departamento de taquigrafia, revisÃo e redaÇÃo · hino nacional pela banda de música do...
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DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA,
REVISÃO E REDAÇÃO
SESSÃO: 058.4.50.ODATA: 05/05/98
TURNO: Matutino
TIPO SESSÃO: Sessão Solene - CD
LOCAL: Câmara dos Deputados
HORA INÍCIO: 10h28minHORA TÉRMINO: 12h30min
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ REDAÇÃO FINALNúmero Sessão: 058.4.50.O Tipo Sessão: Sessão Solene - CDData: 05/05/98 Montagem: Yoko
CÂMARA DOS DEPUTADOS
SESSÃO ORDINÁRIA DE 05/05/98
IV — HOMENAGEM
(Homenagem à memória do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon).
PRESIDENTE (Michel Temer) - Convite ao Ministro do Exército, General ZenildoZoroastro de Lucena, ao Contra-Almirante Roberto da Silva Legey e ao Sr.Angelo Cristiano Rondon para composição da Mesa Diretora. Execução doHino Nacional pela Banda de Música do Batalhão de Polícia do Exército.Homenagem à memória do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon.
Oradores: MURILO DOMINGOS, AROLDE DE OLIVEIRA, ANTONIO FEIJÃO,GILNEY VIANA, RODRIGUES PALMA, ARNALDO FARIA DE SÁ, ALDOREBELO.
PRESIDENTE (Paulo Paim) - Presença no plenário de alunos do Colégio Militar deBrasília. Aviso de realização, no Salão Negro da Câmara dos Deputados, deeventos em homenagem à memória do Marechal Cândido Mariano da SilvaRondon. Agradecimento da Presidência às autoridades presentes á sessão.
V - ENCERRAMENTO
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I - ABERTURA DA SESSÃO
O SR. PRESIDENTE (Michel Temer) - A lista de presença acusa
o comparecimento de ........ Srs. Deputados.
Está aberta a sessão.
Sob a proteção de Deus e em nome do povo brasileiro iniciamos
nossos trabalhos.
O Sr. Secretário procederá à leitura da ata da sessão anterior.
II - LEITURA DA ATA
O SR. ...........................................................................................,
servindo como 2º Secretário, procede à leitura da ata da sessão antecedente, a
qual, sem observações, é aprovada.
O SR. PRESIDENTE (Michel Temer) - Passa-se à leitura do
expediente.
O SR. ............................................................................................
procede à leitura do seguinte
III - EXPEDIENTE
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O SR. PRESIDENTE (Michel Temer) - Finda a leitura do
expediente, passa-se à
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IV - HOMENAGEM
O SR. PRESIDENTE (Michel Temer) - Srs. Parlamentares,
demais autoridades, senhoras e senhores, esta é uma sessão solene dedicada a
homenagear a memória e a figura do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon,
sessão solene esta derivada de um requerimento do nobre Deputado Murilo
Domingos.
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O SR. PRESIDENTE (Michel Temer) - Para compor a Mesa,
tenho a honra de chamar o Exmo. Sr. Ministro do Exército, General Zenildo Lucena.
Quero chamar também o Sr. Contra-Almirante Roberto da Silva Legey,
representando o Sr. Ministro-Chefe do Estado Maior das Forças Armadas. Convido
também, representando a família do Marechal Rondon, o Dr. Angelo Cristiano
Rondon, seu neto, para fazer parte da Mesa.
Composta a Mesa, convido todos para, de pé, ouvirmos a Banda
de Música do Batalhão de Polícia do Exército de Brasília, sob a regência do Ten.
Ronaldo Esron Menon da Cunha , que tocará o Hino Nacional.
(Execução do Hino Nacional)
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O SR. PRESIDENTE (Michel Temer) - A Câmara dos Deputados
tem a honra de promover esta homenagem ao Marechal Cândido Mariano da Silva
Rondon, neste dia 5 de maio, que celebra os 133 anos de seu nascimento.
Passados já quarenta anos de sua morte, o Brasil ainda sente presente o trabalho
que, em prol desta terra, desenvolveu esse excepcional brasileiro que, como
pouquíssimos outros em qualquer tempo, honrou a sua nacionalidade.
Lembrar Rondon, senhoras e senhores, é trazer à memória as
páginas mais épicas e ao mesmo tempo mais sublimes da história brasileira,
momentos que definiram o século XX no Brasil, que teve em Rondon um dos
maiores expoentes de brasilidade, que se traduziu num apelo que sempre devotou
ao serviço empreendido em prol do desenvolvimento, da integração, da unidade
nacional, da paz social.
Imbuído de profundo espírito patriótico, o que incluía
obrigatoriamente a curiosidade por todas as coisas do nosso chão, a Rondon o
Brasil deve a descoberta e a catalogação de boa parte dos seus recursos e
riquezas naturais: em suas expedições, nas quais fazia questão de se acompanhar
de especialistas de diversas áreas científicas, foram descobertos minerais, vegetais
e animais até então desconhecidos dos cientistas; confeccionou mapas das mais
remotas regiões, refez outros, conferiu-os, corrigiu erros.
O Brasil se viu, enfim, pela vontade e obra de Rondon,
expandido dentro de si mesmo. Rondon deu continuidade ao trabalho dos primeiros
bandeirantes que se embrenharam costa adentro nas terras desconhecidas, com a
diferença de que ele adentrava o interior não com o espírito de espoliar a riqueza
autóctone, como os primeiros, mas para conhecê-la e oferecê-la a todo o povo;
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contactava os povos primitivos não com a intenção de escravizá-los, mas com o fim
de protegê-los do contato maléfico com o branco inescrupuloso.
São conhecidas essas suas palavras, que bem traduzem o seu
pensamento e modo de agir com relação aos indígenas brasileiros:
"Temos para com os índios grande dívida contraída desde o
tempo de nossos maiores, que lhes foram invadindo os
territórios, devastando a caça, furtando o mel, para não falar
em males muito maiores, mais graves, vergonhosos e
infames."
Deu continuação à obra de Rio Branco — este, na definição de
nossas fronteiras, Rondon na proteção e no desenvolvimento delas: até os nossos
extremos levou os cabos das comunicações, e seria mais tarde incumbido de
inspecionar as fronteiras brasileiras desde a Guiana Francesa até o Uruguai, ao
longo de mais de dez mil quilômetros; e também a ele seria incumbida uma
espinhosa missão de conciliação bilateral, esta no litígio sobre o Porto de Letícia,
da qual saiu aclamado por seu magnífico trabalho e pelo desfecho pacífico entre os
contendores.
Assim, é simples dever de justiça para esta Casa promover a
lembrança deste brasileiro que elevou sobremaneira o nome do Exército brasileiro,
a quem serviu com vocação desde a juventude até os seus últimos dias, que
sempre pautou sua dilatada vida pelos princípios mais rígidos e sólidos do amor ao
semelhante, que, como outros próceres da nossa história, honrou com o seu
serviço este País.
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É com grande prazer, portanto, que a Câmara dos Deputados
promove esta solenidade, a pedido e por sugestão do Deputado Murilo Domingos, a
quem concederei a palavra após registrar as presenças dos familiares: Sra. Maria
Inês Rondon Amarante, Sra. Mariana Rondon Amarante, Sr. Coronel Antonio Lara
Marialva Meireles Rondon, Sr. Major Benjamin Acioly Rondon do Nascimento, Dra.
Fernanda Cristina Rondon.
Registro também as presenças do Senador Jonas Pinheiro e da
Sra. Maria da Glória Garcia, Prefeita do Município de Santo Antônio do Leverger.
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O SR. PRESIDENTE (Michel Temer) - Concedo a palavra ao
nobre Deputado Murilo Domingos, autor da proposição.
O SR. MURILO DOMINGOS (PTB-MT. Sem revisão do orador.)
- Sr. Presidente Michel Temer, nobres colegas Deputados; Ministro Zenildo de
Lucena, em cujo nome quero cumprimentar toda a família militar; Contra-Almirante
Roberto da Silva Legey, representando o Ministro-Chefe do EMFA; familiares do
Marechal Rondon; Sr. Senador Jonas Pinheiro, que representa a cidade de Santo
Antônio do Leverger, onde nasceu Rondon; Sra. Prefeita de Santo Antônio do
Leverger, Glorinha Garcia; Dr. Cursíndio Monteiro da Silva, Chefe da Consultoria
Jurídica do EMFA; Dra. Alaíde Poquevique, Secretária de Turismo da Chapada dos
Guimarães; nobre Vereadora Cleusa, da localidade de Mimoso, especificamente
onde nasceu Rondon.
Nossos agradecimentos iniciais ao Comando Militar do Planalto,
por intermédio do seu Comandante, General-de-Divisão Carlos Roberto Figueiredo
Uchôa de Moura; ao Colégio Militar de Brasília, por intermédio do seu
Comandante, Coronel de Infantaria Telmo Luiz Moré; ao Centro de Instrução de
Guerra Eletrônica, por intermédio do seu Comandante, Coronel de Comunicações
Sérgio Gomes Novo, e também à Banda de Música do Pelotão de Polícia do
Exército, Batalhão Brasília, regida pelo Tenente Ronaldo Esron Menon da Cunha.
Há pessoas que, incensadas nos compêndios da história por
sua importância e grandeza, levam-nos a crer que nunca existiram como seres
comuns, criaturas portadoras das qualidades e dos defeitos inerentes à condição
humana. Reverenciadas pelo povo, parecem homens que se fizeram lendas,
sobrepostas, em razão da imaterialidade dos mitos, aos ponteiros com que se mede
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o tempo. Assim cultuamos figuras como Tiradentes, Machado de Assis, Duque de
Caxias, Rui Barbosa, Rio Branco, Santos Dumont e outros brasileiros que se
imortalizaram pelo arrojo das idéias e pelo brilho da inteligência. Nesse grupo de
celebridades, inscreve-se, por dever de justiça, o nome glorioso do Marechal
Rondon, o civilizador da última fronteira, a quem a Câmara dos Deputados tem a
honra de prestar, nesta sessão solene, a respeitosa homenagem que lhe
consagram todos os brasileiros.
Exatamente no dia 5 de maio nascia, há 133 anos, o menino
Cândido Mariano da Silva, na localidade de Mimoso, proximidades da Baía de
Chacororé, atual Município de Santo Antonio do Leverger, no Estado de Mato
Grosso.
No final de sua inigualável vida e como reconhecimento de seu
amor à terra natal, o homenageado elaborou o projeto e custeou a construção da
Escola Santa Claudina. A obra foi executada pelo então Engenheiro Garcia Neto e
inaugurada em 13 de junho de 1948. Posteriormente, já como Governador do
Estado do Mato Grosso, o Dr. Garcia Neto procedeu a reformas, ampliando-a, e
implantou a rodovia de acesso à localidade de Mimoso.
Aprendeu as primeiras letras na sua cidade natal, tendo como
mestre um furriel, veterano da Guerra do Paraguai. Posteriormente, levado pelo seu
tio paterno, Manuel Rodrigues da Silva Rondon, foi residir em Cuiabá. Terminou o
primário na Escola Pública João Albuquerque, matriculando-se em seguida no
Liceu Cuiabano, onde concluiu o curso com 16 anos, isto em 1881.
Cônscio da vocação que o impelia à carreira das armas,
muda-se para o Rio de Janeiro, onde, de 1881 a 1890, freqüentou a Escola Militar.
Dizia Rondon:
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"Era a minha vida austera e afanosa. Não perdia um
minuto, consagrando todo o meu tempo, toda a minha
capacidade moral, intelectual e prática ao objetivo único de
vencer com brilho, vencer para regressar a Cuiabá e,
realizando o voto de meu pai, servir à minha terra."
Rondon se orgulhava de possuir em suas veias sangue dos
índios terena e bororo, por parte da avó materna, e dos índios guanás, por parte da
avó paterna.
Em homenagem a seu tio Manuel Rondon, requereu ao Ministro
da Guerra que fosse acrescentado ao seu nome o apelido de Rondon. Com a
Portaria nº 28, de 1890, aquela autoridade deferiu sua petição, e passou a se
chamar Cândido Mariano da Silva Rondon, nome que o acompanhou para o resto
da vida.
Terminou o curso em 1889, ano em que foi destronado Dom
Pedro II com a Proclamação da República. Ao lado de Benjamin Constant, o jovem
Rondon participou ativamente do movimento, pondo em risco o seu posto de oficial
que conquistara com tanto sacrifício.
No ano seguinte, diplomou-se Bacharel em Matemática,
Ciências Físicas e Naturais, pela Escola Superior de Guerra do Brasil.
Quando no posto de capitão, casou-se com D. Francisca Xavier
da Silva, a 1º de fevereiro de 1892, sendo seus filhos: Araci Rondon Amarante,
Benjamim Rondon, Clotilde Rondon Amarante, Marina Rondon Berardinelli, Beatriz
Emília Rondon, Maria Molina Rondon e Branca Luiza Rondon.
Admirador de Benjamim Constant, Rondon fez suas opções pela
República e pela filosofia de Augusto Comte. Acreditava Rondon na criação de uma
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sociedade ideal, tendo "o amor como princípio, a ordem como base e o progresso
como fim".
Com a necessidade do estabelecimento de comunicações entre
as diversas Províncias e o Governo Imperial, este decidiu pela construção de uma
linha telegráfica que ligaria Franca a Uberaba e Goiás a Cuiabá, tendo sido criada
a "Comissão Construtora de Linhas Telegráficas."
O isolamento de Mato Grosso, limitante com a Bolívia e o
Paraguai, impunha urgência a essa ligação, principalmente com a implantação do
regime republicano.
A "Comissão Cuiabá", responsável pelos trabalhos situados à
margem esquerda do Araguaia, por indicação de Floriano Peixoto, foi chefiada pelo
Major Gomes Carneiro, tendo o homenageado como ajudante.
Rondon começou, assim, a impressionante epopéia de que seria
protagonista, tomando a si a fabulosa missão — suicida para muitos — de integrar
o Brasil por meio da implantação de linhas telegráficas ao longo das fronteiras e no
coração da selva amazônica. Do Paraguai às terras que, depois, constituiriam o
Território do Acre.
Lembre-se que, nesse início de século, o extremo Norte era
como se não fizesse parte do Brasil. Eram milhares de quilômetros quadrados onde
muitas vezes não se encontrava um único vivente. Região inacessível, a
colonizá-la não se dispunham as levas de imigrantes que demandavam o sul do
País na esperança de um futuro melhor. Somem-se a esses transtornos a
hostilidade compreensível dos povos da floresta, o legítimo temor dos aborígines, a
justificada beligerância das nações indígenas frente a ameaças de invasores
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brancos resolvidos a explorar, ocupar e quase sempre usurpar terras cuja posse
lhes parecia tão natural quanto a água que bebiam e o ar que respiravam.
Construída a etapa Cuiabá-Araguaia, em 30 de abril de 1891,
partiu-se para a complementação das ligações telefônicas com as ondas da
fronteira com mais de 1 mil e 746 quilômetros quadrados, alcançando Corumbá,
Porto Murtinho, Bela Vista e Cáceres, divisa com a Bolívia, e, ainda, passando por
Coxim, Nioaque, Miranda, Livramento e Poconé.
Rondon, com seu alto sentimento patriótico, registrava em cada
ato e passagem a marca de sua personalidade, empreendendo pesquisas,
investigações, explorações e observações nos campos da geografia, cartografia,
flora, fauna, geologia, orografia, potamografia, com estudos relativos à origem de
cursos d'água, coordenadas geográficas para futuras operações geodésicas,
composição do solo, variedades botânicas, manifestando seu interesse pelo
trabalho de feição científica, valorizando a natureza e a política.
Encaminhou ao Museu Nacional do Rio de Janeiro 23 mil e 107
exemplares de Botânica, Zoologia, Mineralogia, Geologia e Antropologia. Até 1918,
haviam sido incorporadas e devidamente classificadas 1 mil e 200 unidades.
Muitas espécies novas e até famílias, nos domínios da História
Natural, tomaram denominações derivadas do seu nome, como homenagem, por ter
ele possibilitado sua descoberta nos fatos científicos.
Criou-se a Comissão de Linhas Telegráficas e Estratégicas de
Mato Grosso ao Amazonas, a 11 de março, sob a responsabilidade de Rondon. A
missão é concluída a 1º de janeiro de 1915, sendo a extensão da linha-tronco de 1
mil e 947 quilômetros, e mais 763 dos ramais.
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Assim, chegando a lugares onde nunca estivera o ser humano,
estendendo fios pela vastidão dos campos e abrindo passagem nas profundezas da
selva, viveu Rondon uma das maiores e mais formidáveis odisséias da história
contemporânea.
Ao cabo de sua missão, havia desbravado e estudado uma superfície de cerca de
500 mil quilômetros quadrados, equivalente ao território da Espanha;
desempenhado importante papel nos trabalhos de definição das fronteiras
nacionais e concorrido para solucionar, pacificamente, a questão de limites entre o
Peru e a Colômbia.
A criação do Serviço de Proteção ao Índio, em 1910, e do
Parque Nacional do Xingu, em 1952, marcou admiravelmente a sua obra em favor
da população indígena brasileira.
Quando aventureiros atiraram em índios, como caçam bichos,
impôs Rondon aos seus comandados o respeito que se devia aos povos da
floresta, cunhando o admirável lema que o imortalizaria: "Morrer se preciso for.
Matar nunca".
O Congresso de Raças reunido em Londres, em 1913,
homenageou Rondon sob aplausos, pelos princípios e idéias inspiradas por José
Bonifácio, em 1823, estabelecendo a regra que norteou todo o seu trabalho,
apontando a obra de Rondon como exemplo a ser imitado "para a honra da
civilização universal" e recomendando a todas as nações o método de atração de
grupos indígenas eleito por Rondon e adotado pelo Brasil.
O Marechal Rondon foi distinguido como antropólogo, etnólogo,
sociólogo, geólogo, sertanista, indianista. Mais do que tudo, porém, foi ele um
humanista, um civilizador, um intelectual cônscio da prevalência do homem no
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universo de que é parte, sabedor de que não há nada maior nem mais nobre do
que a vida humana.
Daí o valor dispensado aos índios, a atenção com que os distinguiu, a importância
que lhes deu como sujeitos de uma história, como senhores de uma cultura e
mantenedores de uma tradição.
Em dezembro de 1913, inicia a expedição científica com
Theodore Roosevelt, que durou até maio de 1914, e durante a qual colocou o nome
de Roosevelt a um rio desconhecido de 1 mil e 500 quilômetros, o Rio da Dúvida.
A Sociedade Geográfica de Nova Iorque premiou o grande
brasileiro, em 1914, como o desbravador que mais se aprofundara em terras
tropicais. Nesse mesmo ano, o ex-Presidente norte-americano Theodore Roosevelt,
que o tivera por guia na famosa expedição ao sertão do Brasil, dá sobre ele um
importante testemunho:
"O Cel. Rondon não é apenas um oficial e um cavalheiro,
no sentido honrosamente verdadeiro para os melhores oficiais
do Exército, em qualquer bom serviço militar. É também um
explorador, particularmente intrépido e competente, homem
dotado de espírito científico, naturalista de campo, intelectual e
filósofo. Com ele a conversação ia da caçada de onças e dos
perigos da exploração no Mato Grosso, no grande sertão, à
antropologia indígena, aos perigos da civilização puramente
industrial ,materialista e à moral positivista.
O positivismo do coronel era para ele verdadeiramente
uma religião da humanidade, um credo que lhe impunha ser
justo,
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bom e útil para com seus semelhantes, viver sua vida com
coragem e encarar a morte sem se preocupar com crença ou
descrença, nem com que o além-desconhecido possa reservar
para ele.
Concluída a comunicação telegráfica com a Amazônia,
empenha-se no trabalho de elaboração da Carta de Mato Grosso, em 1915, que,
pela fidelidade dos trabalhos daquela época, pouco deferiram das novas cartas
elaboradas com os instrumentos atuais de grande precisão; inclusive o traçado das
pavimentações asfálticas estão próximas aos das linhas telegráficas de Rondon.
General-de-brigada, foi nomeado Diretor de Engenharia do
Exército em 1919.
Em 1924, foi nomeado General-em-Chefe Comandante das
Forças em Operações no Paraná e em Santa Catarina, para neutralizar ações das
tropas revolucionárias que, partindo de São Paulo, pretendiam atingir o Rio e
estender, conflagrando o País do Rio Grande do Sul ao Contestado — missão que
considerava a mais difícil de sua vida.
Em 15 de janeiro de 1927, recebeu a comissão de Inspetor de
Fronteiras, inspecionando as linhas do Oiapoque até Marcelino Ramos, nas divisas
de Santa Catarina com o Rio Grande do Sul, onde chegou a 3 de outubro de 1930.
O percurso compreendeu a inspeção de 17 mil e 316 quilômetros.
Por ocasião da Revolução de 1930, foi feito prisioneiro pelas
forças custodiadas, por ordem do Chefe da Revolução, Getúlio Vargas. Oswaldo
Aranha procurou obter a sua adesão ao movimento, e Rondon negou-se a
atendê-lo já que condenava recorrer às armas para solução de problemas políticos.
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Indicado pelo Presidente da República mediador em problema
de fronteira entre o Peru e a Bolívia, se houve com tanta distinção que foi
condecorado pelos governos dos países litigantes.
Nesta homenagem a Rondon, permito-me, pela riqueza e
autenticidade, registrar conceitos, opiniões e expressões descritas com
competência e brilho pela escritora Esther de Viveiros, que marcam muito bem o
valor e a grandeza desse pequeno grande homem:
Na realidade, os homens quase sempre diminuem quando
deles nos aproximamos, mas outros há que brilham, ao longe,
como estrelas e, ao lhes chegarmos perto, verificamos que
são sóis esplêndidos a iluminar o caminho da evolução da
Espécie.
Ao refletir sobre Rondon, prossegue:
O que o torna grande não é o ter na sola dos pés o maior
caminho jamais percorrido (...), o que o torna incomparável é
sua incomparável obra de paz.
E complementa:
Com afã de apóstolo, passou pelos perigos como
dominador intangível. Pelas dificuldades, como se não
existissem. Pelas ingratidões, como se não as sentisse. Pela
saudade dos que se iam, como se não fosse seu peito escrínio
de delicada sensibilidade... Porque sua vida era como a reta
que o desenhista traça firmemente: olhos fixos no ponto a
atingir.
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Condecorações e homenagens prestadas a Rondon pelo País,
pelas nações estrangeiras, pelas sociedades científicas nacionais e internacionais.
Condecorações nacionais: Gran Cruz da Ordem do Mérito
Militar, no Brasil; Medalha Militar de Prata, Ouro e Platina do Exército brasileiro, por
ter completado respectivamente vinte, trinta e quarenta anos de serviço, sem nota
alguma que o desabonasse; Medalha de Ouro — Mérito da Sociedade de Geografia
do Rio de Janeiro.
Condecorações estrangeiras: Medalha de Prata — Medalha
Crévaux, da Sociedade de Geografia de Paris; Medalha de Bronze — The
Explorer's Club , dos Estados Unidos da América do Norte.; Gran Cruz da Legião
de Honra (Comendador), da França; Comendador da Ordem La Couronne da
Bélgica, pelo Rei Adalberto, com as seguintes palavras: "Pelo bem que o Senhor
tem feito à humanidade"; Membro de Honra da La Societé Suisse Des
Americanistes; Grande Oficial da Ordem El Sol, do Peru; Grande Oficial da Ordem
de Boyacá, da Colômbia; Gran Croce del Ordine al Merito della República , da
Itália.
Homenagens nacionais: Cartão de Ouro — com os dizeres:
"Homenagem dos munícipes de Santo Antônio do Madeira, no ato da inauguração
da linha telegráfica Cuiabá-Madeira, 1º de janeiro de 1915". Medalha oferecida
pelos mato-grossenses, residentes no Rio de Janeiro, para comemorar a travessia,
através do sertão, de Mato Grosso ao Amazonas, em 1919.
O título de Civilizador dos Sertões foi conferido ao General
Rondon pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em 1939, no seu
regresso de Letícia, em sessão solene no Itamaraty, presidida pelo Ministro
Oswaldo Aranha.
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Inscrição no Livro do Mérito, presidida pelo Presidente da
República, Brasil.
Homenagens estrangeiras: Prêmio Livingstone da Sociedade
de Geografia de Nova Iorque, em 1914.
Inscrição com letras de ouro maciço num livro aberto à
curiosidade dos visitantes da Sociedade de Geografia de Nova Iorque: "Rondon, o
explorador que mais se avantajou em terras tropicais."
Diplomas diversos: cerca de trinta diplomas diversos de
Presidente honorário, Membro de Honra, Membro Efetivo, Membro Correspondente
de Sociedades de Geografia, de História e de Instituições Científicas diversas, tanto
brasileiras, da Capital e dos Estados, como estrangeiras.
Diversos atos e leis também consagraram seu nome, a exemplo
de Rondonópolis, Município criado pela Lei nº 666, de 10/12/1953, hoje um dos
importantes pólos de desenvolvimento de Mato Grosso.
Em sessão solene das duas Casas do Congresso, em 1955, foi
votada por unanimidade uma lei, segundo a qual ficou o General Rondon com o
direito às honras de Marechal.
Teve o privilégio de receber em vida a homenagem maior que
se pode prestar a um homem, ao ver o antigo Território de Guaporé chamar-se
Rondônia, através da Lei nº 2.731, de 17 de fevereiro de 1956, como gratidão por
tudo que fizera em prol da grandeza do Brasil e do progresso do mundo.
No trabalho do General Jaguaribe de Mattos, com aprovação
dos membros do 3º Congresso Internacional de História das Ciências, em Portugal,
denominou-a, por ficção geográfica, Meridiano Rondon, caracterizando uma linha
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nítida e ininterrupta desde o mar, na foz do rio Essequibo, na costa da Guiana
Inglesa, à foz do Rio da Prata.
Recebeu manifestações em favor da idéia de ser conferido o
Prêmio Nobel da Paz, em 1957, postulado pelo The Explorer's Club dos Estados
Unidos com apoio de entidades científicas e culturais do mundo inteiro, como
"pioneiro da fraternidade na América do Sul", embora Rondon nunca tivesse movido
iniciativa a honrarias.
No ano seguinte, em 19 de janeiro de 1958, morria, aos 93 anos
de idade, em meio à reverência ao luto de toda a Nação.
As homenagens a Rondon estenderam-se inclusive post
morten , como é o caso do Município de Marechal Cândido Rondon, no Paraná,
criado pela Lei 4.245, de 25 de julho de 1960, e, pelo decreto de 6 de abril de 1963,
passou a ser o Patrono das Comunicações.
Sras. e Srs. Deputados, dignas autoridades presentes, Mato
Grosso se orgulha deste seu filho, e a Câmara dos Deputados e o Brasil como um
todo enaltecem o seu passado de glória, exemplo para o presente e para o futuro.
Aos familiares do Mal. Cândido Mariano da Silva Rondon,
Civilizador da Última Fronteira e Patrono das Comunicações, o meu, o nosso
agradecimento pela honrosa presença neste plenário, aos quais estendo o
conteúdo deste pronunciamento como respeitosa homenagem da Câmara dos
Deputados, devida a um brasileiro que honrou sua Pátria e fez mais digno o tempo
em que viveu.
E no dizer de Demósthenes Martins:
"Rondon, sábio, como o qualificou Teodoro Roosevelt;
santo, como o julgou Paul Claudel; ideal feito homem, como o
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agnominou Roquete Pinto, ou charmeur d'indiens , como o
retratou Charles Badet, é personalidade singular que o
reconhecimento dos brasileiros há de glorificar no altar da
Pátria, como exemplo a ser seguido pelas gerações vindouras,
e que pompeará, luminosa, nos fastos da História como um
dos grandes operários da grandeza do Brasil."
Não poderia terminar a minha alocução sobre esse insigne
mato-grossense sem citar as palavras do Embaixador da Turquia no Brasil, Fuad
Carim:
"Rondon, altura média, testa larga, fisionomia distinta, traços
finos, olhos amendoados, queixo delgado, herói que nasceu
soldado e morrerá soldado, mas herói sui generis que, para
não matar, nem deixar que se matasse um só homem, preferiu
arrostar cem vezes a própria morte..."
Ao encerrar, Sr. Presidente, quero agradecer a todos a
presença, especialmente aos familiares do Marechal Rondon, bem como ao
Exército brasileiro, pela colaboração prestada, por intermédio do Ministro Zenildo
Lucena, para que esta sessão solene ficasse marcada com o brilho que estamos
sentindo aqui. Agradecemos também ao Grupo Folclórico Municipal de Santo
Antônio de Leverger, pela participação, com uma exposição sobre as lembranças
de Rondon.
Muito obrigado. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Michel Temer) - Antes de conceder a
palavra ao próximo orador, esta Presidência quer registrar a presença ilustre do
General-de-Divisão Carlos Alberto Figueiredo Uchôa de Moura, Comandante do
Comando Militar do Planalto; do Sr. Coronel de Infantaria Telmo Luiz Moré,
Comandante do Colégio Militar de Brasília; do Sr. Coronel de Comunicações Sérgio
Gomes Novo, Comandante do Centro de Instrução de Guerra Eletrônica.
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O SR. PRESIDENTE (Michel Temer) - Neste momento, para
falar pelo PFL, concedo a palavra ao nobre Deputado Arolde de Oliveira, ao mesmo
tempo em que transfiro a Presidência ao Deputado Paulo Paim.
O SR. AROLDE DE OLIVEIRA (PFL-RJ. Sem revisão do
orador.) - Sr. Presidente, Exmo. Sr. Ministro do Exército, General Zenildo Lucena;
Exmo. Sr. Contra-Almirante, Roberto da Silva Legey, representando o seu
Ministro-Chefe do EMFA, Dr. Angelo Cristiano Rondon Amarante, que compõe a
Mesa, representando os familiares do Mal. Rondon — aqui já citados pelo
Presidente; Senador Jonas Pinheiro, que participa também desta sessão solene,
como bom mato-grossense; Sra. Maria da Glória Ribeiro Garcia, Prefeita de Santo
Antônio do Leverger; meus prezados colegas Deputados Federais; Srs.
Oficiais-Generais, Oficiais Superiores, Oficiais do Exército e das outras Forças
Armadas; alunos e alunas do Colégio Militar; demais autoridades presentes; Srs.
Comandantes Militares aqui citados, é com muita alegria que quero registrar a feliz
inspiração do Deputado Murilo Domingos ao solicitar, por requerimento, a
realização desta sessão solene em memória do Marechal Rondon.
Muito honrado e com extrema alegria, quero agradecer ao Líder
do Partido da Frente Liberal, Deputado Inocêncio Oliveira, por me haver designado
para representá-lo e ao nosso partido nesta oportuna e meritória homenagem à
memória do ilustre brasileiro Cândido Mariano da Silva Rondon. Honrado, porque
posso me associar a tão ilustres líderes militares e civis para falar de Rondon. E
falar de Rondon é falar da própria história do Brasil na fase de consolidação da
República. É falar do espírito patriótico e pioneiro das Forças Armadas, em
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particular, do Exército Brasileiro. É falar da história da integração de um
país-continente de condições geopolíticas tão favoráveis.
Estou feliz porque a vida de Rondon tem marcado de forma
indelével minha própria carreira profissional. É o patrono da minha turma de
Aspirantes da Arma de Engenharia e Comunicações do Exército da Academia
Militar das Agulhas Negras, de 1959. Está aqui também o General Muniz, meu
colega de turma e também meu amigo e companheiro desde o fim da nossa
adolescência e o início da nossa mocidade. Portanto, Rondon é o patrono da Arma
de Comunicações do Exército.
Comemora-se hoje — Rondon nasceu a 5 de maio de 1865 — o
Dia Nacional das Telecomunicações, setor a que me dediquei profissionalmente.
Para mim, a figura, o pensamento e a obra de Rondon constituem-se em referência
permanente. Por isso estou feliz.
Rondon foi diplomado Oficial do Exército na Escola Militar da
Praia Vermelha em 1889, dando início a uma brilhante carreira militar, ao longo da
qual, até o posto de General-de-Divisão, quando retirou-se da ativa em 1930,
cumpriu missões que o projetaram entre os contemporâneos e as gerações futuras
como verdadeiro paradigma.
Primeiro como professor, estimulado por Benjamin Constant, de
quem adotou também a doutrina positivista que o acompanhou pelo resto da vida.
Em seguida, Gomes Carneiro, então chefe da Comissão de Construção de Linhas
Telegráficas, convenceu-o a largar o ensino e os estudos — era Bacharel em
Ciências Físicas, Naturais e Matemáticas — e ir para o sertão dedicar-se ao
trabalho de construção e manutenção de estações de linhas telegráficas entre
Cuiabá e o norte do País, bem como Paraguai e Bolívia. Conhecia bem a vida e a
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natureza dessa região do País, pois era nascido em Mimoso, próximo a Cuiabá, no
Estado de Mato Grosso.
Foi nessa época que começou a notabilizar-se como sertanista,
estudando apaixonadamente o comportamento e a cultura indígena, o que lhe valeu
exercer o cargo de Diretor do Serviço de Proteção ao Índio, e, em outra
oportunidade, mais tarde, o de Presidente do Conselho Nacional de Proteção aos
Índios.
Ainda nessa época, em 1912, acompanhou o ex-Presidente dos
Estados Unidos, Theodore Roosevelt, em expedição de cinco meses pelo
Centro-Oeste e pela Amazônia. No silêncio dos acampamentos, nas jornadas pela
selva, nas travessias de rios e igarapés e no contato com a flora, com a fauna e
com as populações indígenas, Roosevelt desfrutou da intimidade do pensamento,
do caráter e da paixão daquele quase caboclo mato-grossense, e pôde aquilatar a
grandiosidade da obra sertanista que Rondon realizava. Quando retornou à
América, fez uma síntese de sua experiência com Rondon nos seguintes termos:
"A América pode apresentar ao mundo duas realizações
ciclópicas: ao Norte, o Canal do Panamá; ao Sul, o trabalho de
Rondon — científico, prático, humanista."
Queria dizer com isso que o Canal do Panamá, ao interligar dois
oceanos, integrava o comércio entre os povos do leste e do oeste, enquanto que o
trabalho de Rondon interligava, pelas telecomunicações da época, o telégrafo, o
litoral brasileiro às suas fronteiras longínquas e integrava as nações indígenas à
Nação brasileira.
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Talvez poucos saibam, mas o Presidente Roosevelt ficou tão
impressionado com Rondon e seu trabalho que escreveu um livro de várias
centenas de páginas, relatando sua magnífica viagem ao interior do Brasil, onde
Rondon aparece como principal referência.
Promovido a General em 1919, Rondon foi nomeado Diretor de
Engenharia do Ministério da Guerra, na gestão de Pandiá Calógeras, muito
lembrado porque era civil e porque construiu dezenas de quartéis modernos e
avançados para a época. Não devemos esquecer a contribuição inevitável do seu
Diretor de Engenharia, o General Rondon.
Mesmo afastado da vida militar, foi convocado pelo Governo em
diversas oportunidades para contribuir com a sua densa experiência de verdadeiro
bandeirante nas questões de fronteiras, inclusive como árbitro para dirimir conflitos
de demarcação entre a Colômbia e o Peru.
Faleceu aos 92 anos de idade no Rio de Janeiro, em 1958, dois
anos antes da inauguração de Brasília, plataforma definitiva no avanço das
fronteiras econômicas ao oeste do Brasil e até a Amazônia, que ele tanto conheceu
e tanto amou.
O pensamento e a obra de Rondon se confundem com a própria
doutrina militar. Com certeza, sua contribuição foi inestimável, diretamente e
através dos chefes militares que o sucederam, na decantação e consolidação do
comportamento do Exército em face a questões nacionais. O pioneirismo, o
patriotismo, o integracionismo, o pacifismo, a honradez, a disciplina e o
compromisso social, que são características dos nossos líderes militares,
transbordam para a própria instituição do Exército, dando-lhe perenidade,
abrangência e credibilidade diante da Nação, e contam, sem dúvida, na origem,
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com a contribuição do exemplo e da obra do Marechal Rondon. O posto de
Marechal foi-lhe concedido em 5 de maio de 1955, em sessão solene do Congresso
Nacional, como reconhecimento pátrio pelos relevantes serviços prestados ao
Exército Brasileiro.
No tempo presente, Rondon viveria de forma muito mais
profunda a nossa contradição.Ocupar economicamente a Amazônia e vê-la
sucumbir à destruição das queimadas, da poluição dos seus rios, da extinção das
suas espécies, do extermínio das nações indígenas, ou não explorar as riquezas
em detrimento da própria nação brasileira e vê-la objeto da cobiça e ganância
estrangeiras. Não, não creio. Rondon não viveria esta contradição. Ele, como
cientista, como ambientalista e com pragmatismo, realizaria o sonho de uma
ocupação ordenada, justa e racional da região amazônica.
Mas Rondon não está entre nós. Permanece a sua memória e o
testemunho de sua vida como fonte de inspiração para ultrapassarmos esse dilema
e essa contradição de nosso tempo, condição sine qua non para garantirmos uma
adequada qualidade de vida às gerações do terceiro milênio.
Nossas homenagens ao falarmos de Rondon alcançam também
o Exército brasileiro, que abrigou em seus quadros, como privilegiado, o ilustre
cidadão Cândido Mariano da Silva Rondon.
Muito obrigado, Sr. Presidente, muito obrigado senhoras e
senhores. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Esta Presidência registra,
com enorme satisfação, a presença entre nós do Sr. General-de-Brigada Ary Silvio
Tomaz Nunes, do Sr. General-de-Brigada José Batista de Queiroz, do Sr.
General-de-Brigada Manoel Indiano da Fonseca e do Sr. General-de-Brigada Mário
de Oliveira Seixas.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Passo a palavra ao
Deputado Federal Antonio Feijão. S.Exa. falará pela bancada do PSDB.
O SR. ANTÔNIO FEIJÃO (PSDB-AP. Sem revisão do orador.) -
Sr. Presidente; Dr. Angelo Rondon, através de quem cumprimento todos os
descendentes do Marechal Rondon; General Zenildo Lucena, através de quem
cumprimento as Forças Armadas, especialmente o Exército brasileiro; demais
membros da Mesa; Parlamentares do Estado do Mato Grosso, dos quais destaco o
Senador Jonas Pinheiro; Deputados Federais Gilney Viana, Rodrigues Palmas,
Murilo Domingos, senhoras e senhores, demais autoridades aqui presentes,
normalmente, quando homenageamos alguém nesta Casa, há uma repetição do
gregoriano bibliográfico da autoridade a ser homenageada, e sendo um pouco
caboclo, talvez até imitando de certa forma o ímpeto que fez essa grande figura
nacional e internacional do Marechal Rondon, vou também romper o lógico e
destacar, com toda a vênia ao meu partido, o PSDB, aos redatores do brilhante
discurso, a minha vontade de falar do fundo do meu coração, como brasileiro, como
nacionalista que mora no Amapá e que sentiu a floresta, como geólogo e como
caboclo das matas da Amazônia.
Gostaria de dizer isso especialmente porque vejo aqui políticos,
brasileiros de várias esferas, militares jovens e militares que atingiram o generalato.
Quero dizer que o melhor discurso com que se poderia honrar hoje Rondon, para
que pudéssemos homenageá-lo, seria falar um pouco dos seus ideais com relação
às sociedades que ele descobriu na Amazônia, aos brasis que ele garimpou.
Rondon foi um homem que achou vários brasis. Humboldt, com
todo o seu saber, transbordou do Século XVIII para o Século XIX na Amazônia sem
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trazer grandes coisas para o Brasil. Visitou Casiquiari e achou grandes espécies,
tornando-se famoso. Rondon fez muito mais, mas com a vontade de construir um
Brasil único, galopando pelo desconhecido, tornou-se mais do que antropólogo, do
que sociólogo, do que geólogo, do que geógrafo. Sua obra era tão infinita que ele
não parava para cumprimentar o sucesso.
Foi ouvindo o discurso brilhante e completo do Deputado Murilo
Domingos que me deu vontade de falar sobre a questão indígena, tão buscada na
sua essência, não como povos desconhecidos, mas como brasileiros que querem
ser apresentados ao Brasil. Rondon via nas sociedades indígenas o Brasil e os
brasileiros que o próprio Brasil e nós, ditos civilizados, desconhecíamos.
Hoje, dia de meditação, é necessário entendermos que as
sociedades indígenas que ele tanto buscou integrar ao Brasil não se devem estar
fragmentando numa planilha curta, de visão fundiária, achando que o chão é a
maior dádiva que se pode dar ao homem. É a cultura, é esta que protege. Nem um
universo de florestas poderá proteger uma cultura que não suporte uma economia
que caminha em seu confronto. Rondon caminhava nos seus passos. Vi ontem a
descoberta de jazidas de diamantes a milhões de anos-luz, mas eram os seus
passos, as suas enfermidades que faziam com que ele tivesse tempo para decantar
o Brasil que ele descobria.
Hoje, peço a toda a classe militar, aos seus comandantes e aos
Parlamentares desta Casa que não deixem que instituições e canetas façam uma
política indigenista de papel, a qual, em vez de fazer o que Rondon fazia,
aglomerar os brasis para uma nação, separa o Brasil em pedaços, em enclaves de
nações.
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Não nos vamos deixar iludir pela construção de enclaves, achando que o espaço é
maior do que a sociedade. O Brasil precisa abraçar as suas fronteiras com o seu
povo. Se não podemos mais vivificar as fronteiras com o povo que aglomera a
maior parte de nossa cultura, vamos integrar as culturas que estão na fronteira ao
Brasil que somos.
Esta deve ser uma nova visão para debate. Vamos transformar
aqueles povos naquilo que sempre foram: os primeiros brasileiros. Nós somos os
segundos, os terceiros, as gerações que sucederam aos invasores, que, por força
da fé e da lei, viraram conquistadores. Mas nós somos o Brasil, e eles estão quase
em uma intersecção ou em uma sobreposição ao mesmo espaço nosso.
O que falta para sermos um só? Interagir as culturas sob o
Pavilhão e sob o Hino Nacional. Falta mais nacionalismo nas ações. Não podemos
deixar que uma hipocrisia escravizada pela força dos países ricos possa ditar uma
nomenclatura federativa nova ao nosso território, que decanta cinco séculos de
luta, desde as primeiras visões de Pinzón, na foz do Oiapoque, até o sangue
dolorido de todos os bandeirantes que deformaram Tordesilhas e transformaram
esta fronteira que não podemos mais entregar, porque não fomos nós que a
conquistamos; foram os nosso antepassados.
Esta é a obra de Rondon: conquistar o espaço colocando sobre
ele o maior afloramento que Deus dá à natureza, que é o valor do homem, seja ele,
como dizia, indígena, seja ele caboclo, como Rondon foi, seja ele mulato, negro ou
mesmo português. Isso é o que está muito bem dito nesse discurso chamado "O
Humanismo Rondoniano".
Para mim, seria uma frase só. Poderíamos formar antropólogos
só na seita de Rondon. Poderíamos formar uma geopolítica militar só no conceito
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de Rondon. Ele foi maior do que qualquer academicismo ou do que todas as
declarações de Humboldt , depois que viu que duas grandes bacias se uniam na
Amazônia.
Então, agora, a obra dele deverá ser feita por nós. Vamos fazer,
com a tecnologia que descobre diamantes no espaço, o que Rondon fez com os
pés, com os amigos, com os caboclos, com os indígenas, mas, principalmente, com
o coração de brasilidade, que é integrar o Brasil ao povo brasileiro.
Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Com satisfação,
registramos as presenças do General-de-Brigada Luiz Carlos Minussi e dos
Generais-de-Divisão Adalberto Imbrósio, Carlos Roberto Uchôa de Moura,
Dilermando Carlos Soares Adler, Francisco Roberto de Albuquerque, Gilberto
Rodrigues Pimentel e Luiz Seldon da Silva Muniz.
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O SR PRESIDENTE (Paulo Paim) - Concedo a palavra ao
Deputado Gilney Viana, pelo PT.
O SR. GILNEY VIANA (PT-MT. Sem revisão do orador.) - Sr.
Presidente, Sr. Ministro do Exército, General Zenildo Zoroastro Lucena, Sr.
Contra-Almirante, Roberto da Silva, representante do Ministro-Chefe do EMFA, e
Dr. Angelo Cristiano Rondon, neto do Marechal Rondon, em nome do qual saúdo
todos os seus descendentes, sinto-me honrado em representar o Partido dos
Trabalhadores nesta sessão solene que presta homenagem a um dos filhos mais
dignos desta terra, o brasileiro e sertanista Cândido Mariano da Silva Rondon.
Rondon é filho de Mimoso, antiga Sesmaria do Morro Redondo,
pertinho da curva do rio, onde nasceu o Senador Jonas Pinheiro. Nas suas
memórias, Rondon lembrava-se daquela terra natal assim:
"Ali ninguém é proprietário; não há cercas demarcando
as terras familiares; ali se cultiva em comum a terra e não há
disputa."
Por isso, quando ele, após a Proclamação da República, na
sua maturidade, percebeu que as leis cambiavam, fez questão de estabelecer o
registro em nome de sua avó e de sua descendência.
Reproduzo, de certa forma, o mesmo procedimento do Deputado
Antônio Feijão, do Amapá, porque não me sinto afetivamente à vontade em
discursar lendo.
Seria repetitivo falar do papel histórico desempenhado por
Rondon — até porque outros oradores já o fizeram — no desbravamento do sertão;
do seu papel de indigenista, de sertanista, de contactador com os povos indígenas
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e de iniciador de pesquisas sobre a fauna e a flora, não apenas da floresta mas
também do Pantanal Mato-grossense, e do seu papel no estabelecimento das
comunicações. Por isso ele é o patrono das comunicações em geral no Brasil.
Vou cingir-me a algumas declarações de Rondon e à percepção
que tenho delas hoje. Quando vou a Santo Antônio do Leverger ou a Barão de
Melgaço — naquela época não existiam esses Municípios —, percebo que há
muita coisa ainda da época de Rondon naquela região. É incrível, mas ainda
existem sesmarias no Pantanal Mato-grossense e na Baixada Cuiabana. Ainda há
terras comunais, divisas.
Em função desse anacronismo histórico, aquele povo conserva
seu padrão cultural pantaneiro. Certamente, a Prefeita de Santo Antônio do
Leverger irá brindar-nos com uma dessas manifestações folclóricas de cururu e
siriri, que nos dará um pouquinho da sensação do que é ser pantaneiro, do que foi
Rondon.
Particularmente, quando ando no Chapadão dos Parecis, passo
pela Estação Rondon. Lá existe um poste fincado, às vezes sobre um cerrado já
desnudo, mas ali está um símbolo do papel histórico de Rondon. É um poste já sem
fio, mesmo porque as comunicações modernas prescindem disso. Mas todos que
por ali passam fazem questão de indicar, particularmente para o estrangeiro e o
brasileiro de outros terras, que por ali passou Rondon.
Conheço também o Rio Roosevelt, o Guariba e o Aripuanã. Já
andei por aquelas terras onde andaram o ex-Presidente Theodore Roosevelt e o
Marechal Rondon. Por incrível que pareça, há pouca diferença daqueles idos de
1913, quando por ali perambularam.
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Só para se ter uma noção, há cerca de dez ou quinze anos, as
crianças, filhas dos seringueiros do beiradão dos Rios Aripuanã, Guariba e
Roosevelt, não tinham apenas registros civis, porque ainda há muitos brasileiros
que não os têm, mas nenhuma denominação familiar.
Lembro-me até de um secretário da Prefeitura de Aripuanã.
Quando as terras comunais, também dos seringueiros, foram negociadas e
apropriadas por fazendeiros, que foram expulsando os seringueiros com seus
filhos, fez-se um colégio de seringueiros no beiradão do Rio Aripuanã. Esse
secretário literalmente denominou as crianças dos seringueiros. Foi engraçado,
porque deu a elas nomes de cantores populares daquela época. Conto essa
passagem da época de Rondon para mostrar que muita coisa não cambiou, apesar
das violentas e importantes mudanças havidas no País.
Conhecendo os povos indígenas do Brasil e convivendo com
eles, particularmente com os de Mato Grosso, entre eles os parecis e os bororo,
constato que ainda existe a memória de Rondon. E é uma memória positiva, se
considerarmos as novas e muito agressivas ondas de colonização dos povos
indígenas, pois não respeitavam as suas vidas, muito menos os seus padrões
culturais. E o Marechal Rondon, não obstante ter um espírito desbravador, era
profundamente humanista. E é isso que o distingue dos desbravadores modernos
da Amazônia, é isso que faz com que ele supere os conceitos da época e se torne
moderno, antropologicamente.
Permito-me citar um conceito que considero relevante, tirado do
livro da Sra. Ester Viveiros, intitulado "Rondon conta sua vida", que precisamos
reeditar, porque é hoje uma obra rara. Que eu saiba, é a única publicação que traz
um depoimento vivo do Marechal Rondon.
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Diz ele:
"Desde muito cedo me empolgou o problema do brasilíndio.
Expulso da terra, de que era legítimo dono, pelo invasor que
viera, com mostras de paz, trazer sangue, ruínas, destruição, é
ele o mais digno de benemerência. Trata-se do resgate da
mais sagrada dívida de honra, da reparação das mais
dolorosas culpas e erros sociais dos nossos antepassados"
E eu diria aos familiares do Marechal Rondon: também dos
erros da atual geração.
Mas Rondon não era generoso apenas com aqueles que eram
diferentes dele próprio e de nós, da nossa sociedade nacional. Era generoso com
seus companheiros de Exército e com os civis que participavam das expedições,
com as mulheres que os acompanhavam. Naquela época a expedição era formada
por uma verdadeira coluna.
Já no fim de sua vida, em seu depoimento ele assim se refere,
quando retorna mentalmente ao Pantanal, a Mimoso, a Santo Antônio do Leverger,
a Barão do Melgaço: ,
"Diante dos meus olhos, já quase sem vista, levantava-se a
estação de Melgaço; e além, lá no alto, como que procurando
aproximar-se do céu, o pequeno cemitério, com singelas
cruzes de madeira e canteiros, onde ninguém depunha flores,
mas onde havia também nomes de mulheres, heroínas
anônimas a acompanhar os maridos nas longas marchas,
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ajudando-os a carregar as bagagens, com eles sofrendo a
inclemência do sol e da chuva, vivendo aquela vida dura que
procuravam amenizar, encontrando, em sua dedicação, forças
para, ainda assim, encher o sertão de risos e canções — o
sertão onde muitos ficariam a dormir para sempre".
Sr. Presidente, para terminar esta singela mensagem, digo aos
vários descendentes de Rondon — descendentes por consangüinidade,
descendentes por missão, como os oficiais, membros das Forças Armadas,
particularmente do Exército brasileiro — que na tumba do Marechal Rondon não se
apagará o fogo da pira da nacionalidade. No cemitério onde está a sua tumba não
faltarão flores oferecidas por esta e pelas futuras gerações de brasileiros que
honrarão a sua memória. (Palmas).
Era o que tinha a dizer.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Registramos ainda entre
nós, com satisfação, a presença do Sr. Sulivan Silvestre de Oliveira, Presidente da
FUNAI.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Passamos a palavra ao
nobre Deputado Rodrigues Palma, que falará pelo PTB.
O SR. RODRIGUES PALMA (PTB-MT. Sem revisão do orador.)
- Sr. Presidente, Deputado Paulo Paim, Sr. Ministro do Exército, quero
cumprimentar o companheiro e amigo Deputado Murilo Domingos pela feliz
iniciativa da realização desta homenagem. Quero dizer também que me dou por
satisfeito com o seu pronunciamento e com o de todos os que falaram sobre a vida
de Rondon, sobre o militar Rondon, sobre o pacificador Rondon, sobre o
conquistador Rondon. Dou-me por satisfeito com os brilhantes discursos feitos
neste plenário, mas quero ainda, em poucas palavras, relatar algo sobre o homem
Rondon, sobre o mato-grossense, o mimosiano Rondon.
Tive e ainda tenho a grata satisfação de conviver com pessoas
que lhe dedicaram extrema amizade, que conviveram intimamente com Rondon,
como é o caso do ex-Governador José Garcia Neto, amigo pessoal do Marechal
Rondon e meu sogro, com quem convivo, e de quem ouço falar sobre Rondon. Com
que gosto, com que orgulho o cidadão Garcia Neto fala do homem Rondon, do pai,
do filho, que, ao receber um recurso recebido do exterior, em função de
homenagem prestada ao Marechal, aplica esse dinheiro na construção de uma
escola em Mimoso, a escola Santa Claudina, que foi construída pelo Engenheiro
José Garcia Neto na Baía de Chacororé, a baía-mar, a baía que todos nós
aprendemos a gostar e admirar. E Garcia Neto conta que, para construir a escola,
por várias vezes dirigiu-se a Mimoso, ao lado de operários e de companheiros,
atravessando a baía em canoa, levando todos os materiais — areia, pedra, tijolos
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—. Rondon fez questão de construir essa escola para que os mimosianos, assim
como ele, pudessem adquirir educação, conhecimento e saber.
Esse era Rondon, o homem de quem muito tenho ouvido falar.
Tive, inclusive, a oportunidade de ler cartas que escreveu ao amigo José Garcia
Neto e a várias outras pessoas que com ele conviveram.
Estou satisfeito, Deputado Murilo Domingos, com os discursos
aqui proferidos sobre a vida de Rondon, o pacificador, o homem, a pessoa e o
conquistador que, como bem disse o Deputado Gilney Viana, soube conquistar e,
sobretudo, ser conquistado pelos índios e por aqueles que viviam na selva.
O homem Rondon transmitiu para todos nós, mato-grossenses,
cuiabanos, nós que vivemos na Baixada Cuiabana, em Santo Antônio de Leverger,
em Barão de Melgaço, no Mimoso, dentro do coração da brasilidade, do espírito do
brasileiro, o compromisso não de conquista, mas de levar fraternidade,
conhecimento e, sobretudo, apoio àqueles que viviam completamente isolados do
resto do mundo.
Graças à ação de Rondon podemos hoje percorrer todo o
Estado de Mato Grosso com grande tranqüilidade, comunicando-nos com o mundo
via satélite. Rondon fez o primeiro elo, o primeiro contato, a primeira conquista,
levando o seu coração, a sua presença, o seu amor ao Brasil e, sobretudo, sua
disposição de fazer com que as pessoas pudessem se entrelaçar. Não era o
conquistador que chegava para ocupar, mas para ser conquistado por aqueles que
vivem na terra.
Portanto, meus amigos, é com imenso prazer, com verdadeira
alegria, que presto à memória do Marechal Rondon minha homenagem. Esta é a
homenagem daquele que conheceu sua vida e que, por intermédio de pessoas que
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com ele conviveram, aprendeu a admirá-lo, não pelas glórias recebidas pelo
trabalho exercido na condição de militar ou de conquistador, mas pelo trabalho
realizado como homem, como pessoa que soube transmitir amor e fraternidade a
todas as pessoas que vivem em Mato Grosso. (Palmas.)
Era o que tinha a dizer.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Com a palavra o nobre
Deputado Arnaldo Faria de Sá, que falará pelo PPB.
O SR. ARNALDO FARIA DE SÁ (PPB-SP.Sem revisão do
orador.) - Sr. Presidente, Deputado Paulo Paim; demais Parlamentares presentes;
Sr. Ministro de Exército, General Zenildo Zoroastro de Lucena, na figura de quem
cumprimento todos os Generais e Praças do Exército brasileiro aqui presentes; Dr.
Angelo Cristiano Rondon, neto do Marechal Rondon; Senador Jonas Pinheiro, que
prestigia esta sessão da Câmara dos Deputados; Sra. Prefeita do Município de
Santo Antônio de Leverger, Sra. Maria da Glória Garcia, é com alegria contida que
assomamos a esta tribuna não apenas para cumprimentar Rondon, mas, acima de
tudo, para lembrar a importância do Exército brasileiro.
Quando se fala de Rondon, é lembrado o pacifista. E esta tem
sido a tônica de ação do Exército Brasileiro.
Exmo. Sr. Ministro Zenildo Zoroastro de Lucena, nos dias de
hoje, preocupa-me a grande oferta de espaço às chamadas "reservas", entre aspas,
quando, na verdade, quem fazia reserva, mas para o povo brasileiro, era o
Marechal Rondon. As reservas que buscava, desbravando lugares nunca antes
explorados, eram para todo o povo brasileiro.
Comentava eu com alguns companheiros desta Casa que são
feitas reservas de milhares e milhares de quilômetros para pequenos grupos de
pessoas, que não sabem utilizá-las. Entretanto, algumas organizações
não-governamentais, cujas sedes são no exterior, acabarão contrastando com o
trabalho realizado por Rondon. É por esse motivo que, nesta homenagem ao
Marechal Rondon, queremos enaltecer o trabalho do Exército brasileiro.
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No atual momento vivenciado na política legislativa, procura-se
atingir as chamadas forças auxiliares, as Polícias Militares. E esse é apenas o
começo de uma caminhada adredemente preparada: atingir-se-á as forças
auxiliares para, depois, atingir as Forças Armadas.
E é por isso, General Zenildo de Lucena, que temos de estar
atentos. Muitos de nós temos de seguir o exemplo de Rondon nos dias de hoje,
para preservarmos o território nacional, salvaguardando a importância das nossas
Forças Armadas e particularmente do nosso Exército. Sabemos que a Força com
maior identificação popular é o Exército, a Força terrestre. O Exército é, pois, de
entendimento simples para toda a comunidade.
Nos dias de hoje há necessidade de sermos um pouco Rondon
e resgatarmos o grande valor do Exército brasileiro, que alguns tentam manchar,
diminuir, atingir. Esquecem-se alguns, quando se fala em anistia, de que o perdão é
para todos, de que não se anistia apenas para um lado. A anistia é para todos,
General.
Acompanhamos recentemente a tempestade em copo d'água
que se fez em relação ao caso do General Fayad. De repente, para administrar o
contexto político, o Governo acabou cedendo. Na verdade, quando se fala em outro
contexto, quando se está do outro lado, tudo é mais fácil. A anistia, no contexto
amplo, no contexto genérico, é o esquecimento, mas só se esquecem do que lhes
interessa.
Entendo que há necessidade de revalorização das nossas
Forças Armadas, do nosso Exército, e, neste momento, a imagem do Marechal
Rondon pode nos ajudar a sermos, todos nós, os desbravadores de um novo
tempo, de um novo momento. E quando se quer fazer alguma mudança ou reforma
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na Constituição tenta-se de todas as formas atingir o valor e a importância das
nossas Forças Armadas.
É importante que todos nós, neste momento, possamos
efetivamente saudar o Marechal Rondon e, mais do que isso, agirmos com ele,
desbravando e buscando os espaços que são extremamente importantes.
A todo momento o Exército é lembrado. Exemplo atual é o fato
de, nessa seca que vive hoje o Nordeste brasileiro, o Exército estar sendo chamado
para prestar seus serviços. Nas horas de crise, de dificuldades, lembram-se do
Exército, das Forças Armadas. Na verdade, as Forças Armadas têm tido importante
papel não apenas no passado, como tanto nos lembramos nesta homenagem a
Rondon, mas também nos dias de hoje e, com certeza, para todo o futuro desta
Pátria. É interessante valorizar e resgatar a importância das nossas Forças
Armadas, particularmente do Exército brasileiro.
Tenho certeza de que esta homenagem é muito pequena perto
da grandiosidade do que foi Rondon e do que é hoje o Exército brasileiro.
É por isso que assomo a esta tribuna no dia de hoje para
cumprimentar todos os militares brasileiros, não apenas os que estão presentes a
esta sessão solene, mas todos aqueles que compõem as nossas Forças Armadas,
o nosso Exército brasileiro. Estamos aqui prestando uma homenagem não apenas
ao Marechal Rondon, não apenas aos oficiais generais das três Armas, mas
também aos praças das nossas Forças Armadas, porque eles, na verdade, formam
a base da pirâmide do grande contingente que a sociedade brasileira espera — e
espera muito! —, para podermos superar muitas dificuldades.
Digo isso não apenas em relação à segurança nacional em
sentido estrito, mas à segurança nacional no seu sentido mais amplo.
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Que possamos representar, na verdade, para a sociedade do
futuro, a importância que Rondon teve no passado e aquilo que queremos
amalgamar no presente para, efetivamente, termos o futuro que queremos, mas não
com as atitudes de alguns que tentam — e os próprios assessores parlamentares
das Forças que estão aqui presentes sabem —achincalhar, menosprezar, atingir o
Exército brasileiro, que tem sofrido, em algumas ocasiões, lamentavelmente, por
omissão do Executivo e por pressão do Legislativo.
Tenho certeza de que, lembrando Marechal Rondon, com a luta
obstinada e determinada não apenas de V.Exa., General Zenildo de Lucena,
Comandante do Exército brasileiro, mas de todos os oficiais generais e praças aqui
presentes, saberemos, hoje, amanhã e sempre fazer novamente aquilo que fez o
Marechal Rondon.
Temos uma "Operação Rondon" em andamento. Ela não
necessita apenas da luta, do apoio, da ajuda de todos vocês que no dia de hoje
representam o Exército brasileiro, as Forças Armadas e o Brasil, mas de todos nós,
tendo sempre Rondon como exemplo, Rondon como prática, Rondon como meta do
futuro. Parabéns a todos. Parabéns a Rondon. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Passamos a palavra, neste
momento, ao nobre Deputado Aldo Rebelo. S.Exa. falará pelo PCdoB.
O SR. ALDO REBELO (PCdoB-SP. Sem revisão do orador.) -
Sr. Presidente, Deputado Paulo Paim, Exmo. Sr. Ministro do Exército, General
Zenildo Zoroastro de Lucena, senhores representantes aqui presentes dos
Ministérios, estimados familiares do Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon,
cumprimento o Deputado Murilo Domingos, do Mato Grosso, pela generosa
iniciativa de prestar esta homenagem e fazer com que a Câmara dos Deputados
também a preste.
O Marechal Rondon, ao longo de sua vida e mesmo depois,
recebeu homenagens no Brasil e em todo o mundo. Foi condecorado por governos,
foi reconhecido pela sua atividade em prol da causa indígena, da unidade do nosso
território, da pacificação do nosso País, da harmonia dos brasileiros com seus
irmãos da América Latina. Chefiou missões diplomáticas difíceis. Mediou conflitos
de fronteiras entre países latino-americanos, sendo, em todas essas missões,
laureado pela sua persistência, pela sua inteligência e pela sua capacidade de
servir.
Teve Rondon a felicidade de nascer quando se formava na
sociedade brasileira o sentimento democrático e a aspiração republicana. Nasceu
quando ecoavam os últimos tiros da Guerra do Paraguai. Desenvolveu-se
convivendo com brasileiros ilustres e lutadores do final do século passado. Foi
contemporâneo do Marechal Deodoro da Fonseca. Foi contemporâneo de Floriano
Peixoto. E com eles e com os civis republicanos lutou pela República, lutou pela
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consolidação da república, abriu sua mente e seu coração às idéias mais
avançadas da época,
fazendo, a partir dali, uma brilhante carreira militar e, além disso, uma brilhante
carreira cívica grande brasileiro e patriota que foi.
Ouço, com satisfação, o ilustre Deputado Paes Landim.
O Sr. Paes Landim - Deputado Aldo Rebelo, acompanho com
atenção o discurso de V. Exa. que sintetizou muito bem o papel desenvolvido por
Rondon em nosso País e os seus ideais republicanos. Sabem todos que Rondon foi
um dos mais valorosos homens da nossa República. Quero apenas dizer que
Fernando Azevedo, em sua monumental obra "Cultura Brasileira", retrata muito bem
que a expedição científica de Rondon foi a maior contribuição que o País já teve no
campo da história natural e ao mesmo tempo foi a que mais projeção deu ao Brasil
no exterior. Ao homenagear Rondon vamos rememorar sobretudo o seu espírito
republicano. Era um homem do diálogo, da pesquisa, da aventura — no bom
sentido da expressão. Foi incumbido exatamente da missão de estudar uma zona
desconhecida do Brasil: a Amazônia. Esse foi o objetivo do ato administrativo que
criou a missão do grande Cândido Rondon. Esse espírito republicano de Rondon é
o paradigma, por excelência, do nosso Exército, representado aqui por esta figura
exemplar que é o General Zenildo de Lucena, a quem presto minhas homenagens.
Ele que é praticamente o segundo Ministro do Exército que vem da geração de
Agulhas Negras. Formado exatamente em um ambiente de respeito aos valores
republicanos e democráticos, mas sem perder de vista, em nenhum momento, o
espírito da ordem, da disciplina e do respeito à hierarquia. É exatamente esse
sentimento republicano de Rondon que engradece o Brasil, que engrandece
sobretudo a história republicana, os grandes momentos do Exército, tão bem
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representado neste momento pelo seu Comandante-Chefe, o General Zenildo de
Lucena. Muito obrigado nobre Deputado Aldo Rebelo. Apesar da divergência
ideológica, tenho por V.Exa. o maior respeito, exatamente pela maneira civilizada,
concisa com que V.Exa. defende seus ideais nesta Casa.
O SR. ALDO REBELO - Tenha certeza, Deputado Paes Landim,
que o respeito é recíproco. Eu agradeço o inteligente aparte de V.Exa., como
sempre o faz, e o incorporo com satisfação ao meu pronunciamento.
Como dizia, Sr. Presidente, quando o Brasil marchava para
transformações profundas e duradouras na sua estrutura política e jurídica, com o
advento da República, e na sua estrutura social, com o fim da escravidão, tivemos
também na sociedade brasileira e no seu exército lutadores exemplares, como o
próprio Rondon, como Deodoro e Floriano, filiados a suas altas patentes aos clubes
abolicionistas existentes na época. Condecorados pelos clubes abolicionistas, esta
contribuição, que depois prosseguiria em defesa da causa indígena, Rondon já a
oferecia na luta contra o regime servil, na luta contra a escravidão.
Ainda jovem oficial, foi destacado por seu professor e ideólogo,
Benjamim Constant Botelho de Magalhães, cabeça pensante do movimento
republicano, para missões específicas e delicadas, como, por exemplo, a de sondar
a posição do Almirante Eduardo Wandekolk a respeito do desencadeamento do
movimento que proclamou a República. Cumpriu essa missão com seu colega de
farda, Augusto Tasso Fragoso. Na mesma madrugada em que se proclamava a
República, incorporou-se na guarda pessoal da brigada que marchava para o
quartel general ao encontro do Marechal Deodoro e daqueles que fizeram, no dia
15 de novembro de 1889, importante transformação republicana na vida da
sociedade brasileira.
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Terminada a luta, terminado o movimento da República, recebe
Rondon missões específicas, já então na sua terra, Mato Grosso, e incorpora-se a
uma comissão do Major Gomes Carneiro, para fazer a ligação entre a cidade de
Cuiabá e as margens do Rio Araguaia por via telegráfica. Deslocado da missão do
Major Carneiro, que depois morreria heroicamente no Cerco da Lapa, quando o
extinto regime monárquico tentava desesperadamente um gesto de restauração,
Rondon faz sua opção pelo trabalho que escolhera, até mesmo por seus
antecedentes, neto que era de índia bororó, caboclo, como caboclo também era
Floriano Peixoto, que nas suas feições não negava sua ascendência indígena.
Era um brasileiro não apenas legítimo, mas por essência: era
um brasileiro mestiço. Compreendia, por esta razão, fazer parte das novas etnia e
civilização que se formava: um Brasil gigantesco, mas pouco integrado, que tinha
pouco assegurada sua unidade territorial. Rondon compreendia isso. Depois, como
patrono da Arma de Comunicação, fez-se justiça a seu esforço e dedicação.
Rondon marchava pelas regiões inóspitas do Centro-Oeste e da Amazônia,
cumprindo a missão patriótica de civilização e unificação do Território Nacional,
mas, ao mesmo tempo, na sua visão humanista, tendo todo o cuidado necessário
no contato que fazia com populações primitivas, com populações indígenas.
O Deputado Murilo Domingos já citou a sua consigna,
transmitida aos seus soldados e oficiais, que marchavam sob tensão, em região
desconhecida, acometidos pela malária e beribéri e cercados pela ameaça — ou
mistificação da ameaça — do contato com povos primitivos, muitos deles tidos
como antropófagos. No entanto, Rondon se aferrava ao princípio: morrer, se
necessário; matar, não. Entre outras coisas, dizia a seus soldados: temos para com
os índios grande dívida, contraída desde os tempos dos nossos maiores, que lhes
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foram invadindo territórios, devastando a caça, furtando o mel, para não falar em
males muito piores, mais graves, vergonhosos e infames.
Era a partir dessa compreensão que Rondon desenvolvia seu
trabalho. Foi a partir dessa compreensão e dessa prática que Rondon foi
reconhecido nacional e internacionalmente, não apenas como desbravador e
cientista, mas, acima de tudo, como ser humano que compreendia a natureza,
distinção e particularidade dos povos indígenas.
Não foi homem totalmente compreendido em todos os
momentos da sua vida. Nos anos 30, como tinha liderado e comandado um
destacamento que combatera a coluna de Miguel Costa e Prestes, vitoriosa a
Revolução de 30, Rondon foi preso. Foi atacado violentamente por Juarez Távora,
que dizia que ele distribuía postes e fios pela Amazônia como se fossem
brinquedos para índios, dilapidando o patrimônio público. No entanto Getúlio,
Osvaldo Aranha e outros, que não tinham talvez o sangue quente de Juarez
Távora, nem sua juventude, compreenderam o papel de Rondon.
Rondon pediu reforma do Exército. Esta foi aceita, mas não foi
aceito o desligamento das suas missões e funções. O próprio Getúlio Vargas,
consolidado o Movimento de 30, ofereceu a Rondon a direção e a confiança de
todos os serviços que ele vinha prestando à Nação e ao povo brasileiros. Através
do próprio Getúlio, recebeu a missão de mediar conflito difícil entre duas nações
latino-americanas.
Teve a sorte de ter vida longa, e sua longevidade foi
aproveitada para sempre defender as mesmas causas.
Em 1954, ainda com Getúlio Vargas, pediu a criação do
Parque Nacional do Xingu. Depois, com Juscelino, queixou-se da situação em que
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se encontrava o Serviço de Proteção aos Índios, da mistura dessa atividade com
interesses políticos partidários, e solicitou de Juscelino a moralização do Serviço de
Proteção aos Índios. Em 1955, o Congresso Nacional votou lei especial para que
fossem concedidas a Rondon, que se reformara como general, honras de marechal
do Exército brasileiro. Por esta razão é que eu dizia, Sr. Presidente, que não é a
primeira homenagem que esta casa presta a Rondon: é mais uma homenagem, a
qual tenho esperança e confiança em que as futuras gerações, os futuros
Congressistas, os futuros oficiais das nossas Forças Armadas, a nossa juventude e
o povo brasileiro renovem a esse brasileiro que honrou a sua condição não apenas
de militar, mas sobretudo de patriota.
Sr. Presidente, termino fazendo rápida consideração sobre a
atualidade do pensamento e da ação de Rondon. Creio que se mantém a
preocupação de Rondon, Sr. Presidente e Srs. convidados, com a questão dos
povos indígenas. Creio que o nosso povo, nossos governantes, esta Casa, as
Forças Armadas e o Exército ao qual pertenceu Rondon não podem faltar neste
momento na sua solidariedade e na sua compreensão a esses primeiros brasileiros,
que são os nossos irmãos indígenas.
Creio que a solidariedade a eles, a defesa dos seus costumes,
da sua cultura e a preservação inclusive de suas vidas, é tarefa nossa. Mas, ao
mesmo tempo, digo que se Rondon preocupou-se com os índios, ele foi também um
patriota preocupado com a preservação da unidade nacional e da defesa do nosso
território. Que essa preocupação permaneça atual para todos nós. Que não se
pretexte, Sr. Presidente, nem aqui nem fora daqui, a proteção aos índios para se
ameaçar a integridade do Território Nacional. Os índios são brasileiros, e pelos
brasileiros serão protegidos. Suas vidas serão garantidas pelo povo brasileiro, pelo
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Governo brasileiro, pelas Forças Armadas do País. Os índios serão garantidos por
aqueles que sempre lutaram em sua defesa. Exterminadores de índios, cultuadores
de assassinos de índios não terão e não têm o direito de se imiscuírem no
tratamento dessas populações e na soberania da nossa Pátria.
Portanto, que a memória, a vida e a ação de Rondon sejam
preservadas, principalmente nos dias de hoje, quando se fala em globalização,
quando se procura apagar a história dos povos, quando se procura pregar
falsamente o desmanche dos Estados nacionais das nações frágeis e dos povos
oprimidos, porque os Estados nacionais fortes e dominantes são cada vez mais
fortes e dominantes. Rondon pensava nisso. Rondon era um brasileiro, um patriota.
Creio, Sr. Presidente, que é da unidade do nosso povo que se
poderá se reproduzir o objetivo de vida, o lema e a trajetória desse grande filho do
povo brasileiro.
Honra e glória ao Marechal Rondon. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Neste momento, é com
muita satisfação que registramos a presença entre nós daqueles que, sem sombra
de dúvida, representam neste plenário o conjunto da juventude brasileira, os líderes
de amanhã: os alunos do Colégio Militar de Brasília.
A eles uma salva de palmas, com muito carinho. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Convidamos a Banda de
Música do Batalhão de Polícia do Exército, sob a regência do Ten. Ronaldo Esron
Menon de Cunha, para que apresente "Dobrado do Mato Grosso" e "Canção das
Comunicações.
(Apresentação musical). (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Dando continuidade à
homenagem, esta Presidência informa a todos que, a seguir, no Salão Negro da
Câmara dos Deputados, teremos o lançamento do cartão magnético da TELEMAT,
em homenagem ao Marechal Rondon, pelo Presidente da empresa, Dr. Eduardo
Freire.
Ainda no mesmo salão ocorrerá a abertura da exposição sobre o
Marechal Rondon pelo Sr. Ministro do Exército, General Zenildo Zoroastro Lucena.
Logo após, haverá uma apresentação do Grupo Folclórico Municipal de Santo
Antonio de Laverger, seguida de um coquetel e da apresentação do documentário
"A Expedição de Roosevelt", produzido pelo jornalista Cáca de Souza, e de um
vídeo cedido gentilmente pela TV Cultura , intitulado "Rondon, o Sentimento da
Terra".
Neste momento, esta Presidência, encerrando os trabalhos,
agradece a todos os presentes, especialmente ao Ministro do Exército, General
Zenildo Zoroastro Lucena; ao Contra-Almirante Roberto da Silva Legey,
representando o Sr. Ministro Chefe do EMFA, e aos familiares do Marechal
Rondon, Dr. Angelo Cristiano Rondon Amarante, Maria Inês Rondon Amarante,
Mariana Rondon Amarante, Coronel Antonio Lara Marialva Meireles Rondon, Major
Benjamim Acioly Rondon do Nascimento e Fernanda Cristina Rondon.
Assim, esta sessão de homenagem, realizada a partir de
requerimento de autoria do Deputado Murilo Domingues, cumpriu seu objetivo de
homenagear o grande, saudoso Marechal Cândido Mariano da Silva Rondon.
Esta Presidência teria a acrescentar somente o seguinte: há
homens que morrem e há outros que viverão sempre entre nós, pela sua
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caminhada, pela sua história e pelo legado que deixaram a esta País. Esse homem
é o Marechal Rondon.
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V - ENCERRAMENTO
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Nada mais havendo a
tratar, vou encerrar a presente sessão, antes convocando para hoje, às 14 horas,
sessão ordinária da Câmara dos Deputados com a seguinte
ORDEM DO DIA
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim) - Está encerrada a sessão.
(Levanta-se a sessão às 12h30min)
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