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IAHR AIPH XXI CONGRESO LATINOAMERICANO DE HIDRÁULICA SÃO PEDRO, ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL, OCTUBRE 2004 DELINEAMENTO AUTOMÁTICO DA REDE DE DRENAGEM EM BACIAS HIDROGRÁFICAS COM ÊNFASE EM TRECHOS DE ZERO ORDEM Roberto Valmir da Silva Bolsista CAPES, Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós-graduação em Eng. Ambiental Caixa Postal 476, Florianópolis – SC, Brasil. CEP 88040-900, [email protected] Masato Kobiyama Bolsista CNPq, Universidade Federal de Santa Catarina, Dep. de Engenharia Sanitária e Ambiental Caixa Postal 476, Florianópolis – SC, Brasil. CEP 88040-900, [email protected] RESUMO: Um modelo matemático denominado WADI foi desenvolvido com o objetivo de delinear automaticamente a rede de drenagem de uma bacia hidrográfica com base em sua topografia. O modelo possui cinco rotinas principais que realizam tarefas de importação de dados, triangulação, correção de triangulação, correção de áreas planas e delineamento da rede de drenagem. O modelo foi aplicado em quatro subbacias localizadas no município de Florianópolis, Santa Catarina, sul do Brasil. As redes de drenagem delineadas automaticamente foram comparadas com as digitalizadas. Discordâncias nas nascentes foram atribuídas a trechos de zero ordem. A delineação da rede de drenagem é sensível à falta de dados e/ou erros na digitalização da topografia. Para investigar as características da bacia de zero ordem, cinco parâmetros foram relacionando área, comprimento e declividade foram analisados. Os resultados desta análise mostraram evidências que o modelo WADI pode delinear os trechos de zero ordem. ABSTRACT: A mathematical model WADI (Watershed Investigation) was development to automatically delineate the drainage network only with its topography data. The model has five main procedures that execute: data importation, triangulation, its correction, flat regions correction and the drainage network delineation. The model was applied to four basins located in Florianópolis city, Santa Catarina state, southern part of Brazil. The automatically delineated drainage networks were compared with drainage networks derived from the digitalized maps. The biggest difference in the comparison was associated with the zero order segments. The drainage network delineation is very sensible to data lack and/or topography digitalization errors. To investigate the zero order basin characteristics, five parameters related to its area, length and slope were analyzed. The results of this analysis showed evidences that the WADI could delineate the locality of the zero order segments. PALAVRAS-CHAVE: Rede de drenagem, TIN, ordem-zero. Hidrología Superficial y SubterráneaMonferrer

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Page 1: DELINEAMENTO AUTOMÁTICO DA REDE DE DRENAGEM EM … · A rede de drenagem de uma bacia hidrográfica constitui uma variável fundamental no entendimento, simulação e previsão de

IAHR AIPH XXI CONGRESO LATINOAMERICANO DE HIDRÁULICA

SÃO PEDRO, ESTADO DE SÃO PAULO, BRASIL, OCTUBRE 2004

DELINEAMENTO AUTOMÁTICO DA REDE DE DRENAGEM EM BACIAS HIDROGRÁFICAS COM ÊNFASE EM TRECHOS DE ZERO ORDEM

Roberto Valmir da Silva Bolsista CAPES, Universidade Federal de Santa Catarina, Programa de Pós-graduação em Eng. Ambiental

Caixa Postal 476, Florianópolis – SC, Brasil. CEP 88040-900, [email protected]

Masato Kobiyama Bolsista CNPq, Universidade Federal de Santa Catarina, Dep. de Engenharia Sanitária e Ambiental

Caixa Postal 476, Florianópolis – SC, Brasil. CEP 88040-900, [email protected]

RESUMO: Um modelo matemático denominado WADI foi desenvolvido com o objetivo de delinear automaticamente a rede de drenagem de uma bacia hidrográfica com base em sua topografia. O modelo possui cinco rotinas principais que realizam tarefas de importação de dados, triangulação, correção de triangulação, correção de áreas planas e delineamento da rede de drenagem. O modelo foi aplicado em quatro subbacias localizadas no município de Florianópolis, Santa Catarina, sul do Brasil. As redes de drenagem delineadas automaticamente foram comparadas com as digitalizadas. Discordâncias nas nascentes foram atribuídas a trechos de zero ordem. A delineação da rede de drenagem é sensível à falta de dados e/ou erros na digitalização da topografia. Para investigar as características da bacia de zero ordem, cinco parâmetros foram relacionando área, comprimento e declividade foram analisados. Os resultados desta análise mostraram evidências que o modelo WADI pode delinear os trechos de zero ordem. ABSTRACT: A mathematical model WADI (Watershed Investigation) was development to automatically delineate the drainage network only with its topography data. The model has five main procedures that execute: data importation, triangulation, its correction, flat regions correction and the drainage network delineation. The model was applied to four basins located in Florianópolis city, Santa Catarina state, southern part of Brazil. The automatically delineated drainage networks were compared with drainage networks derived from the digitalized maps. The biggest difference in the comparison was associated with the zero order segments. The drainage network delineation is very sensible to data lack and/or topography digitalization errors. To investigate the zero order basin characteristics, five parameters related to its area, length and slope were analyzed. The results of this analysis showed evidences that the WADI could delineate the locality of the zero order segments. PALAVRAS-CHAVE: Rede de drenagem, TIN, ordem-zero.

Hidrología Superficial y SubterráneaMonferrer

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1. INTRODUÇÃO A rede de drenagem de uma bacia hidrográfica constitui uma variável fundamental no entendimento, simulação e previsão de processos hidrológicos, além de sua interação com a morfologia local. O adequado mapeamento da rede de drenagem na bacia também possui sua importância na conservação dos recursos hídricos, destacando a conservação das nascentes e o próprio corpo do rio através das matas ciliares. Um estudo sobre matas-ciliares (Zonas Ripárias) pode ser visto em SEMINÁRIO DE HIDROLOGIA FLORESTAL (2003). A formação da rede de drenagem em uma bacia hidrográfica é influenciada por fatores como: Relevo, tipo de solo, cobertura vegetal, profundidade da camada de solo. Neste estudo, analisamos o fator relevo na morfologia da rede drenagem e sua inicialização (nascentes). O relevo pode ser representado digitalmente (DEM – Digital Elevation Model) de duas formas, (1) através de um grid regular de pontos e (2) através de um grid irregular de pontos aleatoriamente distribuídos (TIN – Triangular Irregular Network). Segundo PALACIOS-VÉLEZ e CUEVAS-RENAUD (1986) como também JONES, WRIGHT e MAIDMENT (1990), os grids baseados em TIN representam de maneira mais acurada a topografia. A TIN não necessita de interpolação dos dados originais. Além disso, as faces dos triângulos se adaptam a qualquer mudança abrupta da topografia. Podemos argumentar também que três pontos definem um plano, desta forma diminuindo a arbitrariedade quando comparados a quatro pontos. TACHIKAWA, TAKASAO e SHIIBA (1996) argumentam que grids regulares não são apropriados para modelar fenômenos hidrológicos dinâmicos, pois não podem representar várias formas de encostas tais como convergência, divergência, convexos e côncavos. Nos últimos anos, os modelos baseados em grids regulares ganharam espaço devido ao crescente desenvolvimento dos pacotes de software GIS – Geographic Information System. Os grids regulares são derivados das imagens de satélite em formato raster (grids regulares com informações de cor, altura etc). Ainda assim, alguns GIS utilizam TINs para delineação de sub-bacias ou visualização em três dimensões da superfície. O delineamento automático da rede de drenagem utilizando TINs foi introduzido por PALACIOS-VÉLEZ e CUEVAS-RENAUD (1986) e JONES, WRIGHT e MAIDMENT (1990). O delineamento utilizando DEMs regulares também é realizado utilizando metodologias de QUINN et al. (1991) e TARBOTON (1997). Na interpretação da rede de drenagem de uma bacia e sua conseqüente análise e ordenamento a escala tem uma importante influência. Com o aumento da escala, mais tributários aparecem e os trechos de primeira ordem aumentam em número, alterando a ordem da bacia. A influência da escala no ordenamento de redes de drenagem foi estudada por SHEIDEGGER (1966) e YANG e STALL (1971). O efeito da escala e a resolução dos dados na previsão de fenômenos hidrológicos foi relacionada por WOLOCK e PRICE (1998). A rede de drenagem não é estática, ela dinamicamente se altera. Podemos perceber isto quando olhamos para as nascentes. Estas regiões são morfologicamente dinâmicas. HEWLETT e NUTTER (1970) descreveram a expansão da rede hidrográfica e das áreas saturadas durante um evento de chuva. Esta área variável se expande ou encolhe dependendo das condições de umidade iniciais do solo. Desta forma, quando o escoamento subsuperficial excede a condutividade hidráulica do solo, este escoamento aflora e soma-se ao escoamento superficial por saturação do solo aumentando o comprimento do rio em sua nascente. Este novo trecho adicionado ao comprimento do rio é denominado ordem zero que foi proposto por TSUKAMOTO (1973). TSUKAMOTO e MINEMATSU (1987), DIETRICH, RENEAU e WILSON(1987) e MONTGOMERY e DIETRICH (1992) apresentaram estudos referentes aos canais de ordem zero. Bacias de ordem zero são regiões de freqüentes descargas de sedimentos e são caracterizadas por solos de baixa profundidade, baixa profundidade do lençol freático para gerar escoamento superficial por saturação do solo e baixa declividade (TSUKAMOTO e MINEMATSU, 1987). O presente trabalho teve como objetivo desenvolver um modelo matemático capaz de delinear automaticamente a rede de drenagem de bacia hidrográfica e avaliar se os canais de ordem zero também seriam representados. 2. DESENVOLVIMENTO DO MODELO PARA DELINEAMENTO DA REDE DE DRENAGEM Um modelo matemático denominado WADI (WAtersheD Investigation) foi desenvolvido para delinear automaticamente a rede de drenagem a partir de uma superfície topográfica.

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O modelo foi implementado em cinco rotinas: (1) Algoritmo de importação de pontos e curvas de nível de arquivo DXF (Drawing Interchange Format), (2) algoritmo de triangulação, (3) algoritmo de adequação da triangulação às curvas de nível, (4) algoritmo de correção de regiões planas e (5) algoritmo de extração da rede de drenagem. 2.1 Algoritmo de importação de pontos e curvas de nível de arquivo DXF Este algoritmo extrai de um arquivo em formato DXF, contendo as curvas de nível de uma região, os pontos (x, y, z) e grava-os em um arquivo temporário. As curvas de nível também são armazenadas em um arquivo temporário. A Figura 1 mostra um exemplo de curvas de nível e malha de pontos importados.

Figura 1. Importação do arquivo DXF. (a) Pontos (x, y, z) importados. (b)Curvas de nível importadas.

2.2 Algoritmo de triangulação Para discretização da superfície topográfica, isto é, a geração do modelo digital do terreno (DTM), foi necessária a implementação de um algoritmo de triangulação. Existem vários algoritmos de triangulação baseados ou não no critério de Delaunay. O algorítmo implementado foi uma adaptação do algoritmo apresentado por CHONG-WEI e TIAN-YUAN (1998), chamado SLOAN97 que é um melhoramento do algoritmo apresentado originalmente por SLOAN (1987). Este algoritmo realiza uma triangulação não limitada, no qual o único fator que influencia na triangulação é a distância entre os pontos. A Figura 2 mostra a triangulação realizada sobre os pontos importados e o modelo digital do terreno (MDT).

Figura 2. Triangulação dos pontos. (a) Malha gerada. (b) DTM.

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2.3 Algoritmo de adequação da triangulação às curvas de nível As curvas de nível ligam pontos com mesma altura ou cota. Como o DTM é derivado destas linhas, as arestas dos triângulos formados não podem atravessar as linhas das curvas de nível, quando isto ocorre, ocasiona em uma representação inválida da superfície. A Figura 3(a) mostra um exemplo deste tipo de erro. O algoritmo de correção implementado executa os procedimentos: (1) Verifica quais arestas dos triângulos da triangulação pertencem ou não às curvas de nível; (2) das arestas que não pertencem, verifica quais ligam pontos com diferença de cota superior à distância entre as curvas de nível; e (3) caso a distância seja maior o algoritmo executa uma função chamada swap (Figura 4(a)). Esta função troca a aresta comum a dois triângulos. Além destes procedimentos o algoritmo verifica quais linhas das curvas de nível não coincidem com arestas. Destas linhas, verifica quais arestas de triângulos as interceptam. Caso haja intersecção executa a função swat. A Figura 3(b) mostra a correção das arestas.

Figura 3. Adequação da triangulação. (a) Arestas que cruzam as curvas de nível. (b) Arestas corrigidas.

2.4 Algoritmo de correção de regiões planas O algoritmo realiza os seguintes procedimentos: (1) Identifica as regiões planas (conjunto de triângulos planos consecutivos) e as armazena em uma lista; e (2) para cada triângulo plano a rotina procura um triângulo consecutivo não plano. Caso o encontre, executa a função swat entre estes dois triângulos. Quando o somatório dos ângulos formados pelas arestas dos dois triângulos soma menos do que 360º a rotina executa a função swat_inset_point. O ponto inserido tem sua cota determinada pela interpolação dos pontos vizinhos (distância inversa). O procedimento desta função é ilustrado na Figura 4(b). Este algoritmo, assim como as duas funções de troca de arestas, é baseado na metodologia apresentada por WARE (1998). Uma metodologia semelhante foi empregada por GUERCIO e SOCCODATO (1996). A Figura 5(a) mostra regiões planas em uma triangulação e 5(b) a correção destas regiões.

Figura 4. Funções de correção da triangulação. (a) Função swat. (b) Função swat_inset_point.

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Figura 5. Correção de regiões planas. (a) Identificação de regiões planas. (b) Correção das regiões planas

(inserção de um novo ponto p1).

2.5 Algoritmo de delineamento da rede de drenagem O algoritmo de delineamento da rede de drenagem baseia-se na metodologia apresentada por PALACIOS-VÉLEZ e CUEVAS-RENAUD (1986) e JONES, WRIGHT e MAIDMENT (1990). Esta metodologia encontra um vetor que representa a máxima inclinação de um plano. Dada a equação do plano

0=+⋅+⋅+⋅ DzCyBxA (1) extraímos o vetor normal

kCjBiAn ⋅+⋅+⋅= (2) e por produto misto achamos o vetor que possui a máxima declividade do plano:

kC

BAjBiAv ⋅

+−⋅⋅+⋅=

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(3)

Para cada triângulo da malha é calculado o vetor de máxima declividade. Desta forma, saindo de cada centróide de triângulo temos linhas que representam a direção do escoamento superficial. As linhas de fluxo sobre arestas são consideradas canais e as sobre faces dos triângulos são consideradas escoamentos em superfície. A Figura 6(a) mostra a extração da rede de drenagem de uma superfície topográfica em duas dimensões e 6(b) em três dimensões.

Figura 6. Rede de drenagem extraída de uma superfície topográfica. (a) Duas dimensões. (b) Três dimensões.

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Para identificação dos rios da bacia, a rotina seleciona os escoamentos que passam através de arestas de triângulos, considerando tais escoamentos como rios. Em um passo seguinte a rotina une os canais contínuos identificando os rios da bacia.

Figura 7. Identificação dos rios.

3. APLICAÇÃO DO MODELO O modelo foi aplicado em quatro subbacias hidrográficas localizadas no município de Florianópolis, estado de Santa Catarina, região sul do Brasil. A subbacia do Itacorubi com 1,15 km2 e de ordem 3, a subbacia do Córrego Grande com 2,58 km2 e ordem 4, a subbacia do morro do Pinheiro com 1,35 km2 e ordem 2 e a subbacia do morro do Badejo com 1,35 km2 e ordem 2 (Figura 8).

Figura 8. Localização das subbacias.

As subbacias foram extraídas digitalmente de uma base cartográfica em escala de 1:10.000 elaborada pelo Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (IPUF). Para as quatro subbacias foram aplicadas as rotinas do modelo e a rede de drenagem delineada automaticamente foi gerada mostrando os escoamentos em superfícies e em canais. A Figura 9 mostra este delineamento.

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(a) (b) (c) (d) Figura 9. Delineamento da rede de drenagem. (a) Subbacia Itacorubi. (b) Córrego Grande. (c) Morro do Badejo.

(d) Morro dos Pinheiros. 4. RESULTADOS E DISCUSSÕES A partir da rede de drenagem delineada automaticamente, foram extraídos todos os rios das subbacias. Estes foram comparados com os rios digitalizados a partir da base cartográfica. As Figuras 10 e 11 apresentam a comparação.

Figura 10. Comparação entre as redes de drenagem delineada automaticamente e digitalizada. (a) Subbacia do

Itacorubi. (b) Córrego Grande.

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Figura 11. Comparação entre as redes de drenagem delineada automaticamente e digitalizada. (a) Subbacia do

Morro do Badejo. (b) Morro do Pinheiro.

Como podemos visualizar, o modelo delineou de forma satisfatória a rede de drenagem nas quatro bacias. Foram observadas algumas discordâncias quanto ao traçado, principalmente na subbacia do Morro do Badejo. Discordâncias quanto à localização das nascentes também foram observadas em todas as subbacias.

A delineação automática da rede de drenagem é extremamente sensível à topografia. Portanto, falhas na digitalização das curvas de nível ou mesmo as ausências de dados – regiões planas onde o modelo executa interpolações – provocam discordâncias entre as redes delineadas e digitalizadas. Outra razão, segundo BEVEN (2001), seria que o escoamento somente é predominantemente regido pela topografia em solos de baixa profundidade sobre a camada impermeável,

Os locais onde aconteceram as maiores discordâncias foram as nascentes dos rios. Como hipótese, nosso estudo definiu estes comprimentos de rio excedentes na direção de montante como canais de ordem zero. Para cada nascente, onde ocorreu discordância, totalizando 38 nascentes, foram extraídos os seguintes parâmetros: D1 – declividade da nascente de primeira ordem, D0 – declividade do trecho de zero ordem, L0 – comprimento do trecho de zero ordem, LA – comprimento da bacia de zero ordem e A0 – área da bacia de zero ordem. A Figura 12 ilustra estes parâmetros.

Figura 12. Parâmetros retirados das nascentes.

Foi aplicada uma análise estatística multivariada por componentes principais para investigação do relacionamento entre os parâmetros. A Figura 13 mostra a projeção dos parâmetros nos planos fatoriais.

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(a) (b)

Figura 13. Projeção dos parâmetros nos planos fatoriais. (a) Planos 1 e 2. (b) Planos 1 e 3.

Analisando as projeções podemos perceber uma correlação entre D0 e D1. Esta correlação deve-se ao fato dos trechos serem contínuos. Podemos perceber também uma correlação entre LA e A0. Esta correlação também foi verificada por MONTGOMERY e DIETRICH (1992). Verificamos também a correlação negativa entre L0 e D0, bem notada nos planos fatoriais 1 e 2 e ligeiramente notada nos planos 1 e 3. Quanto maior a declividade do trecho de zero ordem menor é o seu comprimento. A Figura 14 mostra a relação entre os parâmetros.

Figura 14. Relação entre declividade e comprimento do trecho de ordem zero.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho mostrou evidências que a delineação automática realizada pelo modelo WADI,

consegue mapear os trechos denominados zero ordem. Esta potencialidade do modelo é útil para a conservação dos recursos hídricos, pois bacias de ordem zero constituem regiões potenciais na produção de sedimentos.

Pesquisas futuras devem ser voltadas para o estudo de relações entre área mínima para inicialização de canais que foram tratadas por MONTGOMERY e FOUFOULA-GEORGIOU (1993). Devemos também realizar levantamentos em campo dos canais e trechos de zero ordem para a completa validação do modelo e um número maior de subbacias e nascentes deve ser levantado para melhorar as análises estatísticas. Além disso, outras técnicas de interpolação como a interpolação cúbica devem ser testadas futuramente.

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