desenho animado - calça quadrada, cabeça redonda - tese de mestrado

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Tese de Mestrado - UFPB

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA CENTRO DE EDUCAO

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO LINHA DE PESQUISA: POLTICAS PBLICAS E PRTICAS EDUCATIVAS

    DESENHO ANIMADO E EDUCAO: Cala Quadrada, Cabea Redonda?

    MARGARIDA SONIA M. MONTE SILVA

    Orientadora: Prof. Dra. Adelaide Alves Dias

    JOO PESSOA 2010

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    MARGARIDA SNIA M. MONTE SILVA

    DESENHO ANIMADO E EDUCAO: Cala Quadrada, Cabea Redonda?

    Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Educao da Universidade Federal da Paraba como requisito parcial para obteno do grau de Doutora em Educao, sob a orientao da Prof. Dra. Adelaide Alves Dias.

    JOO PESSOA 2010

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    S586d Silva, Margarida Snia M. Monte Desenho animado e educao: cala quadrada, cabea redonda?/

    Margarida Snia M. Monte Silva. Joo Pessoa : UFPB, 2010. 167 f.: il. Orientadora: Adelaide Alves Dias.

    Tese (Doutorado) UFPB /CE.

    1. Pedagogia crtica. 2. Desenho animado. 3. Representao simblica. 4. Internalizao. 5. Resistncia.

    UFPB/BC CDU: 37.013(043)

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    MARGARIDA SONIA M. MONTE SILVA

    DESENHO ANIMADO E EDUCAO: Cala Quadrada, Cabea Redonda?

    Aprovada em: ____/____/______

    BANCA EXAMINADORA

    ___________________________________________________

    Orientadora: Prof. Dr. Adelaide Alves Dias UFPB

    ___________________________________________________

    Prof. Dr. Walter Matias Lima UFAL

    ____________________________________________________

    Prof. Dr. Glria das Neves Dutra Escario UFPB

    ____________________________________________________

    Prof. Dr. Snia de Almeida Pimenta UFPB

    ____________________________________________________

    Prof. Dr. Jos Vaz Magalhes Neto UFPB

    JOO PESSOA 2010

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    A Gilberto, lugar seguro das minhas lembranas. A Joo Gabriel, filsofo e razo da minha vida. A Sarinha, anjo e alegria do meu viver.

    Dedico

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    AGRADECIMENTOS

    Ao Deus misericordioso, por ter me concedido mais uma vitria na minha vida.

    Aos meus queridos pais, Jos e Giselda, obrigado por tudo que me ensinaram e me apoiaram por toda uma vida.

    Aos meus irmos: Hildebrando, Edmundo e Leonardo em cuja determinao eu me espelho.

    s minhas irms, companheiras e amigas, fontes de apoio incondicional, Lcia, Helena e Zelinha, que carinhosamente chamo de: As trs Marias.

    A Joo Gabriel que, com sua filosofia infantil, me motivou a escolher o tema desse trabalho e pelas suas sugestes durante o percurso de elaborao.

    A Sarinha, que com alegria, serenidade e companheirismo tornou menos rdua a caminhada.

    direo, ao corpo docente e aos funcionrios da Escola de Educao Bsica da Universidade Federal da Paraba, pela acolhida carinhosa e por permitirem a realizao da pesquisa.

    s amadas crianas participantes da pesquisa de campo, que com seu conhecimento e capacidade me conduziram a saber mais sobre elas.

    A Michelle Kely Batista Silva, pelo seu excelente trabalho de filmagem das rodas de conversa.

    prof. Dr. Adelaide Alves Dias que orientou esse trabalho, obrigada pelo profissionalismo eficiente, pela justia e principalmente pela amizade.

    amiga Nazar Zenaide sempre presente em minha vida com sua ajuda eficiente, amizade grandiosa, incentivo constante e humildade edificante. Obrigada por permanecer minha amiga.

    A Mara Simes, que com bondade esteve presente, de maneira prestimosa sem reclamar diante dos meus inmeros limites.

    A todos os colegas da turma 26 do Doutorado em Educao pelo incentivo e companheirismo.

    Finalmente, a todos que contriburam para a realizao deste trabalho.

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    SILVA, Margarida Sonia Marinho do Monte. Desenho animado e educao: Cala quadrada, cabea redonda? 2010. 180p. Tese (Doutorado em Educao) Programa de Ps-Graduao em Educao. Universidade Federal da Paraba. Universidade Federal da Paraba UFPB, Joo Pessoa, 2010.

    RESUMO

    A tese contm uma anlise da relao entre os contedos transmitidos pelo desenho animado Bob Esponja e a formao da subjetividade infantil utilizando os conceitos de representao simblica, internalizao e resistncia, baseados em Piaget (1978) Vygotsky (2007) e Giroux (1986), respectivamente. Nesta investigao, participaram 62 crianas de 03 a 05 anos, alunos da Escola de Educao Bsica da Universidade Federal da Paraba, matriculados nos turnos manh e tarde em 2009. A pesquisa etnogrfica utilizou a observao direta, entrevistas com os alunos e rodas de conversa antes e depois que os mesmos assistiram ao vdeo do desenho animado Bob Esponja. Os dados obtidos e submetidos a anlise indicam que os contedos do referido desenho interferiram na subjetividade dos espectadores infantis de 03 e de 04 anos, em proporo maior do que naqueles de 05 anos. Esta interferncia demonstrada pela preferncia em ser o personagem principal do desenho, adotando atitudes e comportamentos padronizados, no entanto, no os impedindo de acrescentar aos contedos do desenho animado um sentido prprio. A tese defende ainda que a educao escolar tem potencial para capacitar os alunos no sentido de educar para mdia televisiva, especificamente os desenhos animados, atravs do dilogo e anlise crtica, procedimentos adotados pela pedagogia crtica. Conclumos que devemos integrar escola os estudos de educao para a mdia televisiva, como instrumento pedaggico e como objeto de estudo para que se desenvolva nos alunos uma postura crtica diante dela.

    Palavras-chave: Desenho animado Representao simblica Internalizao Resistncia Pedagogia crtica.

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    SILVA, Margarida Sonia Marinho do Monte. Cartoon and education: square pants, round head? 2010. 180p. Thesis (Doctorate in Education) Post-graduation Program in Education. Federal University of Paraba. Federal University of Paraba UFPB, Joo Pessoa, 2010.

    ABSTRACT

    The thesis presents an analysis of the relation between the contents transmitted by the SpongeBob animated series and the infantile subjectivity formation using the concepts of symbolic representation, internalization and resistance based on Piaget (1978) Vygotsky (2007) and Giroux (1986) respectively. In this investigation sixty-two children, between 03 and 05 years old, took part. They were students from the Basic Education School of the Federal University of Paraba, enrolled in the morning and afternoon shifts in 2009. The ethnographic research used the direct observation, interviews with the students and dialogues in circle before and after they watched the SpongeBob series video. The data obtained and submitted to analyses indicate that the contents, of the mentioned cartoon, intervened in the subjectivity of the infantile spectators, between 03 and 04 years old, in a proportion higher than in those who were 05 years old. Such interference is demonstrated by the preference of being the main cartoon character, adopting standardized attitudes and behaviors. Nevertheless, this does not prevent the children from adding their own meaning to the cartoons contents. The thesis still advocates that the school education has the potential to prepare the students as concerns educating them by means of the television media, specifically, the cartoons, through the dialogue and the critical analysis; procedures adopted by the critical pedagogy. We concluded that we should integrate to school the educational studies for the television media as both a pedagogical instrument and a study object so as to promote a critical behavior in the students in regard to the media.

    Keywords: Cartoon Symbolic representation Internalization Resistance Critical pedagogy.

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    SILVA, Monte Margarida Marinho Sonia. Dibujos animados y educacin: pantalones cuadrados, cabeza redonda? 2010.180p. Tesis (doctorado en educacin) Programa de posgrado en educacin. Universidad Federal de Paraba. Universidad de Federal de Paraba UFPB, Joo Pessoa, 2010.

    RESUMEN

    La tesis presentada contiene un anlisis de la relacin de los contenidos transmitidos por el dibujo animado Bob Esponja y la formacin de la subjetividad infantil mediante los conceptos de representacin simblica, internalizacin y resistencia, basados en Piaget (1978), Vygotsky (2007) y Giroux (1986) respectivamente. En esta investigacin han participado 62 nios de 3 a 5 aos, alumnos de la Escuela de la Educacin Bsica de la Universidad Federal de Paraba, matriculados por la maana y por la tarde en el ao de 2009. La investigacin etnogrfica ha utilizado la observacin directa, entrevistas con estudiantes y ruedas de conversacin antes de que ellos hubieran visto el video del dibujo animado de Bob Esponja como tambin despus de que lo haban visto. Los datos obtenidos y sometidos a anlisis indican que los contenidos de ese diseo, interfiere en la subjetividad de los espectadores infantiles de 3 y de 4 aos en una proporcin ms amplia que en los de 5 aos. Esa interferencia es demostrada por la preferencia en "ser" el personaje principal del diseo, adoptando actitudes y conductas estandarizadas, sin embargo, no les impide aadir a los contenidos del dibujo animado un sentido propio. La tesis sostiene todava que la educacin escolar posee el potencial para habilitar a los alumnos hacia la educacin de los medios de televisin, especficamente los dibujos animados, mediante el dilogo y el anlisis crtico, procedimientos adoptados por la pedagoga crtica. Hemos llegado a la conclusin de que debemos integrar a la escuela, los estudios de educacin para los medios de televisin, como una herramienta pedaggica adems de un objeto de estudio para que se desarrolle en los aprendices una postura crtica frente a ella.

    Palabras clave: Dibujo animado Representacin simblica Internalizacin Resistencia - Pedagoga crtica.

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    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 D. A. Popaye .......................................................................................33 Figura 2 D. A. Pockemon...................................................................................34 Figuras 3 Desenhos Animados Disney .............................................................38 Figuras 4 Contos de Fadas ...............................................................................39 Figura 5 Maurcio de Sousa e seus personagens .............................................39 Figura 6 D. A. Pockemon ..................................................................................40 Figura 7 Criana assistindo televiso ................................................................41 Figura 8 Heris de desenhos antigos ................................................................42 Figuras 9 Produtos com ilustraes de desenhos animados ............................45 Figura 10 D. A. As meninas super poderosas ...................................................46 Figura 11 D. A. O Laboratrio de Dexter ...........................................................47 Figura 12 D. A. Dragon Ball-Z ...........................................................................47 Figura 13 D. A. Pica-Pau...................................................................................48 Figura 14 D. A. Jimmy Nutron ........................................................................48 Figura 15 D. A. Tom e Jerry ..............................................................................49 Figuras 16 D. A. Bob Esponja Cala Quadrada ...............................................50 Figura 17 D. A. Bob Esponja .............................................................................51 Figura 18 Morada de Bob Esponja ...................................................................51 Figura 19 Patrick ...............................................................................................52 Figura 20 Lula Molusco .....................................................................................53 Figura 21 Sr. Siriguejo.......................................................................................54 Figura 22 Sandy ................................................................................................54 Figuras 23 Produtos com ilustraes de Bob Esponja .....................................83 Fotos 1 Brindes da lanchonete Burger King ......................................................83 Figuras 24 Ilustraes de vrios desenhos animados.....................................104 Figuras 25 Ilustraes referentes ao d.a. Bob Esponja...................................105

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    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 N total de alunos de 3 a 5 anos (2009) ..........................................102

    Quadro 2 Nmero de meninos e meninas pesquisados quanto ao reconhecimento do desenho animado Bob Esponja, seus personagens e sua preferncia por eles. .......................................103

    Quadro 3 Caracterizao das crianas em funo do reconhecimento do desenho animado Bob Esponja e sua preferncia. .........................106

    Quadro 4 Nmero de alunos por turma e turno que participaram da segunda fase da pesquisa: ............................................................................110

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    LISTA DE SIGLAS

    UFPB Universidade Federal da Paraba

    EEB UFPB Escola de Educao Bsica da Universidade Federal da Paraba

    D. A. Desenho Animado

    CEMC Cultura Educacional Mundial Comum

    AGEE Agenda Globalmente Estruturada para a Educao

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    SUMRIO

    1 CONTEXTUALIZANDO O TEMA ....................................................................13 1.1 Criana e Visibilidade Social.......................................................................21

    2 CULTURA INFANTIL E DESENHO ANIMADO................................................30 2.1 A Televiso e o Telespectador ..................................................................30 2.2 Desenhos Animados ....................................................................................37 2.2.1 Um pouco da histria...................................................................................37 2.2.2 Os desenhos animados e a criana ............................................................40 2.2.3 Se liga nessa!..............................................................................................44 2.2.4 Bob Esponja Cala Quadrada ...................................................................50

    3 SUBJETIVIDADE E DESENVOLVIMENTO INFANTIL ....................................57 3.1 Construo, Interao, Cognio Jean Piaget: Um olhar......................58 3.2 Construo, Interao, Cultura Lev, Vygotsky: Outro olhar .................65 3.3 Globalizao, Indstria Cultural e Consumo .............................................72 3.4 Construo, Interao, Cultura, Resistncia Henry Giroux: Olhares que se cruzam ..............................................................................................88

    4 ORGANIZAO DOS DADOS DA PESQUISA ..............................................98 4.1 Natureza e Lcus da Pesquisa ...................................................................98 4.2 Procedimentos na Construo e Anlise dos Dados..............................100 4.3 Descrio e Anlise da Primeira Fase da Pesquisa Aproximao e Busca..102 4.4 Descrio e Anlise da Segunda Fase da Pesquisa Interao e Registro .108 4.4.1 Escolha do episdio ..................................................................................108 4.4.2 Assistindo ao episdio...............................................................................110 4.4.3 Roda de conversa e confeco dos desenhos..........................................111 4.4.4 Voc quer ser Bob Esponja? Falas das crianas.....................................113 4.4.5 Fazendo arte fantasia e realidade .........................................................114 4.4.6 Na pista dos saberes.................................................................................155

    CONSIDERAES FINAIS ................................................................................159

    REFERNCIAS...................................................................................................161 APNDICES .......................................................................................................168

    Apndice 1....................................................................................................169 Apndice 2....................................................................................................170

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    1 CONTEXTUALIZANDO O TEMA

    Estudiosos das mais diversas reas de conhecimento dedicaram-se e ainda se dedicam a pesquisar sobre desenhos animados e sua relao com a comunicao, educao, brincadeiras e jogos, sexualidade, violncia, estados psicolgicos e imaginrio infantil. Os efeitos dos desenhos animados sobre quem os assiste so incontestveis. O que desejamos conhecer como ocorre tal influncia numa determinada faixa etria do desenvolvimento humano.

    Os desenhos animados so parte integrante da mdia televisiva que, hoje, assume, junto escola e famlia, papel significativo na educao das novas geraes. Com esta afirmativa no estamos atribuindo falta de autonomia aos telespectadores diante da mdia televisiva. Apesar de sabermos que os textos miditicos so carregados de sentido e servem a propsitos e interesses preestabelecidos, investigamos aquele que os recebe e sua relao com eles. A criana, quando assiste aos desenhos animados, constri sentido para o que v na televiso. O que nos interessa investigar como eles influenciam a subjetividade de crianas de 3 a 5 anos de idade. O desenho animado Bob Esponja Cala Quadrada o instrumento miditico que utilizamos para estudar essa relao. Diante de tais concepes institumos como tese para essa investigao:

    O desenho animado Bob Esponja com seus contedos, ao mesmo tempo que diverte, interfere na formao da subjetividade de crianas de 3 a 5 anos de idade que, por sua vez, constroem sentido para o que assistem mediante o contexto social em que esto inseridas.

    Nossos objetivos, nesse estudo so: investigar como ocorre o processo de construo de sentidos em crianas de 3 a 5 anos de idade ao assistirem o desenho animado Bob Esponja, isto , como ele influencia em suas subjetividades; verificar qual a frequncia com que crianas de 3 a 5 anos assistem ao desenho animado Bob Esponja, e a preferncia em relao ao mesmo dentre outros desenhos animados; atribuir criana a condio de receber e participar como autora das produes culturais; e, por ltimo, pretendemos incentivar educadores a desenvolverem o hbito de relacionar-se criticamente diante da mdia televisiva,

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    especificamente diante dos desenhos animados, tornando-os em meios que contribuam para o desenvolvimento infantil de forma emancipatria.

    Apresentamos o trabalho de pesquisa atravs de 4 (quatro) captulos. O primeiro deles, que ora estamos escrevendo, intitula-se Contextualizando o Tema, que contm a exposio da tese, objetivos, justificativa e consideraes sobre os captulos desenvolvidos. Ainda nesse primeiro captulo, dissertamos sobre a criana e visibilidade social, a televiso e o espectador, os desenhos animados, contando um pouco da histria dos mesmos, sua relao com as crianas e descrevemos alguns desenhos animados veiculados pela televiso brasileira. O desenho animado Bob Esponja, que foi escolhido como instrumento na pesquisa, tambm descrito nesse primeiro captulo. Bob Esponja Cala Quadrada um desenho animado veiculado atravs da televiso brasileira, desde 1999 e tem sido objeto de estudo de dissertao de Mestrado, artigos de peridicos e de trabalho de concluso de curso. Citamos alguns desses estudos no desenvolvimento dessa investigao, a exemplo de Boutin (2006) que apresentou a dissertao de Mestrado: Aspectos Pedaggicos do Desenho Animado Infantil Bob Esponja Universidade Metodista de So Paulo em So Bernardo do Campo. Pillar (2009) com o artigo: Efeitos de humor de Bob Esponja e Medeiros (2009) que apresentou: Produes de sentido em Bob Esponja Cala Quadrada. Ainda Lira (2005) escreveu O Merchandising Capitalista no Desenho Bob Esponja e Silva (2008) apresenta Desenho Animado: Instrumento de Manuteno Social, ambos os trabalhos apresentados na concluso de cursos de Graduao.

    Quanto a forma como abordamos a infncia concedendo-lhe visibilidade, captando suas opinies e concepes, no interpretando suas falas nem tampouco transcrevendo-as. Consideramos que h a necessidade de no esquecer a criana como sujeito, cidad, que tem voz e que produz cultura. As crianas tm o direito de dar um sentido diferente aos conceitos e aes e produzir uma nova leitura do mundo, e queremos garantir a elas esse direito.

    Estudar a mdia atravs de um desenho animado investigar como ocorre a relao entre mdia e fico no desenvolvimento infantil. Lembramos que as pesquisas revelam os desenhos animados como preferncia das crianas, dentre outras narrativas ficcionais (FANTIN, 2006). O desenho animado Bob Esponja Cala Quadrada que como instrumento na nossa pesquisa tem um dos maiores ndices

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    de audincia no Brasil, se comparado aos outros 170 pases em que veiculado (PILLAR, 2009). Como motivao pessoal, ao exercermos o magistrio superior, temos estudado o papel do desenho animado como estratgia pedaggica, acompanhando o trabalho de concluso de Curso de Pedagogia de alguns alunos estagirios. Tambm apresentamos artigos em simpsios e congressos que tratam do desenho animado como texto, e como seus contedos so compreendidos pelas crianas. O interesse pelo estudo do desenho animado remonta ainda constatao no seio familiar, ou seja, nos filhos, da preferncia desse tipo de mdia televisiva e a inerente necessidade em acompanhar o desenvolvimento dos mesmos.

    Outra justificativa podemos encontrar no papel que a televiso exerce na vida das pessoas. Como meio de comunicao de massa ela tem um papel importante na formao do sujeito como veculo de informao e comunicao junto com outros meios (MOLINA e PRADOS, 2009). s vezes reconhecida como estimuladora da violncia, apatia e consumo, porm, tambm reconhecida como estimuladora do conhecimento, informao e diverso (FERNANDES, 2003). Advm dessa dicotomia, a escolha do ttulo da tese em questo. Quando apresentamos a indagao Cala Quadrada, Cabea Redonda?, estamos nos referindo possibilidade dos contedos do desenho animado Bob Esponja em homogeneizar ou no o pensamento daqueles que o assistem. A realidade das crianas brasileiras quanto preferncia pela televiso, alm de outros meios miditicos, acrescentada preferncia tambm de muitos pais, pois estando a criana assistindo TV em casa, estaria, em termos, longe dos riscos que a rua oferece como drogas, prostituio, roubo, violncia, dentre outros, no horrio oposto ao que frequentam a escola. No Brasil, o tempo de permanncia na escola ainda inferior ao que a criana permanece fora da escola.

    Na escola, a TV no utilizada como estratgia pedaggica na maioria das vezes e, assim, os alunos assistem a filmes infantis, documentrios, entrevistas, desenhos animados, apenas como entretenimento. Quando bem planejada, essa atividade alcana o objetivo proposto, e os alunos correspondem com prazer e aprendizagem. Portanto, cabe aos educadores considerar a cultura da mdia como uma fora educacional substancial, uma pedagogia pblica, como afirma Giroux

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    (2003), e utiliz-la para a construo de conhecimento crtico, reflexivo e emancipatrio dos alunos.

    Vejamos atravs dos tempos, como chegamos aos dias de hoje cultura de imagens.

    Desde a Antiguidade Clssica at o Renascimento a tradio oral prevaleceu na organizao do conhecimento. Sem registros escritos, a fala preenchia, alm da funo de comunicao, a de conservao do conhecimento. Era a supremacia auditiva que, mesmo aps o surgimento da escrita, perdurou por muito tempo, pois o conhecimento da mesma era ento monoplio de uma elite de escribas alheia s massas iletradas. At o sculo XV, a literatura existia para ser narrada em pblico, e o manuscrito era apenas um instrumento acessrio dessa vasta e influente cultura oral.

    A cultura tipogrfica introduziu a viso como o primeiro dos sentidos na hierarquia, tomando o lugar da audio. A linguagem escrita liberou o homem da dependncia da memria do falante para a aquisio do conhecimento. Por meio de caracteres, a escrita conservaria o conhecimento.

    Sculos depois, os meios eletrnicos estenderam e extrapolaram os limites usuais da viso e da audio, alterando nossa realidade cotidiana. Uma sensibilidade nova parece se instalar no indivduo contemporneo, cada vez mais incapaz de viver sem estmulos audiovisuais.

    Os meios de comunicao como jornal, rdio, televiso, trem, carro, moeda, etc. so verdadeiras extenses do homem, pois servem para vincul-lo aos outros homens. Eles so mensagens que podem exercer efeitos distintos sobre a mente.

    As sociedades contemporneas industrializadas so consideradas sociedades de massa, ou seja, compostas por grande nmero de indivduos annimos. As instituies dominantes, escolas, igrejas, etc., tentam prover as necessidades dessa multido de pessoas. Essas instituies tambm criam outras perspectivas, da mesma forma em que desenvolvem mecanismos eficazes para controlar essas massas humanas, faz-las produzir, consumir e se conformar.

    Uma sociedade assim, exige mecanismos culturais adequados, capazes de transmitir informaes com rapidez para o maior nmero de pessoas possvel. So mecanismos que transmitem uma viso de mundo dos diferentes povos,

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    ultrapassando barreiras de espao fsico e social. Tais instrumentos so principalmente o rdio, a televiso, a imprensa e, mais recentemente, a informtica, que fazem parte da cultura niveladora, homogeneizadora, produto da indstria cultural.

    A indstria cultural, centrada nesses meios de comunicao de massa, tem um ritmo acelerado de produo e consumo e constitui uma esfera da atividade econmica. Ela ainda exerce um papel fundamental na organizao social e est, sem dvida, associada ao exerccio do poder e ordenao da vida coletiva.

    Os meios de comunicao de massa penetram em todas as esferas da vida social moderna, no meio urbano ou rural, na vida profissional, nas atividades religiosas, no lazer, na educao, na participao poltica. Eles tambm difundem maneiras de se comportar, propem estilos de vida, modos de organizar a vida cotidiana, de se vestir, de construir sua casa, maneiras de falar e de escrever, de sonhar, de sofrer, de pensar, de lutar, de amar.

    Eles ainda funcionam de forma homogeneizadora dirigindo mensagens comuns a todos, gerando necessidades e expectativas massificadas. A lgica de sua maneira de funcionar o amaciamento dos conflitos sociais: A indstria cultural parece homogeneizar a vida e viso do mundo das diversas populaes (SANTOS, 2005). Percebemos, no entanto, que a prpria indstria cultural tambm est suscetvel a contradies na vida social. Sobre as mensagens transmitidas o controle no total, pois por mais homogneo que seja o contedo delas no possvel substituir integralmente a percepo das pessoas.

    Os meios de comunicao, e, em particular a televiso, exercem alguma influncia sobre quem deles faz uso e utilizam a linguagem como instrumento. So as palavras que levam os indivduos a se modificarem, como tambm os gestos e as imagens. A linguagem em geral, portanto, alm de ser um conjunto de estmulos (sinais) visuais compreende, ainda, o modo como as pessoas se organizam. Da, tambm, sabe-se que a leitura de elementos idnticos ou semelhantes pode ter muitas possibilidades. Por conseguinte as consequncias da linguagem podem ser negativas ou positivas, dependendo do seu uso e dos meios que so utilizados para transmiti-la. A linguagem exerce um papel importantssimo na vida das pessoas.

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    As novas tecnologias da comunicao introduziram outras linguagens, invadindo com imagens, som e informaes, de maneira to forte, intensa e insistente, quase todos os cantos e recantos do Planeta e de nossa privacidade (CARLOS, 2006).

    o texto imagem, que reeduca o olhar, o perceber do espectador. A imagem tem um papel fundamental na leitura de mundo, tanto para os letrados como para os iletrados e, comprovadamente, mais para estes ltimos. Os programas televisivos tm o poder de ativar a percepo para os diferentes nveis de conscincia crtica. A tica presente na escolha das imagens das imagens transmitidas pela televiso e cinema pode inibir ou estimular estilos de conduta. O filsofo brasileiro Brissac Peixoto, 1992 (apud PAIVA, 2005) mostra a potncia do imaginrio vigilante do cinema, orientando estilos de gosto e formas de conduta, configuraes tico-estticas no cenrio urbanizado das grandes cidades. Com certeza, o telespectador tem a liberdade de exercer sua faculdade de julgar, porm, devemos nos lembrar da possibilidade menor de que dispem as crianas, ainda, de utilizar seu senso crtico. Os desenhos animados povoam o imaginrio infantil de heris e viles que representam figuras sedutoras e poderosas, mas, s vezes, estranhas e mesquinhas. Essa ambiguidade, pode no ser percebida pela criana. A TV exerce uma ao de seduo e condicionamento sobre ela a ponto de se transformar uma necessidade fundamental como alimentar-se ou divertir-se. Atravs da TV so difundidas imagens junto s diversas culturas locais, como um tipo de padronizao do imaginrio e estilo de vida, mobilizando momentos preciosos de investimento afetivo. O carter da interculturalidade dos programas televisivos exibidos internacionalmente merece tambm ateno, quando nos reportamos mdia televisiva e objetividade infantil. As imagens televisivas trazem consigo outro tipo de ambiguidade, ou seja, apresentam uma stira dos costumes como tambm uma apologia das convenes (PAIVA, 2005). Estaria de acordo com o carter ambguo da globalizao, isto , inovar e conservar. A outra reflexo que podemos destacar que a dicotomia entre o bem e o mal muitas vezes torna-se banal nos desenhos animados e para as crianas pode no ficar claro o que certo e errado. Nota-se que, nas tramas dos desenhos animados, os humilhados e desgraados pela ao do destino ou pela maldade dos poderosos absorvem o esprito individualista, adquirem uma conscincia ressentida

  • 19

    do mundo e a partir de um plano pessoal partem para destruir seus algozes (COSTA, 2002). Passamos a descrever o segundo captulo onde desenvolvemos o marco terico cujo ttulo Subjetividade e Desenvolvimento Infantil, e foi subdividido em quatro sesses ou itens. Os conceitos de representao simblica definido por Jean Piaget (1978) e de internalizao apresentado por Vygotsky (2007) (sesses 1 e 2 deste captulo) so importantes para a compreenso desse processo, como tambm o conceito de indstria cultural (sesso 3), criado por Adorno e Horkheimer (1985), socilogos participantes e fundadores da Escola de Frankfurt, juntamente com outros estudiosos da Teoria Crtica da Sociedade (sesso 5). Outro elemento conceitual importante est contido nos estudos de Giroux (1986), que nos possibilita, atravs dos conceitos de resistncia e pedagogia crtica, uma viso no tradicional da escola (sesso 4). A representao simblica a caracterstica marcante do segundo estgio de desenvolvimento cognitivo proposto por Piaget (1978). Nesse estgio, a compreenso e o pensamento simblico so reorganizados, porm, no h lgica. O pensamento da criana geralmente egocntrico, sendo, incapaz de considerar outras perspectivas que no sejam as suas e animista, atribuindo motivao e caractersticas humanas a objetos inanimados e aos animais. Ainda nesse estgio, a criana tem dificuldade para distinguir entre fantasia e realidade, e essencialmente, baseia suas concluses no pensamento intuitivo.

    Os estudos sobre mdia que utilizam a teoria piagetiana, em sua maioria, focalizam-se nas caractersticas cognitivas do pensamento pr-operacional (2 a 7 anos, apesar de as crianas desse estgio apresentarem progressos espetaculares em relao ao anterior no mbito de vrios saberes como linguagem, desenho e atividades prticas de vida diria. nesse estgio que elas apresentam maior suscetibilidade de serem influenciadas pelos estmulos simblicos provocados pelos contedos da TV, inclusive com possibilidades de criar ou reforar padres j existentes de consumo. fundamental que percebamos como a mdia televisiva atua na construo e produo das memrias infantis estando seus contedos presentes nas reas econmica, social, familiar, escolar, etc (FISCHER, 2007).

    O conceito de internalizao por Vigotsky explicado no como um determinismo social sobre o individual. Ao contrrio, a criana se apropria do social

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    de uma forma muito particular, de maneira que internalizao e transformao interagem constantemente. Nas pesquisas sobre subjetividade e mdia televisiva, a teoria vygotskyana (2007) ajuda a explicar como realmente a qualidade das trocas provindas dos contedos cognitivos influencia decisivamente na forma como as crianas tornam mais complexo o seu pensamento e processam novas informaes.

    O conceito indstria cultural foi empregado pela primeira vez em 1947, quando foi publicado o livro Dialtica do Esclarecimento de Adorno e Korkheimer. Esse conceito, explicaram eles, visava substituir cultura de massas, pois esta expresso induz ao engodo que satisfaz aos interesses dos detentores dos veculos de comunicao de massa. Estes ltimos querem dar a entender que cultura de massas como uma cultura surgindo espontaneamente das prprias massas. Para Adorno (2002), tal no ocorre, pois afirma ele que a indstria cultural quem adapta seus produtos ao consumo das massas e determina o prprio produto, e, o conceito de indstria cultural d base intencionalidade de formao de um tipo de cultura.

    Adorno e Horkheimer (1985) expem de modo bem claro que a cultura se converteu em mercadoria. A proposio advm da expresso desenvolvida por eles de indstria cultural, a qual refere-se s indstrias interessadas na produo em massa de bens culturais, ressaltando que a expresso no diz respeito s empresas produtoras nem s tcnicas de difuso de bens culturais, e sim a um movimento histrico-universal.

    Os desenhos animados, como um tipo de mdia televisiva, encerram duas possibilidades: a produo de sentido por parte do espectador, como tambm, so dotados de intencionalidade que corresponde aos interesses das classes dominantes. Perpassando sobre essas possibilidades apresentamos a sesso: Globalizao, Indstria Cultural e Consumo.

    Por ltimo, no item 4, ainda como base terica, concentramos a ateno nos estudos de Henry Giroux (1986), que tratam da resistncia e pedagogia crtica em Educao. Ele analisa a escola como um local de dominao e reproduo, mas que, ao mesmo tempo, permite um espao de resistncia. Nesse mbito, nos presenteia com a possibilidade da pedagogia crtica. Tais elementos conceituais se apresentam necessrios quando, na consecuo de um dos objetivos da pesquisa, almejamos alertar para a necessidade da reflexo crtica frente mdia televisiva, especificamente frente aos desenhos animados.

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    O quarto captulo transcorre como, metodologicamente, conduzimos a pesquisa e o intitulamos: Organizao dos Dados da Pesquisa. Est subdividido em: Natureza e Lcus da Pesquisa; Procedimentos na Construo e Anlise dos Dados; Descrio da Primeira Fase da Pesquisa Aproximao e Busca e Descrio da Segunda Fase da Pesquisa Interao e Registro..

    Nas consideraes finais, intencionamos enfatizar os aspectos conclusivos da pesquisa, como tambm opinies e sugestes relativas s concluses.

    1.1 Criana e Visibilidade Social

    Um dos objetivos dessa investigao contribumos, para a afirmao de que a criana produz e produzida na/pela cultura. Dentro dessa concepo sociocultural, o conceito de criana uma construo histrica e sua constituio se d mediante interaes sociais. A criana no um ser passivo e deve ser compreendida como um ser capaz de experimentar, criticar e julgar (DIAS, 2009).

    Atualmente, est tambm se tornando um consenso entre os investigadores da infncia que, em suas pesquisas, devem revelar o ponto de vista da criana (VASCONCELOS e SARMENTO, 2007). Isto significa que no damos voz criana, posto que a ela j est atribuda esta capacidade, mas nos empenhamos em escut-la. Para tanto, os estudos investigativos sobre a infncia precisam colocar a criana no centro da indagao, considerando-a interlocutora privilegiada e co-autora nas e das pesquisas. As pesquisas devem buscar conhecer as crianas por meio do que elas mesmas expressam, observando a vitalidade de suas aes em diferentes contextos da atualidade. Assegurando visibilidade s numerosas formas de pensamento e aes das crianas, os pesquisadores atentam para falar com as crianas e no falar por elas. Isto significa consider-las atores sociais plenos, constituindo um desafio terico-metodolgico para os estudiosos da infncia. Constitui uma perspectiva sociolgica que considera no s as adaptaes e internalizaes dos processos de socializao, mas tambm os processos de apropriao, reinveno e reproduo realizadas pela criana (DELGADO e MLLER, 2005).

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    Nas suas pesquisas, os socilogos da infncia assumem o lugar de aprendizes deixando-se levar pelas mos e pelas vozes das prprias crianas e assim que conduzimos a presente investigao. Sarmento (2007) postula que:

    a infncia tem sofrido um processo de ocultao. Esse processo decorre das concepes historicamente construdas sobre as crianas e dos modos como elas foram inscritas em imagens sociais que tanto esclarecem sobre os seus produtores (o conjunto de sistemas estruturados de crenas, teorias e idias, em diversas pocas histricas) quanto ocultam a realidade dos mundos sociais e culturais das crianas, na complexidade da sua existncia social.

    Mais uma vez reforamos que a conduo da nossa pesquisa com crianas contextualizando-as socialmente, atribuindo importncia a sua participao.

    O interesse histrico pela infncia relativamente recente. A referncia histrica infncia aparece tardiamente e essa , alis, uma das razes que levaram ries (1981) a afirmar a ausncia da conscincia da idia da infncia at o incio da modernidade.

    Os estudos dos socilogos da infncia atuam em dois campos:

    Estrutura e ao: substitui o reducionismo biolgico pelo reducionismo sociolgico.

    Ser em devir: considerar que a criana um vir a ser esquecer que carter inacabado da vida dos adultos to evidente quanto o das crianas.

    A historiografia mais recente sobre a infncia tem considerado que:

    mais do que ausncia da conscincia da infncia, na Idade Mdia e na pr-modernidade existiam concepes que foram profundamente alteradas pela emergncia do capitalismo, pela criao da escola pblica e pela vasta renovao das idias com a crise do pensamento teocntrico e o advento do racionalismo. Os sculos XVII e XVIII, que assistem a essas mudanas profundas na sociedade, constituem o perodo histrico em que a moderna idia da infncia se cristaliza definitivamente, assumindo um carcter distintivo e constituindo-se como referenciadora de um grupo humano que no se caracteriza pela imperfeio, incompletude ou miniaturizao do adulto, mas por uma fase prpria do desenvolvimento humano (SARMENTO, 2007).

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    Expomos, em seguida, as concepes apresentadas por Sarmento (2007) sobre as imagens sociais da infncia, frisando que a criao de sucessivas representaes das crianas ao longo da histria produziu um efeito de invisibilizao da realidade social da infncia.

    Baseando-se nos estudos de Jenks & Prout, o autor citado anteriormente destaca dois perodos quanto construo da imagem da criana: a pr-sociolgica e a sociolgica. Segue uma suscinta explanao de cada uma delas.

    1. Imagens da criana pr-sociolgica:

    A criana m (the evil child) baseada na idia do "pecado original", a imagem da criana m est associada a toda uma conceitualizao do corpo e da natureza como realidades que necessitam de serem controladas; a teoria de Hobbes sobre a exigncia de controle dos "excessos".

    A criana inocente contrapondo-se criana m, essa concepo fundamenta-se no mito romntico da infncia como a idade da inocncia.

    A criana imanente essa imagem considera a idia de um potencial de desenvolvimento da criana, no a partir de uma natureza intrinsecamente boa, mas da possibilidade de aquisio da razo e da experincia, a qual aparece na formulao filosfica da teoria da sociedade de John Locke.

    A criana naturalmente desenvolvida a psicologia do desenvolvimento, a partir, especialmente, dos trabalhos de Piaget, constitui-se como o principal referencial de entendimento e interpretao da criana no sculo XX, com profunda influncia na pedagogia, nos cuidados mdicos e sociais, nas polticas pblicas e na relao cotidiana dos adultos com as crianas.

    2. Imagens da criana sociolgica

    A criana inconsciente essa imagem social tem Freud como figura de referncia, e atribui ao inconsciente o desenvolvimento do comportamento humano, com incidncia no conflito relacional na idade infantil, ocorrendo na relao com as

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    figuras materna e paterna. A criana vista como um preditor do adulto, mais do que como um ser humano completo e um ator social com sua especificidade, de modo que a psicanlise introduziu um vis interpretativo que impede a anlise da criana a partir do seu prprio campo. Acresce ainda o determininismo que leva, frequentemente, a atribuir comportamentos desviantes a vivncias infantis, o que no deixa de ser uma derivao da imagem da criana m, que se revela quando adulta...

    As distintas representaes da infncia se caracterizam singularmente pelos traos de negatividade, mais do que pela definio de contedos (biolgicos ou simblicos) especficos. A criana considerada como o no-adulto e este aspecto nega as caractersticas de um ser humano completo. A infncia como a idade do no, localiza-se desde o significado dessa fase em latim, ou seja, infans: o que no fala.

    Na segunda metade do sculo XIX, desenvolveu-se e consagrou-se a infncia como a idade da no-razo, em torno da qual, se institucionalizou a escola e se inventou o aluno.

    Com a Revoluo Industrial e a consequente necessidade de especializao de mo-de-obra, as crianas foram exploradas em mltiplas atividades produtivas. Nesse perodo, o sentimento de infncia est vinculado a um ideal abstrato, fundado nas noes de inocncia e moralizao.

    Assim, produz-se uma idia de criana abstrata, frgil, inocente, indefesa, incapaz, incompleta, que precisa sofrer processos de socializao, mediante formao em instituies escolares, para poder tornar-se, no futuro, uma pessoa capaz de atuar na sociedade (DIAS, 2009).

    No perodo entre as duas guerras mundiais (1918 a 1939), as crianas foram retiradas das fbricas (mas, sobretudo nos pases centrais da Europa e da Amrica do Norte), e foram consideradas como seres afastados da produo e do consumo, sendo a infncia investida da natureza da idade do no-trabalho.

    Hoje em dia as formas especficas de trabalho das crianas a aprendizagem escolar, ajuda familiar, algumas atividades sazonais, por exemplo tornaram-se ocultas na anlise da diviso social de trabalho e produziram essa idia generalizante, afinal ilusria, de que as crianas no trabalham (SARMENTO, 2007).

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    Nos dias atuais, mais e mais se afirma uma indstria cultural para as crianas, frequentemente dominada pela comunicao da violncia, pela erotizao induzida, pela difuso de modelos de referncia transmitidos pelos meios de comunicao. De uma forma geral, cresce a complexificao das condies de vida das crianas, com estruturao dos seus cotidianos segundo dinmicas indutoras de comportamentos agressivos, competitivos e agonsticos (SARMENTO, 2007). Assim referem dados, tem se produzido a ideia que as crianas atuais vivem, definitivamente, um processo de adultizao precoce e irreversvel, e, por consequncia, habitam a idade da no-infncia.

    Com efeito, a infncia deve a sua diferena no ausncia de caractersticas (presumidamente) prprias do ser humano adulto, mas presena de outras caractersticas distintivas que permitem que todas as crianas do mundo tenham algo em comum, nas reas fsica, mental, psicolgica e social. Tal distino vai alm de todas as outras operadas pelo fato de pertencerem a diferentes classes sociais, ao gnero masculino ou feminino, ou seja qual for o espao geogrfico onde residem, cultura de origem e etnia.

    A infncia no a idade da no-fala. Todas as crianas, desde bebs, tm mltiplas linguagens, porque se expressam. A infncia no a idade da no-razo. Para alm da racionalidade tcnico-instrumental, hegemnica na sociedade industrial, outras racionalidades se constroem, designadamente nas interaes de crianas, com a incorporao de afetos, da fantasia e da vinculao ao real. A infncia no a idade do no-trabalho. Todas as crianas trabalham nas mltiplas tarefas que preenchem os seus cotidianos.

    A infncia , simultaneamente, uma categoria social, do tipo geracional, e um grupo social de sujeitos ativos, que interpretam e agem no mundo, construindo e desconstruindo seus pressupostos atravs das culturas infantis.

    Sarmento (2007) ainda nos fala da invisibilidade cvica da criana, decorrente do afastamento do mundo da infncia do mundo dos adultos, da separao de reas de atividade, reservadas para a ao exclusiva dos adultos e inacessveis, por consequncia, ao das crianas. A invisibilidade cvica tambm decorre da colocao, sob forma direta (especialmente no espao familiar) ou sob forma institucional (especialmente no caso da escola), das crianas sob proteo adulta. O confinamento da infncia a um espao social condicionado e controlado

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    pelos adultos produziu, como consequncia, o entendimento generalizado de que as crianas esto naturalmente privadas do exerccio de direitos polticos, por exemplo votar para eleger os dirigentes.

    A restrio de direitos polticos infncia, caracterstica da modernidade ocidental, no tem, todavia, um carter universal. Sociedades e comunidades radicadas no Oriente e no hemisfrio sul, ou mesmo grupos tnicos minoritrios na Europa, no se caracterizam pela excluso das crianas da vida coletiva e, inclusive, integram as crianas nas assemblias e espaos de deciso coletiva, com efetiva participao cvica.

    Entrementes, a participao poltica no se restringe ao poder de voto. O que importa aqui, acentuarmos o fato de que as crianas privadas de direitos polticos diretos tendem a ser, em consequncia da sua ausncia forada da cena poltica representativa (governo, parlamento, cmaras municipais etc.), invisibilizadas como atores polticos concretos. Por conseguinte, no de ausncia de ao poltica que se trata, mas de invisibilizao na cena pblica.

    No votando nem sendo eleitas, as crianas so tematizadas fora do quadro do referencial de destinatrios polticos, os designam como cidados, contribuintes, patrcios ou mesmo povo. A invisibilidade , no caso, homloga da excluso: as crianas so o grupo geracional mais afetado pela pobreza, pelas desigualdades sociais e pelas carncias das polticas pblicas. Para a recusa da compreenso das crianas como atores sociais com competncias polticas concorre um conjunto de fatores. Em primeiro lugar, a noo moderna de cidadania. O estatuto de membro da comunidade impe, ao mesmo tempo, obrigaes e deveres do cidado para com a comunidade, todavia, a concepo clssica de cidadania recusa o estatuto poltico s crianas.

    Em segundo lugar, a escola foi sendo historicamente tematizada pela modernidade como o lugar da formao de jovens cidados, plenos de direitos, capacidade e competncia, para competirem e/ou se solidarizarem numa sociedade com igualdade de oportunidades. A escola corresponde institucionalizao histrica de processos de disciplinao da infncia, que so inerentes criao da ordem social dominante. Contudo, a escola permanece como um palco conflitual de

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    projetos polticos e pedaggicos que tanto orienta-se para uma efetiva ampliao dos direitos das crianas, quanto sustentar-se em lgicas de ao que perpetuam a inscrio histrica da dominao.

    Ao mesmo tempo em que a modernidade introduziu a escola como condio de acesso cidadania, realizou um trabalho de separao das crianas do espao pblico. As crianas so vistas como os cidados do futuro; no presente, encontram-se afastadas do convvio social amplo, salvo no contexto escolar, e resguardados pelas famlias da presena plena na vida da sociedade dos adultos.

    A imagem da criana com um cotidiano superpreenchido, ilustra bem uma atividade dependente e vigiada sob controle adulto, numa extenso custodional do poder familiar, agora alargado s mltiplas agncias de ocupao infantil (SARMENTO, 2007).

    Sarmento (2007) ainda nos fala sobre a (In)visibilidade cientfica, que o construtivismo psicolgico coloca sob suspeita o pensamento infantil, porque pressupe a sua incompletude e imperfeio. mais de uma falha do que de uma realizao que se trata, sempre que se ouve o significado que as crianas do aos seus gestos ou experincias. Escutar a voz das crianas consiste, em ltima anlise, em escutar a voz do adulto que se revela num discurso previamente interpretado.

    De modo semelhante, se as teorias dominantes da socializao rasuraram a ao interpretativa das crianas, no deixaram de criticamente enunciar, pertinentemente, muitos dos processos mais ou menos ostensivos ou mais ou menos sutis de dominao, de inculcao normativa e comportamental e de exerccio da violncia simblica.

    At hoje, a fixao de imagens sociais das crianas contribuiu para que se regulassem a vida das crianas, se fixassem pontos de referncia para a interpretao da mesma, se padronizassem as relaes entre crianas e adultos, se definissem os programas institucionais e os procedimentos, prescries e interdies face ao das crianas.

    Um campo cientfico interdisciplinar os estudos da infncia no pode abdicar da imaginao metodolgica, que faa da voz das crianas no o outro da

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    voz dos adultos, mas a expresso de uma autoria que faz a diferena com os adultos.

    As concepes de outros estudiosos da sociologia da infncia, que apresentamos alguns deles logo a seguir corroboram a idia de Sarmento (2007), reafirmando que a construo do ser social, ocorre por meio de mltiplas negociaes com seus prximos, e na identidade do sujeito. Essa noo estimula a compreenso das crianas como atores sociais capazes de criar e modificar culturas, embora inseridas no mundo adulto. Para consolidar um campo de estudo que defende a escuta, enfocando a infncia e a cultura infantis, os estudiosos da infncia utilizam, em suas pesquisas, referenciais tericos-metodolgicos desafiadores. O nosso trabalho se insere tanto terica como metodologicamente neste campo de estudo.

    Podemos citar Javeau (2005), que estudou em que dimenses se designa o conceito de infncia. Para esse autor, se conceito de infncia reduzido ao termo criana, entra-se no campo psicolgico; se reduzido ao termo infncia, entra-se nos campos demogrfico e econmico; e se se fala de crianas, entra-se no campo antropolgico ou socioantropolgico.

    Mollo-Bouvier (2005) tambm questiona a delimitao das concepes de infncia, enfatizando a socializao da criana na qualidade de sujeito social que participa de sua prpria socializao, mas tambm da reproduo e da transformao da sociedade.

    Indagando a respeito de qual o lugar que pode ocupar a questo da deficincia no quadro da sociologia da infncia, Plaisance (2005) analisa, ao mesmo tempo, a histria da infncia dita deficiente e as evolues recentes, a partir de 1975, em matria de escolarizao. O autor levanta as hipteses de que a representao da criana portadora de deficincia dominada pela representao da deficincia, mais do que a representao da criana, como criana e que a alteridade da criana com relao ao adulto redobrada no caso da criana deficiente.

    Outros autores tambm se articulam teoricamente sociologia da infncia. o caso de Alderson (2005) que faz uma reviso da literatura internacional considerando: as etapas do processo de pesquisa, nas quais as crianas podem

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    estar envolvidas; os nveis de participao das crianas e o uso de mtodos que podem aumentar o envolvimento delas na pesquisa, respeitando seus direitos.

    Tambm Corsaro (2005) relata pesquisas etnogrficas comparativas com crianas de pr-escola nos Estados Unidos e na Itlia. O autor deu enfoque entrada no campo, ao estabelecimento do status de participante e coleta de dados. Ele ainda discute como passou a fazer pesquisa com, e no mais sobre crianas.

    Montandon (2005) nos apresenta em seu artigo, que no basta examinar as prticas educativas de seus educadores, mas que necessrio compreender as perspectivas das crianas. Isto quer dizer que preciso analisar no apenas o que os educadores fazem com as crianas, como tambm o que estas fazem com o que se faz com elas.

    Gullestad (2005) trata em seu artigo das infncias imaginadas, que so lembranas da infncia trazidas pelo adulto e que compem uma parte central e natural da representao da pessoa adulta. As histrias de vida, as anlises da relao entre a narratividade e o social, o trabalho de memria e de textualizao so fontes que se tornam essenciais para a compreenso das experincias infantis e, em particular, para entender o ponto de vista das crianas.

    Rayou (2005), com a preocupao de escapar do adultocentrismo, discute as estratgias metodolgicas que utilizou durante doze anos em pesquisas sobre socializao das crianas e dos jovens com diferentes nveis de escolarizao. Os estudos dos socilogos da infncia citados nesta sesso, nos fazem perceber seu empenho em seguir a concepo de que a infncia um conceito constitudo scio-historicamente e que criana participa ativamente dessa construo.

    Sob este ponto de vida, buscar conhecer as crianas alm das imagens e idias construdas socialmente ao longo da histria, torna-se um movimento de desconstruo dos fundamentos e concepes existente, e, como anteriormente falamos, conduzimos nossa investigao terica e metodologicamente nessa inteno.

    A televiso um dos meios de comunicao de maior acesso dos indivduos, fazendo parte, com frequncia, de seu contexto social. No segundo captulo: Cultura Infantil e Desenho Animado, discutimos como se d a relao entre a TV e o Telespectador.

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    2 CULTURA INFANTIL E DESENHO ANIMADO

    2.1 A Televiso e o Telespectador

    Debates e discusses a respeito do papel e influncia da televiso, tm ocorrido no mundo todo, por ser ela, um dos meios de comunicao mais utilizados por significativa parcela da populao. s vezes considerada responsvel por males que afligem a sociedade como violncia, apatia e consumo. Sua programao vista como instrumento de alienao e transmissora da ideologia dominante. Porm, esta apenas uma das formas de perceber o papel da televiso no contexto atual (MESQUITA e SOARES, 2008). Primeiramente, temos que concordar que a televiso faz parte da vida diria de milhes de pessoas nos mais diferentes locais e nas mais variadas culturas e que, tambm, na vida das crianas atua como presena marcante. A mdia televisiva, por exemplo, individualiza seus consumidores, pois estuda seus hbitos e gostos de consumo para assegurar uma vendagem rpida e direcionada os meios de comunicao podem levar os indivduos a se modificarem, influenciando na sua maneira de pensar e agir. Eles utilizam a linguagem como instrumento. So as palavras, gestos e imagens, que levam os indivduos a se modificarem. A linguagem em geral, portanto, alm de ser um conjunto de estmulos (sinais) visuais (como cores, sons, formas, movimentos, materiais, etc.) compreende ainda, o modo como as pessoas se organizam. Da, constatamos que a leitura de elementos idnticos ou semelhantes pode ter muitas possibilidades.

    A televiso surge como um meio de comunicao que veicula informaes, com inteno de informar e tambm convencer os telespectadores. Como a televiso utiliza a linguagem, ela comunica, mas tambm atravs da palavra a televiso argumenta, relata, discute, entra em relao com as pessoas que aprendem, ensinam, amam, odeiam, etc. Em geral, quando se toma a palavra no se quer apenas comunicar alguma coisa, se quer tambm persuadir o outro, convencendo-o de que suas razes so as melhores. Nesse aspecto, interfere na ao do outro, vendendo-lhe uma ideia, uma imagem, um estilo de vida. Aqui se v a palavra como mercadoria e que, para tanto, transmitida de diferentes maneiras com o objetivo de sempre vender mais. As ideias explicam a realidade das coisas

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    como se fosse sua essncia, mas a sua aparncia. Somente a capacidade de discernimento do receptor far com que ele perceba a diferena entre aparncia e essncia, entre causa e efeito.

    Atualmente, somos bombardeados pelo discurso persuasivo na poltica, na propaganda, nos meios econmicos, nas telenovelas, nos filmes importados da TV. Essas produes desejam mostrar produtos, expor conceitos ou apresentar histrias, bem como expor idias e modos de viver. Tentando alcanar as pessoas em sua vontade e ao, elas no so apenas convencidas pelos contedos televisivos a acreditar; passam a considerar que essas idias so verdadeiras e nicas. bem comum ouvir algum dizer: verdade, eu vi na televiso.

    A TV exerce uma ao de seduo e condicionamento sobre as pessoas de todas as idades, a ponto de se transformar numa necessidade fundamental como alimentar-se ou divertir-se. No entanto, a esse respeito Freitag (2006) nos alerta que crianas e adolescentes expostos aos contedos televisivos agem e reagem aos estmulos expostos, fazendo uma seleo do que lhes interessa ou no, daquilo que lhes parece procedente ou improcedente o que embasa nossa tese de que as crianas produzem sentido ao assistirem TV.

    As crianas e adolescentes no podem ser encaradas como massa informe, amorfa, que podem ser modeladas revelia de sua vontade e independentemente de sua conscincia, nem devem ser encarados como passivos. Eles agem e reagem aos estmulos de diferentes maneiras e de acordo com o seu nvel de compreenso da situao. No se prestam a um treinamento de estmulo e resposta preconcebida ou intencionada. So seres criativos capazes de aprendizagem de julgamento prprio, resguardadas as etapas de sua formao ou gnese intelectual e moral. Mas, tambm, no podem ser tratadas, antes do tempo, como adultos que j poderiam ou deveriam ter atingido maturidade biolgica, lingustica, moral, cognitiva, em suma: a autonomia moral (FREITAG, 2006)

    Corroborando as ideias da autora anteriormente citada, tambm Molina e Prados (2009), afirmam que a televiso, por ser um fenmeno bsico da civilizao dos meios de comunicao de massa, necessrio estud-la em suas manifestaes. Apesar dela no exerce um papel determinante na formao do sujeito como veculo de informao e comunicao, mas pode influenciar no processo educacional pelos seus contedos. Porm, ela, a TV, no exerce sozinha esse papel. Muitos outros fatores sociais e culturais esto criando condies para mudar o ambiente da infncia na atualidade. Os modos de circulao da informao

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    atualmente so muitos e variados formando um complexo multimdia do qual participam a prpria TV, agora com canais a cabo, diferentes revistas, jornais, CD-rooms, vdeo-games, computadores, etc. (FERNANDES, 2003). A TV no a nica fonte de informao, mas a mais acessvel e a mais reconhecida publicamente, e isto consenso entre os pesquisadores. Quando a TV criticada negativamente, ela considerada estimuladora da violncia, apatia e consumo. Citamos algumas pesquisas que demonstram essa influncia negativa da TV.

    Durante os programas e nos intervalos comerciais estmulos intencionais, porm, velados, so apresentados com o objetivo de maior consumo de produtos. O prprio nome (intervalo comercial) j indica a inteno, lembrando que so esses produtos que patrocinam os programas. Decorre uma espcie de cpia dos padres consagrados pela televiso. Desde chaveiros a material escolar, roupas e calados, at garotos que falam grias ou garotas que tentam imitar a cantora adolescente, seguem um padro televisivo. So as chamadas febres e manias.

    Devido excessiva exposio de crianas e adolescentes que veem televiso at oito horas dirias estes grupos podem agir de forma semelhante ao que assistem. Essas pessoas compartilham de uma rede de significados transmitida pela TV, e, portanto, tendem a repetir comportamentos de pessoas e personagens apresentados (HAMBURGER, 2003). As pessoas costumam, ainda, incorporar a seu vocabulrio palavras de origem inglesa equivalente em nosso idioma: chamam de bike a bicicleta, de fashion a moda, de bus o nibus. So os meios de comunicao de massa e, principalmente, a televiso que homogeniza. Os padres mundiais se tornam os padres que ela mostra. A verdade do mundo passa a ser aquela exibida pela TV, e todo mundo, de uma forma global, cabe dentro da tela do aparelho receptor de televiso. As pessoas copiam porque, aquilo que mostrado na tela aparece como algo socialmente consagrado, como um caminho para o reconhecimento e para o sucesso. A situao da cultura, tal como ela colocada pela mdia, no premia a originalidade, mas a cpia e por isso vemos programas semelhantes e grupos musicais idnticos (CARVALHO, 2007). Atravs da televiso, a mdia pode utilizar mensagens subliminares para vender produtos e ideologias. Seja de forma clara ou no, alguns programas de auditrio, telenovelas e tambm desenhos animados apresentam produtos que

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    sero inconscientemente percebidos com probabilidades de aumentar seu consumo. O experimento de Jim Vicary (1956) demonstra muito bem esse fenmeno. Tal experimento consistia em colocar em um cinema de New Jersey (EUA) durante a exibio dos filmes, propaganda taquicoscpica, ou seja, diretamente nos filmes exibidos, eram embutidos legendas estimulando o consumo de determinados produtos. Essas legendas eram exibidas de maneira to rpida, que s se poderia perceb-las inconscientemente (ou subliminarmente). O resultado que o consumo de tais produtos, nos intervalos dos filmes, aumentou em 60%. Outro exemplo, o do desenho Popaye que ajudou ao governo americano a acelerar o consumo de uma supersafra de espinafre. Algumas crianas, apesar de no gostarem muito de verduras em geral, passaram a acreditar que ficariam fortes como o Popaye, se consumissem espinafre (1929).

    Fonte: http://images.google.com.br

    Figura 1 D. A. Popaye

    Outros dois episdios tambm demonstram o efeito dos meios de comunicao sobre indivduos ou sobre as massas: o pnico Pockemon e a transmisso radiofnica da guerra dos mundos em 1938.

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    Fonte: http://images.google.com.br

    Figura 2 D. A. Pockemon

    O pnico Pockemon (1997) ocorreu no Japo, precisamente em 16 de dezembro de 1997, quando um desenho animado, do mesmo nome, aps ser transmitido, vrias crianas foram vtimas de convulso. Isto ocorreu devido rpida mudana de cores, em uma velocidade taquicoscpica, e o crebro da criana no foi capaz de assimilar, provocando assim a convulso.

    A guerra dos mundos ocorreu em 1938, quando o ator/diretor Orson Wells (EUA), aterrorizou milhares de estadunidenses relatando uma invaso fictcia de marcianos, atravs do rdio. O episdio acarretou o xodo das pessoas fugindo de extra-terrestres num verdadeiro terror coletivo.

    Cada um desses eventos mostra o poder que tm os meios de comunicao de massa de influenciar diretamente na vida das pessoas.

    As horas dedicadas TV no so devidas ao fato desta oferecer s crianas programas que muito apreciam, mas tambm porque os pais no incentivam os filhos para outras atividades. O excesso de obrigaes dos mesmos um dos motivos, como tambm, o desinteresse dos pais por coisas de criana, ou seja, o no reconhecimento dos adultos do seu papel como mediador entre a mdia televisiva e os telespectadores crianas (FERNANDES e OSWALD, 2005). O resultado pode ser um tanto alarmante como, por exemplo, atrasar o desenvolvimento fsico motor das crianas. A Academia Norte Americana de Pediatria divulgou que a TV pode afetar a sade fsica e social dos jovens. De

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    acordo com o estudo, a TV no indicada para os bebs, pois uma atividade na qual h pouca interatividade com os pais e com outras pessoas (1999). Autores como Armand Mattelart e Ariel Dorfman (1980) escreveram no perodo Allende, no Chile, o livro: Para ler o Pato Donald Comunicao de Massa e Colonialismo. O livro fruto da pesquisa dos autores sobre a influncia exercida pelos produtos Disney na Educao e no relacionamento social de crianas de todo mundo. uma crtica bem forte ao imperialismo norte-americano, defendendo a tese de que a leitura das histrias em quadrinhos no era to inocente assim como se pensava. O que os autores mostram que, atravs desse produto cultural, pode-se enviar mensagens ideolgicas que est imulam a dependncia cultural e reforam valores tpicos da economia capitalista. Eles denunciam a ideologia subjacente aos quadrinhos, medida que confirmam os valores da classe dominante, deformam a viso do trabalho, encobrem conflitos e levam passividade poltica. Na dcada de 1990, esses autores relativizaram parte de suas concluses.

    No Brasil, um grupo de professores da Universidade Federal de Santa Catarina, formou o Ateli da Aurora (2007), que se destaca desde 2000 com teses, dissertaes, resenhas e artigos orientados para o tema: Criana, media e imaginao. Um deles, j publicado em livro, trata da representao social da criana e reproduo da ideologia dominante, organizado pela professora Elza Dias Pacheco e se intitula: Televiso, criana, imaginrio e educao: dilemas e dilogos. Neste livro os vrios textos enfatizam a influncia dos desenhos animados na forma como as crianas reagem socialmente, escolhem seus heris, refletem sobre seu futuro, ou seja, constroem seu pensamento. Nesse mesmo livro, a autora escreveu o captulo: As metforas do Pica-Pau: efeitos da ideologia dos desenhos animados nas crianas que, em outro momento, transformou em livro aps pesquisa aprofundada. O livro se intitulou: O Pica-pau: heri ou vilo? Representao social da criana e reproduo da ideologia dominante.

    Finalizamos esse captulo apresentando dez teses ou proposies sobre as crianas e a TV, de Bob Yodge e David Tripp (1986), publicadas na Inglaterra sob o ttulo: Children and Television: a Semiotic Approach (Crianas e televiso: uma abordagem semitica). Essas proposies j viraram clssicas na lngua inglesa de

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    tanto serem citadas na bibliografia da rea e resumem a nossa viso sobre a relao TV e telespectador infantil:

    1. A criana capaz de decodificar a TV de forma ativa e poderosa; mas nem todos os programas e modos de assisti-los trazem o mesmo benefcio;

    2. As respostas e a interpretaes das crianas mudam conforme a idade

    3. A TV para crianas contm formas ideolgicas dominantes, mas tambm algumas alternativas a elas.

    4. A habilidade de julgar o que realidade na TV s pode ser adquirida pela prpria experincia com o meio.

    5. As crianas tm necessidade tanto de programas com fantasia como de programas com a realidade.

    6. A violncia nas mdias qualitativamente diferente da violncia real.

    7. As crianas reformulam os significados adquiridos por meio da TV.

    8. As formas ideolgicas tm um efeito determinante na interpretao da televiso.

    9. A famlia uma instncia ativa na determinao dos significados da TV.

    10. A escola um lugar onde a televiso deveria ser compreendida e incorporada.

    A nossa investigao contribui para a afirmao dessas proposies acima citadas. O meio que escolhemos para analisar a relao mdia televisiva e formao da subjetividade infantil o desenho animado Bob Esponja.

    A sesso seguinte dedicada a descrever o conceito, um pouco da histria e a relao dos desenhos animados com a criana, a descrio de alguns desenhos animados veiculados pela televiso brasileira, dentre eles, Bob Esponja Cala Quadrada.

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    2.2 Desenhos Animados

    2.2.1 Um pouco da histria

    A criana no faz sua interpretao do mundo apenas atravs da famlia e da escola, ela o faz, tambm atravs do seu ambiente, dos grupos de mesma idade e, com certeza, dos media que esto presentes nas suas horas livres, em suas aes e representaes infantis cotidianas.

    Os desenhos animados fazem parte da vida das crianas desde muito cedo. Eles podem ser definidos como todo o contedo de animao, desenvolvido sem a utilizao constante e predominante de personagens representados por atores humanos (Classificao Indicativa, 2006, p. 217). Na classificao geral da televiso, os Desenhos Animados compem um gnero que engloba a categoria de entretenimento. uma sequncia de desenhos, cada qual ligeiramente diferente do seguinte, dispostos de tal maneira que, uma vez filmados e projetados sobre a tela, so vistos como se estivessem em movimento. Expressam em sua maioria, os movimentos das coisas, seres, aes, de uma forma exagerada, caricaturada, sobretudo quando se trata de desenhos humorsticos, so os chamados cartoons. O animador de desenhos animados deve ter a habilidade do cartunista para criar seus personagens em movimento, a habilidade de expresso dramtica e rtmica numa perfeita sincronizao de imagens mveis e sons (FUSARI, 1985, p. 33). Desde o seu inventor, mile Reynaud, em primeiro de dezembro de 1888, o desenho animado foi idealizado para crianas, mas, nos ltimos tempos sofreram alteraes de linguagem e contedo para conquistar o pblico de outras faixas etrias. Hoje, os desenhos animados tambm so empregados em charges que tratam, com humor, de questes polticas e de assuntos de interesse pblico.

    A arte da animao consiste em conhecer a fundo o movimento natural dos seres e interpret-lo de forma criativa. Na maioria dos filmes de animao realizados nos Estados Unidos da Amrica, as cabeas dos personagens tm proporo maior que a realidade e, dentro delas, os olhos dos personagens tambm so aumentados, facilitando detalhes de expresso.

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    Os desenhos animados esto vinculados, como tcnica e expresso:

    Ao desenho de imagens registro de movimentos e sons.

    fotografia escrita da luz cinematografia escrita do movimento televiso recebe e transmite imagens e sons mediante sinais

    eletromagnticos.

    O outro termo vinculado ao desenho animado anime, que provem de mang. O mang, no Japo, uma ilustrao de uma histria ou conto que pode ir para TV em forma de anime. Assim, as historinhas saem da revistas e chegam TV em forma de desenhos animados.

    O movimento inverso tambm ocorreu, quando um desenho animado, na dcada de 1930, nos EUA, passou depois para as revistas de quadrinhos. Estamos nos referindo ao Mickey Mouse, o ratinho que deu origem ao imprio Disney e a inmeros outros personagens como o Pato Donald, Tio Patinhas, Margarida, Z Carioca, Minie, Joo Bafodeona e outros tantos mais.

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    Figuras 3 Desenhos Animados Disney

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    Disney, na produo de desenho animado, levou s telas alguns contos de fadas, at ento, conhecidos somente atravs de livros. Contos como Cinderela e Branca de Neve, hoje so conhecidos mais pelos desenhos animados do que pelos livros (BIBE LUYTEN, 1985).

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    Figuras 4 Contos de Fadas

    Quanto ao Brasil, a experincia em cinema de animao, tem mostrado, sobretudo, a existncia de tentativas isoladas e as enormes dificuldades de produo e distribuio. Quem tem se destacado nessa rea Maurcio de Sousa que, iniciando com histrias em quadrinhos em 1959, com os personagens Bidu e Franjinha, realizou trabalhos de cinema de animao na dcada de 1970, os quais continua at hoje. Nessa poca ele criou a personagem Mnica e outros como Magali, Cebolinha, Casco, Tina, etc. (FUSARI, 1985), representando crianas e suas histrias. Recentemente, em 2008, Maurcio de Sousa conta a histria dessas mesmas crianas na adolescncia, para atingir o pblico adolescente que na infncia acompanhou os personagens como crianas.

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    Figura 5 Maurcio de Sousa e seus personagens

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    2.2.2 Os desenhos animados e a criana

    Neste item, descrevemos a relao dos desenhos animados e a criana quanto aos contedos por eles abordados.

    Nos ltimos 25 anos, a quantidade de desenhos infantis aumentou, consideravelmente, pois tambm aumentou o nmero de canais que oferecem mltiplas opes durante 24 horas, ininterruptas, na TV, a cabo, somando-se queles exibidos nos canais abertos. Poucos pais e mes conhecem a variedade e quantidade de desenhos infantis, ficando margem desse mundo dos filhos. As dificuldades tambm se do quanto ao contedo dos desenhos animados, que antes apresentavam a luta entre o bem e o mal, dos viles e heris de forma linear com comeo, meio e fim. Hoje os desenhos no terminam num mesmo captulo e os viles e heris so mutantes. Eles se modificam, se transformam em personagens com caractersticas mais resistentes, constituindo o que chama-se de evoluo.

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    Figura 6 D. A. Pockemon

    A antroploga e professora da Universidade de So Paulo USP, Esther Hamburger (2003), afirma que a lgica da mutao uma das novidades dos desenhos de hoje. Em outras palavras, os personagens contemporneos no morrem, eles se transformam. preciso que os adultos e crianas compreendam as subdivises, micro-evolues e digivolues desses personagens. So desenhos

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    de argumento complicado, que invadiram o pas com sua complexidade oriental, mais precisamente japonesa. Os estados psicolgicos tais como expectativa, excitao, medo, fascnio e outros, so apresentados pelas pessoas desde muito cedo. So estados que fazem parte da relao dos indivduos com o mundo, inclusive, com a televiso que constitui uma boa parte do universo existencial das pessoas. tambm atravs da televiso que as crianas comeam a perceber o mundo que as rodeia. So as experincias sensoriais na infncia to importantes e marcantes, que tais impresses so as ltimas a sobreviverem, quando o crebro se desorganiza por senilidade, traumatismos fsicos e mentais etc. So tambm as primeiras a voltarem recordao, aps o perodo de amnsia. Concordamos, assim, quo fortes e persistentes so as imagens e impresses vivenciados e presenciados na infncia.

    As crianas, ao assistirem desenhos animados, ficam atentas quando eles so atraentes o suficiente para tanto. Muitas vezes, alimentam-se assistindo TV, realizam as tarefas escolares e outras atividades.

    Os adultos sentem dificuldade em se comunicar com as crianas nessas ocasies. Parecem hipnotizadas pelas mensagens televisivas, mergulhadas no mundo da fantasia.

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    Figura 7 Criana assistindo televiso

    Os desenhos animados apresentam cada vez mais semelhanas com a realidade. Isto pode se constatar quando observamos os heris dos desenhos

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    animados de dcadas anteriores, e os de hoje em dia. Hoje, temos como heris, crianas com superpoderes como o caso das Meninas Superpoderosas e de Goku, em Dragon Ball; pequenos gnios como Dexter e Jimmy Neutron; meninos e meninas astutas, que desafiam o medo e enfrentam qualquer

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    Figuras 8 Heris de desenhos antigos

    obstculo com sua sabedoria e estratgias. Os super-heris do passado como Batmam, Superman e Mulher Maravilha eram heris adultos (imagens cima). Os heris-mirins de hoje vo escola, recebem bronca dos pais, ficam de castigo, desobedecem, reclamam por carinho e ateno, burlam as leis dos adultos e so capazes de grandes feitos. Os heris-mirins realizam feitos impossveis para os adultos como salvar a cidade de inimigos poderosos, criar maquinarias e aparatos eletrnicos que permitem comunicaes interplanetrias, manipular com destreza os segredos do mundo virtual e isso tudo e muito mais sem o suporte dos adultos. Nesta correlao, essa aproximao de realidade e fantasia, tendo como centro as crianas como heris, faz com que os desenhos animados tenham uma estreita relao com o imaginrio infantil. bom ressaltar que a autonomia e independncia desses heris-mirins despertam os mesmos desejos nas crianas que os assistem. Quando os desenhos so violentos a criana poder considerar que o mais forte quem tem razo e que se obtm o que se pretende quando se detm o poder. A quantidade de violncia presente nos desenhos animados principalmente de ao e aventura chega a ser mais elevada do que nos programas destinados a adultos em horrio de grande audincia (CARVALHO, 2007). Os desenhos animados so objeto de estudo nas mais diversas reas, ou seja, na educao, na psicologia, na poltica, em cincias da comunicao, na sociologia etc. Citamos alguns desses trabalhos dentre os muitos existentes.

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    Mesquita e Soares (2008) investigaram, com base em alguns episdios dos desenhos Jimmy Nutron e o laboratrio de Dexter, quais as vises de cincia so veiculadas por meio desses episdios. Para os autores, importante compreender como se desenvolveu e tem desenvolvido o pensamento cientfico em nossa sociedade. Eles sugerem o uso de desenhos animados como alternativa para motivar debates que privilegiem a construo do conhecimento cientfico.

    Molina e Prados (2009) estudaram a informao e os sentidos dos discursos manifestados no desenho animado veiculado na televiso. Segundo a metodologia semitica, o desenho pode ser visto como um texto, em que se pressupe um processo de enunciao e que analisado, possibilita uma discusso sobre a educao e a cultura. O desenho animado utilizado nessa pesquisa Cyberchase, a corrida do espao que faz parte do mercado cultural infantil exibido pela TV Cultura de So Paulo Brasil.

    Ricon (2009), por sua vez, procurou identificar e analisar as representaes sociais contidas na figura dos cientistas, expressas nos discursos e produes de um grupo de crianas em articulao com personagens apresentadas como cientistas em desenhos animados de grande audincia. Ele possibilitou, em sua anlise, estudar questes relevantes e decisivas para a compreenso da gerao mdia (media generation). Santiago (2009) objetivou estudar a intencionalidade de contedos dos desenhos animados dos estdios Disney, entre 1938 e 1940, cujas temticas abordavam insultos e desprezo poltico dos Estados Unidos da Amrica para com as potncias do eixo europeu Itlia, Alemanha e Japo. O objetivo era aproximar e alinhar as outras naes no esforo de guerra. Os motivos que levaram o pesquisador a organizar esse texto foi reconhecer o papel ideolgico, veiculado nos enredos dos filmes de desenhos animados, exibidos diariamente nos principais canais de televiso da poca.

    As pesquisadoras Silva e Gomes (2009) corroboram as ideias acima citadas ao analisar representaes artsticas e ideolgicas presentes em desenhos animados, em especial nas produes do estdio Disney, que demonstram situaes do cotidiano como diversidade, comportamento e relacionamento interpessoal. As autoras afirmam que os desenhos animados so importantes para a

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    formao da identidade do indivduo j que a imagem transmite objetividades, alm de subjetividades. A produo de sentidos da criana sobre os desenhos animados o artigo escrito por Fernandes (2003). Nele, a autora parte do pressuposto de que a criana um sujeito ativo, produtor de significados na sua relao com a cultura televisiva. Em procedimento, busca investigar como as crianas do significados e se apropriam do que veem na telinha, no esquecendo de que a televiso no exerce influncia sozinha. Muitos outros fatores sociais e culturais esto criando condio para mudar o ambiente da infncia, na atualidade.

    Fernandes e Oswald (2005) estudaram as relaes adultas e infantis na contemporaneidade, focalizando a recepo dos desenhos animados. Os autores recusam a idia de passividade das crianas diante da TV. Afirmam que elas so produtoras de cultura e que, de acordo com as mediaes, a recepo influenciada assim como a produo de sentidos sobre o que assistem. O artigo analisa os depoimentos de crianas na faixa etria dos 9, 10 anos, de duas escolas (pblica e privada), relativos aos desenhos animados, apontando as mediaes que determinam desencontros e encontros entre crianas e adultos.

    Os artigos aqui descritos no se esgotam. A nossa inteno demonstrar o interesse pelo estudo dos desenhos animados nas mais diversas reas como tambm compartilhar com as idias apresentadas pelos autores.

    O item a seguir apresenta informaes sobre alguns desenhos animados difundidos na televiso brasileira, os quais vamos utilizar como instrumentos com as crianas participantes da pesquisa.

    2.2.3 Se liga nessa!

    Os desenhos animados, alm das funes de entretenimento e lazer, tem tambm as funes mtica e fabuladora, caractersticas das obras de fico. Eles constituem os lderes de preferncia entre crianas de diferentes faixas etrias. Todavia, os desenhos animados esto conquistando adolescentes e adultos dependendo dos contedos abordados. Periodicamente, os produtores lanam desenhos animados com novos personagens e enredos. Os de maior sucesso ganham verso para cinema e vdeo

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    e passam a ilustrar uma srie de outros produtos: capas de caderno, mochilas, chaveiros, camisetas e bons. Os personagens principais do desenho tornam-se

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    Figuras 9 Produtos com ilustraes de desenhos animados

    ainda bonecos. Trazendo embutidos padres culturais e de consumo, os desenhos animados fazem parte do quadro pertinente a um contexto cultural que prega a globalizao que, na maioria das vezes, no considera as diferenas e particularidades de cada ser humano; pelo contrrio, estimula a massificao, a mecanizao e a automatizao. Quanto sociedade, esta representada como una, esttica, harmnica, sem antagonismo de classes, e a ordem natural do mundo quebrada apenas pelos viles que, encarnando o mal, atentam geralmente contra o patrimnio. Os bons defendem a si mesmos e aos outros, derrotando os maus. Essa uma forma simplista que reduz todo conflito luta entre o bem e o mal, sem considerar quaisquer opinies e interesses divergentes das pessoas. Pelo exposto, o conflito reduzido ao nvel individual como se tudo fosse resultante de problemas morais e no, tambm, de problemas polticos e sociais.

    A assistncia televisiva torna possveis vrios fenmenos como a imitao individual, e depois, coletiva. A ao televisiva sobre o imaginrio infantil aparece nos jogos, nas atitudes, nas produes de textos e desenhos. Sob um aspecto lgico, os adultos tm-se inquietado cada vez mais com a influncia da televiso sobre as crianas.

    Apresentamos algumas informaes referentes a desenhos animados que so difundidas na televiso brasileira. Eles podem ser vistos em diferentes canais, ou atravs da televiso a cabo sinal captado mediante um pagamento de uma

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    assinatura, ou da televiso aberta sinal que pode ser sintonizado por qualquer aparelho de TV. Alguns desenhos animados so exibidos em ambos os canais.

    A televiso brasileira exige desenhos animados classificados como educativos e outros classificados como desenhos animados para entretenimento. Os canais educativos mais populares no Rio de Janeiro so a TV Futura e Multirio.

    A emissora educativa do Estado de So Paulo, a TV Cultura, criou nos anos 90, o Castelo R-Tim-Bum. Apesar de hoje em dia no serem transmitidos mais episdios inditos, ainda muito elogiado pelos pais e considerado um programa educativo de qualidade.

    As emissoras brasileiras que transmitem desenhos animados em circuito aberto so o Sistema Brasileiro de Televiso (SBT), Rede Globo de Televiso (TV Globo), Rede Bandeirantes de Televiso (BAND), e Rede Record e Rede TV. Os canais das TVs pagas nos lares brasileiros j no so to raros. Dentre eles, podemos citar aqueles que exclusivamente transmitem programas infanto-juvenis, inclusive desenhos animados: Disney Channel, Fox, Discovery Kids, Nickelodeon, Jetix, Cartoon Netword e outros.

    Segue-se uma breve descrio de alguns desenhos animados exibidos nos canais brasileiros, utilizados na construo de dados com o objetivo de detectar o reconhecimento dos mesmos pelas crianas.

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    Figura 10 D. A. As meninas super poderosas

    As Meninas Superpoderosas Essas mini-heronas so barulhentas, bravas e lutam como gente grande. Lindinha, Florzinha e Docinho so trs garotas especiais, que moram na pacata Townsville, com seu criador, Professor Utnio. Elas frequentam o jardim-da-infncia local e, nas horas vagas, protegem a cidade contra

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    o malvado Macaco Loco, que tem o crebro aparente (Cartoon Network e TV Globo).

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    Figura 11 D. A. O Laboratrio de Dexter

    O Laboratrio de Dexter Dexter um menino prodgio que, de dentro de seu laboratrio, elabora mil planos e mquinas para salvar o mundo ou enfrentar valentes na escola. Seu lema : Todo dia um grande dia para a cincia! Quem no d folga para o geniozinho e adora sabotar as invenes dele a saltitante bailarina Dee Dee, sua irm mais velha (Cartoon Network).

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    Figura 12 D. A. Dragon Ball-Z

    DragonBall-Z As Dragon Balls so sete esferas de cristal que, juntas, invocam o poderoso Drago. Quem conseguir uni-las tem um desejo concedido. O heri Goku, com a ajuda de outros guerreiros terrestres e do filho Gohan, tenta manter as Dragon Balls longe de mos erradas. Ao todo, so 22 personagens no

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    desenho, que tambm tem outra verso com oito a menos, a DragonBall GT. Nesta, o guerreiro Goku volta a ser criana por causa de um feitio inimigo. (TV Globo e no Cartoon Network).

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    Figura 13 D. A. Pica-Pau

    Pica-Pau Esse desenho animado foi criado em 1940 e estrelou vrios curta-metragens de animao e s na dcada de 1950 passou a ser exibido na televiso. O Pica-Pau tem voz e risada inconfundveis. No incio o Pica-Pau representava um personagem violento. Depois ele ganhou uma personalidade mais tranquila e menos agressiva, porm provocador e faz deboche dos outros personagens (TV Record).

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    Figura 14 D. A. Jimmy Nutron

    Jimmy Nutron um garoto gnio, mas que tem problemas para se adaptar com os colegas de sala e, por isso, conta com a ajuda de seus amigos Caio e Sheen. Jimmy inventa um monte de coisas, e quando acham que ele est

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    dormindo, na verdade est voando por a e inventando novas coisas para tornar a vida mais fcil. Sempre que tem uma idia genial fala: Idias a mil!. Seu laboratrio secreto fica no subsolo do quintal de sua casa (NicKelodeon)

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    Figura 15 D. A. Tom e Jerry

    Tom e Jerry A trama desse desenho animado se baseia geralmente em tentativas frustradas do gato Tom de capturar o rato Jerry. Por causa das habilidades do engenhoso ratinho e por ser menos esperto, Tom no consegue pegar Jerry em nenhum episdio. Tambm so utilizadas diversas armadilhas e truques que, no final, no do resultado satisfatrio e sempre se seguem o caos e a destruio. Alguns episdios deixaram de ser exibidos, pois foram considerados racistas (Boomerang). Esses desenhos animados, descritos anteriormente, nos revelam um panorama recente daqueles exibidos pela TV brasileira, pois os criadores renovam seu acervo ou ainda surgem novos criadores de desenho animados.

    O meio pelo qual estudamos a mdia televisiva o desenho animado. Escolhemos dentre muitos aqui descritos ou no, o desenho animado Bob Esponja, Cala Quadrada, o qual descrevemos com detalhes no item a seguir.

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    2.2.4 Bob Esponja Cala Quadrada

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    Figuras 16 D. A. Bob Esponja Cala Quadrada

    Temos como objetivo neste item, descrever o desenho animado que serviu de objeto de estudo em nossa investigao. Tratamos aqui, de sua origem, personagens principais e dinmica dos contedos.

    Bob Esponja Cala Quadrada, atualmente exibido pelo canal Nickelodeon (TV a cabo), de segunda a sexta-feira, em horrios variados. Na TV aberta, tambm, de segunda a sexta-feira pela manh, exibido no programa TV Globinho da Rede Globo.

    Bob Esponja foi criado em 1999, por Stephen Hillenburg, nos Estados Unidos e j foi traduzido para 25 idiomas chegando a 170 pases. Dentre estes, o