da divisão do trabalho entre os sexos - daniele kergoat

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  • 7/24/2019 Da diviso do trabalho entre os sexos - Daniele Kergoat

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    Da diviso do trabalho entre os sexos1

    Daniele Kergoat (CNRS -Frana)

    O objetivo desse texto expor o mais claramente possvel a necessidade do conceito de

    "diviso sexual do trabalho" e sua funo heurstica. Organizaremos nossa exposio em tomo de

    trs uest!es bsicas#

    $. O ue entendemos por "diviso sexual do trabalho"% O ue recobre exatamente essa

    expresso%

    &. O esforo de problematizao em termos de diviso sexual do trabalho indispensvel%

    'o seria possvel utilizar com igual proveito outros enfoues j existentes%

    (. )ue perspectivas novas essa problemtica abre para a reflexo% )ue reconstruo da

    realidade social prop!e ao observador%

    1. O que a diviso sexual do trabalho?

    *or ue falar em diviso "sexual"%

    +omo ue se situa em relao , diviso social do trabalho%

    )ue os homens sejam prioritariamente designados para a produo e as mulheres para a

    reproduo -trabalho assalariadotrabalho domstico/0 ue as tarefas produtivas sejam reservadas

    ora aos homens0 ora ,s mulheres... isso to comum a todas as sociedades e to antigo ue

    esses dados apareceram de incio como "naturais" e "evidentes"0 a tal ponto ue nenhumanecessidade -objetiva ou subjetiva/ de tratar esses fen1menos se manifestou2 afinal de contas0 a

    sociologia no se interroga sobre o fato de ue o cu azul0 ue a terra gira ou ue so as fmeas

    ue0 no reino animal0 do , luz. +laro ue a famlia0 o trabalho... apareciam como campos

    sociol3gicos0 mas como campos fechados0 delimitados pelo destino natural da espcie# a

    sociologia da famlia0 aceitava como um dado -e portanto sem uestionar/ os papis masculinos e

    femininos2 aos homens0 a ida , guerra ou a responsabilidade pela subsistncia econ1mica da

    famlia0 ,s mulheres0 a atribuio do trabalho domstico...2 uanto , sociologia do trabalho0 ela

    raciocinava sobre um modelo geral de "produtor" ou de "trabalhador"0 modelo sempre masculino0

    1Este texto foi publicado emDiviso capitalista do trabalho. Tempo Social, publicao do departamento de

    Sociologia da USP, organizada por Helena Hirata. So Paulo, 1!"# $%&1'%, ! sem.1()(. Traduzido por Helena

    Hirata, re*isto por +agda e*es.

    1

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    tanto gramatical uanto conceitualmente. 4m suma0 esses dados no tinham -salvo em etnologia/

    o statusde fen1menos sociais.

    5oram necessrias as interpela!es do feminismo para ue essas certezas fossem

    abaladas. 6o longo desses anos0 os papis no assalariamento e na famlia apareceram como o

    ue so0 isto 0 no como o produto de em destino biol3gico0 mas como um " constructo social0"

    resultado de relaes sociais2 o trabalho tambm foi reuestionado0 atravs da recusa de limit7lo

    exclusivamente ao trabalho assalariado e profissional2 pouco a pouco prop1s7se uma definio

    cada vez mais ampla do trabalho0 levando7se em conta0 simultaneamente0 tanto o trabalho

    domstico uanto o trabalho assalariado.

    4m suma0 a diviso do trabalho entre os sexos se imp1s progressivamente como uma

    modalidade da diviso social do trabalho0 da mesma forma ue a diviso entre o trabalho manual e

    o trabalho intelectual ou a diviso internacional do trabalho.

    4ssa forma de diviso social vlida para todas as sociedades# historiadores e etn3logos

    mostraram0 demonstrando7o0 ue as modalidades dessa diviso variam muito no tempo e noespao0 a tal ponto ue tarefa especificamente masculina numa sociedade pode ser

    especificamente feminina em outra.

    8as no porue as modalidades se modificam0 ue as sociedades deixam de ser

    organizadas em tomo da diviso do trabalho entre os sexos e isso merece ser estudado. 6 diviso

    sexual no todavia a 9nica forma de diviso social do trabalho# ela articula7se0 interpenetra7se

    com outras formas de diviso social. 'o se trata portanto aui de pleitear a exclusividade de uma

    forma da diviso social0 mas argumentar no sentido de ue a sociologia retire as viseiras ue

    entravam o conhecimento -e perpetuam0 reproduzindo7as0 as rela!es de dominao/ para abordar

    um campo social certamente mais complexo mas ao mesmo tempo mais interessante0 maiscontradit3rio e portanto mais vivo e suscetvel de dar espao ao ator social.

    2. Diviso sexual do trabalho e noes alternativas

    6 diviso sexual do trabalho aparecia como "natural" e portanto no sociol3gica2 mas na

    realidade as atitudes0 os comportamentos0 as prticas sociais dos homens e das mulheres variam.

    4ssa diferena no pode ser sempre escamoteada# em particular no terreno do trabalho0 uer se

    trate de prticas em relao , organizao tcnica e social do trabalho ou dauelas em relao aossindicatos e , reivindicao0 tais diferenas colocam problemas porue tanto a organizao do

    trabalho uanto a organizao sindical devem0 num dado momento0 lev7las em considerao0 seja

    para utiliz7las da melhor maneira possvel0 seja para compreender certas resistncias.

    :a0 a uesto# no seria um esforo desnecessrio falar de diviso sexual do trabalho%

    !

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    'o poderamos utilizar0 com igual proveito0 as no!es j existentes# desigualdade0

    inferiorizao0 marginalizao0 superexplorao etc.% ;ejamos0 ento0 como essas no!es so

    utilizadas e o ue elas permitem explicar.

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    Bajuda7lasC no seu acesso ao trabalho por diversos arranjos# horrio0 licena0

    aposentadoria etc.

    4m suma0 nessa 3ptica seria suficiente#

    instru7las melhor para ue elas se paream com os homens2

    mas ajud7las para ue elas continuem mulheres.

    Eais solu!es so fadadas ao fracasso#

    mesmo uando so melhor instrudas0 elas permanecem -com idade e nvel de diploma

    euivalentes/ desempregadas por muito mais tempo ue os homens2 e uando obtm

    finalmente emprego0 uase sempre com uma ualificao inferior2

    mesmo uando obtm facilidades com o trabalho de meio7perodo0 percebe7se

    rapidamente ue o auxlio em uesto s3 as marginaliza mais -bloueio da promoo0

    por exemplo/ e remete7as rapidamente ao universo domstico -pela no7partilha do

    trabalho domstico ue provocada pela sua passagem a meio7perodo/(

    O fracasso dessas explica!es suscita uma primeira observao. :eve7se notar

    inicialmente ue esse tipo de explicao traz em si mesmo seu limite na medida em ue dicotomiza

    o ator social BmulheresC# de um lado a trabalhadora0 de outro a me7esposa. Ora0 as prticas

    sociais no so evidentemente dicotomizadas mas remetem , unidade dos indivduos. 6ssim0 no

    de se espantar ue as Bsolu!esC ue prop!em para ajudar as mulheres a deixar essa situao

    marginal em relao ao universo do trabalho sejam fadadas ao fracasso.

    4m suma0 a noo de inferiorizao preenche uma dupla funo# descrever uma situao0mas esvaziar o problema te3rico ue lhe subjacente.

    4ntretanto no basta mostrar ue uma explicao suficiente. F necessrio ressaltar em

    ue consiste a dificuldade0 sobre o ue a explicao deveria se debruar para dar conta do

    problema. *ara isso daremos um segundo exemplo0 o da diferenciao sexual no ue diz respeito

    ,s ualifica!es operrias. Observamos ue0 se os dados estatsticos se referem a uma sociedade

    particular0 a sociedade francesa0 os avanos da pesuisa comparativa internacional mostram ue a

    mesma demonstrao poderia ser efetuada paralelamente para todos os pases.

    Eodos os dados mostram ue0 para uma mesma classificao0 os postos de trabalho

    femininos so bastante distintos daueles ocupados pelos homens e ue0 ao mesmo tempo0 anatureza da penibilidade da tarefa e a carga de trabalho ue pesa sobre uns e outros variam

    sensivelmente segundo o sexo.

    %/anilele 0ergoat efetuou uma pesuisa sobre mul2eres ue trabal2am meio&per3odo no setor de ser*ios e

    na ind4stria oper5rias, *endedoras, assalariadas em escrit6rio e faxineiras". Um dos resultados dessa pesuisaindica ue o trabal2o dom7stico, partil2ado com o marido uando ambos so assalariados em tempo integral,

    *olta a ser realizado exclusi*amente pelas mul2eres uando elas trabal2am meio per3odo. -f.8e tra*ail 9

    temps patiel. 8a documentation ranaise, 1(): .daT."

    :

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    Tabela 1

    Operrios no ualificados -G/

    HHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH

    Iomens J 8ulheresJ

    & trabalham em linha de montagem....................................................A0A &K0L

    & tm um ritmo de trabalho imposto#

    pelo deslocamento automtico de um produto

    ou de uma pea......................................................................A0$ $K0L pela cadncia automtica de uma muina...................... .$M0N &L0A

    por normas de produo...................................................&A0( M&0K

    & tm uma remunerao ue depende do ritmo de trabalho................$N0$ &@0

    & repetem sempre uma mesma srie de gestos ou de

    opera!es ...................................................................................((0L KN0K

    HHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHHH

    -G/ *esuisa sobre as condi!es de trabalho0 do 8inistrio do Erabalho francs0 -realizada junto a $A.L assalariados0 em

    $@AN e reatualizada em $@NL.

    4ssa diviso sexual0 j ntida uando estudamos uma 9nica categoria0 a dos operrios no

    ualificados0 toma7se ainda mais clara uando comparamos simultaneamente sexos e categorias.

    F assim ue0 se retomarmos a pesuisa do 8inistrio do Erabalho0 examinando desta vez a

    categoria "operrios ualificados"0 veremos ue as denomina!es admitidas geralmente e

    generalizadas ao conjunto da mo de obra recobrem realidades bem diferentes segundo o sexo#

    $LJ das operrias ualificadas trabalham em linha de montagem0 uando apenas &0&J dos

    operrios ualificados -e A0AJ dos operrios no ualificados/ o fazem2 &KJ das operrias

    ualificadas tm um salrio ue depende do ritmo de trabalho -contra respectivamente $KJ para

    os operrios ualificados e $NJ para os no ualificados/2 MN0&J repetem sempre uma mesma

    srie de gestos e de opera!es -contra &0AJ para os operrios ualificados e ((0LJ para os no7

    ualificados/. ?sso significa ue uma operria ualificada tem duas vezes mais possibilidades de

    trabalhar em linha de montagem ue um operrio no ualificado e uma vez e meia mais

    possibilidades de ter uma remunerao dependente do ritmo de trabalho e de ter ue repetir

    ;

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    sempre a mesma srie de gestos ou de opera!es# a clivagem passa portanto entre homens e

    mulheres de classe operria! "em mais do que entre categorias pro#issionais!

    6ssim0 apenas sobre o plano da organizao tcnica 7 plano ue poderamos supor pouco

    dependente a priorida ideologia0 e mais facilmente objetivvel 7 aparece claramente ue a situao

    das operrias qualitativamentediferente dos operrios e no s3 uantitativamente0 porue as

    categorias s3cio7profissionais tradicionais -"os no ualificados"0 "operrios ualificados".../

    recobrem tipos de trabalho bem diferentes segundo se trate de homens ou de mulheres. F por isso

    ue dizemos ue o conceito de supere$plora%o em si s& ' insu#iciente para dar conta da condi%o

    operria #eminina.

    ;emos assim claramente ue as diferenas observadas no tratamento ue nossas

    sociedades reservam aos homens e ,s mulheres no campo do trabalho0 no tm a ver com um

    mais ou menos0 mas devem ser relacionadas0 no a modula!es0 mas a diferenas0 contradi!es

    entre os dois sexos0 a relaes sociais0 em suma.

    40 inversamente0 se admitirmos ue existe uma rela%o socialespecfica entre homens emulheres0 decorreria da ue h necessariamente prticas sociais di#erentes segundo o sexo

    -assim como o problema da ualificao0 ue veremos mais adiante/. 4 dado ue se trata de

    polticas sociais0 e no mais de condutas reguladas biologicamente0 pode7se encontrar um

    princpio de inteligibilidade. 6ssim0 o ue era ininteligvel para o soci3logo ou fora do campo de sua

    disciplina0 torna7se objeto de uestionamento.

    +oncluindo# no se pode raciocinar unicamente em termos de rela!es de classe -as

    mulheres seriam mais vulnerveis ue os homens na relao capitaltrabalho/ assim como no se

    pode raciocinar a partir de uma 9nica categoria de sexo -ser mulher acrescentaria ou subtrairia

    algo , situao tpico7ideal do "trabalhador"/.Os comportamentos humanos0 coletivos ou individuais0 s3 podem aduirir um sentido0

    referidos a um conunto de rela!es sociais0 pois este conjunto0 sua configurao e sua

    mouvanceue constituem a trama da sociedade. +hega7se assim a um outro ponto essencial da

    problemtica da diviso sexual do trabalho# a vontade de no pensar isoladamente0 de no

    imperializar uma relao social0 mas0 ao contrrio0 esforar7se para pensar conjuntamente em

    termos de complexidade e de co7extensividade as rela!es sociais fundamentais# de classe e de

    sexo.

    3. A diviso sexual do trabalho: u outro olhar sobre a realidade

    6ui0 a uesto a tratar a seguinte# com a problemtica da diviso sexual do trabalho0

    trata7se simplesmente de argumentar para exigir o reconhecimento das mulheres igualmente como

    atores sociais0 para trabalhar em seguida sobre a condio feminina...ou uma maneira de

    considerar a realidade -atravs de uma teoria e de mtodos/ ue permita ver de outra maneira

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    essa realidade0 de descobrir novas facetas0 de relacionar fen1menos ue classicamente

    permanecem isolados%

    4m suma0 ser ue tal problemtica permite organizar mais amplamente0 de forma mais

    coerente0 a explicao racional de nossas sociedades e de seu funcionamento% 4 se a resposta for

    positiva0 nos perguntaremos se0 na medida em ue essa problemtica permite uma renovao da

    anlise das prticas sociais e0 portanto0 das lutas0 ela poderia ter consePncias polticas%

    *ara ilustrar0 vamos retomar o exemplo da ualificaoformao das operrias0 ue ilustra

    o esforo de desconstruoreconstruo exigido por essa problemtica# se as operrias esto nos

    nveis mais baixos da escala de classifica!es0 seria primeiro0 porue so mal formadas pelo

    aparelho escolar e segundo porue elas se mobilizam pouco pelos problemas de ualificao. Eal

    o discurso dos economistas e dos soci3logos0 e esuerda e direita esto grosso modode acordo

    com ele.

    '3s nos insurgimos contra tais afirma!es e o ue delas decorre0 a saber#

    ue bastaria reformar o aparelho de formao0 de abrir por exemplo carreirasmasculinas para ue as mulheres tenham meios de aduirir uma formao superior0

    facilmente negocivel no mercado de trabalho2

    ue bastaria ue as mulheres fossem conscientes do eneu ue representa a

    ualificao na relao capitaltrabalho para ue lutem... e ganhem nesse domnio.

    6 esse raciocnio em termos de desigualdade e de voluntarismo -ou de conscientizao0 o

    ue d no mesmo/0 os trabalhos ue realizamos permitem opor a argumentao seguinte# em vez

    de dizer ue as mulheres operrias tm urna formao nula ou mal adaptada0 dizemos ao contrrio

    ue elas tm uma formao perfeitamente adaptada ao tipo de empregos industriais ue lhes sopropostos0 formao aduirida de incio por um aprendizado -a "profisso" de futuras mulheres

    uando eram meninas/ e em seguida por uma "formao contnua" -trabalhos domsticos/. 6s

    mulheres operrias no so operrias no7ualificadas ou ajudantes porue so mal7formadas

    pelo aparelho escolar0 mas porue so bem formadas pelo conjunto do trabalho reprodutivo.

    4sse fato tem duas consePncias#

    como esta ualificao das mulheres no aduirida pelos canais institucionais

    reconhecidos0 ela pode ser negada pelos empregadores2 notemos alis ue a

    ualificao masculina tambm eneu das rela!es sociais capitaltrabalho0 o

    patronato procurando sempre neg7la2 mas o ue especfico ,s mulheres0 ue o

    no7reconhecimento das ualidades ue se lhes exige -destreza0 min9cia0 rapidez etc./

    parece socialmente legtimo0 pois tais ualidades so consideradas inatas e no

    aduiridas0 como fatos de natureza e no de cultura2 .

    $

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    as pr3prias operrias interiorizam essa banalizao do seu trabalho2 como a0 auisio

    de seu savoir-#airese faz fora dos canais institucionais de ualificao0 sempre em

    referncia , esfera privada0 ele aparece como uma auisio individual e no coletiva.

    Qm raciocnio como este permite compreender melhor as prticas existentes0 mas tambm

    permite estruturar melhor o campo de foras nas uais elas se realizam e portanto as condi!es-te3ricas/ nas uais podem evoluir.

    F ue o problema da fomao7ualificao7classificao das mulheres no se desenvolve

    num terreno neutro0 onde todo mundo teria a maior boa vontade de se debruar sobre o Bcaso"

    desse grupo minorizado das mulheres. Rem ao contrrio0 os homens apropriam7se das carreiras

    rentveis do aparelho de formao0 e isso se acelera com a crise2 no se trata aui de uma

    afirmao gratuita# conhecem7se as dificuldades de acesso ,s carreiras masculinas e as

    dificuldades0 ou uase7impossibilidade0 em fazer valer seu diploma uando se mulher0 com

    diploma dito masculino0 perante um patro homem. 6lm disso0 sabe7se ue os homens so mais

    combativos no ue diz respeito , sua pr3pria ualificao e classificao. ?sso no se deve0 anosso ver0 ao fato de ue tenham mais conscincia do eneu da ualificao na relao

    capitaltrabalho2 eles no so mais sensveis por natureza a essa uesto da mesma maneira ue

    no nasceram mais combativos ue as mulheres2 entretanto0 para eles0 serem reconhecidos como

    "ualificados" tem um significado bem diferente do ue para as mulheres.

    ;7se aui como a comparao homensmulheres colocada sob a perspectiva das

    rela!es sociais0 atravs da problemtica da diviso sexual do trabalho0 permite abordar os dois

    lados da uesto# como o sistema social e sua evoluo determinam o lugar das operrias na

    escala das ualifica!es0 e como*orue as operrias interiorizam este lugar2 mas tambm0 como

    as operrias podem transformar este sistema e onde0 em ue pontos precisos0 comearam a faz7lo.

    +oncluindo0 resumiremos o ue dissemos pondo em evidncia os trs pontos centrais0 em

    tomo dos uais se estrutura a problemtica da diviso sexual do trabalho#

    a diviso do trabalho entre os homens e as mulheres faz parte integrante da diviso

    social do trabalho. :e um ponto de vista hist3rico0 a estruturao atual da diviso sexual

    do trabalho -trabalho assalariadotrabalho domstico2 fbrica0 escrit3riofamlia/

    apareceu simultaneamente com o capitalismo0 a relao salarial s3 podendo surgir com

    a apario do trabalho domstico -deve7se notar de passagem ue esta noo de

    "trabalho domsticoC0 no nem a7hist3rica nem trans7hist3rica2 ao contrrio0 sua

    gnese datada historicamente/. :o nascimento do capitalismo ao perodo atual0 as

    modalidades desta diviso do trabalho entre os sexos0 tanto no assalariamento uanto

    no trabalho domstico0 evoluem no tempo de maneira concomitante ,s rela!es de

    produo2

    )

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    a diviso do trabalho um termo genrico ue remete a toda uma srie de rela!es

    sociais -como por exemplo a diviso internacional do trabalho0 a diviso entre o trabalho

    manual e intelectual.../. 6 diviso do trabalho entre os sexos remete , relao social

    entre homens e mulheres0 ue atravessa e atravessada pelas outras modalidades da

    diviso social do trabalho. Eentamos demonstrar0 no ue diz respeito a essa imbricaoentre diferentes rela!es sociais0 ue rela!es de classe e rela!es de sexo no eram

    hieraruizveis0 mas co7extensivas2 em outras palavras0 trata7se de conceitos ue se

    recobrem parcialmente e no de conceitos ue "se recortam" ou "se articulam"2

    a diviso sexual do trabalho0 se ela tem sua raiz na designao prioritria das mulheres

    ao trabalho domstico0 no pode de forma alguma ser considerada operat3ria

    unicamente no ue diz respeito ,s mulheres0 ao trabalho domstico0 , esfera do privado

    ou , da reproduo. Rem ao contrrio0 trata7se de uma problemtica -e no da abertura

    de um novo campo regional/ e de uma problemtica ue atravessa e d sentido ao

    conjunto de rela!es sociais ue recobre o termo de diviso social do trabalho2 da anecessidade de desconstruoreconstruo da maior parte dos conceitos utilizados em

    sociologia. 4sse trabalho s3 pode ser0 ali0 pluridisciplinar e transversal em relao ,s

    compartimenta!es do tipo sociologia do trabalhosociologia da famlia.

    O exemplo do conceito de "trabalho" sem d9vida o mais expressivo# as disjun!es

    clssicas entre trabalhono trabalho0 trabalho assalariadotrabalho domstico... foram recusadas

    como sendo o reflexo da ideologia dominante e esforamo7nos por reestabelecer as rela!es entre

    o ue tinha sido separado0 at ento0 atravs de uma definio mais extensiva de trabalho -o

    conceito de trabalho recobrindo tanto o trabalho assalariado uanto o trabalho domstico/ e

    afastando7o do =mbito exclusivo das rela!es mercantis. 6 partir da0 o trabalho domstico e asparticularidades do trabalho assalariado das mulheres no so mais "exce!es" em relao a um

    modelo ue se sup!e ser geral0 mas tal problemtica pressup!e uma tentativa de reconstruir um

    modelo geraldo ual essas mesmas especificidades seriam elementos constitutivos.

    'este sentido0 a problemtica da diviso sexual do trabalho se inscreve na grande tradio

    da sociologia ue precisamente de ir alm das aparncias0 alm do senso comum0 para mostrar

    ue o ue percebido como "natural" por uma sociedade0 o unicamente porue a codificao

    social to forte0 to interiorizada pelos atores ue ela se toma invisvel# o cultural torna7se a

    evidncia0 o cultural se transmuta em natural.

    -Eraduo de Ielena Iirata0 revista por 8agda 'eves/

    Iirata0 Ielena0 org. :iviso capitalista do trabalho. Eempo