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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO CRISTIANE SIMÕES BENTO DE SOUZA Deficiência de Vitamina A em adolescentes do sexo masculino atendidos em uma Unidade Básica de Saúde Ribeirão Preto 2011

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UNIVERSIDADE DE SO PAULO

FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRO PRETO

CRISTIANE SIMES BENTO DE SOUZA

Deficincia de Vitamina A em adolescentes do sexo masculino atendidos em uma Unidade Bsica de

Sade

Ribeiro Preto

2011

CRISTIANE SIMES BENTO DE SOUZA

Deficincia de Vitamina A em adolescentes do sexo

masculino atendidos em uma Unidade Bsica de Sade

Dissertao de Mestrado apresentada

Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto

da Universidade de So Paulo para

obteno do ttulo de Mestre em Sade da

Criana e do Adolescente. Opo:

Investigao em Pediatria.

Orientador: Prof. Dr. Ivan Savioli Ferraz

Ribeiro Preto

2011

AUTORIZO A REPRODUO E DIVULGAO TOTAL OU PARCIAL DESTE

TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRNICO, PARA

FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.

FICHA CATALOGRFICA

Souza, Cristiane Simes Bento de

Deficincia de vitamina A em adolescentes do sexo masculino atendidos em uma

unidade bsica de sade

RIBEIRO PRETO, 2011.

86P: IL; 30 CM

Dissertao (Mestrado) Universidade de So Paulo, Faculdade de Medina de

Ribeiro Preto, 2011.

Orientador: Ferraz, Ivan Savioli.

1. Deficincia de vitamina A, 2. Retinol, 3. +S30DR, 4. A dolescentes, 5. Sade

Pblica.

Nome: SOUZA, Cristiane Simes Bento de Ttulo: Deficincia de Vitamina A em adolescentes do sexo masculino atendidos em uma Unidade Bsica de Sade. Dissertao apresentada Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto da Universidade de So Paulo para obteno do ttulo de Mestre em Sade da Criana e do Adolescente. Opo: Investigao em Pediatria. Aprovada em: ____________________ Banca Examinadora: Prof. Dr. __________________________________Instituio: ___________________ Julgamento: _______________________________ Assinatura: __________________ Prof. Dr. __________________________________Instituio: ___________________ Julgamento: _______________________________ Assinatura: __________________ Prof. Dr. __________________________________Instituio: ___________________ Julgamento: _______________________________ Assinatura: __________________

Dedicatria

Ao meu querido Deus, que a pessoa que eu mais amo na vida.

Ora, quele que poderoso para vos guardar de tropeos e para vos apresentar com exultao, imaculados diante da sua glria, ao nico Deus, nosso salvador, mediante Jesus Cristo, Senhor Nosso, glria, majestade, imprio e soberania, antes de todas as eras, e agora, e por todos os sculos. Amm!

(Epstola de Judas, 24 e 25 Bblia Sagrada) minha querida famlia: Meu esposo Ronie Carlos Bento de Sousa Melhor serem dois do que um... Porque se carem um levanta o companheiro; se algum quiser prevalecer contra um, os dois lhe resistiro; o cordo de trs dobras no se rebenta com facilidade.

(Eclesiastes 4:9, 10 e 12, Bblia Sagrada) (...) Meu riso to feliz contigo O meu melhor amigo o meu amor (...) Seus olhos, meu claro Me guiam dentro da escurido Seus ps me abrem o caminho Eu sigo e nunca me sinto s Voc assim Um sonho pra mim...

(Velha Infncia, Tribalistas) Que bom compartilhar com voc minha vida e meus sonhos. Amo voc. Agradeo a Deus por voc ser quem voc , sbio, ntegro, honesto, trabalhador, a pessoa mais humilde que eu j conheci. Obrigada por cuidar de mim e de nossos filhos. Tenho muito orgulho de voc!

s vezes a gente pergunta para as crianas o quanto elas gostam da gente... e elas abrem bem os braos e dizem: Um tanto assim! Teve um dia, em que voc tinha feito uma das muitas viagens entre Ribeiro Preto e Goinia, que voc disse: desde que voc veio fazer o mestrado, eu j viajei tantos quilmetros que daria para eu ir at a Lua! Foi pra mim a sua resposta: : Um tanto assim! Obrigada por sonhar por mim e comigo. Eu amo voc tambm! Um tanto assim! Meus filhos: Isabela e Samuel Os filhos so um presente do Senhor; eles so uma verdadeira beno.

(Salmos 127:3 Bblia, NTLH) Ser me de vocs me faz querer ser melhor, mais forte, ir alm, para poder deixar para vocs um legado, uma herana no corruptvel, da qual vocs possam se orgulhar e se espelhar... Vocs so os presentes mais preciosos e queridos que eu j ganhei na vida! Ouvir suas vozes, ver vocs aprendendo com a vida, escutar seu riso, enxugar suas lgrimas, curar suas dores, segurar suas mozinhas, a maior riqueza que eu tenho! Que eu possa sempre dizer: olhem para mim, sigam meus passos. O caminho seguro e eu estou ao seu lado. Segure minha mo, estou com vocs!. Sei que vai chegar o dia em que cada um de vocs vai seguir seu prprio caminho. Peo a Deus que os guarde, os livre do mal, prepare pessoas boas para compartilharem a vida com vocs... e principalmente, que vocs guardem a f! Um beijinho (com muitas estrelinhas para a Isabela) e um abrao (de macaco, da nave-me para o astronauta Samuel). A mame ama vocs! minha me, Maria Lusa Simes Dias

Agradeo a Deus por todos os momentos que voc esteve ao meu lado. Pelos momentos em que precisei e voc esteve por perto. Pelas coisas que aprendi e ainda aprendo com voc e pelo seu exemplo. Amo voc! A meu pai Obed de Souza (in memorian) s vezes ainda me lembro da cano que voc cantava para eu dormir quando eu tinha medo: Finda-se este dia, que meu Pai me deu/ sombras vespertinas/ cobrem j os cus/ oh! Jesus, bendito! Se comigo ests/ eu no temo a noite/ vou dormir em paz! Voc orava comigo e segurava as minhas mos, que eram to pequenas. E era segurando minha mo que voc entrava no hospital, orgulhoso de sua filha que seria mdica como voc. Voc meu exemplo. Me ensinou a amar o estudo e o trabalho, me ensinou princpios que carrego ao longo da vida. Voc esteve comigo em momentos alegres e tristes. Me lembro que liguei para voc de dentro da ambulncia, quando transportei para a UTI um RN pela primeira vez... de quando opervamos juntos... de segurar sua mo e ouvir sua voz deitada em uma mesa de cirurgia... Da mesma forma que no pude compartilhar com voc quando fiz a primeira puno lombar em um beb, no tenho voc por perto para repartir esta vitria de hoje, que tambm sua, pois voc me ensinou a ser o que hoje eu sou. Eu creio no cu. Que um dia eu vou ver voc de novo, em um lugar em que a doena e a morte no tem mais poder. E agradeo a Deus por voc ter sido o meu pai e por eu ainda hoje ser sua filha! minha irm, Paulinne Simes de Souza Arruda (sistinha) (...) Sempre juntas (...). Sei que sempre posso contar com voc. E mesmo longe, sempre estou do seu lado e voc do meu. Porque estamos sempre juntas!

Admiro voc, sua fora, sua praticidade, sua coragem e integridade. Tenho orgulho de ser sua irm. Amo voc! Aos meus irmos Obed e Rafael Amo vocs do fundo do meu corao! Que Deus os abenoe e proteja sempre, vocs e suas famlias.

Agradecimentos Ao meu orientador: Professor Doutor Ivan Savioli Ferraz, Caro amigo, que me orientou e me ensinou lies valiosas, do Mestrado e de vida. Continuo contando com seu apoio e amizade. Ao Professor Doutor Carlos Alberto Nogueira de Almeida, Querido amigo, obrigada por tudo, em especial pela sua generosidade. Conte sempre comigo tambm. Ao professor Doutor Hlio Vannucchi, Pelas valiosas contribuies ao meu trabalho e minha formao acadmica. um privilgio t-lo nesta trajetria. Ao professor Doutor Jlio Csar Daneluzzi, Agradeo pelo apoio e receptividade enquanto desenvolvi este trabalho. Marlene, Vera, Sandra, Silvandira, Rosalina, Cidinha, Wanda, Edna, Ceclia,Creusa,Snia, Margarida, Roseli, Eliana, Lcia, Malu e Verinha Agradeo pela acolhida, apoio e amizade e pelas contribuies a este trabalho, que de todas ns! Aos adolescentes participantes deste trabalho, Tudo isso no seria possvel sem a colaborao de vocs. Desejo a vocs muita sade e um crescimento e desenvolvimento sadio e feliz. Sandra Oliveira, Cludia Mendes e Ana Takaasi Pelo apoio e pelas orientaes, pela amizade de vocs!

Aos professores do Mestrado, Aqui representados pelos nomes de Helosa Bettiol, Marisa Barbieri, Lus Antnio Del Ciampo, Marisa Marisa Mrcia Mussi Piata e Marco Antnio Barbieri Por me abrirem as portas para um mundo novo. s minhas tias Odeth e Osame (in memorian) Oneme e Olga Agradeo pelo cuidado na infncia. Pelas histrias, msicas, brincadeiras, pelos bolos e bolinhos, sufls, pavs, passeios, quintais e por tantas outras lembranas queridas. Vocs moram no meu corao! minha av Maria (in memorian) Pela pessoa positiva e corajosa que foi e pelo exemplo que nos deixou. Ao tio Toninho e tia Luza Pelo carinho e cuidado quando eu era pequena e pelas lembranas de tantos momentos queridos que passamos juntos. Amo vocs! A meu padrasto, Marcos Tadeu Pereira de Carvalho, Obrigada pelo carinho de sempre! A meus sogros, Manoel Bento de Souza e Fumico Maeda de Sousa, Obrigada pelas oraes e pela pacincia em ficar tanto tempo privados da companhia do Ronie e dos meninos, enquanto estivemos fora. Que Deus os recompense. s queridas sobrinhas Ceclia e Helosa

Amo vocs! Desejo do fundo do corao as bnos do Papai do cu e tudo de bom nesta vida (incluindo vacinas e alimentao saudvel!). Aos queridos sobrinhos Tamiris, Lucas e Larissa, Amo vocs! Espero passarmos mais tempo juntos. Vanessa, Fernanda, Daniel, Lucas, Caroline e Amanda Que Deus os abenoe sempre. Vocs so muito legais! Aos meus cunhados, Marcelo de Andrade Arruda Marcos Antnio Bento de Sousa Pelo apoio e pelas planilhas de EXCEL! Conto com vocs no doutorado! Professora Anne Mary Staunton, Minha querida professora de Ingls, que um verdadeiro exemplo de vida, amor a Deus e ao prximo. amiga Divina Romualda da Silva, Pelo seu apoio, amizade e carinho com minha famlia. amiga Rafaela Teixeira Por estarmos perto estando longe, pelas oraes e pela amizade de sempre! Professora Doutora Rita Francis Gonzales Y Rodrigues Branco, Pela amizade de sempre e pela acolhida no meu regresso Goinia. Doutora Braslia Maria de Almeida Fonseca Pinheiro,

Pela amizade de sempre e pela mo generosamente estendida. Voc um exemplo para mim h tantos anos... quando eu crescer, quero ser igual a voc! doutora Luciana de Oliveira Silva Malafaia e Pastor Joel Obrigada pelo Carinho, amizade, exemplo de vida e famlia que vocs representam para ns. Que Deus abenoe vocs e sua casa! Mestra Professora e Doutoranda Karla Cristina Malta Costa, Companheira de jornada e amiga. Admiro muito voc, sua coragem e sua fora. Voc corajosa, um exemplo para mim. Agradeo a Deus pela sua vida e pelo que aprendi com voc! Aos queridos Henrique Salles e famlia Pelo apoio e acolhida em Ribeiro Preto. Vocs foram maravilhosos e moram em nossos coraes. Nunca esqueceremos de vocs. Igreja Metodista Central de Ribeiro Preto, Pela acolhida e carinho e por tudo que aprendemos com vocs. Igreja Bom Pastor em Goinia, Por nos receberem de volta, com o amor de sempre!

RESUMO

SOUZA, C. S. B. S. Deficincia de Vitamina A em adolescentes do sexo masculino

atendidos em uma Unidade Bsica de Sade. 2011. 68 f. Dissertao (mestrado) -

Faculdade de Medicina, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2011.

Introduo: A Deficincia de vitamina A (DVA) uma das carncias nutricionais mais

prevalentes no mundo. um problema de sade pblica com elevada morbidade e

mortalidade em vrios pases em desenvolvimento. Acomete principalmente crianas

pr-escolares, gestantes e nutrizes. Poucos trabalhos estudam a prevalncia de DVA

entre adolescentes. Objetivos: verificar a prevalncia de DVA em adolescentes

atendidos em um ambulatrio de pediatria geral no municpio de Ribeiro Preto (SP);

estudar a influncia de indicadores socioeconmicos e bioqumicos no status de

vitamina A desta populao. Materiais e mtodos: Desenho: estudo descritivo

transversal de prevalncia; Amostragem: 80 adolescentes do sexo masculino entre 10 e

19 anos. Mtodos: teste +S30DR (o adolescente recebeu uma dose oral de 200.000UI

de vitamina A imediatamente antes da primeira coleta de sangue. Uma segunda

amostra foi obtida 30 a 45 dias aps para determinao do +S30DR); dosagem da

Protena C Reativa; entrevista e avaliao antropomtrica. Resultados: 43,8% (35/80)

adolescentes apresentaram testes +S30DR positivos. As mdias dos nveis de retinol

srico pr e ps-suplementao foram de 1,30 mol/l (DP:0,41) e 1,54mol/l (DP:0,41),

respectivamente (p= 0,01; teste t de Student). Idade, renda familiar, nmero de

pessoas no domiclio e escolaridade dos pais no se mostraram como fatores de risco

para a DVA. Os nveis sricos de PCR e os episdios febris e diarricos no alteraram

os valores finais de +S30DR. Concluses: A elevada prevalncia de DVA nesta

populao sugere a realizao de novos estudos que possam comprovar ser pertinente

a incluso desta faixa etria em programas de preveno e erradicao desta carncia

nutricional.

Descritores: adolescente; deficincia de vitamina A; retinol; sade pblica.

ABSTRACT

SOUZA, C. S. B. S. Study of the prevalence of Vitamin A Deficiency among

adolescents, attended at a day care centre. 2011. 68 f. Dissertao (mestrado) -

Faculdade de Medicina, Universidade de So Paulo, So Paulo, 2011.

Background: Vitamin A Deficiency (VAD) is one of the most prevalent nutritional

deficiencies in the world. It constitutes a public health problem with high morbidity and

mortality rates for many developing countries. It mainly affects preschool children,

pregnant and lactating women and few studies have been done to evaluate its

prevalence among adolescents. Objectives: To determine the prevalence of VAD

among adolescents treated at a day-care pediatric clinic in Ribeiro Preto (So Paulo);

to study the influence of socioeconomic and biochemical indicators on the status of

vitamin A in this population. Materials and Method: Design: A descriptive cross-

sectional study of prevalence; sampling: 80 male 10 to 19-year-old adolescents.

Methods: +S30DR test (The adolescent received an oral dose of 200,000 IU vitamin A

immediately after the first blood collection. A second blood sample was obtained 3045

days after supplementation in order to determine the +S30DR); dosage of C-reactive

protein; interview and anthropometric measurements. Results: a total of 43.8% (35/80)

adolescents presented positive +S30DR tests. The mean serum retinol pre and pos-

supplementation levels were 1.30 mol/l (DP:0.41) and 1.54mol/l (DP:0.41),

respectively (p= 0.01; test t of Student). Age, income, number of people in the home or

parents' education did not present as risk factors for VAD. Serum levels of CRP and

fever and diarrhea episodes did not alter the final values of + S30DR. Conclusions: The

high prevalence of VAD in this population would suggest the need for further studies

which could prove that it would be relevant to include this age group in programs for the

prevention and eradication of this nutritional deficiency.

Descriptors: adolescent; vitamin A deficiency; retinol; public health.

Sumrio

1. Introduo ............................................................................................................... 16 1.1. Alteraes funcionais devido deficincia da Vitamina A ............................... 18 1.2. Metabolismo da vitamina A .............................................................................. 20 1.3. A linha do tempo da vitamina A ..................................................................... 23 1.4. Aspectos epidemiolgicos da deficincia da Vitamina A.................................. 25

1.4.1. A prevalncia da DVA no mundo .............................................................. 26 1.4.2. Histrico e situao da DVA no Brasil ...................................................... 28

1.5. A deficincia de vitamina A em adolescentes .................................................. 29 1.6. O diagnstico da DVA .................................................................................. 31 1.7. Estratgias para controle da DVA ................................................................ 33

2. Justificativa da Proposio ...................................................................................... 35 3. Objetivo ................................................................................................................... 36

3.1. Objetivo Geral .................................................................................................. 36 3.2. Objetivos Especficos ....................................................................................... 36

4. Casustica e Metodologia ........................................................................................ 37 4.1. Desenho do estudo .......................................................................................... 37 4.2. Aspectos ticos ................................................................................................ 37 4.3. Local de estudo ................................................................................................ 37 4.4. Determinao da amostra ................................................................................ 37 4.5. Critrios de incluso ......................................................................................... 38 4.6. Critrios de no incluso .................................................................................. 39 4.7. Critrios de excluso ........................................................................................ 39 4.8. Materiais e Mtodos ......................................................................................... 39 4.9. Anlise estatstica dos dados ........................................................................... 44

5. Resultados .............................................................................................................. 45 6. Discusso ................................................................................................................ 52

6.1. Consideraes finais........................................................................................... 60 7. Concluso ............................................................................................................... 63 8. Referncias Bibliogrficas ........................................................................................ 64 APNDICE A QUESTIONRIO ............................................................................................ 83 APNDICE B TCLE ................................................................................................................ 85

16

1. Introduo

A vitamina A (VA) um termo que se refere a compostos alimentares essenciais

que possuem estrutura e propriedades biolgicas do retinol (lcool-lipdico). Pertence

ao grupo das vitaminas lipossolveis e apresenta sensibilidade ao oxignio, ao calor e

luz (em especial aos raios ultravioleta) (RONCADA, 2008; IUCIF JR, ANGELIS, 2008;

ROSS, 2009).

A VA pode ser obtida a partir de dois grupos de alimentos: os de origem animal,

na forma de retinol ou vitamina A pr-formada e os de origem vegetal, os carotenides

da provitamina A. Os dois grupos apresentam em sua estrutura ao menos um anel -

ionona ligado a uma cadeia lateral composta de ligaes duplas conjugadas carbono-

carbono (MATTOS et al., 2007; RONCADA, 2008; ROSS, 2009; WEFFORT, 2009).

As fontes da vitamina A pr-formada so a carne, principalmente as vsceras,

apresentando elevadas concentraes o fgado dos mamferos e dos peixes marinhos;

a gema do ovo, os peixes, o leite integral e seus derivados, como iogurte natural,

manteiga, queijos e creme de leite. Vrios alimentos so fortificados obrigatoriamente

durante sua fabricao, conforme preconizado pela legislao bromatolgica

(WEFFORT, 2009).

Nos alimentos de origem animal, a maior parte da VA encontra-se esterificada

com cidos graxos, formando steres retinlicos (palmitato ou acetato), enquanto as

preparaes farmacolgicas contm palmitato ou acetato produzido sinteticamente.

Ambos geram retinol e so equivalentes nutricionalmente. O all-trans-retinol, in vivo,

oxidado e isomerizado a 11-cis retinal e em seguida a all-trans e a 9-cis-cido

retinico (IUCIF JR, ANGELIS, 2008; ROSS, 2009).

Os alimentos ricos em provitamina A so aqueles de origem vegetal com

colorao amarelada, alaranjada ou verde escura, como manga, mamo, caju, goiaba

vermelha, cenoura, milho (amarelo), batata doce (amarela), abbora (madura),

moranga, couve, mostarda, espinafre, brcolis, caruru, folhas de beterraba e cenoura,

chicria, alface e agrio. O azeite de dend, ou leo de palma, apresenta elevadas

17

concentraes, enquanto as razes brancas, tubrculos e todos os gros tm contedo

reduzido de provitamina A (WEFFORT, 2009).

O termo provitamina A refere-se aos carotenides, pigmentos lipossolveis e

poliinsaturados com atividade biolgica de vitamina A. Em geral esto associados

clorofila e outros pigmentos da fotossntese nos cloroplastos. Podem ser produzidos por

plantas e microorganismos inferiores, como as algas. Somente 10% dos mais de 600

carotenides isolados de fontes alimentares podem ser considerados precursores da

vitamina A, a saber, o , o e o -caroteno e a -criptoxantina (OLSON, 1991; ROSS,

2009).

Dentre eles, o -caroteno o mais conhecido e constitui aproximadamente 20%

dos carotenides totais, estando presente nas cenouras e em vegetais de folhas

amarelas e verdes; o -caroteno encontrado em cenouras e leo de palmeira

vermelha e a -criptoxantina no pimento vermelho, laranjas e mamo papaia. O

licopeno, a lutena e a cantaxantina tambm so carotenides, mas no possuem

atividade de vitamina A (RONCADA, 2008; ROSS, 2009).

Os alimentos ricos em carotenides da provitamina A tm custo mais acessveis

que os de origem animal. Em pases subdesenvolvidos muitas vezes representam a

principal, ou mesmo, a nica fonte disponvel de vitamina A (OLSON, 1991; SOUZA et

al., 2002; ROSS, 2009).

A vitamina A pr-formada e a provitamina A diferem quanto sua

biodisponibilidade e possuem atividade biolgica diferente. Para tornar possvel a

comparao entre as quantidades da vitamina presentes nos alimentos, foram criadas

unidades ou fatores de equivalncia. A unidade internacional (UI) foi uma das primeiras

unidades propostas, mas no levava em conta a absoro insuficiente dos carotenides

pelo sistema digestrio humano. Foi substituda em 1967 pelo retinol equivalente (ER),

que leva em conta o valor inferior de absoro de outros carotenides da provitamina A

em comparao com o -caroteno. O equivalente unidade de retinol (RAE) foi criado

em 2001, aps a demonstrao de que a bioatividade dos carotenides era menor do

que se pensava (ROSS, 2009).

As ingestes dirias recomendadas (RDAs) determinam as necessidades mdias

estimadas (EARs) da VA, que correspondem ingesto que atende s necessidades

18

nutricionais de metade dos indivduos do grupo estudado. So expressas em

microgramas RAE/dia e foram calculadas para homens e mulheres com base nas

reservas hepticas. Em lactantes, inclui a quantidade necessria para suprir as

necessidades de VA dos lactentes.

Para crianas e adolescentes, os valores se baseiam nas EAR para adultos,

reduzidos proporcionalmente com base no peso metablico. Para menores de 12

meses, no h evidncias cientficas suficientes para derivar EAR. Recomenda-se,

ento, a ingesto adequada (AI), baseada na quantidade de VA presente no leite

materno. A tabela 1 apresenta a equivalncia de cada uma destas unidades (ROSS,

2009).

Tabela 1 Comparao entre unidades de equivalncia de Vitamina A:

Unidade Equivalncia

1 UI 0,30 g de all-trans retinol 0,6 g de all-trans betacaroteno

1 RE 1g de retinol 6g de betacaroteno 12 g de outros carotenides da provitamina A (todo-trans)

1 EAR 1 g de all-trans-retinol 2 g de all -trans -betacaroteno em leo 12 g de all -trans betacaroteno * 24 g de all -trans carotenide da provitamina A *

Fonte: Ross, 2009. * com base alimentar.

1.1. Alteraes funcionais devido deficincia da Vitamina A

A VA fundamental para o crescimento adequado do organismo, para a

diferenciao celular e manuteno da integridade dos epitlios, principalmente do trato

respiratrio e gastrointestinal. Tambm tem importante papel na viso e no

19

desenvolvimento e funcionamento do sistema imunolgico (FERRAZ, DEL CIAMPO,

2005; ROSS, 2010).

A VA atua na diferenciao celular. Experimentos realizados com ratos albinos

(WOLBACH, HOWE, 1925) demonstraram que o revestimento epitelial dos tecidos se

tornava raso (escamoso), ressecado e ceratinizado na presena de DVA e que as

alteraes eram mais precoces em animais mais jovens. Na DVA ocorre queratinizao

dos epitlios respiratrio, gastrointestinal e genitourinrio, fazendo com que os tecidos

percam a funo de barreira natural contra agresses do meio externo. Devido a este

fenmeno, h dificuldade de passagem de imunoglobulinas secretoras nos tratos

gastrointestinal e respiratrio, o que favorece a translocao bacteriana intestinal, e

contribui para o pior prognstico em casos de diarria e infeces respiratrias

(STEPHENSON, CLARK, 1920; VELSQUEZ-MELENDEZ et al., 1994; GERALDO,

2003; ROSS, 2009).

Em recente reviso de estudos experimentais, Olson e Mello (2010) associaram

a DVA a alteraes de comportamento e deficincias de aprendizado e memria em

roedores; os autores examinaram os efeitos dos retinides na sinalizao do

aprendizado vocal/auditivo em pssaros de canto, sugerindo que a VA atue em

importantes funes cerebrais tambm no perodo ps-embrionrio, na manuteno da

plasticidade neuronal e da funo cognitiva.

A DVA se associa resposta imune inadequada, ao excesso de produo de

citocinas tipo 1 (ou Th1) e em alguns casos, reduo da resposta tipo 2 (Th2); alm

disso, h desregulao na atividade microbicida dos neutrfilos, na fagocitose mediada

por macrfagos e na citotoxicidade mediada por clulas natural killer. Nveis reduzidos

de VA prejudicam a diferenciao celular, o tratamento e a recuperao de doenas

infecciosas (ROSS, 2009).

No desenvolvimento embrionrio, os retinides esto envolvidos na regulao do

desenvolvimento dos membros, sistema nervoso central, sistema cardiovascular,

ouvidos, olhos e sistema esqueltico. A DVA est relacionada a defeitos na crista

neural, retardo do crescimento intrauterino, baixo peso ao nascer e mortalidade

neonatal precoce (MORRISS-KAY, SOKOLOVA, 1996; ROSS, 2009).

20

No que se refere viso, a VA atua na retina, na transmisso de informaes ao

crtex visual do crebro e na manuteno da morfologia e funes celulares das

membranas conjuntivais e crnea. A VA liberada no lquido lacrimal mantm a

diferenciao celular e a integridade estrutural da crnea, que um tecido avascular.

Na DVA, a produo reduzida de muco pelas clulas globulosas das membranas

conjuntivais, leva ao ressecamento progressivo (xerose) da crnea e ao surgimento de

manchas de Bitot, geralmente no quadrante externo dos olhos. Ao contrrio da

ceratomalcea e da ulcerao, estas alteraes so reversveis com a instituio do

tratamento (ROSS, 2009).

Os carotenides interagem com radicais livres, atuando no controle de processos

inflamatrios em que so produzidos xido ntrico, perxido e peroxidonitrito. Vrios

estudos epidemiolgicos apontam para uma possvel associao entre a ingesto de

frutas e vegetais ricos em carotenides e risco reduzido de cncer e de doenas

cardiovasculares (MAYNE, 1996; ROSS, 2009; MAYNE, 2010).

1.2. Metabolismo da vitamina A

A VA obtida a partir da dieta na forma pr-formada (steres de retinil) ou de

carotenides de provitamina A. A eficincia da absoro da VA pr-formada elevada e

permanece alta mesmo com o aumento da ingesto, o que favorece a recuperao

rpida da DVA e faz parte da etiologia da hipervitaminose.

O mesmo no ocorre com os carotenides: se a ingesto aumenta, a eficincia

da absoro cai. Possuem baixa biodisponibilidade, com variao interindividual e

dependente do tipo de alimento e do processamento a que o mesmo submetido.

(ROSS, 2009).

Assim como os retinides, os carotenides podem existir em mltiplas formas

isomricas. Nos alimentos, a maior parte se encontra em formas all trans, mas

alguns contm formas cis (dependendo da forma de cultivo e do armazenamento dos

21

alimentos), que so absorvidas com menos eficincia, mas podem, em parte, sofrer

isomerizao a all-trans - carotenide no intestino (ROSS, 2009).

Na luz intestinal, a pr-vitamina A emulsificada formando micelas. Os steres

de retinil sofrem a ao de hidrolases (principalmente da lipase pancretica) no

intestino delgado liberando o retinol que absorvido passivamente pelos entercitos na

presena de sais biliares e gordura (ROSS et al., 2009; ROSS, 2009).

Os carotenides, diferente do retinol, no possuem protenas citosslicas ou

receptores nucleares especficos, e podem ser transportados por diversas protenas

plasmticas . Assim como o retinol, so tambm emulsificados e solubilizados em

micelas, para serem em seguida absorvidos pelos entercitos por difuso passiva.

So convertidos em retinol pela ao de enzimas de clivagem (principalmente a

monoxigenase) na mucosa intestinal. O primeiro produto da reao o retinal, que

pode ser reduzido a retinol (em sua maior parte) ou oxidado em cido retinico, que a

forma metabolicamente ativa nas clulas-alvo, com exceo da retina, onde o 11 cis-

retinal tem este papel (McLAREN, FRIGG, 2001; ROSS, 2009).

No interior das clulas intestinais, o retinol reesterificado pela ao da enzima

lecitina retinol aciltransferase (LRAT) que esterifica o retinol ligado a protenas de

ligao dos retinides (CRBP-I e CRBP-II). Trata-se da principal via de esterificao.

J a enzima retinol aciltransferase (ARAT) age apenas na presena de altas

concentraes de retinol e esterifica exclusivamente o retinol ligado CRBP-I (ROSS et

al.,2009; ROSS, 2009).

Os steres de retinil misturam-se a outros lipdios neutros para formarem os

quilomcrons e so transportados pelo sistema linftico intestinal para a circulao

sistmica. Nos casos de DVA, os steres de retinil no so detectados nos

quilomcrons, mas aumentam consideravelmente aps a administrao de altas doses

de retinol (ROSS et al., ROSS, 2009).

Os quilomcrons transportados pelo sistema linftico so conduzidos at ao

fgado, onde os steres de retinil so hidrolizados e captados no hepatcito por

endocitose. A seguir, a VA segue ou por uma via secretria ou por uma via de

armazenamento, dependendo do estado nutricional.

22

A VA a ser armazenada transferida na forma de retinol do hepatcito para

clulas hepticas estreladas, tambm chamadas de clulas de Ito, que contm o maior

pool concentrado de VA no fgado e se localizam no espao entre os capilares e os

hepatcitos. A VA reesterificada e armazenada em gotculas de lipdeo

citoplasmtico, sob a forma de palmitato de retinil (ROSS et al.,2009; ROSS, 2009)

Durante processos inflamatrios, as reservas das clulas de Ito so mobilizadas.

A diminuio do retinol srico e do cido retinico durante a inflamao pode levar

deficincia aguda de vitamina A (ROSS, 2009).

A VA armazenada como ster retinlico no fgado convertida em retinol e

liberada na corrente sangunea em propores equimolares (1:1:1) com duas protenas

sintetizadas pelo fgado: a protena ligadora de retinol (RBP- retinol binding protein),

sintetizada pelas clulas do parnquima heptico, e a transtirretina (TTR) (uma pr-

albumina), que estabiliza o complexo RBP-retinol para que atinja os rgos-alvo,

protegendo-o do metabolismo e da excreo pelos glomrulos renais. (MATTOS, 2007;

RONCADA, 2008; ROSS, 2009; WEFFORT, 2009).

O fgado rgo importante para a regulao da homeostase da VA no

organismo. A RBP e a TTR possuem meia-vidas curtas e seus nveis so mantidos

custa da sntese elevada. So sensveis s alteraes fisiolgicas e nutricionais e esto

reduzidas na inflamao e infeco, no trauma e na desnutrio energtico-protica

(ROSS, 2009).

Diante de DVA, a sntese de RBP mantm-se inalterada, porm a secreo de

holo-RBP prejudicada, com acmulo de apo-RBP nas clulas parenquimatosas. Se a

VA administrada, os nveis de mRNA da LRAT e a atividade heptica aumentam

progressivamente, sendo a holo-RBP rapidamente formada. Estes eventos so a base

fisiolgica dos testes de resposta a dose RDR (relative dose response), MRDR

(modified relative dose response) e +S30DR (serum 30-day dose response test), nos

quais o aumento dos nveis sricos de retinol ps-suplementao ocorre pela liberao

de retinol ligado RBP acumulada durante o estado de carncia e refletem as reservas

hepticas de VA (WHO, 1996; ROSS, 2009; FUJITA et al., 2009).

Nos tecidos, o complexo TTR-RBP-retinol liga-se a um receptor celular de

membrana, o receptor de RBP, e libera o retinol para dentro da clula-alvo. O retinol,

23

transformado em cido retinico, pode se ligar protena CRABP (cellular retinoic acid

binding) para ser liberada posteriormente ou ligar-se diretamente a receptores

nucleares, (RAR e RXR), que ativam os genes responsveis pelos efeitos da VA no

organismo (BAVIK etal, 1993; McLAREN; ROSS, 2009).

Parte da holo-RBP plasmtica filtrada pelos glomrulos. A RBP e a TTR se

ligam megalina, receptor presente na superfcie apical das clulas tubulares proximais

renais. Parte da RBP captada sofre transcitose transversal s clulas renais e outra

parte degradada no espao intracelular. Cada molcula de retinol pode ser reciclada

de sete a onze vezes entre o fgado, plasma, rins e outros tecidos. A RBP, por sua vez,

no reaproveitada. Os mecanismos de descarte da VA pelo organismo so bastante

limitados, em comparao capacidade de armazenamento o que favorece o acmulo

em nveis txicos quando a ingesto excede s necessidades (ROSS, 2009).

1.3. A linha do tempo da vitamina A

Documentos antigos, como os escritos de Hipcrates, comprovam que a

cegueira noturna era conhecida e tratada pelos gregos com fgado de animais. O papiro

de Eber, escrito no Egito h 3.500 anos, relata a xeroftalmia em um idoso (WOLF, 1978;

MAUMENEE, 1993; VASCONCELOS et al., 2007; SOMMER, 2008; ROSS, 2009).

David Livingstone, explorador da frica, descreve como a administrao de fgado

podia reverter a cegueira noturna e alteraes epiteliais (WOLF, 1996; GUNDERSEN,

BLOMHOFF, 2001).

Durante o sculo XIX, alteraes oculares caractersticas como a xeroftalmia e

queratomalcea foram observadas em escravos brasileiros, rfos e camponeses

durante a quaresma. Destaca-se o estudo do brasileiro Gama Lobo, publicado em

1865, com o relato de quatro crianas escravas com sinais e sintomas de DVA. Ele

associou o quadro a uma carncia nutricional antes mesmo da descoberta de qualquer

vitamina. Em 1860, Hubbenet, observando crianas de um orfanato, descreveu

24

alteraes metaplsicas oculares que ficaram conhecidas como as manchas de Bitot

(VASCONCELOS, 2007; SOMMER, 2008).

Datam da metade do sculo XIX as primeiras tentativas de associar as

deficincias oftalmolgicas carncia nutricional. No entanto, a era moderna de

pesquisa da VA teve incio em 1913, com as pesquisas de Osborne e Mendel na

Universidade de Yale e de Mccollum e Davis, na Universidade de Wisconsin. Eles

observaram a capacidade de lipinas (extradas de manteiga, ovos e leo de fgado de

bacalhau) promoverem a sobrevivncia de ratos alimentados com dietas em que a

banha de porco e leo de oliva eram fonte de gordura. A VA foi chamada de

lipossolvel A (MCCOLLUM; DAVIS, 1913; OSBORNE; MENDEL, 1913; ROSS,

2009).

Em seguida, Steenbock extraiu de vegetais amarelo-escuros uma frao lipdica

(mais tarde chamada de -caroteno) precursora da lipina hoje identificada como retinol

lcool lipdio. Posteriormente, entre as dcadas de 1920 a 1950, a DVA foi associada

xeroftalmia, diferenciao anormal dos tecidos e ao prejuzo das funes

imunolgicas; VASCONCELOS et al., 2007; ROSS, 2009).

Em 1928 a VA comeou a ser utilizada no tratamento de algumas infeces,

como sarampo. Os efeitos da DVA no crescimento e na defesa do organismo contra

outras infeces foram descobertos na dcada de 1930. As estruturas qumicas do

caroteno e da vitamina A foram determinadas entre os anos 1930 e 1932 (SOMMER,

2008).

Karrer et al. (1931, apud IUPAC-IUB JCBN) sintetizaram o retinol e determinaram

a estrutura do -caroteno, quase um sculo aps Wackenroder referir-se aos pigmentos

amarelo-alaranjados extrados de cenouras como carotenides. Arens e van Dorp, em

1946, sintetizaram o cido retinico e demonstraram sua capacidade de restaurar o

crescimento, mas no a viso de ratos. Wald determinou o papel da VA na viso

(ROSS, 2009).

Durante as dcadas de 1960 a 1980 foram descobertas as protenas envolvidas

no transporte e metabolismo do retinol e em 1987, Chambon e Evans relataram a

clonagem do primeiro receptor de retinide nuclear (ROSS, 2009).

25

Aps a Segunda Guerra Mundial, as formas graves da DVA sofreram drstica

reduo no nmero de casos em pases desenvolvidos, fazendo com que o interesse

dos pesquisadores destes pases diminusse pelo assunto. Porm, o interesse pelas

pesquisas sobre a vitamina A aumentou a partir de 1974, quando a Organizao

Mundial da Sade (OMS) e a U.S. Agency for International Development promoveram

um encontro de mdicos e nutricionistas em Jacarta, na Indonsia, no qual se discutiu a

associao entre o aumento da mortalidade e a xeroftalmia (WOLF, 1978; MAUMENEE,

1993; SOMMER, 1996; 2008; ROSS, 2009).

A partir da primeira metade da dcada de 80 do sculo XX, pesquisas visando

determinar a prevalncia da xeroftalmia demonstraram que a deficincia subclnica

leve de VA se relacionava maior mortalidade infantil. Desde ento, a xeroftalmia

considerada a ponta de um iceberg, representando uma pequena proporo de formas

graves em populaes em que formas subclnicas esto presentes em nmero

consideravelmente maior. Calcula-se que o nmero de crianas com DVA subclnica

seja cinco a dez vezes maior que aquelas que apresentam formas clnicas mais graves

(FAWZI et al., 1993; GLASZIOU, 1993).

Nos dias atuais, os estudos sobre a VA englobam desde programas de sade

pblica com o objetivo de erradicar a DVA at a pesquisa bsica, visando a utilizao

clnica do retinol em especialidades como a dermatologia e a oncologia (ROSS, 2009).

1.4. Aspectos epidemiolgicos da deficincia da Vitamina A

Considerada uma das carncias nutricionais mais prevalentes no mundo e

problema grave de sade pblica em mais de sessenta pases (RAMAKRISHNAN,

DARNTON-HILL, 2010), a DVA acomete cerca de trs bilhes de pessoas, dentre as

quais, 250 a 500 milhes so crianas (WHO, 2000). West Jr (2002) estima que 127

milhes de pr-escolares apresentem DVA, e 4,4 milhes, xeroftalmia clnica.

Em pases em desenvolvimento a forma clnica da DVA causa de cegueira e

aumento da morbidade e da mortalidade por doenas infecciosas, principalmente

26

diarria e sarampo (SACHDEVA et al, 2011). Uma metanlise que reuniu estudos sobre

vacinao contra o sarampo e suplementao simultnea com VA durante o tratamento

da doena, concluiu que a medida foi capaz de reduzir a mortalidade em at 62%

(SUDFELD; NAVAR; HALSEY, 2010).

Outra metanlise avaliou o impacto da suplementao de rotina com vitamina A -

uma das principais estratgias da OMS para o combate cegueira em pases em

desenvolvimento como preveno da cegueira causada pelo sarampo. Os estudos

includos no trabalho no foram conclusivos em afirmar que a suplementao capaz

de evitar a cegueira relacionada esta infeco viral (BELLO et al., 2011)

Nos pases em desenvolvimento, com freqncia a DVA est associada

desnutrio e carncia de outros microelementos. Gestantes, nutrizes, recm-

nascidos e pr-escolares so classicamente considerados grupos de risco, sendo alvo

de estudos e de programas que visam erradicao da DVA. Nos pases

desenvolvidos, a DVA est presente, em geral, na forma subclnica e relacionada

ingesto inadequada de retinol e carotenides em indivduos sem desnutrio aparente

(STEPHENS et al.; WHO, 1996).

A OMS considera a Deficincia de Vitamina A (DVA) um problema de sade

pblica com base na prevalncia regional de sinais oculares tradicionais de deficincia

grave (como a xerose da crnea e as manchas de Bitot) e em nveis de retinol sricos

inferiores a 0,70 mol/l. (DE PEE; DARY, 2002; ROSS, 2009; TANUMIHARDJO, 2010).

1.4.1. A prevalncia da DVA no mundo

Dois principais fatores causais esto relacionados DVA: o primeiro, a ingesto

inadequada de VA para satisfazer as necessidades orgnicas. O segundo, o sinergismo

entre episdios infecciosos e a carncia de vitamina A (MILAGRES et al., 2007).

Miller et al. (2002) acrescentam que crianas de pases em desenvolvimento

apresentam vrios episdios infecciosos durante a infncia, portanto, apresentam maior

consumo de vitamina A pelo catabolismo gerado por perda urinria e m absoro

27

intestinal. Tais crianas geralmente so amamentadas ao seio por mes que tambm

apresentam DVA e recebem, por isso, leite materno com baixas concentraes de

retinol.

Geraldo et al. (2003) citam as publicaes do Subcomit da Organizao das

Naes Unidas (ONU) que associam a DVA pobreza e natureza dos alimentos

disponveis, bem como s prticas alimentares das populaes.

Ramalho et al (2002) observaram que nenhum pas do mundo dispe de um

inqurito populacional que permita descartar a DVA como um problema de sade

pblica. Para comprovar os critrios clnicos definidos pela Organizao Pan-americana

da Sade (OPAS) e pela OMS para os diversos indicadores de deficincia de vitamina

A, os estudos necessitariam de amostras aleatrias que poderiam chegar a 4,4 milhes

de crianas, e poucos pases teriam condies tcnicas e financeiras de realizar tais

inquritos clnicos.

A prevalncia da DVA elevada na frica, sia e Amrica Latina.

Mora et al (1998), em reviso sobre a prevalncia de DVA entre pr-escolares na

Amrica Latina e Caribe, afirmaram que apesar dos efeitos da DVA serem bem

conhecidos desde a dcada de 60 do sculo XX, poucos esforos tm sido feitos para

combater a forma subclnica da doena. Eles encontraram taxas de prevalncia que

variavam de 6% no Panam a 36% em El Salvador.

Villalpando et al. (2003) encontraram a prevalncia de 25% dosando o retinol

srico de crianas mexicanas com idade at 12 anos e Castejon verificou a prevalncia

de 35,4% em crianas de 2 a 6 anos na Venezuela. Na Colmbia, Navarro et al. (1996)

observaram a prevalncia de 13,2% entre pr-escolares e Maslova et al. (2009), de

14% em 2811 crianas entre 5 e 12 anos em Bogot.

A DVA tambm tem sido encontrada na sia. Estudando escolares, Kathib

(2002), na Jordnia, e Singh e West Jr. (2004), no sudeste asitico, observaram

prevalncias de DVA de, respectivamente, 21,8% e 23,4%. Em outro estudo, Pedro et

al. (2004) observaram 38% de prevalncia em crianas de 1 a 5 anos de idade nas

Filipinas. Em um estudo do Distrito de Aligarh, estado indiano de Uttar Pradesh,

Sachdeva et al (2011) observaram que a xeroftalmia era um grave problema de sade

pblica entre crianas de zero a 60 meses de idade; os autores tambm observaram

28

que a prevalncia das manifestaes oculares aumentavam a medida que a idade das

crianas se elevava.

Na frica, Farbos et al (1995) encontraram 43,5% de prevalncia entre pr-

escolares no Mali e Kassaye et al verificaram 58,5% entre crianas de 6 a 9 anos na

Etipia. Dabon, Delisle e Receveur (2011), observaram 38,7% de prevalncia entre

649 escolares de idades entre 7 e 14 anos em Ouagadougou, Burkina Fasso.

1.4.2. Histrico e situao da DVA no Brasil

Em junho de 1865, os Annaes Brazilienses de Medicina, peridico editado pela

Academia Nacional de Medicina do Rio de Janeiro, publicou pela primeira vez a

comunicao cientfica "Da oftalmia brasiliana". Neste estudo, Gama Lobo relatou

quatro casos clnicos de deficincia de VA em crianas escravas com idade entre

dezesseis meses e seis anos de idade.

Alm de descrever minuciosamente os sinais e sintomas da deficincia

nutricional, o autor apontou sua etiologia, identificando um conjunto de fatores que

contribuam para a ocorrncia da doena. Demonstrando extraordinrio raciocnio

clnico, associou a doena a uma carncia nutricional especfica, em uma poca que

nenhuma das vitaminas havia sido descoberta (VASCONCELOS, 2007).

Segundo os critrios da OMS (WHO/UNICEF, 1994), o Brasil considerado rea

de prevalncia subclnica grave para a DVA. Uma reviso dos trabalhos sobre a

prevalncia de DVA, publicados no Brasil a partir da dcada de 60 do sculo XX, no

constatou a xeroftalmia e a cegueira nutricional como um problema de sade pblica no

pas. No entanto, cegueira noturna, manchas de Bitot e xerose conjuntival foram

relatadas entre as dcadas de 70 e 80, na regio nordeste. A reviso aponta ainda

grupos populacionais onde ocorre a forma subclnica da DVA, incluindo capitais, como

Rio de Janeiro e Recife e grandes cidades, como Campinas e Ribeiro Preto

(MILAGRES et al., 2002; GERALDO et al., 2003).

29

Prado et al. (1995) encontraram 44,7% de prevalncia entre lactentes e pr-

escolares com idade de 6 a 72 meses da zona rural do semi-rido do estado da Bahia.

Santos et al (1996) constataram que a DVA um problema grave de sade pblica em

municpios da mesma regio. Martins et al. (2004) verificaram 32,1% de nveis de retinol

insuficientes em 607 crianas entre 6 e 60 meses no ano de 1998, no estado de

Sergipe. Vasconcelos e Ferreira (2007), em um grupo de 652 crianas com menos de

60 meses de idade no estado de Alagoas, identificaram uma prevalncia duas vezes

maior do que o valor estabelecido pela OMS para considerar a DVA como problema

grave de sade pblica.

Na regio Norte, os dados so escassos. Alencar et al. (2002), estudaram uma

amostra de crianas entre 2 a 5 anos no estado do Amazonas e no encontraram sinais

clnicos, apesar de haver uma prevalncia de 25% de DVA subclnica.

Na regio Sudeste, Ramalho et al. (2001) registraram a prevalncia de 34,3% em

pr-escolares de 2 a 5 anos no municpio do Rio de Janeiro. Santos et al. (2005)

verificaram 29% na faixa etria de 6 a 14 anos no municpio de Cruzeiro Novo, Minas

Gerais. No estado de So Paulo foram observadas prevalncias que variam de 17,6%

em Campinas (GONALVES CARVALHO, 1995) a 30% em outros sete municpios

(SOUZA, 1998).

Em Ribeiro Preto, Favaro et al. (1986), estudando crianas com idades entre 2

a 8 anos, observaram 48,8% de prevalncia de nveis sricos de retinol considerados

deficientes. Neste mesmo municpio, mais especificamente na comunidade onde se

pretende desenvolver o presente trabalho, Ferraz et al observaram prevalncia de

21,4% em lactentes (2000) e de 74,5% de DVA em pr-escolares (2004); Custdio et al.

(2009) observaram prevalncia de DVA de 20,4% em escolares e Martins et al. (2010),

em trabalho que estudou o binmio me e filho, prevalncia de 66,1% de DVA

subclnica em lactentes aos 3 meses.

1.5. A deficincia de vitamina A em adolescentes

30

Os adolescentes no so classicamente considerados como grupo de risco e

no esto includos sistematicamente em estudos investigativos e nem em programas

de controle e combate DVA. Ross (1998) justifica a existncia de poucos estudos pela

diminuio das taxas de mortalidade absoluta na adolescncia. Olson (1984) no

observou casos de DVA ao dosar as reservas hepticas de retinol em autpsias de

adolescentes at 15 anos, que foram a bito por diversas causas.

Entretanto, Bloem (1996) apontou que a DVA entre adolescentes tem

implicaes em sade pblica no que se refere mortalidade e anemia e interroga o

impacto sobre a morbidade e crescimento.

Alguns estudos realizados na ltima dcada tm apontado carncia de vitamina

A entre adolescentes em diferentes pases (RAMALHO et al, 2004). Um estudo

transversal realizado entre meninas operrias em uma fbrica de roupas em

Bangladesh com idades entre 12 e 19 anos, (AHMED et al., 1997), observou que 56%

apresentavam nveis de retinol srico inferiores a 1,05 mol/l, sendo que 14%

apresentavam nveis abaixo de 0,70 mol/l, verificando associao positiva do consumo

de vegetais verdes escuros com o status de vitamina A.

Adolescentes entre 16 a 20 anos em Valncia, na Espanha, foram investigados

acerca de sua dieta habitual com evidncias de que o consumo de vitamina A era

inadequado para suprir as necessidades nutricionais, bem como de outros

micronutrientes. A adolescncia foi considerada pelo estudo como sendo perodo de

alto risco para carncia nutricional devido s alteraes de estilo de vida adotadas tais

como hbitos alimentares, fumo e consumo de lcool (FARR et al., 1999).

Neuhouser et al (2001) com base em dados do Third National Health and

Nutrition Examination Survey (NHANES III) encontraram baixos nveis de retinol srico

em adolescentes obesos entre 12 e 19 anos de idade quando comparados ao grupo-

controle de adolescentes sem obesidade; os autores destacaram a escassez de dados referentes a esta faixa etria.

Goyle e Prakash (2009) encontraram 49,1% de prevalncia de baixos nveis de

retinol em 111 meninas indianas entre 10 e 15 anos.

31

No Brasil, Ramalho et al (2004), estudando escolares e adolescentes na Favela

da Mar no Rio de Janeiro, observaram baixos nveis de retinol srico em 11,98% entre

escolares de 7 a 10 anos e de 7,92% em adolescentes com idade entre 10 a 17 anos.

Em Ribeiro Preto, estudo transversal realizado com adolescentes migrantes

cortadores de cana aos doze anos de idade evidenciou consumo insuficiente de

vitamina A e de outros micronutrientes na dieta, a partir de dados obtidos atravs de

inqurito nutricional. Observou-se que a mdia do consumo de vitamina A e outros

micronutrientes nesta populao eram equivalentes a dois teros do recomendado pela

FAO (Food and Agricultural Organization)/ WHO (DESAI et al., 1984).

Desse modo, novos estudos que ajudem a definir o perfil epidemiolgico entre os

adolescentes certamente contribuiro para a melhor compreenso da DVA nesta faixa

etria.

1.6. O diagnstico da DVA

A OMS (1996) props que o diagnstico da DVA possa ser feito por meio de

alguns indicadores, a saber:

- citolgicos: exame da impresso conjuntival;

-fisiolgicos: avaliando o comprometimento da viso com prova de adaptao

rpida ao escuro e tempo de restaurao da viso, avaliando a funo dos bastonetes

retinianos;

- dietticos: obtidos a partir de inquritos qualitativos e quantitativos;

- bioqumicos: dosagem de retinol srico e da protena ligadora do retinol (RBP)

no plasma ou na secreo lacrimal e os mtodos de resposta dose: RDR, MRDR e o

+S30DR (OLSON, 1991; WHO, 1996; FERRAZ et al., 2004; MATTOS et al., 2007;

MILAGRES et al., 2007; WEFFORT et al., 2009b).

A bipsia heptica o mtodo ideal de avaliao dos estoques de vitamina A no

organismo, porm eticamente impraticvel a sua utilizao para o diagnstico tanto

na prtica clnica quanto em populaes.

32

Uma alternativa a utilizao dos mtodos de resposta dose, que parte do

princpio de que a protena transportadora de retinol, a RBP, continua sendo produzida

e acumulada no fgado mesmo em situaes de DVA.

Quando administrada uma dose padro de retinol, o excesso de RBP

acumulado no fgado liberado sob a forma de holo-RBP (retinol ligado RBP).

Comparando os nveis sricos de retinol dosados antes e aps a suplementao com

vitamina A, observa-se um aumento superior a 20% na segunda amostra de sangue de

indivduos com DVA, causado pela liberao na corrente sangunea do excesso de

RBP (ligado em uma proporo equimolar com o retinol) acumulado no fgado.

Os mtodos de resposta dose, portanto, avaliam indiretamente as reservas

hepticas de retinol. Dentre eles, o RDR considerado o padro-ouro, identificando

deficincias marginais de vitamina A (RUSSEL, 1983; FLORES et al, 1984).

O exame consiste na dosagem de retinol srico em jejum, seguida

imediatamente pela suplementao com retinol, em geral na forma de palmitato. Aps

um perodo de cinco horas realiza-se novamente a dosagem de retinol. O aumento

igual ou maior do que 20% nos nveis de retinol srico na segunda coleta, quando

comparado primeira, indica reservas hepticas de vitamina A diminudas (FLORES et

al, 1984; FUJITA et al, 2009).

Flores et al (1984) sugeriram que o RDR pudesse ser utilizado em pesquisas de

campo para diagnosticar populaes em risco de DVA e para avaliar os resultados de

programas de erradicao. Estudando a prevalncia de DVA em 93 crianas com idade

entre um ano e meio e sete anos em Recife (PE), os nveis sricos de retinol em jejum

foram dosados antes da suplementao com 200.000 UI de palmitato de retinil e 30,

120 e 180 dias aps a administrao da referida suplementao, cuja dose

recomendada pela OMS para o tratamento da DVA.

Observaram um aumento significativo da mdia e da mediana aps 30 dias da

suplementao e em seguida, uma reduo a nveis prximos aos valores pr-

suplementao aps 120 dias e ainda menores aps 180 dias.

Baseado nestas observaes, o aumento nos nveis de retinol acima de 20%

aps 30- 45 dias da suplementao, na dose recomendada para o tratamento da DVA,

33

quando comparado aos nveis pr-suplementao, ocorre pela formao do complexo

holo-RBP e indica positividade ao exame +S30DR (FLORES et al, 1984; OMS, 1995).

O estudo de Flores et al (1984), levando em conta a observao de que o retinol

srico declinou aps 120 dias a nveis prximos aos da pr-suplementao, prope

ainda que o intervalo de administrao da suplementao de vitamina A ideal seja de

quatro meses, e ao invs do intervalo de seis meses habitualmente recomendado pela

OMS como intervalo entre as doses de tratamento da DVA.

1.7. Estratgias para controle da DVA

Dentre as estratgias para controle da DVA, incluem-se a suplementao pela

fortificao dos alimentos, como a do acar em El Salvador, Guatemala e Honduras

(MORA et al., 1998). A estratgia de suplementao com a vitamina A durante as

campanhas de imunizao tem sido adotada em diversos pases, inclusive no Brasil

(WHO, 1998; BRASIL, 2004).

No entanto, em um ensaio clnico duplo-cego realizado em Bangladesh, no foi

observada diferena nas mortalidades materno, fetal e infantil entre grupos de mes de

13 e 45 anos de idade que receberam palmitato de retinol ou -caroteno ou ainda,

placebo do primeiro trimestre de gestao at a 12. semana ps-parto (WEST et al,

2011).

O Banco Mundial lista esta medida como uma das intervenes mdicas de

maior custo-efetividade (WORLD BANK, 1994; RAMALHO, 2002). Sem a

suplementao, populaes de pases em desenvolvimento onde as fontes de vitamina

A so predominantemente de origem vegetal no so capazes de manter um status

adequado de VA (SOMMER, DAVIDSON, 2002; RAMAKRISHNAN, DARNTON-HILL,

2010).

Calcula-se que programas de interveno nutricional, ainda que no integrados a

outros programas em sade e nutrio, possam evitar, a cada ano, a morte de 2,5

milhes de crianas e salvar da cegueira nutricional irreversvel outras 500 mil. Estes

programas previnem ainda, a sndrome de deficincia imunolgica nutricional em quase

34

um bilho de pessoas, segundo prevalncia anual estimada (RAMALHO et al., 2002,

DE AZEVEDO PAIVA et al, 2010).

35

2. Justificativa da Proposio

Como j citado anteriormente, a DVA um problema de sade pblica no Brasil

e no mundo. Diante de seus efeitos adversos sade, torna-se urgente reconhecer

populaes de risco, a fim de se tomar decises efetivas no combate a esta carncia

nutricional. Poucos so os estudos na literatura nacional e internacional acerca da

prevalncia em adolescentes, visto que esta faixa etria no classicamente

considerada grupo de risco para DVA.

Estudos anteriores na comunidade onde ser realizado o estudo observaram

elevadas taxas de DVA entre lactentes e purperas (FERRAZ et al., 2000; MARTINS et

al. 2010), pr-escolares (FERRAZ et al., 2004) e escolares (CUSTDIO et al., 2009).

Diante desta realidade, levantou-se a hiptese de serem observadas importantes

taxas de DVA entre os adolescentes. Considerando que a quantidade de vitamina A

preconizada pela OMS para diagnstico da DVA atravs do teste +S30DR, apresenta

risco potencial de teratogenicidade e diante da impossibilidade em assegurar que

participantes do sexo feminino no estivessem grvidas no momento da coleta, bem

como de que no engravidariam nos cento e vinte dias seguintes ingesto do

palmitato de retinil, optou-se por avaliar o status da vitamina A exclusivamente entre os

adolescentes do sexo masculino desta comunidade (FLORES, 1984; GUILLONNEAU;

JACQZ-AIGRAIN, 1997; CHAGAS et al., 2003).

Desta forma, foi objetivo deste trabalho conhecer a prevalncia de DVA entre os

adolescentes do sexo masculino e estudar a possvel influncia de alguns fatores

clnicos e scio-demogrficos na DVA nesta populao.

36

3. Objetivo

3.1. Objetivo Geral

Estimar a prevalncia da DVA entre os adolescentes do sexo masculino da

comunidade atendida pelo CMSC Vila Lobato.

3.2. Objetivos Especficos

a) Estimar a prevalncia da DVA entre adolescentes do sexo masculino com

idade entre 10 anos completos e 19 anos incompletos, utilizando-se do

teste +S30DR (serum 30-day dose response test).

b) Avaliar o estado nutricional dos adolescentes participantes por meio de

medidas antropomtricas e sua associao com a DVA.

c) Verificar a influncia de variveis sociodemogrficas e clnicas sobre o

status das reservas de vitamina A dos participantes do estudo.

37

4. Casustica e Metodologia

4.1. Desenho do estudo

Trata-se de um estudo descritivo transversal de prevalncia.

4.2. Aspectos ticos

Todos os dados foram coletados aps esclarecimento dos objetivos e

procedimentos do estudo aos participantes e a seus pais ou responsveis legais, dos

quais foi obtido o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), aps a

consentimento da participao do adolescente no estudo.

O projeto foi submetido e aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa (CEP) do

Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto da Universidade de

So Paulo (processo HCRP n 6797/2009).

4.3. Local de estudo

Os dados foram colhidos entre adolescentes do sexo masculino da comunidade

atendida pelo servio de Pediatria do CMSC Vila Lobato, unidade de ateno primria

sade localizada no municpio de Ribeiro Preto (SP) e ligada Faculdade de Medicina

de Ribeiro Preto da Universidade de So Paulo (FMRP-USP), por um convnio

firmado entre o Hospital das Clnicas da FMRP-USP e a Secretaria Municipal de Sade.

4.4. Determinao da amostra

38

A amostra foi calculada levando-se em conta que a populao total de Ribeiro

Preto estimada pelo DATASUS (com base no censo do IBGE de 2000) para o ano de

2009 era de 563.107 habitantes. A proporo de adolescentes entre 10-19 anos de

idade no municpio era de 82.336 habitantes (14,62).

Estimou-se que a populao da rea abrangida pelo CMSC Vila Lobato para o

ano de 2009 fosse de 17.372 habitantes, segundo dados fornecidos pela Secretaria

Municipal de Sade, Diviso de Planejamento em Sade. Assim sendo, aplicando-se o

percentual de adolescentes entre 10-19 anos da cidade de Ribeiro Preto (14,62%) a

esta comunidade, obteve-se uma populao de 2.562 adolescentes.

O tamanho amostral foi calculado estimando uma prevalncia de DVA na

comunidade de 20% e em um valor de preciso de 5%; desta forma, chegou-se ao

nmero de 233 adolescentes; considerando ainda que a distribuio entre os sexos

mais ou menos igualitria (50% de homens e 50 % de mulheres), com pequenas

diferenas locais, a amostra calculada de 117 adolescentes do sexo masculino. Para

finalizar, foi adicionado 20% visando compensar provveis perdas, obtendo-se uma

amostra final de 140 adolescentes do sexo masculino.

A caracterizao social da populao local foi realizada por Ferraz et al. (2004),

observando que a renda per capta das famlias de US$ 115,21/ms (mediana US$

86,00/ms) e que 53,7% das mes e 58,7% dos pais no haviam completado o ensino

fundamental. Infere-se a partir destes dados que quase a totalidade da populao

objeto do estudo provavelmente freqenta as escolas pblicas da regio e, portanto, a

pesquisa foi tambm divulgada nestas escolas.

4.5. Critrios de incluso

A populao de estudo composta por adolescentes do sexo masculino (10

anos completos a 19 anos incompletos) residentes na rea atendida pelo CMSC Vila

Lobato e que no se incluam nos grupos descritos no item critrios de excluso deste

projeto.

39

4.6. Critrios de no incluso

Adolescentes do sexo masculino, portadores de doenas crnicas que

comprometam o estado nutricional.

Adolescentes do sexo feminino, devido ao risco potencial de teratogenicidade

causada por doses elevadas de retinol. Diante da dificuldade no apenas de excluir o

diagnstico de gravidez no momento em que ocorre a suplementao, mas tambm de

garantir que no ocorra concepo em um perodo de at 120 dias (perodo em que os

nveis de retinol retornam a valores prximos pr-suplementao), optou-se pela

realizao da pesquisa apenas em adolescentes do sexo masculino (FLORES, 1984;

GUILLONNEAU; JACQZ-AIGRAIN, 1997; CHAGAS et al., 2003) .

4.7. Critrios de excluso

Adolescentes que no compareceram segunda coleta de sangue foram

excludos do estudo.

4.8. Materiais e Mtodos

Seleo dos participantes. Os adolescentes do sexo masculino foram includos

medida que compareciam por demanda espontnea ao CMSC Vila Lobato e aceitavam

participar da pesquisa, aps a anuncia de seus pais ou responsveis legais. Eram,

ento, orientados a realizar a coleta de sangue, na data aprazada. A pesquisa foi

divulgada entre matriculados nas escolas estaduais da regio da rea atendida pelo

CMSC Vila Lobato, em Ribeiro Preto. Todos os participantes residiam na rea

geogrfica estudada.

Por meio da direo da Escola Estadual Professor Walter Ferreira estabeleceu-

se contato com os adolescentes da escola e com seus pais ou responsveis. Durante

reunies de pais e mestres, em palestras aos alunos e professores e por meio de

40

contatos telefnicos foram explicados aos pais ou responsveis legais pelo adolescente

os objetivos do trabalho e os procedimentos a que seriam submetidos os participantes

do estudo. Aqueles que concordaram com a participao do menor sob sua guarda

assinaram o TCLE aprovado pelo CEP, conforme especificado no item 4.2. deste

trabalho. Duas outras escolas da regio no permitiram a divulgao da pesquisa entre

os alunos.

Deteco da DVA atravs do mtodo +S30DR. O mtodo consiste na coleta de

uma amostra de sangue (5 ml) para dosagem dos nveis de retinol srico

imediatamente antes (T0) e outra, 30-45 dias aps (T1) a suplementao com 200.000

UI de palmitato de retinil (Arovit - Produtos Roche Qumicos e Farmacuticos)

administrados por via oral. As coletas foram realizadas no CMSC de Vila Lobato.

Para clculo do +S30DR, aplica-se a frmula (T1-T0/T1) x 100. Resultados

individuais 20% indicam baixas reservas hepticas de vitamina A (WHO, 1996). Todas as coletas de amostras de sangue para a dosagem do retinol srico foram

realizadas pela manh, aps jejum mnimo de 6 a 8 horas. Salienta-se que a dose de

palmitato de retinil utilizada para a realizao do teste segura, conforme estabelecido

pela OMS (WHO, 1996), e que efeitos colaterais so muito raros (BAHL et al., 2002).

Os efeitos colaterais mais comumente relatados so vmitos e cefalia que cedem

espontaneamente ou com uso de analgsicos comuns.

Ferraz et al (2003) relataram que 1,1% (2/188) dos pr-escolares apresentaram

episdios de cefalia (autolimitada, cedendo espontaneamente sem deixar seqelas

neurolgicas) referidos pelos pais at 24 horas aps a suplementao com a vitamina

A, aparentemente sem qualquer outra causa para o sintoma. Os resultados dos exames

foram informados aos pais ou responsveis em retorno posterior do adolescente

agendado na unidade de sade.

A dosagem dos nveis de retinol srico foi realizada pelo mtodo da

cromatografia lquida de alta peformance (high performance liquid chromatography -

HPLC), que preferencialmente recomendado pela OMS por apresentar melhor

sensibilidade e especificidade que outros mtodos, como a fluorescncia e a

espectrofotometria. A cromatografia baseia-se no princpio de que as molculas

possuem pesos moleculares e cargas eltricas de superfcie diferentes, e, portanto,

41

percorrem em tempos diferentes uma coluna contendo partculas eletricamente

carregadas (ARNAULD, 1991; CRAFT, 1996; WHO, 1996; GUNDERSEN, BLOMHOFF,

2001; FERRAZ, 2004; FUJITA et al., 2009).

A tcnica realizada seguiu o seguinte protocolo de determinao de retinol, alfa-

tocoferol e beta-caroteno em amostras biolgicas por HPLC2:

Dados tcnicos:

Coluna Tipo ODS (C18) de 25 cm por 4.6 mm

Fluxo de 1.0 ml por minuto

Fase mvel: Acetonitrila/Diclorometano/Metanol (70/20/10)

Deteco UV/Vis: Retinol = 325, -tocoferol = 292, -caroteno = 450

Preparo da amostra :

PLASMA: Pipetar 0,5 ml de soro ou plasma em 1 ml de etanol absoluto e agitar

bem. Pipetar em seguida 1 ml de n-hexano e agitar por 2 minutos. Centrifugar por 10

minutos. Retirar 0,5 ml do sobrenadante (n-hexano) e secar cuidadosamente sob

nitrognio. Ressuspender a amostra em 0,5 ml de fase mvel, agitar e injetar no HPLC.

Dados em mol/L.

O aparelho utilizado para a anlise das amostras foi um cromatgrafo Shimadzu

(Japan), modelo LC9, de coluna tipo C18 (OD5) (25 cm x 0,46 cm) que realiza a leitura

em um comprimento de onda de 325 nm da quantidade de retinol presente na amostra.

Tal quantidade dada por um pico num cromatograma e comparado com um padro

previamente j conhecido. O padro externo de retinol utilizado nas dosagens foi o da

marca Sigma (all-trans retinol). Alm da realizao da curva de calibrao com padro

externo, foram realizados testes de reprodutibilidade e de recuperao2, no sendo

utilizado padro interno (FERRAZ et al., 2003).

As amostras de soro foram descongeladas e foram retirados 500 l para a

dosagem do retinol srico pelo HPLC. Para iniciar a extrao das vitaminas

2 Procedimento utilizado no Laboratrio de Nutrio e Metabolismo da Faculdade de Medicina de

Ribeiro Preto, sob a coordenao do Prof. Dr. Alceu Afonso Jordo Jnior. 2 No teste de reprodutibilidade, a amostra a ser dosada quantificada vrias vezes no cromatgrafo. No

teste de recuperao, o padro externo e a amostra a ser dosada so quantificados juntos. Em ambos os testes, verifica-se se est havendo grande variabilidade entre as dosagens (Arnaud et al. Simultaneous

determination of retinol, -tocopherol and -carotene in serum by isocratic high-performance liquid chromatography. J. Chromatogr., Amsterdan, v.572, p.103-116, 1991).

42

lipossolveis, adicionou-se 1 ml de metanol, agitando-se em seguida. Para continuar a

extrao, adicionou-se tambm 1 ml de N-hexano, agitando a soluo por mais 2

minutos. A amostra foi centrifugada por 10 minutos a 5.000 rpm e, em seguida,

retiraram-se 0,5 ml do N-hexano (sobrenadante), onde estavam as vitaminas

lipossolveis e secou-se a mistura em vapor de nitrognio.

Para a leitura no HPLC, dissolveu-se novamente a mistura em 0,5 ml da fase

mvel - eluente que feito no prprio laboratrio (70% de acetonitrila; 20% de

diclorometano; 10% de metanol) - e injetou-se a soluo para a leitura pelo

cromatgrafo, j calibrado por uma mistura padro de retinol, a um fluxo de 2 ml/min e

mediu-se a quantidade de retinol na amostra num comprimento de onda de 325 nm,

sendo mostrado no cromatograma fornecido pelo aparelho como um pico naquele

comprimento de onda. O tempo total da corrida na coluna utilizada no cromatgrafo foi

de 7 minutos (3 minutos e 25 segundos para a sada do retinol).

Para se ter o resultado final do retinol srico, fez-se um clculo atravs da regra

de trs, tomando por base a dosagem prvia do padro usado (retinol puro). O limite

de deteco do mtodo de 0,016 mol/l (ARNAUD et al., 1991).

Dosagem da PCR. Para se estudar a possvel interferncia de processos

inflamatrios e/ou infecciosos nos resultados dos nveis de retinol, foram dosados os

nveis sricos de protena C reativa (PCR), protena sintetizada pelos hepatcitos,usada

como um marcador bioqumico de fase aguda de processos inflamatrios (WINKLES;

LUNEC; DEVERILL FILTEAU, 1993; VELSQUEZ-MELNDEZ, 1994b; FUJITA et al.,

2009).

Para tanto, durante a primeira coleta, uma alquota de 5 ml de sangue foi

destinada dosagem srica da PCR, totalizando um volume de 10 ml colhido na

primeira coleta. A dosagem foi feita pelo mtodo da turbidimetria (WINKLES et al.,

1987; LEDUE et al., 1989). Avaliao do estado nutricional. No momento da primeira coleta de sangue, as

medidas antropomtricas (peso e altura) foram aferidas para o clculo do indicador

estatura/idade e do ndice de massa corporal (IMC), e o estado nutricional foi

classificado segundo os pontos de corte propostos pela OMS (2007) e pelo SISVAN -

Ministrio da Sade (2008), conforme especificados nas tabelas 2 e 3.

43

Tabela 2 Pontos de corte de altura por idade estabelecidos para adolescentes:

Valores crticos Diagnstico Nutricional

< Percentil 3 < -2z score Baixa estatura

Percentil 3 -2z score Estatura normal

Percentil 97 +2z score Alta estatura

Tabela 3 - Pontos de corte de IMC por idade estabelecidos para adolescentes

As medidas antropomtricas dos adolescentes foram aferidas de acordo com as

normas da OMS (1995), pela pesquisadora ou por pessoal treinado do corpo de

enfermagem do CMSC Vila Lobato. Utilizou-se balana eletrnica digital da marca

Filizola com preciso de 100 gramas e antropmetro vertical de madeira com preciso

de 0,5 cm. Os participantes foram pesados e medidos com roupas leves e descalos.

Os participantes que apresentavam febre (T axilar 38 C, aferida com

termmetro) ou diarria (trs ou mais episdios de fezes amolecidas; fezes amolecidas

com presena visvel de sangue viso desarmada, independente do nmero de

episdios em um perodo de vinte e quatro horas - BAQUI, et al, 1991) em um perodo

de 15 dias anteriores da coleta da primeira amostra de sangue eram novamente

agendados para realizarem o exame quinze dias aps a resoluo do quadro. A

ocorrncia de tais eventos aps a primeira coleta no foi indicativo da suspenso da

coleta da segunda amostra de sangue.

Valores crticos Diagnstico Nutricional

< Percentil 3 < -2z score Baixo IMC para idade

Percentil 3 e < Percentil 85 Escore-z -2 e < Escore-z +1 IMC adequado ou eutrfico

Percentil 85 e < Percentil 97 Escore-z +1 e < Escore-z +2 Sobrepeso

Percentil 97 Escore-z +2 Obesidade

44

Entrevista. Realizada para verificar a possvel associao de indicadores

socioeconmicos e os nveis de retinol. A idade dos participantes foi calculada em

meses e classificada em menores de 14 anos (< 168 meses) maiores de 14 anos ( 168

meses) at 19 anos incompletos. . A cor da pele foi observada e categorizada em

branca, negra ou outra.

Para verificar a possvel associao entre o nvel de escolaridade dos pais com

a DVA, foi perguntado qual o ltimo ano da srie escolar cursado de forma completa e

com sucesso pela me, pelo pai ou pelo responsvel legal pelo adolescente. A resposta

foi categorizada em menos de oito anos completos com sucesso ou mais de oito anos

completos com sucesso.

A questo referente quantidade de pessoas moradoras no domiclio foi

categorizada em at quatro pessoas e mais de quatro pessoas. Acerca da soma dos ganhos de todos os moradores do domiclio, incluindo a

renda proveniente de salrios, penses, aluguis de bens ou imveis, tickets ou

bolsas fornecidas pelo governo. O montante foi categorizado em at trs salrios

mnimos e mais de trs salrios mnimos.

Vide apndice A.

4.9. Anlise estatstica dos dados

Para verificar a diferena entre as mdias dos valores de retinol pr e ps-

suplementao foi utilizado o teste t de Student. Na anlise dos fatores de risco para a

DVA, foi aplicada a metodologia de regresso logstica, obtendo-se medidas de risco

chamadas odds ratio (OR) e seus intervalos de confiana 95% (IC 95%).

O software utilizado foi o SAS 9.0.

45

5. Resultados

O clculo amostral estimava a participao de 140 adolescentes. A pesquisa foi

divulgada a um nmero consideravelmente maior, no apenas entre os atendidos

regularmente no CMSC Vila Lobato, mas tambm entre estudantes de escolas da

regio em que estudam moradores da rea, habitualmente atendidos em servios

ligados a planos de sade.

Cem adolescentes do sexo masculino concordaram em participar da pesquisa,

comparecendo primeira coleta. Seus pais ou responsveis autorizaram e assinaram o

TCLE.

Deste total, 20 no compareceram no tempo aprazado para a segunda coleta e

seus dados no foram includos no estudo. Da amostra prevista, previa-se um

acrscimo de 20% (resultando 140 participantes ao final) ao nmero calculado

inicialmente (117 adolescentes). A obteno de 80 participantes equivale a 68,4% da

amostra inicial.

Dos 80 adolescentes estudados, 43,8% (35/80) apresentaram teste +S30DR

indicativos de baixas reservas hepticas de VA.

A mdia dos nveis sricos de retinol pr-suplementao foi de 1,30 mol/l

(desvio-padro - DP - = 0,41). O valor mnimo pr-suplementao foi igual a 0,68 mol/l,

enquanto o mximo foi igual a 2,70 mol/l. O valor da mediana foi de 1,29 mol/l.

A mdia ps-suplementao foi igual a 1,54 mol/l (DP = 0,41), com os valores

mnimo e mximo ps-suplementao de 0,67 mol/l e 2,73 mol/l, respectivamente.

Houve diferena estatisticamente significante entre as mdias pr e ps-

suplementao (p

46

Grfico 1 Boxplot dos valores de retinol srico pr e ps-suplementao com 200.000 UI de vitamina A

de adolescentes do sexo masculino atendidos no CMSC de Vila Lobato (2009 -2010).

1.0

1.5

2.0

2.5

Perodo

Vita

min

a A

Pr Ps

47

Observa-se diferena estatisticamente significante entre as mdias dos nveis

sricos de retinol pr e ps-suplementao (1,30 mol/l e 1,54 mol/l, respectivamente;

p

48

Observou-se que o ponto de corte de 20 % possui 79% de sensibilidade e 69%

de especificidade, sendo o mais adequado para a populao estudada (NEWMAN et al,

2007).

Em relao distribuio das idades dos adolescentes, 62,5% (50/80) tinham

entre 10 e 14 anos e 37,5% (30/80) tinham mais de 14 anos, at 19 anos incompletos,

conforme exposto na Tabela 4.

Tabela 4 Caractersticas scio-econmicas dos adolescentes atendidos no CMSC de Vila Lobato (2009-2010)

Deficincia Vit. A

IC 95%

IC 95%

Sim No OR1* LI LS OR2** LI LS

IDADE 14 anos 17(34.00) 33(66.00) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref

> 14 anos 18(60.00) 12(40.00) 2,92 1,14 7,42

3,46 0,13 9,21

COR Branca 17(39.53) 26(60.47) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref

Negra 8(57.14) 6(42.86) 2,04 0,60 6,92

2,23 0,65 7,71 Outra 10(43.48) 13(56.52) 1,18 0,42 3,28

1,21 0,43 3,39

ESCOLARIDADE

ME

> 8 anos 19(44.19) 24(55.81) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref At 8 anos 16(43.24) 21(56.76) 0,96 0,40 2,33

0,96 0,40 2,36

ESCOLARIDADE

PAI

> 8 anos 15(39.47) 23(60.53) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref At 8 anos 17(48.57) 18(51.43) 1,45 0,57 3,67

1,53 0,60 3,93

Desconhece 3(42.86) 4(57.14) 1,15 0,23 5,88

1,26 0,40 9,87

N PESSOAS NO DOMICLIO

At 4 15(39.47) 23(60.53) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref Mais de 4 20(47.62) 22(52.38) 1,39 0,57 3,39

1,38 0,57 3,38

RENDA DA

FAMLIA

At 3 mnimos 24(46.15) 28(53.85) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref Acima de 3 11(39.29) 17(60.71) 0,76 0,29 1,92

0,79 0,31 2,02

* odds ratio; ** odds ratio ajustado pelo valor da PCR

49

Entre os participantes, 53,4% (43/80) eram brancos, 14,5% (17/80) eram negros

enquanto as categorias parda e amarela, somando 28,7% foram reclassificadas como

outras. No houve associao desta varivel com a DVA.

Observou-se quanto escolaridade dos pais dos adolescentes, que 53,7%

(43/80) das mes tinham mais de oito anos de estudos completados com sucesso e

46,2% (37/80) tinham at oito anos de escolaridade. Quanto aos pais, 47,5% (38/80)

tinham mais de oito anos de estudo e 43,7% (35/80), at oito anos de estudo

completos; trs participantes (3,7%) no sabiam informar a escolaridade paterna

(Tabela 4).

Em relao ao nmero de pessoas vivendo em um mesmo domiclio, viviam em

residncias com at quatro pessoas, 47,5%, (38/80) dos adolescentes; os demais,

52,5% (42/80), viviam em domiclios com mais de quatro pessoas (Tabela 4).

A renda familiar de 65,0% (52/80) dos adolescentes era inferior a trs salrios

mnimos e de 35,0% (28/80), superior a trs salrios mnimos mensais (Tabela 4).

A protena C reativa foi positiva em 5% (4/80) dos adolescentes com DVA e em

3,7% daqueles sem DVA. Foi negativa em 38,7% (31/80) dos participantes com DVA e

em 52,5% daqueles sem DVA.

Um dos participantes (1,25%) com DVA referiu ter apresentado diarria segundo

os critrios definidos neste trabalho dentro do perodo de 15 dias que antecederam a

coleta, no apresentando, porm, o quadro durante o exame (Tabela 5).

No houve relato de febre segundo a definio de critrios deste estudo pelos

adolescentes. (Tabela 5).

A classificao do estado nutricional mostrou que 65% (52/80) dos adolescentes

eram eutrficos, 17,5% (14/80) apresentavam sobrepeso e 17,5% (14/80) eram obesos

(Tabela 5).

Em relao aos dados antropomtricos, 90,0% (72/80) dos adolescentes

apresentavam altura normal para idade, enquanto 7,5% (6/80) apresentavam alta

estatura e 2,5% (2/80), baixa estatura (Tabela 5).

50

Tabela 5 Variveis clnicas e sua associao com a deficincia de vitamina A em adolescentes atendidos no CMSC de Vila Lobato

*Odds **Odds ratio ajustado pelo valor da PCR

Um dos participantes apresentou trs episdios de vmitos nas 24 horas

seguintes suplementao com vitamina A. Tratou-se de quadro autolimitado, sem

outras causas aparentes, que cedeu espontaneamente, no sendo relatado novamente

em consultas subseqentes. Durante o perodo, o adolescente fez uso de sais de

reidratao oral.

Para verificar se as variveis estudadas seriam fatores de risco para DVA nesta

populao, foi aplicada a metodologia de regresso logstica, obtendo-se o odds ratio

Deficincia Vit. A

IC 95%

IC 95%

Sim No OR1 LI LS OR2 LI LS

PCR < 0,5 31(42.47) 42(57.53) Ref Ref Ref

* * *

>= 0,5 4(57.14) 3(42.86) 1,80 0,37 8,66

* * *

DIARRIA

Sim 1(33.33) 2(66.67) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref

No 34(44.16) 43(55.84) 1,58 0,14 18,18

1,90 0,15 23,59

FEBRE

Sim 0(0.00) 0(0.00) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref

No 35(43.75) 45(56.25) * * *

* * *

Z-SCORE IMC

Eutrofia 23(44.23) 29(55.77) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref

Sobrepeso 7(50.00) 7(50.00) 1,26 0,39 4,11

1,09 0,31 3,84

Obesidade 3(30.00) 7(70.00) 0,54 0,13 2,32

0,52 0,12 2,26

Desnutrio 2(50.00) 2(50.00) 1,26 0,17 9,65

1,29 0,17 9,88

Z-SCORE ALT

Estatura normal 30(41.67) 42(58.33) Ref Ref Ref

Ref Ref Ref

Baixa estatura 1(50.00) 1(50.00) 1,40 0,08 23,28

1,47 0,09 24,47

Alta estatura 4(66.67) 2(33.33) 2,80 0,48 16,28

2,70 0,46 15,84

51

(OR) e seus respectivos intervalos de confiana com 95% de confiabilidade (IC 95%).

Os resultados so apresentados nas tabelas 4 e 5.

Cada varivel foi ajustada pela PCR, por ser esta varivel capaz de influenciar a

relao entre as demais e os nveis da vitamina A, tentando-se, assim, controlar o seu

efeito de possvel varivel de confuso.

Nenhuma das variveis analisadas se mostrou associada DVA. Ter mais de 14

anos mostrou associao maior chance de apresentar DVA, porm esta associao

no se manteve aps o ajuste pela PCR (Tabela 4).

52

6. Discusso

O objetivo deste estudo foi verificar a prevalncia de DVA utilizando o exame

+S30DR em adolescentes do sexo masculino com idades entre 10 anos completos e 19

anos incompletos, atendidos em uma Unidade Bsica de Sade.

Sabe-se que a DVA um importante problema de sade pblica nos pases em

desenvolvimento, contribuindo para o aumento da mortalidade e da morbidade,

principalmente por doenas infecto-contagiosas como sarampo e diarria. Nveis

sricos reduzidos de vitamina A associam-se tambm ao retardo do crescimento,

queratinizao de epitlios e comprometimento do sistema imune (WHO, 1996;

SOMMER; WEST, 1996; WEST JR.; 2002; BLACK, 2003; FERRAZ et al., 2004;

MINISTRIO DA SADE, 2009; DE AZEVEDO PAIVA, 2010).

Os adolescentes no so considerados como uma populao de risco para DVA

e poucos trabalhos na literatura estudam esta faixa etria. Alguns trabalhos

demonstram que os nveis sricos de retinol so maiores quanto maior a idade da

criana. Porm, sabe-se que durante a adolescncia h um aumento das necessidades

metablicas devido ao crescimento intenso, ao desenvolvimento dos caracteres sexuais

secundrios e da capacidade reprodutiva, fenmenos que aumentam o consumo de

vitamina A; em conseqncia variao hormonal, tambm h aumento da demanda

de vitamina A no sexo feminino durante o ciclo menstrual (LEWIS et al, 1990; BRABIN,

BRABIN, 1992; ZEFERINO et al, 2003).

A dosagem srica de retinol o mtodo recomendado pela OMS e o mais

utilizado em pesquisas para o diagnstico de DVA em populaes. Entretanto, os nveis

sricos de retinol sofrem influncia da quantidade de protena presente na dieta e do

mecanismo pelo qual a vitamina A reciclada pelo organismo durante o seu

metabolismo. Por se tratar de um nutriente de depsito, se mantm em nveis normais

mesmo em quadros iniciais de depleo.

Sabe-se que a dosagem srica de retinol apresenta boa correlao com as

reservas do organismo quando os resultados so inferiores a 0,70 mol/L ou superiores

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a 1,05 mol/L, porm tem valor limitado em diagnosticar a DVA em valores

intermedirios (UNDERWOOD, 1980; KELLEHER & LNNERDAL, 2001).

Visando contornar as limitaes da dosagem isolada do retinol, foram

desenvolvidos os mtodos de resposta dos nveis sricos aps a administrao de uma

dose padro de vitamina A. Estes mtodos, conhecidos como mtodos de resposta

dose, estimam indiretamente as reservas hepticas de vitamina A. Baseiam-se no

princpio de que a protena RBP, transportadora da vitamina A, continua a ser produzida

no fgado mesmo durante estados carenciais.

Diante da administrao de vitamina A, seja medicamentosa ou pela dieta, o

excesso de RBP liberado na corrente sangunea ligado ao retinol em concentraes

equimolares, promovendo um aumento dos nveis ps-suplementao quando

comparados aos nveis pr-suplementao (AMDE-MANESME et al., 1984; FLORES

et al., 1984; AMDE-MANESME et al.,1987).

Na comunidade em que foi realizado o presente estudo foi demonstrada

anteriormente a prevalncia de DVA em outras faixas etrias (FERRAZ et al, 2000;

FERRAZ et al, 2004; CUSTDIO et al, 2009; MARTINS et al, 2010).

Dos cem participantes que realizaram a primeira coleta, vinte no compareceram

segunda coleta. Utilizando o mtodo +S30DR, encontrou-se 43,75% (35/80) de

prevalncia de DVA entre adolescentes do sexo masculino. Observou-se ainda que

alguns participantes, mesmo com valores relativamente elevados de retinol srico pr-

suplementao, apresentavam resultados de +S30DR indicativos de DVA.

Dos 80 participantes do estudo, 56 (70%) tiveram valores de retinol srico pr-

suplementao acima de 1,05 mol/L. Dentre eles, 17 (30,3%) apresentaram o teste

+S30DR positivo, demonstrando que apesar do nvel srico ser considerado adequado,

eles ainda poderiam apresentar baixas reservas hepticas de vitamina A.

Observando-se que alguns adolescentes com nveis de retinol sricos normais

ainda apresentavam testes +S30DR compatveis com baixas reservas hepticas de

DVA