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CÂMARA DOS DEPUTADOS DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES TEXTO COM REDAÇÃO FINAL COMISSÃO ESPECIAL - REFORMA POLÍTICA EVENTO: Audiência Pública N°: 0264/03 DATA: 09/04/03 INÍCIO: 14h56min TÉRMINO: 17h31min DURAÇÃO: 02h35min TEMPO DE GRAVAÇÃO: 02h36min PÁGINAS: 45 QUARTOS: 31 REVISÃO: Antonio Morgado, Luciene Fleury, Maria Teresa, Veiga, Víctor, Waldecíria SUPERVISÃO: Ana Maria, Cláudia Luiza, J. Carlos CONCATENAÇÃO: Neusinha DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃO FRANCISCO DE OLIVEIRA – Professor de Sociologia da Faculdade de Filosofia e Letras e Ciências Humanas da USP e Coordenador do Projeto de Reforma Política do Instituto Cidadania PAULO VANNUCHI – Cientista Político e Diretor do Instituto Cidadania FÁBIO KERCHE – Mestre em Ciência Política e ex-Secretário Acadêmico do Projeto de Reforma Política do Instituto Cidadania SUMÁRIO: Apresentação, por representantes do Instituto Cidadania, do livro Reforma Política: Estudos e Propostas. Debate acerca da fidelidade partidária, do financiamento público de campanhas e do voto obrigatório. OBSERVAÇÕES Há intervenções inaudíveis.

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CÂMARA DOS DEPUTADOS

DEPARTAMENTO DE TAQUIGRAFIA, REVISÃO E REDAÇÃO

NÚCLEO DE REDAÇÃO FINAL EM COMISSÕES

TEXTO COM REDAÇÃO FINAL

COMISSÃO ESPECIAL - REFORMA POLÍTICAEVENTO: Audiência Pública N°: 0264/03 DATA: 09/04/03INÍCIO: 14h56min TÉRMINO: 17h31min DURAÇÃO: 02h35minTEMPO DE GRAVAÇÃO: 02h36min PÁGINAS: 45 QUARTOS: 31REVISÃO: Antonio Morgado, Luciene Fleury, Maria Teresa, Veiga, Víctor, WaldecíriaSUPERVISÃO: Ana Maria, Cláudia Luiza, J. CarlosCONCATENAÇÃO: Neusinha

DEPOENTE/CONVIDADO - QUALIFICAÇÃOFRANCISCO DE OLIVEIRA – Professor de Sociologia da Faculdade de Filosofia e Letras eCiências Humanas da USP e Coordenador do Projeto de Reforma Política do InstitutoCidadaniaPAULO VANNUCHI – Cientista Político e Diretor do Instituto CidadaniaFÁBIO KERCHE – Mestre em Ciência Política e ex-Secretário Acadêmico do Projeto deReforma Política do Instituto Cidadania

SUMÁRIO: Apresentação, por representantes do Instituto Cidadania, do livro Reforma Política:Estudos e Propostas. Debate acerca da fidelidade partidária, do financiamento público decampanhas e do voto obrigatório.

OBSERVAÇÕESHá intervenções inaudíveis.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Havendo número para

abertura dos trabalhos, convido para compor a Mesa o Dr. Francisco de Oliveira,

professor titular de Sociologia da Faculdade de Filosofia e Letras e Ciências

Humanas da USP, Coordenador do Projeto de Reforma Política do Instituto

Cidadania; o Dr. Paulo Vannuchi, cientista político e Diretor do Instituto Cidadania; e

o Dr. Fábio Kerche, Mestre em Ciência Política e ex-Secretário Acadêmico do

Projeto de Reforma Política do Instituto Cidadania.

Esclareço ao Plenário que iniciamos hoje a fase de audiência pública e que a

Deputada Luiza Erundina apresentou requerimento para que o Instituto Cidadania

apresentasse as propostas depois da realização de três seminários.

Gostaria de solicitar, quebrando o Regimento, à Deputada Luiza Erundina que

faça a apresentação política dos nossos convidados, porque eu fiz apenas a

apresentação técnica.

A SRA. DEPUTADA LUIZA ERUNDINA – Sr. Presidente, colegas

Parlamentares, quero dizer que a idéia desta audiência pública com os Srs.

Francisco de Oliveira e Paulo Vannuchi, do Instituto Cidadania, vem atender a uma

necessidade percebida nos debates nas quatro reuniões desta Comissão Especial

de Reforma Política. Percebemos que precisávamos ter uma compreensão mais

global, mais estrutural da proposta de reforma, na qual pudéssemos apreciar, refletir

e votar as questões mais específicas, do ponto de vista das legislações eleitoral e

partidária.

Para grande parcela de membros desta Comissão há a necessidade e o

interesse de que a reforma política aponte na direção de se repensar o Estado

brasileiro, sua natureza, sua estrutura e seu papel nos novos tempos, a composição

dos entes federativos, a distribuição de poder e de competência. Temos consciência

da preciosa contribuição que os senhores nos trarão, para que possamos avançar

na compreensão dessas questões de ordem mais global.

Evidentemente, o Prof. Francisco de Oliveira não precisa de apresentação —

e eu sou suspeita para apresentá-lo. Primeiro, porque é nordestino como eu, e sua

fama, seu prestígio, sua liderança intelectual surgiram há décadas no Nordeste, na

SUDENE, e vieram para cá até os dias de hoje, em que o professor é uma

referência para quem quer pensar seriamente este País. Com certeza, mais do que

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seu conhecimento, sua sabedoria, sua vivência e seu fantástico patrimônio

intelectual, ele nos deixa gratificados somente com a sua presença.

Também sou suspeita para apresentar o Paulo Vannuchi, companheiro de

luta, de militância, de sofrimento e de alegria no Partido dos Trabalhadores durante

17 anos — o tempo que fiquei no Partido. Sei do seu valor e também do seu

compromisso político e intelectual. Ele faz parte da história de luta e de resistência

democrática no País. Teve um irmão vítima da ditadura militar. Por tudo isso e,

sobretudo, pelo acúmulo de conhecimento, de pesquisa e de estudos que tem feito,

juntamente com Francisco de Oliveira e outros companheiros, realmente ele nos dá

a certeza do acerto do convite a esses dois companheiros como representantes do

Instituto Cidadania.

Para esta Comissão, sem dúvida alguma, é um grande presente S.Sas. terem

aceito o nosso convite. Vamos tentar assimilar e incorporar suas propostas ao

esforço de construção que estamos fazendo na Comissão.

Desculpem-me por não apresentar o outro convidado. Lamentavelmente, não

tenho informações sobre a sua pessoa. Mas agradeço-lhe a presença nesta reunião.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Eu já o tinha

anunciado. Trata-se do Dr. Fábio Kerche, Mestre em Ciência Política e Secretário

Acadêmico do Projeto de Reforma do Instituto Cidadania.

Antes de passar a palavra ao Prof. Francisco de Oliveira, quero dizer da

satisfação de poder oferecer, como Presidente, ao Relator essa contribuição. O

nosso eminente Relator vai receber hoje um conjunto de estudos, cujos autores

tomo a liberdade de citar: Fábio Wanderley Reis, Estudo Panorâmico sobre

Questões Envolvidas em uma Reforma Política; Wanderley Guilherme dos Santos,

Francisco de Oliveira, Helgio Trindade, Fábio Konder Comparato, sobre as relações

entre os Poderes; Maria Victória Benevides, sobre o sistema da democracia

participativa; Chico Whitaker, Limites e Alternativas para Iniciativa Popular de Lei;

Jairo Nicolau, As Principais Propostas de Reforma Política que Têm Sido

Apresentadas no Brasil; Fernando Limonge e Argelina Figueiredo, Tratamento

Exaustivo da Utilização de Medidas Provisórias desde 1988; Fernando Abrucio,

sobre a questão federativa; Otávio Soares Dulci, sobre sistema partidário brasileiro;

Carlos Ranulfo Melo, sobre a migração e a fidelidade partidária; Renato Janine

Ribeiro, Voto Obrigatório, Voto Facultativo; Rachel Meneguello, Dados sobre a

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Opinião dos Eleitores Brasileiros a Respeito de Vários Itens da Reforma Política;

Celina Souza, David Samuels, sobre financiamento de campanha; Gustavo Venturi,

sobre pesquisas eleitorais; Joffre Neto, sobre Legislativo Municipal; Francisco de

Oliveira, Maria Célia Paoli, Cibele Saliba Rezek, sobre Orçamento Participativo.

Os Seminários foram em número de três, realizados em São Paulo, Rio de

Janeiro e Porto Alegre. Penso que vale a pena uma reflexão sobre um dos

parágrafos do encaminhamento, porque traduz o sentimento do trabalho ofertado:

“No conjunto, vale como a rica fonte de dados,

números, informações e reflexões para contribuir no

trabalho que os legisladores têm pela frente. Não se trata

de uma proposta estruturada, visto que na convicção do

então Coordenador do Instituto Cidadania, hoje

Presidente da República, somente no Legislativo é

possível desenvolver debates e costurar os consensos,

que são necessários à viabilização das reformas políticas

que despontam como desejáveis ao aperfeiçoamento de

nossa instituição democrática.”

Em meu nome, na condição de Presidente, e em nome da Comissão, e em

nome do Presidente da Câmara dos Deputados, agradeço ao Instituto Cidadania

pela intenção de fazer um pré-lançamento desse trabalho — uma vez que a Editora

Fundação Perseu Abramo vai lançá-lo em maio —, e a deferência a esta Comissão.

Antes de ouvirmos o Prof. Francisco de Oliveira, concedo a palavra ao

eminente Relator.

O SR. DEPUTADO RONALDO CAIADO – Sr. Presidente, Sras. e Srs.

Parlamentares, Srs. Convidados, Prof. Francisco de Oliveira, Dr. Paulo Vannuchi, Dr.

Fábio Kerche, a todos boa tarde.

Em primeiro lugar, cumprimento a Deputada Luiza Erundina por apresentar o

requerimento a esta Comissão, contendo os dados que o Presidente acaba de

enfocar. Essa associação de pensadores que compõem o Instituto Cidadania

debruçou-se no trabalho durante vários anos e, com suas experiências e estudos,

vão ofertar a esta Comissão um trabalho extenso. Sem dúvida nenhuma, o Relator,

assim como todos os membros desta Comissão, teremos acesso a esse trabalho

publicado e tiraremos dele as reflexões, os resultados das pesquisas para

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transformá-los em projetos de lei, a fim de melhorar essa relação político-partidária,

conforme dissertou a Deputada Luiza Erundina, entre a estrutura federativa do País

e assuntos outros que devemos tratar nesta Comissão.

Agradeço a todos pelo trabalho ofertado a esta Comissão. Tenho certeza de

que sobre os temas agendados, sobre os passos que já demos até este momento

tomaremos a liberdade de consultá-los, via telefone, sobre matérias as quais esta

Comissão necessite buscar mais subsídios.

Hoje pela manhã o Presidente e eu fizemos parte de uma reunião do

Conselho Federal de Medicina, em que discutimos a reforma política. Esperamos

que os membros da Comissão possam levar a discussão da reforma política a todos

os encontros e debates.

A mídia tem enfocado apenas as reformas tributária e da Previdência, e

estamos mostrando que, se não evoluirmos na reforma política, não conseguiremos

aprová-la nem preencher o Legislativo brasileiro, seja federal, estadual ou municipal,

com pessoas qualificadas que debatam o assunto, tenham ética na prática política,

preparo para os debates e realmente estejam compromissadas com a participação

política, não com aquela visão que, muitas vezes, querem nos impingir, de

Parlamentares restritos a alguns colégios eleitorais, fazendo acertos ou conchavos.

Pelo contrário, há Parlamentares com propostas, idéias consistentes, pessoas que

sabem debater assuntos nacionais.

O Presidente foi extremamente feliz na reunião de hoje quando disse — o que

é uma grande verdade — que os temas nacionais não estão sendo debatidos nesta

Casa com consistência. Existe quase uma pulverização da ação dos Parlamentares

no Congresso Nacional. Na corrida para levar benefícios a um Município ou uma

ação, muitas vezes vê-se o Parlamentar aqui apenas com a função de ir atrás de

verba orçamentária ou destinar atendimento ao Município, quase um trabalho social

no seu distrito eleitoral, sem se preocupar com temas maiores, sem discutir assuntos

nacionais que, sem dúvida, interferirão na vida de cada um de nós brasileiros. Na

verdade, nós estamos aqui também para discutir assuntos como o álcool, a saúde, a

educação, o MERCOSUL e outros da organização nacional e internacional, bem

como a relação dos Poderes e outros assuntos maiores.

Enfim, acredito que nossos professores vão expor uma longa matéria.

Infelizmente, o tempo é restrito para que nos tragam todas as experiências. Mas

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peço aos nossos pares que mostrem cada vez mais a importância desta Comissão

Especial da Reforma Política.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Estamos chegando à

conclusão de que o Instituto Cidadania é também um dos responsáveis pela queda

do Risco Brasil e do dólar!

Passo a palavra ao Prof. Francisco de Oliveira.

O SR. FRANCISCO DE OLIVEIRA – Agradeço a esta Comissão, em especial

ao Presidente, Deputado Alexandre Cardoso, ao Deputado Ronaldo Caiado, Relator,

e, particularmente, à minha conterrânea, Deputada Luiza Erundina, pelo convite para

comparecer a esta audiência pública.

Esse trabalho foi arquitetado em primeiro lugar porque a reforma política é

sempre a mais falada e nunca implementada. Então, resolveu-se dirigir as atenções

para um conjunto de estudos que subsidiassem o Congresso Nacional, não mais do

que isso, até porque, entendemos todos, acadêmicos e políticos, que política nunca

é uma questão unívoca, digamos — felizmente não é. Política é sempre plural:

várias opiniões e pontos de vista podem convergir ou divergir. Isso é salutar, e não

deve de ser lamentado.

Portanto, não se poderia pensar em um conjunto de propostas de reformas

políticas fechadas em si, mesmo porque isso não se compadece exatamente com o

caráter democrático do Estado brasileiro e dos anseios da sociedade.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Professor, um

momento, por favor. Peço a gentileza de convidar para compor a Mesa o nosso

Presidente, Deputado João Paulo Cunha.

O SR. FRANCISCO DE OLIVEIRA – Muito obrigado.

A arquitetura pensada para os trabalhos da Comissão do Instituto Cidadania

repousa sobre dois pilares. Primeiro, um conjunto de especialistas dos mais

renomados no Brasil. A lista que o Deputado Alexandre Cardoso citou inclui alguns

dos mais conceituados cientistas políticos brasileiros, de várias regiões e

universidades. O outro pilar seria constituído de Parlamentares do Congresso

Nacional que aliassem à reflexão acadêmica a larga experiência que o Parlamento

tem acumulado sobre as questões da reforma política. E assim constituiu-se uma

comissão, uma espécie de dobradinha: um Deputado fazendo par com um professor

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universitário, para, juntos, produzirem estudos, propostas, relatórios sobre as

questões chaves escolhidas. Isso caminhou muito bem, até que as eleições

aceleraram os corações e catapultaram as atividades dos Deputados para aquilo

que é essencial numa democracia: as próprias eleições. E o grupo acadêmico

continuou a fazer seu trabalho. Essa arquitetura deu muito certo, e certamente suas

reflexões vão ser passadas e repassadas no Congresso Nacional.

Faziam parte dessa Comissão o Deputado João Paulo Cunha, Paulo

Vannuchi, André Singer, Porta-Voz da Presidência da República, Fábio Kerche,

Francisco Whitaker, Maria Victória Benevides, Professora da Universidade de São

Paulo, e eu, Francisco de Oliveira. Durante alguns meses, foram realizados três

seminários, no Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre, onde se discutiram, com

maior abertura, diversos assuntos com a presença de personalidades políticas. E

estes acadêmicos e políticos que aqui subscrevem estudos — deve ser dito — não

foram escolhidos pela sua cor partidária, mas por sua competência e por

representarem o amplo espectro político brasileiro. Isso foi feito exatamente com o

objetivo de se obter dessa experiência subsídios para uma nova reflexão.

A Comissão norteou-se por alguns princípios que deveriam informar

propostas de reforma política. O primeiro princípio é o de alcançar a maior inclusão

dos cidadãos na política, entendida exatamente como o lugar e o espaço onde se

constroem e se decidem os destinos nacionais; o segundo, melhorar a

representatividade das representações populares; o terceiro, alcançar maior

transparência na política; o quarto ponto, vigiar o caráter democrático das

competições políticas; o quinto, melhorar os instrumentos de controle do cidadão

sobre a política e as instituições representativas; sexto, abrir a política para maior

participação ativa dos cidadãos; por último, combater a corrupção e o abuso do

poder econômico nas eleições.

Tais princípios enfeixaram-se nos cinco pontos abordados nessas propostas

de reforma política. Os cinco pontos escolhidos visam a discussões, reflexões e

proposições sobre os sistemas eleitoral e partidário, o financiamento público das

campanhas, o controle das representações e, finalmente, sobre um tema que não é

tão novo quanto parece, uma vez que a Constituição brasileira já o acolhe: as novas

formas de democracia participativa.

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Esses foram os princípios e os pontos que orientaram os estudos de reforma

política para oferecimento de subsídios. Trata-se exatamente de um conjunto de

reflexões que procura ajudar no trabalho de repensar os problemas e o

aperfeiçoamento das instituições políticas brasileiras.

Vou trazer mais algumas informações, exatamente para provocar, em nossa

interlocução, o debate sobre as várias questões.

O trabalho da Profa. Maria Victória Benevides, resumindo muito, tenta discutir

as formas que a própria Constituição de 1988 já abriu para a participação popular,

mais direta e ativa; ou seja, fazer com que os cidadãos não sejam chamados apenas

de dois ou de quatro em quatro anos, mas constantemente, sem que se pretenda

chegar ao sonho impossível e totalitário de se fazer política o tempo todo. Mas que

sejam convocados de forma mais ativa para se pronunciarem sobre questões

fundamentais, como os plebiscitos, os referendos, as iniciativas populares, e uma

nova forma que está emergindo em várias cidades brasileiras, o chamado

orçamento participativo, forma privilegiada de introduzir o cidadão no conhecimento

daquilo que é o coração do Estado moderno — o seu orçamento.

As reflexões da Profa. Maria Victória ajudam no sentido de mapear essas

questões nas experiências mundial e brasileira.

O Prof. Fábio Konder Comparato, da Faculdade de Direito da USP, trabalhou

as questões relativas ao controle das representações, na perspectiva da

democratização, apoiando-se já nos princípios constitucionais brasileiros, na

experiência mundial e nos sistemas democráticos, no sentido de como o soberano

se auto-impõe aos controles que a sociedade pode acionar a cada momento. Não é

soberano aquele que decide sozinho, mas aquele que convoca a sociedade para

suas decisões.

O Prof. Helgio Trindade, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, disse

que a democracia social tem os maiores requisitos e, portanto, como a democracia

representativa deve acolher as novas formas da democracia social no Brasil e no

mundo, tentando avançar além dos limites que nos são fixados pela própria

Constituição; isto é, introduzir o Estado social, moderno, de forma mais aderente às

regras de normatividade da democracia representativa.

O Prof. Wanderley Guilherme dos Santos, do Instituto Universitário de

Pesquisa do Rio de Janeiro, trabalhou o tema da universalização da democracia,

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ressaltando algo que parece problemático, e sempre uma surpresa, o caráter

universalizador que a democracia no Brasil está ganhando. Talvez o Brasil tenha o

eleitorado de maior e contínua expansão no mundo, cerca de 116 milhões de

eleitores, só comparável ao colégio eleitoral da Índia e dos Estados Unidos.

Provavelmente, nós sejamos o terceiro maior colégio eleitoral do mundo. Nós,

brasileiros, que sempre choramos as nossas mágoas, podemos nos surpreender

com isso, mas penso que os Srs. Deputados não se surpreendem, uma vez que

recebem votação popular.

O Prof. Wanderley Guilherme dos Santos também ressalta que o instituto do

voto obrigatório parece tão contraditório, que suscita opiniões de que talvez o

cidadão devesse ser livre para não votar. Ele explicará porque o voto obrigatório foi

um fator de democratização decisivo, de ampliação da escolha eleitoral. Trabalhou

com indicadores das eleições realizadas entre 1946 e 2000, a fim de mostrar como

se ampliaram o colégio e a oferta eleitorais, medidos pelo número de candidatos que

disputaram vagas nas Assembléias Legislativas e na Câmara Federal.

Para espanto de muitos céticos do vigor da democracia brasileira, as Regiões

Sudeste e Centro-Oeste acusaram, desde 1945, crescimento da oferta de

candidatos por cadeira na escala de um para dez. Ou seja, o Sudeste brasileiro

passou de um candidato por cadeira, o que praticamente era um monopólio, para

cerca de quinze candidatos. No Centro-Oeste a situação foi mais ou menos idêntica;

no Nordeste, região considerada de pouca competitividade eleitoral, o indicador

multiplicou-se por seis, a exemplo do Norte.

Em outras palavras, o Prof. Wanderley Guilherme dos Santos mostra-nos

como o voto obrigatório tem sido, na verdade, poderoso fator de democratização e

de abertura do leque político brasileiro.

O Prof. Fábio Wanderley Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais,

também renomado cientista político, ensaiou uma reflexão geral sobre a reforma

política e sobre as tensões entre a estabilidade e a instabilidade políticas, entre

eficiência e representatividade democrática, enfim, sobre um conjunto de questões

cotidianas, ponderando, talvez peculiarmente, com a sua experiência mineira,

usando aquilo que chama de “decantação tancrediana”, ou seja, o fato de que a

política e as instituições nacionais precisam de tempo para amadurecerem e

lograrem seus melhores frutos. Isso talvez possa ser traduzido no velho mote

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popular que diz: “devagar com o andor, que o santo é de barro”. Ou seja, é preciso

cuidar de democracia, deixá-la experimentar e crescer e não entrar numa espécie de

reformismo avassalador e incessante, sem que as instituições políticas sejam

provadas pelo próprio exercício da soberania popular.

Era este o resumo que eu queria apresentar-lhes antes de iniciarmos o

debate.

Muito obrigado, Sr. Presidente, Sr. Relator, pelo tempo a mim concedido.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Antes de conceder a

palavra ao Dr. Paulo Vannuchi, passo a palavra ao Deputado João Paulo Cunha,

Presidente da Câmara dos Deputados, agradecendo a V.Exa. a presença na

Comissão Especial da Reforma Política.

Sr. Presidente João Paulo Cunha, esta Comissão já começou a dar frutos.

Votamos a primeira proposta, e o eminente Relator já colhe as assinaturas dos

Líderes para, após a semana Santa, através de requerimento de urgência, submetê-

la à apreciação do Plenário da Casa.

Tem V.Exa. a palavra.

O SR. PRESIDENTE DA CÂMARA DOS DEPUTADOS (João Paulo Cunha)

– Sr. Presidente da Comissão Especial da Reforma Política, Deputado Alexandre

Cardoso, Sr. Relator, Deputado Ronaldo Caiado, Prof. Francisco de Oliveira, a quem

muito admiro por emitir boas opiniões sobre variados assuntos, inclusive sobre o

Banco Central, caro amigo Paulo Vannuchi, Prof. Fábio Kerche, Sras. e Srs.

Deputados, fiz questão de comparecer à apresentação deste trabalho sobre reforma

política, cujo formato lembra a Bíblia, que o Instituto Cidadania oferece à Câmara

dos Deputados.

Participei de parte considerável da elaboração do projeto e dei modesta

colaboração. Considero positivo a Comissão ouvir os representantes do Instituto

Cidadania e receber esta contribuição que, tenho certeza, ajudará Deputados e

Deputadas a conformar opinião sobre os mais diversos temas. Evidentemente,

torna-se difícil conformar maiorias, afinal V.Exas. têm opinião própria sobre cada

assunto. Não é simples ter unidade sobre os mais diversos temas relacionados à

reforma política. Somente com debate é que podemos chegar a determinado ponto.

E é isso o que a Comissão está fazendo.

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Sinto-me satisfeito ouvir o Presidente Alexandre Cardoso dizer que já há uma

proposta, sugerida por esta Comissão, a ser apreciada pelo Plenário. Realmente, é

muito positivo. E tenho certeza de que esta Comissão produzirá muito mais. O Brasil

carece de reforma política. É evidente que há desconforto, de nossa parte e da

sociedade, em conviver com uma situação insegura nesse setor; o resultado da

eleição não se traduz na distribuição do tempo na TV ou nos meios de comunicação

da Casa, e que o que prevalece muitas vezes é a posse, em detrimento do resultado

eleitoral. Seria positivo caminharmos no sentido de respeitar o que a urna produz.

Exatamente o resultado eleitoral deveria ser o guia para o estabelecimento da

divisão do espaço de cada partido na Casa. Vamos discutir esse assunto, o sistema

eleitoral, o voto facultativo, entre outros.

O Prof. Francisco de Oliveira, na sua explanação inicial, traz um dado

interessante: a defesa do voto obrigatório feita pelo Prof. Wanderley Guilherme dos

Santos. E se sustenta em uma tese progressista: o voto obrigatório incluiu os

cidadãos no sistema eleitoral. É uma tese admirável que, certamente, fará com que

a Comissão Especial e a Casa façam debate qualificado sobre o tema e tantos

outros que a reforma política traz à luz.

Por derradeiro, parabenizo todos os integrantes desta Comissão,

especialmente os Deputados Alexandre Cardoso e Ronaldo Caiado, que

recentemente ofereceram um café da manhã aos presidentes dos partidos, para

colher opiniões e pontos de vista diversos sobre os temas aqui abordados.

Certamente saberão conduzir esse trabalho para um bom porto, que seja a definição

daquilo que é melhor para consolidar os nossos sistemas político e partidário.

Parabenizo os membros do Instituto Cidadania e o Dr. Paulo Vannuchi, que

fizeram um trabalho muito importante para o Brasil. Dentre tantos trabalhos

realizados pela entidade, mais um é oferecido à sociedade brasileira.

Parabenizo também os membros desta Comissão Especial pelo belíssimo

trabalho que fazem. Espero que a Casa consiga dar uma resposta à sociedade,

evidentemente aquilo que for possível e o que representar o conjunto de nossas

opiniões, para melhorar a representação e a condução política e partidária.

Um abraço a todos do Instituto Cidadania, ao Prof. Francisco de Oliveira e

aos membros da Comissão.

Muito obrigado.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) - Sr. Presidente, antes

de sua retirada, recebo oficialmente do Instituto Cidadania este trabalho, que se

incorporará ao acervo e será disponibilizado ao eminente Relator, Deputado

Ronaldo Caiado. (Palmas.)

Após as palavras do Prof. Francisco de Oliveira e a saudação do Presidente

João Paulo Cunha, tenho o prazer de conceder a palavra ao Prof. Paulo Vannuchi,

Coordenador do Instituto Cidadania.

O SR. PAULO VANNUCHI – Agradeço aos Deputados Alexandre Cardoso e

Ronaldo Caiado e, especialmente, à Deputada Luiza Erundina pelas exageradas

palavras de carinho.

É com muita emoção que participo dos trabalhos de uma Comissão que, para

mim, conforme recordou a Deputada Luiza Erundina, tem muito de festa

democrática, seguindo a linha das brincadeiras aqui feitas.

Há aqui companheiros conhecidos, veteranos das experiências de prisão

política, de exílio, a exemplo do Deputado Aloysio Nunes Ferreira, que para nós é o

pai da Gabi, nossa colega da USP.

Prof. Francisco de Oliveira, vou falar um pouco do Instituto Cidadania.

Distribuirei aos Srs. Deputados um trabalho que será lançado daqui a um mês, em

forma de livro. Peço a V.Exas. que sejam reservados quanto a esse trabalho, para

garantirmos o impacto do seu lançamento.

Sou assessor do Presidente Lula há vinte anos. Estamos juntos desde o

começo nessa experiência do Instituto Cidadania. E esse projeto, como disse o Prof.

Francisco de Oliveira, é diferente dos demais já realizados pelo Instituto, que nasceu

com o objetivo de fomentar discussões suprapartidárias para a elaboração de

projetos de políticas públicas. De lá saíram algumas propostas conhecidas, como o

Programa Fome Zero, Segurança Pública para o Brasil, Projeto Moradia e muitos

outros.

Na discussão da reforma política, o nosso grande coordenador, hoje

Presidente da República, recomendou que não fizéssemos apenas uma proposta,

mas um estudo. Trabalhamos desesperadamente durante uma semana para

finalizar a edição, corremos contra o relógio. Peço a V.Exas. que nos perdoem

alguns erros cometidos na pressa de oferecer-lhes este estudo antes das votações.

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Não há qualquer direcionamento. Mesmo o financiamento público de

campanha, ponto consensual entre debatedores de seminários, foi incluído no

estudo. Mas quem quiser localizará também argumentos contrários. Não houve uma

busca. Decidimos que, se íamos falar do financiamento público de campanha,

devíamos encontrar um especialista favorável que ressaltasse os aspectos

favoráveis e desfavoráveis.

Trata-se de um depósito de idéias, dados e sugestões; as propostas estão

embutidas. Os Deputados saberão localizar as propostas.

No plano de divisão dos trabalhos, realizada em três, o lote maior ficou com

Fábio Kerche, nosso secretário acadêmico, Doutor em Ciências Políticas, que na

próxima sexta-feira defenderá na USP sua tese de doutorado, cujo tema é “O Papel

do Ministério Público e o Controle Democrático”.

Gostaria de falar só mais um pouco do trabalho da Profa. Maria Victória

Benevides, espécie de âncora do nosso trabalho. Estaria presente a esta reunião,

mas ontem caiu de cama com uma forte gripe e cancelou a viagem. É, certamente, a

maior autoridade brasileira no tema democracia participativa.

Ela começa seu trabalho tentando desfazer o mito da contraposição entre a

democracia direta e a democracia representativa, esta consolidada. Toda a

discussão em torno da chamada democracia participativa diz respeito à busca de

elementos, na participação popular, de aperfeiçoamento, valorização e elevação da

qualidade da representação. Retoma o tema da soberania popular como fundamento

maior da democracia; lembra o art. 3º da nossa Carta Magna, para dizer quais são

os objetivos, tarefas e deveres primordiais do Estado brasileiro. Quando começa a

atualizar a discussão, parte da idéia de que não se trata apenas dos temas já

introduzidos no debate de 1987 e 1988: referendo, plebiscito, iniciativa popular.

O debate tem que incorporar hoje a questão da televisão, ou seja, discutir

democracia é discutir espaço público; discutir televisão é discutir espaço público,

espaço de divulgação da informação, de formação de opinião. É preciso discutir o

tema no momento que o Congresso Nacional considerar adequado, incorporando as

regras da representação, geralmente concebidas muito tempo antes dessa inovação

histórica, e a modificação estrutural que a existência da televisão e do rádio vai

introduzindo, o marketing político, para atualizar nossas regras.

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Ela fala em direito de antena, ou teledemocracia, faz um apanhado das

experiências de países que já têm essa metodologia para se começar a pensar em

introduzir algo semelhante aqui.

Quando fala das formas de democracia direta, de participação popular, não

limitada ao espaço de quatro em quatro anos, intervalo das eleições, retoma a

questão doutrinária sobre referendo, plebiscito, casos para um e para outro, discute

a iniciativa popular, incorpora o tema orçamento participativo e fecha com a

educação para a cidadania, que hoje várias redes trabalham no Brasil. A idéia de

uma participação popular crescente na decisão política requer educação, que se dá

no próprio processo político; educação não formal, mas também educação formal,

aperfeiçoamentos dos vários currículos do sistema público de educação, do

Ministério, etc., para que se prepare melhor o eleitor ou o futuro eleitor para votar,

para exercer a cidadania plenamente.

Também lembra a valorização dos conselhos, incluindo os avanços já

alcançados, inclusive em Conselhos Gestores, em Conselhos de Representantes de

vários Municípios. E a Comissão de Legislação Participativa, criada em 2001 por

iniciativa do Deputado Aécio Neves.

Vou falar rapidamente sobre o trabalho de Chico Whitaker, ex-Vereador de

São Paulo, exilado político por muitos anos e hoje Secretário-Executivo da

Comissão Brasileira de Justiça e Paz da CNBB.

A partir do tema geral, democracia participativa, faz a recapitulação da

iniciativa popular de lei. Desde o primeiro momento da Constituinte, da coleta de

assinaturas, da plenária pró-participação popular, até o balanço, um tanto quanto

melancólico e pessimista, de apenas duas iniciativas populares conseguirem tramitar

nesta Casa, uma só aprovada até hoje, transformada na Lei nº 9.840, da Comissão

de Combate à Corrupção Eleitoral.

Também levanta problemas, solicita à Casa que estude aperfeiçoamentos.

Lembra o projeto da Deputada Luiza Erundina sobre redução do percentual de 1%

de assinaturas, por conhecer a experiência de coletar um milhão de assinaturas de

cidadãos que não andam com o título de eleitor.

Além dessa idéia, faz sugestões no sentido de serem utilizadas urnas

eletrônicas autorizadas e cedidas pelo TSE para a região, o que resolveria o

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problema da autenticidade. Apresenta também a idéia de delimitação de temas pelo

Congresso Nacional, a fim de se evitar a banalização da iniciativa popular.

Trabalho do filósofo político Renato Janine Ribeiro, da USP, é a anteposição

do voto obrigatório ao voto facultativo. É um ensaio bastante livre, coloquial, que, no

fundo, aborda tema clássico da teoria política, um tanto complexo: a anteposição do

conceito de liberdade liberal ao de liberdade democrática.

José Guilherme Merchior discute magistralmente liberalismo novo e antigo e

afirma que o conceito liberal de liberdade é muito mais propriamente assentado na

alma do liberalismo, na proteção do indivíduo frente ao Estado, ao passo que a idéia

de liberdade democrática tenderia mais para a associação comunitária.

No fundo, a discussão sobre voto facultativo e voto obrigatório reflete as duas

concepções. E Renato Janine Ribeiro sustenta que o voto obrigatório é o que mais

propende num país como o Brasil, para reforçar a participação de todos os cidadãos.

Claro que também faz ponderações sobre os argumentos contrários.

A cientista política Raquel Meneguello, da UNICAMP, analisa algumas

pesquisas recentes de opinião pública sobre reforma política. Trata-se de perguntas

ao cidadão, na rua e em seu domicílio, sobre como vê os partidos, a fidelidade

partidária, a coligação, a própria idéia de reforma política. Vale a pena ler com

atenção.

O trabalho de um cientista político e Vereador do PT em Taubaté foi

incorporado ao estudo porque pareceu ao Dr. Fábio Konder Comparato e à Profa.

Maria Victória Benevides sugestão muito interessante para os senhores legisladores,

tendo em vista que apresenta a idéia do Legislativo no Município.

O Prof. Fábio Wanderley Reis, no seu trabalho, usa a expressão reformas

políticas, no plural. Talvez haja outras para os próximos anos. Faz um belo estudo

sobre como o Vereador é reconhecido pelo conterrâneo como autoridade, como

alguém que pode conseguir um hospital, uma ambulância, asfalto para essa ou

aquela estrada, e como isso cria necessária dependência em relação ao Executivo e

desequilibra a desejável relação entre os Poderes. Como é do PT, o professor

encerra com 13 sugestões de aperfeiçoamento nessa área.

Sobre os temas dos seminários resumidos neste livro não vou ter tempo de

falar, nem de submeter aos convidados a famosa revisão. Portanto, qualquer

barbeiragem é responsabilidade nossa.

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O primeiro seminário foi realizado em 22 de abril de 2002, na USP, na famosa

Faculdade de Filosofia, situada na Rua Maria Antônia. A abertura foi feita pelo

Presidente Lula e por Francisco de Oliveira. De manhã, o tema foi o financiamento

público de campanha. Falaram, dentre outros, o cientista político do IUPERJ Jairo

Nicolau, um dos grandes especialistas da área, com o maior número de publicações

recentes sobre o tema, que tem um trabalho próprio neste livro, ao qual Fábio

Kerche fará referência; o Senador Roberto Requião, hoje Governador do Paraná; o

empresário Ricardo Young, Presidente do Conselho Deliberativo do Instituto Ethos

de Responsabilidade Social; e o Deputado João Paulo Cunha, Presidente desta

Casa, que acaba de nos honrar com a sua presença. À tarde, foram abordados os

seguintes temas: voto distrital e voto proporcional em anteposição e coligações

proporcionais. Os convidados foram o cientista político Fernando Limongi, professor

da USP e Presidente do CEBRAP, que todos conhecem por ser um dos

especialistas que mais tem publicado artigos sobre o assunto; o Ministro Costa Leite,

ex-Presidente do Superior Tribunal de Justiça, então no PSB; e o Dr. Fábio Konder

Comparato.

No seminário do Rio de Janeiro, realizado no IUPERJ, discutiu-se a relação

entre os Poderes com o então Deputado Federal Milton Temer e o cientista político

Luiz Verneck Viana. Faltou, embora tivesse prometido ao Deputado João Paulo

Cunha que compareceria, o Prefeito César Maia. À tarde foi debatida a questão da

Federação pelo Deputado Jorge Bittar, pelo Prof. Maurício Barreira, da Fundação

Getúlio Vargas, e pelo Prof. Wanderley Guilherme dos Santos, do IUPERJ.

No terceiro e último seminário, realizado em Porto Alegre no mês de junho,

falaram sobre partidos políticos e controles democráticos os ex-Prefeitos Tarso

Genro e Raul Pont, o Deputado Fernando Coruja, do PDT de Santa Catarina, e o

cientista político André Marinho. À tarde, o tema discutido foi democracia

participativa. O debate começou com a Profa. Maria Victória Benevides, depois

falaram o Deputado Estadual Bernardo de Souza, do PPS do Rio Grande do Sul, ex-

Prefeito de Pelotas, onde houve a experiência embrionária do orçamento

participativo, o especialista da Universidade Federal do Rio Grande do Sul Luciano

Fedozzi e o ex-Governador Olívio Dutra.

Muito obrigado.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Agradeço ao Prof.

Paulo Vannuchi e passo imediatamente a palavra ao Prof. Fábio Kerche. Ao fim da

sua explanação, as inscrições serão encerradas.

Tem V.Sa. a palavra.

O SR. FÁBIO KERCHE – Sr. Presidente, Deputado Alexandre Cardoso, Sr.

Relator, Ronaldo Caiado, Sras. e Srs. Deputados, devo confessar o meu desconforto

em falar para V.Exas. Costumo falar para alunos, o que é um pouco mais fácil.

Vou tentar ser breve e claro. Vou falar rapidamente sobre alguns papers

apresentados neste livro. Comentarei, inicialmente, o artigo do Prof. Jairo Nicolau,

da IUPERJ, intitulado “Reforma da Representação Proporcional do Brasil”. Nele, o

professor diz não haver uma reforma política boa ou má, em abstrato. Ela é boa ou

má se atinge os objetivos tentados anteriormente. Se o objetivo, por exemplo, é

diminuir o número de partidos, há certos instrumentos; se é aumentar a

proporcionalidade, há outros.

O Prof. David Samuels, da Faculdade de Ciência Política da Universidade de

Minnesota, em seu artigo “Financiamentos de Campanha e Eleição no Brasil” usa

dados do Tribunal Superior Eleitoral, prestação de contas de campanhas, para fazer

a análise da questão e chega a conclusões muito interessantes. Por exemplo: que

as campanhas brasileiras são muito caras mesmo quando comparadas com as dos

Estados Unidos. No final do artigo, discute as vantagens e desvantagens do

financiamento público de campanha. Em princípio, ele acha o ponto interessante,

mas lembra que devemos tomar certos cuidados, porque somente o financiamento

público não impede o chamada caixa dois das campanhas.

O Prof. Fernando Limongi e a Sra. Argelina Figueiredo — talvez os dois

cientistas políticos mais citados no Brasil —, no artigo “Medidas Provisórias”

enfatizam que a medida provisória representa, na verdade, uma delegação do Poder

Legislação para o Poder Executivo, mas não abdicação. Os autores argumentam

que há interesse do Legislativo de que as medidas provisórias sejam um instrumento

de criação legislativa.

O Prof. Fernando Abrucio, da PUC de São Paulo e da Fundação Getúlio

Vargas, no seu artigo “Reforma Política e Federalismo” cita o histórico da Federação

no Brasil e no mundo e toca em dois pontos interessantes, relativos à reforma

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política, que destaco: o papel do Senado e a questão da Federação; a

desproporcionalidade da representação dos Estados.

A Profa. Celina Souza, da Universidade Federal da Bahia, no seu artigo

“Políticas Públicas e Orçamentos Públicos” faz o histórico da diminuição do peso

individual na construção dos orçamentos, demonstrando que, depois da CPI do

Orçamento, o caráter individualista das propostas orçamentárias se transformou; e

faz um estudo sobre o Orçamento Participativo, ou seja, como fazê-lo em âmbito

federal e local, as novas experiências e projetos mais coletivos de elaboração do

Orçamento.

O Dr. Gustavo Venturi, Cientista Político da USP, ex-Diretor do Datafolha, em

seu artigo “Opinião Pública, Legislação Eleitoral e Democracia” discute as pesquisas

eleitorais e a liberdade de divulgação, que não deve ser confundida com ausência

de regulamentação. Ele defende que as pesquisas sejam amplamente divulgadas,

mas que os instrumentos de controle em relação à metodologia e a quem financia

sejam reforçados, a fim de que o cidadão tenha condições de escolher melhor os

seus representantes.

O Prof. Carlos Ranulfo Melo, da Universidade Federal de Minas Gerais, em

seu artigo “Migração Partidária na Câmara dos Deputados” apresenta um dado que

V.Exas. devem conhecer: de 1985 a 2001 houve 1.035 migrações partidárias entre

os Deputados Federais.

(Intervenção inaudível.)

O SR. FÁBIO KERCHE – Não. Deputados Federais.

O artigo é muito interessante, Deputado, porque mostra as diferenças

partidárias, como e quantas vezes ocorre a migração, e que, além de mudar a

relação de forças internas na Câmara, o fato prejudica ou arranha a imagem da

própria Casa. Ao final, propõe a discussão do assunto.

Por fim, o artigo o Prof. Otávio Dulci, da Universidade Federal de Minas

Gerais, sobre os partidos políticos no Brasil. Segundo sua análise, a legislação

brasileira é rígida quanto ao direito de um partido à representação, à cláusula de

exclusão, ao quociente eleitoral, mas muito permissivo quanto ao funcionamento dos

partidos. Ele propõe também um debate sobre a eventual reforma do sistema

partidário brasileiro e mapeia a história partidária brasileira.

Vou finalizar, porque acho mais interessante o debate.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Antes de passar a

palavra aos eminentes Deputados, quero registrar que o Relator fará as suas

observações ao final do debate.

Os Srs. Deputados já têm a ata da última reunião.

Regimentalmente, pergunto ao Plenário se há necessidade da sua leitura.

O SR. DEPUTADO MARCOS ABRAMO – Solicito a dispensa da leitura, Sr.

Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Dispensada a leitura

da ata.

Em discussão. (Pausa.)

Não havendo quem queria discutir, passa-se à votação.

Os Deputados que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)

Aprovada.

Srs. Deputados, quero registrar o que me disse um jornalista: “Deputado, a

primeira reforma a ser encaminhada para a Casa acabou sendo a reforma política”.

Entendo que essa foi a grande contribuição que o Instituto Cidadania deu a esta

Comissão e a esta Casa. A entidade merece abrir os debates desta reunião de

audiência pública.

Agradeço, em meu nome e em nome do Relator, à Deputada Luíza Erundina

por ter feito o requerimento de realização desta reunião.

Passarei a palavra aos Srs. Deputados, antes solicitando que, por haver

grande número de inscritos, seja respeitado o tempo de três minutos.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA – Sr. Presidente, não consegui entender

com quem e onde deveria fazer a inscrição.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Querem se inscrever

os Deputados João Almeida, Renildo Calheiros, Chico Alencar, Colombo e Nilton

Baiano. (Pausa.)

Estão encerradas as inscrições.

Com a palavra a nobre Deputada Luiza Erundina.

A SRA. DEPUTADA LUIZA ERUNDINA – Sr. Presidente, colegas

Parlamentares, caros expositores desta reunião de audiência pública, como já se

previa, a contribuição dada aqui é suficiente para debatermos todos os temas

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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relativos a uma verdadeira reforma política, tendo como base particularidades e

concepções acerca da questão e visando dar consistência ao trabalho.

Graças à forma de apresentação, bastante instigante, mesmo durante a

Semana Santa muitas pessoas provavelmente vão se deliciar com esse trabalho.

No pouco tempo que tenho não pretendo me referir à exposição dos três

convidados, até porque não domino suficientemente bem o assunto para discutir

questões pontuais. Sinto-me, entretanto, tentada a abordar algumas questões não

necessariamente ligadas ao que foi apresentado, mas que têm sido objeto de

discussão e de preocupação não só desta, mas também de outras Comissões de

que temos participado.

Ontem houve um ciclo de debates, promovido pela bancada do Partido

Socialista Brasileiro, sobre o Sistema Financeiro. Vamos realizar vários debates

sobre os diferentes temas das reformas em curso na Casa. Por que estou falando

nisso? Porque, quando tratávamos da reforma do Sistema Financeiro houve a

necessidade de definirmos que Estado queremos, de que Estado precisamos e

quais reformas precisam ser feitas. Houve quem perguntasse: “Autonomia do Banco

Central em relação a quê?” Portanto, trata-se de elaboração muito mais estrutural e

não simplesmente de abordar esse ponto específico.

V.Sas. conseguem ver relação entre a reforma política e as demais reformas

em discussão na Casa — previdenciária, tributária, agrária e do Poder Judiciário?

V.Sas. vêm relação entre a abordagem da reforma política e dos outros temas em

curso na Casa?

Outra questão sobre a qual queria falar é a cláusula de barreira. Fala-se muito

que o Brasil tem muitos partidos, pequenos, médios e grandes. Surge, então, a

denúncia de legendas de aluguel, enfim, de deformação que existe ou se imagina

existir. Pergunto: como o Instituto Cidadania analisa o tema no trabalho

apresentado, tendo em vista o atual número de partidos e sua identidade político-

ideológica?

A democracia está no centro do debate da reforma política. Em certo sentido,

avançamos em relação ao que está previsto na Constituição de 1988, sobretudo em

relação aos mecanismos de participação da sociedade civil organizada. Cito os

conselhos paritários, as audiências públicas e outros mecanismos das três esferas

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de Poder que têm sido exercitados de forma incipiente, mas são muito importantes

para a democracia participativa.

Na Câmara, a Comissão de Legislação Participativa, criada há pouco mais de

um ano, tem muita receptividade na sociedade civil organizada. Com um ano e meio

de funcionamento, foram apresentadas mais de cem sugestões de projetos de lei,

vários deles aprovados nesta e em outras Comissões de mérito. Um deles foi

aprovado pelo Plenário da Câmara. Há, portanto, uma dinâmica muito mais ágil do

que aquela que se origina da iniciativa de um Parlamentar. Muitas vezes

apresentamos projeto de lei, e depois de um ou dois mandatos ainda não

conseguimos aprová-lo nesta Casa, muito menos no Senado, para vê-lo sancionado

pelo Presidente da República. Esse mecanismo, mesmo com pouco tempo de

funcionamento, já demonstra a sua eficácia e o interesse da sociedade civil

organizada de se apropriar desse espaço de participação democrática.

Chamo a atenção de V.Exas. para o fato de que há um embrião de

Orçamento Participativo, iniciativa da Comissão de Legislação Participativa. Do

Orçamento de 2002 constaram recursos no limite de quase 40 milhões de reais. É

muito pouco em relação a um orçamento de bilhões de reais, mas foram incluídos e

aprovados na Comissão Mista de Orçamento por sugestão de entidades da

sociedade civil, por intermédio da Comissão de Legislação Participativa. Portanto,

seria o embrião do Orçamento Participativo, processo no qual a sociedade civil

organizada propõe e vê aprovados recursos para programas e atividades de

organizações de âmbito nacional.

Peço a V.Sas. que teçam mais considerações a respeito disso.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – A Presidência vai

conceder a palavra a três Srs. Deputados, para depois passá-la aos membros da

Mesa.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA – É natural que V.Exa. tenha sido

condescendente com a Deputada Luiza Erundina, autora do requerimento.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Sim, a Deputada Luiza

Erundina é a autora do requerimento.

Peço aos Srs. Deputados que respeitem o prazo de três minutos, para que

todos possam falar.

Com a palavra o Deputado José Divino.

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O SR. DEPUTADO JOSÉ DIVINO – Sr. Presidente, Sr. Relator, Sras. e Srs.

Deputados, membros da Mesa, o País vive uma falsa democracia. Minha

preocupação é no sentido de que esta Comissão faça uma reforma não para a

sociedade, mas para atender aos interesses de partidos políticos, de caciques

políticos e das elites. Neste País o voto é obrigatório, mas o Deputado eleito vota da

forma que quiser, e isso não é democracia.

Penso que um país que não dá liberdade a seu povo para votar com a sua

consciência, que impõe o voto obrigatório, não é democrático. É como se a classe

política brasileira dissesse que o povo brasileiro não tem capacidade,

responsabilidade e consciência do seu dever. Não concordo com o voto obrigatório.

É evidente que vai crescer o número de inscritos. Para dirigirmos um carro,

precisamos de habilitação; é obrigatório fazer a declaração do Imposto de Renda

para aumentar o número de declarantes — essa é uma tese furada.

Qual é o pensamento do Instituto Cidadania a respeito do financiamento

público de campanha em um país onde a educação e o planejamento familiar não

são prioridade?

No meu Estado, o Rio de Janeiro, há dois meses o funcionalismo público está

em greve. Quanto à lista e à idéia de que vai ser um balcão de negócios, se

aprovada, será melhor negócio abrir os partidos na Bolsa de Valores, porque o

primeiro da lista vai ter o mesmo valor do passe de Ronaldinho.

Eram essas as minhas considerações.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Obrigado, Deputado

José Divino.

Com a palavra o Deputado Lincoln Portela.

O SR. DEPUTADO LINCOLN PORTELA – Sr. Presidente, Sras. e Srs.

Deputados, Sr. Relator, Dr. Francisco de Oliveira, Dr. Paulo Vannuchi, Dr. Fábio

Kerche, hoje estou me sentindo pobre — desculpem-me a comparação, toda a

analogia por si mesma é imperfeita —, financeiramente pobre, a exemplo daquele

que vai à casa do rico e vê uma mesa muito bem posta, um jantar com muitas

iguarias, fica inibido e come pouco.

Lamentavelmente nosso tempo acaba sendo escasso para ouvi-los e, talvez

até individualmente, um tema fosse debatido por vez.

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Tenho grande prazer em estar aqui. Sinto-me enriquecido. Sei que vou fazer

bom uso deste trabalho, percebe-se, muito bem elaborado pelo Instituto Cidadania.

Mas deixo apenas minha palavra. Gostaria de alimentar-me um pouco mais com

aquilo que os senhores têm a nos oferecer.

A Deputada Luiza Erundina fala de cláusulas de barreira, que, dependendo de

como são usadas, para mim acabam sendo um instituto da ditadura, talvez menos

rigorosas, levando-se em conta que as legendas de aluguel não se devem ao

tamanho dos partidos.

Quando os gregos iam para as praças encenar e colocavam máscaras,

diziam que era hipocrisia. O partido ser pequeno não significa que seja de aluguel.

Todos sabemos quanto custa uma eleição, tanto dos grandes quanto dos pequenos,

e o tipo de negociação e acordos feitos, tanto com os pequenos quanto com os

grandes.

Concluindo, quanto a voto facultativo, de 1946 para 2000, a oferta eleitoral no

Sudeste cresceu 1,10%, também por causa da proliferação dos partidos, o que é

inteiramente constitucional. As mulheres também entraram na vida política. Estou

resumindo em linguagem telegráfica minha manifestação para não ultrapassar o

tempo. De 1970 para 2003, 32 anos, o Brasil cresceu em 80 milhões de brasileiros,

houve explosão demográfica.

Jamais o voto obrigatório incluirá o coração do cidadão livre. O voto

obrigatório cresce não por causa da inclusão social, mas da inclusão obrigatória e do

crescimento democrático. É preciso que uma análise seja bem feita. Para mim,

democracia completa é aquela em que as pessoas têm liberdade para querer votar

ou não.

Deixo apenas essa observação e não uma pergunta, para dar minha

contribuição.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso ) – Passo a palavra ao

Prof. Francisco de Oliveira, pelo tempo de três minutos. S.Sa. responderá as

questões a ele direcionadas. Depois ouviremos os Profs. Paulo Vannuchi e Fábio

Kerche.

O SR. FRANCISCO DE OLIVEIRA – Guimarães Rosa, que escrevia livros

quilométricos, dizia que não tinha tempo para ser sintético.

Vou ater-me a duas questões, que saíram de várias intervenções.

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Quanto à obrigatoriedade, que parece contradição com democracia, o estudo

da Cidadania não tem posição alguma. Isso não é recuar da linha de batalha.

Entendemos que estamos numa sociedade plural, complexa, que não é redutível a

qualquer esquema. Qualquer esforço da Ciência Política para reduzi-la a qualquer

esquema rema contra a maré e desrespeita a complexidade dessa sociedade.

O estudo da Cidadania oferece um conjunto de sugestões. Nenhuma delas é

demonstrável positivamente. Não existe isso em Ciência Política nem em quase

nenhum assunto da sociedade. Não se demonstra uma coisa contra outra. São

opções e escolhas que estão à disposição dos cidadãos e dos seus representantes.

Há consenso formado pela experiência, pela formação, de que o voto

obrigatório, por exemplo, no Brasil, é democratizante. Evidentemente, questiona-se:

é democrático obrigar? Trata-se de uma sociedade de desiguais — é preciso não

esquecer isso —, apesar de complexa, na qual uns têm mais chances do que outros.

O voto obrigatório — os Deputados sabem disso muito mais do que eu — não

significa que ninguém pode deixar de votar. Pode. Só que o cidadão tem obrigações

no sentido de que a direitos correspondem deveres. É esse o dilema entre voto

obrigatório e voto facultativo. Se ele for funcionário público e não votar, terá de pagar

multa para continuar recebendo seu salário. Essa não é uma decisão dele, mas

deste Congresso Nacional.

Há consenso majoritário que não fecha a questão de que voto obrigatório é

mais democrático do que, aparentemente, voto facultativo. Algumas experiências

recentes vão nesse sentido.

A França, por exemplo, em 2002, confiou na faculdade de votar de seu povo e

quase se assustou com a eleição de um político de extrema direita, racista, que

pretendia excluir os imigrantes do corpo político do país. Atemorizou-se porque

confiou no voto facultativo. Mas a experiência está demonstrando que não é bem

assim.

A sociedade norte-americana, o segundo maior colégio eleitoral do mundo —

só perde para a Índia — e a maior potência do planeta, tem seu presidente eleito por

25% dos cidadãos.

Será que todos têm consciência de que estão abrindo mão de um direito

fundamental? Não há direito mais fundamental, entre todos os direitos humanos,

senão o de fazer política, porque nele o cidadão tem o direito de intervir no seu

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Estado, de mudar o rumo das coisas, de escolher outros representantes. Essa é

uma posição de consenso, mas tampouco fechada.

A cláusula de barreira não é consensual. A posição da maior parte dos

estudiosos de Ciência Política diz que pode ser perigosa do ponto de vista de fazer

surgir novas opções no espectro político de uma sociedade.

É dito que o sistema brasileiro é muito permissivo, muito aberto. Mas os

estudos que os senhores encontrarão neste repositório, que, se deve ser lido como

bíblia, como alguém sugeriu, são no sentido de sua riqueza, diversidade de pontos

de vista, e não no de rigidez nem de dogma. Isso todos sabemos, fomos criados

nessa tradição. Não há escritor ainda que tenha conseguido superá-la em sua

riqueza, diversidade e pluralidade.

Em relação à cláusula de barreira, a experiência sugere que é preciso não

enrijecer muito, para não evitar o aparecimento de novas opções. Nosso momento é

ilustrativo a esse respeito. Se tivesse havido cláusula de barreira em 1980, não

teríamos o Presidente que temos. Foi preciso um sistema aberto e capaz de aceitar

inovações.

Não há nada taxativo nem unidirecional neste estudo.

É só o que tenho a dizer.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Muito obrigado, Prof.

Francisco de Oliveira.

Para a complementação dos quesitos apresentados, passo a palavra aos

Profs. Paulo Vannuchi e, depois, Fábio Kerche.

O SR. PAULO VANNUCHI – Deputada Luiza Erundina, sobre a ordem das

reformas, não tivemos a chance de discuti-la para a apresentação do trabalho. Com

o tempo apertado que temos para responder, preferiria deixar a questão para uma

próxima vez.

Na conversa pessoal que tive com o Presidente Lula, na semana passada,

ficou claro que reforma política é atribuição, competência do Poder Legislativo. Não

se trata de o Poder Executivo estar propondo, discutindo outros dois ou três

encaminhamentos. Foi reafirmada a importância da reforma política como parte da

mudança que se pretende desenvolver no Brasil.

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É essa a mesma importância da democracia participativa da sua fala. Há

alguns estudos valorizando muito a experiência do orçamento participativo — já há

número significativo de Prefeituras de vários partidos que o realizam. Não existe

mais diferença: Oposição, Direita ou não. Foi aprovado como recomendação da

Conferência de Istambul, em 1996, e recomendado em relatórios do Banco Mundial

como prática saudável.

A questão que apareceu à reflexão é que era discussão de orçamento

participativo no âmbito municipal, e os analistas demonstraram consciência da

complexidade.

O texto da Profa. Maria Vitória fala de seu diálogo com o Prof. Fábio

Comparato. Ela dizia: “Eu, muito descrente a respeito da possibilidade de se pensar

um orçamento participativo de nível federal...” E o Prof. Comparato respondeu com o

argumento de que o orçamento é constituído de três peças: o PPA, a Lei de

Diretrizes e a Lei de Orçamento. Nas duas primeiras é possível estudar, pensar,

imaginar alguma maneira de que, na discussão das duas primeiras, haja

possibilidade de consulta.

A questão da lista envolve também polêmica clara, que compete menos a nós

chegarmos aqui com posição, agora com o Deputado José Divino, a favor ou contra.

Registro que também nesse calhamaço vão aparecer argumentos no seguinte

sentido: a lista fortalece os partidos. É verdade, e o Prof. Limonge desenvolve isso

bem não no texto que trata de medidas provisórias, mas em sua fala no seminário

da USP, quando diz: “O problema é que se pode criar a chamada partitocracia”. Isso

levou a Itália a um plebiscito, cujo resultado foi contrário ao financiamento público de

campanha. Naquele período, houve muito medo de fortalecer excessivamente o

poder das máquinas partidárias e esvaziar o poder do eleitor cidadão, agente

fundamental da vida política.

Por último, Deputado Lincoln Portela, reforço a idéia do um por vez. Nesse

sentido, deixo a sugestão de que, na programação da Comissão — nem digo que

seríamos os três —, a partir do estudo, fossem convocados esses especialistas,

pessoas que já trabalharam nesse ramo. Faríamos um esforço concentrado, num

único dia, para ouvir vários deles em um seminário. Realmente valeria muito a pena.

Seria o momento de entrar no debate técnico. O especialista vem aqui e diz: “Olha,

fiz uma pesquisa, durante um ano, sobre isso, tenho essa opinião...”

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Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Prof. Fábio Kerche,

V.Sa. quer fazer alguma observação?

O SR. FÁBIO KERCHE – Apenas um rápido comentário, Sr. Presidente.

Primeiramente, em relação à pergunta da nobre Deputada quanto à cláusula

de barreira. Acho que o quociente eleitoral acaba funcionando um pouco como isso.

Em segundo lugar, no futuro livro há diferentes posições em relação ao

número de partidos. Alguns dizem que o número é excessivo; outros, não.

Como disse no começo, não há nenhuma reforma política neutra. A reforma

política parte de um diagnóstico. Se o diagnóstico for no sentido de que há um

número excessivo de partidos, uma série de instrumentos poderão ser adotados.

Por exemplo, algo limitado, na mudança do sistema eleitoral: se se mudar

para majoritário, a escolha de Deputados, para o chamado voto distrital, tende-se a

reduzir o número de partidos; se se proibir coligações, tende-se a diminuir partidos;

ou se suficiente, o voto proporcional garante o maior número de partidos etc.

Estou querendo dizer que existem instrumentos tanto para diminuir o número

de partidos como para aumentar. Politicamente, a discussão está em avaliar se o

número de partidos no Brasil é excessivo. Primeiro, temos de fazer esta discussão: é

excessivo? Prejudica ou não a governabilidade? Prejudica ou não a negociação aqui

dentro? Se for excessivo, há instrumentos para diminuir o número de partidos? Caso

contrário, existem outros instrumentos?

É isso que o livro apresenta. Não há um ponto fechado no diagnóstico, nem

nas sugestões; há um debate mapeando alternativas.

Em relação ao financiamento público, Deputado José Divino, a avaliação de

vários autores é que ele, em princípio, democratiza a disputa eleitoral porque

permite outros candidatos participarem do processo eleitoral. Porém, todos

ressaltam que é preciso, primeiro, debater amplamente com a sociedade e

convencê-la de que vale a pena retirar dinheiro do Orçamento para financiar

políticos, talvez tentando quebrar a ligação entre o financiador e aquele que recebe

o financiamento. Todos ressaltam que, caso seja adotado, é preciso reforçar os

instrumentos de controle desses gastos, via TSE e TREs, com prestação constante

de contas não só após o final da eleição, mas durante todo o processo eleitoral.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Muito obrigado.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

27

A Mesa passa a palavra ao Deputado João Paulo Gomes da Silva, do PL de

Minas Gerais — parece-me que o Deputado Bonifácio de Andrada declinou porque

tem um compromisso —, depois aos Deputados Nilton Baiano e João Almeida.

O SR. DEPUTADO JOÃO PAULO GOMES DA SILVA – Sr. Presidente,

nobre Relator, senhores convidados, penitencio-me pelo fato de não ter tido

oportunidade de ler o documento que recebemos agora, aliado ao fato de os

senhores todos terem sido muito reticentes em suas explanações, o que acaba

prejudicando bastante a realização do evento.

Contudo, o pouco que pude perceber me deixou bastante assustado. E, se

bem entendi, o Instituto de Cidadania, a despeito de não ter posição firmada, por

exemplo, sobre o voto obrigatório ou facultativo, detectei certa apologia ao sistema

atual do voto obrigatório. É de se lamentar que não tenha posição, pois tenho

percebido e dito sempre que, se o processo eleitoral pretende ser um instrumento da

democracia, o voto não pode continuar sendo obrigatório. Há uma contradição

intransponível nisso. Não há como explicar que a eleição, sendo obrigatória, integra

o processo democrático.

Percebo que isso serve para aumentar a ojeriza e a distância que a

população, sobretudo os mais humildes, guarda em relação à eleição e à atividade

política, que é tão nobre, de maneira geral.

O fato de termos 116 milhões de eleitores, a meu juízo, não nos autoriza

comemorar e dizer que são eleitores incluídos, que são cidadãos, até porque um

Título de Eleitor não retira ninguém da exclusão, absolutamente ninguém. E a

realidade nos mostra isso de maneira irrebatível.

O exemplo da França, a meu juízo, não deve ser aplicado ao Brasil porque

aqui, muito provavelmente, aconteceria o contrário. Percebo um receio muito grande

dos partidos que fazem política na freqüência de centro-direita de concordar com o

voto facultativo exatamente pelo poder de mobilização popular dos partidos que

fazem política na freqüência de centro-esquerda. Entendo que o efeito poderia ser

contrário daquele ocorrido na França.

Em relação ao financiamento público de campanha, não quero acreditar que

exista entre nós alguém que aceite que esse financiamento possa elidir ou reduzir o

emprego de recursos particulares, quer seja nas malhas e nas vias de doação, quer

seja nos recursos próprios de uma campanha política. Digo isso porque nossas

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instituições são todas muito precárias, e não teríamos instrumentos para fiscalizar e

coibir esse comportamento.

Não dá para acreditar que entre nós, nesta Casa, há alguém que entenda que

o financiamento público possa prestar-se a outra finalidade além de desacreditar a

atividade política.

O SR. DEPUTADO ALOYSIO NUNES FERREIRA – Não posso aceitar, sem

meu veemente protesto, afirmação que desqualifica minha atividade parlamentar.

O SR. DEPUTADO JOÃO PAULO GOMES DA SILVA – Solicito ao nobre

Presidente que mantenha minha palavra. Não estou pedindo ao nobre Deputado

para concordar comigo.

O SR. DEPUTADO ALOYSIO NUNES FERREIRA – O que não aceito é

ofensa ao autor de uma iniciativa parlamentar. Sou um dos autores do projeto de lei

de financiamento público de campanha e não aceito esse tipo de desqualificação do

meu trabalho. Respeito a opinião de V.Exa., mas não aceito...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Vou pedir ao

Plenário...

O SR. DEPUTADO JOÃO PAULO GOMES DA SILVA – Não concedi aparte

ao nobre colega, caro Presidente, e tenho humildade suficiente para pedir

desculpas, porque sequer sabia que S.Exa. era autor de projeto dessa natureza que

tramita na Casa. O nobre colega não tem de concordar comigo e também não quero

que perca a oportunidade de se manifestar. Acho que o debate é democrático. Estou

falando aqui em meu nome e no de outras pessoas que represento. Tenho o direito

de falar. Se V.Exa. puder manter minha palavra, Sr. Presidente, gostaria...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Deputado João Paulo

Gomes da Silva, tem V.Exa. a palavra como orador inscrito.

O SR. DEPUTADO JOÃO PAULO GOMES DA SILVA – Obrigado, caro

Presidente...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Não posso impedir

protestos nem questões de ordem porque fogem ao meu controle. Evidentemente,

manterei a palavra sempre que puder, de acordo com o Regimento.

Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO JOÃO PAULO GOMES DA SILVA – Muito obrigado,

Presidente.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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Receba o nobre ex-Ministro meu pedido de desculpas. Não sabia que V.Exa.

era autor de uma proposta dessa natureza. Vim aqui combater idéias, não quero

agredir nem vilipendiar o nome ou as propostas de ninguém.

Prossigo. Colocaríamos sobre o eleitor aquela sensação de que estaria

pagando aos políticos não apenas depois de sua eleição e de sua posse. O simples

fato de registrar uma candidatura já colocaria o eleitor na obrigação de pagar, de

atribuir certa importância financeira ao eleitor.

Não consigo ver contribuição alguma nisso, nobre Presidente, e sabemos

bem que no cenário atual, a menos que haja uma mudança tão radical, que não

percebo, o sistema de listas, por exemplo, poderia ser um instrumento que criaria um

campo fértil para se aplicar tal sistemática, mas tal lista, com a atual Constituição, é

impossível, porque temos o sufrágio direto e secreto garantido nela, e o partido

seria, portanto, no sistema de lista, um atravessador desse voto direto, o que não é

possível.

Por fim, nobre Presidente, o orçamento participativo. Vivi isso muito

objetivamente e acho que esbarraremos na conceituação. A idéia é boa. Agora, a

aplicação tem experimentado muitos tropeços. Temo, por exemplo, que o orçamento

participativo torne-se um instrumento de manipulação política ideológica, como tem

sido feito, porque se consagram apenas parcos recursos financeiros à comunidade

carente, faz-se uma disputa, um cabo-de-guerra e, evidentemente, a discussão fica

entre um hospital e uma clínica médica, um hospital e um posto de saúde ou uma

escola e um posto de saúde, quando todos são importantes e necessários, enquanto

nas outras faixas, tanto do eleitorado quanto do orçamento, não há nenhuma

interatividade entre a sociedade e a administração pública.

Portanto, a democracia participativa é uma boa idéia, mas precisa ser muito

bem lapidada. Acho que o Instituto de Cidadania pode fazer isso e ofertar

contribuição muito melhor.

Não sei se fiz exatamente uma pergunta. Acho que trouxe um pouco dos

meus questionamentos a respeito dos problemas apresentados e prometo ler

bastante o importante instrumento que recebi da Mesa.

Obrigado.

O SR. DEPUTADO RENILDO CALHEIROS – Sr. Presidente, peço a palavra

pela ordem.

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O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Deputado Renildo

Calheiros, tenho dito que pela ordem é concessão da Mesa, porque se o Deputado

pede pela ordem, vai falar...

O SR. DEPUTADO RENILDO CALHEIROS – Não, Sr. Presidente, serei

breve.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Pois não, Deputado.

O SR. DEPUTADO RENILDO CALHEIROS – Estou preocupado, Sr.

Presidente, porque hoje a Ordem do Dia será pesada e daqui a pouco esta reunião

terá de ser suspensa.

Minha sugestão é a seguinte: se não for muito grande a lista de inscritos,

solicito a V.Exa. que, ao passar a palavra a todos os inscritos, limite o tempo de

cada um em três minutos e, finalmente, que os expositores respondam apenas as

questões que considerem mais importantes.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Se o Plenário estiver

de acordo, aceitarei a sugestão. Sou um escravo do Plenário e do Regimento.

Concedo a palavra ao nobre Deputado Nilton Baiano.

Só vou pedir aos Parlamentares que sejam bem rápidos, pois fui

condescendente com o Deputado João Paulo Gomes da Silva e gostaria de não sê-

lo mais.

Desculpe-me, Deputado. Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO NILTON BAIANO – Não o desculpo, aplaudo V.Exa. pela

decisão.

Infelizmente cheguei atrasado e não pude ouvir a palestra do Prof. Francisco

de Oliveira. Entendo que o voto obrigatório não é uma ira e que a população não

queira votar. Na minha opinião, os políticos é que têm de ser mudados, quando não

responderem aos anseios da população; e, além de não responderem, ainda

aparecem na mídia envolvidos em irregularidades em diversos setores. Isso, no meu

modo de entender, é que cria na população a ira contra os políticos, e o cidadão

deixa de querer votar.

Temos de modificar a postura política para responder aos anseios da

população.

Quero fazer uma pergunta ao Dr. Fábio Kerche sobre financiamento público,

porque também faço voz a alguns Parlamentares que falaram antes de mim. A meu

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ver, esse debate deveria ser diferente e mais longo. Na Mesa há pessoas com

grande capacidade até para nos orientar nas próximas votações.

Sou a favor do financiamento público. É a minha opinião. Não quero, com

essa afirmação, agredir ninguém, mas o financiamento público diminuiria, sim,

desvios. As empresas não querem ter caixa dois, principalmente as mais

organizadas, pois caixa dois é coisa de trambiqueiro, de pessoas que vivem

envolvidas em alguns rolos. Empresa que não tem caixa dois e que, às vezes,

deseja fazer doações a políticos sente-se contrariada. Pior, no momento em que

houver lei regulamentando a situação, ela não vai querer doar mais nada para

ninguém, não vai mais financiar campanhas. Então, na minha visão, o financiamento

público é importante e diminui, sim, certos desvios.

O Dr. Fábio Kerche fez menção à organização da Justiça. Na sua opinião,

não deveríamos organizar melhor os partidos para que eles possam tomar conta

também da área financeira?

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Muito obrigado,

Deputado Nilton Baiano.

Com a palavra o Deputado João Almeida, do PSDB da Bahia.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA – Sr. Presidente, Sras. e Srs.

Deputados, quero também saudar os membros do Instituto de Cidadania e dizer que

estou muito feliz, pois agora tenho minha via-sacra para a Semana Santa — lembro

apenas que há dezoito estações aqui e na via-sacra são quatorze. Vou ter que

eliminar quatro.

Cheguei a ser sondado pelo Deputado João Paulo para participar de um

debate exatamente sobre coligações partidárias e financiamento público de

campanha, depois o evento não foi confirmado. Recebemos aqui contribuição muito

valiosa, que vai nos ajudar muito a refletir e a formar nossas opiniões sobre a

reforma política.

Vou falar apenas sobre dois pontos: financiamento público e campanha. Hoje,

o grosso, o essencial e o educativo da campanha política é financiado pelo Poder

Público — rádio e televisão, os dez e os vinte minutos, as inserções o ano todo. Não

é de graça; é pago pelo Erário e custa muito dinheiro. O que o financiamento privado

banca é a deseducação, a compra do voto, o showmício e a esbórnia. Falta muito

pouco dinheiro para se ter uma eleição decente e competitiva, com condições de

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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participação num patamar de equilíbrio para realizar nossas eleições. O grosso do

custo da campanha, o essencial da campanha hoje é financiado pelo Erário. Se

baixarmos o custo, tiraremos do sistema de campanha a doação, o brinde e o

benefício pessoal. A campanha vai ficar muito barata. Então, o complemento

necessário é muito pouco dinheiro. Só para esclarecer meu ponto de vista.

Outro ponto é a cláusula de desempenho etc. Ao examinar isso, temos de

pesquisar nossa legislação e o que se pratica lá fora. Os senhores sabem que são

coisas completamente diferentes. O que está em vigor no Brasil é diferente do que

há na Alemanha e em outros países. O conceito é completamente diverso.

Enfim, Sr. Presidente, não quero alongar-me, pois esses temas serão

discutidos oportunamente.

Quero parabenizar o Instituto de Cidadania e agradecer o envio de

instrumento tão valioso para nossos trabalhos.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Muito obrigado,

Deputado João Almeida.

Com a palavra o Deputado Renildo Calheiros.

O SR. DEPUTADO RENILDO CALHEIROS – Sr. Presidente, Sr. Relator,

Sras. e Srs. Deputados, em primeiro lugar, quero parabenizar o Instituto de

Cidadania pelo importante trabalho produzido. Também quero dizer que, ao

contrário do Deputado João Almeida, vou precisar lê-lo até o São João. Pelo volume

de texto que há aqui, acho que para a Semana Santa não vou dar conta. (Risos.)

Para respeitar o prazo de três minutos, estabelecido pelo Presidente para

nossa intervenção, vou mencionar telegraficamente algumas questões

Durante muitos anos, no Brasil, tivemos o bipartidarismo. Inicialmente, o MDB

e a ARENA; depois o PMDB e o PDS. Em seguida, surgiram mais três partidos: o

PTB — se não me falha a memória —, o PDT e o PT. Mas durante muitos anos, no

período do regime militar, era o sistema bipartidário. Não sei se por um erro de

formação, foi o momento em que comecei a participar um pouco da vida política

brasileira, mas fiquei com isso na cabeça.

Sempre associei a restrição à liberdade de organização partidária; sempre

associei impedimentos ao funcionamento parlamentar a medidas não democráticas,

mas ligadas a um regime autoritário, a um regime de exceção.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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Na época da ditadura militar, além do bipartidarismo, existia também a

fidelidade partidária, fixada em lei. Houve até um caso famoso, com um Deputado do

Sul — se não me engano, do Estado do Paraná, do MDB — que fez discurso da

tribuna da Câmara dos Deputados saudando o Ato Institucional nº 5. O Diretório

Nacional do MDB se reuniu e o expulsou, pois achou aquela atitude uma agressão

ao que o MDB defendia à época. O Deputado entrou com ação na Justiça e recebeu

decisão favorável. Então, mediante sentença concedida pelo Poder Judiciário, voltou

para o MDB, de onde havia sido expulso e com o qual politicamente não tinha

nenhuma afinidade naquele momento. Digo isso porque, a meu ver, fidelidade

partidária é uma necessidade, mas deve ser objeto de lei, objeto do estatuto dos

partidos políticos.

Esta é a minha questão: o exame da fidelidade partidária deve ser transferido

para o âmbito do Poder Judiciário ou deve ser matéria afeta aos partidos? Muitas

vezes, as pessoas querem resolver questões nos partidos sem assumir a decisão

como uma posição do partido, querem que a lei resolva um problema político que

não estão querendo enfrentar. Levanto essa questão também para reflexão.

Gostei muito quando o Dr. Francisco de Oliveira, citando o Dr. Fábio

Wanderley Reis, disse que é necessário tempo para que as instituições se

consolidem. Penso dessa maneira, sou um otimista com relação à vitalidade da

democracia brasileira. Acho que o Brasil, com poucos anos de democracia, da

metade da década de 80 para cá, vem dando, vamos dizer assim, algumas lições a

outros países. No Brasil, tem-se eleição para Presidente da República num dia e já

na madrugada seguinte sabemos quem foi eleito, sem contestações, sem denúncias

de fraude sequer em todo o País.

A democracia brasileira elegeu um ex-líder sindical. Ele havia sido preso no

início da década de 80 porque o regime de então o acusava de atentar contra a Lei

de Segurança Nacional. Hoje é o Presidente da República, legitimamente eleito pelo

povo brasileiro. A democracia no Brasil já produziu uma CPI para investigar o Poder

Judiciário. Com muitas limitações, não foi muito longe, é verdade, mas o fez. A

democracia brasileira produziu processos que culminaram com a cassação de

Deputados. A democracia brasileira já afastou, por meio de impeachment, um

Presidente da República sem ter, hora nenhuma, colocado em risco, vamos dizer

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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assim, para usar uma expressão mais compreensiva, a legalidade democrática ou,

em algum momento, agredido nossa Constituição.

Penso que nossa democracia é jovem e vejo com muita preocupação certo

esforço em alguns setores do Congresso Nacional e fora dele também de se querer

regulamentar demais as coisas no Brasil. Sou contra regulamentação excessiva. O

Brasil precisa experimentar sua democracia, sem procurar copiar modelos de outros

países. Isso não dá certo, nunca deu certo em lugar nenhum, muito menos em um

país como o Brasil.

Apenas uma pergunta ao Dr. Francisco, que passou tangenciando pelo

problema.

Cada um dos Parlamentares que estão aqui quer uma reforma política. Todos

somos presididos por um aperfeiçoamento da democracia brasileira. Não há nenhum

que deseje desrespeitar a democracia, mas cada um vê a consolidação da

democracia e seu aprimoramento de uma forma.

Na minha maneira de ver, não há problema em se ter democracia de mais;

problema há em democracia de menos. Busco mais democracia para o Brasil.

Não concordo com a opinião de alguns colegas que acham que o problema

da democracia brasileira são os pequenos partidos. Pelo contrário, o problema da

democracia brasileira está nos grandes partidos, que, a rigor, não funcionam como

partidos políticos. É só observarmos a participação dos partidos nas últimas eleições

e nas próprias votações no Congresso. Não acredito que o problema esteja no

Congresso brasileiro. Alguns dizem que há uma certa lentidão. Não concordo com

essa opinião da mídia, principalmente de que, talvez, a lentidão seja causada pelos

pequenos partidos, como PV, PRONA ou PMN. Seguramente não é.

Outro ponto. Quando os 513 Deputados são eleitos, não é distribuída uma

bomba atômica para cada um, para que possa, se quiser, destruir o plenário. Aqui se

leva em consideração o peso de cada partido, e esse peso é proporcional à

quantidade de votos que os partidos obtiveram. Quando os partidos grandes se

entendem, as matérias são aprovadas. Não é um partido pequeno que obstrui a

pauta, não é um partido pequeno que retira matérias importantes, que não foram

votadas porque ele foi contra. O partido pequeno tem peso pequeno. Nossos

problemas estão nas dificuldades criadas pelos grandes partidos. É a minha maneira

de ver.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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Para finalizar, Sr. Presidente, vou falar sobre a cláusula de barreira, que tem

como objetivo explícito enxugar o quadro partidário, diminuir o número de partidos

em atividade no Congresso Nacional, o que se convencionou chamar de

funcionamento parlamentar. Na minha maneira de ver, a cláusula de barreira,

embora exista em outros países, é um atentado à democracia. Exigir-se quadro

partidário enxuto através da cláusula de barreira é um mecanismo artificial; é exigir

da sociedade que ela negue sua própria pluralidade. Em qualquer sociedade devem

existir tantos partidos quantos ela deseje. Cabe ao povo dizer que partidos devem

crescer e que partidos não devem.

Fui Presidente da UNE e busquei apoio no Congresso para nossas causas.

Àquela época, o PT tinha cinco Deputados. Hoje tem o Presidente da República, 91

Deputados e vários Senadores. Tivesse a cláusula de barreira sido aplicada naquela

época, qual seria o resultado hoje? Havia um partido que se intitulava o maior do

Ocidente. Hoje nem existe mais.

Penso que precisamos buscar o aprimoramento da democracia. Só não

podemos regulamentar demais para não restringirmos a própria democracia, que

ainda precisa florescer no Brasil.

Solicito aos nobres expositores que façam algum comentário sobre a cláusula

de barreira, que, para mim, restringe as liberdades democráticas.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – O Deputado Colombo

é o último inscrito. Após S.Exa. passarei a palavra aos senhores expositores.

Concedo a palavra ao Deputado Colombo.

O SR. DEPUTADO COLOMBO - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, em

certa ocasião, Deputado Distrital pelo Paraná, fui até o Presidente daquela Casa, já

falecido, pois os Deputados estavam recebendo muitas críticas da comunidade. Eu

disse: “Temos de fazer algum seminário ou debate, chamar professores, para falar

que política é importante, para resguardar a imagem do político”. Ele olhou para mim

e disse: “Meu querido Deputado, você está começando. Desde que escolhi a política

sempre fui criticado e sempre fui reeleito”. Ele me fez refletir: por que acontece esse

fenômeno?

Pude perceber que os políticos são vistos pela população por uma lupa. À

medida que cometemos qualquer deslize ou que há qualquer problema, essa

mesma lupa vai querer ver o problema.

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Podemos fazer analogia com a queda de um avião. Estatisticamente é muito

mais seguro viajar de avião. Contudo, acontecem acidentes de avião no Pará, no

Paraná, em qualquer lugar. Qualquer acidente de avião é motivo de notícia. Já o

acidente de carro, tão corriqueiro, que mata tantas pessoas, não é notícia nem de

jornais locais.

A vida do político, mais criticado ou menos criticado, é peculiar à nossa

atividade. Nossa atuação vem sendo ampliada por conta da mídia, da informação.

Quando um artista mata alguém num acidente de carro, ele é muito mais cobrado e

criticado; articulistas escrevem matérias por conta disso. Portanto, estamos inseridos

num caldo cultural que faz avaliações sobre nossa atuação. As críticas aos políticos

acontecem em todos os lugares do mundo. Mesmo sem se preocupar muito com

isso, como disse Weber, temos a chamada ética da responsabilidade, em que pese

atuarmos muito com a ética da oportunidade.

Temos que nos preocupar — refiro-me aos nossos debatedores, às pessoas

que vêm colaborar conosco, do Instituto Cidadania — não só com o período pré-

eleição como também com o pós-eleição. Parece-me que sua tese de doutoramento

vai um pouco por aí.

Na nossa cultura, será que caberia pensarmos em algumas propostas de

âmbito internacional? Já foi abordada a dificuldade de importarmos idéias.

Entretanto, no Brasil, nosso sistema cartorial e muitas outras coisas nos impuseram

isso. Cabe, então, certa reflexão. Temos que considerar nossa especificidade

cultural, por exemplo, as comparações do esquadrinhamento do pensamento

cultural do eleitor brasileiro, em que aparecem a antipatia e a simpatia versus, em

outros países mais dominantes, a idéia de partido, idéias e propostas. São esses os

esquadrinhamentos. A simpatia pode ser caracterizada por um sorriso, presentes,

compra de voto, favores de toda ordem. Então, considerando a questão cultural, em

que foi avaliada a especificidade cultural, o estilo brasileiro, a forma de ser, pergunto

aos debatedores como ficaria o controle eleitoral pós-eleição. Seria possível

pensarmos no recall, na recondução aqui no Brasil? Seria possível pensarmos no

veto popular? Alguém já avaliou se é suficiente, agradável, se pode continuar o

sistema eleitoral sendo gerido pela Justiça Eleitoral?

Então, são estas as minhas questões: recall, veto popular, questão cultural e

Justiça Eleitoral.

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Muito obrigado, Sr.

Deputado.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Sr. Presidente, peço a palavra pela

ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Sr. Presidente, em primeiro lugar, é

importante perceber que o orçamento participativo nem sempre foi utilizado como

manipulação política. Alguns Deputados presentes foram Prefeitos e — sabem disso

— o usaram como forma de participação efetiva da população. É importante

perceber isso. É claro que ele tem que ser modificado, melhorado, mas não

podemos desqualificar o orçamento participativo afirmando que sempre foi usado

como instrumento de manipulação política.

Em segundo lugar, é melhor trabalhar em cima da cultura política reinante do

que em cima do toma lá, dá cá, da relação familiar que manda e domina e do jeitinho

brasileiro. Nesse sentido, temos de abordar a questão...

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Deputado Luiz Couto.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO - Pois não.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – É a minha

benevolência. V.Exa. pediu pela ordem e já citou dois temas. Pela ordem é, no

máximo, para abordar um tema. Por favor, encerre suas considerações.

O SR. DEPUTADO LUIZ COUTO – Concordo com que o financiamento

público tem de ser enfrentado, pois infelizmente, sabemos, as grandes organizações

criminosas, para lavar dinheiro, têm financiado campanhas. O financiamento público

é fundamental para acabarmos com essa situação na política brasileira. Sou

membro titular desta Comissão e Relator de um projeto na Comissão de Direitos

Humanos. Tenho o direito de me pronunciar.

O SR. DEPUTADO JOSÉ EDUARDO CARDOZO – Sr. Presidente, peço a

palavra pela ordem.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Tem V.Exa. a palavra.

O SR. DEPUTADO JOSÉ EDUARDO CARDOZO - V.Exa. tem sido tão

benevolente que, tenho certeza, não faltaria com a benevolência para com este

Deputado. À vista de algumas ponderações feitas, particularmente pelo nobre

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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Deputado João Paulo Gomes da Silva, sobre o financiamento público de

campanhas, acredito que V.Exa., juntamente com o Sr. Relator, haverá de incluir

esse tema como um dos próximos para debate desta Comissão, uma vez que creio

não ser este o momento para uma polêmica mais aguda.

Acredito que as ponderações feitas foram fortes e da parte pelo menos dos

que defendem essa iniciativa, eu e o nobre ex-Ministro Aloysio Nunes Ferreira,

gostaríamos de ter, no plano das idéias, a possibilidade de demonstrar as razões

que obviamente nos parecem apresentar essa proposta não como algo

absolutamente razoável, mas como algo que é defensável, sustentável e que pode

em muito mudar a configuração política do País.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) - Muito obrigado,

Deputado José Eduardo Cardozo.

Passo a palavra ao eminente Relator, Deputado Ronaldo Caiado.

O SR. DEPUTADO RONALDO CAIADO - Sr. Presidente, Sras. e Srs.

Parlamentares, mais uma vez agradeço aos palestrantes, que aqui tiveram a

oportunidade de fazer, de maneira sucinta, um resumo desse estudo que nos

oferecem hoje como um conjunto de sugestões em vários temas.

Não poderia perder a oportunidade, Relator que sou, de ouvir a opinião de

cada um deles em relação aos temas que definimos. Depois de longa discussão

nesta Comissão, definimos uma pauta, na qual resolvemos não incluir emendas

constitucionais, porque exigiria Comissões Especiais e também um rito totalmente

diferente, com duas votações em cada Casa e quorum diferenciado.

Assim, optamos por buscar mudanças que possam realmente atender ao

clamor da população, pelo menos alguns pontos que realmente a sociedade não

admite mais, e o primeiro item apresentado foi a fidelidade partidária. Como a

matéria exigiria uma proposta de emenda à Constituição, buscamos algumas

variantes. A primeira delas é a filiação partidária.

Foi entendimento desta Comissão que a primeira filiação deverá ser mantida

por um ano. Quanto à segunda filiação, quero ouvir a opinião dos palestrantes e dos

acadêmicos que aqui estão para saber o que pensam e quais são as sugestões do

Instituto de Cidadania em relação a isso. Deveríamos ter um prazo mais alongado,

como o do Senado, que é de quatro anos? Esse prazo deveria ser diferenciado no

CÂMARA DOS DEPUTADOS - DETAQ COM REDAÇÃO FINALNome: Comissão Especial - Reforma PolíticaNúmero: 0264/03 Data: 09/04/03

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caso de um político exercer o cargo de Governador, Presidente ou Prefeito, diferente

de Vereador, Deputado Federal e Senador?

Em relação ao financiamento público, apesar de já ter sido discutido, neste

vade-mécum aqui teremos alguma orientação no sentido de saber se o ordenador

de despesas deverá ser o presidente do partido, o Ministério Público ou o Tribunal

Regional Eleitoral?

Os senhores vinculam o financiamento de campanha à lista fechada ou se

pode ter também um financiamento público de campanha com listas abertas, como

temos hoje? Alguns defendem a necessidade quase obrigatória da lista fechada,

para que o presidente do partido possa ser o ordenador e ter o compromisso e a

responsabilidade de responder por essas despesas.

Cito o terceiro tema dessa pauta, o final das coligações nas eleições

proporcionais. Esta matéria também está em discussão. Já foi aprovado um projeto

no Senado Federal, que está para ser discutido nesta Casa. Não vou citar os outros

temas, pois seríamos extremamente abrangentes aqui.

Quero ouvir as ponderações dos nossos palestrantes, que nos ofertaram um

livro que, sem dúvida nenhuma, traz argumentos e dados consistentes para

podermos, como disse muito bem o Dr. Paulo Vannuchi, baseados nessas idéias e

pesquisas, buscar sugestões e propostas para nossa reforma política.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) - Muito obrigado, Sr.

Relator.

Vou passar a palavra aos palestrantes. É importante que no final dos

comentários V.Sas. insiram suas considerações finais.

Tem a palavra o Prof. Fábio Kerche.

O SR. FÁBIO KERCHE – Sr. Presidente, há um leque enorme de perguntas e

comentários. Nossa intenção aqui não é propor, mas sim apresentar diagnósticos e

subsídios. Tenho opinião sobre uma série de coisas, mas não recebi nenhum voto.

São os Srs. Deputados que vão discutir o tema. Tentamos contribuir, ampliando o

leque comparativo de outros países e outras experiências.

Vou escolher alguns temas aqui e comentá-los rapidamente. O primeiro é o

recall, modelo existente nos Estados Unidos. Lembro, Srs. Deputados, que o recall

existe num sistema chamado distrital puro, um sistema majoritário. Num sistema

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proporcional de lista aberta, não consigo imaginar um sistema de recall eficiente.

Quer dizer, o Deputado sempre vai ter um número reduzido de votos. E se

questionarem seu mandato? A maioria da população pode não ter votado nesse

Deputado. Como fazer? É diferente de uma eleição majoritária. O princípio é

saudável, mas será complicado aplicá-lo num sistema eleitoral de lista aberta como

o nosso.

Deputado Ronaldo Caiado, com o mesmo espírito de não ter propostas

prontas e acabadas, esclareço que, em relação ao financiamento público, a lista

fechada, de certa forma, facilitaria o financiamento público. Em princípio, a lista

aberta não impede o financiamento público, desde que haja regras de distribuição

entre todos aqueles que disputam a eleição. Ficaria mais fácil com a lista fechada,

porque como a campanha é feita menos no candidato individualmente e mais no

partido, esse dinheiro poderia ser usado para promover a legenda como um todo, e

não individualmente, em cada candidato. Acho que é possível coexistirem os dois

sistemas; um não impede o outro.

Em relação às coligações proporcionais, existem dois instrumentos. Ou se

acaba com a coligação, o que talvez leve a uma diminuição do número dos partidos,

ou se permite a coligação, mas se distribuindo as cadeiras de acordo com o número

de votos que cada partido membro da coligação recebeu. Não é simplesmente

acabar ou manter; existe um meio-termo, pois a coligação às vezes pode

representar um compromisso para se governar depois. Existe um meio-termo

possível.

Só mais um ponto: financiamento público de campanha. Na verdade, não dá

para fazer isso sozinho. Deve-se reforçar. De qualquer maneira, mesmo no

financiamento público é necessário reforço. Mas a idéia é tentar, e isso foi discutido

por vários autores aqui, problematizar um pouco a relação entre aquele que financia

e o que recebe. E, segundo um dos artigos aqui, são poucas as empresas que o

fazem — geralmente são empresas familiares. Ou seja, muito pouca gente doa

dinheiro para campanha eleitoral no Brasil, diferentemente dos Estados Unidos,

onde 10% dos eleitores doam dinheiro para campanha eleitoral e as empresas são

proibidas de doar dinheiro diretamente aos candidatos. Ou seja, a idéia de

financiamento público, e esse é o argumento daqueles que defendem essa tese, é

que, em princípio, pode parecer um gasto excessivo para a população, mas a médio

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prazo pode romper uma ligação entre aquele que financia e aquele que recebe, o

que é interpretado por alguns como algo que pode incentivar a corrupção, favorecer

interesses não republicanos etc. Esse debate merece ser ampliado.

Fico por aqui. A idéia, reforço, é tentar mapear um pouco o debate para que

os senhores tomem as decisões corretas a fim de aprimorar a democracia brasileira.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) - Muito obrigado, Prof.

Fábio Kerche.

Com a palavra o Prof. Paulo Vannuchi.

O SR. PAULO VANNUCHI - Muito obrigado.

Farei comentários esparsos e rápidos.

Primeiro, Deputado Colombo, chamo a atenção para a leitura do texto do

Prof. Wanderley Guilherme dos Santos, que tem abordado muito o tema da

dignidade da política. Ele registra que qualquer pesquisa para medir o prestígio dos

políticos é sempre baseada em um noticiário que diariamente repete que os políticos

não são bons, não prestam etc. Então, há necessidade de fazer essa recuperação,

pois ninguém nega que exista problema para ser resolvido. O Prof. Francisco de

Oliveira também fez uma análise muito lúcida e curta a respeito desse quadro.

Nessa rodada final, houve muita concentração no tema do voto facultativo, do

voto obrigatório e na questão do financiamento público de campanha.

Em relação ao financiamento, quero chamar a atenção para o fato de que,

além do artigo do David Samuels, no seminário de São Paulo, houve uma mesa

sobre o assunto. Nela estão registrados os argumentos do Deputado João Paulo

Cunha, aparentemente uma defesa do financiamento público por um especialista,

mas dizendo que ninguém tem ilusão de que o financiamento em si resolve o

problema. Foi lembrado aqui que já há algum financiamento público importante do

horário eleitoral, etc., e a discussão está relacionada à introdução de novos

mecanismos.

No seminário, o Deputado João Paulo Cunha fez referência ao projeto do

Deputado Aloysio Nunes Ferreira e resumiu mais ou menos as condições para isso,

além da ampla discussão na sociedade — recomendada pelo Prof. Jairo — para se

chegar à conclusão de que, eventualmente na decisão de apoiar, não se trata de

tirar dinheiro da educação e da saúde para gastar em política, mas sim de um

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investimento que, se aperfeiçoar o sistema e combater a corrupção, pode ser muito

econômico para o Estado, para o Tesouro.

Os critérios são aparelhamento de fiscalização. Como estão aparelhados hoje

os Tribunais Eleitorais, realmente é difícil, pois a prestação de contas não pode ser

feita como é hoje: após. Terá que ser mensal ou algo equivalente, para que o custo

de burla das regras pese sobre os próprios candidatos ainda na campanha, na

prestação de contas dos gastos de julho ou de agosto ou de setembro. Nesse

sentido, a discussão tem que ser de fato muito cautelosa, que perceba também os

argumentos que, me parecem, o senhor quis lembrar.

Sobre a cláusula de barreira, é importante lembrar que há na reflexão do livro

alguma recomendação no sentido de que isso existe como regra — fala-se muito da

cláusula alemã e que, no caso brasileiro, já foi incorporada com o adiamento da

vigência —, de mais uma recomendação para repensar o fato de que ela poderia

afetar uma base mais profunda da democracia na proporcionalidade, até porque se

ela é uma cláusula de 5%, é uma cláusula alta.

Em dezembro, participei de seminário com partidos socialistas, social-

democratas, em Berlim e havia lá uma realidade interessante. O antigo Partido

Comunista da Alemanha Oriental, que, daqueles partidos lá do Bloco Soviético, foi o

que fez a mais profunda modernização e participa da Prefeitura de Berlim, não

atingiu a cláusula agora — tinha 36 Deputados, caiu para dois —, numa situação em

que o Partido Verde já tinha vivido lá antes e que obriga o próprio sistema partidário

alemão, como uma cláusula de tolerância, a manter os fundos partidários por oito

anos, na presunção de dar uma chance ainda de dois processos eleitorais para

recuperar. Não é só uma eleição que resolve liminarmente a questão.

Há no texto tendência de questionar o problema das coligações proporcionais,

em que diz que, de fato, a busca de afirmação da identidade partidária é a criação

de uma simpatia de um eleitor para com um partido. Então, muitas vezes, na ampla

coligação proporcional há uma ordem de eleitos, às vezes muito diferenciada no

espectro.

(Intervenção inaudível.)

O SR. PAULO VANNUCHI – Exato, vão votar diferentemente no Congresso

Nacional. Então, há essa recomendação.

Agradeço a todos a oportunidade de estar aqui.

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Estamos à disposição no Instituto Cidadania, em São Paulo, para qualquer

convocação.

Repito, se houver interesse em prosseguir, mais do que nos chamar de volta,

o importante agora é consultar a lista dos especialistas para saber qual traria mais

contribuição para o debate.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Concedo a palavra ao

Prof. Francisco de Oliveira.

O SR. FRANCISCO DE OLIVEIRA – Serei breve.

Primeiro, quero comentar sobre o que disse a Deputada Luiza Erundina no

início do debate. O que ameaça a democracia brasileira não são nem os eleitores

nem os partidos. Há estudos, que estão nesta bíblia aqui, que vão mostrar a

consistência do voto dos eleitores e das legendas ao longo do tempo. Uma

aparência que a imprensa vende com muita facilidade é que os partidos votam

qualquer coisa de qualquer modo.

Estudos do Fernando Limonge, da Argelina Figueiredo e de um professor da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul mostram a consistência do voto dos

eleitores e das bancadas no Congresso ao longo do tempo. Eles não votam assim

tão erraticamente quanto se pensa, é muito mais consistente num sistema que

permanece com muito pouca barreira. O surpreendente é que caso como o do

Deputado do MDB, aqui relatado, que votou a favor do AI –5 não se repete ao longo

da história no Congresso Nacional. É extremamente raro.

Então, onde estão os riscos para a democracia? Não estão nem nos partidos

nem nos eleitores. O risco está no enrijecimento crescente e no afastamento dos

temas centrais da cidadania do terreno da política; nas grandes organizações

econômicas; no fato de que são retiradas da política e transferidas para um terreno

aparentemente técnico decisões que são cruciais a respeito da Nação, a respeito da

cidadania. Esta não é uma tendência só brasileira, mas mundial, contra a qual todos

os democratas estão convocados a lutar.

Automatismos que são escritos na Constituição, às vezes, com as melhores

intenções, retiram do governante o poder de governar. O automatismo mais

extremado foi dado pela Argentina. A Argentina, durante dez anos, teve como

constitucional a obrigação de manter a paridade entre o peso e o dólar, isto é, elege-

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se o presidente para ele não governar. Se o Presidente da República não pode tocar

na moeda do seu Estado, é melhor ele ir para casa, porque a moeda é o ponto

central do sistema capitalista.

O risco para a democracia vem de outra direção. Portanto, é necessário

voltar. Embora a pauta sobre a qual esta Comissão se constituiu seja limitada, como

o Deputado Ronaldo Caiado mostrou, é preciso desdobrá-la, em períodos

sucessivos, em outras discussões e em outras abordagens, para tentar uma

melhoria da democracia brasileira.

O que tentamos fazer aqui neste livro e nesta contribuição foi, com as

tendências presentes em partidos eleitores e no sistema político brasileiro, melhorar

a representatividade, a democracia.

Tudo isso é imperfeito, e as críticas surgidas são inteiramente pertinentes. É

bom desconfiar da perfeição. Ela é totalitária e retira exatamente da política e dos

políticos a decisão sobre o destino da Nação. Diz adágio de um cientista político

americano: “Ama o imperfeito e serás democrata”.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) – Professor, antes de

encerrar a reunião, quero fazer duas observações.

Primeiramente, na qualidade de Presidente, quero dizer que tenho observado

enorme qualificação na conquista das eleições majoritárias. Infelizmente, nas

eleições proporcionais tem-se passado ao largo dos debates dos temas nacionais. A

distritalização do voto tem provocado um processo de desqualificação do

Parlamento brasileiro. Digo isso porque estou acabando de fazer um trabalho sobre

a distritalização do voto que aconteceu nas últimas duas eleições para esta Casa.

Esse trabalho está sendo feito com base na enorme concentração de votos por urna

numa mesma cidade, em que se tem 70% da votação num determinado bairro ou

em dois, três ou quatro bairros.

Evidentemente, a eleição passada foi o grande exemplo disso. Este

Parlamento vai discutir, por exemplo, a reforma da Previdência e provavelmente

quase nenhum dos Srs. Parlamentares apresentou como seu programa de execução

ou o partido apresentou como programa de execução da sua base parlamentar a

não ser a proposta do Executivo, mas evidentemente o funcionamento da base

parlamentar não teve tempo na televisão ou não conseguiu chegar ao eleitor.

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E o fato mais marcante, aproveitando o custo da eleição, é que um Deputado

no Amapá custa per capita muito mais do que em São Paulo, pois no Amapá tem-se

oito Deputados com o mesmo tempo na televisão que os 70 em São Paulo. Então, a

exposição desse Parlamentar nos Estados em que as bancadas são menores

evidentemente é muito maior. Assim, o custo lá vai ser muito maior do que em São

Paulo.

Ficaram claras aqui a complexidade do tema e a necessidade de ampliarmos

esse debate. Na primeira vez que me pronunciei, na qualidade de Presidente, disse

que também não podemos discutir a complexidade da matéria e não obter resultado.

Temos aqui o exemplo do esforço que o Deputado João Almeida tem feito, parece-

me que há duas ou três Legislaturas, e evidentemente os resultados não têm sido

apresentados sequer ao Plenário.

O SR. DEPUTADO JOÃO ALMEIDA – Protesto.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Alexandre Cardoso) - Deputado, estou

dizendo isso pelo esforço que V.Exa. tem feito e pelo esforço que temos feito aqui.

Temos que apresentar a este Plenário alguns resultados, sem prejudicar o amplo

debate que vamos travar nesta Comissão.

Na semana que vem teremos uma semana ceifada pela necessidade de os

Srs. Parlamentares lerem a bíblia apresentada a esta Casa. A Comissão vai realizar

trabalhos internos e solicitar que a próxima reunião se dê no dia 23 de abril, às

14h30min, em plenário a ser comunicado aos Srs. Parlamentares pela assessoria

Agradeço aos expositores e aos Srs. Parlamentares a presença.

Declaro encerrada a presente reunião.