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Controladoria-Geral da União Ouvidoria-Geral da União PARECER Referência: 99902.000720/2014-82 Assunto: Recurso contra decisão denegatória ao pedido de acesso à informação . Restrição de acesso: Sem restrição. Ementa: Associação civil solicita relatórios referentes a questões ambientais da construção da UHE Belo Monte – Meio Ambiente – A regra é a publicidade, o sigilo exceção – Sigilo bancário. Sigilo Comercial – Acata-se a argumentação do recorrente – Recurso conhecido e parcialmente provido - Recomendações. Indicar possibilidade de recurso. Órgão ou entidade recorrido (a): Caixa Econômica Federal - CEF Recorrente: I.R.N. Senhor Ouvidor-Geral da União, 1. O presente parecer trata de solicitação de acesso à informação com base na Lei nº 12.527/2011, conforme resumo descritivo abaixo apresentado: RELATÓRIO Data Teor Pedido 21/04/2014 Associação civil solicita as seguintes informações sobre a atuação da CEF no âmbito do contrato nº 391.115-37/12, envolvendo repasse de R$7 bilhões em operação indireta do BNDES para financiamento da Usina Hidroelétrica Belo Monte: “1) Cópia de Relatórios Gerenciais de Avaliação Socioambiental, e respectivo Plano de Ação, apresentados trimestralmente pela beneficiária Norte Energia S.A.; 2) Cópia dos Relatórios de Monitoramento Socioambiental de Atendimento aos Princípios de Equador, elaborados trimestralmente por consultor Socioambiental Independente; 3) Informe, com respectiva documentação, em conformidade com as determinações do Contrato no. 391.115-37/12 e dos Princípios do Equador, sobre as ações tomadas pela Caixa para garantir: a) que a Norte Energia, S.A. resolva tempestivamente os referidos problemas de inadimplência no cumprimento de condicionantes da LI 795/2011, inclusive no âmbito do processo nº 655-78.2013.4.01.3903, e b) o cumprimento da decisão do TRF-1, referente à Apelação Cível no. 0025999-75.2010.4.01.3900/PA.” 21

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Controladoria-Geral da UniãoOuvidoria-Geral da União

PARECER

Referência: 99902.000720/2014-82

Assunto: Recurso contra decisão denegatória ao pedido de acesso à informação.

Restrição deacesso:

Sem restrição.

Ementa: Associação civil solicita relatórios referentes a questões ambientais daconstrução da UHE Belo Monte – Meio Ambiente – A regra é a publicidade, osigilo exceção – Sigilo bancário. Sigilo Comercial – Acata-se a argumentação dorecorrente – Recurso conhecido e parcialmente provido - Recomendações.Indicar possibilidade de recurso.

Órgão ouentidade

recorrido (a):

Caixa Econômica Federal - CEF

Recorrente: I.R.N.

Senhor Ouvidor-Geral da União,

1. O presente parecer trata de solicitação de acesso à informação com base na Lei nº 12.527/2011,

conforme resumo descritivo abaixo apresentado:

RELATÓRIO Data TeorPedido 21/04/2014 Associação civil solicita as seguintes informações sobre a atuação da

CEF no âmbito do contrato nº 391.115-37/12, envolvendo repasse deR$7 bilhões em operação indireta do BNDES para financiamento daUsina Hidroelétrica Belo Monte: “1) Cópia de Relatórios Gerenciais de Avaliação Socioambiental, erespectivo Plano de Ação, apresentados trimestralmente pelabeneficiária Norte Energia S.A.; 2) Cópia dos Relatórios de Monitoramento Socioambiental deAtendimento aos Princípios de Equador, elaborados trimestralmentepor consultor Socioambiental Independente; 3) Informe, com respectiva documentação, em conformidade com asdeterminações do Contrato no. 391.115-37/12 e dos Princípios doEquador, sobre as ações tomadas pela Caixa para garantir: a) que aNorte Energia, S.A. resolva tempestivamente os referidos problemasde inadimplência no cumprimento de condicionantes da LI 795/2011,inclusive no âmbito do processo nº 655-78.2013.4.01.3903, e b) ocumprimento da decisão do TRF-1, referente à Apelação Cível no.0025999-75.2010.4.01.3900/PA.”

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Resposta Inicial 09/05/2014 “Prezado (a), I.R.N.,

1. Conforme solicitação através do E-SIC, site CGU, informamos que:

1.1. Sobre o Contrato de Financiamento nº 0391.115-37/2012, firmadocom a empresa NORTE ENERGIA S/A passamos a tecer asconsiderações a seguir elencadas.

1.2. Considerando que a LAI tem o escopo de levar a transparência ainformações, em sua maioria, de caráter público e, residualmente, decaráter privado, ao qual a Lei atribui um tratamento diferente sob oregime jurídico das informações a nível pessoal, como podemosobservar em seu Capítulo IV, Sessão V, que vem, via de regra,resguardando a informação pessoal.

1.3. Considerando que o Decreto nº 7.724, de 16/05/2012, queregulamenta a Lei de Acesso a Informação, nos diz em seu CapítuloII, art. 6º, inciso I: “Art. 6o O acesso à informação disciplinado nesteDecreto não se aplica: I - às hipóteses de sigilo previstas na legislação,como fiscal, bancário, de operações e serviços no mercado de capitais,comercial, profissional, industrial e segredo de justiça; e” (grifosnossos)

1.4. Considerando que as Sociedades Anônimas gozam de um regimeespecífico de sigilo comercial, não excluindo as demais hipóteseslegais de sigilo, em consonância com o disposto no Capítulo IV, artigo22, da Lei nº: 12.527, de 18/11/2011, que transcrevemos: “Art. 22. Odisposto nesta Lei não exclui as demais hipóteses legais de sigilo e desegredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentesda exploração direta de atividade econômica pelo Estado ou porpessoa física ou entidade privada que tenha qualquer vínculo com opoder público.”

1.5. Considerando que as informações solicitadas são atinentes apessoa jurídica de direito privado, que tem sua estratégia de mercadoprotegida pelo artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal, que foiestendida a pessoa jurídica de direito privado, conforme consta daSúmula 227 do STJ.

1.6. Levando em conta que a informação solicitada está abarcada porsigilo bancário, segundo pode-se verificar dos artigos 1º e 10º da LeiComplementar 105, de 10/01/2001, os quais transcrevemos: “Art. 1ºAs instituições financeiras conservarão sigilo em suas operaçõesativas e passivas e serviços prestados.” “Art. 10. A quebra de sigilo,fora das hipóteses autorizadas nesta Lei Complementar, constituicrime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatroanos, e multa, aplicando-se, no que couber, o Código Penal, semprejuízo de outras sanções cabíveis.”

1.7. Concluímos que não cabe a CAIXA, no âmbito da LAI, por meiodo SIC, manifestar-se sobre o Contrato de Financiamento nº:0391.115-37/2012, pois as informações solicitadas tratam de assuntosnegociais. Informa, ainda, que a relação da Caixa Econômica Federal,enquanto instituição financeira, sob a forma de empresa pública,vinculada ao Ministério da Fazenda, que integra o Sistema FinanceiroNacional, com o cliente bancário é fiscalizada pelo Banco Central doBrasil, cujos canais de atendimento, informações e reclamações sãoregulamentas pela autarquia mencionada.

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1.8. Colocamo-nos à disposição para as informações que se fizeremnecessárias.

2. Informamos que a CAIXA mantém SAC para informações,reclamações3. A CAIXA coloca-se à disposição através de seus canaisde atendimento.

Atenciosamente,

CAIXA - Serviço de Informações ao Cidadão”

Recurso à

Autoridade Superior08/07/2014

A demandante recorreu com base nos seguintes

argumentos:

“a) as determinações do Artigo 5º, inciso XXXIII, do Arti-go 37, §3º, inciso II e do Artigo 216, §2º da Carta Magna,que obrigam, aos órgãos públicos, inclusive instituiçõespúblicas financeiras, a possibilitar o acesso a dados de in-teresse público para qualquer interessado;b) que estes preceitos constitucionais, como também a Lei12.527/2011, estabelecem a necessidade de se adotar oprincípio do acesso público a informação como regra, e anegação da informação, sob a alegação de sigilo bancário,somente em casos excepcionais, em que existe um eviden-te risco de prejuízo para as partes envolvidas;c) que o referido princípio de prevalência da transparênciana gestão pública encontra pleno respaldo na jurisprudên-cia recente, a exemplo do Processo no. 0020225-86.2011.4.02.5101 (TRF2 2011.51.01.020225-7) em que oTRF-2 determinou o acesso público a todos os relatóriossolicitados ao BNDES pela Folha de São Paulo a respeitodo perfil social, econômico e ambiental de empreendimen-tos financiados, preservando apenas as informações bancá-rias e fiscais das empresas contratantes, ed) que as informações solicitadas sob o protocolo no.99902000720201482 tratam de aspectos sociais e ambien-tais de um empreendimento público, financiado com re-cursos públicos, sem a necessidade de divulgação de da-dos bancários ou fiscais das partesinteressadas; portanto, caracterizam-se como informaçõesde interesse público nos termos do artigo 3º, inciso II, daLei 12.527/2011, onde deve prevalecer o principio datransparência.”

Ademais, acrescentou que, eventuais informações bancári-as e fiscais de empresas contratantes nos documentos soli-citados podem ser suprimidas pela Caixa, sem comprome-ter a divulgação das demais informações de interesse pú-blico sobre o empreendimento.

Resposta do Recurso

à Autoridade

14/07/2014 A CEF repetiu os argumentos da resposta inicial e acrescentou que asinformações devem ser solicitadas à empresa Norte Energia S/A, jáque dizem respeito a um projeto sob responsabilidade dela. O recursofoi julgado por Rogério de Paula Tavares, do DESAN - DE

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Superior Infraestrutura e Saneamento.

Recurso à

Autoridade Máxima24/07/2014

A demandante repetiu os argumentos apresentados no seurecurso de 1ª instância.

Resposta do Recurso

à Autoridade

Máxima

29/07/2014O recurso foi indeferido por José Carlos Medaglia Filho, Vice-Presidente VIGOV - VP Governo, que ratificou osargumentos apresentados nas instâncias anteriores.

Recurso à CGU 08/08/2014 A demandante recorreu à CGU nos seguintes termos:

“1. A Caixa adotou uma interpretação distorcida do Decre-to 7.724/2012 e da própria Lei 12.257/2011, como tambémda Lei 105/2001, ao afirmar que restrições que visam pro-teger interesses privados (estratégias de mercado, assuntosnegociais, etc.) possam ser extrapoladas para negar infor-mações essenciais de interesse público, que tratam deestratégias de gestão de impactos sociais e ambientais so-bre recursos hídricos e outros bens públicos, como resulta-do da implantação de grande empreendimento de infraes-trutura, financiado com recursos públicos;2. Tal interpretação exacerbada contradiz, em primeiro lu-gar, determinações do Artigo 5º, inciso XXXIII, do Artigo37, §3º, inciso II e do Artigo 216, §2º da Carta Magna, queobrigam, aos órgãos públicos, inclusive instituições públi-cas financeiras, a possibilitar o acesso a dados de interessepúblico para qualquer interessado;3. Tais preceitos constitucionais, como também a Lei12.527/2011, estabelecem a necessidade de se adotar oprincípio do acesso público a informação como regra, e anegação da informação, sob a alegação de sigilo bancário,somente em casos excepcionais, em que existe um eviden-te risco de prejuízo para as partes envolvidas;4. As informações solicitadas sob o protocolo no.99902000720201482 tratam de aspectos sociais e ambien-tais de um empreendimento público, financiado com re-cursos públicos, sem a necessidade de divulgação de da-dos bancários ou fiscais das partes interessadas; portanto,caracterizam-se como informações de interesse públiconos termos do artigo 3º, inciso II, da Lei 12.527/2011,onde deve prevalecer o princípio da transparência;5. O referido princípio de prevalência da transparência nagestão pública encontra pleno respaldo na jurisprudênciarecente, a exemplo do Processo no. 0020225-86.2011.4.02.5101 (TRF2 2011.51.01.020225-7) em que oTRF-2 determinou o acesso público a todos os relatóriossolicitados ao BNDES pela Folha de São Paulo a respeitodo perfil social, econômico e ambiental de empreendimen-tos financiados,preservando apenas as informações bancárias e fiscais dasempresas contratantes;6. A posição da Caixa neste caso – ou seja, negação total

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de informações sobre a gestão socioambiental de um em-preendimento de infraestrutura pública, financiado com re-cursos públicos, que gera impactos sobre recursos hídricose outros bens públicos - é também incompatível com a Leide Informações Ambientais (Lei 10.650/2003);7. Por fim, a insistência em manter uma posição de nega-ção total de informações de interesse público com o perfildescrito, além das contradições já apontadas, traz gravesriscos para o efetivo cumprimento da Resolução BACENno. 4.327 de 25 de abril de 2014, que trata do estabeleci-mento e da implementação de Política de Responsabilida-de Socioambiental pelas instituições financeiras e demaisinstituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central doBrasil.”

2. Haja vista a necessidade de colher esclarecimentos adicionais sobre o caso, esta Controladoria

encaminhou solicitação à CEF em 05/09/2014, cuja resposta, recebida em 19/09/2014, segue

abaixo:

“1. Em atenção ao Pedido de Acesso à Informação nº:99902.000720/2014-82, que trata da Ocorrência Atender Caixa nº: 3312436,referente ao registro no e-SIC realizado pela INTERNATIONAL RIVERSNETWORK, a seguir passamos a transcrever as solicitações feitas por essaControladoria, assim como a tecer esclarecimentos que dizem respeito aoContrato de Repasse 391.115-37/12 firmado com a empresa NORTEENERGIA S/A. “...a) A CEF detém Relatórios Gerenciais de Avaliação Socioambiental,com seus respectivos Planos de Ação, previstos como obrigação da be-neficiária nas cláusulas 13ª e 14ª (LX, “q”), do contrato nº 391.115-37/12? Se sim, solicito a gentileza de encaminhá-los a esta Controlado-ria para que possamos avaliar a alegação de sigilo levantada pela Caixapara negar o acesso à informação....” RESPOSTA: Informamos que recebemos Relatórios de Monitoramento So-cioambiental Independente do Projeto UHE Belo Monte, contudo em virtu-de do Termo de Compromisso Contratual firmado entre esta CAIXA e aNORTE ENERGIA S/A estamos impedidos de fornecê-los segundo constade cláusula de confidencialidade contida no ora mencionado Termo. “...b) A CEF detém Relatórios de Monitoramento Socioambiental deAtendimento aos Princípios de Equador, elaborados trimestralmentepor consultor Socioambiental Independente, previstos na cláusula 13ªdo contrato nº 391.115-37/12? Se sim, solicito a gentileza de encaminhá-

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los à esta Controladoria para que possamos avaliar a alegação de sigilolevantada pela Caixa para negar o acesso à informação....” RESPOSTA: Comunicamos o recebimento do Relatório de Atendimentoaos Princípios do Equador do Projeto UHE Belo Monte apresentado pelaNORTE ENERGIA, contudo em virtude do Termo de Compromisso Con-tratual firmado entre esta CAIXA e a NORTE ENERGIA S/A estamos im-pedidos de fornecê-los segundo consta de cláusula de confidencialidadecontida no ora mencionado Termo. “...c) Haja vista que a comprovação da regularidade ambiental do Pro-jeto é uma obrigação da beneficiária no contrato de abertura de créditopara financiamento nº 391.115-37/12, a CEF tomou alguma ação para:I) garantir que a Norte Energia, S.A. resolva tempestivamente os referi-dos problemas de inadimplência no cumprimento de condicionantes daLI 795/2011, inclusive no âmbito do processo nº 655-78.2013.4.01.3903(Justiça Federal, Seção Judiciária do Pará); II) garantir o cumprimen-to da decisão do TRF-1, referente à Apelação Cível no. 0025999-75.2010.4.01.3900/PA....” RESPOSTA: Quando da contratação desta operação de crédito esta Institui-ção se preocupou em fazer constar do instrumento contratual obrigações quevisam manter a regularidade ambiental no Projeto Belo Monte, entre estas ocompromisso por parte da empresa de manter em plena validade as licençasambientais, de observar a Legislação Socioambiental, e, de estarem atentosaos padrões, critérios e diretrizes dos Princípios do Equador, para citar algu-mas destas obrigações. Além do cuidado demonstrado à época da contratação prosseguimos contan-do com a assistência prestada por nossa área de engenharia e, também, pelaconsultoria ambiental independente que nos fornecem os Relatórios de Mo-nitoramento Socioambiental, assim como nos informam sobre o andamentodas condicionantes da Licença Ambiental nº: 795/2011. Informamos, ainda, que o cumprimento de decisões judiciais é fator inerentea NORTE ENERGIA S/A, sendo esta a responsável perante o juízo, contudocaso tal ação ou omissão venha a implicar em alguma irregularidade ambi-ental estaremos acionando as medidas contratuais previstas visando o sanea-mento da inconformidade ou do descumprimento de obrigação existente. “...d) Caso as respostas ao item “c” sejam negativas, solicito que a CEFesclareça se decisões judiciais que estabeleçam obrigações à Norte Ener-gia S.A., decorrentes do descumprimento da legislação socioambiental,têm o condão de sobrestar os repasses previstos no contrato nº 391.115-37/12....”

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RESPOSTA: Reforçamos que esta CAIXA somente se pronuncia em açõesem que é parte, contudo, informamos, ainda, que se a empresa vier a des-cumprir a legislação socioambiental estaremos, dentro de nossa alçada, apli-cando o dispositivo contratual que prevê várias medidas inibitórias de talação dentre as quais podemos citar o sobrestamento do repasse.”

3. Como a recorrida alegou a existência de cláusula de confidencialidade que impediria a entrega

das informações demandadas, solicitou-se, então, o encaminhamento à CGU do Termo de

Compromisso Contratual firmado entre a CAIXA e a NORTE ENERGIA S/A, com a indicação

precisa do fundamento de validade legal da mencionada cláusula de confidencialidade, para

possibilitar a instrução adequada do recurso e garantir o pleno exercício das competências

decorrentes do art. 16 da Lei nº 12.527/2011. A resposta foi recebida em 29/09/2014, nestes termos:

“RESPOSTA:

1. Informamos no que tange ao Termo de Compromisso Contratual fir-mado entre esta CAIXA e a NORTE ENERGIA S/A estamos impedidos defornecê-lo segundo dever de confidencialidade, ao qual a CAIXA está obri-gada.

1.1 Conforme entendimento da área jurídica da CAIXA as informações so-licitadas a princípio por essa Controladoria e respondidas por meio de escla-recimentos enviados anteriormente, têm-se a impossibilidade jurídica deatendimento aos pedidos, pelos pontos a seguir elencados.

1.1.1 Os esclarecimentos solicitados por meio do expediente da Lei Nº:12.527/11 dizem respeito a operação financeira strictu sensu, compreendidaentre aquelas previstas na Lei Complementar nº: 105/01, do que decorre de-ver de sigilo legal, ou seja, os documentos solicitados estão atrelados e inte-gram uma operação financeira bancária, e, por via de consequência, acober-tados pelo disposto na referida Lei Complementar. 1.1.2 Observemos, ainda, a sujeição da operação ao regime jurídico pró-prio das empresas privadas, devemos estar alertas ao disposto na Constitui-ção Federal de 1988, no artigo 173, § 1º.

1.1.3 Tendo em vista a natureza sigilosa, sendo necessário registrar aprevalência, in casu, do princípio constitucional da intimidade privada, pre-vista na Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, inciso X, bem como daincidência direta da Lei Complementar nº: 105/01.

“EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUNAL DE CONTASDA UNIÃO. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. IMPOSSIBILIDADE.SEGURANÇA CONCEDIDA. O Tribunal de Contas da União, a despeito

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da relevância das suas funções, não está autorizado a requisitar informaçõesque importem a quebra de sigilo bancário, por não figurar dentre aqueles aquem o legislador conferiu essa possibilidade, nos termos do art. 38 da Lei4.595/1964, revogado pela Lei Complementar 105/2001. Não há como ad-mitir-se interpretação extensiva, por tal implicar restrição a direito funda-mental positivado no art. 5º, X, da Constituição. Precedente do Pleno (MS22801, rel. min. Menezes Direito, DJe-047 de 14.03.2008.) Ordem concedi-da.(MS 22934, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, jul-gado em 17/04/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-090 DIVULG 08-05-2012 PUBLIC 09-05-2012)

PENAL. RECURSO ESPECIAL. DOCUMENTOS NECESSÁRIOS PARAINSTRUIR AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONTRATOS DE MÚTUO. CAI-XA ECONÔMICA FEDERAL. RELAÇÕES JURÍDICAS ABRANGIDASPELO CONCEITO DE OPERAÇÃO FINANCEIRA. REQUISIÇÃOPELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ILEGITIMIDADE. NECESSIDADE DEAUTORIZAÇÃO JUDICIAL. JUSTIFICATIVA EFICAZ NÃO-CONFI-GURAÇÃO DO TIPO PENAL INSCRITO NO ART. 10 DA LEI 7.347/85.RECURSO ESPECIAL PROVIDO.1. Os contratos de mútuo firmados com a Caixa Econômica Federal estãoabrangidos pelo conceito de operação financeira que se extrai do § 1º do art.5º da Lei Complementar 105/01.2. O Ministério Público não possui legitimidade para requisitar documentosque impliquem quebra de sigilo bancário. Precedentes do STF.3. A justificativa eficaz para o não-atendimento à requisição do MinistérioPúblico afasta a configuração do tipo penal inscrito no art. 10 da Lei7.347/85.4. Recurso especial provido para restabelecer a decisão proferida pelo Juízode 1º grau.(REsp 633250/AM, Rel. Ministra LAURITA VAZ, Rel. p/ Acórdão Minis-tro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em21/11/2006, DJ 26/02/2007, p. 632) “

1.1.4 Observemos, também, o precedente dessa própria CGU que abordaquestão de sigilo em operação do FI-FGTS no NUP 99902.002140/2013-49,entendimento este que, mutatis mutandis, aplica-se à análise ora em tela:

“4. Impõe-se dizer que “segredo industrial”, por definição, consiste na infor-mação que não é nem pode se tornar uma informação de domínio geral, casocontrário não seria “segredo”. Tendo em vista o quesito da exploração daatividade econômica, o segredo industrial encontra guarida na necessidadede não informar à concorrência o “know-how de negócios” ou o “businessintelligence” que norteia, in casu, o processo de tomada de decisões de umaempresa estatal. Uma vez que a aplicação financeira de recursos do FGTS éa exploração direta de uma atividade econômica da Caixa Econômica Fede-ral – CEF, os laudos de avaliação que subsidiaram as decisões do Comitê deInvestimento merecem a devida restrição de acesso. Caso contrário, eventu-ais investidores e especuladores, conhecendo os pressupostos que afetaramo Comitê de Investimento no passado, poderiam se antecipar aos seus movi-

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mentos, vez que esses mesmos pressupostos tenderão a afetá-lo novamenteem decisões futuras. Tendo em vista o volume financeiro que compõe o FI-FGTS (cerca de 28 bilhões de reais), esse arcabouço certamente impactariao mercado acionário brasileiro. Desta forma, ao contrário do que o recorren-te alega, as informações confidenciais são críticas antes e também depois deos negócios estarem concretizados.

5. Por outro lado, há de se proteger inclusive a competitividade da recorridano mercado financeiro. O disposto no artigo 5º, § 1º, do Decreto nº7.724/2012, que regulamenta a Lei de Acesso à Informação, corrobora coma necessidade de resguardo das informações de empresas públicas que estãosubmetidas às normas pertinentes da CVM, com o intuito de não prejudicara competitividade das entidades públicas, conforme abaixo transcrito:

Decreto nº 7.724/2012

Art. 5º Sujeitam-se ao disposto neste Decreto os órgãos da administração di-reta, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as socieda-des de economia mista e as demais entidades controladas direta ou indireta-mente pela União.

§ 1º A divulgação de informações de empresas públicas, sociedade de eco-nomia mista e demais entidades controladas pela União que atuem em regi-me de concorrência, sujeitas ao disposto no art. 173 da Constituição, estarásubmetida às normas pertinentes da Comissão de Valores Mobiliários, a fimde assegurar sua competitividade, governança corporativa e, quando houver,os interesses de acionistas minoritários.”

1.1.5 Desta forma, assim como a Administração deve garantir amploacesso às informações de natureza pública, está obrigada também a protegera informação sigilosa, conforme se extrai da própria Lei 12.527/11:“...CAPÍTULO II

DO ACESSO A INFORMAÇÕES E DA SUA DIVULGAÇÃO

Art. 6º Cabe aos órgãos e entidades do poder público, observadas as normase procedimentos específicos aplicáveis, assegurar a: I - gestão transparente da informação, propiciando amplo acesso a ela e suadivulgação; II - proteção da informação, garantindo-se sua disponibilidade, autenticida-de e integridade; e III - proteção da informação sigilosa e da informação pessoal, observada asua disponibilidade, autenticidade, integridade e eventual restrição de aces-so. (...)Art. 22. O disposto nesta Lei não exclui as demais hipóteses legais de sigiloe de segredo de justiça nem as hipóteses de segredo industrial decorrentes daexploração direta de atividade econômica pelo Estado ou por pessoa físicaou entidade privada que tenha qualquer vínculo com o poder público.”

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4. Em mais uma interlocução, a CGU submeteu à apreciação da entidade recorrida o Parecer nº

3.454, de 01/09/2014, por meio do qual esta casa analisou pedido dirigido ao BNDES com objeto

semelhante ao deste recurso, considerado um importante precedente acerca da aplicação da Lei de

Acesso à Informação no que se refere ao cumprimento de obrigações socioambientais previstas nos

contratos de financiamento da Usina Hidroelétrica de Belo Monte. Contudo, em mensagem recebida

no dia 06/10/2014, a recorrida ratificou seu posicionamento contrário ao atendimento do pedido:

1 Em atenção ao Pedido de Acesso à Informação nº:99902.000720/2014-82, que trata da Ocorrência Atender Caixa nº: 3312436,referente ao registro no e-SIC realizado pela INTERNATIONAL RIVERSNETWORK, que solicita informações atinentes ao Contrato de Repasse391.115-37/12 firmado com a empresa NORTE ENERGIA S/A, informa-mos que esta Instituição se vê impossibilitada de fornecer as informaçõesem virtude dos motivos anteriormente mencionados, assim como devido aoTermo de Compromisso Contratual firmado entre esta CAIXA e a NORTEENERGIA S/A, onde consta cláusula de confidencialidade. 2 Ressaltamos, ainda, que esta CAIXA esta atenta e, caso venha a serde nosso conhecimento conduta praticada pela empresa que implique emdescumprimento da legislação socioambiental estaremos, dentro de nossa al-çada, aplicando o dispositivo contratual que prevê várias medidas inibitóriasde tal ação dentre as quais podemos citar o sobrestamento do repasse.

É o relatório.

Análise

5. Registre-se que o Recurso foi apresentado perante a CGU de forma tempestiva e recebido na

esteira do disposto no caput e §1º do art. 16 da Lei nº 12.527/2011, bem como em respeito ao prazo

de 10 (dez) dias previsto no art. 23 do Decreto nº 7724/2012, in verbis:

Lei nº 12.527/2011Art. 16. Negado o acesso a informação pelos órgãos ou entidades do Poder ExecutivoFederal, o requerente poderá recorrer à Controladoria-Geral da União, que deliberaráno prazo de 5 (cinco) dias se:(...)§ 1o O recurso previsto neste artigo somente poderá ser dirigido à Controladoria Geral daUnião depois de submetido à apreciação de pelo menos uma autoridade hierarquicamentesuperior àquela que exarou a decisão impugnada, que deliberará no prazo de 5 (cinco)dias.

Decreto nº 7724/2012

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Art. 23. Desprovido o recurso de que trata o parágrafo único do art. 21 ou infrutífera areclamação de que trata o art. 22, poderá o requerente apresentar recurso no prazode dez dias, contado da ciência da decisão, à Controladoria-Geral da União, quedeverá se manifestar no prazo de cinco dias, contado do recebimento do recurso.

6. Quanto ao cumprimento do art. 21 do Decreto n.º 7.724/2012, observa-se que consta da resposta

que a autoridade que proferiu a decisão, em primeira instância, era hierarquicamente superior à que

elaborou a resposta inicial, assim como também consta que a autoridade que proferiu a decisão em

segunda instância foi um dos vice-presidentes da empresa.

7. Trata-se de pedido de acesso aos Relatórios de Monitoramento Socioambiental Independente do

Projeto UHE Belo Monte e aos Relatórios de Atendimento aos Princípios do Equador do Projeto

UHE Belo Monte apresentados pela Norte Energia à CEF como obrigação decorrente do Contrato

de Abertura de Crédito para Financiamento mediante Repasse de Recursos do BNDES nº

391.115.37/12, celebrado entre a CEF, o Banco BTG Pactual S.A. e a Norte Energia S.A.

8. O banco se negou a atender ao pedido, em síntese, com base nos seguintes argumentos:

a) As empresas públicas estão submetidas às normas da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no

que se refere à divulgação de informações, conforme disposto no art. 5º, §1º do Dec. nº 7.724/2012;

b) As Sociedades Anônimas gozam de um regime específico de sigilo comercial;

c) As informações solicitadas dizem respeito a operação financeira e estão abarcadas por sigilo

decorrente da Lei Complementar nº 105/2001;

d) A existência de Termo de Compromisso Contratual firmado entre a Caixa e a Norte Energia que

contém cláusula de confidencialidade e impede a entrega das informações demandadas.

A) Da interpretação do art. 5º, §1º do Dec. nº 7.724/2012

9. As empresas públicas são pessoas jurídicas de direito privado sujeitas a regime jurídico

diferenciado, pois integram a Administração Pública e se submetem aos princípios norteadores da

atividade administrativa pública, tal como determina o art. 37 da Constituição Federal, bem como à

Lei nº 12.527/2011, por força do inciso II do seu art. 1º. Esse regime jurídico diferenciado as

coloca em uma situação peculiar no que se refere à promoção da transparência e à garantia do

direito fundamental de acesso à informação quando desenvolvem atividade econômica em um setor

de livre concorrência, já que a divulgação de determinadas informações pode colocá-las em uma

condição de desvantagem perante seus competidores privados. 211

10. Por isso, o art. 5º, §1º, do Dec. nº 7.724/2014 determinou que as empresas estatais federais que

atuam em regime de concorrência sujeitam-se às normas da CVM sobre divulgação de informações,

a fim de assegurar sua competitividade, governança corporativa e, quando houver, os interesses de

acionistas minoritários.

11. Como ponto de partida para esta análise, há que se ter em mente que a divulgação de

informações relevantes da vida das empresas, determinada pela CVM no exercício da sua atividade

reguladora, tem propósitos diversos daqueles almejados pela LAI. As intenções da CVM são,

dentre outras: assegurar o bom funcionamento do mercado de valores mobiliários; coibir fraudes ou

manipulações que criem condições artificiais de demanda, oferta e preço dos valores mobiliários

negociados no mercado; assegurar que o investidor tenha informações suficientes que o permita

negociar com os valores emitidos por uma companhia. O objetivo da LAI, por outro lado, é

assegurar o direito fundamental de acesso à informação, com vistas à promoção da transparência e

do controle social da administração pública. Logo, as normas da CVM não podem ser vistas como

determinantes da transparência ativa ou passiva das estatais. Elas formam um piso mínimo de

transparência, sobre o qual devem ser adicionadas novas informações sempre que assim exigir o

interesse público ou os direitos individuais. Quanto à interpretação do artigo 5º, §1º, do Dec. nº

7.724/2014, citamos ainda os ensinamentos de Cunha Filho e Xavier (2014)1:

Ainda sobre as empresas públicas, faz-se necessário tecer algumas considerações

adicionais sobre o art. 5º, §1º, do Decreto n. 7.724/12. Com fundamento neste dispositivo,

muitas empresas públicas têm se esquivado de franquear acesso a informações, alegando

ausência de regulamentação específica por parte da Comissão de Valores Mobiliários

(CVM). Algumas empresas estatais têm entendido que, não havendo norma da CVM que as

obriguem a divulgar as informações solicitadas, os pedidos de informação podem ser

negados, pois do contrário estariam recebendo um tratamento diferente dos demais

concorrentes, em prejuízo de sua governança e competitividade.

No entanto, o art. 5º do Decreto deve ser interpretado à luz da Constituição e da Lei

de Acesso à Informação, e não isoladamente, como tem sido feito por essas empresas

estatais.

De fato, a LAI regulamenta um direito fundamental, que, como tal, possui

aplicabilidade imediata, conforme disposto no art. 5º, §1º, CF. Ainda que seja lícito

argumentar que ausência de regulamentação impeça a plena efetividade dos direitos

fundamentais, de forma alguma é possível dizer que esse direito fundamental somente

começará a ter efetividade após a edição de norma regulamentar restritiva.

O art. 5º, § 1º do Decreto 7.724/12 estabelece que as empresas,sociedades de economia mista e demais entidades que atuam sob o regime

1 CUNHA FILHO, Marcio Camargo; XAVIER, Vítor César Silva. Lei de Acesso à Informação:teoria e prática. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2014.

212

de concorrência estarão submetidas às normas pertinentes da CVM;contudo, exige igualmente um juízo acerca de quais temas e situaçõespodem ferir a competitividade, a governança corporativa e os interesses deacionistas minoritários, só assim revestindo essas situações de sigilo.

A CVM, na verdade, atua visando a garantir que fatos relevantes desociedades abertas estejam disponíveis a todos no mercado de capitais a fimde dirigir os investimentos privados,2sem que apenas alguns investidorestenham acesso a informações privilegiadas. Em diversos normativos, a CVMdefiniu o que seria fato relevante e, consequentemente, aquilo que deverianecessariamente ser informado ao mercado.3 Com efeito, qualquer fato quepossa interferir na decisão do investidor deve ser divulgado pelas sociedadesabertas, o que justifica a possibilidade da própria CVM ser consultada (art. 7ºda Instrução Normativa n. 358/02).

É por isso que Orphão (2003, p. 85), ao analisar a evolução dosnormativos da CVM, assevera que “a finalidade precípua da legislação nãopode ser regular, de forma exaustiva, a divulgação de informações por partedas companhias, mas sim determinar quais as informações mínimasobrigatórias e fornecer diretrizes às companhias quanto ao restante dasinformações que devem ser divulgadas”.

É consenso que o rol de informações públicas fixado pela CVM nacondição de fato relevante não é exaustivo (Orphão, 2003, p. 55), tendocaráter meramente exemplificativo. Isso porque as empresas podem divulgaroutras informações espontaneamente se quiserem, o que garantiria umaimagem de confiança e seriedade da administração, nos termos do Parecer deOrientação 29/96 da CVM.4 Desse modo, a CVM pode prever, por meio deatos normativos próprios, as informações que necessariamente devem serdivulgadas em transparência ativa, não possuindo competência, contudo,para estabelecer a proibição de divulgação de quaisquer informações pelavia da transparência passiva. Interpretação em sentido diferente seria atribuiruma competência não prevista em lei para a CVM.

Por outros termos, a regulação da CVM possui um escopo importante,mas não exaure as situações de publicidade da informação. Neste sentido,não é razoável supor que a CVM regulará exaustivamente todas as hipótesesde sigilo de informações e tampouco determinará taxativamente a totalidadedo que pode ou deve ser fornecido pelas empresas ou entidades submetidasao seu regulamento, já que exceções de publicidade dependem de previsãolegal. Então, são justamente as informações que não estão na lista da CVMque podem ser solicitadas pela via da transparência passiva. Tampouco sepode presumir que a publicação de informações fora dos parâmetrosestabelecidos pela CVM será prejudicial à atuação das empresas estataissujeitas ao regime de concorrência.

(...) De fato, o art. 5º, § 1º do Decreto 7.724/12 estabelece que asempresas públicas, sociedades de economia mista e demais entidades que

2 “A divulgação e a credibilidade da informação são consideradas vitais para o bom funcionamentodos mercados financeiros que não têm outra forma de atrair os investidores que não sejapossibilitando que eles escolham seus investimentos com todo o conhecimento dos títulos nos quaisirão investir” (Rontchevsky apud Orphão, 2003, p. 86).3 Nesse sentido, vide Nota Explicativa 28 de 08/02/84, Instrução 202/93, Parecer de Orientação 29/96e Instrução 358 de 03/01/02, esta ainda vigente. 4 Disponível em http://www.cnb.org.br/CNBV/pareceres/par29-1996.htm , acesso em 08 de junho de 2014.

213

atuam sob o regime de concorrência estarão submetidas às normaspertinentes da Comissão de Valores Mobiliários; contudo, o decreto tambémexige um juízo de quais temas e situações podem ferir a competitividade, agovernança corporativa e os interesses de acionistas minoritários, só assimrevestindo essas situações de sigilo.

Por outros termos, o que se evidencia é que a falta de determinação dedivulgação por parte da CVM não pode servir de justificativa genérica,formal e abstrata para a negativa a todo e qualquer tipo de informação (...)Ou seja, não se pode presumir que as informações não listadas pela CVMnecessariamente irão prejudicar as estatais, devendo essa análise ser feita nocaso concreto a partir de uma ponderação de valores públicos e privadosenvolvidos. (...) Somente dessa forma garante-se a interpretação extensivade um direito fundamental, ao qual a hermenêutica veda a possibilidade dainterpretação restritiva (...)

O dever de guardar reserva sobre os negócios previstos na Lei de Sociedades

Anônimas não conflita com o dever de disponibilizar informações. Nesse sentido, a própria

Lei prevê o dever de prestar informações em seu art. 157, dentre outros. Ora, não é,

portanto, a disponibilização de qualquer informação que causa risco a uma empresa; ainda,

se a informação é disponibilizada a todos, não há como um particular auferir vantagem em

relação aos demais investidores. Por isso, tentando igualar o acesso às informações no

mercado de ações, a CVM estabelece em sua Instrução Normativa n. 480, de 7 de dezembro

de 2009 algumas informações de caráter público e ostensivo que necessariamente devem

ser publicadas.

12. Registre-se, portanto, que o entendimento da CGU acerca do disposto no §1º do art. 5º do Dec.

nº 7.724/2012 não corresponde à alegação das empresas estatais de que estariam desobrigadas a for-

necerem informações cuja publicidade não fosse objeto de determinação específica por parte da

CVM, conforme o precedente firmado no Parecer nº 3.778, de 26/09/2014 (NUPs

99901.000706/2014-99, 99902.001015/2014-01 e 99909.000123/2014-98). Há que se entender o

§1ºdo art. 5º do Dec. nº 7.724/2014 como um parâmetro de análise: diante de demandas de acesso à

informação dirigidas às estatais que atuam em regime concorrencial, é preciso levar em conta se a

informação requerida tem potencialidade para, se divulgada, prejudicar a competitividade, a gover-

nança coorporativa e os interesses de acionistas minoritários. No caso em exame, a CEF não de-

monstrou de que modo da publicidade dos relatórios demandados afetaria sua atividade comercial.

B) Do sigilo bancário e comercial

13. Inicialmente, no que se refere à alegação de sigilo, há que se considerar que eventuais dados

bancários ou financeiros constantes dos relatórios demandados não os tornam sigilosos na sua inte-

gralidade. Nos termos do art. 4º da LAI, não há que se confundir a informação sigilosa que porven-

tura possa existir nos documentos pleiteados com os documentos propriamente ditos. Em outras pa-

214

lavras, um documento é a unidade de registro de diversas informações, sendo que a existência de in-

formações sigilosas não tem o condão de torná-lo sigiloso na íntegra. É por isso que a LAI dispõe,

no §2º do seu art. 7º que:

Art. 7º(...)§ 2º Quando não for autorizado acesso integral à informação por ser elaparcialmente sigilosa, é assegurado o acesso à parte não sigilosa por meiode certidão, extrato ou cópia com ocultação da parte sob sigilo.

14. Nesse sentido, determinou o STF, em reclamação apresentada pelo BNDES contra a Folha de

São Paulo, a concessão de liminar em favor do jornal, a fim de que fosse realizada a entrega de rela-

tórios de análise do banco com as informações submetidas ao sigilo bancário tarjadas. O Supremo

entendeu que “a negativa generalizada de fornecimento dos referidos relatórios, mesmo com relação

às partes que não contenham informações abrangidas pelos sigilos fiscal e bancário, atentaria, sem

sombra de dúvidas, contra o direito à informação e a liberdade de imprensa”.5

15. O sigilo bancário tem por fundamento o resguardo da intimidade e da vida privada, valores con-

sagrados no art. 5º, X, da Constituição Federal. Em sua decorrência, cabe aos bancos guardar discri-

ção acerca dos dados econômicos e pessoais de seus clientes, custodiados em razão da prestação de

serviços bancários. Assim, a princípio, as informações abrangidas pelo sigilo bancário não podem

ser divulgadas pelas instituições financeiras. No entanto, nem toda informação produzida ou custo-

diada por instituições financeiras é acobertada pelo sigilo. Este se aplica somente a dados direta-

mente relacionados a operações de natureza financeira, como as exemplificadas no §1º do art. 5º da

LC nº 105/20016:

§1º Consideram-se operações financeiras, para os efeitos deste artigo: I – depósitos à vista e a prazo, inclusive em conta de poupança; II – pagamentos efetuados em moeda corrente ou em cheques; III – emissão de ordens de crédito ou documentos assemelhados; IV – resgates em contas de depósitos à vista ou a prazo, inclusive de pou-pança;

5 Supremo Tribunal Federal. “Ministro Ricardo Lewandowski garante acesso da Folha a relatórios do BNDES”. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=261147.6 Cunha Filho, Marcio Camargo; Xavier, Vítor César Silva. Lei de Acesso à informação: teoria e prática. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2014. p. 233.

215

V – contratos de mútuo; VI – descontos de duplicatas, notas promissórias e outros títulos de crédito;VII – aquisições e vendas de títulos de renda fixa ou variável; VIII – aplicações em fundos de investimentos; IX – aquisições de moeda estrangeira; X – conversões de moeda estrangeira em moeda nacional; XI – transferências de moeda e outros valores para o exterior; XII – operações com ouro, ativo financeiro; XIII - operações com cartão de crédito; XIV - operações de arrendamento mercantil; e XV – quaisquer outras operações de natureza semelhante que venham a serautorizadas pelo Banco Central do Brasil, Comissão de Valores Mobiliáriosou outro órgão competente.

16. Diante disso, cabe examinar se as informações buscadas por meio deste pedido de acesso dizem

respeito a dados bancários ou financeiros da empresa Norte Energia custodiados pela CEF. O Con-

trato de Repasse 391.115.37/12 prevê, na cláusula 13ª, dentre as obrigações socioambientais a se-

rem cumpridas pela beneficiária (Norte Energia), a contratação de consultor ambiental independen-

te, que deve apresentar, trimestralmente, a partir de 2013 e durante todo o período do financiamen-

to, Relatórios de Monitoramento Socioambiental de Atendimento aos Princípios do Equador,

com o resultado da averiguação de regularidade socioambiental do projeto da UHE. Tal relatório

deve ser elaborado após vistoria de campo e com base no Relatório Gerencial de Avaliação Socio-

ambiental, a ser emitido trimestralmente pela Norte Energia.

17. A CEF é uma instituição financeira signatária dos Princípios do Equador, um conjunto de dire-

trizes para a análise de financiamento de projetos que leva em conta a magnitude dos seus riscos e

impactos socioambientais potenciais. Ao se submeter aos Princípios do Equador, o banco se obriga

a vincular a concessão do financiamento ao atendimento, por parte do beneficiário, de 10 princípios.

Cabe à instituição financeira exigir do cliente a elaboração de um Plano de Gestão Socioambiental e

um Plano de Ação dos Princípios do Equador. O mesmo conjunto de diretrizes prevê a contratação

de um consultor socioambiental independente, que deve propor um Plano de Ação que leve o proje-

to à conformidade dos Princípios do Equador, ou indicar a impossibilidade de se alcançar a confor-

midade7.

18. O Anexo VII do contrato traz as condições mínimas para a elaboração do Relatório Gerencial

de Avaliação Ambiental, a partir do qual são elaborados os Relatórios de Monitoramento Socio-

ambiental de Atendimento aos Princípios do Equador:

7 Disponível em: www.equator-principles.com216

a) Histórico e situação atual;b) Relatório de Controle Ambiental e Projeto básico ambiental e Execução(previsto e detalhado);c) Programas ambientais (descrição, objetivo, início, ações ou atividadesdesenvolvidas, fases e cronograma, controle, metas);d) Programa Socioeconômico (descrição, objetivo, início, ações ou ativida-des desenvolvidas, fases e cronograma, controle, metas);e) Relatório comparativo do cronograma de implantação do PROJETOcom os Programas Socioeconômicos e ambientais;f) Fatos relevantes do Licenciamento Ambiental (licenças, outorgas e auto-rizações já emitidas, andamento e previsão de expedição de renovação, ma-nifestação desfavorável de autoridade, laudos, relatórios);g) Status de implantação do PLANO DE AÇÃO e ações de adequação paraatendimento aos PRINCÍPIOS DO EQUADOR; h) Eventual descumprimento do PLANO DE AÇÃO, das condicionantes daslicenças ambientais do PROJETO e da LEGISLAÇÃO SOCIOAMBIENTAL;i) Indicar a ocorrência de invasões, esbulho, turbação ou ameaça à posselivre e desembaraçada das áreas objeto do PROJETO por movimentos soci-ais e medidas previstas/adotadas;j) Informar a ocorrência de danos ambientais e de impactos não previstose/ou relevantes, bem como a repercussão desta;k) Informar a existência de qualquer notificação, autuação, ação, fiscaliza-ção, decisão judicial ou administrativa e medidas previstas/adotadas;l) Condicionantes das Licenças Ambientais do PROJETO e a comprovaçãodo cumprimento de tais Condicionantes;m) Histórico e status dos Programas de Saúde e Segurança do Trabalho.

19. O conteúdo do Relatório Gerencial de Avaliação Ambiental incorpora análises decorrentes dos

Princípios do Equador, mas não se restringe a elas. É um relatório amplo, que retrata o cumprimento

da legislação ambiental brasileira por parte da beneficiária. Nesse ponto, cabe lembrar que a

Constituição garante a todos o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, e impõe à

coletividade e ao Poder Público o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras

gerações. Dentre os principais instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, capazes de

promover o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, está o licenciamento

ambiental, por meio do qual o Estado exerce o controle prévio de atividades que, de modo geral,

tendem a degradar o meio ambiente.

20. Para cada impacto identificado no Estudo Prévio de Impacto Ambiental (EIA), realizado como

condição para o licenciamento, são propostas pelo empreendedor e pelo órgão licenciador medidas

de controle, acompanhamento, mitigação ou compensação de danos. Essas medidas resultam na

elaboração de diversos planos, projetos e programas ambientais que são desenvolvidos pelo

empreendedor como condição de validade das licenças ambientais. O conteúdo mínimo do

217

Relatório Gerencial de Avaliação Ambiental diz respeito a constatações e verificações que derivam

do licenciamento ambiental ou decorrem de outras normas de ordem pública, como aquelas

referentes aos programas de saúde e segurança dos trabalhadores. As informações referentes a ações

judiciais e medidas administrativas decorrentes do poder de polícia estatal também são públicas,

exceto aquelas que dizem respeito a ações que correm em segredo de justiça.

21. No que se refere ao sigilo comercial decorrente da Lei nº 6.404/1976, seu fundamento é o

mesmo daquele sigilo que recai sobre dados bancários e fiscais, ou seja, a proteção do núcleo de

autodeterminação da imagem da empresa. No entanto, assim como na análise da alegação de sigilo

bancário, a verificação do conteúdo mínimo dos relatórios não leva ao âmbito privado da relação

entre a beneficiária e a CEF, pois tal conteúdo não diz respeito a informações negociais ou a

estratégias comerciais da empresa. Ao contrário, mostra a sua natureza pública, referente às

obrigações assumidas com o Estado, que tem efeitos sob a sociedade e transcende a relação

contratual, saindo da esfera da autodeterminação da imagem e, portanto escapando ao direito à

privacidade da contratante. Eventuais dados bancários ou relacionados a operações de natureza

financeira que, indevidamente, estejam contidos nos relatórios não têm o condão de afastar o

princípio da máxima divulgação preconizado pela LAI, cabendo à recorrida tarjá-los.

C) Sobre a alegada existência de cláusula de confidencialidade

22. A fim de robustecer o argumento pela publicidade das informações solicitadas pela

International Rivers Network, é importante compreender o financiamento da UHE de Belo Monte.

Segundo a Nota Técnica AIE/DEENE 002/2014, elaborada pelo BNDES em resposta ao pedido de

esclarecimentos da CGU formulado no âmbito do pedido de acesso à informação nº

99903.000418/2013-33, o financiamento de longo prazo concedido a Norte Energia perfaz o valor

de R$22,5 bilhões e se divide basicamente em dois grupos de instrumentos contratuais: um voltado

para o financiamento de máquinas e equipamentos nacionais; e outro voltado para o financiamento

dos demais itens de investimentos. Ainda conforme a referida Nota Técnica:

“(...) Em 31/03/2011, por meio do Contrato de Financiamento MedianteAbertura de Crédito nº 11.2.0134.1, foi contratado o apoio financeiro de R$3.685 milhões no âmbito do Programa BNDES de Sustentação do Investi-mento – PSI/BNDES para financiamento de máquinas e equipamentos naci-onais do projeto. (...)O financiamento de longo prazo dos demais itens de investimento, no valorde R$ 18.815 milhões, foi contratado em 18/12/2012 na modalidade mista,

218

isto é, direta e indireta: a contratação da parte direta, no valor de R$9.815bilhões, foi efetuada por meio do Contrato de Financiamento MedianteAbertura de Crédito nº 12.2.1238.1; e da parte indireta, no valor de R$9.000 bilhões, por meio de contrato de repasse dos agentes financeirosCaixa Econômico Federal (R$ 7.000 milhões) e Banco BTG Pactual (R$2.000 milhões), no âmbito do contrato de Abertura de Crédito para Finan-ciamento Mediante Repasse de Recursos do BNDES nº 391.115-37/12.(...)”. Grifo nosso.

23. O crédito de R$ 9.000 bilhões referente ao Contrato de Repasse nº 391.115-37/12 decorre dos

recursos ordinários do BNDES, que são compostos, dentre outas fontes, pelos recursos do Fundo de

Amparo ao Trabalhador (FAT), pelos recursos originários do FAT – Depósitos Especiais e do Fundo

de Participações PIS/PASEP. O financiamento indireto, por meio de contrato de repasse

firmado com a CEF, não desconstitui o fato de que os recursos designados a Norte Energia são

públicos e destinados a um projeto de desenvolvimento, com impactos que extrapolam a mera

relação negocial entre as partes.

24. A CEF alega que as informações solicitadas são atinentes a pessoa jurídica de direito privado,

que tem sua estratégia de mercado protegida pelo art. 5º, X da Constituição. No entanto, no que se

refere à relação entre o BNDES, a CEF e a empresa Norte Energia, existe evidente derrogação do

regime privado por normas jurídicas de Direito Público. O direito privado se caracteriza pela

autonomia da vontade na escolha dos valores a realizar e pela disponibilidade dos direitos

envolvidos. Já o regime de direito público “caracteriza-se pela criação de órgãos e funções na esfera

pública, a quem é atribuída a titularidade de bens vinculados à realização de valores essenciais,

assim como a competência para promover a satisfação de interesses indisponíveis”. No caso

concreto, as informações demandadas são de interesse público, tuteladas inclusive pelo princípio 10

da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (1992):

A melhor maneira de tratar as questões ambientais é assegurar a parti-cipação, no nível apropriado, de todos os cidadãos interessados. No ní-vel nacional, cada indivíduo terá acesso adequado às informações relati-vas ao meio ambiente de que disponham as autoridades públicas, inclu-sive informações acerca de materiais e atividades perigosas em suas comu-nidades, bem como a oportunidade de participar dos processos decisórios.Os Estados irão facilitar e estimular a conscientização e a participação popu-lar, colocando as informações à disposição de todos. Será proporcionadoo acesso efetivo a mecanismos judiciais e administrativos, inclusive no quese refere à compensação e reparação de danos. - Destaque nosso.

219

25. Ademais, em que pese a Norte Energia ser uma sociedade anônima privada, ela conta com par-

ticipação estatal (49,98% de suas ações são do Grupo Eletrobrás) e foi constituída com vistas à rea-

lização da expansão da oferta de energia no país, sendo parte relevante da estratégia de atuação do

Estado na economia. Vê-se, portanto, que a empresa foi formada como instrumento de realização

de políticas públicas e não como forma de satisfação de seus exclusivos interesses. Marçal Justen

Filho denomina como funcionalização do direito a vinculação do direito à realização de fins que

transcendem a satisfação de desígnios privados. Segundo ele, tal conceito expressa:

(...) a vinculação dos direitos e deveres individuais e coletivos à consecuçãode certos fins, que transcendem a situação transitória dos titulares. Facul-dades e deveres são determinados por um vínculo inerente, intrínseco e in-suprimível com a satisfação daqueles fins. Todo o poder jurídico, discipli-nado pelo direito público ou pelo direito privado, tem natureza instrumen-tal. É instrumento não de locupletamento individual do titular, mas da reali-zação dos direitos fundamentais.8

26. No âmbito da atividade econômica privada, a funcionalização significa a “vedação a desvios,

abusos ou excessos que inviabilizem a realização dos direitos fundamentais alheios”9. Em outras

palavras, mesmo as relações regidas pelo direito privado não estão alheias à realização dos valores

constitucionais, o que pode ser descrito pela expressão “função social da propriedade, da empresa

ou do contrato”.

27. Nesse contexto, não nos parece possível à CEF, que se submete aos ditames da Lei de Acesso à

Informação, negar-se a atender ao pedido em tela argumentando que se trata de informação privada

referente à empresa beneficiária do contrato. Trata-se de informação de interesse público, cuja

transparência é necessária ao controle social quanto ao adequado cumprimento das cláusulas

contratuais que dizem respeito ao atendimento das normas ambientais, e também para permitir um

legítimo debate acerca das políticas públicas de desenvolvimento e seus impactos sobre a vida das

pessoas. No caso de Belo Monte, a construção da usina atinge o modo de vida de 120 mil pessoais

que vivem na sua área de influência direta10. Ainda que, por um absurdo, se admitisse a natureza

privada da informação, convém lembrar que é dever do estado disponibilizar “informação

produzida ou custodiada por pessoa física ou entidade privada decorrente de qualquer vínculo com

8 Justen Filho, Marçal. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2014. p.146.9 Ibid., p. 149.10 Brzezinski. Maria Lúcia Navarro Lins. Para entender Belo Monte: a história de uma usinahidrelétrica contada pelo jornal O Estado de São Paulo. Cadernos IHU / Universidade do Vale doRio dos sinos. Instituto Humanitas Unisinos. Nº 47 (2014) – São Leopoldo: IHU/Unisinos, 2014. p.20.

220

seus órgãos ou entidades, mesmo que esse vínculo já tenha cessado” (inciso III, art. 7, Lei

12.527/11), especialmente em virtude da CAIXA ter assumido deter a custódia da informação (art.

8, Lei 12.527/11), in verbis:

É dever dos órgãos e entidades públicas promover, independentemente de requerimentos, a

divulgação em local de fácil acesso, no âmbito de suas competências, de informações de

interesse coletivo ou geral por eles produzidas ou custodiadas. – Destaque nosso.

28. Recentemente, a CGU determinou ao BNDES, no Parecer nº 3.454, de 01/09/2014, a entrega, ao

Instituto Socioambiental, dos Relatórios de Auditoria Socioambiental Independente previstos no

Contrato de Financiamento Mediante Abertura de Crédito nº 12.2.1238.1, firmado entre o banco e a

empresa Norte Energia S.A. Esta instância recursal considerou a extensão da cadeia de publicidade

financeiro-orçamentária referente ao financiamento para afastar as alegações do BNDES acerca do

sigilo das informações constantes nos relatórios. Isso porque o BNDES atua realocando recursos

públicos por meio de contratos privados de financiamento, a fim de executar políticas públicas de

fomento às atividades econômicas, sendo que parcela do financiamento é destinada ao cumprimento

de regras do licenciamento ambiental que, se infringidas, geram efeitos que recaem sobre toda a

sociedade. Na ocasião, concluiu-se que:

(...) a cadeia de publicidade financeiro-orçamentária, no que toca aos itensA e B do recurso interposto no âmbito do processo 99903.000463/2013-98,estende-se desde as origens do recurso até o cumprimento do mandamentoconstitucional do §2º do art. 225 por meio do adimplemento efetivo dascondicionantes constantes nas licenças emitidas pelo poder público.

29. Ainda sobre o Parecer nº 3.454, naquela ocasião o BNDES alegou a existência de cláusula de

confidencialidade no contrato firmado entre a Norte Energia e a empresa de auditoria independente,

que impediria a entrega ao solicitante dos Relatórios de Auditoria Socioambiental Independente. A

CGU solicitou acesso à referida cláusula, mas sua solicitação foi negada. Por isso, esta instância

considerou que a negativa do BNDES em oferecê-la equiparar-se-ia à “negativa de prova da

circunstância que limitaria o exercício de direito fundamental”, e lançou mão do Princípio 7 da

Resolução 147 do Comitê Jurídico Interamericano acerca do Direito à Informação, segundo o qual

recai sobre o órgão ou entidade que denegou o acesso à informação o ônus probatório das razões

determinantes da restrição ao direito fundamental de acesso. Assim, haja vista que o recorrido se

221

negou a fornecer elementos que permitissem a análise da sua motivação, esta Controladoria afastou

a alegação de confidencialidade para fins de análise de mérito.

30 Neste recurso, a CEF também lançou mão da cláusula de confidencialidade existente no Termo

de Compromisso firmado entre ela e a empresa Norte Energia como mais um argumento a favor da

restrição de acesso. Entretanto, se negou a fornecer o referido documento à CGU. Nesse contexto,

ante o precedente firmado no Parecer nº 3454, não é possível levar em consideração a alegada

cláusula na análise do recurso.

31. Não obstante, salvo melhor juízo, mesmo que o Termo de Compromisso tivesse sido entregue à

CGU, é importante consignar que a referida cláusula não se sobrepõe ao direito fundamental de

acesso à informação quando o que está em jogo é a publicidade de informações de interesse

público, especialmente neste caso concreto em que a supremacia do interesse público não implica a

violação do direito fundamental consubstanciado no inciso X do art. 5º da Constituição, já que o

conteúdo dos relatórios demandados não diz respeito a informações negociais ou a estratégias

comerciais da empresa.

32. Finalmente, no que se refere à solicitação nº 3 do pedido inicial, a CEF prestou os

esclarecimentos reproduzidos no parágrafo 2 deste parecer. Em síntese, o banco afirma que as

providências referentes ao cumprimento de decisões judiciais são tomadas pela beneficiária do

contrato e que apenas se manifesta nas ações em que é parte. Em consulta aos sites da Justiça

Federal do Pará e do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, verificou-se que a CEF não é parte

nas ações judiciais citadas pelo recorrente. Diante disso, não se vislumbram informações a serem

entregues pelo banco em atendimento a este item do pedido de acesso.

Conclusão

33. De todo o exposto, opina-se pelo conhecimento e, no mérito, pelo provimento parcial do

recurso, uma vez que os relatórios demandados têm natureza pública e são custodiados por empresa

pública que se submete aos ditames da Lei de Acesso à Informação.

34. Sugere-se fixar o prazo de 10 dias para a entrega ao recorrente dos Relatórios de

Monitoramento Socioambiental Independente do Projeto UHE Belo Monte (previstos no

contrato como Relatórios Gerenciais de Avaliação Socioambiental, e respectivo Plano de Ação) e do

222

Relatório de Atendimento aos Princípios do Equador do Projeto UHE Belo Monte (previstos

no contrato como Relatórios de Monitoramento Socioambiental de Atendimento aos Princípios de

Equador) com a obliteração de eventuais informações sigilosas que estejam registradas no mesmo

suporte daquelas informações de interesse público. A disponibilização deve ser tal que assegure a

compreensão de todos os itens do escopo mínimo do Relatório Gerencial de Avaliação Ambiental,

previsto no Anexo VII do contrato de financiamento, que estejam efetivamente consolidados nos

relatórios demandados.

35. Por derradeiro, observou-se que CEF descumpriu procedimentos básicos da Lei de Acesso à

Informação. Nesse sentido, recomenda-se orientar a autoridade de monitoramento competente que

reavalie os fluxos internos para assegurar o cumprimento das normas relativas ao acesso à

informação, de forma eficiente e adequada aos objetivos legais, em especial recomenda-se que

informe em suas respostas ao requerente a possibilidade de recurso, o prazo para propor o recurso e

a autoridade competente para apreciá-lo.

MAÍRA LUÍSA MILANI DE LIMA

Analista de Finanças e Controle

D E C I S Ã O

223

No exercício das atribuições a mim conferidas pela Portaria n. 1.567 da

Controladoria-Geral da União, de 22 de agosto de 2013, adoto, como fundamento deste ato, o

parecer acima, para decidir pelo provimento parcial do recurso interposto, nos termos do art. 23 do

Decreto nº 7.724/2012, no âmbito do pedido de informação 99902.000720/2014-82, dirigido à

Caixa Econômica.

A entidade deverá entregar ao recorrente, no prazo de 10 (dez) dias a contar da

notificação desta decisão, após eventual comprovação de ressarcimento de despesas com cópias

reprográficas, os Relatórios de Monitoramento Socioambiental Independente do Projeto UHE Belo

Monte e o Relatório de Atendimento aos Princípios do Equador do Projeto UHE Belo Monte, com a

obliteração de eventuais informações sigilosas que estejam registradas no mesmo suporte daquelas

informações de interesse público. O comprovante de entrega da informação deverá ser inserido na

aba “Cumprimento da Decisão”, no e-Sic.

JOSÉ EDUARDO ROMÃOOuvidor-Geral da União

224

PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICAControladoria-Geral da União

Folha de Assinaturas

Referência: PROCESSO nº 99902.000720/2014-82

Documento: PARECER nº 4701 de 08/12/2014

Assunto: 99902.000720/2014-82

Ouvidor

Assinado Digitalmente em 08/12/2014

JOSE EDUARDO ELIAS ROMAO

Signatário(s):

Este despacho foi expedido eletronicamente pelo SGI. O código para verificação da autenticidade deste

documento é: 17071ed6_8d1e121ea02fcf3