carvalho Eugênia Coelho Paredes 24/10/00

33. Sandra Regina Geiss Lorensini Eugênia Coelho Paredes 25/10/00

34. Alceu Zóia Peter Buttner 26/10/00

35. Rosiley Aparecida Teixeira Souto Antônio Carlos Máximo 27/11/00

36. Glauce Viana de Souza Torres Michèle Sato 04/12/00

37. Vania Nunes Meirelles Pereira José Adolfo R. Rodrigues 07/12/00

Rev. Educ. Pública, Cuiabá, v. 10, n. 17, jan.-jun. 2001. 175