conversa entre godard e daney
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8/17/2019 Conversa Entre Godard e Daney
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Conversa: Jean-Luc Godard/Serge Daney
(a propósito das História(s) do Cinema )
Godard e Daney falando sobre as histórias do cinema. Dois olhares semelhantes
sobre a situação do cinema, mesmo objeto de estudo: o cinema enuanto
!histórico!. "m momentos, entretanto, #arece ue os dois falam l$n%uas diferentes,
ue desen&ol&em seu #ensamento #aralelamente, com #euenas bifurcaç'es
a#enas. "stilo um #ouco estranho, mas ue d uma idia da dimensão do
#ensmento contem#or*neo sobre o cinema e sua história.
+er%e Daney: oc- fa a história do cinema no momento em ue est claro #ara
&oc- ue essa #esuisa não se realiou, ou ue ela acabou, e ue os ensinamentos
ue ela #oderia ter sobre a &ida das #essoas, dos #o&os, das culturas não foram
absor&idos. /uando &oc- era mais didtico, uando &oc- acredita&a na
transmissão das coisas, de maneira mais militante, eu me diia ue &oc- tenta&a
sem#re reconduir as e0#eri-ncias ue #odemos ter atra&s de um filme na &ida
das #essoas, mesmo ue &oc- as im#usesse de forma muito dura. 1%ora, &oc- diria
ue im#oss$&el faer al%o assim, mesmo ue o cinema tenha tentado fa-2lo. 3,
então, somente a história de um fracasso ou um fracasso tão %randioso ue ainda
&ale a chance de recont2lo4
5ean26uc Godard: 1 felicidade não tem história...
+D: +e &oc- &- um filme de erto& hoje: ha&ia em sua obra hi#óteses muito
ori%inais, ue fieram dele um cineasta muito minoritrio. 1dmitamos ue isso foi
escondido #or +talin...
56G: 1t #or "isenstein. 7as suas dis#utas eram muito saud&eis. 8 #roblemas
&inha antes daueles ue os contaram: a lin%ua%em, a im#rensa. 9ão estamos
curados dessa l$n%ua, a não ser no momento em ue falamos uando estamos
doentes, e uando de&emos &er um bom analista (e h #oucos, da mesma forma
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ue h #oucos #ensadores bons). 8 fato de meu #ai ter sido mdico #ro&a&elmente
me conduiu a isso de forma inconsciente: dier ue uma doença sinusite j
monta%em. 8 cinema indica ue al%uma coisa #oss$&el se nós nos esforçarmos em
chamar as coisas #elos seus nomes. " o cinema era uma no&a maneira, &asta e
#o#ular, de chamar as coisas #elo nome. (...)
+D: etomo esse e0em#lo de erto&. H al%o no cinema ue tentou se dei0ar &er,
ue foi &is$&el, mas ue de#ois foi recoberto. 7as eles, os filmes, #ermanecem:
#oss$&el &er a fita de um filme de erto&. 1 coisa ue era #ara &er #or trs do filme
de erto& foi recoberta, mas de ualuer maneira #ermanece o objeto, ue
sobre&i&e a todas as leituras, a todas as não2leituras. " &oc-, o ue sente diante
desse objeto: admiração, tristea, melancolia4 oc- acha tudo isso bom4
56G: 8 cinema uma arte, e a ci-ncia tambm uma arte. 3 o ue eu di%o nas
minhas História(s) do Cinema. 9o sc. ;? milh'es de +@atch). 8ra, Alaubert conta ue esse
nascimento da tcnica (as telecomunicaç'es, os semforos) simult*nea B besteira,
a de 7adame o&ary. 1 ci-ncia tornou2se a cultura, lo%o, outra coisa. 8 cinema,
ue era uma arte #o#ular, deu nascimento B tele&isão, e isso #or sua #o#ularidade,
mas tambm ao desen&ol&imento da ci-ncia. 8ra, a tele&isão a cultura, ou seja,
comrcio transmissão, e não arte. 8 ue os ocidentais chama&am de arte se
#erdeu um #ouco. 7inha hi#ótese de trabalho em relação B história do cinema
ue o cinema o Eltimo ca#$tulo da história da arte de um certo ti#o de ci&iliação
indo2euro#ia. 1s outras ci&iliaç'es não ti&eram arte (isso não uer dier ue elas
não criaram), elas não tinham essa idia de arte li%ada ao cristianismo, a um só
deus. 9ão sur#reendente ue se fale muito da "uro#a hoje em dia: #orue ela
desa#areceu, lo%o, #reciso criar um ersatz Fcom#ensação, eui&alente. 9. do .,
como diiam os alemães durante a %uerra. em2se o maior trabalho em
desmembrar o im#rio de Carlos 7a%no e de#ois refaem2no... 7as isso só
concerne a "uro#a Central o resto, como a Grcia, não e0iste.
6o%o, o cinema arte #ara nós. 1lm disso, nós sem#re dis#utamos com
Holly@ood, e nós a censur&amos #or não se com#ortar como Durand2uel ou
1mbroise ollard com Canne, ou heo an Go%h com seu irmão. 9ós a
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censur&amos #or ter um #onto2de2&ista unicamente comercial, de ti#o cultural e
não art$stico. +ó a 9ou&elle a%ue disse ue o cinema americano era arte. ain
admitia ue 1 +ombra de uma DE&ida era um bom HitchcocI, mas não
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encontraria um in&esti%ador se #esuisasse o ue 7allarm fe no dia em ue
escre&eu esse te0to...
+D: 8 cinema tambm criou esse sentimento de #ertencimento ao mundo e at ao
#laneta, ue est #restes a desa#arecer com a comunicação. "u, uando ia ao
cinema, eu me era le&ado um #ouco como um órfão do social o filme (%raças B
monta%em, B narrati&a) me alça&a do social antes de me remeter a ele.
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+D: 7as a 9ou&elle a%ue foi a Enica %eração ue começou a faer cinema no
momento da che%ada da tele&isão. "ntão ela j #ertence aos dois mundos. 1lm
disso, o #ró#rio ossellini, ue e0erceu um #a#el muito im#ortante #ara a
9ou&elle a%ue, só deu esse #asso mais tarde.
56G: 1 história de ossellini a mesma ue a do Cristo... 1 mesma coisa com
enoir, ue filmou o Dr. Cordelier no momento em ue Claude erma faia
seus dramati*ues. 3ramos subju%ados #elo trabalho de enoir e incendi&amos
Claude arma.
+D: "ssa du#la herança da tele&isão muito interessante. 1 tele&isão francesa foi
constru$da em %rande #arte na continuação do cinema de *ua%it' "ran,aise, odramtico. ", ao mesmo tem#o, nos anos M?, certos %randes cineastas como
ossellini ou at mesmo como resson e ati, ue não trabalharam
necessariamente #ara a tele&isão, anteci#a&am o dis#ositi&o da tele&isão, &endo
ue eles #oderiam obter outros efeitos de %rande am#litude com uma memória do
cinema, ou seja, um filme. oc- era cr$tico e de#ois cineasta, e &oc- hesitou entre os
dois. 5amais hou&e discurso antitele&isão da #arte de cineastas como Nelles,
HitchcocI ou ati. Hou&e então um ti#o de incesto feli no começo, ue tornou2se
lo%o de#ois infeli.
56G: Jara retomar a ima%em da terra e do arado, di%amos ue eles eram ao
mesmo tem#o o asno e o boi... 3 #reciso não confundir o terreno e o instrumento: a
tele&isão não um terreno, ela um instrumento. 1 #artir do momento em ue o
instrumento torna2se o terreno, che%a2se B 1
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8 cinema, o romance, a #intura de ins#iração euro#ia fieram uma #arte das
coisas ue eles #odiam faer: a criança cresceu. "ntão a tele&isão não fe uase
nada e &isto seu uni&ersalismo e sua #o#ularidade, uma catstrofe em escala
mundial.
+D: 3 a #assa%em de al%o ue #odia ser uni&ersal a al%uma coisa ue &oltou a ser
&ilaresco... 6 na +u$ça, se a %ente li%a a tele&isão, &emos o ue acontece na !&ila
su$ça!, mas sabemos tambm o ue se #assa na !&ila italiana! ue est ao lado.
Cada um tem seus ritos, suas #articularidades... em2se o sentimento de um
en%randecimento enorme do terreno e de um arado #euenininho, ue &ai sem#re
no mesmo sentido. "nuanto o cinema tinha um terreno ue não era com#leto, um
terreno de e0#lorador, onde o ue ha&ia sido descoberto o ha&ia sido#essoalmente...
56G: Jara mim, isso se tornou mais claro uando #ercebi, de#ois de um certo
nEmero de anos, ue não se mostrou os cam#os de concentração. Aalou2se deles,
mas eles não foram mostrados. Jode ser #or causa da minha classe, da minha
cul#abilidade o moti&o #elo ual eu me interessei #or isso... Aoi o ue me mostrou,
#or e0em#lo, ue a nou&elle &a%ue não era um começo, mas um fim.
+D: +e o cinema #Ode e0#lorar e mostrar tanto, não foi #elos acontecimentos
inditos na história da humanidade: as duas %randes %uerras mundiais e os
cam#os4 1 Jrimeira Guerra 7undial modificou ra#idamente e com muita força a
lin%ua%em do cinema. Jenso em Gance, em Griffith, em idor, em aymond
ernard, ou em enoir, ue #artici#ou da %uerra como ca&aleiro... 1 #erce#ção do
mundo retornou como os cam#os, como as trincheiras.
56G: De#ois, hou&e dois sobressaltos: o neo2realismo italiano e a nou&elle &a%ue.
+D: +im, e eu #enso ue Aassbinder fecha esse sobressalto, tentando reconstituir
al%o ue não te&e ima%em, a 1lemanha do #ós2%uerra. (...) 8 ue hoje #recisar de
uma ima%em, nessa #aisa%em audio&isual ue se desenha, com a sociedade ue
mudou4
56G: 3 uma uestão ue eu me coloco comumente uando tento mostrarima%ens, pictures como diem os americanos. ento encontrar res#ostas,
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#rocurando saber ual era a uestão a essas res#ostas ue foram dadas.
3 #reciso não confundir a necessidade e o desejo. 9o fim do sc. ;
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De#ois, isso desa#areceu. +e %ostamos ainda dessa idia de cinema na tele&isão,
ue ainda resta uma lembrança disso, como uando os %re%os amam ou&ir as
histórias de Seus. 9ão temos mais nossa identidade, mas uando li%amos a
tele&isão, h um &a%o sinalinho ue tal&e tenhamos ainda uma. De#ois, os filmes
desa#arecerão da tele&isão.
+D: 1 1mrica um #a$s B #arte, ue continua a faer filmes reno&ando muito
#ouco os moldes de narrati&a e as formas. 3 um cinema muito formatado de uma
&e #or todas, desde o começo do cinema falado.
56G: 1 1mrica não tem história no mesmo sentido ue a China, a Jrsia ou o
"%ito. Contrariamente, ela est cheia de &rias #euenas histórias e, de re#ente,#ela &ia inconsciente da Jrimeira Guerra 7undial, de#ois muito consciente na
+e%unda Guerra, ela se a#oderou como um #ro#rietrio se a#odera de uma casa
#orue o locatrio morreu na %uerra.
+D: 1 es#ecificidade do cinema americano não est somente li%ada B identidade.
odo mundo se coloca essa uestão, os ja#oneses se #er%untam muito sobre isso
a%ora, e eles abandonam seu cinema. 9o caso dos americanos, o ue funciona
tambm a idia de ori%em: a "uro#a, uma #assa%em da $blia, um roteiro
#uritano, uma certa forma de narrati&a... 8 cinema #ermite &erificar se isso
funciona sem#re. "ssa idia de ori%ens funciona ainda mais na tele&isão. 7as a
"uro#a esta&a muito &elha #ara dier de onde ela &inha, e não foi forte demais
#ara dier o ue ela #odia in&entar. /ue im#licam como necessidade de ima%ens o
indi&idualismo, ou as conuistas sociais4 8 ue um indi&$duo es#era de ima%ens
ue não seriam, como as ima%ens #ublicitrias, ima%ens ue ser&em #ara esconder
outras, mas ue abririam #ara outro caminho4 "sse indi&$duo não seria maisescra&o da sala de cinema, mas ele seria um #ouco como &oc- hoje. 9ós estamos
todos l: ue faer com as ima%ens, j ue se tem a tend-ncia de consumi2las
soinho e de fa-2la ser&ir a objeti&os #essoais4
56G: oltamos B monta%em: em#re%a2se a #ala&ra ima%em, mas elas não são mais
ima%ens. +ó h relaç'es. 8s americanos, ue são mais #ra%mticos, utiliam essa
força. Lma ima%em jamais est soinha, ela chama uma outra. 8ra, hoje, o ue
chamamos de ima%ens são conjuntos de solidão reli%ados #elo dier ue , na #ior
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das hi#óteses, o de Hitler, mas ue nunca che%a a ser o de Dolto, de Areud, de
Nitt%enstein. 8s im#ressionistas (ue são alis muito #ouco amados, #oucas
#essoas t-m em sua casa re#roduç'es de 7onet ou de um #ote de flores de enoir)
ti&eram uma &isão, e o cinema nasceu tecnicamente mais ou menos na mesma
#oca. 1ntes, não ha&ia uma diferença tão %rande entre um ce%o e al%um ue &ia.
"u sem#re disse ue #ara continuar a faer filmes, eu #referia #erder meus olhos a
#erder a minha mão (...) 8s americanos diem pictures #ara as ima%ens e #ara as
foto%rafias, mas #ara os filmes eles diem movie. "les manti&eram a noção de
mo&imento, eles são mais corretos. " #ara a tele&isão, eles diem net3or4 , a teia
de aranha... "m todos os %randes filmes ue &imos de#ois de cem anos, as
dificuldades no trabalho eram o elemento motor do roteiro. 3 alis ainda o caso
nas sries, como Stars4y e Hutc5: um deteti&e trabalhando. 1s #essoas sem#re
uisera mostrar o trabalho, e ao mesmo tem#o elas sofrem. 1%ora, eles não %ostam
mais de seu trabalho. 1ntes, eles %osta&am. 8 ue eles não %osta&am era de serem
mal2#a%os. oc- encontra isso nos lu%ares mais desfa&oriados: um chofer de
Onibus %osta de seu Onibus, o ue ele não %osta são das condiç'es de trabalho.
Jede2se ue a ima%em trabalhe !B lToeil! FB &ista, mas literalmente uer dier !ao
olho!. 9. do ., não B #ala&ra. 8 franc-s interessante #or esses #asses de
m%ica... Joderia2se dier !trabalhar B mão!... !rabalhar o olho! uer dier não
trabalhar. 1 identidade est no embrião... 9ão se es#era mais re#resentaç'es do
real e, ao mesmo tem#o, não se es#era mais nada de si mesmo, e uerem fi%uras no
sentido em ue os #atinadores faem fi%uras.
+D: 3 o ue se diia ale%remente nos anos U?: abai0o a re#resentação, #ol$tica e
art$stica. 7as no cinema, sobre o ual &oc- hoje fa a história, era2se re#resentado
na tela, era #oss$&el ser tomado refm #elo filme, de#ois restitu$do ao mundo,enriuecido. 7as esta&a muito li%ado ao medo de ser tomado, e de#ois de ser solto,
e esta&a muito li%ado ao sujeito. 1s #essoas se faiam um ti#o de #sicanlise
sel&a%em &endo filmes. 7as não era uma re#resentação feita em nossa aus-ncia,
contrariamente ao ue se disse. Da&a2se um #asso ao lado, e olha&a2se soinho. Aoi
assim ue aconteceu o desdobramento do cinema moderno, ue tambm causou
im#asses, &erdadeiras loucuras. Coloca&a2se, com efeito, essas uest'es: ser ue
eu sou corretamente tomado como refm4 esses #rocedimentos são bons4 eu &ou a
al%um lu%ar assim4 7oraliou2se a #erce#ção de forma ue se era re#resentado
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#elos filmes. 7uitas &ees, inclusi&e, eles não #odiam funcionar sem nós. HitchcocI
foi uem fe isso melhor. De#ois #assou2se #ara um outro sistema, sobre o ual os
tecnocratas falam com uma %rande candura e uma %rande felicidade, #ois isso lhes
abre as #ortas de não sei ual #ara$so: a #artici#ação. Jarte2se do #rinc$#io de ue
temos uma relação interati&a com a ima%em, então ela não tem ue nos
re#resentar, ue não #recisamos &i%i2la, nem &er se ela trabalha o real. 9ão
estamos mais num #er$odo de %uerra e de medo, mas antes de #a (com o mundo
da tele&isão) e da an%Estia, e eu sou &isado como indi&$duo, e no melhor dos casos
como cidadão. /uando refletimos sobre a ima%em numrica, sobre a ima%em de
s$ntese, temos um estranho sentimento de ue as ima%ens #odem se auto%erar uma
as outras %raças a #ro%ramas (como a cissi#aridade, ou seja, ao in&s de faer um
filme como se fa um filho, de um ato se0ual, de amor, a ima%em se desdobraria
como um clone). 3 um mundo cada &e mais sinttico, como se hou&essem alçado
as fi%uras do mundo ue as circunda, como se hou&essem constatado ue a c*mara
filmasse não somente as fi%uras, mas tambm o ue ha&ia em &olta. 3 &erdade ue
certos cineastas trabalharam em #assar do detalhe ao conjunto. Hoje, #arece ue o
Enico objeti&o ter ima%ens ue trabalhem soinhas, e ue trabalhem como num
nEmero de tra#io: no &aio, de forma &aia, in vitro. 9ão se uer mais o meio2
ambiente. 8ra, meio2ambiente nossa relação com os outros, mas tambm com o
resto do mundo. Jor isso ele tornou2se tão tribal: a tele&isão não se ocu#a do resto
do mundo, d dele a#enas al%uns documentos. De fato, o ue me incomoda ue o
cinema moderno alçou a fi%ura humana, ad&ertindo o es#ectador ue ela tinha
sido destru$da, e ue o ne%ócio não era refi%ur2la mostrando heróis soberbos ue
sa$am dos cam#os. 1li, hou&e um atentado f$sico B ess-ncia humana soube2se disso
muito cedo, di%eriu2se muito tarde, e mesmo assim não com#letamente. Hoje
estamos num #er$odo em ue o cinema não #ode mais dar conta do meio2ambiente,seria muito im#ortante trabalhar essa uestão, ue #arece entretanto interessar a
todos os homens de #oder, os #ublicitrios, as #essoas de comunicação e da m$dia:
a%ora ue temos #ersona%eninhos sintticos alçados, em ue meio2ambiente
&amos coloc2los4 8ra, não h nenhum no momento... 3 a raão #ela ual um
filme como + 6rso ou 7mensid8o zu% obti&eram tamanho sucesso: eles contam a
história de #euenos es#cimes indi&iduados numa #aisa%em %rande demais #ara
eles. 1 #ublicidade, ue foi criticada #or ra'es morais um #ouco curtas,certamente e0erceu um %rande #a#el nesse sentido: ela nos habituou a &er
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sim#lesmente um #ersona%em, um cor#o #or &e. 8 ue ela &endia, um
desodorante ou 7arlboro, não faia nenhuma im#ort*ncia. 8 essencial era ue se
&ia a#enas um indi&$duo num não2meio2ambiente: um cu aul, uma #iscina... 1
uestão de refaer o meio2ambiente muito im#ortante, #orue não sabemos em
ue mundo o indi&$duo moderno &ai habitar. 9o momento, ele est soinho, e a
fi%ura dele est mais #ró0ima da e0#eri-ncias da 7%5a do Dr9 $oreau ou
de ran4enstein. 9ão se sabe muito bem como isso funciona, então a#lica2se esse
mimo num animal &iinho do homem, num mam$fero ue o urso. /uer2se ensinar
ao homem auilo com ue ele se #arece &endo de lado um animal ue se &este
como ele. Jrocura2se dier a ele ue sua história se #arece com a dele, mas não se
est &erdadeiramente certo. 3 essa dE&ida ue condu 5ean25acues 1nnaud,
muito cra#ulosamente, alis, a faer tanto o realismo como a truca%em. Jara mim,
tr%ico &er como, uando não se colocam mais as uest'es de monta%em, a
uestão da fi%ura, não necessariamente humana, ue se coloca. +e isso um #ouco
&erdadeiro, com#reende2se #orue &oc- se interessa #ela história do cinema,
#orue o cinema não se interessou nisso. "le, no momento do cinema falado,
sim#lesmente jo%ou um jo%o ue lhe fe estalar a %oela, flertando com as
#ro#a%andas ue cria&am es#cimes de su#er2homens.
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de 7atisse e um outro de Giotto, uase a mesma, e entretanto isso não im#ediu
7atisse de #intar #or toda sua &ida. (...)
+D: Gostaria ue &oc- descre&esse esses dossi-s im#ec&eis, de cores diferentes,
ue estão diante de &oc-. 3 a sua bateria de %uerra #ara faer a sua história do
cinema4
56G: +im, são classificaç'es, sub2classificaç'es. 1ntes, me diiam ue eu tinha ue
ler a ida de 6ittr, e de#ois a de Cu&ier... Jara &er como a idia de classificação
&eio a eles num momento dado. 3 tambm um #ouco o momento em ue 7ar0
mostrou a noção de luta de classes. 6o%o, minha história de cinema chama2se
#rimeiramente odas as Histórias. 3 um monte de #euenas histórias onde#odemos &er si%nos. De#ois, Lma História +ó, #orue a Enica história ue j
hou&e, e &oc- conhece a minha ambição: eu deduo ue a Enica história ue
tenha ocorrido, ue ha&er e ue não #ode ha&er outra. 3 meu lado de #roco de
aldeia. De#ois, h estudos #ontuais, cortes, como ata% 0e%eza, ue #arte da
lembrança do filme de +iodmaI, 0e%eza ata% (5e Great Sinner/+ Grande 1ecador ,
=QRQ), com 1&a Gardner, baseado em + Jogador , de Dostoi&sIi. 3 sobre o fato de
ue foram sobretudo %arotos ue filmaram %arotas, e ue isso tambm foi fatal
#ara essa história, #elo sim#les fato de uerer contar histórias. De#ois, h um
estudo mais #rtico ue eu chamei de $oeda do so%uto, baseado no t$tulo do
li&ro de 7alrau0 sobre arte. 3 uma anlise da cr$tica, #orue isso nunca foi feito.
"u sem#re fi o ue não feito. "ra at sistematicamente num momento: i&ette
fe isso, ohmer fe isso, Chabrol fe isso e, bem, eu tambm, eu faço o ue eles
não fieram. 1ssim, a %ente cobre o terreno. Jermaneci muito sartreano sob esse
#onto de &ista: o homem o ue ele fa, e o ue se fa dele. +ão cr$ticas &isuais, eu
ueria melhorar o ue eu j tinha feito num #ro%rama. omemos como e0em#lo a
%uerra: eis como um cineasta estim&el como VubricI mostra a %uerra, eis como
um documentarista cubano mostra a mesma %uerra, eis dois cinemas. 1$, eu #enso
ue &ou #e%ar =R 5uillet, ler tr-s das tuas frases sobre esse filme e &er como &oc-
#ode dier isso4 Jode2se descre&er dessa maneira4 9ão, a$ eu direi: o mal absoluto
#assou sobre +er%e #elo tem#o de um bater de asas. De#ois, .esposta das
revas mostra #orue foi a
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entendo muita coisa hoje: a idia ue o cinema de&eria ter conse%uido al%uma
coisa. 1 #intura num certo momento conse%uiu a #ers#ecti&a, ach conse%uiu um
certo nEmero de coisas em mEsica, o romance conse%uiu certas coisas, mas o
cinema de&eria e não #Ode, #ela a#licação da in&enção do cinema falado. /uando
&emos 1apa d
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os erros, e eu de&o sem dE&ida ser o #rimeiro a errar ao #ensar ue eu de&o
re#arar os errosK
+D: " a sua #resença f$sica de comentador nas tuas histórias4
56G: 3 #ara faer tele&isão. 1 #rimeira srie feita com t$tulos de li&ros, a
se%unda ser feita com t$tulos de obras musicais, #icturais, de#ois de #aisa%ens.
+D: /ue dossi- mais te deu trabalho4
56G: 9enhum. "u at fi a #rimeira srie sem consult2los. 3 o ue eu chamo de
arrebatamento. 9a tele&isão, não ue não haja trabalho, não h arrebatamento.
"ntão, o resultado como uma #artida de 6econte... Durante muito tem#o, eu fuidefeitista, eu meio ue critiuei um #ouco demais. "m momentos, eu tenho ciEmes
ao &er ue + 6rso tenha um tal sucesso. 7e fa bem &er ue +traub reclama de
mim #ela amar%ura nesse n$&elK "u fi certas histórias de casais, e se eu não fui
bem sucedido, tal&e #orue não hou&esse a boa fi%ura. 3 #reciso faer um
#ersona%em ue faça boa fi%ura. +e a ima%em de s$ntese che%asse hoje como
che%ou o cinema falado, eu acho ue eu #araria. "u tentaria um #ouco, eu não
conse%uiria, eu ficaria sem &ontade e #araria. "u não me sinto i%ual a essas #essoasue trabalham com muinas ue lhes #ermitem acreditar ue eles faem al%uma
coisa. 3 como o 7initel, dois anos de#ois, uando se tem #roblemas com a
namorada, o 7initel não ser&e #ara nada. "ntretanto, %osto muito das muinas.
/uando acabei as História(s) do Cinema, fui dier obri%ado a cada muina, at os
cli%notants. 9ão tenho rai&a dos ja#oneses #or ter feito muinas, eu tenho rai&a
deles #elo ue eles faem. /ue eles façam filmes em ima%ens de s$ntese, mas ue
eles não contm comi%o #ara escre&er o roteiro... Como di ostand, as teorias#assam, mas a rã continua...
raduido #or uy Gardnier
a #artir do #ublicado na edição M=P dos Cahiers du Cinema
Vindo de
http://www.contracampo.com.br/01-10/conversajlgsd.html
http://www.contracampo.com.br/01-10/conversajlgsd.htmlhttp://www.contracampo.com.br/01-10/conversajlgsd.html