deliberaÇÃo do conselho de administraÇÃo da … · para os elementos que haviam tido contacto...
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DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA
ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE
(VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL)
Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde exerce funções de regulação, de
supervisão e de promoção e defesa da concorrência respeitantes às atividades
económicas na área da saúde nos setores privado, público, cooperativo e social;
Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo 5.º
dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto;
Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde
estabelecidos no artigo 10.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º
126/2014, de 22 de agosto;
Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos
no artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de
agosto;
Visto o processo registado sob o n.º ERS/051/2017.
I. DOS FACTOS
I.1. Origem do processo
1. A Entidade Reguladora da Saúde (ERS) tomou conhecimento de participação
elaborada pelo exponente B.M., em 2 de maio de 2017, no que concerne à atuação
do Hospital de Santarém, E.P.E. (HDS), entidade prestadora de cuidados de saúde
inscrita no Sistema de Registo de Estabelecimentos Regulados (SRER) da ERS sob o
n.º 12297, e relativa ao diagnóstico e notificação de doença contagiosa, após
contacto do exponente com a utente M.N..
2. Para uma averiguação preliminar dos factos enunciados pelo exponente, e ao abrigo
das atribuições e competências da ERS, procedeu-se à abertura do processo de
avaliação registado sob o número n.º AV/055/2017.
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3. No entanto, face aos elementos recolhidos no referido processo de avaliação e
atendendo à necessidade de uma averiguação mais aprofundada dos factos
relatados, ao abrigo das atribuições e competências da ERS, o respetivo Conselho de
Administração deliberou, por despacho de 30 de agosto de 2017, proceder à abertura
do presente processo de inquérito, registado internamente sob o n.º ERS/051/2017,
com o intuito de determinar se, in casu, foi ou não assegurada a prestação de
cuidados de saúde garantistícos dos direitos e legítimos interesses dos utentes, que à
ERS cumpre garantir, mormente do direito à proteção da saúde.
I.2. Diligências
4. No âmbito da investigação desenvolvida pela ERS, realizaram-se as seguintes
diligências instrutórias:
(i) Pesquisa no SRER da ERS relativa à inscrição do Hospital de Santarém, E.P.E.
(HDS), constatando-se que o mesmo é um estabelecimento prestador de
cuidados de saúde registado no SRER da ERS;
(ii) Pedido de elementos enviado ao HDS em 31 de maio de 2017, com insistência
datada de 18 de julho de 2017, e análise da resposta endereçada à ERS e
rececionada em 2 de agosto de 2017;
(iii) Pedido de relatório de apreciação clínica a perito médico consultado pela ERS, a
7 de agosto de 2017, e análise do respetivo parecer;
(iv) Notificação de abertura de processo de inquérito enviada ao exponente em 4 de
setembro de 2017;
(v) Notificação de abertura de processo de inquérito e pedido de elementos
adicional enviado ao HDS em 4 de setembro de 2017, e análise da resposta
endereçada à ERS, rececionada em 2 de outubro de 2017.
II. DOS FACTOS
5. A ERS tomou conhecimento de participação elaborada pelo exponente B.M., em 2 de
maio de 2017, no que concerne à atuação do HDS, e relativa ao diagnóstico e
notificação de doença contagiosa, após contacto do exponente com a utente M.N..
6. Concretamente, cumpre destacar os seguintes factos alegados pelo exponente:
“[…]
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--- Participo a vossa Exª que, no passado dia 28 de Abril do presente ano, pelas 08H30
fui solicitado pela Central Rádio para me deslocar a uma residência, juntamente com o
elemento policial P.G. (Testemunha), onde era necessário ser efectuada uma abertura
de porta com socorro e consequente transporte ao hospital, situação essa relatada na
Participação por mim elaborada, sob o NPP: 195854/2017, cuja cópia se anexa.
--- Pelas 23h30 do mesmo dia, quando me encontrava na minha residência, em tempo
de descanso, recebi uma chamada telefónica por parte do Graduado de Serviço à
Esquadra à qual pertenço, informando-me de que se havia deslocado àquele
Departamento policial o Sr.º F.N. (Testemunha), filho de M.N. (Vítima) transportada ao
hospital, dando conta que já no hospital desta cidade havia sido diagnosticado à sua
Mãe uma patologia denominada Meningite Bacteriana, a qual, segundo o pessoal
médico de serviço, seria altamente contagiosa através das vias respiratórias e outras.
--- Adiantou F.N. (Testemunha), que à sua mãe M.N. (Vítima) havia sido determinada
quarentena naquela Unidade Hospitalar.
--- Por esse facto seria necessário que todos os elementos que tivessem tido contacto
directo com a Vítima, se deslocassem ao Hospital desta cidade, urgentemente, com o
intuito de tomar medicação própria para o efeito, nomeadamente CIPROfloxacina
500mg.
--- Mais informou que também tinha alertado a corporação dos Bombeiros Municipais
desta cidade do sucedido, uma vez que também tinham comparecido no local.
--- De imediato entrei em contacto telefónico com a Testemunha que me havia
acompanhado na ocorrência, deslocando-nos de seguida para a unidade hospitalar,
onde chegámos pelas 00h15, encontrando-nos com o Bombeiro F.V., chefe do grupo
de serviço dos Bombeiros Municipais deste Cidade, que, após ter sido informado
também pelo familiar da Vítima, ali se deslocou, com o intuito de recolher medicação
para os elementos que haviam tido contacto direto com a vítima.
--- Na companhia deste, contactei com uma enfermeira, cujos dados identificativos
apenas sei tratar-se de T.P., a qual confirmou o diagnóstico e os factos acima
referidos, fornecendo-me de imediato a referida medicação.
--- Questionada por mim sobre quais os procedimentos internos do Hospital face
àquela situação, a mesma apenas me soube responder que nestes casos são
contactados telefonicamente os elementos presentes naquele turno de serviço.
--- Questionada T.P. por mim, sobre o porquê de ter sido de F.N. (Testemunha),o filho
da Vítima a contactar esta Polícia a alertar para o sucedido e não o pessoal de serviço
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do Hospital, a mesma não teceu qualquer comentário ou observação, dando a
entender que desconhecia a situação. […]
--- De referir que desde o início da ocorrência, pelas 8h30 do referido dia, até me ter
sido dado conhecimento por parte de F.N. (Testemunha), decorreram cerca de 15
horas, tempo esse que passei, bem como todos os outros envolvidos, em contacto com
familiares e outros, totalmente alheio à situação narrada por falta de comunicação da
mesma pelas entidades competentes. […]”.
7. Nessa senda, foi enviado um pedido de elementos ao prestador, por ofício datado de
31 de maio de 2017, com insistência datada de 18 de julho de 2017, concretamente
solicitando:
“[…]
1. Se pronunciem, de forma fundamentada e circunstanciada sobre a situação descrita
na aludida reclamação, se possível acompanhada dos respetivos elementos
documentais;
2. Envio de identificação da utente (nome completo, número de utente) e cópia do
relatório do episódio de urgência da utente (Alert), em 28 de abril de 2017;
3. Descrição, pormenorizada e documentalmente suportada, dos protocolos e/ou
procedimentos em vigor no Serviço de Urgência (SU), após deteção de doenças de
declaração obrigatória (DDO);
4. Informação quanto ao cumprimento da notificação obrigatória de doenças
transmissíveis pelos profissionais médicos presentes no SU em 28 de abril de 2017,
através da aplicação informática de suporte ao Sistema Nacional de Informação e
Vigilância Epidemiológica (SINAVE), nos termos do disposto na Portaria n.º 248/2013,
de 5 de agosto, acompanhada do respetivo suporte documental;
5. Procedam ao envio de quaisquer esclarecimentos complementares julgados
necessários e relevantes à análise do caso concreto. […]”.
8. Assim, por ofício rececionado na ERS a 2 de agosto de 2017, veio o HDS informar
que:
“[…]
Pedindo antecipadamente desculpa pela não resposta atempada ao pedido de V.
Exas. datado de 31/05/2017 sobre o processo em epígrafe, vimos agora responder,
seguindo a ordem das perguntas formuladas.
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1. Sobre o episódio de urgência da Sr.ª D. M.N., segue a informação da Sr.ª Diretora
do Serviço de Urgência, Dr.ª G.A. (anexo 1).
Sobre o procedimento da enfermagem, segue a informação da Sr.ª Enf.ª
Coordenadora do Departamento de Urgência, Enf.ª P.L. (anexo 2).
2. Junta-se cópia do Relatório do episódio de urgência com identificação da Utente
(anexo 3).
3. Protocolo de Procedimentos em vigor no Serviço de Urgência após confirmação de
doença de Declaração Obrigatória (anexo 4).
4. Não foi feita a notificação de doença transmissível pelos profissionais médicos
presentes no Serviço de Urgência no dia 28 de abril porque, segundo a informação da
Sr.ª Diretora do Serviço de Urgência (ver anexo 1):
“De acordo com o agente isolado, Listeria monocytogenes, não estava indicada
profilaxia aos contactantes.”
“No Serviço de Urgência não foi efetuado Registo SINAVE porque enquanto
permaneceu no serviço, não existiu isolamento de agente”
5. Considera-se, reavaliando a situação, ter existido um procedimento geral preventivo
por “excesso” dirigido aos “contactados”, mesmo desconhecendo os graus de
contacto.
Quanto a eventuais chamadas por terceiros de contactados voluntários ou
involuntários, sempre podem ocorrer, não estando no controlo dos Serviços o seu
impedimento.
Mais se informa ser prática envolver os Serviços de Saúde Pública quando a chamada
de elementos da comunidade se torne recomendável. […]”.
9. Em anexo a tais esclarecimentos, juntou o HDS a resposta à reclamação 72GC/2017,
com informação da Sr.ª Diretora do Serviço de Urgência, da qual consta o seguinte:
“[…]
A D. M.N. foi admitida no S. Urgência com quadro clínico sugestivo de Pneumonia e
Meningite provavelmente bacterianas.
Por quadro clínico sugestivo de meningite bacteriana embora não se conhecendo o
agente etiológico, foram efetuadas profilaxias aos contactos.
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Está registado no processo da doente (SClinico), pelo Dr. J.C., médico responsável
pela equipa da área médica a 28/4: “Foi feita profilaxia ciproxina de contacto no SU e
na família (filho, nora, neto e companheiro).
Foi efetuada colheita de liquor para exame microbiológico em 28/4 e o resultado
etiológico foi disponibilizado pela Microbiologia em 3/5/2017 com identificação de
Listeria monocytogenes.
A doente foi internada para o Serviço de Medicina IV cujo internamento decorreu de
28/4 a 11/5 (registo de entrada no Serviço de Medicina IV às 00:46h de 29/4/2017).
Teve alta com os diagnósticos: Meningite a Listeria monocytogenes; Pneumonia
adquirida na comunidade sem agente isolado; Dislipidemia mista; HTA, cuja nota de
alta se anexa à presente resposta.
O quadro clínico à entrada era sugestivo de Meningite provavelmente bacteriana sem
critérios de gravidade ou suspeita forte de agente etiológico infecioso que obrigasse a
profilaxia de contactos. Contactado o Dr. J.C. referiu que preferiu o excesso de zelo,
pelo que foram efetuadas profilaxias; disse também, não ter tido conhecimento de
outros contactos que eventualmente obrigassem a profilaxia.
De acordo com o agente isolado, Listeria monocytogenes, não estava indicada
profilaxia aos contactantes. No serviço de Urgência são cumpridas as Guidelines/
NOCs para doença infeciosa quer seja Meningite ou outra patologia.
No Serviço de Urgência não foi efetuado o Registo SINAVE porque enquanto
permaneceu neste serviço não existiu isolamento de agente.
Refere-se ainda que esta direção não teve conhecimento de qualquer diligência do
queixoso ou da instituição que representava para esclarecimento de dúvidas ou
comunicação de ocorrência. […]”.
10. Mais juntou o HDS a exposição da Sr.ª Enf.ª Coordenadora do Departamento de
Urgência, da qual consta o seguinte:
“[…]
Como é referido na resposta à reclamação efetuada pela Drª G.A., o médico
responsável pela equipa da área médica – Dr. J.C. procedeu ao registo em SClínico
“Foi feita profilaxia de contacto no SU e na família (filho, nora, neto e companheiro) ”.
Perante uma situação em que há necessidade de assegurar esta profilaxia, o
Enfermeiro Coordenador de Departamento, Enfermeiro Chefe ou Enfermeiro
Responsável de Equipa, (dependendo da hora e dia da semana em que esta situação
ocorra), contacta pessoalmente ou por telefone todos os profissionais envolvidos
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(enfermeiros e assistentes operacionais) e fornece a medicação que o médico indicar,
bem como a sua dosagem.
O Serviço de Urgência dispõe de antibioterapia destinada a este efeito, pedida aos
Serviços Farmacêuticos – habitualmente 50 comp de Ciprofloxacina 500mg.
Este procedimento foi cumprido na situação em causa.
A informação sobre a necessidade de assegurar profilaxia a outros profissionais
envolvidos (bombeiros, elementos policiais) não foi transmitida pelos enfermeiros.
Tivemos agora informação pelos registos que constam neste processo, de que foi o
familiar da doente, o Sr. F.N. que alertou a Corporação de Bombeiros e os elementos
Policiais.
Chegando ao conhecimento da Enfermeira Chefe S.M. e Enfermeiras Responsáveis
de Equipa – P.C. e T.M. de que se estava a efetuar profilaxia a todos os contactos da
doente M.N., houve preocupação das mesmas em assegurar o fornecimento da
medicação a quem dela necessitasse. […]”.
11. Tendo em conta a necessidade de avaliação técnica dos factos em presença, em 7 de
agosto de 2017, foi solicitado parecer a perito médico consultado pela ERS, cujas
conclusões, em suma, se reconduzem a:
“[…]
Trata-se de situação clinica de doente com quadro clinico e analítico sugestivo de
meningite bacteriana, com identificação posterior de Listeria em liquor cefalo-
raquidiano.
Foi colocado o problema da realização de profilaxia antibiótica nos contactos
familiares, bem como nos profissionais (forças de segurança e bombeiros) que
estiveram em contacto com a doente.
Verifica-se que foi realizada a profilaxia nos contactos profissionais do SU, mas não
nos restantes.
Aparentemente não terá sido feita a declaração de doença no SINAVE.
Colocam-se alguns problemas:
1 – Foi realizada profilaxia antibiótica numa situação cuja necessidade é questionável,
mas por uma questão de “excesso de cuidado” conforme referido na resposta da
Instituição.
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2 – No entanto, a partir do momento que esta profilaxia é realizada em alguns
profissionais, deve ser extensível a todos, por uma questão de equidade.
3 – Esta situação deveria, na minha opinião, ser extensível aos bombeiros que
efectuaram o socorro à doente.
4 – Relativamente aos elementos da segurança (policia) dependeria se estiveram em
contacto directo com a doente, o que provavelmente não teria sido necessário, logo
não haveria indicação, o que não invalida a necessidade de os contactar para avaliar o
risco de contágio.
5 – De acordo com a informação disponibilizada não foi realizada a declaração de
doença no SINAVE, o que não poderia ser realizado no SU por falta de resultado
bacteriológico, mas que deveria ter sido realizada no Internamento.”.
12. Assim, conclui, em suma, o perito médico consultado pela ERS que:
“[…]
Houve excesso de cuidados na implementação da profilaxia antibiótica. No entanto,
este excesso de cuidados poderá ter sido entendido como necessário pelo clinico
atendendo ao quadro de meningite bacteriana, podendo a eventual gravidade do
quadro clinico sugerido a possibilidade de meningite por Menigococus.
No entanto, nessa presunção, a profilaxia deveria ter sido estendida aos elementos dos
bombeiros (que terão “pegado” na doente e feito o respectivo transporte). É mais
discutível a necessidade de profilaxia aos elementos da segurança policial mas não foi
inquirida a actuação dos mesmos junto da doente (houve contacto com a mesma?).
Não foi efectuada a declaração obrigatória de doença infeciosa.
Constata-se que não foi respeitado o princípio da igualdade no tratamento/profilaxia
antibiótica, bem como a não declaração de doença infeciosa.”.
13. Na sequência deste parecer clínico, por ofício datado de 4 de setembro de 2017, a
ERS enviou novo pedido de esclarecimentos ao HDS, concretamente solicitando:
“[…]
1. Tendo presente o parecer do Perito Médico da ERS, esclareçam quais os motivos
e/ou razões para a falta de notificação da Meningite por Listeria monocytogenes ou
Listeriose, diagnosticada à utente M.N., dado ser esta uma doença sujeita a
notificação, clínica e laboratorial, obrigatória, nos termos da alínea ll) do n.º 1 do
Despacho n.º 15385-A/2016, de 21 de dezembro, da Direção Geral da Saúde;
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2. Que indiquem, com envio do suporte documental respetivo, os procedimentos em
vigor no Serviço de Urgência (SU) do HDS, após a deteção de Doenças de Declaração
Obrigatória, previstas no Despacho n.º 15385-A/2016, de 21 de dezembro e,
consequente, acionamento do Sistema Nacional de Informação e Vigilância
Epidemiológica (SINAVE), sempre que aplicável;
3. Envio de quaisquer outros elementos, documentos ou esclarecimentos adicionais
tidos por relevantes para o completo esclarecimento da situação em apreço. […]”.
14. Por ofício rececionado pela ERS em 2 de outubro de 2017, veio o HDS prestar os
esclarecimentos solicitados, afirmando que:
“[…]
Em resposta ao solicitado e pedindo antecipadamente desculpa por se ter ultrapassado
em dois dias o prazo fixado, vimos informar, respeitando a ordem das questões
colocadas:
1. Quais as razões para a falta de notificação…
A Assistente Graduada Sénior de Medicina Interna, Dr.ª M.E., informa ter realizado a
notificação conforme anexo 1 (dois documentos).
2. Envio de suporte documental de procedimentos em vigor…
O suporte documental, do conhecimento do corpo clínico, é o dispensado pela Direção
Geral de Saúde, de acordo com as circunstâncias, com o respectivo procedimento
conforme plataforma do SINAVE, disponível no sistema.
O Hospital não tem instituídos outros procedimentos no Serviço de Urgência para
efeitos de notificação.
Habitualmente a notificação é feita em contexto de internamento após avaliação e
confirmação laboratorial.
Após a detecção e confirmação da doença, é notificada na plataforma do SINAVE, que
passa a diligenciar em conformidade.
Não existem outros procedimentos instituídos. […]”.
15. Em anexo a tais esclarecimentos, juntou o HDS cópia da Notificação de Listeriose
efetuada através do SINAVE, datada de 29 de setembro de 2017, bem como uma nota
da Dr.ª M.E., de onde consta o seguinte:
“[…]
Exma. Srª Dirª Clínica
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Relativamente à notificação da doença de declaração obrigatória respeitando à
doente:
M.N. […]
Venho informar que a mesma foi realizada à data da alta, 11 de maio de 2017, apesar
de actualmente não se encontrar inscrita em registo SINAVE.
Mais informo, que dado não se encontrar no sistema informático SINAVE a referida
notificação, a mesma foi repetida à data de hoje 29-09-2017. Junto o documento da
referida notificação impressa. […]”.
III. DO DIREITO
III.1. Das atribuições e competências da ERS
16. De acordo com o preceituado no n.º 1 do artigo 4.º e no n.º 1 do artigo 5.º, ambos dos
Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, a ERS
tem por missão a regulação, a supervisão e a promoção e defesa da concorrência,
respeitantes às atividades económicas na área da saúde dos setores privado, público,
cooperativo e social, e, em concreto, à atividade dos estabelecimentos prestadores de
cuidados de saúde;
17. Sendo que estão sujeitos à regulação da ERS, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º dos
mesmos Estatutos, todos os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, do
setor público, privado, cooperativo e social, independentemente da sua natureza
jurídica.
18. Consequentemente, o Hospital de Santarém, E.P.E. é um estabelecimento prestador
de cuidados de saúde, inscrito no Sistema de Registo de Estabelecimentos Regulados
(SRER) da ERS sob o n.º 12297.
19. As atribuições da ERS, de acordo com o n.º 2 do artigo 5.º dos Estatutos da ERS
compreendem “a supervisão da atividade e funcionamento dos estabelecimentos
prestadores de cuidados de saúde, no que respeita […entre outros] [ao] “cumprimento
dos requisitos de exercício da atividade e de funcionamento”, “[à] garantia dos direitos
relativos ao acesso aos cuidados de saúde”, e “[à] prestação de cuidados de saúde de
qualidade, bem como dos demais direitos dos utentes”.
20. Com efeito, são objetivos da ERS, nos termos das alíneas a), c) e d) do artigo 10.º
dos Estatutos da ERS, “assegurar o cumprimento dos requisitos do exercício da
atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde”; “garantir os
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direitos e interesses legítimos dos utentes” e “zelar pela prestação de cuidados de
saúde de qualidade”.
21. No que toca à alínea a) do artigo 10.º dos Estatutos da ERS, a alínea c) do artigo 11.º
do mesmo diploma estabelece ser incumbência da ERS “assegurar o cumprimento
dos requisitos legais e regulamentares de funcionamento dos estabelecimentos
prestadores de cuidados de saúde e sancionar o seu incumprimento”.
22. Já no que se refere ao objetivo regulatório previsto na alínea c) do artigo 10.º dos
Estatutos da ERS, de garantia dos direitos e legítimos interesses dos utentes, a alínea
a) do artigo 13.º do mesmo diploma estabelece ser incumbência da ERS “apreciar as
queixas e reclamações dos utentes e monitorizar o seguimento dado pelos
estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde às mesmas”.
23. Finalmente, e a propósito do objetivo consagrado na alínea d) do artigo 10.º dos
Estatutos da ERS, a alínea c) do artigo 14.º do mesmo diploma prescreve que
compete à ERS “garantir o direito dos utentes à prestação de cuidados de saúde de
qualidade”.
24. Para tanto, a ERS pode assegurar tais incumbências mediante o exercício dos seus
poderes de supervisão, consubstanciado, designadamente, no dever de zelar pela
aplicação das leis e regulamentos e demais normas aplicáveis, e ainda mediante a
emissão de ordens e instruções, bem como recomendações ou advertências
individuais, sempre que tal seja necessário, sobre quaisquer matérias relacionadas
com os objetivos da sua atividade reguladora, incluindo a imposição de medidas de
conduta e a adoção das providências necessárias à reparação dos direitos e
interesses legítimos dos utentes – cfr. alíneas a) e b) do artigo 19.º dos Estatutos da
ERS.
III.2. O direito dos utentes à prestação de cuidados de saúde de qualidade
25. Atendendo à situação de vulnerabilidade que, regra geral, apresentam os utentes dos
serviços de saúde que recorrem à prestação de cuidados de saúde, torna-se ainda
mais premente a necessidade de os cuidados de saúde serem prestados pelos meios
adequados, com prontidão, humanidade, correção técnica e respeito.
26. Sempre e em qualquer situação, toda a pessoa tem o direito a ser respeitada na sua
dignidade, sobretudo quando está inferiorizada, fragilizada ou perturbada pela doença.
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27. A este respeito, encontra-se reconhecido na LBS, mais concretamente na sua alínea
c) da Base XIV, o direito dos utentes a serem “tratados pelos meios adequados,
humanamente e com prontidão, correção técnica, privacidade e respeito”.
28. Norma que veio a ser consolidada no artigo 4.º ("Adequação da prestação dos
cuidados de saúde”) da Lei n.º 15/2014, de 21 de março, segundo o qual “O utente
dos serviços de saúde tem direito a receber, com prontidão ou num período de tempo
considerado clinicamente aceitável, consoante os casos, os cuidados de saúde de que
necessita” (n.º 1).
29. Tendo o utente, bem assim, “(…) direito à prestação dos cuidados de saúde mais
adequados e tecnicamente mais corretos” (n.º 2).
30. Estipulando, ainda, o n.º 3 que “Os cuidados de saúde devem ser prestados
humanamente e com respeito pelo utente”.
31. Quanto ao direito do utente ser tratado com prontidão, o mesmo encontra-se
diretamente relacionado com o respeito pelo tempo do paciente1, segundo o qual deve
ser garantido o direito do utente a receber o tratamento necessário dentro de um
rápido e predeterminado período de tempo, em todas as fases do tratamento.
32. Aliás, o Comité Económico e Social Europeu (CESE), no seu Parecer sobre “Os
direitos do paciente”, refere que o “reconhecimento do tempo dedicado à consulta, à
escuta da pessoa e à explicação do diagnóstico e do tratamento, tanto no quadro da
medicina praticada fora como dentro dos hospitais, faz parte do respeito das pessoas
[sendo que esse] investimento em tempo permite reforçar a aliança terapêutica e
ganhar tempo para outros fins [até porque] prestar cuidados também é dedicar tempo”.
33. Quando o legislador refere que os utentes têm o direito de ser tratados pelos meios
adequados e com correção técnica, está a referir-se à utilização, pelos prestadores de
cuidados de saúde, dos tratamentos e tecnologias tecnicamente mais corretas e que
melhor se adequam à necessidade concreta de cada utente.
34. Ou seja, deve ser reconhecido ao utente o direito a ser diagnosticado e tratado à luz
das técnicas mais atualizadas, e cuja efetividade se encontre cientificamente
comprovada, sendo, porém, óbvio que tal direito, como os demais consagrados na
LBS, terá sempre como limite os recursos humanos, técnicos e financeiros disponíveis
– cfr. n.º 2 da Base I da LBS.
1 Vd. o ponto 7. da “Carta Europeia dos Direitos dos Doentes”.
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35. Por outro lado, quando, na alínea c) da Base XIV da LBS, se afirma que os utentes
devem ser tratados humanamente e com respeito, tal imposição decorre diretamente
do dever de os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde atenderem e
tratarem os seus utentes em respeito pela dignidade humana, como direito e princípio
estruturante da República Portuguesa.
36. De facto, os profissionais de saúde que se encontram ao serviço dos
estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde devem ter redobrado cuidado em
respeitar as pessoas particularmente frágeis em razão de doença ou deficiência.
37. Efetivamente, sendo o direito de respeito do utente de cuidados de saúde um direito
ínsito à dignidade humana, o mesmo manifesta-se através da imposição de tal dever a
todos os profissionais de saúde envolvidos no processo de prestação de cuidados, o
qual compreende, ainda, a obrigação de os estabelecimentos prestadores de cuidados
de saúde possuírem instalações e equipamentos que proporcionem o conforto e o
bem-estar exigidos pela situação de fragilidade em que o utente se encontra.
38. Nesta conformidade, a política de saúde prossegue, como objetivo fundamental, entre
outros, obter a igualdade dos cidadãos no acesso aos cuidados de saúde,
independentemente da sua condição económica e do local onde residam, bem como
garantir a equidade na distribuição de recursos e na utilização de serviços.
39. A necessidade de garantir requisitos mínimos de qualidade e segurança ao nível da
prestação, dos recursos humanos, do equipamento disponível e das instalações está
presente no sector da prestação de cuidados de saúde de uma forma mais acentuada
do que em qualquer outra área.
40. As relevantes especificidades deste setor agudizam a necessidade de garantir que os
serviços sejam prestados em condições que não lesem o interesse nem violem os
direitos dos utentes.
41. Efetivamente, a qualidade tem sido considerada como um elemento diferenciador no
processo de atendimento das expectativas de clientes e utentes dos serviços de
saúde.
42. Particularmente, a assimetria de informação que se verifica entre prestadores e
consumidores reduz a capacidade de escolha dos últimos, não lhes sendo fácil avaliar
a qualidade e adequação do espaço físico, nem a qualidade dos recursos humanos e
da prestação a que se submetem quando procuram cuidados de saúde.
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43. Além disso, a importância do bem em causa (a saúde do doente) confere uma
gravidade excecional à prestação de cuidados em situação de falta de condições
adequadas.
44. O utente dos serviços de saúde tem direito a que os cuidados de saúde sejam
prestados com observância e em estrito cumprimento dos parâmetros mínimos de
qualidade legalmente previstos, quer no plano das instalações, quer no que diz
respeito aos recursos técnicos e humanos utilizados.
III.3. Do Sistema Nacional de Informação de Vigilância Epidemiológica (SINAVE)
45. A Lei n.º 81/2009, de 21 de agosto, instituiu um sistema de vigilância em saúde
pública, que identifica situações de risco, recolhe, atualiza, analisa e divulga os dados
relativos a doenças transmissíveis e outros riscos em saúde pública, bem como
prepara planos de contingência face a situações de emergência ou de calamidade
pública.
46. Nessa senda, foi criada uma rede, de âmbito nacional, envolvendo os serviços
operativos de saúde pública, os laboratórios, as autoridades de saúde e outras
entidades dos sectores público, privado e social, cujos participantes contribuem para
um sistema nacional de informação de vigilância epidemiológica, denominado
SINAVE.
47. O SINAVE é, assim, um sistema que permite monitorizar a ocorrência de doenças
transmissíveis suscetíveis de constituir um risco para a saúde pública, implementar
com rapidez e segurança medidas de prevenção e controlo destas doenças e cortar a
cadeia de transmissão na comunidade e ocorrência de novos casos de doença e
surtos.
48. Ora, o incumprimento do dever de notificação obrigatória, previsto no n.º 3 do artigo
16.º da Lei n.º 81/2009, de 21 de Agosto, constitui contraordenação muito grave,
punível, no caso de pessoas singulares, com coima de € 100 a € 10 000 e, no caso de
pessoa coletiva, com coima de € 10 000 a € 25 000, tudo conforme previsto no artigo
21.º do referido diploma.
49. Sendo que, “A instrução dos processos de contra-ordenação compete à DGS, no
âmbito das suas atribuições, a quem devem ser enviados dos autos levantados pelas
autoridades de saúde”, tudo de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 22.º da Lei n.º
81/2009, de 21 de Agosto.
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50. Mais dispondo a Lei n.º 81/2009, de 21 de Agosto, que “As situações de
incumprimento da presente lei devem ser comunicadas à autoridade de saúde
territorialmente competente, pelos cidadãos ou entidades, do sector publico, privado
ou social que as identifiquem” (cfr. n.º 3 do artigo 22.º).
51. A Portaria n.º 248/2013, de 5 de agosto, com a redação conferida pela Portaria n.º
22/2016, de 10 de fevereiro, veio estabelecer os prazos e o processo de notificação
obrigatória de doenças transmissíveis e a metodologia de introdução de dados na
aplicação informática de suporte ao SINAVE, bem como as regras para a proteção dos
dados pessoais dos doentes e confidencialidade da informação de saúde.
52. Para tal dispondo, que a notificação obrigatória de doenças transmissíveis e outros
riscos em saúde pública é obrigatória para todos os profissionais de saúde do sector
público, privado ou social (cfr. n.º 2 do artigo 1.º do aludido diploma).
53. Mais impondo no seu artigo 7.º que:
“1 - Os casos de doenças sujeitas a notificação obrigatória devem ser notificados quer
se tratem de casos possíveis, prováveis ou confirmados, sendo aquela
obrigatoriamente complementada pela notificação laboratorial dos resultados dos
exames realizados para confirmação do caso, se aplicável.
2 - A existência de notificação clínica não exime a obrigatoriedade de notificação
laboratorial, caso exista, nem a existência de notificação laboratorial exime a
obrigatoriedade de notificação clínica. […]”.
54. E, ainda, estipulando no seu artigo 8.º que:
“1 - A notificação, clínica e laboratorial, dos casos de doenças suscetíveis de constituir
uma emergência em saúde pública, a definir por despacho do diretor-geral da Saúde,
deve ser feita imediatamente, através da aplicação informática de suporte ao SINAVE.
2 - A notificação, clínica e laboratorial, dos casos de doenças sujeitas a notificação
obrigatória que não se enquadrem no disposto no número anterior deve ser feita
através do SINAVE, tão cedo quanto possível e sem ultrapassar o prazo máximo de
24 horas contadas desde o diagnóstico clínico ou, caso ocorra primeiro, o diagnóstico
laboratorial, de forma a garantir a implementação de medidas de controlo e prevenção
de casos adicionais. […]”.
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55. Ora, a lista de doenças sujeitas a notificação obrigatória está, atualmente, prevista no
Despacho do Diretor-Geral da Saúde n.º 15385-A/2016, publicado na Série II, 1º
Suplemento, do Diário da República n.º 243/2016, de 21 de dezembro2.
56. Sendo que, no n.º 1 do aludido Despacho é elencado o conjunto de doenças sujeitas
a notificação, clínica e laboratorial, obrigatória, enquanto o seu n.º 2 cataloga os
microrganismos sujeitos a notificação laboratorial obrigatória.
57. Dispondo a alínea ll) do n.º 1 do Despacho n.º 15385-A/2016, de 21 de dezembro,
que a Meningite por Listeria monocytogenes ou Listeriose é uma doença sujeita a
notificação, clínica e laboratorial, obrigatória, sendo, por conseguinte, abrangida pela
rede de informação e comunicação estabelecida pelo sistema nacional de informação
de vigilância epidemiológica (SINAVE).
III.4. Análise da situação concreta
58. Analisados os factos apurados no decurso dos presentes autos, constata-se que a
utente M.N. foi admitida no Serviço de Urgência do HDS, no dia 28 de abril de 2017,
pelas 09h17m, “[…] com quadro clínico sugestivo de Pneumonia e Meningite
provavelmente bacterianas.”;
59. E, de acordo com a informação junta aos autos pelo prestador, “[…] embora não se
conhecendo o agente etiológico, foram efetuadas profilaxias aos contactos”;
60. Posteriormente, foi obtido o diagnóstico laboratorial de “Meningite a Listeria
monocytogenes”;
61. A este respeito, e de acordo com o perito médico consultado pela ERS, “Houve
excesso de cuidados na implementação da profilaxia antibiótica. No entanto, este
excesso de cuidados poderá ter sido entendido como necessário pelo clinico
atendendo ao quadro de meningite bacteriana […]”.
62. Mais referindo que, quanto à administração de profilaxia “[…] a partir do momento que
esta profilaxia é realizada em alguns profissionais, deve ser extensível a todos, por
uma questão de equidade.”.
63. Já no que respeita à notificação obrigatória de doença transmissível, afirma o
prestador que, “Não foi feita a notificação de doença transmissível pelos profissionais
2 Que revogou o Despacho n.º 5681 -A/2014, do Diretor -Geral da Saúde, de 21 de abril, publicado
no Diário da República, 2.ª série, n.º 82, de 29 de abril, retificado pela Declaração de Retificação n.º
609 -A/2014, de 1 de junho, publicada no Diário da República, 2.ª série, n.º 113, de 16 de junho.
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médicos presentes no Serviço de Urgência no dia 28 de abril porque, segundo a
informação da Sr.ª Diretora do Serviço de Urgência […] enquanto permaneceu no
serviço, não existiu isolamento de agente”.
64. Aqui chegados, impõe-se analisar os procedimentos levados a cabo pelo Serviço de
Urgência do HDS após deteção de doença de declaração obrigatória, a fim de aferir se
os mesmos foram aptos à garantia do direito à proteção da saúde.
65. A este respeito, dispõe a alínea ll) do n.º 1 do Despacho n.º 15385-A/2016, de 21 de
dezembro, da Direção-Geral da Saúde, que a Meningite por Listeria monocytogenes
ou Listeriose – diagnosticada à utente M.N., é uma doença sujeita a notificação –
clínica e laboratorial – obrigatória, através do sistema nacional de informação de
vigilância epidemiológica (SINAVE).
66. Sendo que, a Portaria n.º 248/2013, de 5 de agosto3, impõe que “Os casos de doenças
sujeitas a notificação obrigatória devem ser notificados quer se tratem de casos
possíveis, prováveis ou confirmados […].” (cfr. n.º 1 do artigo 7.º);
67. O que, in casu, não sucedeu, afirmando o prestador, de forma categórica, que “No
Serviço de Urgência não foi efetuado o Registo SINAVE porque enquanto permaneceu
neste serviço não existiu isolamento de agente.”;
68. Descurando, no entanto, o dever de cuidado que sobre si impendia, de proceder, de
imediato, à notificação clínica4 da suspeita de Meningite, uma vez que, do relatório do
episódio de urgência da utente M.N., resulta um diagnóstico clínico inicial de
“Meningite bacteriana + Pneumonia adquirida na comunidade”, registado pelas
21h34m do dia 28 de abril de 2017;
69. Constando, inclusive, do processo clínico da utente um Diagnóstico de Saída de
“Meningite de Causa Não Especificada”.
70. Acresce que, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 8.º da Portaria n.º 248/2013,
de 5 de agosto5, “A notificação, clínica e laboratorial, dos casos de doenças sujeitas a
notificação obrigatória […] deve ser feita através do SINAVE, tão cedo quanto possível
e sem ultrapassar o prazo máximo de 24 horas contadas desde o diagnóstico clínico
ou, caso ocorra primeiro, o diagnóstico laboratorial, de forma a garantir a
implementação de medidas de controlo e prevenção de casos adicionais.”.
3 Com a redação conferida pela Portaria n.º 22/2016, de 10 de fevereiro.
4 Pois que, nos termos do n.º 3 do artigo 7.º da Portaria n.º 248/2013, de 5 de agosto, com a
redação conferida pela Portaria n.º 22/2016, de 10 de fevereiro, a notificação clínica não exime a obrigatoriedade de notificação laboratorial, nem a existência de notificação laboratorial exime a obrigatoriedade de notificação clínica. 5 Com a redação conferida pela Portaria n.º 22/2016, de 10 de fevereiro.
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71. Ora, da informação junta aos autos pelo prestador, resulta que o diagnóstico
laboratorial de Meningite por Listeria monocytogenes “[…] foi disponibilizado pela
Microbiologia em 3/5/2017 […]”;
72. Por isso, 5 (cinco) dias após o diagnóstico clínico de “Meningite bacteriana” efetuado à
utente M.N..
73. De onde se infere que, o Serviço de Urgência do HDS atuou em clara
desconformidade com as diretrizes nacionais de prevenção e controle de doenças
transmissíveis;
74. Na medida em que, no que respeita a doenças transmissíveis e outros riscos para a
saúde pública, apenas através de medidas de prevenção, alerta, controlo e resposta
atempada se poderá acautelar e garantir o direito dos cidadãos à defesa e proteção da
saúde;
75. E uma conduta omissiva, como se revelou a do HDS no caso trazido aos autos,
impacta gravemente com a garantia de proteção da saúde da população, através da
vigilância das doenças infeciosas;
76. Não se podendo senão concluir que os procedimentos adotados pelo HDS, no decurso
do evento relatado não foram garantistícos da proteção dos direitos e interesses
legítimos dos utentes, que à ERS cumpre garantir, mormente do direito à proteção da
saúde.
77. Ademais, muito se estranha a resposta do prestador, que, quando questionado pela
ERS sobre os motivos e/ou razões para a falta de notificação da Listeriose
diagnosticada à utente M.N., refere que “[…] a mesma foi realizada à data da alta, 11
de maio de 2017, apesar de actualmente não se encontrar inscrita em registo SINAVE.
[…] a mesma foi repetida à data de hoje 29-09-2017.”.
78. Assim, tendo presentes os factos apurados no decurso dos autos, constata-se que a
conduta do HDS, não se mostrou consentânea com a garantia da proteção dos direitos
e interesses legítimos dos utentes, mormente do direito à proteção da saúde.
79. Por todo o vindo de expor, considera-se necessária a adoção da atuação regulatória
infra delineada, ao abrigo das atribuições e competências legalmente atribuídas à
ERS, no sentido de garantir o cumprimento pelo HDS das normas legalmente
instituídas em matéria notificação de doenças transmissíveis e outros riscos em saúde
pública, obviando à repetição de situações futuras de índole idêntica à ocorrida;
80. Por outro lado, considerando as competências da Direção-Geral da Saúde (DGS) e
das demais autoridades de saúde territorialmente competentes e melhor descritas
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supra, deverá a presente deliberação ser levada ao conhecimento quer da DGS, quer
da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo, I.P. (ARS LVT).
IV. AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS
81. A presente deliberação foi precedida de audiência escrita dos interessados, nos
termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 122.º do Código de
Procedimento Administrativo (CPA), aplicável ex vi da alínea a) do artigo 24.º dos
Estatutos da ERS, tendo sido notificados para se pronunciarem relativamente ao
projeto de deliberação da ERS, no prazo de 10 dias úteis, o Hospital de Santarém,
E.P.E. (HDS) e o exponente B.M..
82. Decorrido o prazo legal concedido para o efeito, a ERS recebeu a pronúncia do
prestador Hospital de Santarém, E.P.E., do exponente B.M., bem como de testemunha
da Participação elaborada pelo exponente, o agente da PSP P.G..
83. Assim, por comunicação eletrónica de 3 de novembro de 2017, tomou a ERS
conhecimento da pronúncia aduzida pelo agente da PSP P.G., concretamente
alegando:
“[…] após ter tido conhecimento do Processo de Inquérito com o número em epigrafe,
decorrente de uma Participação elaborada, por elemento Policial, da qual sou
testemunha, nos termos do Código do Procedimento Administrativo informo que:
1 Confirmo todo o teor dessa mesma Participação, por ter estado presente em todos
os momentos nela descritos, quer aquando do primeiro contacto com a Vitima, quer
posteriormente na Unidade Hospitalar.
2 Essa mesma Participação, apenas teve como objetivo, para que futuramente e em
situações idênticas, os profissionais que tenham contacto com doentes com este tipo
de patologia, sejam tratados com a mesma equidade que o pessoal hospitalar, e que
lhes seja reconhecida igualdade de tratamentos e procedimentos que foram prescritos
e recomendados a nível preventivo independentemente de se vir a confirmar ou não a
doença.
3 Como foi referido na mesma Participação, houve necessidade de haver o
arrombamento /escalamento por parte dos Bombeiros, para poder aceder à vítima que
se encontrava acamada. Como tal, e a fim de acompanhar a ação dos Bombeiros,
quer eu, quer o meu colega, estivemos no interior da habitação e dependência onde
se encontrava a doente.
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4 No quarto onde se encontrava a doente foi necessário interceder junto da mesma,
com o intuito de a questionar sobre a sua identidade e pelo motivo de encontrar
acamada, tendo a paciente respondido vagamente às questões que lhe foram
perguntadas. Durante a abordagem policial e intervenção dos bombeiros em
circunstância alguma, foi possível avaliar, nem tão pouco suspeitar de qual a
enfermidade que a doente padecia, motivo pelo qual, não foram tomadas quaisquer
precauções que eventualmente tivessem que ser tomadas.
5 Neste contexto e não havendo suspeitas do que quer que fosse, foi a paciente
transportada ao Hospital desta cidade, pelos Bombeiros, regressando nós ao serviço
normal, tendo terminado o turno de serviço, sem qualquer tipo de outro incidente que
fosse digno de relatar.
6 No mesmo dia, cerca das 23h30, e passadas que foram cerca de 15 horas, período
durante o qual fiz toda a minha vida quotidiana, mantendo contactos diretos com as
mais variadas pessoas, com especial relevância, para com os meus filhos menores,
recebi uma chamada telefónica da parte de elementos policiais da esquadra onde
labora, informando-me de que um familiar da vitima havia tido conhecimento no HDS
que à sua mãe, havia sido diagnosticado uma meningite bacteriana, altamente
contagiosa, cujo diagnostico havia sido feito naquele hospital onde permanecia
internada e isolada.
7 Mais me informou que era do seu conhecimento que o pessoal hospitalar e os
familiares diretos da pessoa infetada, onde se incluía, haviam efetuado tratamento
profilático para aquela doença, uma vez que existia sério risco de contágio com as
pessoas que estiveram próximas da paciente.
8 Mediante esta informação, prontamente nos dirigimos à unidade hospitalar em
causa, onde já se encontrava elemento dos Bombeiros Municipais desta cidade, que
ali se deslocou, por ter sido também ele avisado pelo familiar do tipo de doença que a
paciente transportada padecia.
9 Já no hospital efetuamos contacto com o serviço de urgência e enfermeira de
serviço, a quem explicámos o motivo da nossa deslocação tendo apenas, e passado
cerca de [1]6 horas do sucedido sido nos administrada a medicação profilática, quando
todos os restantes intervenientes, leia-se médicos enfermeiros e pessoal auxiliar,
haviam já sido medicados após a suspeita.
10 Mais tarde foi-me informado que tal bactéria, se poderia transmitir por via aérea,
como tal depreendo que esse mesmo contacto foi efetuado. Tanto mais que, apesar
de se vir a constatar ser negativa, foi referido pelo familiar, que a Vitima se encontrava
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isolada a todos os contactos na unidade hospitalar, havendo assim, na minha humilde
opinião, uma suspeita baseada em alguns indícios, indícios esses bastante fortes, que
fizeram com que toda a equipa tomasse as devidas precauções.
11 Mais uma vez reforço, que apesar de não estar confirmada qual o agente
bacteriológico, existia a suspeita, e como tal todo a todo o pessoal hospitalar, foi
administrado profilaxia, seja por prevenção, seja por equidade essa mesma profilaxia
apenas foi administrada aos outros intervenientes iniciais, e volto a dizer alheios ao
quadro clinico, devido ao facto de o familiar ter tido o cuidado de se deslocar à
corporação de bombeiros e esquadra de Policia envolvidos a informar do sucedido em
tempo útil, e por isso se terem deslocado por vontade própria àquela unidade
hospitalar a indagar sobre procedimentos a adotar.
12 Questionados por mim no local, qual os procedimentos a adotar a posterior toma da
profilaxia, apenas me foi dito que se não houvesse qualquer tipo de sintomatologia,
não havia necessidade de outros meios de diagnóstico, motivo pelo qual, até ao
momento não fui contactado, nem por iniciativa própria efetuei qualquer despistagem
ao meu estado de saúde, relativo a esta situação.
13 Em conclusão, reafirmo que a Participação elaborada, visa esclarecimentos de
procedimentos a adotar em situações futuras, uma vez que nesta situação, e no meu
entendimento, lamentavelmente se tomou uma atitude negligente e desrespeitosa para
quem esteve em contacto inicial com a paciente, que a se verificar, não
atempadamente, poderia correr o risco de propagar doença contagiosa por omissão,
por apenas nem ter tido conhecimento dessa suspeita, sendo que facilmente se
poderiam identificar os restantes elementos envolvidos, devido aos vários registos
efetuados, bem como o seu contacto, quanto mais não seja para que lhes tivesse sido
possibilitada a tomada de atitudes que prevenissem a propagação de qualquer
doença, que inerente às suas funções profissionais poderão contrair e posteriormente
propagar, por omissão aos restantes.”.
84. Também por comunicação eletrónica de 3 de novembro de 2017, se pronunciou o
exponente B.M., nos seguintes termos:
“[…]
1. O contacto mantido entre a minha pessoa e a doente aconteceu aquando da
abertura de porta para a qual fui solicitado no exercício das minhas funções de Policia
(explanada em Participação também por mim redigida).
Nestas situações é procedimento normal que se entre na residência do cidadão a fim
de verificar o motivo da abertura de porta e que se identifique o mesmo, entre outros
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pró formas, de modo a que seja reunida informação necessária à elaboração do
respectivo expediente.
Calculo que possa daí depreender-se que o risco de contágio, caso a patologia se
viesse a verificar, seria real, quer através do contacto directo com a doente (tacto),
quer através das vias respiratórias.
2. Desde a data dos factos e após toma da medicação (relembro que por iniciativa
própria dirigi-me ao Hospital de Santarém assim que tive conhecimento da totalidade
da situação, não tendo sido notificado ou contactado por aquele estabelecimento de
saúde) mencionada em Participação por mim elaborada que deu origem ao presente
processo, não houve qualquer tipo de alteração ao meu estado de saúde (sintomas)
pelo que não senti necessidade de avaliar o meu estado clínico e/ou de saúde;
3. Entenda-se que resolvi expor a situação por não ter considerado correcto o modo
como a mesma foi conduzida no que concerne à consideração devida para com as
Forças de Segurança assim como para os restantes meios que estiveram presentes no
local.
4. Foi minha intenção alertar para o sucedido de modo a que, doravante, sejam
encetados esforços por quem de direito para garantir que tal não volte a suceder quer
com colegas de profissão, quer com utentes que ali se desloquem em semelhante
cenário;
5. A ter havido "excesso de zelo" para com a doente e seus familiares (profilaxia
ciproxina de contacto), na minha humilde opinião, esse mesmo "excesso de zelo"
deveria ter sido extensível às Forças de Segurança presentes no local (se não por uma
questão de equidade, que o fosse por uma questão meramente preventiva ou apenas
informativa);
6. Houve preocupação de colocar de sobreaviso Enfermeiros e Assistentes
Operacionais presentes naquele turno e que tenham tido, eventualmente, contacto com
a doente. Tal preocupação não existiu com as Forças de Segurança que estiveram
presentes no local.
Mais uma vez, na minha humilde opinião, esse sobreaviso deveria ter sido extensível
às Forças de Segurança (se não por uma questão de equidade, que o fosse por uma
questão meramente preventiva ou apenas informativa);
7. Não tive conhecimento que tenha havido qualquer tipo de procedimento para que se
apurasse quem havia mantido contacto com a doente até a mesma ter dado entrada no
Hospital de Santarém;
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8. Considero que não houve o mínimo interesse ou preocupação em questionar, avaliar
e garantir o estado de saúde daqueles que primeiro chegaram ao local, (li algures na
dissertação que seria discutível essa necessidade...) que contactaram com a doente e
que, por sua vez, Ignorando totalmente o quadro clínico da mesma, volveram às suas
vidas correndo o risco de contagiar familiares e amigos (podendo alguns deles já ter
idade avançada ou estados de saúde fragilizados);
9. Havendo procedimentos/guidelines pré-estabelecidos para este tipo de cenários no
Hospital de Santarém, então urge melhorá-los; não os havendo, torna-se imperativo
criá-los, implementá-los e fazê-los cumprir por quem de direito;
10. Sendo o mínimo exigível, penso que não é demasiado que sejam consideradas as
Forças de Segurança e outros meios que laborem no "círculo" do Hospital de Santarém
no que respeita a planos de segurança/contingência aquando de situações
semelhantes.”.
85. Por sua vez, por comunicação eletrónica de 7 de novembro de 2017, o Conselho de
Administração do HDS remeteu à ERS a pronúncia sobre o conteúdo do projeto de
deliberação do Conselho de Administração desta Entidade, mais referindo que “acolhe
todos os termos da instrução, (IV. DECISÃO ), dando-lhe cumprimento , de que fará
prova no prazo estabelecido”.
86. Assim, tomou a ERS conhecimento da pronúncia aduzida pelo HDS, que
concretamente vem alegar:
“[…]
1º
A presente pronúncia apenas se reporta à matéria a art. 11º e 12º que se entende
injustificada e incongruente nos seus termos.
TUTELA PÚBLICA DA IGUALDADE
2º
De facto, parece que foi aceite o excesso na implementação da profilaxia antibiótica
mas depois estabeleceu-se censura por não ter abrangido a totalidade dos
intervenientes.
3º
Tal matéria integra incongruência que não se pode aceitar.
4º
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Igualmente não se pode aceitar a conclusão de violação do princípio de igualdade no
tratamento pelos factos que bem constam apurados nos autos.
5º
Isto é, a avaliação da igualdade de tratamento no que se refere à profilaxia antibiótica,
carece de avaliação casuística.
6º
Casuística que resulta da ponderação das condições de partida do terceiro ou do
acompanhante, da sua situação médica concreta, da intensidade de contacto, entre
múltiplas outras circunstâncias, que tornam desrazoável qualquer afirmação do
princípio de igualdade como facto autonomamente relevante no caso concreto.
7º
De resto a aplicação do princípio da igualdade é mal baratado na perícia que se
impugna no que se refere aos intervenientes no transporte, ou que tenham “pegado”
(sic) no doente e ainda mais incompreensível na medida em que se minimiza na logica,
no que se refere aos elementos da força policial.
8º
Consigna-se como afirmação de natureza técnica que a terapêutica antibiótica deve ser
usada no respeito pelas regras técnicas sem excessos medicamente injustificados.
9º
Pelo que não se aceita a parte final propalada a nº 12 como boa, no âmbito da
avaliação a efectuar no Ministério da Saúde.
QUANTO À NOTIFICAÇÃO
10º
Aceita-se a matéria a art. 58º para dela retirar consequências.
11º
Consequências que são o eventual excesso de actuação no que se refere à terapêutica
de parte dos envolvidos, por mera sugestão do quadro clínico.
12.º
Igualmente se aceita a matéria a nº 60 na parte em que indicia que a confirmação foi
obtida após o atendimento imediato.
13º
25 Mod.016_01
Na verdade só em 02/05/17 o exame bacteriológico confirma a patologia (doc.nº1).
14º
Em 03/05/17 foi efetuada a notificação segundo confirmação hoje obtida dos
competentes serviços e que se junta como doc.2 e sobre o qual será requerida
diligência probatória.
15º
Circunstância não anteriormente invocada por lapso de que nos penitenciamos.
16º
Termos em que conclui pela desrazoabilidade do raciocínio da igualdade no que se
refere ao caso concreto e o cumprimento do dever de notificação logo que a situação
clínica se revelou adequada a SINAVE.
REQUER:
a) que se obtenha e junte aos autos a participação RNU nº 378406591, efectuada em
03/05/17, NT. 42[8]549 e a que se reporta o doc. nº 2;
b) que da sua junção seja notificado o respondente. […]”.
87. Em anexo a tais esclarecimentos, juntou o HDS uma comunicação eletrónica de 6 de
novembro de 2017, cujo remetente é o Servicedesk dos SPMS, de onde consta o
seguinte:
“[…]
Existem 2 notificações efetuadas para a mesma doente RNU n.º 378406591
ambas efetuadas pelo Dr. F.G. no H. Santarém, respetivamente, em 03-05-2017
(NT. 428549) e 29-09-2017 (NT.437354). […]”.
88. Cumpre, pois, analisar os elementos invocados nas pronúncias supra elencadas,
aferindo da suscetibilidade dos mesmos infirmarem a deliberação delineada.
89. Sendo que, quanto às pronúncias do exponente B.M. e do agente da PSP P.G.,
cumpre destacar que as mesmas não colidem com o sentido da decisão projetada, por
não trazerem elementos factuais novos que pudessem justificar qualquer alteração da
medida da intervenção regulatória projetada;
90. Não havendo necessidade de alteração ou introdução de medidas de diferente cariz
regulatório à luz dos elementos trazidos aos autos.
91. No que respeita à pronúncia do HDS, faz-se, desde já, notar que todos os argumentos
apresentados foram devidamente considerados e ponderados pela ERS.
26 Mod.016_01
92. Ainda que dos mesmos não tenha resultado uma alteração no sentido da decisão que
a ERS ora entende emitir.
93. Isto porque, os argumentos aduzidos não põem em causa o quadro factual e legal
apresentado pela ERS no seu projeto de deliberação.
94. Embora levantem questões que justificam uma análise ponderada que de seguida se
apresenta;
95. Contudo, mantém-se a necessidade de intervenção regulatória, tendo em vista, desde
logo, a garantia de uma interiorização e assunção das obrigações decorrentes das
regras e orientações a cada momento aplicáveis em matéria de doenças
transmissíveis e outros riscos de saúde pública.
96. Tudo isto, para que seja possível no futuro não só evitar a ocorrência de situações
concretas como aquela que deu origem à abertura dos presentes autos, bem como
aferir se as diligências levadas a cabo pelo HDS se coadunam com o conteúdo da
referida intervenção.
97. Quanto ao referido nos artigos 2.º a 9.º da pronúncia do prestador, no que toca ao
parecer clínico do perito médico consultado pela ERS, refira-se que no projeto de
deliberação notificado foi feita uma reprodução literal do ali referido, sendo certo que
em momento algum a ERS se pronunciou sobre a questão clínica daí subjacente, por
a mesma não ser da competência desta Entidade;
98. Com efeito, ao longo de toda a decisão projetada, pretendeu a ERS distanciar-se de
uma qualquer avaliação clínica quanto aos concretos cuidados de saúde aplicados a
todos os intervenientes no concreto caso, por se tratar de matéria que não se insere
no âmbito de atribuições e competências desta Entidade Reguladora.
99. Sendo que a atuação da ERS sobre a situação em causa foi delimitada às suas
atribuições e competências, designadamente no que toca a “garantir os direitos e
interesses legítimos dos utentes”, mormente o direito à defesa e proteção da saúde.
100. E, com base nos elementos de que dispunha e que foram trazidos aos autos pelo
próprio prestador, considerou esta Entidade que a conduta do HDS teria sido omissa e
desconforme às diretrizes nacionais de prevenção e controle de doenças
transmissíveis.
101. No entanto, da análise do documento n.º 2 agora trazido aos autos pelo prestador
(documento que, desde já, se aceita por se ter como autêntico, não se revelando
necessária a realização de diligências probatórias adicionais), constata-se que o HDS
procedeu à notificação laboratorial da Listeriose diagnosticada à utente M.N. em 3 de
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maio de 2017, e não apenas em 11 de maio e em 29 de setembro de 2017, como
inicialmente foi referido pelo prestador em resposta ao pedido de elementos da ERS;
102. E, por isso, aquando do diagnóstico laboratorial de Meningite por Listeria
monocytogenes efetuado à utente.
103. Contudo, não se pode olvidar que, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 8.º da
Portaria n.º 248/2013, de 5 de agosto6, “A notificação, clínica e laboratorial, dos casos
de doenças sujeitas a notificação obrigatória […] deve ser feita através do SINAVE,
tão cedo quanto possível e sem ultrapassar o prazo máximo de 24 horas contadas
desde o diagnóstico clínico ou, caso ocorra primeiro, o diagnóstico laboratorial, de
forma a garantir a implementação de medidas de controlo e prevenção de casos
adicionais.”;
104. Sendo certo que a notificação efetuada pelo prestador ultrapassou largamente o prazo
máximo de 24 horas contadas desde o diagnóstico clínico que, recorde-se, ocorreu em
28 de abril de 2017.
105. De tal forma que, apesar do prestador ter procedido à notificação de doença
contagiosa através do SINAVE a 3 de maio de 2017, a verdade é que deveria ter
diligenciado ab initio por tal notificação, ainda que apenas tivesse por base no
diagnóstico clínico efetuado;
106. Na medida em que, pelo menos desde as 21h34m do dia 28 de abril de 2017
(conforme resulta do relatório do episódio de urgência da utente M.N.) o prestador
suspeitava de um quadro clínico de “Meningite bacteriana + Pneumonia adquirida na
comunidade”, devendo, nessa altura, proceder à notificação clínica7 da suspeita de
Meningite;
107. Dessa forma possibilitando a adoção de medidas de prevenção, alerta, controlo e
resposta atempada, no sentido de acautelar e garantir o direito dos cidadãos à defesa
e proteção da saúde.
108. Tendo sido esta a questão fulcral que norteou todo o projeto de decisão notificado, e
que enformou a necessidade de adoção dos procedimentos e medidas impostos.
109. Pelo que a linha argumentativa do HDS não colhe nos termos aduzidos, por isso se
mantendo a necessidade de manutenção da decisão nos termos projetados.
6 Com a redação conferida pela Portaria n.º 22/2016, de 10 de fevereiro.
7 Pois que, como anteriormente referido, nos termos do n.º 3 do artigo 7.º da Portaria n.º 248/2013,
de 5 de agosto, com a redação conferida pela Portaria n.º 22/2016, de 10 de fevereiro, a notificação clínica não exime a obrigatoriedade de notificação laboratorial, nem a existência de notificação laboratorial exime a obrigatoriedade de notificação clínica.
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110. Por outro lado, importa notar que o HDS demonstrou na sua pronúncia a sua intenção
de coadunar o seu comportamento, quer com as normas legalmente instituídas no
quadro de doenças transmissíveis e outros riscos de saúde pública, quer com a
instrução constante do projeto de deliberação regularmente notificado;
111. No entanto, não apresenta ainda prova, nomeadamente documental, do seu efetivo e
integral cumprimento;
112. Em face do exposto, verifica-se a necessidade de manutenção dos termos da
instrução, tal como projetada e notificada, de forma a garantir o direito à proteção da
saúde e que situações idênticas à verificada nos presentes autos não se venham a
repetir no futuro.
113. Tudo visto e ponderado, conclui-se pela insusceptibilidade dos argumentos invocados
infirmarem a decisão projetada, bem como pela desnecessidade de adoção de novas
diligências instrutórias, pelo que a decisão projetada se mantém na integra.
V. DECISÃO
114. O Conselho de Administração da ERS delibera, nos termos e para os efeitos do
preceituado nas alíneas a) e b) do artigo 19.º e alínea a) do artigo 24.º dos Estatutos
da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, emitir uma
instrução ao Hospital de Santarém, E.P.E., no sentido de:
(i) Implementar procedimentos que garantam o estrito cumprimento das normas
legalmente instituídas no quadro de doenças transmissíveis e outros riscos de
saúde pública;
(ii) Garantir a imediata notificação clínica das doenças sujeitas a notificação
obrigatória, quer se tratem de casos possíveis, prováveis ou confirmados, sendo
a notificação clínica complementada com a notificação laboratorial dos
resultados dos exames realizados para confirmação do caso;
(iii) Garantir, em permanência, através da emissão e divulgação de ordens e
orientações claras e precisas, que os referidos procedimentos sejam
corretamente seguidos e respeitados por todos profissionais;
(iv) Dar cumprimento imediato à presente instrução, bem como dar conhecimento à
ERS, no prazo máximo de 30 (trinta) dias úteis após a notificação da deliberação
final, dos procedimentos adotados para o efetivo cumprimento do disposto em
cada uma das alíneas supra.
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115. A instrução ora emitida constitui decisão da ERS, sendo que a alínea b) do n.º 1 do
artigo 61.º dos Estatutos da ERS, aprovados em anexo ao Decreto-Lei n.º 126/2014,
de 22 de agosto, configura como contraordenação punível in casu com coima de €
1000,00 a € 44 891,81, “[….] o desrespeito de norma ou de decisão da ERS que, no
exercício dos seus poderes regulamentares, de supervisão ou sancionatórios
determinem qualquer obrigação ou proibição, previstos nos artigos 14.º, 16.º, 17.º,
19.º, 20.º, 22.º, 23.º ”.
Porto, 16 de novembro de 2017.
O Conselho de Administração.