da possibilidade do desconto salarial do …siaibib01.univali.br/pdf/rafael luis haas.pdf · termo...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
DA POSSIBILIDADE DO DESCONTO SALARIAL DO SERVIDOR PÚBLICO GREVISTA
RAFAEL LUIS HAAS
Itajaí, junho de 2011
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
DA POSSIBILIDADE DO DESCONTO SALARIAL DO SERVIDOR PÚBLICO GREVISTA
RAFAEL LUIS HAAS
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel
em Direito. Orientador: Professor Mestre Clovis Demarchi
Itajaí, junho de 2011
AGRADECIMENTO
Ao Direito que me deu novas maneiras de ver e
entender o mundo.
À família, em especial à minha mãe, pelo carinho
recebido e por todas as oportunidades oferecidas.
Aos amigos que me fizeram perceber que a vida
merece ser vivida, de melhor maneira, junto das
pessoas com quem se gosta.
Ao meu orientador, que soube lidar com as minhas
dificuldades, além de dar sua atenção e dedicação.
A todos vocês, agradeço por me ajudarem a concluir
esta etapa.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do
Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de
toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, junho de 2011.
Rafael Luis Haas Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do
Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Rafael Luis Haas, sob o título “Da
possibilidade do desconto salarial do servidor público grevista”, foi submetida em
06.06.2011 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: MSc.
Clovis Demarchi, MsC. Antônio Carlos Cabral e Especialista Luis Felipe Machado, e
aprovada com a nota 8,0 (oito vírgula zero).
Itajaí, junho de 2011
Professor Mestre Clovis Demarchi Orientador e Presidente da Banca
Professora Mestre Maria Claudia da Silva Antunes de Souza Coordenação de Monografia
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Administração Pública:
Em sentido formal, é o conjunto de órgãos instituídos para consecução dos
objetivos do Governo; em sentido material, é o conjunto das funções necessárias
aos serviços públicos em geral; em acepção operacional, é o desempenho perene
e sistemático, legal e técnico, dos serviços próprios do Estado ou por ele
assumidos em beneficio da coletividade.1
Administração Pública Direta:
O Estado, pelos seus diversos órgãos e agentes públicos, executa as
atividades administrativas que lhe são diretamente afetas, especialmente as
atribuições consideradas essenciais ou indelegáveis, por dizerem diretamente
com a própria segurança do Estado. Assim, a execução direta é a que é realizada
pelos órgãos das pessoas jurídicas de direito público, sem intermediários, por
seus próprios meios.2
Administração Pública Indireta:
É o conjunto de entes, que podem ser públicos ou privados, os quais
exploram atividades econômicas ou prestam serviços públicos vinculados ao
Poder Executivo.
Agente Ímprobo:
É todo agente público que pratica por ação ou omissão, atos de
improbidade administrativa, com ou sem dolo.
Agente Político:
1 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33 ed. São Paulo: Malheiros, 2010,
p.64 2 BRAZ, Petrônio. Manual de direito administrativo. 2 ed. São Paulo: Direito, 2001, p.132-133.
São os componentes do governo nos seus primeiros escalões, investidos
em cargos, funções, mandatos ou comissões, por nomeação, eleição designação
ou delegação para o exercício de atribuições constitucionais.3
Agente Público:
Todas as pessoas físicas incumbidas, definitivas ou transitoriamente, do
exercício de alguma função estatal.
Ato Administrativo:
É todo ato jurídico que produza efeitos em um caso concreto, praticado
pela Administração Pública, enquanto Poder Público, isto é, fazendo valer sua
autoridade.4
Ato Ímprobo:
É o ato praticado por agente ímprobo no exercício de sua função, cargo ou
eventual mandato, em descumprimento aos princípios que norteiam a
administração pública.
Direito Administrativo:
É o ramo do direito público que tem por objeto os órgãos, agentes e
pessoas jurídicas administrativas que integram a Administração Pública, a
atividade jurídica não contenciosa que exerce e os bens de que se utiliza para a
consecução de seus fins, de natureza pública.5
Direito Financeiro:
Incumbido de zelar pela disciplina das receitas e despesas do Estado e
que, sem dúvida nenhuma, compõem a função administrativa, pois, sem a
regulamentação das finanças, não seria possível a autuação do próprio Estado.6
3MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. p.76 4 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo Brasileiro. 5 ed. São Paulo: Saraiva,
2001. 5 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22.ed. São Paulo, Atlas, 2008, p.25 6 BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de direito administrativo. p.60/61
Direito Público:
É o ramo do direito que visa regular os interesses estatais e sociais,
cuidando da conduta individual.
Estado:
Ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo
situado em determinado território.7
Moralidade Administrativa:
È um conjunto de regras a ser seguido em uma Administração Pública,
constituindo um pressuposto de validade de todo ato administrativo.
Patrimônio Público:
Conjunto de bens que pertencem ao domínio do Estado, e que se institui
para atender a seus próprios objetivos ou para servir a produção de utilidades
indispensáveis às necessidades coletivas.8
Princípios Administrativos:
São proposições básicas e fundamentais que condicionam todas as
estruturações subseqüentes dos atos da administração pública.
Lei de Responsabilidade Fiscal:
Lei Complementar que estabelece normas de finanças públicas voltadas
para a responsabilidade na gestão fiscal, obrigatórias para a União, Estados,
Distrito Federal e Municípios.
Serviço Público:
Toda atividade material que a lei atribui ao Estado para que a exerça
diretamente ou por meio de seus delegados, com o objetivo de satisfazer
7 PASOLD, Cesar Luiz. Função social do estado contemporâneo. 2 ed. Florianopolis. OAB/SC,
2002. p.45 8 SILVA, Plácido e. Vocabulário jurídico, 19 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p.594
concretamente às necessidades coletivas, sob regime jurídico total ou
parcialmente público.9
Direito do Trabalho:
É o conjunto de princípios, regras, e instituições atinentes à relação de
trabalho subordinado e situações análogas, visando assegurar melhores
condições de trabalho e sociais ao trabalhador, de acordo com as medidas de
proteção que lhe são destinadas10.
9 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella, Direito Administrativo. p.96 10 MARTINS, Sergio Pinto. Direito do trabalho. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 8.
SUMÁRIO
RESUMO........................................................................................... XI
INTRODUÇÃO ..................................................................................12
CAPÍTULO 1 .....................................................................................15
DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA .....................................................15
1.1 CONCEITO .................................................................................................... 15
1.2 HISTÓRICO ................................................................................................... 19
1.3 ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA...................................... 23
1.4 ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA................................................. 24
CAPÍTULO 2 .....................................................................................26
DOS AGENTES PÚBLICOS E DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ...........................................................26
2.1 DOS AGENTES PÚBLICOS.......................................................................... 26 2.1.1 Agentes políticos ...................................................................................... 27 2.1.2 Agentes administrativos........................................................................... 28 2.1.2.1 Servidores públicos...........................................................................................28 2.1.2.2 Empregados públicos........................................................................................28 2.1.2.3 Temporários .......................................................................................................28 2.1.2.4 Comissionados ..................................................................................................29 2.1.3 Agentes honoríficos.................................................................................. 29 2.1.4 Agentes delegados.................................................................................... 29 2.1.5 Agentes credenciados .............................................................................. 29
2.2 PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ............................................ 30 2.2.1 Princípio da Legalidade ............................................................................ 32 2.2.2 Princípio da Impessoalidade .................................................................... 34 2.2.3 Princípio da Moralidade............................................................................ 36 2.2.4 Princípio da Publicidade........................................................................... 39 2.2.5 Princípio da Eficiência .............................................................................. 41 2.2.6 Princípio da supremacia do Interesse público ....................................... 43 2.2.7 Princípio da Continuidade ........................................................................ 45
CAPÍTULO 3 .....................................................................................46
SERVIÇO PÚBLICO, GREVE E DESCONTO SALARIAL................46
3.1 DIREITO DE GREVE ..................................................................................... 46 3.1.1 Greve .......................................................................................................... 46 3.1.2 Histórico no Brasil .................................................................................... 48
3.2 DA GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO.......................................................... 50 3.2.1 Noções gerais............................................................................................ 50 3.2.2 Situação atual sobre greve no serviço público ..................................... 52
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................57
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...........................................61
RESUMO
Esta monografia tem por objetivo analisar a possibilidade do
desconto salarial dos dias não trabalhados em greve do setor público no
ordenamento jurídico brasileiro. Lembra-se do seu desenvolvimento histórico, uma
vez que a Constituição Federal de 1967, no seu § 7º do art. 157 a proibia. Vindo a
ser garantida no inciso VII do art. 37 da Constituição da República Federativa do
Brasil. Os autores não são unânimes sobre a eficácia do disposto no artigo da
Constituição de 1988. O direito de greve do servidor público depende da edição de
lei ordinária especifica (no texto originário da Constituição era exigida lei
complementar, modificado pela Emenda Constitucional 19/1998). Situação esta que,
por inércia do Congresso Nacional, ainda não ocorreu, fazendo com que o Supremo
Tribunal Federal julgasse a eficácia do inciso VII do art. 37 da Constituição da
República Federativa do Brasil em mandado de injunção, denunciando a omissão do
Congresso Nacional na regulamentação do direito de greve para os servidores
públicos civis. A Administração Pública é dividida em direta e indireta. A
Administração Direta Compreende os órgãos da União, Estados, Distrito Federal e
Municípios. A Administração Indireta diz respeito às fundações, autarquias,
sociedades de economia mista e empresas públicas. Os agentes públicos são
responsáveis para que a Administração Pública funcione, ou seja, executam uma
função pública. No art. 37 da Constituição Federal da República Federativa do Brasil
de 1988 encontram-se os princípios fundamentais da Administração Pública, além
desses conta-se com os princípios implícitos. A greve no serviço público mostra uma
relação entre o Direito Administrativo e o Direito do Trabalho. A matéria é de Direito
Administrativo, pois envolve a greve no serviço público e não nas empresas
privadas.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia busca compreender as características
fundamentais inerentes à Administração Pública, aos Agentes Públicos, seus
princípios norteadores, além do direito de greve. Tem como objeto de análise o
instituto do direito de greve, com foco na possibilidade do desconto salarial do
servidor público grevista.
O seu objetivo institucional é produzir a presente Monografia
para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí
– UNIVALI. O objetivo geral da pesquisa é verificar o direito de greve do servidor
público e a possibilidade do desconto salarial dos dias paralisados.
Para tanto, principia–se, no Capítulo 1 com o estudo da
Administração Pública, conceituando-a como responsável dos serviços públicos,
além de seus sentidos (subjetivo e objetivo), histórico, sua organização na qual
temos a Federal, Estadual, Distrito Federal e Municipal, dispostas no art. 20 a 32 da
Constituição Federal da República Federativa do Brasil, finalizando com os
responsáveis pelo cumprimento do papel da administração, ou seja, os órgãos
públicos.
No Capítulo 2, tratando dos agentes públicos, responsáveis
pelo exercício da função pública, classificados em: políticos, administrativos,
honoríficos, delegados e credenciados. Além dos princípios de direito administrativo
(supremacia do interesse público), aos quais a Administração Pública está
subordinada, em especial, os dispostos no art. 37, caput, da Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988 (legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência).
No Capítulo 3, tratando de examinar o direito de greve,
lembrando do seu desenvolvimento no decorrer do tempo, como também das
disposições constitucionais à greve, dando especial atenção a evolução da greve no
serviço público, do ponto de vista da legislação, bem como na jurisprudência pátria.
13
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,
seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a
possibilidade do desconto salarial do servidor público grevista.
Para a presente monografia foram levantadas as seguintes
hipóteses:
Primeira: Administração Pública pode ser definida como a
atividade desenvolvida pelo Estado para a consecução dos interesses coletivos,
sendo, também, o conjunto de órgãos e pessoas jurídicas que exercem a função
administrativa do Estado.
Segunda: Os princípios inerentes à Administração Pública são
aqueles expostos no art. 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de
1988, esses positivados de forma expressa, outros, de forma implícita.
Terceira: A Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 permitiu o direito à greve, devendo ser regulamentada por Lei, o que por
inércia estatal não ocorreu, levando o STF, por analogia, a aplicar a legislação
vigente à iniciativa privada.
Quarta: A Legislação vigente não apresenta orientação quanto
ao desconto de dias parados por motivo de greve. O que se aplica são as decisões
dos tribunais. No caso específico dos descontos dos dias parados, os Tribunais
entendem que os dias parados devem ser descontados.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de
Investigação11 foi utilizado o Método Indutivo12, na Fase de Tratamento de Dados o
11 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente
estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 12 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2011. p. 83.
12 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86.
14
Método Cartesiano13, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas
do Referente14, da Categoria15, do Conceito Operacional16 e da Pesquisa
Bibliográfica17.
13 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE,
Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.
14 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.
15 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.
16 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.
17 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.
CAPÍTULO 1
DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
1.1 CONCEITO
Administrar significa não só prestar serviço, executá-lo, como,
outrossim, dirigir, governar, exercer a vontade com o objetivo de obter um resultado
útil18.
Administração Pública é a manifestação instrumental de
comando e de hierarquia prevista em lei para dar executividade às diretrizes
estabelecidas anteriormente pelo próprio Estado19.
A Administração Pública, como objeto específico do Direito
Administrativo, pode ser concebida em duplo sentido:
Sentido subjetivo, formal ou orgânico: onde a Administração
Pública corresponde a um conjunto de pessoas jurídicas - de direito público ou
privado –, de órgãos públicos e de agentes públicos, que formam o aparelhamento
ou estrutura da administração.
Sentido objetivo, material ou funcional: correspondem ao
conjunto de funções ou atividades administrativas, que são públicas, consistentes
em realizar concreta, direta e imediatamente os fins constitucionais atribuídos ao
Estado20
18 MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios Gerais do Direito Administrativo. Rio de
Janeiro: Forense, 1979. v. 2. 19 BALDACCI, Roberto Geits. Elementos do Direito. Direito Administrativo. 3 ed. São Paulo:
Editora DPJ, 2004. 20 CUNHA JÚNIOR, Dirley. Direito administrativo. 30ed. Bahia: Editora Juspodivm. 2004. p. 499.
16
No que tange a Administração Pública, Alexandre de Moraes21
leciona que pode ser definida objetivamente como a atividade concreta e imediata
que o Estado desenvolve para a consecução de seus interesses coletivos e
subjetivamente como o conjunto de órgãos e de pessoas jurídicas aos quais a lei
atribui o exercício da função administrativa do Estado.
Na visão de Hely Lopes Meirelles22, a Administração Pública
pode ser estudada em três sentidos: o formal, a matéria e o operacional. No sentido
formal, é o conjunto de órgãos instituídos para a consecução dos objetivos do
Governo; no sentido material, é o conjunto das funções necessárias ao serviço
público em geral. Na acepção operacional, é o desempenho perene e sistemático,
legal e técnico, dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em benefício
da coletividade.
Assim, observa-se que a Administração Pública é o conjunto de
pessoas públicas, seus órgãos e serviços, que desenvolvem a atividade ou função
administrativa, bem como, não pratica atos de governo, mas tão-somente, atos de
execução, com maior ou menor grau de autonomia funcional, segundo a
competência do órgão e de seus agentes.
A Administração Pública é responsável pela prestação dos
serviços públicos, seja por seus órgãos e entidades, seja delegando para outras
pessoas jurídicas23, assim pode-se concluir que está inserida no Poder Executivo24.
Luiz Alberto Blanchet25 acrescenta que “uma das três
atividades do Estado, ao lado da jurisdição e da legislação, a Administração Pública
é a atividade de gerenciamento dos interesses públicos, o que deve operar-se de
acordo com as normas do Direito Administrativo”.
21 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13 ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 310. 22 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27 ed. São Paulo: Malheiros. 2002. p.
63. 23 ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo. 3.ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 127 24 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 11 ed. São Paulo: Editora dos Tribunais,
2007. p. 42 25 BLANCHET, Luiz Alberto. Curso de Direito Administrativo. 5. ed. Curitiba: Juruá, 2008. p. 39
17
São dois os sentidos que Odete Medauar26 entende a
administração: a) em sentido subjetivo, formal ou organizacional; b) em sentido
objetivo formal ou funcional”.
Nesse sentido leciona Odete Medauar27:
No aspecto funcional, Administração Pública significa um conjunto de atividades do Estado que auxiliam as instituições políticas de cúpula no exercício de funções de governo, que organizam a realização das finalidades públicas postas por tais instituições e que produzem serviços, bens e utilidades para a população, como, por exemplo, ensino público, calçamento de ruas, coleta de lixo.
E continua Odete Medauar28:
Sob o ângulo organizacional, Administração Pública representa o conjunto de órgãos e entes estatais que produzem serviços, bens e utilidades para a população, coadjuvando as instituições políticas de cúpula no exercício das funções de governo.
Por serem termos que andam juntos, muitas vezes são
confundidos29, sendo necessário esclarecer. No entendimento de Hely Lopes
Meirelles30:
[...] materialmente, Governo é o conjunto de funções estatais básicas, e Administração é o conjunto de funções/atribuições necessárias aos serviços públicos, a serem desempenhadas por órgãos ou entidades do Estado.
O mesmo doutrinador31 ainda esclarece que:
[...] formalmente, Governo é o conjunto de órgãos e poderes constitucionais (com seus agentes políticos), e Administração é o conjunto de funções estatais básicas, e Administração é o conjunto de órgãos ou entidades (com seus servidores ou empregados) instituídos para a realização dos objetivos do Governo;
26 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 42. 27 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 42. 28MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 42. 29 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33. ed. Atual. São Paulo: Malheiros
Editores, 2010. p. 64. 30 Apud. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p. 64. 31 Apud. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p. 64.
18
operacionalmente, governar é conduzir politicamente os negócios e serviços públicos, e administrar é desempenhar regular e continuamente os serviços do Estado.
Pela dificuldade de fixar o conceito de Administração Pública,
diz-se que a mesma se deixa descrever, mas não se deixa definir32.
Vale citar a posição de José dos Santos Carvalho Filho33, para
quem o Direito Administrativo é “o conjuntos de normas e princípios que, visando ao
interesse público, regem as relações jurídicas entre as pessoas e órgãos do Estado
e entre esta as coletividades a que devem servir.”
Assim, sinteticamente, pode-se afirmar que o Direito
Administrativo tem como objeto o estudo de toda e qualquer atividade administrativa,
seja emanada pelo Poder Judiciário, Executivo ou Legislativo.
Na definição do professor Hely Lopes Meirelles34, à
Administração Pública é:
Em sentido formal, é o conjunto de órgãos instituídos para a consecução dos objetivos do Governo; em sentido material, é o conjunto das funções necessárias aos serviços públicos em geral; acepção operacional, é o desempenho perene e sistemático, legal e técnico, dos serviços próprios do Estado ou por ele assumidos em beneficio da coletividade. Numa visão global, a Administração é, pois, todo o aparelhamento do Estado preordenado a realização de serviços, visando à satisfação das necessidades coletivas.
No mesmo sentido, tem-se a definição de Maria Sylvia Zanella
Di Pietro35 acerca da Administração Pública:
Em sentido subjetivo, formal ou orgânico, ela designa os entes que exercem a atividade administrativa; compreende pessoas jurídicas, órgãos e agentes públicos incumbidos de exercer uma das funções em que se triparte a atividade estatal: a função administrativa; em
32 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 43. 33 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito administrativo. 17.ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2007. p. 6. 34 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p. 64. 35 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22.ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 49.
19
sentido objetivo, material ou funcional, ela designa a natureza da atividade exercida pelos referidos entes; nesse sentido, a Administração Pública é a própria função administrativa que incumbe, predominantemente, ao Poder Executivo.
Na visão de José Cretella Júnior36 em conceituar à
Administração Pública, este mesmo cita a dificuldade que há em definí-la, eis que
este vocábulo abriga vários significados, todavia estando todos eles ligados, veja-se
a sua definição:
Administração não é só governo, poder executivo, como também a complexa máquina administrativa, o pessoal que a movimenta, a atividade desenvolvida por esse indispensável aparelhamento que possibilita ao estado o preenchimento de seus fins. Pelo que, Administração é a atividade que a máquina do Estado desenvolve, mediante o desempenho de atos concretos executórios, para a consecução direta, ininterrupta e imediata do interesse público.
Interpretando-se primeiramente Administração, entende-se ser
o conjunto de atos, orientados, direcionados e comandados para a satisfação de um
objetivo comum, traçado por certo grupo. Sendo este objetivo, preliminarmente
estudado e criado com o intuito de obter os melhores meios para sua consagração.
Já se conceituado o vocábulo “pública”, é natural a idéia de
povo, ou seja, todos detém os mesmo direitos sobre certas coisas, ou são
beneficiados de forma igual. Assim, portanto, s Administração Pública são os atos
exercidos por um Estado organizado objetivando realizar serviços visando à
satisfação da necessidade da coletividade.
1.2 HISTÓRICO
Apenas com a expansão da atividade administrativa, sobretudo
no âmbito social e econômico, que a Administração Pública passou a ser inserida na
Constituição. Percebe-se, pelas Constituições do século XIX, como na de 1824, que
36 CRETELLA JÚNIOR, José. Direito Administrativo Brasileiro. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense.
2000. p.16.
20
ignoravam o assunto, pois não continham capítulo específico sobre Administração
ou sobre servidores37.
Desde os primórdios da civilização, os homens costumavam
viver em grupos, objetivando um bem comum, a sobrevivência. Por adotarem o
convívio mútuo, os componentes de determinados agrupamento estavam sujeitos a
padrões de conduta, o que levaria a realização dos diversos interesses inerentes a
manutenção social.38
Esses agrupamentos de indivíduos, inicialmente eram regidos
por normas estabelecidas consensualmente pelos próprios componentes, passando-
se a ser, ulteriormente, impostas por aqueles que se elevaram a categoria de
autoridade superior aos demais. Tinha-se, assim, o detentor de um poder superior, o
qual determinava, em termos absolutos, o padrão de conduta a ser seguido. Essa
necessidade, de emancipação de um poder superior, ocorreu diante de um
crescimento dos grupos, o qual necessitava de uma cúpula para ditar as regras, ou
seja, administrá-lo. Tendo-se, assim, ainda que informalmente, o início da
Administração Pública desde os primórdios.39
Após a ascensão destas cúpulas, começaram a surgir o
conceito de supremacia dos interesses soberanos em detrimento dos interesses
individuais dos membros de cada coletividade, o que pode ser constatado a partir da
própria forma de elaboração normativa. Um grande exemplo na história onde se
constata que, o interesse do administrador público sobressaiu aos interesses
públicos, dessa forma, sendo o dinheiro público consumido por atos contrário ao do
interesse da coletividade, esteve nas ações de Nabucodosonor, filho de
Nabopolassar, que assumiu o Império Babilônico em 624 A.C., o qual construiu
estupendos jardins suspensos, tendo tal excentricidade precedida de gastos
incalculáveis, com intuito, apenas, de satisfazer a Rainha Meda. 40
37 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 45. 38 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 4 ed. Rio de Janeiro:
Lumen Júris, 2008. p. 58. 39 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. p. 58. 40 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. p. 3.
21
Com a evolução dos anos, diante o tamanho descompasso
existente entre as funções desempenhadas pelo detentor do poder superior, a
administração pública, e os anseios da coletividade, houve a necessidade de
severas mudanças. Tais mudanças tiveram como marcos significativos as edições
de diplomas que consagram a existência dos denominados direitos fundamentais,
estabelecendo princípios de limitação de divisão dos poderes, conforme ensina o
constitucionalista Pedro Lenza41, são eles:
As obras de glosadores da Idade Média, principalmente dos séculos XIII e XIV, nas quais se encontra o germe dos atuais direitos constitucional, administrativo e fiscal. Dentre elas, a obra de Andrea Bonello (1190 a 1275 d.C.), dedicada ao estudo dos três últimos livros do Código Justiano, que tinham sido deixados de lado, porque eram dedicados a estruturas fiscais e administrativas de um império que já não existia.;
A Magna Carta de 1215, imposta pelos Barões e pelo Clero ao Rei João Sem Terra, na Idade Média, a qual representa o grande marco do constitucionalismo medieval, esta estabeleceu, mesmo que formalmente, limites ao poder real, buscou a proteção a importantes direitos fundamentais, dentre os quais se destaca o iudicium per legem terrae (julgamento Segundo a lei do pais), ancestral da cláusula “due process of law”;
A obra de Bartolo de Sassoferrato (1315-57), a qual lançou as bases da teoria do Estado Moderno;
O Petition of Rights de 1628, editado sob as inspirações de Sir Edward Coke, da Câmara dos Comuns, durante a Idade Moderna, dispôs que “o homem livre somente pode ser preso ou detido pela lei da terra, ou pelo devido processo legal, e não pela ordem especial do Rei sem qualquer acusação”, consagrando-se a garantia fundamental que, ninguém seria preso sem a evidência de uma justa causa;
A Declaração Francesa de 1789, deflagrada durante a idade contemporânea, o iluminismo, a qual teve como preâmbulo a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, concretizou uma contraposição ao absolutismo reinante, por meio do qual se elegeu o povo como o titular legitimo do poder;
A Constituição Francesa de 1791, por meio de seu art. 3 dispôs que “não há na Franca autoridade superior a da Lei. O Rei não reina acima dela e somente em nome dela pode exigir obediência”, dessa
41 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.p. 4-6.
22
forma, portanto, visava à exclusão de qualquer similitude com o regime anterior.
A Lei de 28 pluvioso do Ano VIII (1800), que organizou juridicamente a Administração Pública na França.
A necessidade da criação e evolução destas leis, ocorreu por
questões de sobrevivência, pois o povo estava vivendo a mercê dos que detinham o
poder, os quais governavam visando apenas a sua satisfação, em total
descompasso do bem comum.
A exposição destes marcos históricos demonstra-se o quão
lento foi o processo para que se instituíssem a primazia da lei, o que assegurou aos
cidadãos a garantia de que a regra de conduta imposta seria editada por um órgão
representativo da vontade popular. Dessa forma, identificada a existência de normas
de conduta, constata-se o segmento das sociedades politicamente organizadas.
A partir das edições das leis, as quais os homens que detém o
poder são submetidos, iniciou-se a forma que dava garantia aos cidadãos contra os
desmandos do poder público. Dessa maneira, impondo-se a submissão do poder
público a um quadro normativo geral e abstrato, disposto de forma prévia e que tinha
a função conformadora da atividade estatal.
Destarte, com a criação das leis que ditam e delimitam as
atitudes de um governo, as quais tendem a seguir a um objetivo comum, temos a
criação de uma Administração Pública organizada, a qual visa o bem de seu povo.
Assim, em tese, trabalham de forma organizada, criando e ditando regras que visam
à melhoria de vida de seus habitantes, denominando-se Administração Pública42.
No Brasil, não foi diferente sua evolução como a do mundo. No
começo, período colonial, ao tempo das capitanias, quem detinham todos os
poderes, o de controlar, de administrar e, de legislar eram os donatários, os quais
eram outorgados pelo monarca português, que é claro, governava para o seu próprio
bem. Esta realidade começou a ser mudada no período Imperial, momento em que
42 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. p. 56.
23
se criou a divisão de funções entre o Poder Legislativo, o Poder Judiciário, o Poder
Executivo e o Poder Moderador.
Diante disso, percebe-se que o nascimento de uma
Administração Pública organizada dar-se quando o poder se descentraliza da mão
de um único grupo e se divide em vários poderes distintos, fazendo com que, assim,
a vontade de todo grupo seja exercida.
1.3 ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Na organização administrativa brasileira existe a Administração
Federal, a Administração Estadual, a Administração do Distrito Federal e a
Administração Municipal, tendo suas atribuições administrativas dispostas,
principalmente, nos artigos 20 a 32 da Constituição da República Federativa do
Brasil, assim cada um dos entes políticos que integram o Estado brasileiro é dotado
de estrutura administrativa independente43.
Organizado o Estado no que respeita à divisão do território, à
forma de governo, à investidura dos governantes, à instituição dos Poderes e às
garantias individuais, estruturam-se, hierarquicamente, os órgãos encarregados do
desempenho de certas atribuições que estão sob sua responsabilidade44.
É de natureza administrativa a criação, estruturação, alteração
e atribuições das competências dos órgãos da Administração Pública45, sendo essa,
repartida em Administração Direta e Administração Indireta.
Entende-se que a Administração Direta seja o conjunto de
órgãos criados na estrutura de cada uma das pessoas políticas para o exercício das
funções administrativas e outras atípicas 46, enquanto que a Administração Indireta
compreende as entidades dotadas de personalidade jurídica própria, ou seja, as 43 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 47. 44 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. 14.ed. ver. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 44. 45 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. p. 45. 46 ROSA, Márcio Fernando Elias. Direito administrativo. 11. ed. reform. São Paulo: Saraiva, 2010. p.
33.
24
autarquias, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as fundações
públicas. 47
Para Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo48, o Estado, para
desempenho de suas atribuições adota duas formas de organização e atuação
administrativas: centralização e descentralização. Assim lecionam:
Ocorre a chamada centralização administrativa quando o Estado executa suas tarefas diretamente, por meio dos órgãos e agentes integrantes da denominada administração direta. Nesse caso, os serviços são prestados diretamente pelos órgãos do Estado, despersonalizados, integrantes da mesma pessoa política (União, Distrito Federal, estados ou municípios).
Ocorre a chamada descentralização administrativa quando o Estado desempenha algumas de suas atribuições por meio de outras pessoas, e não pela sua administração direta. A descentralização pressupõe duas pessoas distintas: o Estado (a União, o Distrito Federal, estados ou municípios).
1.4 ÓRGÃOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Órgãos Públicos são partes ou componentes da estrutura do
Estado49, criados para que a Administração Pública cumpra seu papel na
sociedade50, conclui-se, portanto, que são unidades integrantes da estrutura de uma
mesma pessoa jurídica nas quais são agrupadas competências a serem exercidas
por meio de agentes públicos51.
Órgãos Públicos ou órgãos administrativos são unidades de
autuação, que englobam um conjunto de pessoas e meios materiais ordenados para
realizar uma atribuição predeterminada. Por exemplo: uma Secretaria Municipal de
Educação é um órgão público municipal formado por um conjunto de servidores e
47 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 65. 48 ALEXANDRINO, Marcelo PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 18. ed. ver. e
atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010. p. 23. 49 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. p. 45. 50 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 48. 51 ALEXANDRINO, Marcelo PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. p. 120.
25
meios materiais, destinados a colocar em prática as atribuições do Município no
tocante ao ensino.52
Hely Lopes Meirelles53 define os órgãos da Administração
Pública como:
Centros de competência instituídos para o desempenho de funções estatais, através de seus agentes, cuja atuação é imputada à pessoa jurídica a que pertencem. São unidades de ação com atribuições específicas na organização estatal. Cada órgão, como centro de competência governamental ou administrativa, tem funções, cargos e agentes, mas é distinto desses elementos, que podem ser modificados, substituídos ou retirados sem supressão da unidade orgânica.
Nessa mesma linha de entendimento, segue-se o ensinamento
de Diógenes Gasparini54:
Órgãos públicos não são pessoas, mas centros de competências criados pelo Direito Público. Ademais, são partes ou componentes da estrutura do Estado e por isso dele não se distinguem. Vale afirmar: não têm personalidade jurídica. Se a tivessem, os direitos e obrigações decorrentes de sua ação ou omissão lhes pertenceriam, e não ao Estado
No mesmo norte do raciocínio, na obra de Marcelo Alexandrino
e Vicente Paulo55, encontra-se o conceito de órgão público:
Podemos conceituar órgãos públicos como unidades integrantes da estrutura de uma mesma pessoa jurídica nas quais são agrupadas competências a serem exercidas por meio de agentes públicos. Como se vê, órgãos são meros conjuntos de competências, sem personalidade jurídica própria; são resultados da técnica de organização administrativa conhecida com “desconcentração”.
Assim, os órgãos públicos compõem a Administração Pública.
52ROSA, Márcio Fernando Elias. Direito administrativo. 11. ed. reform. São Paulo: Saraiva, 2010. p.
58. 53 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p. 66-67. 54 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. p.48. 55 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. p. 118.
CAPÍTULO 2
DOS AGENTES PÚBLICOS E DOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
2.1 DOS AGENTES PÚBLICOS
Para que a Administração Pública funcione, por meio de seus
órgãos, é indispensável à existência de seus executores, os agentes públicos.
Assim, de acordo com José dos Santos Carvalho Filho56, tem-se a definição de
agentes públicos:
São todos aqueles que, a qualquer título, executam uma função pública como prepostos do Estado. São integrantes dos órgãos públicos, cuja vontade é imputada à pessoa jurídica. Compõem, portanto, a trilogia fundamental que dá o perfil da administração: órgãos, agentes e funções.
Na doutrina descomplicada de Marcelo Alexandrino e Vicente
de Paulo57, acerca de agentes públicos, aprende-se que:
Considera-se agente público toda pessoa física que exerça, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função pública.
Conforme se constata, a expressão “agente público” tem sentido amplo, englobando todos os indivíduos que, a qualquer título, exercem uma função pública, remunerada ou gratuita permanente ou transitória, política ou meramente administrativa, como prepostos do Estado.
Não se deixando de citar a definição do professor, Hely Lopes
Meirelles58, sobre agentes públicos, a qual mantém o sentido dos conceitos ora
apresentados, assim, segue-se:
56 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito Administrativo. p. 15. 57 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. p. 122.
27
São todas as pessoas físicas incumbidas, definitiva ou transitoriamente, do exercício de alguma função estatal. Os agentes normalmente desempenham funções do órgão, distribuída entre os cargos de que são titulares, mas excepcionalmente podem exercer funções sem cargo. A regra é a atribuição de funções múltiplas e genéricas ao órgão, as quais são repartidas especificamente entre os cargos, ou individualmente entre os agentes de função sem cargo. Em qualquer hipótese, porém, o cargo ou função pertence ao Estado, e não ao agente que o exerce, razão pela qual o Estado pode suprimir ou alterar cargos e funções sem nenhuma ofensa aos direitos de seus titulares, como podem desaparecer os titulares sem extinção dos cargos e funções.
Por meio destas definições, conclui-se que os agentes públicos
são as pessoas físicas que atuam em cada órgão, setor, da administração pública.
Dessa maneira, fazendo-se com que a máquina estatal funcione. Outrossim,
ressalta-se que cada um destes agentes públicos detém uma função específica,
contribuindo-se, portanto, para uma administração pública organizada.
Constata-se na obra Direito Administrativo Descomplicado de
Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo59, a adoção da classificação proposta por Hely
Lopes Meirelles60, dos agentes públicos, os quais são divididos em cinco grandes
grupos:
2.1.1 Agentes políticos
São os integrantes dos primeiros escalões do Poder Público,
atuam com plena liberdade funcional, desempenhando suas atribuições com
prerrogativas e responsabilidades próprias, estabelecidas na Constituição e em leis
especiais.
Estes exercem funções governamentais, judiciais e quase-
judiciais, elaborando normas legais, conduzindo os negócios públicos, decidindo e
atuando com independência nos assuntos de sua competência. Sendo eles: os
Chefes do Executivo (Presidente da República, governadores e prefeitos), seus
auxiliares imediatos (ministros, secretários estaduais e municipais) e os membros do
58 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p.75. 59 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. p. 124-127. 60 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p. 75-81.
28
Poder Legislativo (senadores, deputados e vereadores). Alguns autores enquadram,
também, como agentes políticos os membros da magistratura (juízes,
desembargadores e ministros de tribunais superiores) e os membros do Ministério
Público (Promotores de Justiça e Procuradores da República).
2.1.2 Agentes administrativos
São todos aqueles que se que exercem atividade para o
Estado ou às suas entidades autárquicas e fundacionais por relações profissionais,
sujeitos à hierarquia funcional e ao regime jurídico determinado pela entidade estatal
a que servem. São os detentores de cargos públicos, de empregos públicos e de
funções públicas nas Administrações Direta e Indireta das diversas unidades da
Federação, nos três Poderes. Sendo classificados em:
2.1.2.1 Servidores públicos
São os titulares de cargos públicos de provimento efetivo e de
provimento em comissão, exemplo, polícias, servidores do INSS, concursados em
geral;
2.1.2.2 Empregados públicos
São ocupantes de empregos públicos, sujeitos a regime
jurídico contratual trabalhista, assim, são regidos pela Consolidação das Leis
Trabalhistas, sendo chamados “celetistas”;
2.1.2.3 Temporários
São contratados por tempo determinado para atender a
necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do art. 37, IX,
da Constituição. Não possuem cargos nem empregos públicos, exercem uma função
pública remunerada temporária e o seu vínculo funcional com a Administração
Pública é contratual, sendo um contrato de direito público, por exemplo as
contratações de Agentes do Censo;
29
2.1.2.4 Comissionados
Suas ocupações são transitória, tendo suas nomeações por
meio da confiança que existe entre a autoridade nomeante e, os seus titulares não
adquirem estabilidade. São admitidos na Administração Pública pessoas estranhas
ao seu quadro, podendo ser preenchidos por funcionários de carreira ou não.
2.1.3 Agentes honoríficos
Enquadram-se nesta categoria os cidadãos requisitados ou
designados para, transitoriamente, colaborarem com o Estado mediante a prestação
de serviços específicos, em razão de sua condição cívica, de sua honorabilidade ou
de sua notória capacidade, geralmente são atividades que não detém remuneração.
Como exemplo, pode-se citar os mesários eleitorais, os jurados, os membros dos
Conselhos Tutelares criados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente e outros
dessa natureza;
2.1.4 Agentes delegados
São os particulares contratados pelo poder público que
exercem atividade, obra ou serviço público e o fazem em nome próprio. Assim, não
atuam em nome do Estado, mas apenas colaboram com o Poder Público. Sujeitam-
se, porém, no exercício da atividade delegada, à responsabilidade civil objetiva, nos
termos do artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição e ao Mandado de Segurança.
Dessa maneira, enquadram-se como “funcionários públicos” para fins penais
(Código Penal, art. 327). São os concessionários e permissionários de serviços
públicos, os leiloeiros, os tradutores públicos, entre outros.
2.1.5 Agentes credenciados
São aqueles que recebem a incumbência do poder público
para representá-lo ou praticar certa atividade específica, auferindo uma renda por
certo serviço prestado. Seria exemplo a administração pública contratar um
esportista famoso para representá-la em um evento internacional.
30
Por fim, conclui-se que os agentes públicos são todas as
pessoas que, de forma definitiva ou transitória, remuneradas ou não, servem o
Poder Público como instrumentos de sua vontade. Assim, são todos aqueles que
trabalham ou prestam serviços para a Administração Pública.
2.2 PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Compreendendo-se a Administração Pública como instrumento
de viabilização de Governo, é desejável que se imponha aos órgãos instituídos para
desincumbirem-se de seus misteres a submissão aos princípios constitucionais
insculpidos no art. 37 da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (este último inserido
pela Emenda Constitucional n° 19/98), princípios estes basilares no Estado
Democrático de Direito, servindo assim como parâmetro à atividade de controle.
Defluem desses princípios vários outros, dentre os quais o
princípio da razoabilidade e/ou proporcionalidade. Conquanto não expresso no
Estatuto Maior, seu afloramento ocorre em vários dispositivos constitucionais.
Quanto a esse princípio, ensina Lúcia Valle Figueiredo61 que
não há outro meio de se aferir a legalidade de certos atos administrativos, a não ser
pelo meio da razoabilidade Impende a aferição da pertinência com a conseqüente
correlatividade entre o ato emanado e seu pressuposto fático. Se houver qualquer
possibilidade de competência discricionária, deverá esta também se submeter ao
controle da legalidade. Em outras palavras: determinadas necessidades
administrativas, a serem implementadas, fazem com que, inexoravelmente, para
controle do ato praticado, tenha-se de inferir a congruência lógica entre a atuação
administrativa e a necessidade invocada.
Importa, também, trazer a lume dois outros princípios retores
da Administração Pública: 1) o da supremacia do interesse público sobre o privado e
2) o da indisponibilidade do interesse público. A esses princípios Celso Antônio
61 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Controle da Administração Pública. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 1991. p. 8-9.
31
Bandeira de Mello62 atribui a condição de fonte matriz do sistema jurídico-
administrativo, pertinente ao corpo de órgãos não personalizados que compõe a
chamada Administração em sentido orgânico.
A esse propósito, é pertinente destacar a fricção existente entre
o instrumental disponibilizado pelo Direito Administrativo, que pressupõe, como
visto, a existência de um “interesse público” identificável objetivamente, e o novo
quadro evolutivo pelo qual passa o Estado brasileiro.
O Governo Federal vem implementando reformas tendentes a
uma redefinição do papel estatal, mediante uma gradativa redução de sua
participação no processo produtivo e no campo social, seja por intermédio de
privatização de empresas públicas, seja mediante transferência de atribuições a
agências autônomas e a órgãos públicos não-estatais, como é o caso das
organizações sociais, instituídas pela Lei n° 9.637/9863.
No Caput do artigo 37 da Constituição da República Federativa
do Brasil encontramos os princípios fundamentais da Administração Pública.
O artigo 4º da Lei de Improbidade Administrativa64 dispõe que
todos os Agentes Públicos, de qualquer dos Poderes da União, ou de qualquer dos
entes federativos, são obrigados a observar, no exercício da Administração Pública,
os princípios constitucionais que regem a matéria.
Dessa forma, a observância dos princípios básicos é que
permite o necessário equilíbrio entre o direito dos administrados e as prerrogativas
da Administração Pública na busca do bem comum.
62 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 8a ed., São Paulo,
Malheiros Ed., 1996, p. 25. 63 Disponível em: <https://redeagu.agu.gov.br/UnidadesAGU/CEAGU/revista/ Ano_II_julho_2001/0507
PalestraAGUBenjamin.pdf>. Acesso: 12 mar. 2011. 64 Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a velar pela estrita
observância dos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.
32
2.2.1 Princípio da Legalidade
O Estado de Direito, juridicamente organizado e obediente às
leis, se contrapõe ao regime absolutista prevalecendo, desta forma, à vontade do
povo. Encontra-se nesta concepção de Estado, todo o embasamento do princípio
da legalidade de que a vontade popular necessita ser a base do poder, devendo
este ser exercido em conformidade com as normas vigentes, estas oriundas do
interesse social.
Na lição de Paulo Magalhães da Costa Coelho o princípio da
legalidade é entendido como sendo “[...] essencial para a plena vigência do Estado
de Direito. Por ele e em razão dele, toda a atividade administrativa, inclusive a
discricionária, fica balizada pelos ditames legais” 65.
O Poder Legislativo detém o maior grau de competência
normativa delegada pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
entretanto estabelece, concomitantemente, o princípio da legalidade como
instrumento que garante os direitos fundamentais do cidadão e, ainda, como
parâmetro da atividade administrativa. “Esta garantia se traduz na participação do
povo ou de seus representantes na produção de normas que introduzam inovação
na ordem jurídica” 66.
Tem-se claramente a idéia de que a atividade administrativa
será aplicada em conformidade com o sistema legal submetendo-se,
conseqüentemente, ao que estabelece o princípio da legalidade. “A legalidade na
Administração não se resume à ausência de oposição à lei, mas pressupõe
autorização dela. Como condição de sua ação” 67.
Convém destacar que, em situações excepcionais, o princípio
da legalidade poderá estar submetido a algumas restrições “como nos casos das
65 COELHO, Paulo Magalhães da Costa. Manual de direito administrativo. p. 29. 66JUSTEM FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. p.140. 67MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 73.
33
medidas provisórias (art. 62, parágrafo único, da CF), da decretação do estado de
defesa (art.136) e do estado de sítio (arts. 137 a 139)” 68.
Caso a Administração Pública voltar a atenção exclusivamente
para o texto legal, por certo, não irá atingir a plenitude total da aplicação do princípio
da legalidade. “A administração, por isso, deve ser orientada pelos princípios do
Direito e da Moral, para que ao legal se ajunte o honesto e o conivente aos
interesses sociais.69
O princípio da legalidade é o princípio capital para a
configuração do regime jurídico administrativo70, surge como conquista do Estado de
Direito, a fim de que os cidadãos não sejam obrigados a se submeter ao abuso de
poder71.
Além disso, está consubstanciada no artigo 5º, II, da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; [...].
Por esses dispositivos deve-se entender que a Administração
Pública só pode atuar nos limites da lei, ou seja, está sujeita aos mandamentos da
lei e às exigências do bem comum.
Diógenes Gasparini72 define que o princípio da legalidade
significa estar a Administração Pública, em toda a sua atividade, presa aos
68 COELHO, Paulo Magalhães da Costa. Manual de direito administrativo. p. 32. 69 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. p.88. 70 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 22. ed. ver. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2007. p. 96. 71 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 7. ed. ver. atual. e ampliada. São
Paulo: Malheiros, 2004. p. 42. 72 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. p. 7.
34
mandamentos da lei, deles não se podendo afastar, sob pena de invalidade do ato e
responsabilidade de seu autor, ou seja, é a submissão da Administração às leis,
devendo essa obedecê-las, cumpri-las, pô-las em prática.
Neste sentido, as lições de Marcelo Alexandrino e Vicente
Paulo73:
[...] a legalidade traduz a idéia de que a Administração Pública somente tem possibilidade de atuar quando exista lei que o determine (atuação vinculada) ou autorize (atuação discricionária), devendo obedecer estritamente ao estipulado na lei, ou, sendo discricionária a atuação, observar os termos, condições e limites autorizados na lei.
Além do mais, o princípio da legalidade cumpre um propósito
político, qual seja, de impedir qualquer favoritismo, perseguição ou desmando74.
2.2.2 Princípio da Impessoalidade
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
procura, com a instituição do princípio da impessoalidade, combater diretamente o
entendimento de que questões pessoais sejam o principal objetivo das atividades
administrativas. Deste modo, decisões alimentadas por questões envoltas de
particularidades, tais como, vingança, antipatias, simpatias, nepotismo,
favorecimentos em processo licitatórios são práticas, claramente, repelidas por este
princípio constitucional. “Busca, portanto, que predomine o sentido de função, isto é,
a idéia de que os poderes atribuídos finalizam-se ao interesse de toda a
coletividade, portanto a resultados desconectados de razões pessoais”.75
Deste modo, a Administração Pública, não deverá ater-se em
dispensar tratamento provido de comportamentos de caráter pessoal que possam
privilegiar ou prejudicar determinados setores. Se assim o proceder, o administrador
estará comprometendo seriamente o bom desempenho de sua atividade funcional.
“Ele – agente público – é a Administração Pública, que não tem seu rosto e seus 73 ALEXANDRINO, Marcelo PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. p.194. 74 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. p. 97. 75 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p.126.
35
sentimentos. A ela - Administração – cabe agir com isonomia relativamente aos
administrados.76
A responsabilidade pela execução do ato administrativo é
inerente ao administrador que, conseqüentemente, é visto como instrumento de
“manifestação da vontade estatal e, portanto, as realizações administrativo-
governamentais não são do agente político, ma sim da entidade pública em nome da
qual atuou”.77
Mais uma vez, comprava-se a importância da existência dos
princípios, neste caso o da impessoalidade, compreendidos como entes
indispensáveis para a plenitude de um Estado de Direito “traduzido na construção de
um governo de leis e não de homens – esta desvinculação pessoal do governo é
fundamento e inspiração para a existência atual e concreta do princípio da
impessoalidade em nosso texto constitucional”.78
O princípio da impessoalidade objetiva igual tratamento, sem
discriminação, da Administração para todos os administrados, quer-se quebrar
qualquer privilégio no atendimento79.
De acordo com Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo80 o
princípio da impessoalidade deve visar ao interesse público, e lecionam:
A impessoalidade da atuação administrativa impede, portanto, que o ato administrativo seja praticado visando a interesses do agente ou de terceiros, devendo ater-se à vontade da lei, comando geral e abstrato em essência. Dessa forma, ele impede perseguições ou favorecimentos, discriminações benéficas ou prejudiciais aos administrados. Qualquer ato praticado com objetivo diverso da satisfação do interesse público será nulo por desvio de finalidade.
76 BERTONCINI, Mateus Eduardo Siqueira Nunes. Princípio de direito administrativo brasileiro. p.
103. 77 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. p. 312. 78 ROSA, Renata Porto de Adri. et. al.Princípios informadores do direito administrativo.São Paulo:
NDJ, 1997. p.24. 79 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. p. 9. 80 ALEXANDRINO, Marcelo PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado p. 198.
36
Os mesmos doutrinadores81 também afirmam que o princípio
está ligado à idéia de proibir a vinculação das atividades da Administração à pessoa
dos administradores.
Na visão de Hely Lopes Meirelles82, a impessoalidade
confunde-se com a finalidade, uma vez que impõe ao administrador uma atuação
que vise somente o seu fim legal, entendendo-se como fim legal o que a norma de
Direito indica expressa ou tacitamente como objetivo do ato, e que seja de forma
impessoal.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro83 aponta dois sentidos referentes
ao princípio da impessoalidade:
Exigir impessoalidade da Administração tanto pode significar que esse atributo deve ser observado em relação aos administrados como à própria Administração. No primeiro sentido, o princípio estaria relacionado com a finalidade pública que deve nortear toda a atividade administrativa. Significa que a Administração não pode atuar com vistas a prejudicar ou beneficiar pessoas determinadas, uma vez que é sempre o interesse público quem tem que nortear o seu comportamento. [...]
Dessa forma, a obediência ao princípio da impessoalidade
aplica-se tanto ao tratamento equitativo dispensado aos administrados quanto à
imputação dos atos praticados, que deve ser atribuída ao órgão ou à entidade da
Administração Pública e sempre deve visar o Interesse Público.
2.2.3 Princípio da Moralidade
É certo que um dos grandes males que assolam a sociedade
brasileira diz respeito à impunidade que, claramente, influencia a prática de ilícitos
diversos que, no caso da Administração Pública, tem-se, como principal exemplo, a
prática de atos envoltos pela corrupção, assim, através da inserção do princípio da
81ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado p. 199. 82 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. p. 92. 83 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. p. 67.
37
moralidade na Constituição da República Federativa de 1988, procurou-se de certa
forma combater esta nefasta prática pelo ente público.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro apresenta, de forma mais clara, a
questão ora apresentada quando afirma:84
Com a inserção do princípio da moralidade na Constituição, a exigência de moralidade estendeu-se a toda a Administração Pública, e a improbidade ganhou abrangência maior, porque passou a ser prevista e sancionada com rigor para todas as categorias de servidores públicos e a abranger infrações ou outras que não apenas o enriquecimento ilícito.
Não basta que o administrador público cumpra com suas
atribuições estritamente em conformidade com a legalidade. Deve, entretanto, atuar
respeitando “os princípios éticos de razoabilidade e justiça, pois a moralidade
constitui, a partir da Constituição de 1988, pressuposto de validade de todo ato da
administração pública”.85
A questão ética estabelece um elevado grau de dificuldade de
compreensão haja vista a abrangência de seu conceito e, ainda, da variação que
ocorre de lugar para lugar e, da mesma forma, de tempo em tempo. Esta dificuldade
é sensivelmente reduzida quando, flagrantemente, percebe-se a imoralidade em
determinados atos praticados pela Administração Pública.86
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
prevê, no seu art. 5º, inciso LXXIII, a possibilidade de qualquer cidadão propor ação
popular para anular ato lesivo à moralidade administrativa. Como, da mesma forma,
“a moralidade pode se controlada internamente pela própria Administração, e
externamente através do Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Consta, do
Judiciário e das Comissões Parlamentares de Inquérito”.87
84 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. p. 671. 85 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. p. 312. 86 ROSA, Renata Porto de Adri. et. al.Princípios informadores do direito administrativo. p. 186. 87 ROSA, Renata Porto de Adri. et. al.Princípios informadores do direito administrativo. p. 186.
38
O princípio da moralidade regula o agir da Administração
Pública através de um conjunto de regras de conduta88, portanto deverá seus
agentes atuar na conformidade de princípios éticos.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello89, a Administração
deverá proceder em relação aos administrados com sinceridade, sendo lhe interdito
qualquer comportamento astucioso, eivado de malícia, produzido de maneira a
confundir, dificultar ou minimizar o exercício de direitos por parte dos cidadãos.
De acordo Odete Medauar90 o princípio da moralidade é de
difícil tradução verbal, talvez porque seja impossível enquadrar em um ou dois
vocábulos a ampla gama de condutas e práticas desvirtuadoras [...].
A mesma doutrinadora afirma que a Constituição Federal
aponta instrumentos para sancionar sua inobservância, sendo um deles a ação
popular proposta para anular ato lesivo à moralidade administrativa.
Pode-se relacionar o princípio da moralidade à idéia de
probidade e de boa-fé, sendo vedada a Administração Pública qualquer
comportamento que os contrarie91.
O artigo 2º, parágrafo único, inciso IV, da Lei n. 9.784/199992,
vincula a moral administrativa à idéia de probidade e boa-fé:
Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:
88 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. p. 10. 89 MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. p. 115. 90 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 125. 91 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. p. 10. 92 Lei que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.
39
IV - atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé; [...]
No que diz respeito à moral administrativa, Emerson Garcia e
Rogério Pacheco Alves93 destacam:
A moral administrativa, por sua vez, é extraída do próprio ambiente institucional, condicionando a utilização dos meios (rectius: poderes jurídicos) previstos em lei para o cumprimento da função própria do Pode Público, a criação do bem comum, o que denota um tipo específico de moral fechada, sendo fruto dos valores de um círculo restrito ocupado pelos agentes públicos. Enquanto a moral comum direciona o homem em sua conduta externa, permitindo-lhe distinguir o bem do mal, a moral administrativa o faz em sua conduta interna, a partir das idéias de boa administração e de função administrativa, conforme os princípios que regem a atividade administrativa.
Nessa seara, a Administração Pública deve observar os
princípios do direito e da moral na busca dos interesses sociais.
2.2.4 Princípio da Publicidade
Todo ato promovido pela Administração Pública deve estar ao
alcance do conhecimento de qualquer cidadão, exceto aqueles considerados
sigilosos que, se divulgados, comprometem a segurança de pessoas ou de
instituições. Estas exceções estão previstas na Constituição da República
Federativa do Brasil de 1988 que dispõe em seu art. 5º, incisos X e XXXIII94:
X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
XXXIII – todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse coletivo ou geral que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado.
A exigência de publicidade na Administração Pública objetiva
não só permitir ao cidadão conhecer os atos de quem esta no poder e, assim, ter a
93 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. p. 73. 94 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
40
possibilidade de controlá-los, mas também porque este princípio é, por si mesmo,
um instrumento que permite diferenciar o lícito do ilícito.95
No Estado Democrático de Direito parte-se da premissa de
que o poder reside no povo, portando, deve-se combater toda pratica administrativa
que resulte no “ocultamento aos administrados dos assuntos que a todos
interessam, e muito menos em relação aos sujeitos individualmente afetados por
alguma medida.96
O princípio da publicidade é responsável pela divulgação de
atos, contratos e outros instrumentos celebrados pela Administração Pública direta e
indireta, para conhecimento, controle e início de seus feitos, trata-se, portanto, de
importante instrumento para manter a transparência97.
Há exceção para essa transparência, assim citadas por
Gasparini98:
[...] os atos e atividades relacionados com a segurança nacional (art. 5º, XXXIII, da CF), os ligados a certas investigações, a exemplo dos processos disciplinares, de determinados inquéritos policiais (art. 20 do CPP) e dos pedidos de retificação de dados (art. 5º, LXXII, b, da CF), desde que prévia e justificadamente sejam assim declarados pela autoridade competente.
É por meio da publicidade que se exerce efetivamente a
democracia. Isso, por que é necessário que o povo, em um regime democrático,
saiba do que ocorre, saiba dos atos que estão sendo praticados nas repartições
públicas e pelos agentes públicos.
Acerca do princípio da publicidade, Lucas Rocha Furtado99
posiciona-se:
95 ROSA, Renata Porto de Adri. et. al.Princípios informadores do direito administrativo. p. 254. 96 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo, p. 110. 97 FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. p. 62. 98 GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. p. 11. 99 FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 108.
41
A publicidade é conseqüência direta do princípio democrático. Somente em regimes ditatoriais pode ser admitida – até porque não há outra opção – a prática de atos secretos, sigilosos. É direito da população, e dever do administrador; divulgar os atos praticados pela Administração a fim de que possam os cidadãos tomar as providências necessárias ao controle da legalidade, da moralidade, da eficiência das atividades do Estado.
Diógenes Gasparini100 assevera que “esse princípio torna
obrigatória a divulgação de atos, contratos e outros instrumentos celebrados pela
Administração Pública direta e indireta, para conhecimento, controle e início de seus
efeitos [...]”.
Sendo assim, a publicidade é requisito de eficácia e
moralidade, não podem os atos irregulares convalidar-se com ela, nem os regulares
a dispensarem para sua exeqüibilidade.
2.2.5 Princípio da Eficiência
A Administração Pública procura, tendo a eficiência como uma
aliada executar suas atribuições de modo célere e seguro. “Eficiência contrapõe-se a
lentidão, a descaso, a negligência, a omissão – características habituais da
Administração Pública brasileira, com raras exceções” 101.
Ressalta-se, porém, que a subordinação da Administração
Pública não deve representar uma radical imposição aos requisitos inerentes à
lucratividade íntimos de instituições privadas. “Ao contrário, atividade estatal deverá
traduzir valores de diversa ordem, não apenas aqueles de cunho econômico” 102.
Diferem, portanto, do ponto de vista público do privado,
enquanto neste prevalece à intenção de particulares naquele predomina a
coletividade. “[...] a Administração Pública não administra para si, para fazer
100 GASPARINI, Diogenes. Direito administrativo. p. 11. 101 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p.129. 102 JUSTEM FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. p.65.
42
concretizar seus próprios interesses, mas sim aqueles interesses qualificados
legalmente, o bem comum e a principiologia constitucional” 103.
Cabe, entretanto, salientar que a atividade administrativa é
pautada pela aplicação, de forma conjunta e com elevada intensidade, de vários
princípios. Procura-se, desta forma, reduzir o desperdício econômico tendo em vista
a aplicação de procedimentos que, claramente, intentam a otimização de resultados.
“Quando houver incompatibilidade entre a eficiência econômica e certos valores
fundamentais, deverá adotar-se a solução que preserve ao máximo todos os valores
em conflito, mesmo que tal signifique uma redução da eficiência econômica”.104
Incluído pela Emenda Constitucional 19, de 4.6.1998, no seu
artigo 3º, alterando o caput do art. 37.
O princípio da eficiência impõe à Administração Pública Direta
e Indireta a obrigação de realizar suas atribuições com rapidez, perfeição e
rendimento, para produzir resultados que satisfaçam as necessidades da
população105.
No entendimento de Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo106 o
objetivo é assegurar que os serviços públicos sejam prestados com adequação às
necessidades da sociedade.
E continuam107:
A idéia de eficiência aproxima-se da de economicidade, princípio expresso no art. 70, caput, da Constituição, referente ao controle financeiro da Administração Pública. Busca-se atingir os objetivos traduzidos por boa prestação de serviços, do modo mais simples, mais rápido, e mais econômico, melhorando a relação custo/benefício da atividade da Administração.
103 COELHO, Paulo Magalhães da Costa. Manual de direito administrativo. p. 50. 104 JUSTEM FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. p. 86. 105 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. p. 127. 106 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. p. 204. 107 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. p. 204.
43
Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro108, o princípio da eficiência
apresenta dois aspectos:
[...] pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público (grifo da autora).
Alexandre de Moraes109 aponta como características básicas
do princípio da eficiência o direcionamento da atividade e dos serviços públicos à
efetividade do bem comum, imparcialidade, neutralidade, transparência, participação
e aproximação dos serviços públicos da população, eficácia, desburocratização e
busca da qualidade.
Com isso, o princípio da eficiência é aquele que impõe à
Administração Pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem
comum, por meio do exercício de suas competências e primando pela adoção dos
critérios legais e morais necessários à melhor utilização possível dos recursos
públicos, de maneira a evitarem-se desperdícios e garantir-se uma maior
rentabilidade social110.
2.2.6 Princípio da supremacia do Interesse público
Apesar de não estar expressamente elencado no artigo 37 da
Constituição, este princípio se faz importante frete ao tema em discussão.
Previsto expressamente no artigo 2º da Lei n. 9.784/99111, o
princípio da supremacia do Interesse Público (ou do Interesse Público), traz a
exigência de atendimento aos fins de interesse geral, vedada à autoridade
administrativa a renúncia de poderes e competências, salvo autorização em lei. 108 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. p. 82. 109 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. p. 312. 110 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. p. 310. 111 Art. 2º. A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade,
motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.
44
O princípio do Interesse Público está intimamente ligado ao da
finalidade. A primazia do Interesse Público sobre o privado é inerente à atuação
estatal e denomina-a, na medida em que a existência do Estado justifica-se pela
busca do interesse geral112, como já visto anteriormente nos apontamentos acerca
do Estado e da Administração Pública.
Acerca desse princípio Celso Antônio Bandeira de Mello113
ensina:
O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. Assim, não se radica em dispositivo específico algum da Constituição, ainda que inúmeros aludam ou impliquem manifestações concretas dele, como, por exemplo, os princípios da função social da propriedade, da defesa do consumidor ou do meio ambiente (art. 170, III, V e VI), ou tantos outros. Afinal, o princípio em causa é um pressuposto lógico do convívio social.
Igualmente, por meio do princípio da supremacia do Interesse
Público garante-se aos administrados que a Administração Pública dê prevalência
aos interesses gerais sobre os individuais, bem como atue vinculadamente na busca
pelo Interesse Público, sob pena de, não o fazendo, desvirtuar a finalidade da
atividade administrativa.
Dessa forma, percebe-se que, em razão desse imperativo, o
Agente Público não pode visar outra finalidade que não o Interesse Público inerente
à atividade estatal, devendo os poderes outorgados a ele serem empregados
rigorosamente com a observância das normas legais, sendo injurídica a utilização
desses poderes que acabe por violar direitos individuas sob a alegação de que se
trata da supremacia do interesse geral, sem o sê-lo efetivamente114.
112 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. p. 103. 113 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. p. 96. 114 GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade administrativa. p. 56.
45
2.2.7 Princípio da Continuidade
Por esse princípio entende-se que o serviço público, sendo a
forma pela qual o Estado desempenha funções essenciais ou necessárias à
coletividade, não pode parar115, os desejos dos administrados são contínuos116.
A interrupção de um serviço público prejudica toda a
coletividade, que dele depende para a satisfação de seus interesses e
necessidades117.
Para Diógenes Gasparini118 o princípio da continuidade nem
sempre significa atividade ininterrupta, sem intermitência, mas tão-só regular, isto é,
de acordo com a sua própria natureza ou forma de prestação. Assim, são contínuos
os serviços de coleta de lixo, executados pela Administração Pública a intervalos
certos, de três em três dias, por exemplo.
Para Marcelo Alexandrino e Vicente Paulo119 esse princípio
implica restrição de determinados direitos dos prestadores de serviços públicos e
dos agentes envolvidos em sua prestação, por exemplo, a impossibilidade de o
particular prestador de serviço público por delegação interromper sua prestação,
mesmo que o poder concedente descumpra os termos do contrato que tenha
celebrado com ele. Essa restrição é denominada “exceção do contrato não
cumprido”.
115 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. p. 88. 116 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. p. 17. 117 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado p. 212. 118 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. p. 18. 119 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. p. 212.
CAPÍTULO 3
SERVIÇO PÚBLICO, GREVE E DESCONTO SALARIAL
3.1 DIREITO DE GREVE
3.1.1 Greve
A denominação “greve” surgiu após a Revolução Francesa,
porque os operários que abandonavam coletivamente o trabalho iam para a Praça
da Prefeitura, em Paris, conhecida como “Place de greve”, porque era comumente
invadida por cascalhos (“grève”, em francês), advindos do rio Sena120.
Os grevistas buscam com esse instituto forçar o/ou os
empregadores a atender as suas reivindicações diante do abandono, coletivo e
temporariamente, do serviço121, é, portanto, um mero instrumento de pressão, que
visa propiciar alcance de certo resultado concreto, em decorrência do
convencimento da parte confrontada122.
No entendimento de Amauri Mascaro Nascimento123:
[...] greve é uma garantia coletiva constitucional; a oportunidade de seu exercício e os interesses através dela defendidos são aqueles definidos pelos trabalhadores, que devem fazê-lo de modo abusivo, mantendo, nas atividades essenciais, o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.
120 SUSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. 2 ed. ver. e atualiz. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 608. 121 SAAD, Eduardo Gabriel. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2000. p. 372. 122 DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2010. p.
1316. 123 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação do direito do trabalho. 27. ed. ver. e atual. São
Paulo: LTr, 2001. p. 562.
47
Frente ao direito positivo brasileiro, a greve deve ser
conceituada como suspensão coletiva, temporária e pacífica, da prestação pessoal
de serviços em uma ou mais empresas, no todo ou em parte, determinada por
entidade sindical representativa dos respectivos empregados (a hipótese de
comissão de negociação deve ser desprezada em face da existência de
confederações de todos os ramos profissionais), com a finalidade de pressionar a
correspondente categoria econômica, ou os empresários, para a instituição ou
revisão de normas ou condições contratuais ou ambientais de trabalho, assim como
para o cumprimento de disposições de instrumento normativo124.
No ensinamento de José Afonso da Silva125:
Inicia-se com base num procedimento jurídico: acordo dos trabalhadores em assembléia sindical; Ela, assim se desencadeia e se desenvolve sob a égide do poder de representação do sindicato, pois é um instrumento dos trabalhadores coletivamente organizados para a realização de melhores condições de trabalho para toda a categoria profissional envolvida. Vê-se, pois, que ela não é um simples direito fundamental dos trabalhadores, mas um direito fundamental de natureza instrumental e desse modo se insere no conceito de garantia constitucional, por que funciona como meio posto pela Constituição à disposição dos trabalhadores, não como um bem auferível em si, mas como um recurso de última instância para a concretização de seus direitos e interesses.
E continua o mesmo autor126:
[..] os trabalhadores podem decretar greves reivindicativas, objetivando a melhoria das condições de trabalho, ou greves de solidariedade, em apoio a outras categorias ou grupos reprimidos, ou greves políticas, com o fim de conseguir as transformações econômico-sociais que a sociedade requeira, ou greves de protestos.
Foi assegurado pela Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 (art. 9º, §§ 1º e 2º)127 o direito de greve aos trabalhadores em geral,
124 SUSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. 2. Ed. ver. e atualiz. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 617. 125 SILVA, Jose Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 26 ed. ver. atual. São Paulo:
Malheiros Editores Ltda, 2006. p. 304. 126 SILVA, Jose Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 26 ed. ver. atual. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2006. p. 304. 127 Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a
oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.
48
ressalvados os serviços e atividades essenciais e o atendimento das necessidades
inadiáveis da comunidade, a serem definidos em lei federal128, assim a norma é de
eficácia restringível (contida), pois as atividades essenciais devem ser
resguardadas.
Deve-se deixar claro que a Lei n. 7.783, de 28 de junho de
1989, dispõe sobre o exercício do direito de greve para os trabalhadores privados,
define as atividades essenciais e regula o atendimento das necessidades inadiáveis
da comunidade.
3.1.2 Histórico no Brasil
Na lição de Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins129 a
greve, no Brasil, começa a partir da industrialização nacional, verificando-se vários
distúrbios nas empresas, sobretudo em São Paulo, com caráter mais sério, a partir
de 1917.
A história da greve, hoje reconhecida como direito do
trabalhador, se confunde com a do sindicalismo, até porque ela sempre foi utilizada
como um dos processos de atuação dos sindicatos, visando ao êxito das suas
reivindicações em favor dos trabalhadores por eles representados.
Nas lições de Orlando Gomes e Elson Gottschalk130, a greve
no Brasil teve sua fase de tolerância, proibição e reconhecimento, como delito e
como direito.
§ 1º - A lei definirá os serviços ou atividades essenciais e disporá sobre o atendimento das
necessidades inadiáveis da comunidade.
§ 2º - Os abusos cometidos sujeitam os responsáveis às penas da lei. 128 ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo. 4. Ed. ver. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2009. p. 291. 129 BASTOS, Celso Bastos; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentários a Constituição do
Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 2. Volume: arts. 5 a 17. 3. Ed. ver. atual. São Paulo: Saraiva, 2004. p. 574.
130 GOMES, Orlando e GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 17ª Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. p. 637.
49
Os mesmos autores ainda afirmam que “antes de 1930,
entretanto e a partir do início do século XX, era praticada livremente.”
Com a Constituição dos Estados Unidos do Brasil de 1937 a
greve passou a ser recurso nocivo ao capital e ao trabalho131, o Código Penal de
1940 incluiu um título IV, para punir os crimes contra a organização do trabalho,
inclusive a greve exercida em determinadas circunstâncias132.
Ainda quanto ao histórico do instituto da greve no Brasil, os
mesmos autores133, lecionam:
Com o Dec.-Lei nº 9.070, de 15 de março de 1946, anterior à Constituição de 1946, mais inspirado na “Declaração de Princípios da América”, pouco antes do fim da última Guerra Mundial, o Brasil voltou à tradição liberal, reconhecendo o direito de greve. Sobrevinda a Constituição de setembro de 1946, encontrou em vigor aquele decreto-lei, considerado constitucional pelo Supremo Tribunal Federal em face dos amplos termos contidos no texto: “É reconhecido o direito de greve, cujo exercício a lei regulará” (art. 158). Posteriormente, porém, o art. 158 da Constituição foi regulamentado pela Lei nº 4.330, de 1º de junho de 1964, que estabeleceu profundas alterações ao diploma anterior.
A Constituição de 1967 reconheceu o direito de greve (art. 158, alínea XXI), mas não a permitiu nos serviços públicos e atividades essenciais, revogando, assim, parcialmente, a Lei nº 4.330, de 1º de junho de 1964. Igual disposição foi inserida na Emenda nº 1, de 17 de outubro de 1969.
Arnaldo Sussekind134 distingue depois das Emendas
Constitucionais nºs 18 e 19 da Constituição de 1988, grupos que cabem ao direito de
greve:
[...] empregados de empresas privadas, que abrangem as sociedades de economia mista e as chamadas empresas públicas, e
131 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 3. Ed. ver. e ampl. São Paulo: LTr,
2007. p. 1277. 132 GOMES, Orlando e GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 17ª Ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2006. p. 637. 133 GOMES, Orlando e GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 17ª Ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2006. p. 637. 134 SUSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. 2. Ed. ver. e atualiz. Rio de Janeiro:
Renovar, 2004. p. 611.
50
às quais se equiparam “os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados (art. 2º, § 1º, da CLT).
Servidores públicos da administração direta e indireta (autarquias e fundações públicas) de qualquer dos poderes da União dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (art. 37, VII, com a redação advinda da Emenda Constitucional nº 19, de 4.6.98).
Militares das Forças Armadas (art. 142, IV, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 18, de 5.2.98).
Militares dos Estados, Distrito Federal e Municípios, integrantes das Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares, organizados com base na hierarquia e disciplina (art. 42, §5º, com as alterações determinadas pela Emenda Constitucional nº 18 cit.).
3.2 DA GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO
3.2.1 Noções gerais
Foi assegurado pela Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988 o direito de greve aos servidores públicos, como está previsto no
inciso VII, do art. 37, in verbis:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
Fernanda Marinela135 ressalta que o texto constitucional
quando menciona lei específica, se refere a uma lei ordinária que deve cuidar
especificamente desse assunto, portanto, não pode ser considerado
135 MARINELA, Fernanda. Direito administrativo. 4 ed. Niterói: Ímpetus, 2010. p. 649.
51
automaticamente exercitável com a simples promulgação da Constituição de
1988136.
Gera discussão quanto à natureza dessa norma no que diz
respeito à aplicabilidade das normas constitucionais, entre uma norma de eficácia
contida e outra de eficácia limitada137:
A corrente minoritária defende tratar-se de norma de eficácia contida, também denominada norma de eficácia restringível ou resolúvel. Orienta que o servidor público pode fazer greve desde já, todavia, quando a lei específica for aprovada, ela poderá regulamentar e restringir o exercício desse direito.
De outro lado, tem-se a corrente majoritária que entende tratar-se de uma norma de eficácia limitada, que não é autoaplicável, o que significa dizer que os servidores não podem exercer o direito enquanto não for editada a lei regulamentando a matéria. Dessa forma, considerando que o princípio da legalidade para o direito público estabelece que os agentes só podem fazer o que está previsto ou autorizado em lei, e como até o presente momento a lei ainda não foi elaborada, o exercício da greve representava, como regra, uma conduta ilegal.
Odete Medauar138 destaca três entendimentos:
a) a ausência de lei não elimina esse direito, que o servidor poderá exercer; b) a ausência de lei impede o servidor de exercer o direito de greve; c) a ausência de lei não tem o condão de abolir o direito reconhecido pela constituição Federal, devendo-se por analogia, invocar preceitos da lei referente à greve dos trabalhadores do setor privado (Lei 7.783, de 28.06.1989), em especial quanto a serviços essenciais.
Apesar de gozar desse direito, os servidores públicos tem
dificuldades para exercê-lo de forma legítima porque a citada lei específica ainda
não foi editada pelo Congresso Nacional139. Fato este que possibilita ao Supremo
Tribunal Federal, em face da inércia do legislador, à sua decisão no julgamento de
três mandados de injunção, determinando a aplicação temporária ao setor público,
136 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. p. 289. 137 MARINELA, Fernanda. Direito administrativo. 4 ed. Niterói: Ímpetus, 2010. p. 649. 138 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 11 ed. ver. e atual. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2007. p. 280. 139 MARINELA, Fernanda. Direito administrativo. p. 649.
52
no que couber, da lei de greve vigente no setor privado (Lei 7.783/1989), até que
seja editada a lei regulamentadora140.
Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei n. 4.497, de
2001141, que dispõe sobre os termos e limites do exercício do direito de greve pelos
servidores públicos.
3.2.2 Situação atual sobre greve no serviço público
Em 2007, o Supremo Tribunal Federal, rompendo com sua
tradição em mandado de injunção, adotou a teoria concretista geral, julgando
procedente novos mandados de injunção sobre o assunto (MI 670/ES, 708/DF e
712/PA), para declarar mora legislativa abusiva e conceder ao servidor o direito de
exercer greve, observados os preceitos da Lei 7.783/89, que trata da greve na
iniciativa privada.
A decisão resolveu preencher uma lacuna legislativa, com
efeitos erga omnes, utilizando-se da analogia para determinar a utilização da lei
referida até que adviesse a lei específica preconizada na Constituição.
A partir dessa decisão, começaram a surgir várias discussões
sobre os contornos do direito de greve dos servidores públicos.
Sobre os serviços que não podem ser objeto de greve, além
das proibições constitucionais relativas aos militares das forças armadas e aos
policiais militares (art. 142, § 3º, IV, c/c art. 42, § 1º), há entendimento do ex-ministro
Eros Grau no sentido de que policiais civis também não podem entrar em greve.
Aliás, para esse ministro, o direito de greve não é absoluto. Há serviços públicos em
que a coesão social impõe sejam prestados plenamente, em sua totalidade.
Nesse sentido, Eros Grau entendeu ser proibida a greve nos
serviços de segurança pública, de administração da Justiça, de arrecadação
140 ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. p. 289. 141 Verificar em http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=27779
53
tributária e de saúde pública (Recl 6.568, DJ 25/09/09), posição que ainda não está
pacificado no STF142.
No Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, vem se admitindo
a greve nos mais variados setores, salvo os proibidos pela Constituição. No entanto,
levando em conta os princípios da supremacia do interesse público e da
continuidade do serviço público, esse tribunal vem, caso a caso, estipulando um
percentual mínimo de pessoal a continuar trabalhando, a fim de que não haja
paralisação total dos serviços.
A título de exemplo, o STJ143, considerando o período eleitoral,
definiu em 80% o mínimo de servidores necessários na Justiça Eleitoral (Pet 7.933,
DJ 08/06/2010). Para a Justiça Federal, fixou-se em 60% o mínimo de servidores em
serviço (Pet 7.961, DJ 18/06/2010). E para os médicos peritos do INSS144,
determinou-se que 50% mantivessem o trabalho (Pet 7.985, DJ 25/06/10).
Para fazer valer suas decisões o Superior Tribunal de Justiça
vem fixando o pagamento de multa à entidade representante dos trabalhadores, no
caso de descumprimento de decisão relativa à greve. Trata-se de multa diária, que
vem sendo fixada entre R$ 50.000,00 (Cinqüenta Mil Reais) e R$ 100.000,00 (Cem
Mil Reais) para sindicatos de grande porte.
Quanto a possibilidade de corte nos vencimentos dos grevistas,
o STJ, possui controvérsia a respeito. O posicionamento tradicional admite o corte.
Mas há decisão recente no sentido de que, por se tratar de direito constitucional do
servidor e envolver verba alimentar, o corte é proibido (MC 16.744, J. 10/05/10). É
bom lembrar que a Lei 8.112/90 dispõe que só por lei é possível o desconto de
vencimentos (art. 45). Ademais, ainda não foi instituído um Fundo de Greve, com
contribuições para o exercício desse direito constitucional. Nada impede, todavia,
que se determine que o servidor grevista reponha, posteriormente, as horas não
trabalhadas. Observe-se o que determinou o Conselho Nacional de Justiça com
142 Supremo Tribunal Federal. 143 Superior Tribunal de Justiça. 144 Instituto Nacional do Seguro Social.
54
relação a pedido de providências em relação a greve dos Servidores de Justiça do
Estado de Pernambuco145:
Os servidores não devem enfraquecer o movimento paredista com receio dos descontos em folha. O Conselho Nacional de Justiça já decidiu, em 2010, em acórdão proferido no Pedido de Providências nº 0003909-31.2010.2.00.0000, decidiu que o desconto dos dias parados em greve só pode ser feito após o oferecimento da opção de compensação das horas.
Requerente: Sindicato dos Servidores de Justiça do Estado de Pernambuco Requerido: Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco ACÓRDÃO EMENTA: SERVIDOR PÚBLICO. GREVE. DESCONTO NOS VENCIMENTOS. ATO ADMINISTRATIVO. COMPETÊNCIA DO CNJ. LEGALIDADE. IMPOSSIBILIDADE FÁTICA E/OU JURÍDICA DE COMPENSAÇÃO DAS HORAS NÃO TRABALHADAS. INOCORRÊNCIA. OPÇÃO DO SERVIDOR. PROVIMENTO PARCIAL. 1. O ato ou decisão que determina o corte no vencimento dos servidores públicos do Poder Judiciário em razão da realização de greve reveste-se de inegável natureza administrativa, estando, pois, sujeito ao controle de legalidade pelo Conselho Nacional de Justiça, nos termos do inciso II do § 4º do artigo 103-B da Constituição. 2. O desconto direto de valores nos vencimentos dos servidores públicos do Poder Judiciário em razão da realização de greve somente pode ocorrer depois de facultado ao servidor optar em compensar os dias de paralisação com o trabalho. 3. Provimento parcial.
Quanto a questão específica do desconto dos dias paralisados,
o Tribunal Regional da 4ª Região assim se manifestou146:
Processo: AC 7200 SC 0013866-45.2009.404.7200. Relator(a): MARGA INGE BARTH TESSLER Julgamento: 09/02/2011 Órgão Julgador: QUARTA TURMA Publicação: D.E. 16/02/2011
145 Disponível em: http://www.aspj-pe.org.br/noticias.php?cod=950. 146 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal 4ª Região:
http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/18590143/apelacao-civel-ac-7200-sc-0013866-4520094047200-trf4
55
Ementa ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. FUNCIONÁRIO PÚBLICO. DIREITO DE GREVE. DESCONTO DOS DIAS NÃO TRABALHADOS. IMPOSSIBILIDADE.
1. A Constituição Federal, rompendo com a sistemática anterior, dá ao servidor público o direito de greve (CF, art. 37, inciso VII). Trata-se de 'norma de eficácia contida'. Isso quer dizer que lei complementar estabelecerá limites para o exercício do direito de greve, embora não possa dificultá-lo excessivamente. Mas, enquanto não vierem tais limitações, o servidor público poderá exercer seu direito. Não fica jungido ao advento da lei complementar regulamentadora.
2. Não se enquadrando os dias paralisados, em virtude de greve, nos casos previstos de falta não justificada, e não havendo qualquer previsão legal nesse sentido, não pode haver descontos nos vencimentos dos substituídos.
3. O desconto de vencimentos no período que perdurar o movimento paredista não fica autorizado. Precedente do STF.
Importante observar que a Administração Pública pode
descontar os dias parados, mas o não desconto é sempre uma cláusula de
negociação. Recentemente, o Secretário de Administração do Município de
Campinas147 – SP, ao comentar sobre o movimento grevista que se deflagrou no
município, afirmou:
Os servidores fizeram tudo dentro da lei. A greve é legal. No entanto, o Executivo entende que todos os serviços públicos são essenciais e não apenas saúde ou educação. Não se pode privar a população desses serviços. Portanto, o servidor que resolver parar terá seus dias descontados.
Ao servidor público somente será possível e legal a
deflagração de greve depois de editada lei específica, seja na esfera Federal,
Estadual ou Municipal, posto que a Lei nº 7783/89 (Lei de Greve) não se aplica aos
servidores públicos estatutários, conforme disposição expressa.
Desta forma, servidores públicos que participarem de
movimento grevista estão sujeitos a aplicação de sanções disciplinares, apuradas
147 Disponível em: http://www.rac.com.br/noticias/campinas-e-rmc/84099/2011/05/17/prefeitura-vai-descontar-dias-parados-dos-grevistas.html
56
em devido processo administrativo, por falta injustificada ao trabalho, podendo ser
descontados os dias não trabalhados.
No que se refere aos servidores em estágio probatório, a sua
participação em movimento grevista acarreta avaliação negativa de sua conduta no
serviço público, podendo ensejar a sua exoneração antes do término do estágio,
instaurado o competente processo administrativo disciplinar Mas, tal servidor,
embora não esteja ainda efetivado, ainda sem estabilidade no serviço público, tem
assegurado todos os direitos constitucionais previstos aos demais servidores,
podendo exercitar seu direito constitucional de participação na greve148.
148 BRASÍLIA. Supremo Tribunal Federal. 1ªT., RE 226966/RS, rel. orig. Min. Menezes Direito, rel. p/ o acórdão Min. Carmen Lúcia, 11.11.2008. inf. 528.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Administração Pública só existe em virtude da presença do
corpo de servidores públicos, que materializa as ações administrativas.
Um dos principais instrumentos de pressão para negociação
em questões de interesse dos trabalhadores lato sensu é a greve. Antes vedada
pelo ordenamento jurídico, com o advento da Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988, sobreveio respaldo jurídico para o exercício do movimento
grevista, a depender de regulamentação infraconstitucional, até hoje inexistente.
Aplicando-se analogicamente a lei de greve da iniciativa
privada (Lei 7.783/89), abre-se a possibilidade do exercício desse direito pelos
servidores públicos, que não pode ser ceifado com o não-pagamento dos dias
parados.
A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem entendido
que é necessária lei para o exercício desse direito, ou seja, que tal norma tem
eficácia limitada. Preocupa a inoperância legislativa, que, mesmo após tantos anos
da promulgação da CRFB/88149, nada fez a respeito.
Assim se manifestou o Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
a mora do legislador não pode impedir o exercício do direito de greve e não autoriza
a administração a imputar faltas injustificadas aos servidores grevistas, à míngua de
autorização legal ou de deliberação negociada.
O exercício regular de um direito não pode ser punido, seja
qual for a penalidade aplicável.
O desconto na remuneração dos dias não trabalhados é uma
forma de punição.
149 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
58
No primeiro capítulo primou-se pela análise da Administração
Pública desenvolvendo seu conceito, histórico, organização e órgãos.
No capítulo segundo, foram abordados os agentes públicos e
os princípios fundamentais elencados no art. 37, caput, da CRFB/88.
Dentro da análise dos agentes públicos decorrem diversas
espécies de agentes públicos: a) agentes políticos; b) agentes administrativos; c)
agentes honoríficos; d) agentes credenciais.
Ainda no capítulo segundo abordou-se os princípios
norteadores do direito administrativo, os quais orientam todas as atividades da
Administração Pública.
O capítulo terceiro foi dedicado ao direito de greve, acentuando
o estudo do direito de greve do servidor público, bem como jurisprudência recente
sobre a matéria.
A greve é considerada como a suspensão coletiva, temporária
pacífica, total ou parcial, de prestação pessoal de serviços.
Constata-se, ainda, que a greve é a suspensão coletiva do
trabalho, pois a paralisação realizada por apenas uma pessoa não constitui greve,
podendo ensejar a dispensa por justa causa.
Atualmente o direito de greve do servidor público está
assegurado no art. 37, VII, da CRFB/88, que, antes da edição da EC150 19/1998,
previa que tal direito deveria ser fixado através de lei complementar. Com a EC
19/1998 passou a exigir lei específica para regulamentação do direito de greve, o
que até hoje não aconteceu.
Com a inércia do Poder Legislativo em regularizar sobre a
matéria, o STF, com vários mandados de injunção julgados, determinou que fosse
150 Emenda Constitucional.
59
aplicada a lei de greve dos empregados da iniciativa privada até a regulamentação
específica.
Com relação às hipóteses levantadas, observa-se que:
Primeira: Administração Pública pode ser definida como a
atividade desenvolvida pelo Estado para a consecução dos interesses coletivos,
sendo, também, o conjunto de órgãos e pessoas jurídicas que exercem a função
administrativa do Estado. Esta hipótese foi confirmada, conforme demonstrado no
primeiro capítulo da presente monografia.
Quanto a Segunda: Os princípios inerentes à Administração
Pública são aqueles expostos no art. 37 da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988, esses positivados de forma expressa, outros, de forma implícita.
Pode-se dizer que a presente hipótese foi confirmada, mas necessita de
esclarecimentos, visto que não são somente os princípios expressos no artigo 37 da
CRFB/88 que se aplicam à Administração Pública. Pode-se afirmar que os
estipulados no art. 37 são os diretamente aparentes, sem com isso, desmerecer os
demais princípios que se aplicam ao tema.
A Terceira: A Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 permitiu o direito à greve, devendo ser regulamentada por Lei, o que por
inércia estatal não ocorreu, levando o STF, por analogia, a aplicar a legislação
vigente à iniciativa privada foi confirmada na integra ao se observar a decisão do
STF no ano de 2007.
Quanto a quarta hipótese: A Legislação vigente não apresenta
orientação quanto ao desconto de dias parados por motivo de greve. O que se aplica
são as decisões dos tribunais. No caso específico dos descontos dos dias parados,
os Tribunais entendem que os dias parados devem ser descontados. Esta hipótese
ficou confirmada em parte, ou seja, não há legislação específica que regulamente a
greve dos servidores públicos. Correto afirmar que o que se aplica são as decisões
dos tribunais, visto a ausência legislativa. Finalmente, há uma preocupação nos
tribunais quanto aos descontos dos dias parados. Permitir a greve, mas enfraquecê-
60
la com a possibilidade de descontar os dias parados. Punição ou justiça? Como
meio termo, possibilitar a reposição dos dias parados, e assim, não efetivar o
desconto.
Quanto à Metodologia empregada foi utilizado o Método
Indutivo. Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas do
Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa Bibliográfica.
A intenção do graduando quanto ao trabalho desenvolvido foi o
de cumprir uma tarefa exigida pela legislação quanto à elaboração de um trabalho
de conclusão de curso, bem como não teve a intenção de abranger o tema na sua
totalidade, mas, poder contribuir com a discussão sobre a temática.
.
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS
ALEXANDRINO, Marcelo PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 18. ed. ver. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2010.
ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2007.
BALDACCI, Roberto Geits. Elementos do Direito. Direito Administrativo. 3 ed. São Paulo: Editora DPJ, 2004.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 8a ed., São Paulo, Malheiros, 1996.
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 3 ed. ver. e ampl. São Paulo: LTr, 2007.
BASTOS, Celso Bastos; MARTINS, Ives Gandra da Silva. Comentários a Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 2004.
BASTOS, Celso Ribeiro. Curso de Direito Administrativo Brasileiro. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2001.
BERTONCINI, Mateus Eduardo Siqueira Nunes. Princípio de direito administrativo brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2002.
BLANCHET, Luiz Alberto. Curso de Direito Administrativo. 5. ed. Curitiba: Juruá, 2008.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
BRASÍLIA. Supremo Tribunal Federal. 1ªT., RE 226966/RS, rel. orig. Min. Menezes Direito, rel. p/ o acórdão Min. Carmen Lúcia, 11.11.2008. inf. 528.
BRAZ, Petrônio. Manual de direito administrativo. 2 ed. São Paulo: Direito, 2001.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito administrativo. 17.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007.
COELHO, Paulo Magalhães da Costa. Manual de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2004.
CRETELLA JÚNIOR, José. Direito Administrativo Brasileiro. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense. 2000.
CUNHA JÚNIOR, Dirley. Direito administrativo. 30 ed. Bahia: Editora Juspodivm. 2004.
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 9. ed. São Paulo: LTr, 2010.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22.ed. São Paulo, Atlas, 2008.
62
FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Controle da Administração Pública, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1991.
FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Curso de direito administrativo. 7. ed. ver. atual. e ampliada. São Paulo: Malheiros, 2004.
FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2007.
GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa. 4 ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2008.
GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. 14.ed. ver. São Paulo: Saraiva, 2009.
GOMES, Orlando e GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. 17 Ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
JUSTEM FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005.
LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 13 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
MARINELA, Fernanda. Direito administrativo. 4 ed. Niterói: Ímpetus, 2010.
MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 11 ed. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2007.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27 ed. São Paulo: Malheiros. 2002.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33 ed. São Paulo: Malheiros, 2010.
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 22. ed. ver. e atual. São Paulo: Malheiros, 2007.
MELLO, Oswaldo Aranha Bandeira de. Princípios Gerais do Direito Administrativo. Rio de Janeiro: Forense, 1979. v. 2.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 13 ed. São Paulo: Atlas, 2003.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação do direito do trabalho. 27. ed. ver. e atual. São Paulo: LTr, 2001.
PASOLD, Cesar Luiz. Função social do estado contemporâneo. 2 ed. Florianópolis. OAB/SC, 2002.
PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 12 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2011.
RIO GRANDE DO SUL. Tribunal Regional Federal 4ª Região: http://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/18590143/apelacao-civel-ac-7200-sc-0013866-4520094047200-trf4
63
ROSA, Márcio Fernando Elias. Direito administrativo. 11. ed. reform. São Paulo: Saraiva, 2010.
ROSA, Renata Porto de Adri. et. al. Princípios informadores do direito administrativo.São Paulo:NDJ, 1997
SAAD, Eduardo Gabriel. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2000.
SILVA, Jose Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 26 ed. ver. atual. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2006.
SILVA, Plácido e. Vocabulário jurídico, 19 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002,
SUSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho. 2 ed. ver. e atualiz. Rio de Janeiro: Renovar, 2004.