da escola pÚblica paranaense 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os...

26
O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 Produção Didático-Pedagógica Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7 Cadernos PDE VOLUME I I

Upload: others

Post on 19-Feb-2020

2 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE

2009

Produção Didático-Pedagógica

Versão Online ISBN 978-85-8015-053-7Cadernos PDE

VOLU

ME I

I

Page 2: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO DO PARANÁ-SEED PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE

PROFESSORA ELIANE APARECIDA BUGHAY

UNIDADE DIDÁDICA

"EU TE BENZO, EU TE CURO”: PRÁTICAS COTIDIANAS DE BENZEDEIRAS NA COMUNIDADE DE SÃO CRISTÓVÃO, VOZES DE UMA

TRADIÇÃO.

UNIÃO DA VITÓRIA 2010

Page 3: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

2

ELIANE APARECIDA BUGHAY

“EU TE BENZO, EU TE CURO”: PRÁTICAS COTIDIANAS DE BENZEDEIRAS NA COMUNIDADE DE SÃO CRISTÓVÃO, VOZES DE UMA

TRADIÇÃO.

Produção Didático-Pedagógica elaborado para intervenção no Colégio Estadual Adiles Bordin, em 2010, atendendo à solicitação do Programa de Desenvolvimento Educacional do Estado do Paraná, na área de História. Orientadora: Prof. Ms. Leni Trentim Gaspari FAFIUV

UNIÃO DA VITÓRIA 2010

Page 4: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

3

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...............................................................................................................4

QUE É BENZEÇÃO? QUEM SÃO AS BENZEDEIRAS?.............................................5

HISTÓRIA ORAL............................................................................................................7

AS BENZEDEIRAS NA HISTÓRIA.............................................................................11

COMO ELAS RECEBEM O DOM DE BENZER.........................................................15

O TRABALHO DE BENZER.........................................................................................18

QUEM VAI SE BENZER ..............................................................................................21

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................24

Page 5: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

4

INTRODUÇÃO

O presente trabalho foi elaborado para ser desenvolvido no Ensino Fundamental,

mais precisamente no 3º ano do quarto ciclo, ou 7 ª série/8°série.

Ele foi pensado a partir da necessidade que temos de fazer com que o aluno

sinta-se participante na produção do conhecimento histórico. Por isso, privilegiamos a

oralidade, tendo como instrumento principal o desenvolvimento da pesquisa através dos

recursos proporcionados pela história, narrada oralmente.

O fio condutor de tudo está nas entrevistas realizadas com três mulheres que

trabalham como benzedeiras no Distrito de São Cristóvão, município de União da

Vitória, em cujo local também está a escola, em que trabalho, envolvendo toda a

comunidade dos alunos e alunas, e também o espaço onde moro.

Ainda que o objetivo principal do trabalho seja a promoção da história oral como

recurso didático no Ensino Fundamental, buscamos também dar voz a personagens que

não aparecem nos livros escolares.

Em se tratando das três mulheres entrevistadas acerca de sua atividade como

benzedeiras, de forma exclusiva, praticada apenas por mulheres, outras questões podem

ser observadas, como as referentes ao estudo de gênero e a história das mulheres que se

sobressaem no corpo do trabalho.

Page 6: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

5

QUE É BENZEÇÃO? QUEM SÃO AS BENZEDEIRAS?

Você certamente já ouviu falar em benzedeira! E em benzeção? Não? Sim?

Sim ou não, vai a definição que encontramos no dicionário, para termos uma

noção mais certa do que se pensa por aí sobre isto:

benzedeira Significado de Benzedeira sf (benzer+deira) 1. Mulher que pretende curar doenças com benzeduras. 2. Bruxa. Fonte: dicionário online de português.

Pelo que nos apresenta o dicionário, escolhido ao acaso na internet, benzedeira é

um substantivo feminino com dois sinônimos: a mulher que cura, ou que pretende curar

através de benzeduras e ainda, bruxa! E benzeção é o ato ou efeito de benzer. Mas, e

bruxa? Por que este é também um sinônimo de benzedeira? Bem, isso precisa de um

novo parágrafo.

Como veremos adiante, a história das benzedeiras estará bastante ligada à

história das mulheres, assim, como em alguns momentos da história ocidental, como nas

chamadas Idades Média e Moderna, as mulheres que ferissem alguma imposição das

classes dominantes poderiam ser tachadas de bruxas - e as benzedeiras estavam

inseridas aí – sendo que esse adjetivo marcará presença até os dias atuais. Mas isso é

coisa para nos aprofundarmos mais adiante.

Em tempo:

Antes de mudarmos de assunto ou de fazermos a atividade, tire dúvidas

referentes às palavras ou conceitos que não conhece no glossário ou pergunte então à

professora!

GLOSSÁRIO

Idade Média: período que foi tradicionalmente delimitado com ênfase em eventos políticos. Nesses

termos, ter-se-ia iniciado com a desintegração do Império Romano do Ocidente, no século V (em 476 d.

C.), e terminado com o fim do Império Romano do Oriente, com a Queda de Constantinopla, no século

XV (em 1453 d.C.) ou com a descoberta da América (em 1492);

Idade Moderna: período específico da História do Ocidental que vai de 29 de maio de 1453 quando

Page 7: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

6

ocorreu a tomada de Constantinopla pelos turcos otomanos até a Revolução Francesa, em 14 de julho de

1789.

História ocidental: que trata da história do mundo ocidental;

Mundo ocidental: compreende os países da Europa (por oposição à Ásia, o "mundo oriental"), e os que

têm suas raízes históricas e culturais ligadas à Europa. Nesta definição se incluem, além da própria

Europa, também as Américas e a Oceania e, em parte, também a África do Sul;

ATIVIDADE

Você conhece alguma benzedeira de nosso bairro? Já foi lá alguma vez? As

pessoas da comunidade gostam dela? O que falam sobre ela? E você, o que acha dela?

Através de um texto, compartilhe isso conosco!

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

PARA CONHECER MAIS UM POUQUINHO:

Sons e vídeos;

http://www.youtube.com/watch?v=g0FlMT-599A

http://www.youtube.com/watch?v=SCSXyB8vzYQ

Livros;

OLIVEIRA, E.R. O que é benzeção. São Paulo: Brasiliense, 1985.

Page 8: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

7

HISTÓRIA ORAL

A história oral é uma via de inclusão social. (Carlos Bakota)

Você alguma vez já assistiu na televisão alguma entrevista? Leu em jornal ou

revista uma entrevista? Certamente já. Isso está bastante presente no dia a dia. E de

história oral, você já ouviu falar? Pois bem, quem ainda não conhece ficará sabendo

mais sobre essa forma de se trabalhar a História.

História oral é um recurso moderno usado para a elaboração de documentos,

arquivamento e estudos referentes à experiência social de pessoas e de grupos. Ela é

sempre uma história do tempo presente e também reconhecida como história viva.

MEIHY, J.C.S.B. Manual de História Oral. São Paulo: Loyola, 2002.

Se fossemos explicar quando surgiu a história oral, diríamos que foi há muito

tempo atrás. Heródoto, considerado por muitos o “pai da História”, realizava seu

trabalho, escrevendo relatos que eram contados por pessoas que moravam nos locais

visitados por ele. Dessa forma, a História propriamente dita, nasceu do fato de alguém

estar contando algum acontecimento que, em seguida, era escrito.

Mas, como método de pesquisa em história, propriamente dito, a história oral é

bastante nova. Iniciou-se nos Estados Unidos da América a partir de 1930, quando se

fazia uma investigação sobre a vida de ex-escravos daquele país. Após essa época, a

história oral se espalhou por outros países do mundo, chegando e ganhando bastante

força no Brasil.

História oral é uma alternativa para estudar a sociedade por meio de uma

documentação feita com o uso de depoimentos gravados em aparelhos eletrônicos e

transformados em textos escritos.

Idem, pág.14.

O historiador Sérgio Buarque de Hollanda nos alerta para o fato de que é preciso

dar voz a sujeitos mudos da história, ou seja, às pessoas que não recebem a devida

atenção pela História escrita, propriamente dita. E é nesse sentido que a história oral se

transforma numa ferramenta bastante importante.

Page 9: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

8

Existem três possibilidades para se explicar a fundamentação documental da história

oral:

1) quando não existem documentos;

2) quando existem versões diferentes da história oficial; e

3) quando se elabora uma “outra história”.

Idem, pág. 24 e 25.

No estudo da história local, ou seja, da história que está mais próxima de nós,

que não estudamos, mas que precisamos dar maior atenção, a história oral se torna

fundamental. Para estudar as benzedeiras da nossa comunidade, podemos e devemos

encontrar e estudar material escrito que trate do tema. Mas, aliados a isso, temos de

conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-

las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu trabalho, quais os rituais que

utilizam e quem as procura, por exemplo.

A necessidade da história oral se fundamenta no direito da participação social, e nesse

sentido está ligado ao direito de cidadania.

Idem. Pág. 20.

ALGUNS CUIDADOS COM A HISTÓRIA ORAL

Para a realização de pesquisas, utilizando a história oral, de início é necessário

um projeto que seja apresentado às pessoas participantes. Em hipótese alguma, as

entrevistas podem ser coletadas de forma clandestina. A pessoa entrevistada precisa

estar ciente que terá seu depoimento gravado e - de início - deve assinar um documento

chamado Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, porque estará fazendo parte do

projeto de pesquisa. Após a transcrição da entrevista, deve-se oferecer o conteúdo para

análise e aprovação por escrito por parte da pessoa entrevistada. Caso ela censure

trechos da entrevista, isso deverá ser respeitado. A autorização para a utilização da

entrevista é realizada através de outro documento chamado Carta de Cessão de Direitos

para Utilização de Depoimento Gravado.

Page 10: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

9

Durante a entrevista ainda, o entrevistador ou a entrevistadora precisa conduzir o

trabalho, deixando a pessoa entrevistada à vontade para falar como deseje. Não se deve

fazer juízo de valor sobre o que está falando, bem como não desrespeitar o jeito de ser e

pensar da pessoa entrevistada.

Lembre-se, para uma boa entrevista é preciso saber ouvir. Como sugere Gaspari

(2005, p. 25)

(...) ao ouvir relatos que são muito particulares, criam-se laços de presença e põem-se

em movimento os sentidos corporais e espirituais que são próprios da relação humana e

exercitados na interação: ver, ouvir e falar. Ver o outro, o entrevistado, no sentido de

apreender, apropriar-se de suas emoções, do vivido, com aceitação, cumplicidade e

reciprocidade e, a partir daí, fazer história e produzir sentido. Ver, falar e ouvir é um

diálogo, mesmo que entre desiguais.

Em tempo: a professora estará à disposição para conduzir o trabalho. Ela é que pode

ajudar quando surgirem dúvidas.

GLOSSÁRIO

Inclusão social: conjunto de meios e ações que servem para combater injustiças e dar oportunidade à

pessoas ou grupos menos favorecidos dentro da sociedade. Aqui, no caso da disciplina de História, é

preciso que seja dado espaço a personagens que não aparecem na História oficial, mas que também

fazem parte da construção dessa História.

Heródoto: Historiador grego (484 a.C.- 420 a.C.). Considerado como o primeiro historiador, é autor da

primeira grande narrativa histórica do mundo ocidental antigo. É por isso chamado de pai da História.

Sérgio Buarque de Hollanda: Nascido em 1902 e falecido em 1982, em São Paulo, foi um dos mais

importantes historiadores brasileiros, além de ser crítico literário e jornalista. Escreveu obras como

Raízes do Brasil e Visões do Paraíso, obras básicas para uma melhor compreensão da sociedade

brasileira.

Fundamentação documental: provar alguma coisa tendo como base algum documento.

História Local: Método de trabalhar História a partir da realidade, espaço e tempo dos alunos e alunas.

É um bom caminho para aproximar as pessoas do conceito de sujeito histórico.

Page 11: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

10

PARA CONHECER MAIS UM POUQUINHO:

Sites;

http://cpdoc.fgv.br/acervo/historiaoral

http://www.fflch.usp.br/dh/neho/root.php

http://www.site.historiaoral.org.br/

Livros;

MEIHY, J.C.S.B. Manual de História Oral. São Paulo: Loyola, 2002. PRINS, G. História Oral. In: BURKE, P. (Org.) A Escrita da História. Novas Perspectivas. São Paulo: UNESP; 1992. JOUTARD, P. História Oral. In: BURGUIÉRE, A. Dicionário das Ciências Históricas. Rio de Janeiro: Imago; 1993.

Page 12: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

11

AS BENZEDEIRAS NA HISTÓRIA

Por ser uma prática, em sua maioria, realizada por mulheres, na história, a

benzeção está fortemente ligada à condição da mulher.

Durante a Idade Média, a Igreja Católica era uma instituição com um poder

muito maior do que ela tem hoje. Além de proprietária de muitas terras – os feudos –

ela também dominava a leitura e a escrita. E pense o que era isso numa época em que a

maioria da população era analfabeta!

Nesse período, as mulheres eram muito mal vistas pela Igreja Católica. Elas

eram tidas como criaturas débeis ou que poderiam ser facilmente tentadas pelo diabo.

Essas ideias não eram nada novas. Filósofos da Antiguidade Clássica, como Platão e

Aristóteles já haviam escrito bastante sobre a inferioridade feminina. Os pensadores da

Igreja somente se aproveitaram de suas ideias, unindo a isto a questão da facilidade

delas serem tentadas pelo diabo e, desta forma, realizar coisas em seu nome.

Quando foi criado o Santo Oficio, as mulheres foram bastante vigiadas por esse

órgão repressivo. A prática de benzeção foi encarada como bruxaria, como coisa de

mulheres a serviço do diabo aqui na Terra. Com a atuação do Santo Ofício, muitas

mulheres foram presas, interrogadas, torturadas e condenadas à morte.

Observe, no texto abaixo, algumas ideias de membros da Igreja Católica acerca

das mulheres:

Numa religião em que a carne é maldita, a mulher se apresenta como a mais temível

tentação do demônio. Tertuliano escreve: “Mulher, és a porta do diabo. Persuadiste

aquele que o diabo não ousava atacar de frente. É por tua causa que o filho de Deus

teve de morrer; deverias sempre andar vestida de luto e de andrajos.” E Santo

Ambrósio: “Adão foi induzido ao pecado por Eva e não Eva por Adão. É justo que a

mulher aceite como soberano aquele que ela conduziu ao pecado.” E São João

Crisóstomo: “Em meio a todos os animais selvagens não se encontra nenhum mais

nocivo do que a mulher.” Quando se constituiu o direito canônico, no século IV, o

casamento surgiu como uma concessão às fraquezas humanas, sendo incompatível com

a perfeição cristã. “Empunhemos o machado e cortemos pelas raízes a árvore estéril do

casamento”, escreve São Jerônimo. A partir de Gregório VI, quando o celibato foi

imposto aos padres, o caráter perigoso da mulher foi também severamente sublinhado:

todos os padres da Igreja lhe proclamaram a abjeção. Santo Tomás foi fiel a essa

Page 13: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

12

tradição ao declarar que a mulher é um ser “ocasional” e incompleto, uma espécie de

homem falhado.

Beauvoir, S. O segundo sexo. Volume 1. São Paulo: Círculo do Livro, 1986. Pg.127.

Apesar do Santo Ofício ser uma instituição criada durante o período medieval, é

no período chamado de Moderno que ele ganha maior força e atuação, principalmente

na Espanha e em Portugal.

Nesse período, muitas pessoas consideradas pecadoras, hereges, foram presas,

interrogadas sob torturas e condenadas às duras penas, de acordo com a gravidade da

falta para com a Igreja Católica.

As mudanças na mentalidade européia trazidas pelo Renascimento não foram

capazes de alterar velhas ideias que se tinha sobre a mulher. A Reforma Católica

aproveitou os poderes reforçados através do Santo Ofício para perseguir mais

fortemente as mulheres. A ideia da benzeção tida como bruxaria é muito mais acentuada

neste período e, como resistência, elas praticavam às escondidas. Porém, como a

delação era bastante comum, muitas foram presas, interrogadas, torturadas e, na maioria

das vezes, condenadas à morte na fogueira.

Com o desenvolvimento das ciências através do humanismo, a medicina se

aproveita para condenar também as pessoas que realizam ou se utilizam da prática de

benzeção.

Mesmo em meio a tanta repressão e perseguição, as mulheres resistiram e,

mesmo escondidas, continuavam as práticas de benzeção que eram passadas de geração

em geração. No Brasil Colônia, a herança europeia dos benzimentos ganha novas

influências, tanto indígena quanto africana e, numa terra continental com raríssimo

acesso a medicina formal, a maioria da população busca nas benzedeiras a cura para os

tormentos que lhes afligem.

GLOSSÁRIO

Feudos: o feudo era um benefício, muitas vezes, um lote de terras, que, no Período Medieval, o senhor

doava a um nobre. Os feudos contavam com uma infraestrutura necessária para manter aquele tipo de

sociedade.

Criaturas débeis: criaturas fracas, sem personalidade, que cedem facilmente ao apelo de alguém mais

forte ou mais inteligente.

Page 14: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

13

Antiguidade Clássica: Esse termo refere-se a um longo período da História da Europa que se estende

aproximadamente do século VIII a.C., com o surgimento da poesia grega de Homero, até a queda do

Império Romano do Ocidente no século V d.C., mais precisamente no ano 476. No eixo condutor desta

época, que a diferencia de outras anteriores ou posteriores, estão os fatores culturais das suas civilizações

mais marcantes, a Grécia e a Roma antigas.

Platão: importante filósofo grego da antiguidade

Aristóteles: foi um filósofo grego, aluno de Platão e professor de Alexandre, o Grande. Seus escritos

abrangem diversos assuntos, como a física, a metafísica, a poesia, o teatro, a música, a lógica, a retórica,

o governo, a ética, a biologia e a zoologia.

Santo Ofício: O Tribunal do Santo Ofício era uma instituição eclesiástica de caráter "judicial", que tinha

por principal objetivo "inquirir heresias" - daí também ser conhecido como Inquisição. Foi criado no

Período Medieval e teve atuação acentuada durante a chamada Reforma Católica, no Período Moderno.

Tertuliano: nascido em Cartago no ano 155, foi um dos mais importantes escritores eclesiásticos da

Antiguidade.

Santo Ambrósio: nascido em Trier, atual Alemanha, em 340, foi bispo da atual Arquidiocese de Milão,

e é considerado um dos Doutores da Igreja, já que fora profundo conhecedor e analisador dos textos

bíblicos.

Doutores da Igreja: certos homens e mulheres que são reverenciados pela Igreja pelo especial valor dos

seus escritos, pregações e a santidade de suas vidas. Cada um deles deu uma contribuição especial à fé,

ao entendimento dos evangelhos e à doutrina cristã.

São João Crisóstomo: teólogo e escritor cristão que nasceu na Síria, em 349. Era grande orador e

também considerado um dos doutores da Igreja.

São Jerônimo: tradutor da bíblia para o latim.

Gregório VI: foi Papa de 1 de maio de 1045 a 20 de dezembro de 1046.

Santo Tomás: padre e teólogo do século XIII foi um dos mais importantes pensadores da Igreja

Católica.

ATIVIDADE:

Pesquise na Internet alguns instrumentos de tortura utilizados pela Inquisição contra as

mulheres consideradas bruxas, a fim de observar a violência contra essas mulheres.

Depois, forme grupos com colegas para a organização de cartazes sobre essa prática.

PARA CONHECER MAIS UM POUQUINHO:

Sons e vídeos;

Tapete Vermelho. Direção: Luiz Alberto Pereira. Brasil: 2006. 100 min.

O Poço e o Pêndulo. (The Pit and The Pendulum). EUA: 1991.

Textos e livros;

Page 15: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

14

Beauvoir, S. O segundo sexo. Volume 1. São Paulo: Círculo do Livro, 1986. BUONICORE, A. O anti-feminismo na história. Disponível em http://br.dir.groups.yahoo.com/group/cafeconsciencia/message/5233. Acessado em 04 de julho de 2010. DELUMEAU, J. História do medo no Ocidente. São Paulo: Cia. das Letras, 2009. SOUZA, L. M. O diabo e a Terra de Santa Cruz. São Paulo: Cia das Letras, 1993.

Page 16: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

15

COMO ELAS RECEBEM O DOM DE BENZER

“Eu aprendi por que eu via a mãe benzê, daí eu pegava, via ela rezar, acendia a vela

nos pézinho dela, nos santinho e rezava.”(Dona Helena Cordeiro)

Aqui reproduzimos um trecho do livro O que é Benzeção, de Elda Rizzo de

Oliveira que nos ajudará a compreender melhor como se dá o processo da descoberta de

que a pessoa será uma benzedeira:

Geralmente a descoberta do dom pela benzedeira ocorre paralelamente ao

reconhecimento de algum acontecimento forte na sua vida. (Isso pode ser) Um pedido

de auxílio para uma situação desesperadora, vindo de poderes sobrenaturais (ou) outras

situações em que ocorre o reconhecimento da existência do seu dom: quando a

benzedeira depara com alguma doença incurável; quando ocorre uma revelação, por

exemplo, uma visão de que uma santa a protege numa estrada perigosa; ou quando ela

ouve uma voz que a orienta no sentido de retribuir às pessoas, a graça da benção que

recebe dos santos; ou ainda quando, na ausência de outras benzedeiras, ela precisa

aprender o conhecimento do trabalho para poder benzer as crianças que ficavam

doentes. Às vezes recebe o dom de pessoas de sua família, como de uma avó, de uma

tia; outras vezes, quando possui uma característica de bondade ou de habilidade para

ajudar as pessoas e isso é identificado por outra pessoa como sendo um dom, ou tem-se

ainda todas essas situações combinadas de diversas maneiras entre si.

OLIVEIRA, E. R. O que é Benzeção. São Paulo: Brasiliense, 1985. pg. 34)

Das benzedeiras que foram entrevistadas para este trabalho - fora dona Josefa

Podgurski que disse ter aprendido sozinha a benzer - a descoberta pelo dom aconteceu

de forma meio parecida. Dona Helena Cordeiro já tinha a sua mãe que era parteira e

benzedeira, além do pai, que benzia mordedura de cobras em animais e pessoas. Ela

acabou aprendendo com a mãe as orações e remédios para serem utilizados para cada

caso. Quando sua mãe veio a falecer em complicações de parto, uma ocasião fez ela se

utilizar dos conhecimentos que tinha. Depois que começou, não conseguiu parar tão

cedo. No quadro abaixo citamos partes de seu relato:

Page 17: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

16

Eu aprendi por que eu via a mãe benzê, daí eu pegava, via ela rezar, acendia a vela nos

pézinho dela, nos santinho e rezava. (...) De ver e decerto tinha o dom também, né. Eu,

quando era criança, eu desmaiava, sabe, não sei o quê que me dava, eu desmaiava e

daí, um dia, tava plantando feijão com meu pai, e o pai plantando milho e eu feijão, que

o espaço era curto pro feijão, e o milho já mais longe assim, pra não fechar o feijão, né.

Pra dar a planta bem. E eu plantando, roça de toco, daí eu desmaiei e o sinal, nunca

mais saiu o sinal. Ih, tinha um sinalzão grande, agora já fechou, aqui ó, pegou quase

aqui, se tivesse pegado aqui, tinha morrido. Caí com o pescoço naquele toco assim, daí

me trouxeram pro hospital maternidade, fiquei internada, tudo, daí, nossa, ficou uma

bola assim, eu sofri daquilo. Daí minha mãe fez um pedido pra mim sarar, e ela ia

passar o dom dela pra mim. (...)! Pra mim sarar e nunca mais dar desmaio em mim. Daí

quando eu ficava mais adulta assim, assumir o benzimento. Daí, eu não quero ser

benzedeira, a mãe é benzedeira, mas eu não quero. Disse que não queria, né. Daí não

me deu mais ataque. Daí, desde o dia em que nós fomos num casamento, daí deu

hemorragia numa menina lá, pelo nariz, sangue pelo nariz, tinha arrebentado umas

veinha assim e a menina tava morrendo. E até eles achar um carro longe, lá na

cachoeira, longe, até pegar o carro, era um casamento que tinha, daí até pegar, arrumar

ligeiro uma condução, tinha gente lá com condução, usavam muito aqueles jipe, né, e

aquelas caminhonete ximbica, que diziam, né. Usavam muito daqueles carro,

antigamente. Daí até achar a condução, a menina, eu peguei e, primeiro benzimento

que eu fiz, eu peguei e falei pra mãe da menina. Me deu aquela vontade de ajudar

assim, sabe, falei, vamos lá no quarto que eu quero ver essa menina. Ela disse: a

senhora benze? Eu: benzo sim. Daí eu: não. Eu não benzo, mas, sei fazer uma oração.

Fui lá no quarto e fiz minha oração que nem minha mãe. Fiz minha oração e daí pedi

uma cabeça de palha, né, tirei a lasquinha, fiz a cruzinha, tirei o sangue da menina, fiz a

cruzinha e fiz na testa e nas mãos, mas olha, não levou nem dois minuto o sangue

estancou, daí essa menininha não precisou levar no médico, daí ponharam, não, não é

preciso levar.

Helena Cordeiro. Depoimento coletado em 04/02/2010.

Dona Elvira também veio de uma família benzedeira. Igual a dona Helena, sua

mãe era benzedeira e parteira e o pai também benzedor. Além deles, outras pessoas

também lhe ensinaram:

Page 18: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

17

Desde criança minha mãe ensinava e daí a gente trabalhava em casa que tinha criança,

mandavam a gente tirar quebrante, daí foi indo e eu comecei a benzer. A mãe e o pai

(eram benzedores) os dois. O papai ensinava mais a gente que a mamãe. Minha mãe

era parteira. Era mulher muito forte, mas morreu de repente, com 62 anos. (...).

Cera foi uma otra curadera que me ensinô.(...)Engraçado que ela disse: oia eu vô te

ensiná, porque nóis tinha que pegá um caminhão como daqui na Rondinha pra levá as

crianças lá(...). Daí ela me ensinô, daí eu fui indo, fazendo.

Elvira Lima da Silva.Depoimento coletado em 05/01/2010.

GLOSSÁRIO

Dom: pessoa que faz bem determinada coisa e que descobre que, além de ter aprendido de alguma

forma, aquilo que sabe já estava nela.

Revelação: Coisa que é revelada; inspiração; conhecimento súbito; ato ou efeito de revelar ou de

revelar-se.

Jipe: O termo jipe é o nome dado aos automóveis destinados ao uso fora de estrada, ou off road,

normalmente com tração nas quatro rodas. A palavra jipe é um aportuguesamento do termo em inglês

jeep, derivado da pronúncia em inglês da sigla GP, que significa general purpose ou "uso geral". Na

zona rural, onde as condições de acesso eram dificeis em tempos passados, os jipes eram muito

utilizados.

Ximbica: forma pejorativa ou mesmo carinhosa de chamar o jipe.

Condução: carro; meio de transporte.

Cabeça de palha: palha de milho, retirada inteira da espiga.

Rondinha: Localidade do município de Paula Freitas.

Page 19: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

18

O TRABALHO DE BENZER

“Conforme a benzedura usa uma arrudi, outro ramo que seje. A benzedura de

rendidura não precisa de ramo nem coisa nenhuma e só a benza de passa a mão e

benza! As pessoas aí, tem sarado. Graças a Deus!”

(José Valdoir Euzébio de Brito no documentário “Benzeduras: a sagração do cotidiano”.)

Para realizar benzeções, as benzedeiras se utilizam de rituais aprendidos ao

longo do tempo ou que passaram a realizar por conta própria, quando ocorreu a

revelação do dom. Os rituais podem ser somente a partir de orações ou ainda com a

utilização de água, velas, cera, plantas medicinais, dentre outras.

Vejamos como são realizados os benzimentos por cada uma das benzedeiras

entrevistadas.

Dona Josefa Podgurski se utiliza da cera de abelhas, da palha de linhaça e dos

talos de couve.

A cera de abelhas é utilizada da seguinte forma: depois de aquecida em fogo, a

cera é derramada na água de uma vasilha que fica sobre a cabeça da pessoa a ser

benzida. Enquanto isso, dona Josefa faz uma oração em voz baixa. Esse procedimento é

utilizado para a retirada de susto ou nos casos – principalmente em crianças – de bichas.

A palha de linhaça utilizada é resultado do trabalho artesanal realizado pela

própria benzedeira. Em seu quintal ela cultiva o vegetal desde o plantio, na lua crescente

do mês de julho até a colheita em dezembro e demais tratamentos. Para a produção da

palha utilizada por ela nos benzimentos, há um processo de tratamento da linhaça

colhida. Primeiramente é deixada de molho em um tanque de lavar roupas durante o

período de nove dias. Neste tempo, a água do tanque é trocada várias vezes. Depois

disso, seca-se a linhaça ao sol, depois se maceta e está pronta para a utilização que

consiste em enrolar nove pedacinhos da palha sobre um paninho que ficará sobre a

cabeça ou sobre as pernas da pessoa benzida. Acende-se a palha e durante a queima ela

faz uma oração.

O talo de couve é utilizado para benzimentos de cobreiros*. Aí ela corta o

vegetal sobre a área infectada. Nesse processo se utiliza também de oração.

Dona Helena Cordeiro, sempre em seus benzimentos, reza um pai-nosso e nove

ave-marias. Para dor de dente em crianças, além da oração, utiliza uma folha de melissa

que depois serve para fazer o chazinho. Apesar de se utilizar mais de raminhos de

arruda nos benzimentos, dependendo o caso, usa hortelã – principalmente em crianças -,

Page 20: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

19

erva de santa maria e alecrim do campo que “tira o vício das pessoa.” Além dos

benzimentos em casa, dona Helena realizou vários batizados no poço de São João

Maria, no Morro da Cruz, “pra não dá tosse comprida.”

Dona Elvira, como dona Josefa, também se utiliza da cera de abelhas. Além

disso, tira medidas da criança que “falta medida”, benze “peito aberto”, rendiduras,

bronquite e faz simpatias para criança embruxada, além de benzer contra atrapalhos no

amor, nas finanças e profissionais.

GLOSSÁRIO

Linhaça: a semente do linho ou a fibra fornecida pelo caule do mesmo vegetal.

Bicha: nome popular de lombriga.

Cobreiro: forma popular para denominar algumas reações alérgicas da pele.

Rendidura: forma popular de chamar hérnia ou contusões musculares.

Embruxada: vítima de olho gordo.

ATIVIDADE

Agora que você conhece um pouco mais sobre a história oral e sobre as benzedeiras,

chegou a hora de sair para o trabalho de pesquisa. Siga as dicas da professora e bom

trabalho.

1) Faça um levantamento do número de benzedeiras que há em sua comunidade.

Depois escolha uma delas para realizar a atividade que segue:

Importante: se a benzedeira consentir, a partir do que você aprendeu sobre história oral,

grave com ela a entrevista em equipamento de áudio.

• Nome da benzedeira:________________________________________________

• O que benze:_______________________________________________________

• Como benze:_______________________________________________________

• Como aprendeu a benzer:_____________________________________________

• Desde quando benze:_________________________________________________

2) Durante o trabalho de campo, converse com a benzedeira sobre a possibilidade de

fotografar o local em que elas benzem, bem como o ato da benzeção. Depois disso,

organize na escola uma exposição fotográfica.

Page 21: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

20

PARA SABER MAIS UM POUQUINHO:

Livro;

SILVA, V.A.G. Benza Deus! Benzedeiras em Curitiba: modernidade e tradição:

histórias de vida. Curitiba: Edição do Autor, 2009.

Filmes;

A sagração do cotidiano: benzeduras. Direção Janete Kriger. Brasil: 2009. 17 min.

Benzeduras. Direção Adriana Rodrigues. Brasil: 2008. 72 min.

Page 22: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

21

QUEM VAI SE BENZER

Eu benzia mais mulher com criança, e as pessoa adulta procuravam quando tavam

atrapalhado assim nos negócio, nas coisa.

Helena Cordeiro

Dentro de cada momento da História, o trabalho das benzedeiras era procurado

para resolver as mais diversas situações, desde as que envolviam a baixa oferta de

serviços de saúde como as ligadas ao alívio de tormentos psicológicos ou busca de

sucesso de ordem amorosa, financeira, familiar, e outros.

A forte presença das benzedeiras na atualidade só pode ser explicada por um

viés: elas só existem por que tem alguém que as procura. Vejamos o que cada uma das

entrevistadas falou sobre as pessoas que benzem:

Dona Josefa:

Atende casos em que a medicina não resolve, e se as pessoas a procuram é porque tem

fé e acreditam que possa resolver os seus problemas.

Dona Helena:

(quem procurava) Era mais mulher com criança e as pessoa adulta também

procuravam, quando tavam atrapalhado assim, atrapalhados assim nos negócio, nas

coisa. Que nem tinha uma menina que já era noiva, fazia quase dez anos e não casava,

eles queriam fazer uma festa, uma festinha e não dava, sempre dava atrapaio, o noivo

era caminhonero também, daí tavam atrapaiado. Daí ela ofereceu uma nossa senhora,

aquela que tá ali com a capelinha na mesinha de lá. Ela prometeu que se eu

encaminhava ela pra casar, ela trazia, daí. Mas não demorou um tempo, já se

encaminhou, acho que nem um ano, casou. (...)

Dona Elvira disse que as pessoas a procuram para benzer quebrante, susto,

criança com cólica dos primeiros meses, bronquite, peito aberto, machucaduras e ainda

atrapalhos amorosos, financeiros e profissionais.

Situação comum às três benzedeiras é que pessoas de todas as camadas sociais

procuram seus benzimentos.

Gomes (2007) afirma que “o ser humano tem sede e busca incessantemente algo

que possa satisfazer suas necessidades e desejos. Quando a dor, o sofrimento e a

Page 23: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

22

angústia se instalam na vida, procuramos algo que possa recompor e reestruturar nossa

existência. Entretanto, a busca do bem estar físico, orgânico, por si, não possibilita a

integralidade e a felicidade que tanto buscamos”. Isso ajuda a compreender um pouco o

porquê das benzedeiras serem procuradas.

Page 24: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

23

ATIVIDADE

É necessário também pensar a atividade das benzedeiras a partir das pessoas que

as procuram. A partir desta afirmação é que realizaremos esta atividade de campo. Mais

uma vez você exercitará seus dotes de historiador/a!

• Converse com alguma pessoa que frequenta a benzedeira que você entrevistou na

outra atividade. Explique a ela por que você está realizando tal trabalho e

certifique-se de que ela quer participar da atividade. Se ela aceitar, mãos à obra!

Preencha os dados abaixo:

Gênero ( )Masculino ( )Feminino Idade: ___anos

Quantas vezes já veio se benzer aqui?

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

Por que motivos procura benzedeiras?

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

Já procurou outras benzedeiras ou só vem aqui?

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

Você vai ao médico também ou resolve seus problemas de saúde somente com

benzimentos?

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

______________________________________________________________________

PARA SABER MAIS UM POUQUINHO:

Livros;

GOMES, S.R.S. Saúde e salvação: o sagrado das rezadeiras em Paulista. Dissertação de Mestrado. Paulista: Universidade Católica de Pernambuco, 2007.

Page 25: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

24

REFERÊNCIAS

FONTES PRIMÁRIAS

CORDEIRO, Helena. Entrevista. União da Vitória, 04 de fevereiro de 2010.

PODGURSKI, Josefa. Entrevista. União da Vitória. 08 de Julho de 2010.

SILVA, Elvira Lima da. Entrevista. União da Vitória, 05 de janeiro de 2010.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

ALVES, P.; SCHALLENSBERGER, E.; BATISTA, A. A. A História regional – Desafios para o Ensino e a Aprendizagem. In.: Akrópolis, v.13,n°.1, jan/mar.,2005. Umuarama: UNIPAR, 2005. BEAUVOIR, S. de O segundo sexo: 1.fatos e mito. Rio de Janeiro: Nova fronteira, 1980. CAINELLI, M. Educação histórica: perspectiva de aprendizagem da história no ensino fundamental. IN: Educar em Revista. Curitiba: Editora UFPR, 2006. DELUMEAU, J. História do medo no ocidente1300-1800: uma cidade sitiada. São Paulo: Companhia das Letras, 2009. GASPARI, L.T. Imagens femininas nas “Gêmeas do Iguaçu” nos anos 40 e 50. União da Vitória: Kaygangue, 2005. GOMES, S.R.S. Saúde e salvação: o sagrado das rezadeiras em Paulista. Dissertação de Mestrado. Recife: Universidade Católica de Pernambuco, 2007. Disponível em http://www.br/tede//tde_busca/arquivo.php?codArquivo=142 Acessado em 25 de janeiro de 2009. JOUTARD, P. História oral. In:BURGUIÉRE, A.(Org) Dicionário das Ciências Históricas. Rio de Janeiro: Imago; 1993. KLAPISCH-ZUBER, C, Mulheres. In: BURGUIÉRI, (Org) Dicionário das Ciências Históricas. Rio de Janeiro: Imago; 1993. MEIHY, J. C. S. B. Manual de História Oral. 4.ed. São Paulo: Loyola; 2002. OLIVEIRA, E. R de. O que é benzeção. São Paulo;Brasiliense; 1985. PARANÁ. Secretaria de Estado da Educação. Departamento de Educação Básica. Diretrizes Curriculares da Educação Básica: história. Curitiba: SEED, 2009. PRINS, G. História Oral. In: BURKE,P. (Org.) A Escrita da História. Novas Perspectivas. São Paulo: UNESP; 1992. SILVA, V.A.G. Benza Deus! Benzedeiras em Curitiba: modernidade e tradição: histórias de vida. Curitiba: Edição do Autor, 2009. SOUZA, L. M. O Diabo e a Terra de Santa Cruz. São Paulo: Cia das Letras; 1986.

Page 26: DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE 2009 · conversar com nossas benzedeiras, colher delas os depoimentos, dar voz a elas, deixá-las que socializem tudo o que sabem, como iniciaram seu

25

THOMPSON, P. A Voz do Passado: história oral. Rio de janeiro: Paz e Terra; 1992. VAZ, V, As benzedeiras da cidade de Irati: suas experiências com o mundo, e o mundo da benzeção. Dissertação de mestrado. São Paulo: PUC, 2006. Disponível em: http//www.dominiopublico.gov.br/dowload/texto/cp007790.pdf acessado em 25 de janeiro de 2010.