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Dança de Salão: possibilidades de intervenção pedagógica por meio da Educação Física Aparecida Romeiro Calixto 1 Debora Gomes 2 Resumo: Embora faça parte dos conteúdos da Educação Física, a dança de salão geralmente é pouco explorada na escola, no entanto, quando é proposta, um grande número de alunos, em sua maioria meninos, tem dificuldade de aceitar as atividades por timidez, discriminação e/ou concepção cultural. Diante do exposto, este estudo teve por objetivo investigar as possibilidades de intervenção pedagógica em torno do conteúdo Dança de Salão nas aulas de Educação Física, valorizando a cultura local e promovendo uma reflexão acerca da apropriação da Dança pela Indústria Cultural. A proposta foi desenvolvida em dois anos, distribuídas em quatro momentos: elaboração do projeto; elaboração do caderno pedagógico; implementação da proposta descrita no caderno pedagógico realizada no primeiro semestre de 2015, formação de Grupos de Trabalho em Rede (GTR) no período de setembro a dezembro de 2015; e relato por meio da produção deste artigo. Por meio de atividades pedagógicas, além de inserir possibilidades com o trato do conteúdo dança de salão, foram realizadas vivências voltadas para a percepção do corpo, a socialização, o potencial rítmico e expressivo, a criatividade, o espírito de cooperação. Por fim, apesar de observarmos vários pontos positivos em relação à implementação do conteúdo de Dança de Salão nas aulas de Educação Física, ressaltamos a dificuldade de desenvolvermos um trabalho pedagógico sistematizado com todos os conteúdos previstos para disciplina, uma vez que duas aulas semanais se tornam insuficientes diante da diversidade de conteúdos existentes e descritos nos documentos oficiais. Palavras-Chave: Educação Física. Dança de Salão. Mídia. Gênero. 1. Introdução As primeiras práticas de atividades físicas no Brasil foram dos indígenas, os quais praticavam nado, remo, luta, corrida, arco e flecha, dentre outras, necessárias para sua sobrevivência. Aos negros trazidos como escravos, atribui-se a origem da prática de capoeira. Em ambos os casos a prática de tais atividades tinham cunho utilitário, mas também ritualístico, condição da dança realizada pelos índios e pelos escravos por meio da capoeira (MARINHO, 2011). Como prática sistematizada, a Educação Física começou a fazer parte das atividades nas escolas primárias e secundárias desde o século XIX, onde era denominada de Ginástica e tinha como objetivo difundir os ideais da sociedade do período. Dentre os intuitos com os quais a Educação Física foi desenvolvida nas escolas no século XIX e XX, destacam-se: higienista, militarista, esportivista e tecnicista, todos eles, entendendo que deve ser promovido uma prática de atividade física, a qual, irá “treinar, adestrar, disciplinar, eleger o melhor, separar os aptos dos inaptos”. 1 Professora da Rede Estadual de Ensino do Paraná, graduada em Educação Física (FAFICLA) e especialista em Ginástica de Competição (UEL), [email protected]. 2 Professora do Departamento de Educação Física da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), graduada em Educação Física (UEM) e mestre em Educação (UEM), [email protected].

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Dança de Salão: possibilidades de intervenção pedagógica por meio da Educação Física

Aparecida Romeiro Calixto1

Debora Gomes2 Resumo: Embora faça parte dos conteúdos da Educação Física, a dança de salão geralmente é pouco explorada na escola, no entanto, quando é proposta, um grande número de alunos, em sua maioria meninos, tem dificuldade de aceitar as atividades por timidez, discriminação e/ou concepção cultural. Diante do exposto, este estudo teve por objetivo investigar as possibilidades de intervenção pedagógica em torno do conteúdo Dança de Salão nas aulas de Educação Física, valorizando a cultura local e promovendo uma reflexão acerca da apropriação da Dança pela Indústria Cultural. A proposta foi desenvolvida em dois anos, distribuídas em quatro momentos: elaboração do projeto; elaboração do caderno pedagógico; implementação da proposta descrita no caderno pedagógico realizada no primeiro semestre de 2015, formação de Grupos de Trabalho em Rede (GTR) no período de setembro a dezembro de 2015; e relato por meio da produção deste artigo. Por meio de atividades pedagógicas, além de inserir possibilidades com o trato do conteúdo dança de salão, foram realizadas vivências voltadas para a percepção do corpo, a socialização, o potencial rítmico e expressivo, a criatividade, o espírito de cooperação. Por fim, apesar de observarmos vários pontos positivos em relação à implementação do conteúdo de Dança de Salão nas aulas de Educação Física, ressaltamos a dificuldade de desenvolvermos um trabalho pedagógico sistematizado com todos os conteúdos previstos para disciplina, uma vez que duas aulas semanais se tornam insuficientes diante da diversidade de conteúdos existentes e descritos nos documentos oficiais. Palavras-Chave: Educação Física. Dança de Salão. Mídia. Gênero.

1. Introdução As primeiras práticas de atividades físicas no Brasil foram dos indígenas, os

quais praticavam nado, remo, luta, corrida, arco e flecha, dentre outras, necessárias

para sua sobrevivência. Aos negros trazidos como escravos, atribui-se a origem da

prática de capoeira. Em ambos os casos a prática de tais atividades tinham cunho

utilitário, mas também ritualístico, condição da dança realizada pelos índios e pelos

escravos por meio da capoeira (MARINHO, 2011).

Como prática sistematizada, a Educação Física começou a fazer parte das

atividades nas escolas primárias e secundárias desde o século XIX, onde era

denominada de Ginástica e tinha como objetivo difundir os ideais da sociedade do

período. Dentre os intuitos com os quais a Educação Física foi desenvolvida nas

escolas no século XIX e XX, destacam-se: higienista, militarista, esportivista e

tecnicista, todos eles, entendendo que deve ser promovido uma prática de atividade

física, a qual, irá “treinar, adestrar, disciplinar, eleger o melhor, separar os aptos dos

inaptos”.

1 Professora da Rede Estadual de Ensino do Paraná, graduada em Educação Física (FAFICLA) e especialista em Ginástica de Competição (UEL), [email protected]. 2 Professora do Departamento de Educação Física da Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), graduada em Educação Física (UEM) e mestre em Educação (UEM), [email protected].

Somente no final do século XX surgiram abordagens teórico metodológicas

propondo para as aulas de Educação Física, a superação dos modelos utilizados até

então (higienista, militarista, esportivista, tecnicista), ampliando desta forma o papel

desta disciplina na escola.

De acordo com Marinho (2011, p. 139), Educação Física

é uma prática social, como em última instância são todas as atividades humanas. O seu pano de fundo é a questão pedagógica e não a médica. Contra tudo e quase todos, trabalhamos com valores; o que temos a determinar são os que fundamentam esta prática social. [...] Social, para nós, é sinônimo de coletivo, algo que atinja a todos, e não a alguns privilegiados.

Observa-se que atualmente a Educação Física não é mais somente uma

“atividade realizada para treinar/disciplinar o corpo”, mas sim, disciplina integrante do

contexto escolar que compõem a base nacional comum, ou seja, à partir da Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº 9.394 do ano de 1996, artigo 26,

parágrafo 3º, a Educação Física integrada à proposta pedagógica, passou a ser

componente curricular obrigatório da Educação Básica (Educação Infantil, Ensino

Fundamental e Ensino Médio).

A Educação Física é a disciplina responsável por tratar das atividades que

compõem a cultura corporal de movimento (esporte, ginástica, dança, lutas, jogos e

brincadeiras), “[...] é uma disciplina que trata, pedagogicamente, na escola, do

conhecimento de uma área denominada aqui de cultura corporal” (COLETIVO DE

AUTORES, 2009, p. 61).

Nesse sentido, partindo de seu objeto de estudo e de ensino, Cultura Corporal, a Educação Física se insere neste projeto ao garantir o acesso ao conhecimento e à reflexão crítica das inúmeras manifestações ou práticas corporais historicamente produzidas pela humanidade, na busca de contribuir com um ideal mais amplo de formação de um ser humano crítico e reflexivo, reconhecendo-se como sujeito, que é produto, mas também agente histórico, político, social e cultural (PARANÁ, 2008, p. 123).

Observa-se que dentre os conteúdos que estruturam o planejamento da

disciplina está a dança, que apresenta como um dos seus conteúdos específicos a

Dança de Salão. A opção por estudar esta temática se deu pelo fato da existência

de um projeto chamado Festival de Talentos, no qual em um dos dias ocorrem as

apresentações de dança. O que se tem observado nas apresentações é que os

meninos se apresentam em menor número, portanto a escolha pela Dança de Salão

também visa motivar os meninos se integrarem nas vivências de dança.

A escolha do curso de Meio Ambiente, decorre de ser as turmas do Ensino

Médio em que encontro-me atuando nos últimos anos. Quanto a dança de salão,

acredita-se que dançando a dois os meninos possam se interessar e participar

ativamente das aulas, além de ser um conteúdo pouco explorado nas aulas de

Educação Física, devido as limitadas oportunidades de estudo, vivência e

aprofundamento teórico metodológico em torno da dança de salão.

Dança é

[...] uma expressão representativa de diversos aspectos da vida do homem. Pode ser considerada como linguagem social que permite a transmissão de sentimentos, emoções da afetividade vivida nas esferas da religiosidade, do trabalho, dos costumes, hábitos, da saúde, da guerra, etc. (COLETIVO DE AUTORES et al, 2009, p. 81).

Diante do exposto, justifica-se este estudo que visou investigar as

possibilidades de intervenção pedagógica em torno do conteúdo Dança de Salão

nas aulas de Educação Física do curso técnico de Meio Ambiente, valorizando a

cultura local e promovendo uma reflexão acerca da apropriação da Dança pela

Indústria Cultural.

Pretendeu-se ainda, propor vivências de atividades que auxiliassem na

percepção do corpo, no despertar da sensibilidade e do espírito de cooperação,

permitindo o contato com diferentes manifestações corporais e valorizando a cultura

local, com vistas ao projeto educativo e à valorização do educando no processo de

ensino e aprendizagem.

2. Dança de Salão e Educação Física no Ensino Médio

A Diretriz Curricular da Educação Básica (DCEB) do Estado do Paraná, prevê

Dança de Salão como conteúdo específico da Educação Física no Ensino Médio.

Portanto, é de suma importância que se inclua este conteúdo no processo de ensino

e aprendizagem.

Por meio da dança de salão é possível explorar aspectos relacionados ao

desenvolvimento físico, motor, cognitivo, da criatividade, da percepção do corpo, do

espírito de cooperação e a da socialização, além de possibilitar o acesso ao

conhecimento das culturas expressas nesta manifestação, levando o aluno a tomar

consciência sobre a existência de diversas culturas, mas também da sua cultura,

integrando-se e percebendo a diversidade presente na sociedade, “[...] contribuindo

para a formação de indivíduos mais sensíveis, críticos, criativos e transformadores”

(BARRETO, 2008, p. 82).

De acordo com Barreto (2008), o trato com a dança deve ter como maior

objetivo o processo de desenvolvimento, a experiência como caminho para diversas

finalidades na formação de indivíduos críticos, criativos e de grande sensibilidade,

pois

Dançar... um dos maiores prazeres que o ser humano pode desfrutar. Uma ação que traz uma sensação de alegria, de poder, de euforia interna e, principalmente, de superação dos limites dos seus movimentos. Algumas pessoas não se importam com o passo correto ou errado e fazem do ato de dançar uma explosão de emoção e ritmo que comove quem assiste. Superam os entraves emoldurados pela vergonha e invadem as pistas de dança, mostrando numa expressão corporal todo sentimento por diferentes ritmos de música (BARRETO, 2008, p.1).

Em geral, os alunos gostam e se identificam com as aulas de Educação

Física, porém o conteúdo que buscam são os esportes coletivos. Neste contexto,

cabe a nós professores ao planejar as aulas, organizá-las de maneira que sejam

vivenciadas tanto atividades relacionadas ao esporte, quanto às relacionadas aos

demais conteúdos estruturantes previstos na DCEB (ginástica, dança, lutas, jogos e

brincadeiras).

A dança, assim como o esporte, é uma das manifestações da cultura do movimento mais importantes e relevantes em todo mundo. Ela vem se fragmentando cada vez mais em tipos e modelos diferentes e com o auxílio dos meios de comunicação e da indústria cultural, muitas vezes tem se orientado para a total desportivização. Entre as manifestações mais conhecidas da dança podemos citar a dança folclórica, a dança popular ou social, a dança carnavalesca, a dança de salão, o jazz e o ballet entre outras (KUNZ, 2004, p. 90).

O desafio que se coloca no cotidiano é ampliar as experiências corporais dos

alunos, sendo a Dança de Salão uma atividade que poderá contribuir para isto,

permitindo ao aluno a consciência do seu corpo que é importante para a vivência

não somente deste conteúdo.

A consciência corporal é, portanto, a capacidade que o indivíduo possui para reconhecer e controlar o corpo como um todo e seus componentes pelas partes segmentares e a partir daí alcançar habilidades motoras e possibilidades de explorar o inter-relacionamento com o outro, objetos e meio ambiente em geral pelos conhecimentos práticos da mecânica corporal (NANNI, 2008, p. 155-156).

A Dança de Salão colabora também na vida social de quem a vivencia, tendo

em vista que é comum em comemorações e encontros de grupos de pessoas esta

atividade, o que irá possibilitar ao aluno colocar em prática o que apreendeu, se

sentindo bem com ele mesmo, melhorando sua autoestima, trabalhando também

sua expressividade.

A dança pode contribuir para a área da Educação Física na medida em que, através da experiência artística e da apreciação, estimula nos indivíduos os exercícios da imaginação e da criação de formas expressivas, despertando a consciência estética, como um conjunto de atitudes mais equilibradas diante do mundo (BARRETO, 2008, p. 117).

Neste sentido podemos fazer com que os alunos se integrem no meio em que

vivem de forma dinâmica e atuante, conseguindo ser aceito por meio dessas

atividades sociais, sendo importante para sua autonomia, de maneira que no seu dia

a dia em outras atividades, a pessoa consiga se sentir mais segura e determinada em

suas atitudes.

3. Implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica

3.1 Relato da Implementação

A implementação do Projeto de Intervenção Pedagógica na escola, “Dança de

Salão: possibilidades de intervenção pedagógica por meio da Educação Física”, foi

iniciada no dia 12 de março no 3º ano e no dia 13 de março de 2015, no 4º ano,

ambos do Ensino Médio, curso de Meio Ambiente Integrado. O término da

implementação ocorreu somente nos dias 10 e 13 de julho, pois no período de 25 de

abril a 10 de junho ocorreu paralização das atividades escolares.

Foi realizada uma aula inaugural, a fim de explicitar como seriam as aulas e o

Projeto de Dança de Salão. Para um diagnóstico inicial sobre o conhecimento e a

vivência dos alunos em torno da Dança de Salão, foi entregue um questionário com

perguntas sobre o tema, em seguida foi realizada uma dinâmica de dança buscando

promover socialização entre os alunos.

Quanto ao conceito de dança de salão, a maioria dos alunos afirmaram que

são as danças realizadas em festas, bailes, casamentos... e estão relacionadas à

divertimento, lazer, e vinte e dois por cento (22,44%) dos alunos reconheceram

como manifestação da cultura que faz parte da vida das pessoas (tabela 01).

A maioria dos alunos (83,67%) afirmou já ter visto dança de salão em festas,

casamentos, aniversários e formaturas e ainda, sessenta e cinco por cento em

programas de televisão e filmes, porém a maioria não dança este estilo (tabela 02 e

gráfico 01).

Tabela 01: Conceito Dança de Salão

Respostas f %

Danças realizadas em festas/bailes/casamentos/baladas/salão/ ocasiões especiais/confraternização

17 34,69

Divertimento/animação/legal/lazer/bem-estar/não deixa ficar parado 15 30,61

Forma ou manifestação da cultura/faz parte da vida/popular 11 22,44

Vários ritmos/passos/músicas/técnicas 9 18,36

Dança a dois 9 18,36

Dança artística tradicionais/bela/bonita/bom 9 18,36

Atividade física/exercício para mente e para o corpo 7 14,28

Expressão Corporal/de sentimentos 5 10,20

Estilo musical 3 6,12

Hobbie 2 4,08

Comprometimento do casal 2 4,08

Sedução/envolvente 2 4,08

Adaptação de ritmo 1 2,04

Emprego 1 2,04

Dança elegante 1 2,04

Dança complexa 1 2,04 * O percentual total ultrapassa 100%, tendo em vista que os alunos atribuíram mais de uma resposta.

Tabela 02: Locais onde viram dança salão

Respostas f %

Festas/Casamentos/Aniversários/Formatura 41 83,67

Tv/filmes 32 65,30

Bailes 21 42,85

Apresentações/Festivais/Eventos 7 14,28

Internet 6 12,24

Escola de dança 5 10,20 * O percentual total ultrapassa 100%, tendo em vista que os alunos atribuíram mais de uma resposta.

Gráfico 01: Alunos que já dançaram dança de salão

No caso dos alunos que já dançaram dança de salão, a maioria afirmou que

dançam o estilo gaúcho, dança bastante realizada na comunidade local, geralmente

em festas, casamentos aniversários e formaturas (tabela 03 e 04).

Tabela 03: No caso de quem dança, quais as danças

Respostas f %

Gaúcha/vaneirão/vaneira/sete passos 18 78,26

Forró 2 8,69

Valsa 2 8,69

Não sei 2 8,69

Tango 1 4,34

Salsa 1 4,34

Sertanejo 1 4,34 * O percentual total ultrapassa 100%, tendo em vista que os alunos atribuíram mais de uma resposta.

Tabela 04: No caso de quem dança, onde dança

Respostas f %

Festas/casamentos/aniversários/formatura 14 60,86

Bailes 9 39,13

Aula de dança 5 21,73

Apresentação na escola/festival de talentos 2 8,69

Família e em casa 2 8,69 * O percentual total ultrapassa 100%, tendo em vista que os alunos atribuíram mais de uma resposta.

Como atividade para ser realizada na comunidade, foi entregue um

questionário com questões relacionadas às experiências com dança das pessoas

que viveram sua juventude nos anos 1970, 1980 e 1990, para isto, cada aluno

deveria entrevistar uma pessoa da família ou da comunidade.

Na segunda aula, a partir dos questionários respondidos foi feito um debate

com as respostas colhidas da comunidade. Todos os alunos fizeram a entrevista,

sendo que a maioria optou por conversar com os próprios familiares (tios, pais, avós)

(gráfico 02).

Gráfico 02: Participantes da entrevista sobre dança de salão

Alguns alunos relataram que ficaram surpresos com o fato de que seus

familiares participavam assiduamente dos bailes e ainda conheciam vários tipos de

danças, inclusive alguns nem imaginavam que seus familiares sabiam dançar tantos

ritmos. As danças mais citadas foram as gaúchas (xote, vaneirão, rancheira, bugio),

mas também apareceram valsa, sertanejo, discoteca, polonesa, lambada, axé, mpb,

rock, samba, bolero. Os locais apontados como espaços onde dançavam foram:

escolas, clubes, discotecas, residências, salão de bailes, depósitos e ginásios de

esportes (tabela 05 e 06).

Tabela 05: Locais em que os familiares/conhecidos dançavam dança de salão

Respostas f %

Bailes/discoteca/clubes/salões/matinês/baladas/casarões/ casas de show/barracões/associações/depósitos

41 83,67

Festas/casamentos/aniversários 23 46,93

Escola/ginásio de esportes 12 24,48

Não dançava 2 4,08

Terreirão de café 1 2,04 * O percentual total ultrapassa 100%, tendo em vista que os alunos atribuíram mais de uma resposta.

Tabela 06: No caso de familiares/conhecidos que dançavam, quais as danças

Respostas f %

Gaúcha/rancheira/vaneirão/chote/vanera/bugio 47 100

Valsa 10 21,27

Dance/discoteca/disc musica 8 17,02

Sertaneja 7 14,89

Lambada 5 10,63

MPB 2 4,25

Lenta 1 2,12

Polonesa 1 2,12

Axé 1 2,12

Samba 1 2,12

Bolero 1 2,12

Marchinha 1 2,12

Arrasta pé 1 2,12 * O percentual total ultrapassa 100%, tendo em vista que os alunos atribuíram mais de uma resposta.

Algumas curiosidades foram abordadas, uma delas foi que nos bailes dos

anos de 1980, o cavalheiro que estava sem par ficava com um chapéu e quando

este desejava dançar com uma dama, passava o chapéu para o cavalheiro que

estava com ela e este ficava com o chapéu a procura de uma nova dama para

dançar. Outra curiosidade é que em alguns bailes do interior, quando a dama que

era convidada para dançar e não aceitava, não poderiam dançar com mais ninguém.

Apenas a moça ou mulher acompanhada poderia recusar o convite dos que não

fossem seu companheiro. Também existiam normas de comportamento, dentre elas

não era permitido dançar muito colado, sendo que eram as próprias pessoas

participantes do baile que controlavam e até mesmo expulsavam quem não

respeitava as normas.

Na terceira aula foi vivenciado a movimentação proposta pelo método “Passo”

da autoria de Lucas Civiatta, o qual visa o desenvolvimento da percepção rítmica

combinada com o movimento realizada em quatro tempos. Em seguida os alunos

foram organizados em uma roda de mãos dadas, onde realizaram o movimento de

abrir e fechar as pernas deslocando para a direita e depois para a esquerda,

diminuindo a abertura até chegar em dois para lá e dois para cá. No final da aula foi

questionado com os alunos o que acharam da técnica desenvolvida por Civiatta,

sendo que os mesmos afirmaram que gostaram.

Na quarta aula foram assistidos os vídeos “Era uma vez uma outra Maria”

parte 1 e o trecho da novela Malhação. Ao final dos dois vídeos os alunos foram

divididos em pequenos grupos para responder questões sobre diferenças entre

atividades de homens e mulheres impostas pela sociedade, levando-os a um debate

sobre gênero e diversidade levantando pontos de consenso e polêmicas.

Na quinta aula foi apresentado por meio de slides a origem, história,

peculiaridades e tipos de Dança de Salão. No final, foi realizada a atividade de

deslocamentos em duplas que exploraram possibilidades de deslocamentos em

cima de linhas desenhadas no chão.

Na sexta, sétima, oitava e nona aula foi vivenciado o Forró. Por meio de slides

foi apresentado o histórico e o passo básico do forró. Também foram assistidos

vídeos com as variações do forró. Foram vivenciadas várias atividades com o passo

básico tradicional (dois para lá e dois para cá), passo participa, passo de costas,

forró arrasta pé (passo diferente, para frente e para trás), passo onda ou ondinha e

chuveirinho, sempre primeiro sem e depois com música. Durante a vivência dos

passos, observou-se que como a maioria dos alunos precisavam compreender e

realizar o passo básico, pouco dominaram as variações dos passos.

Na décima aula foi introduzido o assunto a Influência da Mídia e a apropriação

da dança pela Indústria Cultural. Foi lido um texto sobre o assunto e assistido dois

vídeos: Manipulação da Mídia e Influência da Mídia na Sociedade. A partir de três

questões sobre o assunto foi promovido um debate, que teve como mais um recurso

para reflexão a apresentação de uma charge. Foi solicitado ainda, a produção de um

texto sobre o assunto, o qual foi realizado em casa e entregue na aula seguinte. Por

meio dos textos dos alunos foi possível perceber que os mesmos têm consciência da

influência da Mídia que acaba impondo modos de agir e consumir para todos,

reconhecendo que as vezes consomem determinados ‘produtos’ para se sentirem

parte do grupo e porque sentem-se cobrados por todos para estarem dentre dos

mesmos ‘padrões’, no entanto, afirmaram que sabem da necessidade de serem mais

críticos diante do que lhes é imposto pela indústria cultural.

Na décima primeira aula foi iniciado o vaneirão, onde passou-se o histórico

por meio de slides e logo após o vídeo sobre o passo básico desta dança. Como o

vaneirão faz parte das atividades sociais e de lazer da comunidade, vários alunos já

sabiam dançar este ritmo, permitindo que ajudassem os que não sabiam dançar.

Na décima segunda e terceira aula vivenciamos o soltinho, onde foi

apresentado o histórico e depois passado vídeo sobre o passo básico, giro simples,

caminhada e relógio do soltinho. A vivência de várias atividades ocorreu sem e

depois com música.

A décima quarta e quinta aula foi organizada para a vivência da salsa, que

ocorreu por meio do conhecimento da história e características. As aulas estiveram

organizadas para que os alunos realizassem passo básico lateral, passo básico

frente e trás, giro da dama, cross body e giro do cavalheiro, sempre primeiro sem e

depois com música.

Na décima sexta aula, os alunos responderam um questionário sobre as

vivências promovidas pelo projeto de intervenção pedagógica, no qual registraram

suas opiniões sobre o conteúdo, o processo de ensino aprendizagem e a

transposição das vivências para o cotidiano fora da escola. Em seguida vivenciamos

todas as danças aprendidas durante as aulas e no final ao serem questionados

sobre a que mais gostaram, apontaram o vaneirão, o qual dançaram mais uma vez.

Para encerrar foi feito um agradecimento pela participação de todos.

O caderno pedagógico foi organizado com um número de atividades maior do

que necessário para as aulas, pois a ideia foi deixar opções para diversificar as

aulas entre as turmas, portanto, algumas não foram vivenciadas neste momento.

Quantos aos obstáculos, alguns alunos, por nunca terem tido acesso a dança

de salão, tiveram dificuldades na aprendizagem, principalmente os meninos, mas as

meninas da sala ajudaram a sanar estas dificuldades quando estavam dançando a

dois. Quando algum aluno apresentou dificuldades maiores, foram realizadas

intervenções individuais repetindo as movimentações.

Os alunos foram receptivos e colaboraram constantemente nas atividades,

demonstrando vontade de sanar suas dificuldades sem desistirem do objetivo. O 3º

ano demonstrou-se mais motivado até o último dia, inclusive vibrando com palmas

depois do término de cada ritmo que dançaram.

Por fim, na implementação do projeto PDE foi possível promover a vivência

de todos os ritmos propostos, possibilitando que todos os alunos conseguissem

fazer o passo básico de cada ritmo, além de refletirem sobre a questão de gênero e

influência da mídia muito constante no universo da dança. Observando o resultado

do trabalho, é possível considerar que o processo de ensino e aprendizagem foi

‘rico’, sendo uma opção para que no próximo ano outra turma possa vivenciá-lo.

3.2 Contribuições dos Professores Participantes do Grupo de Trabalho em

Rede (GTR)

Quando iniciou o curso do Grupo de Trabalho em Rede (GTR) apresentando

o Projeto de Intervenção Pedagógico aos cursistas, os dezoito participantes

concordaram que a Dança é um conteúdo importante, alguns relataram preconceitos

dentro da escola por parte da equipe pedagógica que chegou afirmar que a

professora estava promovendo “festinha, bagunça e desordem”, além da falta de

apoio e cooperação entre os próprios colegas da escola, que relatam o incômodo do

som, porém, afirmaram que quando o objetivo é promover uma festa/festival/mostra,

toda a escola (professores, funcionários, alunos, equipe pedagógica), apoia o

trabalho e cobra do professor de Educação Física a responsabilidade de preparar e

ensaiar as apresentações, chegando a liberar as aulas das demais disciplinas para

os ensaios.

Também destacaram existir lacunas na formação acadêmica, bem como, as

dificuldades como falta de espaço, falta de material e as vezes alunos que não

querem fazer aula devido a timidez, questões religiosas e de gênero. Seguem

alguns relatos do GTR:

[...] ocorre no colégio onde trabalho, que quando é trabalhado a dança em sala de aula, existe um pouco de resistência por parte de alunos, mas quando tem festival de dança, os alunos se envolvem de maneira natural, onde existe uma parceria de alunos não importando em que ano está, formam grupos e ensaiam no colégio (PROFESSOR A, 2015). Acredito que a dança deveria fazer parte de todos sem preconceito de cor, raça, sexo e religião. Mas alguns pais e alunos ficam a princípio com certo receio, é necessário trabalhar os preconceitos existentes, pois algumas

vezes os alunos não querem participar das aulas de dança por terem em mente que a dança os deixa “afeminados” [...] (PROFESSOR B, 2015). Já trabalhei com dança em sala de aula e uma das maiores preocupações, na minha opinião foi que os pais não pensassem que o professor estaria fazendo bailão, até mesmo professores de outras áreas destoarem com comentários errôneos [...] (PROFESSOR A, 2015). Uma mãe veio falar que o filho não poderia fazer aula de dança por que eles são da ‘igreja x’ onde dança é proibida, e pediu para dar um trabalho em substituição (PROFESSOR C, 2015).

Em outro momento foi solicitado a opinião dos cursistas com relação ao

Caderno Pedagógico e a possibilidade de utilização do mesmo na escola.

[...] está bastante claro, com objetivos bem definidos [...], coloca o conteúdo proposto de uma forma que vem ao encontro com nossos anseios e dificuldades no âmbito escolar (PROFESSOR B, 2015). Muito importante a diversificação dos ritmos e também o aprofundamento teórico sobre cada um, mostrando aos alunos a sua importância para o Brasil (PROFESSOR G, 2015). [...] muito interessante, de grande clareza e importância [...] e também ajuda no cotidiano escolar (PROFESSOR H, 2015). [...] serve de apoio para todos que querem colocar no seu planejamento a atividade dança na escola (PROFESSOR A, 2015). [...] muito interessante e o aprofundamento teórico bastante rico (PROFESSOR I, 2015). [...] conteúdo muito bem construído e bem embasado, um verdadeiro referencial e condutor para que possamos desenvolver também em nossos colégios (PROFESSOR F, 2015). [...] bem didático (PROFESSOR C, 2015).

Diante dos relatos, foi possível perceber a importância do Caderno

Pedagógico, enquanto ferramenta necessária e motivadora para a organização

didático pedagógica no cotidiano escolar.

A última etapa o GTR teve como objetivo socializar o relato das ações

implementadas, fomentando o grupo debater sobre os pontos positivos e negativos

da ação pedagógica desenvolvida, dentre os quais destacamos os seguintes:

É importante oferecer oportunidades de exploração e criação com o corpo envolvendo a dança. Deve estar pautado num processo pedagógico e a dança vem para quebrar esse gelo, que é essa resistência de alguns alunos (PROFESSOR A, 2015). Acredito que uma aprendizagem significativa ocorre efetivamente quando o professor domina o conteúdo, planeja e usa a metodologia possível e disponível (PROFESSOR D, 2015).

Quando nós enquanto educadores mostramos aos nossos alunos a dança além dessa visão limitada, ampliamos seus ‘horizontes’, onde a dança pode ser vista como uma atividade social, prazerosa, onde se amplia também a consciência corporal, estética, a expressividade, habilidades motoras e a relação com o outros, que a dança de salão proporciona de uma forma esplêndida (PROFESSOR E, 2015). O que achei mais válido foi a proposta de nossos alunos serem levados a pensar e reorganizar seus conhecimentos através de reflexões que podemos conduzir bem! É o que precisamos fazer para uma sociedade mais ativa e questionadora (PROFESSOR F, 2015). O preconceito é o maior obstáculo que enfrentamos para colocarmos a dança no dia a dia da escola (PROFESSOR G, 2015). O projeto iniciou meio tímido, pois os alunos do nosso colégio são pessoas tímidas e ousam pouco a fazer coisas diferentes. No decorrer das aulas, por conta de pessoas mais desinibidas, eles foram se soltando. Como ponto positivo forte, vejo a pesquisa e o aprofundamento teórico de algo diferente que nunca ousaram pesquisar. O ponto negativo é que as aulas de dança foram no pátio e como sempre tem alunos com aula vaga por vários motivos, alguns ficavam envergonhados e se recusaram a fazer os passos de dança. No geral, a escola só ganha e eles também. Hoje alguns vem perguntando quando vai ter mais (PROFESSOR J, 2015). Sem dúvida o começo é muito complicado, não é fácil, não temos local adequado, eles tem muito vergonha, mas no decorrer do trabalho é muito gratificante e motivador o fato de os alunos pedir para fazer de novo mostra isso. Temos que ter paciência, nos esforçar que o trabalho acontece (PROFESSOR B, 2015). Embora sabemos, alguns problemas em relação aos alunos ou ambiente na escola, podemos sim promover essa nova situação em âmbito escolar com grande aproveitamento (PROFESSOR A, 2015). Meus alunos são bem tímidos em relação a dançar em pares e foi preciso várias atividades para se soltarem e iniciar o trabalho com a dança de salão, porém de acordo com o desenvolvimento das atividades eles foram descobrindo os passos e tentando melhorar em cada ritmo trabalhado, o debate sobre gênero foi também muito rico. E como é gratificante! Perceber o envolvimento e evolução no trabalho realizado. Nossos alunos possuem potencial muito grande que nem sempre exploramos em sua totalidade (PROFESSOR I, 2015). Todos temos as dificuldades no início deste conteúdo uma vez que nossos alunos não tem o hábito de trabalhar com o mesmo. Porém, quando o iniciamos despertamos uma grande vontade de vivenciá-lo e sempre estar praticando a dança de salão em algumas aulas (PROFESSOR E, 2015). [...] colhi os bons frutos, com a maior socialização de alunos, o gosto pela dança de salão, assim como uma abertura para discussões para as diferenças e o preconceito de gênero, dentre outros pontos positivos também importantes (PROFESSOR K, 2015). Sem dúvida, o projeto de dança de salão é viável para ser ministrado nas aulas de Educação Física, antes de tudo, uma dança social. Vários pontos positivos: material teórico de ótima qualidade, a socialização dos alunos, o crescimento do professor junto aos alunos, sair da teoria levando a dança para a prática, etc. (PROFESSOR L, 2015).

Por fim, de maneira geral observa-se que o principal ponto de dificuldade é a

timidez dos alunos e o espaço inadequado, porém, no decorrer da ação pedagógica

é possível identificar a viabilidade e contribuição das aulas com a dança para a

socialização dos alunos, o fomento à discussão de questões de diversidade e

gênero, bem como, a ampliação de possiblidades pedagógica para os professores.

4. Considerações Finais

Pode-se afirmar que o projeto de Dança de Salão foi de grande valia onde os

alunos mais tímidos participaram das atividades e tiveram vontade de aprender,

ajudando uns aos outros. As meninas que tinham mais facilidades foram

colaboradoras, o que facilitou o processo de ensino e aprendizagem.

Um conteúdo polêmico de ser desenvolvido dentro dos colégios, dado o

preconceito de nossa sociedade, muitas vezes machista e segregativa, contudo, foi

encontrado um caminho interessante a ser traçado por meio de questionários,

debates, apresentação da origem da dança de salão e utilização de recursos

interativos que os colégios oferecem. Os alunos se tornaram mais receptivos ao

trabalho, permitindo promover uma aprendizagem significativa e efetiva,

compartilhando a apropriação de conhecimentos, por meio de estratégias e ações

planejadas.

Quanto ao GTR, foi interessante compartilhar e trocar experiências por meio

dos fóruns. Os cursistas relataram a importância da fundamentação teórica

consistente, mas também, das possiblidades de sistematização de vivências,

portanto, perceberam que é viável o desenvolvimento do conteúdo Dança de Salão

na escola.

Por fim, apesar de observarmos vários pontos positivos em relação à

implementação do conteúdo de Dança de Salão nas aulas de Educação Física,

ressaltamos a dificuldade de desenvolvermos um trabalho pedagógico sistematizado

com todos os conteúdos previstos para disciplina, uma vez que duas aulas semanais

se tornam insuficientes diante da diversidade de conteúdos existentes e descritos

nos documentos oficiais.

Referências

BRASIL, Ministério da Educação. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 23 dez. 1996. BARRETO, D. Dança...: ensino, sentidos e possibilidades na escola. 3.ed. Campinas-SP: Autores Associados, 2008. COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do Ensino da Educação Física. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2009. KUNZ, Eleonor. Transformação didático-pedagógica do esporte. 6. ed. Ijuí-RS: Unijuí, 2004. MARINHO, Vitor. O que é Educação Física. 2.ed. São Paulo: Brasiliense, 2011. NANNI, Dionísia. Dança Educação: princípios, métodos e técnicas. Rio de Janeiro: Sprint, 2008. PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Diretrizes Curriculares da Educação Básica – Educação Física. Curitiba: Secretaria de Educação Básica, 2008.