criticas a homeopatia

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Hospital Universitário da USP Críticas à Homeopatia CARLOS EDUARDO MARCELLO Divisão de Clínica Médica do HU

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Argumentos contra a homeopatia

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Hospital Universitário da USP

Críticas à Homeopatia

CARLOS EDUARDO MARCELLODivisão de Clínica Médica do HU

Hospital Universitário da USP

O que é “ser médico"À introdução da 14a edição (1998) do clássico “Harrison’s Principle of

Internal Medicine” preconizado por todas as escolas médicas do Ocidente (chamadas alopáticas pelos homeopatas), lê-se à primeira página uma recomendação escrita desde a 1a edição em 1958:

“Tato, simpatia e compreensão são qualidades esperadas do médico, desde que o paciente não é uma mera coleção de sintomas, sinais, funções desarranjadas e emoções perturbadas. O paciente é um ser humano com medos e esperanças, procurando alívio, ajuda e conforto. Para o médico, assim como para o antropólogo, nada no homem é estranho ou repulsivo. O misantropo pode se tornar um astuto diagnosticador das doenças orgânicas, mas dificilmente poderá ter sucesso como médico. O verdadeiro médico tem um sopro Shakespeariano de interesse pelas notáveis inteligências e pelos néscios ignorantes, pelos orgulhosos e os humildes, pelos heróis estóicos e pelos patifes lamurientos. O médico cuida de gente.” - não são argumentos exclusivos da Homeopatia; são conceitos ensinados desde os primeiros momentos nas faculdades de medicina tradicionais.

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Princípios da Homeopatia

• Lei dos Semelhantes (similia similibus curantur). Por ex. se uma substância for capaz de provocar angústia existencial, diarréia e febre em uma pessoa sadia, essa substância curará uma pessoa cuja doença natural apresente essas características.

• Doses infinitesimais (dinamização = diluição + sucussão). A técnica “desperta” as propriedades latentes da substância.

• Medicamento único.

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Lei dos Semelhantes• O livro “Organon”, obra fundamental do glorificado (pelos

homeopatas) Hahnemann, foi publicado em 1810. Contém a “doutrina” a ser seguida. Baseado em “experimentos” em familiares e alunos de Hahnemann, sem qualquer rigor metodológico.

• A lei dos semelhantes é um postulado que nunca foi demonstrado. É dela que nasce toda a Homeopatia.

• Em 1789 a medicina dita “oficial” não conhecia as causas celulares das doenças e acreditava tratar das moléstias usando sangrias, sanguessugas, laxantes, cirurgias sem anestesia e cauterizações com ferro em brasa. Dessa barbárie “oficial/alopática” nasceu um contrapoder: a Homeopatia.

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Princípios da Homeopatia: Doses infinitesimais

• A dinamização ocasiona o que se chama “memória da água”: as moléculas de água guardariam por lembrança a substância que esteve em contato com ela.

• A preparação 30C equivale a 1g da substância diluídos em 1 x 1030 g de água. Numa concentração dessas, os químicos nos dizem que há 1 molécula da substância em 30m3 da solução.

• O remédio comum para gripe, da homeopatia, por exemplo, é produzido a partir de fígado de pato, geralmente em uma preparação de 200C. Qual, das inúmeras moléculas presentes em tal preparação, causa a memória na água?

• A água que usamos certamente já esteve em contato com rejeitos químicos, urina, metais radioativos, urina de dinossauros, venenos – milhões de substâncias. Porque ela somente se lembraria das substâncias que os homeopatas alegam ser úteis?

• Químicos e físicos atestam que nas preparações além de 32C há somente água destilada e nenhuma “energia” ou “força” conhecidas.

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Evidências científicas• Nos últimos 30 anos menos de 200 estudos originais ou meta-análises

com algum padrão científico foram realizados comparando a homeopatia com o placebo. É inconclusivoÉ inconclusivo se a homeopatia pode ou não ter um efeito discretodiscreto em doenças levesleves. Pode ser que tenha.

• Estudo notório comparou 110 estudos homeopáticos com 110 estudos alopáticos. O efeito* do tratamento homeopático apresentou uma eficácia sempre equivalente à do placebo, diferentemente dos tratamentos alopáticos, estatisticamente mais eficazes que o placebo. (Lancet, 366(726-732))

• Dizer homeopático: “Homeopatia e alopatia não compartilham unidades, instrumentos, paradigmas, nem epistemologia. Os estudos que se apresentam tentam "desmascarar" a homeopatia com métodos aceitos e adaptados à alopatia. São esses, é certo, métodos hegemônicos nos dias atuais. Métodos cartesiano-positivistas adotados largamente pela intelligentzia científica mundial. Nem por isso (pelo fato de ser hegemônico), os outros pensares e paradigmas são "errados“ “ (sic).

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Doenças tratadas pela homeopatia• Alergias, moléstias de pele, infecções leves, doenças

respiratórias, artropatias, “idiopáticas”, enxaqueca, estados de humor – estas são as doenças abordadas *de fato*, apesar de haver alegação de que podem tratar qualquer doença.

• A homeopatia não classifica ou nomeia doenças. Não há, na homeopatia, algo como a CID (Classificação Internacional de Doenças), o que dificulta imaginar o que ela trata ou cura (tudo?). Alega que depende muito do poder da reação do paciente ao medicamento.

• Anatomia, fisiologia, fisiopatologia, exame físico parecem ser conhecimentos relativamente supérfluos na prática homeopática, desde que o importante é que se encontre uma substância que se encaixe com os sintomas e estado de espírito do doente.

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Doenças tratadas pela homeopatiaQuantas pessoas foram salvas ou substancialmente melhoradas

pela homeopatia a partir das seguintes doenças:

• Obesidade• Diabetes• Sífilis• Tuberculose• Meningite• Endocardite infecciosa• Insuficiência cardíaca• AIDS• Leucemias em crianças• Linfomas

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Situações não consideradas pela homeopatia

• Hipertensão arterial• Dislipidemias• Hiperglicemia assintomática• Vacinação das populações (erradicação

da varíola, desaparecimento do sarampo)

(Para a homeopatia estes problemas, por serem assintomáticos, não precisam ser tratados. O que dizer de alguém com pressão arterial de 180x130mmHg? De alguém com colesterol=400mg/dL? De portadores de glicemia=170mg/dL?)

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Curiosidades da Homeopatia• Não evolui nem revê suas bases de conhecimento. O Organon

de 1810 bastará para o todo sempre. Nestes 200 anos adição de 2-5% da base de Hanehman.

• Alegação dos adeptos: “A homeopatia existe há mais de 200 anos e cada vez se torna mais popular.” Pois a Astrologia existe desde a Idade Média e todo mundo sabe que terá mais sorte em prever um eclipse do sol se perguntar a um astrônomo e não a um astrólogo. O Programa do Ratinho é muito popular. Antigüidade e perenidade nunca foram sinônimos de verdade.

• Alegação homeopática: “O preconceito contra a homeopatia provém de um conluio, uma grande conspiração do complexo médico-industrial-midiático, pois tem o receio de que se possa diminuir seu poder e lucros.”

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Curiosidades da Homeopatia• Contradição homeopática: Finge não promover

sistematicamente uma imensa estrutura com fins comerciais, como consultas caras e não cobertas por seguros médicos consultas caras e não cobertas por seguros médicos (ou cobertas por preços “diferenciados” ...)(ou cobertas por preços “diferenciados” ...) e redes de fabricantes e de farmácias especializadas que vendem água destilada a preços abusivos.

• Os homeopatas se beneficiam do fato de que uma parte substancial das pessoas que usam a homeopatia desconhece os seus preceitos. E pouco interesse têm em instrui-las. As pessoas acreditam estar usando alguma espécie de extratos vegetais “naturais” que contém princípios químicos promotores de cura, assim como sabemos que o chá de camomila é digestivo e o de erva-cidreira é ansiolítico. A maioria fica surpresa quando lhe é desvendada a verdadeira natureza da homeopatia.

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Conclusão sobre a Homeopatia• Há um ditado da língua inglesa que serve como uma

luva para a Homeopatia: “Extraordinary claims require extraordinary proofs and the burden of proof is on the claimant” – A homeopatia faz alegações extraordinárias e deveria nos mostrar extraordinárias e irrefutáveis provas de suas alegações. Não é o que acontece.

• A questão sobre a homeopatia nunca se encerrará porque os homeopatas não usam os argumentos racionais embasados no método científico, que é a atmosfera que, desde cedo, a imensa maioria de nós aprendeu a respirar no mundo ocidental. Para os homeopatas a questão é a de que têm fé no seu método. Fé não se discute.

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Opção• Porque optar pela pseudociência se se pode escolher a

ciência? A ciência está longe de ser um instrumento perfeito de conhecimento. É apenas o melhor que temos. A ciência tem um mecanismo de correção de erros embutido em seu próprio âmago. Quando interpretamos com falta de método os fatos e nossas esperanças, escorregamos para a pseudociência e para a superstição.

• Os homens ansiamos pela certeza. Estaremos sempre atolados no erro. Em cada geração haverá uma redução das margens desses erros e será ampliado o corpo de dados a que elas se aplicam.

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Opção• O método científico é uma profissão de humildade. É

o reconhecer que como homens, somos estúpidos, equivocados, podemos facilmente ser ludibriados por aparências.

• Daí a necessidade do uso de controles e de se cegar resultados. Não se deve aceitar os argumentos de autoridade ou de livros de doutrina. As autoridades devem provar suas afirmações como todo mundo.

• A Homeopatia despreza o método científico. Ela acredita que “já chegou lá”. “Já está ao lado da verdade.” E sobrevive a partir de relatos de casos sujeitos a todo tipo possível de viéses.

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Armadilhas da ausência de método

TEMPO

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A Evolução das doenças, apesar de poder ser estudada na média, é importantemente errática no paciente individual

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Armadilhas da ausência de método

Pacientes com qualquer tipo de doença têm uma mediana de comportamento, mas há os extremos

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Conseqüências para a Medicina • A existência e o “sucesso” da homeopatia e das medicinas

alternativas nos casos anedóticos e isolados, contados no dia a dia, mas sem nenhuma preocupação de precisão ou compilação metódica dos dados, deveriam ser motivo de profunda reflexão.

• A real crise na medicina nos dias de hoje não se deve aos princípios científicos – ela tem relação com a perda da relação fundamental entre médico e paciente. Essa perda de confiança tem relação com o fato de a medicina alopática ter se tornado “a oficial”, “a das massas”. É preciso que lembremos da noção clássica freqüentemente esquecida na medicina moderna: cuidar de doentes é uma arte. A ciência é um grande recurso, mas a medicina não se restringe a ela.

• A arte de curar não significa abandonar os avanços espetaculares da ciência moderna, mas sim incorporá-los em uma prática médica sensível e humanitária.

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Conclusões• O autor desta apresentação foi incumbido de ser o

advogado do diabo da Homeopatia. A apresentação teve essa finalidade.

• Pessoalmente, o autor não advoga o uso da Homeopatia.

• Entretanto, usando argumentação anterior, é forçoso reconhecer que como homens, somos estúpidos, equivocados, facilmente ludibriados por aparências e o método científico não necessariamente é a melhor ou única resposta. Pode haver outras respostas. Mas estamos longes das certezas da Homeopatia.

Obrigado!CARLOS EDUARDO MARCELLODivisão de Clínica Médica do [email protected]