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DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS CAMPUS I PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS (PPGEL) CURSO DE MESTRADO EM ESTUDO DE LINGUAGENS LINHA DE PESQUISA 2 LINGUAGENS, DISCURSO E SOCIEDADE ÁREA DE CONCENTRAÇÃO - SOCIOLINGUÍSTICA SELMO ALVES DOS SANTOS PRÁTICAS DE ESCRITA DE ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS EM DIFERENTES CONTEXTOS DA VIDA COTIDIANA SALVADOR-BA 2015

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DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS HUMANAS – CAMPUS I PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDO DE LINGUAGENS (PPGEL)

CURSO DE MESTRADO EM ESTUDO DE LINGUAGENS LINHA DE PESQUISA 2 – LINGUAGENS, DISCURSO E SOCIEDADE

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO - SOCIOLINGUÍSTICA

SELMO ALVES DOS SANTOS

PRÁTICAS DE ESCRITA DE ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS EM DIFERENTES

CONTEXTOS DA VIDA COTIDIANA

SALVADOR-BA

2015

SELMO ALVES DOS SANTOS

PRÁTICAS DE ESCRITA DE ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS EM DIFERENTES

CONTEXTOS DA VIDA COTIDIANA

Dissertação apresentada como requisito

complementar para a obtenção do grau de

Mestre em Estudo de Linguagens.

Orientadora: Profa. Dra. Ligia Pellon de Lima

Bulhões

SALVADOR-BA 2015

FICHA CATALOGRÁFICA Sistema de Bibliotecas da UNEB

Bibliotecária: Jacira Almeida Mendes – CRB: 5/592

SANTOS, Selmo Alves dos. Práticas de escrita de estudantes universitários em diferentes contextos da vida cotidiana / Selmo Alves dos Santos. – Salvador, 2015. 110F. Orientadora: Profa. Dra. Ligia Pellon de Lima Bulhões. Dissertação (Mestrado) - Universidade do Estado da Bahia. Departamento de Ciências Humanas. Campus I. 2015. Contém referências e anexos. 1. Escrita - Aspectos sociais. 2. Linguagem. 3. Letramento. 4. Família. 5. Escolas. 6. Língua portuguesa. I. Bulhões, Ligia Pellon de Lima. II. Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Ciências Humanas. CDD: 401.93

PRÁTICAS DE ESCRITA DE ESTUDANTES UNIVERSITÁRIOS EM DIFERENTES

CONTEXTOS DA VIDA COTIDIANA

Dissertação apresentada como requisito

complementar para a obtenção do grau de

Mestre em Estudo de Linguagens.

Aprovada em 09 de março de 2015.

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________ Profa. Dra. Ligia Pellon de Lima Bulhões (Orientadora)

Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens da Universidade do Estado da Bahia

___________________________________________________________________

Profa. Dra. Rosa Helena Blanco Machado Programa de Pós-Graduação em Estudo de Linguagens da Universidade do Estado

da Bahia

___________________________________________________________________ Prof. Dr. Patrício Nunes Barreiros

Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Estudos Linguísticos e do Mestrado Profissional em Letras – PROFILETRAS – da Universidade Estadual de Feira de

Santana (UEFS)

DEDICO ESTE TRABALHO:

À minha orientadora, Professora Ligia, pelo olhar zeloso e atento a cada palavra

empregada, a cada conceito trazido, a cada dizer. Um exemplo de responsabilidade, compromisso e mestria sintetizados na escrita de um trabalho que celebra o nosso encontro. Obrigado por me ter escolhido, acreditado e “embarcado” nesta minha/nossa história! Impossível vencer a “luta com as palavras” e aparar incompletudes sem você. Estará eternizada em mim, nesta “nossa” escrita. À Professora Rosa Blanco, o anjo bom e acolhedor, puro “sabor”, que marcou a minha trajetória no PPGEL, desde o início, ainda quando estava na função de coordenadora do Programa. Um telefonema para matrícula no PPGEL em plena semana do Natal de 2012 (o meu melhor presente daquele ano!) e uma palavra de incentivo fizeram muita diferença. Inegáveis foram as primorosas contribuições oferecidas no Exame de Qualificação e na finalização do trabalho. Por tudo isso, ficará guardada na minha memória afetiva. Ao Professor Patrício, por ter aceitado participar gentilmente da minha banca e pelas valiosas contribuições e indicações de leitura no Exame de Qualificação e na finalização do trabalho.

À minha mãe, o meu maior exemplo de vida, na sua aparência física frágil, mas sábia e forte como um “javali”, e a minha inspiração, sempre (in memorian).

À minha família, por ter sabido compreender as minhas ausências (e não foram poucas!) e por ter vivenciado comigo as preocupações e as emoções diuturnas na produção desta escrita.

À minha colega/amiga/irmã Leilinha, pelas palavras de incentivo e de encorajamento, quando achei que fosse desistir. Resisti.

AGRADEÇO:

Aos professores e às professoras do PPGEL, indistintamente, pelas aulas problematizadoras e ricas e pelos grandes ensinamentos de cada um/uma, à sua maneira. Meu muito obrigado a: - Jaciara Ornélia, pela simplicidade nos gestos e nas palavras, desde o dia da

minha prova escrita de seleção. Um exemplo a ser seguido; - Norma Lopes, pelo sorriso fácil e pelas palavras de incentivo e pelo convite a que eu ingressasse no PPGEL, desde o dia da minha prova de entrevista. Seu convite, Querida, foi uma “sentença”, por isso consegui chegar até aqui; - Lúcia Parcero, pela serenidade e pela palavra amiga e doce, desde o dia da minha prova de entrevista. Meu carinho; - Cristina Carvalho, pela elegância no trato e pelo farto e belo sorriso, na simpatia

plena nas aulas; - João Santana e Sayonara Amaral, pela perfeita sintonia que formam nas problematizações das aulas sobre teorias de linguagens e análise do discurso; - Maria do Socorro Carvalho e Márcia Rios, pelas ousadas sugestões de

desconstrução dos paradigmas de pesquisa; - Adelaide Oliveira e Celina Abbade, por “passearem” tão bem e com tanta tranquilidade nas dimensões da língua, cultura e do léxico; - Gilberto Sobral, pelo acolhimento amigo, sempre; um ser humano generoso.

Aos/Às colegas de turma, pela socialização de saberes e histórias de vida. Momentos inesquecíveis aqueles. Aos sujeitos da pesquisa, meus “quase” alunos na UNIRB, pela confiança, até mesmo nas revelações muito confidenciais. Sem as contribuições de cada um de vocês, seria impossível trilhar por tão complexa caminhada. Meu muito obrigado! Aos funcionários do PPGEL, a Camila, Geysa e Danilo, indistintamente, pelo convívio e pelas gentilezas. Vocês foram verdadeiros “mestres de plantão”, orientando-nos sempre que precisávamos. Meu muito obrigado!

Escrever, eu já andava rabiscando, mesmo

antes de entrar para a escola. Escrevia nas

paredes do galinheiro, no cimento do tanque

ou no passeio da rua. Arranjava um pedaço

de carvão, de tijolo, de caco de telha, pedra

de cal. Minhas irmãs me pediam para traçar

amarelinha no quintal. Eu caprichava. Usava

uma vareta de bambu sobre a terra batida.

Além de fazer as casas bem quadradas e

certas, ainda escrevia os números e as

palavras céu e inferno. De tanto as meninas

pularem em cima, as palavras se apagavam,

aos poucos, mas escrever de novo não era

sacrifício para mim. (QUEIRÓS, 1997, p. 40).

RESUMO

As novas formas de produção, materialização e circulação dos textos, principalmente a partir do advento da cultura impressa, por volta do século XVIII, na fase intermediária da industrialização, trouxeram transformações significativas às práticas de escrita, tornando-as muito mais complexas. Em consequência disso, houve também mudança considerável de perfis dos sujeitos letrados diante do novo papel da leitura e da escrita. Nessa dissertação, tem-se como objetivo investigar as práticas cotidianas de escrita de estudantes das disciplinas Leitura e Produção de Textos e Novos Paradigmas da Educação, do Curso de Pedagogia da Faculdade Regional da Bahia (UNIRB), do município de Salvador (BA). Esses estudantes são oriundos de bairros populares do referido município e dos municípios de Lauro de Freitas e Simões Filho. As experiências de escrita e leitura são confrontadas com as atividades escolares de escrita que são desenvolvidas por eles no contexto de sala de aula, levando-se em conta os gêneros de escrita que compõem estes domínios discursivos, os chamados multiletramentos digitais, e a atitude que estes alunos revelam sobre o seu desempenho como leitores e redatores de textos acadêmicos. Trata-se de um estudo de base etnográfica, que está orientado pela releitura dos pressupostos teóricos de herança bakhtiniana. A pesquisa indica, no tocante à cultura escrita, que se vive um momento de produção de textos nos formatos mais diferenciados, por meio dos quais os sujeitos promovem usos e atitudes da língua, interagem com os seus pares para tratarem de assuntos cotidianos, constituindo-se a escrita como espaço único, numa prova inquestionável da existência da vida através da permanência da palavra. Palavras-chave: Usos e práticas cotidianas de escrita. Gêneros discursivos. Atitudes linguísticas. Etnografia.

RÉSUMÉ

Les nouvelles formes de production, la réalisation et la diffusion de textes, surtout depuis l'avènement de la culture de l'imprimé, par le XVIIIe siècle, dans la phase intermédiaire de l'industrialisation, ont apporté d'importantes modifications aux pratiques d'écriture, ce qui les rend plus complexe. En conséquence, il y avait aussi des profils de changements considérables de sujets alphabétisés sur le nouveau rôle de la lecture et de l'écriture. Dans cette thèse, a pour objectif d'enquêter sur les pratiques quotidiennes des élèves qui les disciplines de lecture et de production du texte et de nouveaux paradigmes de l'éducation, l'école de l'éducation du Collège régional de Bahia (UNIRB), la ville de Salvador (BA). Ces étudiants viennent de quartiers pauvres de la municipalité et des municipalités de Lauro de Freitas et Simoes Filho. Écriture et de lecture des expériences sont confrontés à des activités scolaires de l'écriture qui sont développés par eux dans le contexte de la classe, en tenant compte des genres d'écriture qui composent ces champs discursifs, les multilittératies dits numériques, et l'attitude que ces étudiants révèlent sur leur performance en tant que lecteurs et rédacteurs de textes académiques. Il est une étude ethnographique de la base, qui est guidée par la relecture des hypothèses théoriques de l'héritage de Bakhtine. La recherche indique, par rapport à la culture écrite, nous vivons un moment de la production de textes dans les plus différentes formes, à travers lequel les sujets favorisent l'utilisation et les attitudes langue, d'interagir avec leurs pairs pour régler les affaires quotidiennes, constituindo- si l'écriture comme un espace unique dans une preuve irréfutable de l'existence de la vie à travers la parole de permanence.

Mots-clés: Usages et la pratique quotidienne de l'écriture. Genres. Attitudes

linguistiques. Ethnographie.

LISTA DE QUADRO

Quadro 1 - Descrição dos Sujeitos da Pesquisa.......................................................83

LISTA DE FIGURAS

Figura 1- Recorte de relatório acadêmico........................................................... 51

Figura 2 - Convite postado no Feed de Notícias do Facebook.................................52

Figura 3 - Divulgação de evento na Faculdade postado no Feed de Notícias do Facebook....................................................................................................................53 Figura 4 - Cartaz escolar explorando temática da Copa do Mundo de 2014............54

Figura 5 - Cartaz escolar explorando temática do São João.....................................54 Figura 6 - Cópia de exercícios de escrita retirados de livro didático.........................56

Figura 7 - Texto escolar retirado de livro didático......................................................57

Figura 8 - Cartaz escolar com tema da Copa do Mundo de 2014.............................58 Figura 9 - Cartaz escolar com tema da Copa do mundo no Brasil de 2014..............58 Figura 10 - Recorte de memorando escrito como trabalho de pesquisa para a

faculdade....................................................................................................................60 Figura 11- Recorte de relatório escrito em grupo para a faculdade..........................61

Figura 12 - Imagem de cartaz postado no Feed de Notícias do Facebook...............62

Figura 13 - Imagem de cartaz postado no Feed de Notícias do Facebook...............62 Figura 14 - Resenha sobre a importância do Jornal da Igreja Universal...................64 Figura 15 - Manchete do Jornal da Igreja Universal..................................................65 Figura 16 - Manchete e Lead do Jornal da Igreja Universal......................................65 Figura 17 - Cópia de texto retirado de livro didático para atividade escolar..............66 Figura 18 - Cópia manuscrita de exercício de escrita retirado de livro didático para atividade escolar.........................................................................................................67 Figura 19 - Cópia de exercícios de escrita retirados de livro didático para atividade

escolar........................................................................................................................70 Figura 20 - Cópia de exercícios de escrita retirados de livro didático para atividade escolar........................................................................................................................71

Figura 21- Resenha sobre o tema da violência.........................................................74 Figura 22 - Cartão virtual sobre o dia das mulheres retirado do Feed de Notícias do

Facebook....................................................................................................................75 Figura 23 - Agradecimento retirado do Feed de Notícias do Facebook....................75 Figura 24 - Relato de inspiração religiosa retirado do Feed de Notícias do Facebook....................................................................................................................75 Figura 25 - Cartão virtual com versículo retirado do Feed de Notícias do

Facebook....................................................................................................................76 Figura 26 - Louvor retirado do Feed de Notícias do Facebook.................................76

Figura 27 - Louvor retirado do Feed de Notícias do Facebook.................................77 Figura 28 - Cartão virtual com mensagem religiosa retirado do Feed de Notícias do Facebook....................................................................................................................78 Figura 29 - Cartão virtual com mensagem religiosa retirado do Feed de Notícias do

Facebook....................................................................................................................79 Figura 30 - Versículos bíblicos.................................................................................. 79 Figura 31 - Folheto coletado na igreja.......................................................................81

Figura 32 - Folheto coletado na igreja.......................................................................81

Figura 33/frente - Folheto coletado na igreja............................................................81

Figura 33/verso - Versículos do Gênesis..................................................................82

Figura 34 - Versículos bíblicos retirados da Internet.................................................82

Figura 35 - Fotografia de cartaz no interior da igreja.................................................83

SUMÁRIO 1 PALAVRAS INICIAIS..............................................................................................12 2 A ESCRITA COMO PRÁTICAS SOCIOCULTURAIS............................................18 2.1 Gêneros do Discurso.........................................................................................25 2.2 (Multi)letramentos..............................................................................................29 2.3 Atitudes Linguísticas.........................................................................................33 3 METODOLOGIA DA PESQUISA............................................................................38 3.1 O Estudo Numa Perspectiva Etnográfica: Breves Considerações................38 3.2 Critério de Escolha dos Sujeitos e os Contextos Pesquisados....................40 3.3 Procedimentos e Instrumentos de Coleta de Dados......................................42 3.4 Experiências de Campo.....................................................................................44 4 DESCRIÇÃO DOS DADOS DA PESQUISA..........................................................51 4.1 Práticas de Escrita dos Sujeitos nos Contextos Universitário e Profissional...............................................................................................................51 4.2 As Escritas nos Contextos Religioso e de Lazer............................................72 4.2.1 As Escritas no Contexto de Lazer.....................................................................72 4.2.2 As Escritas no Contexto Religioso....................................................................75 4.3 Descrição dos Sujeitos da Pesquisa................................................................83 Sujeito DM.................................................................................................................84 Sujeito TB..................................................................................................................85 Sujeito MS.................................................................................................................86 Sujeito SA..................................................................................................................86 Sujeito AM.................................................................................................................87 5 ANÁLISE DOS DADOS..........................................................................................89 5.1 Atitude/Concepção Conservadora Sobre a Língua/Escrita............................89 5.2 Sobre as Práticas de Escrita, com Prática Social, Constitutivas e Constituídas de Práticas de Cunho Religioso.......................................................91 5.3 A Questão dos Gêneros do Discurso...............................................................91 5.4 Sobre os Textos Extraescolares.......................................................................93 6 PALAVRAS FINAIS................................................................................................95 REFERÊNCIAS..........................................................................................................98 APÊNDICES.............................................................................................................101 APÊNDICE A - ROTEIRO DE PERGUNTAS DA PRIMEIRA ETAPA (Comum a todos os sujeitos entrevistados)..........................................................................102 APÊNDICE B - ROTEIROS DE PERGUNTAS DA SEGUNDA ETAPA (Específicos por ordem de entrevistados, gerados com base nas respostas da primeira entrevista)...............................................................................................................103 Entrevistado 1 (MS)................................................................................................103 Entrevistado 2 (DM)................................................................................................104 Entrevistado 3 (SA)................................................................................................105 Entrevistado 4 (TB).................................................................................................107 Entrevistado 5 (AM)................................................................................................109

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1 PALAVRAS INICIAIS

Entende-se que a via de análise da produção escrita, que operacionaliza o

conceito de mediação por meio de unidades linguísticas textuais, pode revelar-se

muito fecunda, tanto do ponto de vista teórico quanto prático. Em termos teóricos

porque concebe a linguagem escrita como construções sociais balizadas por

inúmeros fatores, como as práticas da escrita de uma determinada comunidade e as

relações que tornam possível o acesso à linguagem em seu conjunto. Em termos

práticos porque, ao desvendar processos e descortinar os domínios das práticas da

escrita, pode auxiliar os estudos a compreender o lugar da escrita na cultura

contemporânea e como se dão, nos dias de hoje, as várias escritas, as atitudes e o

viver dos sujeitos pela linguagem.

Nesse trabalho, tem-se como objeto de estudo as manifestações cotidianas

de escrita de estudantes do Curso de Pedagogia da Faculdade Regional da Bahia

(UNIRB), sediada no município de Salvador (BA), sujeitos pertencentes, portanto, a

uma cultura letrada, oriundos de bairros distintos, seus usos, atitudes e experiências

de escrita nas disciplinas Leitura e Produção de Textos, do primeiro semestre, e

Novos Paradigmas da Educação, do segundo semestre, enquanto leitores e

redatores dos textos acadêmicos do curso, tendo como parâmetro a concepção de

língua e escrita que todos eles mantêm.

Algumas questões orientaram o desenvolvimento da pesquisa, a partir da

compreensão atual de língua e escrita como um conjunto de práticas sociais, isto é,

da concepção de língua/escrita baseada em usos e do fato de que ainda pouco se

sabe sobre as manifestações de escrita que compõem os vários domínios da vida

diária, além da escola, e do entendimento de que a avaliação que as instituições de

ensino superior fazem dos sujeitos enquanto usuários da língua/escrita deveria levar

em conta os usos de escrita que são significativos para eles fora do ambiente

escolar. São elas:

- Quais as experiências cotidianas de escrita dos vários campos da vida

social, de estudantes de segmentos sociais distintos, que são estudantes e colegas

de classe de um curso universitário, e a sua relação com as experiências de leitura

e produção de textos acadêmicos em sala de aula?

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- Será que o advento de multiletramentos digitais e seus desdobramentos em

práticas de produção de textos e de leitura em ambientes virtuais relacionam-se às

diferentes atividades de escrita dos estudantes pesquisados, principalmente, se

considerarmos as novas exigências de uma era de globalização? Eles têm

possibilitado outros significados e modos de escrever e ler em diferentes contextos

sociais de interação verbal, inclusive na faculdade?

- Qual a atitude que os estudantes assumem sobre as suas práticas de

escrita?

Definiu-se como objetivo geral: Investigar as práticas cotidianas de escrita de

estudantes das disciplinas Leitura e Produção de Textos e Novos Paradigmas da

Educação, do Curso de Pedagogia da Faculdade Regional da Bahia (UNIRB), do

município de Salvador (BA), e confrontá-las com as atividades escolares de escrita

que são desenvolvidas por eles no contexto de sala de aula, levando-se em conta

os gêneros de escrita que compõem estes domínios discursivos, os chamados

multiletramentos digitais, e as atitudes que estes alunos revelam sobre o seu

desempenho como leitores e redatores de textos acadêmicos.

Os objetivos específicos definidos para o estudo foram os seguintes:

1. Pesquisar as práticas cotidianas de escrita de sujeitos de segmentos

sociais distintos, que são estudantes e colegas de classe das disciplinas Leitura e

Produção de Textos e Novos Paradigmas da Educação;

2. Investigar quais as práticas de leitura e de escrita dos sujeitos que

ocorrem em ambientes virtuais possibilitados por ferramentas da web, tendo em

vista os chamados multiletramentos digitais;

3. Investigar as atitudes dos sujeitos com relação aos usos escolares de

escrita nas disciplinas, considerando-se o que escrevem e leem para tanto, tendo

em vista a concepção de língua e escrita que todos mantêm;

4. Estudar a possível relação entre experiências extraescolares, gêneros de

escrita, contexto social dos estudantes.

Entre os autores que constituem o referencial teórico da investigação

proposta, merecem destaque, principalmente, Chartier (1990, 1991, 1999, 2002,

2003, 2007), Bakhtin (1992, 2003), Marcuschi (1995, 2001, 2002, 2004, 2005,

2008), Fernandéz (1998), Rojo (2002, 2004, 2005, 2009), Gnerre (2003), Street

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(2003), Goldenberg (2004), De Certeau (2011) e Bourdieu (2011).

Adotou-se como metodologia de estudo a leitura exploratória de textos

produzidos sobre o tema. Após o levantamento do referencial teórico, fez-se uma

cuidadosa seleção das fontes que seriam aproveitadas conforme as opções teóricas

dos autores definidos. Encontra-se, a seguir, um breve mapeamento dos principais

teóricos e suas contribuições para a fundamentação e sustentação da pesquisa.

Recorreu-se às ideias de Chartier (1990, 1991, 1999, 2002, 2003, 2007),

cujas contribuições foram de cabal relevância para a compreensão da cultura

escrita, segundo a qual é a partir de uma dada perspectiva histórica, de um espaço e

de uma especificidade única que ocorrem os usos de escrita dos sujeitos.

Através de Bakhtin (1992, 2003), buscou-se discutir os gêneros do discurso

enquanto enunciados ou unidades concretas de comunicação, cuja elaboração e

organização se dão de acordo com a esfera da atividade humana e de uma relativa

estabilidade em meio à heterogênea diversidade da atividade humana, o que gera

os diferentes gêneros.

Marcuschi (1995, 2001, 2002, 2004, 2005, 2008) contribui com o estudo ao

contextualizar os gêneros na vida cultural e social. Busca ampliar a visão dos

gêneros em contextos democráticos, bem como descreve de que maneira eles se

estabelecem e se desenvolvem. Sintetiza sua discussão sobre a ocorrência dos

gêneros, apresentando-os a partir de seus objetivos, sua função, estrutura, bem

como a partir de sua temporalidade e mudança, a exemplo dos gêneros digitais.

Buscou-se em Fernandéz (1998) subsídio no sentido de fundamentar o

estudo a partir dos usos e das atitudes linguísticas dos sujeitos na sociedade. Assim

sendo, o autor contribui com a pesquisa, na medida em que discute as atitudes com

base nas escolhas, positivas ou negativas, dos sujeitos dentro de uma determinada

língua e estrutura social.

De Certeau (2011) contribui com o estudo ao tratar das mudanças no plano da

escrita no mundo ocidental, a partir do século XVII. Ressalta a posição hegemônica

da escrita nos grupos sociais de prestígio, de certa forma superada pelo “jogo

escriturístico”, traduzido por novas formas de (re)invenção do cotidiano pelos

sujeitos, em outras maneiras de fazer.

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A pesquisa apoiou-se em Street (2003) com o objetivo de estudar a relação

entre escrita e oralidade no contexto social. Para estabelecer tal relação, o autor

aponta a coexistência de dois enfoques ou modelos engendrados pelas instituições

sociais como mecanismos de reprodução do poder, o autônomo e o ideológico. Faz

sérias críticas ao primeiro por defender o uso de técnicas e habilidades específicas a

serem aprendidas, sendo a escola uma grande reprodutora de tais condições.

Quanto ao modelo ideológico, caracterizar-se por conter questões de análise,

segundo as quais as abordagens sobre o assunto necessitam vislumbrar os

diferentes contextos discursivos e o real significado da escrita na vida das pessoas,

em suas diversas manifestações.

Em Gnerre (2003), pôde-se discutir o prestígio social da escrita, esta de modo

geral calcada na valorização de uma única variedade linguística, a culta ou “padrão”,

historicamente produzida dentro de grupos de poder, em oposição a diferentes

variedades orais, estas quase sempre associadas a conteúdos de menor prestígio

social.

Outros autores, como Rojo (2002, 2004, 2005, 2009), Goldenberg (2004) e

Bourdieu (2011), trouxeram contribuições relevantes ao estudo. Através de Rojo

(2002, 2004, 2005, 2009), buscou-se situar o estudo no plano de diferentes tipos de

letramento, os quais passam a exigir dos sujeitos diferentes habilidades nos usos e

nas práticas sociais de linguagem nas diversas esferas (família, igreja, trabalho,

mídias, escola etc.) e contextos.

O diálogo com Goldenberg (2004) permitiu inserir e compreender a pesquisa

na perspectiva etnográfica, segundo a qual os cenários e os contextos em que os

sujeitos interagem acabam por imprimir determinadas marcas nas ações desses

sujeitos. Destaca a autora o fato de que a pesquisa se delineia no confronto das

singularidades dos espaços vividos, intensificadas pela intersubjetividade entre

pesquisador e pesquisado.

Bourdieu (2011) contribuiu com a pesquisa por problematizar a noção de

espaço social enquanto condição importante na definição de papéis sociais

hierarquizados que os sujeitos assumem na defesa de interesses coletivos. Isso

significa dizer que os contratos advindos das complexas relações produzidas em

determinados espaços orientam os processos de troca.

16

Em síntese, com base nos autores estudados, a pesquisa indica, no tocante à

cultura escrita, que se vive um momento de produção de textos nos formatos mais

diferenciados, por meio dos quais os sujeitos promovem usos e atitudes da língua,

interagem com os seus pares para tratarem de assuntos cotidianos, constituindo-se

a escrita como espaço único, numa prova inquestionável da existência da vida

através da permanência da palavra.

O trabalho constitui-se de seis seções, estruturadas da seguinte forma:

A primeira seção busca contextualizar o objeto da pesquisa e apresentar os

percursos percorridos no sentido de se atingir os propósitos e objetivos definidos.

A segunda seção problematiza a escrita enquanto práticas socioculturais e

históricas a partir de algumas perspectivas teóricas dos autores estudados que

possam esclarecer as experiências e atitudes cotidianas de grupos sociais de

indivíduos e, em particular, dos sujeitos investigados, imbricados em diversos

fenômenos da comunicação verbal, manifestadas através dos gêneros discursivos

concretos, o que inclui as práticas de letramento.

A terceira seção sintetiza a metodologia e os procedimentos empregados na

realização da pesquisa e os critérios para a escolha dos sujeitos, em que se

delineou a natureza etnográfica do estudo e se problematizou as experiências de

campo.

Na sequência, a quarta seção apresenta os dados da pesquisa, tendo como

foco central as experiências e as atitudes de escrita dos sujeitos nos vários

contextos, desde aquelas observadas nas práticas escolares até aquelas

vivenciadas dentro de outras práticas, como as de natureza religiosa e de lazer.

Além disso, faz a descrição dos sujeitos da pesquisa de acordo com alguns fatores,

como nome, idade, gênero/sexo, residência e profissão, buscando caracterizá-los e

situá-los no processo do trabalho.

A quinta seção promove a análise dos dados obtidos, tomando-se por base a

perspectiva dos usos de escrita dos sujeitos investigados, nos diversos e

heterogêneos contextos em que eles se encontravam, dentro de determinados

processos de interação verbal, buscando-se compreender os eventos de escrita

enquanto práticas situadas.

A sexta e última seção faz uma síntese dos resultados obtidos com a

17

realização do estudo e as constatações a que se chegou, a partir das reflexões

teóricas realizadas sobre a língua, com o objetivo de identificar mecanismos para o

enfrentamento de desafios postos na contemporaneidade em torno do complexo

fenômeno da produção escrita nos mais variados contextos.

18

2 A ESCRITA COMO PRÁTICAS SOCIOCULTURAIS

Tomando-se por base as contribuições dos autores estudados para a

realização desse trabalho, deve-se pensar a escrita enquanto prática sociocultural. A

escrita, compreendida como um conjunto de práticas sociais, caracteriza-se pelas

condições e pelo espaço social em que ocorre. Bourdieu (2011), ao apresentar a

noção de espaço social, afirma que:

Pode-se [...] representar o mundo social em forma de um espaço [...] construído na base de princípios de diferenciação ou de distribuição constituídos pelo conjunto das propriedades que atuam no universo social considerado, quer dizer, apropriadas a conferir, ao detentor delas, força ou poder neste universo. Os agentes e grupos de agentes são assim definidos pelas suas posições relativas neste espaço. [...] Na medida em que as propriedades tidas em consideração para se construir este espaço são propriedades atuantes, ele pode ser descrito também como um campo de forças, quer dizer, como um conjunto de relações de força objetivas impostas a todos os que entrem nesse campo e irredutíveis às intenções dos agentes individuais ou mesmo às interações diretas entre os agentes. (BOURDIEU, 2011, p. 133).

Depreende-se da afirmação do autor que a relação entre os sujeitos se dá num

complexo processo hierarquizado de atribuições conferidas dentro de determinados

espaços. Trata-se, pois, de uma relação dinâmica, cujo funcionamento e

desenvolvimento estão relacionados com a definição de papéis nos grupos sociais,

dentro de determinados contratos, por meio dos quais os indivíduos estabelecem

trocas em que devem prevalecer as razões e os interesses coletivos.

Nesta perspectiva, é importante estudar as relações e confrontos entre as

manifestações de escrita de sujeitos em diferentes contextos da vida cotidiana. No

caso desse estudo, as escritas de estudantes universitários de grupos populares de

Salvador, Lauro de Freitas e Simões Filho possibilitam o conhecimento das práticas

de escrita por eles desenvolvidas em diferentes situações de interação discursiva

que ocorrem para além do espaço escolar e da atitude que mantêm em relação a

elas.

Compreende-se que a relação entre língua, cultura e sociedade faz parte da

existência humana, dentro da história social, criando convenções, a arte, a ciência, a

tecnologia. E tais dimensões afetam todas as atividades humanas, devendo, por isso

mesmo, ser compreendidas na problematização do cotidiano, na valorização da

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experiência de indivíduos e grupos sociais e na leitura de diferentes realidades e

condições concretas.

Por conseguinte, a compreensão da interface entre língua, cultura e sociedade,

além de conter questões de análise, contém delicadas questões metodológicas

acerca da busca da interpretação da experiência alheia, tendo em vista a

complexidade das interações de diferentes sujeitos, aqui compreendidos como

sujeitos biográficos e culturais, que escrevem suas histórias pessoais, situadas em

diferentes contextos da vida social. Por essa óptica, sublinha Chartier (2002) que:

História cultural, tal como a entendo, tem por principal “objecto” identificar o modo como, em diferentes lugares e momentos, uma determinada realidade social é construída, pensada, dada a ler”. (CHARTIER, 2002, p. 17).

Na esteira dos autores citados, ele afirma que entre os séculos II e IV, em

algumas civilizações antigas, como na Antiguidade grega e romana, a cultura escrita

era constituída de páginas e folhas de uma mesma encadernação, de longa

duração, que circulava através de um tipo de livro chamado de códex, vindo

substituir os rolos. Sobre as formas de escrita antigas, conforme ele:

No século IV da era cristã, uma nova forma de livro impôs-se definitivamente, em detrimento daquela que era familiar aos leitores gregos e romanos. O códex, isto é, um livro composto de folhas dobradas, reunidas e encadernadas, suplantou progressiva mas inelutavelmente os rolos que até então haviam carregado a cultura escrita. (CHARTIER, 2002, p. 106).

O autor leva em conta algumas mudanças nas formas de produção escrita,

cujo processo cumpre uma tripla ruptura: uma nova técnica de inscrição e de

divulgação do escrito; uma nova relação com os textos e uma nova

forma de organização. Assim, segundo Chartier (2003, p. 17), são “[...] rupturas que

transformam os modos de inscrição, registros e comunicação dos discursos”.

Ele sugere que é preciso superar as noções universalizantes e abstratas de

texto e confrontá-las com a realidade concreta das pessoas, das suas

especificidades, a partir da cultura e dos significados a ela atribuídos, numa

perspectiva dialética que necessita levar em conta a dinâmica dos textos e sua

natureza socialmente construída. Em termos práticos, isso quer dizer que o texto

20

estrutura-se a partir da realidade sócio-histórica dos sujeitos e se configura por

diferentes dimensões, sendo a principal delas a sua relação com a cultura local.

Assim sendo, o texto é produzido na “historicidade de sua produção e na

intencionalidade da sua escrita” (CHARTIER, 1990, p. 62).

Segundo Chartier (1991, p.178), “toda reflexão metodológica enraíza-se, com

efeito, numa prática histórica particular, num espaço de trabalho específico”. Se o

texto resulta de um fazer histórico, ou seja, da representação de uma realidade

social que é contada a partir de um enfoque, ele parte de uma determinada

perspectiva história que retrata os usos de escrita dos sujeitos dentro de um espaço

e de uma especificidade única.

Permite-se dizer que é preciso investigar a materialidade da escrita nos

diferentes contextos e nas diferentes formas de inscrição da linguagem, desde

aquelas produzidas nos primórdios das civilizações antigas, até aquelas produzidas

antes e depois de Gutenberg, no cenário ocidental, o que inclui práticas visíveis de

relações de poder, formas estas que marcaram e continuarão marcando as

experiências cotidianas dos indivíduos, dando sentido às memórias e vivências das

suas trajetórias de vida. Para Chartier (2007, p. 9), a escrita possibilita "fixar traços

do passado, trazer as lembranças dos mortos ou a glória dos vivos". Noutra forma

de dizer, tal movimento pode ser traduzido como um exercício por meio do qual se

escreve com as mãos do presente as coisas do passado.

A propósito do poder normativo exercido por grupos que detêm o controle da

escrita de prestígio sobre determinadas camadas da sociedade, lembra Chartier

(1999, p. 23) que “a cultura escrita é inseparável dos gestos violentos que a

reprimem”. Para o autor:

A relação assim instaurada entre a cultura da elite e aquilo que não o é diz respeito tanto às formas como aos conteúdos, aos códigos de expressão como aos sistemas de representações, logo ao conjunto do campo reconhecido à história intelectual. Estes cruzamentos não devem ser entendidos como relações de exterioridade entre dois conjuntos estabelecidos de antemão e sobrepostos (um letrado, o outro popular) mas como produtores de "ligas" culturais ou intelectuais cujos elementos se encontram tão solidamente incorporados uns nos outros como nas ligas metálicas. (CHARTIER, 2002, p. 56).

A revolução provocada pela escrita alfabética e a sua popularização através

21

da imprensa, na sociedade ocidental, a partir do século XVII, resultou de oposições

entre grupos sociais de usuários de diferentes domínios. Desde então, a cultura

escrita e as diversas formas que ela assumiu, além de outros aspectos, serve como

fenômeno para o processo de expansão do poder do Estado.

Esse contexto de mudanças ocorridas no processo de escrita no mundo

ocidental De Certeau (2011) classifica como sendo o da “invenção da indústria

escriturística”, e pontua que o ato de escrever sempre esteve associado às elites

cultas da sociedade. Aqui, interessa destacar a ideia de historicidade da linguagem

e, em particular, as contribuições por ele trazidas para uma melhor análise de como

se processa esse novo lugar social ocupado pela escrita.

A respeito do espaço hegemônico ocupado pela escrita no ocidente do

século XVII, o autor afirma o seguinte: “Designo por escritura a atividade concreta

que consiste, sobre um espaço próprio, a página, em construir um texto que tem

poder sobre a exterioridade da qual foi previamente isolado” (DE CERTEAU, 2011,

p. 204).

A propósito disso, o autor aponta três elementos decisivos: O primeiro deles

é a folha em branco. Esta significa “um lugar de produção para o sujeito”,

compreendido como “espaço próprio” desse sujeito que o provoca como autor.

O segundo elemento, a construção do texto, representa os “fragmentos ou

materiais lingüísticos” que “são tratados neste espaço, segundo métodos explicáveis

e de modo a produzir uma ordem”. Essa condição criada pela escrita através de

“uma série de operações articuladas (gestuais e mentais)” imprime na página

“trajetórias que desenham palavras, frases, enfim, um sistema, o modelo de uma

razão produtora” (DE CERTEAU, 2011, p. 226). Reforça o autor que o texto adquire

condição “itinerante, progressiva e regulamentada”.

O terceiro e último elemento atua sobre a exterioridade. Significa não

apenas o jogo “onde se representa a formalidade das práticas, mas tem como

condição de possibilidade o fato de ser distinto das práticas sociais efetivas” (DE

CERTEAU, 2011, p. 226). Isso quer dizer que o “jogo escriturístico” remete “à

realidade de que se distinguiu em vista de mudá-la” (DE CERTEAU, 2011, p. 226). É

a capacidade que tem a escrita de transformar a própria realidade.

Em outras palavras, o que se quer mostrar é que “as coisas que entram na

22

página são sinais de ‘uma passividade’ do sujeito em face de uma tradição; aquelas

que saem dela são as marcas do seu poder de fabricar objetos”. Portanto, segundo

o autor, a economia escriturística combina “o poder de acumular o passado e de

conformar a seus modelos a alteridade do universo”, constituindo-se uma prática

“capitalista e conquistadora” (DE CERTEAU, 2011, p. 226).

Esses três elementos consolidam a economia escriturística, ou seja,

favorecem a fabricação da linguagem. Nesse sentido, quem domina a escritura,

conquista um poder. Esse “poder, essencialmente escriturístico”, define “o código da

promoção sócio-econômica e domina, controla ou seleciona segundo suas normas

todos aqueles que não possuem esse domínio da linguagem” (DE CERTEAU, 2011,

p. 226).

Com os fenômenos da língua em sociedade e da ideia historicamente

produzida pela escrita enquanto instrumento de poder, sobretudo a partir do cenário

do mundo ocidental nos séculos XVII e XVIII, o que se vê é o surgimento de práticas

verbais cada vez mais complexas e de natureza predominantemente grafocêntrica

de invenção do cotidiano. Tal invenção, nestes períodos, é produzida, conforme a

compreensão do autor, como uma espécie de superação das imposições feitas aos

sujeitos, isto é, constituem “maneiras de fazer” que jogam com o jogo do outro.

Reside aí o que se considera como sendo uma sabedoria popular. Assim sendo, “[...]

palavra que um jogo de palavras associa à acrobacia do saltimbanco e à sua arte de

saltar no trampolim, e como trapaçaria, astúcia e esperteza no modo de utilizar ou

de driblar os termos dos contratos sociais” (DE CERTEAU, 2011, p.79). Tal fato

remete, no caso do grupo dos sujeitos observados nessa pesquisa, aos textos,

materiais escritos, às situações e aos lugares que apareceram em contextos e em

práticas de escrita bastante diversas.

Na sua argumentação, o autor critica o fato de as práticas de escrita (ou

práticas escriturísticas) serem legitimadas pela ciência e política. À língua escrita

reservou-se uma estreita ligação com a racionalidade e a tecnologia, associada à

ideia de progresso. Por assim dizer, a economia escriturística, ou a lógica da cultura

da escrita, engendrada pelo mundo ocidental, consolida-se por meio do papel, cujas

práticas são legitimadas pelas instituições sociais.

Visto que a escrita passou a representar um novo lugar de produção para o

23

sujeito - a página em branco e a sua escritura -, defende-se o pressuposto de que o

discurso escrito é “conectado” e “coesivo”. Tal concepção evidencia o mito de que a

linguagem escrita deriva seu significado diretamente das próprias palavras escritas.

Portanto, a linguagem em sociedade se constrói e se circunscreve pelo que dela se

fabrica pela escrita, pela “abstração”, travestida numa cultura legítima e de poder.

A contribuição de De Certeau (2011) é de fundamental importância para uma

melhor compreensão das mudanças causadas por novas perspectivas, de natureza

fortemente hegemônica, em relação às práticas de escrita no mundo ocidental, a

partir do século XVII. Pontua o autor que no “jogo escriturístico” as táticas e astúcias

subvertem o cotidiano e mostram maneiras de como o fazer. A escrita, afinal de

contas, é fenômeno cultural, situado, diverso, embora sob a égide de um modelo

imposto.

Street (2003), por sua vez, sugere que se estude a escrita em sua relação

com a oralidade e o contexto social e defende, para tanto, o que denomina modelo

ideológico em detrimento de um modelo autônomo de escrita, já que não a

compreende como um bem em si mesmo, mas associada às condições/instituições

socioculturais de que faz parte. Considera o autor, ainda, que estudos atuais sobre a

escrita têm contribuído para uma melhor compreensão do modelo ideológico, que se

caracteriza por relacionar as estruturas culturais às práticas de escrita em diferentes

contextos discursivos, tendo como foco as relações de poder na sociedade.

Defende, portanto, uma abordagem teórica que possa dar conta do real significado

da escrita na vida das pessoas e ao que seja culturalmente particular e universal em

suas manifestações.

O autor critica o que chama de modelo autônomo de escrita por compreendê-

lo como um conjunto de técnicas e habilidades específicas a serem aprendidas,

constituindo-se, sobretudo, como objeto de interesse das instituições sociais, como a

escolar. Trata-se de um modelo que se refere a uma visão tradicional de escrita que

se restringe à sua condição de código, desviando a atenção do contexto social onde

a escrita se manifesta, e da sua importância para as relações de poder em

condições sociais determinadas. Assim sendo, a escrita é vista aqui como um

mecanismo neutro, uma tecnologia a ser dominada por grandes parcelas da

população para garantir o funcionamento mecânico das instituições, ou do estado

24

burocrático. As ideologias são, portanto, “naturalizadas”, vistas como instituições de

reprodução de padrões culturais e de poder de grupos de prestígio, referendadas

pelas instituições.

Street (2003) faz duras críticas, nos níveis metodológico, empírico e teórico, a

autores como Ong (1998), que colocam a escrita como o marco que dividiria as

sociedades em dois estágios: de um lado, a mentalidade “pré-lógica”, o mito e a

incapacidade de abstração; de outro, a “lógica”, a história, o desenvolvimento da

ciência, da objetividade e do pensamento crítico. Para Street (2003), Ong (1998), em

suas análises, não considera as condições sócio-históricas concretas das diferentes

culturas.

O que deve ser ressaltado é que a escrita sempre ocupou uma posição de

prestígio social e, por isso mesmo, é considerada “um bem certamente desejável”

(GNERRE, 2003, p. 5). Isso significa dizer que a escrita, historicamente, teve um

valor intocável durante décadas e, como tal, apresenta vantagens em relação à fala.

Assim: “[...] A capacidade de ler e de escrever é considerada intrinsecamente boa e

apresenta vantagens óbvias sobre a pobreza da oralidade” (GNERRE, 2003, p. 5).

Posição parecida assume Marcuschi (2001), ao afirmar que a escrita é adquirida em

situações formais, principalmente na escola, e apresenta caráter de maior prestígio

como bem cultural desejável.

A escrita se manifesta enquanto prática social situada, concretizada por certos

grupos histórico-culturais, a partir do status ou das características dos seus usuários.

O termo “situada” é pensado sob a óptica das interações entre os sujeitos, ou seja,

situada na linguagem e situada no contexto físico (GHERARDI, 2008).

Ao tratar do prestígio social da escrita, Gnerre (2003) lembra a existência de

diferentes variedades orais e não uma só determinada variedade linguística culta ou

“padrão”, instituída como tal historicamente em círculos de poder, tendo como

modelo a escrita formal, legitimada por toda a sociedade e considerada a própria

língua. Sobre a associação da língua a conteúdos de prestígio social, sublinha o

autor o seguinte:

A língua padrão é um sistema comunicativo ao alcance de uma parte reduzida dos integrantes de uma comunidade; é um sistema associado a um patrimônio cultural apresentado como um “corpus” definido de valores, fixados na tradição escrita. (GNERRE, 2003, p. 6).

25

A questão central compartilhada pelos autores acima citados, sob pontos de

vista particulares, diz respeito à cultura escrita gerada principalmente a partir da

invenção da escrita alfabética no mundo ocidental. Portanto, após a leitura desses

autores, o que se pode dizer sobre eles, em linhas gerais, é que veem a escrita

enquanto usos e manifestações concretas e diversas de diferentes sujeitos e

enquanto fenômeno histórico-cultural e ideológico dentro das relações de poder dos

diferentes grupos sociais.

2.1 Gêneros do Discurso

Os estudos sobre os gêneros no Brasil, principalmente nos últimos anos,

apontam uma enorme diversidade com relação aos conceitos de gênero textual e

gênero do discurso. Nesse trabalho, as manifestações de escrita, enquanto textos,

são consideradas unidades de comunicação verbal, ou enunciados concretos, de

acordo com a perspectiva sócio-histórica e dialógica de Bakhtin para o estudo dos

gêneros do discurso.

No capítulo VIII do seu livro “A Estética da Criação Verbal”, Bakhtin (2003)

afirma que as interações verbais têm o objetivo de promover a comunicação entre

um falante e um ouvinte, os quais assumem modos variados de utilização da língua,

utilização esta que se efetua dos enunciados, sendo estes orais ou escritos,

concretos e únicos.

Nesse sentido, os enunciados, ou unidades concretas de comunicação, são

elaborados e organizados de acordo com cada esfera da atividade humana

mediante tipos relativamente estáveis de enunciados, denominados gêneros do

discurso. Tais enunciados caracterizam os gêneros a partir do seu conteúdo

temático, estilo verbal e de construção composicional, que, por sua vez, refletem as

condições específicas e as finalidades das esferas da atividade humana. Isso

permite dizer que o falante de uma língua dada já dispõe de um repertório de

gêneros e os emprega com base no conhecimento que adquire na sua língua

materna.

Importa ressaltar as intenções comunicativas e necessidades sociointerativas

dos sujeitos em cada esfera de uso da linguagem. O discurso, que se constitui de

26

enunciados concretos, estabelece intercâmbios socioculturais, fruto de processos

cognitivos e conhecimentos acumulados historicamente.

Partindo dessa compreensão, o texto produzido pelos sujeitos como parte

ativa do contexto social em que eles vivem, abre espaço aos diversos discursos,

ideologicamente situados, como os de esfera familiar, artística ou outra, e

representa-os criticamente, pondo-os em interação, diálogo e também em conflito.

Bakhtin (2003) entende que as relações entre os sujeitos da enunciação não

se dão num vácuo social. São estruturadas e determinadas pelas formas de

organização e de distribuição dos lugares sociais nas diferentes instituições e

situações de produção dos discursos. Ele pontua que é “[...] em cada esfera de

utilização da língua, que se elaboram os tipos relativamente estáveis de enunciados,

sendo isso o que denominamos de gêneros do discurso” (BAKHTIN, 2003, p. 279).

Ele divide os gêneros do discurso em dois grandes grupos: gêneros primários

e gêneros secundários.

Os gêneros primários são espontâneos e produzidos nas situações corriqueiras de

comunicação. Os gêneros secundários, por sua vez, caracterizam-se por certas

situações discursivas complexas, em que se exige uma ação discursiva mais

elaborada, como fazer um requerimento, enviar uma carta, um abaixo-assinado.

O autor aproxima os gêneros primários do discurso da oralidade e das esferas

do cotidiano e relaciona os gêneros secundários às esferas dos sistemas ideológicos

constituídos, que surgem em situações sociais mais complexas e muitas vezes

associadas à escrita.

Ele cita os três elementos constitutivos dos gêneros, que são o conteúdo

temático, a composição e o estilo. O conteúdo temático relaciona-se aos temas que

um certo gênero abrange dentro de um dado campo da comunicação, que

“correspondem a situações típicas da comunicação discursiva” (BAKHTIN, 2003, p.

293). A composição, heterogênea devido à grande diversidade da atividade humana,

corresponde à estrutura, à organização característica dos diferentes enunciados.

Rojo (2005, p.196) refere-se à forma composicional como sendo “os elementos das

estruturas comunicativas e semióticas compartilhadas pelos textos pertencentes ao

gênero”. O terceiro elemento, o estilo, diz respeito ao uso típico dos recursos

lexicais, fraseológicos e gramaticais da língua, correspondendo às escolhas dos

27

recursos no gênero.

Para Bakhtin (2003), a escolha do gênero leva em conta com quem o locutor

está falando, em que circunstâncias e com que finalidade. Ao abordar o jogo

argumentativo ou a alternância dos falantes no contexto do enunciado, o autor

considera o seguinte:

O primeiro e mais importante dos critérios de acabamento do enunciado é a possibilidade de responder — mais exatamente, de adotar uma atitude responsiva para com ele (por exemplo, executar uma ordem). Esse critério vale tanto para a curta pergunta banal, por exemplo: “Que horas são?” (pode-se respondê-la) ou para o pedido banal ao qual se pode aceder ou não aceder, quanto para a exposição científica, com a qual se pode concordar ou discordar (total ou parcialmente), e para o romance (no âmbito artístico), sobre o qual se pode formular um juízo de conjunto. (BAKHTIN, 2003, p. 290).

O enunciado envolve o complexo processo da comunicação verbal, da fala

viva, daí a sua natureza essencialmente responsiva. Isso quer dizer que situações

de acordo ou de desacordo (total ou parcial) e até mesmo o caso de um silêncio no

processo de compreensão ou execução de uma ordem pressupõem sempre uma

resposta (“toda compreensão é prenhe de resposta”), fazendo desse modo com que

o ouvinte se torne também locutor. Assim, o ouvinte dotado de uma compreensão

passiva é representado como - parceiro do locutor - não correspondendo ao

protagonista real da comunicação verbal. Já a compreensão responsiva ativa, em

seu todo, seria entendida como geradora de uma resposta (“resposta com que conta

o locutor”).

O autor, portanto, parte do pressuposto da existência de uma língua viva e

interativa, sendo o enunciado concreto constituído de duas faces - locutor/ouvinte - e

o território comum desses sujeitos. A língua representa o produto da interação

verbal, servindo de expressão de um em relação ao outro. O enunciado é que define

um sujeito em relação ao outro, no plano da coletividade; é no perímetro das

relações interpessoais, mediadas pela linguagem, que os homens constroem

conhecimento e se firmam no meio social. Em termos práticos, tal fenômeno ocorre

quando alguém, ao contar como ocorreu um conjunto de fatos, reais ou fictícios,

costuma fazer uso de gêneros narrativos; para se instruir alguém sobre como fazer

alguma coisa (por exemplo, fazer um objeto qualquer, como montar uma mesa, jogar

28

certo tipo de jogo etc.), faz-se uso de gêneros instrucionais; para se convencer

alguém sobre determinadas ideias, faz-se uso de gêneros argumentativos.

Ao se referir ao acabamento do enunciado, o autor afirma que ele é

determinado por três fatores indissociavelmente ligados no todo orgânico: 1) o

tratamento exaustivo do objeto do sentido; 2) o intuito, o querer-dizer do locutor; 3)

as formas típicas de estruturação do gênero do acabamento.

O tratamento exaustivo do objeto do sentido é muito variável a depender da

esfera da atividade humana. Ocorre na vida cotidiana, de perguntas puramente

factuais e de respostas igualmente factuais, na vida prática, na vida militar (os

comandos e as ordens), na vida profissional, ou nas esferas em que os gêneros do

discurso são padronizados ao máximo e a criatividade é quase inexistente. Já nas

esferas criativas, como no caso das ciências, o tratamento exaustivo será muito

relativo.

Quanto ao segundo fator, o intuito, o querer-dizer do locutor, pressupõe que,

em qualquer enunciado, desde a réplica cotidiana até as grandes obras complexas

científicas ou literárias, capta-se o intuito discursivo ou o querer-dizer do locutor que

determina o todo do enunciado: sua amplitude, suas fronteiras, e é esse querer-dizer

que permite medir o acabamento do enunciado.

O terceiro e último fator, isto é, as formas típicas de estruturação do gênero

do acabamento, diz respeito às formas estáveis do gênero do enunciado.

Corresponde ao querer-dizer do locutor e se realiza acima de tudo na escolha de um

gênero do discurso. Essa escolha é determinada em função da especificidade de

uma dada esfera da comunicação verbal, das necessidades de uma temática (do

objeto do sentido), do conjunto constituído dos parceiros etc.

Segundo Bakhtin (2003), “As mudanças históricas dos estilos da linguagem

estão indissoluvelmente ligadas às mudanças dos gêneros do discurso” (BAKHTIN,

2003, p.267). Para ele, “o gênero sempre é e não é ao mesmo tempo, sempre é

novo e velho ao mesmo tempo” (BAKHTIN, 2003, p. 106).

Marcuschi (2008), ao tratar da noção de gênero, aponta a função dos gêneros

na vida cultural e social. Assim, conforme ele:

Existem gêneros que circulam necessariamente em toda a população como formas organizadoras da vida social. São eles os documentos em geral; as contas e notas; nomes de ruas; endereços; cédulas de

29

dinheiro; atestados; formulário etc. O certo é que o cidadão, mesmo quando não letrado em alto nível serve-se de um sem - números de gêneros, mas em sua maioria bastante regulados e padronizados. (MARCUSCHI, 1995, p. 32).

De acordo com o autor, “é impossível se comunicar verbalmente a não ser por

algum gênero, assim como é impossível se comunicar verbalmente a não ser por

algum texto” (MARCUSCHI, 2005, p.19). Desse modo, a vida cultura e social é

constituída, no plano da atividade verbal, através dos gêneros. Sejam estes

definidos a partir de seus objetivos, sua função, estrutura, sejam pela sua

temporalidade, o que inclui os gêneros emergentes, por exemplo, as cartas

eletrônicas (e-mails), os diários (blogs), bate-papos (chats), as videoconferências,

aulas virtuais e os demais gêneros digitais, como reflexo das mudanças sociais.

Pode-se afirmar que a seleção de aspectos da materialidade linguística

cotidiana determinados pelos parâmetros da situação de enunciação – sem a

pretensão de esgotar a descrição dos aspectos linguísticos ou textuais - mas

apenas ressaltar as “marcas linguísticas”, aponta para a ocorrência de uma

diversificação de temas relevantes nos textos.

Portanto, partindo-se desse princípio, a formulação de novas indagações

sobre a produção escrita não pode perder de vista a complexidade dos meios

sociais vigentes. Tal aspecto possibilita uma melhor análise das características do

mundo mais recente e a escrita com uma realidade que promove a ampliação dos

estudos diante da gama de textos hoje produzidos.

2.2 (Multi)letramentos

Considera-se que as novas formas de produção, materialização e circulação

dos textos, principalmente a partir do advento da cultura impressa, por volta do

século XVIII, na fase intermediária da industrialização, trouxeram transformações

significativas às práticas de escrita, tornando-as muito mais complexas. Em

consequência disso, houve também mudança considerável de “perfis dos sujeitos

letrados e as ideologias sobre o papel da leitura e da escrita” (BUZATO, 2009, p. 12).

Tais práticas de leitura e escrita nas sociedades, entende Rojo (2002)

tratarem-se de “diferentes tipos de letramento”, os quais, segundo ela, igualmente

“vão exigir diferentes combinações de capacidades de várias ordens” (ROJO, 2002,

30

p. 4). Para a autora, o termo letramento:

[...] busca recobrir os usos e práticas sociais de linguagem que envolvem a escrita de uma ou de outra maneira, sejam eles valorizados ou não valorizados, locais ou globais, recobrindo contextos sociais diversos (família, igreja, trabalho, mídias, escola etc.), numa perspectiva sociológica, antropológica e sociocultural. (ROJO, 2009, p. 98).

Enquanto a atividade de letramento atravessa diferentes contextos e áreas

sociais, o termo multiletramento, conforme a autora:

[...] significa que compreender e produzir textos não se restringe ao trato do verbal oral e escrito, mas à capacidade de colocar-se em relação às diversas modalidades de linguagens – oral, escrita, imagem, imagem em movimento, gráficos, infográficos etc. – para delas tirar sentido. (ROJO, 2004, p. 31).

Essas “diversas modalidades de linguagens”, ou esses ambientes de

convergência de linguagens, obviamente, dão lugar a novos gêneros discursivos,

quase diariamente: chats, blogs, aula virtual, dentre outros. E isso se dá porque hoje

se dispõe de novas tecnologias e ferramentas de leitura e escrita, que, convocando

novos letramentos, configuram também os enunciados/textos em sua multiplicidade

de modos de significar. São modos de significar e de configurações que se valem

das possibilidades hipertextuais do texto eletrônico e que trazem novas feições para

o ato de leitura: já não basta mais a leitura do texto verbal escrito – é preciso colocá-

lo em relação com um conjunto de signos de outras modalidades de linguagem

(imagem estática, imagem em movimento, som, fala) que o cercam.

Vale salientar que as novas abordagens sobre letramento foram

impulsionadas pelos pressupostos de Bakhtin (2003), que passaram a enfocar as

funções sociocomunicativas da linguagem humana, numa via de construção social

de significados.

Marcuschi (2002) afirma que é exatamente nesse contexto de acontecimentos

que os gêneros se expandem e, nos dias de hoje, devido ao impulso da cultura

eletrônica, como o telefone, o gravador, o rádio, a TV e, particularmente, o

computador pessoal e sua aplicação mais notável, a Internet, houve uma explosão

de gêneros, tanto na oralidade como na escrita. Logo, conforme o autor, é “[...] neste

contexto que os gêneros textuais se constituem como ações sócio-discursivas para

31

agir sobre o mundo e dizer o mundo, constituindo-o de algum modo” (MARCUSCHI,

2002, p. 22).

De maneira análoga, Chartier (1999) enfatiza que as mudanças nos modos de

ler, produzir e fazer circular textos nas sociedades trouxeram consigo novas

situações de produção de leitura-autoria e que a tela do computador permite infinitas

possibilidades de uso e intervenção pelo leitor, muito mais livres do que qualquer

uma das formas antigas do livro. Por tal raciocínio, ocorreram mudanças profundas

na concepção entre autor e o leitor, entre autoridade e apropriação. Nesse sentido,

segundo Rojo (2005), não mais se pode falar de leitor-autor, mas de lautor, condição

esta que cria novas situações de produção de leitura-autoria.

Sob tais condições, esses meios operam em ambientes públicos ou privados,

ou são compartilhados, limitando-se ou não às noções de espaço e tempo, e

caracterizam-se, sobretudo, pela velocidade, imaterialidade e fluidez. Funcionam

como suporte, isto é, “um locus físico ou virtual” (MARCUSCHI, 2008, p.173), que

serve para atender à nova agilidade comunicativa, na ocorrência de novos gêneros.

Considera-se que o mundo atual, dito globalizado, constitui-se de muitas

culturas híbridas, altamente personalizadas, o que provoca uma consciência

altamente descentrada e fragmentada (identidades multifacetadas). Aqui, parte-se

do paradoxo da globalização, compreendendo que “[...] a sua universalização produz

diversificação por vezes ao ponto assustador da fragmentação” (ROJO, 2005, p.

135).

Ao se referir à ocorrência desses novos gêneros e ao reconhecer a

complexidade das diversas práticas sociais de comunicação vivenciadas pelas

pessoas, Lemke (2010) considera que:

As tecnologias do letramento há um bom tempo não são tão simples quanto a caneta, a tinta e o papel. E na era da imprensa, assim como antes dela, o letramento raramente esteve atrelado de forma estrita ao texto escrito. (LEMKE, s/p, 2010).

Depreende-se da afirmação do autor que a noção de letramento supera (ou

deve superar), de alguma maneira, as velhas práticas e se debruça, historicamente,

sobre as complexas relações existentes entre leitura e escrita nas sociedades.

Com base em Canclini (2008[1989]), deve-se referir às manifestações

32

culturais letradas em efetiva circulação social como um conjunto de textos híbridos

de diferentes letramentos, de diferentes esferas, que se caracterizam por um

processo de escolha pessoal e política e de hibridização de diferentes produções.

Para o autor, a produção cultural atual caracteriza-se por um processo de

“desterritorialização, de “descoleção e de hibridação”, permitindo que cada pessoa

possa fazer “sua própria coleção”, sobretudo a partir das novas tecnologias. Afirma

ele que “essa apropriação múltipla de patrimônios culturais abre possibilidades

originais de experimentação e comunicação, com usos democratizadores”

(CANCLINI, 2008[1989], p. 308).

Essa perspectiva reforça a ideia de descolecionar os “monumentos”

patrimoniais escolares pela introdução de novos e outros gêneros de discurso, ditos

“impuros”, de outras e novas mídias, tecnologias, variedades, linguagens. Assim, na

vida social, os sujeitos assumem, através de práticas de linguagem, identidades,

para mascarar-se ou explorar “eus” possíveis (ROJO, 2005, p. 16), produzindo

novos significados.

A autora considera que cada grupo de indivíduos desenvolve um conjunto de

práticas sociais interdependentes que interligam pessoas e estratégias de

construção de significado, sendo que cada um deles é parte integral de uma cultura

e tem um papel em manter e transformar a sociedade, porque os elos sociais

produzem ligações essenciais entre significados e fazeres. E esses fazeres são, em

si mesmos, ressalta a autora, rituais que produzem uma chave entre o eu e a

sociedade, o meio através do qual se “age, participa e se molda por sistemas e

redes “ecossociais” (ROJO, 2005, p. 16) mais amplos, sem fronteiras. As relações

são transformadas na dinâmica desses sistemas de auto-organização mais amplos e

– as percepções humanas, identidades e possibilidades – são transformadas

juntamente com eles. Segundo ela:

As práticas de linguagem ou enunciações se dão sempre de maneira situada, isto é, em determinadas situações de enunciação ou de comunicação, que se definem pelo funcionamento de suas esferas ou campos de circulação dos discursos (científico, jornalístico, literário, artístico, de entretenimento, íntimo, familiar e assim por diante). Essas esferas ou campos e seu funcionamento estão elas mesmas situadas historicamente, variando de acordo com o tempo histórico e as culturas locais (ou globais). (ROJO, 2005, p. 14).

33

Atualmente, a introdução de novos gêneros de discurso ditos “impuros”

(CANCLINI, 2008[1989], p. 308), ou manifestações híbridas, os quais nascem do

cruzamento entre as chamadas cultura erudita e cultura popular, ou central e

marginal, acaba por provocar a (re)organização dos dados da realidade. É possível

afirmar, com base na afirmação da autora, que há conflitos entre duas forças

relacionadas: a globalização e a política da diversidade em nível local, isto é, a

diversidade cultural global, como fenômeno local, provoca a justaposição e o choque

de mundos divergentes.

Em síntese, interessa analisar, nesse estudo, as escritas dos sujeitos

investigados produzidas nos vários contextos observados, nas quais se pode

verificar a ocorrência de determinados gêneros do discurso. Desse modo, as

atividades de escrita nesses espaços, na medida em que revelam as experiências

cotidianas dos sujeitos, revelam da mesma maneira as suas escolhas sobre os

assuntos de seu interesse na convergência de linguagens.

2.3 Atitudes Linguísticas

O tema atitudes, há muito tempo, tem sido de interesse das ciências

humanas. O pioneirismo de seu estudo deve-se à Psicologia Social, tendo como

precursores Lambert e Lambert (1966), segundo os quais:

[...] uma atitude é uma maneira organizada e coerente de pensar, sentir e reagir em relação a pessoas, grupos, questões sociais ou, mais genericamente, a qualquer acontecimento ocorrido em nosso meio circundante. (LAMBERT; LAMBERT, 1966, p. 78).

Observa-se que as atitudes constituem um complexo fenômeno psicológico

que se reveste de grande significado social (LAMBERT; LAMBERT, 1966). Desse

modo, as atitudes estão diretamente relacionadas aos processos psicológicos e à

maneira como os sujeitos agem e atribuem valores em relação aos outros, em

determinados grupos sociais.

Com o passar do tempo, outros campos das ciências sociais passaram a

interessar-se pela temática das atitudes e os seus efeitos na vida em sociedade,

como a Sociologia e a Antropologia, as quais buscaram compreender os fenômenos

sociais dentro das relações existentes. No campo da Sociologia da Linguagem,

34

importa destacar os estudos sobre as atitudes linguísticas, assim como os estudos

sociolinguísticos sobre o mesmo tema realizados a partir do início dos anos 70.

Para a Sociolinguística, que estuda a língua a partir de sua natureza

socioideológica, isto é, dentro de um conjunto complexo de relações existentes entre

língua e sociedade, as atitudes, ou julgamentos de valor, que os sujeitos manifestam

sobre os diferentes usos da língua refletem as relações de poder presentes na

sociedade, sendo, portanto, objeto de estudo deste campo de conhecimento, além

dos usos diversos da língua.

As leituras de alguns autores sobre o tema, a exemplo de Fernández (1998),

ajudam a compreender que as atitudes linguísticas, além de serem influenciadas

pelos fatores sociais, estão associadas aos padrões de prestígio sustentados pelas

comunidades de fala, a partir do que as pessoas pensam e falam. Segundo o autor:

[...] uma manifestação da atitude social dos indivíduos distinguida por centrar-se e referir-se especificamente tanto à língua como ao uso que dela se faz na sociedade, e ao falar de ‘língua’, incluímos qualquer tipo de variedade lingüística: atitudes em relação a estilos diferentes, socioletos diferentes, dialetos diferentes ou línguas naturais diferentes. (FERNÁNDEZ, 1998, p.179).

De fato, as atitudes linguísticas fazem parte do cotidiano dos sujeitos e dos

grupos que as operam em relação à língua ou a um dialeto em particular, de modo

que tais atitudes são, de certo modo, a resposta para o outro, especificamente como

falar um com o outro, a variedade, o dialeto, a língua do outro. Por essa

compreensão, as diferenças linguísticas influenciam decisivamente a adoção de

atitudes também diferentes. O simples fato de uma pessoa considerar uma variante

mais desenvolvida do que outra, por exemplo, representa juízo de valor, ou atitude

assumida com relação a padrões culturais de determinado grupo, o que inclui o

comportamento sobre as manifestações linguísticas.

As atitudes linguísticas podem ser caracterizadas por vários fatores, como

meio social, sexo, idade, função social, dentre outros, do indivíduo, e pelas situações

em que ocorrem as interações discursivas. Em geral, as atitudes linguísticas

decorrem de relações entre linguagem e poder, principalmente em sociedades

estratificadas, e são compartilhadas em agências de socialização como a escola e o

meio social, assim como em diversas instâncias da vida burocrática. Logo, avaliar a

35

atitudes de indivíduos de determinados grupos sociais com relação à língua permite

prever, pelo menos em parte, o comportamento ou julgamento de valor que eles

mantêm sobre as diferentes manifestações discursivas.

Para Fernández (1998, p. 179), “A atitude é uma manifestação lingüística da

atitude social dos indivíduos, que se distingue por foco e especificamente por se

referir tanto à linguagem e ao uso que se faz dela na sociedade". Nesse caso, a

atitude pode ser positiva ou negativa de acordo com as experiências dos sujeitos.

Assim sendo, as atitudes linguísticas se dão a partir de sociedades estratificadas e

de situações sociais vivenciadas, situadas, favorecendo algumas escolhas dentro de

uma determinada língua.

Fernández (1998) considera que duas linhas teóricas orientam a interpretação

sobre as atitudes linguísticas, a mentalista e a comportamentalista. Com base nesta

linha, as atitudes são entendidas como uma "[...] conduta, como uma reação ou

resposta a um estímulo, isto é, a uma língua ou situação ou a características

sociolinguísticas dadas" (FERNÁNDEZ, 1998, p.182); para a linha mentalista, as

atitudes são interpretadas como um "[...] estado interno do indivíduo [...] uma

categoria intermediária entre um estímulo e o comportamento ou a ação individual"

(FERNÁNDEZ, 1998, p.182). Essas duas perspectivas ajudam a compreender o

comportamento linguístico que os indivíduos adotam sobre sua língua e sobre a

língua dos outros.

Dominique Lafontaine define atitude linguística como sendo “a maneira como

sujeitos avaliam línguas, variantes, variáveis linguísticas ou, mais frequentemente,

locutores expressando-se em línguas ou variantes linguísticas particulares” (1997, p.

56). Com base na definição de Lafontaine (1997), Rodrigues (2008) afirma que:

[...] a atitude linguística constitui então um comportamento, uma ação, uma conduta, uma postura em relação a uma língua. É uma manifestação da atitude social dos indivíduos que interfere tanto na língua como no uso que dela se faz em sociedade. (RODRIGUES, 2008, s/p).

Se as atitudes linguísticas relacionam-se aos comportamentos assumidos

pelos sujeitos no plano social dentro de uma língua dada, pode-se mesmo afirmar

que elas decorrem de condições psicossociais, e que, segundo Rodrigues (2008,

s/p), “[...] a atitude em relação a uma língua e a atitude em relação ao grupo social

36

que dela se serve parecem confundir-se”. Assim sendo, situações de segurança ou

de insegurança tanto em relação ao uso da língua, quanto ao uso de uma ou outra

variedade da língua, por exemplo, revelam os comportamentos dos sujeitos nos atos

comunicativos.

Pode-se afirmar que as atitudes linguísticas atuam firmemente no processo

de exclusão ou de inclusão social. Segundo Tarallo (1986, p.14), “[...] as atitudes

lingüísticas são as armas usadas pelos residentes para demarcar seu espaço, sua

identidade cultural, seu perfil de comunidade, de grupo social separado”.

No caso dos sujeitos investigados nessa pesquisa, isto é, estudantes

universitários de uma faculdade privada da cidade do Salvador, é possível afirmar

que a compreensão das atitudes linguísticas auxilia a análise das manifestações de

escrita universitária em confronto com as escritas cotidianas extraescolares que

constituem outras práticas culturais, como as escritas de cunho religioso e de lazer,

em contextos linguísticos e culturais diferentes. Estas são manifestações

sociodiscursivas situadas, fruto, portanto, da realidade sociocultural dos referidos

sujeitos.

TB, sujeito dessa pesquisa, por exemplo, quando perguntada na segunda

entrevista sobre o que escrevia nas disciplinas da faculdade, respondeu, em relação

à disciplina Psicomotricidade, não produzir textos, e sim fazer avaliação escrita. E

que só escreve texto seu no Facebook, já que às vezes posta algum texto que esteja

relacionado à sua religião, ou algum depoimento quando quer falar ou extravasar

alguma coisa. Já o sujeito MS, quando perguntado sobre o que tinha escrito

ultimamente, respondeu que estava escrevendo só trabalhos da faculdade, muito

embora fossem observadas, nas páginas do Facebook, mensagens por ele postadas

dentro de outras práticas de escrita, como as religiosas e de lazer.

Pode-se antecipar que os dois sujeitos mencionados compartilham uma

atitude conservadora sobre a língua, especificamente a escrita. A concepção de

língua como um conjunto de práticas socioculturais no contexto de outras práticas

não se vislumbra aqui. Em linhas gerais, o entendimento do processo de formação

do escritor / leitor é formal, escolar, já que ocorre a partir do ensino-aprendizado de

produção de texto escrito através de exercícios e avaliações, que no caso ocorrem

na faculdade. O texto, neste caso, tem a função de atender às expectativas do

37

professor, seu interlocutor. Já o texto extraescolar é compreendido como atividade

de formação religiosa, política, de lazer etc., visto que envolve diferentes

interlocutores, intenções e situações discursivas próprias, além de contextos

singulares de realização. Não é, por conseguinte, avaliado como fruto de experiência

cultural letrada.

A discussão sobre as atitudes linguísticas será ampliada em seção posterior,

quando da análise dos dados coletados.

38

3 METODOLOGIA DA PESQUISA 3.1 O Estudo Numa Perspectiva Etnográfica: Breves Considerações

Em razão da natureza desse estudo, optou-se pela pesquisa qualitativa de

base etnográfica. Por tal compreensão, a pesquisa científica não representa uma

escolha metodológica pura e simplesmente, mas sobretudo uma decisão

previamente elaborada, com vistas a valorizar as singularidades dos sujeitos em

relação ao contexto social e histórico em que estão inseridos. Aqui, vale destacar

principalmente as contribuições trazidas para o estudo por Goldenberg (2004),

dentre outros autores, a qual afirma que:

O “olhar científico” [...] não se reduz a certos procedimentos metodológicos. A pesquisa científica exige criatividade, disciplina, organização e modéstia, baseando-se no confronto permanente entre o possível e o impossível, entre o conhecimento e a ignorância. (GOLDENBERG, 2004, p. 13).

Sob tal óptica, o interesse do pesquisador qualitativo não se limita apenas

aos resultados. Desse modo, ao se analisar um espaço específico dos sujeitos,

analisa-se, também, o campo de possibilidades, buscando-se apreender

determinados fenômenos que se manifestam no cotidiano das pessoas e como

estas se comportam.

A ideia de cotidiano, aqui colocada, refere-se à própria condição de vida

vivida dos sujeitos nos diferentes espaços observados, a partir de questões e/ou

temas que se lhes apresentam como pertinentes nas práticas sociais. Isso

pressupõe que os sujeitos são protagonistas da pesquisa (pesquisador e

pesquisados), em cuja dinâmica se tece a dimensão “do lugar”, “do habitado”, “do

praticado”, “do vivido”, “do usado”, como defendem De Certeau (2011) e outros

estudiosos. Assim:

O cotidiano é aquilo que nos é dado cada dia (ou que nos cabe em partilha), nos pressiona dia após dia, nos oprime, pois existe uma opressão do presente. Todo dia, pela manhã, aquilo que assumimos, ao despertar, é o peso da vida, a dificuldade de viver, ou de viver nesta ou noutra condição, com esta fadiga, com este desejo. O cotidiano é aquilo que nos prende intimamente, a partir do interior. É uma história

39

a meio de nós mesmos, quase em retirada, às vezes velada. (DE CERTEAU, 2011, p. 31).

De acordo com Moreira e Caleffe (2006), a etnografia tem como

característica enfocar o comportamento social no cenário, confiando em dados

qualitativos, em que as observações e interpretações ocorrem no contexto da

totalidade das interações humanas. Os resultados da pesquisa são interpretados

com referência ao grupo ou cenário, conforme as interações no contexto social e

cultural e a partir do olhar dos sujeitos que dela participam.

A compreensão do campo se torna imprescindível nesse tipo de estudo por

trabalhar com pessoas, cuja natureza é carregada de subjetividades, dentre outros

aspectos afetivos que interferem diretamente no processo.

Quanto à ocorrência da subjetividade na pesquisa, comenta Romanelli

(1998) o seguinte:

A subjetividade, elemento constitutivo da alteridade presente na relação entre sujeitos, não pode ser expulsa, nem evitada, mas deve ser admitida e explicitada e, assim, controlada pelos recursos teóricos e metodológicos do pesquisador, vale dizer, da experiência que ele, lentamente, vai adquirindo no trabalho de campo. (ROMANELLI, 1998, p. 128).

A questão trazida pelo autor acerca da subjetividade na pesquisa, fato este

que permite as várias manifestações dos sujeitos e a apreensão de suas

particularidades pelo pesquisador, é ampliada por Goldenberg (2004), quando se

refere à figura do pesquisador qualitativo e às concepções dos indivíduos sobre o

mundo que os cerca, apontando o plano da intersubjetividade na pesquisa. Isso

significa dizer que a pesquisa não se trata apenas de um método de observação,

mas do confronto entre o universo social do pesquisador e do pesquisado, ou seja, o

diálogo, as experiências, a cultura, que se refletem nas opções teóricas. Por

conseguinte, não há a objetividade nem subjetividade absolutas na pesquisa. Nesse

sentido:

Não podendo ser realizada a objetividade nas pesquisas sociais, e o conhecimento objetivo e fidedigno permanecendo com o ideal da Ciência, o pesquisador deve buscar o que Pierre Bourdieu chama de objetivação: o esforço controlado de conter a subjetividade. (GOLDENBERG, 2004, p. 45).

40

O controle da subjetividade na pesquisa não é possível ser realizado

plenamente, mas defende Goldenberg (2004, p. 45) a ideia de que “[...] é essencial

conservar-se esta meta, para não fazer do objeto construído um objeto inventado. A

simples escolha de um objeto já significa um julgamento de valor”.

O pesquisador qualitativo não pode fazer julgamentos, nem permitir que

seus preconceitos e crenças contaminem a pesquisa. Para Goldenberg (2004, p.

31), “[...] como a realidade social só aparece sob a forma de como os indivíduos

vêem este mundo, o meio mais adequado para captar a realidade é aquele que

propicia ao pesquisador ver o mundo através dos olhos dos pesquisados”.

A pesquisa etnográfica se utiliza de técnicas voltadas para descrição densa

do contexto estudado, como afirmam Hammersley e Atkinson (1994), segundo os

quais o valor da etnografia como método da pesquisa social está no fato da

existência de uma variedade de modelos culturais e do seu significado na

compreensão dos processos sociais. A etnografia, como também outras pesquisas

qualitativas, busca a inserção no contexto natural para permitir o acesso às

experiências, aos comportamentos, às interações, para assim compreender a

dinâmica do grupo estudado.

Nessa perspectiva, o observador - que, para Bakhtin “não se situa em parte

alguma fora do mundo observado, e sua observação é parte integrante do objeto

observado” (BAKHTIN, 2003, p. 355) - é partícipe dos eventos que observa. Como

parte integrante da realidade que produz no campo de pesquisa, sua voz se

encontra com as vozes dos sujeitos, produzindo novos significados para as

experiências vividas.

Nesse tipo de pesquisa, os dados e informações obtidos não se dão num

vazio de suposições ou abstrações pura e simplesmente, e sim resultam de um

trabalho de campo onde o objeto é delineado processualmente, favorecendo uma

melhor interpretação sobre os fenômenos observados. Isso significa dizer que as

informações geralmente são complementadas por outras questões que

momentaneamente possam surgir no decorrer de todo o processo do trabalho.

3.2 Critério de Escolha dos Sujeitos e os Contextos Pesquisados

Um critério adotado para a escolha dos sujeitos foi a diversidade de

41

gênero(sexo) e idade, para compor um corpus representativo das pessoas

pesquisadas. Outro critério foi serem os sujeitos estudantes do segundo semestre

do Curso de Pedagogia da Faculdade Regional da Bahia (UNIRB), Unidade de

Patamares, em Salvador. Os sujeitos também foram escolhidos por residirem em

bairros populares das cidades de Salvador, Lauro de Freitas e Simões Filho.

A inclusão dos sujeitos na pesquisa se deu, inicialmente, pela aceitação ao

convite do pesquisador para participarem da pesquisa, formalizada mediante a

assinatura do Termo de Consentimento preconizado na Resolução n.º 196/1996, do

Conselho Nacional de Saúde.

Kramsch (1993, p.10) considera a língua como um sistema de “opções

entrelaçadas” e afirma que as palavras “texto” e “contexto” algumas vezes são

usadas separadamente, para fins de conceitualização destes processos, mas que

seriam, na verdade, “noções inseparáveis”.

Malinowski, antropólogo que investigou durante muitos anos os habitantes

das Ilhas Trobiand, no Sul do Pacífico, foi o primeiro pesquisador a teorizar sobre o

conceito de contexto. Segundo o autor, seria necessário o fornecimento de

informações acerca da situação em que o texto ocorre, criando, assim, o termo

“contexto de situação”, referindo-se a todo o ambiente no qual o texto é produzido

(HALLIDAY, 1989, p. 6).

A noção de contexto de usos de escrita adotada nessa pesquisa, para efeito

de reflexão e interpretação, refere-se aos espaços em que os sujeitos se encontram

e as situações por eles vividas e suas manifestações, reforçando-se os atos

comunicativos situados, isto é, determinados pelas condições cotidianas, reais e

concretas. Tal pressuposto se apoia em Bakhtin (1992) ao conceber a noção de

língua:

[...] como um fenômeno social da interação verbal, realizada pela enunciação ou enunciações, e “não constituída por um sistema abstrato de formas lingüísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico de sua produção. (BAKHTIN, 1992, p. 123).

Nessa perspectiva de trabalho, torna-se de fundamental importância,

portanto, conhecer o contexto situacional no qual determinado texto (oral ou escrito)

é produzido para ser interpretado.

42

O contexto principal da pesquisa é a Faculdade Regional da Bahia (UNIRB).

Trata-se de uma instituição de ensino universitário particular fundada em 2002, no

município de Salvador, e depois em Alagoinhas. Oferece diversos cursos de

graduação tradicionais e tecnológicos nas áreas de saúde, humanas e exatas, entre

eles o de Pedagogia, e de pós-graduação lato sensu. Além do contexto da

faculdade, outros contextos sociodiscursivos, extraescolares, fizeram parte da

pesquisa, a exemplo do contexto profissional ou do trabalho, religioso e do lazer dos

sujeitos investigados.

3.3 Procedimentos e Instrumentos de Coleta de Dados

Um dos procedimentos metodológicos adotados para a coleta de dados foi a

realização de entrevistas temáticas semiestruturadas gravadas. Para tanto, definiu-

se previamente um roteiro de perguntas a serem feitas a todos os sujeitos, conforme

apresentado no Apêndice A.

Foi adotada a entrevista semiestruturada gravada, por permitir que sua

aplicação seja mais explorada e ampliada pelo pesquisador para obter respostas de

maneira rápida, de modo a atender aos objetivos pretendidos. Na primeira fase das

entrevistas, optou-se pela entrevista-piloto ou o pré-teste, conforme denominação de

Triviños (1987), instrumento este que permite verificar a estrutura e a clareza do

roteiro, por meio de uma entrevista preliminar com as pessoas escolhidas.

Foram preparadas duas distintas entrevistas temáticas: uma para ser aplicada

com a professora da disciplina Novos Paradigmas da Educação Básica e outra com

o grupo de estudantes. Dessas, apenas foram realizadas as entrevistas com os

estudantes, conforme apêndice citado acima.

As entrevistas temáticas com os sujeitos pesquisados, realizadas em quatro

momentos e com uma duração média de aproximadamente 30 minutos por sujeito,

tiveram duração de 148 minutos no total. Basearam-se em questões sobre as

variadas práticas de escrita da vida cotidiana dos sujeitos, desde aquelas produzidas

no contexto acadêmico (na faculdade), fruto das demandas das disciplinas cursadas;

nas escolas onde eles atuam como professores-estagiários, oriundas das atividades

destinadas aos seus alunos; até aquelas que decorreram de outras práticas, como

as religiosas e de lazer, inclusive os incontáveis acessos à rede social Facebook.

43

É importante esclarecer que, após a realização das entrevistas temáticas,

foram elas transcritas com base no modelo do Projeto de Estudo da Norma

Linguística Urbana Culta do Brasil (NURC). O NURC teve seu início em 1969, tendo

como proposta inicial documentar e estudar a norma falada culta de cinco capitais

brasileiras: Recife, Salvador, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. Em síntese,

o que foi aproveitado do NURC para a transcrição das falas dos sujeitos

investigados apresenta-se recortado a seguir:

___________________________________________________________________

1. Iniciais maiúsculas: só para nomes próprios ou para siglas (USP etc.) 2. Fáticos: ah, éh, eh, ahn, ehn, uhn, tá (não por está: tá? você está brava?) 3. Nomes de obras ou nomes comuns estrangeiros são grifados. 4. Números: por extenso. 5. Não se indica o ponto de exclamação (frase exclamativa). 6. Não se anota o cadenciamento da frase. 7. Podem-se combinar sinais. Por exemplo: oh:::. (alongamento e pausa). 8. Não se utilizam sinais de pausa, típicos da língua escrita, como ponto-e-vírgula, ponto final, dois pontos, vírgula. As reticências marcam qualquer tipo de pausa, conforme referido na Introdução. 9. Silabação. Por exemplo: tran-sa-ção. 10. Entoação enfática (letra maiúscula). Exemplo: reTÊM.

Fonte: PRETI (2001)

Como recurso metodológico, também foram feitos registros fotográficos dos

contextos estudados. Para a realização das fotografias e a gravação das entrevistas,

utilizou-se um aparelho celular tipo MP3.

Outro procedimento de pesquisa diz repeito às observações diretas feitas

durante as entrevistas temáticas nas escolas em que a maioria deles atua como

professores-estagiários e nas igrejas que frequenta. As relações estabelecidas por

esses sujeitos em diferentes situações e contextos de interação verbal foram

consideradas. Também foram recolhidos textos escritos e lidos pelos sujeitos, para

comporem os dados da pesquisa.

Do mesmo modo, foi elaborado o diário de campo, sendo este um instrumento

básico para o pesquisador. Trata-se de um documento pessoal em que são

registradas observações, experiências, até as percepções advindas das interações

entre os sujeitos no processo do trabalho. Assim, o diário de campo é um

44

instrumento por meio do qual o pesquisador registra, de modo mais fiel, detalhado e

seguro possível, cada ida ao campo.

Concebe-se o diário de campo enquanto notas em que o pesquisador registra

as observações do comportamento e as manifestações dos sujeitos quanto aos

vários pontos investigados e ainda suas impressões pessoais, que podem modificar-

se com o decorrer do tempo.

Por tal perspectiva metodológica, o diário de campo representa, nesse

estudo, importante documento descritivo e explicativo das experiências no campo

como instrumento de resgate do mundo vivido. A respeito desse aspecto, vale citar o

pensamento de Bourdieu (2011), a seguir, que mostra a necessidade do registro e

da explicação.

[...] como se processa realmente o trabalho em pesquisa [tornando possível] fazer uma ideia do que se passa na intimidade do “laboratório” ou, mais modestamente, da oficina - no sentido do artífice ou do pintor do Quatrocento: com todas as hesitações, todos os embaraços, todas as renúncias, etc. (BOURDIEU, 2011, p. 19).

Com base no que recomenda o autor, a partir dos registros realizados através

do diário de campo, foi possível descrever as práticas de escrita dos sujeitos nos

contextos investigados, pela apreensão do mundo empírico, nele abarcando os

fenômenos de forma mais fidedigna e confiável. Esses passos permitiram uma nova

leitura do corpus, selecionando os documentos que reuniam os critérios

estabelecidos para viabilizar a investigação, cujo recorte subsidiou a realização do

trabalho.

3.4 Experiências de Campo

O trabalho de campo se deu desde o início da pesquisa, já no momento em

que o pesquisador manteve contato inicial com todo o grupo na faculdade, quando

prestou esclarecimentos sobre o trabalho de pesquisa a ser realizado e as razões

pelas quais gostaria da participação de sujeitos daquele contexto universitário.

Também foi dito que seria exigida a adesão do grupo por um período de tempo

relativamente longo, considerando-se que estavam previstas entrevistas e

observações dentro e fora do espaço escolar, com disponibilidade de tempo e

45

informações pessoais.

Convém esclarecer, quanto ao grupo de sujeitos escolhidos para esse estudo,

que a pesquisa foi projetada inicialmente para ser aplicada, levando-se em conta a

diversidade de gênero(sexo), idade e semestre letivo. Desse modo, projetou-se a

pesquisa para dois grupos de sujeitos que estavam frequentando duas disciplinas,

sendo uma do segundo semestre e outra do quarto semestre letivos do Curso de

Pedagogia de uma instituição de ensino superior (IES) privada situada no município

de Lauro de Freitas, próximo ao de Salvador, onde o pesquisador também atua

como docente em disciplinas de semestres letivos distintos. Porém, a realização da

pesquisa na referida IES foi substituída de imediato, tão logo, no primeiro contato

com os dois grupos, o pesquisador verificou tratar-se de grupos constituídos de ex-

alunos seus no curso, em semestre letivo anterior. Esse fator motivou a substituição

desse grupo de estudantes por outro da Faculdade Regional da Bahia (UNIRB),

unidade de Patamares, em Salvador, onde o pesquisador também é docente e o

estudo foi realizado.

Incluiu-se, ainda, no rol dos sujeitos de pesquisa, a participação das

professoras das disciplinas frequentadas pelo grupo de estudantes escolhidos,

todavia a professora da segunda IES escolhida não fora entrevistada por sucessivas

alegações de suposta falta de tempo, indisponibilidade esta que obrigou a sua

exclusão no processo das entrevistas.

Portanto, pôde-se vivenciar, nos dois grupos de sujeitos projetados (tanto dos

discentes quanto da docente), imprevistos já no início da investigação, exigindo

medidas de superação por parte do investigador para dar andamento ao processo

do estudo.

Do mesmo modo que o primeiro momento de coleta de dados, o segundo

trouxe alguns desafios já no início. Aos serem consultados pelo pesquisador sobre o

agendamento de horário para as visitas às escolas e igrejas, a fim de serem

realizadas as novas entrevistas, os sujeitos pesquisados alegaram algumas

dificuldades iniciais. Algumas delas diziam respeito à incompatibilidade de horário,

visto que pela manhã se encontravam em aula na faculdade e pela tarde estavam

desenvolvendo atividades como professores-estagiários com os seus alunos nas

escolas, ocasião em que estavam priorizando os preparativos das festas juninas e

46

da Copa do Mundo de 2014.

Vale salientar que no mês de junho as escolas tiveram um recesso de cerca

de duas semanas, motivo este, assim como outros já mencionados acima fizeram

com que as visitas aos referidos locais fossem adiadas e numa variação temporal

significativa, cuja realização se deu no período de 05/06/2014 a 30/06/2014 do mês

de junho.

O primeiro momento das primeiras entrevistas se deu no dia 14/11/2013, na

sala de aula de n.º 51 da faculdade, quando foram entrevistados os sujeitos TB e

AM. Na sequência, o segundo momento ocorreu no dia 18/11/2013, na sala de aula

de n.º 51 da faculdade, quando foi entrevistado o sujeito MS. O terceiro momento

ocorreu no dia 29/11/2013, corredor de aulas da faculdade, quando foi entrevistado o

sujeito SA. E o quarto e último momento ocorreu no dia 13/12/2013, na sala de aulas

de n.º 49 da faculdade, quando foi entrevistado o sujeito DM.

Na segunda etapa da pesquisa, totalizaram-se quatro visitas de observação

às Escolas Municipais Professora Maria de Lourdes Santana Alves, local de estágio

do sujeito TB; Nova Sussuarana, local de estágio do sujeito AM; Epaminondas

Berbert de Castro, local de estágio do sujeito MS; e Arx Tourinho, local de estágio do

sujeito SA; e três visitas às Igrejas Assembleia de Deus, de Pau da Lima,

frequentada pelo sujeito TB; e Casa da Bênção de Deus, do Bairro Vida Nova,

município de Lauro de Freitas, frequentada pelo sujeito SA. Esta última foi visitada

duas vezes, tendo sido a primeira visita em um culto numa manhã do dia de

domingo, quando o sujeito SA a frequenta como membro ouvinte e a segunda visita

em um culto numa noite de segunda-feira, quando SA exerce a função de líder,

fazendo pregações. As visitas ocorreram no período de 05/06/2014 a 30/06/2014.

Foram vivenciadas situações ricas no campo e ao mesmo tempo desafiadoras

para o pesquisador pela ocorrência de dificuldades externas na coleta de dados, a

exemplo de recolhimento de escritas dos sujeitos, porque não poderiam ser

produzidas por solicitação direta do pesquisador. Outras vezes, a despeito de

declararem a produção de determinados textos, os sujeitos pesquisados não os

disponibilizaram na sua totalidade sob a alegação, por exemplo, de não os estarem

encontrando entre os seus arquivos pessoais.

47

Assim, experiências como essas, de ordem operacional e pessoal, fizeram-se

presentes já na primeira etapa das entrevistas e se repetiram durante alguns outros

momentos do estudo. Todavia, há de se considerar que os desafios vivenciados

acabaram por sugerir a adoção de novas estratégias por parte do pesquisador, de

modo a tornar a ação investigativa exequível.

Eis, a seguir, o relato de algumas situações de dificuldades pontuais ocorridas

durante as etapas de coleta de dados da investigação:

Deve-se dizer, sobre a visita à escola de AM, que ela ocorreu numa tarde em

que professores e alunos estavam reunidos no pátio apresentando danças e

músicas que remetiam à temática da Copa do Mundo de 2014 e ao São João, em

meio a um cenário muito festivo, alegre e colorido por bandeirolas e cartazes. Uma

verdadeira festa. Na ocasião, por causa da grande movimentação no local, o

pesquisador fora convidado por AM a acompanhá-la até a sala onde ela ministra as

suas aulas, um ambiente mais silencioso que funciona ao mesmo tempo como uma

minibiblioteca e sala de aulas, a fim de que a gravação da entrevista fosse ali

realizada.

Logo após a gravação da entrevista, o pesquisador pediu que lhe fossem

mostrados os outros ambientes da escola, quando observou a existência de textos e

cartazes colados nas paredes, principalmente no refeitório da escola, contendo

motivações da Copa de 2014 e bandeiras de alguns países participantes da

competição e seus pratos típicos, fotografando-os. Ressalte-se que o registro

fotográfico das referidas manifestações foi uma iniciativa do próprio pesquisador, já

que AM não as citou em nenhum momento da entrevista.

Ainda sobre a participação de AM na pesquisa, vale citar os momentos em

que ela deixou de confirmar ao pesquisador a visita ao centro espírita que frequenta

e demorou a fornecer cópia das escritas acadêmicas e escolares, quando MS (outro

sujeito pesquisado e colega de turma de AM), tentando ajudar o pesquisador,

interveio através de ligações telefônicas e de recados a ela por outros colegas da

faculdade para saber o que sucedia, sem êxito no início, já que AM não estava indo

à faculdade nem atendia aos telefonemas. Por causa desses contratempos, a vista

ao centro espírita foi descartada e apenas parte das escritas por ela mencionada

nas entrevistas foi recolhida. Ressalte-se, quanto aos textos pessoais (poéticos e

48

lúdicos), com finalidade tanto pessoal, para reflexão, como também pedagógica,

para uso com os seus alunos, que AM declarou produzir, que nenhum deles foi

entregue.

Em outra ocasião, no campo, quando da visita do pesquisador à Escola

Municipal Arx Tourinho, em 06/06/2014, onde SA é professora-estagiária,

inicialmente houve a observação direta na sala de aula em que ela desenvolvia

atividade de escrita com os alunos e, em seguida, ocorreu a entrevista gravada.

Enquanto SA acompanhava a atividade, o pesquisador, que chegou àquela sala

após a aula ter sido iniciada, sentou-se numa cadeira ao fundo, até que os alunos

concluíssem o trabalho e pudesse ser realizada a entrevista com SA. Estavam em

sala seis alunos, um número abaixo do regular, cuja falta do restante da turma,

segundo SA, ocorreu por ser um dia de sexta-feira em que as aulas se encerrariam

mais cedo (às 15h), devido a uma reunião previamente agendada com o corpo

docente da escola. Tal informação pôde ser confirmada, já que, tão logo a entrevista

gravada com SA foi encerrada, ela se dirigiu um pouco atrasada e às pressas à sala

onde já se encontravam outros professores reunidos.

Outro momento do trabalho de campo envolvendo a participação de SA diz

respeito à primeira visita feita pelo pesquisador à igreja que ela frequenta. A visita

ocorreu numa manhã de domingo, quando, pós o término do culto, o pesquisador foi

convidado por SA a ir a uma sala reservada aos pastores, para que o conhecessem.

Em seguida, também atendendo ao convite de SA, o pesquisador foi por ela

conduzido a outro espaço da igreja para degustar um lanche, após o qual ele se

retirou do local, com o convite de SA de voltar àquela igreja em uma das noites de

segunda-feira para observação, dia este em que SA exerce a função de líder

(pregadora) da igreja.

A segunda visita do pesquisador àquela igreja, numa noite de segunda-feira,

com o objetivo de observar a atuação de SA como pregadora, trouxe uma situação

particular. Ao se iniciar o culto, SA e dois outros membros que pregavam junto com

ela convidaram todos os presentes, inclusive o pesquisador, a formarem um círculo

de oração na frente da parte interna da igreja, próxima ao altar. Neste ato, todos

oravam e entoavam cânticos de louvor, emitindo palavras incompreensíveis e

emocionadas de adoração a Deus.

49

Deve-se dizer, também, sobre a participação de SA na pesquisa, que ela

havia declarado nas entrevistas ter produzido textos narrativos sobre “coisas”

inventadas para crianças e, em especial, para as suas filhas, quando meninas,

porém não apresentou cópia das referidas produções escritas por ter extraviado na

ocasião da mudança de residência que fez.

Ainda no contexto do trabalho de campo, vale informar, quanto à visita feita

pelo pesquisador à igreja frequentada por TB (Assembleia de Deus - CEADEB do

fim de linha do bairro de Pau da Lima), que ela se deu na noite de domingo do dia

08/06/2014, quando o local estava superlotado e, em razão disso, não foi possível

manter contato pessoal com TB, já que ela havia chegado àquele local desde cedo e

estava envolvida com as apresentações religiosas do grupo de jovens da igreja

programadas para aquela noite; do mesmo modo, não houve a coleta de material

(textos escritos, folhetos nem fotografias). E, ao final do culto, todos os presentes se

dispersaram rapidamente, saindo do local, sem que o pesquisador tivesse mantido

contato pessoal com TB naquela ocasião.

Cumpre esclarecer que o sujeito TB, a despeito de ter informado que produziu

textos para a disciplina Leitura e Produção de Textos e ter prometido disponibilizar

cópia das referidas produções, não as apresentou ao pesquisador.

Sobre a participação do sujeito DM na pesquisa, ressalte-se que as duas

entrevistas foram realizadas com ela nos espaços da faculdade, visto que reside no

município de Simões Filho, não desenvolve trabalho formal nem frequenta outra

instituição, além da faculdade, que sugerisse ida a campo.

Todos os sujeitos pesquisados, de modo geral, informaram ter escrito textos

para as diversas disciplinas da faculdade, entretanto apenas parte desses textos

escritos foi disponibilizada ao pesquisador, por esquecimento ou por não terem sido

encontrados pelos entrevistados. Logo, todos esses acontecimentos representaram

dificuldades ou obstáculos, uma vez que demandaram tempo de solicitação, vários

contatos e espera por parte do pesquisador, ante a expectativa de dispor de

importante acervo de autoria dos sujeitos investigados e de poder incorporá-lo ao

corpus constituído.

50

Nesse sentido, encontros e desencontros marcaram o processo de realização

da coleta de dados, mas em parte superados por estratégias adotadas pelo

pesquisador com o propósito de poder cumprir os objetivos traçados para o estudo.

A pesquisa de campo resultou, portanto, em 35 (trinta e cinco) textos

recolhidos, 10 (dez) entrevistas realizadas, a produção de fotografias em diferentes

contextos sociais e de um diário de campo.

51

4 DESCRIÇÃO DOS DADOS DA PESQUISA

4.1 Práticas de Escrita dos Sujeitos nos Contextos Universitário e Profissional

TB, em relação às suas práticas de escrita na faculdade, declarou ter

dificuldades na disciplina Novos Paradigmas da Educação, pois demorou a entender

esse conceito, bem como a compreender a leitura dos textos. Refere-se a dois ou

três textos de cujos títulos e autores disse não se lembrar.

A figura n.º 1, abaixo, intitulada Planejamento Familiar, produzida por TB no

contexto da disciplina Novos Paradigmas da Educação, é um trabalho entregue para

avaliação pela professora da disciplina.

Planejamento Familiar

O planejamento familiar é uma forma de assegurar que as pessoas têm acesso a informação, a métodos de contracepção eficazes e seguros, a serviços de saúde que contribuem para a vivência da sexualidade de forma segura e saudável. A prática do planejamento familiar permite que homens e mulheres decidam se e quando querem ter filhos, assim como programem a gravidez e o parto nas condições mais adequadas. O conceito de planejamento familiar as vezes é muito concentrado na ideia de prevenção a gravidez indesejada, porém esse assunto vai muito mais além disso, trata-se também de um dos grandes problemas educacionais e de saúde refletidos na sociedade [...].

Introdução

A família é a mais antiga instituição na história da raça humana. O lar é o lugar onde mora o marido, a mulher e os filhos. A união pelo casamento de um homem e uma mulher juntamente com seus filhos, forma a família. E a família foi projetada para ser uma instituição forte, refúgio seguro, onde deve prevalecer a dignidade e os sagrados ensinos, que tornam a pessoa humana digna de si.

Neste trabalho abordaremos que a segurança básica de uma criança depende do que ela observa no dia a dia entre o seus pais. Sabe-se que a criança está mais voltada a assimilar os estímulos do meio que a cerca de acordo com as necessidades inerentes à sua idade. Por isso, a estrutura e a ordem são elementos

52

importantes para o desenvolvimento de uma criança. Ela necessita sentir a segurança do amor dos pais.

Conclusão

Planejar a família é reservar a ela um tempo especial, sabendo-se que a mesma deve ser prioridade na vida de um casal. Atualmente a humanidade não é deficiente de conscientização para os problemas apresentados na sociedade, pois métodos para a prevenção não faltam. O que falta mesmo é elaborar uma política pública para solução, ou ao menos, amenização dos problemas encontrados, quando não há o planejamento. [...].

Figura 1: Recorte de relatório acadêmico

Já em relação à disciplina Leitura e Produção de Textos, oferecida no primeiro

semestre do curso, TB justificou que as dificuldades iniciais por ela encontradas,

inclusive resultando em notas baixas, deveram-se ao fato de ter havido uma troca de

professoras, e que as dificuldades foram aos poucos sendo superadas e, por

conseguinte, as notas também recuperadas, após a digitação de uma atividade de

produção de texto extraclasse que ela fez orientada pela nova professora. Citou a

atividade, mas não disponibilizou cópia.

Ainda sobre as escritas no contexto da faculdade, TB costuma utilizar a rede

social Facebook para se comunicar por escrito com colegas da sua turma, como

mostram as figuras n.º 2, um convite, e n.º 3, uma divulgação de evento no contexto

da faculdade, abaixo:

7 de maio Estou mesmo envaidecida. Esse é um seminário que mostrou a força dos pequenos e valentes, sei que a professora está com muito orgulho. Esse convite é para todos que se interessem pelo tema ou/e para quem é da área de educação. E em especial para nossas ex-colegas de curso Andréia Andrade, Mikaele Silva & Silvia Santana Meninas, olhem como estamos chiques. Queremos vocês lá' VIII Seminário de Pedagogia Turmas matutina e noturna. Inscrições no local. AGENDE-SE!!!

53

Figura 2: Convite postado no Feed de Notícias do

Facebook

Figura 3: Divulgação de evento na Faculdade postado no Feed de Notícias do

Facebook

TB, ao tratar das atividades de escrita que fazem parte da escola onde

trabalha como estagiária das séries iniciais, relatou as dificuldades de leitura e

escrita dos alunos. Daí a importância, segundo ela, do Programa do Fluxo, em que

atua, cujos alunos requerem um acompanhamento mais próximo. Disse que os

alunos são divididos por níveis: pré-silábico, silábico, silábicos alfabéticos, e que a

maioria deles está nos níveis silábicos alfabéticos e alfabéticos.

As figuras n.º 4 e n.º 5, a seguir, são cartazes decorativos produzidos com o

tema da Copa de 2014 e do São João e afixados às paredes da escola. TB, em

nenhum momento, referiu-se a eles.

54

Figura 4: Cartaz escolar explorando temática da Copa do Mundo de 2014

Figura 5: Cartaz escolar explorando temática do São João

Apesar de afirmar que gostava muito de escrever (“fazer textos”), TB não se

considera boa redatora, e sim uma redatora “intermediária”, pois alega dificuldade de

“encaixar” o texto. Acrescentou que, quando começa a ler os textos que produz,

considera que não estão bons. Segundo ela, mesmo que procure seguir as normas

que aprende na escola, isto é, “introdução, desenvolvimento e conclusão”, para

conferirem coerência aos textos, quando os lê, não os julga coerentes.

AM, segundo sujeito entrevistado, apontou dificuldades na disciplina

Metodologia do Trabalho Científico, do primeiro semestre da faculdade, por falta do

livro de Thomas Kunn, o que a deixou perdida, também em razão das normas

técnicas de apresentação do texto. Do mesmo modo, apontou muitas dificuldades no

55

começo da disciplina Leitura e Produção de Textos, porque, segundo ela, tudo foi

novidade. Considera complicada a escrita acadêmica e cita como exemplo o uso da

margem e do negrito, pois nunca tinha ouvido estas palavras, mas disse ter

conseguido “pegar” o conteúdo da disciplina, com o passar do tempo, cujos

ensinamentos lhe servem até hoje.

AM, ao ser perguntada se costumava ler e escrever na disciplina Novos

Paradigmas da Educação Básica e como avaliava as suas práticas de leitura e

escrita na referida disciplina, respondeu afirmativamente e com entusiasmo (“com

certeza (frase exclamativa)”). Indagada sobre que tipo de leitura e escrita fazia na

disciplina, declarou que havia escrito muita coisa (“tenho...muitas coisas...”), cuja

rotina de escrita se caracterizava por buscas em livros, a partir dos assuntos dados

pela professora, com retorno para ela mesma, enquanto professora, até mais do que

para a própria professora da disciplina, a quem se referiu de forma elogiosa (“aquela

professora é cheia de bagagem...aquela professora é sem comentários...”).

Ainda sobre as práticas de leitura e escrita no contexto da faculdade, declarou

nas entrevistas que procurava consultar livros da biblioteca e as suas revistas como

fontes de informação para fundamentar os conteúdos das disciplinas. Informou que

costumava fazer anotações de aula e tirar dúvidas com as professoras, a partir dos

textos por ela construídos. Usa a Internet – Google - com a ajuda da filha para fazer

os trabalhos da faculdade, por indicação dos professores.

Quando entrevistada se escrevia para outras disciplinas, além da disciplina

Novos Paradigmas da Educação, respondeu com certa lentidão e hesitação, e,

tentando cobrar da memória o que escrevera, disse que escrevia textos lúdicos e

poéticos (“escrevo....éh...textos lúdicos...textos também poéticos...éh...deixo ver...é

esses textos mesmo...”). E, quando perguntada se esses textos lúdicos e poéticos

eram de uso pessoal ou se tinham finalidade acadêmica, respondeu

afirmativamente, isto é, disse que se tratavam de textos pessoais com finalidade

acadêmica, por ser professora e estar trabalhando com alunos do quinto ano.

Gosta de anotar, disse que tinha curiosidade e que a escrita fazia parte da

“nossa” vida, é necessária. Considera-se boa redatora e, para confirmar tal

habilidade, citou a seleção a que fora submetida, com aprovação, para ingressar no

atual estágio, o qual, dos quinze concorrentes, apenas três foram selecionados.

56

Ressalte-se que AM prometeu, em entrevista, disponibilizar cópia das produções

escritas que declarara fazer, porém não cumpriu, alegando dificuldades de localizá-

las, apesar de pedidos insistentes do pesquisador. Apenas disponibilizou cópia de

atividades retiradas dos livros que vem utilizando nas suas aulas. Desse modo, as

figuras n.º 6 e 7, a seguir, são, respectivamente, exercícios de escrita e texto escolar

utilizados na escola onde AM é estagiária.

Figura 6: Cópia de exercícios de escrita retirados de livro didático

57

Figura 7: Texto escolar retirado de livro didático

Foram coletados cartazes decorativos colados nas paredes e, principalmente,

nas imediações da cozinha da escola, contendo motivações da Copa de 2014.

As figuras n.º 8 e 9, a seguir, referem-se à competição.

58

Figura 8: Cartaz escolar com tema da Copa do Mundo de 2014

Figura 9: Cartaz escolar com tema da Copa do mundo no Brasil de 2014

Como já dito acima, AM informou que os textos pessoais que escrevia eram

de gênero lúdico e poético, com finalidade pedagógica, porém não entregou cópia

das produções escritas por ela mencionadas. Quando perguntada se interagia com

59

outras pessoas através de alguma rede social, do tipo Twitter, Instagram, Facebook,

declarou o uso regular dessas redes sociais, embora tenha afirmado que “não sou

muito ligada...não...minha filha é que abre pra mim...não tenho muito tempo...”.

Ela usa o site de busca Google, na Internet, com regularidade apenas para a

realização dos trabalhos da faculdade (“...uso o Google...sim...inclusive quando

meus professores dizem assim...aí eu vou lá...gosto de anotar...tenho

curiosidade...”). AM, porém, não disponibilizou cópia de nenhuma dessas atividades

escritas produzidas para a faculdade.

MS, o terceiro sujeito entrevistado, quando perguntado sobre as suas práticas

de leitura e escrita na faculdade, respondeu que tem alguma dificuldade em produzir

as resenhas solicitadas pelos professores. Citou a disciplina Prática Orientada III, na

qual disse ter apresentado trabalho sobre a importância do livro didático e ter usado

como recurso os livros didáticos que utiliza ao dar aula como estagiário, com os

quais aprendeu muito, pois vêm com o manual do professor com sugestões

pedagógicas no final. Prefere esse material ao que oferece a Internet, muito embora

a utilize como fonte de pesquisa para a faculdade. Admite copiar os textos (“eu olho

e copio”). Pondera que os recursos tecnológicos podem falhar, na hora de um

trabalho oral, pois a Internet às vezes “cai”. Atualmente, a sua produção escrita se

limita à faculdade, através de texto digitado ou em papel pautado, para entregar ao

professor. Informou que escreveu carta e memorando para a disciplina Leitura e

Produção de Textos, assim como produziu um relatório em grupo para a disciplina

Novos Paradigmas em Educação. Declarou que lê bem os textos acadêmicos, mas

às vezes tem dificuldade de produzi-los. Na sequência, as figuras n.º 10 e 11

ilustram, respectivamente, um memorando que MS diz ter escrito e um relatório para

as disciplinas citadas, apresentados como trabalhos de pesquisa.

60

Figura 10: Recorte de memorando escrito como trabalho de pesquisa para a faculdade

61

Figura 11: Recorte de relatório escrito em grupo para a faculdade

MS, quando perguntado sobre as suas práticas de leitura e escrita fora da

faculdade, mais uma vez se referiu às leituras que faz de textos da revista e do jornal

da Igreja Universal. Informou que, além dessas leituras, também lê livros sobre

Psicologia Educacional. Justificou que gosta de ler esses livros porque falam do

professor e do aluno. Admite que estes não são bem atualizados, mas trazem coisas

que ainda servem sobre a Educação. Não disponibilizou cópia dos aludidos livros.

Verificando-se as práticas de escrita de MS, pode-se constatar que ele se

revela um usuário intenso do Facebook. Por meio desta rede social, posta muitas

fotografias e mensagens escritas tanto de cunho informativo quanto de

entretenimento, a fim de se relacionar com amigos e colegas da faculdade. Foram

selecionadas algumas postagens, com a exclusão de tantas outras, para preservar a

62

imagem dos sujeitos. Desse modo, as figuras n.º 12 e 13, abaixo, são uma breve

amostra do universo de postagens que MS compartilha com estas pessoas.

VIII SEMINÁRIO ESTUDANTIL PEDAGOGIA 2014.

Todos Juntos Por Uma Educação Inclusiva...

Figura 12: Imagem de cartaz postado no Feed de Notícias do Facebook

Figura 13: Imagem de cartaz postado no Feed de Notícias do Facebook

63

Mencionou, ao tratar das atividades de escrita que fazem parte da escola

onde trabalha como estagiário, as produções escritas com finalidade pedagógica. A

esse respeito, citou, como uma de suas principais fontes de referência para a

preparação das aulas, o Jornal da Igreja Universal do Reino de Deus. Para ele, o

jornal traz reportagens interessantes (“e eu gosto muito de ler aquelas reportagens

[...] porque tem muitas coisas interessante”). Ainda destacou, a respeito das leituras

que faz no jornal da IURD, o fato de as mensagens trazerem conforto e alerta para

quem está lendo. Admitiu extrair conteúdos do jornal para a sua prática pedagógica,

ao mesmo tempo em que disse concordar e discordar de algumas de algumas

matérias, sem precisá-las (“tem coisas que eu discordo...tem coisas que eu

concordo...porque a gente tá aqui não é só pra concordar...pra discordar...”).

Ao reiterar, nas leituras que faz no jornal, as contribuições que trazem aos

professores, destacou que todos os meses é publicada uma reportagem tratando de

um alimento diferente, que ele recorta e cola no seu caderno de aulas. As figuras n.º

14, 15 e 16, a seguir, escolhidas e cedidas pelo próprio MS, ilustram o que ele disse.

A primeira trata-se de uma resenha de sua autoria, por meio da qual MS quis

destacar a importância do Jornal da Igreja Universal para a sua prática como

professor. As demais são cópias de parte das matérias jornalísticas editadas pelo

jornal.

64

Figura 14: Resenha sobre a importância do Jornal da Igreja Universal

65

Figura 15: Manchete do Jornal da Igreja Universal

Figura 16: Manchete e Lead do Jornal da Igreja Universal

Além dos recortes de textos do Jornal da Igreja Universal, as práticas de

escrita de MS no contexto da escola onde trabalha como estagiário caracterizam-se

por cópias manuscritas dos livros didáticos que consulta. As figuras n.º 17 e 18, a

seguir, fornecidas por MS, são exemplos de tais práticas.

66

Figura 17: Cópia de texto retirado de livro didático para atividade escolar

67

Figura 18: Cópia manuscrita de exercício de escrita retirado de livro didático para atividade escolar

SA, o quarto sujeito entrevistado, declarou, quanto às práticas de leitura e

produção de textos realizadas para a faculdade, que teve dificuldades “terríveis” na

disciplina Interdisciplinaridade e atribui tais dificuldades ao método de ensino da

professora, razão pela qual tirava nota 6; 6 e pouco, e notas altas nas outras

disciplinas. Gosta de ler tudo o que se refere aos teóricos, dentre eles Piaget,

Wallon, Vigotsky, e se referiu a uma atividade de escrita que a professora pediu na

68

disciplina Metodologia do Ensino Fundamental com o objetivo de saber o que os

alunos haviam entendido sobre os citados filósofos. Na disciplina Leitura e Produção

de Textos, disse que não produziu textos, apenas leu. Gostou de um deles, de

autoria de “Vilaça Costa”, que achou claro, porque traz o conceito de “inteligência

metagenética” e “competência metagenética”, e resumiu tais termos da seguinte

forma: “o homem...pela inteligência...sabe identificar...pela moldura do texto...se está

diante de um gênero ou de outro”.

Dando continuidade à sua narrativa de experiências acadêmicas, considera

que tal perspectiva de análise trazida pelo texto a que se referiu acima é diferente de

como a escola ensina, onde as coisas são sempre as mesmas. E não é só isso.

Essa leitura lhe abriu a visão, segundo ela, pois passou a interessar-se mais pela

escrita acadêmica. E disse: “quando eu estou diante de um jornal...que vem aquela

parte ali da crônica...aí eu ali já sei que foi uma pessoa que escreveu aquilo ali...e

ele tem um objetivo do que ele escreveu ali...professor não tem ideia da importância

daquilo ali na vida..eu fico olhando e estudando que na faculdade eles pede o

autor... segundo o autor...segundo a visão do autor...ele fala o quê? você concorda?

aí esses detalhes vêm abrindo mais a minha visão e o gosto pela leitura”.

Discorrendo, ainda, sobre as questões da leitura e escrita de textos, disse que

há muito tempo deseja “saber lidar” com a redação dissertativa e narrativa. Disse

que observa “nessas faculdades que ninguém tem esse olhar pra lidar...pra querer

desenvolver dentro da pessoa esse gosto dela pra escrita...pra pessoa saber

gêneros textuais”. Mas foi na Internet que encontrou o professor Pimentel, que

ensina de “forma extraordinária” como fazer redação, a exemplo de

desenvolvimento, conclusão, indo mais além disso. Disse ela que, segundo o citado

professor, “a gente tem que criar...quando a gente começa a criar...vai vindo mais

criação”.

Quando perguntada sobre o uso da Internet, declarou não ter paciência para

usá-la e que só a usa para estudar. Só tem E-mail. Acha que se expressa bem, mas

tem dificuldade de “passar para o papel”, e disse que “não sou boa não”, em relação

a usos de escrita.

Quando indagada sobre como andava a sua leitura acadêmica, SA respondeu

ter passado a se interessado mais por tal prática, depois da leitura do texto de

69

Vilaça. Disse que, agora, quando está diante de um jornal, que vem “aquela parte da

crônica”, que já sabe que foi uma pessoa que escreveu aquilo com um objetivo.

Citou a contribuição da professora de Leitura e Produção de Textos, Juliana, nesse

processo de interpretação da leitura e destacou a importância do professor na vida

do aluno.

Quanto às práticas de leitura e escrita na escola em que SA leciona,

observou-se a produção escrita de frases com conteúdo da Copa 2014 e de

formação de palavras, envolvendo famílias silábicas do tipo -la, -pa. Enquanto os

alunos realizavam a atividade, SA caminhava pela sala prestando atendimento

individual a eles e, em determinado momento, citou oralmente a frase, a seguir,

como exemplo: “O Lepo é o mascote da Copa”.

Vale informar que a escola estava decorada com cartazes com conteúdo da

Copa do Mundo de 2014, sem que a entrevistada em nenhum momento da visita

fizesse referência a eles como atividades de língua portuguesa. As figuras n.º 19 e

20, abaixo, referem-se a algumas atividades escolares desenvolvidas por SA com

seus alunos.

70

Figura 19: Cópia de exercícios de escrita retirados de livro didático para atividade escolar

71

Figura 20: Cópia de exercícios de escrita retirados de livro didático para atividade escolar

DM, o quinto e último sujeito entrevistado, foi a que menos interagiu e

contribuiu com o processo da pesquisa tanto presencialmente quanto pelas redes

sociais. É o único sujeito do grupo de entrevistados que não exerce nenhuma

atividade laboral formal, já que é vendedora da Avon. Quando procurada algumas

vezes pelo pesquisador no próprio espaço da faculdade para a segunda entrevista,

não foi por ele encontrada. Os seus colegas de turma informavam que ela vinha

72

faltando, mas não sabiam dizer por quê. Portanto, o acervo de material a respeito de

DM é pequeno e de pouca magnitude para o estudo.

Quando perguntada sobre o que lia e escrevia na faculdade, respondeu

escrever apenas provas e trabalhos. Prometeu apresentar cópias das atividades,

mas nunca as trouxe.

DM respondeu, sobre os conteúdos e atividades da disciplina Leitura e

Produção de Textos, não ter dificuldade na disciplina em nenhum momento, já que

sempre se identificou com ela. Disse que até mesmo no ensino médio sempre tirou

boas notas em Português, em leitura. Acrescentou que até mesmo em classes de

palavras, a exemplo de substantivo, sempre teve êxito. Não se lembra dos assuntos

estudados na disciplina, recordando-se só da paródia que fez sobre as funções da

linguagem, tendo o seu grupo assumido a função de linguagem referencial.

Ainda sobre as suas práticas de escrita no contexto da faculdade, DM disse

que só escreve os textos da faculdade e usa E-mail para fins de estudo, isto é, para

passar os trabalhos da faculdade. Alegou dificuldade na disciplina Metodologia,

porque “tem que botar muita coisa quando é jornal...periódico”. Escreve para

trabalhos e provas na faculdade. Disse que queria se formar como professora de

Português, apesar de que “têm muitas regras”. Não apontou dificuldades em Leitura

e Produção de Textos, visto que se identifica com a matéria. Ressaltou que até

mesmo no ensino médio sempre tirava notas boas em Português, em atividades de

leitura. Considera-se uma redatora mediana e cita dificuldades na repetição de

palavras, mas afirmou que não tinha dúvidas em pontuação.

4.2 As Escritas nos Contextos Religioso e de Lazer

4.2.1 As Escritas no Contexto de Lazer

MS, quanto perguntado se lia jornais ou revistas na Internet ou em outros

meios e se escrevia textos pessoais, respondeu que não costumava ler jornais nem

mesmo na Internet, reservando esta ferramenta ao estudo de assuntos da

faculdade. E, mais uma vez, citou as fontes da Igreja Universal como recurso dos

estudos pessoais. Já em relação ao uso do Facebook, informou utilizá-lo para falar

73

com os amigos e colegas da faculdade.

SA informou que, no tempo livre, gostava de assistir a filmes de romance, por

isso tem assinatura da Sky e citou o filme “Escrito nas Estrelas” como o seu

preferido, contando o enredo. Disse ler jornais muito pouco, pois não tem mais

paciência e precisa de tempo para ler os textos da faculdade.

Quando perguntada sobre as práticas de escrita pessoais, afirmou que gosta

mais de “narrar” “coisas inventadas” para crianças. Geralmente, escrevia para as

filhas lerem, que descobriam a sua autoria por causa da letra. As filhas gostavam do

“fato narrativo”, mas reclamavam da letra. Disse ter perdido tais produções na última

mudança de residência que fez da Fazenda Grande para o bairro Vida Nova, em

Lauro de Freitas. E que não tem mais paciência nem tempo para tanto, até porque

agora as filhas cresceram. Mesmo assim, apresentou ao pesquisador, por livre e

espontânea vontade, a resenha, a seguir, de n.º 21, de sua autoria, que ela afirma

ser um texto extraescolar.

74

Figura 21: Resenha sobre o tema da violência

DM, quando perguntada sobre as suas práticas de leitura e escrita fora do

contexto da faculdade, disse que lia, escrevia e conversava com seus amigos

somente pelo Facebook, mas não todos os dias por falta de tempo, já que tem

afazeres fora de casa. Usa o Orkut e MSN também para estar em contato com eles.

75

Lê mais pela Internet: “costumo ver na Internet os assuntos, as notícias”.

Vale lembrar que, para preservar a imagem de DM e seus seguidores, não

foram aqui reproduzidas as referidas postagens.

Na sequência, a figura n.º 22, abaixo, reproduz uma mensagem

comemorativa de DM postada no Facebook aos amigos pela passagem do Dia das

Mulheres.

8 de março

Feliz dia das mulheres...

Figura 22: Cartão virtual sobre o dia das mulheres retirado do Feed de Notícias do Facebook

A figura n.º 23, a seguir, apresentada sem a imagem de DM, constitui uma

mensagem de agradecimento a seus seguidores pela lembrança do aniversário dela.

23 de fevereiro

obrigado a todos que lembraram do meu aniversário...que Deus abençoe a todos...

Figura 23: Agradecimento retirado do Feed de Notícias do Facebook

4.2.2 As Escritas no Contexto Religioso

Segundo TB, fora da faculdade, ela só escreve em redes sociais,

especificamente no Facebook. A figura n.º 24, abaixo, do domínio religioso, mostra

uma mensagem de TB dirigida aos seus amigos da referida rede.

6 de maio próximo a Salvador Eu, no auge dos meus 24 (beirando a transição para os 25), paro para pensar: 2014, ano de copa \o/ mas também de eleição...hii, que

76

contradição! Ou seria má intenção? Não sei, só vou prestar mais atenção que as pessoas se negam a entender o milagre da salvação Um dia uma pessoa morre de tiro sem motivo, e no outro por agressão, difícil é saber que foi tudo uma grande confusão. Tarde demais, não tem como voltar atrás. É por isso que me sinto obrigada a dizer: JESUS É A ÚNICA SOLUÇÃO' Desculpa o desabafo, é que o meu espírito não tolera perdição' #DeusabençoemaisumavezoBrasil #mesentindoinquieta #mesentindopoeta

Figura 24: Relato de inspiração religiosa retirado do Feed de Notícias do Facebook

Em muitas outras mensagens postadas por TB, no Facebook, os assuntos de

inspiração religiosa aparecem com maior frequência, a exemplo das figuras n.º 25,

26 e 27, a seguir.

14 de março

Já é o bastante Deus reconhecer o meu valor

Figura 25: Cartão virtual com versículo retirado do Feed de Notícias do Facebook

17 de abril próximo a Salvador

Quero ouvir a tua voz e quero caminhar, por caminhos que me

levam pra junto de ti;

Quero ouvir a tua voz e então profetizar, milhões de bençãos pra

mim;

Eu não quero ser guiada pela emoção, mas guardar tua palavra

em meu coração. Não quero errar, nem te entristecer, óh espírito

77

de Deus'

#amém

Figura 26: Louvor retirado do Feed de Notícias do Facebook

A figura n.º 27, abaixo, refere-se a uma mensagem de cunho religioso de DM

aos amigos virtuais.

Dia maravilhoso obrigado Senhor por tudo que o Senhor está

proporcionando em minha vida...galera estou me sentindo muito

bem ...dêem glórias ao Deus todo poderoso que ele tudo

fará....Amém....

Figura 27: Louvor retirado do Feed de Notícias do Facebook

TB, quando entrevistada sobre as práticas de escrita no contexto religioso,

informou que a sua igreja possuía uma revista, mas que ela ainda não havia

adquirido, razão por que acompanha as aulas pela Bíblia e faz leitura todos os dias.

Os cultos religiosos da Igreja Assembleia de Deus, de que TB participa, tratam

basicamente da importância do bom testemunho de um cristão e da necessidade de

constante vigília com vistas à volta de Jesus, através de estratégias variadas, como

pregação por jovens da igreja (leitura oralizada do Livro de Mateus, cap. 25),

cânticos de louvor, dança (balé) e dramatização. Nos momentos em que os jovens

“atores” dramatizavam os fragmentos de textos bíblicos e citavam os livros em que

estes se encontravam, os membros ouvintes os acompanhavam com leituras

oralizadas e emocionadas em voz alta, rendendo cânticos de louvor do tipo “Glória a

Deus! “Aleluia”. Até emitiam sons incompreensíveis, como se estivessem em transe.

Ressalte-se, ainda, que em nenhum momento da visita do investigador àquela

entidade, num domingo à noite, foi possível a aquisição de material de escrita ali

produzido, já que todos os membros estavam concentrados no evento, tanto o grupo

de jovens que faziam a pregação dramatizada quanto os demais membros ouvintes,

que filmavam e gravavam as apresentações. Portanto, não houve espaço, pode-se

dizer, para a possível distribuição de textos editados pela igreja.

AM informou que, fora da esfera acadêmica, lê textos espíritas e citou alguns

autores, como Chico Xavier, Alan Kardec, Joana de Ângeles. Não citou títulos.

Afirmou que a leitura espírita lhe dá tranquilidade e que a considera uma experiência

78

de vida.

MS, mesmo não se declarando ser seguidor de uma religião específica, posta

no Facebook, e com relativa frequência, mensagens de cunho religioso, como se

pode verificar nas figuras n.º 28 e 29, a seguir, retiradas do Feed de Notícias.

Figura 28: Cartão virtual com mensagem religiosa retirado do Feed de Notícias do

Facebook

79

Figura 29: Cartão virtual com mensagem religiosa retirado do Feed de Notícias do Facebook

No culto da Igreja Casa da Bênção de Deus, frequentada por SA, houve a

pregação dos dois pastores, a partir da leitura reflexiva do Livro Bíblico de

Malaquias, cap. 1.º, versículo de 6 a 14, conforme a figura n.º 30, abaixo, retirada da

Internet pelo pesquisador. Os membros foram convidados a acompanhar a leitura

com suas Bíblias, durante a qual falavam em voz alta frases do tipo “Glória a Deus!”,

inclusive SA, que se encontrava sentada na primeira fila, onde permaneceu durante

todo o tempo do culto na condição de membro ouvinte, já que às segundas-feiras, à

noite, como já foi dito, ela assume o papel de líder.

Malaquias 1: 1 Peso da palavra do SENHOR contra Israel, por intermédio de Malaquias. 2 Eu vos tenho amado, diz o SENHOR. Mas vós dizeis: Em que nos tem amado? Não era Esaú irmão de Jacó? disse o SENHOR; todavia amei a Jacó, 3 E odiei a Esaú; e fiz dos seus montes uma desolação, e dei a sua herança aos chacais do deserto. 4 Ainda que Edom diga: Empobrecidos estamos, porém tornaremos a edificar os lugares desolados; assim diz o SENHOR dos Exércitos: Eles edificarão, e eu destruirei; e lhes chamarão: Termo de impiedade, e povo contra quem o SENHOR está irado para sempre.

80

5 E os vossos olhos o verão, e direis: O SENHOR seja engrandecido além dos termos de Israel. 6 O filho honra o pai, e o servo o seu senhor; se eu sou pai, onde está a minha honra? E, se eu sou senhor, onde está o meu temor? diz o SENHOR dos Exércitos a vós, ó sacerdotes, que desprezais o meu nome. E vós dizeis: Em que nós temos desprezado o teu nome? 7 Ofereceis sobre o meu altar pão imundo, e dizeis: Em que te havemos profanado? Nisto que dizeis: A mesa do SENHOR é desprezível. 8 Porque, quando ofereceis animal cego para o sacrifício, isso não é mau? E quando ofereceis o coxo ou enfermo, isso não é mau? Ora apresenta-o ao teu governador; porventura terá ele agrado em ti? ou aceitará ele a tua pessoa? diz o SENHOR dos Exércitos. 9 Agora, pois, eu suplico, peça a Deus, que ele seja misericordioso conosco; isto veio das vossas mãos; aceitará ele a vossa pessoa? diz o SENHOR dos Exércitos. 10 Quem há também entre vós que feche as portas por nada, e não acenda debalde o fogo do meu altar? Eu não tenho prazer em vós, diz o SENHOR dos Exércitos, nem aceitarei oferta da vossa mão. 11 Mas desde o nascente do sol até ao poente é grande entre os gentios o meu nome; e em todo o lugar se oferecerá ao meu nome incenso, e uma oferta pura; porque o meu nome é grande entre os gentios, diz o SENHOR dos Exércitos. 12 Mas vós o profanais, quando dizeis: A mesa do Senhor é impura, e o seu produto, isto é, a sua comida é desprezível. 13 E dizeis ainda: Eis aqui, que canseira! E o lançastes ao desprezo, diz o SENHOR dos Exércitos; vós ofereceis o que foi roubado, e o coxo e o enfermo; assim trazeis a oferta. Aceitaria eu isso de vossa mão? diz o SENHOR. 14 Pois seja maldito o enganador que, tendo macho no seu rebanho, promete e oferece ao Senhor o que tem mácula; porque eu sou grande Rei, diz o SENHOR dos Exércitos, o meu nome é temível entre os gentios. (MALAQUIAS, cap. 1, v. 1-14). Figura 30: Versículos bíblicos

Vale informar que na primeira visita de observação feita à Igreja Casa da

Bênção de Deus foram adquiridas cópias de diversos folhetos bíblicos produzidos

pela entidade contendo versículos variados, contemplando os seus eventos.

Ressalte-se que foi dito por SA ao pesquisador não poder fotografar nem filmar o

81

local por determinação do pastor, condição esta naquela ocasião respeitada. As

figuras de n.º 31, 32, 33/frente e 33/verso, a seguir, mostram parte da vasta

programação da igreja no sentido de garantir a assiduidade dos membros.

Texto 31: Folheto coletado na igreja

Figura 32: Folheto coletado na igreja

Figura 33/frente: Folheto coletado na igreja

82

Figura 33/verso: Versículos do Gênesis

No segundo culto desta igreja, a pregação da noite se caracterizou pela

leitura do texto bíblico de Salomão e realização de corrente de oração com os

membros organizados em roda, na frente da igreja. Neste culto, SA estava como

pregadora, tendo ela convidado o pesquisador para também ir à frente da igreja para

participar da atividade com os irmãos, da qual ele participou integralmente. Durante

o evento, os membros liam o versículo bíblico de Salomão e entoavam cânticos de

louvor a Deus com muita emoção, podendo-se observar que alguns choravam. As

figuras, a seguir, de n.º 34 (Versículo bíblico de Salomão), n.º 35 (Equipe Vasos de

Deus) e 36 (Festa da Colheita), referem-se a fotografias do interior da igreja tiradas

pelo pesquisador na segunda visita.

I Reis - 1:11

Então falou Natã a Bate-Seba, mãe de Salomão, dizendo: Não ouviste que Adonias, filho de Hagite, reina? E que nosso senhor Davi não o sabe? I Reis - 1:13 Vai, e chega ao rei Davi, e dize-lhe: Não juraste tu, rei senhor meu, à tua serva, dizendo: Certamente teu filho Salomão reinará depois de mim, e ele se assentará no meu trono? Por que, pois, reina Adonias? I Reis - 1:17

E ela lhe disse: Senhor meu, tu juraste à tua serva pelo SENHOR teu Deus, dizendo: Salomão, teu filho, reinará depois de mim, e ele se assentará no meu trono. I Reis - 1:19

E matou vacas, e animais cevados, e ovelhas em abundância, e convidou a todos os filhos do rei, e a Abiatar, o sacerdote, e a Joabe, capitão do exército, mas a teu servo Salomão não convidou. (SALOMÃO, Vers. 1:11-1:19).

83

Figura 34: Versículos bíblicos retirados da Internet

Figura 35: Fotografia de cartaz no interior da igreja

4.3 Descrição dos Sujeitos da Pesquisa

São apresentados, no quadro abaixo, os sujeitos da pesquisa de acordo com

os seguintes fatores: nome, idade, gênero/sexo, residência (bairro/cidade) e

profissão. Vale destacar que, da amostra dos 5 (cinco) sujeitos pesquisados, 1 (um)

é do gênero/sexo masculino e 4 (quatro) são do gênero/sexo feminino.

NOME IDADE

GÊNERO/SEXO RESIDÊNCIA (BAIRRO/CIDADE)

PROFISSÃO

DM

19

F

Centro/Simões

Filho

Estudante

TB

24

F

Capelinha de São

Caetano/Salvador

Professora-

Estagiária

84

MS

44

M

Pernambués/

Salvador

Professor-

Estagiário

SA

48

F

Vida Nova/Lauro de

Freitas

Professora-

Estagiária

AM

53

F

Pirajá/Salvador

Professora-

Estagiária

Os sujeitos escolhidos para o estudo são todos estudantes do segundo

semestre do Curso de Pedagogia da Faculdade Regional da Bahia (UNIRB),

Unidade de Patamares, Salvador-Bahia, com faixa etária que varia entre 19 e 53

anos de idade. A maioria é membro de igrejas evangélicas (3 dos 5 pesquisados),

desenvolve estágio na Secretaria de Educação do Município de Salvador nas séries

inicias da educação básica (4 dos 5 pesquisados) e reside em bairros considerados

populares das cidades de Salvador, Lauro de Freitas e Simões Filho.

O critério adotado no trabalho de campo para a inclusão dos sujeitos na

pesquisa foi a participação voluntária. Para tanto, o investigador manteve contato

inicial com todo o grupo, num intervalo de aula da disciplina Novos Paradigmas da

Educação, e esclareceu a natureza do trabalho de pesquisa a ser realizado e as

razões pelas quais gostaria da participação de sujeitos daquele contexto escolar.

A inclusão dos sujeitos na pesquisa foi consentida, mediante a assinatura do

Termo de Consentimento preconizado na Resolução n.º 196/1996, do Conselho

Nacional de Saúde.

Sujeito DM:

DM, aluna de 19 anos, é moradora do município de Simões Filho. Está

separada do marido, com quem vivia até pouco tempo atrás, também na companhia

do sogro, enfermo. Hoje, mora sozinha, pois a mãe vive com o padrasto, que tem

quase a idade de DM, razão pela qual esta optou por morar sozinha. Os pais são

85

separados. O pai tem 40 anos de idade, estudou até a 3.ª série do ensino

fundamental e vive do trabalho que realiza como pescador, na Ilha de Itaberaba,

onde reside. A mãe tem 38 anos de idade e cursou até a 8.ª série do ensino

fundamental. O ex-marido tem 28 anos de idade, estudou até a 3.ª série do ensino

fundamental e vive do trabalho que realiza administrando os aluguéis residenciais

do seu pai. DM trabalhou em lojas como vendedora de roupas de praia, bijuterias e

calçados, sem carteira assinada. Atualmente, só estuda e vende produtos da Avon.

Frequenta a Igreja Quadrangular eventualmente, como visitante. No tempo livre,

gosta de assistir a programas de televisão, como o The Voice Brasil, e ir à casa de

vizinhos.

Informou, acerca da sua vida acadêmica, que sempre estudou em escolas

públicas, não tendo nunca repetido ano ou interrompido os estudos. Sempre gostou

da disciplina Língua Portuguesa e até pensou em ser professora na área, mas

declinou da ideia por causa das regras gramaticais.

Sujeito TB:

TB, aluna de 24 anos, é moradora do bairro de São Caetano desde os três

anos de idade, onde reside apenas com a mãe, já que sua irmã mais velha se

casou e foi morar nos Estados Unidos, e seus pais são separados. O pai é policial

militar e tem o nível médio completo, e a mãe é formada em Teologia, professora do

Curso Teológico e secretária-geral da Igreja Quadrangular, além de professora do

Curso Teológico da Assembleia de Deus. TB trabalhou como operadora de

telemarketing cerca de dois anos e meio, de 2009 até 2012. Fez estágio de sete

meses com alfabetização de crianças e foi professora da Escola Bíblica Dominical

da Igreja Batista da Restauração. Atualmente, cumpre contrato de estágio como

professora do Programa de Fluxo na Secretaria de Educação do Município de

Salvador. Frequenta a Igreja Assembleia de Deus do fim de linha do bairro de Pau

da Lima. No tempo livre, gosta de acessar o Facebook e sair com os amigos.

Narrou, sobre a sua vida acadêmica, que sempre estudou em escola privada.

No início, numa escola do mesmo bairro em que mora, até o Fundamental I todo e,

86

depois, do Ensino Fundamental II ao Ensino Médio, na Escola Adventista do Sétimo

Dia da Liberdade, sem nunca ter repetido o ano.

Sujeito MS:

MS, aluno de 44 anos, é morador do bairro de Pernambués. Participava de

atividades católicas, tendo feito catecismo e sido coroinha, quando morava no

Pelourinho. Hoje, não mais, porque mora em Pernambués, na companhia dos pais,

aposentados e com o ensino fundamental I incompleto. O pai era sapateiro e a mãe,

lavadeira, tendo esta lavado e passado muita roupa para fora, de cuja atividade,

segundo considera MS, ganhava “direitinho”. Foi professor de reforço escolar numa

escola privada, durante muito tempo, trabalhando com o público infantil. Atualmente,

cumpre contrato de prestação de serviço como estagiário na Secretaria Municipal

de Educação.

Logo no início da primeira entrevista, MS manifestou interesse em saber para

que serviria a pesquisa. Mostrou-se entusiasmado com os esclarecimentos do

pesquisador e prontificou-se a ajudar no que estivesse ao seu alcance, e o fez

enquanto pôde, tanto no fornecimento de informações quanto na disponibilização de

material.

Relatou, sobre a sua história acadêmica, que concluiu o Curso Normal na

Escola Filantrópica Divino Mestre, no Convento de Santo Antônio, onde estudou a

partir da 5.ª série do ensino fundamental, sem nunca ter repetido ano escolar.

Sujeito SA:

SA, aluna de 48 anos, é moradora do município de Lauro de Freitas. Os pais

têm o ensino fundamental I incompleto; só a mãe é viva. Foi professora de reforço

escolar em casa, durante seis anos, e embaladeira. Hoje, é estagiária pela

Secretaria Municipal de Educação de Salvador, na Escola Municipal Arx Tourinho,

situada no bairro de Nova Esperança, próxima à Ceasa. Leciona o 5.º ano do

ensino fundamental, cumprindo carga horária de 20 horas-aula semanais, no

Projeto Alfa e Beto, cuja clientela se constitui de alunos rejeitados por outras

escolas. Ensina Português e Matemática, já que não há tempo para lecionar as

87

outras matérias, pois os alunos demoram a entender os assuntos. Frequenta a

Igreja Casa da Bênção de Deus há 10 anos, o que transformou a sua vida, já que

trouxe, segundo ela, benefícios para a sua relação conjugal. É membro da Igreja

Casa da Bênção de Deus do bairro Vida Nova, em Lauro de Freitas. De terça-feira a

domingo, ocupa o papel de ouvinte e, às segundas-feiras, à noite, é líder daquele

grupo religioso, atuando como pregadora. No tempo livre, gosta de assistir a filmes

de romance para relaxar e, por isso, tem assinatura da Sky. Citou como seu filme

predileto “Escrito nas Estrelas”.

Em relação à sua história acadêmica, estudou em escola pública até fim do

ensino fundamental. Afirmou que tivera dificuldades na escola, na infância. Na 4.ª

série, tinha 14 anos, chegando à 8.ª série com 18 anos, ocasião em que

interrompeu os estudos para trabalhar na fábrica de biscoitos Tupi, perto de Simões

Filho. Aos 24 anos, entrou para o ensino médio em escola particular, paga pelo

marido.

Sujeito AM:

AM, aluna de 53 anos, é moradora do bairro de Pirajá, onde hoje reside

apenas com o esposo, que tem ensino médio e exerce a profissão de colorista (faz

composição e combinação de cores de tinta de parede), já que os dois filhos do

casal, um rapaz e uma moça, ambos com ensino médio completo, se casaram e

foram morar nas suas próprias casas. Frequenta uma comunidade espírita e

desenvolve trabalho social com pessoas carentes e cadeirantes de seu bairro e de

outros lugares, com a distribuição de mingau nas marquises com um grupo de

amigas. Os cadeirantes, a que se refere, são do bloco carnavalesco Me deixe à

vontade, cujo trabalho social desenvolvido é no sentido de ajudar a “enturmar”

aquelas pessoas e a dar água. Ajuda também no bloco Buscapé, pintando as

crianças, e distribui mantimentos que chegam à creche de seu bairro. Frequenta o

Centro Espírita Joana de Ângelo, no bairro da Liberdade. Declarou sentir-se

tranquila com o espiritismo, mas não se recusa a ir à Igreja Batista a convite de

colega. Disse que trabalhar em Educação é o seu dom. É professora do ensino

fundamental, nas séries iniciais, há mais de vinte anos, já tendo trabalhado na rede

88

privada com o público infantil e, atualmente, é estagiária do 1.º ao 4.º anos do ensino

fundamental em escola municipal. No tempo livre, gosta de escrever e de revisar os

assuntos da faculdade, além de ler os livros espíritas.

Quanto à sua histórica acadêmica, informou que sempre estudou em escolas

públicas até o Curso Normal, este concluído no Colégio Estadual Pinto de Carvalho.

Nunca repetiu o ano escolar, sempre teve amor pelos estudos e guarda boas

recordações. Mesmo antes de concluir o Curso Normal, com uns dez anos de idade,

já atuava na área ajudando as professoras. Tem a irmã como grande incentivadora,

que é pedagoga atuante. Acrescentou que optou pelo Curso de Pedagogia, porque

adora o magistério e quer aprender mais e progredir na carreira. Entrou tarde para a

faculdade, depois de os filhos cresceram e se casarem, e conta com o apoio do

marido.

89

5 ANÁLISE DOS DADOS

5.1 Atitude/Concepção Conservadora Sobre a Língua/Escrita

A partir da concepção de escrita como construção sociocultural e, tomando-se

como ponto de partida o contexto escolar e as práticas de escrita dentro de

determinadas funções sociais letradas desenvolvidas pelos sujeitos pesquisados,

algumas questões observadas durante a pesquisa são aqui interpretadas.

Sobre as atitudes dos sujeitos pesquisados, pode-se dizer que, muito embora

possam variar os usos ou as experiências de escrita, a visão

conservadora/formal/burocrática sobre a língua é compartilhada/reconhecida pelos

universitários – tanto na condição de alunos como de professores nas escolas onde

trabalham, mesmo oriundos de grupos populares nos quais o nível de escolaridade

de pessoas próximas e parentes não é alto. Para eles, saber português é conhecer

as suas regras e o domínio formal do texto.

DM diz que se considera boa em Português porque sabe regras gramaticais e

de pontuação, mas desistiu de ser professora nesta área e não quer ensinar a

matéria por causa delas. Diz, ainda, ter dificuldade na disciplina Metodologia,

referindo-se ao fato de ter de colocar “muita coisa” quando se trata de jornal ou

periódico. Citou como prática de escrita apenas os trabalhos e provas produzidos na

faculdade.

AM diz ter tido dificuldade com negrito/margem e divulga exercícios

gramaticais que ensina aos alunos, e não os textos criativos que diz usar com eles.

Reconhece que a escrita faz parte da vida, é necessária, porém, para justificar que

se considera boa redatora, apoia-se em critérios produzidos pelas instituições (no

caso – a escolar), quando citou a sua aprovação para ingressar no estágio como

professora da rede municipal, tendo sido ela um dos três candidatos selecionados

no grupo de quinze concorrentes.

Para TB, a dificuldade de leitura e escrita dos seus alunos relaciona-se ao

pouco domínio da escrita alfabética, e não à experiência destes na recepção e

produção de textos.

SA, embora seja a única a criticar a padronização do texto acadêmico e a

90

prática pedagógica repetitiva e limitada em língua portuguesa nas escolas, como

professora não adota como unidade de ensino o texto, e sim palavras/famílias

silábicas. E diz, ainda, que as filhas reclamam da sua letra nas histórias que

escreve, como sendo falha textual.

MS divulga como exemplo os exercícios gramaticais que passa para os

alunos ao tratar da questão de texto. Os textos selecionados por ele em um jornal

para utilizar com os alunos são para ensino de outras disciplinas, como Ciências,

não sendo considerado, também, como para formação do leitor/escritor.

Com exceção de SA, para todos os outros entrevistados saber escrever um

texto acadêmico é aprender as normas que regem a sua introdução, o

desenvolvimento e a conclusão. E sobre este assunto específico, SA reconhece que

nem mesmo procurando seguir as normas que aprende na escola, não consegue

produzir textos coerentes.

Os cartazes colocados por alunos/professores com textos escritos, desenhos

e imagens sobre um mesmo tema não são considerados como experiências de

leitura e escrita de seus alunos, pois não fazem parte das atividades de língua

portuguesa, e sim de eventos da escola. Textos para eles são exercícios avaliativos,

são deveres, o que revela uma visão conservadora. Do mesmo modo, os textos

pessoais não são considerados, nem os do domínio religioso, nem os que fazem

parte de eventos escolares, como os observados no interior das igrejas, na copa e

nos corredores das escolas – todos eles considerados como práticas culturais, o que

exclui a língua como fenômeno cultural.

Ainda sobre as experiências e atitudes em leitura e escrita do contexto

escolar, a exemplo da trajetória escolar como fator social pertinente (relacionada à

faixa etária), verificou-se que SA e AM tiveram uma escolaridade tardia e com

interrupção. Embora tenham uma concepção conservadora de língua/escrita, SA faz

críticas ao texto acadêmico, quando se refere à ausência de criatividade e ausência

do ensino de diversidade de gêneros e talvez por isso tenha dito gostar mais de

narrar “coisas inventadas”, de certa forma constitui uma manifestação de desacordo

em relação aos modelos empregados pela instituição escolar. Por sua vez, AM relata

o seu estranhamento da escrita acadêmica, e é o único sujeito que relata que

escreve textos não acadêmicos, optando pela produção de textos lúdicos e poéticos.

91

A influência do sistema escolar parece ser mais forte, portanto, nos sujeitos mais

jovens com escolaridade regular. No caso de MS, muito embora seja da mesma

faixa etária de AM e SA, passou por processo escolar regular.

Todas essas situações observadas no processo da pesquisa levam a concluir,

portanto, que a concepção e o aprendizado da escrita relacionam-se fortemente ao

domínio de formas prescritivas, de rituais da palavra e de grupos doutrinários, aos

deveres escolares, passando estas ao largo do que se entende por práticas culturais

letradas, nas quais se incluiriam os textos digitais compartilhados, os bilhetes de

todo dia, as orações, os convites etc., observados nas interações verbais dos

sujeitos pesquisados, nas quais a escrita não é vista como um processo complexo

que envolve inúmeras fases, idas e vindas, algumas vezes simultâneas.

5.2 Sobre as Práticas de Escrita, com Prática Social, Constitutivas e Constituídas de Práticas de Cunho Religioso

Levando-se em conta o fato de que a maioria dos sujeitos pesquisados tem

participação efetiva em atividades de cunho religioso, instituem-se leitores e

produtores de textos, tanto os impressos como os digitais. Assim sendo, são textos

que fazem parte do cotidiano destes sujeitos, e não são se destinam à leitura

individual e silenciosa, de acordo com as esferas da vida social em que ocorrem.

Embora sejam tradicionais, constroem e reelaboram os seus significados nas leituras

coletivas: os textos digitais a partir do contexto virtual, e os impressos em cultos

realizados em contextos socioculturais singulares. Há multimodalidade, quando se

mesclam oralidade/escrita/imagem nos cultos, na linguagem dramática, na dança,

no canto etc., que constituem esses textos, e tais estratégias constituem distintos

modos e formas em que a língua se materializa. A língua é, então, elemento de

interação entre sujeitos e realidade sócio-histórica.

5.3 A Questão dos Gêneros do Discurso

Sobre os textos de gêneros acadêmicos citados e exemplificados como fruto

de produção, pode-se observar que parte deles se apresenta como cópia ou

apropriação de textos acadêmicos lidos, nos formatos online ou impresso, mas se

constituem todos eles como modelos concretos de escrita. Essa reprodução se

confunde com autoria, visto que os textos se constroem, na visão bakhtiniana,

92

dialogicamente em relação a outro dentro de uma perspectiva de heterogeneidade

discursiva concreta, segundo a qual a língua é entendida como uma prática material

e sempre constituída na interação social, o que se evidencia nos usos e

experiências de escrita dos sujeitos pesquisados.

Tais unidades reais de comunicação verbal ou enunciados concretos e únicos,

situados temporalmente, elaborados no contexto específico de uma faculdade,

dizem respeito às pessoas envolvidas: os autores, outros alunos participantes e o

leitor presumido, no caso o professor representando a instituição escolar. E mesmo

assim, os gêneros prescritivos ou normativos variam de acordo com as

circunstâncias – no caso, a tarefa escolar, e a posição/relação social dos parceiros,

isto é, aluno e professor.

Os textos de gêneros acadêmicos apresentam formas padronizadas, às quais

os sujeitos submetem a sua intenção discursiva, que na verdade não é livremente

concebida por eles, e sim pela instituição escolar. Não são criativos em recursos

estilísticos e não permitem a expressão da individualidade do autor/aluno, o que

conduz à repetição dos discursos. Talvez resida daí o fato de os textos acadêmicos

citados serem em muitos casos reproduzidos, copiados. Isso se explica devido à

exterioridade dos textos, isto é, a relação dos sujeitos com a língua nas diversas

situações de poder em que eles produzem o discurso, o que gera a falta de

expressividade e singularidade no uso da palavra, que jamais representa, segundo

Bakhtin (2003), um gesto neutro.

Outra questão que deve ser apontada é que existe uma relação valorativa que

os presumidos autores (no caso - os sujeitos pesquisados) estabelecem entre o seu

enunciado – o texto acadêmico - e o objeto de discurso ou realidade concreta, em

função da futura avaliação formal do texto pelo professor. Portanto, o papel ou a

presunção do outro, no caso o professor, é essencial para a constituição do

enunciado, já que na chamada cadeia de comunicação verbal este se liga aos elos

que o sucedem a partir da expectativa de uma posterior reação-resposta de um

destinatário – o professor. Tal situação é evidenciada quando os sujeitos, ao citarem

os textos escolares, sempre demonstram preocupação com esta questão valorativa

em função de um leitor presumido (no caso – o professor).

93

5.4 Sobre os Textos Extraescolares

Quanto aos textos bíblicos, mesmo os textos da tradição cristã, como

versículos etc., são reapropriados pelos sujeitos leitores, já que é cada um deles

quem fala também, em sua intenção discursiva própria, ao compartilhá-los com o

outro concreto, presumido, para quem reafirma as suas crenças. Já as

particularidades de recursos linguísticos, como a apresentação formal do texto, são

decorrentes das características singulares destes gêneros do discurso não

escolares.

Sobre os multiletramentos, é interessante notar que o texto acadêmico,

enquanto gênero do discurso, mesmo produzido em suporte digital, pode ser

compartilhado e não confinado a um contexto específico (não territorialidade), ou de

“desterritorialização, de “descoleção e de hibridação”, a que se refere Canclini

(2008[1989], p. 308), e se constitui de outras linguagens, são reproduzidos,

copiados, assim como os textos impressos. Mesmo nestes casos, observa-se que os

textos produzidos continuam sendo textos como dever, que servem para avaliação

de um outro, que é a instituição escolar, que opera como controladora e

organizadora dos discursos dos sujeitos.

Outra questão diz respeito à leitura e produção de textos coletivos ou

compartilhados, que podem constituir contextos de interação discursiva tradicionais,

como o religioso, não sendo uma novidade do contexto virtual, como já dito. Só que,

quando são compartilhados pela Internet, neste compartilhamento, há a questão da

multiculturalidade, nos tais “usos democratizadores” (CANCLINI (2008[1989], p.

308), muito embora haja as escolhas, as “coleções”, o que vem de dentro para fora

culturalmente. A partir das produções textuais desses sujeitos, pode-se destacar a

ocorrência da circularidade nos textos, compartilhados em grupos virtuais, como os

de cunho religioso, ou de relações pessoais, como os de cartões de aniversário, e os

comentários que entram em circulação.

Com a análise dos usos e experiências de escrita, pode-se confirmar que eles

se dão num conjunto complexo de interações verbais e se inscrevem nas práticas

sociais dos sujeitos como elementos significativos para estes, dentro de

determinadas situações, a partir de recursos variados, nos quais entram em jogo

94

inúmeros fatores, como os sociais e linguísticos. No caso destes, pontuam-se as

próprias escolhas dos sujeitos quanto ao uso de um ou de outro gênero discursivo

nas produções impressas ou virtuais. E, mesmo que tais produções representem

singularidades dos sujeitos em situações concretas, elas obedecem, como já dito, a

certos padrões de formalidade, resultado das experiências letradas dos sujeitos e

com forte influência da escola. Afinal de contas, os gêneros discursivos operam

dentro de uma estabilidade social. Quanto aos fatores sociais, pode-se apontar a

própria diversidade dos contextos em que os sujeitos se inserem, a começar pelo

espaço da faculdade, que se amplia com os outros espaços, como os religiosos e de

lazer, favorecendo as interações.

Em todos os casos analisados, o que se confirma é que as práticas de escrita

dos sujeitos são orientadas no âmbito das necessidades comunicativas. E essas

necessidades acabam interferindo nas decisões sobre o uso pertinente de um ou de

outro texto gênero discursivo, devendo-se reconhecer que em qualquer um deles os

sujeitos se inscrevem como efetivos usuários da palavra e assumem posições sócio-

históricas imbricadas com as várias circunstâncias vivenciadas, já que tais posições

no plano discursivo jamais são neutras.

95

6 PALAVRAS FINAIS

Partindo-se dos resultados obtidos com a realização da pesquisa, foi possível

organizar as constatações em dois níveis: quanto aos usos concretos de escrita dos

sujeitos naqueles ambientes e quanto à real compreensão deles sobre tais usos e

possibilidades de comunicação, tomando-se por base as questões levantadas.

Nesse sentido, foi possível perceber que, muito embora os textos dos sujeitos

estejam relacionados a várias situações de comunicação, nos diferentes contextos

(tanto escolares quanto extraescolares), há de se reconhecer que as concepções ou

percepções de escrita desses sujeitos estão fortemente atreladas ao domínio

escolar, quando, mesmo atuando em diversos processos de interações verbais,

alegam pouca proficiência nas referidas produções. Essa atitude dos sujeitos

pesquisados evidencia claramente a concepção que trazem de que, para eles, o

processo de escrita se limite ao aspecto formal, à padronização. Logo, é possível

afirmar que a compreensão de escrita dos sujeitos pode ser explicada, mesmo nos

dias de hoje, por ainda existir a concepção de escrita como sinônima de realização

de tarefas previamente determinadas, como dever. Isso pôde ser evidenciado nas

situações observadas durante o estudo, quando três dos cinco sujeitos entrevistados

declararam-se redatores de textos pouco proficientes, por entenderem que uma boa

escrita estaria balizada por aspectos formais e gramaticais.

Foi possível evidenciar, também, quanto às práticas de escrita nos contextos

da faculdade e das escolas frequentadas pelos sujeitos, por meio das quais buscam

responder às demandas daqueles espaços enquanto estudantes universitários e

professores-estagiários, respectivamente, que muitas delas resumem-se a cópias de

outras escritas retiradas dos livros sugeridos pelos professores da faculdade, da

Internet e dos livros didáticos adotados como recurso nas aulas. Nem sempre,

portanto, as atividades de escrita apresentam-se de forma criativa e pessoal. Isso

mostra que a escola ainda não forma bons leitores nem redatores de textos

acadêmicos, já que são reprodutores/copiadores.

Ainda sobre os usos de escrita observados, identificaram-se algumas atitudes

distintas. Um grupo faz uso da Internet de maneira esporádica, principalmente para

a realização das atividades escolares, e outro grupo utiliza tal recurso para

finalidades diversas, tanto dentro das práticas acadêmicas quanto dentro de outras

96

práticas. Apenas um grupo dos sujeitos investigados interage através do Facebook,

para relacionar-se com os amigos virtuais e tratar de assuntos variados.

Dos cinco sujeitos investigados, dois afirmaram nunca acessarem as redes de

relacionamento, alegando falta de tempo ou não gostarem. E, quando da visita às

escolas para a coleta de dados, em nenhum momento, os sujeitos mencionaram

como usos e práticas de escrita os cartazes afixados naqueles locais com temas

alusivos à Copa do Mundo de 2014 e ao São João. Pode-se dizer que tais práticas

são por eles concebidas como atividades meramente culturais, das quais a língua

seria excluída.

O processo de investigação leva a concluir que será necessário um trabalho

de revisão de conceitos sobre a questão dos usos e das práticas de escrita por parte

sobretudo das instituições sociais, para que haja uma mudança significativa nas

atitudes das pessoas em relação aos eventos sociodiscursivos. Assim sendo, as

constatações são as seguintes: 1) quanto ao contexto escolar, que as práticas de

escrita nele desenvolvidas ainda se limitam a concepções conservadoras por

negligenciarem os diversos modelos criativos existentes na sociedade

contemporânea, gerados principalmente após o surgimento da escrita impressa e

impulsionados pelas novas tecnologias e linguagens no bojo do que passou a

chamar-se multiletramentos; 2) que nem mesmo os avanços observados nas

instituições de ensino, em especial, no ensino universitário, conseguiram formar

sujeitos mais experientes em relação às suas práticas sociais de escrita; 3) quanto

aos usos e às manifestações de escrita, que tais fenômenos se encontram dentro

das relações de poder dos diferentes grupos sociais.

A conclusão da pesquisa representa, na verdade, um recomeço, porque, ao

retomar o trabalho, já é possível enxergá-lo de uma forma diferente e, ao se pensar

sobre as próprias práticas de escrita inseridas nos diversos contextos sociais,

também se percebe que é preciso reconhecer tais fenômenos dentro de práticas

diferenciadas com o uso de novos recursos e caminhos diversos, impressos e

virtuais (fora de uma superfície física). Os caminhos começaram a ser abertos, mas

ainda é preciso ir muito além.

Como se pode ver, seja do ponto de vista das atitudes linguísticas, seja da

perspectiva dos pressupostos teóricos, as tendências mais fortes apontam para uma

97

discussão centrada nas novas exigências da sociedade. Desse modo, os sujeitos

investigados, com base nos dados levantados, fazem parte de um grupo social

letrado e vivenciam no seu cotidiano as experiências mais diversas de interação

verbal.

As características fundamentais da sociedade contemporânea que mais têm

impacto sobre a questão da escrita são, pois: maior complexidade, mais tecnologia,

compreensão das relações de espaço e tempo, adaptação a situações novas. Enfim,

um homem bem informado e mais autônomo, na medida em que o próprio conceito

de conhecimento e as formas de aquisição dele são hoje muito variados, de certo

modo democratizado (o conhecimento) pelos novos recursos comunicativos.

A sociedade atual criou diferentes linguagens para se comunicar: cinema, TV,

rádio, histórias em quadrinhos, revistas, jornais, computadores, entre outros. Todas

essas linguagens devem entrar na produção do conhecimento, e é preciso falar,

escrever, grafar, movimentar, pintar etc., para que os sujeitos se sintam mais

próximos e pertencentes a esta nova sociedade e às possibilidades por ela

oferecidas e se reconheçam nos usos de gêneros discursivos tidos como

emergentes, ou que possam apropriar-se deles, além dos acadêmicos e tradicionais.

Por fim, as questões aqui trazidas remetem a um ponto central: a

necessidade de serem superadas as já desgastadas concepções hierarquizantes e

universalizantes em relação à escrita, que dão nenhuma ou pouca importância aos

usos e às manifestações de escrita concretas. Essa lógica, ainda muito presente nas

instituições sociais – e a escola é grande exemplo delas - não mais corresponde aos

desafios que estão aí postos, que questionam as concepções de interação

discursiva tradicionais, permitindo aos sujeitos desenvolverem autonomia nas suas

escolhas e maior expressividade por meio de suas interações comunicativas como

fruto da realidade sócio-histórica.

98

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101

APÊNDICES

102

APÊNDICE A – ROTEIRO DE PERGUNTAS DA PRIMEIRA ETAPA (Comum a

todos os sujeitos entrevistados)

- Data da entrevista; - Local; - Tipo de entrevista; - Hora de início e de término da entrevista; - Duração da entrevista.

Aluno

1 - Nome; idade.

2 - Bairro onde mora: há quanto tempo reside com a família.

3 - Estrutura familiar (número de pessoas da família – na mesma residência;

profissão e escolaridade dos parentes próximos).

4 - Já estudou em quais escolas antes? Particulares ou públicas? Em que séries?

5 - Já interrompeu os estudos alguma vez? Por quê?

6 - Já repetiu alguma série?

7 - Você tem dificuldade em alguma matéria na universidade? Por quê?

8 - Experiência profissional? Estuda e trabalha, no momento?

9 - Atividades que gosta de desenvolver no tempo livre (=lazer) no espaço familiar /

comunitário e em outros locais.

10 - Atividades religiosas que fazem parte de sua rotina, e quais.

11 - Função social/comunitária que possivelmente exerce no bairro em que mora e

adjacências. O que faz nesta função?

12 - O que, no seu cotidiano, costuma ler e escrever: quando, onde e por quê?

13 - Participa de redes sociais? Quais? Twitter, Blogs, e/ou etc.?

14 - Na faculdade, você lê / escreve para essa disciplina? Que textos? Há textos só

produzidos individualmente, ou há os que são feitos também em conjunto? Usam

que suportes/ferramentas da internet para ler e produzir textos acadêmicos? Ou não

usam?

15 - Você tem dificuldades nesta disciplina, ou em outra? Por quê? Em caso positivo,

tem relação com o que lê e/ou escreve para cumprir o conteúdo obrigatório?

16 - O que você tem escrito ultimamente?

103

APÊNDICE B - ROTEIROS DE PERGUNTAS DA SEGUNDA ETAPA (Específicos por ordem de entrevistados, gerados com base nas respostas da primeira entrevista) Entrevistado 1 (MS) - Data da 2.ª entrevista/observação: 05/06/2014 - Local: Escola Municipal Epaminondas Berbert de Castro - Endereço: Av. Hilda – Pernambués. - Tipo de entrevista/observação: Presencial/Direta - Hora de início e de término da entrevista/observação: Das 16 às 16h50min - Duração da entrevista/observação: 50min22s

Pesquisador - M, com base nas informações que você me deu na entrevista

anterior, na Faculdade, gostaria de retomar e complementar, agora, algumas

perguntas e fazer outras aqui na escola, onde você desenvolve estágio como

professor de crianças. São elas:

1 - Você escreve para outras disciplinas, além da disciplina Novos Paradigmas da

Educação?

2 - Quais os conteúdos e atividades da disciplina Leitura e Produção de Textos? Tem

dificuldades aqui ou não? Produziu ou leu textos nesta disciplina? Quais? Tem algum

deles, para disponibilizar?

3 - Considera-se bom redator, ou acha que tem dificuldades com a produção de

textos? E com a leitura acadêmica?

4 - Lê jornais, revistas? Mesmo na internet? Quais? Escreve textos pessoais?

Quais? Eles estão disponíveis?

5 - Você utiliza a internet? Para quê? Quando? Em que sites/redes

sociais/aplicativos? Tem o Facebook?

6 - Qual é a profissão e escolaridade dos seus pais?

7 - Você informou em entrevista gostar de ler as matérias da Folha Universal. Pode

disponibilizar algum exemplar?

8 - Você disse que lia jornal. Que tipo de jornal? Da Universal?

9 - Você informou que, ultimamente, estava escrevendo só trabalhos da Faculdade,

também digitando e escrevendo em folha de papel pautado para entregar aos

professores. Pode disponibilizar?

104

Entrevistado 2 (DM)

- Data da 2.ª entrevista/observação: 06/06/2014 - Local: Sala 12 da Faculdade UNIRB - Tipo de entrevista/observação: Presencial - Hora de início e de término da entrevista/observação: Das 10h22min às 10h50min - Duração da entrevista/observação: 28min50s

Pesquisador – D, com base nas informações que você me deu na entrevista

anterior, lá na Faculdade, gostaria de retomar e complementar, agora, algumas

perguntas e fazer outras. Vamos a elas:

1 - Você escreve para outras disciplinas, além da disciplina Novos Paradigmas da

Educação?

2 - Quais os conteúdos e atividades da disciplina Leitura e Produção de Textos? Tem

dificuldades aqui ou não? Produziu ou leu textos nesta disciplina? Quais? Tem algum

deles, para disponibilizar?

3 - Considera-se boa redatora, ou acha que tem dificuldades com a produção de

textos? E com a leitura acadêmica?

4 - Lê jornais, revistas? Mesmo na internet? Quais? Escreve textos pessoais?

Quais? Eles estão disponíveis?

5 - Qual é a escolaridade e profissão do seu marido?

6 - Você informou em entrevista ter escrito provas e trabalhos. Pode disponibilizar

alguns textos?

105

Entrevistado 3 (SA) - Data da 2.ª entrevista/observação: 06/06/2014 - Local: Escola Municipal Arx Tourinho - Endereço: Bairro de Nova Esperança (CEASA – Salvador) - Tipo de entrevista/observação: Presencial/Direta - Hora de início e de término da entrevista/observação: Das 14h20min às 15h30 - Duração da entrevista/observação: 50min57s

Pesquisador – S, com base nas informações que você me deu na entrevista

anterior, lá na Faculdade, gostaria de retomar e complementar, agora, algumas

perguntas e fazer outras aqui na escola, onde você desenvolve estágio como

professora de crianças. São elas:

1 - Você escreve para outras disciplinas, além da disciplina Novos Paradigmas da

Educação?

2 - Quais os conteúdos e atividades da disciplina Leitura e Produção de Textos? Tem

dificuldades aqui ou não? Produziu ou leu textos nesta disciplina? Quais? Tem algum

deles, para disponibilizar?

3 - Considera-se boa redatora, ou acha que tem dificuldades com a produção de

textos? E com a leitura acadêmica?

4 - E aí como está a sua leitura acadêmica?

5 - Lê jornais, revistas? Mesmo na internet? Quais? Escreve textos pessoais?

Quais? Eles estão disponíveis?

6 - Por que não lê muito?

7 - Nem na internet?

8 - Tem escrito textos pessoais?

9 - Nem pra suas filhas, pra criar, inventar?

10 - Seus pais são vivos?

11 - Qual é a profissão dela e o nível de escolaridade?

12 - Você informou em entrevista já ter interrompido os estudos em algum momento

da sua vida e com 18 anos ainda estava na 8.ª série. E entrou no 2.º grau atual

ensino médio com quantos anos?

13 - Você informou ter tido dificuldade na disciplina Interdisciplinaridade. Teve

dificuldade com a leitura/resenha de algum texto? Qual(is)? Pode disponibilizar

algum?

14 - Você informou liderar grupo na igreja que frequenta. Daí pergunto: O que faz o

líder? Como são as celebrações? Há obrigações que envolvam leitura e escrita? Em

casa e na igreja? Como ocorrem? Lê textos bíblicos em casa? É possível

disponibilizar esse material produzido?

106

15 - Faz leituras bíblicas em casa?

16 - Escreve alguma coisa em casa sobre sua igreja?

17 - Você informou produzir narrações de coisas inventadas e ler para crianças e

suas filhas. Pode disponibilizar algum texto?

18 - Quando foi essa mudança?

19 - Ah, então quando eu a entrevistei, em outubro, você já não tinha mais esses

textos?

20 - São quantas filhas?

21 - Você informou não interagir com redes sociais e usar pouco o e-mail e apenas

usar o computador para estudar. Para quê? Para ler? Copiar textos? Produzir

textos?

107

Entrevistado 4 (TB) - Data da 2.ª entrevista/observação: 10/06/2014 - Local: Escola Municipal Professora Maria de Lourdes Santana Alves - Endereço: Capelinha de São Caetano - Tipo de entrevista/observação: Presencial/Direta - Hora de início e de término da entrevista/observação: Das 9h10min às 10h - Duração da entrevista/observação: 50min54s

Pesquisador – T, com base nas informações que você me deu na entrevista

anterior, na faculdade, gostaria de retomar e complementar, agora, algumas

perguntas e fazer outras aqui na escola, onde você desenvolve estágio como

professora de crianças. São elas:

1 – Há quanto tempo você está nesse estágio?

2 – Os estagiários costumam mudar de escola quando termina o período ou não?

3 – Que atividades de escrita você está desenvolvendo com os seus estudantes?

Quais são essas atividades?

4 - Você escreve para outras disciplinas, além da disciplina Novos Paradigmas da

Educação?

6 – Fale dessas escritas das outras disciplinas.

6 - Quais os conteúdos e atividades da disciplina Leitura e Produção de Textos? Tem

dificuldades aqui ou não? Produziu ou leu textos nesta disciplina? Quais? Tem algum

deles para disponibilizar?

7 - Considera-se boa redatora, ou acha que tem dificuldades com a produção de

textos? E com a leitura acadêmica?

8 – Lê jornais, revistas? Mesmo na internet? Quais? Escreve textos pessoais?

Quais? Eles estão disponíveis? São várias perguntas. A primeira delas: Lê jornais e

revistas?

9 – Mesmo na internet?

10 - Escreve textos pessoais?

11 – Tem algum ou alguns textos que você não tenha disponibilizado no face a que

eu possa ter acesso?

12 – Diário, por exemplo?

13 – Qual é a escolaridade e a profissão de seus pais e de sua irmã?

14 – Sua mãe é viva?

15 – O que é que ela faz?

16 – E a sua irmã, ela faz o que da vida?

17 – Na entrevista anterior, você informou que, devido às dificuldades de leitura e

escrita dos alunos, a escola adotou algumas atividades. Que atividades são essas?

108

E na sua opinião, por que os alunos não aprendem a ler nem a escrever?

18 – Por que vocês não consideraram interessante o livro didático?

19 – na mesma entrevista, você informou que lia livros de Augusto Cury. Você

saberia informar o título desses livros ou texto? Você dispõe deles?

20– Você informou não entender, inicialmente, os conceitos dos novos paradigmas

da educação. Então, pergunto o que você não entendia, o conteúdo ou teve

dificuldade de leitura? Achou o texto difícil? Tem algum texto sobre este conceito?

Entendeu a pergunta?

21 – Foram vários teóricos que a professora apresentou?

22 - Não lembra o nome?

23 – Você me informou em entrevista ter sido professora da escola bíblica dominical

da Igreja Batista Restauração. Eu gostaria de saber se você frequentou ou frequenta

cultos? Lê/lia textos bíblicos em casa ou nos cultos? Que textos? Estão disponíveis?

Além disso, que atividades havia nessa escola? Em que contextos? Como eram

desenvolvidas? Tem os textos das aulas?

24 – Você me informou que usava muito o google acadêmico. Lê e copia textos?

Elabora textos? Só ou com os colegas? Qual o processo?

109

Entrevistado 5 (AM) - Data da 2.ª entrevista/observação: 11/06/2014 - Local: Escola Municipal de Nova Sussuarana - Tipo de entrevista/observação: Presencial/Direta - Hora de início e de término da entrevista/observação: Das 14h54min às 15h36min - Duração da entrevista/observação: 40min39s

Pesquisador - A, com base nas informações que você me deu na entrevista

anterior, na Faculdade, gostaria de retomar e complementar, agora, algumas

perguntas e fazer outras aqui na escola, onde você desenvolve estágio como

professora de crianças. Vamos a elas: 1- Você escreve para outras disciplinas, além da disciplina Novos Paradigmas da

Educação?

2 - Esses textos lúdicos e poéticos são pessoais ou têm finalidade acadêmica?

3 - Quais os conteúdos e atividades da disciplina Leitura e Produção de Textos? Tem

dificuldades aqui ou não? Produziu ou leu textos nesta disciplina? Quais? Tem algum

deles, para disponibilizar?

4 - Teve dificuldade nessa disciplina? Que tipo de dificuldade?

5 - Quais foram os textos lidos nessa disciplina?

6 - Considera-se boa redatora, ou acha que tem dificuldades com a produção de

textos? E com a leitura acadêmica?

7 - Lê jornais, revistas? Mesmo na internet? Quais? Escreve textos pessoais?

Quais? Eles estão disponíveis?

8 - Então você tem assinatura de jornal. Que tipo de jornal?

9 - Por que a escolha dessas três fontes de informação?

10 - Qual é a profissão e a escolaridade de seu marido e de seus filhos?

11 - O que faz um colorista?

12 - Qual é a diferença entre um colorista e um pintor?

13 - E seus filhos, fazem o que da vida?

14 - Na entrevista anterior, você informou já ter parado de trabalhar para estudar.

Então, pergunto Quando? Antes ou depois do Normal? E quando entrou para a

faculdade, estava sem estudar há quanto tempo?

15 - Antes ou depois do Normal, do Curso do Magistério?

110

16 - E quando entrou para a Faculdade estava sem estudar há quanto tempo?

17 - Você informou que no primeiro semestre não tinha o livro de Thomas Kuhn e

que, por isso, ficou um pouco perdida e não gostava de Metodologia Científica. Daí,

pergunto: Perdida por dificuldade com a leitura do texto? Com alguma resenha? Ou

especificamente com algum conceito? Qual é o título do livro?

18 - Teve dificuldade com alguma resenha ou a professora não adotou?

19 - Teve dificuldade com algum conceito em Metodologia?

20 - Não lembra nenhum nome de título de livro? 21 - Nem mesmo de Thomas Kuhn?

22 - Escreveu sobre ele? Produziu algum texto? Que tipo de texto?

23 - Você informou gostar muito de escrever. Então, pergunto: O que você gosta de

escrever?

24 - Você declarou que, quando começava a ler um livro espírita, sentia uma

tranquilidade. Essa leitura espírita é feita individualmente? No centro e/ou em casa?

Ou é atividade em grupo? Como se processa essa ação de ler? Que textos são

lidos? Pode disponibilizar algum?

25 - Dessa leitura espírita, que textos são lidos no âmbito do espiritismo?

26 - Você informou usar o Google e gostar de fazer anotações. Que anotações são

essas e de que maneira elas se processam?

27 - Em entrevista, você informou que, quando a professora dava os assuntos, você

costumava pegar o que ela escreveu ali e ir buscando, procurando. Buscando e

procurando onde? No quadro? No livro? Esclareça melhor esse processo.

28 - Você disse que tinha escrito muitas coisas. O quê, por exemplo? Que tipos de

texto? Pode disponibilizar algum(uns) deles?

29 - Os livros nos quais você busca algo são de onde? Da biblioteca? Você lê?

Anota?