da janela do meu quarto - uma visão do lugar onde vivo

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O livro "Da Janela do meu quarto – uma visão do lugar onde vivo" demonstra o ponto de vista de estudantes do Ensino Médio Integrado do Campus Tucuruí do IFPA, suas impressões e reflexões percebidas sobre o lugar onde vivem.Aqui vocêviajará pelas estradas de ferro – que muito contribuíram para a economia danossa região, fará um passeio pelo rio Tocantins e refletirá: onde estão suaságuas? Conhecerá nosso torneio de pesca esportiva, lembrará do seu dia a diaquando sonha, se indaga, se indigna. Indigna? Sim! Afinal, nem só de crônicas econtos este livro é composto. Os artigos de opinião revelam o quanto nossosestudantes estão desenvolvendo seu senso crítico e mostram que para issoacontecer, basta uma boa dose de ironia, conhecimento do assunto e pesquisa –receita que nossos autores seguiram.Para que você, leitor, recebesse as informações contidas neste livro, foramrealizadas entrevistas com moradores de Tucuruí, autoridades, pesquisas em sites,jornais e revistas especializadas, a fim de que os dados se mantivessem reais ecomprobatórios; esta parte da construção textual é importante, pois escrever émais transpiração que inspiração. Sem pesquisa não se chega ao alvo.Então, ouvindo música ou tomando um café com biscoitos o convidamos ase deliciar com estes textos simples, porém reveladores da realidade. Agora vocêestá no barco, pegue o seu remo e comece a navegar. Afinal, como dizia FrancisBacon: “A leitura torna o homem completo; a conversação torna-o ágil, e oescrever dá-lhe precisão .”Portanto, leia e se quiser, inspire-se para escrever também. Nunca digaque não sabe escrever, pois como afirmava o grande escritor Samuel Johnson “éescrevendo mal que um dia se chega a escrever bem. ”. Abra a janela do seuquarto e perceba que há muito a se descobrir no lugar onde você vive.Boa Leitura!Miranilde OliveiraOrganizadoraEbook: Yago Werner

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Reitor do IFPA Cláudio Alex Jorge da Rocha

Diretor Geral do Campus Tucuruí Anderson Walber de Jesus Barbosa

Diretor de Ensino, Pesquisa, Extensão, Inovação e Pós-Graduação Samuel da Luz Borges

Diretor de Administração e Planejamento Leonardo Possamai Mezzomo Coordenador de Extensão Ronaldo Meireles Martins

Coordenadora de Pesquisa, Inovação e Pós-Graduação Fernanda Atanaena Gonçalves de Andrade

Organizadora do livro Miranilde Oliveira Neves

Apoio Técnico e Organizacional Yago Werner Ferreira Costa

Projeto Gráfico Lays Andreza Alves Martins Yago Werner Ferreira Costa

Revisão Miranilde Oliveira Neves

D111 Da janela do meu quarto: uma visão do lugar onde vivo/ NEVES, Miranilde Oliveira (org.); ilustração COSTA, Yago Werner Ferreira, MARTINS, Lays Andreza Alves; fotografia BANDEIRA, Guilherme Barros. — Tucuruí/PA:Editora, 2014. 108 p.: il; color.: 21 cm. ISBN 978-85-6500-365-0 1. Literatura Brasileira. I. Neves, Miranilde Oliveira. II. Costa, Yago Werner Ferreira. III. Martins, Lays Andreza Alves. IV. Bandeira, Guilherme Barros. V. Título. CDD: 969.9

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Prefácio Raimundo Sanches

Nosso município carece de ter sua história contada e recontada.

Durante muito tempo, ouvimos que somos um lugar sem identidade cultural. Mas essa ideia não resiste a alguns estudos sobre sua origem e sobre seu povo. Não resiste também quando alguém resolve nos contar um pouco do seu olhar sobre a cidade. Vemos, então, que há muitas memórias latentes, pulsando para mostrar que Tucuruí tem sim uma identidade cultural e bastante significativa.

É o caso deste livro. As crônicas, contos e artigos de opinião aqui

presentes revelam um pouco da história deste município banhado pelas águas escuras do Rio Tocantins, que figura aqui ora como um vilão, ora como um bem precioso. Da mesma forma, é vista a Usina Hidrelétrica, que guarda o paradoxo de ser sinônimo de desenvolvimento e ao mesmo tempo nela respingam as críticas pela falta de energia na cidade. Esta falta de energia, também, revela um duplo sentimento: de ódio, porque causa transtornos aos cidadãos, mas provoca um sentimento romântico ao permitir que as famílias voltem a conversar, que os irmãos voltem a fazer brincadeiras antigas.

Neste livro, conhecemos um pouco dos recantos da cidade, alguns

belos lugares, ou pelo menos o saudosismo de que já tivemos belas paisagens que o crescimento urbano destruiu ou escondeu, como os Igarapés Santos e Santana. Para quem nasceu nesta cidade, ou está aqui há muito, logo sente uma nostalgia imensa dos banhos no Santos, dos gritos harmônicos da velha Maria Fumaça, do cheiro das castanhas do Pará e do barulho das antigas corredeiras do velho Tocantins.

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E assim, no nosso imaginário, um turbilhão de histórias e memórias vão se formando e nos dando conta de que temos uma imensa história subjacente, através da qual aos poucos vai-se revelando uma incipiente identidade.

O projeto do livro não tem a pretensão de ser uma fonte de

pesquisa sobre o município, até porque se trata de um livro de crônicas, contos e artigos de opinião, como já foi dito, ademais escrito por jovens estudantes que começaram a ver a cidade através das janelas do seu quarto. Mas, com certeza, o livro estimulará esses mesmos jovens a pesquisarem mais e a mergulharem fundo na história do Tocantins, do Santana e do Santos, do município como um todo, bem como incitará outros jovens e adultos a também contarem seus casos e causos sobre esta maltratada, mas ainda linda Tucuruí.

É esta uma leitura gostosa que vai nos dar a conhecer um pouco

desta cidade, do seu povo e de sua história.

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Apresentação Miranilde Oliveira

Da Janela do meu quarto – uma visão do lugar onde vivo é o resultado de

mais um ano do projeto oficinas de textos. Inicialmente os participantes do projeto se inspiraram no tema das

Olimpíadas Nacionais de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro – O lugar onde vivo, pois no IFPA-Câmpus Tucuruí, sempre incentivamos os estudantes a concorrerem a prêmios que estimulam a leitura e a escrita e o material enviado para desenvolver as oficinas durante as Olimpíadas é inspirador, motiva educandos e educadores a sair da rotina, descobrir outros caminhos e alçar novos voos. Foi exatamente o que aconteceu com nossos autores neste livro.

No começo, tímidos e sem boas noções do que seria uma crônica ou um

artigo de opinião, iniciaram suas tarefas. Foram persistentes. Ouviram muitos nãos, mas souberam crescer. O resultado está aqui: pais, professores e comunidade em geral presenteados com a boa leitura elaborada por nossos estudantes.

Sei que valeu muito o nosso esforço: vir à escola em período de greve para

participar das oficinas que em momento algum pararam, entender que ainda era preciso construir e reconstruir várias vezes o mesmo texto para que ele se aperfeiçoasse, compreender que a leitura e a interpretação são aliadas de uma boa produção e assim seguir em frente, sem desanimar, tudo isso traz boas consequências. Nossos autores são vitoriosos e eu tenho muito orgulho de tê-los em sala de aula.

Aqui está apenas o começo! Vocês estão seguindo a máxima de Monteiro

Lobato e por isso colherão muitos bons frutos, pois “um país se faz com homens e livros”.

A escrita também é uma viagem. É um momento de descobertas. Aqui você viajará pelas estradas de ferro – que muito contribuíram para a economia da

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nossa região, fará um passeio pelo rio Tocantins e refletirá: onde estão suas águas? Conhecerá nosso torneio de pesca esportiva, lembrará do seu dia a dia quando sonha, se indaga, se indigna. Indigna? Sim! Afinal, nem só de crônicas e contos este livro é composto. Os artigos de opinião revelam o quanto nossos estudantes estão desenvolvendo seu senso crítico e mostram que para isso acontecer, basta uma boa dose de ironia, conhecimento do assunto e pesquisa – receita que nossos autores seguiram.

Para que você, leitor, recebesse as informações contidas neste livro, foram

realizadas entrevistas com moradores de Tucuruí, autoridades, pesquisas em sites, jornais e revistas especializadas, a fim de que os dados se mantivessem reais e comprobatórios; esta parte da construção textual é importante, pois escrever é mais transpiração que inspiração. Sem pesquisa não se chega ao alvo.

Então, ouvindo música ou tomando um café com biscoitos o convidamos a

se deliciar com estes textos simples, porém reveladores da realidade. Agora você está no barco, pegue o seu remo e comece a navegar. Afinal, como dizia Francis Bacon: “A leitura torna o homem completo; a conversação torna-o ágil, e o escrever dá-lhe precisão.”

Portanto, leia e se quiser, inspire-se para escrever também. Nunca diga que não sabe escrever, pois como afirmava o grande escritor Samuel Johnson “é escrevendo mal que um dia se chega a escrever bem.”. Abra a janela do seu quarto e perceba que há muito a se descobrir no lugar onde você vive.

Boa Leitura!

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Agradecemos a todos que têm contribuído direta ou indiretamente na construção do nosso caráter: pais, professores e amigos. Esta obra não existiria sem o apoio de vocês em nosso cotidiano.

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Aos nossos pais – razão da nossa existência.

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Sumário

Rio Tocantins, por que bates em minha porta? 13 Tucuruí, para onde foram tuas águas? 16 Tucuruí – um sonho de pesca 18 Clara visão do inferno 20 Caminhos de ferro 22 Jornada Para a Vivenda 26 Sonhos desfeitos 29 Último Desejo 31 Nessa terra tem cultura 33 Uma cidade que você não costuma ver na TV 34 Bancos com mentes vazias por bancos com mentes brilhantes 38 Enfeites de domingo 41 Um lugar chamado Bacuri! 43 E se não fosse um sonho? 46 Nostalgia 49 Sentimentos controversos 52 As Crônicas de Magnus 54 A lição de um sonho 59 Era dia de reconciliação 61 O mendigo e a caixa 63 Coragem 65 De volta ao passado 67 Quem eles pensam que são? 69 O segredo para alcançar um sonho 71 A dor da ausência 73 Má influência 75 Lembranças da minha cidade 77 Sorriso de alegria vale mais que mil palavras tristes 80

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O lado bom da vida não está na cidade! 82 Uma história que não está nos livros 84 Insônia 86 Feliz Aniversário, amor. 88 A vida no cemitério 90 Nem sempre o diabo é culpado 92 Desenvolvimento: desafios e resultados 96 Até quando “peixes do Inverno”? 99 Tucuruí: a cidade da energia em meio à escuridão 103 Transcametá: sorrisos amarelos em meio à paisagem verde 107 Minha Janela 110

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Rio Tocantins, por que bates em minha porta? Vivo em um lugar que é repleto de riquezas naturais, uma delas é a

água, recurso que impulsionou o nosso desenvolvimento econômico e deu origem à identidade do lugar onde vivo – Tucuruí – o rio das formigas e dos gafanhotos.

É isso mesmo! Fomos agraciados por Deus, com o imenso Tocantins!

A água do rio nos sacia e alegra muita gente, mas é uma pena que nem todo mundo tenha a oportunidade de conhecê-la pessoalmente, pois na maioria das vezes, essa água só chega às casas através de canos.

Já eu não, tenho a chance de estar frente a frente com ela em

algumas épocas do ano. Diz a lenda que o deus das águas se enfurece quando os pescadores pescam em dias proibidos. Assim, ele começa a gritar, e a água vai subindo, impedindo que aqueles pescadores pesquem de novo ali, até que acontece: o rio transborda.

Um grande problema é que nós somos vizinhos do rio, aqueles

chamados ribeirinhos, aí já sabe... Com o rio enchendo não dá outra: lá vem a água bater na minha porta. Para mim, ela é a chave da felicidade, então a aceito de braços abertos, pulando e brincado com os amigos da rua, e foi nessa onda que aprendi a nadar. Primeiro meus pezinhos mergulharam e, quando vi, já estava nadando como um Tucunaré perseguindo sua presa.

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Todos os anos minha rua vira parte do rio, e nesses dias de glória tenho sempre o mesmo sentimento: de que achei Atlântida, aquela cidade perdida que foi submersa pela água. A grande diferença é que aqui os homens não se tornam deuses, eles continuam sendo homens, só que agora sem seus “castelos”.

A verdade é que as enchentes trazem prejuízos para nós e além de

afetar a saúde, levam as coisas que meus pais conseguiram com tanto esforço e é por isso que os vejo preocupados logo que se aproximam as cheias. Às vezes temos que sair de casa às pressas em nossa canoinha, e depois ir para um abrigo, pois já não temos condições de ficar ali. A parte mais difícil para mim é ter que dar tchau à água. E mesmo com todo o prejuízo causado pelas cheias, eu ainda sou um amante do Rio Tocantins, pois quando se é criança, não se vê o lado ruim da vida.

Um dia eu cresci e descobri que aquela lenda, era lenda mesmo!

Soube a verdade: o fato era que o homem jogava lixo nas ruas, nos igarapés e no próprio rio, percebi que eu mesmo fazia isso, então quando vinha a chuva, a água não tinha para onde escoar e ficava por lá mesmo, assim o nível do rio subia cada vez mais. E ainda tem o nosso grande orgulho: a Usina Hidrelétrica que com sua boca gigante vomita a água do lago para o nosso rio, aumentando o “caos natural”.

Hoje quando recebo aquela “visita de todos os anos”, fico parado

olhando, e o que enxergo é um rio chorando e pedindo socorro pra mim. O que posso fazer, eu faço, e também tento sensibilizar as outras pessoas, para não cometerem o mesmo erro do nosso passado.

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As enchentes continuam acontecendo, mas agora não me alegro mais como na minha infância, pois já entendo o porquê de ocorrer, e sei os danos que elas causam ao meu povo. Aprendi que cada cheia é um grito de socorro do rio, pedindo para que parem de poluí-lo, de agredi-lo e nada é mais justo que atender a esse pedido.

Ainda nascerão outros ribeirinhos que também precisam conhecer

o Tocantins, não da mesma forma que eu, frente a frente, mas que o rio seja como um belo quadro posto do outro lado de suas casas, para que sejam amantes dele tanto quanto eu, pois o que Tucuruí precisa não é do velho camarada Tocantins batendo em sua porta todos os anos, mas sim da saudação cordial de suas águas, que banham o lugar onde vivo, e fazem dele o que cantamos em nosso hino: “mundo de paz, de amor e união”.

Thiago Araújo

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Tucuruí, para onde foram tuas águas?

Era uma tarde nublada quando olhei pela janela do meu quarto e vi o igarapé Santos, e de conseguinte lembrei-me do igarapé Santana, cujas águas cortam Tucuruí, e deságuam no rio Tocantins, que alimenta a famosa Usina Hidrelétrica de Tucuruí. Fiquei triste por ver como a cada dia que passa esses igarapés padecem.

Lembrei que minha vó, filha de indígenas, tinha muito a me contar

sobre os igarapés, fui até a ela, que estava sentada numa cadeira de descanso, fazendo crochê enquanto corria pela casa aquele cheiro de biscoito que acaba de sair do forno. Sentei-me ao seu lado com os olhos cheios de lágrimas e perguntei-a: - vó, conte-me sobre o tempo em que os igarapés Santos e Santana ainda tinham vida. E ela me contou a história que ouviu dos próprios pais:

-Filho, estes rios, segundo papai kaué dos Assurini, foi uma benção

de Deus, e ele me disse que Deus os deu uma ordem, a qual eles teriam que derramar vida sobre a terra, e fiquei muito feliz naquele dia, pois toda vez que mergulhava, eu sentia a vida que emanava deles, e para saber isto era só olhar para as margens e ver o verde que prosperava.

- O tempo foi passando e me via num pesadelo sem fim, o choro das

águas cantando e clamando a Deus: “Ai de nós, ai de nós, aos teus filhos fomos dados como benção, sem culpa fomos amaldiçoados, não foi erro nosso, pois derramamos sobre a terra o que tu nos mandaste: vida, vida! Viemos com a vida, e como salário recebemos a morte”. Contou-me ela.

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- Enquanto ela me falava de como banhava nos igarapés Santos e Santana e como padeciam, olhei para o seu rosto e vi uma lágrima correr no cantinho dos olhos. E perguntei: - vó, por que ninguém nunca fez nada? E respondeu-me: filho, desde quando esta cidade estava sendo construída nunca pensaram onde ou no que estavam construindo, as casas, serrarias, lojas tudo sobre os igarapés, enquanto o governo não faz nada, a única coisa que nos resta é sensibilizarmo-nos do que fizemos. Neste momento, ela levantou-se para pegar um pouco de chá e biscoitos.

Enquanto ela retornava fui até à margem do igarapé Santos, e olhei

aos céus e disse: Deus, será que ainda há chance de salvar estes que tu nos deste para derramar vida? Quando olhei novamente, vi alguns peixes nadando. No mesmo momento me veio aquele sentimento de faça a sua parte.

- Minha vó tinha toda razão, porém seria muito bom se eu ainda

por herança dos povos passados pudesse banhar nas águas dos igarapés Santos e Santana. Mas por enquanto fico só nos sonhos e nas lembranças de quem um dia já foram Santos e Santana – Braços saudáveis do grande Tocantins, que já despejaram vida sobre a terra em que vivo.

Fernando Barroso

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Tucuruí – um sonho de pesca Chamo-me Marina, nasci e cresci às margens do rio Tocantins e

sinceramente o rio foi o meu berço... O que faço? Sou uma autêntica pescadora, faço parte de um grupo de mulheres pescadoras poderosas e destemidas, afinal, quem foi que disse que pesca é só pra homem?

O que eu amo no meu trabalho? Ah! Com certeza o TORTUC... Sou

a oficial organizadora e coordenadora do evento... E pra quem não sabe, TORTUC é o torneio de pesca que a minha amada cidade de Tucuruí realiza.

Como eu espero o mês de agosto!...Já até imagino ... Dos mais velhos

aos mais novos carregando suas varas e correndo saltitantes com grande euforia... “As crianças gritam entre si: “Eu vou ganhar!...Não, eu vou!...Eu vou pescar um de 50 kg. Seu Gonçalo – um velho chato e arrogante urrou para as crianças em resposta: “Aquietem o facho de vocês, isso é coisa pra gente grande”. Os índios somente os observavam, pois eles encaravam da largada até à premiação dos vencedores com grande seriedade.

O festival em si visa não só a diversão... Para todos os participantes,

o mais importante é levar as recordações da beleza natural da minha região, conciliando a pesca esportiva com a preservação ambiental, Aliás, como poderia me esquecer da preservação? Se é o essencial da festa! Pois já é tão exportado o nosso tucunaré! Por isso os peixes são pesados e logo depois devolvidos ao lago.

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Tenho plena convicção de que quem passa por aqui jamais se esquece da grande hidrelétrica que é uma potência nacional; do carinho que temos em receber nossos turistas e apresentar a cada um parte da nossa cultura e da nossa culinária, pois como o tucunaré tem cuidado com suas proles, nós temos com os nossos visitantes e é por isso que vale muito a pena conhecer o TORTUC – uma alegre marca do lugar onde vivo.

Juliana Priscila

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Clara visão do Inferno “Quem tudo quer, tudo perde” já dizia minha mãe, e eu nunca a

ouvira. Hoje, anos após a sua morte, percebo o quão idiota fui e sou. Se a

ouvisse nada de mal teria me acontecido. Tudo começou com os meus 15 anos. Lembro como se fosse semana

passada. Eu, com skate nos pés e boné na cabeça numa dessas praças que ninguém lembra o nome, já tinha caído algumas vezes, meus cotovelos sangravam e minha calça rasgou. Foi quando a vi. Seu vestido amarelo brincava com a brisa de fim de tarde, seus cachos pareciam molas e tive vontade de tocá-los. E, depois de algumas investidas e muitos “foras”, consegui. Duas semanas depois namorávamos. Seu nome? Clara.

Minha mãe, minha querida, saudosa e falecida mãe não apoiava

nosso relacionamento. Dizia que eu era novo, que atrapalharia meus estudos e que eu não podia ter tudo de uma só vez.

Os anos passaram, Clara e eu casamos, apesar de seus ciúmes e de

meu egoísmo. Muitos anos depois nossos gêmeos vieram. Talvez tenha sido nesse momento que eu perdi o controle. Clara e eu nos afastamos e ficamos frios.

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Conheci Raquel, que me seduziu com seus olhos verdes e pernas duras e roliças, e traí Clara. Primeiro uma ou duas vezes por mês, depois quatro, cinco, seis, até que não ficava um dia sem ver Raquel.

Clara descobriu e foi embora levando meus filhos com ela. Ao ir,

deixou um bilhete que dizia: “Eu não amo mais você. Vamos dar um tempo. Um dia a gente se vê.” Ali meu mundo acabou. Uma semana depois Raquel conheceu outro homem.

Então, finalmente, percebi que tinha tudo o que precisava e joguei

fora por uma aventura. Só, hoje estou. Eu quis tudo e com nada fiquei. Como já dizia minha mãe: “Quem tudo quer, tudo perde”.

Thaís Rodrigues

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Caminhos de ferro Durante muito tempo eu me questionava como um pequeno lugar

como esse em que eu vivo, situado no Norte do país, no estado do Pará, pudesse abrigar tantas histórias e mistérios em seus recantos. O nome do meu lugar é Tucuruí.

A extinta estrada de ferro Tocantins, situada aqui em Tucuruí,

antigamente chamada de Alcobaça tinha o intuito de fazer o transporte de cargas, entre elas pedras preciosas e especiarias.

Eu todos os dias ao fim da tarde ia para a estação ver se havia

chegado algum trem, alguma carga, alguma coisa nova. Gostava de admirar a beleza dos trens, pois meu pai dizia que eles vinham de outras partes do mundo, eram fabricados na Espanha, Itália e possuíam grande beleza em seus detalhes.

Quando algum trem chegava era uma movimentação só: gente para

lá e para cá. Tinha que ser feito logo o descarregamento. Eu adorava quando vinham cargas alimentícias, pois por várias vezes as cargas eram transportadas por sacos e quando o saco não resistia à viagem, ele furava e ao chegar à estação era distribuída para o povo. Por várias vezes chegava a sentir dor de barriga de tanto comer castanha do Pará.

Era muito gratificante pensar que cargas vinham e iam para algum

lugar. Essas cargas conheciam vários lugares e passavam pela mão de muitas pessoas. Após toda a movimentação, lá se vai o trem para o galpão

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de máquinas, ser restaurado para que no outro dia, já voltasse a seus afazeres.

Os tucuruienses que moravam aqui tinham as ferrovias como

maior porte econômico, muitas pessoas trabalhavam na estação, no galpão ou na produção de ferrovias na grande expansão de quilômetros e quilômetros de estrada adentro da grande mata fechada que nos cerca.

Sinto grande orgulho de Tucuruí, pois aqui habitou a sede da

Estrada de Ferro Tocantins. E sabe o que é mais interessante: eu sou uma moradora privilegiada – moro próximo da antiga estação de trem que atualmente é o INCRA e ainda perto do galpão de máquinas que atualmente é a Feira Municipal.

Depois de todos os anos que os caminhos de ferro predominaram,

eles nos trouxeram muitas alegrias, porém algumas tristezas também. Eu escutava os comentários, “mais uma batalha entre índios e ferroviários”, várias pessoas morriam nesses combates e deixavam suas famílias.

Os índios que aqui predominavam eram os Assurini e Parakanã e

eles com amor por sua natureza não aceitavam que o homem branco viesse lhe arrancar as matas e colocar caminhos de ferro no meio de sua floresta.

Os ferroviários, por sua vez, precisavam tirar o seu sustento

fazendo esse tipo de trabalho, era triste quando víamos os noticiários que

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mais um índio morreu defendendo a sua mata, e mais um ferroviário se foi, deixando sua família.

Após vários anos da Estrada de Ferro Tocantins veio a extinção da

mesma. É uma pena a alegria dos meus fins de tarde ir embora! Lá se vem a Hidrelétrica de Tucuruí, que com as águas do rio Tocantins cobre os meus caminhos de ferro e o sonho de um dia eu poder participar daquele corpo de ferroviários.

Com a necessidade de se criar a Hidrelétrica, tivemos que perder

nossos caminhos de ferro. Esse lugar é tão pequenino! Mas já foi, e é alvo de grandes transformações. Deixamos de ser a cidade sede da Estrada de Ferro Tocantins, a antiga Alcobaça, para sermos Tucuruí, a capital da energia.

Ainda hoje sou privilegiada, mesmo não tendo mais meus caminhos

de ferro, tenho ainda aqui na rua de minha casa a “Associação dos extintos ferroviários da estrada de ferro Tocantins’’ que me faz voltar ao tempo de caminhos de ferro.

As histórias por mim vividas hoje me fazem chorar, ao me recordar

das felicidades que possuía ao ver meus caminhos de ferro. Hoje as pessoas não valorizam tanto nosso passado, nem sequer o presente! E o futuro? Ah, só a Deus pertence... Que possamos valorizar nossos momentos simples, para que eles se tornem inesquecíveis.

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Por aqui vou ficando, já fiz meu papel. Tentei te retratar Tucuruí. Essa minha pequena cidade, tanta história tu escondes em teus recantos. E esse lugar me leva a tantos lugares somente por suas histórias, e histórias essas que faço questão de falar pelo grande orgulho que tu me ofereces.

Com toda altivez, sigo em frente, e apesar de todos os problemas

enfrentados por nós, somos capazes de enxergar as belezas de nosso lugar. Problemas sociais, políticos e econômicos nos rodeiam, porém a felicidade e o orgulho de ser tucuruiense está presente em meu sangue. Orgulho maior de retratar as belezas que aqui presenciei e continuo a admirar como as inesquecíveis estradas de ferro.

Rafaela Pessoa

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Jornada Para a Vivenda Apesar de essa não ser a fatia que eu mais goste do dia, eu me sinto

privilegiado de estar vivo nesses momentos, onde a vida nos convida a passar tão depressa, mas que podemos traduzir em uma eternidade quando queremos.

Estava eu, conformado de comer frio naquele dia. Já eram

17h47min e eu ainda na espera de alguma condução, carona ou algo que me levasse até a minha casa. Eis que então, meu coração pulsou freneticamente...

- O busão chegou, disse Alexsandro. - Guarda Meu lugar aí Alê, eu disse. - beleza! Uma mistura de fome e ansiedade pra chegar em casa: tinha dois

“leões” pra matar. Um deles era o sono incólume que eu sentira desde que entrei na sala de aula, outro, a fome que me consumia a cada respiração em falsa sem contrair o abdômen. Não sei se meu irmão Alexsandro sente a mesma coisa, dizem que univitelinos absorvem as mesmas dores (não acredito nisso). Por falar em Alexsandro, desculpa a má educação... Chamo-me Alexanderson Sanches, sou negro e tenho 16 anos de idade, estudo no IFPA – Câmpus Tucuruí, nasci e meus pais continuam aqui, no

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sudeste do estado do Pará com meus sete irmãos Alexsandro, Aline, Amanda, Ananda, Andrés, Aldilene e Almerinda.

Meu pai se chama Frederico Sanches, ele é marceneiro e minha

mãe Janaína, doméstica. Esse é um dos motivos para eu e meus irmãos irmos de ônibus. É também motivo da minha gana e vontade de estudar. Assim que me sentei na cadeira, olhei para o céu e o pôr do sol se fazia por completo! Por poucos momentos percebi que o Lugar onde vivo é palco pra muita coisa, uma delas é o voo dos pássaros antes das seis.

“Tucuruí é palco de muita coisa” pensei alto, na verdade eu falei

isso... O meu berço é palco de grandes construções e grandes feitos históricos. Antes, Aqui era chamado de Alcobaça e nela havia uma grande estrada de ferro, hoje, ela é conhecida como “rio dos gafanhotos” ou só Tucuruí. Ela comporta a maior usina hidroelétrica genuinamente brasileira e, além disso, possui praias lindíssimas que nos vários meses do ano exibem toda sua beleza.

Pelo trajeto eu vejo todos os dias as belezas de minha cidade, assim

como passo por ruas que não existiam quando as tribos indígenas raízes de Tucuruí - Assurini e Gavião por aqui andavam. Observo também como há uma grande espera por mudanças, estampada em cada rosto enrugado, em cada gota de suor, em cada sorriso dos feirantes, que esperam por melhorias desde que a mesma foi criada. A feira fica bem pertinho do Cais, ponto turístico e onde o ônibus não passa muito longe.

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Antes de descer do ônibus, roguei a Deus para que ele prezasse pela vida dos necessitados, assim como eu que não sabia se haveria algum almoço quando chegasse em casa. Desci aqueles quatro e sujos degraus do ônibus e dei cerca de duzentos e quarenta e sete passos e a um terço de respirações para chegar até o meu quarto e dos meus irmãos.

Minha terra é linda, mas não posso me esquecer de onde estou,

estou no transporte público, que às vezes deixa a desejar! O ônibus deveria ser uma forma simples e barata de se locomover, mas o barato sai caro e assim, o “busão” como o Alê disse, é nada mais que um termômetro; às vezes ele está me mostrando a pobreza, e às vezes ele está me mostrando a poesia em forma de natureza. Mas o importante é perceber como é ingênuo e singelo o olhar de um garoto negro, suburbano e pensativo durante sua jornada para casa e quantas lições podemos aprender com isso.

Guilherme Bandeira

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Sonhos desfeitos

Poderia eu, um pequeno índio, descrever a evolução e as mudanças de uma cidade? Não sei, mas vou ao menos tentar.

Meu nome é Tinã, tenho 76 anos, sou nascido e criado em um lugar

próspero, hospitaleiro e que abriga uma grande Usina Hidrelétrica às margens do rio Tocantins, lugar de povo de fé, lugar interativo, Tucuruí.

Hoje, ao andar pelas ruas de Tucuruí, as famosas Santo Antônio,

Lauro Sodré, Sete de Setembro, não me encontro. Simplesmente não me acho. Vejo o quanto mudou, como tudo cresceu! Mudanças e crescimento rápidos demais, na verdade, descomunais.

Devido à construção da Usina Hidrelétrica muitos migraram para

cá, à procura de emprego e de uma vida melhor, famílias pobres, humildes, que tinham esperança que aqui encontrariam algo melhor.

Com isso, Tucuruí cresceu de forma exagerada. De belas aldeias e

vilarejos, tornou-se pandemônios de seres humanos sem saber pra onde ir. Assim, minha Tucuruí é o que é hoje: uma importante, porém desorganizada cidade do sudeste do Pará.

Acontece que nem sempre foi assim... Há 76 anos me recordo com

emoção desta cidade, ou melhor, daquela pequena aldeia. Eu junto com minha família, todos índios, vivíamos em um lugar simpático, pequeno e

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bem pacato, onde todos os índios que habitavam na minha aldeia – a Trocará, se conheciam e se davam muito bem.

Recordo-me das danças, dos rituais indígenas que praticávamos,

lembro que dormia ouvindo os sons que a noite me reservava, e acordava ouvindo os sons que o dia me regia. Se era bom? Ah, era maravilhoso!

Aí veio um homem branco e começou a transformar o lugar em

que eu vivia, Alcobaça recebeu outro nome. O homem branco de pouco em pouco foi mudando, desmatando, transformando o pouco em tudo isso que é hoje: Tucuruí.

Eu, um inocente índio, sofri e acompanhei de perto suas

modificações. Ao longo do tempo percebi que aquela aldeia transformou-se em vilarejo, o vilarejo transformou-se em vila, e a vila transformou-se nisso que é hoje: poluição, desmatamento e falta de bom senso e ética entre nós, cidadãos. Minha aldeia se transformou em bagunça, meu descanso em estresse, minha paz, nem sei onde ficou. Eu era feliz e não sabia.

Marcos Vinícios

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Último desejo

“Guerra, guerra, guerra, bombas, bombas, fome, mortes, sofrimentos, minha vida se resume assim”.

Sou Aleksandra, tenho 10 anos e presenciei uma guerra

interminável entre duas facções que ao longo do tempo se desenvolveram tanto em tecnologia e ficaram mais poderosos que governos, estados, todos os famosos yowai dengen e vindictis.

Morava com meus pais, meu irmão de seis anos e minha tia em

Dankov na Rússia – cidade pacífica, mas que ao passar dos anos começou a ser território de guerra entre as facções, o clima entres as duas facções já estava tenso desde o último confronto entre eles que causou um grande estrago no leste da África.

Tudo começou quando a minha família já temia o pior: “a guerra”

sem lugar para onde ir, tínhamos apenas uma opção: ficar e esperar um milagre. Logo de manhã as comunicações já tinham sido cortadas, o desespero tomou conta de quem havia ficado na cidade.

A guerra nem tinha começado direito e a primeira bomba logo

atingiu metade da minha casa e foi assim que vi minha tia Martinha morrer. Nesse momento, entrei num cômodo distante e entre desespero e lágrimas, meus pais arrastam-na com seu irmão para fora de casa com os suprimentos que puderam carregar. Em seguida, homens totalmente de preto, entraram nas cidades exterminando todos que viram pela frente

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sem dó, enquanto eu e minha família nos escondemos em uma casa abandona.

Aterrorizados a única coisa que nos cabia era o abraço e o choro.

Meu Deus! Qual o porquê da guerra? Ao anoitecer, chegaram mais aviões com tecnologias muito avançadas, taques de guerra se movimentando por todo lado, crianças nuas andando pelas ruas, gritando pelos nomes de suas mães. Eu não aguentava mais ver tanto sofrimento.

No dia seguinte, pessoas famintas invadiram a casa onde estávamos

e roubaram nossos poucos suprimentos, corri para ver se conseguiria pegar um pouco de comida, mas quando ia atravessar a rua correndo, uma bomba simplesmente cai em cima da casa matando assim toda a minha família em questão se segundos, ao ver a explosão, caí no chão gritando sem parar.

Chorando, vendo corpos de pessoas mortas me fez sofrer mais

ainda, tudo que eu queria era morrer, então corri desesperada até chegar perto de um tanque de uma das facções e me atirei na frente deles querendo parar ou simplesmente tendo coragem para me matar, até que um soldado que estava do outro lado salvou-me e não concedeu meu último desejo. A morte não me atingiu, mas por dentro já tinha me tomado há muito tempo.

Meiriane Araújo

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Nessa terra tem cultura

Terra de verdes matas e florestas densas, um pedaço da Amazônia paraense, Tucuruí. Mapará, Tucunaré, Cará. Peixes típicos de seu lago, com uma vertente legítima e autêntica da cultura local.

O lugar não é tão importante, mas, carrega traços de cidade grande, time de futebol até isso aqui tem, ouço gritos que bradam a cada gol:

- Independente! Independente! O nome então desafia as leis da física, Galo elétrico.

Há se eu fosse guia turístico, levaria os visitantes para comerem açaí na casa de Dona Marli, sem lugar pra visitar, turista tem que pelo menos o “bucho” enganar.

Tacaca, vatapá, carimbó entre danças e comidas ouço a voz da

índia, enquanto lava o bumbum do moleque sapeca, sim, Tucuruí de cultura indígena sim. Lá vem a morena de saia rodada dançado e pulando para o moço, será que é boto ou é homem de nossa terra, nunca se sabe.

Enfim deixo-vos a pensar um pouco aqui na minha terra Tucuruí,

comendo tucunaré provando tucupi, dançando carimbó, torcendo pelo independente gritando: Gol, Gol, GOOOOOOOOOL.

Fernando Barroso

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Uma Cidade Que Você Não Costuma Ver na Tv

Sinto o sol bater na janela do meu quarto. A titã aurora já se renova pelos céus claros da minha rua. Por volta das 6h da manhã deste verão, acordo vendo as explosões de cores quentes lá no céu. Ah, Tucuruí... é impossível para mim sonhar com outra cidade que não sejas tu.

Me chamo Gustavo, ou “Guto” para os mais íntimos, mas quase

mais ninguém me chama assim. Lembro-me quando os meninos da rua gritavam: “Guto, chuta a booola!”, e assim eu era o melhor atacante da molecada.

Moro no Jardim Paraíso, o “JP”, como nós moradores o chamamos

de costume. Foi no “JP” que eu cresci, tive meus primeiros amigos que guardo até hoje dentro do peito, tive meus primeiros amores, ah, aquelas meninas da rua de baixo..., enfim, as primeiras impressões do mundo.

A minha rotina é a mesma todos os dias, nunca muda. Logo depois

de contemplar o quão lindo é o alvorecer do dia, eu vou para o banho e escovo os dentes, em seguida procuro meu uniforme. Tenho três e sempre lavo um quando chego da escola, depois tomo meu café da manhã, aquele que a Dona Laura faz do mesmo jeito nesses últimos dezesseis anos. Antes de partir para a escola, eu vou ao quarto dos meus pais, pedir as bênçãos deles, não posso sair sem fazer isso, pois me sinto inseguro.

Chego à parada de ônibus sempre às 06h50min em ponto. Ando

entre as pessoas que parecem de outra geração presas nesse bairro,

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apenas pelo fato de todas elas dizerem “Bom Dia!”. Sempre me encontro com Heitor e Maria Vitória para pegarmos o “busão”. Há dias em que ele passa tão cheio que eu acho que vai explodir. Lá dentro é muito apertado, existem várias pessoas indo para as suas escolas e trabalhos, mas nada que nos impeça de nos divertimos nesse percurso.

Sempre deparamos com as panelinhas dentro do busão, as

patricinhas, com o seu “tenho meu próprio estilo e não encosta muito”, os nerds falando sobre os últimos videogames, e o pessoal da quadra que sempre tem que comentar um jogo novo todas as manhãs. Quando chegamos ao Posto, onde é a última parada da cidade, a Ana Lívia sobe no “busão”, e a partir de agora todos vamos dando gargalhas até chegar à escola. A Ana não perdoa ninguém, ela tira sarro com a cara de todo mundo, por sorte as pessoas não levam as brincadeiras dela a sério.

Não há como não adorar essa cidade. Do “busão” podemos ver todas

as mais belas paisagens da cidade, o Rio Tocantins, que bate na porta dos ribeirinhos da baixa matinha nos tempos de cheia, a Usina Hidrelétrica, que produz energia para vários cantos do país e que, pelo que minha professora de história disse, é umas das obras faraônicas do governo militar.

Hoje o “busão” foi pontual, então não me atrasei. Ao chegar ao

Instituto, deparo com a primeira aula de matemática, não consigo gostar dessa matéria, acho que os números são tão complexos quanto o homem. A minha paixão mesmo são as aulas de literatura, essas sim, eu presto atenção em cada detalhe. Nesse bimestre estamos estudando sobre as

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novelas de cavalaria. Eu me divirto muito lendo os livros sobre o “Ciclo Arturiano”.

Quando toca o último sinal, todo mundo volta ao ponto para

enfrentar outra batalha para pegar o busão. Ele volta tão cheio quanto veio. A Ana Lívia volta mais calma, afinal tá todo mundo cansado. Chego em casa e vou logo para o banho. Dona Laura sempre me espera para nós almoçarmos juntos e conversamos sobre como foi o meu dia.

Logo pelo fim da tarde, ouvimos o majestoso canto dos pássaros

pela rua, como se eles estivessem nos embalando nessa melodia para anunciar que mais um dia chegava ao fim. Ao caminhar pelas ruas que me viram crescer, ainda posso ver todas as rodas de conversa na frente das casas. Conheço todos os vizinhos e não consigo passar por eles sem dizer um simples ‘Olá’.

Houve a reinauguração da pracinha aqui perto de casa, e isso fez

muitas pessoas virem para cá no final das tardes. Agora eu posso ouvir novamente os gritos das crianças que brincam em um playground que tem um monte de brinquedos novos. Também posso ver as pessoas fazendo os seus exercícios físicos com a academia que foi instalada na praça. Eu e meus amigos sempre vamos jogar conversa fora lá. Quando a lua cai sobre os nossos lares, eu subo na laje da minha casa e vejo as estrelas dançando no céu.

E esse é o lugar onde vivo, não é uma cidade que costumamos ver

na televisão, mas aqui eu e meus amigos sabemos como nos divertir. As

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pessoas aqui são muito receptivas, sempre acolhemos bem todos os visitantes. Eu tenho orgulho de poder cantar a minha terra e os meus conterrâneos: “Tucuruí, Tucuruí, dedicamos-te louvor, o fulgor de tuas matas irradia luz e amor”.

Gustavo Silva

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Bancos com mentes vazias por bancos com mentes brilhantes A vantagem de ter um quarto como o meu, é que todas as manhãs o

sol bate na minha janela e me chama para viver. O convite é tão especial que não me atrevo a recusar e é nesse clima começa o meu dia. É verdade que o dia se inicia perfeito, mas no decorrer dele, sinto-me infeliz pelo que vejo e ouço.

Morar perto de uma praça pública criada no intuito de

proporcionar lazer e incentivar a prática de esportes é o desejo de muita gente, mas o que pode ser visto como uma vantagem, acabou virando algo lamentável, pois o que presencio diariamente é um “cenário perturbador”: jovens e adolescentes são os que mais frequentam a praça, mas não para jogarem fora conversas bobas ou para darem gargalhadas saudáveis como a juventude de antigamente. O caso agora é outro: as drogas, o álcool, a violência e a prostituição formam o novo modelo de diversão por aqui.

A praça tinha tudo para ser o melhor lugar do bairro, pois lá ainda

se ouve o canto dos pássaros, o vento bagunça seu cabelo sem piedade e as frondosas mangueiras se fingem de guarda-sol para você. É atraída por tudo isso que ainda passo por lá e às vezes até procuro um cantinho para mergulhar num livro e ir para o além. Infelizmente não posso ficar por muito tempo, se eu ficar, vou ser mais uma na plateia que assiste ao espetáculo de horror e que pode se tornar vítima dele.

Não importa se está dia ou se é noite, sempre tem alguém na praça

viajando numa ilusão que só as drogas permitem. Sempre há uma garota

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quase despida, rodeada por alguns rapazes. Sempre existe uma pessoa largada num banco por causa do porre. O Pior disso tudo é ver que até aqueles que acabaram de sair da infância, já adentram nesse cenário. Presencio constantemente alunos que saem de suas escolas em busca dessa diversão que considero totalmente danosa.

O que me deixa confusa é tentar compreender o que se passa nessas

mentes tão jovens, que poderiam optar por viver um futuro brilhante, mas escolhem vegetar em uma zona sem perspectivas. A vida é tão curta para ser desperdiçada assim... Essas meninas e meninos merecem mais que isso, porém as drogas cegam, ensurdecem e calam o grito da alma que pede por socorro. Talvez seja por isso que mesmo tendo quadra para brincar, eles preferem bancos para fumar.

Sei que a presença dessa galera que se entregou ao vício incomoda

a vizinhança, mas não quero que tirem essa juventude da praça, não quero ser egoísta o suficiente para achar que apenas eu e meu livro a merecemos. Quero que os ensinem a ouvir o canto dos pássaros, a sentir o cheiro das flores e das folhas trazido pelo vento, a viajar não na ilusão de um vício ou de uma noite com quem não se ama e sim na verdade da imaginação que só a leitura dá.

Cansei de começar o dia tão bem e terminá-lo com o coração

apertado por causa do cenário perturbador que fica aqui pertinho de casa. Chega de ver gente que tem tanta vida para viver e que pode escolher ter um futuro promissor, jogar tudo isso pelo ar. Não dá mais para olhar para a praça e enxergar bancos com mentes vazias, porque a

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verdade é que essas mentes podem ser bem mais que vazias, elas podem ser brilhantes, só precisam de quem as lapidem.

Nayara Matos

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Enfeite de Domingo

O eterno espreguiçar, com direito a atraso no almoço, pijamas e muito tédio constitui um clássico domingo na família de Lucas.

Todos ali continuam seguindo a sua rotina preguiçosa, quando o pai sugere aos dois filhos um passeio, nada planejado, em busca de algo legal para se fazer durante o entardecer. A falta de planejamento irrita Lucas, mas ele concorda em ir para não chatear seu pai.

Durante o passeio de carro, o garoto tinha como única distração e companhia o irmão de três anos, Arthur. Quando percebeu, ele estava bastante concentrado, com o seu dedo indicador bem gordinho no nariz e Lucas resolveu perturbá-lo, cumprindo o seu papel de irmão mais velho:

-Está limpando o salão? Vai ter festa hoje?

O menininho, com toda inocência respondeu:

-Não. Eu estou limpando o meu nariz!

-Oh, Deus! Isso é uma metáfora, Arthur!

E Arthur já irritado retrucou:

-Não, isso não é uma metáfora! Isso é o meu nariz!

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O menino olha pelo retrovisor e vê que o pai não consegue segurar o riso e ele acaba rindo também.

Decidem ir comer na barraquinha da D. Sônia, levam Arthur aos brinquedos e logo voltam os três para casa, para dormir e enfrentar o recomeço da Segunda porque todo dia tem a sua história.

Maria Beatriz

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Um lugar chamado Bacuri! Parece engraçado. Na verdade não parece, é engraçado. Mas é um dos lugares que eu

mais gosto no mundo, a casa da vovó, bem em uma das áreas mais conservadas da Amazônia.

Bem, eu acho que eu gosto um pouco mais de chegar até lá. Eu gosto de sair de casa praticamente de madrugada, porque a

minha mãe adora ser exclusiva e pegar o primeiro micro-ônibus pra cidade que dá acesso à fazenda dos meus avós. Mas não é por isso que eu gosto de sair de madrugada, eu gosto de ver o sol nascendo ou pegar o início desse espetáculo.

Gosto de ir à janela ou em algum ponto onde eu consiga ver a

estrada direitinho em qualquer automóvel, próprio ou não. Gosto de ir ultrapassando cada obstáculo, cada carro, cada pessoa, cada história, cada pedaço de terra, cada pedaço de mundo.

Gosto de ver os campos verdinhos e curtos de longe, que dá vontade

de ir lá em cima da montanha e descer rolando naquele verde infinito. Gosto muito de quando eu chego na metade do caminho, gosto de

ver aquelas pessoas apressadas na rodoviária da cidade, apressadas como se fosse a última chance para chegarem ao seu destino.

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Aí a viagem recomeça novamente, mas dessa vez são quase dez horas. No caminho que dá direto até a casa dos meus avós, existe uma paisagem tão bela quanto a primeira: cheia de vida e com muitos animais, às vezes cruzando a estrada a toda velocidade, e também com muitas árvores que em certos pontos cobre o céu da estrada e forma uma cobertura majestosa.

Logo depois de passar através desse lindo pedaço da estrada,

começa a reserva ambiental da aldeia Parakanã, é o sinal de que estamos chegando ao destino final. A imagem fica cada vez mais linda.

Ao longo do caminho os meus olhos viajam com alguns riachos nas

entradas das fazendas do lado oposto à reserva indígena, é tão lindo que parece ter sido feito à tinta. E do lado indígena, meus olhos viajam com outra coisa: enquanto do lado de fazendas é um campo aberto, do lado indígena uma floresta fechada que às vezes é bastante alta e em outras, tão baixa que dá pra ver seu interior magnífico e suas variações perfeitas de árvores e animais.

Em certo ponto do caminho vejo uma árvore com folhas amarelas

no topo das montanhas, por volta das 12 horas, e perto dali um rebanho de gado e outros animais, sei que estou a poucos metros da fazenda dos meus vovôs.

Quando chego é uma sensação tão boa e engraçada de ver a minha

vovó surpresa e desesperada, mesmo sabendo da data e da hora

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aproximada que nós chegaríamos, e ela faz isso de uma forma que é somente dela.

Chegando a Bacuri, eu sinto o cheiro da natureza, uma sensação

bastante acolhedora por ver aquele lugar praticamente dando boas vindas com sua paisagem, me sinto tão bem-vinda que isso me causa o sentimento de que lá é a minha verdadeira casa.

Jacqueline Romaro

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E se não fosse um sonho?

Na tranquila cidade de Breu Branco, vive uma garotinha chamada Silvana, a qual gosta de passear pela cidade, principalmente nas feiras perto de sua casa.

Silvana sai de sua casa para ir à feira comprar sua fruta predileta,

que é abacaxi. Chegando à barraca do senhor Manoel, ela pergunta: - Seu Manoel tem abacaxi? -Acabei de vender os últimos Silvana, veja nas outras barracas se

tem. - Tá certo, muito obrigada. Ela segue sua busca pela fruta em mais duas barracas e nenhuma

tem abacaxi. Quase desistindo, vai à outra barraca, lá tem sua fruta, mas está sem o vendedor. Ela espera um pouco e ninguém aparece. Quando se vira, vem uma velhinha e pega o abacaxi do balcão e bota na bolsa de Silvana sem que a garota percebesse. A velhinha é uma solitária que tem problemas mentais e gosta de incriminar os outros.

A velha, completamente desnorteada, chama um policial e afirma: - Ela pegou meu abacaxi, leve-a presa.

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O policial pede para todos irem à delegacia. Chegando à delegacia, o delegado solta a garotinha, pois era um

crime brando (e que ela não cometeu). A velhinha pede para a garota ir à sua casa para acalmá-la, e a garota aceita.

A casa da velha de dois andares, parecia uma casa de bruxas, cheia

de objetos antigos e muito valiosos. A velha diz: - Você aceita um chá? - Aceito. Respondeu a garota um pouco assustada. -Vou preparar seu chá, me espere e não toque em nada. -Pode deixar. Falou a garota com o pensamento longe. A velhinha foi para o andar de cima e a garota ficou embaixo,

pensando por que a velha tinha a acusado de ter roubado. Em seus pensamentos fala assim:

-Já que ela me acusou de um crime que eu não cometi, vou furtar

algo dela. Olha em volta e vê um despertador bem antigo, ela pega e bota em sua bolsa e espera seu chá, nervosa, só para tomar e ir embora.

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A velhinha traz o chá da garota. No momento em que a velha está servindo o chá, o relógio despertador toca, e a garota pensa: ela vai me matar. Quando pensa nisso, ela acorda e diz:

-Ainda bem que foi só um sonho. E é verdade, leitor: nem em sonhos deve-se pensar em coisas

erradas, pois já pensou se não fosse só um sonho?

Vinícius Franttine

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Nostalgia

Não são nem 8 horas e me acordam com aquele barulho infernal. Uma mistura de rock com música eletrônica. Meus vizinhos recomeçam a bagunça da noite anterior e o que me resta a fazer é chamar o porteiro ou o síndico deste prédio para tomar providências, já que meus joelhos doem demais para andar e meu reumatismo está atacando.

Interfono à portaria e José, o porteiro, atende.

- José, aqui é Sr. Casimiro Alves do 101. Quero que você venha aqui e mande esses infelizes do 102 desligarem esse maldito aparelho infernal e essa música diabólica.

- Bom dia ao senhor, também, Sr. Casimiro. Farei o que o senhor pediu o mais rápido possível.

- Bom dia por qual razão? Não preguei os olhos a noite inteira por causa desse moleques barulhentos.

- Sinto muito, Sr.

- Irá sentir mais ainda se essa música não parar em 5 minutos. – digo e desligo.

Talvez tenha sido rude e ranzinza com José, mas conheço a figura já que moro nesse prédio há 15 anos dos quais 08 José faz parte, se não

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pressionar, não funciona. E nos meus 60 anos de vida, aprendi a lidar com pessoas preguiçosas.

Esses jovens de hoje não sabem apreciar a boa música, é o que eu digo. Onde estão os clássicos? O blues e jazz me fazem falta. Hoje em dia é só essa barulheira sem sentido e letras gritadas. Não existem mais músicas românticas, nos tempos atuais as pessoas só se importam com o dinheiro e a aparência. Os sentimentos foram deixados de lado.

Cinco minutos se passam e nada de José aparecer. Já foram mais cinco e a música continua. Se em 2 minutos esse barulho não parar, eu irei tomar providências, pessoalmente. Dois minutos se passam e nada de José. Visto um roupão por cima de meu pijama azul com listras brancas e toco a campainha do apartamento em frente ao meu. Um garoto desconhecido, de uns 17 anos é quem atende.

- E aí coroa, que que tu queres? – me diz.

Ah, uma pessoa que não tem prática com esse linguajar jovem se sentiria perdida, mas o convívio semanal com meu netos, enfim, me ajudou em algo.

- O que eu quero? Quero que desliguem esse som e vão dormir! Percebem que horário é?

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- O tio, não vem miá nossa social, não. Hoje é aniversario do meu brother Fê e estamos comemorando, entra na vibe.

O garoto abre a porta, me convidando a entrar. O que vejo me dá nostalgia. Fitas de papel crepom coloridas estão presas ao teto, balões amarrados na parede e há uma mesa com bolo, doces e alguma bebida misteriosa e de aparência boa. Essa cena me lembra das pequenas festas escondidas que dávamos em meu tempo de faculdade. Bebedeiras que varavam a madrugada, os amigos que fiz nessas festas duraram por toda a minha vida, inclusive o grande amor da minha vida eu conheci numas dessas festinhas.

De repente a música muda do electro para uma balada de jazz. Meu corpo automaticamente se balança, vou até uma garota e a tiro para dançar, ela aceita e a rodo pelo salão – que na verdade, é a sala do ap dum garoto que não conheço. (Devíamos estar em contraste com a sala, ela de micro short e top e eu de pijama e roupão). Quando a música termina, agradeço a dança à garota e volto ao apartamento com lágrimas nos olhos.

Quatro minutos após sair do apartamento em frente, a música barulhenta recomeça. Por mim, eles podem fazer o barulho que quiserem. Agora sei que às vezes vale tudo por pequenos momentos de nostalgia.

Thaís Rodrigues

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Sentimentos controversos

Tucuruí, rio de formiga e gafanhoto, a antiga Alcobaça que fica no sudeste do Pará e na Amazônia, e que hoje leva energia para vários cantos do Brasil à custa de um rio encantador. É assim que é conhecido o lugar onde vivo.

Pena que essa denominação é praticamente exclusiva para quem

está fora da região, pois quem vive aqui sofre com frequentes quedas de energia que duram minutos, horas, e em alguns casos, dias. Uma incrível contradição, não é? E isso provoca uma verdadeira relação de “amor e ódio” com esse abastecimento de energia medíocre para com quem vive praticamente dentro da usina hidrelétrica.

Engraçado que às vezes eu digo ser uma pessoa tão inteligente, mas

em alguns momentos acaba gostando desse tipo de coisa. O que acontece comigo quando falta energia à noite lá em casa é isso, duas sensações distintas: o odiar e o gostar. Então eu vou começar pelo sentimento mais breve e ruim.

Odeio porque eu tenho que ficar aturando os vizinhos falando alto

e reclamando que a energia da cidade não funciona, disso todos sabemos, então vamos agir!

Odeio também porque eu fico com um calor infernal e também

porque os mosquitos não dão trégua.

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Aí vem o outro lado: o gostar. Eu particularmente gosto porque parece que a gente só conversa de verdade quando isso acontece: eu, minha mãe e o Janderson (meu irmão) – nos lembramos de histórias engraçadas que aconteceram com a gente. Eu gosto de ver o brilho nos olhos da minha mãe sentindo orgulho de ter dois filhos obedientes e malucos dentro de casa, gosto de ver o sorriso no canto da boca do meu irmão, mesmo que ele diga que não foi engraçado.

Gosto de ver a pele da minha mãe meio laranja por causa da luz da

vela, e também gosto de ver revistas velhas com nossa iluminação mínima, como se a gente não soubesse a próxima reportagem ou imagem e até mesmo a palavra seguinte.

Gosto de adivinhar qual será o próximo cômodo no escuro, apesar

da casa não ser tão grande, por mais que eu tropece em algum objeto ou móvel eu gosto desse pequeno sentimento de descoberta que a gente só sente quando se é criança.

Eu gosto de ser a heroína na escuridão, por ser a única que sabe o

esconderijo exato das velas. E é claro eu gosto muito de quando a energia volta (apesar de acabar com esse momento bom e absurdo). Adoro a sensação de surpresa e susto, os gritos dos vizinhos na rua, e de ir apagando vela por vela.

Jacqueline Romaro

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As Crônicas de Magnus

Tudo começa em um dia nublado, meio sombrio, estranho, bem estranho para um lugar onde sempre é sol: o vilarejo de Alcobaça. Neste dia, todos ficaram em alerta, com medo, pois a quarta pessoa na mesma semana tivera sumido.

Muito preocupado, o prefeito do vilarejo, Bento Pereira, fica com

uma pulga atrás da orelha, pois isso nunca foi de acontecer, se nem crime quase tinha. Então, alguém resolve chamar Herbert Magnus, um amigo e experiente caçador que acabara de chegar ao vilarejo. Logo chega à prefeitura e os dois dialogam:

- Prefeito: Quanto tempo, Herbert, ou deveria dizer, senhor

Magnus. - Magnus: Chame-me como preferir, velho amigo, Bento Pereira. - Magnus: Fiquei sabendo de alguns acontecidos no vilarejo, muito

suspeitos. - Prefeito: Sim, era pra isso que o chamei. Estou preocupado com

esses acontecidos. Aqui quase não há crime, como pode estar havendo esses sumiços?

- Magnus: Farei de tudo, para resolver esse mistério.

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Imediatamente Magnus estuda os acontecimentos, descobre um fato que houve há muitos anos - um garoto, cujo o nome era José Filho, desapareceu e nunca mais foi visto, todos pensavam que havia se matado de desgosto, pois todo dia após a escola, um grupo de garotos, filhos de fazendeiros, caçoavam-no, precisamente seis, pois sua família tem origens indígenas. Tais garotos, estes, hoje adultos, estão sumindo.

Vinte anos depois da semana em que houve o acontecido. Magnus

pensa: - Será que Zé não morreu e voltou para se vingar dos que lhe

caçoavam? - Ainda têm duas pessoas que não foram pegas por esse alguém,

Tião Ferreira e João Matias, um mora no Cais e ou outro no Centro do vilarejo, tenho que me apressar ou pode acontecer mais um sumiço.

Então, Magnus monta em seu cavalo e vai até à casa de João

Mathias, no Cais do vilarejo. Por sorte ele ainda estava lá, e questiona tudo o que está acontecendo. Se diz arrependido e afirma que se pudesse voltar ao passado e mudar, faria isso.

João Mathias conta a Magnus algo que jurou nunca dizer a alguém.

Diz que após um dos dias que sempre caçoavam Zé Filho, ele caíra e batera a cabeça, com medo, os garotos enterraram-no. Logo, Magnus diz:

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- Não estou aqui para julgá-lo, estou para resolver esse mistério, o que foi feito não há mais de voltar. Agora vamos à busca de Tião, esse alguém que está pegando seus amigos ainda deve estar por aí.

Chegando ao centro, onde fica a casa de Tião, ele não estava mais

lá, porém, tinha marcas de bota com lama na casa. Prontamente, João fala algo:

- Sei de onde vem essa terra, essa é a terra do cemitério, conheço,

pois sempre vou visitar o túmulo de minha mãe. Rapidamente, Magnus e João dirigem-se ao cemitério, próximo ao

local eles veem as mesmas pegadas da bota com algo sendo arrastado, que provavelmente é Tião. Dizem eles:

- Magnus: Vejo que está fresco, há pouco tempo passaram por aqui. - João: Sim, agora vamos, o cemitério é por esse caminho, basta

entrarmos aí que chegamos. Mas senhor Magnus... O que acontecerá adiante?

- Magnus: Só resta-nos ir para saber. Aproximando-se, Magnus, fica abismado, pois, pela primeira vez

em toda a sua jornada desvendando mistérios, ele vê o que sempre leu nos livros de sua família – Zumbis.

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Quando alguém morre antes do tempo, ou a morte vem à força, esse mesmo indivíduo volta à vida após um tempo indeterminado para cumprir sua jornada.

E lá estava José filho, carregando o corpo desmaiado de Tião. João, se apavora, tenta ir embora, porém, Magnus o proíbe. E diz

que precisa de sua ajuda para pôr um fim a isso. Então, Magnus dá as instruções para João:

- Magnus: Você tem que ir lá, e tentar convencer o José Filho a

parar, ou então serei obrigado a matá-lo. - João: Eu irei, mas, o senhor me garante que voltarei vivo de lá? - Magnus: Vou dar a volta pela floresta, se não der certo o plano...

Irei matá-lo, com minha Crossbow. João vai, aproxima-se de Zé, que então, larga o corpo de Tião e vai

até João. - Zé: Quem diria em João, você aqui, me poupando o tempo de

pegá-lo. - João: Pare Zé, você não é assim, não era pelo menos. Você foi meu

melhor amigo!

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- Zé: Exatamente, disse certo, quer dizer que já fui, um dia, agora não sou mais!

- Zé: Sabe por quê? Você tirou o bem mais precioso de mim – a

força de vontade de um garoto, que um dia quis mudar esse medíocre vilarejo, onde só quem tem força de opinião são os ricos, vocês.

- Zé: ME MATANDO, ACABARAM COM O SONHO DE UM

GAROTO! Agora vão ter o que merecem: a morte e será do mesmo jeito que a minha: agonizante, de baixo de uma terra sem respirar.

- João: Não era a minha intenção, eu só queria ser alguém. Alguém

reconhecido igual ao meu pai, por isso, fiz tais ações. - João: Sim, está certo, percebo o que fiz, tens o direito de acabar

com minha vida, do mesmo jeito que fizemos com a sua. Então, faça o que tenha que fazer. Acabe logo com isso, assim conseguirei me libertar dessa maldição que me aprisiona.

- Zé: Isso que irei fazer, por você um dia ter sido meu amigo, a sua

morte será rápida. E assim, aproximando mais de João Para matá-lo, de dentro da floresta, Magnus atira e a flecha acerta o meio da cabeça de Zé, e o mata de vez. Dando-se fim a essa Maldição.

THE END. Autor: Renée Gondim.

Inspirado nas series The walking Dead e Supernatural. Ao som de David Guetta - Lovers On The Sun; Bastille – Pompeii; Christina Perri – Human; Imagine Dragons – Demons e Radioactive; Detonautas - O Dia Que Não Terminou e Coldplay - The Scientist.

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A lição de um sonho Gotas de chuva caíam pela janela e eu ali, trêmula de frio e pavor.

Estava sozinha, todos haviam saído para a festa de 100 anos da minha avó. Por um momento pensei em sair, mas não podia – uma dor infernal tomava conta da minha coluna. Só me restava então, assistir algo na TV, mas quando a liguei, exatamente nessa hora, faltou luz. Pensei com minhas anteninhas: beleza! Eu trancada em casa, doente, chuva forte lá fora e agora sem luz na cidade da energia! Devo estar em dívidas com Deus e pensando nisso comecei a meditar, meditar, pensei tanto que adormeci. Ao adormecer, tive um sonho.

No sonho que tive eu estava no hospital e todos estavam ao meu

redor: olhos arregalados e cara de pena; não sabia o motivo e aquilo me deixava muito curiosa e ao mesmo tempo com muita raiva.

O médico falou para minha mãe que eu estava com uma doença

muito grave e que tinha que fazer um rigoroso tratamento, ela sabia de tudo e qual era essa terrível doença e nada me contavam, mas sentia que estava triste e cabisbaixa.

Então, decidi perguntar para ela qual era o meu problema e ela

falou que estava com um tumor na cabeça bem desenvolvido e que tinha pouco tempo de vida. Naquele momento fui à lua e voltei; fiquei em estado de choque, refleti que não ia me adiantar, reclamar e decidi aproveitar o tempo que me restava. Então, ri, chorei, amei e desapeguei. Eu aproveitei tudo com muita vontade.

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O tempo passou e minha mãe e eu fomos ao hospital e o médico verificando o laudo, viu que algo estava errado e percebeu que tinha trocado os laudos e que eu estava em perfeita saúde. A verdade é que era outra pessoa que estava com o problema.

Nossa! Aquilo era um milagre! Eu nem acreditava que fosse

verdade, foi quando de um suspiro acordei e estava tão feliz pela luta do meu sonho que fui à casa da minha vó e encontrei a minha família e comecei a aproveitar a festa e vi que Deus fez aquilo só pra me mostrar como cada dia mais minha vida deve ser valorizada.

Geisy Freitas

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Era dia de reconciliação

Gotas de chuva caíam pela janela e eu ali, trêmula de frio e pavor. Estava sozinha, todos haviam saído para a festa de 100 anos da minha avó. Por um momento pensei em sair, mas não podia – uma dor infernal tomava conta da minha coluna. Só me restava então, assistir algo na TV, mas quando a liguei, exatamente nessa hora, faltou luz. Pensei com minhas anteninhas: beleza! Eu trancada em casa, doente, chuva forte lá fora e agora sem luz na cidade da energia! Devo estar em dívidas com Deus e pensando nisso comecei a meditar, meditar, pensei tanto que adormeci. Ao adormecer, tive um sonho.

No sonho voltava ao tempo! Era uma menina de sete anos de uma

cidade modesta, em um dia normal em minha casa, mamãe estava fazendo café, aquele aroma... Deu-me uma saudade de casa... De repente meu pai entra e bate na mesa gritando: “Anda logo com esse café mulher, que eu tenho que ir para o trabalho!”, vendo meu pai tratar minha mãe daquele jeito me trouxe um velho sentimento de tristeza e imponência.

Meu pai saindo para o serviço, decido acompanhá-lo em sua

jornada, quando já fazia uma hora de caminhada e meus pés latejavam de tanta dor, mas se já estava ali eu iria continuar, e foi o que fiz.

Ao longe percebo meu pai entrando em uma lavoura de cana de

açúcar, alguns brutos gritavam para meu pai: ”Anda molengão, pega logo tua enxada... não é bebê pra ter moleza, não!” Não resisti ao ver e ouvir tanto desaforo, então, saí gritando pra cima dos homens e comecei a

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chorar e a falar: “Solta meu pai, solta meu pai”, de repente acordo e me vejo tremendo aos prantos me debatendo na cama!

Eu me levantei e apesar da dor na coluna, comecei a arrumar

minha mala, tudo fazia sentido, não perderia mais tempo. Próxima parada: me reconciliar com meu papai.

Juliana Priscila

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O mendigo e a caixa

Um lugar de encantos que se esconde no coração da floresta Amazônica e que abriga uma população de grande esplendor cultural e é considerado atualmente como cidade potência, pois distribui energia elétrica para os mais diversos lugares do Brasil. Esse é o lugar conhecido como Tucuruí.

Tucuruí possui vários pontos turísticos: praças, chácaras, ginásio

poliesportivo, bosque e cais. O lugar que mais frequento são as praças públicas. Muitas pessoas passeiam, conversam umas com as outras, trocam e-mail e apreciam as paisagens naturais.

Certo dia, estava passeando pela praça do Rotary quando

inusitadamente encontrei uma caixa de presente. Olhei para um lado, depois para o outro. Não vi ninguém. Então, lembrei-me do ditado popular "achado não é roubado". Peguei a caixa e levei para casa. No dia seguinte fiquei curioso para saber de quem era aquela caixa. O que será que tinha dentro daquela caixa? Pensei bastante, resolvi então, voltar à praça para tentar achar o provável dono. Chegando lá perguntei:

- Alguém perdeu uma caixa aí? Algumas pessoas responderam: - Não... Não... - Vocês têm certeza? - Sim! Temos sim. - Então, tá bom.

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Fiquei agoniado, sem saber o que fazer com a caixa misteriosa, resolvi dá-la à primeira pessoa mendiga que encontrasse pela rua. De volta, na avenida 7 de Setembro, avistei um senhor todo maltrapilho, sujo, imundo com suas roupas todas rasgadas com as mãos estendidas pedindo esmola. Ele dizia:

-Me dê um real... As pessoas fugiam dele porque cheirava mal, cheguei pertinho

dele e ofereci uma caixa de presente? Ele respondeu: - Oh! Meu filho, ninguém se aproxima de mim.

Quando chego perto das pessoas, todas se afastam. Só quero um trocado pra comprar comida. Você vai me dar um real?

- Não, vou lhe dar um presente que encontrei na praça. Acho que o senhor vai gostar...

- Muito obrigado e que Deus te ajude! O mendigo pegou a caixa e foi embora para perto do cais, onde

costumava ficar à noite. No outro dia, ao ler o jornal, na página policial, apareceu a foto do mendigo querendo devolver a um rapaz desconhecido, uma caixa com R$ 1.000.000.00 (um milhão de reais). Ao investigar, a polícia foi informada que foi o apresentador Silvio Santos que sorteou uma cidade do Brasil para deixar numa praça um prêmio surpresa. Tudo em homenagem ao programa "A praça é nossa". A caixa chegou a Tucuruí e eu a perdi.

Vigner Vieira

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Coragem

Havia um homem cujo nome era Anésio, ele tinha a aparência de meia-idade, alto, forte fisicamente e morava em uma vila perto da pequena cidade de Tailândia no estado do Pará.

Anésio era considerado pela sua vizinhança uma pessoa corajosa,

que supostamente enfrentaria tudo que visse pela frente. Essa sua fama só pegou por causa de grandes histórias que já havia acontecido em sua vida. Isso era o que ele sempre dizia e afirmava ser verdadeiro.

Sempre saía em seu belo carro para dar uma volta, e causando

inveja aos seus vizinhos. Tinha apenas uma empregada já velha que fazia tudo para ele até cozinhava, pois ele não sabia mal acender a boca do fogão.

Mas um dia, bandidos entraram em sua casa e roubaram quase

tudo que havia que havia lá dentro por sorte ele não estava na casa. No dia seguinte seu vizinho perguntou para Anésio:

- o que aconteceu em sua casa? - nada de mais, uns bandidinhos entraram em minha casa, coitados

quando me viram ficaram tão apavorados que saíram correndo de medo. Passaram-se alguns dias, um grupo de jovens estava fazendo um

teatro no meio da vila, de como se reagir em um caso de roubo, curioso

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como ele era, mesmo sem saber de nada do que estava acontecendo, se aproximou das poucas pessoas que estavam reunidas assistindo.

De repente um dos jovens que estava fazendo papel de ladrão

gritou: - É um assalto! Ao ouvir isso ficou tão assustado e desesperado que saiu disparado

numa velocidade de surpreender, no outro dia um de seus vizinhos lhe perguntou:

-O que lhe aconteceu para você ter corrido tanto assim ontem? -

diz com sarcasmo. - É que eu me lembrei que o fogo do arroz estava aceso.

Meiriane Araújo

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De volta ao passado A falta de luz é algo caótico para a maioria das pessoas, já que

praticamente tudo o que fazem depende da luz, ou melhor, da eletricidade. Eletricidade produzida aqui em Tucuruí, minha cidade que amo com orgulho, que abriga mais de cem mil pessoas em seus braços e cuida de cada um de nós com carinho.

Nesses dias, Tucuruí tem vivido alguns de seus dias no escuro. A

falta de energia está presente no dia a dia das pessoas. Muitos não gostam dessa situação, já que é entediante e muito desagradável, pois não podemos fazer as coisas que normalmente fazemos como acessar a internet, curtir páginas em redes sociais, e mais um monte de coisas. Mas eu gosto desses apagões justamente por isso.

Gosto porque as pessoas começam a fazer coisas que não fazem

diariamente, pelo menos a maioria, como sair na rua e jogar bola com os amigos, ler um livro esquecido debaixo do armário, brincar com jogo de tabuleiro em família ou até mesmo conversar com as pessoas a nossa volta, coisa que eu pessoalmente gosto, pois sabemos como foi o dia dela e como ela está passando.

Eu pessoalmente gosto de passar os dias sem luz com meus irmãos.

Já que nós jogamos os jogos de tabuleiro que estão em cima do armário, jogos que nunca mais vi ninguém jogar, como: Banco Imobiliário, War, Monopólis, e Jogo da Vida. Esses jogos marcaram a minha infância, e

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mesmo hoje eu tendo 18 anos, não me esqueço de como é divertido jogá-los.

São essas pequenas coisas que não fazemos no nosso dia a dia que

fazem a diferença de uma vida chata e sem graça, uma vida feliz. Eu pessoalmente não gosto da falta de luz, principalmente se eu estiver sozinho, já que é muito chato esperar ela voltar. Mas se eu estiver com meus irmãos, às vezes fico torcendo pra que ela falte.

Jose Luiz Oliveira

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Quem eles pensam que são? Mais um dia se passa na cidade de Tucuruí, lugar onde passa uma

imensa usina hidrelétrica, que leva energia para parte do Brasil. Grandes se escondem aqui, por exemplo, eu e meu irmão.

Eu e meu irmão estamos a cada dia ficando mais velhos e feios. É,

mais a vida é assim e assim será pra sempre. Aquela típica conversa de velhos sem ver nada, mas sentindo tudo ao seu redor. Estamos relembrando os melhores momentos da nossa vida. Então, chego ao meu irmão Santos e digo:

- lembra do nosso tempo de menino? - Lembro sim! Momentos iguais aqueles jamais viveremos. As

pessoas da época em que éramos meninos gostavam da gente, algumas ainda gostam.

- É, mas de uns tempos pra cá, estamos sendo desprezados pela

nossa própria família e amigos. Essas pessoas que vivem próximos de nós só querem zoar a nossa cara. Só sabem nos maltratar e o pior de tudo é que estamos velhos e quase acabados.

- Naquela época éramos muito famosos em Tucuruí. Muitas pessoas

gostavam de nós, todos os dias vinham nos visitar no nosso santuário, davam alegria pra gente, nunca reclamavam de nós, hoje nos fazem ficar tristes.

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-Não adianta ficarmos reclamando, basta essas pessoas olharem para nós que verão nossa situação. Eles sabem que se nos tratarem como lixo, terão consequências ruins.

- você esqueceu? Só somos lembrados no mês de março, com

muitas críticas, só faltam nos matar, mas, mesmo velhos, nesse tempo estamos muito fortes, eles que nos fazem ficar mais fortes, parece que não enxergam isso.

- Já está no mês de julho vamos embora, não aguentamos o calor de

Tucuruí, vamos para um lugar desconhecido por nós, mas conhecido por eles. Não demora muito as pessoas nos mandam uma mensagem pra voltar à nossa triste vida, que não muda de uns tempos pra cá.

- Às vezes meu irmão, esqueço que nós somos o Santos e você o

Santana, dois igarapés velhos cheio de história pra contar. - É verdade. E muitas crianças nem conhecerão nossas histórias.

Vinícius Franttine

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O segredo para alcançar um sonho

O alarme toca melodia suave, o brilho do sol invade as janelas do meu quarto e logo percebo que já amanheceu. Assim acordo todos os dias às cinco horas da manhã para ir ao colégio. Meu dia começa bem cedo, e hoje não vai ser um dia qualquer, estou sentindo. Vai ser diferente, vai ser especial.

Após tomar um banho, ouço minha querida mãezinha dizer que o

café já está na mesa, penso comigo: dia especial mesmo, o melhor café da manhã, aquela tapioca bem sequinha com café puro e quentinho, espero ter a mesma sorte hoje na escola; vou apresentar um trabalho sobre o meio ambiente, estou aqui morrendo de medo de começar a gaguejar lá na frente.

O ônibus está realmente lotado, será que minha sorte foi só no café

da manhã? Espero que não, mas finalmente cheguei ao colégio e fui correndo para a classe, fui finalizar tudo do nosso trabalho, pois seríamos o primeiro grupo, e eu seria o primeiro a falar.

Chegou a hora, nosso grupo foi chamado, minhas pernas estavam

trêmulas, minhas mãos suando, seria o primeiro trabalho apresentado e eu não poderia estragar tudo, certo? Certo. Logo comecei, estava indo bem, até ver Antonina chegando. Meu Deus! Como ela era linda, aqueles olhos tão negros quanto o céu sem lua.

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Eu realmente me desconcentrei, ali estava a menina do último ano por quem eu era apaixonado e nunca tive sequer uma chance de poder falar com ela, aquilo realmente poderia mudar, e mudaria, dei o meu melhor no trabalho, apresentei como nunca tinha apresentado, eu dei um verdadeiro show, e adivinha quem me deu parabéns após receber às notas? Exatamente, Antonina.

Ela deu aquele sorriso, que só ela tinha, eu agradeci e retribui os

parabéns, Fomos liberados, fui em um ônibus lotado para casa, sem me importar, eu estava sonhando, vivendo num mundo mágico, foi apenas o começo, pois quem sonha, quem vive, quem tenta, Com certeza, um dia consegue.

Andréia Caroline de Sousa

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A dor da ausência

Vivo em uma cidade onde as pessoas são agradáveis, ouvi dizer que ela é próspera, rica, que está se desenvolvendo rápido, e com um lema que muitas pessoas de fora e dentro da região conhecem que é “Cidade da energia”, (lema que eu não concordo, pois falta energia quase todo dia no bairro em que morro), há sim! Tucuruí.

Com várias outras qualidades e defeitos, ainda me pergunto o

porquê de uma cidade como Tucuruí não ter muitas oportunidades, como maior número de empregos dignos, porque estou dizendo isso? Pelo fato de que há muito tempo meu pai tem viajado a vários lugares em busca de emprego e agora ele está em Belo Monte como ajudante de pedreiro, na construção daquela barragem.

Foi no domingo que vi meu pai chegando da cansativa viagem,

corri para abraçá-lo, então pude ver um olhar em minha mãe, um olhar que raramente via, olhar de alegria, os olhos dela brilhavam ao ver meu pai, e o que eu senti era inexplicável.

Mas chegou aquele dia de angústia ver novamente meu pai partir

tendo só a esperança de vê-lo de novo daqui há seis meses ou mais, só então, me voltou minha tristeza comecei a sentir outra vez a triste ausência de meu pai.

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Dói muito ele não estar aqui do meu lado me ajudando me aconselhando, me ensinando os valores da vida, incentivado a nunca desistir dos meus objetivos, dos sonhos.

Quando eu crescer, fico pensando quais serão as histórias que eu

vou contar para meus filhos sobre meu pai. Queria que não fosse essa.

Meiriane Araújo

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Má influência

Nossa vida é repleta de obstáculos e tentações, precisamos ser fortes. E no decorrer do tempo, percebemos o quanto a fraqueza e a maldade de alguém pode influenciar outras pessoas.

Este caso ocorreu numa cidadezinha do Estado do Pará, quando um

grupo de amigos decidiu ir a uma balada no fim de semana. Chegando lá começam a dançar e a se divertir normalmente.

Após algum tempo na festa, um dos garotos chamado Pedro e um

dos mais rebeldes do grupo de amigos, retira do bolso uma pedrinha, mais parecida com uma balinha, e então oferece a um dos amigos, chamado Henrique, que o interroga:

- O que é isso, Pedro? - É uma coisinha que você vai gostar Henrique! – Responde Pedro. - Isso é droga? - Pergunta Henrique. - É sim, é só por hoje. Estou a fim de me animar, toma uma aí pra ti!

Eu sei que tu vai curtir. E Henrique aceita. Os dois então, começam a consumir o produto. Quando os outros amigos percebem que Pedro e Henrique estão

fumando lá no cantinho da festa, seus amigos vão se aproximando. E entre

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um papo e outro, todos entram na “onda” e decidem provar, e esse provar se torna um tremendo vício.

Nos nossos dias é comum vermos situações como essa, em que

alguém com más intenções coloca outras pessoas no caminho errado e principalmente pessoas fracas e é por isso que nunca me esqueço deste ditado: “Uma ovelha má, põe um rebanho a perder”.

Rafaela Pessoa

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Lembranças da minha cidade

Sentada em uma cadeira no escritório de advocacia comecei a recordar como era a vida na minha cidade, Tucuruí, havia mais de três anos que eu não ia lá.

Mês passado resolvi visitar meus pais e alguns parentes e vi o quanto sentia falta de lá. Me formei há cinco anos em Direito, realizando o sonho dos meus pais e o meu. Só que a filha um dia tinha que sair de casa e amadurecer, mas eles não imaginavam que esse "sair de casa" incluía mudar de cidade. Percebi que precisaria disso, a cidade não tinha tantas oportunidades de emprego na minha área. Enfim, a saudade bateu de tal forma que agora até penso em voltar. Ficar perto dos meus pais, familiares e amigos.

Foi pensando em tudo isso que peguei o pequeno espelho em cima da mesa. Olhei pro meu rosto. Estava tão cansada e nem aparentava os 26 anos que tinha. Meu cabelo estava amarrado em um coque, nem disfarçando a pressa pra chegar ao trabalho.

Moro atualmente na capital, Belém, e como qualquer capital é agitada. Um pequeno sorriso se forma em meus lábios ao lembrar que achava Tucuruí agitada. Nem se compara. Agora me vem à memória os tempos de escola. Sempre pegava o ônibus lotado. Acho que é por isso a impressão de que a cidade era agitada. Lembro de pensar que

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não tinha nada de importante naquela cidade, de que tudo era sempre a mesma coisa, sem lugares para ir. Realmente carece de distrações. Um lugar pra ir com a família nos fins de semana, tirar o estresse do trabalho, sair com os amigos. Nunca pensei sentir saudade de lá.

Agora percebo que talvez não seja o lugar o mais importante, mas sim o conjunto de tudo. Nesse lugar nasci e cresci. Nesse lugar construí uma vida. Errei e acertei. Me formei. Não só como profissional, mas como pessoa também. Precisamos apenas de um lugar e momentos. E tive isso. Talvez não fosse madura o suficiente para perceber isso.

Lembro que meus pais me levavam pra ver o rio e os barquinhos lá no cais. Lembro de brincar na rua com meus amigos. Dos amigos da adolescência. Mas lembro de achar que aquilo não era pra mim. Sou feliz aqui também, mas sinto falta da minha cidade. Meus amigos ainda continuam lá. Morava na cidade, mas estudava na vila residencial e ia a semana toda pra lá. Pra isso tinha de pegar o ônibus. Com o tempo o percurso começou a se tornar monótono, às vezes olhava pra paisagem verde e bonita, mas com o tempo e como sabia que era a mesma todos os dias nem olhava mais.

Uma coisa interessante eram os passeios da escola: apesar de nós já termos visitado a Usina Hidrelétrica daqui e falar e fazer uma cara de já fui lá toda vez que a professora falava o local da visita, sempre ficávamos impressionados com ela. Só de imaginar que as pessoas da região assistem

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e bebem água gelada por causa dela. Meus amigos ainda continuam lá. Alguns casaram e tiveram filhos. Outros levam uma vida de aventureiros. Aqui tenho amigos, gosto do meu trabalho. Com o tempo tive que me acostumar.

Levantei, desliguei o computador e saí. Queria que fosse assim com a saudade também, mas ela não vai embora, insiste em ficar e brincar com o meu coração. Por quê?

Klarissa Carvalho de Souza

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Sorriso de alegria vale mais que mil palavras tristes

Havia em um vilarejo, lugar distante da cidade grande, um velho chamado Eurico. Eurico era despreocupado da vida e quem o conhecia sabia que era um velho bem humorado, brincalhão, que não parecia ter tempo ruim, mas o que ninguém sabia, era o que ele carregava dentro de uma caixa que sempre levava consigo, e quando alguém lhe perguntava sobre a caixa, ele mudava de assunto.

Numa noite fria com um leve sereno, Eurico passava em frente a uma casa quando avistou um jovem chorando. Aproximou-se e foi logo perguntando o nome do rapaz: - Como você se chama? O rapaz com choros e soluços respondeu: - Daniel. O velho sentindo tristeza pelo menino, olhou para ele e perguntou: - Mas porque você está triste? Ele respondeu: - Não quero falar. O velho Eurico já sabia que teria dificuldades de fazer o jovem Daniel se abrir e externar suas tristezas.

Depois de um pouco mais de insistência, enfim o velho Eurico havia conseguido arrancar algo do jovem que disse: - Não sei mais o que fazer, olho para o mundo e não sinto mais vontade de viver, tudo o que eu faço sempre dá errado.

O velho Eurico baixou a cabeça, como quem estivesse lembrando-se de algo, e com um gesto de negação olhou para o jovem Daniel e disse: - Muito pouco. Daniel olhou para ele meio irado e respondeu: - Como

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que muito pouco? Você mal me conhece. O velho pegou a caixa e entregou para Daniel e disse: - Abra. Daniel sem entender respondeu: - Para quê? Uma caixa não vai resolver meus problemas. O velho olhou para ele e disse: - Tudo depende de você.

Daniel movido pelas palavras do velho abriu a caixa, quando a abriu, a surpresa: uma carta que dizia:

- Pai, eu sei que a culpa não foi sua, a pista estava muito escorregadia, você fez o que pôde, lutou até o último segundo pra salvar minha vida, e aqui entre as ferragens do carro, decidi pedir aos bombeiros que lhe escrevessem esta carta antes de eu partir. Só quero lhe fazer um pedido: faça sua vida valer a pena. Não viva uma vida de tristeza! Seja qual for a situação, e a cada sorriso que você der, estarei com você. Ah! A mamãe disse para você não se preocupar que ela vai cuidar bem de mim. Te amo!

Quando o jovem Daniel terminou de ler a carta deu um leve sorriso, olhou para o velho Eurico e disse: - Obrigado. O velho levantou-se colocou a caixa como de costume embaixo do braço e saiu andando, mas antes de dobrar a esquina: olhou novamente para trás e disse ao jovem Daniel: - Sorriso de alegria vale mais que mil palavras de tristeza.

Fernando Barroso

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O lado bom da vida não está na cidade! Cidade agitada, semáforos mudando de cor a cada instante, eu

estava realmente precisando desse fim de semana no campo. Aqui é calmo, o único barulho que posso ouvir é o das árvores, galhos batendo um no outro, isso é que é vida, essa paz não tem preço, campo perfeito.

Aqui logo escurece, e como não temos energia, a lamparina

clareia essa noite de lua nova. Temos Baião de dois fresquinho pra jantar. Essa comida caseira tem bondade!

Depois da janta, o melhor é deitar nessa rede na área e observar

como as obras do nosso criador têm perfeição: vejo tantas estrelas... parecem até infinitas, eita mundão!

Aqui no campo ainda temos essas histórias contadas pela minha

bisa, os cabelos tão brancos quanto a neve, eita mulher arretada! Nunca vi mais trabalhadeira, essa mulher não para um instante, e vou dizer que as histórias da minha bisa são as melhores. Sempre que venho pra cá, ela é quem nos entretém a noite toda.

O tempo passa tão rápido, olho no relógio e ainda são oito e meia,

olho para os lados e meus velhinhos queridos já caíram no sono. Aqui é assim: as pessoas acordam cedo e dormem cedo, vida contrária à da cidade, vida perfeita, assim classifico essa vidinha no campo!

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O bom lado daqui, é que sem energia, você para pra pensar, ver o mundo à sua volta, e ele não para, o tempo tá passando, e aqui vejo isso com toda a claridade do mundo. Vou aproveitar enquanto todos estão aqui, pois quando se vão, a única coisa que fica além das lembranças, é saudade, saudades que são eternas.

Andréia Caroline de Sousa

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Uma história que não está nos livros Não acredito no verso que diz: “É preciso ver para crer”. Imagino

que quem criou esta frase, duvidava demais, não cria no palpável e deveria ter a alma muito escura para não perceber com os olhos do coração e a pureza de espírito, tudo o que está ao seu redor. Falo assim porque sinto o chão gostoso de onde moro - Tucuruí, minha cidade querida, repleta de encantos e beleza, de pessoas hospitaleiras prontas para acolher e ajudar seus visitantes. Cidade que se originou de um povoado pequeno chamado de Alcobaça e já foi palco de abrigo da antiga Estrada de Ferro Tocantins desenvolvendo-se com a construção da famosa Usina Hidrelétrica de Tucuruí, que para quem não sabe abastece vários Estados do nosso País.

Quem vem a Tucuruí precisa conhecer o nosso carnaval – eu

sambo, pulo, toco e seguindo meu pandeiro, não abandono o molejo do meu corpo, os dois saem saltitantes pela avenida e não tem turista que resista.

E o festival do Tucunaré? Eita, momento bom, meu Deus! Quem

prova do nosso peixe, tem sempre a vontade de retornar. Por falar em peixe, eu me lembrei das gostosas comidas da festa

junina: bolo de macaxeira, vatapá, tacacá, pamonha... Quem tem medo de engordar, eu só lamento. Fui privilegiado pela natureza, então, como o que quiser e continuo em forma.

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Contemplar o espelho d’água formado por nossas ilhas e lagos é um presente para cada um de nós. Minha cidade, meu amor, aqui nasci, cresci e pretendo construir minha família. Minha Tucuruí, conhecida como cidade da energia, que agregou tantos imigrantes, hoje posso dizer- te, Oh Tucuruí, quanto tu cresceste!

Ainda quero contar Para os meus netos esta história da cultura

verdadeira e do povo que se une e se abraça nas melhores ou piores situações. Quero contar esta história que não está nos livros, mas está em nossos corações e que por falta de vidência não vejo, mas sinto com os olhos da alma e a sensibilidade de um toque ou o cuidado da minha audição.

Leonardo Barroso

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Insônia

Era meia noite e no meu quarto ouvia os barulhos do relógio fazendo “tic-tac”. Não conseguia dormir, nem mesmo pensar em sono. Que angústia me sobreveio naquele momento” Pela casa inteira um cheiro de café. Sentado na beira da cama olhos inchados, e doloridos, quase os ouvia falar “socorro, nos feche”. Que forca é esta que me persegue?

Decidido a dormir, tomei alguns remédios que o médico havia me receitado, esperei por alguns minutos, e nada do sono vir, triste caí em prantos, pois o sono havia me abandonado e sozinho comecei a gritar pela casa: “sono, seu perverso, eu te amava, todas as noites nos encontrávamos, até mesmo na escola, no trabalho, onde tivesse conforto, ali tu me possuías, você não se lembra daquela vez que dormi sobre meu caderno em plena aula da professora Jalibaré, que perigo corri por tua causa, você bem sabe que ela era uma cobra.

Horas já haviam se passado, e meus olhos já estavam inchados por causa da insônia, depois que caí em prantos então, quase não se via que eles estavam abertos. O jeito era eu me conformar, fui até a estante pegar um livro para ler, adivinhem o nome do livro? Na terra dos sonhos, Mil maravilhas. Oh, Deus que castigo, o que fiz para merecer?

Deixei o livro lá mesmo, decidi então, assistir a um filme e quando liguei a televisão, oh, não! Um programa de venda, e uma apresentadora

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sem coração dizendo: Compre sua cama e tenha mais conforto na hora de dormir. Nesta altura do campeonato, o dia estava quase amanhecendo. Decidi fazer mais uma tentativa de dormir. Cansado e destruído por dentro olhei para minha cama, e disse: Filha, tantos anos nos conhecemos, não me decepcione.

Deitei-me e com toda a vontade fechei os meus olhos e disse: é agora! Até que enfim havia conseguido dormir. Até o despertador tocar, o cachorro latir e os trabalhados quebrarem o asfalto com a britadeira.

Peguei o relógio furioso joguei direto na cabeça do cachorro, olhei para o trabalhador com o intuito de ofendê-lo, escorreguei, caí do quinto andar do prédio, não morri, mas consegui um sono de cinco dias de coma. Posso dizer que aquele dia fui o homem mais feliz do mundo, quer dizer com um pouco de dores, é claro.

Fernando Barroso

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Feliz Aniversário, amor

“Feliz aniversário, amor”.

Há quanto tempo que não nos correspondemos! Por negligência da minha parte, admito. Mas não falemos de coisas tristes e que já se resolveram, que falemos de coisas boas (como seu aniversário) e do futuro que te resta pelo frente.

Hoje, quando decidi te escrever, meus olhos se encheram de lágrimas. É difícil ver que tanto tempo se passou desde que você saiu de minha casa e te ver como uma mulher e não, mas, como minha pequena bailarina, que dançava e saltitava pelos cômodos de meu apartamento ao som de qualquer balada.

É ... Bem que dizem que o tempo passa rápido, que se descuidarmos quando percebermos já estaremos dentro de um caixão sob sete palmos de terra. Hoje, também percebi o quão fui descuidado com você, deixando você dormir de cabelos molhados e sem cobertor, comendo besteiras antes do jantar, mandar Irene, minha empregada, te levar aos seus concertos de balé quando eu deveria lhe acompanhar. Enfim, coisas pequenas, mas que a mim, fizeram grande falta na velhice e que, provavelmente, lhe fizeram falta na adolescência, (o que, talvez, explica a sua grande mágoa de mim, a sua decisão de partir) por isso e por outras coisas mais, lhe peço perdão.

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Filha, eu te amo, e amo seus filhos e marido e toda a sua nova família pelo fato de te amarem. Ainda não gosto da sua decisão de morar em outra casa em outra cidade, longe de mim, mas tenho que aceitar, pois você está feliz e é isso que me importa. Não vou mentir, fico triste ao pensar em você tão longe de mi...”

Assim dizia a carta que foi encontrada sob o corpo do meu falecido pai no dia de meu aniversário. Irene, sua empregada a encontrou quando entrou em seu escritório para limpá-lo e viu meu pai sobre a mesa e sobre o papel. Dizem que ela ainda não se recuperou do choque, mesmo após um semana ter se passado. Eu ainda não me recuperei, também.

Pai, se o senhor soubesse o quanto lamento por minhas faltas, pela filha irresponsável e insuportável que fui, não pediria perdão. Ainda assim te perdoo pelos seus pequenos equívocos e peço perdão pelos meus.

Eu te amo. Sei que as palavras que digo em seu funeral, nesse momento, talvez, não serão ouvidas pelo senhor, ainda assim digo, grito ao mundo, EU TE AMO – sussurrando, completa – eu sempre amei e sempre amarei.

Thaís Rodrigues

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A vida no cemitério

Numa noite de inverno, fria e escura o vento embalava as ruas vazias de uma pequena cidade. A felicidade da solidão era o cemitério, ali se encontrava a verdadeira razão da sobrevivência.

Aquele lugar, porém, era o refúgio dos mortos. Todos ali juntos e

reunidos numa só razão, viviam sendo bem cuidados pelo velho e rabugento Sr. Thompson, coveiro do cemitério, o qual era muito enjoado. O mesmo limpava, espanava, lavava e se duvidasse de vez em quando até morria junto com os demais defuntos.

As covas tinham vida própria, acompanhadas de seus corpos

velhos e empoeirados do tempo. Nada ali era tão verdadeiro quanto os sentimentos mortais do lugar. As árvores dançavam ao som do vento e se escutava as folhas secas caírem ao chão.

Era tudo tão escuro, o que tornava o lugar sombrio e assustador.

As visitas de pessoas no cemitério eram mais pela parte do dia, pois havia um medo em visitá-lo. O coveiro Sr. Thompson vivia tão mal humorado que até os defuntos reclamavam.

As covas abandonadas eram as que davam mais medo, retratos

antigos, flores murchas, vasos quebrados, bom, tudo dava um ar de filme de terror. Normalmente em dia de finados o cemitério lota de gente, parentes visitando seus entes queridos, amigos e familiares. E Sr.

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Thompson continua de mau-humor e diz não entender pra quê visitar pessoas mortas.

Todas as noites o silêncio sombrio do cemitério assustava a todos

que passavam perto do mesmo. Quando chegava alguém novo no local, os corpos se reviravam em suas covas querendo saber quem era o mais novo defunto. Sr. Tomson odiava movimentação no cemitério.

Passados alguns anos, aquele dito cemitério foi desativado e enfim

os seus moradores puderam ter um pouco de paz. E o Sr. Thompson? Bom, a sua idade chega com o tempo e ele vem a falecer e ser enterrado no mesmo cemitério onde trabalhou, antes que fosse desativado. E corrigindo: Sr. Thompson agora vai ser rabugento lá em outra dimensão, com seus amigos de cova. Então, quando ver as catacumbas se levantarem, acredite: é a paciência dos mortos que morreu por culpa das brigas do Sr. Thompson.

Rafaela Pessoa

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Nem sempre o diabo é culpado

Há diversas pessoas que diante dos percalços da vida preferem não assumir suas responsabilidades quando nem tudo está dando certo. E na tentativa de desviar do dedo que a culpa as aponta, colocam no centro das atenções, ou do dedo, o diabo. Em Tucuruí, localizada no sudeste do Estado do Pará, não é diferente. Podemos encontrar muitos com este tipo de mentalidade e que ajudam no atraso do desenvolvimento da localidade que em 2013, foi apresentada como um dos cinco municípios mais ricos do Estado.

Teoricamente, com o que foi apresentado neste ranking, imaginar que o lugar referenciado tenha demasiados problemas sociais seria até um pecado – sei que o cara lá de baixo gosta disso. Pois é, mas temos. E grande parte da culpa não é do “tinhoso”, é nossa.

Conhecido pelo seu lema "Capital da Energia" pela presença da Usina Hidrelétrica, o lugar é abençoado por suas riquezas. Porém, a presença de verba não significa que não se tenha abacaxis a serem descascados. Até porque, quando se há capital a pergunta que se tem que fazer não é quanto tem que ser investido, mas como se deve e em que.

Há alguns anos, o atual chefe executivo de Tucuruí denunciou a uma emissora de rádio local a fraude que estava ocorrendo na instituição administrativa máxima no nível municipal. Segundo este, a sangria

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denunciada seria estancada e os valores poupados da extorsão seriam usados para asfaltar a cidade. Recentemente, porém, moradores do bairro mais populoso bloquearam a principal via de acesso à área.

Um blog local entrevistou a moradora Dorotéia Santiago, 56 anos. Segundo ela, apesar dos residentes já terem encontrado as autoridades e os mesmos garantido que as obras seriam realizadas, nada foi feito. Os esforços foram nulos. Para alguns o dia 1º de Abril passa. Para outros ao que parece, não.

Ao longo desta já longa jornada administrativa, o que se viu foram apenas buracos sendo tapados. Segundo o artigo 23, inciso XX da Constituição Federal de 1988, é dever do órgão público que chefia um município a promoção à melhoria das condições habitacionais. Como prover uma pavimentação de qualidade para as vias urbanas, mas no lugar em questão não é o que acontece – seria um absurdo dizer que apenas em Tucuruí ocorre estes casos, porém, não devemos ser “Maria vai com as outras”, não é verdade? E um instrumento básico que ajudaria nestes casos, fora – estranhamente – deixado pra lá: o Plano Diretor.

Representando o Instituto Federal da localidade, o diretor geral Raimundo Sanches esteve presente na elaboração do projeto, que contou com a colaboração de diversos segmentos sociais do município. Segundo Raimundo, o plano possui “todas as ações que devem melhorar a estrutura física da cidade.” Mesmo tendo sido aprovado pelo órgão legislativo do

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município, não foi colocado em prática. Raimundo afirma que os membros que ajudaram na elaboração, levantaram problemas como, olha que irônico, a mobilidade urbana. “Infelizmente, está engavetado!” afirma o diretor sobre o documento.

Realmente a sangria denunciada acabou ou não? Será que a denuncia foi feita para que a população estivesse a par dos acontecimentos? Eu sei, não vou me contradizer. Assim como não devemos simplesmente jogar a culpa dos nossos males no diabo, não devemos meramente apontar o dedo para nossos representantes e afirmar com todo vigor que a culpa é totalmente deles. Eles não nos obrigam a colocá-los no poder. A cidade já convive com isto há muito tempo - é evidente a falta de visão por parte das pessoas. Os grandes culpados somos nós que os escolhemos, o cenário real é este. Continuamos nos vendendo, e pior, por muito pouco.

Penso que uma das armas para acabar com estes casos é usada em vão por grande parte dos habitantes. Então, chega-se a estranhar tanta reclamação – se você vota de qualquer jeito, não adianta reclamar se te governam de qualquer jeito. Teremos mais uma oportunidade de mudar nosso triste cenário – chega a ser assustador como gente sem a menor capacidade consegue continuar nos ludibriando. Em breve, estaremos escolhendo nossos representantes. Quem sabe seremos nós a dizimar a

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sangria que deixa nossa cidade doente? Sim, porque a responsabilidade é minha e sua, pois: nem sempre o diabo é culpado.

André Costa

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Desenvolvimento: desafios e resultados

“Década perdida”. Essa é a denominação atribuída ao período iniciado no fim dos anos 70 e que se estendeu por toda a década de 80 no Brasil. Tal denominação se deve ao fato de que no referido período, o país enfrentou uma de suas maiores crises. Assim sendo, o Estado precisou buscar novas formas de movimentar a economia brasileira e, com isso, teve início um intenso processo de modificação nos âmbitos econômico e social do país.

Em Tucuruí, Sudeste do Pará, esse processo se deu a partir da

implantação da maior fonte geradora de energia hidráulica do país. É notório que a construção da hidrelétrica trouxe e continua a trazer vários benefícios para Tucuruí e região e, por conta disso, representa um marco na história da cidade. No entanto, “nem tudo são flores”. A usina também causou uma série de impactos negativos em nosso município.

Baseada em tudo o que tenho observado ao longo de meus 17 anos

como moradora de Tucuruí, afirmo que a usina, além de um marco, significa um “divisor de águas” entre o passado e o presente de minha cidade.

Digo isto, pois, segundo as pessoas que moram na cidade há mais

tempo, no período anterior à inicialização das obras, Tucuruí fazia jus ao que se pode chamar “cidade pacata”. O município possuía, em média, uma população de 5 mil habitantes cujo principal meio de sustento eram as atividades pesqueira e extrativista; os índices de violência eram baixos e

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não havia muitos problemas relacionados com transporte público, em outras palavras, Tucuruí foi um lugar tranquilo para se viver.

Hoje, passados quase 40 anos do início da construção, o cenário de

minha cidade é outro. Penso que a industrialização chegou a Tucuruí como uma pessoa sem convite chega a uma festa, “de penetra”, e a cidade não estava nem um pouco preparada para tamanha mudança. Tenho essa visão, pois, mesmo após tantos anos, as marcas negativas deixadas pelo centro hidrelétrico são imensas.

Exemplo claro disso, é o crescimento desenfreado da cidade, haja

vista que, se na década de 60, a região de Tucuruí era pouco povoada, em 1975 – ano do início da implantação da hidrelétrica –, passou a ser um verdadeiro “formigueiro humano”.

Tal fato se deve ao grande número de pessoas que migraram para o

município em busca de emprego e melhores oportunidades de vida, contudo, a quantidade de mão-de-obra requisitada foi desproporcional ao número de migrantes. O resultado foi a criação de aglomerados urbanos e o aumento significativo dos índices de violência.

Também é preciso destacar que, para a construção da usina,

estima-se que 14 povoados ribeirinhos tenham sido alagados, o que obrigou seus moradores a sair de suas casas em busca de outros lugares para viver.

Deve-se ressaltar, que a empresa responsabilizada pela hidrelétrica não somente indenizou os moradores atingidos na época, como também

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tem desenvolvido projetos sociais e ambientais nas proximidades do lago, porém para os atingidos apenas tais ações são insuficientes.

Sabe-se que até 2020 o Governo pretende implantar 24 novos

pólos energéticos. Sabe-se também que isto proporcionará uma série de benefícios para as cidades que receberão as hidrelétricas. Porém, os danos causados em Tucuruí, deixam claro que paralelamente aos benefícios vêm os malefícios.

Com isso, afirmo: antes de se iniciar a construção de uma

hidrelétrica em determinado município, a realização de aprofundados estudos sociais é indispensável, uma vez que, por esse meio pode-se saber se a cidade, em todos os seus âmbitos, está preparada para receber a tamanha mudança que representa a implantação de uma usina.

Após ver, ouvir e viver tantos impactos negativos deixados em

minha cidade, digo com toda certeza: a preparação do município para receber uma hidrelétrica representa a pedra fundamental para que as obras sejam pontes que conduzam as cidades para o DESENVOLVIMENTO e não para uma sociedade marcada por problemas. Afinal, como afirmou Karl Marx: “De nada valem as ideias sem homens que possam pô-las em prática”. Trazendo para a nossa realidade, afirmo: De nada adianta possuirmos grandes construções, se não tivermos uma sociedade sólida para movimentá-la.

Débora Freitas

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Até quando “peixes do Inverno”?

Tucuruí, cidade que me viu nascer e crescer, é vista como um “pedaço iluminado da Amazônia”. O lugar onde vivo não decepciona quem está à procura de recursos naturais de rara beleza. Destacada no cenário internacional como “Palco energético da Amazônia”, por abrigar em seu território a quarta maior usina hidrelétrica do mundo, esse lugar me encanta pelo seu povo, que é formado por diversas culturas, que participaram da sua construção. Tucuruí, na maior parte do ano é pólo de abastecimento de peixes para as regiões vizinhas, exceto no inverno, quando os nossos pescadores transformam-se em “pesca”, pois são envoltos em uma rede de problemas.

O Rio Tocantins, que está na lista dos trinta maiores rios do mundo,

é o sustento das famílias ribeirinhas que vivem nas áreas mais baixas da cidade, onde 90% dessa comunidade constituem-se de pescadores. Protagonistas de uma triste realidade, esses cidadãos sofrem anualmente com o sufoco de terem as suas casas invadidas pelas águas do Tocantins, e isso acaba por acarretar um turbilhão de problemas para esses alagados, dentre eles, a meu ver, o pior: a desagregação destes para outras partes da cidade.

É comum, no período do inverno, sair de casa pela madrugada, pois

as águas invadem tudo o que encontram pela frente, inclusive, o abrigo de nossas famílias, e é nesse momento que sentimos o peso do descaso. Isso poderia ser evitado, pois com os radares meteorológicos seria possível

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prever a intensidade das chuvas, sem a necessidade de acordarem de madrugada e se encontrarem debaixo d’água.

As famílias que vivem próximo ao rio sabem bem o que é sofrer no

inverno Amazônico, que ocorre no período de novembro a abril. Estrela Dutra, de 21 anos, moradora no bairro desde que nasceu, conta que a sua família teve que arcar com os gastos de uma construção de dois andares, já que quando as enchentes vêm, a parte baixa da casa é toda inundada pelas águas.

O restante de nossas famílias, que não tem condições de arcar com

uma construção deste porte, é obrigado a ir para o Parque de Exposições da cidade, um abrigo improvisado, onde se alojam próximo aos celeiros de animais, e sofrem com a falta de segurança e o escasso atendimento médico. Alguns alojados reclamam que este ano não houve ônibus para ir até o centro da cidade para comprar medicamentos, mantimentos e frequentar as aulas.

Do meu ponto de vista, esses alojamentos são de péssima qualidade

e distantes do bairro dos atingidos, o que consequentemente acaba ocasionando a decisão de permanência de alguns ribeirinhos, já que a distância é grande para chegar até o rio e exercer a profissão de pescadores, com a qual sustentam suas famílias. Ademais, neste período, os moradores têm suas casas saqueadas pelos chamados “Piratas das Cheias”, que furtam o que não foi possível levar para o abrigo.

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Ainda sobre os abrigos, fiquei sabendo que no começo deste ano, foi apresentado pela coordenadora de defesa civil do estado do Pará o “Plano Estadual de Contingência a Enchentes e Desastres Hidrológicos”, que objetiva integrar os diversos setores da cidade para a busca de um bem comum para os atingidos, como é o caso de nossos alagados. Na reunião foi apresentado um orçamento que gira em torno de R$ 10,6 milhões, que deveria ser usado para custear as muitas despesas com os desastres ambientais.

O que se observa, entretanto, é que não se está percebendo este investimento e os “peixinhos” reagem: até mesmo fechar rodovia federal, esses moradores fizeram, no intuito de receber resposta de nossos governantes, afim de, custear parte dos gastos que são incalculáveis quando vêm as cheias.

Como nada é planejado, todos os anos a Prefeitura de Tucuruí faz

dispensa de licitação para atender os atingidos, com recursos mínimos. Além disso, a Prefeitura espera pela ajuda de outras esferas governamentais, que destinam recursos através de decretos ou leis criados em caráter de emergência para atender os atingidos por calamidades, como é o caso da Lei Federal nº 8.742, que institui em seu 2º parágrafo, o benefício eventual em decorrência das enchentes.

Para se resolver o problema, sabe-se que a retirada dessas famílias

para uma habitação “decente” é a solução mais plausível. Mas não podemos arrancá-los à força de suas moradias, pois lá estão suas raízes. Alguns moradores afirmam que é possível ajustar as suas casas para receber as cheias, como é o caso da construção de casas de dois ou três

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andares. O remanejamento destes para outras partes da cidade seria um tanto complicado, viver longe do rio não é uma boa alternativa, o que os faz enfrentar a vida de “Peixes do Inverno” todos os anos.

Frente a esta problemática os moradores continuam aqui à espera

de mudança. E a mudança é possível de ser concretizada, mas é preciso iniciativa, não apenas por parte do poder público, mas também daqueles que já não aguentam mais essa situação, tristeza não resolve, como diz uma frase de Vinicius de Moraes: “Não fiques triste, pescador, que mágoa não pega peixe”; é preciso continuar a luta, a reivindicação e insistir para não ser esquecidos, pois só assim, poderá haver a esperança de que os peixes do inverno um dia nadem para um lugar onde o verão nunca acabe!

Gustavo Silva

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Tucuruí: a cidade da energia em meio à escuridão

Às margens do rio Tocantins, situam-se várias cidades e povoados; e um deles, foi escolhido para abrigar a maior escultura do capital internacional da Amazônia: a usina hidrelétrica, construída em Tucuruí. Atualmente, após décadas desde sua construção e finalização, a usina é a grande responsável pelo desenvolvimento social e econômico da minha cidade. No entanto, apesar de ser um pólo produtor de grande quantidade de energia elétrica, Tucuruí passa por sérios problemas no que tange à qualidade da energia que chega à cidade, levando a mesma, não raramente, a ficar na total escuridão.

Vale ressaltar que a energia gerada em Tucuruí é repassada pela

empresa Eletrobrás-Eletronorte, proprietária da usina, a uma concessionária de distribuição, que estende a energia para todo o estado do Pará, chegando a Tucuruí.

É fato também que a Lei nº 9.074, regida pelos termos do Art. 175

da Constituição Federal do Brasil, afirma em seu capítulo II, com relação aos deveres das empresas concessionárias de serviços públicos, que estas empresas devem promover um “serviço adequado, satisfazendo as condições de regularidade, continuidade, eficiência e segurança”. Todavia, mesmo sendo lei, não a vejo ser cumprida nos serviços da concessionária em minha cidade.

De acordo como exposto em Março de 2014 pela ANEEL (Agência

Nacional de Energia Elétrica), em sua análise da qualidade dos serviços

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prestados por concessionárias de energia elétrica em todo o Brasil, a que atua em Tucuruí, em um ranking de 35 empresas, ficou em 33º lugar. Um paradoxo e tanto! Afinal, pagamos uma fortuna por uma “qualidade” ausente em nossa energia.

É isso mesmo! Possuímos uma grande usina hidrelétrica em “nossos

quintais” e recebemos uma das piores e mais caras energias de todo o país. A nossa população – ou, ao menos, parte dela – tenta fazer sua parte: protesta e vai às ruas em busca de seus direitos. Em Fevereiro de 2014, por exemplo, algumas dezenas de índios Assurini, moradores dos arredores da cidade, por se sentirem lesados com os incontáveis danos causados por conta dos blecautes, foram ao prédio da empresa distribuidora de energia, no município, em busca de esclarecimentos.

Em resposta aos protestos indígenas, o diretor de Engenharia da

concessionária, disse em entrevista a uma emissora de rádio da cidade que cerca de 20 milhões de reais foram investidos nos últimos anos pela empresa e já foram instalados novos circuitos e alimentadores recentemente para o abastecimento da cidade. A população relata, no entanto, que os apagões e prejuízos advindos dos mesmos só aumentaram no decorrer do tempo.

Eu mesma tenho vários amigos e conhecidos que já tiveram aparelhos elétricos queimados em casa por conta dos apagões sendo que nem um ressarcimento a eles foi dado e entendo o quanto é difícil trabalhar e se esforçar para adquirir determinado aparelho e perdê-lo, de uma hora pra outra. É horrível!Chegamos, então, à seguinte questão: Qual é, realmente, o fator causador destes apagões?

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O engenheiro eletricista Helder Camargo Baptista, morador da

cidade, diz que as principais causas dos blecautes em Tucuruí residem na falta de manutenção adequada para os equipamentos, que são antigos; na não inserção de transformadores mais eficientes e ainda, nos “gatos” – instalações elétricas não oficiais feitas pela própria população – que podem aumentar, e muito, o consumo do sistema (que já é precário) sem que ele esteja preparado para isso.

Penso que a população que se utiliza dos “gatos” não o faz por outro

motivo, senão, pela baixa condição financeira. Afinal, nossa energia é extremamente cara e, apesar de morarmos em uma das cidades mais bem desenvolvidas de todo o estado, moramos no interior; e poucas são as ofertas de trabalho. Diante desta situação, muitos vão embora à procura de emprego.

Os impactos negativos causados pela construção da usina são uma

fonte de sofrimento até os dias de hoje para nossas famílias; afinal, povoados inteiros tiveram que deixar suas casas para que fosse possível a formação do lago artificial da usina. É tanto, que ainda atualmente existem movimentos como o MAB (Movimento dos Atingidos por Barragem) por meio do qual, os que se sentem lesados reivindicam seus direitos por conta destes prejuízos sociais.

Será que o sofrimento que tantas pessoas já passaram (e ainda

passam) por conta da construção desta usina foi em vão? Será que uma energia de qualidade e com um preço justo não seria o mínimo a que

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deveríamos ter direito? Sei que não sou a única a pensar desta forma, assim como entendo que há muitos que não têm conhecimento dos seus direitos e outros, que já se acomodaram a viver da maneira em que estamos, mas a verdade é que não aguentamos mais. Acredito que não há outra maneira de chegarmos à solução destes impasses, senão através do investimento. O nosso povo merece isso!

A empresa concessionária, em minha opinião, deve diminuir suas

altas tarifas e substituir seus equipamentos ultrapassados por outros novos e eficazes que supram toda a demanda, como é previsto em lei; já os órgãos responsáveis pelo desenvolvimento da cidade, precisam investir em novas formas de emprego e renda para que a parcela da população que se utiliza dos “gatos” possa vir a abandonar toda e qualquer forma clandestina de utilização de energia. Apenas assim, “a cidade da energia”, como Tucuruí é conhecida em sua região, fará jus à nomenclatura que possui e sairá da escuridão.

Jaqueline Lima

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Transcametá: sorrisos amarelos em meio à paisagem verde Tucuruí, cidade interiorana do sudeste paraense, fica às margens do

rio Tocantins, o qual abriga uma importante hidrelétrica – obra que pela sua grandiosidade recebeu o título de palco energético da Amazônia. Entretanto, aqui, temos problemas visíveis como em qualquer outro município do Pará e do Brasil. Um deles é o acesso às áreas rurais mais próximas, como por exemplo, a estrada federal que passa por Tucuruí – a Transcametá, a qual se encontra em péssimas condições de trafegabilidade pelo fato de esta não ser asfaltada.

Surge então o dilema: pavimentar a rodovia BR-422 seria a

solução? O fato de a estrada estar bastante esburacada, ocasiona transtornos

para quem necessita desse acesso: no período de chuva muita lama e na época mais seca, poeira. Daí vem a expressão de que as pessoas que passam pela Transcametá ficam “com poeira até os dentes”.

Ambientalistas afirmam que o município de Tucuruí não necessita

com urgência dessa revitalização, já que a cidade foi criada devido ao rio Tocantins, pois a Transcametá não é considerada a principal via da região. Para eles, é necessário fazer um estudo profundo sobre os reais problemas dos moradores de áreas rurais. Além disso, ressaltam que é preciso que órgãos públicos, como por exemplo, INCRA, IBAMA, DNIT estudem a amplitude dos impactos ambientais que a obra de asfaltamento traria à região, só então, seria adequada a ideia de rodovia nessa área.

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Penso que a citada via, a qual possui cerca de 300 km, é digna de destaque, uma vez que, não beneficia apenas Tucuruí, mas vários municípios, dentre eles: Novo Repartimento, Baião, Mocajuba, Cametá até Limoeiro do Ajuru, passando por uma região de agronegócio, o que torna a estrada uma importante linha de tráfego entre essas cidades que adentram pelo chamado “baixo Tocantins” no Pará.

A situação da rodovia é tão grave que para percorrê-la, os

motoristas são obrigados a enfrentar a péssima qualidade da estrada, o que é destacado em blogs e telejornais, não só da região, pois, geralmente, para viajar cerca de 80 km pela Transcametá, gastamos o tempo equivalente à distância de Tucuruí a Marabá que é de 260 km. “Quem utiliza com frequência, sabe que na época do inverno é comum a formação de atoleiros; mesmo quando eles não cortam a estrada, impedindo a ida e vinda dos veículos, o perigo de acidentes é constante”, disse o contador Nelito Lopes ao blog do jornalista Val-André Mutran de Brasília.

Diante de tantos problemas me questiono: o que está faltando para

que este quadro se reverta? Até hoje não consegui ver medidas que satisfizessem nossas reivindicações, pois algumas vezes, quando passei pela Transcametá percebi o quão perigosa vem se tornando: não existe polícia rodoviária no local e, após a federalização, o fluxo de veículos aumentou. Um proprietário de terra e morador antigo de Tucuruí conta que quando ocorrem assaltos na região, a estrada torna-se rota de fuga para muitos criminosos.

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Outro motivo contrário ao asfaltamento da rodovia em questão, é a existência, no percurso da estrada, de uma Reserva Extrativista e de uma reserva indígena Assurini.

O fato é que não queremos que a Transcametá se transforme em

uma segunda Transamazônica, visto que esta foi construída para interligar o país há mais de 40 anos e ainda hoje está quase intrafegável em sua maior parte.

Diante disso, percebo que o problema substancial da Transcametá é

de cunho da gestão pública, principalmente pela falta de conexão entre municípios, estado e união. Estas camadas do poder devem contribuir a fim de que haja uma reestruturação na estrada.

Frente a esta problemática, os moradores continuam à espera de

mudança. Mudança essa que poderá chegar com a pavimentação da via em questão, pois como ratificou Augusto Comte: “o progresso não é mais do que o desenvolvimento da ordem”. Logo, é preciso ação. Não quero continuar vendo, crianças demorando tantas horas para chegar à escola, nem doentes viajando horas e horas para chegar ao hospital mais próximo. Nosso povo merece condições favoráveis de saneamento básico e vias de fácil acesso a toda a região. Só assim, poderemos sorrir sem denunciar o amarelo deixado pela poeira do nosso “verão amazônico”.

Jacqueline Romaro

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Minha janela

Da janela do meu quarto, Vejo a dor e o amor.

Ouço o canto de pássaros, Entoados com louvor.

No céu escuro as estrelas.

No sol, um enaltecer profundo. Os olhos das crianças reluzem

esse lugar do mundo.

A brisa cálida da noite bela. Sob o sol, o vento e a chuva,

contam os dias para o casamento dela. Quem diria? Não será mais viúva.

Vejo e ouço muitos casos,

Mas sempre sustento um belo sorriso. Acredito que já vivi demasiados fatos,

Da janela do meu quarto. E esse é o meu paraíso.

Yago Werner

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