design capa jornalmeia hora

23
BRAZILIANJOURNALISMRESEARCH-Volume7-Número1- 2011 148 O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010 RESUMO O artigo investiga as reformulações da apresentação gráfica pelas quais passou o jornal Zero Hora (ZH) entre os anos de 1990 e 2010, centrando-se em suas capas. Analisa como a publicação reformulou seu design no período, a fim de discutir como tais modificações podem estar relacionadas a mudanças tecnológicas ligadas à circulação de edições também em outros suportes. Problematiza relações entre elementos visuais e princípios de edição jornalística, tendo em vista a trajetória do veículo. A significativa alteração dos layouts percebida ao longo dos anos avaliados parece estar associada à crescente quantidade de informações disponíveis no espaço gráfico e que é perpassada pelo intenso uso de recursos gráficos e imagens que muitas vezes comprometem a hierarquia do que é noticiado. Palavras-Chave: Jornalismo impresso. Zero Hora. Design. Capas. Planejamento gráfico. Copyright © 2011 SBPJor / Sociedade Brasileira de Pesquisa em Jornalismo DOSSIÊ ANA GRUSZYNSKI Universidade Federal do Rio Grande do Sul BRUNA AMARAL Universidade Federal do Rio Grande do Sul INTRODUÇÃO O jornalismo impresso vem se transformando nos últimos anos, impactado, sobretudo, pela presença da internet que, com seus inúmeros serviços, oferece diferentes formas de acesso à informação. No âmbito da web, versões de jornais on-line foram gradualmente se conformando como produtos autônomos, deixando para trás as iniciativas pioneiras de duplicar edições impressas de publicações em Portable Document Format (PDF) e disponibilizá-las on-line (STRELOW; GRUSZYNSKI; NECCHI, 2010; QUADROS; QUADROS JR.; MASIP, 2010). De previsões que deram uma vida útil ao jornal de papel de apenas mais alguns anos a alternativas editoriais e comerciais que articulam possibilidades de permanência desses veículos no sistema midiático, acompanhamos um território de amplas reformulações. Nesse contexto em que tensões entre novos meios e aqueles já consolidados se estabelecem, conceitos como os de remediação (BOLTER; GRUSIN, 2000; BOLTER, 2001) e mediamorfosis (FIDLER, 1998)

Upload: danielle-tsantos

Post on 13-Sep-2015

216 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

jornal

TRANSCRIPT

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011148

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

    RESUMO O artigo investiga as reformulaes da apresentao grfica pelas quais passou o jornal Zero Hora (ZH) entre os anos de 1990 e 2010, centrando-se em suas capas. Analisa como a publicao reformulou seu design no perodo, a fim de discutir como tais modificaes podem estar relacionadas a mudanas tecnolgicas ligadas circulao de edies tambm em outros suportes. Problematiza relaes entre elementos visuais e princpios de edio jornalstica, tendo em vista a trajetria do veculo. A significativa alterao dos layouts percebida ao longo dos anos avaliados parece estar associada crescente quantidade de informaes disponveis no espao grfico e que perpassada pelo intenso uso de recursos grficos e imagens que muitas vezes comprometem a hierarquia do que noticiado.Palavras-Chave: Jornalismo impresso. Zero Hora. Design. Capas. Planejamento grfico.

    Copyright 2011SBPJor / Sociedade

    Brasileira de Pesquisa em Jornalismo

    DOSSI

    ANA GRUSZYNSKIUniversidade Federal do Rio Grande do SulBRUNA AMARALUniversidade Federal do Rio Grande do Sul

    INTRODUO

    O jornalismo impresso vem se transformando nos ltimos anos,

    impactado, sobretudo, pela presena da internet que, com seus inmeros

    servios, oferece diferentes formas de acesso informao. No mbito

    da web, verses de jornais on-line foram gradualmente se conformando

    como produtos autnomos, deixando para trs as iniciativas pioneiras

    de duplicar edies impressas de publicaes em Portable Document

    Format (PDF) e disponibiliz-las on-line (STRELOW; GRUSZYNSKI; NECCHI,

    2010; QUADROS; QUADROS JR.; MASIP, 2010). De previses que deram

    uma vida til ao jornal de papel de apenas mais alguns anos a alternativas

    editoriais e comerciais que articulam possibilidades de permanncia

    desses veculos no sistema miditico, acompanhamos um territrio de

    amplas reformulaes.

    Nesse contexto em que tenses entre novos meios e aqueles

    j consolidados se estabelecem, conceitos como os de remediao

    (BOLTER; GRUSIN, 2000; BOLTER, 2001) e mediamorfosis (FIDLER, 1998)

  • 149BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    mobilizam no campo terico questes centrais ao tema. Levando em

    considerao a matriz digital como caracterstica fundamental dos novos

    meios, Bolter e Grusin (2000) entendem que a remediao (remediation)

    compreende a lgica formal pela qual estes renovam (refashion) as

    formas dos meios anteriores, aprimorando-as. Os termos hipermediacia

    (hypermediacy) e imediacia (imediacy) correspondem a estratgias

    de remediao, em que o primeiro indica um estilo de representao

    visual que visa a maior proximidade possvel da nossa experincia

    visual cotidiana, de modo que abstramos a presena do meio e temos

    a sensao de que estamos diante do objeto de representao; evoca,

    portanto, transparncia. J o segundo est associado noo de

    opacidade e remete apresentao de diferentes atos de representao

    que se tornam visveis e perceptveis ao observador. Fidler (1998), por

    sua vez, atravs da noo de mediamorfosis, entende que necessidades

    percebidas, presses de ordem poltica e competitiva, inovaes sociais

    e tecnolgicas desempenham papel fundamental na transformao

    dos meios. Para o autor, novas formas comunicacionais ao sofrerem

    a influncia dos meios convencionais se adaptam e se reformulam

    segundo ambientes distintos.

    Tendo em vista a articulao entre perspectivas tericas e dados

    empricos que possam contribuir no debate acerca da hibridao entre

    meios e linguagens, o presente artigo trata do jornal Zero Hora (ZH),

    publicado pela primeira vez em 1964 e que, em 1996, lanou sua verso

    on-line. Em dezembro de 2009 tornou-se acessvel tambm pelo Kindle, e

    o lanamento do seu aplicativo para Ipad em fevereiro de 2011 assinalou

    mais uma iniciativa do peridico na disponibilizao de seus contedos

    em diferentes plataformas.

    O estudo tem como foco o design das capas do jornal impresso,

    analisando as reformulaes de sua apresentao grfica nos ltimos

    vinte anos, a fim de inferir como tais modificaes podem estar

    relacionadas s mudanas tecnolgicas, em especial no que diz respeito

    circulao de edies em outros suportes. Se nos primrdios da web o

    impresso era a principal referncia para guiar os processos de produo,

    edio e design do jornal on-line, parece que, na atualidade, observa-se

    uma tendncia inversa.

    O corpus avaliado compreendeu as capas do dia primeiro de

    maro dos anos de 1990 a 2010, priorizando uma avaliao da estrutura

    geral do projeto grfico ao longo desse espao temporal. Tendo como

    base a pesquisa bibliogrfica, estabeleceram-se conceitos e categorias

    que delimitaram o objeto de estudo e orientaram a sistematizao de

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011150

    uma tabela de recursos grficos que foi utilizada para uma primeira

    anlise de ordem quantitativa. A partir dos resultados encontrados nessa

    etapa realizou-se uma anlise qualitativa, que priorizou as relaes entre

    os elementos e sua vinculao com princpios de edio jornalstica e

    com a histria do prprio veculo.1

    A forma do jornal e os processos de edio jornalstica

    O mosaico de notcias que se compe no papel ou na tela ganha

    sua forma final por meio do trabalho de design, que opera na juno

    entre um nvel abstrato (conceber/projetar) e outro concreto (registrar/

    configurar), atribuindo forma material a conceitos intelectuais (CARDOSO,

    2000). A forma fsica de um texto, o modo de disposio dos elementos

    na pgina, so fatores que determinam a relao histrica entre autores,

    textos e leitores. O campo fsico e visual que se define a partir dos

    recursos tecnolgicos de escrita constitui um espao condicionante

    a partir do qual alternativas de articulao da retrica tipogrfica so

    responsveis por conformar um texto. Nesse sentido, diferentes edies

    de um mesmo contedo permitem a proposio de novas significaes,

    podendo atender expectativas de pblicos diferenciados, evidenciando

    assim o papel do design na conformao de peas comunicacionais.

    O jornal tem uma personalidade grfica que compreende

    uma continuidade de estilo em que um diagrama de base assegura

    uma variabilidade de layouts a partir de um esquema comum. Nas

    negociaes entre forma e contedo, o projeto editorial baliza decises

    tomadas ao longo dos processos de edio. Entre os valores do campo

    que condicionam a prtica profissional, est o fator temporal, onde o

    imediatismo e a velocidade brevidade entre o acontecimento e a sua

    transmisso so soberanos (WOLF, 2006; TRAQUINA, 2005).

    Contudo, se a composio visual tem papel importante na

    orientao dos leitores pelas pginas e sedimenta uma srie de opes

    tomadas ao longo das etapas editoriais, o foco dos leitores costuma estar

    na histria, ou seja, naquilo que narrado, no fato noticiado. A mediao

    efetuada pelo design, ento, parece ter um carter de transparncia. Uma

    vez que acontecimento e acontecimento jornalstico no so equivalentes,

    vemos que o planejamento grfico colabora de modo fundamental para

    a insero dos fatos em um quadro contextual. O relato elaborado visa a

    construir um sentido, desvendando causas, envolvidos, consequncias

    etc., tornando-o, assim, um acontecimento jornalstico. O design, ento,

    responde a valores-notcia e ao newsmaking.

    A sistemtica de efetuar o projeto grfico dos jornais foi

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 151BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    gradualmente se consolidando justamente em torno de uma noo de

    previsibilidade dos acontecimentos, e muito menos na idia de ruptura

    que habitualmente associamos produo jornalstica peridica. Sua

    diviso em sees e cadernos, a presena de suplementos especiais so

    eixos fundamentais que enquadram a variedade temtica de informaes

    presentes nas publicaes. Distribuir fotos e textos, ampliar, cortar, inserir

    legendas etc., no apenas embelezar a composio, mas estabelecer

    hierarquias e contrastes que visam sobretudo informar. Temos, portanto,

    o entendimento do jornal impresso como um dispositivo (MOUILLAUD,

    2002) forma que estrutura o espao e o tempo, constituindo assim

    uma matriz que articula os contedos.

    Do ponto de vista histrico, sua conformao grfica se inicia

    com uma distino em relao ao livro e compreende a ampliao do

    tamanho das pginas, introduo do ttulo no cabealho da capa, destaque

    para a periodicidade e distribuio do texto em vrias colunas. Tendo

    em vista que as caractersticas materiais se estabelecem gradualmente

    mediadas pela qualificao das tcnicas de composio e impresso,

    podemos assinalar ainda outros marcos fundamentais na transformao

    de sua visualidade. Nesse sentido, a introduo da fotografia conduz

    progressiva hierarquizao das informaes na medida em que ancora

    graficamente os layouts, delineando as bases para a concepo de jornal

    moderno sob o ponto de vista do projeto grfico. A fotocomposio

    e a impresso offset, por sua vez, propiciam a paginao modular,

    abarcando novas estratgias de classificao de contedos, fotos

    maiores e experincias tipogrficas que visam marcar a identidade

    das publicaes. J a impresso a cores e a introduo das tecnologias

    digitais de diagramao e produo grfica consolidam o papel do design

    na produo jornalstica, tendo na infografia o carter exemplar de um

    recurso onde textos e imagens se aliam para revelar os mais diversos

    aspectos de uma notcia (GRUSZYNSKI, 2010). As experincias grficas

    contemporneas evidenciam que o design do jornal no tem mais como

    ser visto apenas como etapa final de um processo, na medida em que

    est diretamente vinculado ao perfil da organizao que o edita, bem

    como ao conjunto de profissionais e suas rotinas produtivas, que so

    mediadas por recursos tecnolgicos gerenciados cada vez mais pelos

    membros das redaes e integrados em redes miditicas.

    Em linhas gerais, o elementos fundamentais do projeto grfico

    compreendem o formato ligado a especificaes do suporte e o

    espao grfico que dele deriva, que organizado segundo um diagrama

    (grid). Nele so dispostos textos, imagens e recursos de apoio como

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011152

    fios e texturas, que tm na cor sua caracterstica fundamental. Critrios

    compositivos, por sua vez, regem a articulao destes elementos

    embasados em princpios perceptivos que orientam a sintaxe da

    linguagem visual (DONIS, 1997). Estes, contudo, so condicionados

    por valores especficos do campo jornalstico, em que apelo esttico

    e compromisso informativo tensionam as escolhas possveis, muitas

    vezes tambm subordinadas modulao comercial da publicao.

    H que se ressaltar ainda a distino entre as diferentes partes

    de um jornal, em que capa tem um papel singular na medida em que visa

    chamar a ateno do leitor, especialmente quando os fatos do dia so

    inditos ou inusitados, informando e enunciando o que est disposio

    dos leitores no interior do peridico. nela tambm que est o nome do

    peridico, que indica a existncia de um referente que visa ser (re)conhecido

    pelo leitor em um espao simblico: entre vrios, este o jornal.

    Zero Hora e suas capas

    A Zero Hora foi criada em maio de 1964, logo no incio da ditadura

    militar brasileira (Figura 1). Hoje distribuda em todo o estado do Rio

    Grande do Sul (RS) e o principal dos oito peridicos do Grupo RBS Rede

    Brasil Sul , empresa que atua em diversos ramos ligados informao e

    entretenimento. A circulao do jornal, segundo dados de 2009 do Instituto

    Verificador de Circulao (IVC), a sexta do pas e a maior do RS.

    Figura 1: Capas de ZH de 01/05/1964, 01/03/1970 e 01/03/1990

    Avanos tecnolgicos marcaram e transformaram o jornal de

    maneira bem acentuada. Recchia (2010) identifica perodos que denomina

    de redao analgica, redao informatizada e redao integrada. O

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 153BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    primeiro vai do lanamento da publicao at o ano de 1988, quando

    as mquinas de escrever foram aposentadas e a fotografia analgica,

    usando filme e qumicos para a revelao, ainda era dominante. A redao

    informatizada compreende a entrada dos computadores na rotina dos

    jornalistas, que trouxe tambm a primeira grande reforma grfica do

    jornal em 1989. Neste perodo, h tambm todo o processo de adaptao

    ao uso dos computadores e o incio da fotografia digital. Em 2007,

    configurou-se a redao integrada. Em setembro deste mesmo ano, a RBS

    lanou o portal zerohora.com, que trouxe jornalistas do meio on-line

    para junto dos que trabalhavam exclusivamente para o jornal impresso.

    O intervalo temporal escolhido para avaliao retrata as

    mudanas ocorridas na redao relacionadas informatizao.

    Considerando o carter exploratrio do estudo, avaliou-se uma capa

    de cada ano para que tivssemos uma viso geral de como se alterou

    a diagramao da primeira pgina do jornal no decorrer do perodo.

    Escolhemos aleatoriamente o dia 1 de maro para todas as capas por

    j ser quando o ano, de fato, inicia passadas as datas comemorativas de

    fim de ano e as frias.

    Com base no referencial terico que considerou historicamente

    a constituio do jornal sob o ponto de vista do projeto grfico; o

    entendimento das relaes entre projeto editorial, processos de edio

    jornalstica e produo grfica; bem como o detalhamento dos aspectos

    formais que compreendem o design de jornais e em uma avaliao

    preliminar dos exemplares que compuseram o corpus, estruturamos

    uma tabela que foi utilizada para uma primeira avaliao de ordem

    quantitativa que considerou rea (editorial e comercial), grid, nveis

    de texto (caractersticas tipogrficas e hierarquia), imagem e outros

    elementos (tarjas, fios, boxes).2

    Aps o levantamento de todos os dados quantitativos,

    percebemos alguns momentos em que as caractersticas grficas das

    capas eram similares. Com base nesta observao, as agrupamos em

    quatro perodos os quais agregaram a anlise de ordem qualitativa das

    20 capas, que considerou as relaes entre os elementos grficos e sua

    vinculao com princpios de edio jornalstica e com a histria do

    prprio veculo. Vejamos brevemente alguns aspectos ilustrativos deste

    percurso3 para, ento, tecermos a discusso dos resultados da pesquisa.

    As capas de 1990 a 1994 identificamos como perodo pioneiro

    emprego de novos recursos. O incio dos anos 1990 marca a entrada

    definitiva do computador na redao, com a digitao de textos visualizados

    em telas verdes, fotografia ainda analgica e comunicao via internet

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011154

    incipiente. O perodo marcado pela primeira reforma grfica realizada no

    jornal em 1989, por Marcio Garcia que aumentou o tamanho das letras

    obrigando os jornalistas a diminuir os textos, e recomendou o uso de um

    maior nmero de imagens (e em tamanho maior).

    Figura 2: Capas de ZH de 1 de maro de 1990, 1991, 1992, 1993 e 1994, respectivamente

    Nas capas (Figura 2), as imagens tm papel relevante, destacando-

    se a diferena de tamanho entre a foto principal e as demais em 1994,

    contudo, fotomontagem e ilustrao concorrem se desconsiderarmos a

    distino assinalada pela rea do box. No intervalo o logotipo quadrado,

    preto e com letras sem serifa, ocupa 5,18% da rea da capa e muda

    constantemente de lugar. Em nenhuma edio encontramos anncios

    que ocupassem mais de 4% da totalidade da capa.

    O uso de fios de diferentes espessuras significativo na

    demarcao de contedos, ainda que nem sempre os espaamentos

    entre os elementos e o uso de branco favoream essa distino. H uma

    variedade de apropriaes de um diagrama de cinco colunas, sem que

    uma identidade visual se constitua de modo evidente. Observa-se uma

    coluna dedicada a chamadas que , talvez, o elemento mais constante,

    ainda que flexvel. As capas so predominantemente preto e branco, a cor

    est presente nas imagens, exceo de um amarelo suave que preenche

    o fundo do box em 1994. Em termos tipogrficos, se estabelecem nveis

    de textos por meio de variaes de tamanho, peso e inclinao de tipos

    com serifa, predominantemente. Uma fonte sem serifa utilizada nas

    cartolas. A quantidade de elementos e sua organizao nem sempre

    favorece a pregnncia do layout, em que clareza, simplicidade e

    regularidade auxiliam na percepo das informaes.

    As capas dos anos de 1995 a 1998 (Figura 3) nomeamos

    como perodo de conformao valorizao da cor e da imagem.

    Dada a familiarizao dos jornalistas com o computador e o avano das

    tecnologias digitais, ocorre uma expanso da internet. Aumenta o uso

    do e-mail como forma de comunicao e os jornais brasileiros comeam

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 155BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    a fazer suas primeiras experincias na web. Neste perodo, primeiro

    disponibilizado o caderno de informtica na rede e, no ano seguinte, em

    1996, cria-se o Zero Hora digital, que atualizado a cada 24 horas.

    Figura 3: Capas de ZH de 1 de maro de 1995, 1996,1997 e 1998, respectivamente

    No intervalo de tempo que compreende estas edies, h a

    reformulao do logo de Zero Hora (Figura 4) em um modelo que se

    mantm at hoje: Zero Hora escrito em maisculas com fonte serifada e

    uma barra colorida acima do nome do jornal (Figura 5). A rea ocupada

    por ele na capa passou para 12,21% da pgina, o que lhe conferiu muito

    mais destaque e visibilidade. Outra marca grfica do perodo a ausncia

    de cartolas. A barra vertical com chamadas menores ora na esquerda,

    ora na direita tambm desapareceu.

    Figura 4: O logo quadrado da edio de 1 de maro de 1992, criado por Hans Donner,

    usado at a reforma de 1994

    Figura 5: O logo horizontal da edio de 1 de maro de 1996, usado de 1994 em diante

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011156

    Ainda h a presena de muitos fios para separao dos

    elementos. Percebe-se uma maior utilizao de cor e a ampliao do

    tamanho das imagens. Os estilos tipogrficos deixam de lado o itlico

    usado nas legendas, mantm as distines de peso (regular/negrito)

    e introduzem tipos sem serifa em algumas chamadas. No h muita

    coerncia na escolha de fontes para os ttulos, o que denota falta de

    continuidade nas capas, pois a cada edio analisada as fontes variam:

    ora se usa a mesma fonte para todos os ttulos, ora se usa um tipo

    diferente para cada elemento.

    A edio de 1997 um exemplo de pgina completamente

    simtrica. Todas as matrias principais so dispostas da mesma forma

    com a mesma fonte, exatamente do mesmo tamanho. As fotos embaixo

    das manchetes secundrias passam, inclusive, a sensao de que elas

    as acompanham. No entanto, so manchetes tercirias dentro de boxes

    com linha. O fator que deixa diferenciar a manchete principal do resto

    sua posio central e o uso de uma ilustrao, maior que todos os outros

    elementos da capa. O uso do box para delimitar o espao das matrias

    no foi suficiente para criar distino visual, dificultando a localizao do

    elemento mais relevante. Mesmo o anncio no canto inferior esquerdo

    tem um tratamento grfico significativamente parecido com a matria

    que vem no box do canto inferior direto. Em um primeiro olhar, tem-se

    a impresso que ambas as caixas (que tm como cor predominante o

    vermelho) tratam-se de um anncio publicitrio.

    De 1999 a 2005 temos o perodo de consolidao maior

    uniformidade no projeto grfico. O incio dos anos 2000 deixa o

    jornal Zero Hora com uma visualidade bem caracterstica. Nota-se que

    neste perodo, h uma forte diviso da capa em dois espaos principais:

    o lado esquerdo, reservado para a manchete, a foto principal, que vem

    sempre na parte inferior, e alguma manchete menor, e o lado direito, onde

    entram outras chamadas menores que, algumas vezes, recebem tanto

    destaque grfico que podem ser tratadas como manchetes tambm. Esta

    diviso feita pela insero de um fio vertical grosso na cor azul em

    todas as capas (Figura 6).

    Temos de volta a coluna com chamadas que existia nos anos

    1990 e depois foi abolida. A separao da capa em duas reas distintas d

    ao jornal Zero Hora um projeto grfico mais visvel. Notamos a volta das

    cartolas, usadas nas matrias na coluna da direita e o uso da cor vermelha

    em ttulos e nas cartolas deste elemento. As fontes no variam tanto

    como nos perodos anteriores e a disposio dos dados se mantm quase

    a mesma ao longo dos anos, o que de certa forma deixa as capas do

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 157BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    Figura 6: Capas de ZH de 1 de maro de 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004 e 2005, respectivamente

    perodo um tanto quanto montonas, sem muita experimentao grfica.

    O logo horizontal se consolida neste perodo, no sem antes

    passar por uma pequena alterao que no se mantm. Pode-se ver

    que nas capas de 1999 e 2000 h uma troca de fonte no logo. Nestes

    dois anos (Figura 7), o logo aparece com uma letra cuja serifa mais

    proeminente e com suas pontas mais quadradas do que a utilizada at

    ento e nas edies posteriores a 2001 (Figura 8). De 2002 em diante,

    ao lado do logo, temos sempre a presena do logotipo da RBS junto ao

    nome do jornal do lado esquerdo.

    Figura 7: Reproduo do logo usado em 1999 e 2000

    Figura 8: Reproduo do logo usado de 1995 a 1998 e aps 2000

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011158

    A diagramao da primeira pgina das edies de 2006 a 2010

    (Figura 9) identificamos como perodo de inovao estratgias

    diversificadas de atrao visual, que compreende diversas mudanas

    importantes. Uma reforma grfica realizada em setembro de 2005 deu

    maior destaque para os cadernos na capa, criando uma linha horizontal

    de chamadas bem abaixo do logo. O projeto passou a valorizar fotos

    mais abertas e na linha horizontal h sempre, no mnimo, duas imagens.

    A reforma padronizou o tamanho e a fonte das chamadas da coluna da

    direita, que ganhou um fio fino e preto. As cartolas agora tm um fundo

    lavanda e um fio grosso azul sobre elas. A mesma cor utilizada tambm

    em boxes e outros elementos da pgina.

    Figura 9: Capas de ZH de 1 de maro de 2006, 2007, 2008, 2009 e 2010, respectivamente

    Em 2007, a redao recebeu os profissionais que trabalham

    exclusivamente para a verso on-line do jornal, abrindo-se tambm

    espao no impresso para chamar os materiais produzidos pela mdia on-

    line. Outra reforma4 ocorrida em 2009, ampliou a rea do logo que passou

    a ocupar 23,91% da pgina, pois essa passou a compreender tambm as

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 159BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    chamadas para os cadernos. As fotos e ttulos adicionaram um fundo

    colorido para o logo e, em algumas ocasies, at invadem seu espao.

    A primeira capa do perodo, a de 2006, apresenta a nova coluna

    da direita, agora feita por dois fios finos. As cartolas padronizadas com

    letras em caixa alta e sem serifa, esto sobre todas as chamadas da

    rea. A linha abaixo do logo contm chamadas para os cadernos. So

    trs boxes diferentes, cada um com uma cor diferente remetendo para

    um suplemento distinto onde os logos dos cadernos acompanham as

    chamadas. Cria-se, com isso, um eixo horizontal que se liga coluna

    da direita emoldurando o contedo do centro da pgina. A quantidade

    de elementos grficos das duas reas acaba, entretanto, prejudicando

    a organizao visual, no por uma disposio desordenada, mas pelo

    excesso de informao em um espao diminuto. A manchete ganhou

    uma linha de apoio sem serifa. As fotos perderam as bordas que se

    mantinham desde os anos 1990. Na manchete secundria, que aparece

    dentro de um box lavanda, usam-se marcadores em forma de seta para

    separar cada um dos quatro ttulos relacionados ao assunto principal.

    Cada uma dessas matrias est, entretanto, em uma parte diferente do

    jornal, o que quebra a linearidade que a disposio grfica dos elementos

    sugere, j que o uso do cone de setas passa uma idia de fluxo. A

    tentativa de inovao grfica acabou por confundir o leitor.

    A primeira pgina de 2007 segue o padro adotado no novo

    projeto: manchete, linha de apoio, manchete secundria com foto em box

    lavanda e chamadas menores na coluna da direita, todas com cartolas

    e linha superior com chamadas para os cadernos. Os elementos esto,

    sim, mais organizados. Mas o fato de, nas matrias que extrapolaram o

    espao da coluna da direita, ter-se empregado o mesmo padro seguido

    na coluna, deu a elas o mesmo valor hierrquico das chamadas. Usa-

    se de tons pastis para acompanhar o tom lavanda do projeto. No

    entanto, ainda h um grande nmero de informaes e cores. Nesse

    sentido, a edio de 2008 exemplar: a manchete est dentro do box

    lavanda, delimitado por um fio grosso e preto, com seis fotos coloridas.

    Nele, o espaamento entre as imagens e as margens do prprio box

    varia bastante. As cores quentes das fotos da primeira linha contrastam

    com a pretensa sobriedade das cores do projeto grfico. A manchete

    secundria compreende dois ttulos exatamente do mesmo tamanho,

    que recebem o mesmo tratamento das chamadas da coluna da direita,

    s so mais largas, denotando a baixa hierarquia entre os elementos. As

    cartolas seguem com o padro anterior com linha azul grossa sobre elas.

    A linha superior da pgina segue com chamadas dos cadernos.

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011160

    A novidade uma chamada para o site de zerohora.com. Assim

    como as outras, ela est em um box (azul escuro), mas nela se usa fonte

    branca sem serifa, alm de uma seta de mouse ao lado do ttulo, numa

    tentativa de aproximar da visualidade da internet. Nesta barra superior,

    temos os logos dos cadernos que recebem chamada. Todos os ttulos vm

    em um box com uma foto das matrias. As fotos so coloridas, o logo

    dos cadernos colorido. A pgina a que mais traz imagens de todas as

    analisadas, com dez elementos imagticos de diferentes cores. O visual

    acaba ficando carregado e bastante prejudicado, pois quase no sobra

    espao em branco e formam-se diferentes conjuntos que no conversam

    entre si. Pois, alm disso tudo, ainda temos o lavanda dos boxes e das

    cartolas acompanhadas do fio grosso azul. Ao lado do logo de Zero Hora,

    temos o selo para a campanha violncia no trnsito, isso tem que ter fim

    para aumentar ainda mais o nmero de elementos na pgina.

    Em 2010, destaca-se o aumento da rea do logo. O logotipo em si

    no aumentou de tamanho, mas a rea do cabealho dobrou e nela, agora,

    esto as chamadas para cadernos, que antes tinham uma barra abaixo do

    logo. A partir desta alterao, o logo tomado pela imagem que, no caso

    deste exemplar, inclusive se sobrepe a ele. Junto imagem, temos tambm

    o fundo verde e o logotipo do caderno. A apropriao da rea do cabealho

    por outros elementos tira dele a solenidade e a importncia como fator de

    identificao do jornal. Outra variao o fato de a manchete perder a linha

    de apoio. H tambm uma diminuio no uso dos fios.

    Discusso dos resultados

    As anlises realizadas apontam para a existncia de uma

    identidade grfica nas capas de Zero Hora que veio se conformando e

    consolidado no tempo. Esta supe que o leitor, hoje, pode facilmente

    diferenciar o jornal dos outros por sua visualidade. No entanto, isso no

    equivale afirmao de que o peridico tenha boa legibilidade entendida

    tanto no que se refere percepo dos tipos quanto preciso com que

    sua composio conduz compreenso intelectual do texto , nem que

    seu layout resulte em composies em que a organizao visual favorece

    a compreenso e rapidez de leitura ou interpretao (pregnncia).

    No mbito da tipografia, o levantamento dos dados evidenciou o

    predomnio do uso de fontes serifadas regulares, em caixa baixa e em preto.

    As variaes em itlico deixaram de ser usadas j no incio do perodo de

    consolidao e ttulos em caixa alta apareceram em raras ocasies. No caso

    das manchetes, isso se justifica no argumento de afastar-se do modelo

    de chamadas caractersticos de tablides de apelo popular. Em sentido

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 161BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    oposto, contudo, parece dar-se o emprego da cor, que cresceu com o passar

    dos anos nem sempre de modo estratgico no sentido da legibilidade e

    qualidade informacional. A aquisio de novos equipamentos tanto para

    edio, quanto para impresso do jornal pode justificar a presena de um

    nmero crescente de matizes para a primeira pgina.

    A partir da ltima reforma grfica de Zero Hora, nota-se uma

    diminuio no emprego de fios. Segue, no entanto, o hbito de separar

    contedos com fundos coloridos, prtica recorrente na amostra coletada.

    Em linhas gerais, podemos inferir que a tecnologia aumentou o nmero

    de elementos diferentes com os quais o diagramador deve lidar na

    hora da montagem da pgina. Entretanto, antes de saber como esses

    elementos so organizados na capa, importante destacar quais so

    essas informaes e com que frequncia elas aparecem.

    A partir do cruzamento dos dados dos quadros de anlise, foi

    possvel constatar que a primeira pgina, como se espera de um jornal,

    tem contedo predominantemente editorial. Os anncios aparecem em

    mais da metade da amostra, mas na maior parte dos casos ocupam uma

    rea inferior a 10% da pgina (Grfico 1). O espao disponvel para o

    texto prevalece na maioria dos casos; esse nmero apresenta uma queda

    a partir dos anos 2000. Somente nos anos de 1998, 2003 e 2010, a

    imagem ocupou a maior parte da primeira pgina. Existem outras capas,

    contudo, em que h uma predominncia imagtica, mesmo que as

    fotos e/ou ilustraes no sejam grandes o suficiente para que isso se

    expresse de maneira visvel no grfico apresentado.

    Grfico 1: Distribuio da rea das capas de 1990 a 2010 em %

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011162

    A quantidade de matrias nas capas varia bastante de um ano

    para outro (Grfico 2). A partir da reforma grfica de 2005, nota-se um

    aumento considervel no contedo chamado na primeira pgina, que

    culmina no ano de 2006, quando temos 13 matrias diferentes ilustrando

    a capa. Os reflexos da ltima reformulao grfica, feita em 2009, so

    percebidos no ano de 2010. As mudanas propostas queriam valorizar

    ainda mais a imagem. A capa deste ano traz fotos grandes e fundos

    coloridos acompanhando um nmero reduzido de chamadas: apenas

    cinco chamadas, a metade da mdia mostrada nos cinco anos anteriores.

    Grfico 2: Quantidade de matrias chamadas na capa por ano

    O grande nmero de chamadas no interessante nos tablides,

    afinal, eles tm um tamanho reduzido e por mais que, em determinados

    dias, haja uma infinidade de assuntos interessantes para se tratar e

    muitos dos princpios de paginao de jornais standard e tablide sejam

    os mesmos, o design de capa de deste ltimo no pode simplesmente

    transform-la no que Finberg e Itule (1989) chamam de um jornal

    standard encolhido. Deve-se respeitar os limites de espao e lanar mo

    de poucos elementos marcantes para que eles tenham o efeito desejado.

    O exagero no emprego das imagens cria uma disputa pelo olhar

    do leitor, que acaba ficando sem saber qual o elemento visual dominante.

    O box do esporte, na capa de 2004 (Figura 10), por exemplo, sofre

    deste problema. Ao invs de eleger uma matria principal do caderno

    para ocupar a capa, o editor preferiu destacar trs acontecimentos

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 163BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    esportivos relevantes. As trs fotos do box acabam competindo entre si

    e no destacam nenhum dos eventos. Tenta-se, inclusive, compensar a

    diferena de tamanho entre elas usando um amarelo mais escuro e um

    fio preto no fundo da ltima foto, o que acaba poluindo ainda mais a rea

    que j pequena e est divida em duas colunas. Outro modelo de box

    que atrai o olhar do leitor pelos motivos errados o usado na capa de

    2001 (Figura 10). O fio, o fundo, a borda e a foto criam um excesso de

    informao desnecessrio em um espao to reduzido.

    Figura 10: Box usado nas capas de 2004 e 2001, respectivamente

    Nota-se no jornal certa recorrncia na tentativa de remediar

    o excesso de informao com uma significativa presena de recursos

    grficos, provocando uma desorganizao generalizada. Esta afirmao

    exemplificada visualmente na capa de 2008 (Figura 11). O primeiro

    olhar j acusa que h contedo em demasia na pgina. Pode-se pensar

    que isso acontece por a manchete principal vir acompanhada de seis

    diferentes fotos em que predominam cores quentes, que contrastam

    com a sobriedade do tom lavanda usado no projeto grfico.

    Percebemos que a manchete principal tem, alm das muitas

    fotos, trs molduras: o box lavanda, a linha preta e grossa que o envolve e

    as dez chamadas dispostas no seu entorno. Esses elementos, usados para

    separar e destacar contedo, poderiam ser abolidos sem prejuzo algum

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011164

    Figura 11: Capa de ZH de 2008

    para a capa. Alm disso, quase no h espaos brancos. O excesso de

    elementos dificulta a leitura rpida e confere capa uma baixa pregnncia

    ao se opor significativamente ao conceito de simplicidade visual.

    Em contraste a essa situao, podemos destacar a capa de

    1997 (Figura 12), que apresenta uma quantidade menor de elementos,

    menos cores e menos fios que a tornam pretensamente mais simples.

    Nela, o item principal est destacado no centro e possui um tamanho

    que nos deixa perceb-lo como o mais importante da composio. Os

    outros ttulos, contudo, possuem exatamente o mesmo tamanho que a

    manchete principal, o que faz com que ela s possa ser classificada como

    tal pelo tamanho da foto que a acompanha. Alm disso, a disposio

    dos elementos em uma diagramao em trs colunas extremamente

    verticalizada cria uma simetria enfadonha. Assim, tudo que se ganha

    na simplicidade neste exemplar, perde-se pela absoluta monotonia

    e pelo baixo nvel de hierarquizao. A repetio d-se de forma to

    forte que ao observarmos o anncio no canto inferior direito, esperamos

    que o quadro do canto inferior esquerdo tambm seja o anncio. A

    diagramao, inclusive, usou cores prximas as do anncio no contedo

    editorial, o que confunde o leitor ainda mais.

    Outro exemplo de como a composio pode prejudicar a

    legibilidade o box da capa de 2006 (Figura 13), que trata de diversos

    assuntos referentes volta das frias de vero. A indicao das quatro

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 165BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    Figura 12: Capa de ZH de 1 de maro de 1997

    chamadas menores utiliza uma seta vermelha ao lado de cada um dos

    textos. Uma vez que setas so smbolos usados para indicar direo ou

    sentido, elas criam certo movimento na linha dos ttulos, possibilitando

    a suposio que um bloco continua o outro. Entretanto, os assuntos no

    esto encadeados de maneira contnua nem quanto estrutura pois

    no esto em pginas consecutivas e nem quanto ao prprio tema

    pois esto em editorias diferentes.

    Nota-se, em todo o perodo analisado, que o jornal traz uma

    quantidade elevada de elementos na capa. A ltima reforma grfica,

    realizada em 2009, diminuiu o nmero de itens chamados na primeira

    pgina. Contudo, o aumento da rea do cabealho, que aboliu a linha

    horizontal com chamadas coloridas para cadernos do perodo de

    Figura 13: Reproduo do box da capa de 1 de maro de 2006

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011166

    consolidao, transformou o campo do logo no novo local para essas

    remisses. Atualmente, cores, texto, outros logos e imagens dividem

    espao com o logotipo de Zero Hora. Em muitos casos, as fotografias se

    sobrepem ao nome do jornal, como no exemplar da amostra (Figura 14).

    Figura 14: rea do cabealho de ZH atualmente

    As cores e as fotos usadas neste espao compartilham a ateno

    do leitor com o logotipo do jornal, reduzindo o destaque dado ao seu nome.

    Sendo esta uma rea relevante para a identidade do peridico, na medida

    em que ela se confunde com os contedos abordados, h uma alterao

    significativa em relao tradio do jornal como dispositivo. Quando

    o prprio nome do jornal perde importncia, um fator que tem papel

    significativo na credibilidade do veculo junto ao leitor v-se redimensionado.

    O prprio jornal evidencia que mudou graficamente buscando

    firmar novo modelo de edio diante da fora de outras mdias nesse

    sculo de informao a cada segundo, em cada lugar (ZH, 27/06/2009).

    Cientes do percurso histrico que conformou a visualidade dos jornais

    ao longo do tempo, e tendo analisado edies de ZH ao longo de 20

    anos, nos parece evidente que a introduo e apropriao das tecnologias

    digitais teve significativa influncia no projeto grfico e na diagramao

    das capas do peridico. Temos hoje um maior nmero de recursos

    grficos compositivos que podem ser reproduzidos com boa qualidade

    de impresso e em menor tempo. Nesse sentido, cabe destacar que o

    Grupo RBS construiu e equipou com rotativas Wifag e o sistema de

    expedio Ferag um novo parque grfico com uma rea de 12 mil metros

    quadrados, que possibilitou que o limite de pginas coloridas passasse

    para a totalidade da edio. Este parque grfico foi inaugurado em 2009.

    No que se refere aos processos editoriais, a informatizao

    agilizou os fluxos de produo e edio de textos e imagens que

    se integram no programa de paginao. No caso de ZH, um software

    que gerencia a parte comercial, indica aos diagramadores a reserva de

    espaos para os anunciantes. A criao de uma diversidade de modelos

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 167BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    de diagrama de pginas mestras auxilia a minimizar as tenses inerentes

    s negociaes entre qualificao do material editorial e tempo. Por outro

    lado, na medida em que alguns cliques possibilitam a alterao do layout,

    a introduo de notcias, mesmo que nos ltimos minutos do fechamento,

    pode ser fator de influncia no aumento da mdia de matrias na capa

    identificado nos ltimos anos. Podemos inferir ainda, que a redao

    integrada propicia negociaes entre os editores, que visam definir que

    informaes iro ser veiculadas em cada suporte, quando, e como.

    Se a capa o espao que pauta o leitor, que visa inform-lo de

    maneira clara quais os fatos importantes do dia, vimos nos exemplares

    avaliados que essa hierarquizao fica, por vezes, prejudicada. O excesso

    de elementos visuais, em especial imagens e cores, evoca pginas de

    jornal tablide de perfil mais popular. ZH, no entanto, busca ser um

    jornal srio e concentra 49% dos seus leitores nas classes A e B5.

    Consideraes Finais

    Analisando e comparando capas dos ltimos 20 anos de Zero

    Hora possvel associar elementos grficos presentes no impresso que

    remetem visualidade de edies de jornais desenvolvidos para a web.

    Poderamos dizer que as barras largas que separam o contedo na pgina

    em papel evocam as barras de navegao que encontramos na maior

    parte dos sites, a separao de contedos sempre presentes no jornal

    como as chamadas de caderno em eixos superiores horizontais recriam

    as molduras de sites. Contudo, diferentemente do que vemos em tela,

    no temos uma barra de rolagem para o contedo que fica entre essas

    molduras, da a importncia de selecionar cautelosamente o que ser

    destacado na capa impressa, um espao bidimensional e com restries

    espaciais distintas de documentos digitais.

    Se afirmarmos que as pginas analgicas foram se conformando

    de modo a ficarem mais parecidas com o que vemos na internet em

    um movimento inverso fase inicial dos jornais na rede estaremos

    ainda posicionados nas impresses iniciais que mobilizaram a questo

    de pesquisa. O referencial terico que vem se constituindo em torno

    da cultura grfica demonstra a riqueza e complexidade que lidar com

    os vrios fatores que a perpassam. Se os ingredientes parecem ser

    basicamente os mesmos textos e imagens com suas cores distribudos

    em um espao determinado com o apoio de linhas e espaos vazios , a

    anlise revelou a variedade de alternativas compositivas resultantes das

    decises editoriais. A conformao do dispositivo jornal, do livro como

    referncia primeira passando pela concepo de peridico moderno sob

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011168

    o ponto de vista do projeto grfico, nos desafia contemporaneamente a

    refletir sobre a intricada trama que tensiona tradio e inovao.

    A discusso demanda ainda a problematizar tais aspectos

    segundo as especificidades das prticas e valores jornalsticos, apenas

    introduzidos no presente estudo. Alm disso, o conceito de remediao

    (BOLTER; GUSIN, 2000; BOLTER, 2001) permite aprofundarmos a reflexo

    em torno das estratgias visuais articuladas pelo design ora de

    transparncia, ora de opacidade na configurao das informaes. Em

    uma cultura visual marcadamente miditica, onde nossa proficincia de

    leitura compreende lidar com diferentes meios cotidianamente e, muitas

    vezes, simultaneamente, redutor afirmar que o jornal impresso hoje se

    parece com o jornal digital, seja para ser lido em um browser ou em um

    aplicativo para Ipad. Meios convencionais e novas formas de comunicao

    esto reformulando seus modelos segundo caractersticas e ambientes

    singulares, em um caldo de aceleradas inovaes tecnolgicas.

    No caso especfico do objeto avaliado, uma vez que a rea do

    suporte papel no infinita e nem extensvel como o espao na web,

    fica ainda mais evidente a necessidade de seleo dos contedos para a

    capa do jornal. Em nosso corpus, contudo, vimos que houve um aumento

    da quantidade de dados e recursos grficos nas capas do jornal ao longo

    do perodo avaliado. Esse incremento na quantidade sem uma estratgia

    slida para organizar e distribuir de maneira coerente as matrias na

    primeira pgina nem sempre resultou em qualificao editorial. A

    simplicidade no momento da diagramao no significa pobreza de

    contedo visual, mas evidencia uma preocupao com a apreenso e

    assimilao dos contedos. Afinal, crucial que um meio de espao

    bidimensional e restrito posicione de modo estratgico e hierrquico as

    notcias, assumindo suas potencialidades consolidadas em sculos de

    histria e reinventadas a cada edio.

    NOTAS

    1 O estudo emprico aqui apresentado foi realizado como trabalho de concluso do curso de jornalismo por Bruna Amaral e orientado por Ana Gruszynski. O quadro terico e a perspectiva adotada vincula-se pesquisa Entre o pixel e o papel: a comunicao visual nos suplementos culturais de jornais impressos na contemporaneidade Um estudo sobre os jornais Folha de So Paulo e Zero Hora, que est sendo desenvolvida no Laboratrio Eletrnico de Arte & Design (LEAD) da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicao (FABICO) da Universidade Federal do Rio

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral

  • 169BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011

    Grande do Sul (UFRGS), com o apoio do CNPq. Esta tem como objetivo geral identificar tendncias no planejamento grfico de jornais impressos brasileiros na contemporaneidade, tendo em vista especialmente o mbito do segmento de cultura dos peridicos Zero Hora e Folha de S. Paulo.

    2 Os procedimentos metodolgicos so detalhadamente descritos em: AMARAL, B. Entre papis e pixels: o design das capas do jornal Zero Hora de 1990 a 2010. Monografia (Graduao em Jornalismo) - Faculdade de Biblioteconomia e Comunicao da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010.

    3 A anlise qualitativa deteve-se na avaliao dos elementos aqui apenas apontados em funo da restrio de espao. Cada uma das capas foi considerada segundo diagrama, imagens, tipografia e recursos grficos.

    4 A reformulao deu ateno especial para edio de domingo, na qual o jornal investe em uma rea de destaque, muitas vezes com ilustrao ou fotomontagem, para chamar a ateno para uma matria ou srie especial. Os cadernos dominicais so chamados em uma rea maior junto do logotipo. H um espao para chamadas de Classificados e suas ofertas, fundamentais para a venda da edio avulsa nesse dia da semana.

    5 Dados do Mdia Kit de Zero Hora, disponvel em: http://publicidade.clicrbs.com.br/zh/about?uf=1. Acesso em 15 out. 2010.

    BIBLIOGRAFIA

    AMARAL, B. Entre papis e pixels: o design das capas do jornal Zero Hora de 1990 a 2010. Monografia (Graduao em Jornalismo) - Faculdade de Biblioteconomia e Comunicao da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2010.

    BOLTER, J. D. Writing space: computer, hypertext, and the remediation of printing. New Jersey: Lawrence Erlbaum Associates, 2001.

    BOLTER, J. D.; GRUSIN, R. Remediation: understanding new media. Baltimore: The MIT Press, 2000.

    CARDOSO, R. Uma introduo histria do design. So Paulo: Edgard Blcher, 2000.

    DONDIS, Donis A. Sintaxe da linguagem visual. So Paulo: Martins Fontes, 1991.

    FIDLER, R. Mediamorfosis: comprender los nuevos medios. Buenos Aires: Granica, 1998.

    FINBERG, Howard I.; ITULE, Bruce D. Visual Editing - a graphic guide for journalists. Belmont: Wadsworth Publishing Company, 1989.

    O DESIGN DAS CAPAS DO JORNAL ZERO HORA DE 1990 A 2010

  • BRAZILIAN JOURNALISM RESEARCH - Volume 7 - Nmero 1 - 2011170

    GRUSZYNSKI, A. Jornal Impresso: Produto Editorial Grfico em Transformao. Anais do XXXIII Congresso Brasileiro de Cincias da Comunicao INTERCOM. Caxias, set. 2010.

    MOUILLAUD, M. Da forma ao sentido. In: MOUILLAUD, M.; PORTO, S. (org.). O jornal. Da forma ao sentido. Braslia: Editora UnB, 2002. p. 29-35.

    QUADROS, C.; QUADROS JR., I. B.; MASIP, P. M. Webjornalismo: da forma ao sentido. Os casos de Gazeta do Povo e La Vanguardia. Revista Galxia, So Paulo, n. 20, p. 161-177, dez. 2010.

    RECCHIA, M. Da Remington Redao Integrada: incorporao de tecnologias na prtica jornalstica e a transformao da visualizao da notcia no jornal Zero Hora. 2010. 350 f. Dissertao (Mestrado em Concentrao em Comunicao Miditica) - Universidade de Santa Maria, Santa Maria, 2010.

    STRELOW, A.; GRUSZYNSKI, A.; NECCHI, V. Backup do jornalismo digital. In: PRIMO, A. Mapeamento 2: do ensino de jornalismo digital no Brasil em 2010. So Paulo: Ita, 2010.

    TRAQUINA, N. Teorias do Jornalismo. A Tribo Jornalstica uma comunidade interpretativa transnacional. Florianpolis: Insular. V. 2, 2005.

    WOLF, M. Teorias da Comunicao. Portugal: Editorial Presena, 2006.

    Ana Gruszynski doutora em Comunicao pela Pontifcia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Professora do Programa de Ps-graduao em Comunicao e Informao (PPGCOM) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). E-mail: [email protected]

    Bruna Amaral graduada em Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Atua como jornalista na Zero Hora. E-mail: [email protected]

    Ana Gruszynski e Bruna Amaral