contraponto 01 - a arte de manipular bonecos

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Nesta edição: entrevistas com o rapper Slim Rimografia e o músico, empresário e professor Roberto Panarotto; Será que Jornalistas ganham bem?; A vida de assessor de imprensa; A arte descomplicada; Os infinitos benefícios da leitura; E o texto de capa sobre a arte de manipular bonecos. A contraponto esta disponível no site da LEJ Primavera: lejornalismo.com.br.

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A Liga Estudantil de Jornalismo está atuando na estruturação interna da organização. Este é o momento para am-pliar horizontes e fazer acontecer. Se você ou a sua empresa acredita no desenvolvimento social através da comunicação e da informação, estamos dispostos a por isso em prática. Entre em contato, nós cumpriremos nossa missão.

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Editorial

Com riqueza de palavras, de cultura e de sentimentos, a Liga Estudantil de Jornalismo Primavera forma--se diante da certeza. Esta que nos motiva a construir uma ideologia apoiada em horas de debate, trocas de informações, leituras coletivas, descontentamento com a realidade e atitude de mudança para a valo-rização do ser. No dia 11 de junho de 2011, inauguramos uma nova fase em nossas vidas. Esta revista é o fruto público de estudos incan-sáveis, de entrevistas muito bem pensadas, nas abordagens criati-vas, com o foco na introspecção da diversidade comunitária. Realiza-mos aqui uma discussão. De repor-tagem em reportagem, exploramos os sentidos mais nobres do jorna-lismo. Um conteúdo vindo da pró-pria educação de seus produtores, respeitando as observações diárias e a cultura adquirida dentro da aca-demia. Ancorada, inclusive, pelos professores que semearam em seus

alunos um anseio pela qualidade da informação, pela profundidade dada às questões, pela objetivida-de expressada nos textos e, sobre-tudo, pelo interesse público que o jornalismo traz consigo que não deixaremos ser esquecido. Itens e mais itens, separados por vírgulas, figuram numa lista interminável de expressões que culminam nas pá-ginas a seguir. Não há compromis-so com as respostas concretas, elas não movem o mundo, buscamos as perguntas que não nos deixam em uma zona de conforto social. Desejamos a você, uma excelente leitura. Formada por acadêmicos de jornalismo, residentes na cidade de Chapecó, Santa Catarina, a Liga Estudantil de Jornalismo Primave-ra é uma organização não-gover-namental sem fins lucrativos. Tem em seus pilares estatutários a inde-pendência editorial e é patrocinada

A LIGA ESTUDANTILapenas por ideologias de mudança. Os membros da LEJ Primavera não têm uma única convicção e muito menos o mesmo objetivo de vida. Pelo contrário, vivem a discordar e discutirem arduamente cada pa-rágrafo publicado. Acreditamos na pluralidade, no debate e vivemos enraizados por um sentimento de liberdade para pensar e expressar. Em comum, a busca por um jorna-lismo capaz de despertar uma so-ciedade adormecida no senso co-mum. Daí Primavera, nome dado a Liga Estudantil. Uma analogia di-reta com o fim da escuridão do in-verno, esperança de mudança que não nos deixa parados. A ONG foi criada na noite fria e inspiradora de 11 de junho de 2011, através de uma dinâmica criadora da visão, dos valores e da missão. Para co-nhecer melhor e ter contato com a LEJ e seus membros, acesse o site lejornalismo.com.br.

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CONTRAPONTOA revista da Liga Estudantil de Jornalismo

ProduçãoCamila Dourani ArrudaEduardo Kauê Florão

Isabela SudattiJulherme José Pires

Kaehryan Alyssa FauthLuiz Antonio Pancotte

Lydiana Caroline Rossetti OrsoNatan Augusto Silveira

Pricila Eduarda LiraStéfany Cristina Breda Ozelame

Vinicius Alexandre Farfus

Todos os direitos reservadosLiga Estudantil de Jornalismo Primavera © 2012

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PANAROTTOCULT12

Mapa

JORNALISTA GANHA BEM?24

A SOCIEDADE POR SLIM18

A ARTE DESCOMPLICADA

A VIDA DE ASSESSOR DE IMPRENSA24

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Artes Visuais

Arte: um bicho de uma cabeçaAs confusões em relação à arte podem ser desfeitas com uma única atitude

Luiz A. Pancotte

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A Arte pode ser definida sob um ponto de vista bastante simples: como uma maneira de expres-

sarmos sentimentos, sensações, vi-vências ou espaços através da utili-zação de uma linguagem gráfica ou estética. Neste sentido, percebe-se que há certa dificuldade em definir formalmente o que é arte, uma vez que ela necessita ser compreendi-da dentro de um contexto históri-co social, onde uma determinada obra foi escrita, pintada, elaborada. Arte significa expressão. Desde o momento em que o homem elabo-rou as famosas pinturas na gruta de Lascaux (França), essa forma de expressão vem acompanhando diferentes momentos históricos, sociais e econômicos, os quais o homem moderno experimentou. Tanto como forma de expressão de um sentimento ou vivência, ou utilizada para difundir até mesmo ideais políticos, a arte, sob deter-minados aspectos, é caracterizada como uma forma de linguagem. Quem nunca entrou em um museu ou em um teatro e ao ver uma obra de arte ou ouvir uma

música erudita se perguntou: o que significa isso realmente? Ao se fa-zer essa pergunta, o observador ou ouvinte passa a ter seus sentidos provocados. E é justamente isso que uma obra de arte significa: uma explosão de sentimentos des-pertos, onde a vivência pessoal do artista se mostra totalmente des-pida diante do observador. Ques-tões passam a ser feitas, dúvidas começam a surgir, sentimentos de paixão, ódio, amor, etc. Tudo aflora do consciente ou inconsciente do observador. Nesse sentido, definir arte passa a ser a tarefa mais difícil outorgada a um ser humano, uma vez que arte pode ser em última instância inerente a apenas um in-divíduo da raça humana. Você já pediu a algum artista para definir a arte? Não? Então não pergunte isso nunca. Não se tem uma definição exata do que é. Ao frequentar locais onde material artístico é exibido, o ob-servador deve se despir de todo e qualquer preconceito. Desta forma não haverá confronto com a ideia do artista. Como a arte também significa a herança de determina-

dos aspectos que influenciam na linguagem técnica da criação do artista, o resultado é algumas obras mais apreciadas do que outras. Consequentemente, algumas obras passam a ser definidas como belas, audíveis, legíveis ou não. Despido de preconceito em uma exposição de arte ou audição de uma orques-tra sinfônica, a primeira reação será principalmente emocional, seguida dos sentimentos de aceita-ção. Indiferente de qual seja a rea-ção do público, é uma reação, que traduz o objetivo de todo e qual-quer artista: despertar emoções no observador. Como é usual dar valor so-mente quando a arte está inserida em um contexto, muitas vezes ela passa despercebida aos olhos ou ouvidos. Um exemplo claro disso está em uma experiência feita pelo The Washington Post. A propos-ta foi colocar Joshua Bell, um dos maiores violinistas do mundo, to-car seu Stradivarius, estimado em três milhões de dólares, em uma estação de metrô de Nova Iorque. De calça jeans, camiseta e boné, Bell tocou por mais de 45 minutos

Artistas de-batem a arte e como enxergá-la

Izabel Vizotto

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o seu instrumento. O resultado: foi praticamente ignorado pelos que passavam pelo local. Alguns dias antes, Bell havia se apresentado no Symphony Hall de Boston, onde uma boa cadeira custa a bagatela de US$ 100. Arte provoca controvér-sias, uma vez que sua própria de-finição abrangente permite tal situação. O que pode ser conside-rado belo e estético para uma de-terminada parcela da população pode ser ofensivo e não ser reves-tido do próprio conceito de arte ou a qualquer aspecto teórico que a remete a esta concepção. No en-tanto, não se pode esquecer que, mais ou menos elaboradas, mani-festações artísticas são capazes de quebrar paradigmas e remeter a uma dimensão de reflexão, dúvidas e emoções. A história da arte está repleta de exemplos que quebram os limites da estética convencional e entram para o panteão das obras--primas imortais: os Girassóis de Van Gough, a Capela Cistina, pin-tada por Michelangelo e os auto--retratos de Frida Kahlo. A arte de rua deve ficar restrita somente às ruas?A grafitagem, facilmente observa-

da em paredes e muros externos de grandes cidades, reflete tal dis-cussão. Até pouco tempo conside-rada um movimento de contesta-ção, passa a ter conotação artística quando seus traços e formas de lin-guagem refletem a realidade social e histórica dos criadores. Tal refle-xão se faz com os movimentos so-ciais que divulgam as rádios comu-nitárias, dança de rua, embaladas pelo ritmo do funk, com letras re-cheadas de frases de protestos e de contestações. É importante ressal-tar que esse tipo de arte possui um movimento “de baixo para cima”, isto é, surgido nas classes sociais mais desfavoráveis e se proliferam nas consideradas mais elevadas. Contudo, em um primeiro mo-mento, este deslocamento encon-trava forte barreira por motivos preconceituosos, uma vez que os ditos intelectuais pertenciam a es-sas classes mais abastadas. Afinal, arte é cultura, e mesmo assim não chega a todas as classes sociais. Durante toda a história da humanidade, a arte vem sendo utilizada também para razões obs-curas, com fins políticos. Desde os antigos egípcios e babilônios, ela foi usada intensamente para de-monstrar o poderio de um sobe-

rano, considerado uma repre-sentação divina sobre a terra. Sendo divino, as concepções de vida após a morte assu-miam uma dimensão impor-tante, inclusive no cotidiano da população. Grandes monu-mentos erigidos como tumbas mortuárias atingiam o grau máximo de sofisticação. Na Grécia e Roma antigas, igual-mente, as obras representavam o feito de dominação de outros povos, em que esses impérios absorviam não somente suas riquezas, mas também aspec-tos culturais. A famosa obra dessa época, a Coluna de Traja-no, magnificamente ilustra este exemplo. Utilizando-se de uma

linguagem artística até então não imaginada, pode ser observada a história de dominação do império romano sobre povos com poderio bélico inferior. Esta obra de arte até hoje inspira artistas, principal-mente os que utilizam a linguagem cinematográfica para divulgar uma ideia ou emoção. No mundo mo-derno, outros inúmeros exemplos podem ser abordados. Métodos de divulgação dos ideais nazistas du-rante a primeira metade do século passado, onde a fotografia e o cine-ma passam a assumir uma impor-tância bastante grande para divul-gação desses ideais, abrangendo o maior número possível de pessoas. A arte, mesmo que deturpada de seu nobre ideal, deixa de ser vista somente por poucas pessoas e pas-sa a agregar grandes massas da po-pulação entre seu público. Indiferente da maneira como é produzida e divulgada, nos dias atuais, a arte pode atingir dife-rentes culturas e classes sociais. Ao estabelecer uma real comunicação com a obra e o autor, facilmente o público percebe que a arte não é um bicho de sete cabeças.

Audr

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Cas

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Artes Visuais

Landahlauts

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A fotografia não é o bicho, mas cada vez é mais popular

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Impacto

A ARTE DE MANIPULARBONECOS

Kaehryan Fauth

Parecia ser dia. O céu, amare-lado, confundia a pessoa lar-gada sob o céu encoberto de nuvens cinza. Aparentemen-

te acordou agora, sem saber de nada. Como chegou ali? Acordou mas con-tinua parada, como se não tivesse for-ça, vontade de sair de onde está. Mise-rável, sujeita a tudo, porém nada tão ruim quanto o que já lhe aconteceu. Algo estava visivelmente a mantendo presa ao nada, mas o quê? Cordas caíam de seus punhos. Presas ao ven-to, demonstravam pesar mais do que o ferro. Tiraram tudo que a mantinha viva. Tiraram sua vida sem sequer a matar. Extorquiram sua alma e agora já não vê a própria vida que restou. Há vida que depende de evolução, cons-trução de ideais e propósitos. Há vida, que depende dos outros mais do que de si próprio, vida que inexiste sem manipuladores. Marionetes não tem alma. Antes o céu resplandecia no brilho por trás das nuvens brancas, tudo tinha mais cor e

autonomia vivenciada no desabrochar de flores, me lembro bem. Tempos bons, as pessoas tinham opção. Opta-vam pelo mais conveniente, mas sem deixar o bom senso de lado. Algumas não se davam ao trabalho de julgar as opiniões, mas faziam valer seu pré--julgamento. Lembro-me bem, tão bem que me assusto de pensar como tudo foi acabar assim. O que vejo agora são pessoas presas à cordas in-visíveis, transparentes ao seu próprio senso. O tempo parou para elas. São as novas cobaias do círculo vicioso de estagnação crítica e social. São as no-vas marionetes da elite. A sociedade foi sendo apu-nhalada aos poucos, das mais diver-sas formas. Com sorrisos, sussurros, promessas, passado, tudo foi moldado para que parecesse conveniente àque-la realidade. O contexto, porém, não exigia análise. Cidadãos e soldados, com a farda colorida, que as poucos foi desbotando. Os sorrisos e a cordia-lidade deram lugar a tempos difíceis,

pintados na tela em tons de cinza,

que aos poucos aumentaram seu con-traste para definir o preto e o branco, diferenças distintas. Tudo aconteceu pela busca desenfreada por uma vida perfeita, uma vida perfeita, o “sonho americano”, que sempre será um so-nho. As vestes pesavam sob os ombros dos soldados, que não eram regidos por si próprios, e sim, pela ambição enganosa. O decreto foi a definição de um líder que teria de trazer redenção, mas trouxe apenas discórdia entre as classes. O julgamento consistiu em fa-tores artificiais, anilina pura jogada na chuva, pra dar cor ao que estava mor-to. Votos à quem não merecia sequer chance. Manipulação teatral. A raça alienada não se importou com a abs-tenção de seus votos. Uma cesta deles foi dada em troca de promessas. Votos baratos. A raça que se opunha ao jogo tinha um semblante guerreiro, porém

Chan360

crônica

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A ARTE DE MANIPULARBONECOS

uma cesta vazia, carregada com a der-rota. A cesta branca, pura e repleta de planos que jamais seriam colocados em prática. A sociedade foi dominada de-mocraticamente. O líder se levantou e ninguém se opôs. Bastou. O líder persuadiu. Usou sua retórica da forma mais convincente possível ao olho dos ingênuos. Qualquer um que o contra-dissesse estava condenado a uma sen-tença de exclusão silenciadora. O ideal já não era superação, não era voltar ao que foi, era dominação. Um ideal em comum, sujeito a modificações da própria mente dos membros da tribo. Individualismo. Agregados por pensamentos em co-mum, segregados da massa pelo fato de perceberem aos poucos que, na verdade nunca fizeram parte dela. O teatro de cordas, no qual os figurantes não eram aqueles que viviam, e sim os soberanos sobre toda a rede. Os prota-gonistas da paródia da vida. O líder finalmente dominou a massa, com todos os truques e fer-ramentas que não lhe custaram nada que não fosse seu tempo. A história é narrada de maneira trágica pela usur-pação de almas através da persuasão desenfreada, concluída em promessas sonegadas: mentiras. Não há como voltar no tempo e reformar as ideolo-gias. O início comprometeu o fim de tal forma que as amarrações presas nos punhos dos atordoados sejam tão fortes quanto às máscaras de gelo que mumificam meu rosto. Manipulação camuflada. As ameaças transpassam

os direitos e vozes. Guerra fria pós--moderna. Meus olhos enxergam tudo. Ainda que meus lábios não se me-cham, posso narrar silenciosamente o massacre de todo um povo. A fra-queza maior é a dor que transpassa minhas veias ao ver toda uma geração sujeita ao nada. Destinada a sofrer por seus próprios erros, escolhida a dedo por seus próprios enganos. Metafo-ricamente, é como nascer borboleta com as asas cortadas. Viver sete dias sem sequer poder voar. É como ter uma tela e não poder pintar. É como ter cabeça e não querer pensar.

ManipularDiante de tais fatos, chego à conclusão de que a arte de manipular envolve a aptidão das duas partes: a opressora e a oprimida. Ou talvez, o manipulador e a marionete. Certas artes como ma-nipulação de ventríloquos exige uma ligação constante entre o manipulador e o ventríloquo. Já na manipulação de bonecos há uma total entrega de atos. O boneco está sujeito aos desejos de quem o manipula, sem limites nem cumplicidade, relação de troca: vida por aplausos. A manipulação de bonecos exige primordialmente duas aptidões essenciais ao manipulador: retórica e desenvoltura. Já do boneco, o que se es-pera é o que virá de quem o manipula. Ele é mera peça do teatro, detalhe do show que precisa estar de acordo com o que seu mestre exige, mas a troco de quê? De sua pele seca emanam suspi-ros de quem um dia pôde ser algo e não foi. A questão não é ser boneco ou ventr í-

loquo. A real indagação é o por quê de seres humanos se submeterem a car-gos tão cruéis, de manipuladores de sua própria raça, enquanto outros se sujeitam a serem manipulados, papel tão lamentável em uma peça vivencial que não atrai nada além do comodis-mo e da exploração de sua própria raça. Não é cômodo nem recom-pensador. É o que o meio lhe propõe. Onde está o contraponto ao meio? Onde está a resposta dos oprimidos? Nada se resolve enquanto não for dito. A manipulação só é efetiva quando há a sujeição de ambos os lados, se não houver, haverá luta. As etapas não envolvem ciclos de convencimento, na maioria das vezes inclui apenas a repressão, atos desencadeados pela estagnação psicológica. Ausência de alma. Alma que só desperta com co-res, raios de sol. A esperança hiberna-da na gélida chuva. Os raios em meio às nuvens negras dão o sinal de que a chuva não vai tardar. É a última chance. O mani-pulado despertado, aprisionado, pode enfim acordar de seu sono atordoante com a chuva. O reino do “felizes para sempre” estava materializado naquela imensidão de pessoas em busca de um propósito enquanto eram usadas. Um ideal em comum, sujeito a modifica-ções contextuais da própria mente dos membros da tribo. Individualismo ou massa incrédula? Enfim, o último entardecer antes de um novo dia, o despertar trará novas fontes e ideais. Autonomia e emancipação. Vejo ao longe, o sol. Com ele, a esperança do reprimido.

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Paralelo

PARA CONSTRUIR UMA CULTURA EM NÍVEIS

Camila Arruda

Uma grande “peça teatral”, estre-lada pelo “ator” Roberto Pana-rotto. É assim que o graduado em Letras – que trabalha com litera-tura, quadrinhos, cinema, produ-ção audiovisual, designer, publi-cidade e jornalismo – encara seus 38 anos de vida. Fazia teatro na escola, escrevia, dirigia e inter-pretava. “Com os cabelos e a bar-bas sempre crescendo”, estas são as informações que você encontra sobre Panarotto no Facebook. De Chapecó, Santa Catarina, a figu-ra, conhecida pelos vinte anos da Banda Repolho ou nos seis anos do programa de televisão Voo do Morcego, hoje atua no Studio Alice. Onde se estuda, se cria, se produz, se planeja, se inventa comunicação. Além do Studio, atua como professor de realida-de regional, cinema e processos criativos na Universidade Comu-nitária da Região de Chapecó. Desde 1991 na irreverente Ban-da Repolho, mais uma de tantas parcerias dos irmãos Roberto e Demétrio Panarotto, desconstrói e brinca com os cenários ao redor. No “Agito com Balalau” (acb2.wordpress.com), há oito anos Ro-berto escreve algo a partir de um ponto de vista. O dele. É a partir deste olhar que Roberto Pana-rotto concede entrevista a CON-TRAPONTO sobre a ideia plural e nivelada da cultura e como a manipulação social limita e cega

a percepção cultural. CONTRAPONTO: O que quali-ficar como cultura no contexto pós-moderno, o que pode ser no-minado como cultura?Roberto Panarotto: É difícil medir cultura, dizer que eu tenho mais cultura que você, mas eu acho que a cultura se faz em níveis. É difícil você transitar no mundo globali-zado de hoje, a tua percepção em relação às coisas muda quando você conhece mais coisas. Eu gos-to de usar o exemplo da leitura e o próprio processo de aprendizagem que você tem dentro disso, você é criança e lê: o gato, o gato e o no-velo de lã, o gato bebe leite. Você tem três, quatro, cinco anos, e o teu poder de percepção está voltado para aquilo. Se você nunca mais ler, quando tu tiver vinte anos a tua percepção da leitura vai continuar dentro da mesma linha de raciocí-nio, quer dizer você precisa treinar, o cérebro entre aspas é um mús-culo, você precisa fomentar ele. Aí quando você começa a ler mais coisas você vai exigindo um grau de dificuldade maior, então con-sequentemente, vai chegar a certa idade que você vai querer ler Paulo Coelho, legal é leitura, mas vai che-gar o momento que você vai que-rer ler o Luiz Carlos Borges, Jaimes Joice, Ulisses, que é uma outra coi-sa bem mais complexa. Então para mim a cultura se faz neste sentido,

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quanto maior for a tua absorção de informações maior será a tua per-cepção de mundo. E a cultura para mim, não necessariamente pra mim, mas é da forma que eu vejo, ela é meio que a espinha dorsal da sociedade. Esse é um dos princí-pios e das propostas culturais que

a gente tenta abordar. Como tu valorizas um teatro, tendo a per-cepção de que aquilo é importante. É como eu penso a cultura, é uma coisa orgânica, ela se movimenta, ela se mistura e está tudo total-mente interligado. E o povo culto ele produz muito mais, cria muito mais perspectiva. Eu costumo fa-zer uma comparação entre Santa Catarina e a Islândia, em termos de extensão territorial, não em for-mato, Santa Catarina é muito pa-recida com a Islândia. A Islândia tem 300 mil habitantes aproxima-damente, é a região Oeste de Santa Catarina. 80% da Islândia é inabi-tável, por que tem geleira e vulcão. Os 300 mil que vivem na Islân-

dia, tem uma produção per capta de literatura, música, teatro que é um absurdo, uma das maiores do mundo. Mas são 300 mil habitan-tes, em uma ilha, isolados. Se eles conseguem pensar cultura, por que a gente não pode pensar a cultura aqui na nossa região? Ou potencia-

lizar isso de algu-ma forma? CP: E a questão de não potencia-lizarmos a cultu-ra, você acredita que tem relação com o comer-cial, e neste caso, certas manifes-tações culturais seriam mais viá-veis?Panarotto: Tem uma frase que eu não sei se é do Tom Zé que fala que “quando tu aumentas muito a informação você diminui o públi-co, e quando di-minui a informa-ção você aumenta o público”. É por

isso, por exemplo, que você vê uma crescente de bandas sertane-jas, por que é uma música que não tem informação. E quando eu digo que não tem informação, não tem informação nem enquanto música por que eles trabalham com muito poucas notas, muito pouca letra, por que é só refrão, justamente para as pessoas cantarem. É mais fácil a pessoa cantar um “ai ai ai ai ai” do que a pessoa ter uma poe-sia ali, com uma letra um pouco mais complexa, e porque toca nes-sa questão do sentimento, eles só falam de amor e amor é popular. Não que seja ruim falar de amor, você tem exemplos como o Rober-to Carlos, que escreve sobre amor

de uma forma poética. Não estou dizendo que tem que ser comple-xo, pode ser genial sendo simples. Mas a música sertaneja, a meu en-tender, é pobre. Ela acaba sendo o reflexo das pessoas que consomem isso. Elas entendem o que é canta-do, se você colocar mais dois ver-bos e três substantivos elas não vão entender. CP: Neste contexto, pode-se falar em cultura popular e cultura eru-dita?Panarotto: Os termos muitas ve-zes acabam sendo mercadológicos. Sim, eu acho que existe essa ideia de cultura popular e cultura mais profunda. Eu não separaria desta forma, porque acho que algumas coisas poderiam ser “popular” se o nível intelectual das pessoas fosse mais elevado. A Graforreia Xilar-mônica comprovou que pode ser popular, pode ser bacana e pode ter informação. Eu não sei se essa divisão é pertinente. E na verda-de, eu acho que o problema está na educação, o povo não é educa-do para consumir coisas culturais. A gente vive em um país em que é muito mais fácil você manipular as pessoas que são limitadas ou igno-rantes no sentido real da palavra, de você ignorar as coisas. O gover-no nunca vai investir em política cultural, às vezes educacional, por-que é muito mais fácil dar uma ces-ta básica do que dar um livro para a pessoa aprender. E isso não é agora, isso é histórico no Brasil. In-dependente de partido, sempre foi assim. Um país para evoluir precisa potencializar a educação. CP: Vamos falar sobre o movi-mento de contracultura. Como você percebe hoje manifestações desse movimento que teve seu auge em 1960?Panarotto: Todas essas manifesta-ções eu tenho impressão que são muito pertinentes a sua época, di-

Luiz

. A. P

anco

tte

No final do dia, Roberto Pan-arotto recebe a CP em seu estúdio.

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gamos assim. Quer dizer, você estava vivendo em um mundo “x” na década de 1950 e 1960, e essas pessoas pensaram em al-ternativas. A contracultura tem esse lado de pensar a cultura de uma forma mais abrangente, e de certa forma valorizar coisas que não eram tidas e vistas como arte. Lógico que o termo “con-tracultura” está muito vincula-do àquele período, assim como você dizer que o Barroco estava vinculado com aquele período, hoje você pode fazer uma obra com características barrocas. A contracultura vai permanecer ali, mas muitas das coisas que a gente pensa para o Unocultural (Programa de incentivo cultu-ral dirigido por R. Panarotto na Unochapecó), por exemplo, tal-vez carreguem esses princípios. Se você tem na mídia Ivete San-galo e as bandas baianas – que são covers delas mesmas – você tem que mostrar para as pessoas que existem alternativas. Então, está todo mundo olhando para um lado você tem que virar o rosto da pessoa para o outro. Aquele mo-vimento foi muito importante na-quele período, porque ele fez com

que aumentassem as possibilida-des. A ideia da cultura, a meu en-tender, tem que ser plural. A hora que tu tiveres batendo sempre na mesma nota, não tem sentido. Não tem sentido você restringir um universo de possibilidades a uma coisa só. Os movimentos que pen-

savam alternativas naquela época hoje não fazem muito sentido. Por que hoje você tem outra realidade, você não repete as coisas. Tem um livro do Deleu-ze, filósofo francês, que fala em diferença e repetição. Quer dizer, as coisas se repetem, mas elas não são iguais, você nun-

Uno

cultu

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O projeto Unocultural entra no terceiro ano

Paralelo

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ca vai conseguir fazer um novo Woodstock. Outro conceito ligado a esse movimento da con-tracultura é a liberdade.

Abrir as portas da percepção. Que é muito bacana, mas tu não podes levar ao pé da risca hoje. Hoje tu podes abrir as portas da percepção vendo um show do Otto, Tom Zé, Vitor Ramil. Tu podes pensar que a droga hoje é mais uma opção, mas não pode ser “a” opção. Mes-

mo não usando, eu não sou contra. Mas as pessoas que ficam muito presas a isso não fazem nada. As pessoas não ficaram famosas porque usavam drogas, elas ficaram famosas porque elas pen-savam, porque elas produ-ziam coisas diferentes. CP: Como isso te influen-cia?Panarotto: Influencia-me muito nessa coisa que co-meça a surgir meio pós isso, que se ninguém está fazen-

do por ti então faz. Um dos princípios do movimento punk: faça você mesmo. E aí em termos de referência a gente bebe muito des-sa coisa: de você olhar e ver que es-sas pessoas estavam pensando em coisas diferentes, estavam olhando para o outro lado, estavam vendo o mundo de uma forma diferente. Eu gosto de citar a frase do “filó-sofo” Xirú Missioneiro: “o mundo para ser mundo tem quer de tudo um pouco”. Óbvio que é brincadei-

ra, mas esta frase tem um sentido absurdo. Quer dizer, a gente vive em um mundo que é plural, pra que limitar se tu podes abrir as possibilidades? Por que dizer que só isso é legal e passar o dia intei-ro fumando maconha, se tu podes fazer muitas outras coisas? Sem olhar pelo lado do preconceito. E a mesma coisa com a música. Por que ficar ouvindo só sertanejo e tomando cerveja no final de se-mana? Mas isso é o reflexo cultu-ral do trabalho, como é a novela, a televisão, a manipulação. CP: É relacionado à indústria cultural, que desde a teoria cri-tica já fazia menção a essa domi-nação?Panarotto: É. Nesse caso a massi-ficação é utilizada de forma polí-tica. Porque o cara trabalha o dia inteiro – não sei se tem um país em que as pessoas trabalhem tan-

to quanto no Brasil – de forma es-crava e no sentido de não pensar. Chega o final da tarde em casa tu não vais querer ler o Dostoievski. Tu vais querer ver a novela “Fogo e Paixão” e ouvir o Fogo e Paixão do Vando. Isso tudo tem um fator político dentro da nossa sociedade, que é uma forma de você manipu-lar. Você vai manipular as pessoas dessa forma: coloca trabalhar o dia inteiro, dá dois dias de folga e ven-de cerveja, por exemplo, e divulga que cerveja é bom. E aí a ideia de massificação e a percepção da in-dústria cultural. Volto a dizer não sou contra. Eu adoro cinema, que nasce dentro de uma indústria cultural. Mas é a mesma percep-ção, você pega o cinema produzi-do em Hollywood, ele é produzido e pensado desde o início para ser comercial, para ganhar dinheiro e para dar retorno. Mas em paralelo a isso surge o cinema russo, surge o movimento francês com a Nouvel-le vague, que faz coisas geniais. Aí tu cais naquela ideia que eu acho

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que é a diferença entre entreteni-mento e cultura. Entretenimento é entreter somente. Cultura pode ser entretenimento também, mas é mais profundo, não é tão raso. Mas eu acho que é importante. Para viabilizar uma exposição eu preci-so de dinheiro, esbarro na questão comercial, na indústria da massa, na indústria cultural. CP: E o Unocultural, surge com a ideia de não limitar as possibili-dades culturais?Panarotto: Você é aquilo que você consome, mas principalmente você é o reflexo do que a sua fa-mília te proporciona. Então, por exemplo, eu e o Demétrio Pana-rotto – meu irmão que é guitarrista da Banda Repolho – somos aqui de Chapecó, a gente tinha acesso a coisas simples como ver o meu pai lendo o tempo todo, eu não via o meu pai de outra forma a não ser lendo. Em casa a gente tinha aces-so a televisão, mas a gente tinha acesso a uma biblioteca e meu pai tinha discos e fitas cassete, e a mi-nha mãe era professora e pintava. Então, a gente cresce na década de 1970 em Chapecó em um universo que é totalmente ligado a questões

culturais. Em função da nossa li-gação com a música surge a Banda Repolho, que propõe brincar com o cenário, desconstruir. Em 1997, chegou o momento de entrarmos na universidade, onde você muda a tua percepção de mundo. E aí a gente olhou e disse: a universidade deveria proporcionar cultura. Na época, trouxemos Tom Zé e Zé Ge-raldo, além de mobilizar uma série de outras coisas e organizar shows de amigos. Passou aquele período, entramos no mercado de trabalho e cinco anos depois eu volto para a universidade com a mesma fixação, achando que esta mesma universi-dade deveria proporcionar eventos culturais. Aí eu começo a perceber isso de uma maneira diferenciada, dessa vez como professor. Na épo-ca, conversei com o Ricardo Rava-nello que era Diretor de Marketing e Comunicação da Unochapecó e propus um evento musical. Se o estado não consegue nem dar o bá-sico para a população, como é que vai gerar cultura que é “supérfluo”, não deveria, mas cultura é supér-fluo – tu deixas de ler um livro, mas não deixa de comer. Então o proje-to começou a potencializar alguns trabalhos, trazendo gente de fora

no sentido musical, cinema, teatro, e apostando nas produções locais. O Unocultural está apenas come-çando o segundo ano de trabalho, mas a ideia é evoluir. Enfim, a ideia do projeto surge dessa necessidade. É aquele princípio que eu falei no início de você construir a cultura. CP: Em relação ao público do Unocultural, são as mesmas pes-soas?Panarotto: Depende da atração, é um público muito plural. Isso é ba-cana, porque quando você termina o projeto e atinge 10 mil pessoas, diversifica muito o público. CP: A ideia é ir disseminando a proposta através disso?Panarotto: Com certeza, para este ano estamos planejando trazer o Marcelo Camelo. Pode ser que nem todas as pessoas gostem, mas você coloca mil pessoas para assis-tir o show e novecentas saem satis-feitas e falando maravilhas. Sem-pre apostando na diversidade, não queremos bater sempre na mesma tecla. Isso tem a ver com que você disse de potencializar.

Paralelo

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Conhecido como o braço forte do capitalismo na América Latina, o Brasil é o país da desigualdade.

Terra onde a educação não flores-ce, as instituições não se atualizam e uma parte da população passa fome. Em gravíssimo estado de alerta, os movimentos sociais estão cada vez mais estrangulados. Ape-sar da evolução comunicacional, através da internet, e a formação de diversos protestos online, a so-ciedade está presa na invisibilidade dos conceitos mercantilistas. Os estrategistas trocaram a opressão coercitiva pela conceitual. Hoje em dia as pessoas estão presas no que a teoria do jornalismo “espiral do silêncio” impecavelmente explica. A teoria defende que os indivíduos buscam a integração social através da observação dos outros, e pro-curam se expressar dentro dos pa-râmetros da maioria, para evitar o isolamento. A cultura popular de-seducada e empobrecida é terreno fértil para a abordagem ideológica e pragmática dos tradicionais veícu-los de comunicação. A implementação de modelos baseados no padrão consumista é peça chave para a manutenção do sis-tema, e infelizmente já estão impregnados na sociedade. Acha-mos que votamos em quem é melhor para nós, mas somos se-duzidos por outras

Contexto

A FALSA DEMOCRACIACrônicas de uma sociedade iludida, vivendo na ficção

Julherme J. Pires

“verdades”. Alguns filósofos e so-ciólogos consideram a democracia brasileira e residente na maioria dos países do ocidente, não ope-rante. E até mesmo exerça o con-trário de seu papel. Ou seja, um regime atuando em estado de opa-cidade. Para exemplificar o enfra-quecimento das tradições, está o desaparecimento das festas popu-lares. As que ainda persistem são basicamente religiosas e existem nas regiões mais pobres e desloca-das dos grandes centros ou longe até mesmo do perímetro de alcan-ce dos meios de comunicação. O etnólogo, musicólogo e folclorista, Luís da Câmara Cascudo contex-tualiza o maior exemplo: “o car-naval de hoje é de desfile, carnaval assistido, paga-se para ver. O car-naval, digamos, de 1922 era com-partilhado, dançado, pulado, gri-tado, catucado. Agora não é mais assim, é para ser visto”. Quando os povos perdem as suas culturas, ficam mais suscetíveis a serem do-minados.

Escreve Eduardo Galeano em sua obra prima As Veias Aber-tas da América Latina: “a demo-cracia formal teria continuidade caso se pudesse garantir que não escaparia ao controle dos donos do poder”. O trecho mostra o porquê da opção “democrática”. Os países vivem reféns de forte influência política de opressores. Por muitas vezes eles mudam de nome, mas sempre estão lá. São forças que fazem girar o mercado de capi-tais. Nos EUA, os grandes bancos comandam o clero político, como mostra o documentário vencedor do Oscar de 2011, Trabalho Inter-no. Em outros países, como do mo-saico europeu, pegando o exemplo a Espanha, são enforcados por políticas econômicas nocivas à in-tegridade social da própria popu-lação. Lá, o povo já está entenden-do a mecânica de funcionamento do sistema. O movimento spanish revolution é a maior prova disso. Trata-se de um movimento ínte-gro e sem liderança, que está avan-çando sobre esta falsa democracia

que impera nos países capitalistas do ocidente. Isso porque a atitu-de contaminou diversos outros países, como Israel e Inglaterra. Expandiu-se tanto, que chegou ao berço da calúnia, os Estados Unidos da América. Com outro nome, mas com o mesmo objeti-vo, os indignados lutam contra a supremacia do 1% mais rico, que detém cerca de 40% das riquezas do país. Nada como um espelho para o mundo.

artigo

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Música

Barulho de ôni-bus ao fundo, “licença”, “você pega sempre

esse ônibus?”. Slim: “Um CD sai a R$10,00, eu faço três por 25. Aceito passe de ônibus, metrô e tic-ket restaurante”, conclui o rapper. Um dos pas-sageiros, observando o discurso do músico per-gunta, “Será que é bom isso aí?”. “Olha, não sei não, viu. Com essa voz aí, imagine cantando... deve ser o fim!”, respon-de uma passageira. Esta descrição é da primeira faixa do primeiro álbum do rapper Slim Rimo-grafia, Financeiramente Pobre (2003). Aí já vem o aviso claro de que se trata de um repertório inde-

pendente de gravadora e que preza pelo espíri-to original do rap – ritm and poesy. É, você vai encontrar gente dizendo que rap não é música. No entanto, resultado de um arranjo, com batidas pró-prias (okey!?), este estilo musical tem se tornado um ponto de fuga para as letras mais bem pen-sadas da música brasi-leira atualmente. Quem ouve Slim Rimografia na primeira vez pensa que é brincadeira, mas é só ir clicando nas seguintes para descobrir uma fonte rica de pensamento críti-co e anseio por transfor-mação. Dentro do uni-verso criado pelo mago das rimas, destacam-se

faixas tanto do primei-ro, quanto do segundo e terceiro álbuns. Em In-trospectivo (2006), a faixa Novos Tempos faz a men-te do ouvinte dar um so-lavanco. “Novos tempos, pessoas sem tempo pra nada, selva de concreto e cimento, onde tento vi-ver e sonhar”. O refrão é apenas a porta de entra-da para a reflexão intensa disposta ao decorrer da letra. As batidas aqui são misturadas com outros sons presentes na vida moderna: leia-se celu-lares, carros... “A vida é um grande carnaval, você tem que se fantasiar para ser alguém pelo que tem, nunca pelo que é”. Slim Rimografia é um rapaz comum, como

ESSA É PA TOCA NA RÁDIOComo a dupla de rappers Slim Rimografia e Thiago Beats faz da música um recanto de teorias e

uma análise profunda da sociedade contemporânea

Julherme J. Pires

explica a faixa Autobio-grafia. Em entrevista a CONTRAPONTO ele esclarece que concluiu o Ensino Médio. Mesmo assim, suas letras estão abastecidas com as prin-cipais teorias da pós--modernidade (ou con-temporaneidade). São encontrados vestígios destas convergências em diversos trechos de seus álbuns. O Filósofo e an-tropólogo francês, Edgar Morin, dá uma pincelada do que é a contempora-neidade: “o século XX fez a aliança com duas barbáries, uma carrega a guerra, massacre, de-portação e fanatismo, e a outra é anônima e gélida ao contato, seu interior abriga a “racionalização,

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MAIS QUE EXISTIR

“Hoje minha vida é difícil me sinto sempre tão inseguro. Os dias me assustam quando caminhando pelas ruas penso no futuro.”

“Sonhos, morreram prematu-ros em dias duros e frios.”

“Coração cheio de magoas sorrir? É quase um desafio. Seguro as lágrimas, solitário entre milhões de almas que vagam. Perdido entre tristes passos nesse deserto sem água”.

“O que me resta? Revolta é voz da frustração que

me testa.Em cada brinde que

saúda a derrota entre botecos e festas”.

“A fé move mon-tanhas, ateu, meus pés ficam estáti-cos. A esperança se foi e hoje os versos melo-dramáticos, me

diz...”

Viver, é bem mais que existir(força pra lutar)Viver, é bem mais que existir(força pra sorrir)Viver, é bem mais que existirViver..

que só conhece o cálculo e ignora o indivíduo, seu corpo, seus sentimentos, sua alma e que multiplica o poderio da morte e da servidão técnico-indus-triais”. O grande carnaval é claramente o resultado da racionalização calcu-lista erguida pela socie-dade ao longo do século passado.

“Pensar o Pós--modernismo implica em refletir o contraste daquele com o Moder-nismo e como este rom-pe com a Modernidade, herdeira da tradição que opera com a racionalida-de iluminista nas ciên-cias, na tecnologia e até mesmo nas artes”, explica o professor da Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da UNESP, Olympio José Pinheiro,

em seu artigo “A Encruzilhada de Janus Bifrons: Arte, Ciência

e Tecnologia na Contemporaneida-de”. E neste processo de alteração, provocado essen-

cialmente pelo modo de produ-ção capitalista, des est abi l i zou até mesmo os valores sociais, principalmente no Ocidente. “O amor se corrom-peu, a fé virou ateu. Até o amor morreu entre Ju-lietas e Romeus. Humanidade em ruínas me lem-bra o coliseu. Nos púlpitos não sei se são Profetas ou fariseus. Pra al-guns é o apogeu, pra mim apo-calipse. Huma-

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nidade na escuridão vivendo um eterno eclipse.”, diz a letra de Epifa-nia, do mais recente disco de Slim, Mais que existir (2009). Neste, o rapper apresenta seu pessimismo na mais alta voltagem. O ponto de efusão negativa chega na faixa que dá nome ao álbum, Mais que exis-tir: “Tem muito luto pra tão pouca

luta, valores invertidos orgulho do fracasso, vergonha de ser bem su-cedido. Conduta contrária de tudo aquilo que acredito. Vai vendo, hoje vitória não é quem vence mais e sim quem sofre menos!” Mas é claro, não se pensa a atualidade sem olhar para trás. Slim faz o paralelo explícito. A ex-plicação, digamos perfeita, da atual situação dos negros no Brasil. Na faixa Zumbi, ele justifica o resga-te histórico necessário e essencial para formular a poesia crítica:

“Apagar a história é ensinar a ig-norar. (...) Sabe quem Zumbi foi... aquele que lutou, morreu por você, foi...”. De fato, Zumbi é um herói nacional, tanto que o dia de sua morte virou o “dia da consciência negra”, feriado adotado por mais de 200 municípios em todo Brasil. Desde as batalhas nos quilombos, muita coisa mudou. “A rotina ti-rou a inspiração da poesia, tirou as cores do pincel do quadro que

o pintor coloria, tirou a emoção da canção e de quem a fazia, ti-rou a felicidade do palhaço e o sorriso da ale-gria”, cantarola a faixa Novos Tempos. Slim vai além: “Escravi-dão não acabou se sabe o que mudou? temos nossas própria senzala bem lon-

ge da casa do sinhô”, diz na faixa Canção da Vitória. Apesar de forte, os versos de Slim vão de encontro ao pen-samento de Edgar Morin: “Se a modernidade é definida como fé incondicional no progresso, na tec-nologia, na ciência, no desenvolvi-mento econômico então – conclui – esta modernidade está morta”. Foi no primeiro álbum, que Slim Rimografia pôde ter alcançado sua obra-prima. Trata-se de a música Poeticamente a Vida. Num trecho,

ele e Morin chegam a quase unifor-midade: “Amor hoje confundido com bens matérias. Dinheiro faz das pessoas: assassinos, celebrida-des, estrelas ou marginais.” Aliás, o primeiro álbum já tem uma riqueza intelectual de amplitude extrema. O trecho, “baseado em fatos reais, aqui não tem ficção; nosso efeito causa efeito, deixo todo mundo bobo; informação, não alienação como nas novelas da globo”, vem dela. E veja que esta não é a única crítica a mídia tradicional exposta nas letras do rapper. O Professor do Departamento de Comunica-ção da Faculdade de Comunicação da Universidade Federal da Bahia e pesquisador do Conselho Nacio-nal de Pesquisa (CNPq), Antonio Albino Canelas Rubim, entende a contemporaneidade como a “Idade Mídia”. E ele utiliza de exemplos claros de livros e artigos intitula-dos com o tema. “‘Aldeia Global’ (McLuhan, 1974), ‘Era da Infor-mação’ ou ‘Sociedade Rede’ (Cas-tells, 1992), ‘Sociedade Informá-tica’ (Schaff, 1991), ‘Sociedade da Informação’ (Lyon, 1988; Kumar, 1997, dentre outros), ‘Socieda-de Conquistada pela Comunica-ção’ (Miège, 1989), ‘Sociedade da Comunicação’ ou ‘Sociedade dos Mass Media’ (Vattimo, 1991), ‘So-ciedade da Informação ou da Co-municação’ (Soares, 1996), ‘Capi-talismo de Informação’ (Jameson, 1991) e ‘Planetas mídias’ (Moraes, 1998). Todas estas denominações, entre muitas outras possíveis, têm sido insistentemente evocadas para

CONTRAPONTO: Quem escre-ve as letras?Slim Rimofragia: Todas as letras são escritas por mim “Slim Rimo-grafia” sempre escrevi muito antes dos raps já fazia alguns poemas e textos.

CP: No que se baseia para as escrever?

SR: Na vida não só na minha vida, mas em toda vida que nos cerca acho muito inspirador observar o mundo e roubar poemas do cotidiano.

CP: Qual é o grau de instrução, tanto do Slim como do Thiago (e de quem escreve e dos outros participantes em geral)?

SR: 2º grau completo acho que a maioria tem esse nível de intrução.

CP: Qual é o objetivo das letras? É provocar um despertar da socie-dade para as questões abordadas ou simplesmente fazer poesia?SR: Acho que os dois fazer poesia é um despertar particular, espa-lhar poesia é compartilhar essa

Cássio Abreu

Música

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“aprisionados” em falsas identida-des sejam reconhecidos pela socie-dade”. Está mais do que claro de que cultura não é algo adicional ou supérfluo. É um elemento funda-mental para a identidade de uma sociedade. E eis o porquê de “mago das rimas”: “Ocuspocus, abra kadabra, poder transfor-mador com a magia das pala-vras. Sim simsalabim, alaka-sam, que se abram os portais do conhecimento guardados pela fada guardiã. Aqui chama-da denominada biblioteca, com magia parecida com a que foi construída templos astecas. Ri-mas mágicas a serviço da cons-trução de um novo ser com novas filosofias, um novo saber. Somos bruxos, magos e centu-riões, do povo os verdadeiros e legítimos guardiões, monta-dos num cavalo alado chama-do cultura”. Esta obra, Rimagia, também está no primeiro ál-bum. Ao longo dos três álbuns, Slim Rimografia dá mostras de estar conectado com os estudos mais avançados da pós-mo-

dizer o contemporâneo. Parte desta sociedade está na cultura. E é quase unânime entre os estudiosos das ciências sociais, de elaque se tratar de a mais im-portante. Susana de Castro é dou-tora em filosofia pela Ludwig-Ma-ximillian Universität de Munique (Alemanha) e professora de Filoso-fia da Educação do Departamento de Fundamentos da Educação da Faculdade de Educação da UFRJ. Em seu artigo “Nancy Fraser e a teoria da justiça na Contempora-neidade”, ela explica que “em países como o Brasil, com enormes dis-paridades econômicas, seria uma grande alienação acharmos que a questão cultural se sobrepõe à eco-nômica”. E o professor da mesma universidade carioca, Claudio de Paiva Franco, explica “desestabili-zar o pensamento vigente de uma sociedade, o senso comum, ques-tionar a origem das coisas é uma tarefa desafiadora. É dessa forma que o multiculturalismo é apresen-tado: como algo perturbador que, ao questionar vários aspectos da vida social, pode propiciar novas possibilidades para que indivíduos

vontade de mudar algo de sentir a vida é despertar pro mundo é acordar pra vida.

CP: Vocês têm outras ações sociais fora da música?SR: O Thiago (Beats) trabalha com Silkscreen eu Slim só faço músicas e por alguns anos fui arte educa-dor porem os shows não nos deixa

muito tempo livre para fazer projetos sociais apenas pequenos workshop e palestras.

CP: O que pensam sobre o capita-lismo?SR: Não é o melhor porem é im-possivel ser comunista ou socialis-ta num sistema capitalista temos a necessidade do dinheiro, mas

jamais ser escravo dele.

CP: Planos para o futuro da du-pla?SR: Fazer muita música.

Janaina Castelo Branco/siteNOIZ

dernidade. Isso se chama visão. Não é olhar somente para o próprio um-bigo. É perceber o que acontece a sua volta. Cultura num nível elevado gera transformação e quem a detém se liberta do censo co-mum e das corren-

tes das informações pagas. “Escuta: tem muito luto pra tão pouca luta. Você escuta muito discurso e vê pouca conduta”, este verso da faixa Postura conclui bem esta reporta-gem.

Na faixa Honra Meu Mérito, Slim canta: “Pianos tocam notas e acordes tão tristes. Soldados lutam por paz que não existe”. Esta leitura é similar a feita ainda na década de 40 pelo jornalista e escritor inglês Eric Arthur Blair, mais conhecido como George Orwell. Em sua obra 1984, Blair trabalha conceitos sociais pensando em 40 anos para mais tarde. “E, como é praxe, os grupos dominantes das três potências ao mesmo tempo sabem e ignoram o que estão fazendo. Dedicam a vida à conquista do mundo, mas também sabem que é necessário continuar a guerra, sem fim e sem vitória”. Neste trecho do livro, Blair explica como os “mandantes” organizam uma agenda militar para controlar a população criando patriotismo e medo. Um modelo de dominação presente em nossa sociedade.

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Jornalismo

JORNALISMO INSTITUCIONALIZADOEntre tantas definições e especulações sobre o mercado da Assessoria de Imprensa, a CP foi

em busca do que é, o que faz e o que os profissionais pensam sobre

Lydiana Rossetti

O ato de comunicar se-gundo o dicionário é fazer saber, por em contato, tornar co-

mum. E é o que querem muitas empresas: fazer com que a infor-mação rápida, passageira, se torne algo permanente, conhecido pelas pessoas. Afinal quem não é visto não é lembrado. As empresas estão utili-zando cada vez mais as estratégias e os meios de comunicação para firmarem relacionamento com seu público, seja ele interno ou exter-no. As assessorias de comunicação são a peça chave para esta relação, que é realizada por departamento interno ou pela contratação de ins-tituições especializadas no assunto. O que envolve os três campos da área da comunicação social: Jorna-lismo, Relações Públicas e Publici-dade e Propaganda. Especialmente aos profis-sionais de jornalismo cabe a fun-ção de assessor de imprensa. Esta prática profissional consolidou-se após a segunda guerra mundial, e desde a criação sofreu muito pre-

conceito e desconfiança dos pro-fissionais da imprensa, que acredi-tavam que este segmento limitava a atuação de um jornalista, quase que uma traição à profissão. Em al-guns países se nega até hoje a con-dição de jornalista para profissio-nais que trabalham nesta área. Para o professor universitário e autor do livro A Reportagem, Nilson Lage, o surgimento das assessorias contri-buiu decisivamente para a profis-sionalização do setor de comuni-cação social, com a delimitação de posições, o lado de quem fornece e o de quem coleta a informação. Um assessor de imprensa exerce serviços muito maiores que apenas a produção e reprodução de releases. Elaboração de produ-tos jornalísticos como fotografias, programas de rádio ou televisão, edição de periódicos destinado ao público externo e interno do órgão assessorado, e a participação na definição de estratégias de co-municação também fazem parte das funções deste profissional. Para a jornalista e coor-denadora do Núcleo de Relações

com o Mercado do Senai de Cha-pecó, Ana Paula Eckert, a função de assessorar cabe totalmente a um jornalista, preferencialmente formado, que além da produção de material sobre a empresa, sabe lidar com a imprensa. Ana cita o exem-plo de solicitações de entrevista da mídia local. Os veículos entram em

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contato com ela para designar al-guém que saiba falar sobre o tema a ser tratado, portanto ela como assessora deve conhecer desde a pessoa que entenda o assunto até a pessoa que se porte bem na frente das câmeras, que saiba conceder uma entrevista. Desde 2005, Ana trabalha

no Senai. Entrou na empresa ain-da na faculdade, mas não atuava na área. Em 2007, um ano antes de se formar, entrou para o Nú-cleo onde hoje é a coordenadora. Ela conta que o trabalho realiza-do é uma comunicação integrada. Além dela, uma publicitária e uma administradora trabalham no se-

tor, desenvolvem desde um informativo a organização de eventos.

As organizaçõesMostrar o assessorado não significa deixar de lado o interesse público. Tanto in-terna quanto externa a in-formação deve ser impor-tante para o “destinatário”. Um produto produzido jornalisticamente só terá resultados se for de interes-se da sociedade. De acordo com a Gerente de Comuni-cação Social, Isabel Cristi-na Trierveiler Machado, é desta forma que a comuni-cação da Aurora Alimentos procura trabalhar. A comunicação in-terna funciona com o auxí-lio de jornais murais, rádio, revista, para que funcio-nários sintam-se parte da

empresa. Há 12 anos, a Aurora contrata uma empresa terceirizada para prestar assessoria de imprensa externa. Para Isabel, a comunica-ção é essencial para o crescimento e fortalecimento da instituição. “Se a empresa não se comunicar com o público, fica a mercê do mercado”, explica. É também o que Ana afir-ma, “não vejo o Senai sem esse se-tor”, quando se refere ao núcleo que trabalha. Para ela, um profissional tem que estar sempre aberto a no-vas experiências, não se prender a apenas a sua função e mostrar para a empresa o quanto a comunicação é necessária.

As vantagens e as desvantagensNa região muitas empresas ainda não perceberam a importância de ter ou contratar os serviços na área de comunicação. “Grandes empre-sas que poderiam ter um profis-sional atuando não possuem, ou a pessoa não é formada”, conta Ana.Ao contrário de Ana, a responsável pela assessoria de imprensa da em-presa Nova Multicomunicação de Chapecó, Camila Farias, acredita que esta é uma área que ganham a cada dia mais reconhecimento. Eles assessoram oito empresas, sem contar as que contratam os serviços eventualmente.Camila acredita que a comunica-ção terceirizada com a qual tra-balha, seja a mais vantajosa. “Para uma empresa manter um profissio-nal é muito caro. Então terceirizar é a melhor opção. Muitas empresas não precisam de uma assessoria diária”, explica. Mesmo com a vontade re-pentina que às vezes toma conta em pegar um assunto que renda uma boa pauta e começar a redi-gir o texto, Ana Paula gosta mui-to do que faz, “não me vejo saindo daqui”. Ela confessa que onde tra-balha não se fala em piso salarial, mas sim em planos de cargos e sa-lários, e por trabalhar oito horas e a função agregar outros processos empresariais acaba ganhando mais que um repórter, por exemplo. Benefícios como plano de saúde, odontológico, auxílio cre-che, além de não precisar trabalhar em feriados, fins de semana e fazer plantão, são fatores que Ana acre-dita a deixar estável e confortável na área em que trabalha. Com um olhar exterior aos meios, já que nunca trabalhou em um, ela co-menta: “em um veículo de comu-nicação é mais difícil crescer em questão de cargo, o que é diferente em uma empresa de outra área”.

Assessoria tem pressão menor em relação a tempo

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Jornalismo

SER JORNALISTA? EIS A QUESTÃONatan Silveira

Sete horas da noite. Aprova-dos através do vestibular ou processo seletivo especial, chegam à universidade para

o início do ano letivo. O curso es-colhido: Jornalismo. De um lado – acomodados dentro da sala de aula -, os calouros esperam ansio-sos a entrada do professor com as primeiras palavras sobre a profis-são. De outro, veteranos, mestres e profissionais da área prontos para “aprontar” com os novos alunos. Entre uma e outra brincadeira, de-poimentos são apresentados aos acadêmicos. De um deles sai a se-guinte afirmação: “Ser jornalista não é fácil. Se trabalha muito, mas se ganha pouco”. A partir daí, uma pergunta “percorre” os neurônios dos estudantes. Vale a pena ser jor-nalista? O jornalista chapecoense, Rafael Henzel, 37 anos, diz que vale e declara que a profissão é apaixonante. “O futuro promissor está nas relações profissionais que o jornalista desenvolverá na carrei-ra”, revela. E qual é o motivo para existir tanta paixão, deve imaginar a maioria dos acadêmicos? Para Henzel, é pela importância que a profissão tem frente à socieda-

de. Ele explica que o jornalismo é uma das ferramentas importantes para educar e orientar a população, bem como deve ser utilizada para fiscalizar e auxiliar o crescimento econômico e cultural de uma cida-de, de um estado ou até mesmo do país. O diretor tesoureiro do Sindi-cato dos Jornalistas do Rio Grande do Sul (SJRS), Antonio Barcellos, se mostra convergente ao conceito de Rafael e acrescenta: “O jornalis-mo é o termômetro da consolida-ção democrática”. No livro O Que é Ser Jor-nalista, Ricardo Noblat discorre sobre o problema que a imprensa norte-americana enxergava: o con-trole de muitos veículos de comu-nicação por um número reduzido de empresários – fato semelhante ao ocorrido no Brasil entre 1930 e 1960, com os Diários Associados de Assis Chateaubriand. Contudo, no caso descrito por Noblat, os do-nos das megaempresas pensavam o jornalismo como um negócio que deveria ser subordinado a outros mais lucrativos. Entretanto, o jor-nalista e escritor, expõe a função e o método como o profissional deve lidar com essas intempéries. “O jornalista veio ao mundo para cor-

rer atrás da notícia e oferecê-la ao estimado público da melhor ma-neira possível. Com precisão, cla-reza e honestidade”, afirma. Assim, a indicação apresentada no livro por Ricardo – sem querer – com-plementa a ideia relatada por Hen-zel e Barcellos. Porém, para muitos estudantes de Jornalismo, estes ar-gumentos são considerados pouco. Hoje, o fator preponderante para a continuação no curso é a questão salarial e a situação acerca do di-ploma que regulamenta o exercício da profissão de jornalista.

Mito ou Realidade?No dia 17 de junho de 2009, nove ministros do Supremo Tribunal Federal discutiram a problemática sobre a obrigatoriedade do diplo-ma de jornalista. Com oito votos contra, a formação em um curso superior de Jornalismo deixou de ser necessária para a atuação em veículos de comunicação ou asses-sorias de imprensa profissionais. Mas, esta medida não significou o fim dos cursos da área nas uni-versidades brasileiras. Na ocasião, apenas o ministro Marco Aurélio defendeu o diploma para o exercí-cio da profissão. Desde então, mo-

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bilizações e debates sobre a impor-tância do diploma são realizados pelos sindicatos de jornalistas em todo o país, relata Barcellos. Desta-ca-se o abaixo-assinado online a fa-vor das PECs 33/2009 e 386/2009, de autoria do senador Antônio Carlos Valadares (PSB-SE) e do deputado Paulo Pimenta (PT-RS), respectivamente, disponibilizado

no site da Fede-ração Nacional dos Jornalistas (FENAJ) a partir do mês de agos-to do ano pas-sado. Para An-tonio Barcellos, a maior dificul-dade na adesão das manifesta-ções sindicais da profissão, é o baixo índice de sindicalização dos jornalistas. “Por tradição o jornalista ‘abra-ça’ todas as cate-gorias, menos a sua”, conta. Todavia, a folha de paga-mento do pro-fissional não tem influência do diploma de graduação em curso superior.

Pelo menos essa é a posição do presidente do Sindicato dos Jorna-listas de Santa Catarina (SJSC), Ru-bens Lunge. Em seu ponto de vista, existem outras questões mais rele-vantes e que determinam a quan-tia embolsada. Lunge cita como exemplo, a experiência adquirida pelo profissional. Na mesma linha de raciocínio, Henzel coloca outro fator, não menos importante: a ne-gociação. O jornalista chapecoense lembra uma situação que aconte-ceu com ele no Rio de Janeiro. Sem

formação superior, foi contratado por uma emissora de televisão e a questão salarial foi definida em acordo com o veículo de comuni-cação. Aspecto também levantado por Rafael Henzel, diz respeito à burocrática abertura de uma em-presa, no intuito de aumentar a renda. “Utilizei minha experiência de 15 anos em veículos de comu-nicação para montar uma empresa de assessoria de imprensa. Tenho uma renda muito maior”, enfatiza. O problema é que a cria-tividade nem sempre aflora nas mentes e almas jornalisticamente formadas. Para muitos, a academia serve apenas para proporcioná-los a garantia da diplomação. Resul-tado: uma mesa, um computador, uma térmica de café e alguns co-pinhos descartáveis, além da falta de independência do profissional. Então são das redações que saem os mitos da profissão? Pode-se di-zer que sim. Entretanto, para Bar-cellos, há um pingo de verdade na questão. O diretor tesoureiro do SJRS diz que a situação dos jorna-listas é semelhante a dos profes-sores, contudo os profissionais da educação começaram a escancarar seus salários de fome, enquanto os jornalistas não o fazem por excesso de vaidade. “No jornalismo existe um grande glamour e um pequeno salário”, ressalta. Porém, Rubens Lunge ana-lisa de forma diferente. A tese que o presidente do SJSC utiliza é a se-guinte: falta compreensão dos jor-nalistas quanto à remuneração. O piso salarial da categoria estipula-do pelo sindicato é apenas uma re-ferência e deveria servir como base para os recém-formados, também chamados de “focas”. Uma pesqui-sa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeco-nômicos (DIEESE), apontou que os jornalistas catarinenses rece-bem, em média, mais de dois mil reais mensais. Para Lunge, é inte-

Natan Silveira

Rafael Renzel em jogo da Chapecoense: dá trabalho, mas vale

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ressante que os profissionais com uma carreira consolidada utilizem--se de um quesito apresentado por Rafael Henzel: negociar os venci-mentos com o veículo de comuni-cação. Discussão encerrada? Claro que não. Os pisos salariais também são debatidos.

Na esperança de dias melhoresPor que eu ganho tão pouco? Gos-taria de ganhar mais, pois mereço. Perguntas e respostas dessa rele-vância são encontradas em qual-quer empresa. E as redações jor-nalísticas não fogem o padrão. Até porque no Brasil não existe apenas um “salário mínimo” para jornalis-tas. Cada sindicato estadual estipu-la o seu piso. Mas, porque existem discrepâncias entre os estados, que podem chegar a 60%? Lunge e Bar-cellos, em consenso, têm a orien-tação. Na opinião dos membros dos sindicatos estaduais do RS e SC, a falta de sindicalização, ou até mesmo o apoio às mobilizações e debates da categoria, por parte dos profissionais, contribui para a es-tagnação no valor dos vencimen-tos. “O salário dos jornalistas será melhor quando a categoria quiser que isso ocorra, demonstrando isso em participação em assembléias dos jornalistas, em ações concretas sobre a necessidade de melhorais salariais, em manifestações coleti-vas”, adverte Lunge. O mesmo argumento é uti-lizado pelos dois, quanto ao futuro da profissão no país. Barcellos se mostra confiante e otimista. “Te-mos muito claro que é uma batalha que depende muito do aumento do nosso exército de jornalistas”, res-salta. Para ele, esta é a maneira de expor o risco que a sociedade corre na informação decorrente da con-tratação, pelos veículos de comuni-cação, de profissionais sem forma-ção superior.

Valores

Bob Esponja, Pokémon e Os Simpsons fazem par-te da rotina de muitas crianças, que trocam seus

carrinhos, bonecas e brincadeiras pela televisão. Deste modo, a falta de atividades físicas, pode causar danos a aprendizagem e a saúde ou torná-las suscetíveis ao conteúdo exibido pela mídia. O desenvolvi-mento infantil nos aspectos mo-tor, emocional, social e intelectual, depende do que a criança aprende e acredita ser correto. Assim, a in-fluência da TV e seus programas contribui ou atrapalha para este progresso pessoal? Segundo o pesquisador ale-mão em neurobiologia, Manfred Spitzer, em entrevista concedida ao Zero Hora, a TV engorda, em-burrece e torna as crianças agres-sivas. Ele afirma que crianças que passam mais de quatro horas por dia na frente da televisão possuem déficit de concentração e tem pro-

A INFLUÊNCIA DATELINHA

Na frente da televisão, crianças ficam expostas ao lado bom e ruim da tecnologia

Stéfany Breda

Jornalismo

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blemas sérios com a aprendizagem. Contudo, a psicóloga Michele Ga-boardi Lucas, diz que a televisão é somente um fator, mas não o causador da falta de atenção. “Se a criança consegue se concentrar em outras coisas, até mesmo na televi-são, o problema não é de concen-tração”, afirma. Michele explica que o mundo da fantasia é positivo e pode favorecer os pequenos, sobre os aspectos de esperteza e intelec-tualidade. Todavia, deve existir uma dosagem do tempo de expo-sição na frente da TV. “O acompa-nhamento dos pais, no controle do tempo é de extrema importância”, ressalta. A colocação de limites en-sina às crianças a diferença entre a fantasia e o real. Deixá-la fazer

todas as suas vontades, construi-rá uma barreira entre pai e filho, quando for citada a palavra “não”, já que as crianças estão acostuma-das a fazer tudo o que desejam, no momento em que lhes interessam. Uma palavra negativa soará como uma “ tempestade”. TV Cultura, Disney Juniors e TV Futura. Para a dona de casa Eliane Gnoato, estes são os canais mais indicados para crianças. Elia-ne é mãe de Eloisa Gnoato, de sete anos. “O conteúdo destes canais ajudam na criatividade e no desen-volvimento das crianças. Ensinam jogos, brincadeiras e atividades que despertam o pensar dos pequenos”, conta. Os canais indicados por Eliane são educativos, transmite cultura, curiosidades informações,

brincadeiras, dentre outras pro-gramações que contribuem para a educação das crianças. Conta com desenhos animados e educativos, como cocoricó, para descontrair. Pais, professores, legis-ladores e educadores se preocu-pam com os programas expostos as crianças. De nada adianta estes ensinarem de uma forma, se a te-levisão orienta de outra. Este é um grande desafio a quem realmente se preocupa com o futuro da na-ção. As propagandas de roupas e brinquedos acabam induzindo as crianças a serem seres consumis-tas desde pequenos. Dessa forma, quanto mais tiverem, mais irão querer. Muitas vezes a justificati-va é ausência dos pais. É o caso da pequena Larissa Ribeiro que alega

Dimitris Papazimouris

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precisar de uma boneca para lhe fazer companhia enquanto a mãe está fora. “ Vou ter com o que brin-car quando você tiver no trabalho”, relata Larissa de cinco anos. Tais atitudes geram proble-mas no convívio com outras crian-ças e até mesmo na afetividade com os pais. Com o grande avanço do desenvolvimento tecnológico, os pais já não têm mais tempo de ficar junto com os filhos. Eles aca-bam passando o dia todo no traba-lho. Os filhos ficam nas escolas ou com babás. A noite, os pais já estão cansados demais para dar atenção. Em “A criança e a TV”, Ra-quel Soifer, afirma que as sequên-cias dos desenhos animados, das séries ou das propagandas cujos personagens as crianças tendem a imitar desde tenra idade, não tem relação com a realidade cotidiana e mantêm os pequenos em um mun-do totalmente distanciado dela. Em lugar de oferecer modelos educati-vos, tais personagens destacam-se por sua astucia cruel, sua imorali-dade e sua maldade. “Os supostos heróis de programas apresentados diariamente na televisão e que têm estado mais em moda acentuam a tendência infantil a limitação, com o que incitam as crianças a come-ter atos imprudentes e perigosos, como atirar-se no espaço, subir pelas paredes, fazer traquinagens, etc”, escreve. A partir deste fato contem-porâneo percebe-se a diferença nas relações familiares comparadas ao passado. As mães ficavam em casa cuidando dos filhos e ensinando às meninas os trabalhos domésticos. Os pais levavam os meninos para ajudá-los nas plantações e no cui-dado com os animais. Desta forma, além das crianças ficarem acompa-nhadas dos pais, aprendiam desde muito cedo como cuidar de si e da casa. Outro fator importante é que as famílias eram maiores, portan-to as crianças tinham com quem

brincar, se comunicar e aprender. Não ficavam isolados em frente à televisão por não terem compa-nhias. Além disso, somente as fa-mílias mais opulentas tinham aces-so a TV. Ela - a televisão - não era um aparelho essencial na vida das famílias. O instrumento preponde-rante na época era o rádio. Os pais devem ter cons-ciência de que as crianças precisam ter limites. Por ficarem muitas ve-zes, o dia todo em casa, a grande parceira dos pequenos acaba sendo a TV. Aspecto com mesmo grau de relevância, é que os pais acabam querendo aliar atenção com des-canso. O que acaba gerando atitu-des nem sempre corretas a serem tomadas. O caso de Adriane Car-valho, de nove anos é um exempo. Ela conta que assiste televisão com os pais à noite. Novelas, o progra-ma A Fazenda e filmes, são os pro-gramas mais assistidos pela família dela. Percebemos que essa é a for-ma dos pais de Adriane dedicarem um pouco mais de atenção e cari-nho a menina A professora Leocimara Laura de Faria, explica que em sala de aula, estas questões estão sempre presentes. Manifestam a preocupa-ção com a situação da criança que fica diretamente sob a influência da TV e das outras mídias. “Cada vez mais aumenta o número de fa-mílias que estão entrando para o mercado de trabalho e deixando os filhos sozinhos em casa. “Eles têm, muitas vezes, como único enlevo a própria TV”, revela. O tempo que as crianças fi-cam expostas em frente à televisão, pode tanto trazer pontos positivos quanto negativos. Depende de uma dosagem que não vicie e nem apre-sente às crianças cenas contra indi-cadas. Essa falta de cuidado pode provocar conflitos futuros. Então a dica da psicóloga Michele, é que os pais adquiram novos hábitos, para conviver mais com as crianças.

Valores

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NÓS QUEREMOS A SUA [email protected]

A Liga Estudantil de Jornalismo está atuando na estruturação interna

da organização. Este é o momento para am-

pliar horizontes e fazer acontecer. Se você ou a

sua empresa acredita no desenvolvimento social através da comunicação

e da informação, estamos dispostos a por isso em

prática. Entre em contato, nós cumpriremos nossa

missão.

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O clipe que propagandeia a Copa do Mundo de 2014, que será no Brasil, mostra uma mesa de reu-niões de um escritório em Nova York. Um grito de gol ecoa de um lugar longinquo e um americano engravatado diz (em inglês): “Você ouviu isso?”. O vídeo segue mostrando as nossas belezas naturais como as lindas praias do Rio de Janeiro e as cataratas de Foz de Iguaçu. O locutor termina: “O Brasil está te chamando. Celebre a vida aqui”. Aqui no Brasil, porém, a voz das ruas parece mais protesto do que comemoração. Apaixona-dos por futebol, os torcedores di-zem ter sua cidadania ameaçada por acordos de gabinete e seus di-reitos roubados pelas exigências da FIFA e pelas obras faraônicas que rasgam as cidades. É o que se lê no dossiê

“Mega-eventos e violações de Di-reitos Humanos no Brasil”, pre-parado pela Articulação Nacional dos Comitês Populares da Copa e das Olimpíadas, e lançado nesta segunda-feira (12) de forma simul-tânea pela Pública e em atos de Co-mitês Populares por todo o país. No Rio de Janeiro, have-rá uma concentração em frente à Prefeitura às 10h30; em Belo Ho-rizonte haverá uma marcha que se concentrará na Praça 7 às 14h; em Curitiba, uma marcha sairá às 10h rumo à Prefeitura de São José dos Pinhais. Em Natal haverá uma au-diência pública; em São Paulo e em Porto Alegre, o documento será entregue às devidas prefeituras, enquanto em Brasília o comitê re-gional irá buscar o governo federal.

Acompanhamento das obrasO lançamento do documento

acontece pouco depois da Arti-culação lançar um site próprio (http://www.portalpopulardacopa.org) que deve acompanhar a situa-ção dos torcedores na contagem dos dias para a Copa do Mundo. Tanto o site quanto o rela-tório foram produzidos conjunta-mente por comitês populares, que são agremiações de organizações sociais e pessoas que serão atingi-das pelas obras em Belo Horizonte, Brasilia, Cuiabá, Curitiba, Forta-leza, Manaus, Natal, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador e São Paulo. Além de denúncias de violações de direitos, o documen-to traz um quadro completo de acompanhamento das obras para a Copa do Mundo, incluindo custos previstos, valores licitados e como está o andamento até o momento. A reforma do Maracanã,

Nação

DOSSIÊ INÉDITO REVELA ABUSOS RUMO À COPA DO MUNDOA Pública teve acesso ao relatório feito por organizações populares das 12 cidades-sedes da

Copa. Ele diz que o povo e os seus direitos estão ficando de fora.

Agência Pública 12/12/2011

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por exemplo, tinha um valor pre-visto em 600 milhões mas acabou sendo licitada a um valor de 859 milhões, metade pago pelo BNDES segundo o dossiê. Da mesma for-ma, os píeres do porto do Rio de Janeiro, cujo custo estimado era de 314 milhões, foram licitados a 610 milhões. O mesmo ocorre com dezenas de projetos apontados no levantamento.

É só o começoOs movimentos populares, apoia-dos por acadêmicos e pesquisado-res, estimam que pelo menos 170 mil pessoas têm seu direito à mo-radia violado ou ameaçado pelos mega-eventos que estão por vir, em especial a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. O dossiê aponta que a rea-lização da Copa do Mundo 2014 em doze cidades e das Olimpíadas

2016 no Rio de Janeiro agrega no-vos elementos críticos à já grave questão habitacional nessas capi-tais: grandes projetos urbanos com impactos econômicos, fundiários, urbanísticos, ambientais e sociais. Por exemplo, devem se proliferar os condomínios de luxo e centros empresariais que não “comportam” pobreza em seus arredores, ou que podem atropelar comunidades para se expandir. Não há dados oficiais sobre os despejos; o documento faz uma estimativa a partir de relatos de quem mora nas cidades. Até o início de dezembro, havia 21 casos de vilas e favelas nas cidades de Belo Horizonte, Curiti-ba, Fortaleza, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo que fo-ram desocupadas, segundo o relato de seus moradores, “com estraté-gias de guerra”.

“(São) estratégias de guerra e perseguição, como a marcação de casas a tinta sem esclarecimentos, a invasão de domicílios sem manda-dos judiciais, a apropriação inde-vida e destruição de bens móveis, a terceirização da violência verbal contra os moradores, as ameaças à integridade física e aos direitos fundamentais das famílias, o corte dos serviços públicos ou a demo-lição e o abandono dos escombros de uma em cada três casas subse-qüentes, para que toda e qualquer família tenha como vizinho o ce-nário de terror”, diz o documento. Um dos casos mais em-blemáticos é o do Parque Linear Várzeas do Tietê, na cidade de São Paulo. “Dividida em três eta-pas, a obra prevê a construção de uma avenida, ‘Via Parque’, para ‘valorizar a região’ [...] que fica às margens da rodovia Ayrton Sen-

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na, entre o Aeroporto Internacio-nal de Guarulhos e o futuro está-dio do Corinthians, provável sede paulista na Copa do Mundo, em Itaquera. Mais de 4.000 famílias já foram removidas do local sem serem consultadas sobre a implan-tação do parque e sem saber para onde iriam. Outras 6.000 famílias aguardam, ignorando seu destino. ‘Pegaram nós de surpresa. Com um projeto de tamanha proporção, a comunidade no mínimo tinha que ser consultada. [...] As famí-lias foram morar ali há mais de 40 anos, quando ainda não era Área de Proteção Ambiental’, diz o líder comunitário Oswaldo Ribeiro”. Um dos locais mais amea-çados é Fortaleza, que segundo o documento terá mais de 15.000 famílias atingidas por empreen-dimentos relacionados à Copa do Mundo.

Exploração dos trabalhadores ge-rou 10 greves pelo paísA Fifa determinou que as obras dos estádios deveriam estar prontas antes de 31 de dezembro de 2012, a tempo de sediar a Copa das Confe-derações em 2013. Diversas vezes Jérôme Valc-ke, secretário-geral da entidade, fez pronunciamentos em que alertava para o atraso das obras e cobrava do país um ritmo mais acelerado. Diante de tanta pressão, alguém ti-nha que pagar a conta. Segundo o dossiê, foram os trabalhadores das obras: “Essa pressão parece favorecer também às próprias empreiteiras, uma vez que contribuiu para os atropelos legais, aportes adicionais de re-cursos públicos, irregularidades nos processos de licenciamento de obras e inconsistência e incomple-tude de alguns projetos licitados sem qualquer segurança econômi-ca, ambiental e juridical”, afirma o

documento. “Mais do que isso: serviu como pretexto para as violações de direitos dos trabalhadores nas obras dos estádios e dos projetos de infraestrutura. A conjugação entre a magnitude das obras e os cronogramas supostamente aper-tados para realizar os empreendi-mentos já tem resultado em más condições de trabalho e na supe-rexploração dos operários, a des-peito das cifras milionárias desti-nadas às obras”. Em pouco tempo, mobili-zações, paralisações e greves co-meçaram a pipocar pelo país. O dossiê contabiliza que até novembro de 2011, foram re-gistradas pelo menos dez para-lisações em seis dos 12 estádios que serão usados para a Copa: no Mineirão em Belo Horizonte, no Mané Garrincha em Brasília, no Arena Verdão em Cuiabá, Arena Castelão em Fortaleza, no Arena Pernambuco em Recife e até no Maracanã, no Rio de Janeiro. Entre as principais reivin-dicações das greves estavam des-de aumento salarial e concessão de benefícios como plano de saú-de, auxílio alimentação e garantia de transporte até melhoria nas condições de trabalho (em espe-cial, os trabalhadores reclamam das condições de segurança, salu-bridade e alimentação), aumento do pagamento para horas extras e o fim do acúmulo de tarefas e jornadas de trabalho “desumana-mente prolongadas”.

O povo, excluído da festaEnquanto os movimento sociais estão promovendo cada vez mais o debate sobre as obras da Copa, a população em geral não participa dos órgãos e da estrutura de or-ganização de sua preparação. As portas estão fechadas à participa-ção popular, segundo o dossiê. “Informações sobre os

Nação

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processos de preparação para a Copa do Mundo de 2014 e os Jo-gos Olímpicos de 2016 não são apenas negadas à população em geral, mas mantidas secretas até mesmo para os órgãos de con-trole do próprio Estado, como o Ministério Público” diz o dossiê, e ainda: “Nesse contexto, vemos as populações atingidas fora das ins-tâncias decisórias e mesmo sem ter acesso à informações básicas para a defesa de seus direitos. En-quanto isso, uma diversidade de organismos são instituídos em ní-vel federal, estadual e municipal, tais como grupos gestores, comi-tês, câmaras temáticas e secreta-rias especiais da copa”.

Passada a Copa, fica o legadoEm uma carta anexa ao docu-mento, os comitês populares se mostram preocupados com o le-gado dos mega-eventos. Dizem que até agora não é evidente que as obras contribuam minimamente para a inclusão social e a ampliação de direitos sociais, econômicos, culturais e ambientais: “Ao contrário, a fal-ta de diálogo e transparência dos investimentos aponta para a re-petição do que ocorreu no perío-do dos Jogos Panamericanos de 2007, quando assistimos ao des-perdício de recursos públicos (de acordo com o TCU, mais de R$ 3,4 bilhões foram gastos de forma indevida, mas ninguém foi puni-do) em obras superfaturadas que se transformaram em elefantes brancos”.

apublica.org

O brasileiro está pagando uma festa em que o mundo todo irá desfrutar

Sam Javanrouh

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Literatura

Ler para crescerKaehryan Fauth

“Era uma vez...”, quantas mães sabem o quão importante é contar histórias para seus filhos desde que nascem? Já

viemos ao mundo condicionados a aprender as diversas formas de linguagem para que possamos nos comunicar na sociedade. O psi-cólogo Peter Jusczyk da Universi-dade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, descobriu que seis meses após o nascimento os bebês já são capazes de associar sons e pala-vras aos seus significados. Parece impossível, mas a capacidade de aprendizagem do ser humano co-meça desde sua formação no úte-ro, e continua mais intensamente nos primeiros anos de vida. Uma pesquisa realizada em Chicago, no Estado da Califórnia, também nos Estados Unidos, revela que filhos estimulados pelos pais com gestos ou mesmo à interação com outras crianças têm uma maior facilidade de socialização e de descobrir pala-vras novas. Outro segredo, nem tão secreto assim, é o incentivo a leitu-ra, que além de ajudar a criança a memorizar a grafia das palavras, ajuda também a estimular a cons-trução de frases mais harmônicas. A boa leitura é base da for-

mação cultural de qualquer pessoa, são registros históri-cos feitos em livros que nos apresentam a diferentes cultu-ras, hábitos, realidades, ideo-logias, entre tantas outras coi-sas. Mas quantos livros você lê por ano? Segundo a Câmara Brasileira do Livro, cada bra-sileiro lê pouco mais de dois livros por ano. Este núme-ro, sem dúvidas, é alarmante e influencia diretamente na economia, inclusive na clas-se social de cada indivíduo. É verdade, o Brasil está longe de ter uma formação escolar homogênea, mas com o in-centivo à leitura é possível dar asas para que alunos ampliem seus pensamentos, sonhos e objetivos. Os ingleses mantém uma média de cinco livros lidos anualmente. No que isso resulta? A Inglaterra possui um dos melhores sistemas de ensino do mundo. As escolas têm papel fundamental de educadoras e formadoras de bons hábitos, mas, a leitura é um prin-cípio que deve ser instigado tanto na escola como pelos educadores fundamentais, os pais. Segundo o Ministério da

Educação, a leitura desenvolve o repertório cultural, instiga o sen-so crítico, amplia o conhecimen-to geral, o vocabulário, estimula a criatividade, emoções e claro, prepara melhor a criança, e con-sequentemente facilita o ato de es-crever. Mas afinal, qual a fórmula para o estímulo da leitura? Para a professora de Língua Portuguesa, Juceli Morello Lovatto, o segredo é começar pelo que a pessoa mais

Noukka Signe

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gosta, “o interesse pela leitura dá--se, principalmente, pelo estímulo favorável e pelo aguçar da curiosi-dade sobre o fabuloso mundo da escrita”. Para ela, a leitura culmina em discussões mais consistentes

além de inquietação e satisfação pelo conhecimento, “podemos nos arrepender de não ter lido, mas nunca de ter lido!”, afirma. O jornalista Tiago Franz admite que nas disciplinas de reda-ção e língua portuguesa havia mui-ta cobrança, “Os professores pro-curavam manter a originalidade de cada aluno, mas quase sempre os textos corrigidos eram rabisca-

dos com sugestões”. Segundo ele, cobrava-se muito o uso de palavras alternativas para evitar a repetição exaustiva. A partir disso, já é pos-sível estabelecer alguns objetivos para quem lê mais: a leitura como

meio de se informar, de estudar, e acima de tudo de forma prazerosa. Quanto mais cedo houver essa bus-ca, seja por qualquer um dos obje-tivos, mais eficazes serão os livros. Lembre-se: antes um livro na mão do que dois na estante. Ler é um ato contínuo de desenvolvimento da capacidade crítica, o processo da leitura exige um esforço que ga-rante uma compreensão ampliada

do mundo, de nós mesmos e da nossa relação com a sociedade.

Gíria ou armadilha?“Saca” esse “lance” das gírias? São expressões que geralmente surgem

entre os jovens e têm signi-ficados específicos. Elas têm caráter popular e surgiram como uma espécie de identi-dade cultural de determina-dos grupos ou tribos. Gíria não é sinônimo de falta de instrução ou de mau uso das palavras, é uma busca pela representação de algo que não tem significado especí-fico ainda, ou que tem um significado que complica demais a expressividade do termo. Estas palavras que se agre-gam e aos poucos tomam conta do vocabulário tem um papel muito importan-te, o de renovação das ex-pressões linguísticas. Elas existem desde sempre e distinguem gerações. Algu-mas gírias são situacionais, outras se camuflam e aos poucos se infiltram no nos-so cotidiano, tomando con-ta dele até mesmo de forma imperceptível. As gírias pas-saram de regionais ou de de-terminados grupos sociais, a

socialização a nível mundial, tendo como principal vetor de di-vulgação a internet. Mas é preciso estar atento: quem tem o costume de usar gírias precisa se autovigiar para não usá-las em momentos inapropriados. Afinal, você não vai a um evento formal com uma rou-pa de ginástica, “tá ligado”?

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Fotografia

Silvio Tanaka