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CÂMARA DOS DEPUTADOS
DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO
NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES
TEXTO COM REDAÇÃO FINAL
Versão para registro histórico
Não passível de alteração
COMISSÃO DE EDUCAÇÃO
EVENTO: Audiência Pública REUNIÃO Nº: 0961/16 DATA: 09/08/2016
LOCAL: Plenário 10 das Comissões
INÍCIO: 14h52min TÉRMINO: 17h39min PÁGINAS: 54
DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO
MALVINA TANIA TUTTMAN - Conselheira do Conselho Nacional de Educação — CNE do Ministério da Educação. PATRÍCIA MARTINS DE FREITAS - Mestre em Psicologia e Doutora em Ciências da Saúde. PATRÍCIA NEVES RAPOSO - Diretora de Políticas de Educação Especial da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão — SECADI do Ministério da Educação. DÉBORA DANTAS - Representante do Coletivo Filhos da Flor, da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais do Distrito Federal.
SUMÁRIO
Debate sobre a regulamentação do direito ao aprendizado ao longo de toda a vida, previsto na Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
OBSERVAÇÕES
Houve exibição de imagens. Grafia não confirmada: Capelo.
CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINAL Comissão de Educação Número: 0961/16 09/08/2016
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Professor Victório Galli) - Boa tarde a todas e
a todos. Nós vamos começar os nossos trabalhos.
Declaro aberta a presente reunião de audiência pública da Comissão de
Educação, com a participação da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas
com Deficiência, atendendo aos Requerimentos nº 176, de 2016, e nº 49, de 2016,
de autoria do Deputado Eduardo Barbosa, para debater a regulamentação do direito
ao aprendizado ao longo de toda a vida, previsto na Convenção da ONU sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência.
Convido para compor a Mesa: a Sra. Malvina Tânia Tuttman, Conselheira do
Conselho Nacional de Educação — CNE (palmas); a Sra. Patrícia Neves Raposo,
Diretora de Políticas de Educação Especial — SECADI, do Ministério da Educação
— MEC (palmas); a Sra. Patrícia Martins de Freitas, Mestre em Psicologia e Doutora
em Ciências da Saúde (palmas); a Sra. Débora Dantas, representante do projeto
Coletivo Filhos da Flor (palmas). A Deputada Zenaide Maia, que está chegando,
também vai compor a Mesa.
Antes de passar a palavra aos nossos convidados, informo que a reunião está
sendo gravada, para posterior transcrição. Por isso solicito a todos que forem usar
da palavra que falem ao microfone.
Para melhor ordenamento dos trabalhos, adotaremos os seguintes critérios:
cada expositor terá o prazo de 15 minutos para a sua exposição, o qual não poderá
ser prorrogado. O debate será aberto ao final da última palestra, e as perguntas
deverão se restringir ao assunto da exposição e ser formuladas no prazo de 3
minutos, dispondo o palestrante de igual tempo para a resposta. Serão permitidas a
réplica e a tréplica pelo prazo de 3 minutos. Para responder a cada interpelação, os
expositores terão o mesmo tempo, 3 minutos.
Informo aos Parlamentares que a lista de inscrição para os debates se
encontra na nossa mesa de apoio e solicito aos Deputados interessados em
interpelar os palestrantes que se inscrevam previamente.
Quero registrar a presença do Deputado Ságuas Moraes, meu colega mato-
grossense. É um prazer contar com a sua presença.
Quero registrar também a presença da Deputada Creuza Pereira. É um
prazer tê-la conosco.
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Registro também a presença do Deputado Eduardo Barbosa, autor do
requerimento, a quem, daqui a pouco, eu vou passar a condução dos trabalhos, para
que possa presidir a reunião.
Cumprimento os membros da Mesa, na pessoa do Deputado Eduardo
Barbosa, autor do requerimento para a realização desta presente audiência, as
demais Deputadas e Deputados. Saúdo todos os presentes.
O Congresso Nacional, por meio do Decreto Legislativo nº 186, de 2008,
aprovou o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de
seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007. O
então Presidente Lula promulgou a Convenção por meio do Decreto nº 6.949, de 25
de agosto de 2009.
O propósito desse diploma legal internacional é promover, proteger e
assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades
fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela
dignidade inerente.
A convenção define pessoas com deficiência como aquelas que têm
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os
quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e
efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Esse pacto internacional, de acordo com o seu art. 3º, assenta-se nos
seguintes princípios: o respeito pela dignidade inerente, a autonomia individual,
inclusive a liberdade de fazer as próprias escolhas, e a independência das pessoas,
bem como o respeito pela diferença e pela aceitação das pessoas com deficiência
como parte da diversidade humana e da humanidade. Foi destacado ainda, como
princípio norteador, o respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças
com deficiência e pelo direito das crianças com deficiência de preservar sua
identidade.
Por meio dessa convenção, o Brasil se comprometeu, junto à comunidade
internacional, a garantir o direito das pessoas com deficiência ao aprendizado, ao
longo de toda a vida, com o objetivo do pleno desenvolvimento do potencial humano
e do senso de dignidade e autoestima, além do fortalecimento do respeito pelos
direitos humanos, pelas liberdades fundamentais e pela diversidade humana.
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Foi enfatizado o máximo desenvolvimento possível da personalidade e dos
talentos e da criatividade das pessoas com deficiência, assim como de suas
habilidades físicas e intelectuais.
É importante destacarmos aqui que a convenção foi aprovada, no nosso
ordenamento jurídico interno, como emenda à Constituição. O art. 5º, § 3º, da nossa
Carta Política estabelece que os tratados e convenções internacionais sobre os
direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em
dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes
às emendas constitucionais.
Isso equivale a dizer que qualquer ato omissivo ou comissivo ou lei que
contrarie dispositivo da convenção comete ofensa constitucional e deve sofrer as
responsabilizações cabíveis, ou banimento do mundo jurídico, no caso da legislação
incompatível.
Foi também pela iniciativa desta Casa que aprovamos, após 15 anos de
debate das Casas Legislativas federais e da comunidade, a Lei Brasileira de
Inclusão da Pessoa com Deficiência, ou Estatuto da Pessoa com Deficiência, que
estabelece, no seu art. 27, que a educação constitui direito da pessoa com
deficiência, assegurados sistema educacional inclusivo em todos os níveis e
aprendizado ao longo de toda a vida, de forma a alcançar o máximo
desenvolvimento possível de seus talentos e habilidades físicas, sensoriais,
intelectuais e sociais, segundo suas características, interesses e necessidades de
aprendizagem.
Aprender ao longo da vida não é uma condição do aprendizado, senão do
aprendiz mesmo. A aprendizagem é indissociável da vida. Mas temos que
reconhecer que o caminho é mais longo para as pessoas com deficiência.
Temos o desafio de ensiná-las a aprender a ser autônomas na direção do seu
desenvolvimento, a gerir a gama de conhecimento que é produzido contínua e
diariamente e ser eficientes, num contexto em que o aprendizado acontece por meio
de ações continuadas que não se limitam mais às oportunidades compartilhadas
pelo professor dentro da sala de aula tradicional, senão também pelas mídias
eletrônicas e até pelas interações sociais.
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Espero que, por meio dos debates de hoje, possamos amadurecer as
conquistas que temos, bem como as formas de viabilizar essas conquistas e
possíveis medidas legislativas ou fiscalizatórias que se podem empreender.
A Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência está e
estará sempre disponível para acolher sugestões, para melhorar a legislação e
viabilizar os debates, como o faço agora por meio desta audiência pública, fruto do
requerimento do nobre Deputado Eduardo Barbosa, que tanto se tem destacado na
defesa das pessoas com qualquer tipo de deficiência.
Muito obrigado.
Convido o Deputado Eduardo a presidir os trabalhos.
Já está conosco a Deputada Zenaide. (Palmas.)
(Pausa.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Boa tarde a todos os
presentes.
Desde já, eu quero agradecer a todos os convidados que aceitaram o nosso
convite de pronto.
Hoje, teremos o primeiro debate sobre a regulamentação do direito ao
aprendizado ao longo de toda a vida. Desde que aqui cheguei — já tenho 22 anos
de Câmara de Deputados —, esta é a primeira vez que promovemos uma discussão
nova dentro do nosso cenário, abordando a educação ao longo da vida, tema trazido
pela própria Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência e
absorvida também pela Lei Brasileira de Inclusão, como o nosso Presidente acabou
de citar.
Antes de passar a palavra às convidadas, eu quero falar brevemente sobre o
que nos provocou a fazer esta discussão e promover este debate por meio da
Comissão de Educação e da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com
Deficiência.
O Congresso Nacional tem sido muito demandado por familiares de pessoas
com deficiência, por mães principalmente, que fazem uma verdadeira peregrinação
na luta pelos direitos dos seus filhos.
Nós nos deparamos com um quadro precário nessa área, que repercute em
todos os Estados e Municípios. Após concluírem a educação básica no Brasil, as
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pessoas com deficiência intelectual ou deficiência múltipla, não têm alternativas
ainda estruturadas e com a amplitude de alcance da população com deficiência
intelectual, fazendo com que essas pessoas geralmente voltem para casa, fiquem
sem atividades e se mantenham, muitas vezes, num processo de isolamento.
Quando isso não acontece, são vítimas da rua, sendo até explorados em algumas
comunidades.
Essa angústia das famílias tem trazido para o Congresso Nacional a busca de
uma solução para tal problema. No entanto, essa busca nunca corresponde à altura
da situação enfrentada pelas pessoas com deficiência.
Tendo como respaldo agora a Convenção da ONU e a Lei Brasileira de
Inclusão — LBI, um grupo de Parlamentares envolvidos na Comissão da Pessoa
com Deficiência resolveu discutir o tema. Inclusive, uma dessas Parlamentares está
integrando a Mesa, a Deputada Zenaide, que aqui hoje não está nessa condição.
Ela está aqui na condição de mãe de uma pessoa adulta com deficiência intelectual
e conhece também o drama vivido pela família de pessoas com deficiência,
principalmente pela mãe.
Foram muitas as vezes que compartilhamos com a Deputada Zenaide Maia a
sua angústia por ter que deixar seu filho no seu Estado e vir a Brasília, não tendo ele
aquilo que ela entendia que precisava ter para garantir a sua participação social e ter
uma vida ativa. Mais do que resolver esse drama pessoal, ela busca, de alguma
forma solucionar essa questão e tem condições familiares para tal. A Deputada
Zenaide compartilha com outras mães dessa ansiedade, porque no momento não há
forma de solucionar esse vazio assistencial do Estado brasileiro.
Após conversas com esse grupo de Parlamentares, resolvemos dar foco a
este tema aqui, na Câmara dos Deputados. Eu tive a iniciativa de apresentar um
projeto de lei e, com apoio da Consultoria Legislativa da Câmara dos Deputados,
entendi que nós deveríamos tratar desse assunto, Malvina, no que se refere à
educação de jovens e adultos, que já é uma discussão existente em outras esferas e
em outros países. Assim, nós poderíamos, além de encarar a educação formal de
jovens e adultos já existente no Brasil, tentar trabalhar com o conceito de educação
ao longo da vida na educação informal de jovens e adultos.
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Isso então nos amimou muito, porque não estaríamos reinventando ou
inventando algo, porque a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação já define
claramente o que é educação de jovens e adultos. Nós estaríamos apenas
ampliando a dimensão de seu objetivo e de seus destinatários. No caso desse
público específico ao qual fizemos referência, principalmente as pessoas com
deficiência intelectual ou múltipla, ele poderia ser o primeiro contemplado com a
amplitude da questão.
Nós nos entusiasmamos com isso e vamos, agora, começar este debate, que
no nosso entendimento é muito importante, extremamente necessário e essencial.
Para esta primeira Mesa, chegamos à conclusão de que deveríamos convidar
o Conselho Nacional de Educação, que se posicionará, em algum momento, a
respeito de possível regulamentação desse tema.
Nós tivemos provocação de alguns conselhos estaduais em alguns
momentos, e as respostas que nos deram foi de que entendiam que a educação ao
longo da vida era a educação continuada, mas os argumentos que me deram não
me convenceram disso, porque eu acho que são objetivos muito diferenciados.
Como a própria legislação da educação no Brasil não trata desse termo ainda,
nós vamos ter que a incorporar realmente, e é somente a partir do Congresso
Nacional que conseguiremos indicar isso no arcabouço legal brasileiro.
Entendemos também que precisaríamos ouvir especialistas. Por isso,
trouxemos hoje a Sra. Patrícia Martins, uma das especialistas em neurociência, que
nos mostrará as possibilidades de desenvolvimento de habilidades ao longo da vida,
que é a consistência científica que nós temos, porque estamos trabalhando numa
dimensão social importante, para dar a eles um espaço para a continuidade do seu
desenvolvimento, e temos hoje a ciência nos dando o suporte de que esse
aprendizado é possível, desde que as pessoas também tenham possibilidades de
ser estimuladas. Então, nós precisamos pensar como isso deve ser feito. A presença
da Patrícia nos traz esse olhar científico aqui.
Conversamos sobre isso também no Ministério da Educação, tanto com o
Ministro como com a Secretária Ivana, da SECADI, e com a Patrícia, que está aqui,
e assume a Diretoria de Educação Especial do MEC. Todos foram muito abertos no
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sentido de que o Ministério da Educação tem que encarar esse debate. Quem sabe
daqui para frente nós vamos ter resultados positivos.
A Sra. Patrícia Neves está aqui conosco porque participou de uma discussão
que fizemos acerca de um documento das organizações não-governamentais do
País.
Aqui temos também a presença da Federação Nacional das APAEs. Eu
gostaria que os senhores levantassem a mão. Os coordenadores pedagógicos de
todos os Estados estão aqui presentes, porque felizmente esta data coincidiu com a
de uma reunião de trabalho da Coordenação Nacional de Educação. Eles vieram a
esta audiência, porque são eles que vão assumir o desafio de dar essa resposta à
necessidade dos jovens adultos e de suas famílias.
Essa carta elaborada pelas entidades abordou alguns pontos para o Ministro,
mostrando que nessa questão deveríamos avançar em nosso País.
Com alegria, quisemos abrilhantar a nossa audiência com uma experiência
real, trazida pela Débora Dantas. Ela desenvolve um trabalho — não sei se posso
denominar assim, ela mesma vai definir depois — de linguagens alternativas, na
APAE-DF, cuja proposta metodológica que eu tive a grata surpresa de conhecer e
perceber vem ao encontro daquilo em que acredito. Eu acho que teremos aqui
também a oportunidade de ver alguma coisa concreta, algo já a ser realizado. Dessa
forma, nós estamos estimulados a promover esta audiência.
Está conosco também a Deputada Carmen Zanotto, assim como nosso
Presidente e membros da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com
Deficiência.
Eu gostaria de dizer que a Deputada Carmen foi uma das motivadoras deste
tema, desta discussão, também pela sua vivência. Ela não só é Parlamentar como
tem um irmão adulto com deficiência intelectual que vive aos cuidados dela. Então, a
Deputada Carmen Zanotto também vive, como a Deputada Zenaide Maia, em outra
dimensão. Como irmã, ela tem a responsabilidade de dar ao irmão aquelas
condições dignas de vida.
O exemplo que eu coloco da Deputada Carmen Zanotto é o que identificamos
hoje pelo País afora. Muitas vezes os pais morrem ou estão envelhecidos, e
algumas dessas pessoas têm a graça de possuir um irmão ou uma irmã que assume
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a responsabilidade de estar ao lado delas nessa trajetória; outras ficam em situação
de abandono. Eu conheço, inclusive, em meu Estado, casos em que os vizinhos
assumiram a responsabilidade de dar abrigo, teto a pessoas que perderam os seus
pais e que, por não haver nenhuma referência de serviços, ficaram à mercê da ajuda
humana, da solidariedade de outros.
Este assunto é muito pertinente. Ele nos traz a possibilidade da discussão
técnica do tema, mas com cunho social de relevância.
Vou passar a palavra à Sra. Malvina Tânia Tuttman, para sua exposição, por
15 minutos.
Hoje o Conselho Nacional de Educação está dando posse a seus novos
conselheiros, em evento que conta com a presença do Ministro e dos Secretários do
MEC. A Conselheira Malvina fez questão de estar aqui representado o CNE, no
entanto, ela não vai poder ficar o tempo todo da nossa discussão.
Passo a palavra à Sra. Malvina Tania Tuttman, agradecendo a sua presença.
A SRA. MALVINA TANIA TUTTMAN - Muito obrigada a todos.
É uma satisfação muito grande para o Conselho Nacional de Educação
compor esta audiência com as demais parceiras. E fico feliz que essas parceiras,
com todo o respeito, Deputado, sejam mulheres, porque o normal é nós vermos uma
Mesa, independentemente dos assuntos, composta majoritariamente por homens.
Nada contra isso, mas sou a favor de que as mulheres também possam ocupar
esses espaços de importância.
Eu quero cumprimentar todos, em nome do Conselho Nacional de Educação,
especialmente no do seu Presidente, o Prof. Gilberto Garcia, que, pelos motivos já
apresentados pelo Deputado Eduardo Barbosa, infelizmente não pôde estar aqui.
Ele me pediu, e eu adorei, que participasse, mesmo que por um breve momento. Eu
peço desculpas, porque faço parte do coletivo de 24 conselheiros nacionais e terei
que estar lá presente. Mas já adianto que responderei a todas as questões. Além
das posições, das argumentações, das propostas surgidas à Mesa, o debate é o
mais rico, para que nós possamos assimilá-lo também e dar continuidade, ou num
coletivo, ou nas nossas próprias esferas de atuação.
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Eu já inicio colocando o Conselho Nacional de Educação à disposição dos
senhores. Deixarei os contatos para as respostas que o coletivo presente considerar
pertinente ouvir do Conselho.
Já coloco, Deputado, que o Conselho estará presente a todos os outros
movimentos que esta Casa der prosseguimento, porque, pelo que entendi, este é o
primeiro encontro. Queremos estar no segundo, no terceiro, no quarto, se for
necessário, e nas discussões de encaminhamentos e de conclusões, porque as
nossas crianças, os nossos jovens e os nossos adultos já não têm mais tempo —
não é, Patrícia? — de esperar que possamos encarar, com a seriedade que todos
que estão aqui encaram, essa temática.
Quero dizer aos senhores e às senhoras que o Conselho Nacional de
Educação é formado basicamente por duas câmaras, a Câmara de Educação
Básica e a Câmara de Educação Superior, e um Conselho Pleno, que reúne as duas
câmaras. Existem assuntos, temáticas, em que prevalece o tratamento em uma ou
em outra Câmara; ou, então, no Conselho Pleno. Trabalhamos também por
comissões. E essas comissões temáticas também são comissões das câmaras ou
são comissões bicamerais.
Esta temática tem sido trabalhada pela Comissão de Educação Básica, da
qual eu pertenço. E nós começamos, Patrícia, conversando exatamente sobre esta
demanda da educação ao longo da vida, o que ela significa, e pensando isso junto
com a SECADI.
A SECADI está presente no Conselho, mas esteve especialmente, algumas
vezes, na Câmara de Educação Básica, discutindo a questão da educação ao longo
da vida, Deputado, partindo justamente do entendimento da educação de jovens e
adultos. Acredito que estamos em sintonia nessa questão. Estamos discutindo isso.
Agora, tivemos modificações no Ministério da Educação e também no
Conselho Nacional de Educação, mas as temáticas irão continuar, porque não são
assuntos próprios de determinados grupos, são assuntos nacionais, são assuntos
fundamentais para dar dignidade à nossa população.
Neste contexto, o Conselho Nacional de Educação trabalha sempre em
parceria com as Secretarias do Ministério da Educação, com as representações da
sociedade organizada, da sociedade civil, e com esta Casa.
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Eu gostaria de falar especialmente sobre duas resoluções do Conselho
Nacional de Educação. Desculpem-me se eu falo algumas coisas que já são do
conhecimento da maioria, mas é importante reforçar que o Conselho Nacional de
Educação trabalha, entre outras questões, basicamente com pareceres, que são
estudos sobre uma determinada temática demandada. No caso, esta poderia ser a
temática. Espero que o encaminhamento seja esse, vou fortalecer isso em nome do
Conselho.
Em seguida, vou falar das diretrizes. A toda diretriz antecede um parecer, que
analisa, na teoria e na pratica também, as questões. Não é um coletivo de 12, 10, 6,
2 conselheiros, não. Há um presidente ou uma presidente, um relator ou uma
relatora, mas há um conjunto de outros conselheiros. E essa comissão é ampliada,
sempre com representações. Produz-se um primeiro documento, um segundo
documento, enfim. Quando consideramos que essa documentação está adequada
para ser mais socializada, iniciamos um processo de audiências públicas, em que as
representações se fazem presentes, e há um debate. E esse documento é
modificado na sua íntegra ou em alguns aspectos, e é daí que surgem os pareceres
e também as diretrizes.
Especialmente sobre o tema educação especial, nós temos duas diretrizes: a
última resolução, a Resolução de nº 4, de 2 de outubro de 2009, que institui
diretrizes operacionais para o atendimento educacional especializado na educação
básica, na modalidade educação especial; e uma resolução de 2001, que institui
diretrizes nacionais para a educação especial. As duas estão em vigor: a de 2001,
que instituiu as diretrizes nacionais; e a de 2009, que considerou importante
estabelecer diretrizes operacionais.
Nós temos também um parecer importantíssimo agora, porque, no
entendimento do Conselho Nacional de Educação, não podemos discutir uma
temática de tamanha relevância sem termos um olhar significativo para a formação
dos profissionais, em especial, da educação. Em 1º de julho de 2015, foram
homologadas as diretrizes curriculares nacionais para a formação pedagógica para
graduandos, para profissionais de segunda licenciatura, enfim, que já abordam,
Patrícia Neves, Débora, Patrícia Martins, Deputado, Deputada, a importância da
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formação desses profissionais, mas, logicamente, compete ao Conselho Nacional de
Educação trabalhar essas questões.
O Conselho Nacional tem uma ligação direta com os Conselhos Estaduais e
com os Conselhos Municipais. Eu sou carioca, do Rio de Janeiro. Sou do Conselho
Estadual de Educação também e tive o prazer de ser a relatora de uma diretriz, a
Deliberação nº 355, de 2016, recentemente instituída, que trabalha a educação
especial de forma diferente do Conselho Nacional, no que tange à abordagem do
seu público. O Conselho Nacional trabalha para a educação básica, e nós tivemos o
entendimento, no Estado do Rio de Janeiro, de que essas diretrizes devem ser
também para todo o sistema, incluindo-se aí a formação superior em todos os
cursos.
Eu acredito que esse também é um avanço, não no sentido mais amplo de
que trata esta audiência, mas já é um caminhar importante; senão, nós estamos
delegando, Patrícia, apenas para a educação básica; e, para a educação de jovens
e adultos, na ótica que o Deputado muito bem colocou, é como se parasse o direito
do jovem e do adulto de ter a continuidade formal também dos seus estudos.
Então, a Deliberação nº 355, que é recente, do mês de junho, já trata dessa
abordagem.
Concluindo, como esse processo foi feito? E eu deixo também a possibilidade
de discutirmos isso. Ele foi feito por meio de audiências públicas. O Conselho do Rio
de Janeiro, tal qual o Conselho Nacional, foi a oito polos, congregando todos os
Municípios do Estado, e, o mais importante, junto com o Ministério Público do
Estado. Houve uma parceria do Conselho Estadual de Educação com o Ministério
Público do Estado.
Escutamos mais do que falamos — podem acreditar! Escutamos
representações de profissionais, que apresentaram muitas experiências importantes
e exitosas no chão da escola, das APAEs. Nós temos que escutar o que esses
profissionais estão dizendo. Houve depoimentos importantes dos responsáveis,
Deputada, que nos relatam as suas dificuldades, como os laudos. Enfim, são muitas
dificuldades, e V.Exas., melhor do que eu, sabem disso.
Apontamos quais seriam as prioridades. Tivemos, como o senhor teve
também, a preocupação de receber a assessoria da academia. Tivemos a
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assessoria tanto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro como da
Universidade Federal Fluminense. E o grupo vai-se ampliando. Tivemos também a
participação importante da Ordem dos Advogados do Brasil, que veio discutir
conosco.
Eu acredito que este movimento se inicia na Casa muito bem. O Conselho
Nacional de Educação está dizendo: “Estamos presentes”.
Termino relembrando Carlos Drummond Andrade, nosso grande poeta, em
um dos seus belíssimos poemas: “Vamos juntos, de mãos dadas”.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Muito obrigado, Malvina.
A SRA. MALVINA TANIA TUTTMAN - Desculpe-me por ter-me alongado.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Não se alongou, de
forma alguma.
Eu acho que o posicionamento político do Conselho Nacional de Educação,
ao encontro daquilo que nós desejamos, já é, para nós, uma abertura muito grande
para o desdobramento deste debate. Então, obrigado pela exposição, pelo
envolvimento e por fazer-se presente aqui, representando o Conselho.
Eu quero também destacar a presença do Deputado Angelim, do Deputado
Otavio Leite e do Deputado Izalci, além da presença da Deputada Carmen Zanotto,
que eu já citei.
Eu gostaria de ressaltar a presença do Ministério do Desenvolvimento Social
e Agrário, através da Sra. Vera Lúcia Capelo; também da Sra. Deusina Lopes da
Cruz, grande militante na área da pessoa com deficiência há mais tempo do que eu;
e da Sra. Niusarete Margarida de Lima. Para quem não sabe, ambas são mães de
autistas. Elas contribuíram muito, quando estavam na Associação de Capacitação,
Orientação e Desenvolvimento do Excepcional — ACORDE, para as primeiras
concepções de desenvolvimento de políticas na área. O Brasil deve muito a elas,
quando na ACORDE exerceram essas funções. Agora estão no MDS, e nós vamos
precisar muito delas também.
Vou passar a palavra à Sra. Patrícia Martins de Freitas, que é Mestre em
Psicologia e Doutora em Ciências da Saúde.
A SRA. PATRÍCIA MARTINS DE FREITAS - Boa tarde a todos.
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Eu gostaria de, em primeiro lugar, cumprimentar os membros da Mesa
através do Deputado Eduardo Barbosa, a quem agradeço pelo convite.
Estou muito feliz de participar desta audiência, em especial pela magnitude
que ela representa na questão educacional das pessoas com deficiência.
Destaco a abertura, o convite à Neurociência, uma área que se dedica a
pesquisar e a entender o funcionamento neurocognitivo e como ele pode impactar
as modificações no processo de aprendizagem . Assim, a Neurociência tenta
encontrar as soluções, os caminhos para facilitar a aprendizagem de pessoas com
algum tipo de deficiência neurocognitiva.
Eu vou trazer aos senhores um pouco do meu conhecimento, a fim de
contribuir para a audiência no que diz respeito à regulamentação do aprendizado ao
longo da vida, que, no meu entendimento, é algo a ser debatido com muita
profundidade.
Nós acompanhamos várias crianças em nossos projetos, tanto de pesquisa
quanto de extensão, e vemos o enfrentamento das famílias. Não é por acaso, eu
tenho uma prima e uma sobrinha com paralisia cerebral. Acho que isso é algo que
nos mobiliza mais de perto, não só como cientista, mas também como pessoa. Vou
trazer essa contribuição com o intuito de favorecer o debate.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu sou da Universidade Federal da Bahia, do campus de Vitória da
Conquista, do Instituto Multidisciplinar em Saúde, localizado no sudoeste da Bahia.
Lá existe um grupo de pesquisa, o Núcleo de Investigações Neuropsicológicas da
Infância e da Adolescência — NEURONIA, cujo símbolo é aquele ali.
Em relação às bases científicas que justificam o entendimento, a busca por
esse aprendizado ao longo da vida, primeiramente abordo a nossa compreensão do
desenvolvimento neurocognitivo. O desenvolvimento ocorre ao longo da vida, está
presente do momento da concepção até a morte.
A concepção de desenvolvimento modificou-se, desde a década de 90, com o
conceito de life span, que é o desenvolvimento ao longo da vida. Isso mudou nossa
perspectiva de envelhecimento, de alterações do neurodesenvolvimento, mostrando
que não existe um momento em que nós estagnamos. Nós estamos sempre nos
desenvolvendo.
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Aprendizagem e suas bases neurocognitivas. Quais são as bases
neurocognitivas da aprendizagem? Este é um ponto em que vou me fixar, porque eu
quero que fique bastante clara a importância de nós entendermos como a mente
funciona, como o cérebro funciona, para que possamos ter mais eficiência nas
nossas estratégias de ensino e aprendizagem.
Além disso, vamos trazer aos senhores as seguintes temáticas: o que muda
com as deficiências; e a neuroplasticidade e a funcionalidade.
Desenvolvimento e aprendizagem. O desenvolvimento é um processo de
mudança, ele ocorre através de mecanismos de mudança. Essas mudanças são
pautadas pela interação entre o que nós trazemos de base biológica e a estimulação
do ambiente. Isso já é um consenso na ciência. Não basta o entendimento da nossa
base biológica. Ela é um ponto de partida. Mas nós precisamos entender que o
ambiente promove esse processo.
Por meio de estudos com animais e da comparação entre diferentes estados
socioeconômicos, entre condições onde há muita estimulação e pouca estimulação,
visualizamos claramente um desenvolvimento neurocognitivo diferente, não apenas
em funções como também em estrutura do sistema nervoso central. Não é pouco
falar da importância dessa interação com o ambiente.
Aquisição de informações que são transformadas em conhecimento. Isso é o
que entendemos como aprendizado do indivíduo, mas às vezes há alguma
dificuldade para promover essa aquisição e também para provocar essa expressão.
Às vezes não sabemos qual é o caminho para provocar essa expressão. Esperamos
que o indivíduo mostre um comportamento aprendido naquela hora, naquele exato
momento, quando as condições ainda não estão favoráveis. Isso também tem que
ser observado.
A interação entre bases biológicas e o ambiente, como eu disse, vai depender
da estimulação. Essa estimulação é fundamental, pois é como se vai, de fato,
promover essa mudança, que é o desenvolvimento. Então, o neurodesenvolvimento
vai ocorrer quando o ambiente também proporcionar as aquisições e a modelagem
da estrutura do sistema nervoso central.
Neurociências e educação. A interação entre esses campos ainda é bastante
distante, algo que nos preocupa muito. As neurociências ainda têm tido um impacto
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muito maior no campo clínico da saúde do que na educação. E acreditamos que,
muito pelo contrário, elas deveriam estar presentes e se inserir de forma profunda no
campo educacional, não apenas na educação dos indivíduos com deficiências —
desses em maior magnitude —, mas também na educação das pessoas que não
têm deficiência.
Compreender como o cérebro funciona não é mero luxo científico. Parece que
falar do cérebro, entender como o cérebro funciona, é coisa para um cientista que
está lá dentro da universidade, mas não é. Isso é coisa para o educador, porque é
ele quem vai fazer a estimulação, é ele quem vai trabalhar com estímulos que
precisam prender a atenção do indivíduo.
Como se vai prender a atenção, se não se sabe como a atenção funciona?
Como se vai fazer com que o indivíduo aprenda, se para aprender é preciso
memorizar, e se não se sabe quais são os componentes da memória, nem como a
memória funciona no sistema nervoso central? Esses são alguns elementos que
precisamos entender que têm um grau de limitação e sobre os quais é preciso
refletir.
Funções como atenção, memória, linguagem, planejamento e resolução de
problemas são organizadas em módulos que funcionam dentro de circuitos neurais.
Compreender tais funções não pode estar distante da educação de pessoas com
deficiência, especialmente quando se está pensando na aprendizagem ao longo da
vida. É um processo mais dinâmico. E é preciso compreender esse funcionamento
neuronal e neurocognitivo para se estimular adequadamente.
O que muda com as deficiências. As limitações que caracterizam as
deficiências mostram a necessidade de atendimento diferenciado. Isso está claro!
Mas nós precisamos entender que as estratégias têm que ser individualizadas, elas
têm que ser pensadas caso a caso. No entanto, como se vai pensar caso a caso se
não se está avaliando caso a caso, se não se conhece o funcionamento
neurocognitivo, qual funcionalidade está preservada e qual está em
comprometimento em cada indivíduo?
Os currículos adaptados para a necessidade de cada um e o uso de técnicas
de ensino e aprendizagem com evidências científicas. Nós precisamos sair desse
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modelo educacional muito intuitivo, muito romantizado. Nós precisamos rever na
literatura o que de fato funciona e o que funciona para as pessoas com deficiência.
Eu acabei de ver a publicação de um artigo no qual estavam ensinando a
consciência fonológica, ou seja, a capacidade de identificar fonemas e transpô-los
para a escrita, a pessoas que não tinham habilidade de comunicação e que tinham
deficiência intelectual associada. Então, é preciso questionar se as estratégias para
a aprendizagem de mecanismos de consciência fonológica têm fundamentação
científica e se estão adequadas a pessoas com déficit de comunicação e com
deficiência intelectual.
Neuroplasticidade. Esta é a menina dos olhos das neurociências. Menina dos
olhos das neurociências por quê? Nós estamos lidando com um campo que é
também, até as evidências de neuroplasticidade começarem a se confirmar,
bastante romântico. O que havia era apenas a preocupação e o sonho de que
pudesse haver a recuperação funcional a partir de estímulos, treinos, reabilitação,
processos de ensino e aprendizagem. Eu costumo dizer que a melhor reabilitação,
no caso das deficiências intelectuais, é a questão educacional. Com certeza a
neuroplasticidade mostra evidências de recuperação funcional, ou seja, indivíduos
que têm algum tipo de lesão, mesmo lesão do sistema nervoso central, conseguem
ter o desenvolvimento de funções que poderiam estar comprometidas.
Esse potencial de neuroplasticidade é diferenciado ao longo da vida, mas ele
não deixa de existir. Esse aspecto mostra que o trabalho de investimento no
processo educacional realmente tem fundamento e não se trata simplesmente de
investir em algo que não vai trazer retorno, muito pelo contrário. Quanto mais nós
estimularmos, se o fizermos de maneira adequada e ao longo da vida, mais
resultados o indivíduo com deficiência vai alcançar, tanto na aprendizagem quanto
em outras funções.
Nós não podemos nos preocupar apenas com a aprendizagem escolar. Nós
também temos que nos lembrar das habilidades de autonomia, das competências
necessárias para que esse indivíduo se torne cada vez mais autônomo e tenha mais
participação e maior inserção social. Essa é a nossa causa! Ela não se restringe ao
fato de o indivíduo aprender a ler e escrever, manusear dinheiro ou lidar com
números. Nós temos que nos preocupar com a inserção social.
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Obviamente, aqui nós não estamos tratando do tema com profundidade, por
causa do tempo, mas uma das possibilidades da neuroplasticidade é a modificação
das conexões sinápticas. Neste momento, muitos de vocês que nunca ouviram falar
deste assunto estão fazendo novas conexões sinápticas. Isso é o que acontece
quando nós que não temos nenhum tipo de deficiência estamos aprendendo. Esse é
um processo natural. A neuroplasticidade é inerente à nossa estrutura, que é
plástica, que se modifica.
Nos indivíduos com deficiência o que se espera? Que, a partir do estímulo, da
experiência, também se favoreçam novas conexões, também se favoreça uma
melhor rede sináptica e, portanto, a modificação do comportamento, ou seja, a
aquisição de habilidades, a aquisição de novas funções e também a aquisição da
aprendizagem escolar. Essa ginástica neuronal faz parte de um processo
educacional que já é trabalhado, porém ela precisa ser mais sistematizada, para se
alcançarem melhores resultados.
Pensando nesse processo ao longo da vida, qual é a nossa intenção? Que
essa estrutura continue sendo estimulada, que ela não fique estagnada. O que
acontece? Quando esses indivíduos interrompem o ciclo de escolarização é que, de
fato, eles vão sofrer uma estagnação. A família não dá conta de prover essa
estimulação e, mesmo se for possível a família assumir, nós temos que considerar
que a família passa por um processo de sobrecarga quando assume sozinha o
cuidado, a estimulação, as intervenções. Nós sabemos que sempre há alguém que
assume esse cuidado e acaba sendo essa pessoa que vai passar pela sobrecarga.
Qual é a intenção de proporcionar um processo de aprendizagem ao longo da
vida? Manter a estimulação, garantindo o aperfeiçoamento de habilidades
desenvolvidas e a aquisição de novas funções. Com isso, não estamos pensando
em uma política pública apenas para garantir um espaço de convivência. Não é essa
a intenção. A intenção é a estimulação cognitiva e neurocognitiva e a promoção de
novas conexões sinápticas. Essa tem que ser a intenção, porque esse, sim, vai ser o
efeito que vai garantir uma ampliação da inserção social desses indivíduos.
Estratégias de ensino precisam ser favoráveis ao desenvolvimento gradativo,
contínuo e muitas vezes lento. O desenvolvimento é lento, sim! Quem trabalha com
o deficiente sabe que é lento, mas isso não significa que ele não vá ocorrer. Nós
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precisamos entender isso. No entanto, às vezes esse desenvolvimento pode ser
supreendentemente rápido, o que vai depender muito do contexto, do tipo e das
condições de estimulação e da individualidade de cada criança.
Redução do estresse familiar e das suas consequências. Como eu disse, a
família também precisa ser considerada, e é necessário aumentar a possiblidade de
os membros das famílias se envolverem em atividades de trabalho, em atividades de
inserção social que sejam voltadas para eles mesmos, e não apenas para o cuidado
daquele indivíduo com deficiência. Nós temos que nos preocupar com o efeito que
isso pode ter.
Necessidades. Eu acredito que, para que essa regulamentação possa
ocorrer, é preciso o maior aperfeiçoamento dessas diretrizes que o Conselho estava
apresentando. É necessária a formação, trabalhar esse conhecimento do
funcionamento neurocognitivo e das avaliações funcionais. A formação dos
professores que vão trabalhar com ensino especializado e inclusivo deve ter o olhar
voltado para a questão neurocognitiva. Nós não podemos mais abrir mão disso.
Programas educacionais com evidências científicas. Nós precisamos revisar e
fundamentar a nossa prática educacional. Há uma vasta literatura sobre a prática
educacional com a pessoa com deficiência. Há inúmeras estratégias de ensino
individualizado e de tecnologias assistivas. Isso mostra que existe outro caminho
que não implica apenas levar a criança para oficinas, para trabalhos lúdicos, ou
mesmo criar condições para sua inserção em um contexto de educação regular, mas
isso não ocorrer de fato. Nós não podemos ter uma criança com Transtorno do
Espectro Autista, com inteligência acima da média, sentada numa classe de ensino
regular apenas colorindo. Por que isso acontece? Isso não deveria acontecer. É uma
falha grave. É uma falha de entendimento do que é o Transtorno do Espectro Autista
e de como funciona a estrutura neurocognitiva desse indivíduo.
Impactos e ganhos. Eu elenquei alguns impactos, mas há inúmeros: aumento
dos recursos neurocognitivos para os indivíduos com deficiência intelectual,
devemos nos aprofundar nesse debate, pensando nos diferentes níveis da
deficiência intelectual; ampliação da inserção social; mais qualidade de vida, tanto
para o indivíduo com a deficiência intelectual quanto para suas famílias e também
para aqueles que estão em torno dele; redução de perdas alcançadas. Se nós
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interrompemos a escolarização de um indivíduo, nós o colocamos em uma condição
em que aquilo que ele ganhou ele pode perder. Se aos 17 anos de idade ele
interrompe sua escolarização e passa a vivenciar uma estimulação muito aquém
daquela de que ele necessita, isso pode levar a perdas. Outro aspecto seria
minimizar impactos para o ambiente familiar. Que impactos são esses? O estresse,
a sobrecarga familiar pode gerar a presença de ansiedade, depressão, em especial
para aqueles que assumem o cuidado, porque isso gera preocupação, como vai ser
a vida daquele indivíduo no futuro e o que vai acontecer com ele quando a família
não estiver mais presente. Todos esses são fatores podem ser minimizados com a
regulamentação do aprendizado ao longo da vida.
Eu espero ter contribuído. Não vou me estender mais. Tenho muito a dizer,
mas o tempo é curto. Espero que nós possamos ter outras oportunidades, mas, se
não as tivermos, no debate poderemos aprofundar um pouquinho, para que os
senhores saiam daqui pelo menos com essa mensagem que eu quis passar:
Neurociência não é algo para estar na universidade, dentro de laboratório; é algo
para contribuir em especial com a educação. A educação carece muito desse
argumento científico de como nós funcionamos, como nós vamos aprender. Isso
tudo é base neurocientífica.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Muito obrigado, Patrícia.
Eu acho que a mensagem foi dada aos Parlamentares envolvidos nessa
questão. Nós precisávamos justamente dessa fundamentação para levar à frente a
discussão dentro do Congresso.
Eu quero ressaltar a presença da Sra. Gicileide Oliveira, que é Diretora do
Centro de Ensino Especial do Guará, no Distrito Federal. É um prazer ter a senhora
conosco mais uma vez.
Registro a presença da Sra. Cecília Gomes Muraro, que é psicóloga da APAE
do Distrito Federal; da Sra. Vera Lúcia, quem eu já havia citado; da Sra. Fabiana
Maria das Graças Oliveira, que é Coordenadora Nacional de Educação e Ação
Pedagógica da Federação Nacional das APAEs; da Profa. Erenice Natália Soares de
Carvalho, que é uma especialista e referência na educação especial, já foi Diretora
da Educação Especial do Governo do Distrito Federal e é Consultora da Federação
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Nacional das APAEs. Ela tem vários livros publicados, vários trabalhos à disposição
da ciência brasileira.
Destaco a presença da Sra. Maria Sônia da Silva, da Federação Estadual das
APAEs do Estado de Pernambuco; da Sra. Júnia Ângela, da Federação Estadual
das APAEs do Estado de Minas Gerais, que trabalha conosco e é minha
conterrânea; da Sra. Geórgia Galvão, da APAE de Caruaru, de Pernambuco; da Sra.
Cristiane da Silva Ballester, da Federação das APAEs do Estado do Amazonas; da
Sra. Maria Helena Alcântara de Oliveira, que é Diretora da APAE do Distrito Federal,
Coordenadora da Área de Educação Profissional da Federação Nacional das APAEs
e também antiga militante; do Sr. Luciano Ambrósio, que é do gabinete do Senador
Paulo Paim. É um prazer tê-lo conosco. O Senador Paulo Paim foi nosso colega e
fez a proposição inicial do Estatuto da Pessoa com Deficiência e do Estatuto do
Idoso. Eu tive a honra de presidir a Comissão Especial que o analisou.
Encontra-se presente também a Sra. Maria Cristina Jorge Maróstica, da
Federação das APAEs do Estado de Goiás; e da Sra. Cristiane Andersen, que é
Gerente-Geral da Federação Nacional das APAEs.
Agora nós vamos ouvir o “mundo oficial”, aquela que vai dar continuidade ao
debate que nós estamos realizando. Com muita alegria, recebemos e já
cumprimentamos, porque ela é a recém-nomeada Diretora de Políticas de Educação
Especial e aqui também representa a Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização, Diversidade e Inclusão — SECADI, do Ministério da Educação, a
Secretária Ivana, que está na reunião do Conselho Nacional de Educação, e
representa ainda o nosso Ministro da Educação.
Patrícia Neves Raposo, desejo-lhe sucesso na sua trajetória. Confiamos
muito na senhora e sabemos que a senhora está nos representando no Ministério da
Educação. Com certeza, nessa questão específica, nós precisamos muito que a
senhora seja a grande coordenadora desse processo de regulamentação da
educação ao longo da vida.
Com a palavra Patrícia Neves Raposo.
A SRA. PATRÍCIA NEVES RAPOSO - Boa tarde a todos.
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Deputado Eduardo Barbosa, quero agradecer a V.Exa. pelo convite e pela
oportunidade de, na Câmara, a nossa Casa, discutir um tema tão importante. Quero
agradecer pela participação nesta Mesa e a todos os presentes a esta discussão.
Sem dúvida, este tema representa desafios para o poder público e para a
sociedade civil. É um tema que tem sido estudado por alguns teóricos, ainda de
forma tímida, na minha opinião, mas que terá um impacto significativo na vida de
muitas pessoas com deficiência.
Eu estou aqui representando — desculpem-me, eu deveria ter iniciado com
esta informação — a Secretária Ivana de Siqueira, da Secretaria de Educação
Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão — SECADI do Ministério da
Educação. Eu, Patrícia, estou na Diretoria de Políticas de Educação Especial.
Agradeço, mais uma vez, a presença de todos e o seu convite, Deputado
Eduardo Barbosa.
Eu quero trazer para a discussão, para a reflexão e, em algum momento,
acredito, para a nossa inquietação, algumas questões. Vou partir dos aspectos
legais, para que nós possamos discutir e levantar alguns pontos importantes em
relação ao tema.
Já foi falado, mas eu vou tratar, rapidamente, de alguns aspectos da
Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, adotada pela
Organização das Nações Unidas, em especial no seu art. 24; e sobre a Lei Brasileira
de Inclusão da Pessoa com Deficiência, no seu art. 27, que diz respeito ao direito à
educação e à responsabilidade do Estado. No caso da Convenção, o direito à
educação, assegurando o sistema de ensino inclusivo e o aprendizado ao longo da
vida.
Este é um tema extremamente importante, e eu vou fazer, em breve, uma
referência à questão da educação e da aprendizagem. Mas entendemos que o
nosso ordenamento jurídico enfatiza este tema, que é importante, porque fala da
vida, do curso da vida.
(Segue-se exibição de imagens.)
Eu estou apresentando alguns slides — não sei quem os está acompanhando
—, e este material também representa a minha fala. Se houver qualquer dúvida,
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depois nós poderemos conversar, dialogar sobre o assunto. Os slides trazem alguns
pontos escritos, mas eu vou falar sobre cada um deles.
O chamado fluxo escolar. A palavra fluxo também tem sido discutida, tem sido
estudada. É difícil eu não trazer aqui meu viés de professora, de pesquisadora, de
estudiosa, principalmente, desse tema, e muito curiosa. Mas o fluxo escolar,
principalmente, tem sido discutido. Ele é de fundamental importância quando
pensamos em educação e em aprendizagem.
Em nosso País, nós temos um início, que é a escolarização, e temos um
momento em que essa escolarização, esse percurso escolar está legalmente
determinado. Se for pelo fluxo escolar normal, a pessoa entra na educação infantil e
vai até o ensino superior, o último nível de ensino.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a
educação básica deve ser gratuita e obrigatória de 4 a 17 anos. Nós temos essa
garantia, pelo poder público, pelo Estado, em primeiro lugar. Isso é importante e,
inclusive, consta do Plano Nacional de Educação. A LDB garante também a
educação infantil para crianças de até 5 anos.
Nós sabemos que isso tem um impacto na educação de crianças com
deficiência, em razão dos problemas que essa criança pode ter no seu
desenvolvimento. Sabemos da importância do trabalho nesse período da vida. É
necessária uma estimulação precoce ou qualquer outro termo que signifique isso.
Parece que o termo estimulação precoce não tem sido bem aceito nos últimos
documentos técnicos. Mas ela deve acontecer, com o objetivo de minimizar os
problemas do desenvolvimento.
Vemos também a necessidade das crianças nascidas, nesses últimos 2 anos,
com microcefalia, em razão do zika vírus. Então, é de grande importância esse item.
Queremos que as pessoas que não realizaram, que não cursaram o ensino
fundamental e médio na idade correspondente também tenham a oportunidade do
acesso, por meio de outra modalidade de educação.
E outro aspecto importante, uma figura que surge na LDB, no Capítulo V, Da
Educação Especial, no art. 59, que é a terminalidade específica. Eu quero tratar
desse assunto em breve, mas a LDB — Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional garante a terminalidade específica aos alunos que não tiveram a
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possibilidade de atingir o nível exigido para a conclusão do ensino fundamental na
idade própria — e frisa — em razão das suas deficiências. Então, é assegurada a
terminalidade específica para esses alunos.
Como podemos entender isso? Vamos fazer uma análise dessas questões
legais na escolarização.
Como eu disse, educação e aprendizagem são processos distintos. A
educação é entendida como um processo formal, definido na nossa legislação, que
se inicia com a educação infantil e passa por etapas e modalidades, até o ensino
superior, tendo a educação especial como uma modalidade transversal. Ou seja, em
qualquer etapa ou modalidade de ensino, a educação especial atua para atender
especificamente alunos que apresentam necessidades específicas de
aprendizagem, por meio de atendimentos diferenciados previstos em lei, como foi
citado aqui pela Malvina, do Conselho Nacional de Educação.
A universalização da educação infantil tem problemas. O próprio Plano
Nacional de Educação indica que a universalização não será alcançada nos 10 anos
entre 2014 e 2024. Está previsto que apenas metade da demanda de crianças na
faixa etária de zero a 4 anos será atendida, o que representa uma questão a ser
trabalhada. A implantação de creches que possam atender adequadamente todas as
crianças é um desafio para o Ministério da Educação, mas também para toda a
sociedade. Nós acreditamos que há motivo para a criação de creches para crianças
que necessitam de atendimento especializado, por diversas razões. Assim como
hoje há uma política interministerial para cuidar da questão do Aedes aegypti, nós
acreditamos que essa demanda da educação infantil também vai mobilizar a
estrutura do Estado para tratar da construção de creches para todas as crianças que
necessitam delas.
O ensino fundamental é uma importante fase da escolarização, pois é a fase
do letramento, do numeramento, da oralidade, do desenvolvimento integrado, das
habilidades e competências curriculares do aluno. Muitas vezes, porém, sua
organização escolar e curricular não atende às necessidades de aprendizagem. Aí
há um problema de fluxo.
Eu gosto muito de citar o que o estudioso Luiz Carlos Freitas, da Universidade
de São Paulo, chama de trilhas. Num texto sobre a internalização da exclusão —
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não somente de pessoas com deficiência—, ele diz que muitas vezes são
construídas trilhas no fluxo escolar. Essas trilhas são menos favorecidas e já
carimbam o destino desse aluno no percurso escolar.
Em relação à questão do fluxo e das trilhas, uma das alternativas pode ser a
terminalidade específica, como possibilidade de corrigir o fluxo. Mas ela teve uma
implicação. A terminalidade acabou criando uma demanda de alunos com
deficiência para a educação de jovens e adultos e para a educação profissional, que
não estavam — e, em minha opinião, ainda não estão — totalmente organizadas
para atender essa demanda. Segundo dados que ainda estão sendo mais bem
analisados, o número de alunos com deficiência intelectual e deficiência múltipla é
muito grande, chega a quase 100 mil. Por isso, é importante compreender o que
aconteceu. A educação de jovens e adultos — EJA e a educação profissional ainda
estão em processo de organização, de construção de possibilidades. Por várias
razões, não havia essa demanda, mas agora há.
No ensino médio, na EJA correspondente e no ensino superior, a realidade é
outra. Mesmo que a lei tenha organizado e provocado a construção de núcleos de
acessibilidade para atender as necessidades específicas dos alunos no ensino
superior, a flexibilização do currículo — que é necessária — às vezes está indo de
encontro ao que é desejado para a formação profissional. É como se a formação de
uma pessoa deficiente fosse inferior. Por exemplo, é fundamental um geógrafo com
cegueira fazer uma maquete? Será que é fundamental? Isso foi questionado. E uma
pessoa cega se tornou geógrafa sem fazer uma disciplina de construção de
maquetes. Isso foi entendido como uma flexibilização, e ele se formou sem essa
exigência. Mas isso, na maioria das vezes, não acontece. Ao contrário, as
universidades, as instituições de ensino superior negam essa flexibilização,
considerando a formação desse aluno como inferior.
Portanto, todo o sistema de ensino está se adaptando para receber uma
diversidade de alunos com deficiência, que chegavam até o ensino fundamental,
quando chegavam. Essa é uma realidade.
Nós precisamos trabalhar no que é chamado de aprendizagem ao longo da
vida. A aprendizagem precisa ser entendida como um processo singular de cada
sujeito, nos vários momentos da sua vida, que está mediado por relações sociais.
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Tanto a quantidade quanto a qualidade das relações sociais desses sujeitos,
independente dos espaços onde estão integrados — não falamos em espaços mais
ou menos inclusivos, falamos em espaços sociais —, causam um impacto nessa
aprendizagem mediada.
A aprendizagem ao longo da vida deve ser uma garantia, e para nós, no
Ministério, ela é um ponto de estudo e de reflexão. Vamos promover estudos sobre
essa questão, inclusive da sua interface com as escolas especializadas e seu papel
no desenvolvimento das pessoas com deficiência e no contexto do desenvolvimento
humano. Não podemos deixar de fora a questão da aprendizagem ao longo de toda
a vida, que não necessariamente precisa acontecer em espaços escolares.
Como a minha xará Patrícia falou aqui, a aprendizagem pode acontecer ao
longo de toda a vida, do ponto de vista do desenvolvimento da neuroplasticidade e
da psicologia histórico cultural, a partir de novas e melhores organizações sociais.
Enfim, as ciências têm explicações teóricas, mas é importante promover ações e
desenvolver políticas que atuem no sentido de melhorar a vida das pessoas com
deficiência, já que essas pessoas têm envelhecido.
Salientei a questão do envelhecimento da pessoa com deficiência,
especialmente a intelectual. Tenho conversado sobre esse assunto com a Profa.
Erenice Carvalho — somos grandes amigas e companheiras de estudos e debates.
Ela e outros especialistas, com certeza, poderão trazer muito mais textos e estudos
sobre essa questão.
Mais uma vez, quero agradecer. O MEC está à disposição para discutir, traçar
melhores ações e políticas para a educação do nosso País, sem excluir nenhum
grupo. A inclusão é um processo relacionado a todo e qualquer aluno. Então,
trabalhamos com a educação formal, mas cremos que a aprendizagem, sem dúvida,
deve ocorrer ao longo de toda a vida.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Muito obrigado, Patrícia.
Eu acho que é um alento esse indicativo que você nos traz, estabelecendo um novo
diálogo, inclusive com segmentos representativos, para que nós possamos
vislumbrar essa organização de sistema que alcance essa perspectiva. Obrigado.
Peço que você transmita o nosso abraço ao Ministério da Educação como um todo.
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Quero ressaltar a presença dos Deputados Pedro Uczai e Aliel Machado; da
Viviane Guimarães, do Movimento Orgulho Autista Brasil; da Maria Alzira Correia da
Silva, da Federação das APAEs do Estado do Rio Grande do Norte; da Arabella
Nóbrega, Conselheira Escolar do Centro de Ensino Especial de Brasília; e também
da Marciane Machado Silva, Presidente da Federação das APAEs do Estado de
Tocantins.
Agora, nós vamos passar para a mãe e Deputada Zenaide Maia, que vai
trazer o seu olhar, representando as mães brasileiras. Nós a convidamos justamente
para fazer com que o Brasil entenda que aqui no Parlamento também há pessoas
que vivenciam o que vocês vivenciam lá fora. O Congresso brasileiro é tão colorido,
porque traz as diversas vertentes das necessidades da população brasileira.
Tem a palavra a Deputada Zenaide Maia.
A SRA. DEPUTADA ZENAIDE MAIA - Boa tarde a todas e a todos aqui
presentes.
Eu quero agradecer o convite do meu colega Deputado Eduardo Barbosa,
que defende as pessoas com deficiência. Este é o meu primeiro mandato. Quando
cheguei aqui e o vi, eu disse: “É do lado dele que eu vou estar”.
Quero agradecer a presença de todos que compõem a Mesa e dos meus
colegas Deputados.
Aqui é a Zenaide mãe que está falando. Nós ouvimos muito sobre a criança
deficiente, mas eu acho que só nós temos a vivência. Primeiro, você se prepara para
receber aquele filho, e é um impacto quando o pediatra diz que seu filho tem que ser
reavaliado e estimulado.
Após esses anos todos de convivência com César, o meu filho, eu costumo
dizer que o deficiente, principalmente o intelectual, tem uma luta muito grande,
porque ele começa brigando para que a família aceite sua deficiência. Deputado
Eduardo e todas vocês que são mães, eu sou médica e vi muito isso. Não é por uma
questão de egoísmo, mas a mãe e o pai ficam com aquela esperança de que o
diagnóstico esteja errado e que seu filho realmente não tenha uma patologia com a
qual se tenha que conviver a vida toda.
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Depois desse impacto, passamos a vibrar com cada pequena vitória que ele
tem, como uma passada, se ele não anda. O meu filho é deficiente intelectual e tem
dificuldade de andar. Então, quando ele anda, a mãe vibra.
Eu percebi algo sobre o que a professora e cientista falou: toda família de
deficiente tem a tendência de superprotegê-lo. Nós temos essa tendência, o que não
é bom, por um lado. Como mães, nós temos a tendência de superprotegê-los, mas
temos outros filhos que não têm deficiência. Tive a primeira filha, o Cesinha foi o
segundo, e tive um terceiro filho, depois de 5 anos. Então, começamos a ter um
olhar diferenciado para o filho deficiente, mas o irmão, muito criança, não entende
aquele comportamento. Portanto, temos que nos dar conta de que vivemos num
núcleo familiar.
Também é muito lindo nós ouvirmos que a mãe tem que se dedicar só ao seu
filho, para estimular e para dar maior atenção a ele. Mas essa família tem que ter
uma vida e trabalhar, porque a maioria das crianças com deficiência adoece mais,
tem morbidades mais do que o comum. Então, temos que nos preocupar em ter
mais recursos para cuidar dessa criança. Nós, que somos mães, sabemos que não
é tão simples oferecer estimulação, assistência médica, tudo isso.
Então, Deputado Eduardo, é dito que a mãe não deveria trabalhar, mas a mãe
tem que trabalhar. Muitas vezes, nós sentimos remorso por deixar nosso filho. Nós
formamos, naturalmente, um grupo de mães que levavam seus filhos para trabalhar
psicomotricidade, fonoaudiologia etc., e eu via isso nas colegas. Mas eu sempre
dizia assim: “Não podemos sentir peso de consciência, porque nós não estamos
deixando nossos filhos para nos divertir. Nós estamos indo para o trabalho, para
melhorar as condições de vida deles, as quais nós sabemos que são muito mais
difíceis.”
Eu queria manifestar a vocês a minha felicidade por encontrar aqui uma
população que aparentemente era invisível. No ano passado, criou-se esta
Comissão de Defesa dos Direitos dos Deficientes. Poderia ser dito que não havia
necessidade dela, porque o deficiente já era defendido na Comissão de Direitos
Humanos, na Comissão de Educação e na Comissão de Seguridade Social e
Família. Mas a criação deste espaço de debate é inestimável, por permitir às mães
de todo o País que nos ouvem dizerem: “Nós podemos!”
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Meu filho já é adulto, tem quase 40 anos. Eu disse ao meu amigo Deputado
Eduardo Barbosa, que tem grande experiência, e à minha colega Deputada Carmen
Zanotto que, quando os deficientes passam da faixa dos ensinos normais, é como
se eles deixassem de existir. Não existe nada para essas crianças, quase nada,
mesmo para quem tem condições financeiras. Se você quer estimular uma
educação ao longo da vida para o seu filho, você escolhe um psicólogo aqui, uma
equoterapia ali. Mas um local onde ele vai continuar a se desenvolver não existe.
Falta um espaço para essa população, que é como se deixasse de existir a partir de
uma etapa.
A escola do meu filho é especializada. Inicialmente, o Estado, o Município era
responsável, mas os professores foram retirados. O César tem 15 colegas, os quais
eu tento manter.
César não fala. Meu filho tem uma deficiência intelectual grande e não fala.
Isso para a mãe é difícil, porque nós nunca sabemos exatamente o que ele quer
comunicar. Ao longo do tempo, desenvolvemos uma ideia do que ele está sentindo
ou do quer dizer, mas é diferente.
Eu costumo dizer que nós, pais dos deficientes, temos um medo maior de
morrer do que a população em geral. Como a colega falou aqui, pensamos logo em
quem vai cuidar deles. Isso é uma coisa muito palpável, muito real.
A educação continuada, ao longo da vida, dá maior autonomia, permitindo a
cada um comer com a própria mão e ir aonde puder. Não há dúvida, nós mães de
deficientes comemoramos cada vitória, como ver nosso filho comer com a própria
mão, andar sem depender de ajuda, saber nadar.
Quando César não ia para a aula — nós temos uma tendência de, se ele não
quer ir para aula na escola especializada, não levá-lo —, o meu filho menor me dizia
assim: “Cesinha só vai para a aula quando quer”. Eu respondia: “Meu filho, você não
vê que seu irmão não fala?” Aí ele, com 5 anos, disse: “Ele não fala, mas ele sabe
nadar, e eu não sei nadar”. Então, nós temos que equilibrar isso tudo.
Os homens que me desculpem, mas em mais de 60% das famílias — no
mundo todo, não só no Brasil —, geralmente o pai sai de casa. Eu agradeço a Deus
por não ser meu caso, porque nós sabemos que não é fácil cuidar sozinho dos
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filhos. Nada substitui uma família formada, mas as mães correm atrás. Essa é a
nossa vida real, de cada mãe aqui.
Eu tenho um prazer imenso em defender essa causa. Por isso, quando o
Deputado Eduardo perguntou se eu queria ir como mãe, eu disse: “Olha, é o meu
principal papel. Com certeza, vou estar lá”. Tenho certeza de que as mães que estão
presentes, para as quais eu estou olhando agora, sentem a mesma coisa que eu.
Temos um olhar diferenciado para o nosso filho.
Dra. Patrícia falou de uma coisa sobre a educação que me chamou atenção.
É importante que se tenha conhecimento para saber lidar com o desenvolvimento
neurocognitivo e com a educação dos deficientes. Nós, as mães, temos tendência
de deixar os nossos filhos fazerem tudo, porque são deficientes, mas não podemos
fazer isso.
Estamos otimistas, após ouvirmos nossas convidadas — coincidentemente,
aqui estão duas Patrícias —, por sabermos que esse assunto já está em pauta e ter
visibilidade, não só no MEC, mas nesta Casa.
Eu costumo dizer que esta Casa tem uma importância fundamental, porque
aqui se decide cada detalhe da vida de cada cidadão: do salário, da carga horária
até o medicamento que deve ir ou não para a prateleira. A conquista deste espaço
democrático para defender quase um quarto da população é importante, porque as
pessoas passam a nos ver. É como se essa população não fosse vista antes do
Estatuto da Inclusão, antes da Deputada Mara Gabrilli mostrar sua competência.
Eles eram visíveis até os 17 anos, enquanto estavam na escola. Agora, se
Deus quiser, a educação continuada vai passar, e nós vamos lutar para que eles
sejam vistos ao longo de toda a vida.
Então, Deputado Eduardo Barbosa, eu quero agradecer a cada um dos
presentes. Obrigada a todos vocês! Contem com Zenaide! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Obrigado, Deputada
Zenaide Maia.
Acho que V.Exa. foi muito bem escolhida para estar aqui falando como mãe,
pela sua sensibilidade, pela sua riqueza de expressão. V.Exa. fala com os olhos, fala
com a face e com esse sotaque potiguar gostoso, que também nos envolve.
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Os nordestinos são muito mais expressivos do que os brasileiros de outras
regiões. Isso, aliado ao sentimento que V.Exa. passou, só engrandece a nossa
Mesa. Obrigado, Deputada.
Eu quero destacar uma coisa. Muitos Parlamentares têm pessoas com
deficiência na família, mas poucos têm a coragem de se expor como pais ou como
parentes de uma pessoa com deficiência. E a presença da Deputada Zenaide
também desmistifica isso, porque é um assunto que muitas vezes não é revelado
pelos próprios familiares. Na medida em que S.Exa. coloca — como sempre colocou
desde o primeiro momento — a sua vida pessoal nesse aspecto também como fonte
de inspiração para um mandato político, isso é para nós também um exemplo, que
se deve estender a outros agentes políticos que escondem esse tipo de questão por
eles vivenciada.
Então, Deputada Zenaide Maia, é isso o que a sua exposição representa para
nós desta Mesa. São poucos os que têm coragem de se expor.
Eu quero ressaltar a presença de Maria da Glória Motta, representante da
Organização Nacional dos Cegos do Brasil. É uma alegria muito grande receber a
Glorinha, nossa amiga de muitos anos. Também estão presentes a Arabella
Nóbrega, Conselheira Educacional do Centro de Ensino Especial nº 1, de Brasília; o
Prof. José Rafael de Miranda, Coordenador-Geral de Desenvolvimento da Educação
Especial, da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e
Inclusão — SECADI, do Ministério da Educação, que foi Diretor da Secretaria de
Educação Especial, do Distrito Federal, e é também um especialista na área há
muitos anos; e Vanessa Carvalho de Soares, Assistente da Diretoria de Políticas de
Educação Especial, do Ministério da Educação. Obrigado pela presença.
Agora nós vamos encerrar a exposição, como eu disse, com a participação da
esperança (riso), daquilo que é real, vivenciado com a experiência prática. A Débora
Dantas veio representar isso para nós através de um projeto chamado Coletivo
Filhos da Flor.
Eu dou a palavra, então, a Débora Dantas.
A SRA. DÉBORA DANTAS - Boa tarde a todos. É uma satisfação estar aqui.
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Sou professora da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais —
APAE/DF e estou representando o Coletivo Filhos da Flor, um projeto que está
sendo desenvolvido desde abril deste ano na APAE da 911 Sul.
Nós nos encontramos, na semana passada, com o Deputado Eduardo
Barbosa — eu e a idealizadora do projeto, a Profa. Astrid, que também está na
APAE desde este ano. E foi uma satisfação, foi uma alegria sermos convidadas para
vir apresentar a vocês esse projeto que estamos realizando. Ele está apenas no
comecinho, mas já está fazendo bastante diferença.
(Segue-se exibição de imagens.)
Este é o nosso projeto, que se chama Filhos da Flor. Aí estão algumas fotos
de alguns poucos dos nossos alunos. Nesse projeto, nós pensamos em trabalhar
com o corpo e a alma desses alunos, extrapolando o corpo na medida do limite de
cada um, através da dança e além de qualquer limitação — não limitação física, mas
aproveitando tudo o que há de melhor neles.
Esse projeto tem algumas intervenções humanas e urbanas também. Então,
nós extrapolamos o limite físico da APAE e vamos às ruas. Nós queremos ser vistos,
nós queremos que os alunos sejam vistos. E eles estão sendo vistos e estão sendo
muito recebidos. Essa é uma das nossas intenções.
O que nós queremos com esse projeto é defender a tolerância e as
diferenças. Este é um ponto crucial dele: a inclusão através da tolerância às
diferenças.
O homem depende de cooperação, e a natureza dotou-o do aparato instintivo,
do qual pode surgir a cordialidade necessária para a colaboração. Então, nós
necessitamos interagir com o outro. Portanto, no momento em que fazemos as
nossas intervenções, em que estamos nas ruas, em pontos turísticos ou lugares que
nos recebem de braços abertos, nós estamos fazendo essa ponte, nós estamos
cooperando para que esses alunos sejam vistos, sejam recebidos e sejam queridos
também.
Esse projeto é destinado a alunos e a professores também, a pais, a
familiares e a vários parceiros. Hoje nós temos vários parceiros e colaboradores,
entre fotógrafos, dançarinas, bailarinas, designers. Esse projeto está contando com
muita ajuda, muita colaboração.
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Por trás de cada eslaide que eu exibir, há sempre uma intervenção. Cada foto
destas foi tirada numa intervenção feita. Então, fomos à Torre de TV, à Ermida, a um
haras. Nós estamos correndo Brasília inteira.
Como nasceu o Coletivo Filhos da Flor? O projeto nasceu da empatia
multiprofissional, objetivando capitular essa força solidária. Nós queremos semear o
amor entre os homens, cunhando também o hábito da benevolência, em busca de
uma convivência sustentável, de uma convivência amorosa, de uma convivência
aceitável.
As nossas escolhas. Nós definimos as nossas ações embasadas na
perspectiva de sensibilidade e de valorização do afeto. Delineamos os direitos
humanos que merecem proteção como patrimônio social e simbólico e buscamos
ações, reflexões, fundando um padrão ético amoroso que oriente uma nova conduta
individual e coletiva.
Eu vim aqui representar a parte prática de todo esse debate, de toda essa
conversa — nós fomos convidadas a fazer isso. Mas nós temos, é claro, uma
fundamentação, que está aí. Nossas ações e intervenções estão norteadas no
direito da pessoa com deficiência, com fundamento principalmente na Constituição
Federal, na Convenção das Nações Unidas e na Lei Brasileira de Inclusão — LBI.
Aí estão os arts. 8º, 28 e 43 do Estatuto da Pessoa com Deficiência, aos quais
nós nos apegamos. O art. 8º diz que é dever do Estado assegurar o direito à
educação, à cultura, ao desporto, ao lazer, à convivência familiar e comunitária. O
art. 28 fala da educação inclusiva ao longo de toda vida. O art. 43 fala que o poder
público deve promover a participação da pessoa com deficiência em atividades
artísticas — eles estão virando verdadeiros artistas —, intelectuais, culturais,
esportivas e recreativas, com vistas ao protagonismo.
Nossos objetivos. O projeto se iniciou em abril, sendo que os nossos objetivos
já estão bem à frente daquilo a que nós nos propusemos: desenvolver o potencial
artístico, intelectual e social dos aprendizes. Então, eles estão aí e são verdadeiros
artistas, são protagonistas. Eu vim aqui muito colorida, mas não mais do que eles,
que saem completamente fantasiados e muito bem arrumados. Nós chamamos a
atenção, dançamos na rua. Sempre que saímos, contamos com um fotógrafo.
Fazemos intervenções, conversamos com as pessoas e caminhamos.
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Então, um dos nossos objetivos é promover o potencial artístico, intelectual e
social, sendo eles os protagonistas. Assim promovemos a autoestima, a criatividade
e o aprendizado ao longo da vida. Também é nosso objetivo promover a formação
cultural e artística dos professores, porque, se eles trabalharem felizes, os alunos
também vão receber aquela carga de energia positiva, feliz e alegre. E isso
engrandece o nosso trabalho, o nosso projeto, o nosso dia a dia e a vida deles e de
seus familiares.
Nossa inspiração. Esta é uma foto minha com uma aluna. A nossa inspiração
foi o movimento da contracultura, que teve seu auge na década de 60, quando
nasceu um novo estilo de mobilização. Havia ali um espírito libertário. Eles eram
jovens libertários, queriam transformar, queriam modificar, queriam sair da mesmice.
Por isso, nós nos inspiramos nesse movimento da contracultura. Tanto é que as
roupas que vestimos, as maquiagens que fazemos e os adereços que usamos são
todos baseados nesse movimento.
Estas são as intervenções humanas de que falei. Algumas são feitas através
de fotos. Para aqueles que têm maior problema de mobilidade, nós fazemos
algumas fotos na APAE. Mas a dificuldade em mobilidade não é problema para nós,
porque mobilizamos um grande número de professores, todos muito engajados, e
vamos para as ruas.
Estas são as performances de rua, com manifestações artísticas sempre
ligadas à dança. Uma das nossas estratégias são as intervenções humanas.
Ao final do ano, a nossa intenção é fazer um musical, que será intitulado
Filhos da Flor. Então, além das fotos e das intervenções, temos a intenção de fazer
um musical no final do ano, que já começou a ser preparado.
Inclusive, haverá a abertura do projeto no dia 19, na próxima sexta, às 19
horas, na sede da APAE, na 911 Norte. Nesse dia, serão expostas 1.200 fotos das
intervenções que fizemos de abril até agora, das coreografias que já temos prontas
até hoje e das músicas.
Então, convido todos vocês para a abertura do nosso projeto no dia 19. Não
aconteceu ainda a abertura do projeto, que é bastante novo.
Nós temos um lema: Dance bem, dance sem parar, dance até sem saber
dançar. Mexa-se, ouça a música, sinta a alegria, vista-se e vá! E eles vão com um
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sorriso no rosto. Muitas vezes, nós vemos alguns quietinhos, caladinhos, sentados,
com sono por conta de muitas medicações. Nós dissemos: “Levante-se! Vamos
embora! Enfeite-se! Ponha uma saia! Ponha uma roupa!”
Nós temos o hábito de colocar uns enfeites, um arco de flores na cabeça —
eu vinha com um deles, mas acabei não vindo. Todos eles têm uma jaqueta com a
propaganda do nosso projeto. E aí nós nos vestimos e vamos para a rua, vamos
dançar. Se não formos para a rua, vamos para a sala de dança da APAE. Mas
sempre estamos nos movimentando.
Esta é a nossa equipe técnica e pedagógica, composta pelas professoras,
cada uma na sua função. A Cida Bontempo, lá em cima, é a nossa coordenadora; a
Astrid, à direita, é a idealizadora do projeto Coletivo Filhos da Flor. Todas as outras
são diretoras, colaboradoras e professoras do projeto, trabalhando com muita garra,
com muita fé, com muita esperança e com muita inspiração.
O Coletivo foi dividido em 13 tribos, sendo que cada uma dessas tribos tem
um tema. Só para exemplificar, Rosa Atômica é uma tribo. Então, nós nos vestimos
de acordo com o que a música diz, com o que se passou à época, e fomos tirar fotos
na Praça dos Três Poderes. O fotógrafo tirou nossas fotos. Lá nós levamos o tema
Pacifismo.
Já tivemos também a tribo É Cor de Rosa-Choque. Todos se vestiram de
rosa-choque. Fomos para um haras, onde fizemos as danças e as intervenções e
tiramos as fotos. Tudo isso será apresentado no dia 19.
Além da inauguração desse coletivo, que será no dia 19 de agosto, às 19
horas — não é difícil lembrar —, nós temos uma página do Facebook, chamada
Filhos da Flor, que é movimentada diariamente, sempre com novidades. Estamos de
férias até o final desta semana. A partir da semana que vem, ela será movimentada
diariamente.
Era isso que tinha a dizer. Agradeço a atenção de vocês. Espero que estejam
lá de verdade, porque vai ser muito bonito.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - A Débora vai ficar me
devendo, porque eu havia lhe pedido que viesse a caráter hoje. Mas acho que nós
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Deputados a inibimos, porque ela se caracteriza toda. Nós queríamos que eles
chegassem aqui todos caracterizados.
Débora, você ficou meio tímida! Foi a Eugenia que disse para você não vir a
caráter? (Risos.)
A SRA. DÉBORA DANTAS - Não. (Riso)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Informo a vocês que a
Eugenia é a nossa Secretária da Comissão de Educação, que está aqui e,
felizmente, também teve uma trajetória profissional na educação especial. Nada é
por acaso, por isso, hoje ela está secretariando a essa Comissão de Educação. Ela,
que é muito amiga da Débora, conheceu esse projeto e tem sido nossa facilitadora.
Nós estamos vivendo um bom tempo, Deputada Zenaide Maia, em que as
coisas todas vão se aglutinando a favor da defesa das ideias que compartilhamos.
Gostaria de conceder a palavra a algumas pessoas inscritas, apesar de o
nosso tempo estar avançado. Combinei aqui com os representantes do Ministério do
Desenvolvimento Social e Agrário que eles fariam uso da palavra rapidamente, pois
terão condição de fazê-lo mais apropriadamente em outros momentos.
A nossa ideia pessoal é que possamos estabelecer um encontro entre a
política de educação ao longo da vida, por meio do Ministério da Educação, mas
também nos aproximando do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário,
porque, dentro da Política Nacional de Assistência Social, eles têm
responsabilidades com esse público adulto e em envelhecimento, através de
programas desenvolvidos pela política nos centros-dia ou centros de convivência.
Nós poderíamos justamente promover uma interface dessas políticas,
enriquecendo os programas de atenção a esse público. Inclusive, eu e a Patrícia já
conversamos um pouco sobre isso. Acho que o próximo movimento talvez seja o de
estabelecermos essa construção de um modelo em consonância com as duas
políticas, para que, lá na ponta, elas sejam implantadas de forma prática, efetiva e
real. Isso depende muito dos gestores municipais. Mas, se a diretriz nacional já
estabelecer essa interface, fica muito mais fácil a articulação no Município.
Registro que temos aqui a presença do Secretário Nacional de Atenção à
Saúde, do Ministério da Saúde. É um prazer muito grande tê-lo aqui.
Concedo a palavra à Sra. Deusina.
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A SRA. DEUSINA LOPES DA CRUZ - Inicialmente, eu quero agradecer e
parabenizar o Deputado Eduardo Barbosa. Todos nós que trabalhamos nessa área
sabemos do seu empenho pessoal. Nós nos conhecemos há muito tempo, por
vários motivos, sendo esse o principal motivo.
Estamos aqui a pedido da nossa Secretária Maria do Carmo Brant e da nossa
Diretora Renata, para que acompanhássemos a audiência e colocássemos o nosso
Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário à disposição de todos.
Estão aqui conosco representantes da nossa área de benefícios e da nossa
área de residência inclusiva. Nós trabalhamos com serviços da média complexidade
mais expressivos, sendo o centro-dia um dos que se ouve mais falar.
Gostei muito das exposições de todos. Eu me senti supercontemplada,
principalmente com relação à neurodiversidade. Eu tenho um filho autista de 34
anos. Há 2 anos, quando eu tive um câncer, ele virou para mim e disse: “Isso vai
passar, porque o seu DNA é forte”. E o câncer passou. Aí eu falei: “Olha, não sei se
o meu DNA é forte, mas sei que o teu santo é forte”. (Riso.) Então, temos mil
histórias.
A Nizarete está aqui também, com o filho dela da mesma idade. É uma
companheira. Todo mundo tem sua história de vitória. Nós crescemos muito em
função deles.
Nós realmente sentimos a falta enorme de uma educação especializada na
adolescência e na fase adulta. Todos nós criamos as nossas escolas aqui no Distrito
Federal, com Rafael e todo o mundo. Nossas crianças passaram pelo ensino
integrado. O Carlos Filipe estudou até o sexto ano. Mas a verdade é que a fase da
adolescência e da vida adulta necessita de um processo de aprendizado mais
funcional e específico. E parece que nós não contamos muito com a adesão dos
serviços, que não apostam muito em nós.
A Política Nacional de Assistência Social reconhece a necessidade dos
cuidados e da proteção aos jovens, adultos, mães cuidadoras, cuidadores e
familiares como elemento fundamental para o desenvolvimento das pessoas com
deficiência e do núcleo familiar, dos nossos filhos que não têm deficiência, de tudo
aquilo de que a nobre Deputada falou com muito propriedade.
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Quando isso veio para a letra, fazendo parte da política Política Nacional de
Assistência Social, os serviços na proteção básica, os serviços de convivência
puderam ser ofertados pelo gestor municipal, em parceria com entidades. E nós
vimos que mais de 4 mil Municípios preencheram o Censo dizendo que, em parceria
com as entidades ou por iniciativa própria, eles ofertavam serviços com perfil
compatível ao do serviço de convivência.
É claro que está faltando um pouco desse polimento que estamos definindo
aqui. Mais de 600 Municípios também responderam que prestavam algum serviço
compatível com o centro-dia, que trabalhavam com jovens e adultos e com pessoas
idosas e com deficiência nessa perspectiva da proteção e do cuidado, nessas
atividades que nós compreendemos serem também espaços de aprendizado ao
longo da vida.
A própria companheira do MEC lembrou — e nós vamos ter de dar conta
disso — que o espaço do aprendizado ao longo da vida não necessária e
exclusivamente é o escopo da sala de aula, da educação da escola. Então, talvez
esteja nos faltando uma maior bagagem técnica e legal que legitime um espaço de
aprendizado com essas dimensões, obedecendo a esses critérios tecnicamente
colocados, que nós até dizemos que são comprovados cientificamente.
Eu não chego até aí, não chego a essa perfeição toda. Mas, dentro do escopo
do processo educacional, do processo de proteção e cuidado, do processo de
habilitação e reabilitação, nós já temos elementos muito fortes para melhorar esses
serviços e integrá-los na ponta.
Existe um instrumento de transferência de renda muito importante, que é a
Proposta Pedagógica Curricular — PPC. Temos feito um esforço enorme para
implantar a PPC Escola. São inúmeras crianças de zero a 18 anos fora da rede
educacional, por falta não só de escolas com capacidade de recebê-los, como por
falta de cuidadores ou familiares que possam levá-los à escola. Esses são
problemas primários que seguramente repercutirão na fase adolescente e adulta.
Hoje já existe essa rede de serviços e de informações reais e concretas. Eu
até falei para o Deputado Eduardo Barbosa que existem alguns centros-dia que são
executados em parceria com a APAE e com a Pestalozzi, por exemplo, e que nós
podemos fazer alguns laboratórios para vermos o que está acontecendo ali. Eles
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também fazem outras ofertas em educação e saúde. Eles podem dizer para nós: “A
diferença está aqui, a união está aqui, a ausência está aqui, o vácuo está aqui e a
potência está aqui”. Então existem elementos muito interessantes nessa vida, que
nós podemos e devemos aproveitar.
A política pública é cofinanciada nas três esferas, mas tem uma decisão
municipal de oferta. Nós vivemos, no último ano, uma decisão um pouco fragilizada
em virtude das dificuldades econômicas. Então, nós abrimos o aceite para vários
serviços, sendo que alguns Municípios fizeram o aceite, mas não puderam executar
os serviços. Eu acho que nós vamos superando isso também com as orientações
técnicas e a soma de esforços.
Nós estamos muito esperançosos. Faltava-nos certa luz, mas essa luz está
cada vez mais clara. Eu acho que agora falta alinhavar, andar na mesma direção,
valorizar o esforço de cada um. Não existe serviço de segunda linha. Não se pode
dizer que esse serviço da assistência social é para pobre. Não existe isso, porque
esse serviço nem é para pobre, mas para as pessoas em situação de
vulnerabilidade, de risco e de direito violado.
Então, nós temos bastantes elementos para avançar em tudo isso e valorizar
a iniciativa de todos.
Nós estamos à disposição para seguir. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Obrigado, Deusina.
Eu acho que é nisto que também as duas Comissões, tanto a Comissão de
Educação, como a Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e
nós Deputados que estamos aqui podemos ser facilitadores junto aos Ministros:
justamente para estabelecer uma relação de trabalho conjunto dos dois Ministérios,
para que a proposta possa ser desenhada com esse olhar.
Eu acho que a presença do MDS aqui consolida essa proposição. Vamos
caminhar nesse sentido. E eu coloco, em nome de todos os Deputados aqui
presentes, a nossa disposição de sermos a retaguarda política para o projeto
acontecer.
Eu quero passar agora a palavra ao Deputado Izalci, do PSDB do Distrito
Federal.
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O SR. DEPUTADO IZALCI - Sr. Presidente, Deputado Eduardo Barbosa,
inicialmente eu quero parabenizá-lo pela iniciativa. Todos nós sabemos que V.Exa. é
um ícone desta Casa, é nossa referência nessa área.
V.Exa. participou da audiência pública que fiz recentemente, com relação à
questão financeira dos superdotados, que nós temos que olhar também.
Eu quero tirar uma dúvida. Quero dizer, Deputada Zenaide Maia, que gostei
da sua fala. Realmente não é fácil, a coisa é complicada. Mas precisamos agir,
precisamos dar condições para que as coisas aconteçam.
Eu tenho algumas dificuldades. Há algum tempo, eu tenho visitado algumas
instituições. Está aqui uma minha amiga que é diretora de uma escola do Guará,
cujo trabalho nós acompanhamos. As pessoas trabalham com muito amor nessa
área. Os professores realmente precisam ser muito bem valorizados, porque
trabalham com muito carinho e amor.
Eu estive numa escola. Não sei se mudou, não sei se é no Brasil. Com
relação à LDB, nós fizemos umas modificações de 2013 e 2015, mas eu lembro que
uma vez uma diretora me disse que estava tendo dificuldade, porque a idade mental
do aluno era, sei lá, de 30 ou 40 anos, e parece que havia dificuldade de repasse de
recurso, aliás, até de atendimento, na época. Não podia atender, porque a lei dizia
que era até 18 anos, 17 anos, não sei. Isso foi superado?
Segundo, eu estive recentemente na Pestalozzi também, e eles tinham
dificuldade muito grande com transporte. É um negócio difícil. Já é difícil fazer o
deslocamento; no sistema tradicional, é impossível, ainda mais com esses ônibus
que não têm nem como. Isso desmotiva muito. Muitas famílias têm dificuldade de
realmente levar a criança ou a pessoa com necessidade especial a essas entidades.
Por incrível que pareça, não sei se é questão só de dificuldade econômica,
não temos encontrado essa boa vontade do Governo principalmente com as
entidades privadas, que é o caso da parceria da Pestalozzi e das APAEs. Eu não sei
se é daquele caminho da escola, daqueles programas, se nós não temos como
também viabilizar alguma coisa neste sentido,
Recentemente, eu fui à Pestalozzi, quase 50% dos alunos deixaram de
comparecer. Havia o convênio com o GDF, mas ele foi cortado, e os pais não têm
como... As pessoas vêm da Ceilândia, do Paranoá, de Planaltina para trazer para a
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Pestalozzi, é impossível! E mais de 50%... Há mais um problema: não comparece,
não repassa o recurso, inviabiliza a instituição.
Então, são essas duas colocações. Eu queria ver como está o andamento
disso e de que forma nós podemos ajudar, se é que já resolveram. Se resolveram,
legalmente não se está praticando, porque está havendo esses problemas. Como
está isso?
Quero me colocar à disposição. V.Exa. sabe que o que nós pudermos fazer
na Comissão de Educação, no Ministério, nós vamos juntos, vamos brigar por isso,
porque V.Exa. é um batalhador. Eu sei que todos os que estão aqui deram a sua
contribuição e precisam continuar dando.
Nós temos plano de saúde e educação, precisamos implementar isso. A luta
foi grande. V.Exa. acompanhou de perto isso. Então, eram as duas dúvidas que eu
tinha com relação a isso: a questão do atendimento e a questão do transporte.
Como está isso aqui e nos Estados?
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - O Deputado Izalci
mexeu na ferida, foi ao ponto que, inclusive, suscitou tudo isso aqui.
O que nós estamos criando, com a proposição de colocar dentro da educação
de jovens e adultos a educação ao longo da vida, como a EJA informal, ou seja, que
ela não precise ocorrer dentro de um contexto de sala de aula, como foi colocado
aqui, com uma proposta curricular definida, com um objetivo que é a conclusão do
ensino fundamental, por exemplo, é justamente por isso.
Como a Deputada Zenaide Maia colocou, os seus filhos são vistos pelo
sistema educacional até 17 anos. Há alguns Estados e Municípios que levam isso ao
pé da letra, pela questão econômica, mesmo por que o censo escolar permite incluir
e lançar esses educandos até esse processo de conclusão do ensino fundamental.
Então, se ele está além de 17 anos, ele tem ainda como possibilidade a EJA
formal. Mas concluindo o EJA formal do ensino fundamental, ele está fora do
sistema. Não há nenhum financiamento.
Quando eu conversei com a Débora, por exemplo, ela colocou a sua prática e
experiência aqui. Ela é uma professora do GDF à disposição da APAE do Distrito
Federal. Todo início de ano é uma angústia. Não sabem se vão poder continuar ou
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não, porque uma proposta de trabalho como esta não está enquadrada dentro de
um sistema formal reconhecido para o financiamento.
Então, se o Estado não pode computar essa matrícula, esse trabalho fica
sendo voluntarioso, voluntário, e não com profissionais que vão dar uma retaguarda
técnica ao trabalho, também com esse princípio de alcance que nós queremos ter,
de continuar o estímulo de desenvolvimento, como a Patrícia colocou, que é
essencial. Então, Izalci, essa é a questão da ferida.
Quando nós conversamos com o Paulo Sena, que é nosso consultor técnico,
ele nos mostrou que o debate todo era facilmente resolvido, porque nós tínhamos
que incluir a educação ao longo da vida dentro da EJA. Para mim foi um alívio,
porque a EJA já é uma modalidade. Nós não estamos mudando nada na LDB. O
financiamento, seja pequeno ou grande, existe. Nós vamos concorrer com ele e
trabalhar para ampliar o financiamento também para poder alcançar esse público
que está além da educação formal. Então, V.Exa. mexeu no ponto.
O que nós já encaminhamos ao Ministério da Educação, por meio do Ministro
e do FNDE? Justamente fazer com que os programas já existentes também possam
criar caminhos para identificar esse aluno, porque hoje nós estamos fora disso tudo,
quando estamos além da EJA formal.
Então, nós não temos mais política de transporte escolar para esse fim, esse
aluno não é computado para o Dinheiro Direto na Escola. É um recurso que às
vezes pode ser utilizado para a compra de material para utilização dessas práticas,
por exemplo.
O FNDE está muito sensível a criar esse caminho. Inclusive, eles estão se
aproximando da SECADI para conversar, justamente para dar consistência técnica à
proposta. O Gastão, por exemplo, me falou que não vê nenhuma dificuldade nem
sequer orçamentária do FNDE para já absorver isso.
Inclusive, Patrícia Raposo, eu quero colocar que urge essa discussão
acontecer. Eu até falei com o Gastão Vieira, por exemplo, que, em outubro, nós
estamos definindo as emendas parlamentares. E eu tenho certeza de que, se essa
proposta estiver definida no MEC, vários de nós, Parlamentares, vamos poder
incrementar essas ações com emendas parlamentares destinadas aos Municípios.
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A Deputada Zenaide Maia deu um depoimento: “Eu estou bancando para 15
colegas do meu filho uma proposta de trabalho”. Então, ela pode, com uma emenda
parlamentar, institucionalmente, repassar para seu Município um aporte de recurso
que venha fomentar um trabalho ali desenvolvido. Por iniciativa pessoal, ela está
fazendo isso, o que é louvável, mas não é por aí que nós vamos construir direitos.
Não é por aí.
Então, quanto a isso que V.Exa. colocou, Deputado Izalci, eu quero V.Exa.
conosco nisso. Nós abrimos os caminhos nos órgãos para este debate, agora nós
vamos ter que amarrar isso. Está muito na mão do MEC, agora com o FNDE, definir
esse padrão e aprovar o meu projeto de lei.
O SR. DEPUTADO IZALCI - Quando V.Exa. fala isso, fala no transporte,
porque o transporte não é só para acima de 18 anos. Há criança também no
contraturno que tem dificuldade.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Justamente.
Então, se nós realmente regulamentarmos essa questão da educação ao
longo da vida, nós temos uma possibilidade muito diferenciada de isso se tornar uma
política pública alcançada pelo financiamento à educação.
Deputada Carmen Zanotto, nós conversamos tanto com os olhos, que eu
achei que já tinha lhe dado a palavra.
A SRA. DEPUTADA CARMEN ZANOTTO - Obrigada, Deputado Eduardo
Barbosa, proponente desta audiência pública, com as duas Comissões: Comissão
da Educação e nossa Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa com Deficiência.
Eu queria saudar todas as nossas expositoras e dizer que não é por mera
coincidência que a grande maioria das expositoras convidadas, incluindo a nossa
Deputada Dr. Zenaide Maia, é composta por mulheres, porque o cuidar ainda é uma
tarefa muito feminina.
Então, não me espanta audiência dessa natureza ser composta na maioria
por mulheres, mas nós temos a felicidade de ter o Deputado Eduardo Barbosa, o
Deputado Izalci e um conjunto grande de outros homens nesta Casa, que já
ajudaram a aperfeiçoar a legislação, como a nossa Lei nº 13.146, que é o grande
marco da lei brasileira da inclusão da pessoa com deficiência.
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Eu queria dizer que eu me senti extremamente contemplada por todas as
falas, mas eu, durante as falas, fiquei me perguntando: “Onde estão os nossos
adultos com deficiência?” Provavelmente cerceados dentro de uma casa, dentro de
um quarto, sem a possibilidade de continuar desenvolvendo os seus potenciais.
Então, eu queria dizer para a Patrícia Martins que eu fiquei muito feliz com a
fala dela. Como nós, Parlamentares, já com toda essa legislação, Deputado Eduardo
Barbosa, podemos fazer, efetivamente, com que esses adultos tenham esse direito
assegurado de saírem de seus lares, de irem para um estabelecimento que não
necessariamente seja a escola padrão ou uma escola especializada, mas que
acolha esta população que precisa, efetivamente, continuar sendo estimulada? Se
ela não continuar tendo essa atenção e ficar apenas com a atenção da família...
Digo isso por experiência, a minha mãe tem 91 anos. O Deputado Eduardo foi
muito feliz quando colocou que vemos o Cirinho melhorar conforme mostramos as
coisas para ele, inclusive, as habilidades básicas. O cuidado com a cama dele já é
diferente hoje do que era há alguns anos. O cuidado pessoal dele não depende de
nós. Para higiene ele não depende. Ele depende da família, da mãe e das irmãs
para alguma questão mais complexa. Mas ele já tem todas as básicas, porque
continuamos — mesmo todas nós trabalhando, a mãe é quem fica mais com ele —
estimulando e mostrando para ele.
E aí eu me pergunto quantas habilidades nós poderíamos desenvolver,
inclusive, o conhecimento, para essa população que tem a necessidade desse olhar
diferenciado. Assim, vimos na apresentação da Débora, porque eles estão felizes,
porque eles se sentem parte da sociedade onde estão, quer seja num parque, quer
seja num monumento, enfim, eles se sentem incluídos. Temos que trabalhar muito
para que cada criança e cada adolescente possa, efetivamente, estar incluído e
inserido na nossa sociedade.
E que passemos a deixar de olhá-los como alguém que não é normal. Muito
pelo contrário, temos que olhar e compreender as suas limitações. Eu não pude
ouvir a fala da Deputada Zenaide Maia, mas eu já conheço todo o carinho, todo o
amor — trocamos muitas informações. Eu tive que ir até o Auditório Freitas Nobre,
senão o Deputado Mandetta nos cobraria. Não deu tempo, eu só fui lá.
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O senhor não foi, na condição de médico, acho que nem a Deputada Zenaide,
que também é sua colega médica. Mas eu passei lá rapidamente para dizer que nós
estamos na audiência pública conjunta da Comissão de Educação e da Comissão
de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência e não podemos ficar lá. Mas
também queremos levar o nosso apoio a essa iniciativa que ele está tendo com
relação às entidades e às especialidades médicas.
Eu estive durante o recesso viajando pelo interior do Estado. As APAEs, no
País afora, estão vivendo exatamente o que foi dito aqui. Os professores cedidos do
Estado que estão se aposentando, estão entrando em licença-prêmio ou licença-
maternidade não estão sendo substituídos. Por quê? Todos nós sabemos que
estamos vivendo uma grande crise econômica, então, deve-se enxugar. Então, se o
professor que estava na APAE se aposentou, passa a ser de responsabilidade
daquela entidade a substituição, e não mais do Estado. Ao menos foi o que ouvimos
lá, muito semelhante ao que foi colocado aqui.
Isso, com certeza, a médio e longo prazo, vai impactar na qualidade do
ensino e da atenção prestada por essas instituições especializadas, vai fazer com
que o número de matrículas venha a ser reduzido, pois como acolher se não há
profissionais especializados?
Então, precisamos, efetivamente, mesmo dentro de uma conjuntura difícil com
cortes orçamentários, garantir que as instituições especializadas de atendimento na
área da educação à pessoa com deficiência e iniciativas das escolas regulares
também tenham esse outro olhar.
E me impacta muito quando ouvimos uma mãe ou uma especialista, uma
doutora no assunto, dizendo: “O autista desenhando na sala de aula”. Enquanto os
outros estão tendo o direito de aprender, aquele aluno está lá ocupando uma
cadeira. E quem sabe quanto está se frustrando ou quanto está processando a sua
diferença ainda mais, porque não é abraçado, não é incluído, não é estimulado a
aprender as mesmas matérias que estão sendo dadas.
Precisamos discutir que tipo de escola regular com atendimento à pessoa
com deficiência nós queremos. Eu não quero essa escola. E não sou especialista na
área, sou enfermeira de formação, mas não quero isso, porque não precisamos
apenas de um espaço para colocá-los ou para aliviar a família dizendo que o filho
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está indo para a escola. É preciso que ele vá para a escola e se sinta parte da
escola, e não alguém que está apenas lá. Sejamos muito sinceros: eles sabem e
sentem quando acham que estão incomodando ou estão sendo demais.
Esta é uma das audiências que renovam a esperança de estarmos nesta
Casa, com tantos temas complexos e difíceis. Precisamos renovar nossa esperança
no Ministério da Educação, no Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário, no
Ministério da Saúde, para, mesmo com os poucos recursos que temos, termos a
transversalidade e nos comunicarmos melhor, a fim de que aquilo que constitui a
norma escrita chegue efetivamente aos domicílios e aos Municípios.
Acho que estamos bem contemplados no que respeita à legislação. Na
ciência, já está comprovado que não devemos parar. Assim, precisamos garantir
que todos os adultos que estão nos domicílios possam efetivamente ter a
oportunidade de conviver na sociedade e continuar o aprendizado.
Por isso, este tema nos é muito caro e precisamos somar forças com nosso
líder maior, o Deputado Eduardo Barbosa, bem como com a Deputada Zenaide
Maia, que é mãe e nos traz sua experiência, e com cada um dos Parlamentares, que
entende a magnitude desta matéria.
Quero dizer que este é mais um passo do longo caminho que temos a
prosseguir, para conquistarmos o que está na legislação.
A todos nós, expositoras e expositores, muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Muito obrigado,
Deputada. Quero colocar uma questão, inspirada na fala de V.Exa. Outro dia recebi
uma denúncia gravíssima.
Nós trabalhamos muito pelo processo de aprimoramento da legislação, para
que a política pública cumpra o seu papel principalmente em relação à educação
inclusiva. Hoje o professor de apoio é identificado na legislação como uma garantia,
quando é necessário.
Eu recebi denúncias de que há professores já no final de carreira que têm
optado por ser professores de apoio porque ficam com o aluno fora da sala de aula,
correndo no pátio ou no refeitório, ao longo deste tempo todo, sem nenhum
compromisso com o aprendizado.
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Nós, legisladores, nunca poderíamos imaginar que uma função conquistada
dentro do espaço educacional pudesse ser burlada assim. A consciência profissional
é uma questão ainda muito relevante no nosso País, e não se fazem, de fato,
cobranças para que fatos como este coloquem abaixo conquistas que tivemos com a
legislação brasileira e a possibilidade de financiamento.
A SRA. DEPUTADA CARMEN ZANOTTO - Permita-me, Deputado Eduardo
Barbosa. Acho que não é a consciência profissional, mas, sim, o desconhecimento
de que aquele cidadão ainda é sujeito de direito. Aliás, ele é sujeito de direito e pode
não só aprender o conteúdo curricular, mas também desenvolver outras habilidades.
Eu acho que vamos ter que trabalhar muito em prol disso.
O papel fundamental do MEC talvez seja o de mostrar para este conjunto de
trabalhadores e trabalhadoras que eles são efetivamente a nossa essência, porque
nós somente estamos aqui porque um dia passamos pelos bancos escolares e
porque os professores fizeram e fazem a nossa formação. De outro lado, talvez seja
necessário que a neurociência chegue lá dentro, dizendo que eles são capazes, que
podem aprender e vão aprender.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - É isso mesmo. Trata-se
da consciência não só em relação à ética, mas também ao conhecimento, que traz
uma visão muito maior daquela que estamos tendo.
Concedo a palavra à Sra. Patrícia Freitas. S.Sa. pode aproveitar e comentar
sobre este assunto.
A SRA. PATRÍCIA MARTINS DE FREITAS - Não é uma notícia muito feliz,
mas, para termos uma ideia de como a questão do cuidador pode ser impactante,
fez-se um estudo na Suécia sobre o efeito do cuidador. Em se tratando de algumas
habilidades formais, identificou-se que eles estavam aprendendo mais rapidamente,
mas perdendo em autonomia e comunicação. Desta forma, eles interagiam apenas
com o cuidador.
É óbvio que não se compara com esta experiência infeliz que se está
trazendo, fruto de denúncia.
O estudo científico feito na Suécia mostra que, se não tivermos atenção a
como deve ser feito o trabalho do cuidador, ele pode efeito inverso. O cuidador está
ali para mediar e favorecer o processo de inserção social e mais participação, e não
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o contrário: não pode ficar numa mesinha estimulando ou favorecendo mais, ou
talvez apoiando uma determinada tarefa.
É claro que este é um papel importante, mas a pessoa com deficiência não
pode ser isolada — ela tem que ser inserida. Este mecanismo de inserção vai fazer
com que depois ela consiga se inserir em outros ambientes. A escola é um preparo
para ela ser inserida no transporte público, nos parques, nas lojas, em locais onde
ela vai desenvolver suas habilidades.
É preciso que se trabalhe o papel do cuidador. Qual é o papel do cuidador?
Será que é mais fácil ficar? Deve-se abrir mão da sala de aula para se ficar com
apenas um aluno? Não é isso. É preciso ter conhecimento e preparo para trabalhar
bem o estímulo e, ao mesmo tempo, garantir a participação social e a autonomia.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Muito obrigado, Patrícia
Freitas.
Concedo a palavra à Sra. Ana Cristina Silva, nossa professora de educação
especial no Distrito Federal.
A SRA. ANA CRISTINA SILVA - Boa tarde! Quero participar ao Deputado
Eduardo Barbosa que eu o acompanho desde a luta em prol da Meta 4. Desde
então, tenho assistido aos seus depoimentos sobre escolas especializadas nas
audiências públicas realizadas aqui no Distrito Federal.
Estou aposentada há 1 semana, mas continuo numa luta independente. Nós
nos juntamos a V.Exa., Deputado Eduardo Barbosa, que, mesmo sem saber, nos fez
um bem muito grande. Nós conseguimos nos juntar à luta de V.Exa. pela
manutenção, no Distrito Federal, das escolas especializadas e dos Centros de
Ensino Especial, com o apoio dos Deputados Distritais. Agora estamos tentando
regulamentar lei do Deputado Chico Leite que vem ao encontro da iniciativa de
V.Exa.
Quando me inscrevi, senti falta das escolas especializadas na manifestação
de V.Exa., que já conheço. Fiquei me perguntando onde estão as escolas
especializadas no discurso, na sua iniciativa. Mas, na resposta de V.Exa. ao
Deputado Izalci, eu vi que as escolas especializadas obviamente estão
contempladas no programa Educação de Jovens e Adultos — EJA.
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Neste sentido, eu gostaria de fazer algumas considerações, ainda que
informalmente.
Nesta legislação que pretende ser regulamentada, constará a nomenclatura
escolas especializadas? Hoje nós sabemos, como o senhor sabe, que existe uma
tendência muito forte, com o Decreto nº 4.281, se não me engano, de herança da
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão —
SECADI, que pretendia, de alguma forma, destinar as escolas especializadas
apenas para o atendimento educacional especializado.
Assim, eu gostaria de saber se, neste projeto de lei, nós teremos a retomada
das escolas especializadas com papel específico porque, como a Deputada Zenaide
mencionou, a herança que a SECADI nos deixou foi muito ruim.
Com todo o respeito, temos muitas ações práticas positivas, mas acho que o
resultado social foi muito ruim para a educação especial em si. Eles conseguiram
dividir a educação especial entre quem é contra e quem é a favor da inclusão.
Na última audiência pública promovida pelo Deputado Izalci, à qual eu estava
presente, a Profa. Ivana foi muito feliz na sua explanação. Ela disse tudo o que nós
queríamos ouvir, ao afirmar que matrícula não significa inclusão.
Portanto, eu gostaria de saber como estarão as escolas especializadas neste
projeto de lei, porque o projeto EJA informal já existe há muitos anos. Nós fazemos
isso nas escolas especializadas há muitos anos, o que, no entanto, nunca foi
regulamentado por nenhuma Secretaria de Educação.
Eu fui Vice-Diretora de um Centro de Ensino Especial durante 6 anos e tentei
implementá-lo na minha escola, mas a Direção da Educação Especial, da qual fazia
parte a Sra. Patrícia Barbosa, nunca nos permitiu implementar o EJA formal na
nossa escola.
O projeto EJA informal sempre existiu, junto com o que a Dra. Patrícia falou,
que vem ao encontro do que existe. Nós promovemos nas escolas especializadas é
exatamente o aprendizado da autonomia e da estimulação cognitiva, para que o
estudante avance, independentemente de idade e de condição.
Nós temos uma modulação específica justamente por isso. Ensina-se, neste
centro de ensino especial, a autonomia que, como a doutora falou e provou, faz
parte do programa de aprendizado ao longo da vida.
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Eu acho que uma questão fundamental nesta discussão é a herança.
Enquanto não desmistificarmos este aspecto, dando um antídoto à sociedade
dizendo que as escolas especializadas precisam existir, não haverá outra opção a
médio e a curto prazo. Não vejo outra saída, a não ser receber os estudantes dentro
das escolas especializadas.
Foi dito aqui que a Educação de Jovens e Adultos — EJA ainda está se
organizando hoje. Nós estamos discutindo a educação especial há mais de 20 anos!
O programa EJA ainda está se organizando, as escolas especializadas ainda estão
se organizando. Hoje quem está organizado são as escolas especializadas. Como a
Deputada mencionou, houve uma extinção, pela herança da fala de que somos
segregacionistas ou excludentes. Excludente foi esta fala, que o senhor conhece
muito bem.
Hoje quantos indivíduos não estão em casa porque as APAEs modificaram o
atendimento? Quantos indivíduos não vão para a escola uma ou duas vezes na
semana, por 45 minutos, por causa da nossa herança? Quantos pais não estão
bancando as escolas que foram dissolvidas ou extintas por causa desta herança?
Eu sugiro ao MEC uma estratégia para que torne público que o estudante
será atendido, independentemente de onde estiver. Este, sim, é um processo de
inclusão, não de exclusão.
Em Brasília, somos privilegiados porque nós, diretores, estamos na luta. Nós
participamos de todas as audiências, para manter nossas escolas. Brigamos com o
Secretário de Educação, dizendo que não aceitávamos aquelas condições. Nos
outros Estados, isso infelizmente não aconteceu.
Eu participava da audiência em que o senhor estava no ano passado. Se não
me engano, havia mães do Estado do Acre ou do Amapá. O representante do MEC
estava presente e se lembra do que eu estou falando. As mães diziam o seguinte:
“Eu levo muito mais tempo no trajeto da minha casa para a escola do que o meu
filho dentro da sala de aula”. Isso me cortou o coração.
Portanto, eu gostaria de saber qual a importância das escolas especializadas
no projeto EJA. Gostaria de pedir ao MEC que institucionalizasse a EJA nas escolas
especializadas, coisa que, informalmente, já acontece. Nós não o fazemos efetiva e
comprovadamente porque não somos autorizados a fazê-lo.
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Meus parabéns a V.Exa., Deputado Eduardo Barbosa, pela iniciativa! Eu
acompanho a luta de V.Exa., mesmo aposentada.
Aproveito a ocasião para responder ao que a senhora perguntou: o porquê do
apoio. Porque foi uma política de inclusão a qualquer custo, para dizer à
Organização das Nações Unidas — ONU que estamos respondendo muito bem ao
protocolo. Foi feita uma estratégia em que o aluno tinha que estar de qualquer jeito.
Então, vamos apoiar, porque ele não está na sala de aula, ele está passeando. Mas,
na minha estratégia, estou dizendo que eu tenho 50 mil alunos incluídos no ensino
regular em classe comum.
Há 20 anos, eu fiz o que vocês estão fazendo. Tiro o chapéu para vocês: isto
é inclusão, autonomia, aprendizado, qualidade de vida, autoestima.
Por que as escolas especializadas não podem estar regulamentadas? Eu
acho, Deputado, que não temos que esconder nomes, não! Eu acho que temos que
dizer o que as escolas especializadas fazem, que elas existem e são autorizadas
para tal.
Eu estive com a Deputada Mara Gabrilli para tratar da Lei Brasileira de
Inclusão da Pessoa com Deficiência. Para aprovarmos esta lei, tivemos que fazer
um texto que não barrassem. Enquanto continuarmos usando subterfúgios para
aprovar, nós não avançaremos. Há estudantes em casa, sentados no sofá, por
causa de um País que não os assume.
Nós temos uma boa escola especializada, sim! Se esta escola presta um
atendimento de excelência, por que ela não pode existir? Excludente é aquela
escola cujo aluno fica correndo pelo pátio.
Era isso que eu queria dizer. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Obrigado, Sra. Ana
Cristina.
Peço à Sra. Patrícia Raposo que responda, oportunamente, às perguntas
feitas pela Sra. Ana Cristina.
Gostaria de lembrar que nós encaminhamos à nova gestão do Ministério da
Educação exatamente a nossa preocupação. Ao longo deste debate sobre educação
inclusiva, o Ministério da Educação, no meu entendimento, falhou quando não
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identificou claramente qual o papel da escola especial no contexto da organização
do sistema educacional.
Nós sugerimos ao Ministério da Educação que institua um trabalho que defina
formal e institucionalmente o papel da escola especial. A educação, ao longo da
vida, no nosso entendimento, talvez seja indicada como um dos papéis da educação
especial, da escola especial. Este foi o nosso encaminhamento ao Ministério da
Educação. Agora cabe à Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização,
Diversidade e Inclusão — SECADI dar uma resposta. Nós estamos acompanhando
e mantemos um diálogo aberto para que isso aconteça.
Quem vai formalizar para nós a resposta dos passos já iniciados neste
sentido é a Sra. Patrícia Raposo. Este é o nosso pleito.
Concedo a palavra à Sra. Viviane Guimarães.
A SRA. VIVIANE GUIMARÃES - Sr. Presidente, sou do Movimento Orgulho
Autista Brasil — MOAB. Eu gostaria de parabenizar V.Exa. pela realização desta
audiência. É de momentos como este que precisamos para criarmos possibilidades.
Eu concordo com o senhor quando diz que nossos professores realmente
trabalham com muito amor. Infelizmente, é somente isso que eles têm. Eles não são
preparados pelas nossas universidades. O MEC precisa começar a preparar os
nossos professores. Tanto na área da Licenciatura, como na área da Pedagogia e
da Medicina, eles não são preparados para trabalhar com a inclusão.
Antes de mencionarmos que nossas escolas precisam promover a inclusão,
precisamos preparar nossos professores, porque eles realmente só têm boa
vontade.
Eu agradeço a todos os que passam e aos que passaram pela vida do meu
filho. Meu filho, que é autista, está com 15 anos. Ele recebeu a inclusão devida, mas
porque houve um trabalho conjunto, realmente um trabalho de boa vontade.
Como não estamos preparando nossos professores neste aspecto, nós
voltaremos a falar a mesma coisa daqui a 10 anos, porque nossas escolas não
estão nem pensando em falar sobre inclusão. Elas não sabem o que é autismo, não
sabem direito o que é dislexia, não sabem o que é Transtorno do Déficit de Atenção
com Hiperatividade — TDAH. Sobre a síndrome de Down elas também têm poucas
informações.
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Desta forma, enquanto não prepararmos nossos professores, vamos
continuar falando sobre este assunto, porque eles não são preparados para esta
realidade.
Eu também quero falar com vocês sobre o “diploma social”, um projeto
superinteressante que o Prof. Casemiro Mota apresentou ao Instituto Federal
Catarinense, para que os institutos federais tenham a parte do ensino técnico. Eles
fizeram uma adaptação de acordo com o que o aluno precisava. Se o aluno não tem
condições de fazer, por exemplo, um curso de técnico em construção civil, o diploma
dele vai dizer que, dentro da construção civil, ele pode fazer determinadas
atividades. Portanto, o diploma é adaptado.
Nós precisamos incluir o autista. Nossas crianças com deficiência, quando
crescem, precisam estar incluídas no mercado de trabalho, coisa que infelizmente
não temos hoje em dia. Precisamos lembrar que nossas crianças vão crescer e
precisam estar inseridas, precisam ser tratadas como cidadãs para poderem
produzir.
Deputado, eu posso apresentar para o senhor o projeto do “diploma social”,
que precisa chegar ao MEC. O MEC precisa ter tanto a possibilidade de formar
melhor nossos professores, como a de incluir nossos alunos no mercado de
trabalho.
O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Obrigado, Sra. Viviane.
Eu tenho certeza de que a Sra. Patrícia Raposo receberá vocês para conhecer toda
a proposta. A Sra. Ivana orientou que se deva fazer a interlocução com todas as
organizações deste País. Você, Viviane, pode contribuir muito com a sua
experiência e com o que reconhece como positivo.
Tem a palavra a Sra. Patrícia.
A SRA. PATRÍCIA NEVES RAPOSO - Em primeiro lugar, eu gostaria de dizer
que o Deputado Eduardo Barbosa nos demandou este estudo sobre as escolas
especiais, no contexto da educação brasileira. Desde que cheguei à SECADI, esta
questão está sendo discutida, e nós encaminhamos, nos trâmites administrativos do
Ministério da Educação, um termo de referência para desenvolver esta ação. Em
breve, portanto, teremos o estudo sobre o papel das escolas especiais.
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É preciso conhecer o que o País está fazendo, como as escolas especiais
estão organizadas e como estão funcionando no País, para que possamos definir o
seu papel no contexto da educação brasileira. Em nenhum documento, está
afirmado que a escola especial não deve existir. Nenhum documento decretou o fim
da escola especial. Não existe, da nossa parte, nenhum encaminhamento ou
orientação neste sentido.
Sobre a Portaria nº 243, que define critérios para o financiamento dos Centros
de Atendimento Educacional Especializado, nas instituições especializadas, públicas
ou privadas, quero dizer que ela está sendo revista. Nós estamos discutindo esta
portaria — já discutimos este assunto com o Deputado Eduardo Barbosa.
Sabemos que existem pontos a ser discutidos, estudados, para ver a
convergência ou a divergência com a legislação e se a definição de critérios para as
escolas públicas e privadas está, de fato, ao alcance do Estado ou dos Municípios e
do Distrito Federal, para que esta portaria possa realmente vigorar.
Reafirmo à Ana Cristina que a portaria está sendo revista, com toda a atenção
e todo o cuidado, pela SECADI e pela Diretoria de Políticas de Educação Especial
— DPEE. Tão logo tenhamos resolvida esta questão, ela se tornará pública, e vocês
tomarão conhecimento.
A importância da escola especial é fato. Nós sabemos da sua importância
história. Nós estamos encaminhando este estudo justamente porque queremos
saber qual o papel que a escola especial vai desenvolver. Não é uma questão de
nome. Esse grande duelo que está sendo travado, na verdade, é a construção de
grupos dentro do País que se afastaram do nosso maior propósito: a educação e,
pedagogicamente, o aprendizado, por uma questão de posicionamentos muito
pessoais.
Nós estamos, sim, discutindo e, com certeza, estamos indo ao encontro de
muitos anseios.
O MEC, a nossa Secretaria e a nossa Diretoria estão à disposição para
conversar. Viviane, vamos nos encontrar e conversar sobre esta questão, que é
extremamente importante.
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O SR. PRESIDENTE (Deputado Eduardo Barbosa) - Acho que este assunto
não tem fim, mas vamos ter que encerrar esta reunião porque hoje temos uma
sessão muito importante na Câmara dos Deputados.
Quero agradecer aos nossos expositores, com os quais contamos para a
continuidade deste debate. Agradecemos também a todos os presentes.
Convoco as organizações, entidades e pessoas que militam na área a se
unirem a todos nós, para conseguirmos regulamentar a educação ao longo da vida.
Eu comentei com nossa Secretária e com a Patrícia que, se em 2 anos de um
governo que deve se estabelecer definitivamente em breve este ponto for
conquistado, ele já terá cumprido um papel fundamental.
Muito obrigado a todos.