dê o governo aos pequenos

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Dê o Governo aos pequenos. Júnior Cesar Santiago A. é uma menina, não posso escrever o nome dela, pois é menor e a lei não permite. A. está grávida, diz a si mesma que com quinze anos é dona de seu nariz e tem responsabilidade. A.quer ser mãe. Até cogitou o aborto, mas se arrependeu quando B., sua amiga, morreu na mesa tentando retirar um feto indesejado. Ver sua amiga de treze anos no caixão fez A. perceber o valor da vida. Ela sorriu após o enterro, a vida é curta, deveria vivê-la intensamente. C.,namorado de A. é o outro que não posso nomear aqui. Ele quer ser presidente do Brasil. Faz 17 anos no mês que vem e já tem uma longa ficha criminal. Ele se considera um ativista, é filiado a partido político de esquerda e treina todos os dias seu discurso de campanha. Enquanto rouba a vizinha colocando sua filha de cinco anos sob a mira de um 38 comprado com dinheiro da venda de umas pedrinhas de crack ele pensa: “Vou pedir apoio político ao macarrão do morro do alemão. Mato uns desafetos dele e ele financia minha campanha.”. Mais um grito no ouvido da vizinha que, engraçadinha, foi mexer no telefone. Ele quebra o braço da criança para poder provar que é homem sério e de palavra. Se diz que mata as duas se ela reagir, é verdade. Como pode alguém se revoltar contra seu futuro presidente?. Vou levar este brinco para A..Pensa C. “Minha primeira dama tem que andar distinta”. C. resolve matar a vizinha.Tanto faz roubar ou matar.Ele é menor. Nada acontece aos menores. A FEBEM virou „Casa‟ e a polícia não assusta. Agora é o tempo da juventude. São os pequenos no governo. D., amigo de C. já é presidente do morro do carcará, E., primo de D., é prefeito do ligeirão e todos apóiam C. na candidatura. C. é um novo Robin Hood, Tira dos ricos, dos classe-média, dos média- baixa, de todos aqueles que possuem um salário maior que o dele. Ele não recebe salário. C. e A. tentaram assaltar uma banco. Precisavam de dinheiro para subornar um juiz e autorizar a inscrição deles como candidatos. C. e A. foram presos. C. recebeu uma ameaça severa de ir para „Casa‟ e A., bem... essa passou mal e quase perdeu o bebê. Os direitos humanos processaram a polícia, o Estado e A. recebeu uma grande indenização com a qual pagou todas as despesas de C. Agora C. está tentando se eleger vereador. Um passo de cada vez. Ao lado de vários traficantes ele grita seu slogan: “Dê o governo aos pequenos!!!”.

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Page 1: Dê o governo aos pequenos

Dê o Governo aos pequenos.

Júnior Cesar Santiago

A. é uma menina, não posso escrever o nome dela, pois é menor e a lei não permite. A. está

grávida, diz a si mesma que com quinze anos é dona de seu nariz e tem responsabilidade.

A.quer ser mãe. Até cogitou o aborto, mas se arrependeu quando B., sua amiga, morreu na

mesa tentando retirar um feto indesejado. Ver sua amiga de treze anos no caixão fez A.

perceber o valor da vida. Ela sorriu após o enterro, a vida é curta, deveria vivê-la intensamente.

C.,namorado de A. é o outro que não posso nomear aqui. Ele quer ser presidente do Brasil. Faz

17 anos no mês que vem e já tem uma longa ficha criminal. Ele se considera um ativista, é

filiado a partido político de esquerda e treina todos os dias seu discurso de campanha. Enquanto

rouba a vizinha colocando sua filha de cinco anos sob a mira de um 38 comprado com dinheiro

da venda de umas pedrinhas de crack ele pensa: “Vou pedir apoio político ao macarrão do

morro do alemão. Mato uns desafetos dele e ele financia minha campanha.”. Mais um grito no

ouvido da vizinha que, engraçadinha, foi mexer no telefone. Ele quebra o braço da criança para

poder provar que é homem sério e de palavra. Se diz que mata as duas se ela reagir, é verdade.

Como pode alguém se revoltar contra seu futuro presidente?. “Vou levar este brinco para

A.”.Pensa C. “Minha primeira dama tem que andar distinta”. C. resolve matar a vizinha.Tanto

faz roubar ou matar.Ele é menor. Nada acontece aos menores. A FEBEM virou „Casa‟ e a

polícia não assusta. Agora é o tempo da juventude. São os pequenos no governo. D., amigo de

C. já é presidente do morro do carcará, E., primo de D., é prefeito do ligeirão e todos apóiam

C. na candidatura. C. é um novo Robin Hood, Tira dos ricos, dos classe-média, dos média-

baixa, de todos aqueles que possuem um salário maior que o dele. Ele não recebe salário. C. e

A. tentaram assaltar uma banco. Precisavam de dinheiro para subornar um juiz e autorizar a

inscrição deles como candidatos. C. e A. foram presos. C. recebeu uma ameaça severa de ir

para „Casa‟ e A., bem... essa passou mal e quase perdeu o bebê. Os direitos humanos

processaram a polícia, o Estado e A. recebeu uma grande indenização com a qual pagou todas

as despesas de C. Agora C. está tentando se eleger vereador. Um passo de cada vez. Ao lado de

vários traficantes ele grita seu slogan: “Dê o governo aos pequenos!!!”.