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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE DESEMPENHO INSTITUCIONAL EM GESTÃO PÚBLICA Por Elizabeth Rodrigues de Souza Orientador Profª Fabiane Muniz Rio de Janeiro 2005

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

DESEMPENHO INSTITUCIONAL EM GESTÃO PÚBLICA

Por Elizabeth Rodrigues de Souza

Orientador

Profª Fabiane Muniz

Rio de Janeiro 2005

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

DESEMPENHO INSTITUCIONAL EM GESTÃO PÚBLICA

Apresentação de monografia à Universidade

Cândido Mendes como condição prévia para a

conclusão do Curso de Pós-Graduação “Lato

Sensu” em Gestão Estratégica e Qualidade

Por: Elizabeth Rodrigues de Souza

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha mãe que,

enquanto viva, esteva sempre ao meu lado incentivando

minha carreira profissional e me dando a humildade

de nunca achar que o que eu sei é o bastante.

Obrigada mãe.

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RESUMO

A partir das técnicas empregadas pela administração nos últimos anos, que evoluíram no sentido de adequar as empresas aos parâmetros trazidos pelo processo de globalização da economia, vem sendo amplamente debatida a gestão pública institucional, enquanto setor específico no qual os conceitos da gerência contemporânea podem ser empregados. Guardando a devida e necessária diferenciação entre a gestão da empresa privada e a gestão das organizações públicas – as primeiras visam ao lucro e as outras têm como objetivo o aprimoramento e atendimento social, os novos pressupostos organizacionais poderiam servir-lhes também, dentro do contexto das tendências em administração, que priorizam uma gestão gerencial. A finalidade contida nesta proposta resume-se na busca pela eficácia e pela qualidade na prestação de serviços públicos. No Brasil, o assunto é tema recorrente, sobretudo após a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988, que privilegiou o interesse social, a ética-democrática e o cidadão acima de tudo, enfocando esses objetivos na consecução dos serviços públicos. A abordagem deste assunto é o tema do presente estudo, quando este se propõe a discutir e analisar o desempenho institucional em gestão pública.

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METODOLOGIA Um trabalho, para realizar-se cientificamente, deve possuir estrutura específica, sendo necessário apontar a metodologia utilizada como elemento fundamental para o desenvolvimento e objetivos a que o trabalho científico se propõe. Este estudo tem como fonte de investigação a pesquisa bibliográfica, cujo principal recurso é a referência à doutrina existente sobre o tema, que pode fornecer uma visão do assunto sob a maioria de seus aspectos. A pesquisa bibliográfica é constituída de livros, revistas e material selecionado sobre o tema, produzidos pela melhor doutrina, e que servem de parâmetro para o desenvolvimento e a análise conclusiva deste trabalho.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 07 CAPÍTULO I – A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 09 CAPÍTULO II – ATUALIDADES DA NATUREZA PÚBLICA 18 CAPÍTULO III – TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DA GESTÃO PÚBLICA

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CONCLUSÃO 39 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 41 ÍNDICE 44 FOLHA DE AVALIAÇÃO 45

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INTRODUÇÃO

Na maioria dos países, a administração pública tornou-se extremamente problemática do ponto de vista das transformações ocorridas na economia, que, em função do alto grau de desenvolvimento tecnológico e de comunicações, tornou-se globalizada, impondo um novo modo de relações em nível mundial. O modelo de Estado burocrático, que vigorou ao longo do século XX, tornou-se obsoleto devido ao peso das inúmeras funções que este vinha desempenhando na economia, na administração pública como um todo e nas questões sociais, muitas delas passíveis de serem transferidas à iniciativa privada.

Por outro lado, as teorias da administração, tradicionalmente aplicadas às organizações privadas, e embasadas numa realidade econômica e de mercado, desenvolveram-se nos grandes centros capitalistas muito em virtude deste novo contexto, a exigir técnicas e estratégias que adaptassem as empresas às novas configurações mundiais e ao comportamento dos consumidores, a fim de que sobrevivessem num ambiente altamente competitivo. A retórica da administração moderna é, hoje, significativamente disseminada no debate público, fazendo com que conceitos como ‘eficiência administrativa’, ‘ênfase em resultados’, ‘gestão da qualidade’, ‘desburocratização’, ‘flexibilidade’, ‘desempenho’, ‘planejamento’, ‘política de recursos humanos’ e outros, estejam sendo discutidos para incorporação nas gestões institucionais públicas, como instrumentos estratégicos de eficiência deste setor. No Brasil, a administração e gestão pública historicamente mostraram-se vinculadas a práticas que resultaram insipientes e ineficientes no atendimento às demandas da

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sociedade, ainda que o País tivesse apresentado um desenvolvimento econômico. Com a constituição do Estado Democrático no País, a partir da década de 90, iniciou-se um período de intenso debate sobre a crise do modelo burocrático de Estado, sobretudo, no que diz respeito à incorporação dos direitos de cidadania pelos brasileiros, após um longo período de experiência ditatorial. A Constituição ocupou-se em grande medida com o setor público, tradicionalmente marcado por vícios antigos e persistentes, tais como o patrimonialismo, o autoritarismo, o clientelismo, o nepotismo, a corrupção generalizada, a impermeabilidade à democracia e à participação popular, a falta de transparência e ineficiência dos mecanismos de controle público, tanto estatais quanto não-estatais. Este debate, que ainda perdura em nossos dias, volta-se mais recentemente para a performance das organizações públicas brasileiras, cujas características filosóficas e operacionais ainda se mostram, em sua maioria, pouco estreitadas com as concepções de fundo ético-democrático. Assim é que, as concepções da moderna técnica gerencial propõem uma reestruturação do setor público, de inexorável dinâmica, a fim de que sejam aperfeiçoados os seus mecanismos de eficácia e eqüidade. O presente estudo tem exatamente como tema os paradigmas contemporâneos da gestão pública. A partir do exame da crise do modelo de Estado, da historiografia da experiência brasileira em gestão pública e da influência dos modernos pressupostos teóricos em administração, busca-se encontrar a essência da natureza pública atualmente, e, especificamente no caso brasileiro, as suas necessidades mais urgentes de aprimoramento. Para tanto, o trabalho está dividido em três capítulos que dão esta direção ao tratamento do tema e que chegam às considerações finais com a certeza de que o melhor desempenho institucional da gestão pública se trata de um grande desafio a ser transposto por todos os atores sociais envolvidos – setor público, privado e sociedade civil.

CAPÍTULO I

A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

1.1. Formas Históricas de Administração Pública no Brasil

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O conceito de administração pública não oferece contornos bem definidos, quer pela diversidade de sentidos da própria expressão, quer pelos diferentes campos por meio dos quais se desenvolve a atividade administrativa. Entretanto, sua concepção está indissociavelmente ligada à idéia de atividade desenvolvida pelo Estado, para a consecução direta, ininterrupta e imediata dos interesses públicos. No sentido formal, a administração pública se define pelo conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas às quais a lei atribui o exercício da função administrativa do Estado. E, não obstante diferentes conceituações jurídicas, a totalidade da doutrina admite haver uma relação direta e obrigatória entre a administração pública e a satisfação dos interesses da coletividade. (DI PIETRO, 1999: 61 – 62).

Enquanto instituição estatal, a administração pública encerra uma

idéia relativamente estável no seu papel e nas suas características, muito

embora seus objetivos possam ser alterados do longo do tempo. Por isso,

mesmo havendo interligação conceitual entre administração pública e gestão

pública, ambas não se confundem, dado que a gestão expressa a forma

como a administração pública ou aparato governamental funciona. Assim,

ainda que se adotem políticas públicas semelhantes, as formas de

operacionalizá-las podem ser diferentes, estando a gestão pública sujeita a

freqüentes mudanças.

É possível afirmar que historicamente o Estado moderno iniciou-se com uma administração de característica patrimonial, na qual se confundia o patrimônio público com o privado. Esta administração pública ‘patrimonialista’ predominou no mundo ocidental até o advento da Revolução Industrial, caracterizando-se por ser o Estado e seu aparato uma extensão indistinta do poder dos soberanos, de sua família e da nobreza. Com a instituição do Estado liberal na segunda metade do século XIX, surgiu a administração burocrática ou reforma burocrática do serviço público, na qual a gestão do Estado se incorporou em funcionários de carreira para a execução

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imparcial das políticas dos governantes eleitos rotativamente pelo povo. Para PEREIRA (2004) esta reforma tornou o Estado mais profissionalizado e mais efetivo, mas não exatamente mais eficiente. O Brasil dos anos 30 incluiu-se nessa reforma. (2004: 15 – 16).

Entretanto, foi da convivência entre diferentes princípios de

gestão pública, muitas vezes antagônicos, que se formaram as bases da

administração e da gestão pública brasileiras. Segundo NUNES (1997), a

administração pública no País vem se caracterizando tradicionalmente por

quatro “gramáticas”, isto é, quatro padrões institucionalizados que

relacionam Estado e sociedade: a do clientelismo, a da universalidade de

procedimentos, a do corporativismo e a do ‘insulamento burocrático’, isto é,

aquela burocracia que é bem paga, relativamente hierarquizada e que tem

direitos.

Algumas predominaram e ainda predominam em determinadas

gestões públicas, enquanto outras formas de intermediação guiaram e ainda

guiam outras políticas. Ou seja, a história do setor público brasileiro em

todos os seus níveis não pode ser definida apenas por uma dessas

características, mas sim pela convivência destas quatro lógicas, dentro do

mesmo ambiente político, administrativo e institucional. (NUNES, 1997: 52 –

61).

O clientelismo, de modo geral, indica um tipo de relação entre

atores políticos que envolve concessão de benefícios públicos na forma de

empregos, benefícios fiscais e isenções, em troca de apoio político.

Sobretudo o clientelismo como prática intrinsecamente populista faz parte da

tradição política secular brasileira, existindo em todos os momentos da

historiografia de nossa administração pública, ainda que sob outras duas

nomenclaturas: o patrimonialismo e o fisiologismo. O patrimonialismo, como

uma das formas tradicionais de domínio, foi certamente uma herança

portuguesa. Nele, a idéia de cidadania não é trabalhada e sequer evolui,

uma vez que o Estado é elemento concentrador de poder. Já o fisiologismo

constitui sua maior manifestação cultural. (PEREIRA, 2004: 16).

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Junto à prática corporativista, o clientelismo serviu de instrumento

de legitimidade política. O insulamento burocrático, estratégia por excelência

das elites, foi a forma através da qual as elites modernizantes,

tecnoburocráticas e empresariais promoveram o desenvolvimento no Brasil.

Quanto ao universalismo de procedimentos, significou a afirmação lenta de

um regime burocrático racional-legal e eventualmente democrático, no qual

impera a lei.

ERNI SEIBEL (1994) observa que, devido a um poder

historicamente construído, a estrutura e a prática da administração pública

brasileira mantiveram um caráter arcaico devido a uma configuração

oligárquico-patrimonialista, e estiveram sempre ligadas à fragilidade do

caráter público do Estado, o que tornou a sociedade civil alheia e sem opção

de exercer-lhes qualquer tipo de controle. Prova disso é a evidência da

freqüência de “assaltos” ao erário e da corrupção, inerente a este tipo de

estrutura administrativa. O autor elenca alguns itens que ilustram os limites

de convivência da sociedade brasileira com esta estrutura de poder:

(i) o caráter politicamente privatista (familista e clânico)

e excludente das estruturas e práticas de poder

cristalizadas no aparato institucional brasileiro;

(ii) a inexistência de uma prática de gestão pública,

ética, política, e administrativamente competente

para moralizar e organizar uma sociedade complexa

e que se politiza;

(iii) a não distinção das fronteiras entre o público e o

privado no interior do aparato estatal,

particularmente na administração pública. (SEIBEL,

1994: 112 – 119).

Tal performance caracterizou a cultura político-administrativa

brasileira como predominantemente burocrático-corporativa, uma cultura que orientou por largos séculos a prática entre a gestão das instituições e as demandas

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sociais, nas quais é possível identificar: instrumentos normativos ausentes ou desatualizados; a defasagem sistemática dos processos; a ausência de gestão estratégica em recursos humanos; a baixa qualificação e desmotivação dos servidores; a ineficiência no processo de tomada de decisões; recursos tecnológicos e de comunicação não compatíveis com as modernas ferramentas existentes no mercado; e instalações físicas inadequadas para o servidor e para o atendimento ao cidadão. A essas carências alia-se a ausência de programas de avaliação de desempenho e, em última análise, a dificuldade de rompimento com um tipo de gestão pouco comprometida com a coisa pública e

A leitura que se faz do poder público contemporaneamente modificou-se,

dando-se, agora, através da lente da ética. Os estratos médios da sociedade vêm observando com profunda desconfiança este tipo de relação entre Estado e sociedade, cujas ações traduzem-se na sua incapacidade gestora, e, conseqüentemente, em sua grande dificuldade de construir instituições com regras a partir das quais seja possível arquitetar as dimensões cívicas necessárias, sobretudo, num regime democrático. 1.2. O Estado Contemporâneo e a Crise do Modelo Burocrático

Embora o Estado burocrático tenha tido como principal objetivo a

reorganização total do Estado (no caso brasileiro foi considerado eficaz no princípio, quando o País alcançou bons níveis de desenvolvimento), passou a tornar-se obsoleto frente às mudanças impostas pelo progresso. No nível mundial, este modelo de Estado tridimensional – econômico, social, administrativo – já dava mostras de esgotamento, dada a complexidade e grandiosidade de sua máquina administrativa, lenta, pesada, de altos custos e cada vez mais difícil de se gerenciar.

Nas palavras de BAZILLI (2000),

“Esse gigantismo, em aparente contradição, leva o Estado intervencionista a se esgotar; sobrecarrega o Estado com tarefas dispensáveis e que são melhores desempenhadas pela iniciativa privada; dificulta a adequada realização das atividades essenciais do Estado; a eficiência diminui bem como acarreta a insuficiência de recursos (...)". (BAZILLI, 2000: 79).

Paralelamente à dimensão atingida por este Estado, e contribuindo

muito para o seu colapso, verificou-se na segunda metade do século XX uma profunda alteração no sistema econômico mundial, ocorrida a partir da década de 70, quando, em função da crise do petróleo, o mundo enfrentou uma de suas piores dificuldades econômicas, capitaneada, sobretudo, pela aceleração do desenvolvimento tecnológico e de comunicações que conduziram a uma nova dinâmica do capitalismo internacional, correspondente à globalização.

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De acordo com BAZILLI (2000), a globalização impôs uma dupla pressão sobre os Estados: por um lado cresceu o desafio estatal em proteger os seus cidadãos, dado que a lógica do mercado, privilegiado pela economia, é favorável aos mais fortes e capazes, induzindo ao aumento da concentração de renda; de outro, exigiu do Estado maior eficiência na realização das tarefas públicas, de modo a aliviar as pressões sobre as empresas nacionais e facilitar sua concorrência frente ao mercado internacional.

Nesse novo contexto de economia globalizada, intensa competição e

reorganização da produção em escala mundial, a crise do Estado acabou por se configurar em três diferentes vertentes: crise fiscal, caracterizada pela crescente perda de crédito por parte do Estado e pela poupança negativa, tornando-o incapaz de realizar as políticas públicas; crise do modo estatizante de intervenção do Estado, o que significou o esgotamento do Welfare State (Estado do Bem-Estar Social) e dos países comunistas; e crise modelo burocrático de gestão pública, marcada pelos altos custos e baixa qualidade dos serviços públicos. (2000: 87).

O inchaço das funções e atividades do modelo de Estado burocrático

frente à expansão progressiva de funções econômicas e sociais, do alto desenvolvimento tecnológico e da globalização da economia, abriu espaço para uma crise de proporções mundiais, exigindo que o papel do Estado fosse repensado no sentido de atingir meios efetivos de governabilidade, isto é, meios de adequar suas instituições ao efetivo interesse público, intermediando com mais qualidade seus diversos interesses aos da sociedade em geral.

Assim, abriu-se o caminho para a criação de um modelo de Estado do

tipo gerencial, menos intervencionista e centralizador, e com menos gastos públicos. Neste processo de evolução, a gestão pública foi da administração patrimonialista para a burocrática, e desta para a gerencial: o Estado empresário passa a ser o Estado gerente.

Com efeito, desde a década de 70, os países do mundo ocidental, sobretudo Estados Unidos, Inglaterra Austrália e Nova Zelândia, com performances mais ou menos acentuadas, voltaram-se para as reformas administrativas, todas com características comuns e de caráter gerencial: adoção de técnicas de gestão de negócios, orientação para o cliente e introdução de mecanismos de mercado e competição. As décadas de 80 e 90 têm sido a ‘idade do ouro’ das reformas administrativas drásticas. (PEREIRA, 2002: 21).

“A reforma da gestão pública é um processo está acontecendo no mundo inteiro, especialmente nos países desenvolvidos, nos países de língua inglesa, nos países escandinavos, na Holanda e, mais lentamente, começa a acontecer na França e na Itália. (...) Esse movimento, que é mundial, tem que ser compreendido no quadro de duas grandes forças que moldaram a sociedade contemporânea no século XX. De um lado, temos a globalização, ou o capitalismo global, isto é, o fato de o capitalismo haver-se tornado dominante, e os mercados terem sido abertos para a competição capitalista em todo o mundo. De outro lado, a democracia – esta imensa

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transformação política que marcou o século. Pela primeira vez na história da humanidade temos a democracia como forma dominante de regime político”. (PEREIRA, 2002: 22).

A administração pública gerencial significa um rompimento com o

sistema burocrático tradicional, apesar de ter muitos de seus princípios derivados no modelo anterior. Contudo, enquanto a administração burocrática é mais voltada para si mesma, identificando, com freqüência, o interesse público com os interesses do próprio Estado e direcionando os recursos públicos para o atendimento das necessidades da própria burocracia e do aparato estatal, a administração gerencial relaciona sua atuação ao interesse da coletividade, sob a ótica do cidadão-cliente, ou cidadão-usuário.

No setor público, a gestão das organizações ocorre agora no contexto do

Estado de Direito e da democracia política. O ambiente da gestão pública consiste neste tipo de contexto social, político, jurídico e econômico, no qual os princípios da democracia e legalidade devem ser pontos de partida de qualquer consideração sobre organizações públicas. Nessa perspectiva, na administração gerencial o foco deixa de ser a própria administração pública para tornar-se a satisfação do cidadão. Cabe ao Estado assegurar, no interesse desse cidadão-usuário, a maior eficiência e qualidade dos serviços públicos, e não apenas verificar o cumprimento da legislação em vigor. (PIMENTA, 1998: 181 – 182).

Segundo PIMENTA (1998), esse modelo volta-se para o cidadão como

fim, trabalhando para a melhoria dos serviços públicos prestados e para o desenvolvimento de uma cultura gerencial nas organizações públicas. Trabalha definindo objetivos futuros e intervém apenas nos resultados. Sua proposta é a de revalorizar a imagem dos agentes públicos, garantir equilíbrio das contas públicas, oferecer transparência, equidade e justiça na administração. Focaliza a sociedade como fim. (1998: 183).

Tendência do mundo contemporâneo, o modelo de Estado gerencial foca

sua atenção sobre o cidadão, resgata a função da esfera pública como instrumento do exercício da cidadania e tem toda a sua ação realizada com a finalidade da melhoria da qualidade dos serviços públicos. A principal mudança que se verifica hoje, e que faz o modelo burocrático deficiente para a administração pública, é a necessidade cada vez maior de informações mais rápidas, seguras e acessíveis a todos.

Derrubando sistemas de controle formais típicos da administração

burocrática, a gestão gerencial pública faz ascender controles de produtividade, economicidade e eficiência, ao orientar seus mecanismos de controle para os resultados. Deste ponto de vista, a reforma estatal envolve a criação de mecanismos de responsabilização (ou accountability, isto é, o dever de prestar contas e assumir responsabilidades perante os cidadãos).

Portanto, a administração pública gerencial tem como principal

característica a mudança de foco. Isso pode ser visualizado no quadro abaixo, que foi construído e sintetizado a partir das considerações de PIMENTA (1998). Através

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dele é possível acompanhar as principais diferenças entre a administração pública burocrática e a administração pública gerencial:

QUADRO 1 – DIFERENÇAS ENTRE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA BUROCRÁTICA E GERENCIAL

ADMINISTRAÇÃO BUROCRÁTICA ADMINISTRAÇÃO

GERENCIAL

Auto-referida

Orientada para as necessidades e perspectivas do consumidor

Concentra-se no processo

Orientada para a obtenção de

resultados

Elevado grau de desconfiança

Pressupostos de confiança limitada

Concentração, inflexibilidade,

ausência de delegação de responsabilidade

Descentralização, incentivo à

criatividade e à inovação, delegação de autoridade e de responsabilidade

Controles Preventivos

Rígido controle sobre resultados

Ações sem objetivos claros

Ações com objetivos e metas, traduzidos em indicadores de

desempenho

CAPÍTULO II

ATUALIDADES DA NATUREZA PÚBLICA 2.1. Princípios Constitucionais e Fundamentos e Critérios de Excelência

O Brasil assistiu à tendência internacional de reformulação do

aparelho estatal e, no âmbito nacional, na década de 80, as falhas do

modelo burocrático foram postas em discussão, juntamente com o processo

(ou a propósito dele) de redemocratização vivido no País pela abertura

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política, que culminou com a elaboração e vigência de uma nova

Constituição Federal.

Alcunhado de ‘Constituição Cidadã’, o texto constitucional tocou

em temas inéditos até então, tratados de tal forma que foram considerados

grandes conquistas sociais do povo brasileiro. Por exemplo, as questões dos

direitos humanos, da arbitrariedade do Estado, do fim da censura e da

igualdade de direitos, dentre tantos outros. A Assembléia Nacional

Constituinte de 88 produziu uma Carta Magna analítica e extensiva,

incorporando diversos princípios, direitos e garantias nunca antes vistos nas

Constituições. Posteriormente, as emendas incorporadas ao texto

constitucional promoveram mudanças nos mais diversos setores da vida

nacional e diminuíram o tamanho do Estado.

A abordagem dos Estados democráticos contemporâneos parte do

princípio de que estes não são simples instrumentos para garantir a propriedade e os contratos, mas formulam e implementam políticas públicas estratégicas para suas respectivas sociedades tanto na área social quanto na científica e tecnológica. E para isso é necessário que o Estado utilize práticas gerenciais modernas, sem perder de vista sua função eminentemente pública.

A dimensão democrática contida na Constituição Federal de 1988 fez

com que em seu artigo 37 fossem tratados explicitamente os princípios inerentes à administração pública. São eles legalidade; impessoalidade; moralidade; publicidade e eficiência. Este último revelando-se de grande importância, pois cria um vínculo imediato entre o agente público e o cidadão, cansado da má qualidade dos serviços que lhe são prestados. Implicitamente, a Constituição agregou os seguintes princípios: supremacia do interesse público; finalidade; razoabilidade; e proporcionalidade. O resultado desses pressupostos consiste, na verdade, no regime jurídico decorrente da combinação de dois princípios básicos: o princípio da supremacia dos interesses públicos e o da indisponibilidade desses interesses. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1999).

Nesse sentido, explica CARDOZO (1999):

"Estes, são princípios gerais, necessariamente não positivados de forma expressa pelas normas constitucionais, mas que consistem nos alicerces jurídicos do exercício da função administrativa dos Estados. Todo o exercício da função administrativa, direta ou indiretamente, será sempre por eles influenciado e governado”. (CARDOZO, 1999: 150).

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Tem-se com isso que o sistema constitucional da administração pública brasileira funciona como uma rede hierarquizada de princípios, regras e valores, que não exige mais o mero respeito à legalidade estrita, mas vincula a interpretação de todos os atos administrativos ao respeito desses princípios. Assim, é correto afirmar que apenas a verificação da legalidade de um ato não mais satisfaz as aspirações dos cidadãos, tornando-se necessária a obediência a estes princípios. (CARDOZO, 1999: 150).

O avanço realizado nas técnicas de administração de empresas, de modo

geral, foi outro elemento importante na contribuição para o início de um processo de mudança do setor público, tornando-se válida também para as organizações públicas. Muito embora se saiba das singularidades existentes no gerenciamento da coisa pública, muitas técnicas da moderna administração das empresas foram incorporadas pela administração pública. No entanto, não se trata de simples transposição de modelos idealizados no mundo empresarial, mas do reconhecimento das novas funções do Estado no mundo globalizado, a exigir novas competências, novas estratégias administrativas e instituições remodeladas. (PEREIRA e SPINK, 1998: 10).

Durante os anos 90 o Brasil atravessou os primeiros estágios de uma

longa trajetória rumo à moderna organização capitalista, baseada neste novo caráter de Estado, com poderes menos concentrados, menos burocracia e empreguismo, no qual a participação da sociedade civil e do setor privado tem ajudado a construir uma relação de confiança social baseada na cidadania ativa. Neste Estado pretende-se consolidar um modelo de gestão pública que crie as condições para a implementação de um novo tipo de desenvolvimento econômico-social, fundado nos valores da democracia.

KLIKSBERG (1988) observa que apesar de “reformas administrativas”

estarem sendo tentadas na América Latina desde o início da década de 60, os objetivos finais dos movimentos de reforma estão longe de se concretizar, pois em grande parte dos países latinos os gargalos principais da capacidade gerencial do Estado permanecem intactos. Para o autor, em vários países da América Latina “as decisões de alto nível são tomadas com base em metodologias primárias e rudimentares”. Isso implica que as mudanças não são tão simples assim; o autor explica:

“Mudar a máquina pública não implica transformações meramente formais. Trata-se de um complexo e profundo problema de mudança social, equivalente a qualquer das grandes transformações sociais que a história da humanidade registra. Procura-se modificar um amplo espectro de correlações de poder, atitudes, interesses, ideologias, condutas culturais, capacidades tecnológicas e estruturas organizacionais”. (KLINKSBERG, 1988: 66).

Assim, as discussões sobre a reforma do Estado brasileiro predominam

até hoje, mas dividem a opinião de especialistas. Há autores como LIMA JÙNIOR (1988) que consideram a reforma gerencial pública brasileira, no mínimo, discutível

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por não corresponder à realidade nacional. Primeiro, pelo fato de considerar que as fases patrimonialista e burocrática estão superadas.

Para estes autores, na realidade, no Brasil poucas foram as tentativas de

implantar uma administração burocrática, e quando isto foi tentado seus efeitos benéficos eram neutralizados por algum dispositivo legal. Com relação ao patrimonialismo e o clientelismo, ainda sobreviveriam na cultura brasileira, em especial, nas estruturas de nossa administração pública. (1998: 22 – 25). Estaríamos vivendo, então, uma transição entre modelos de gestão pública.

De todo modo, para a obtenção de novas competências e criação de

novas estratégias de gestão pública é necessário fundamentar-se em critérios de excelência para a formação de padrões otimizados que vão configurar a administração pública gerencial. Baseando-se na premissa de que a gestão pública contemporânea caracteriza-se pela eficácia, eficiência, efetividade, eqüidade e ética democrática, COELHO (2000) destaca os seguintes instrumentos para a consecução desses objetivos:

(i) profissionalização da burocracia – constante treinamento

para se preparar para um mundo em transformação social e tecnológica;

(ii) administração pública voltada para os cidadãos, com transparência e mecanismos de accountability;

(iii) otimização dos recursos públicos por meio da modificação tanto da cultura organizacional como da estrutura de orçamentos;

(iv) transformação dos planejamentos tradicionais; (v) ênfase em resultados e criação de mecanismos para

aferi-los; (vi) constituição de regras institucionais e modelos

organizacionais que motivem o trabalho dos agentes públicos;

(vii) incentivo à inovação e à busca de mais qualidade nos serviços prestados. (COELHO, 2000: 250 – 252).

A autora explica:

“A administração gerencial caracteriza-se pela existência de formas modernas de gestão pública, modificando os critérios de aplicação do controle dos serviços públicos, as relações estabelecidas entre o Poder Público e seus servidores e alterando, também, a própria atuação da administração, que passa a enfatizar a eficiência, a qualidade e a efetiva concretização do regime democrático, mediante a participação mais intensa dos cidadãos”. (COELHO, 2000: 259).

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2.2. A Questão dos Recursos Humanos – Compromisso e Conhecimento como Estratégias de Sensibilização, Informação e Capacitação

A modernização proposta pelo modelo gerencial em gestão pública

implica não só aperfeiçoamento contínuo de métodos, mas, também, dos administradores e servidores envolvidos. Por isso, as questões relativas aos recursos humanos constituem um dos aspectos que suscitam maior preocupação para os analistas, eis que os servidores são as salvaguardas das instituições públicas.

Exige-se no modelo gerencial uma profissionalização centrada no

desempenho, com atuação empreendedora ao invés de voltada para processos. Nesse sentido, a flexibilidade da administração pública gerenciada e seu controle focado em resultados pressupõem a existência de recursos humanos qualificados, em condições de desempenhar suas funções, e preparados para bem utilizar os recursos públicos. Assim, a modelagem de um novo perfil de servidor público está fortemente vinculada à definição de habilidades e competências que deverão ser desenvolvidas para a sua capacitação.

Esta concepção segue os parâmetros da administração contemporânea,

que determinam o conhecimento e a informação como dois dos principais recursos ou ferramentas estratégicas gerenciais de negócios. NONAKA e TAKEUCHI (1997) afirmam que esse paradigma refere-se ao que se poderia chamar de conhecimento útil, que reúne o conhecimento tácito ao conhecimento formal, sistematizado. Ou seja, aquele oriundo da experiência e de valores (conhecimento tácito) e da análise, da pesquisa e do estudo (conhecimento formal e sistematizado), como insumo básico de todo processo que envolve desenvolvimento. O reconhecimento de que a informação e o conhecimento são recursos estratégicos relevantes nas organizações recoloca novamente o elemento humano no centro de todos os processos de melhoria de sua qualidade. (1997: 32 – 39).

No que diz respeito à importância do conhecimento formal adquirido,

uma instituição só alcança patamar desejável de gestão funcional se houver uma constante aprendizagem por parte de seus componentes. É preciso internalizar a importância do sistema de gestão estratégica e de qualidade, mas antes é necessário aprender sobre ele. Para isso é imprescindível conhecer os conflitos e os problemas, sentir-se parte deles e do encaminhamento de suas soluções. É preciso saber o valor dos aspectos inerentes ao processo desta gestão que, uma vez presentes ou ausentes, tornam a instituição mais ou menos eficiente.

E este é um aspecto geralmente considerado dificultoso no Brasil, onde

ainda é marcante a prática do clientelismo e onde é comum o desperdício de talentos. Esta é uma idéia recorrente e de consenso entre os estudiosos do assunto. Segundo CARR e LITTMAN (1992: 31), a gestão de pessoas no serviço público brasileiro ainda está muito vinculada ao paradigma mecanicista, tendo absorvido pouco do paradigma holístico, que se refere à compreensão da realidade como um todo integrado e que, portanto, abrange muito mais profundamente as áreas de atuação humana. Some-se a isso um grave quadro de despreparo dos servidores

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para atuarem com informação e planejamento, o que requer um esforço de capacitação profissional ainda maior.

Por outro lado, é certo que não se pode culpar o servidor público pela qualidade do serviço público oferecido no País, dado que nunca houve uma política de investimento nesse importante segmento, capacitando-o, sensibilizando-o e motivando-o em sua preparação para um desempenho satisfatório frente às mudanças no ambiente e frente às demandas da sociedade e cidadãos mais exigentes. (LIMA JÚNIOR, 1998: 23).

Nessa dimensão, da relativa falta de profissionalismo, o resultado mais

freqüente em relação ao servidor público brasileiro e sua vinculação (ou não-vinculação) com os anseios da coletividade tem sido a manutenção de uma cultura organizacional que intensifica as posturas tendentes ao reforço e ao desenvolvimento das práticas burocráticas, através da inércia que os caracteriza na evolução dos métodos e formas que poderiam inseri-los neste processo. (LIMA JÚNIOR, 1998: 23).

Da perspectiva pós-burocrática, o principal desafio das organizações

públicas, portanto, é canalizar as energias humanas para pensar num trabalho socialmente útil e desenvolvê-lo. Para enfrentar este desafio, e por constituírem o pilar de sustentação da administração pública, os servidores necessitam melhores categorias, e necessitam, para além disso, que sejam valorizados, o que sem dúvida representa uma guinada filosófica e de mentalidade, que requer mudança de atitudes e de comportamentos em direção ao compromisso que os liga à sociedade. A motivação e a inovação é que podem transformar os servidores em agentes das mudanças que se impõem. (MOTTA, 2001: 15).

Traçando um paralelo entre o gerenciamento privado e o público,

MOTTA (2001) explica este ponto de vista:

“Hoje, gerenciar uma empresa ou serviço público, é gerenciar a mudança: enfrentar alterações rápidas e complexas; confrontar-se com ambigüidades; compreender a necessidade de novos produtos e serviços; garantir um sentido de direção em meio ao caos e à vulnerabilidade; e manter a calma diante da perda de significado daquilo que se ajudou a construir. Assim, em um presente intranqüilo e em um futuro incerto, poucos dirigentes e gestores se sentirão confortáveis com o status quo. A maioria perseguirá a inovação como alternativa de sobrevivência”. (MOTTA, 2001: 16).

Refletindo o problema por outro aspecto, DÓRIA (1994) entende que a

ética e a profissionalização são os caminhos mais importantes para a retomada da credibilidade da administração pública brasileira, haja vista a preocupação crescente nos meios acadêmicos e nos meios formadores de opinião a respeito da governabilidade. (1994: 140 – 147). No entanto, admitir uma filosofia de inspiração ético-humanista, na qual o ser humano é o sujeito e fim da vida social, e reconhecer

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que o envolvimento do servidor público com seu trabalho é fator determinante para a melhoria do serviço público, quase nunca representa uma tarefa simples.

A cultura organizacional é geralmente definida como um complexo de

padrões de comportamento, crenças e valores transmitidos coletivamente, apresentando características distintas no conjunto de especificidade de cada organização. São códigos construídos, estruturados e em funcionamento interno, recebendo influência externa. Contudo, FREITAS (1991) observa que os indivíduos, uma vez que tenham assimilado a cultura de uma organização, tendem a manter o comportamento aprendido. Disso resulta que qualquer tentativa de mudança é sempre difícil porque provoca temor diante do novo. (1991: 52 – 55).

A transformação da cultura organizacional, embora esta seja mutável, é,

portanto, um terreno árido e de difícil previsão e um processo lento. Para sobreviver ao ímpeto atual das mudanças, somente organizações que transformam sua cultura interna irão sobreviver.

Sobretudo no campo da gestão de pessoas, sobreviverão caso encarem

seus recursos humanos como seres humanos, alicerçadas em suas três dimensões essenciais: a profissional, a psicológica e a cultural. PALOMINOS (1997) ensina que a dimensão profissional é o domínio da verdadeira profissão do trabalhador, e que se baseia na técnica, experiência e talento; a dimensão psicológica abrange o comportamento de cada pessoa nos seus relacionamentos interpessoais; e finalmente, a dimensão cultural pressupõe a necessidade da visão mais ampla de um projeto, no qual estão inseridas todas as contribuições pessoais do indivíduo, sobretudo seus valores fundamentais. (1997: 52).

Em função disso, para o autor, no cerne de uma gestão empreendedora e

de qualidade não se há de manter o foco apenas na forma operacional na obtenção da qualidade, mas, sobretudo, que esta fomente aquilo que ele denomina como “gestão do compromisso”, assim por ele definida:

“A gestão do compromisso pode ser definida como o conjunto de ações necessárias para obter o engajamento de todos os funcionários na busca da satisfação dos clientes externos e internos (...) A gestão do compromisso, portanto, junto com o aprimoramento contínuo e a motivação de pessoas, é a base para a transformação do corpossauro organizacional, mas a aplicação de programas de qualidade também pode favorecê-la, pois estes estimulam o surgimento de atitudes e competências novas: o desejo de fazer bem feito; o compromisso com a melhoria contínua; o reconhecimento e o respeito às necessidades dos clientes (internos e externos – não podemos esquecer que a moeda tem duas faces); a formação de um novo e maduro vínculo das pessoas com o trabalho. Na gestão de compromisso, ninguém se acomoda nem vive a sonhar com a aposentadoria, porque o trabalho se transforma em algo prazeroso”. (PALOMINOS, 1997: 90 – 92).

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No modelo de serviço público ideal, torna-se indispensável, portanto, que os servidores assumam definitivamente o seu papel e que passem a ser vistos como recursos estratégicos, uma vez que o capital humano é fator determinante na qualidade do desempenho.

Mas para que isso ocorra, é necessário não só o investimento

tecnológico nos órgãos públicos, mas a implantação de um modelo de gestão de recursos humanos que facilite a adoção dos princípios da administração gerencial e capacite os servidores para que sejam agentes estratégicos de mudanças nas organizações públicas. É necessário investimento na qualidade da formação e treinamento, e na mobilização desses servidores no sentido de tornarem-se comprometidos com a coisa pública, bem como a função social que desempenham – o que comprovadamente contribui para a elevação dos padrões de eficiência e eficácia dos serviços prestados.

A revisão do perfil do servidor traz dois benefícios diretos e imediatos

para o serviço público: cria incentivos para que os próprios servidores busquem a melhoria contínua de sua qualificação e que nas suas áreas de atuação trabalhem de maneira mais gerencial e empreendedora, contribuindo para o alcance da missão da instituição.

CAPÍTULO III TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DA GESTÃO PÚBLICA

3.1. A Gestão e o Serviço Público e Seu Papel Social

As modernas teorias da gestão pública orientam para a busca de uma nova postura que reveja ou abandone paradigmas de uma cultura que muitas vezes ainda é predominante.

Segundo TENÓRIO (1988), no Brasil, a magnitude dos problemas

sociais, com todas as suas nuances e complexidades, é um tema que desafia a capacidade de resolução da administração pública como um todo. O autor informa que durante décadas, a intervenção da gestão pública sobre um quadro de grave

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desbalanceamento social foi desperdiçada em ações paliativas, de forte cunho assistencialista que atuavam na própria retroalimentação da miséria e manutenção do status quo, pouco contribuindo para transformações efetivas da conquista da cidadania e de condições mais dignas de existências. (TENÓRIO, 1988: 07).

Ocorre que o processo de remodelagem da máquina administrativa,

baseado na redução de suas funções àquelas típicas de Estado, na modernização e na racionalização dos seus métodos voltados para a busca da maior eficácia com menor custo, impõe um novo quadro de reformulação, de tomadas de decisões sobre temas que pertencem ao conjunto da sociedade, que busca encontrar o seu espaço de influência. Este quadro, evidentemente, envolve também a revisão de conceitos sobre a definição do papel dos recursos humanos públicos, à semelhança do que ocorreu também no setor privado.

Certamente o serviço público tem especificidades que o diferenciam da

empresa privada, a qual, muito embora cumpra uma função social, tem como meta a obtenção do lucro. Já o objetivo do serviço público esgota-se na sua função social – o lucro que eventualmente obtenha uma empresa pública deverá reverter-se necessariamente em benefício do serviço público, não devendo, por imposição ética e legal, servir a qualquer interesse privado.

Conforme KLIKSBERG (1997),

“A utilização de modelos burocráticos tradicionais e a reaplicação mecânica de modelos de gerência privada foram tentativas de solução insuficientes para responder aos desafios específicos do gerenciamento de programas sociais de massa”. (KLIKSBERG, 1997: 44).

Não obstante, assim como a iniciativa privada operou enormes

transformações na área de atendimento ao público, criando serviços de atendimento ao cliente, ouvidorias, etc, ao serviço público também é pertinente a oportunidade de modernizar-se e preparar-se para o exercício pleno no século XXI de outra de suas vocações: a preocupação com o social.

É a partir da redefinição do objetivo fundamental do serviço público em

favor da eqüidade e da justiça social que os agentes públicos assumirão seu papel complementar, cooperando para a construção de uma proteção social universal. Para garantir a eficiência e a eficácia dos serviços públicos, é necessário privilegiar esse papel complementar para que o sistema institucional público se adeque aos cidadãos e não eles às instituições públicas.

Assim, o tema ‘gerência social’ vem sendo problematizado na sociedade

globalizada e está inserido nos debates referentes à alteração do paradigma da administração pública de modelo burocrático para o modelo gerencial. Nessa perspectiva, entende-se, como imperativo a ruptura dos modelos tradicionais de gestão adotados pelas instituições públicas brasileiras por modalidades conducentes à maior conscientização de seu papel como instituições públicas, como força estratégica para a promoção de satisfação coletiva.

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Os parâmetros prevalecentes na gestão social giram em torno da noção

de bem público e cidadania, fazendo com que os critérios de atuação das instituições públicas levem em consideração fundamentalmente a metodologia aplicada para a intervenção nos problemas sociais. Isso significa dizer que esta especificidade do setor público reside também na formação de um agente consciente dos problemas de seu país, comprometido com a sociedade nacional, enfim com contexto no qual está inserido. (KLIKSBERG, 1988: 62 – 67).

Disso resulta o necessário engajamento entre o gestor público, o

servidor e a razão social implícita em suas tarefas, sem distanciarem-se da sociedade, e com a consciência de que o Estado e suas instituições são instrumentos gerados pelo pacto social para garantir a convivência pacífico-harmoniosa da nação como um todo.

Especialmente o servidor, por seus méritos e sua vocação, é o agente

credenciado dessa ação positiva e construtiva. Mas a dimensão política de ambos refere-se à sua responsabilidade pela promoção do desenvolvimento social, cabendo-lhes, inclusive, a responsabilidade de obter dos demais atores – classe empresarial e sociedade civil – o cumprimento de suas responsabilidades sociais.

Nesse sentido, TENÓRIO (1988) refere-se à ação gerencial social como:

“Um conjunto de processos sociais no qual a ação gerencial se desenvolva por meio de uma ação negociada entre seus atores, perdendo seu caráter burocrático em função da relação direta entre processo administrativo e a múltipla participação social e política” (TENÓRIO, 1988: 09).

Assim, o desempenho satisfatório do papel do gestor e servidor público

compreende a sua qualificação e atuação profissional, bem como um gerenciamento que conduza à legitimação da organização pública em que atue, e seu comprometimento com o desenvolvimento, visto como um processo de ampliação da capacidade de realizar atividades valorizadas, e, nesse sentido, o desenvolvimento aqui observado não é a conseqüência automática de desenvolvimento econômico, mas sim, um desenvolvimento social.

Entender a gestão pública voltada prioritariamente para o

desenvolvimento social e para a cidadania implica que os processos de decisão deverão estar abertos para analisar dimensões políticas, sociais e culturais, que se diferenciam das decisões meramente econômicas, técnicas e instrumentais. Deste modo, o servidor não organiza a prestação de serviço de acordo com a sua facilidade, mas com a necessidade de seu público alvo. Esta é a lógica da nova gestão pública: se o cidadão não pode chegar até ele, ele vai até o cidadão. Com isso, o cliente, o usuário do serviço público passa a ser mais respeitado, a ser tratado com dignidade, eficiência e rapidez.

Vistas como um modo de resgatar o conceito de cidadania, direito de

acesso a serviços públicos com qualidade, direito à informação sobre estes serviços, direito à livre expressão sobre a qualidade do atendimento, estes pressupostos vêm

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demonstrar que a velha imagem do serviço público ineficiente e inoperante pode ser desfeita e ultrapassada, até porque, em última análise, este agente é também encarado como cidadão e incluído, ele próprio, nas benesses que a cultura social propicia.

3.2. Qualidade como Princípio Orientador A reformulação do setor público tem como principal objetivo a melhoria

da qualidade dos serviços prestados ao cidadão, entendida em seu sentido amplo, não se restringindo aos aspectos técnicos da atuação pública. Mas tomar a qualidade como um instrumento para conseguir mudanças na maneira de gerenciar e de reorganizar serviços públicos significa trabalhar para alcançá-la e entendê-la como uma atitude profissional, uma forma de encarar o desenvolvimento dos serviços, buscando permanentemente fazer as coisas cada vez melhor. Dessa forma, a qualidade passa a constituir um assunto prioritário na gestão pública moderna, pois passa pela concepção de eqüidade, implicando numa estratégia global e diferente de gestão.

Dentro do feixe de ações de reformulação das organizações no contexto

globalizado, onde as empresas, de modo geral, questionam todos os processos que vinham aplicando, está a adoção crescente de técnicas. Entre as diferentes técnicas, inserem-se aquelas relativas ao conceito de qualidade, que se traduz num modelo de gestão amplamente discutido.

Com efeito, nos últimos anos o termo ‘qualidade’ tem sido sinônimo de

sucesso ou fracasso para muitas organizações, fruto da capacidade que cada uma tem de interpretar adequadamente este conceito. Assim, dentro de um contexto impulsionador e estimulador de profundas transformações, em nome da qualidade têm-se alterado padrões, expectativas, exigências, comportamentos econômicos e sociais, criando-se e consolidando-se novos paradigmas.

A gestão da qualidade referiu-se, inicialmente, apenas à produção de

produtos ou serviços especificamente adequados às exigências dos clientes, partindo do princípio de ouvir e entender o que o cliente realmente almeja e necessita, para que o produto ou serviço pudesse ser realizado com excelência. A busca pela qualidade pontuou as agendas das maiores empresas mundiais, que perseguiram as certificações internacionais em qualidade, adequando seus processos produtivos de acordo com normas a ela referentes.

CROSBY (1995) explica o processo de gerir qualidade:

“A gerência da qualidade é um meio sistemático de garantir que as atividades organizadas aconteçam segundo o planejado. É uma disciplina da gerência que diz respeito à prevenção de problemas, criando as atitudes e controles que possibilitam a prevenção”. (CROSBY, 1985: 36).

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A ampliação dos limites de abordagem sobre a qualidade fez com que esta abandonasse o conceito relativo ao simples ato de controlar produtos e processos, evoluindo para uma visão sistêmica de gestão da qualidade, ao abranger toda a organização. Assim, posteriormente, o termo qualidade passou a representar a busca da satisfação, não apenas do cliente, mas de todos os seus stakeholders, isto é, os elementos significativos na existência de uma organização: clientes, funcionários e comunidade.∗

Nesse sentido, ARAÚJO (2001) diferencia o conceito de qualidade.

Segundo o autor, a qualidade pode ser visualizada através de dois pontos de vista: a qualidade do ponto de vista de quem produz ou serve, que seria concernente com normas e procedimentos internos; e a qualidade do ponto de vista de quem consome, que seria adequar o produto ou serviço às expectativas do cliente. Adicionalmente, observa o autor que nenhuma organização é capaz de possuir um sistema de qualidade total sem antes ter um sistema da qualidade estruturado internamente. Assim, falar em qualidade total sem ter as atividades que interagem direta ou indiretamente sobre o resultado (produto ou serviço) de forma estruturada seria agir caoticamente. (2001: 34).

Nessa perspectiva, a gestão da qualidade não deve ser encarada como

mais um programa de modernização nas organizações. Como se trata de mudança profunda, a implantação mexe com o status quo das organizações, ao referir-se a uma nova maneira de ver as relações entre as pessoas, nas quais o benefício comum é superior ao de uma das partes. Por isso mesmo, enfrentaria muitos obstáculos, frente à dificuldade de implantação de uma nova cultura organizacional. (CROSBY, 1985: 44 – 47).

Do ponto de vista da percepção da qualidade pela ótica do consumidor,

o foco fundamental recai na interação com o usuário, enfatizando-se a idéia de que a criação e manutenção da qualidade dependem de uma aproximação sistemática com ele. Deste modo estariam asseguradas as suas necessidades implícitas ou determinadas, entendidas e atendidas com eficácia e eficiência. Nesse contexto, não só o uso de ferramentas de qualidade e estatísticas seria necessário para se atingir metas de qualidade, pois, além de se trabalhar com as pessoas da organização, há o cliente, envolvido no processo, trazendo-lhe um componente subjetivo. Este aspecto é destacado em organizações de serviços, segmento de características, singularidades e nuances muito próprias.

GIANESI e CORREA (1994) afirmam que a qualidade em serviços é

composta de vários critérios de avaliação que são considerados pelos clientes. São eles: consistência, flexibilidade, competência, credibilidade, tangíveis, custo, acesso, atendimento/atmosfera e velocidade de atendimento. Na visão dos autores, cada critério será mais ou menos importante dependendo do tipo de serviço prestado. Entretanto, a característica mais significativa da prestação de um serviço é que este não pode ser estocado, sendo a avaliação de sua qualidade muito rápida ou até mesmo instantânea. O cliente participa ativamente do processo de prestação de

∗ O termo “stakeholders” foi criado para designar todas as pessoas, empresas e atoress que, de alguma maneira, são influenciadas pelas ações de uma organização.

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serviço e sua presença no processo cria mais expectativas com a experiência de utilização do serviço. (1994: 90 – 91).

Qualidade em serviços tem a ver com pessoas. Instalações, processos

internos e bens facilitadores também são importantes, pois a excelência refere-se a um todo. Contudo, o fator humano se sobressai. Assim, qualidade em serviço significa também qualidade em gestão de pessoas. As pessoas que lidam diretamente com o cliente têm, então, uma grande responsabilidade, pois representam a personificação da empresa e são responsáveis por sua imagem junto ao cliente. Conseqüentemente, devem ser valorizadas à altura da responsabilidade que têm em mãos e apresentarem alto grau de satisfação com o trabalho que realizam. Só se percebe a importância destes temas quando se tem em mente que a prestação de serviços é uma experiência, uma interação do cliente com o funcionário. (GIANESI e CORREA, 1994: 123)

Nesse aspecto, a maioria das organizações de serviços no Brasil ainda

apresenta índices modestos de satisfação de clientes em relação ao serviço que prestam. Os índices de reclamação são grandes especialmente àqueles relativos a telecomunicações, serviços bancários e serviço público. Especialmente nos serviços públicos, verifica-se que o grau de satisfação da população ainda é baixo, em comparação a outros países.

Segundo dados do documento da ‘Primeira Pesquisa Nacional de

Avaliação da Satisfação dos Usuários dos Serviços Públicos’, realizada pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão no ano de 2000, essa maior tolerância dos brasileiros tem estreita correlação com a ausência de tradição na prestação de serviços públicos, que, além de universalizados, apresentem, ao mesmo tempo, uma qualidade adequada. Significa dizer que ainda não há consciência generalizada de que receber um serviço público de qualidade é um direito de cidadania. Assim, o simples acesso ao serviço já produz nos usuários um nível de satisfação nem sempre correspondente à qualidade efetiva do próprio serviço. (MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, 2000: 14).

“A experiência de alguns poucos países na avaliação da satisfação dos usuários de serviços públicos, apesar de recente, encontra-se em patamar mais definido e consolidado. Nessas sociedades, os usuários dos serviços públicos conhecem seus direitos e deveres e sabem exigi-los. Distinguem, também, com mais nitidez, as eventuais alterações para melhor ou para pior na qualidade dos serviços prestados e no acesso a eles. Ademais, é maior o conhecimento dos usuários a respeito da organização e do funcionamento estipulados para os serviços públicos, o que facilita as pesquisas de avaliação. No Brasil, ao contrário, o simples acesso ao serviço ainda é o mais importante”. (BRASIL, 2000: 28).

Mesmo com as informações do documento acima citado, é fato que as

questões postas pela qualidade têm sido menos investigadas na administração

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pública, ao contrário da iniciativa privada. Para DEMING (1990), isso se explica porque:

“Na maioria das repartições públicas, não há um mercado a ser buscado. Ao invés de conquistar um mercado, uma agência governamental deveria prestar, de forma econômica, o serviço prescrito pela legislação vigente. O objetivo deveria se destacar por serviço bem executado”. (DEMING, 1990: 5).

Seguida a perspectiva proposta por DEMING (1990), a qualidade do serviço público não é mensurável pela "conquista de um mercado de clientes", já que enquanto serviço têm as repartições um universo de clientes já definido. No entanto, a não correlação como o mercado não isenta o serviço público de ser executado com qualidade, atendendo, desta forma, os objetivos em função dos quais foi instituído como serviço público a ser prestado à sociedade por definição desta mesma sociedade ao longo de sua trajetória.

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CONCLUSÃO No último quartel do século XX o Ocidente assistiu a transformações

rápidas e significativas no modo capitalista de produção. Impulsionada pelo alto grau de desenvolvimento das tecnologias, destacando-se as de comunicação, a economia tornou-se globalizada, produzindo um novo padrão de relações em diferentes setores, pois a tecnologia não impõe limites às relações entre pessoas, organizações e países, nem tampouco à temporalidade das ações.

No mundo dos negócios, as organizações tiveram que se adaptar,

procurando técnicas inovadoras e estratégicas para sua própria sobrevivência e para que pudessem destacar-se num cenário de grande competitividade. Nesse sentido, qualidade e produtividade passaram a ser fatores-chave, pois com o acirramento da competição, em conseqüência da economia globalizada, a questão da adequada abordagem no trato da qualidade passou a ser uma questão de sobrevivência no mundo empresarial. Da evolução das técnicas operacionais de administração privada, conceitos foram revistos e novas concepções foram introduzidas no ambiente dos negócios, como elementos estratégicos de remodelagem das empresas para atingir critérios de excelência.

Paralelamente, no âmbito das nações, o modelo de Estado burocrático-

centralizador, que orientou o bem-estar econômico, social e administrativo das sociedades, e que predominou durante o século XX, começou a dar mostras de incapacidade de gestão, frente ao inchaço de funções que o tornaram lento, pesado e sem prontidão às demandas populacionais e de uma sociedade mais consciente e exigente de seus direitos de cidadania.

Nessa perspectiva, a administração estatal – aí incluídos todos os órgãos

estatais e serviços públicos, viu-se obrigada a se adaptar e rever conceitos, modelos e práticas, tanto quanto as administrações privadas, no sentido de atingir eficiência e eficácia em gestão, identificando permanentemente suas capacidades às necessidades de clientes/cidadãos, num contexto de crise e colapso econômico-social.

Os paradigmas contemporâneos de natureza pública e privada, ainda

que guardando as respectivas especificidades, passaram a fundamentar-se nas bases da democracia e da cidadania ativa. Conforme foi visto neste trabalho, no que concerne à administração pública, passou-se a adotar uma administração de caráter gerencial, que relaciona sua atuação ao interesse da coletividade, sob a ótica do cidadão-cliente, ou cidadão-usuário.

No Brasil, esta concepção foi referendada por princípios constitucionais,

advindos do amadurecimento da sociedade brasileira, que impuseram novas relações entre os setores públicos e a sociedade. O foco de atuação passou a recair no cidadão como cliente prioritário. Desta evolução, tem-se, hoje, uma visão inteiramente distinta da visão que predominou durante séculos na prestação de serviços públicos no País.

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É fato que a modernização da gestão e dos serviços públicos no Brasil ainda é um desafio a ser enfrentado todos os dias, pois é uma transformação, sobretudo, de caráter político-filosófico. Ao priorizar a função social e a adoção de critérios de excelência, os paradigmas da gestão pública contemporânea consubstanciam-se na eficiência e eficácia, na ética democrática e na eqüidade das relações entre os diferentes atores sociais, em especial entre Estado e sociedade. Nesse contexto, prioriza-se, também, a renovação do quadro de seus recursos humanos – através de seu aprimoramento e comprometimento profissional, buscando-se um novo tratamento que os conduzam a desempenhos satisfatórios perante a sociedade, na medida da compreensão da relevância de seu papel e na forma de encarar a coisa pública.

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA ARAÚJO, Luiz César G. de. Organizações, sistemas e métodos e as modernas ferramentas de gestão organizacional. São Paulo: Atlas, 2001. BAZILLI, Roberto Ribeiro. Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público: Nova Modalidade de Parceria. São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 779, setembro de 2000. BRASIL. Constituição Federal da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1999. BRASIL. Primeira Pesquisa Nacional de Avaliação da Satisfação dos Usuários dos Serviços Públicos. Uma Nova Relação do Setor Público com o Cidadão. Brasília: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. Secretaria de Gestão, 2000. CARDOZO, José Eduardo Martins. Princípios Constitucionais da Administração Pública (de acordo com a Emenda Constitucional n.º 19/98). In MORAES, Alexandre. Os 10 anos da Constituição Federal. São Paulo: Atlas, 1999. CARR, David K. e LITTMAN, Ian. Excelência nos serviços públicos: gestão da qualidade total na década de 90. Rio de Janeiro: Qualitymark, 1992. COELHO, Daniela Mello. Elementos Essenciais ao Conceito de Administração Gerencial. Revista de Informação Legislativa, ano 37, n. 147. Brasília, 2000. CROSBY, Philip B. Qualidade é investimento. Rio de Janeiro: José Olympio, 1985. DEMING, Edwards W. Qualidade: a revolução na produtividade. Rio de Janeiro: Saraiva, 1990. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 1999. DÓRIA, Og Roberto. Ética e profissionalização. Revista do Serviço Público/Escola Nacional de Administração Pública, volume 118, nº 1 Brasília: ENAP, janeiro/julho de 1994. FREITAS, Maria Ester. Cultura Organizacional. formação, tipologias e impactos. São Paulo: Makron Books, 1991. GIANESI, Irineu G. N e CORREA, Henrique Luiz. Administração estratégica de serviços: operações para a satisfação do cliente. São Paulo: Atlas, 1994. KLIKSBERG, Bernardo. A Gerência na Década de 90. Revista de Administração Pública, volume 22, n. 1. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1988. ___________________. O Desafio da Exclusão – Para uma gestão social eficiente. São Paulo: Fundap, 1997.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 02 DEDICATÓRIA 03 RESUMO 04 METODOLOGIA 05 SUMÁRIO 06 INTRODUÇÃO 07 CAPÍTULO I A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 09 1.1. Formas históricas de Administração Pública no Brasil 09 1.2. O Estado Contemporâneo e a Crise do Modelo Burocrático 13 CAPÍTULO II ATUALIDADES DA NATUREZA PÚBLICA 18 2.1. Princípios Constitucionais e Fundamentos e Critérios de Excelência

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2.2. A Questão dos Recursos Humanos – Compromisso e Conhecimento como Estratégias de Sensibilização, Informação e Capacitação

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CAPÍTULO III TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DA GESTÃO PÚBLICA 29 3.1. A Gestão e o Serviço Público e Seu Papel Social 29 3.2. Qualidade como Princípio Orientador 33 CONCLUSÃO 39 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 41 ÍNDICE 44

FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: Universidade Cândido Mendes

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Título da Monografia: Desempenho Institucional em Gestão Pública

Autor: Elizabeth Rodrigues de Souza

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