depois dos quinze - quando tudo começou a mudar

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7/27/2019 Depois dos quinze - Quando tudo começou a mudar http://slidepdf.com/reader/full/depois-dos-quinze-quando-tudo-comecou-a-mudar 1/23 crônicas e contos  D  p  o s   q  u  i  n   z  e  a n   o m e ç o u   a   m  u  d  a   r Bruna Viira 2ª edição

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c r ôn i cas e con to s

 D e  p o i s  d os  q u i n  z  e Q u and  o  t u d o  c om e çou   a  m u d  a  r

Bruna Viira

2ª edição

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 Depois dos quinzeQuando tudo come çou a mudar 

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c r ô n i ca s e c o n t o s

Bruna Vieira

 Depois dos quinzeQuando tudo come çou a mudar 

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Copyright © 2012 Bruna Vieira

Copyright © 2012 Editora Gutenberg

capa e projeto gráfico

Diogo Droschi 

ilustração 

Giovana Medeiros

fotografias Marcelo Werneck 

 José Luiz Zorzan

Mari Milanezi 

Luzia Vieira Jamila Tanaka

editoração eletrônicaChristiane Morais

revisão

Eduardo Soares

Cecília Martins

editora responsávelRejane Dias

Revisado conorme o Acordo Ortográfco da Língua Portuguesa de 1990,em vigor no Brasil desde janeiro de 2009.

Todos os direitos reservados pela Editora Gutenberg. Nenhuma parte destapublicação poderá ser reproduzida, seja por meios mecânicos, eletrônicos, sejavia cópia xerográfca, sem a autorização prévia da Editora.

EDITORA GUTENBERG LTDA.

São Paulo

Av. Paulista, 2073, Conjunto Nacional,Horsa I, 11º andar, Conj. 1101Cerqueira César . 01311-940São Paulo . SP .Tel.: (55 11) 3034 4468

Belo Horizonte

Rua Aimorés, 981, 8º andar .Funcionários . 30140-071 .Belo Horizonte . MGTel.: (55 31) 3214 5700

Televendas: 0800 283 13 22

www.editoragutenberg.com.br

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Vieira, BrunaDepois dos quinze : quando tudo começou a mudar / Bruna Vieira .

-- Belo Horizonte : Editora Gutenberg, 2012.

ISBN 978-85-8235-013-3

1. Literatura juvenil 2. Crônicas 3. Contos I. Título.

12-12774 CDD-869.93

Índice para catálogo sistemático:1. Crônicas : Literatura brasileira 869.93

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Dedico este primeiro livro a todos os caras

que conheci e que me fzeram, seja por 

qual motivo or, abrir o bloco de notas

em uma madrugada qualquer e escrever.

Dedico à minha amília, que me ensinoua enxergar o mundo de um jeito dierente,

quando eu ainda nem podia sentar no

banco da rente do carro. Dedico, por fm,

às minhas leitoras, que no decorrer dos

últimos três anos se tornaram também

minhas melhores amigas.

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The biggest adventure you can take

is to live the life of your dreams.

Oprah Gail Winfrey

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V i ( v e r )(a)

 Lou(cura) .

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Naquela manhã, acordei como se tivesse acabado deechar os olhos – eu realmente precisava levantar daquelacama? Bem, o meu despertador jurava que sim. Quemprecisa de um bom dia? Ignorar broncas, tropeçar em umsapato jogado no chão e abrir a geladeira sem sentir vontadede comer absolutamente nada parecia muito apropriadopara uma segunda-eira pós-término de namoro.

Que tal um banho? Chorar enquanto a água do chuveiroescorresse pelo meu corpo parecia uma proposta tentadora,mas minha promessa de não mais deixar escapar tristeza emorma líquida a tornava impossível. Um banho rápido, umaroupa qualquer e um blush – quebrado – no rosto.

Eu realmente gostaria de ter me lembrado de onde

coloquei o outro pé do meu All Star na última sexta. Tantacoisa que eu gostaria de esquecer... Por que meu cérebro – emeu coração – insistem em guardar apenas coisas idiotas?Bom, ótimo. Lá estava ele, bem na minha cara, debaixo domeu vestido preto jogado embaixo da cadeira. Por que – maisuma vez – eu não lembro como ele oi parar ali? Talvez eu

tenha passado o nal de semana ocupada demais tentandoparar de chorar.Bem, hora de partir. Não nasci rica ou superinteligente

para simplesmente escolher deixar de ir à escola. Naquele

Vértices

 amor de um

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dia, especialmente, o caminho até lá parecia mais compridodo que de costume, e as árvores que antes me cumprimen-tavam pareciam rir da minha cara:

– Aquela não é a idiota que perdeu o namorado paraa melhor amiga?

Uma vantagem de chegar atrasada: poucas pessoas nocorredor. Eu não queria conversar com ninguém sobre o quehavia acontecido no nal de semana. Eu poderia guardaresse segredo para sempre. Mas, bem, para isso eu teria que

matar todos os envolvidos, e eu realmente não queria olharna cara desses até o dia em que eu me tornasse uma garotainvejável e estivesse em pelo menos dez capas de revistadierentes. Nunca.

– Desculpe pela demora proessor, posso entrar?O undo parecia o lugar mais apropriado para mim

naquele momento, embora o meu lugar ainda estivesseaparentemente vazio. Vejo que eu não ui a única a chegaratrasada.

Contas. Presidentes. Átomos.Isso oi o sinal do intervalo? Ninguém sentiria minha

alta lá ora, e eu realmente estava com sono. Quinze mi-nutos de uma soneca sem interrupções…

– Danie, você está bem? – Aquela voz era amiliar,aquele cheiro também.

– Matheus, não acredito, você voltou! – Aquele oi oabraço mais orte que dei nos últimos meses.

– Você não sabe o quanto senti sua alta.– Na verdade eu sei, eu senti isso ao quadrado.Eu estava quase chorando quando lembrei o quanto

consigo ser engraçada – e não idiota – com aquele carapor perto. Eu realmente senti alta do meu melhor amigo.

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– Quando você voltou? Por que não me ligou ou man-dou um e-mail? Eu realmente precisei de você nesse nalde semana.

– Eu queria azer uma surpresa, e, você sabe, eu nãoqueria causar problemas com você e o… – Ele não termi-nou a rase, abraçou-me novamente e disse que agora tudocaria bem, ele realmente estava de volta.

Os quinze minutos passaram muito rapidamente.Enquanto ele trazia a carteira para o meu lado, notei

o quanto seus músculos tinham crescido nesse tempo emque estivemos longe um do outro. Eu poderia ngir queaquele peitoral era um enorme travesseiro e chorar até queminhas últimas lágrimas secassem.

Durante as duas últimas aulas, ele me contou sobre a suaviagem e como oi incrível conhecer o outro lado do planeta.

– A propósito, Danie, o que você ez nesses últimos

meses?– Perdi minha virgindade com um idiota que me

trocou por minha melhor amiga. Ou perdi minha melhoramiga para um idiota que tirou minha virgindade. Qualvocê preere?

Ele apertou minha mão e sorriu como se nada daquiloosse importante. Eu realmente queria acreditar nele.

– Você almoça lá em casa hoje? Minha mãe vai adorarte ver.

– Eu realmente não posso, tenho que resolver algu-mas coisas com o diretor e depois ensaiar. – Eu tinha meesquecido de que o meu melhor amigo agora era um atorde verdade.

– Te vejo mais tarde então?– Eu passo na sua casa à noite, como sempre.Embora ainda existisse algo morto entre meu estômago

e meu coração, eu me sentia melhor. Jogar a mochila no

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soá, comer sem respirar e me deitar na cama até sentirvontade de levantar. Novamente, nunca.

“And it breaks my heart, and it breaks my ha-ah-ah, art. And it breaks my ha-ah-ah, ah-ah-aart” – esse é o meu celulare sua mania de tocar sempre que eu não quero atender.

 Vejam, era o número de um dos vértices do meu triân-gulo amoroso. Desgraçado. Eu não via problema em deixaro celular tocando, anal aquele toque era minha música

predileta. Regina Spektor me entenderia. Eu voltaria adormir, se minha mãe não tivesse gritado:

– Danieeeeeeeee, alguém está na porta chamandopor você.

Eu sempre odiei os gritos da minha mãe, mas aquelaspalavras soaram como um cochicho carinhoso. Levanteicorrendo e ui a caminho da escada, tinha que ser o Ma-theus. Enquanto ele subia, eu, como de costume, senteino último degrau; aquele era o nosso local preerido dacasa. Sempre cávamos conversando por – imperceptí-veis – horas e horas.

Embora eu estivesse eliz pela presença daquele meuvelho – melhor – amigo, comecei a sentir um estranho enjoo

no estomago. Era hora de desabaar, de mexer em eridasque ainda sangravam dentro de mim. Mas tudo aquilo erapreciso: Matheus era o meu Merthiolate. Ok, sem trocadi-lhos da próxima vez.

– Que bom que você chegou.– Desculpa pela demora, você sabe como é o diretor.

Esquece, toda vez, de parar de alar. Mudando de assunto,acho que precisamos conversar sobre assuntos seus. Queroque você desabae, chore, me abrace, me morda ou, sei lá,grite até sua mãe gritar mais alto te mandando calar a boca.

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– Matheus, sabia pereitamente que em algum mo-mento tocaríamos nesse assunto. Você se importa se eunão entrar em detalhes? É tudo muito recente e estranhopra mim. – Alguns alam pra gente car bem, outrosazem a gente car bem. Matheus era exatamente estetipo de cara.

– Claro que não, Dan, os detalhes seus olhos me di-zem. Não se preocupe, conversaremos quando você puder equiser. Ah, quase esqueci, trouxe sorvete de creme. Embora

eu ainda não tenha encontrado gosto nesse sabor, sei queé o seu predileto.

Enquanto preparava os potes para colocar o sorvete,ui desabaando.

– Sabe, Matheus, é como se eu tivesse perdido meusdois braços, e, acredite, a parte realmente diícil é não po-der pegá-los de volta. Dói tanto que eu tenho vontade deesquecer e ligar para os dois ngindo que nada aconteceu.

– Mas é claro que você não vai azer isso…– Eu nunca ui a melhor namorada do mundo, muito

menos a melhor amiga, mas juro que z tudo o que podiapara ser e azer eliz. É realmente muito estranho ver duasdas pessoas que mais amo no mundo se amando.

– Veja pelo lado bom: você me ama e eu te amo. Somosuma dupla como nos velhos tempos, você lembra?

Eu conheço o Matheus desde quando eu usava óculose andava só de calcinha pela casa. Sua mãe o trazia parabrincar com meu irmão, mas ele nunca oi muito ã devideogames. Nossas brincadeiras inventadas sempre orammais interessantes. Embora eu tivesse tudo a ver com aquelecara, e o perume dele osse realmente bom, sempre o en-xerguei como melhor amigo. Ele era sinônimo de sorriso,não de beijo.

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Conversávamos sobre coisas aleatórias até que o meucelular tocou novamente. Matheus olhou para mim como sequisesse dizer: “Eu sei que é ele, quer que eu aça alguma coi-sa?”. Eu apenas balancei a cabeça azendo um sinal positivo.

– A Danie está ocupada demais sendo eliz para alarcom lembranças idiotas como você.

Eu estava? Bem, eu estava.Eu realmente tinha me esquecido o quanto ter um

cara – de verdade – do lado era bom. Tomamos sorvete,

conversamos um pouco mais sobre a viagem e, por m,vimos um episódio de uma série americana que amávamos.Ele adorava imitar um dos personagens:

– Danie (toc, toc), Danie (toc, toc), Danie (toc, toc).Já posso entrar no seu coração, senhorita lágrimas?

– Seu ex-nerd musculoso idiota, você nunca saiu dele.O tempo passou rápido, já era hora de dizer adeus de

novo. Ele se despediu com um abraço apertado e disse queestaria por perto na manhã seguinte. Respirei undo e echeia porta. Olá de novo, solidão.

Como sempre, meu quarto estava uma bagunça. Euprecisava dar um jeito na minha vida – quem está escreven-do isto, eu ou minha mãe? O ato é que, se eu realmente

quisesse começar de novo, eu precisaria apagar algumascoisas que me prendiam ao passado. Apagar e-mails, otos,depoimentos e, por último, arrancar a última olha de todosos meus cadernos da escola. Eu sabia que nada daquilo mearia eliz naquela noite, mas eu estava disposta a tentar.Tomei banho – sem pensar em lágrimas dessa vez – e, depoisde estar vestida com um pijama conortável e pega-rango,fquei alguns minutos me olhando no espelho do banheiro.Por mais que as coisas tivessem mudado completamente,eu ainda era a mesma Danie de sempre.

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Foi naquele exato momento que percebi que não meadiantou de nada apagar e esconder todas aquelas coisas.Minha maior lembrança estava naquele refexo, minhamaior lembrança estava dentro de mim. Era hora de mudarmeu refexo no espelho, era hora de parar de lamentar. Oque uma tesoura tem a ver com isso? Uma nova ranja podeazer coisas que você nem imagina.

ZzZzzZzZzZzZzZZzZz

 Acordar de madrugada era uma merda, acordar tristede madrugada era… Bem, você sabe como é. Pegar o ce-lular pra escutar músicas depois de ir um milhão de vezesà cozinha e voltar correndo com medo do escuro pareciauma boa ideia. Meu celular só tinha músicas com as palavras“amor”, “love”, “você e eu”, “paixão”… Preciso dizer maisalguma coisa? Lá vou eu mergulhar de novo – dessa vez,de bomba – nas minhas lembranças.

Eu ainda conseguia sentir o perume do Phelipe – achoque ainda não apresentei o idiota da história como deveriapra vocês – no meu quarto. Isso só piorava as coisas.

 As pessoas costumam dizer que tentar esquecer al-

guém não unciona; isso defnitivamente não é verdade, nósconseguimos, sim, esquecer o outro, mas em pedaços, aospoucos. O problema é que nossa memória tende a apagarprimeiro o que mais doeu. O que sobra então? Os abraços,os olhares, o perume e o sorriso. Por isso os primeiros diasde solidão são sempre os mais dolorosos. Adormeci enquantome odiava por não conseguir adormecer.

Tudo novo, de novo. Bom dia, árvores idiotas. Bomdia, pessoas idiotas que fcam me olhando como se eu ossea Lady Gaga vestida de carne. Bom dia, carteira. Bom dia,

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meu amo… Péssimo dia. Ele veio, eu podia sentir aqueleperume a quilômetros de distância. Atrás daquela paredeamarela estava uma espécie de dispositivo que azia meucoração disparar e queimar, digo, meu ex.

Respirar, olhar pra rente, rebolar. Respirar, olhar prarente, rebolar.

Eu teria conseguido se ele não tivesse gritado meunome. Ah, aquela voz. Respirei undo e virei pra trás comose eu não soubesse quem era o dono daquele timbre insu-

portavelmente gostoso.– Nós precisamos conversar.Sério, Phelipe? Acho que na verdade eu quero te ma-

tar. Eu teria dito isso, mas a única coisa que saiu da minhaboca oi:

– Quando?– Agora, venha comigo.

 Aquela sim era uma proposta tentadora, mas eu nãopoderia azer isso. Por mim e, agora, pelo Matheus. Elenão sentiria orgulho de me ver voltando atrás. Tudo bem,vai. Algumas palavras e algumas verdades não azem mal aninguém. Lá vamos nós de novo.

Quando chegamos ao undo da escola, ele parou bem

na minha rente e cou me olhando nos olhos.– O que oi? – eu disse enquanto tentava não olhar

para aqueles olhos azuis.– Eu sei que tudo o que você mais quer agora é uma

explicação que aça sentido. Mas, por enquanto, não possodizer toda a verdade para você. Eu te amo, mas isso nãobasta. Admitir isso é a pior parte.

– Por quê?– Nem sempre a vida depende só do que acontece aqui

dentro – segurou minhas mãos e apontou para o coração.

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– A gente cresce e descobre que a parte mais diícil é esco-lher entre o que az a gente eliz e o que az quem a genteama eliz.

– E você escolheu o quê?– Escolhi o melhor pra todo mundo.– Você acha que isso é o melhor? Então divirta-se.Não consegui dizer mais nada. Aquelas rases fzeram

tudo parecer ainda mais conuso. Por que as coisas queele dizia, mesmo que sem sentido, pareciam sempre as

coisas certas?Saí sem olhar pra trás fngindo que nada daquilo havia

acontecido. Pensei: “Matheus, meu flho, você precisa pararde chegar atrasado, mais uma dessas e eu não aguento”.Surpresa! Ele já havia chegado.

– Você estava aí? Nem te vi chegar – eu disse, com osorriso de eu-não-estava-alando-com-meu-ex-acredite-em--mim.

– Eu te vi, mas te achei ocupada demais para atrapa-lhar. – Droga, não uncionou.

– Ele me chamou para conversar, acho que realmenteprecisávamos conversar sobre algumas…

– Dan, você não precisa me explicar nada, é sua vida,

seus sentimentos e, principalmente, o seu ex. Ah, e olha,sua melhor amiga – apontou para a porta.

– Ex! – Fiz questão de ressaltar.– Que seja, a aula vai começar, assente-se por perto.Mais presidentes. Mais átomos. Mais contas. Dessa

vez, mais complicadas que as de ontem.Intervalo? Por avor, não. Eu realmente não queria le-

vantar daquela carteira e olhar pra trás. Eu precisava ser con-fante e parecer eliz. Sentei na mesa de Matheus e converseisobre assuntos irrelevantes. Rir ao alar sobre o tempo? Essa

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era minha tática de mocinha-eliz-sem-passado. Usar meumelhor amigo pra esquecer/maltratar/impressionar o meuex-namorado era maldade, mas eu não tinha outra opção.

No caminho de volta pra casa, Matheus perguntousobre a nossa conversa, e eu disse exatamente o que tinhadito e escutado.

– Esse cara é um idiota. Eu realmente não sei comovocê oi se apaixonar por ele.

Fora os músculos, ora o sorriso, ora o cheiro, ora o

bom humor, eu também não sabia o porquê.Matheus morava longe, mas azia questão de me levar

todos os dias até a esquina da minha rua – na verdade eleparou de azer isso quando comecei a namorar.

– Obrigada por estar sempre do meu lado, amiguinho.– Eu é que tenho que agradecer por você emprestar

o seu sorriso para os meus olhos – disse ele me azendocosquinhas.

Qualquer garota acreditaria que rases como aquelaeram de um cara apaixonado. Não era assim, era o Matheus.Meu melhor amigo e ponto.

 A aula havia acabado mais cedo, então, provavelmente,naquele dia eu almoçaria com toda a amília.

– Mãe, cheguei!– Oi, lha, como oi na aula?Contar uma história típica de flme de Sessão da Tarde

minutos antes do almoço? Não.– Normal, mãe, o de sempre.– Você está dierente, eu realmente acho que aconteceu

alguma coisa. – Fala sério, mães espertas são realmente umproblema.– Sério, mãe, eu só tô cansada. Esse nal de semana

oi exaustante.

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– Pois descanse, seu pai deve chegar amanhã e temuma surpresa pra você.

Eu queria com todas as orças que a última invençãomaluca do meu pai osse uma máquina do tempo e queessa osse a grande surpresa.

– Cadê o Wesley?– Seu irmão saiu com alguns amigos, deve almoçar ora.– Ótimo, eu como a carne dele.Por mais que eu tivesse pena das pobres vaquinhas e

dos porquinhos, eu amava carne. Meu peso sempre estevediretamente ligado ao meu estado emocional. Embora amaioria dos caras me considerassem a garota mais peculiarque já haviam conhecido, eu não era nem nunca ui a maisbonita. Eu sempre me senti dierente, mas não como asoutras garotas que queriam parecer dierentes, eu simples-mente era, por dentro, por sotaque, por sorriso, por alma.

Liguei meu notebook e pensei: por que não dar umaespiada em como anda a vida virtual das pessoas? Na ver-dade, o status do relacionamento do meu ex. Namorando?Comigo ou com minha melhor amiga? Será que ele nãoteve tempo de entrar na internet ou teve tanto tempo quejá ez as mudanças necessárias? Aquela dúvida me corroeu.

Hora de escrever. Vamos esquecer.Escrever e esquecer são duas palavras que, embora

parecidas, não uncionam juntas. Enquanto eu escrevia,eu me lembrava. Enquanto eu me lembrava, eu sentianecessidade de escrever. Organizar aquelas palavras queainda queimavam no meu estômago, e misturadas nova-mente com meus sentimentos, era uma dor necessária. Eurealmente queria saber dizer com a mesma acilidade quetinha pra escrever.

– Olha, um recado do Matheus na minha página:

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“Dan, minha linda, escute essa música… Enquantoestive ora, ela era minha maior lembrança sua. ‘The Best

 Years O Our Lives – Evan Taubeneld’” – Carregando…Foi minha trilha sonora daquela e de outras noites.

 A semana passou assim, entre lágrimas, lembrançase sorrisos ao lado do Matheus. Eu realmente queria azeralguma coisa interessante no nal de semana. Queria des-cobrir um novo motivo; ter aquela empolgação guardadana lembrança para poder esquecer de vez e pensar: por que

estou tão entusiasmada mesmo?Meu pai não havia chegado como minha mãe tinhadito – no-vi-da-de. Desde que o meu pai começou a trabalharem um novo projeto maluco, cujo nome eu não sei comose diz, ele nunca mais oi o mesmo. Eu percebia o olhartriste da mamãe, mas eu era egoísta o suciente para mepreocupar apenas com os meus problemas.

– Danieeeeeeeeeeela, teleone pra você!– Não precisa gritar, mãe. – Eu tinha a sensação de

car dez anos mais velha toda vez que ela gritava comigo.– Alô?– Oi, Dan, aqui é o Matheus. Posso te azer um convite?Uma coisa interessante e legal para o nal de semana,

por avor, por avor, por avor!– É o seguinte, todo começo de bimestre rola um

acampamento no sítio em que o meu pai trabalha, é super-divertido, já ui várias vezes. O lugar é lindo e tem vistasincríveis. Vem comigo? Pensa nas otos!

Passar o nal de semana no meio do nada com o meumelhor amigo? Por que não?

– Claro! Eba! Obrigada por me chamar, agora já tenhoum motivo para estar eliz.– Quer dizer que o sítio é um motivo mais empolgante

que eu?

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