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Fundamentos do Direito da Empresa e da Atividade Comercial (DCO0215) Turma 186-24 Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo Professor Doutor Vincius Marques de Carvalho Anotações: Vera Duarte Lorza Revisão: Vera Duarte Lorza e Pedro Camargos Versão 2.0: junho/2014 Apenas as aulas que serão cobradas na segunda avaliação. Qualquer erro encontrado, favor informar: [email protected] ATENÇÃO: o presente documento não constitui material oficial do curso (09/05 ) A Empresa no Mercado e o Poder Econômico: relações empresariais de organização e atuação Estado se relaciona com a empresa de acordo com três perspectivas, importando para nós hoje os mecanismos de relacionamento do Estado com empresas que detém o poder econômico. Para falar disso é inevitável que saibamos o que estamos tratando quando falamos de poder econômico. O conceito intuitivo dele nos mostra que ele nada mais é que a capacidade que o agente tem de determinar em alguma medida a forma com que o setor econômico em que ele atua será organizado. Como na sociedade capitalista sempre haverá um estado organizando as medidas econômicas, ele disputa esse espaço com as empresas e a medida que ele domina esses espaços ele se torna mais intervencionista. Isso é fundante do que chamamos de constituição econômica. Os três mecanismos utilizados para tal organização: 1. Poder compensatório: situações em que o Estado atua diretamente em alguns setores da economia para que por meio de sua atuação regule essa organização, compensando a atuação da empresa privada. Seria por meio das estatais que isso seria feito. O estado pode até monopolizar um setor, como ocorre com o petróleo. Quando ele o faz, e assim determina o preço no começo da cadeia (no caso na matéria prima usada para fazer combustível), há concorrência, mas ela é quase que determinada pelo estado; isso pode ser demonstrado no preço da gasolina, que varia, mas não muito. 2. Regulação: estado regula os agentes econômicos nesse setor, regulando padrões de entrada, padrões financeiros (valores mínimos para que a empresa possa fazer tal tipo de serviço), preço, etc. Como exemplo, temos o setor de telecomunicações, de energia elétrica, etc. De acordo com o interesse no momento, o estado pode regular mais ou menos. 3. Política concorrencial/ anti truste: ao contrário das duas outras é vista como padrão mínimo de intervenção estatal. Normalmente a atuação do órgão responsável é uma atuação pontual e residual, atuando de acordo como uma situação fática específica, ex post, partindo do pressuposto que o padrão de qualidade e o preço, num mercado concorrencial, é aquele pois é o melhor para o consumidor. Aqui no Brasil essa política assumiu uma importância muito grande, mesmo existindo as outras duas (como nos outros países do mundo). Existiram saltos qualitativos na aplicação dessa política, que começam efetivamente em 94com o plano real. Afirmou aí que não existem exceções, ou seja, todas as empresas são submetidas a tal política, inclusive as estatais, e que a decisão do órgão responsável por tal política, no caso o CADE, não é submetidas aos outros órgãos que regulam os outros dois meios. Ex: Telefônica assumindo

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Page 1: DC00215 - Fundamentos Do Direito Da Empresa e Da Atividade Negocial - Prof. Vinicius Marques de Carvalho - Vera Lorza (186-24) [Versão 1.9 - Para a Segunda Prova] (1)

Fundamentos do Direito da Empresa e da

Atividade Comercial (DCO0215)

Turma 186-24

Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

Professor Doutor Vincius Marques de Carvalho

Anotações: Vera Duarte Lorza

Revisão: Vera Duarte Lorza e Pedro Camargos

Versão 2.0: junho/2014 – Apenas as aulas que serão cobradas na segunda avaliação.

Qualquer erro encontrado, favor informar: [email protected]

ATENÇÃO: o presente documento não constitui material oficial do curso

(09/05 ) A Empresa no Mercado e o Poder Econômico: relações empresariais de organização e

atuação

Estado se relaciona com a empresa de acordo com três perspectivas, importando para nós hoje os

mecanismos de relacionamento do Estado com empresas que detém o poder econômico. Para falar disso

é inevitável que saibamos o que estamos tratando quando falamos de poder econômico. O conceito

intuitivo dele nos mostra que ele nada mais é que a capacidade que o agente tem de determinar em

alguma medida a forma com que o setor econômico em que ele atua será organizado. Como na sociedade

capitalista sempre haverá um estado organizando as medidas econômicas, ele disputa esse espaço com as

empresas e a medida que ele domina esses espaços ele se torna mais intervencionista. Isso é fundante do

que chamamos de constituição econômica.

Os três mecanismos utilizados para tal organização:

1. Poder compensatório: situações em que o Estado atua diretamente em alguns setores da

economia para que por meio de sua atuação regule essa organização, compensando a atuação da

empresa privada. Seria por meio das estatais que isso seria feito. O estado pode até monopolizar

um setor, como ocorre com o petróleo. Quando ele o faz, e assim determina o preço no começo

da cadeia (no caso na matéria prima usada para fazer combustível), há concorrência, mas ela é

quase que determinada pelo estado; isso pode ser demonstrado no preço da gasolina, que varia,

mas não muito.

2. Regulação: estado regula os agentes econômicos nesse setor, regulando padrões de entrada,

padrões financeiros (valores mínimos para que a empresa possa fazer tal tipo de serviço), preço,

etc. Como exemplo, temos o setor de telecomunicações, de energia elétrica, etc. De acordo com

o interesse no momento, o estado pode regular mais ou menos.

3. Política concorrencial/ anti truste: ao contrário das duas outras é vista como padrão mínimo

de intervenção estatal. Normalmente a atuação do órgão responsável é uma atuação pontual e

residual, atuando de acordo como uma situação fática específica, ex post, partindo do

pressuposto que o padrão de qualidade e o preço, num mercado concorrencial, é aquele pois é o

melhor para o consumidor. Aqui no Brasil essa política assumiu uma importância muito grande,

mesmo existindo as outras duas (como nos outros países do mundo). Existiram saltos

qualitativos na aplicação dessa política, que começam efetivamente em 94com o plano real.

Afirmou aí que não existem exceções, ou seja, todas as empresas são submetidas a tal política,

inclusive as estatais, e que a decisão do órgão responsável por tal política, no caso o CADE, não

é submetidas aos outros órgãos que regulam os outros dois meios. Ex: Telefônica assumindo

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todo o controle da vivo, ANATEL concordou, CADE não prevalece a do CADE.

De uma maneira geral essa política anti truste teve uma evolução histórica. No seu nascimento veio com

a missão de restaurar os mecanismos da teoria neoclássica, sendo o consumidor o determinante do preço,

e de regular os excessos. Com as revoluções industriais percebe-se que o poder econômico não é residual

ao capitalismo, mas sim regra, o que traz dificuldades a tal política, que passa a adotar posturas mediante

isso. Nos anos 50, logo após a saída do fascismo e nazismo, período no qual a aliança do poder

econômico concentrado gerou temores anti democráticos, houve a tentativa de atuação mais incisiva do

órgão anti truste, com o objetivo de tornar a concentração de poder a exceção e não mais a regra. Já nos

anos 70, começa-se o crescimento do mercado global, com entrada de produtos estrangeiros nos EUA,

que percebe que vai perder sua primazia; isso faz com que se desenvolva uma nova política anti-truste,

difundida pela chamada Escola de Harvard. Nela admitia-se que a concentração de renda é regra do

capitalismo, e que o Estado, quando a tentava regular, gerava mais ineficiência; por isso, a política anti

truste deve se preocupar menos com isso, devendo manter o foco no crescimento da economia e não com

a divisão interna de recursos. Portanto, pregava-se que se algo gerasse eficiência deveria ser permitido. Já

nos anos 90 e 2000, com a eleição de Obama, volta-se ao padrão anterior, com a tentativa de uma política

anti truste mais incisiva.

No Brasil, a economia e o Estado andam lado a lado, de forma harmônica, somente havendo

interferências pacíficas, tendo a cultura da defesa da concorrência difícil, havendo a necessidade de se

desvencilhar da cultura de captura de renda pelo Estado. Hoje, devido a isso, acusam o CADE de ter

parado no tempo, mas ele está seguindo a doutrina mundial, e busca atuar de forma incisiva. A lógica de

atuação de tal órgão vai de encontro com a ideia de que é impossível ter um anti truste sem valores

políticos , afinal, tais valores sempre estiveram por traz da política anti truste e a jurisprudência sempre os

levaram em consideração. Além disso, em muitos casos a concentração econômica leva a concentração

política e, já que a democracia depende de informação igualitária de todos, quando a concentração é

muito elevada o Estado vai ter que intervir, o que vai contra a lógica liberal. A atuação de tal órgão,

como já visto, é residual (pois a política anti truste é vista como a forma menos intervencionista), e a

economia é concentrada, portanto, os órgãos responsáveis devem agir sobre a compra e venda de

empresas, sobre as tarifas de importação, câmbio, política anti dumbing, servindo como entrave a

políticas do governo que sejam contrárias, já que não pode mitigar a economia per si (ex: não pode falar

pra empresas de um ramo se desmembrarem). Os interesses que o órgão anti truste defende, quando está

agindo, são difusos, ou seja, é o da população como um todo. Isso significa dizer que quando o CADE

recusa uma fusão significa que ele fez uma conta e percebeu que se ele tivesse aceito o mercado

consumidor perderia, e nem mesmo perceberia, e, portanto, não se mobiliza diante disso. As empresas,

mesmo tendo menos gente, tem maior força de pressão, se mobilizando muito mais. A reação da

sociedade, porém, é importante, para combater interesses das grandes empresas e também do governo.

Partindo pro desenho institucional, a política de defesa da concorrência no Brasil nasce com uma lei feita

em 62 que só passa a ser importante em 94, pois ela sai do âmbito de controle de preço e vai para a

regulação da concorrência. Além disso, é nessa data que o CADE se torna uma autarquia e estabelece o

controle de atos de concentração. A lógica de controle utilizada se divide em dois tipos de controle:

1. Controle e estruturas: controla a fusão e aquisição de uma empresa sobre a outra. Fusão e

aquisição são operações societárias lícitas, mas dependendo das características delas e das

empresas podem levar a abuso econômico, por isso devem ser enviadas ao CADE. Começou

(94-2012) sendo uma verificação a posteriori.

2. Controle de condutas: controle de condutas que podem ser prejudiciais a economia. Ex: cartel.

Na lei de 2011 (que entrou em vigor em 2012): cria-se uma nova autarquia que antes estavam em outras

secretarias, e transforma-se o controle de estruturas a priori, ou seja, concentração só é consumada após

aprovação do CADE. No controle de estruturas e condutas tem-se um método, que é diferente para

condutas e estruturas unilaterais e as que não são unilaterais. No controle de condutas e estruturas

unilaterais o tem-se um processo parecido, em que primeiro analisa-se o efeito da condutas ou estruturas.

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Para isso, deve-se identificar qual o mercado que atua, tanto do ponto de vista geográfico, quanto do de

produtos (quem compete com que, quais são os produtos que substituem, no ponto de vista da oferta, a

concorrente consegue dominar o mercado logo em seguida, da demanda- o consumidor migra diretamente

para o outro) e depois medir a participação de cada uma nesse mercado. A presunção da lei é que a

partir de 20% tem-se problemas. Se não tiver deve-se analisar os problemas de barreira na entrada. Se

não tiver problema, analisar qualitativamente a rivalidade (inovação tecnológica, por exemplo). Se não

houver, analisar a eficiência. Quando falamos de cartel, mesmo sendo uma conduta, o processo é um

pouco diferente. Quando identifica-se o acordo formador do quartel, pressupõe-se que aquilo tem efeito

negativo no mercado, dimensionando somente a multa pelo efeito, não sendo a necessária a análise

anterior de quão ruim é o efeito daquilo no mercado para punir. Nesse caso o processo é muito mais

parecido com o criminal, tanto na busca de provas, quando na execução (bisca e apreensão e etc).

Em todas as situações o CADE pode investigar de ofício, mas a maioria dos casos começa com denúncia

externo.

(16/05) A empresa e seu perfil objetivo. Patrimônio e estabelecimento.

1. Conceito e natureza jurídica de estabelecimento:

A ideia de patrimônio está ligada a atividade empresarial, sendo ele o conjunto de posições jurídicas

ativas e passivas da empresa que são avaliáveis em pecúnia e, por isso, o conjunto de bens

empregado pelo empresário em sua atividade. Esse patrimônio tem um regime específico que é

alinhado com a ideia de estabelecimento. Este, por sua vez, é o conjunto de bens, materiais e

imateriais, destacado pelo empresário para exercício da atividade empresarial, conceito definido no

art. 1142 do CC.

A natureza jurídica do estabelecimento é de universalidade de fato (que está definida no art. 90 do

CC), o que pressupõe três características: a existência de um complexo de coisas autônomas (ou

seja, um conjunto de bens singulares, i. é, que tem funções específicas) mas que tem destinação

unitária; eles o tem essa destinação devido a vontade do sujeito, no caso o dono. Já a natureza do

patrimônio é de também uma universalidade de direito (art.91,CC), pois este é algo estático mais, ao

contrário estabelecimento, que depende de um fato e é dinâmico. Nela, as características são: a

existência de um complexo de posições jurídicas ativas e passivas que tem uma destinação

unitária devido a vontade da lei.

2. Elementos que compõem o estabelecimento:

2.1. Bens materiais, móveis ou imóveis

Hoje é pacífico que o imóvel faz parte do estabelecimento. Seria contraditório admitir que o

ponto comercial integre o estabelecimento, mas não o imóvel onde ele está instalado, mesmo que

alugado. Isso não quer dizer que quando se aliena o estabelecimento e sou locatário do imóvel

aliena-se o estabelecimento também, mas sim a posição jurídica do proprietário.

VERÇOSA discorda: A tutela do estabelecimento não abrange a tutela do imóvel no qual se

localiza. Neste caso, por exemplo a venda do estabelecimento não pode ser objeto de um único

instrumento contratual, devendo a transferência do imóvel ser feita por meio de contrato de

compra e venda específico.

2.2. Bens imateriais ( como a propriedade intelectual)

Também fazem parte do estabelecimento. São eles:

a. Insígnia do estabelecimento(nome empresarial):

Conceito: é o nome escolhido pela empresa – ou melhor, pelo empresário individual,

pela sociedade empresária ou pela EIRELI - para o exercício de sua atividade. Ex:

"Companhia Brasileira de Distribuição", por exemplo, é o nome da sociedade

Obs: Acordo de leniência- pessoa vai ao CADE, admite que participou de cartel, mostra

documentos, e em troca tem extinção da punibilidade penal e administrativa.

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anônima do “Pão-de-Açúcar”.

Função: “tem a mesma função do nome civil – ou seja, a identificação do empresário,

para todos os fins de direito, nos negócios que ele vier a realizar no exercício de sua

atividade” e sua proteção “decorre automaticamente do arquivamento dos atos

constitutivos da firma individual e de sociedades e de suas alterações” (Lei 8.934/94,

art. 33, c/c NCC, art. 1.166)”. (VERÇOSA, Haroldo M. D. Curso de Direito

Comercial. Vol. 1. 2ª Ed. Malheiros: São Paulo, 2008, p. 290).

Formas de constituição:

i. Firma ou razão social: se diferem somente pois empresários individuais têm

firmas e sociedades empresárias tem razão social É comum que se tenha o

nome do empresário individual, seguido de uma designação ou descrição de

sua atividade - como "Da Silva Cabeleireiro". A indicação da atividade na

firma é frequente, mas, ao contrário do nome, não é obrigatória. Assim,

firma (empresário individual) ou razão social (sociedade empresária) é

nome empresarial que contém o nome dos que participam da atividade.

Em se tratando de empresário individual, o próprio nome do empresário; no

caso de sociedades empresárias, cada tipo tem suas regras específicas, mas

em geral usa-se o nome dos sócios de responsabilidade ilimitada. Com a

alteração no regime das limitadas e com o pouco uso dos demais tipos

societários, a firma é utilizada essencialmente por empresários individuais.

ii. Denominação social. Esse tipo de nome empresarial é caracterizado pela

ausência do nome dos sócios, havendo uma expressão fantasia. Se o nome

empresarial for uma denominação, a exigência de veracidade se apresenta de

forma menos intensa. Todavia, a expressão fantasia não pode ser

completamente desconexa da atividade exercida. Assim, a denominação não

pode conter atividade que não é realizada, nem pode induzir terceiros a erro -

não pode conter a palavra "construtora" se a sociedade empresária não for

efetivamente uma construtora.

b. Título:

Conceito: é diferente de insígnia do estabelecimento, sendo somente a identificação

deste. No exemplo, “Pão de Açúcar” é o título do estabelecimento

É regulado no art. 1164 do CC, que proíbe a alienação de tal título através do

trespasse, e é por isso que não se usa muito tal mecanismo de compra e venda. .

c. Expectativa de lucros (aviamento):

Conceito: é a aptidão do estabelecimento de produzir lucro, que é evidenciada na

diferença entre o valor da soma dos bens que integram o estabelecimento e o valor

econômico daquele negócio (Ex: a soma de bens de um estabelecimento é X. Porém, o

ponto e a clientela incorporam esse valor, sendo o aviamento de 2X). Segundo Oscar

Barreto, é o “resultado de um conjunto de vários fatores pessoais, materiais e

imateriais, que conferem a dado estabelecimento in concreto, a aptidão de produzir

lucros

Tipos:

i. Aviamente objetivo: Decorre dos elementos objetivos do estabelecimento:

dos bens, de sua forma de organização, matéria-prima de alta qualidade,

equipamento mais avançado, etc. Em um restaurante, por exemplo, uma

comida muito saborosa comporia o aviamento objetivo.

ii. Aviamento subjetivo: ligado a características pessoais do dono do

estabelecimento.

Clientela:

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É a manifestação externa do aviamento . Seria o “conjunto de pessoas que, de fato,

mantém com o estabelecimento relações continuadas de procura de bens e serviços.”

“A clientela não é um bem material, objeto autônomo de direito; é uma situação de

fato, à qual se atribui um valor econômico, muitas vezes relevante, que é protegido

indiretamente pela lei”(Oscar Barreto). Embora agregue valor ao estabelecimento,

pessoas não podem ser alienadas, portanto, quando se aliena um estabelecimento não

se pode garantir que ela irá junto (muitas vezes isso não acontece por aspecto

subjetivos do aviamento). Isso gera conflitos, tendo o direito que lidar com essa

questão.

O primeiro caso que envolveu essa questão foi em 1908, que envolveu uma disputa

entre Rui Barbosa X Conde Álvares Penteado, com a alienação da fabrica de juta e

a companhia nacional de tecidos de Juta. O que ocorreu foi que em 11 de janeiro de

1908, Conde Álvares Penteado alienou a Fabrica Sant’Ana à Sociedade Anônima

Companhia Nacional de Tecidos de Juta, por 3 mil contos de réis. Após a alienação,

Conde estabeleceu-se novamente, mediante a Companhia Paulista de Aniagem.

Quando os clientes souberam que ele– e depois de sua morte, seus sucessores –

operava um novo estabelecimento, deixaram de contratar com a Companhia Nacional

de Tecidos de Juta e se tornaram clientes da Companhia Paulista de Aniagem.A

Companhia Nacional de Tecidos de Juta, representada por CARVALHO DE

MENDONÇA, ajuizou ação pleiteando perdas e danos pelo desvio de clientela, em

face dos sucessores do Conde – os quais, eram representados por RUI BARBOSA

Os argumento jurídicos da Companhia Nacional de Tecidos de Juta (José Xavier

Carvalho de Mendonça eram que:

o Clientela faz parte do estabelecimento e com ele foi vendida.

o Clientela é atraída por características pessoais do empresário titular do

estabelecimento.

o Valor dos bens é inferior ao preço de venda em 3 mil contos de réis, que

correspondeu a “reputação dos produtos” (aviamento) e a “freguesia”.

o Ao alienar o estabelecimento, Conde renunciou ao exercício de indústria

similar.

o Proibição de restabelecimento decorre das circunstâncias do negócio, não há

exigência que seja formal.

o Ao se restabelecer, Conde (i) não “fez boa a coisa vendida”, violando os

artigos 214 e 215 do Código Comercial; e (ii) agiu de má-fé.

Já os sucessores de Rui Barbosa alegam que:

o Conde não estava legalmente obrigado a deixar de exercer “indústria

similar”.

o Renúncia não se presume. Além disso, deve ser restrita no tempo, no espaço

e no objeto.

o Trata-se de estabelecimento industrial, não comercial. Clientela não é atraída

pelas características pessoais do empresário. Não seria razoável esperar que

o Conde soubesse que havia vinculação a ele.

o Excesso de três mil reais corresponde a “valor da posição conquistada em

mercado pela Fabrica Sant’Anna”.

o A eventual obrigação de não restabelecimento é pessoal e não se transfere

aos herdeiros do Conde.

Rui Barbosa ganha a causa, mas hoje perderia por causa do art. 1147 do CC que

afirma: “Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não

pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subsequentes à transferência.

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Parágrafo único. No caso de arrendamento ou usufruto do estabelecimento, a

proibição prevista neste artigo persistirá durante o prazo do contrato”. A discussão

que se coloca com essa lei, então, é o conceito de "concorrente" e qual o espaço de

concorrência. A cláusula de concorrência existia, mas às vezes abusava do conceito

espacial, temporal ou do produto o que ia contra o objetivo de proteção da clientela

(ex: compra-se uma fábrica de manteiga no interior de São Paulo e proíbe-se que o

alienante se estabeleça em todo território nacional para a produção de laticínios). Isso

tinha a ver com a vontade de expansão daquele que estava comprando. Porém, a

clientela da expansão ainda não existia, seria uma proteção futura, o que não é

permitido. Isso fez com que o CADE cria-se uma jurisprudência: 5 anos, no mercado

relevante para a venda de tal produto.

d. Bom nome do empresário

e. Ponto comercial

f. Contratos relacionados com a atividade do empresário

g. Bens inerentes à chamada ‘propriedade industrial’ (marcas e patentes)

3. Trespasse do estabelecimento: é um método de alienação do estabelecimento

3.1. Eficácia da alienação perante terceiros (art. 1.144 CC): o contrato só produzirá efeitos contra

terceiros após o cumprimento das formalidades (averbação à margem da inscrição do

empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis e

publicação na imprensa oficial), salvo prova de que o terceiro tinha conhecimento.

3.2. Exigência de pagamento ou consentimento de todos os credores, se ao alienante não

restarem bens suficientes para solver o seu passivo (art. 1145, CC): dívidas passaram a fazer

parte do estabelecimento também, passando todas as posições jurídicas nos contratos para o

comprador. Se a dívida for maior que o crédito é necessário o pagamemto de todos os credores

ou consentimento expresso, sendo essa a regra geral. A regra especifica é a do art, 129, IV, CC.

3.3. Responsabilidade do adquirente pelos “débitos” do estabelecimento

a. Art. 1146, CC: é a maior novidade do CC 2002. Antes, entendia-se que o estabelecimento

só compreendia elementos do ativo (com exceção dos débitos trabalhistas e tributários, que

têm regulação própria). Desse modo, o adquirente somente se responsabilizaria por dívidas

posteriores, permanecendo as anteriores com o alienante. No novo código, o comprador fica

responsável também pelas dívidas anteriores, porém o devedor primitive (ou seja,o

vendedor) fica obrigado solidariamente ao comprador pelo period de um ano.

b. Art. 1148, CC: determina que o adiquirente acaba entrando no polo passivo ou ativo de

todas as relações obrigacionais do alienante, o que decorre do proprio CC, que estabelece

que estabelecimento é composto por bens, passivos e ativos. Isso mostra que o Novo Código

Civil instaurou no direito positivo brasileiro o conceito de “propriedade dinâmica” ou

propriedade-pertinência” do estabelecimento. Os bens que compõem o estabelecimento

podem estar lá a diversos títulos: “podem ser de propriedade do empresário, podem estar

alugados, podem estar em consignação, podem estar – o que é freqüentíssimo – a título de

leasing, como os computadores, por exemplo”. Assim, “quem aliena um estabelecimento

empresarial vai transferir ao comprador todos aqueles contratos de leasing, de locação etc.

que são pertinentes àqueles bens. Isto é que é o conceito de “propriedade-pertinência” ou

“propriedade dinâmica”. Essa, então, é a inovação”.

c. Art. 299, CC: Segundo a regra do art. 1.146, o credor do crédito vincendo não precisa anuir,

pois precisa esperar o vencimento para cobrar. Mas há a solidariedade de um ano em seu

benefício. Já no 299 o credor precisa anuir e autorizar

3.4. Responsabilidade do adquirente por débitos tributaries (art. 133 do CTN): ou a

transferência é total, ou subsidiaria quando o alienante continuar com a exploração econômica.

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3.5. Responsabilidade do adquirente por débitos trabalhistas (arts 10 e 448 da CLT):

“Art. 10, CLT. Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos

adquiridos por seus empregados.”

“Art. 448, CLT - A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os

contratos de trabalho dos respectivos empregados.”

Em razão da interpretação jurisprudencial dos Arts. 10 e 448 da CLT, atribui-se ao adquirente a

responsabilidade por débitos trabalhistas. Na prática, cobra-se de qualquer um: alienante,

adquirente, membro de grupo econômico, todos acabam sendo imputados, pois adota-se uma

lógica de pagamento

3.6. Cessão de créditos referentes ao estabelecimento (art. 1149, CC): o alienante era credor. Nessa

situação, os respectivos devedores viram devedores do adquirente desde o momento da

publicação da transferência. Se o devedor tiver saudado a sua dívida com o ex dono do

estabelecimento ele esta isento, e se ele deve trasnferir para o novo dono, é uma questão entre os

donos.

Declínio dessa tecnica se deu pois há o problema da responsabilidade solidaria, matéria trabalhista e

tributária e possibilidade da in transferência do nome empresarial, que esta ligadO ao aviamento e a

expectativa de lucro, acaba tendo um valor muito grande, preferindo-se outros meios de ações societárias

(compra de ações, etc).

(23/05) A Empresa como Instituição. A macroempresa e sua função social

1. Características:

O perfil institucional da empresa esta relacionado com a ideia de empresa como organização, o que

traz características:

o A empresa é, por este perfil, vista como um núcleo social organizado em função de um fim

econômico comum e não mera soma de relações individuais de trabalho. É a organização de

pessoas formada por empresário, empregados e colaboradores

o Seu Funcionamento afeta interesses de diversos agentes, inclusive interesses externos a ela e

por isso a instituição sofre incidência de diferentes ramos do direito, ou seja, não só do direito

societário, mas também de outros ramos.

o Prenúncio da ideia de função social da empresa:

- Essa ideia ganha força principalmente na segunda metade do século XX, no pós guerra

- Ela vai de encontro com a ideia de que a matéria empresarial não é de exclusivo

interesse privado, ou seja, dos acionistas da empresa, e nem de exclusivo interesse do

Estado; seria um interesse público não estatal, sendo o interesse da sociedade como um

todo; tal fato está expresso na frase de Comparato: “Se se quiser indicar uma instituição

social que, pela sua influência, dinamismo e poder de transformação, sirva de elemento

explicativo e definidor da civilização contemporânea, a escolha é indubitável: essa

instituição é a empresa”. Essa escolha é indubitável exatamente por conta da ideia de

empresa como instituição, da empresa como motor do desenvolvimento do capitalismo,

da empresa como polo organizador das relações sociais e econômicas na sociedade, e da

empresa, em alguma medida, vista como instrumento do qual o estado lança mão para

atingir determinados objetivos. Seria a ideia já demonstrada (anteriormente) da empresa

como microcosmos da sociedade, tendo um ambiente constitucional que organiza as

relações de poder internos, algumas relações externas, mediante algumas imposições do

direito e que ela realiza algumas atividades de organização do mercado criando uma

burocracia interna também. É por conta da eficiência dessa instituição como força motriz

do sistema capitalista que ela cumpre o papel mencionado por Comparato.

2. Elementos da definição de empresa:

Art. 996 do CC/02: Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica

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organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços

Então se pressupõe que como a empresa é uma atividade organizada e planejadora de determinadas

atividades econômicas há uma relação de hierarquia, comando e poder, dentro dela, que congrega os

fatores de produção para colocar os bens de serviço no mercado. Quanto maior o poder da empresa

em determinados mercados, maior a capacidade dela de transformar o seu planejamento individual,

setorial e do próprio mercado. É nesse sentido que, dependendo do modelo constitucional que

organiza a atuação da empresa, que esse poder pode se configurar como algo que se contrapõe ao

poder do Estado ou de maneira complementar a ele de organizar determinados mercados, e por isso a

importância da regulação tanto interna quanto externa dessa instituição.

3. Definição de interesse social:

Ganha importância devido os efeitos mencionados, ou seja, é difícil imaginar que uma empresa

dominante em determinado mercado, cujo planejamento empresarial impacta na organização do

próprio mercado não tenha que lidar com interesses públicos que sua atuação interage ou impacta. É

dessa perspectiva que se imagina que a empresa deve cumprir alguns deveres específicos perante a

sociedade ou uma função social. A questão toda é que teoricamente parece fazer sentido, mas como

viabilizar isso na pratica? Como o ordenamento jurídico viabiliza a absorção desses interesses e

como isso sai da empresa na forma de sua atuação? É isso que fez com que houvesse uma discussão

muito grande no direito societário do século XX sobre essas teorias dos interesses sociais.

a) Contratualismo:

- Surge antes da concepção institucionalista,tendo seu maior desenvolvimento na Itália.

- Assim como temos uma visão contratualista sobre o surgimento do Estado, com as teorias

do contrato social, que tem uma influência liberal, temos também a transposição disso para

a teoria da empresa. Nessa perspectiva, o interesse da empresa seria, num primeiro

momento, o interesse dos sócios. Ou seja, o interesse social não inclui nenhum elemento

externo – é dizer, o interesse social é definido como o interesse dos sócios e

exclusivamente dos sócios atuais, que, normalmente, visam a maximização dos lucros da

própria sociedade, afinal, ele retornará para o próprio sócio. Por isso, a assembléia-geral

tem poderes absolutos para definir o interesse social e a organização societária. A

sociedade passa a ser vista como coisa dos sócios.

- Porém, com o desenvolvimento do próprio mercado de capitais a teoria contratualista

precisa se renovar. Isso porque, com a pulverização do capital social dessas sociedades,

que passam a ter vários sócios, tendo alguns poderes de gestão e outros não, e as ações

sendo constantemente comercializadas no mercado de capitais, essa visão de empresa

como “coisa dos sócios” passa a sofrer desafios: poderia continuar vinculada ao interesse

dos sócios, mas de que sócios? Os que possuem poder de gestão? Os atuais ou os futuros?

Por que se as ações estão sendo negociadas no mercado de capitais, nem se sabe ao certo

quem são os sócios e quais seus interesses, afinal a maximização dos lucros sempre é

somente um interesse a curto prazo, que pode prejudicar a empresa futuramente. A solução

do contratualismo para isso foi afirmar que o interesse da empresa é o interesse dos sócios

presentes e futuros. Nessa última perspectiva, a preservação da empresa ganha relevo

enquanto interesse a ser tutelado. Assim, o interesse social na visão contratualista moderna

é identificado com a maximização do valor de venda das ações dos sócios.

b) Institucionalismo:

- A teoria institucionalista, por seu turno, teve origem e maior desenvolvimento na

Alemanha, no contexto da segunda guerra mundial.

- Nessa visão a empresa serviria para realizar o seu objeto social, e ele tem a ver com o

interesse público, que seria o interesse de ter as necessidades da sociedades sanadas por

essa organização social. Portanto, as teorias institucionalistas procuraram compreender o

interesse social sob um prisma mais amplo e atento às necessidades sociais. Assim, o

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interesse social passou a ser visto como o interesse da empresa, e não mais como o

interesse dos acionistas.

- Assim, se parte da perspectiva: “O fim da empresa é construir riqueza para a comunidade,

oferecer trabalho, melhorar a técnica, favorecer o progresso científico- e não simplesmente

buscar lucros para distribuição aos sócios. Nesse prisma, os pequenos acionistas (que

especulam somente para maximizar o valor das suas ações, ou seja, só prezam pelo

interesse a curto prazo) são inimigos da empresa, pois, movidos pelo egoísmo, sacrificam

o interesse geral em prol de seu exclusivo benefício”.

- O interesse coletivo que justificaria as pessoas jurídicas não poderia se identificar, pura e

simplesmente, com a soma dos interesses individuais dos seus sócios. Isso acarreta a

necessidade da presença de alguém que não seja sócio que responda e garanta o interesse

da empresa, que é suprasocietário. É nesse contexto que surgem os grandes

administradores, que a despeito de alguns momentos, se sobrepõem a interesses dos

sócios, acabando ter por objetivo garantir a preservação da empresa e a realização de seus

interesses perante a comunidade como um todo.

- Essa teoria, porém, também evoluiu passando para a perspectiva pensar o interesse da

sociedade de uma maneira mais procedimental ou instrumental. Seria o institucionalismo

integracionista. O interesse social é o interesse harmônico e comum dos vários sócios e

dos trabalhadores, que se traduz no interesse na preservação da empresa. Seria a

integração desses interesses, o dialogo deles, impondo alguns níveis de responsabilidade

especiais pros administradores de transparência de deveres de lealdade e diligencia perante

esses fatores internos e externos a empresa. Dado esse pressuposto, é a preservação da

empresa que será o norte para resolução de conflitos internos da empresa. É também na

Alemanha que surge tal perspectiva, que para realizá-la colocou trabalhadores nos órgãos

deliberativos das empresas.

4. Modelos para o tratamento de conflitos sociais:

Surgem das duas perspectivas de gestão do interesse social.

a) Shareholders model: duas perspectivas

A. Retórica ideológica em torno do direito de propriedade. Está relacionado com uma

perspectiva contratualista. Defende-se que há uma relação entre os sócios e a sociedade de

conteúdo dominial (ou patrimonial), conduzindo à conclusão de que o desrespeito aos

interesses dos sócios da empresa importaria uma violação à sua sociedade. É no âmbito

dessa retórica especifica que se problematiza a separação entre propriedade e controle e que

se procura garantir maior proteção aos acionistas minoritários. Esse problema surge nos

anos 30 em que os proprietários de capital deixam de controlar sua própria riqueza e acabam

delegando esse poder aos administradores. É para garantir esse modelo de shareholders que

o direito societário norte-americano desenvolveu diversos mecanismos para a proteção de

acionistas minoritários, assim, a empresa não é absorvida pelo interesse dos

administradores, mas sim fica submetida aos interesses dos acionistas em geral

B. Racionalidade econômica: o modelo de governança centrado na proteção dos acionistas é o

mais adequado por gera eficiências que se traduzem no próprio resultado da atuação da

empresa e na consequente proteção dos interesses de terceiros afetados, trabalhadores e

consumidores inclusos.

b) Stakeholders model: se opõe à visão de que o principal interesse a ser protegido pelas regras de

governança é o interesse dos acionistas-proprietários, portanto, se liga mais a visão

institucionalista, se apegando à importância da responsabilidade social da empresa. Por essa

perspectiva, consumidores, trabalhadores e a comunidade em geral têm interesses nas decisões

sobre a administração das empresas, de maneira que a ideia de que os administradores trabalham

exclusivamente visando ao benefício dos acionistas é uma ficção jurídica incorreta e simplista.

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Portanto, estes são os controladores de fato dessa companhia e por isso tem deveres perante os

acionistas e a sociedade como um todo, passando o direito societário a regular também estes

interesses sociais. Assim, há um dialogo mais intenso entre direito societário, direito da

concorrência, direito dos consumidores e etc.

5. Impacto desse modelo no desenvolvimento dos países:

Estudos foram feitos sobre o impacto desses dois modelos no desenvolvimento do mercado de

capitais de cada país, e daí do desenvolvimento econômico dos países e até da estruturação da

organização industrial. Em um dos artigos de Marc Roll ele coapara os modelos, pois existe uma

discussão de qual seria o melhor deles. Na década de 90 com a globalização, chegou-se a tese de fim

da história do direito societário, pois admitiu-se que o shareholder seria o melhor. Roll discorda

disso, pois esse modelo poderia ser melhor considerando as características especificas dos EUA, que

fez com que ele fosse o mais eficiente. Ele constata que numa economia em que o poder econômico

é concentrado, como no Brasil, em que temos nos principais setores da economia poucas empresas

dominando esses mercados o shareholder é ruim pois ele tem como objetivo principal maximizar o

interesse dos acionistas, ou seja, maximizar o valor das suas ações que seria uma perspectiva a curto

prazo, estimulando as empresas a isso. Se o mercado for concentrado, ou seja, as empresas tem poder

econômico, elas tendem a usar de maneira mais abusiva esse poder econômico quando utilizado esse

modelo, pois elas querem viabilizar o maior lucro possível para garantir o interesse de maximizaçao

das ações e não possuem muita concorrência. Utilizando-se o modelo de stakeholder, em que o

administrador tem mais poder para realizar outros interesses dos acionistas de curto prazo ele pode

fazer a opção de, por exemplo, ao invés de abusar do poder econômico aumentando os preços, usar

os recursos decorrentes do tamanho dele no mercado para expandir sua participação do mercado

reduzindo o preço ou para investir em inovação, novos produtos e serviços, que no fim dialogaria

mais com a perspectiva não rentista da empresa, mas sim de preservação dela.

Já em economias em o poder econômico é difuso, como nos EUA, o modelo de shareholder não

seria tão problemático, pois existe um ambiente concorrência acaba sendo impossível que a empresa

não invista na sua própria preservação, em inovações e desenvolvimento tecnológico pois isso é

necessário para a própria sobrevivência dela.

6. Implicações institucionais desses modelos: modelos implicam em sistemas dentros das empresas

a) Sistema de capital disperso (EUA e Reino Unido): Caracterizado por mercado de capitais forte,

exigência de transparência, monitoramento dos administradores e papel disciplinador de um

mercado ativo de disputa pelo poder de controle.

Nos EUA temos um shareeholder model, que visa maximizar o interesse dos acionistas, mas

quem é responsável por essa preservação é o administrador, que num sistema de capital

pulverizado é quem detém o controle, por isso ele é um fenômeno factual e não jurídico, ou seja,

é quem detém o poder de fato de dirigir a sociedade. Pressume-se que se tem um acionista que

tem mais de 50% das ações, é o controlador, mas quando não há esse fato, o que é muito comum

nos EUA, quem exercer o controle é a administrador, chamando esse controle de controle

gerencial.

b) Sistema de capital concentrado (Maioria dos países da Europa Continental e Japão):

caracterizados pela presença de um acionista controlador majoritário, timidez do mercado de

controle acionário e mercado de capitais insuficientemente forte (sobretudo em comparação com

os primeiros). Nesses países, o grande instrumento de financiamento das empresas é o sistema

bancário. A grande diferença é que o sistema bancário (principalmente na Alemanha) se acopla

ao sistema empresarial, de uma perspectiva de parceria, de investimento e participação da

atuação empresarial, e menos de uma perspectiva rentista que é o que aconteceu no Brasil.

7. O caso brasileiro:

Não adotamos o modelo institucionalista puro e nem o modelo contratualista puro, pegando de pior o

que tinha dos dois em alguma medida. Antes dos anos 2000, as empresas brasileiras jamais contaram

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com o mercado de capitais como fonte real e estável de captação de recursos. Como reflexo disso, a

estrutura de capital das empresas sempre se caracterizou pela alta concentração. Portanto, temos duas

características importantes: a estrutura de capital é concentrada (na maioria das empresas tem um

controlador majoritário identificável, ou seja, temos uma coincidência entre controle e propriedade) e

o controlador tem muito poder. O controlador, portanto, pode decidir de acordo com o seu interesse e

contra todo o interesse da companhia é que o mercado de capitais brasileiro não se desenvolveu, pois

isso gerava uma desconfiança no mercado, pois os investidores nunca saberiam se o controlador

estaria visando o seu interesse próprio ou o interesse da companhia, afinal, não entregariam seu

dinheiro para beneficiar somente uma pessoa.

Diferentemente do que aconteceu na Alemanha, aqui a concentração não implicou associação alguma

entre bancos e indústria. Não se verificou o surgimento de uma classe de financistas capaz de

administrar posições ativas ou passivas na indústria de longo prazo, como no modelo continental

europeu, pois havia um único banco de investimento que era o BNDES. Os bancos privados lidavam

com as empresas financiando empréstimos somente de capital de giro. Então é dessa perspectiva que

o modelo brasileiro não se enquadra no sistema de capital concentrado.. No contexto brasileiro, a

concentração de poder no controlador e a exigência de baixa participação no capital social para

assumir o controle favoreceu estratégias rentistas/patrimonialistas, ou seja, o controlador para o ser

não precisa deter a maioria do capital, mas sim da maioria das ações com direito a voto (lei permitia

que até 2/3 das ações não tivessem direito a voto, com 17,5% das ações era possível ser controlador,

ou seja, determinar o que ia ser feito com 100% do capital social). Então, buscava-se por estratégias

rentistas ou patrimonialistas, pois estava-se arriscando com o dinheiro dos outros.

A Lei das S.A. de 1976 e foi muito elogiada por Comaparato, pois ela reconheceu a figura do

controlador. Aí temos a divergência entre Comparato e Calixto, pois este afirma que ela reconheceu a

figura do controlador, estabilizou sua figura, reconheceu-lhe direitos como sócio empreendedor e

alguns deveres perante a sociedade, porém não fez nada para mudar o modelo.

Ela foi a forma brasileira do descolamento entre propriedade e controle, pois estabeleceu (o já

explicado) que ações preferenciais1 cujo direito de voto podia ser suprimido e que podiam

corresponder a até 2/3 do total das ações. Além disso, o modelo inserido por ela dividiu a função

empresarial em três subpapéis distintos:

o Empresário empreendedor – acionista controlador

o Administrador de empresa (que acaba sendo o próprio controlador aqui no Brasil, pois é ele

quem decide como será composto o conselho de administração. Aos poucos as leis e o Novo

Mercado foram mitigando esses poderes, pois viram que isso era necessário para que elas

conseguissem investimentos)

o Aplicador de capital de risco (especulador)

Ao mesmo tempo que ela dá um poder muito grande ao controlador, ela adota uma visão que

diverge da contratualista, de que o acionista minoritário só é especulador e não visa o bem da

empresa em si, precisando a empresa ser defendida disso e esse alguém seria o controlador que pelo

art. 166, parágrafo único, e pelo art. 154, acaba sendo aquele responsável por assegurar os

interesses da empresa. É significativo o fato de o legislador de 1976 ter se utilizado da expressão

“interesse da companhia” em várias passagens, para o fim de distingui-lo do interesse dos acionistas.

Seria o pior dos mundos pois a lei confere a um acionista, que no caso é o majoritário, o poder-dever

de assegurar os outros interesses da coletividade. A grande questão que se tem é, além da

dificuldade de operacionalizar os interesses desses outros agentes, como aferir se a empresa está

realmente o fazendo. Hoje isso se dá por outras legislações, como a defesa do consumidor, defesa

1 Ações Preferenciais Nominativas são aquelas que menos protegem o acionista minoritário, porque não lhe dá o direito de votar

em assembleia e ainda, em caso de venda da empresa, não lhe garante o direito de participar do prêmio de controle (que nada mais é

do que um valor maior pago ao acionista que detém o comando da empresa). Ações Ordinárias Nominativas dão o direito de votar

nas assembleias da empresa. Com a lei das SAs 76 define-se que para cada ação Ordinária a empresa pode emitir duas ações

Preferenciais (proporção de 2/3). Hoje essa proporção é de 50%.

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ambiental, defesa da concorrência, etc.

Nos Anos 2000 temos um novo ciclo de desenvolvimento no Brasil pelas características:

O PIB acima de 4% ano. Em 2008 o Brasil se torna credor externo pela primeira vez.

Concessão ao Brasil do grau de investimento pela STANDARD & POOR’S, seguida por

outras agências de análise de risco.

Conjuntura internacional torna-se ainda mais positiva para o crescimento do mercado de

capitais

Com isso temos a Lei n° 10.303/2001 que reforma da lei societária, alguns dizem que ela foi tímida,

mas ela dá maior proteção aos não controladores. Com ela, volta o direito de tag along, que tinha na

lei das SAs de 76 mas que foi suprida em 97 devido as privatizações. Era a necessidade da oferta

pública dos acionistas minoritários numa aquisição de controle, voltando o limite de 80% do valor,

ou seja, quem compra o controle tem que pagar no mínimo 80% do que pagou pelas ações do

controlador, sendo uma forma de transferir uma parte do prêmio de controlo pro acionista

minoritário.

Porém, os avanços mais importantes ocorreram na auto-regulação: lançamento, em 2000, pela

BOVESPA, dos níveis diferenciais de listagem – Nível 1, Nível 2 e Novo Mercado, com regras mais

rigorosas de proteção aos minoritários. Além do surgimento do ambiente regulatório de Governança

corporativa. Basicamente o que ela faz são modelos de interação interna na relação entre

controlador, acionistas e administrador que visam criar regras e procedimento para organizar uma

maior proteção do acionista minoritário e, portanto, uma maior transparência na administração da

empresa para, assim, dinamizar o mercado de capitais. Algumas regras que compõe esse movimento

de governança corporativa são:

- reforço do poder que os acionistas têm de selecionar e destituir administradores (selection

and removal);

- reforço do poder de intervir na administração, votar, iniciar ou ratificar decisões

administrativas (initiation and ratification);

- estratégias de incentivo (reward), que busquem recompensar a lealdade dos gestores por

meio de retornos financeiros (regime de pay-for-performance bônus ou outras

compensações), evitando conflitos de interesse;

- proteção de acionistas minoritários por meio de tratamento igualitário, como a distribuição

estritamente pro rata de dividendos, o que faz com que os controladores tentem maximizar

os retornos também dos minoritários;

- trusteeship strategy, que procura eliminar os conflitos de interesse ex ante, utilizando

agentes desinteressados, públicos ou privados, que, agindo como trustees, tenham que

aprovar ou ratificar determinados atos.

A regulação atualmente aplicável a questões de governança corporativa envolve três níveis distintos

e complementares de normas:

- Hard law: Lei das S.A., Código Civil, CVM e Sarbanes-Oxley (lei norte-america que se

aplica a algumas empresas brasileiras que tem acionistas americanos)

i. Lei 6.404/76 (Lei das SAs):

Prevê sistemas de controle e supervisão dos atos dos administradores

Controles internos: órgãos com atribuições diversas (Assembleia, Conselho de

Administração, Conselho Fiscal, Auditoria Interna)

Controles externos: auditoria externa

Deveres fiduciários do acionista controlador e administradores

Dever de lealdade

Dever de informar

Não exercer abusivamente poder de controle

Dever de diligência

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Não agir em conflito de interesses

Voto múltiplo e voto em separado

Conselheiros independentes,ou seja, cada vez mais desligados da figura do

controlador.

Proibição de interlocking, ou seja, uma mesma pessoa que exerce cargos

deliberativos em duas empresas concorrentes. Ex: Abílio Diniz que era presidente do

conselho de administração do Pão de Açucar e da BRF, que era principal fornecedora

do Pão de Açúcar.

Regra de conflito de interesses(regra principal)

Art. 115: conflito entre acionistas

Deliberação tomada devido ao voto do acionista que tem interesse conflitante com a

sociedade é inválida. Esse conflito de interesses esta muitas vezes ligado em que o

acionista tem um interesse particular.Nessas situações o acionista será responsável

por danos e será obrigado a transferir para a companhia as vantagens que ele obteve.

Art. 156 : conflito entre administradores

É vedado ao administrador intervir em qualquer operação social em que tiver

interesse conflitante com o da companhia. É seu dever informar o seu impedimento e

fazer consignar a natureza e extensão do seu interesse.

Apesar da vedação geral à atuação em hipótese de conflito, a lei autoriza a

contratação com a companhia, ou seja, se eu sou um administrador ou acionista

(pessoa jurídica) eu posso vender coisas para a companhia de que sou acionista,

desde que em condições razoáveis ou equitativas, considerados os preços e demais

condições de mercado (art. 156, § 1º).

ii. Sarbanes-Oxley (2002)

Lei americana criada em resposta aos escândalos contábeis que atingiram grandes

companhias americanas. Maior reforma do mercado de capitais americana desde a

introdução da regulamentação após a crise de 1929. Se aplica a todas as empresas

que tenham ações listadas nos EUA, inclusive ADRs (American Depositary

Receipts).

Cria o Public Company Accounting Oversight Board – responsável pela regulação e

fiscalização das empresas de auditoria, que foram as que não conseguiram detectar o

que estava acontecendo em 2008. Estabelece standards de conduta para garantir

independência dos auditores externos e restringir hipóteses de conflito de interesses

(proíbe prestação de alguns serviços por auditores: avaliações, consultorias...).

Determina rotação do sócio da empresa de auditoria responsável pelo relatório a cada

5 anos. Responsabilidade por fraude corporativa e criminal com o aumento de

multas, que chegam a USD 5 milhões e das penas de prisão podem variar de 10 a 20

anos (No Brasil: 1-4 anos).

- Autorregulação: Novo mercado, CAF

Adesão ao Novo Mercado é voluntária

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Esse conjunto de regras dos anos 2000 configurou o desenvolvimento do mercado de

capitais brasileiro pela adesão das empresas ao Novo Mercado ou, pelo menos, ao Nível 1

da BOVESPA. Isso viabiliza a contemporização do poder da Lei das SAs que é um modelo

de capital concentrado, que dá grande ao poder ao controlador e sendo ele o responsável por

assegurador do cumprimento dos interesses sociais, que acabavam coincidindo com os seus

próprios, pois havia muito pouco controle e fiscalização. Então temos uma perspectiva de

um lado institucionalista, na Lei das SAs, pois elas tinham que promover o interesse dos

exteriores ao dos sócios, mas isso funcionou muito mais como uma declaração de princípios,

e ao mesmo tempo um modelo de Shareholder pela metade, pois no fim não era um modelo

que viabilizava o interesse da empresa como o interesse de todos os acionistas, mas sim o do

controlador, atribuindo ao acionista minoritário a função somente de especulador. Essa visão

preconceituosa do acionista minoritário se rompe quando a partir do Novo Mercado se

fornece mais poder a eles e com isso temos o desenvolvimento do mercado, provando que

eles não querem somente especular, mas também ter acesso as informações, a variar o

investimento e com a preservação das SAs. Isso faz com que talvez nós viabilizemos, em

alguma medida, um shareholder model mínimo aqui no Brasil com uma perspectiva

(Que podem circular livremente na bolsa)

Lei das SAs

Não se pode proibir

que quem tenha menos

de 5% das ações vote

Ou seja, não é

decisão somente da

diretoria

Regra mais

importante. No

novo mercado

quem comprar o

controle deve se

oferecer a comprar,

pelo mesmo valor

que ele pagou nas

ações do

controlador, todas

as ações dos outros

acionistas. No caso

da Lei das SAs é de

80% para as ações

ordinárias. Para as

preferenciais não há

obrigação

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institucional que vá caminhar a médio e longo prazo para a integração desses interesses. Na

visão do professor, já é um avanço no que tínhamos antes.

- Soft Law: Código das Melhores Práticas, IBGC, Principles of Corporate Governance,

OCDE

(06/06) Formas de exercício da atividade empresarial

No Brasil existem três situações possíveis:

1. Empresário individual:

o Definição: são empresários individuais, ou sejas, pessoas físicas que exercem atividades

empresariais, sendo necessário o registro na Junta Comercial.

o Está em predominância no contexto brasileiro; em números (até 2005): 51% de empresários

individuais, 48% e sociedades limitadas apenas 1% de outros tipos de sociedades, sendo a

maioria sociedades anônimas.

o Característica principal: patrimônio não se separa do empresário, se comunicando totalmente

com o patrimônio da atividade empresarial, sendo isso uma forma desvantajosa pois não há

como se falar em desconsideração da personalidade jurídica nem em responsabilidade limitada.

o De 2012 pra cá, com a lei 12441/ 2011, temos a criação da Empresa Individual de

Responsabilidade Limitada, que viabiliza a segmentação do patrimônio, e o exercício da

atividade do empresário por meio de uma pessoa jurídica de um sócio só, o que na Alemanha

costuma-se chamar de sociedade unipessoal. Isso fez com que uma mesma pessoa física pudesse

ter dois patrimônios distintos, revisando-se o conceito de unicidade do patrimônio e visando-se

o estímulo a atividade econômica. O que tínhamos no Brasil, antes de tal lei (e que ainda temos

por motivos que serão explicitados abaixo) eram sociedades individuais substancialmente

individuais, mas, muitas vezes, formalmente limitadas ou simples, alocando-se 0,001% do

capital social para outra pessoa somente para poder se configurar como sociedade.

- Características:

Empresa com um único sócio

Só é permitido ter uma EIRELI por pessoa

Ela só se forma se o capital for integralizado (ou seja, tem que estar lá) e o mínimo

é de 100 salários mínimos; tal característica tem o objetivo de limitar a fraude de

credores

- Criticas: a criação da EIRELI não resolveu o problema das empresas que eram

substancialmente individuais mas formalmente limitadas, pois o requisito do capital ter que

ser integralizado e de no mínimo 100 salários mínimos fez com que a criação de uma

empresa desse tipo fosse muito cara, o que nos faz perceber que ela não vai resolver o

problema pois não terá adesão.

- Discussão: outra questão importante sobre as EIRELIs é que a lei fala que temos uma

PESSOA como único sócio, sem especificar se é física ou jurídica. Muitas juntas comerciais

não aceitam que seja jurídica, e a doutrina crítica muito isso, tendo um PL em tramitação

que visa concretizar que pessoas jurídicas também podem atuar como o único sócio.

2. Sociedade:

o Definição (art. 961, CC): é uma associação de pessoas com fins econômicos que reúnem seus

esforços para distribuição dos resultados. Essa definição afirma que a sociedade é um contrato

associativo, ou seja, um contrato instrumental de organização, o que pressupõe a existência de

uma organização dos meios para exercício dessas finalidades específicas e, portanto, as

contribuições dos sócios que destinam-se a permitir o desenvolvimento da atividade social e

criar a organização que cuidará de desenvolver a atividade prevista no contrato. A função de

tais contratos é de organizar direitos, deveres, estrutura societária, mecanismos de deliberação,

sujeições e responsabilidades dentro da organização criada.

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o Diferenciações:

a. Sociedade X Associação: se distinguem no objetivo que perseguem; a sociedade visa

lucro, a associação não (podendo ter renda). Ambas podem tem objetos econômicos, mas

não finalidade econômica, que só a sociedade tem. Essa diferença reflete no tratamento

jurídico dado pra cada tipo. Ex: quando se dissolve uma sociedade, no processo de

liquidação, os recursos que sobraram vão pros sócios. Numa associação, os recursos que

sobram pós liquidação não vão para os associados, mas destinado a outras entidades com

fins não econômicos, estando elas mencionadas no próprio estatuto da associação.

b. Sociedade X Condomínio: condomínio está associado ao compartilhamento de um bem,

ou seja, várias pessoas sendo proprietárias de um bem, podendo esse bem gerar lucro,

ativos ou receita mas a questão toda é que a atividade do condomínio se coloca em função

do bem, para garantir a sustentabilidade do bem, para garantir que ele permaneça do jeito

que ele está. Na sociedade é ao contrário, os bens que a compõem existem em função dela.

Existe um debate na doutrina se os fundos de investimento tem natureza condominial ou

de sociedade pois a distinção da entre fins e meios buscados por eles não está tão clara

ainda.

o Tipos de sociedade: as sociedades brasileiras tem tipicidade fechada, ou seja, não se pode

criar um novo tipo de sociedade, só podendo ser criadas sociedades previstas na legislação.

Temos:

a. Sociedade personificadas: se conformam na forma de uma pessoa jurídica. Têm

autonomia patrimonial. Ex: sociedade anônimas, sociedade limitada, sociedade

simples.

b. Sociedade não personificada:

- Sociedade comum: aquela que ainda não se regularizou, ou seja, que tem o

registro na junta comercial mas esta ainda não o deferiu, ou ainda não pediu o

registro. Antes chamada de sociedade irregular ou de fato. A regra geral dela é

que durante esse período não a responsabilidade limitada (portanto, bens do

sócio são ligadas a do sociedade). Existia um debate na doutrina sobre

sociedade irregular e de fato, pois afirma-se que sociedade regular era aquela

que existia depois do pedido de registro e antes da concessão pela junta e a de

fato que existia antes dos dois. Hoje chamamos ambos de sociedade comum,

não tendo o debate mais utilidade.

Além de termos três situações possíveis temos diferentes regramentos da vida societária, que mostram

como se dá o arranjo da organização societária em geral. São eles:

1. Ordenamento societário:

o É responsável pela determinação da finalidade, do fim social, que é a pedra angular do direito

societário pois é o que vai dar parâmetro ao comportamento dos sócios e administradores no

ponto de vista da legalidade ou da ilegalidade. Ex: crise da Sadia em 2008- Sadia tinha usado

seus rendimentos para investir no mercado de derivativos e com a crise de 2008 ficou muito

prejudicada economicamente. A sociedade tinha um administrador, porém mesmo essa

postura tendo gerado muita renda pros sócios (através do balanço não operacional, que seria

aquilo adquirido não pela venda dos produtos mas por outros meios), o que determinou a

responsabilidade ou não deles seria o enquadramento ou não dessa postura com a finalidade

social da empresa, através do que chamamos de business judgment rule. Isso não significa

que um administrador não pode errar, mas sim que a culpa dele é graduada, significando que

será menor se ele errou para perseguir o fim social da empresa e maior se extrapolou este.

Para os liberais o fim de toda sociedade é lucro, então se ele conseguiu lucro estava

cumprindo a finalidade social. Já para os menos liberais, haveria assimetria e informação entre

acionistas e administrador, não podendo responsabilizar os acionistas por isso pois eles

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estavam confiando no administrador. Além disso, se este não estava cumprindo a finalidade

social da empresa ele deve ser responsabilizado.

o É responsável pela organização da formação da vontade interna e manifestação externa da

companhia, ou seja, ou seja, pelas regras de formação da vontade interna, como o quorum de

deliberação.

o É responsável também pelo status socii, ou seja, pela disciplina dos direitos (patrimoniais, de

informação, fiscalização e retirada, isto é, como ele pode sair da companhia) e dos deveres dos

sócios (contribuir, colaborar para a gestão e ser leal) entre si e perante a sociedade. Portanto,

são as regras relativas ao status dos acionistas.

2. Ordenamento patrimonial:

o Regula as regras de transferência do patrimônioentre a organização societária e os sócios. Ou

seja, como, quando, porque, em algumas situações especificas, os acionistas têm direito a

auferir seus dividendos.

o Regula também a responsabilidade nas relações internas e externas: qual o limite da

responsabilidade dos acionistas ou da companhia.

o Decisão sobre quem os credores devem acionar em caso de dividas da sociedade.

3. Ordenamento da empresa:

o Responsável pela organização interna da empresa, administração e direção. Ou seja, como a

companhia vai ser organizada, portanto, define quem é competente para gerir a empresa

(Conselho de Administração, Diretoria), quem nomeia e destitui os administradores, quais

são os princípios que devem nortear a gestão e qual o grau de independência dos

administradores em relação aos acionistas.

o Também disciplina o grupo de empresas, uma das coisas mais importantes hoje, ou seja,

regula a relação entre as empresas dependentes e dominantes e sua influencia na dinâmica

interna das empresas do grupo. Hoje temos no direito societário grupos de fato e grupos de

direito, sendo a maioria de fato, ou seja, não se constituem formalmente como grupo, não

existe um contrato consorciando essas empresas, mas sim relações societárias entre

empresas. E as vezes isso tem uma holding não operacional, ou seja, que não exerce uma

atividade econômica própria, mas cuja única função é organizar a participação do grupo, e

gerenciar as participações societárias. Por isso, as vezes o que fica vinculado ao

ordenamento da empresa é a discussão sobre a padronização das relações dentro do grupo

econômico.

o É responsável, além disso, pela disciplina das prestações de conta, ou seja, pela fiscalização

e publicação, que hoje no Brasil é muito regulado sobrando muito pra autonomia da

empresa com relação as prestações de conta.

A microempresa não é propriamente outra forma de exercício empresarial e sim uma qualificação que

pode incidir sobre as demais de acordo com seu faturamento. O Estatuto da Microempresa é a lei

complementar 123, que dá concretude à previsão normativa da CF, no art. 170, que favorece tal empresas

qualificadas de tal maneira. Essa qualificação traz facilidades como: (i) a desnecessidade de assinatura de

advogado no contrato de constituição de microempresa; (ii) o registro dos atos constitutivos, suas

alterações e extinções (baixas) ocorre independentemente da regularidade de obrigações tributárias,

previdenciárias ou trabalhistas, principais ou acessórias, do empresário, da sociedade, dos sócios, dos

administradores ou de empresas de que participem; (iii) redução das taxas a serem pagas em órgãos

públicos.

Regime jurídico do empresário

Requisitos:

1. Exercício profissional da empresa (art. 966 CC); ideias relacionadas a:

o Reiteração.

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o Habitualidade.

o Especialidade.

o Risco.

o Intuito de lucro.

o Finalidade econômica.

2. Registro:

2.1. Obrigatoriedade:

Art. 967, CC: “É obrigatória a inscrição do empresário no Registro Público de Empresas

Mercantis da respectiva sede, antes do início de sua atividade.”

o Consequências da ausência de registro: irregularidade. A

Ausência de registro não tira o caráter de atividade, nem o caráter empresarial, mas é

requisito para a regularidade do exercício da atividade.

Arts. 97 e 48 da Lei de Recuperações e Falências (Lei n. 11.101/05):

impossibilidade de requerer recuperação, auto-falência ou falência de outro

empresário.

Essa irregularidade faz com que a sociedade seja tratada como uma sociedade comum, e,

portanto é aplicado o regime desse tipo específico (arts. 986 a 990 CC), o que acarreta

responsabilidade ilimitada dos sócios pelas dívidas da empresa.

2.2. Requisitos para o registro:

Art. 968, CC: “A inscrição do empresário far-se-á mediante requerimento que contenha:

I - o seu nome, nacionalidade, domicílio, estado civil e, se casado, o regime de bens;

II - a firma, com a respectiva assinatura autógrafa;

III - o capital;

IV - o objeto e a sede da empresa.

§ 1 Com as indicações estabelecidas neste artigo, a inscrição será tomada por termo no livro

próprio do Registro Público de Empresas Mercantis, e obedecerá a número de ordem contínuo

para todos os empresários inscritos.

§ 2 À margem da inscrição, e com as mesmas formalidades, serão averbadas quaisquer

modificações nela ocorrentes.”

3. Capacidade:

Art. 972, CC: “Podem exercer a atividade de empresário os que estiverem em pleno gozo da

capacidade civil e não forem legalmente impedidos.”

Pleno gozo da capacidade civil. Arts. 1º a 5º do CC. Art. 180 CC.

Art. 5o A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de

todos os atos da vida civil.

Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:

V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que,

em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria”. Portanto, se o

menor com dezesseis anos completos e não tiver economia própria a incapacidade não cessa, mesmo

que este receba por herança alguma empresa.

3.1. Superveniência de incapacidade ou exercício pelos pais.

Art. 974, CC: “Poderá o incapaz, por meio de representante ou devidamente assistido,

continuar a empresa antes exercida por ele enquanto capaz, por seus pais ou pelo autor de

herança.

§3º - O Registro Público de Empresas Mercantis a cargo das Juntas Comerciais deverá

registrar contratos ou alterações contratuais de sociedade que envolva sócio incapaz, desde

que atendidos, de forma conjunta, os seguintes pressupostos:

I - O sócio incapaz não pode exercer a administração da sociedade

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II - O capital social deve estar totalmente integralizado

III - O sócio relativamente incapaz deve ser assistido e o absolutamente incapaz deve ser

representado por seus representantes”.

Tal artigo exige interpretação compatível com o artigo 972, §5º, V do mesmo Código; quando

os pais ou responsáveis do menor morrem e este herda a empresa temos duas situações: o menor

de 14 anos e menor de 16 anos aplica-se diretamente a regra desse artigo, e quando é maior que

16 anos aplica-se a regra do 972.

4. Ausência de impedimentos:

4.1. Leis especiais-Código Comercial (art. 2º.): o Código Comercial de 1850 tinha uma lista dos

proibidos de comerciar, o que não foi mantido pelo Código Civil de 2002. O Código Civil não

traz lista dos impedimentos, que estão em leis especiais. A identificação é relativa a cada

atividade ou a determinadas funções exercidas pela pessoa física. Por exemplo: juízes,

procuradores e promotores têm restrições a serem empresários, em razão de possíveis conflitos

de interesse.

4.2. Falido enquanto não extintas suas obrigações: além dos casos previstos em leis especiais,

também é impedido o falido enquanto não extintas suas obrigações. Aplica-se aos empresários

individuais, mas alguns tribunais estendem a sócios. Se for sociedade, falida é a sociedade, e

não os sócios – mas, evidenciada fraude ou conluio, é possível a extensão.

Efeitos do casamento:

Se aplica bastante ao empresário individual, tendo implicância direta na vida de sua atividade

empresarial.

1. Constituição do casamento e separação judicial: devem ser registrados na Junta Comercial

Art. 979, CC: “Além de no Registro Civil, serão arquivados e averbados, no Registro Público de

Empresas Mercantis, os pactos e declarações antenupciais do empresário, o título de doação,

herança, ou legado, de bens clausulados de incomunicabilidade ou inalienabilidade.”

Art. 980,CC: “A sentença que decretar ou homologar a separação judicial do empresário e o ato de

reconciliação não podem ser opostos a terceiros, antes de arquivados e averbados no Registro

Público de Empresas Mercantis.”

Face oposta da exigência de averbação do casamento. O credor só pode ser cientificado se a

separação foi averbada em Registro Público. O objetivo deste é justamente dar publicidade e produzir

efeitos dos atos perante terceiros. Até o registro, há eficácia somente entre as partes, mas não entre

terceiros.

2. Contratação de sociedade.

Art. 977,CC: “Faculta-se aos cônjuges contratar sociedade, entre si ou com terceiros, desde que não

tenham casado no regime da comunhão universal de bens, ou no da separação obrigatória.”

Essa regra diz que se o sujeito tiver num regime de separação obrigatória ele não pode ser sócio da

esposa, com o objetivo de impedir a união do patrimônio com a constituição de uma sociedade;

aquilo que tava separado por lei e a sociedade transforma num patrimônio só.

No caso do regime de comunhão universal de bens, o motivo é o inverso, pois na medida que cria-se

uma sociedade, separa-se o patrimônio, que foi unido pela vontade das próprias partes algum dia.

Mesmo não tendo coerência fazer a mesma coisa por motivos diversos, o artigo faz.

Segundo VERÇOSA, esse foi um tema que suscitou grande controvérsia no passado. Essas

sociedades vinham sendo aceitas pelo Direito Comercial, mas sofrendo enormes restrições no âmbito

do “Direito do Trabalho e Tributário, nos quais tem sido muito comum a desconsideração da

personalidade jurídica pela alegação de fraude na constituição de tais sociedades, ou, simplesmente, o

não-reconhecimento da eficácia da separação patrimonial quando os cônjuges eram os únicos

sócios”. Isso porque as sociedades só eram feitas com o objetivo de separar o patrimônio da pessoa

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jurídica para evitar que este seja “contaminado” em caso de dividas das pessoas físicas, esses ramos

do direito pediam a desconsideração da personalidade jurídica do casal que era sócio para poder

atingir o patrimônio da empresa. Mas diante da previsão do Código Civil de 2002, sociedades entre

cônjuges são plenamente válidas, desde que estes sejam casados em regime de comunhão parcial, de

participação final nos aquestos ou de separação obrigatória.

3. Alienação de bens imóveis.

Art. 978,CC: “O empresário casado pode, sem necessidade de outorga conjugal, qualquer que seja

o regime de bens, alienar os imóveis que integrem o patrimônio da empresa ou gravá-los de ônus

real.”

É exceção ao regime geral do Código, segundo o qual o indivíduo, ao se casar, passa a necessitar da

outorga uxória para a prática de certos atos. O exemplo mais patente é a alienação de bens imóveis.

Mas o Código também estabelece que o aval e a fiança (garantia real), comum em matéria de títulos

de crédito, dependem da outorga do cônjuge.

Escrituração da atividade: dever do empresário.

Art. 1.194,CC: “O empresário e a sociedade empresária são obrigados a conservar em boa guarda toda

a escrituração, correspondência e mais papéis concernentes à sua atividade, enquanto não ocorrer

prescrição ou decadência no tocante aos atos neles consignados.”