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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO "LATO SENSU"
PROJETO VEZ DO MESTRE
DESAFIOS DO BIÓLOGO NO SÉCULO DOS
ALIMENTOS TRANSGÊNICOS
Por:
Ana Rosa Jorge Cid
Orientador:
Prof. Luiz Claudio Lopes Alves
Rio de Janeiro
2003
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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO "LATO SENSU"
PROJETO VEZ DO MESTRE
DESAFIOS DO BIÓLOGO NO SÉCULO DOS
ALIMENTOS TRANSGÊNICOS
Objetivos:
Elaborar um trabalho a título
de Especialização buscando
aprofundar o estudo da
Engenharia Genética e
desenvolver passo a passo
alternativas que desafiam a
modernidade científica. Alcançar
novos olhares que reflitam a
presença marcante da ciência e da
tecnologia na vida moderna.
Rio de Janeiro
2003
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AGRADECIMENTOS
A todos os autores, corpo docente do projeto "A vez do Mestre",
ao professor e Doutor D.Sc. Luiz Claudio Lopes Alves pela
orientação desse trabalho. A todos que direta e indiretamente
contribuíram para a confecção desse trabalho acadêmico.
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DEDICATÓRIA
Dedico essa monografia a Deus, razão suprema do amor. À
Luzia Jorge Cid, minha mãe e primeira professora na
Universidade da vida. Também a Mylenna Cid Tenório, minha
filha, a razão da minha existência.
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PENSAMENTO
"Dizem que somos simplesmente "Alguns" a ansiar por um
mundo melhor...
Que somos muitos entre os tantos que vêm com a garra de
querer tentar e que param ante a desilusão e o cansaço.
Dizem que em breve estaremos ultrapassados e maduros.
E dentre tudo o mais que dizem, uma voz brada mais alta; e,
dentre tudo o mais que dizem, uma certeza fica:
Tudo é válido. Vale sonhar, tentar e lutar pelos nossos sonhos.
O que não vale mesmo é deixar de acreditar.
Tudo vale a pena, se a alma não é pequena."
Fernando Pessoa
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APRESENTAÇÃO
Este texto tem como objetivo subsidiar uma discussão sobre a necessidade de
apropriação crítica das novas teorizações científicas nos diferentes campos de
conhecimento, tendo como título de exemplo, na área de educação, informações
sobre a polêmica da genética do terceiro milênio sempre passíveis de novas
conexões, ampliações ou reduções de sentidos.
Será que podemos falar de novas tecnologias sem considerar a modernidade
científica que há muito (desde sempre!) se arrisca com um olhar curioso na
descoberta que o homem faz da sua própria existência?
Em princípio é preciso partir da curiosidade, do desejo, da habilidade de
apontar um futuro, um além que ainda precisa ser desenhado e pensado, do desafio
de formular soluções para problemas reais, do projeto a ser configurado, da pesquisa
e exame de alternativas prováveis.
Desejar fazer ciência e docência ligadas a seu contexto é partir de que a
conceituação de ambiente, hoje, não é como em outros tempos, analisar natureza. É
considerar natureza, técnica, tecnologia, ciência, trabalho, arte, artifício e história
dentro de um projeto coletivo, num espaço que inclui verticalidades.
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RESUMO
Os alimentos transgênicos são considerados por muitos um assunto inviável,
complexo e de muitas incertezas, porém, por se tratar de uma tecnologia nova, a
pesquisa deve ser prioridade quando tem o objetivo de trazer benefícios à vida
humana, mas acaba sendo incompreensível pelo leitor leigo no assunto.
Se esse fosse o maior dos problemas. Neste século em que se tem discutido
bastante a respeito da Engenharia Genética, observamos que o problema maior não
provém diretamente pelo plantio desses alimentos, mas a falta de informação que
continua persuadindo a imagem científica. As perguntas se tornam evidências em
todos os lados e a todas as pessoas, indiferente de raça ou classe social.
Perguntas, perguntas e mais perguntas. O que são realmente os alimentos
transgênicos? Que malefício poderá trazer ao organismo? Mas, uma pergunta, talvez
a mais importante, foge à realidade do nosso país A população sabe que
indiretamente está ingerindo alimentos geneticamente modificados? Indiretamente,
por que não são rotulados como deveriam ser, pois assim a ingestão seria opcional.
Opcional mesmo? A insulina, o hormônio do crescimento e até o pão de trigo são
produtos transgênicos que os brasileiros consomem sem saber. Existe também o
iogurte produzido no exterior com genes modificados e que serviria para prevenir a
cárie.
Sabe-se que a transgenia ao lado de muitas incertezas, benefícios, pois é uma
técnica que melhora a qualidade dos alimentos e a saúde da população.
A pesquisa sobre os alimentos transgênicos é muito interessante, mas é um
processo que exige aprofundamento e busca pelo pesquisador, para que seja visto
como um fato marcante deste novo século que têm ainda muitos caminhos a ser
percorrido.
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METODOLOGIA
A metodologia utilizada nesse projeto de pesquisa se destina a apoiar as
palestras presenciais, para serem discutidas questões polêmicas para as quais ainda
não se têm respostas claras.
A Genética Molecular, ramo da biologia que mais tem se desenvolvido nos
últimos anos, pelo qual se insere o título dessa monografia, vem assumindo
importância sem precedentes na sociedade contemporânea. Esse assunto estimula a
pesquisa biológica e já se tornou conteúdo presente na prática escolar e ao abordar
esse conhecimento em instituições, seja ela pública ou privada, estamos permitindo à
participação e a integração de profissionais e estudantes que não se restringem
somente à área específica, mas também nas áreas de economia, ética e religião.
A necessidade de buscar esse trabalho é um convite ao diálogo para que o
biólogo reflita seu futuro profissional e possa garantir melhores colocações no
mercado de trabalho, no século em que se discutem novos horizontes a serem
alcançados tanto na educação quanto na pesquisa.
A proposta desse trabalho é adequar e valorizar o trabalho acadêmico que,
muitas das vezes, torna-se esquecido entre tantos outros, até que algum interessado
venha consultá-lo. Nesta proposta, objetiva-se buscar uma dissertação acadêmica
adequada à realidade dessa nova tecnologia que hoje é considerada a "Idade da
Genética", criando-se assim uma oportunidade que mais adiante será fruto de
pesquisa para aqueles que venham se especializar ou estejam interessados em
conhecer a necessidade de estar executando esse estudo científico pois é um grande
desafio para a humanidade. E, ainda, envolve perspectivas que estão relacionadas a
complexidade da vida e experiências que podem trazer benefícios humanos na cura
de doenças.
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Ao final da monografia, como anexo, é fornecido exemplos e figuras que
mostram, em detalhes, como acontece a manipulação genética e o que se espera
dessa Ciência no futuro, ou seja, quais as perspectivas a serem desenvolvidas no
decorrer dos anos posteriores a esse século.
Tornou-se importante o apoio do professor de orientação metodológica para o
amadurecimento desse trabalho.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 11
CAPÍTULO I 13
ENGENHARIA GENÉTICA: A CIÊNCIA QUE DESVENDA OS
MISTÉRIOS DA VIDA 14
CAPÍTULO II 18
DESAFIOS DO BIÓLOGO NO SÉCULO DOS ALIMENTOS
TRANSGÊNICOS 19
CAPÍTULO III 21
A EXPLOSÃO DOS TRANSGÊNICOS 22
CAPÍTULO IV 24
ALIMENTOS TRANSGÊNICOS: CERTEZAS E DÚVIDAS 25
CAPÍTULO V 42
TRANSGÊNICOS MATARIAM A FOME? 43
CAPÍTULO VI 46
TEMPO BIOLÓGICO E DURAÇÃO DE VIDA 47
CAPÍTULO VII 49
RAÍZES BIOLÓGICAS 50
CAPÍTULO VIII 54
BIOÉTICA 55
CONCLUSÃO 58
BIBLIOGRAFIA 62
GLOSSÁRIO REMISSIVO 65
ÍNDICE 66
ANEXOS 69
ix
11
INTRODUÇÃO
Desde a segunda metade do século XIX, segundo José Luiz Soares aos nossos
dias a genética percorreu m longo e maravilhoso caminho. O homem cada vez mais
preocupado em evoluir para que o futuro esteja mais perto de suas razões pessoais
que envolve a sua própria sobrevivência procura desafiar a ciência neste novo século
lançando seus olhares e perspectivas para assuntos do seu dia-a-dia.
Pensando na modernidade científica o homem ou melhor especificando, o
cientista dos tempos atuais, descobriu o mecanismo pelo qual se transmitem os
caracteres hereditários, aprendeu a prever e evitar a transmissão das doenças
familiares, desvendou a estrutura molecular dos cromossomos e dos genes, passou a
investigar e detectar a localização exata de cada par de alelos a intimidade dos
cromossomos e, por fim, entregou-se ao emocionante trabalho de manipular o
material genético, transferindo-o das células de um organismo para células de outro
organismo diferente. Foi assim que, da genética molecular nasceu a Engenharia
Genética.
E saber que desde muito tempo o homem instiga a sua própria curiosidade na
busca de informações que refletem a sua vida, a ciência moderna começa a dissipar a
névoa que envolveu os mistérios desse tema por tanto tempo. Mas, dentro dos
conceitos e conhecimentos mais atuais, ainda há pontos suscetíveis de controvérsia.
Os próximos anos certamente reservam extraordinárias novidades na área da
tecnologia, onde o futuro venha proporcionar à humanidade novas chances de
tratamento das doenças hereditárias através de terapias gênicas e de melhoria na
produção agrícola e pecuária. Mas até onde a Engenharia Genética poderá ir, só o
futuro dirá.
O objetivo deste trabalho é buscar respostas através da Engenharia Genética
que de encontro com a Ciência tem revelado um grande progresso na evolução,
principalmente no que se destina à vida humana.
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O capítulo I apresenta os possíveis caminhos que são encontrados através da
Ciência na melhoria da vida humana tentando desvendar os mistérios que podem
trazer a cura de doenças ainda não existentes ou divulgadas.
O capítulo II apresenta a performance do Biólogo no século dos alimentos
transgênicos ainda obscuros aos olhos do mundo.
O capítulo III apresenta a explosão dos alimentos transgênicos sem que
muitas vezes fosse reconhecido pelas pessoas que consomem sem ter noção do que
representa.
O capítulo IV apresenta diante das pesquisas realizadas pelos alimentos
transgênicos as certezas e dúvidas à saúde humana e ao ambiente.
O capítulo V mostra através de uma reportagem publicada pela FAO que a
produção dos alimentos transgênicos em grande quantidade é uma verdadeira ilusão
quando se faz a relação produção / fome da população.
O capítulo VI apresenta um breve comentário a respeito da vida, para o nosso
organismo é programado biologicamente pelas nossas atitudes e pela forma que
vivemos.
O capítulo VII mostra que todo conhecimento adquirido provém de uma
programação genética do organismo o que se manifesta ainda na fase infantil.
O capítulo VIII mostra alguns princípios que o Biólogo deve seguir dentro de
uma pesquisa científica.
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CAPÍTULO I
ENGENHARIA GENÉTICA: A CIÊNCIA QUE
DESVENDA OS MISTÉRIOS DA VIDA.
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ENGENHARIA GENÉTICA: A CIÊNCIA QUE
DESVENDA OS MISTÉRIOS DA VIDA.
"Através da Ciência é possível resolver problemas em
benefício do homem".
Durante anos, acreditou-se não ser possível intervir nos genes em laboratório.
Em pouco tempo o cenário mudou, ou seja, os geneticistas extraíram partes do DNA
de alguns seres vivos e transplantaram-nos em outros; montaram pedaços de DNA
retirados de diversas células, criando híbridos que a natureza nunca inventou. Pouco
a pouco, passou-se do laboratório à produção industrial e foi criada uma verdadeira
"indústria do DNA". Isso é chamado de Engenharia Genética.
Para encontrar respostas para a existência dessa informação foi preciso
esperar até os anos 40, quando algumas experiências decisivas realizadas com
bactérias demonstraram que a determinação da herança dos caracteres dependia de
uma substancia do núcleo da célula, o DNA, e não das proteínas. O DNA era,
portanto, a molécula da vida.
Ninguém sabe como a evolução da vida na Terra chegou ao DNA, mas
considera-se certo que houve alguma forma de organização de grandes moléculas
orgânicas antes de ter sido dado o salto para o que hoje se conhece como vida. O fato
é que agora, como provavelmente há 3,5 bilhões de anos, o DNA tem a mesma
estrutura de dupla hélice descoberta em 1953 pelo norte-americano James Watson e
pelo britânico Francis Crick.
Como em qualquer escada, o importante no DNA são os degraus, formados
por pares de moléculas conhecidas como bases nitrogenadas. Existem apenas quatro
tipos de base no DNA, mais conhecidas pelas iniciais com que são abreviadas, sendo
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a adenina (A), timina (T), citosina (C) e guanina (G). Como são elas que carregam a
informação genética, costumam ser apelidadas de "letras" químicas.
Não dá para ir muito longe com a analogia entre DNA e linguagem, no
entanto. Aquelas quatro letras têm uma propriedade inteiramente diferente de
qualquer coisa encontrável nas línguas escritas, formando dois tipos de pares, A com
T e C com G, sempre. Como cada degrau da escada é formado por um par de bases,
só existem esses dois tipos de degrau que se encaixam.
Essa característica é fundamental para que o DNA realize a contexto uma de
suas principais funções, a duplicação da informação genética. As novas fitas duplas
produzidas são cópias fiéis da original, uma característica muito útil quando se trata
de transmitir e ao mesmo tempo preservar informação.
Para o homem não satisfaz, porém, apenas conhecer ou contemplar alguma
coisa. Decifrada a natureza do DNA e do Código genético, o próximo e lógico passo
foi verificar se seria possível interferir nele, modificá-lo ou manipulá-lo, como logo
se passaria a dizer, com certa conotação negativa. O primeiro passo foi descobrir que
as longas cadeias de bases nitrogenadas são pontuadas por vários tipos de
marcadores. Para as enzimas, essas seqüências-padrão sinalizam onde começam e
terminam os genes, onde deve iniciar a abertura da dupla hélice para a transcrição e
transcrever os pontos específicos que certas proteínas conhecidas como enzimas de
restrição conseguem cortar a cadeia. Aos poucos, os cientistas foram formando sua
coleção de tesouras genéticas.
A era da biotecnologia, propriamente dita, teve início em 1973, pelas mãos
dos norte-americanos Stanley Cohen e Herbert Boyer. Através da Engenharia
Genética foi possível recombinar trechos de DNA de uma bactéria depois de terem
incluído na seqüência um gene de um animal, demonstrando que o código genético
era de fato universal, pois o DNA de espécies distantes era compatível adquirindo
espécies híbridas. Era o início e o prenúncio de uma longa história de relações tensas
entre o público e o setor de pesquisa. Era alvo de muitas discussões em que a
recomendação foi de que os experimentos poderiam ser retomados, desde que
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obedecendo a uma escala de métodos de contenção proporcionais ao risco presumido
no tipo determinado de manipulação genética. Os próprios pioneiros do DNA
recombinante pautavam-se pela intuição de que poderia haver algo de muito
arriscado e imprevisível nessa capacidade recém-adquirida de modificar o patrimônio
genético de indivíduos e mesmo de espécies para não mencionar a transferência de
genes de uma espécie a outra. As novas técnicas, que permitem a combinação de
informação genética de organismos muito diferentes, colocam-nos numa área da
biologia com muitas incógnitas. Apareciam as primeiras conseqüências sociais e
éticas da engenharia genética e surgiam reações sobre a opinião pública. Existem
reações contrárias por parte da população quanto as pesquisas que são desenvolvidas,
pois o campo de Engenharia genética é muito recente. Mas para o pesquisador os
mistérios são desvendados à luz das experiências que se tornam verdade quando a
pesquisa é benéfica à vida. Na época, a preocupação era semelhante à despertada por
alimentos transgênicos, hoje, riscos e incertezas, insuficientemente conhecidos ou
esclarecidos, de uma nova tecnologia. A biotecnologia contínua sofrendo restrições
quanto ao uso dos alimentos transgênicos, ou seja, a proposta deve impor restrições
ao plantio por cinco anos ou pelo tempo necessário para que se estabeleça uma base
mas sólida para uma tomada de decisão mais segura. Aos poucos, os primeiros
produtos alimentares baseados em organismos geneticamente modificados chegaram
ao mercado, antes da mudança de século e de milênio, uma reação negativa cujo
resultado ainda está indefinido. Pode-se dizer que os patronos da biotecnologia foram
surpreendidos por dois fatores que, no entanto, já se delinearam ao longo de toda a
história da engenharia genética e foram por eles negligenciados sabendo-se que a
existência de legislação favorável ou pelo menos não restritiva aos organismos
geneticamente modificados (OGM) não corresponde a uma aceitação da tecnologia
pela opinião pública, como fica evidente pela sucessão de iniciativas contrárias,
ainda que localizadas. A engenharia genética nasceu e permanece polêmica, pois que
seus apologistas considerem ter demonstrado "cientificamente" sua segurança às
autoridades competentes, sensibilizada ou não pelos argumentos de ordem religiosa
ou ética, ignorante ou não das particularidades científicas por trás dessa tecnologia, a
maioria das pessoas consegue intuir que ela cruza uma linha fundamental. Transferir
genes inteiros de uma espécie para outra, algo que na natureza só ocorre em situações
excepcionais e sob controle da seleção natural, é algo muito diverso do trabalho de
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cruzamento de linhagens de plantas e animais realizado há milênios por agricultores,
que contam apenas com a variedade implícita no próprio genoma do organismo para
sobre ela exercer sua seleção.
Tal intervenção pode até ser útil, justificável e desejável, mas nada disso está
garantido a priori. A necessidade e a propriedade dos alimentos transgênicos
precisam ser demonstrados na arena pública, não entre as paredes de agências
reguladoras.
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CAPÍTULO II
DESAFIOS DO BIÓLOGO NO SÉCULO DOS
ALIMENTOS TRANSGÊNICOS
19
DESAFIOS DO BIÓLOGO NO SÉCULO DOS
ALIMENTOS TRANSGÊNICOS
No século XX, em particular nas últimas décadas, as mudanças foram muito
rápidas. Vivemos num mundo em contínua transformação, não só tecnológica, como
também social. Cada vez mais, a sociedade vai ter que opinar sobre problemas éticos
referentes a organismos geneticamente modificados, entender o que são transgênicos,
como surgiram e o que já se sabe sobre seus efeitos. É apenas o início de um debate
que deve se estender ao longo do século 21. E o que estes assuntos têm a ver com o
profissional biólogo? Acreditamos que tudo. De certa forma, estes temas podem ser
vislumbrados pela ótica da Biologia, quando esta laça perspectivas para assuntos do
dia-a-dia. A idéia central do título é um grande desafio, é uma provocação que leva à
futuras reflexões ao biólogo e ao seu mundo de trabalho. E neste mundo em intensa
transformação e que tudo tem que se adequar às novas demandas de percepção, pois
somos solicitados a nos transformarmos à medida em que o mundo se transforma,
como pode o biólogo se posicionar diante de situações não resolvidas e até onde
poderá ir? É uma questão que vai exigir do profissional novos posicionamentos, que
opine e se situe diante das intensas transformações. Neste sentido é vital que ele
entenda as novas características que vêm sendo consideradas como diretrizes para o
profissional do século dos alimentos transgênicos, ou seja, dos debates estratégicos e
decisivos.
O Biólogo tem que se reconhecer como uma classe de profissionais
indispensáveis para a sociedade e para o bem-estar do planeta, ele vive intensamente
a inovação, apresenta habilidade em lidar com a complexidade, capacidade de tomar
decisões, criatividade, empreendedorismo, cooperação, responsabilidade e ética. O
biólogo vem buscando novos espaços, percorrendo caminhos privilegiados, desde a
sua formação é ensinado a lidar com a complexidade da vida, isso mostra que os
caminhos são muitos e as decisões são fatos viáveis na sua carreira.
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A grande perspectiva do biólogo responde a intensa repercussão ao estudo
dos alimentos transgênicos que apesar de desconhecer ainda no momento as poucas
certezas e muitas incógnitas, maior do que qualquer dificuldade é não tentar
encontrar respostas que no futuro pode trazer benefícios à vida humana, como por
exemplo, a cura de doenças hereditárias.
Essas inovações e criações é o grande projeto de futuro para essa profissão. É
preciso colocar o biólogo como ator, como peça social fundamental na construção
deste país.
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CAPÍTULO III
A EXPLOSÃO DOS TRANSGÊNICOS
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A EXPLOSÃO DOS TRANSGÊNICOS
"Sonhar mais um sonho impossível
Lutar quando é fácil ceder
Vencer o inimigo invencível
Negar quando a regra é vender."
Miguel de Cervantes
Os alimentos transgênicos estão por toda parte: em campos de cultivo, nos
alimentos importados, nos tribunais, na imprensa, no Congresso. O debate sobre o
assunto, contudo, tende a ser confuso. Há quem diga que introduzir genes novos em
plantas vai revolucionar a agricultura e salvar o mundo da fome. Para outros, a
aplicação da engenharia genética pode criar novos problemas de saúde e destruir o
equilíbrio da natureza.
A descoberta de que os alimentos transgênicos estavam muito perto de chegar
ao mercado caiu como um obus sobre a sonolenta opinião pública brasileira no
segundo semestre de 1998. A perspectiva de passar a ingerir vegetais geneticamente
modificados despertou no imaginário das pessoas vagos fantasmas associados com a
energia nuclear: uma tecnologia incompreensível, fora de controle público e capaz de
pôr em circulação ameaças invisíveis contra a saúde humana e o ambiente.
Motivado sobretudo pela ignorância sobre os fundamentos dessa tecnologia e
pela surpresa desagradável de vê-la tão perto do próprio corpo sem prévio aviso, o
temor se difundiu rapidamente. Em questão de semanas, era assunto obrigatório nas
redações de jornais e revistas, nos programas de televisão e nas festas em
particular, jantares. O assunto foi dado como favas contadas no vestibular. Um
estilista anunciou que criaria "roupas transgênicas". Até as histórias em quadrinhos,
oráculos dos humores da sociedade, despertaram para o que parecia ser um desastre à
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espreita, observadas nas tiras de Angeli e Laerte publicadas pela Folha de São Paulo
(Em anexo).
Todo mundo queria saber: afinal, os transgênicos fazem mal ou não? Como
quase sempre ocorre no mundo da ciência, não há uma resposta clara, muito menos
definitiva, para essa pergunta, Por mais angustiante e urgente que ela seja, anos de
debate ainda não foram suficientes para esclarecê-la. Contudo, os alimentos
transgênicos constitui provavelmente só o primeiro debate de uma longa série que a
opinião pública de qualquer país, desenvolvido ou não, terá que encarar, e nos quais
a ciência será ingrediente fundamental. Os transgênicos serão apenas o aperitivo de
uma dieta indigesta para quem não for capaz de acompanhar a marcha da
tecnociência e, sobretudo, entender a revolução genética na biologia.
24
CAPÍTULO IV
ALIMENTOS TRANSGÊNICOS:
CERTEZAS E DÚVIDAS
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ALIMENTOS TRANSGÊNICOS:
CERTEZAS E DÚVIDAS
Alimentos transgênicos... quem ainda não ouviu falar neles? Criticados,
elogiados, liberados ou não, como podemos defender ou não esta idéia, se não
sabemos que tipo de benefícios e/ou malefícios pode trazer ao organismo e ao
ambiente. Num primeiro momento é importante a conscientização que o homem tem
em manipular a vida, pois a pesquisa sempre busca a seriedade e o compromisso de
trazer benefícios que melhorem a vida humana através da mais nova técnica da
engenharia genética, a terapia gênica, uma nova medicina que poderá curar as
doenças hereditárias, substituindo os genes defeituosos por genes sadios. O homem
tornou-se objeto da manipulação genética, assim como os animais e as plantas.
Há quem considere que abdicar do poder da manipulação genética seria como
retornar a Idade Média e rejeitar a própria natureza.
Considerando a revolução genética na Biologia, os alimentos transgênicos
ainda causam espanto aos olhos da população que desconhecem suas causas, mas na
realidade o cultivo de alimentos transgênicos é grande em nosso país, cabe-nos
conhecer as variáveis desses organismos para poder definir e reavaliar se vale a pena
investir nessa tecnologia prevendo as conseqüências a curto, médio e longo prazo no
organismo e no ambiente, assegurando a existência de riscos nesta ação.
No ano de 1989, os Estados Unidos foram alarmados por uma epidemia
misteriosa da síndrome de eosinofilia-mialgia, caracterizada por dor muscular e pelo
aumento de um tipo de glóbulo branco no sangue. Mais de 5000 casos foram
registrados, sem que se identificasse de imediato a origem do mal. Morreram pelo
menos 37 pessoas e outras 1.500 ficaram com seqüelas permanentes, antes que a
agência de alimentos daquele país, a poderosa FDA, descobrisse uma associação
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estatística da síndrome com um complemento alimentar, o triptofano. A investigação
revelou mais que 95% dos casos podiam seguramente ser atribuídos ao triptofano
produzido por uma empresa japonesa, a Showa-Denko. Todo o estoque disponível
foi recolhido, mas muito estrago já havia sido feito, inclusive para a imagem pública
da engenharia genética.
Ocorre que o triptofano da Showa-Denko vinha sendo fabricado com o
emprego de bactérias geneticamente modificadas. Elas haviam sido alteradas para
que funcionassem como microusinas de triptofano, ou seja, para que seus genes
comandassem a síntese de enormes quantidades da substância, utilizada na
complementação alimentar e no tratamento de insônia, ansiedade, depressão e tensão
pré-menstrual. O que o controle de qualidade da empresa e a fiscalização sanitária
não foram capazes de prever era que, paralelamente ao triptofano, as bactérias
manipuladas estavam também produzido quantidades crescentes de uma toxina capaz
de provocar a síndrome. Não se sabe ao certo como a modificação genética acarretou
o problema. Uma investigação mais profunda ficou prejudicada porque a empresa
destruiu todos os lotes contaminados. Mas até hoje o episódio, apesar de misterioso e
isolado, é citado como exemplo de que a alteração e inserção de genes num
organismo não é assim tão precisa quanto querem fazer crer os "engenheiros"
genéticos e pode ter efeitos imprevisíveis.
Outro caso que ajudou a marcar negativamente a imagem dos transgênicos
envolveu o Brasil, ainda que indiretamente, e um produto que nem mesmo chegou ao
mercado. Trata-se de um experimento realizado pela empresa Pioeer Hi-Bred
International com a soja. Desejosos de melhorar o teor nutritivo dos grãos da planta,
os técnicos da Pioneer introduziram nela um gene da Castanha-do-pará para que a
soja passasse a produzir uma proteína muito rica no aminoácido metionina. A idéia
era obter uma variedade mais eficiente para alimentação de gado. Como havia um
histórico de reações alérgicas à castanha-do-pará em alguns seres humanos,
decidiu-se testar amostras da soja com soro extraído do sangue dessas pessoas
alérgicas, obtendo resultado positivo, pois a soja modificada mostrou-se capaz de
desencadear a reação, assim como a castanha-do-pará da qual se havia extraído o
gene transferido. A Pioneer abandonou o experimento, embora o produto, em vigor,
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não se destinasse ao consumo humano. No começo da década de 90, a Embrapa,
Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, chegou a fazer pesquisa semelhante
com feijão, utilizando o mesmo aminoácido. Na época alertaram alguns especialistas,
houve condições incomumente favoráveis para que o potencial alergênico fosse
identificado antes da entrada do produto no mercado. Nesse caso, dito especial, a
soja transgênica já era conhecida como alergênica e foi colocada no mercado com
precaução, as amostras de soro de pessoas alérgicas à espécie doadora estavam
disponíveis para testes e o produto foi recolhido. Com isso o próximo caso poderia
ser menos ideal, e o público, menos afortunado.
A dificuldade toda reside em que, desde então, não surgiram novos casos de
danos patentes à saúde humana provocados por plantas transgênicos, apesar das
sucessivas colheitas e do consumo generalizado de alguns produtos, como a soja
resistente ao herbicida glifosato e o milho resistente a lagartas. Seus adversários
argumentam que o princípio de precaução faz o ônus da prova recair sobre os
defensores da tecnologia, eles é que precisariam provar que os organismos
geneticamente modificados, em cada caso, são inofensivos à saúde. Os partidários
dos transgênicos retrucam que uma prova negativa é impossível, ou seja, que não se
pode excluir que no futuro ocorra efeitos hoje desconhecidos, e se escudam nas
técnicas de análise de riscos e no princípio da equivalência substancial, que dista
provar que os alimentos transgênicos têm o mesmo perfil químico e nutricional de
seus congêneres produzidos por métodos tradicionais.
Uma vez que conhecimento necessário para as avaliações de risco somente
depende em boa parte dos ambientes onde se programa a liberação destes
organismos, torna-se óbvio que este conhecimento deve ser gerado no próprio país.
Faz-se necessário um programa de formação de recursos humanos de alta
qualificação para a pesquisa, normatização, testes e fiscalização na área de
biossegurança no país, bem como urgente discussão sobre mecanismos de captação,
gestão e destinação de fundos para a sua efetiva implantação. Parte expressiva destes
recursos poderia ser originada por contribuições da iniciativa privada e das próprias
empresas que aufiram ganhos com os organismos geneticamente modificados.
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O plantio e o cultivo de alimentos transgênicos continuava a ser testados, até
que em agosto de 1998, explodiu no Reino Unido o escândalo das batatas
transgênicas. A emissora de televisão BBC fez um documentário sobre Árpád
Pusztai, do Instituto de Pesquisa Rowett, da Escócia afirmando que alimentos
produzidos com organismos geneticamente modificados não são adequadamente
testados e que tem evidências experimentais de que podem provocar problemas de
saúde em cobaias. Dois dias depois, o instituto divulga deficiências no experimento
de Pusztai e o censura publicamente por discutir resultados que ainda não haviam
sido publicados. Mais dois dias e o cientista, que aos 68 anos já se encontra em idade
de aposentar-se, é suspenso pelo Rowett e recebe determinação de não se pronunciar
mais sobre o caso enquanto uma comissão interna o investiga. Em outubro, o painel
volta a criticar Pusztai, mas não chega a acusá-lo da fraude científica, como
inicialmente se chegara a insinuar, nem divulga os dados do pesquisador. Um
relatório alternativo com esses resultados começa a circular entre cientistas
simpáticos a Pusztai e antipáticos aos transgênicos. Surgia o primeiro mártir da
guerra dos genes.
Pusztai havia montado o experimento para testar o efeito de uma proteína, a
Lectina, na alimentação, utilizando para isso camundongos. A escolha da lectina
fazia sentido, porque se estuda a possibilidade de inserir o gene que a codifica em
plantas como o arroz, para protegê-las de pragas. A lectina está também presente em
várias leguminosas, como o feijão, e se degrada com o cozimento.
Três tipos de ração foram oferecidas a três grupos de camundongos, batatas
normais, batatas salpicadas com lectina e batatas geneticamente alteradas para
produzirem, nas próprias células, a lectina. Segundo Pusztai, só surgiram
anormalidades nos intestinos e no sistema imunológico dos animais alimentados com
o terceiro tipo de batata, isto é, com as transgênicas. Sua conclusão, já que a lectina
apenas salpicada não tinha supostamente provado danos, era de que estes só podiam
decorrer de algum problema criado pela tecnologia de inserção genética.
Representou, portanto, um abalo para toda a indústria da biotecnologia, não só para
as linhas de pesquisa baseadas na introdução da lectina. Era a própria raiz da nova
tecnologia, transferência e manipulação de genes da planta que se tornava suspeita.
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Em fevereiro de 1999, 20 cientistas de 14 países que haviam lido o relatório
alternativo, muitos deles notórios oponentes da biotecnologia, acusam o Instituto
Rowett de perseguir Puusztai e ceder a pressões políticas. Pedem uma moratória no
licenciamento de alimentos transgênicos, argumentando com a detecção de um efeito
imprevisto da tecnologia, que os testes padronizados de toxicidade não haviam sido
capazes de assinalar. O governo trabalhista de Tony Blair descarta a moratória e é
acusado de favorecer a indústria Biotecnológica. A situação do Instituto Rowett piora
quando vem à tona a informação de que ele havia recebido dinheiro para pesquisa da
empresa multinacional Monsanto.
Em outubro de 1999, a revista médica britânica Lancet aceita publicar o relato
de Pusztai, mas o faz de forma desconcertante para os padrões dessa área editorial,
acompanha o texto de dois outros, um com críticas à pesquisa e outro apontando
problemas provocados pela lectina em seres humanos. A Lancet também incluiu um
editorial em que se justifica pela publicação do trabalho de Pusztai, tendo esperado
um ano para tomar essa decisão, depois de submeter o editorial ao crivo de seis
especialistas. Richard Horton, editor da prestigiosa revista de medicina, afirmou que
alguns dos especialistas haviam aconselhado a rejeição, outros, a publicação. A
aprovação final teria ocorrido para que os dados fossem expostos ao debate, no
entanto, interpretaram a atitude inaudita da publicação como temor de atrair a ira do
lobby antitransgênicos e ser acusada de subtrair ao domínio público resultados
incômodos para a poderosa indústria biotecnológica.
Quando até uma revista científica com a tradição da Lancet se enreda de tal
maneira na teia dos efeitos da engenharia genética sobre a saúde, o que não dizer do
público leigo? Esse público decerto se encontra em profunda desorientação; entre
tantos e tão díspares alegações que todos proclamam serem fundadas na mais sólida
ciência. Tal desamparo decorre da incapacidade da comunidade científica e do poder
público de produzir uma conclusão abrangente e, por conseqüência, uma
regulamentação prudente sobre os alimentos transgênicos. No Reino Unido como em
toda parte, o público ainda carece de uma palavra de autoridade que resolva a
questão da segurança dos transgênicos, e não apenas da forma especializada,
setorizada e formalista com que se tenta conquistar a confiança para essa tecnologia
30
perturbadora. Analogicamente, seus adversários tampouco conseguem articular uma
visão alternativa capaz de vingar na esfera pública sem recurso a convicções de
ordem ética ou religiosa, tão legítimas quanto as científicas, mas, ao menos no
quadro das democracias de corte ocidental, uma base menos frutífera para a geração
de consensos. Do ponto de vista científico-reducionista, sabe-se que muitas foram as
conseqüências à saúde e ao ambiente, estando relacionadas nos itens abaixo.
4.1 - Conseqüências à saúde humana
4.1.1 - Alergias
Cerca de 2% dos adultos e 4% a 6% das crianças sofrem de alergias a algum
tipo de alimento, mas 90% desses casos são provocados por um grupo reduzido de
alimentos como leite de vaca, ovos, peixe e crustáceos, diferentes tipos de noz como
castanha-do-pará, trigo, leguminosas, particularmente amendoim e soja. Como
reações alérgicas podem ter conseqüências graves, inclusive choque anafilático,
parada respiratória e morte, as proteínas que as provocam têm sido estudadas a
fundo. O resultado é que se conhecem razoavelmente bem as características dessas
poucas substâncias capazes de desencadear alergias.
Com base nesse conhecimento, os biotecnólogos consideram-se capazes de
detectar, com razoável grau de segurança, qualquer alérgeno que venha a ser
incorporado a um alimento geneticamente alterado, lembrando que a planta recebe
genes estranhos a ela, que por sua vez contém a receita para a síntese de proteínas
que não são naturalmente encontradas no vegetal. Se o gene (ou genes) a ser
transferido para a planta provém de um alimento sabidamente causador de alergias,
utiliza-se o soro do sangue de pessoas alérgicas a esse mesmo alimento para verificar
se a nova comida transgênica, é capaz de provocar a mesma reação. Se o resultado
for positivo, bastará, argumenta-se, rotular o alimento para indicar que pode provocar
tal ou qual alergia ou melhor ainda, abandonar a pesquisa como se faz com a soja
enriquecida com metionina.
31
Se a proteína correspondente ao gene transferido procede de uma fonte sem
histórico conhecido de alergenicidade, a recomendação é analisá-la para estabelecer
sua seqüência de aminoácidos. Obtida a seqüência, ela passa a ser comparada com as
das proteínas que sabidamente causam alergias. Qualquer similaridade na estrutura,
ainda que parcial, exige a realização de ensaios com soro de pessoas alérgicas àquela
substância similar. Outros testes buscariam também verificar se a proteína produzida
no vegetal transgênico sobrevive ao aquecimento e à digestão, pois, se ela não for
capaz disso, não poderá desencadear reações alérgicas. Com exceção do caso da soja
e da castanha-do-pará que muitos consideram ser a prova de que essa abordagem
analítica funciona para o bem do público, não foram identificados por essa via
alimentos transgênicos capazes de provocar alergias. É muito pouco provável que o
sistema atual seja capaz de identificar um alérgeno desconhecido, caso ele seja
induzido no alimento pelas técnicas da engenharia genética. Existe ainda o temor de
que a alteração genética introduza não só o transgene e sua proteína, mas também
perturbações no genoma ou no metabolismo dos organismos geneticamente
modificados, o que eventualmente poderia alterar a estrutura de outras proteínas suas
ou mesmo aumentar sua produção, como parece ter ocorrido no fatídico caso do
triptofano.
4.1.2 - Resistência a antibiótico
Outro receio freqüentemente associado com alimentos transgênicos diz
respeito ao risco de que genes de resistência a antibióticos se transfiram para
microorganismos patológicos, como, por exemplo, bactérias que causam infecções.
Como não se tem notícia de que isso tenha acontecido, o risco é considerado
meramente teórico, mas nem por isso negligenciável. Afinal, o emprego desses genes
de resistência representa uma técnica comum na produção de plantas transgênicas,
precisamente para compensar a falta de precisão no procedimento.
Quando inserem genes num organismo, os engenheiros genéticos nunca
sabem ao certo, onde, exatamente, eles vão ser incorporados, ou mesmo se vão ser
incorporados. Se o forem, existe a chance de que simplesmente não funcionem, ou
seja, de que a proteína pretendida não seja produzida pelo vegetal transgênico, ou
32
não alcance a quantidade necessária para gerar o efeito desejado. Os biotecnólogos
necessitam de um meio para selecionar as inserções mais bem sucedidas e, para isso,
incluem em seu pacote de genes um que confira imunidade diante de um antibiótico
conhecido, como a ampicilina. Parece selecionar as plantas que de fato incorporam o
"coquetel" de genes, basta então tratar as culturas de células com ampicilina,
sobrevivendo somente aquelas que interessam. Elas darão origem aos vegetais, que
por sua vez fornecerão as sementes da primeira geração de transgênicos.
O problema é que esses genes serão ingeridos com o alimento transgênico e
entrarão em contato com bactérias no trato intestinal. Pesquisadores da Holanda do
Instituto de Controle de Qualidade de Produtos Agrícolas de Wageningen já
comprovaram que o DNA inserido em alimento transgênico pode sobreviver no
intestino por até seis minutos, estando portanto disponível para absorção por
bactérias como a Enterococcus. Tal evento teria uma chance em 10 milhões de
ocorrer, mas não se deve esquecer que há bilhões dessas bactérias morando nos
intestinos de cada ser humano, por conseqüente, existe o risco estatístico de uma
transferência horizontal de DNA. Como o problema das linhagens de bactérias
resistentes já é gravíssimo, provocado sobretudo pelo mau uso dos antibióticos, não
há razão para correr esse risco, mesmo porque existem métodos alternativos de
seleção, no caso de plantas, o próprio gene da resistência ao glifosato, ou outro
herbicida, pode ser usado em substituição a antibióticos. Foi por isso que o Reino
Unido negou a empresa Novartis, em 1996, licença para prosseguir com testes de
uma variedade de milho na qual havia sido utilizado como marcador um gene de
resistência à ampicilina. A boa prática biotecnológica tende agora a desestimular o
emprego desses marcadores, ou exige que tais genes sejam de algum modo
desligados ou silenciados no produto final.
4.1.3 - Equivalência Substancial
O cerne da proposta de monitorização dos alimentos transgênicos aprovada
pela indústria e pelo setor de pesquisa em biotecnologia está no conceito de
"equivalência substancial", aceito por organismos internacionais reconhecidos, como
a Organização Mundial de Saúde. Segundo essa diretriz, um alimento transgênico
33
deverá ficar isento de qualquer teste adicional de segurança caso seja possível
mostrar que sua composição bioquímica e nutricional é equivalente àquela da
variedade natural (não modificada geneticamente). Foi o argumento utilizado por
exportadores norte-americanos quando houve reação pública no Reino Unido contra
o desembarque de soja transgênica misturada a convencional, em 1998. O
pressuposto é que, se ela apresenta perfil equivalente nos testes bioquímicos, a soja
geneticamente alterada deve ser considerada, para todos os efeitos, idêntica à
convecional.
Mais uma vez, o procedimento esbarra nos limites estreitos do que se conhece
no presente. Os testes padronizados podem apenas procurar por aquilo que se sabe
constar do alimento normal. Nada garante que novas proteínas ou toxinas criadas ou
surgidas com a manipulação genética da planta não terminem por escapar entre as
frestas do crivo laboratorial empregado. Do mesmo modo, não chega a ser
reconfortante ouvir que a agricultura biotecnológica se restringe a utilizar genes que
codificam substâncias geralmente consideradas seguras. Sempre se poderá
argumentar que possíveis desequilíbrios genômicos desencadeados pela manipulação
do DNA podem ocasionar a produção de proteínas desconhecidas e potencialmente
perigosas.
Melhor dizendo, não sempre, o tempo, na medida em que continuar
testemunhando a virtual ausência de desastres desse gênero, trabalha contra os
inimigos da tecnologia transgênica. Se não surgir um novo caso triptofano, será
provável que essa biotecnologia acabe por ser considerada aceitavelmente segura na
saúde humana, em particular diante dos benefícios que promete, na forma de
alimentos enriquecidos e cultivares resistentes a secas e solos deficientes ou tóxicos.
Maiores dificuldades para os alimentos transgênicos, no entanto, se levantam no
horizonte da saúde do ambiente.
Assim como trouxe problemas à saúde humana, surgiram também
conseqüências temidas e respostas à ciência e ao ambiente. Na madrugada de 29 de
janeiro de 2000, representantes de mais de 130 países reunidos na Quinta
Conferência das Partes da Convenção da Biodiversidade, em Montreal (Canadá),
34
conseguiram enfim chegar a um acordo sobre a identificação de Carregamentos
internacionais de alimentos geneticamente modificados. Estipulando regras
internacionais de biossegurança, o documento, que ficou conhecido como Protocolo
de Cartagena, por causa da fracassada Conferência anterior na cidade colombiana,
prevê que as cargas deverão ser rotuladas com os dizeres "Pode conter transgênicos".
Foi a forma prática encontrada para respeitar o direito de países importadores
fazerem uso do princípio da precaução e, mesmo sem prova científica, poderem
recusar sua entrada no próprio território sem com isso atrair a via e as sanções dos
organismos defensores do livre comércio.
O que faz, contudo, uma provisão dessas num tratado sobre biodiversidade?
As espécies transgênicas são variedades há muito domesticadas, grande parte delas
incapazes de sobreviver no ambiente natural. A primeira vista, não se compreende
por que poderiam representar ameaça digna de nota à diversidade biológica, não a
ponto de dominar e até emperrar a discussão de um protocolo internacional de
biossegurança. Para muitos ambientalistas e pesquisadores, no entanto, é justamente
essa a principal ameaça representada pelas variedades de plantas geneticamente
modificadas, ou seja, introduzi-las criaria uma grande pressão sobre espécies locais,
de ervas daninhas a insetos, de pássaros a parentes silvestres do organismo
transgênico.
Para melhor entender essa preocupação, é preciso ter em mente que, entre os
milhares de testes de vegetais transgênicos em curso no mundo, há dois tipos
principais envolvidos como plantas resistentes a herbicidas e plantas resistentes a
insetos. No primeiro caso, o mais conhecido é o da soja Roundup Ready, da
consoante, tolerante ao herbicida glifosato, mas há outros produtos resistentes ao
glufosinato como uma variedade de arroz que a empresa AgrEvo tenta introduzir no
Brasil. A idéia geral é tornar a planta produtora indestrutível ao veneno,
transferindo-lhe um gene com o código de uma proteína que funcione como antídoto.
Desse modo, a aplicação do pesticida poderia ser feita a qualquer momento,
garantindo a morte de ervas daninhas sem provocar prejuízos à plantação. Já os
organismos geneticamente modificados resistentes a insetos obedecem a um
princípio diverso, em lugar de antídoto, as plantas recebem genes para fabricar o
35
próprio veneno (inseticidas). Teoricamente, não seria mais necessário pulverizar o
campo para controlar pragas como lagartas e besouros, pois eles morreriam ao se
alimentar da própria planta. É o caso de todas as variedades como milho, algodão e
batata batizadas como "Bt", que nada mais são do que plantas que receberam um
gene da bactéria Bacillus thuringiensus para produzir uma toxina que destrói o
aparelho digestivo do inseto.
Essas estratégias podem, como de hábito, ser encaradas de maneiras
diametralmente opostas. De um ponto de vista otimista, aquele apregoado pela
indústria biotecnológica, seria uma maneira de diminuir o uso de pesticidas na
agricultura, mediante uma veiculação muito mais dirigida e eficiente. Para os
pessimistas ou céticos, seria mais correto dizer, trata-se de uma forma radical de
disseminar agrotóxicos pelo ambiente, em particular no caso das variedades Bt, em
que o veículo passa a ser a megapopulação de uma monocultura. Difícil é imaginar
que tamanha intervenção não tenha algum efeito de porte sobre o ecossistema à volta
das plantações. Mais difícil ainda, concluir qual seria o saldo dos prós e dos contras,
pois o debate ainda gera mais calar do que luz.
Na realidade, seria exagero dizer que há consenso sobre a má qualidade de
pesquisas que apontem perigos ambientais na transformação genética de plantas.
Quando muito, pode haver concordância entre geneticistas e outros pesquisadores
prisioneiros do paradigma da biotecnologia. Em outros departamentos das
universidades, como ecologia, entomologia e agronomia, parece haver muita gente
pensando que a melhor atitude talvez seja proceder mais devagar e realizar outros
estudos sobre os efeitos sistêmicos da agricultura transgênica, algo que
provavelmente só poderia ser verificado em áreas e prazos mais largos do que os
restritos testes de campo exigidos pela regulamentação de culturas transgênicas nos
países em que elas já se tornaram rotina. Abaixo encontram-se algumas
conseqüências duvidosas e as respostas que a ciência está delineando para as
hipóteses.
36
4.2 - Conseqüências ao ambiente
4.2.1 - Perda de biodiversidade e erosão genética
Acredita-se que há a possibilidade de que a introdução em larga escala de
plantas geneticamente alteradas afete de modo negativo a biodiversidade local e por
criar perturbações na cadeia alimentar. A disseminação de milho, algodão e batata Bt
criará uma pressão considerável sobre as populações de determinados insetos,
aqueles mais diretamente ligados ou próximos a essas culturas, tornando plausível
até que algumas espécies se extingam localmente ou em definitivo se forem
endêmicas. A escassez desses insetos, por sua vez, pode levar à deterioração de
populações de pássaros e outros predadores dos insetos, ou que deles dependem para
algum ciclo de vida. Espécies transgênicas resistentes a herbicidas podem deflagrar
efeitos semelhante, ao eliminar ou reduzir drasticamente a presença de ervas
daninhas que eventualmente sustentem outros grupos de organismos.
Na conferência internacional "Garantir a Segurança Alimentar". Proteger o
Ambiente e Reduzir a pobreza nos Países em Desenvolvimento: A Biotecnologia
pode ajudar? Realizada em outubro de 1999 na sede do Banco Mundial, em
Washington, quem fez o papel de excêntrico para os padrões norte-americanos
estreitamente pragmáticos foi o naturalista britânico Brian Johnson.
Segundo palavras do Brian Johnson, até alertou: prestar mais atenção aos
efeitos de uma nova onda de avanço da agricultura sobre a vida selvagem era
providência recomendável por motivos não só estéticos ou científicos, mas
igualmente utilitários. Afinal, as espécies que podem estar sendo arrastadas para a
beira da extinção servem ao homem, também, como bioindicadores. Esse sistema
natural de alarme já funcionou uma vez, quando denunciou a acumulação de
produtos tóxicos como DDT e pesticidas organocloradas antes que ela produzisse
efeitos significativos sobre a população humana.
Há quem tema, também, que o sucesso dessas variedades transgênicas entre
plantadores, lembrando que já é geneticamente produtor mundial, os Estados Unidos
37
e a progressiva concentração das empresas produtoras de sementes levem-nas a
predominar nos campos do mundo inteiro. Isso diminuiria ainda mais a já escassa
diversidade de cultivares existente na agricultura, em especial na que se baseia no
uso intensivo de pesticidas e a monocultura. Além da uniformidade genética ser
perigosa, tornando safras inteiras vulneráveis a pragas, essa tendência aceleraria o
desaparecimento de milhares de variedades locais de arroz, milho, trigo e diversas
outras plantas para a segurança alimentar da população mundial. Há também o risco,
sempre presente, de que genes das culturas transgênicas se transfiram para seus
parentes silvestres, conferindo-lhes características que nunca estiveram presentes
nessas populações como resistência a insetos e herbicidas, abrindo a porta para novos
desequilíbrios, embora, em rigor, ninguém possa prever hoje de que tipo e
magnitude.
4.2.2 - Surgimento de Superervas daninhas
No final de 1998, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio),
órgão encarregado no Brasil de licenciar o plantio de culturas transgênicas, examinou
um de seus casos mais polêmicos, o do arroz Liberty Link. Desenvolvida pela
empresa AgrEvo, essa variedade havia recebido um gene de microorganismo
Streptomyces higroscopicus para se tornar resistente ao herbicida glufosinato de
amônia. A CTNBio fez uma série de exigências incomuns para os testes
experimentais, realizados em lotes diminutos no Rio Grande do Sul, nas quais se
incluíam até mesmo redes para dificultar o acesso de pássaros à plantação. A razão
de tanta segurança era o próprio arroz (Oryza Sativa), ou, mais exatamente, uma
variedade Silvestre da espécie, que tornou a principal praga na região Sul, o arroz
vermelho, que infesta plantações e causa grandes quebras de safra. Por se tratar de
plantas da mesma espécie, torna-se muito provável que o gene estranho introduzido
no arroz Liberty Link se transfira horizontalmente para o daninho vermelho, quando
então este se tornaria resistente ao próprio herbicida que deveria matá-lo, ou uma
"supererva daninha", como se tornou conhecido o problema.
Os técnicos da AgrEvo negavam que fosse alta essa probabilidade de fluxo
gênico, argumentando, por exemplo, que as flores do arroz vermelho eram mais altas
38
e não poderiam ser polinizadas pelo arroz transgênico. Além disso, diziam, caso isso
ocorresse e o traço se espalhasse para todo o arroz vermelho do Sul, a agricultura
estaria apenas perdendo um instrumento de combate que já não possuía antes da
introdução do Liberty Link, uma vez que o herbicida não pode ser usado para matar
o arroz vermelho numa lavoura convencional, por que mataria igualmente o próprio
arroz em cultivo. O passo seguinte seria desenvolver outra variedade transgênica,
resistente a outro herbicida.
São poucos, porém, os casos em que a erva daninha pertence à mesma
espécie. Mais comuns são casos como o da colza "Brassica napus" que tem parentes
problemáticos como a B. campestris e a B. rapa, que pertencem ao mesmo gênero
(Brassica), mas não à mesma espécie. Pesquisadores do Instituto Escocês de Pesquisa
Agrícola mostraram em 1996 que o polén de colza transgênica foi encontrado a até
dois quilômetros de distância da lavoura mais próxima. Colegas dinamarqueses
comprovaram que a Brassica napus hibridiza, ou seja, cruza facilmente com a
Brassica campestris.
Mais preocupante, ainda, foi o resultado de um experimento levado a sério
por Joy Bergelson, da Universidade de Chicago, com a planta modelo dos
laboratórios de botânica, uma espécie de mostarda que carrega o nome científico de
Avalidopsis thalvana. Eles cultivaram lado a lado duas variedades, natural e
transgênica, e verificaram que a linhagem geneticamente alterada era por motivos
que não souberam explicar, 20 vezes mais eficiente na hora de cruzar. Nas palavras
da revista Nature à época, era mais "promíscua". Promiscuidade, aliás, é uma
especialidade das plantas, pois até espécies com número diferente de cromossomos
conseguem gerar híbridos.
Conclui-se, portanto, que a hipótese de "superervas daninhas" pode ser algo
mais do que o produto das mentes férteis dos verdes. Seu surgimento pode até ser
muito improvável, como argumentam os defensores da engenharia genética de
plantas, mas basta deixar por alguns momentos a atmosfera otimista da biotecnologia
para perceber que, no fundo, ninguém sabe o que pode acontecer. Para um ramo que
se auto-intitula "ciências da vida", parece haver ainda muita incompreensão sobre o
39
que de fato acontece com ela em seu elemento natural, o ecossistema" muito maior e
muito mais complexo que uma bancada de laboratório.
4.2.3 - Resistência de insetos a pesticidas
Uma das teorias mais populares entre estudiosos da evolução é a da "corrida
armamentista", segundo a qual espécies co-evoluem numa busca frenética de
maneiras de suplantar as armas e as defesas umas das outras. Por esse raciocínio, o
fracasso da estratégia de criar vegetais resistentes a insetos seria apenas questão de
tempo, aquele que as pragas consumiriam para desenvolver, elas também, resistiriam
ao veneno, assim como as bactérias criam imunidade aos antibióticos.
Isso é inevitável porque a variedade genética existente numa população de
insetos ou bactérias fornecerá sempre uns poucos indivíduos naturalmente imunes ao
veneno subitamente mobilizado para a guerra. Todos os seus semelhantes suscetíveis
morrerão depressa, deixando espaço para que os resistentes proliferem e seus genes
logo passem a predominar na população. O receio é que a tecnologia das plantas Bt
acarrete o pior de dois mundos: além de ameaçar espécies benéficas de insetos, como
borboletas monarcas ou joaninhas, ela poderia fomentar uma rápida disseminação de
resistência entre as pragas.
Os defensores da biotecnologia, como de hábito, dizem que há formas de
controlar o problema e administrá-lo. Argumentam que não existe apenas uma toxina
Bt, mas diferentes formulações da substância e igual número de genes
correspondentes, o que permitiria tanto utilizar pacotes de alteração genética
específicos para este ou aquele inseto, quanto alternar e substituir o tipo de pressão
seletiva que o veneno estará introduzindo no ambiente. Além dessa sintonia fina com
as próprias ferramentas da engenharia genética, a emergência da resistência poderia
ser combatida e administrada com métodos mais clássicos da genética de populações
e da agronomia, o estratagema dos refúgios. Trata-se de reservar, numa plantação de
vegetais transgênicos da linha Bt, pequenas áreas com plantas normais para garantir a
alimentação e, assim, a sobrevivência de ao menos alguns insetos não-resistentes,
40
que ficariam então disponíveis para cruzar com os resistentes que estariam
proliferando no restante da plantação.
Como ocorre muitas vezes no caso do "technological fix" uma teoria que tem
como expressão "dar um jeito tecnológico", ou seja, qualquer que seja a experiência,
ela deve ser vista como uma prática que busque respostas exatas, mas funciona muito
bem na teoria, nada garante que vai dar bons resultados na prática. Em primeiro
lugar, porque há pesquisa questionando se a imunidade ao Bt é mesmo uma
característica tão pura ou mendelianamente recessiva quanto a teoria exige. Depois,
como ter segurança de que os agricultores cumprirão mesmo a recomendação de
criar os refúgios? É um trabalho a mais, quando a lógica da adoção das culturas
transgênicas é diminuir as tarefas e cuidados. Fiscalizar seu cumprimento, se a
prática fosse mandatória, mais que trabalhoso seria pouco ou nada trivial, quando se
tem em mente que plantas transgênicas e normais possuem aparência idêntica. Por
fim, uma generalização da resistência de insetos ao Bt inutilizaria esse inseticida
natural, o único hoje aceito pela agricultura dita orgânica que pulveriza sobre as
plantas um preparado líquido com as próprias bactérias Bacillus thuringuensis.
A queixa maior, em resumo, é que os testes hoje empregados no
licenciamento de culturas transgênicas não seriam apropriadas para detectar esse
gênero de efeitos sistêmicos, pelo número reduzido de variáveis que levam em conta
e por suas limitações no espaço e no tempo. Enquanto não forem desenvolvidos
projetos e metodologias para dar conta dessas preocupações ambientais, mesmo
pesquisadores que não têm uma posição de princípio contrária aos transgênicos
consideram mais prudente não plantar vegetais geneticamente alterados em regiões
que sejam centros de difusão e, portanto, de variabilidade genética, na forma de
parentes silvestres da planta em questão, para evitar que o acervo genético da
população silvestre sofra erosão ou poluição, como conseqüência da promiscuidade
com genes de outras espécies, quando não se outro filo. Seria má idéia, assim, plantar
variedades geneticamente modificadas de milho no México, de tomate na Guatemala,
de soja na China ou de mandioca no Brasil.
41
Recomendam, ainda, dar prioridade à utilização da engenharia genética para
selecionar, com muito maior precisão do que em cruzamentos tradicionais, traços
genéticos já disponíveis no próprio genoma da espécie como no caso de pesquisas da
Embrapa, no Brasil, que procuraram obter linhagens geneticamente alteradas de
feijão resistentes a caruncho, mas que foram buscar esses genes em variedades
silvestres de feijão sabidamente imunes. A racionalidade por detrás dessa forma
atenuada de engenharia genética é que as chances de introduzir efeitos colaterais,
provocando instabilidade genômica ou proteínas inéditas na espécie, ficam
consideravelmente reduzidas quando a matéria prima genética provém da própria
espécie. Se o gene e sua característica existem e persistem, não tendo sido
descartados ao longo da seleção natural, é menos provável que possam lançar o
organismo e seus consumidores numa aventura indesejável e imprevisível.
42
CAPÍTULO V
TRANSGÊNICOS MATERIAM A FOME?
43
TRANSGÊNICOS MATARIAM A FOME?
Atualmente a biotecnologia se faz presente na vida das pessoas, sempre
buscando benefícios. Em relação aos alimentos transgênicos ainda existem muitas
controvérsias quanto a opinião da população ao seu uso, pois não se conhecem seus
efeitos. Foi publicado um relatório da FAO contendo informações a respeito da
liberação desses alimentos, em que é preciso à população saber que se trata de
organismos geneticamente modificados. Seus efeitos são imprevisíveis à saúde
humana e ao ambiente, mas mesmo assim há a produção em grande quantidade dos
alimentos transgênicos. E dizer que a produção demasiada desses alimentos mataria a
fome do mundo é uma falsa ilusão. O economista Jean Marc Von der Weid fez
alguns comentários em relação a esse antagonismo de que os alimentos transgênicos
eliminaria a fome mundial. A fome no Brasil é um problema social, e hoje no
mandato do Presidente Lula existe uma campanha contra a fome. É importante as
lutas sociais em favor da população, mas falar que os alimentos transgênicos
substituiriam a fome é uma falácia sem solução.
A FAO calculava haver 840 milhões de pessoas passando fome no mundo em
1996, quando a Conferência Mundial da Alimentação decidiu reduzir esse número à
metade em 20 anos. A população mundial crescerá para 10 bilhões, até 2030,
aumentando em 66% a demanda de alimentos, provocando um brutal agravamento
da fome. As empresas multinacionais produtoras de sementes transgênicas defendem
a sua tecnologia como solução para o problema.
Há oferta suficiente de alimentos para toda a população mundial, mas a
dificuldade de acesso impede a eliminação da fome. A Conferência Mundial de
Alimentação sugere enfrentar o problema aumentando a oferta de alimentos a preços
acessíveis nos países com déficit de produção, ficando as importações como uma
solução alternativa.
44
Seria necessário aumentar a produtividade das culturas a preços mais baixos
para resolver a questão e as empresas multinacionais de variedades transgênicas
alegam ser capazes de fazer isso. Mas a experiência dos Estados Unidos, onde os
transgênicos são produzidos desde 1996, mostra que essa afirmação é uma falácia.
Pesquisas de universidades norte-americanas mostra que as culturas
transgênicas mais difundidas, do milho Bt, resistente a lagarta, e da soja, resistente a
herbicidas, não têm produtividades mais altas do que as variedades convencionais.
No milho, a produtividade média nos últimos cinco anos ficou abaixo das culturas
convencionais, embora mais alta nos anos em que a infestação das lagartas foi
elevada, um em cada cinco anos. Na soja, há inferioridade na produtividade, da
ordem de 5 a 10%.
Os americanos continuam plantando transgênicos, porque há dificuldade de
encontrar sementes não transgênicas, com oferta concentrada nas mãos das empresas
produtoras de transgênicos.
No Terceiro Mundo, os agricultores familiares e os agricultores sem terra
estão mais vulneráveis à fome. Muitos dos famintos urbanos são migrantes que
transferem sua pobreza para as cidades.
A experiência de ONGs e governos com a agroecologia mostra ser possível
aumentar as produtividades dos agricultores familiares, sem impor-lhes riscos
inaceitáveis em investimentos com sementes (transgênicos ou não) e agrotóxicos.
A agroecologia aumenta a produtividade de várias culturas em até 50%,
segundo pesquisa da Universidade de Sussex, na Inglaterra, sem investimentos caros
e arriscados, com efeitos cumulativos e sustentáveis.
Existem no Brasil 3,7 milhões de agricultores familiares, que, no cultivo de
milho, soja, arroz, feijão e trigo produziram cerca de 20,57 milhões de toneladas, em
1996, com uma produtividade média de 1,513 kg/ha. Em sistemas agroecológicos, as
produtividades alcançadas foram, no mínimo, duas vezes maiores.
45
A agroecologia melhoraria a alimentação e a renda dos agricultores
familiares, eliminando um grande foco da fome no país, elevando a oferta de
alimentos de alta qualidade e a baixo custo dos consumidores urbanos.
Os transgênicos podem, na melhor das hipóteses, beneficiar alguns grandes
produtores, mas não têm efeito na solução da fome no Brasil e no mundo. A
agroecologia vem mostrando, no entanto, seu potencial para resolver esse problema,
mesmo sem qualquer apoio oficial em pesquisa, extensão rural ou crédito.
46
CAPÍTULO VI
TEMPO BIOLÓGICO E DURAÇÃO DE VIDA
47
TEMPO BIOLÓGICO E DURAÇÃO DE VIDA
A relação das pessoas com o tempo não é a de meros observadores, mas a de
entes biologicamente programados para serem temporais. A existência de "relatórios
biológicos" que sincronizam a relação entre nossas funções e o ambiente demonstra
isso. A programação genética humana inclui até um tempo de vida para cada célula e
para o organismo como um todo.
Os homens têm, em relação a outros animais, uma percepção ampliada de
espaço e de tempo. Para muitos cientistas, nossa percepção de mundo começou
quando a linguagem surgiu: sem o simbolismo da linguagem a abstração do passado
e do futuro seria impossível. Como o passado continua presente em nossa "memória"
e o futuro está presente em nossa "expectativa", vivemos simultaneamente as três
dimensões do tempo. O presente, para os humanos, é um breve instante entre o
passado e o futuro. A linguagem nos libertou das limitações do presente e permitiu
uma construção mental de tempo e de espaço infinitos e simbólicos, descritos em
palavras e/ou representações através da arte.
[...] Os limites de vida das células humanas intrigaram, por longo tempo, os
cientistas. Discutia-se se elas morreriam com o indivíduo ou seriam imortais,
dispersando-se após a morte deste. Graças aos recursos tecnológicos atuais, sabe-se
que as nossas células não só morrem mas também são geneticamente programadas
para morrer, fenômeno chamado de apoptose.
Em 1961, Leonard Hayflick e Paul Mooead demonstraram, observando
células humanas em cultura, que após 50 divisões celulares (50 gerações celulares)
elas começam a apresentar mudanças morfofisiológicas, com alterações do
citoplasma e diminuição do tamanho do núcleo, e em seguida morrem. A morte
programada (apoptose) é comum em células normais, e os restos celulares são bem
aceitos pelo organismo, não ativando processos inflamatórios. No entanto, quando a
48
morte é acidental (necrose), causada, por exemplo, por queimaduras, os restos
celulares não são reconhecidos e ocorre inflamação nos locais lesados.
Por razões ainda não entendidas, células cancerosas (em cultura) ultrapassam
as 50 gerações e comportam-se como praticamente imortais. Em outras palavras, a
célula cancerosa é uma célula transformada, desorganizada, mas com vida infinita
em meio de cultura (fenômeno da imortalização).
O corpo humano tem trilhões de células, de vários tipos: as da pele, as
nervosas, as musculares, as hepáticas e outras. Cada tipo tem seu tempo de vida
próprio e seu tempo de divisão. As células superficiais da pele, por exemplo,
dividem-se constantemente por mitose. Mais rápidas ainda que elas em sofrer
mitoses constantes são as células epiteliais do sistema digestório. Existe assim um
"relógio biológico" preciso e específico para cada tipo celular, que marca o momento
em que uma célula duplica seu material genético para dividir-se e originar células-
filhas. Um ciclo celular começa quando uma nova célula é formada, por divisão de
uma célula preexistente, e termina quando ela se divide. O crescimento organizado
depende, entre outros fatores, de mecanismos que controlam o tempo de cada etapa
desse ciclo. Se esse controle cessa, em função de alterações genéticas, a célula cresce
desordenadamente (é o que ocorre nas células cancerosas).
Independentemente do ciclo de renovação celular, todas as células acumulam,
com o tempo, lesões que comprometem suas funções. É por isso que, mesmo
ocorrendo a troca constante das células da pele, elas sempre exibem o aspecto da
idade que temos. Tais lesões decorrem de alterações genéticas (mutações somáticas),
transmissíveis às células-filhas, que afetam a eficiência do metabolismo celular,
podendo levar à apoptose ou à transformação em célula maligna.
Por todos esses aspectos, calcula-se que a longevidade máxima possível ao
ser humano é de 120anos, pois em geral nossas células não têm potencial para viver
mais que esse tempo. Ainda que as condições de vida sejam excelentes e que haja
aumento da vida média da população, 120 anos é o nosso limite biológico, nosso
tempo biológico.
49
CAPÍTULO VII
RAÍZES BIOLÓGICAS
50
RAÍZES BIOLÓGICAS
Segundo Jung, para relacionar o arquétipo do professor / aluno e na vivência
da prática escolar outros arquétipos como teoria / prática, licenciatura / pesquisa,
conhecimento / instrução, aprender / apreender, formular / redigir com o instinto,
precisamos buscar um "determinismo genético", um padrão de comportamento
relacionado com esses arquétipos. Conforme as afirmações colocadas por Jung
parece lícito classificar a transmissão de conhecimentos como uma situação típica.
Entretanto, o padrão de comportamento correspondente deve ser suficientemente
flexível e amplo para comportar a imensa gama de conhecimentos e habilidades que
o ser humano é capaz de aprender. Além disso, deve prover também a potencialidade
para a criação de novos conhecimentos. E, aqui, vemos que a extrema complexidade
da mente humana nos convida a ser cautelosos. Não podemos nos ater a uma acepção
muito estrita do instinto, pois ela comportaria um tal automatismo que praticamente
excluiria a possibilidade de aprendizagem. Vale a pena recordar que, para alguns
biólogos, os comportamentos animais classificam-se em "instintivos" e
"aprendidos".
Wilson [1993, p. 65] observa, no entanto, que, para os animais, o potencial de
aprendizagem de cada espécie parece estar inteiramente programado pela estrutura
do cérebro, pela seqüência de liberação de seus hormônios e, fundamentalmente,
pelos genes, cada espécie animal está preparada para aprender certos estímulos,
impedida de aprender outros e é neutra com respeito aos demais.
Mas, e quanto ao ser humano? Embora não estejamos tão programados
geneticamente como os animais, é possível identificar também em nós certos tipos de
automatismos para aprender, Wilson prossegue falando dos estudos de Piaget:
"De significado ainda maior é o fato de as crianças adquirirem habilidades e
emoções de acordo com programas difíceis de alterar. Jean Piaget, eminente
51
psicólogo suíço do desenvolvimento, dedicou toda uma vida à identificação dos
estádios muitas vezes surpreendentes que as crianças atravessam no seu crescimento
puramente intelectual. A mente segue trilhas paralelas, mais intimamente acopladas,
na elaboração de movimentos intencionais, de conceitos de significado e causalidade,
espaço, tempo, limitação e jogo. Sua própria concepção de realidade muda passo a
passo, à medida que a criança, dominada por reflexos, transforma-se na criança
primeiro egocêntrica e depois sociável. Dos esforços voltados unicamente para a
movimentação de objetos, a atividade da criança cresce em direção a uma reflexão
específica sobre os próprios movimentos. Os objetos primeiro são percebidos como
entidades únicas e, em seguida, como membros de grupos a serem classificados com
a ajuda de símbolos visuais e nomes. Piaget, originalmente formado em Biologia, vê
o desenvolvimento intelectual como uma interação de um programa genético
herdado com o ambiente.
Isso leva a refletir que todo estímulo é regulado pela molécula mestra da vida,
que é capaz de fazer e desfazer todas as estruturas mentais do ser humano. Mas há
um antagonismo suposto por Craig Venter em que os genes humanos representam
apenas cerca de 1% ou 2% do total de DNA, como supõe o presidente da empresa
privada Celera (Craig), um dos grupos responsáveis pela decifração do genoma
humano. A maior parte do DNA humano é uma espécie de "deserto" genético, com
vastas regiões de seqüências de nucleotídeos destituídas de informações para a
síntese de proteínas.
Esse "deserto" genético está sendo chamado de "DNA-lixo" ou, como alguns
preferem, "suposto DNA-lixo", já que seu papel biológico ainda não é bem
conhecido. Pesquisadores diversos admitem que nesse "deserto" genético estejam
alguns importantes traços de nossa ancestralidade, com algumas das possíveis
elucidações para os enigmas que ainda cercam o mecanismo de evolução humana.
Esses trechos do DNA humano podem, ainda, estar envolvidos na proteção natural
contra mutações genéticas.
Existe no ser humano uma programação genética que o predispõe a aprender,
em uma seqüência bem definida, e que em tudo se assemelha a um padrão de
52
comportamento. Porém, para que esse padrão de comportamento seja acionado, é
necessário um determinado sinal-estímulo. Tal sinal-estímulo, no que se refere à
aprendizagem humana, deve ser bem mais complexo que para qualquer espécie
animal. Ele está relacionado com o que comumente se chama "motivação" e que
poderíamos definir, ainda que grosseiramente, como "desejo de aprender". Esse
parece ser o aspecto mais misterioso do processo ensino-aprendizagem e para o qual
não existe fórmula mágica. Seja como for, tal sinal-estímulo pode estar ligado ao tipo
psicológico a que pertence o educando [Jung, 1981, Silva, 1992], a aptidões pessoais,
a preferências. Pode, inclusive, mudar em um mesmo indivíduo, em diferentes fases
de sua vida; pode estar relacionado com uma empatia especial do educando pelo
educador e pode ter um forte componente social.
As estruturas mentais de um ser humano são desenvolvidas desde a fase do
nascimento por toda a vida que será a base fundamental para o futuro. A criança é
futuro potencial. Daí decorre que a emergência do motivo da criança na psicologia de
um indivíduo significa, como regra, uma antecipação de desenvolvimentos futuros,
ainda que à primeira vista ele possa parecer uma configuração retrospectiva. A vida é
fluxo, um fluir para o futuro, e não uma parada. Isso concorda exatamente com nossa
experiência da psicologia do indivíduo, que mostra que a criança pavimenta o
caminho para uma futura mudança da personalidade. Fica claro que o ser humano de
encontro com a sua vida profissional, com a escolha que o fez se sentir realizado, ou
seja, naquilo que gosta de fazer, persiste na continuidade desse trabalho, que se
encontra tão intimamente no espírito da busca e da pesquisa, como na solução de
problemas. Ele experimenta o que quer dizer, pensar e descobrir e, assim, adquire
motivo de curiosidade frutífera. Sente o prazer e a satisfação da compreensão e da
clareza, desenvolvendo atitudes de autoconfiança racional e independência e
autonomia interior.
Segundo Craig Venter, as pesquisas atuais apontam, definitivamente, o fim do
determinsmo genético. Assim, a idéia de que todas as características de uma pessoa
estão "impressas" no genoma e podem ser explicadas pelas informações contidas no
DNA constitui uma falácia, que deve ser evitada. Nesse contexto, a influência do
ambiente é tão decisiva quanto o genoma no funcionamento do organismo. Isso
53
explica, por exemplo, porque a prática de exercícios físicos e de uma dieta
equilibrada pode evitar o desenvolvimento de certas anomalias genéticas em
indivíduos portadores de genes que condicionam tais anomalias. Ou o fato de gêmeos
univitelinos, geneticamente idênticos, exibirem diferenças em sua personalidade,
comportamento e mesmo em sua estrutura orgânica, como resposta às diferentes
reações às influências ambientais.
Devido a observações mediante a objetos de estudo vemos que o que nos leva
a ser bons profissionais e amadurecer no percurso do projeto de vida é estar sempre
buscando desafios, pois para os humanos, o presente é um breve instante entre o
passado e o futuro. E o que explica o progresso do homem que faz aquilo que gosta,
é o que ele vivenciou quando era criança, o seu desenvolvimento físico e
psicossocial.
54
CAPÍTULO VIII
BIOÉTICA
55
BIOÉTICA
Assistimos, nos últimos tempos, a um crescente despertar de consciência ética
em relação a diversos desafios levantados pelos avanços científicos e pelo progresso
econômico e técnico. A humanidade começa a dar-se conta de que nem toda
descoberta científica e nem toda vantagem tecnológica trazem sempre efeitos
puramente benéficos para as pessoas e a sociedade. Ela acorda da visão ingênua de
uma ciência isenta de interesses espúrios e de uma técnica limpa e benéfica.
A preocupação ecológica é uma das principais manifestações destes acordar
ético. Ela aponta para os efeitos maléficos de um certo tipo de ciência e técnica que
não levam em consideração a preservação do meio ambiente. A bioética surge, neste
contexto, como uma forte interpelação ética com relação aos avanços na área das
ciências da vida e das políticas de saúde.
Os progressos da ciência biológica (Engenharia genética; técnicas de
reprodução humana; transplantes de órgãos; progressos técnicos quanto à reanimação
e à diagnose pré-natal, colocam novos desafios que a tradicional ética médica não
consegue responder por seu caráter de pura deontologia profissional. É necessário
um saber mais global e interdisciplinar e, principalmente, uma argumentação ética
mais consistente. Assim, surgiu a Bioética como um estudo sistemático das
dimensões morais das ciências da vida e da Saúde.
A Bioética torna-se um fórum de discussão e de construção de consensos
sobre os limites e objetivos de uma pesquisa científica que envolve seres humanos e
de uma política que assegure condições de saúde para todos.
Diante de um problema de Bioética, é necessário, em primeiro lugar,
remetê-lo ao contexto e à mentalidade cultural que servem de horizonte de
compreensão para o seu equacionamento. Qualquer questão relativa à vida humana
56
depende do mundo vivencial no qual ela surge. A mentalidade determina o modo de
compreender e solucionar o problema. Por isso, é importante destacar a visão
sociocultural que inspira e motiva certo problema de bioética. Pode acontecer que o
problema seja justamente provocado pela própria mentalidade.
Não basta apenas remeter a questão ao contexto cultural, é necessário,
esclarecer a visão de ser humano que serve de referencial para a solução. A vida
humana não é uma pura realidade biológica, ela é, antes de mais nada, um evento
pessoal. Trata-se da vida de uma pessoa real ou potencial. O modo de responder a um
desafio no qual está implicada a vida humana depende de que se entende por pessoa
humana. Assim, toda Bioética precisa esclarecer o seu ponto de partida
antropológico.
Somente tendo presente esses dois aspectos (mentalidade subjacente e visão
de ser humano), pode-se construir uma Bioética integral.
A Bioética representa atualmente a face mais dinâmica e atuante da ética.
Ajuda a recuperar o protagonismo da ética ao tentar responder a problemas concretos
que hoje ameaçam a vida humana e ao meio ambiente. A Bioética procura refletir
sobre a vida em seu sentido global numa época em que as biotecnologias se
multiplicam vertiginosamente, abrindo perspectivas de esperança, mas deixando
também um rastro de risco e danos. E ao analisarmos a ciência e a pesquisa num
contexto bioético, ressaltamos a grande preocupação das questões éticas referentes
aos alimentos transgênicos em face a vários questionamentos atuais sem que a
evolução das técnicas, dos procedimentos e dos debates permitirá melhor delimitar
os aspectos positivos e negativos envolvidos nesse processo.
Em 1999, o Dr. Robert P. Lanza conseguiu a adesão de inúmeros cientistas
renomados, vários deles contemplados com prêmios Nobel, para a publicação de uma
carta na revista Science. Esta carta contestava a intromissão da política na limitação
da liberdade da ciência. Aparentemente, esta posição é o oposto do que foi realizado
na década de 1970, no início da Engenharia Genética, quando os próprios cientistas
estabeleceram uma moratória no sentido de auto-estabelecer limites para a pesquisa
57
nesta área. Vale ressaltar que, naquela época, a maioria das pesquisas eram realizadas
em ambientes acadêmicos, contrariamente à situação atual.
No Brasil, a Lei 8974/95, estabeleceu as normas para o uso das técnicas de
engenharia genética apesar de ainda existir controvérsias quanto ao uso contínuo dos
transgênicos visto o pouco controle e o desconhecimento, principalmente do órgão
legislativo sobre o assunto.
Mesmo com todos os estudos independentes indicando que o Brasil não deve
usar transgênicos, o governo federal e uma série de parlamentares continuam
repetindo as mesmas explicações vendidas pelo lobby patrocinado pela Monsanto e
pelo Departamento de Comércio dos Estados Unidos. Sem contar agricultores
brasileiros que, como marionetes, estão entrando no jogo das grandes corporações,
sem questionar nada.
Este é um perigo eminente, que devemos ter uma maior atenção do órgão
legislativo envolvendo um amplo debate nacional, pois toda pesquisa deve ser
monitorada mediante licença do governo e do Conselho Nacional de Meio Ambiente.
É necessário prover a sociedade com informações mais claras e precisas sobre os
alimentos transgênicos, para que cada cidadão possa decidir sobre a conveniência de
sua utilização e/ou consumo. Em todas as situações, o questionamento ético básico é
o de utilizar a vida humana como meio de encontrar respostas através da pesquisa
para a solução de doenças genéticas até obter o objetivo desejado da terapia gênica.
Leonard Martin,em 1993 nos fez refletir a idéia de que a pesquisa não deve
considerar apenas a questão técnica do que se pode fazer, mas a questão ética do que
se deve fazer, pois a discussão delimita algumas questões possíveis quanto ao
consumo de alimentos transgênicos, em que o ser humano deve estar consciente das
possibilidades futuras ao organismo.
A pesquisa é viável e admissível na execução de fatos e na divulgação dos
resultados deixando claro que o grande diferencial é estar realizando estudos que
permitirá no futuro beneficiar à vida humana.
58
CONCLUSÃO
59
CONCLUSÃO
O termo biotecnologia (do grego bios = vida, techno = técnica, logos =
estudo) compreende o estudo das técnicas e dos processos biológicos associados com
a obtenção de produtos de interesse humano. Hoje, a biotecnologia está mais do que
nunca presente em nosso cotidiano, não só acenando com conquistas diversas, mas
também suscitando reflexões, indagações e temores, que não se restringem à área de
ciências biológicas, mas avançam também para a economia, a ética e a religião, entre
outras áreas. Atualmente, a manipulação do DNA constitui um dos mais promissores
ramos da biotecnologia. O conjunto das técnicas envolvidas com a manipulação do
DNA constitui a engenharia genética. Considerada a grande revolução científica do
final do século XX, a engenharia genética entra no século XXI acenando com
notáveis perspectivas para a melhoria da qualidade de vida dos seres humanos e
também com temas polêmicos para a reflexão de todos.
A ciência tem feito descobertas fundamentais à vida humana e na visão de
alguns cientistas, estamos entrando efetivamente em uma viagem ao mundo da
criação, aproximando-nos de alma bioquímica do ser humano e inaugurando a "Idade
da Genética".
O rápido desenvolvimento da engenharia genética está forçando uma
reavaliação da questão do controle da pesquisa científica pelos órgãos legislativos.
Este controle foi praticamente perdido durante a década de 1970, quando as
primeiras experiências envolvendo a manipulação explícita de genes foram
desenvolvidas. O que existia antes, "cruzar" animais ou plantas para criar variedades
novas, é coisa bem diferente, pois não envolvia a manipulação direta de genes. Todos
sabem que cães e gatos são espécies diferentes e que não se cruzam, entretanto, por
meio da manipulação genética direta, essas duas espécies podem, em princípio, ser
"misturadas".
60
Uma das técnicas mais comuns de manipulação genética é a transferência de
genes de um organismo a outro usando, por exemplo, vírus. Nesse caso, genes de um
organismo são transplantados para o vírus, que, por sua vez, é implantado no
organismo em que se deseja depositar o material genético. Esse organismo pode ser
um peixe ou uma espécie de milho ou tomate. Com isso, os genes transferidos
espalham-se pelo organismo, transformando seu material genético e, portanto,
algumas de suas propriedades. Assim, podem-se conseguir, por exemplo plantas de
milho resistentes a certas pragas agrícolas ou um tipo de tomate que cresce mais
rápido e é mais produtivo. Até aí tudo bem, é a ciência a serviço da população, como
deveria ser. Podemos até imaginar um futuro em que os alimentos geneticamente
modificados vão solucionar a fome, um dos maiores problemas da humanidade.
Assim como os alimentos transgênicos, existem também outras pesquisas
importantes no estudo da engenharia genética como a terapia gênica que consiste
basicamente na deleção de genes deletérios ou na inserção de genes normais em
células de uma pessoa portadora de genes alterados e responsáveis por uma
determinada doença. O projeto genoma com a missão de sequenciar e mapear os 30
ou 40 mil genes existentes nas células humanas. A seqüência do genoma humano
será a base de uma revolução na medicina. Incluem-se as pesquisas sobre as vacinas
genéticas que consiste em inocular nas pessoas os genes que codificam proteínas nos
parasitas e que estimulam o sistema imune humano a produzir anticorpos.
Por fim, o que me trouxe a definir essa monografia, o estudo dos alimentos
transgênicos, que trata-se do poder de manipular o coração bioquímico da vida e de
criar e alterar mecanismos orgânicos no mundo vivo.
O dilema começa ao examinarmos os possíveis efeitos ambientais dos
alimentos transgênicos e seu impacto sobre a saúde humana. Se microorganismos são
usados como pontes genéticas, transmitindo material de um ser vivo para outro, por
que esse material não poderia se espalhar para outras espécies de seres vivos? Para
responder a essa questão, virologistas dos Institutos Nacionais de Saúde (NIH) dos
Estados Unidos desenvolveram uma experiência em que um gene causador de câncer
em ratos foi transplantado para uma bactécia, que foi então implantada em outros
animais, para observar se estes também desenvolveriam câncer. Em caso afirmativo,
61
a experiência provaria que o câncer pode se tornar uma doença contagiosa por meio
da manipulação genética. Os cientistas começaram errando, escolhendo uma bactéria
frágil. Por quê? Porque eles não tinham nenhum interesse em comprovar os perigos
da manipulação genética, existiam outros interesses em jogo, eram interesses
políticos, econômicos e também de controle da pesquisa científica. Mesmo assim, a
bactéria infectou alguns animais com câncer, segundo os Institutos Nacionais de
Saúde. Esses resultados não foram publicados em jornais científicos e o depoimento
oficial dos Institutos Nacionais de Saúde dizia que os riscos são menores do que o temido.
A verdade é que ainda não temos comprovação cientifica de que a
manipulação genética de alimentos não poderá gerar efeitos danosos à nossa saúde
ou ao equilíbrio ecológico. Não acredito que seja possível impedir o
desenvolvimento da pesquisa genética e jamais sugeriria tal coisa, que me parece
absurda; a ciência precisa ter liberdade para progredir e uma legislação proibindo
certos tópicos de pesquisa é, na minha opinião, equivalente à censura de imprensa ou
à repressão da opinião pública.
Por outro lado, essa liberdade só pode funcionar se submetida a uma intensa
supervisão da comunidade científica, aliada a órgãos governamentais, livres de
interesses econômicos e políticos que possam comprometer os resultados. Existem
questões éticas que precisam ser debatidas abertamente com a sociedade, desde a
criação de alimentos transgênicos até a manipulação de genes humanos.
Como todo avanço tecnológico, a manipulação genética de seres vivos traz,
ao lado dos benefícios, alguns riscos potenciais nem sempre percebidos com
facilidade. A riqueza de opções torna necessário analisar, caso a caso, o uso da nova
tecnologia. Além disso, para seres sociais, as mudanças, seja no comportamento seja
no modo como garantem a sua sobrevivência, estão sempre associadas a julgamentos
éticos. Portanto, cabe a cada sociedade discutir o assunto e decidir racionalmente que
tipos de tecnologia são, mais aceitáveis para o uso de seus integrantes. O Brasil
também precisa discutir a questão do uso de técnicas de manipulação genética, como
vem ocorrendo há anos em outros países. É fundamental que o país não perca as
oportunidades reais de melhorar suas condições de vida nem aceite a imposição de
decisões tomadas por outras sociedade sem discutir sua adequação à nossa realidade.
62
BIBLIOGRAFIA
63
BIBLIOGRAFIA
LEITE, Marcelo. Os alimentos transgênicos / Marcelo Leite - São Paulo: Publifolha,
2000. - (Folha explica).
SOARES, José Luís, 1934 - Biologia: volume único / José Luís Soares. - São Paulo:
Scipione, 1997.
PAULINO, Wilson Roberto - Biologia atual: volume 1 - São Paulo: Ática, 2002.
JUNGES, José Roque. Bioética: Perspectivas e desafios - São Leopoldo Unisinos,
1999, 322p.
SAIANI, Cláudio - Jung, uma análise da relação professor / aluno. Claudio Saiani. -
São Paulo: Escrituras Editora, 2000. - (Série ensaios transversais).
GLEISER, Marcelo. Os perigos das manipulações genéticas. Folha de São Paulo, 3
set, 2000.
TEICK, Daniel Hessel. Perspectivas para o futuro. Revista Veja, 6 jun. 2000.
AZEVEDO,Eliane S. Cerqueira, Eneida de Moraes Marcílio. Tempo Biológico: a
vida tem horário. Ciência Hoje, n. 159, abr. 2000, p. 67-9.
Revista Science, 12 jan. 2001.
Folha de São Paulo, 27 jun. 2000. Seção "Especial Genoma".
SIMPSON, Andrew. Folha de São Paulo, 27 jun.2000. Seção "Alimentos
transgênicos".
64
Informativo do Conselho Regional de Biologia - 2.ª Região RJ/ES - Bionotícias. Ano
VIII, n.º 49, abril/maio 2002.
http://www.infojus.com.br/clontrans.hhtm - Seminário "clonagem e transgênicos -
impactos e perspectivas".
65
GLOSSÁRIO REMISSIVO
Alelo = Cada uma das formas que um gene pode apresentar. Alelos ocupam o mesmo
locus gênico em cromossomos homólogos.
Aminoácido = Molécula orgânica que contém ao menos um grupo carboxila
(COOH) e um grupo amina (NH2). Os seres vivos apresentam vinte tipos de
aminoácidos que, unidos por ligações peptídicas, constituem as moléculas de
proteína.
Cromossomo = Cada um dos longos filamentos presentes no núcleo das células
eucarióticas, constituído basicamente por DNA e proteínas. Nos cromossomos
situam-se os genes.
DNA = Ácido nucléico constituído por desoxirribose, fosfato e bases nitrogenadas
(adenina, guanina, citosina e timina). Sua molécula é filamentosa, tem cadeia dupla e
arranjo helicoidal (dupla-hélice). O DNA é a substância que forma os genes, onde
estão inscritas, em código, as informações hereditárias.
Enzima de restrição = Enzima que corta a molécula de DNA em pontos específicos,
onde houver determinada seqüência de nucleotídeos. As enzimas de restrição são as
ferramentas básicas da engenharia genética.
Gene = Segmento de molécula de DNA que contém uma instrução gênica codificada
para a síntese de uma proteína. A natureza dos genes e o modo pelo qual são
transmitidos aos longo das gerações são estudados pela genética.
Seleção Natural = Conceito desenvolvido por Charles Darwin para explicar a
evolução biológica, segundo o qual nem todos os indivíduos de uma população têm a
mesma chance de sobreviver e de se reproduzir: levam vantagens os mais bem
adaptados ao ambiente. É um dos pontos principais da teoria evolucionista.
66
INDICE
INTRODUÇÃO 11
CAPÍTULO I 13
ENGENHARIA GENÉTICA: A CIÊNCIA QUE DESVENDA OS
MISTÉRIOS DA VIDA 14
CAPÍTULO II 18
DESAFIOS DO BIÓLOGO NO SÉCULO DOS ALIMENTOS
TRANSGÊNICOS 19
CAPÍTULO III 21
A EXPLOSÃO DOS TRANSGÊNICOS 22
CAPÍTULO IV 24
ALIMENTOS TRANSGÊNICOS: CERTEZAS E DÚVIDAS 25
4.1 - Conseqüências à Saúde Humana 30
4.1.1 - Alergias 30
4.1.2 - Resistência a antibióticos 31
4.1.3 - Equivalência substancial 32
4.2 - Conseqüências ao ambiente 36
4.2.1 - Perda de biodiversidade e erosão genética 36
4.2.2 - Surgimento de superervas daninhas 37
4.2.3 - Resistência de insetos a pesticidas 39
CAPÍTULO V 42
TRANSGÊNICOS MATARIAM A FOME? 43
CAPÍTULO VI 46
TEMPO BIOLÓGICO E DURAÇÃO DE VIDA 47
CAPÍTULO VII 49
RAÍZES BIOLÓGICAS 50
CAPÍTULO VIII 54
BIOÉTICA 55
CONCLUSÃO 58
BIBLIOGRAFIA 62
67
GLOSSÁRIO 65
ÍNDICE 66
ANEXOS 70
68
FOLHA DE AVALIAÇÃO
UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
PROJETO A VEZ DO MESTRE
Pós-Graduação "Lato Sensu"
Título da monografia:
"Desafios do Biólogo no século dos alimentos transgênicos".
Data da Entrega: 26/06/03
Por:
Ana Rosa Jorge Cid
Orientador:
Luiz Claudio Lopes Alves
Avaliado por: ___________________________________ Grau: _______________
Banca Examinadora:
__________________________________________ Grau: ________________
__________________________________________ Grau: ________________
__________________________________________ Grau: ________________
__________________________________________ Grau: ________________
Conceito Final: __________________
Rio de Janeiro, _____ de _______________ de ______.
69
A N E X O S