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Incubar para Competir? Ou para que? José Adeodato de Souza Neto e Sérgio Baptista Zaccarelli * . XXIII Simpósio de Gestão da Inovação Tecnológica – 19 a 22 de outubro de 2004 – Curitiba, Paraná, Brasil Introdução Em todo o mundo, as micro, pequenas e médias empresas - MPMEs ++ + + têm recebido atenção especial dos governos pelo valor que representam para a sociedade, particularmente na geração de ocupação, emprego e renda distribuída. Mesmo em economias desenvolvidas e liberais, diversas políticas públicas são usualmente dirigidas para tirar o melhor proveito da externalidade característica dos pequenos negócios. O relatório da SBA + (SBA - Fiscal Year 2000 Annual Performance Plan) valoriza e enfatiza, entre outros aspectos, a capacidade de geração de emprego da MPMEs. Entre 1990 e 1995, os dados disponíveis indicam que 76,5 % dos novos empregos tiveram origem nas empresas com até 500 empregados e 49% desses empregos foram gerados por firmas com menos de 20 empregados. Novos negócios foram responsáveis por um terço desse crescimento, o que justifica uma série de políticas direcionadas às MPMEs. No Brasil, em 2000, existiam 4.082.122 MPMEs formais representando 99% do total de empresas formais (SEBRAE, 2004 (1)) que respondiam por 44,70% dos empregos (13.610.157), sem incluir as atividades informais que representavam a ocupação de outros 12.870.420 pessoas (SEBRAE, 2004 (2)). Esse quadro não é estático e evolui de ano a ano. A taxa média anual de natalidade é estimada em 19,4% e a taxa média anual de * Professores do Programa de Mestrado em Administração da UNICID ++++ MPME – Micro, Pequenas e Médias Empresas. ++ Small Business Administration. USA 1

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Page 1: Critérios de seleção de propjetos para incubadoras

Incubar para Competir? Ou para que?

José Adeodato de Souza Neto eSérgio Baptista Zaccarelli*.

XXIII Simpósio de Gestão da Inovação Tecnológica – 19 a 22 de outubro de 2004 – Curitiba, Paraná, Brasil

Introdução

Em todo o mundo, as micro, pequenas e médias empresas - MPMEs++++ têm recebido atenção especial dos governos pelo valor que representam para a sociedade, particularmente na geração de ocupação, emprego e renda distribuída. Mesmo em economias desenvolvidas e liberais, diversas políticas públicas são usualmente dirigidas para tirar o melhor proveito da externalidade característica dos pequenos negócios.

O relatório da SBA+ (SBA - Fiscal Year 2000 Annual Performance Plan) valoriza e enfatiza, entre outros aspectos, a capacidade de geração de emprego da MPMEs. Entre 1990 e 1995, os dados disponíveis indicam que 76,5 % dos novos empregos tiveram origem nas empresas com até 500 empregados e 49% desses empregos foram gerados por firmas com menos de 20 empregados. Novos negócios foram responsáveis por um terço desse crescimento, o que justifica uma série de políticas direcionadas às MPMEs.

No Brasil, em 2000, existiam 4.082.122 MPMEs formais representando 99% do total de empresas formais (SEBRAE, 2004 (1)) que respondiam por 44,70% dos empregos (13.610.157), sem incluir as atividades informais que representavam a ocupação de outros 12.870.420 pessoas (SEBRAE, 2004 (2)). Esse quadro não é estático e evolui de ano a ano. A taxa média anual de natalidade é estimada em 19,4% e a taxa média anual de mortalidade situa-se por volta de 12,9%. Em outras palavras, em termos absolutos, isto significa que, em média, 682.817 novas empresas foram abertas e 453.465 empresas foram extintas por ano, no período de 1997 a 2000. Ou seja, a cada 10 novas empresas criadas, outras 6,45 são fechadas (IBGE, 2002). Os dados indicam que, quanto menor a empresa maior a taxa de natalidade e mortalidade. Cerca de 93% das empresas criadas a cada ano empregam menos de 4 pessoas. “Em 2000, do total de 710.258 novas empresas criadas, 659.364 estavam nesta faixa”. Das 457.990 empresas fechadas, 426.856 estavam nesta categoria. Pesquisa realizada pelo SEBRAE (1999) em diversas unidades da Federação dá conta da taxa de mortalidade, de 30% a 61%, no primeiro ano de vida, de 40% a 68%, até o segundo ano e de 55% a 73%, até o terceiro ano. As razões apontadas para essa elevada mortalidade foram, em primeiro lugar, a falta de capital de giro, tanto pelas empresas que estão em atividade como por aquelas que fecharam as suas portas. Também a carga tributária e a recessão econômica foram citadas como outros fatores inibidores dos negócios.

É interessante observar que nenhum desses fatores diz respeito ao ambiente competitivo dos negócios, que foi a real razão de fechamento das empresas menos competitivas. As

* Professores do Programa de Mestrado em Administração da UNICID

++++ MPME – Micro, Pequenas e Médias Empresas.

++ Small Business Administration. USA

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dificuldades apontadas são comuns a todas as empresas e poderiam ter sido avaliadas antes de se iniciar a atividade. É muito mais razoável dizer-se que essas são as principais conseqüências da deficiência de uma análise da “estrutura industrial” e da “qualidade do negócio em si” recomendada por M. Porter (1986), há 20 anos. Vale enfatizar que, se as novas empresas não se diferenciarem daquelas existentes, buscando alguma vantagem competitiva, a história de insucesso será repetida, ou estarão equivocados os autores que tratam de competitividade.

Nas páginas do SEBRAE na internet, lê-se que “estatísticas de incubadoras americanas e européias indicam que a taxa de mortalidade entre empresas que passam pelo processo de incubação é reduzida a 20%, contra 70% detectado entre empresas nascidas fora do ambiente de incubadora”. Há indicações de que provavelmente o mesmo fenômeno deve estar se passando no Brasil.

Em grande parte, a competitividade de uma nação depende da introdução de inovações tecnológicas, cujo vetor mais importante são as pequenas empresas. Os novos produtos, processos ou serviços são, em primeiro lugar, avaliados no mercado, em escalas reduzidas e aqueles de melhor aceitação possibilitam o crescimento dos novos negócios. É preciso não considerar somente os negócios ao consumidor. Novas tecnologias são incorporadas na forma de insumos, componentes ou serviços industriais pelas grandes empresas, que têm pequenas empresas inovadoras como fornecedoras, e assim passam a aumentar sua capacidade competitiva e promovem a difusão tecnológica para outros fornecedores.

Conforme dados da ANPROTEC*, existem hoje no Brasil 207 incubadoras de empresas, muitas das quais “de base tecnológica”, cujo principal papel é promover desenvolvimento regional e tecnológico, gerando empregos e renda, especialmente aqueles de mão-de-obra qualificada.

A presente pesquisa teve a propósito de examinar e discutir alguns aspectos das políticas de gestão das incubadoras, com particular atenção nos fatores de seleção e admissão de novos projetos para incubação. O principal interesse foi examinar a compatibilidade desses fatores de seleção com uma análise adequada dos fatores de competitividade dos investimentos propostos para incubação.

Competitividade: teoria e prática:

Conceitos e definições - O propósito desta secção é discutir a competitividade de um novo projeto e suas causas, já que, em última instância, as incubadoras têm como principal objetivo dar oportunidades de experimentar em nível pré-comercial idéias boas que possam resultar em empresas competitivas e disseminadoras de progresso. Uma das expectativas é aumentar a probabilidade de sucesso e reduzir a mortalidade das empresas, através da seleção e apoio a novos negócios. A incubadora oferece um conjunto de facilidades e exige características indicadoras do potencial competitivo do projeto.

Sem compreender bem as causas da competitividade, não saberemos apreciar algumas das principais opções do planejamento de incubadoras ou dos fatores de seleção de projetos para incubação. Como uma opção de orientação prática e tendo a preocupação de conservar a

** ANPROTEC – Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos de Tecnologia Avançada.

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simplicidade da discussão, decidiu-se recorrer a metáforas nas discussões, principalmente porque essa forma de comunicação parece explicar de maneira mais precisa a essência dos conceitos.

O Valor da Diferenciação - Quanto vale um copo dágua no deserto? Vale mais do que ouro, certamente. Ouro, em geral, e água no deserto têm o seu valor decorrente da raridade, embora cada um desempenhe uma função específica. Quanto vale um copo dágua próximo ao Rio São Francisco? Certamente vale muito pouco, ou talvez não tenha valor algum, embora possa cumprir a mesma função. Quanto vale um copo dágua no deserto se está para chegar um carro pipa cheio dágua? Seguramente, essa informação vai depreciá-lo e o seu valor será inversamente proporcional à sua vulgaridade. Diz a sabedoria popular “tudo que raro é caro” e a ciência econômica apresenta a Lei da Oferta e da Procura.

Ainda insistindo nas metáforas, queremos discutir – “Em terra de cego, quem tem um olho é rei”. Em outras palavras, se todos tiverem dois olhos, aquele que tem um olho está prejudicado. E aquele que somente tem um olho em terra de cego será tão diferenciado dos demais que terá o poder absoluto. Essas frases são como leis universais incorporadas à sabedoria popular. O seu sentido é de que não é tão importante ter-se dois ou quatro olhos, ou dispor de um carro pipa cheio dágua. O valor está intrinsecamente associado à vantagem que se tem em relação aos outros, em um determinado ambiente.

Aplicando esse conceito ao tema da competitividade empresarial, o que importa não é o “conteúdo tecnológico” que o produto, serviço ou processo apresenta. O que traz valor e capacidade competitiva é ter-se um produto, processo ou serviço que os outros não têm; que seja diferente dos outros - diferença tecnológica ou não. A vantagem pode estar associada a um produto que tem um desempenho pior, porém que possa ser vendido a um preço baixo.

No deserto, onde não existe água, o copo dágua é uma inovação radical, é único, é monopolista... Ao chegar o carro pipa, o seu grau de diferenciação diminui porque já há similares e o seu valor decresce. A Tabela 1 mostra cinco graus distintos de diferenciação de uma inovação e o seu nível de proteção, baseado em patentes ou diferenciação do conhecimento científico e da pesquisa.

Tabela 1 - Graus de diferenciação de uma inovação (Abetti, 1988)

Grau deDiferenci

açãoDescrição da Diferenciação

1 Pequena melhoria de produto existente, com aplicação de tecnologia corrente, produto comum, sem patente e sem P&D.

2 Ampliação significativa das características do produto mediante adaptações originais da tecnologia disponível, produto com variações comuns, limitada proteção de patente, pouca P&D

3 Produto novo c/ propriedade da tecnologia, podendo entretanto ser reproduzido por outros, misto de características especiais e comuns, médio esforço de P&D

4 Produto novo c/ propriedade da tecnologia, no nível do estado da arte, produto especializado de múltiplos usos, investimento significativo em P&D

5 Produto ou sistema único e original que torna obsoletos os existentes, baseado em

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tecnologia de propriedade, além do estado da arte, altamente especializada, elevada em elevado investimento em P&D

Observe que a tabela acima mistura dois conceitos – um de diferenciação e outro de proteção, que será o próximo tema a ser discutido. Assim sendo, o “conteúdo tecnológico” não parece ser um indicador adequado para avaliar a vantagem competitiva de um projeto. Este tema será discutido mais adiante.

Proteção da inovação - Não adianta inovar ou diferenciar o produto, processo ou serviço se não houver proteção dessa inovação, já que a cópia ou imitação diminuirá a vantagem – é como a chegada do carro pipa no deserto. A forma de proteção legal do monopólio de exploração da invenção é a patente (Lei da Propriedade Industrial, 1996), que não é uma proteção técnica ou científica – aplica-se à invenção de qualquer natureza que sugira o uso econômico e industrial. Entretanto, a patente somente protege a invenção e estende, por conseqüência, essa proteção às inovações que se originaram da invenção. Há muitas inovações que não têm origem em invenções, porém em descobertas ou simples desenvolvimentos de idéias não patenteadas. Nesses casos é preciso obter outras formas de proteção.

O segredo industrial é usado para proteger da cópia algumas inovações não patenteadas, porém, com a facilidade de informação, característica da nossa era, é quase impossível manter-se um segredo industrial por muito tempo. O recurso mais usado e mais falado é a chamada “core competence”, ou seja, é o conhecimento diferenciado sobre determinados temas. Assim os detentores de conhecimentos técnicos, científicos e outros que se diferenciam dos concorrentes e se renovam permanentemente (competência essencial ou “core competence”) são capazes de transformá-los em vantagens competitivas (diferenciações) e sustentá-las por algum tempo.

O importante não é o conhecimento em si, porém a diferenciação desse conhecimento, em relação aos concorrentes e a capacidade de renová-lo com maior velocidade do que os concorrentes. A possibilidade de proteção, contra cópia ou imitação da inovação que confere a vantagem competitiva deve ser um critério fundamental de seleção de um projeto para incubação ou aplicação de capital de risco. Contrariamente, se a idéia básica de um projeto é fácil de reproduzir ou copiar, a sua capacidade competitiva fica diminuída.

Vantagem da Base Científica - Finalmente, qual a vantagem de se ter uma base de conhecimentos científicos? Será que a ciência é criativa? Ou será que o cientista inventa as coisas? O leigo confunde o cientista com o inventor. É preciso criar um esclarecimento sobre esse ponto. A pior crítica que se pode fazer a um cientista (enquanto cientista) é dizer que ele inventou um determinado conhecimento.

O primeiro papel a ser desempenhado pelo cientista ou pela ciência é descobrir a verdade do universo, de uma invenção, de uma descoberta, de uma idéia ou de um produto que se quer desenvolver ou introduzir no mercado. O cientista é educado para desempenhar esse papel - seja pesquisa de mercado, atitude do consumidor, melhor método de fabricação, especificações do produto, coerência das idéias do inventor etc. O segundo papel, diz respeito à engenharia e ao desenvolvimento. Em se tratando de um produto, processo ou serviço novo, os conhecimentos de engenharia não estão disponíveis aos outros profissionais, particularmente aos engenheiros, consultores ou projetistas. Tome o exemplo simples de um novo material para estrutura de edificações. Não sendo conhecido o comportamento do novo

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material, o engenheiro comum, o mestre de obras, o arquiteto e outros profissionais não poderão usar suas técnicas enquanto outras informações não forem geradas. Somente o conhecimento da ciência, dos fundamentos e a habilidade da experimentação poderão “engenheirar” a inovação (uma estrutura, no caso), conferindo exclusividade ou diferenciação ao detentor do novo material. O terceiro papel da ciência ou do cientista é usar o conhecimento diferenciado para “proteger” a inovação, dificultando a cópia ou imitação de quem não tem aquele conhecimento (a proteção é dada pela assimetria de conhecimento ou informação). Para isso, o conhecimento tem de ser diferenciado, ou seja, o “nosso” cientista tem que ser melhor do que o cientista dos “outros”.

Em resumo, um dos fundamentos das incubadoras é criar um ambiente onde, pelo menos, as condições de competitividade acima estejam presentes, isto é:

Ambiente propício à inovação ou diferenciação;

Ambiente propício à proteção das idéias, invenções e inovações;

Ambiente propício ao estabelecimento de alianças parcerias com outros atores do negócio, particularmente com fornecedores, clientes, empreendedores e financiadores;

Ambiente de elevada capacitação técnica, científica e de experimentação.

As incubadoras de base tecnológica foram criadas para combinar e conciliar os interesses de pesquisadores, instituições de pesquisa, empresas e governo (WIPO, 2003). A cooperação entre essas partes é fundamental para o aproveitamento otimizado da competência de cada ator. Nesse sentido, as incubadoras de base tecnológica oferecem (WIPO, 2003):

treinamento de empreendedores em aspectos técnicos e gerenciais;

estímulo e reforço a competências e habilidades de empreendedorismo nos indivíduos e em grupos;

busca de inovações de processos e produtos, particularmente para micro e pequena empresas;

identificação e negociação de financiamentos para atividades de pesquisa e desenvolvimento que agreguem valor à produção;

desenvolvimento de alternativas viáveis para a venda de produtos e serviços inovadores;

estimulo a serviços adequados de consultoria e aconselhamento para as reais necessidades dos empreendedores que resultem em maior competitividade das empresas;

O cliente ideal ou hipotético de uma incubadora de base tecnológica é o indivíduo ou grupo técnico com conhecimentos diferenciados, uma boa idéia para transformá-la em um negócio e muita “garra” para buscar o sucesso. Esse cliente, provavelmente, não tem experiência em outras áreas do negócio, não preenche a demanda de capital e necessita do apoio em muitas outras áreas para viabilizar o negócio. Assim sendo, os critérios de seleção de projetos para incubação, devem priorizar o grau de inovação e a possibilidade de mantê-lo, através de esquemas de proteção e reduzir as exigências sobre viabilidade econômica e gerencial. Este é o papel da incubadora, e não do proponente.

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Perfil empreendedor do grupo proponente - Dois papéis-chave existem no mundo dos negócios: o empresário e o empreendedor. Ambos são responsáveis pela criação, desenvolvimento, administração e sucesso empresarial, complementando-se na tarefa de conduzir o negócio, cada qual dentro das suas características peculiares (AQUINO, 1988). O empreendedor é o idealizador do negócio, em geral ele é o fundador da empresa, a idéia inicial é sua e pode permanecer válida, mesmo depois do seu desaparecimento ou morte. A sua personalidade molda os valores culturais da empresa. O seu ponto forte não é a racionalidade ou capacidade administrativa, tampouco é o conhecimento técnico e a liderança, embora essas características sejam úteis. O senso de oportunidade e a perseverança com que ele orienta os seus esforços são a melhor medida do sucesso (AQUINO, 1988)

Estratégia competitiva do projeto - As chances de sucesso de uma nova empresa no mercado estão relacionadas à sua habilidade ou capacidade de vencer a concorrência. Mesmo que o produto seja inovador, ele será copiado ou imitado dentro de pouco tempo. Assim, empregando uma abordagem simples, a competitividade pode ser conseguida, produzindo-se e distribuindo-se essencialmente o mesmo produto que os concorrentes, a custos mais baixos de produção e distribuição, ou, alternativamente, apresentando produtos diferentes (em maior ou menor grau) que mereçam a preferência de clientes.

Em ambas alternativas, é preciso que alguma coisa seja diferente do que fazem os concorrentes, caso contrário, estes levariam vantagens por terem chegado primeiro e terem tido tempo de estruturar fornecedores, clientes e canais, além de terem amadurecido o uso da tecnologia de produção e reduzindo custos. Outras vantagens estão associadas àquelas empresas já estabelecidas - a amortização já obtida do investimento, a experiência administrativa, a experiência operacional do seu pessoal, a escala de produção, as barreiras construídas para proteger o negócio e tantas outras. Assim sendo, não há muito sentido em incubar projetos se não sejam diferentes dos existentes. A única vantagem que uma nova empresa poderá levar em relação às existentes, no mesmo mercado, seja ela de “alta tecnologia ou não”, é a diferenciação em relação ao que é praticado, ou seja, é definir em que item ela vai ser diferente e melhor do que as outras, ou ter uma estratégia competitiva válida.

Juntamente com o perfil das pessoas envolvidas, estes são, por excelência, os critérios de escolha de um projeto para incubação ou investimento de risco (ROCK, 1987).

O novo produto ou serviço não necessita ter melhor desempenho do que o dos concorrentes. Ele poderá ter desempenho inferior, desde que o seu preço também o seja. Os exemplos mais conhecidos hoje dessa estratégia estão nos transportes aéreos, através do sucesso dos vôos mais populares – têm preço e desempenho inferiores aos seus concorrentes (conforto, serviços de bordo, horários etc.). O outro exemplo é dado pelos automóveis de menor numero de cilindradas, que certamente têm desempenho geral inferior aos carros de luxo, porém ocupam fração significativa do mercado.

Posicionamento do projeto na rede de negócio - Produzir a custos mais baixos ou melhorar o desempenho do produto não garante o sucesso de um novo projeto. A inserção na cadeia produtiva pode ser de tal forma que fornecedores, clientes ou outros atores se beneficiem mais do que o próprio empreendedor. Embora alguns produtos possam apresentar diferenciação e vantagens técnicas em relação aos produtos concorrentes, fatores como formação da cadeia de fornecedores, a rede de distribuição, o volume de investimentos, marca, assistência técnica, ensaios e testes de homologação ou autorização (por exemplo - medicamentos) e outros

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semelhantes, podem inviabilizar a abordagem de incubação e graduação. Outros tipos de estratégias de promoção devem ser tentados, nos casos em que essas características estiverem presentes.

Descrição da pesquisa

O objetivo do estudo foi investigar a coerência ou a compatibilidade, implícita ou explicita, do conjunto de critérios de seleção com os conceitos de vantagens competitivas e estratégias competitivas, conforme literatura pertinente. A pesquisa foi feita com base nas informações disponíveis nas páginas das incubadoras na Internet, através da análise dos editais e descrições dos processos seletivos ali expostos. Assim, não houve um plano de amostragem intencional ou um propósito de proceder-se a uma análise quantitativa, o que poderá ser feito em trabalhos futuros dirigidos a esse propósito.

A partir de uma lista de 104 incubadoras encontrada nas páginas da Internet de instituições do tipo REDEINCUBAR, SEBRAE, ANPROTEC e outras, consultaram-se as 60 incubadoras com endereços eletrônicos disponíveis. Para compor esta lista foram usados também os instrumentos normais de busca na Internet (Google, Altavista e outros) para localizar outros endereços, compondo-se finalmente esses 60 endereços eletrônicos. Desse total de 60 incubadoras consultadas, somente 42 tinham documentos (HTML, DOC ou PDF) tratando de editais ou critérios de seleção e, desse total, 34 documentos apresentaram os critérios procurados.

Resultados

Os documentos foram analisados, extraindo-se 33 diferentes critérios de seleção, que são apresentados na Tabela 2, a seguir, com a indicação da freqüência de ocorrência.

Tabela 2 - Critérios de Seleção de Projetos e sua Freqüência

Critérios de Seleção % Critérios de Seleção %Viab.Téc, Econ. e Financeira 82 Clássico Plano Estratégico 9

Grau de Inovação 56 Infra-estrutura e Equip. 9

Capacidade Técnica da Equipe 47 Avaliação de Riscos 6

Conteúdo Tecnológico 44 Contribuição ao Avanço 6

Mercado Potencial 41 Geração de Empregos 6

Capacidade Gerencial 35 Matéria Prima 6

Mercado atual 35 Micro e Peq. Empresa 6

Integração com as Pesquisas 32 Posição na rede de negócios 6

Perfil do Empreendedor 29 Retorno sobre o investimento 6

Dedicação ao empreendimento 26 Substituição de importações 6

Processo não poluente 26 Tecnologia 6

Estratégia Competitiva 21 Integração com as Incubadas 3

Impacto no Mercado 21 Interesse Social 3

Capacidade Financeira 18 Proteção 3

Planilha financeira 18 Tecnologia do Instituto 3

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Plano de Negócio Detalhado 12 Organização Administrativa <1

Valores Corporativos <1

Claramente, não se trata de uma lista de critérios independentes, havendo superposição ou redundância, o que consideramos não influir na análise apresentada. Esses critérios podem ser agrupados em três (ou quatro) categorias. A primeira categoria está relacionada a vantagens competitivas do projeto tais como o “grau de inovação”, “estratégia competitiva”, etc. A segunda categoria diz respeito à avaliação econômica do projeto a exemplo de “estudo de viabilidade técnico-econômica e financeira”, “plano de negócios detalhado”, “geração de empregos”, “impacto no mercado”, “substituição de importações” e outros critérios. A terceira categoria compreende critérios de seleção que estão ou deveriam estar incluídos na lista de serviços oferecidos pela incubadora tais como “capacidade gerencial do grupo proponente”, “integração com outros projetos da incubadora”, “capacidade financeira”, “integração com outras pesquisas da instituição”, “processo não poluente” etc.

Merece destaque o fator o Estudo de Viabilidade Técnica, Econômica e Financeira presente em 83% dos documentos examinados e correspondendo à tradicional análise de investimentos, inclusive da taxa de retorno sobre o capital. Outros critérios citados encerram conteúdos parciais do mesmo fator, como: retorno sobre o investimento, plano de negócio detalhado, planilha financeira, mercado atual e outros.

Discussão

Embora os documentos analisados contenham alguns dos critérios de seleção de competitividade, os resultados indicam que o foco da seleção está principalmente direcionado para critérios que nada têm a ver com a competitividade. Alguns exemplos da baixa freqüência desses critérios são discutidos a seguir.

O grau de proteção da diferenciação ou da inovação - somente um documento foi encontrado que trata da obtenção de patentes e nenhum que cuida de examinar o grau de proteção. Isto significa que, se o projeto der certo, a vantagem que justificou a sua aprovação poderá desaparecer, em decorrência de cópias ou imitações.

Analisar a possível estratégia competitiva do projeto é essencial para entender a razão de sucesso do produto, processo ou serviço. Quais são os concorrentes, se existem, e em que o novo produto é melhor do que o dos concorrentes. Em outras palavras, qual a vantagem competitiva imaginada? 80% dos documentos consultados não citam este fator de seleção. Esta é uma característica intrínseca da idéia, não podendo ser compensada pelo apoio da incubadora.

A análise do posicionamento da nova empresa na rede de negócios, conforme discutido anteriormente, pode contra-indicar a incubação e recomendar o licenciamento para empresas estabelecidas, ou pode exigir uma nova estratégia competitiva absolutamente diferente. Este é o caso de negócios que apresentem elevadas barreiras de entrada, como siderurgia, alguns ramos da indústria farmacêutica etc. As exigências de capital, redes de distribuição, laboratórios e cientistas, exigências de homologação e outros podem ser impeditivos de usar a estratégia da incubação. Este fator pode fazer parte da estratégia competitiva, a depender de

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como as informações são coletadas. Somente 6% dos documentos tratam de algum tema correlacionado.

Um terço dos documentos consultados apresenta o perfil empreendedor do proponente como fator de seleção. Este é universalmente aceito como um dos principais critérios de seleção, embora muito difícil de ser aplicado.

Metade dos documentos não apresenta o grau de inovação ou diferenciação como critério para incubação. A literatura pertinente está repleta de teorias e práticas dos chamados projetos “me too” ou sem diferenciação, apontando as baixas chances de sucesso.

A seguir, serão discutidos outros critérios de seleção, em função da freqüência com que são tratados nos documentos das incubadoras.

Viabilidade Técnica, Econômica e Financeira - Como já foi mostrado, 83% dos documentos examinados falam de viabilidade técnica, econômica e financeira. A análise mais detalhada revelou a exigência freqüente da apresentação de planilhas de custo, demonstrativos financeiros, planos de negócio, retorno sobre o capital, planejamento estratégico e assim por diante. O foco utilizado é a clássica análise de retorno sobre o investimento.

Tratando-se do critério mais freqüente, também presente nas incubadoras internacionais, merece as seguintes considerações sobre eles.

A forma adequada de resolver problemas técnicos associados ao desenvolvimento de novos produtos, processos ou serviços é o laboratório e a planta-piloto. Ao pleitear a sua entrada em uma incubadora, um projeto deve ter ultrapassado esta fase do desenvolvimento da tecnologia, ou da viabilidade técnica, ou ser direcionado para equacionar esse problema antes de pleitear a incubação do negócio. Infelizmente, a abordagem de planta-piloto não é suficiente para o desenvolvimento do produto e do negócio que exigem uma presença no mercado, participação dos fornecedores e uma forte interação com os clientes e os usos que estes fazem do produto ou serviço. Esta necessidade é particularmente acentuada quando se trata de uma inovação que requer o desenvolvimento de clientes, fornecedores, canais, modelos diferentes e aperfeiçoamento do produto, enfim, o desenvolvimento de um novo negócio. Em geral, uma boa inovação de produto ou serviço exige também desenvolvimento do negócio. A incubadora é o lugar adequado para o cumprimento desta etapa.

Quanto menores as incertezas associadas a essas informações, menores as necessidades de incubação e vice-versa - quanto mais inovador (diferenciado) for o projeto, mais necessário se torna conhecer a realidade do mercado, particularmente, a estimativa de volumes de vendas, preço, concorrência, canais, fornecedores, clientes, etc. Se estas informações estivessem disponíveis e fossem confiáveis, não haveria necessidade de se incubar um projeto. Na realidade, estas são as informações mais importantes a serem obtidas durante a incubação que, de resto, é uma fase pré-comercial do projeto. A fase de graduação da empresa pode exigir investimentos maiores (escala industrial) e necessitará dos dados obtidos durante a incubação.

Assim sendo, a taxa interna de retorno de um projeto inovador ou o valor líquido presente do fluxo de caixa é, fundamentalmente, obra da imaginação, não merecendo confiabilidade como critério de seleção. Pelo contrário, obter esta informação é a principal razão de incubar.

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Considera-se que o objetivo da seleção é buscar um projeto intensivo em conhecimento, diferenciado, inovador, liderado por um proponente que tenha uma boa base técnica para ser capaz de sustentar a vantagem competitiva resultante da diferenciação. Se a tecnologia é nova ou diferenciada, os bens de capital também o são, as necessidades de espaço, equipamentos, controles, softwares e outros investimentos são desconhecidos ou, no mínimo, completamente imprecisos. Assim sendo, a estimativa de investimento somente é necessária para orientar as despesas da incubadora ou do financiador, porém não tem o menor valor como critério de seleção ou de viabilidade econômica. Se esse argumento não fosse o bastante, acrescente-se a dificuldade de avaliação de empresas virtuais, com baixíssimos investimentos fixos. Em geral, estas apresentariam elevadas taxas de retorno ou do valor presente líquido, sem que isso represente real viabilidade.

O mesmo raciocínio se aplica às vendas ou à receita do projeto. Não há elementos para se fazer uma previsão confiável da receita proveniente das vendas, nos estágios iniciais do projeto. Estas são informações que não podem ser obtidas em planta-piloto ou laboratório, e obtê-las é a principal razão de incubar.

Adicionalmente, o tipo de proponente que reúne as características de competência técnica e perfil empreendedor – que apresente a capacidade de sustentar vantagens competitivas através da diferenciação tecnológica, não deverá ser avaliado pelo plano de negócios, no sentido utilizado. Ele provavelmente irá mostrar fraqueza nesta área e poderá ter grande potencial em outras.

A revista EXAME apresenta uma entrevista interessante com Arie de Geus (2004), ex-executivo da Shell e autor do best-seller A Empresa Viva, onde é defendida a idéia que “as empresas ricas em massa cinzenta não podem ser dirigidas com o velho estilo”.

Se o capital é intelectual, qual a razão de avaliar o retorno sobre o investimento físico? Esse critério poderá eliminar bons projetos antes de nascerem, por imprecisão de dados, ou selecionar projetos inviáveis através de informações imprecisas.

Dessas observações podemos concluir que os indicadores financeiros ou o estudo de viabilidade econômica, no seu sentido tradicional adotado é, no mínimo, incoerente com a realidade dos fatos e não contribui para confiabilidade ou chances de sucesso de um projeto a ser incubado.

Conteúdo tecnológico do produto ou serviço - Costuma-se afirmar que a maior parte dos novos negócios bem sucedidos apresenta elevado “conteúdo tecnológico”, porém o reverso não é verdadeiro, isto é, que os negócios de elevado “conteúdo tecnológico” serão bem sucedidos, necessariamente. Não é o “conteúdo tecnológico” que determina as chances de sucesso de um novo projeto. Existem diversos fatores que levam um novo negócio ao sucesso, entretanto nenhum é, isoladamente, suficiente. A inovação protegida, de natureza “tecnológica” ou não, destaca-se como uma das fortes características condutoras do sucesso. A inovação pode se dar no “design”, na forma de vender ou distribuir, na função que o produto cumpre no mercado etc. A palavra chave é a diferenciação ou grau de inovação. No caso extremo, a diferenciação pode ser absoluta, isto é, o produto ou serviço é único no mercado. Não há similares, conseqüentemente não há preço, e o vendedor tem poder para cobrar, em princípio, quanto quiser. Também a diferenciação pode ser modesta, moderada ou incremental, isto é, pequeno aperfeiçoamento sobre produto existente. Outro fator fundamental

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é o grau de proteção da inovação para que ela se sustente por algum tempo, sem o prejuízo da cópia ou imitação.

Adicionalmente, é preciso ponderar que, se inovar traz a vantagem de ter produtos ou serviços diferentes dos existentes, inovação também pode trazer desvantagens, quando introduz produtos ou serviços desconhecidos ou pouco conhecidos do produtor na sua função, nos novos clientes, nas novas formas de vender, distribuir, suprir de insumos e na tecnologia pouco explorada. Esses são os riscos da novidade. Esta é uma das principais razões que justificam a incubação.

Finalmente, existem produtos de “baixíssimos conteúdos” tecnológicos altamente competitivos e bem sucedidos (Post-it, da 3M, novos designs, novos sabores etc.) e produtos de elevado “conteúdo tecnológico” (telefones celulares, ressonância nuclear paramagnética etc.) dificílimos de viabilizar no mercado, porque exigem estruturas comerciais e marcas fortes concorrentes o que inviabiliza o surgimento de uma pequena empresa incubada. O conceito de “conteúdo tecnológico”, embora bastante utilizado, goza de grande imprecisão e não é uma variável adequada para seleção de projetos.

As áreas mais desenvolvidas da ciência são aquelas que acumulam mais conhecimento e as áreas menos desenvolvidas são as que acumulam menos conhecimentos. É justamente nas novas áreas, onde se têm menos conhecimentos e que pouca gente as conhece, que as chances de sucesso de uma nova tecnologia são maiores. Voltando a insistir no mesmo ponto, não é o conteúdo ou a base tecnológica que dá vantagens, porém a assimetria do conhecimento (diferenciação). É preciso trabalhar nos “nichos” de desconhecimento – conhecer o que os outros não conhecem.

Não somente este foi o quarto critério mais freqüente (45%), como é um fator diferenciador das incubadoras comuns e as de “base tecnológica”. Se esse termo não tiver o sentido de “alta diferenciação”, o seu significado terá grande imprecisão já que é difícil conceituá-lo.

Mercado atual - Estatísticas e dados de mercado estão disponíveis para inúmeros produtos. As TVs e os diários trazem na secção de economia informações sobre petróleo, soja, milho minérios, boi gordo e tantas outras commodities. É relativamente simples levantar-se volumes comercializados, tipo de commodity, preço, quem vende, quem compra e outras informações. Em se tratando de produtos mais diferenciados, com diversos tipos ou modelos e em mercados variados, as informações tornam-se menos acessíveis, requerendo informantes qualificados que cobram pelo serviço. No caso extremo, para produto ou serviço inteiramente novo, sem similar, ou com elevado nível de diferenciação, as informações, simplesmente, não estão disponíveis. Assim sendo, espera-se que, quanto mais inovador ou diferenciado for um produto ou serviço, menos confiáveis são as informações de mercado atual, tais como preço, volumes a serem comercializados, canais de distribuição e vendas, concorrentes e outros.

A importância atribuída a este tipo de informação na seleção de um projeto para incubação fornece um retrato da estratégia praticada. Em outras palavras, é preciso muito cuidado para não atribuir importância relativa ao uso da rentabilidade provável de um projeto de incubação como critério de seleção. Convenhamos – trata-se de pré-investimento. Entretanto, 35% dos documentos consultados falam de dados de mercado atual como critério de seleão.

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Potencial de mercado no futuro - Em princípio, é inócuo estimar-se quantitativamente o mercado potencial de um novo produto, baseado no uso previsto, não tendo sentido estimar-se valores de receita resultantes de vendas que, no mínimo, estariam sujeitos a grande incerteza. Acrescente-se o fato de que tudo dependerá de futuros competidores.

Esta informação qualitativa é interessante na avaliação de uma inovação e na projeção do seu futuro e é um dos critérios empregados para avaliação de investimentos de risco, pelas sociedades de capital de risco e nas incubadoras. Servirá também para orientar a política a ser seguida durante a incubação. Aproximadamente 40% dos documentos consultados falam desse potencial de mercado.

Perfil empresarial do grupo proponente - É preciso não confundir o empreendedor com o empresário. Este último é a pessoa que administra o empreendimento no dia a dia. Trabalha para perpetuar a empresa, planeja organiza, tem experiência comercial e administrativa.

Arthur Rock (1987), um dos provedores de capital de risco para Fairchild Semiconductor, Scientific Data Systems, Teledyne, Intel, Diasonics e Apple Computers, afirma que as pessoas são mais importantes do que a forma da proposta do negócio. As grandes idéias não terão sucesso sem um bom gerenciamento, em outras palavras, é preciso principalmente ter as pessoas certas. Entrevistas mantidas por nós com empresários de risco no Brasil corroboram essas idéias. Entretanto, nem sempre é possível reunir, ao mesmo tempo e no mesmo projeto, todas as condições necessárias. O papel de promover a articulação e a organização do grupo sócio que vai explorar o negócio cabe a incubadora. Um importante critério de seleção é a concordância do proponente em aceitar cooperação e sociedade que, infelizmente não mereceu destaque no estudo.

A competência empresarial é um dos aportes prometidos pelas incubadoras, através de treinamento ou articulação do proponente empreendedor com profissionais ou empresários ou sócios potenciais. Por esta razão, pensamos não ser exigível que o postulante da incubação, além de outros atributos de perfil empreendedor e competência técnica, apresente capacidade gerencial. Basta que ele aceite a participação de terceiros recomendados pela incubadora. Entretanto, 35% dos documentos consultados apresentam exigência da demonstração de capacidade gerencial.

Capacidade financeira de investimento do grupo proponente - Por menor que seja o novo investimento na incubadora, sem capital não haverá negócio e, conseqüentemente, a graduação (sair da incubadora) do projeto será prejudicada. O grupo empreendedor deverá possuir um mínimo de capacidade financeira para investir ou estar disposto a aceitar a participação de terceiros com capital. A importância atribuída a esse fator dependerá do tipo de projeto e da possibilidade do próprio grupo gestor da incubadora de conseguir capital de terceiros. Por outro lado, um dos papéis da incubadora é dar apoio para que o empreendedor obtenha os recursos necessários ao sucesso do empreendimento, sejam esses recursos financiamentos ou capital de risco. É mais recomendável que a concordância da aceitação da participação de capitais externos seja o critério de seleção, do que a capacitação financeira do proponente. A proposta é que a incubação, em si, somente tenha curso, uma vez equacionado o problema financeiro com a ajuda da incubadora.

Integração com as pesquisas em andamento - Dois critérios surgem com objetivos parecidos de reduzir as áreas temáticas dos projetos. Em outras palavras, muitas incubadoras

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restringem as suas áreas de atuação ou exigem a integração com as pesquisas em andamento. Um deles aparece em 3% dos casos como critério de seleção – integração com as pesquisas em andamento. O outro surge na limitação das áreas temáticas de atuação do projeto, por exemplo, biotecnologia, informática, agro-negócios etc. Há um caso específico em que a exigência é de que o projeto use tecnologia desenvolvida pelo instituto de pesquisas gestor e outro que o projeto tenha a participação de um aluno do curso.

É aparentemente racional a limitação das áreas de atuação da incubadora às áreas de atuação do instituto de pesquisas, do departamento da universidade ou de outra instituição gestora. Entretanto, essa restrição pode ser excessiva e não encontrar justificativa, pelas seguintes razões:

a) As instituições participantes desta área de promoção de tecnologia, inovação e novos negócios defendem a idéia de redes de inovação, de cooperação e redes de incubadoras, de tal forma que poderiam perfeitamente complementar sua capacitação técnica através do envolvimento e cooperação com outras instituições, em lugar de restringir as áreas de atuação da incubadora, concentrando os critérios de seleção na maior viabilidade de sucesso.

b) A prática não vai garantir a coincidência das necessidades do projeto com a competência da instituição, tanto do ponto de vista dos usos (mercado) como das principais técnicas de produção. Por exemplo, um projeto de biotecnologia, de agro-negócios ou qualquer outra disciplina pode requerer os conhecimentos e capacitações das mais variadas naturezas. Esses projetos podem ter mercados que não apresentem a menor semelhança de um com o outro. Por exemplo, os produtos finais podem ser commodities, especialidades, dirigidos para saúde humana, defensivos agrícolas, energia (biomassa), solventes, tintas, alimentos e uma infinidade de outras aplicações. Por outro lado, a principal técnica de um projeto chamado de biotecnologia pode ser genética molecular, engenharia química de separação de componentes, desenvolvimento de software, aplicação de energia nuclear e uma infinidade de outras técnicas absolutamente diferentes. Então, a restrição por área do conhecimento, nesse caso não vai ajudar a coincidir a necessidade do projeto com a disponibilidade institucional. Trata-se de uma restrição cuja racionalidade não otimiza a geração de novos negócios, tampouco a utilização da competência instalada.

Outros critérios - Há um conjunto de outros critérios de seleção, além daqueles já discutidos, que surgiram durante a pesquisa e que, se aplicados na seleção de projetos, contribuirão para reduzir as chances de sucesso. Vejamos:

Geração de Empregos. Somente gerará empregos o projeto bem sucedido. Uma empresa gera emprego na sua própria estrutura, nos fornecedores, nos distribuidores e clientes. Se ela é bem sucedida, principalmente em se tratando de um novo negócio, a sua capacidade de alavancagem da economia multiplicará a geração de renda e emprego. Assim esse tipo de critério de seleção não apresenta racionalidade.

Processo não Poluente. Trata-se de um problema óbvio de cumprimento da Lei e de respeito à sociedade, que não deve ser um critério de seleção, porém uma obrigação. O papel da incubadora é dar suporte para se encontrar a solução.

Micro e Pequena Empresa. Este não deve ser um critério explícito, é uma conseqüência da exigência de nova empresa com produto ou serviço diferenciado.

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Conclusões e Recomendações

A pesquisa mostrou que, em geral, as incubadoras estudadas apresentam critérios de seleção de projetos que não traduzem adequadamente os fatores de competitividade e atribuem excessiva ênfase a planos de negócio, baseados em análise de retorno sobre investimento, cujos dados econômicos são necessariamente imprecisos para projetos inovadores.

Outras políticas criam restrições às áreas de conhecimento das instituições gestoras, o que não estimula a formação de redes de cooperação interinstitucional.

A seguir sugerem-se um conjunto de critérios de seleção de projetos de incubação.

Há critérios de seleção que são necessários à viabilidade de um novo projeto, entre eles, aqueles que geram vantagens competitivas. Entretanto, os critérios de seleção que aumentam a competitividade não devem todos figurar como requisitos de entrada, na medida em que a incubadora poderá suprir algumas deficiências iniciais. Naturalmente, a gestão da incubadora deverá regular a maior ou menor dificuldade de admissão em função da demanda e disponibilidade de recursos, como também deve filtrar propostas consideradas inadequadas. Assim sendo, os principais critérios de seleção devem ser aqueles que a incubadora não pode dar e, por essa razão, devem fazer parte das exigências sobre a proposta e o proponente. Sugerem-se:

1. Grau de inovação ou diferenciação do produto ou serviço quando comparado com produtos ou serviços existentes. Não necessariamente se trata de desempenho superior – pode ser preço inferior ou outras características diferentes, tais como facilidade de uso, facilidade de transporte e distribuição, disponibilidade etc.

2. Possibilidade de proteção da inovação. A inovação pode ser protegida por patente de invenção, outros registros de propriedade intelectual (software, cultivar, direito autoral e outros), competência essencial (diferenciada) ou ativo especializado difícil de reproduzir ou copiar. (A incubadora pode ajudar a registrar a patente – não precisa estar pronta).

3. Estratégia competitiva e o posicionamento na rede de negócio. É preciso que o negócio como um todo tenha uma concepção factível e viável no que diz respeito à escala, canais de suprimento e distribuição, assistência técnica e que as principais vantagens competitivas estejam formuladas com certa clareza. Em se tratando de vantagem de custo menor do que o do concorrente (tecnologia de processo), para produto sem diferenciação, a melhor forma de promover o projeto não é incubação, sendo recomendável partir diretamente para escala comercial em uma empresa estabelecida, já que o produto, os clientes a função, os canais, os fornecedores são conhecidos. Uma alternativa a ser examinada é a venda ou licenciamento da tecnologia para terceiros que disponham dessas outras facilidades, outra é a associação com empresas que já disponham dessa estrutura e assim por diante.

4. Perfil empreendedor e técnico dos proponentes. Este critério deve ter peso decisivo, embora se possa ajudá-lo através de consultorias, treinamento ou admissão de sócios.

5. Disposição do proponente de aceitar a participação de capitais de risco e grupos empresariais com experiência .

As três primeiras características dizem respeito à essência do projeto ou da idéia, o que não pode ser suprido institucionalmente pela incubadora. O quinto requisito é necessário para que

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o projeto possa receber uma parte do apoio que a incubadora poderá oferecer, isto é, aportes financeiros, técnicos e gerenciais.

Referências

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