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CONSUMO COLABORATIVO NA MODA: Um estudo sobre as motivações e barreiras da participação em serviços de guarda-roupas compartilhados Eva Farah São Paulo | 2019

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CONSUMO COLABORATIVO NA MODA: Um estudo sobre as motivações e barreiras da participação em serviços de guarda-roupas compartilhados

Eva Farah

São Paulo | 2019

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ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING

PROGRAMA DE MESTRADO PROFISSIONAL EM

COMPORTAMENTO DO CONSUMIDOR

EVA FARAH

CONSUMO COLABORATIVO NA MODA:

Um estudo sobre as motivações e barreiras da participação em

serviços de guarda-roupas compartilhados

SÃO PAULO

2019

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EVA FARAH

CONSUMO COLABORATIVO NA MODA:

Um estudo sobre as motivações e barreiras da participação em

serviços de guarda-roupas compartilhados

Dissertação apresentada como requisito para obtenção do título de Mestre em Administração, com ênfase em Comportamento do Consumidor, pela Escola Superior de Propaganda e Marketing – ESPM. Orientadora: Profa. Dra. Thelma Valéria Rocha

SÃO PAULO

2019

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RESUMO

O consumo colaborativo (CC), caracterizado pelo acesso, em vez da propriedade, a produtos e serviços, ainda enfrenta desafios para ganhar massa crítica e escala. Exemplos de CC têm crescido nos últimos anos e ganhado força em outros setores não tão óbvios, como na indústria da moda. No contexto de consumo compartilhado de moda (CFC), se assiste o surgimento de um novo modelo de negócio, o guarda-roupa compartilhado, que vem ganhando atenção da mídia. A partir desse cenário, o objetivo deste estudo é entender quais são as motivações e as barreiras de participação no sistema de consumo colaborativo de moda de guarda-roupa compartilhado. Para alcançar os resultados, foi utilizada uma abordagem qualitativa por meio de entrevistas em profundidade com uma amostra de 25 pessoas, sendo 14 usuárias e 11 ex-usuárias desse serviço. A partir da análise dos dados, realizada com a ajuda do software ATLAS TI, foram identificadas 13 categoriais de motivações e sete categorias de barreiras. Dessa maneira, espera-se contribuir para a literatura de consumo colaborativo de moda, ainda recente, e munir as empresas desse setor com o conhecimento necessário para se adaptarem a novos modelos de negócios e dar suporte no crescimento do modelo de negócio específico do guarda-roupa compartilhado.

Palavras-chave: Marketing. Comportamento do consumidor. Economia compartilhada. Consumo colaborativo. Moda. Guarda-roupa compartilhado.

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ABSTRACT

Collaborative consumption (CC) is characterized by access, instead of ownership, to products and services and still faces challenges to gain critical mass and scale. Examples of CC have grown in recent years and gained strength in other not-so-obvious sectors, such as fashion industry. In the context of collaborative fashion consumption (CFC), there is a new business model, the fashion library, which has been gaining media attention. From this scenario, the objective of this study is to understand the barriers and motivations of participation in this new collaborative fashion consumption service. To achieve the expected results, the problem was analysed with a qualitative approach through 25 deep interviews, of which 14 with users and 11 with ex-users of this service. From the data analysis, performed using ATLAS TI software, 13 categories of motivations and 7 categories of barriers were identified. In this way, we hope to contribute to the growth of the recent literature of collaborative fashion consumption, and to provide the fashion companies with the necessary knowledge to adapt to new business models and support the growth of the specific business model of fashion library.

Keywords: Marketing. Consumer behaviour. Shared economy. Collaborative consumption. Fashion. Fashion library.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1- Busca pelo termo Sharing economy ............................................................... 17

Figura 2 - Busca pelo termo: Guarda-roupa compartilhado .......................................... 18

Figura 3 - Funcionamento do consumo colaborativo (CC) ............................................. 26

Figura 4 - A estrutura do consumo colaborativo de moda (CFC) ................................... 32

Figura 5 - Recorrência das categorias das motivações entre usuárias e ex-usuárias .... 55

Figura 6 - Recorrência das categorias de barreiras entre usuárias e ex-usuárias .......... 66

Figura 7 - Busca nos Estados Unidos por: What is sharing economy? ......................... 100

Figura 8 - Busca nos Estados Unidos por: Clothes for Rent ......................................... 100

Figura 9 - Busca no Brasil por: Sharing Economy ......................................................... 101

Figura 10 - Busca no Brasil por: O que é economia compartilhada? .......................... 101

Figura 11 - Busca no Brasil por: Airbnb ....................................................................... 101

Figura 12 - Busca no Brasil por: Uber ........................................................................... 102

Figura 13- Busca no Brasil por: Netflix ......................................................................... 102

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Procedimentos Metodológicos .................................................................... 20

Quadro 2 - Componentes intrínsecos e extrínsecos da motivação ............................... 35

Quadro 3 - Motivações de participação em sistemas de CFC ........................................ 38

Quadro 4 - Barreiras de participação em sistemas CFC ................................................. 39

Quadro 5 - Consolidação das motivações e barreiras de participação e CFC ................ 42

Quadro 6 - Recursos metodológicos .............................................................................. 43

Quadro 7 - Dados demográficos e duração das entrevistas .......................................... 47

Quadro 8 - Tempo das entrevistas e das transcrições ................................................... 48

Quadro 9 - Roteiro utilizado como base para as entrevistas com as usuárias .............. 50

Quadro 10 - Roteiro utilizado como base para as entrevistas com as ex-usuárias ....... 51

Quadro 11 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Variedade de produtos

................................................................................................................................ 55

Quadro 12 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Diversão ................... 56

Quadro 13- Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Novidade sem culpa . 57

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Quadro 14 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Experimentar novos

estilos ...................................................................................................................... 57

Quadro 15 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Interação social ....... 58

Quadro 16 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Imagem .................... 58

Quadro 17 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Curadoria ................. 59

Quadro 18 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Frugalidade .............. 60

Quadro 19 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Evitar investimentos

errados .................................................................................................................... 61

Quadro 20 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Financeiro ................ 62

Quadro 21- Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Conveniência ............ 62

Quadro 22 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Consumo Favorável ao

meio ambiente ....................................................................................................... 63

Quadro 23 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação Distanciamento do

sistema .................................................................................................................... 64

Quadro 24 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira Higiene e Preocupações

com a saúde ............................................................................................................ 67

Quadro 25 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Falta de confiança no

acervo ..................................................................................................................... 68

Quadro 26 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Falta de Informações ... 69

Quadro 27 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Falta de propriedade ... 70

Quadro 28 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Dificuldade de uso/acesso

................................................................................................................................ 71

Quadro 29 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Falta de conveniência .. 72

Quadro 30 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Financeira .................... 73

Quadro 31 - Discussão das motivações hedônicas com a teoria ................................... 74

Quadro 32 - Discussão das motivações utilitárias com a teoria .................................... 77

Quadro 33 - Discussão das motivações ambientais com a teoria.................................. 80

Quadro 34 - Motivações de participação em sistemas de guarda-roupa compartilhados

................................................................................................................................ 81

Quadro 35 - Barreiras de participação em sistemas de guarda-roupa compartilhados 82

Quadro 36 - Resumo das motivações e barreiras de participação em sistemas de

guarda-roupas compartilhados .............................................................................. 86

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Quadro 37 - Motivações e barreiras de participação em sistemas de consumo

colaborativo de guarda-roupa compartilhado ....................................................... 87

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Recorrência das categorias das motivações entre usuárias e ex-usuárias ... 54

Tabela 2 - Recorrência das categorias das barreiras entre usuárias e ex-usuárias ....... 65

LISTA DE SIGLAS

CC – Collaborative Consumption (Consumo Colaborativo)

CFC – Collaborative Fashion Consumption (Consumo Colaborativo de Moda)

CL – Collaborative Lifestyles (Estilos de Vida Colaborativos)

CP – Consumer Perspective (Perspectiva do Consumidor)

P2P – Peer to Peer (Par-a-par)

PSS – Product Service System (Sistemas de Serviços de Produtos)

RM – Redistribution Markets (Mercados de Redistribuição)

SDT – Self Determination Theory (Teoria da Autodeterminação)

SE – Shared Economy (Economia Compartilhada)

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................. 11

1.1 PROBLEMA DE PESQUISA .......................................................................................... 14

1.2 OBJETIVOS ................................................................................................................... 14

1.4 JUSTIFICATIVA ............................................................................................................. 16

1.5 MÉTODO ...................................................................................................................... 19

1.6 ESTRUTURA ................................................................................................................. 20

2. REFERENCIAL TEÓRICO ..................................................................................... 21

2.1 O COMPARTILHAMENTO ........................................................................................... 21

2.2 UMA NOVA FORMA DE CONSUMIR: O CONSUMO COLABORATIVO .................. 23

2.3 O CONSUMO COLABORATIVO NA MODA E O GUARDA-ROUPA

COMPARTILHADO ............................................................................................................. 29

2.4 MOTIVAÇÕES DE PARTICIPAÇÃO EM SISTEMAS DE CONSUMO COLABORATIVO

DE MODA (CFC) ................................................................................................................. 34

2.5 AS BARREIRAS DO CONSUMO COLABORATIVO DE MODA (CFC) ........................ 39

2.6. CONSOLIDAÇÃO DAS MOTIVAÇÕES E BARREIRAS DE PARTICIPAÇÃO EM

SISTEMAS DE CFC .............................................................................................................. 41

3. RECURSOS METODOLÓGICOS......................................................................................... 43

3.1 ABORDAGEM ............................................................................................................... 43

3.2 TIPO .............................................................................................................................. 44

3.3 AMOSTRAS E POPULAÇÃO ........................................................................................ 45

3.4 INSTRUMENTO DE PESQUISA ................................................................................... 48

3.5 ANÁLISE DOS DADOS ................................................................................................. 52

4. RESULTADOS ................................................................................................... 53

4.1. DISCUSSÃO ................................................................................................................. 73

5. CONCLUSÃO .................................................................................................... 87

5.1.LIMITAÇÕES ................................................................................................................. 92

REFERÊNCIAS .......................................................................................................... 94

APÊNDICE ............................................................................................................... 99

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1. INTRODUÇÃO

Nos últimos 50 anos, a população mundial consumiu mais bens e serviços do que todas

as gerações anteriores juntas. Desde 1980, consumiu-se 1/3 dos recursos naturais de todo o

planeta (JACKSON, 2005) e já se sabe que o atual nível de consumo é insustentável para a

quantidade de recursos naturais disponíveis (BRADSHAW; BROOK, 2014).

Muitos dos comportamentos de consumo atuais, como o descarte desenfreado,

tornaram-se tão habituais que não se tem consciência do impacto que causam. Para os

fabricantes é um grande potencial de lucro, visto que o descarte instantâneo dos produtos

depois de utilizados, obriga ao cliente comprar mais. Esse tipo de mentalidade foi

desenvolvida logo depois da revolução industrial, a partir de fatores como: o surgimento do

cartão de crédito e estratégias de negócios tais como a obsolescência percebida – que

mantém o consumidor insatisfeito para que as indústrias alcancem a prosperidade econômica

– e a obsolescência planejada – que faz com que os produtos tenham deliberadamente um

ciclo de vida mais curto para aumentar as vendas – intensificaram o problema (BOTSMAN;

ROGERS, 2011).

Atualmente, em se tratando de consumo de vestuário, ter um armário cheio de roupas

e acessórios praticamente novos e sem usá-los é comum (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018). No

começo da década de 1990, as famílias americanas tinham o dobro de produtos do que

costumavam ter 25 anos antes. Em 2005, o consumidor médio americano comprava uma nova

peça de vestuário a cada cinco dias e meio e, em 2012, 30% das roupas do guarda-roupa de

uma família britânica não haviam sido usadas nos últimos 12 meses (WRAP, 2012). Por não

caberem tantos produtos adquiridos nas casas, as pessoas passaram a alugar locais de

armazenamento para ampliar sua capacidade de possuir coisas (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

O hiperconsumo foi impulsionado pela crença de que o dinheiro e o acúmulo do que

ele pode comprar é igual a felicidade, mas sabe-se que não é verdade. A distância entre o que

se tem e, o que se quer, aumenta junto com a quantidade de coisas que se possuí. Essa busca

pela riqueza material também prejudicou os vínculos familiares e comunitários, e a busca por

paixões pessoais e a responsabilidade social (BOTSMAN; ROGERS, 2011). Olhando assim, o

sistema de consumismo pode até parecer a única realidade na vida moderna, mas a sociedade

começa a perceber que é possível criar um sistema mais saudável e sustentável (BECKER-

LEIFHOLD; IRAN, 2018; BOTSMAN; ROGERS, 2011).

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Nos últimos anos, a colaboração tem se tornado a palavra de ordem em diversos

campos, como economia, filosofia, tendências, varejo e empreendedorismo. Aparentemente,

os antigos C’s associados ao compartilhamento – como as cooperativas, os coletivos e os bens

comuns - estão sendo atualizados e reinventados tornando-se atraentes e valiosas formas de

colaboração em comunidade (BOTSMAN; ROGERS, 2011). A colaboração deixou de ser

somente um valor e converteu-se em uma nova forma de viver e consumir (BELK, 2014).

As redes e modos alternativos de aquisição e consumo só crescem, muito diferente

das práticas tradicionais baseadas na posse, estabelecendo uma nova forma de relação

econômica e social denominada Consumo Colaborativo (CC) (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

Nessa forma de consumo, ao invés de comprar e possuir as coisas, os consumidores buscam

o acesso aos bens e preferem pagar pela experiência de acessá-los temporariamente (CHEN,

2009). De acordo com Botsman e Rogers (2011), o CC é o compartilhamento tradicional, troca,

empréstimo, aluguel ou presente redefinidos por meio de tecnologia e comunidades de pares

- que está transformando os negócios, o consumismo e a maneira como vivemos. Os princípios

colaborativos já extrapolaram o meio digital e são aplicados a outras áreas físicas da vida

cotidiana.

As vantagens desse novo padrão de consumo emergente são muitas e não se

restringem apenas à relação entre custo e benefício para os usuários. A redução do consumo,

mesmo que de maneira indireta, traz benefícios significativos ao meio ambiente, tendo em

vista que o CC tem como base a circulação de mercadorias já produzidas (MAURER et al.,

2012), às pessoas, que passam a acessar produtos que elas não seriam capazes

financeiramente de comprar (LOVELOCK; GUMMESSON, 2004), além de possibilitar a

otimização dos seus próprios recursos (BOTSMAN; ROGERS, 2011) e ainda abriu a

possibilidade de criação de novos modelos de negócio extremamente rentáveis (RIFKIN,

2000).

A proliferação de modelos de consumo baseados no acesso e no compartilhamento de

recursos, produtos ou serviços só aumenta e isso está longe de ser tendência de nicho ou uma

reação passageira em lugares ainda em recessão (BOTSMAN; ROGERS, 2011). Eles já estão

presentes em diversos setores da economia e incluem grandes marcas reconhecidas, como

AirBnB, que promove o compartilhamento de espaços; o Netflix, que promove o

compartilhamento de filmes; e a Uber, que promove o compartilhamento de carros

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(PEDERSEN; NETTER, 2015). Cada vez mais empresas surgem com modelos baseados em CC e

alcançam crescimentos expressivos no mercado global (BOCKMANN, 2013).

O cenário brasileiro não é diferente, segundo a IE Business School e o Banco

Interamericano de Desenvolvimento (2017), o Brasil é o líder em iniciativas colaborativas na

América Latina, operando principalmente nos setores de serviços para empresas (26%),

transporte (24%) e aluguel de espaços físicos (19%). Além de casas e carros, a economia

colaborativa está adentrando nichos de mercado e aumentando as oportunidades de

compartilhar em diversas áreas (BOCKMANN, 2013).

Em algumas indústrias esse conceito ainda é recente. Na indústria da moda, por

exemplo, a ideia do consumo colaborativo ainda não é popularizada, mas ideias de

compartilhamento têm se proliferado nesse setor (PEDERSEN; NETTER, 2015). Exemplos

incluem serviços on-line como o ThredUp, que revende itens de vestuário infantil, o Swapstyle,

que permite às pessoas trocarem itens de moda, o Depop, aplicativo com o foco em revenda

de roupas e acessórios usados, e a Blimo e a Roupateca, empresas brasileiras que operam com

o modelo de guarda-roupa compartilhado por meio de assinatura mensal, objeto de estudo

desta pesquisa.

Há boas razões para prestar atenção nessas iniciativas. Em primeiro lugar, espera-se

que o consumo colaborativo tenha um potencial de negócios significativo para a indústria da

moda. Nos EUA, apenas o mercado de roupas usadas para crianças, movimenta entre US$ 1 e

3 bilhões (BOTSMAN; ROGERS, 2011). Além da motivação econômica, o consumo colaborativo

também reduz o consumo excessivo, contribuindo para tornar a indústria da moda mais

sustentável (KOZLOWSKI et al., 2012). Entretanto, apesar de algumas vantagens serem

visíveis, ainda não é claro quais as motivações e barreiras de participação nesses sistemas

(BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018).

A máxima de que você é o que você consome pode precisar ser modificada para

considerar formas de posse e de uso que não envolvam propriedade (BELK, 2014). E se essa

transição realmente está acontecendo e ganhando força, é necessário entender quais as

motivações e barreiras que estão por trás desses novos comportamentos de consumo,

podendo assim alcançar a escala e a adesão necessárias para que o CFC traga os benefícios

esperados aos usuários e às empresas (BOTSMAN; ROGERS, 2011), garantindo a aceleração

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do consumo colaborativo, considerada uma das dez ideias que mudarão o mundo (TIME,

2011).

1.1 PROBLEMA DE PESQUISA

Existe uma variedade de novos conceitos e modos de vida, que trazem preocupações

econômicas, ambientais e sociais. Juntamente com os avanços tecnológicos, o resultado tem

sido uma reestruturação dos padrões de produção e consumo, antes baseados na posse, para

um foco maior no uso e no acesso a produtos e serviços, conhecidos como consumo

colaborativo (BOTSMAN; ROGERS, 2011). Essas novas práticas têm afetado diversas indústrias,

entre elas a moda (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018). Segundo Belk (2010), para que seja

possível compreender essas mudanças, é preciso examinar o comportamento do consumidor

em relação às suas formas alternativas de consumir, suas motivações e razões.

O sucesso dessas plataformas baseadas em consumo colaborativo (CC) depende, em

grande parte, de atingir uma massa crítica de usuários. Sem massa crítica, qualquer usuário

dificilmente seria capaz de encontrar o que procura nesses sistemas, diminuindo assim a

eficiência e conveniência do CC. Para saber se as plataformas de CC podem atingir uma massa

crítica, é necessário saber qual é o potencial do consumidor dessas plataformas, e para

entender esse potencial, é necessário conhecimento das motivações e das barreiras de

participação nesses novos sistemas (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

Nesse contexto, esse estudo busca responder à pergunta: quais as motivações e

barreiras de participação em sistemas de consumo colaborativos de moda?

1.2 OBJETIVOS

A partir da revisão da literatura, o objetivo principal deste estudo é identificar quais

são as motivações e as barreiras de participação em sistemas de consumo colaborativos de

moda. Propõe-se identificar especificamente as motivações e barreiras que influenciam as

mulheres brasileiras, moradoras do estado de São Paulo, a participarem de uma variação

específica de sistema de consumo colaborativo, denominado guarda-roupa compartilhado

(PEDERSEN; NETTER, 2015).

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Para que seja possível alcançar o objetivo principal, este estudo possui dois objetivos

específicos, definidos abaixo:

I. Identificar quais são as motivações de participação no sistema de consumo

colaborativo de moda (CFC) de guarda-roupa compartilhado;

II. Identificar quais são as barreiras de participação no sistema de consumo

colaborativo de moda (CFC) de guarda-roupa compartilhado.

Nos parágrafos seguintes, serão explicados alguns dos recortes deste estudo.

O recorte de gênero deu-se por dois motivos: (i) serviço de guarda-roupa

compartilhado no Brasil é destinado apenas ao público feminino (até onde a autora tem

ciência) e; (ii) mais de 60% das mulheres brasileiras considerarem que roupas e sapatos são

seus maiores gastos pessoais mensais (SPC BRASIL, 2016).

Em relação aos sistemas de CFC, apesar de diversos modelos terem sido abordados na

revisão da literatura, será analisado apenas o modelo de negócio definido como guarda-roupa

compartilhado. A escolha por esse modelo de negócio deveu-se ao seu aparecimento recente

no Brasil e pela atenção que ele está atraindo da mídia (O GLOBO, 2017; METRÓPOLES, 2018;

PEDERSEN; NETTER, 2015).

Apesar da variável idade ser recorrente nos estudos de motivações e barreiras, e da

literatura sugerir que a geração Millennial1 é mais propensa a utilizar os sistemas de CFC

(HAMARI; SJOKLINT; UKKONEN, 2016), não foi realizado recorte etário ou geracional neste

estudo. Isso porque, de acordo com Botsman e Rogers (2011), os jovens foram criados em

ambientes onde existem modelos de negócios operando com base em CC, mas esses hábitos

não estão restritos a uma determinada faixa etária. Pessoas mais velhas e mais jovens

compartilham características e hábitos similares interativos e todas estão praticando, de

diferentes formas, o consumo colaborativo.

Por último, de acordo com Becker-Leifhold e Iran (2018), as motivações e barreiras dos

sistemas de CFC podem ser analisadas tanto do ponto de vista do consumidor quanto do

ponto de vista do negócio. Neste estudo, será analisado exclusivamente a perspectiva do

consumidor (CP), tanto dos consumidores atuais do sistema de guarda-roupa compartilhado

1 A geração Y (também chamada geração Millennials) é um conceito em Sociologia que se refere, segundo alguns autores, às pessoas nascidas após 1980 até meados da década de 1990. Disponível em: < https://pt.wikipedia.org/wiki/Gera%C3%A7%C3%A3o_Y>. Acesso em: 10 maio.2018.

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quanto dos ex-consumidores, que neste estudo serão entendidas como usuárias e ex-usuárias

do serviço.

1.4 JUSTIFICATIVA

A colaboração tem se tornado a palavra de ordem entre economistas, filósofos,

analistas de negócios, pesquisadores de tendências, comerciantes e empreendedores.

Aparentemente os antigos C’s associados ao compartilhamento – como as cooperativas, os

coletivos e os bens comuns - estão sendo atualizados e reinventados por meio de atraentes e

valiosas formas de colaboração em comunidade (BOTSMAN; ROGERS, 2011). As práticas de

consumo que envolvem propriedade são, historicamente, o interesse central dos

pesquisadores de consumo, mas pesquisas que abordam esses novos modos alternativos de

consumo - não baseados na posse - ainda são limitadas (VAN DE GLIND, 2013).

A colaboração deixou de ser somente um valor e tornou-se uma nova forma de viver

e consumir (BOTSMAN; ROGERS, 2011). O fenômeno é tão relevante que a revista Time

anunciou o CC como uma das ideias que vão mudar o mundo (TIME, 2011). Para Botsman e

Rogers (2011), o consumo colaborativo não é uma tendência de nicho, tampouco é uma

reação passageira em lugares em recessão, e sim, uma onda socioeconômica que mudará o

modo como a empresa encara sua proposta de valor e como o consumidor satisfaz suas

necessidades.

Os números confirmam esse crescente interesse. De acordo com os dados do Google

Trends, a busca pelo termo Sharing economy tem crescido, como é possível acompanhar no

Figura 1. A relevância do assunto fica ainda mais clara quando se identifica que as pesquisas

realizadas com o termo What is sharing economy? alcançaram recorde histórico no mês de

abril 2018 nos Estados Unidos, desde que as mensurações começaram a ser realizadas, em

2004 (apêndice). Observando especificamente o consumo colaborativo de moda, a busca pelo

termo Clothes for rent, o equivalente a “aluguel de roupas”2 também teve recorde histórico

em abril de 2018 (apêndice).

2 Tradução livre

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Figura 1- Busca pelo termo Sharing economy

Fonte: Google Trends3

No Brasil, o cenário não é diferente. Também de acordo com os dados do Google

Trends, a busca pelos termos Sharing economy e “O que é economia compartilhada?” tem

crescido nos últimos anos (apêndice). Ao analisar o Figura 2, especificamente o fenômeno do

guarda-roupa compartilhado, o aumento da busca por esse termo desde 2016 confirma que

há crescente interesse por essa forma de consumo. O mesmo acontece quando se analisa o

que tem acontecido em relação ao número de buscas no Google por marcas icônicas que

atuam com modelos de consumo compartilhado no Brasil, como Airbnb, Uber e Netflix

(apêndice).

3 País: Estados Unidos. Período: 2004 – presente. Busca: Sharing Economy. Disponível em: <https://trends.google.com/trends/explore?q=%2Fm%2F0vzt9zc&date=all&geo=US>. <https://trends.google.com/trends/explore?date=all&geo=BR&q=guarda%20roupa%20compartilhado>. Acesso em: 13 maio.2018.

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Figura 2 - Busca pelo termo: Guarda-roupa compartilhado

Fonte: Google Trends

Nesse contexto, o conceito de guarda-roupa compartilhado é relevante tanto como

oportunidade de negócio, quanto como meio de promover um uso mais eficiente das roupas

e acessórios, visto que a redução do descarte pode reduzir os impactos ambientais dessa

indústria (KOZLOWSKI et al., 2012). Aluguel de vestuário já foi identificado como uma

possibilidade para reduzir a demanda de materiais que, por sua vez, teria um impacto

ambiental positivo (ALLWOOD et al., 2006). No entanto, pouco se sabe sobre de que modo os

diferentes tipos de sistemas de compartilhamento de roupas podem funcionar como um

modelo de negócio e até como uma estratégia de sustentabilidade (PEDERSEN; NETTER,

2015).

Sendo assim, este estudo contribui para a literatura emergente de consumo

colaborativo, iniciada por Botsman e Rogers (2011), além de contribuir para a literatura de

sistemas de serviços de produtos (PSS) e varejo de moda, fornecendo conhecimentos práticos

para a indústria e profissionais do marketing e acadêmicos que busquem modelos alternativos

e mais sustentáveis de consumo de moda. Entender as barreiras e motivações da participação

nesse serviço, da perspectiva do consumidor (CP), pode facilitar e acelerar o desenvolvimento

desses modelos de negócios, fornecendo conhecimentos importantes para a difusão e escala

dos CFCs e, principalmente, do guarda-roupa compartilhado.

Este estudo também é inovador por analisar as motivações de participação em

sistemas de serviços de produto do setor de moda, além de ser um dos poucos estudos que

analisa os usuários e os não usuários do consumo colaborativo (ERTZ; DURIF; ARCAND, 2016;

GLIND, 2013). Além disso, até onde a autora tem conhecimento, esse é o primeiro estudo que

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busca entender as motivações e barreiras de participação no serviço de guarda-roupa

compartilhado.

1.5 MÉTODO

Desde o lançamento do livro Botsman e Rogers (2011), o consumo colaborativo vem

recebendo cada vez mais atenção da mídia, dos empreendedores, das empresas e dos

pesquisadores. Pesquisar um tema tão recente exige flexibilidade, pois ao mesmo tempo em

que as teorias são testadas, elas ainda estão sendo construídas e confirmadas (VAN DE GLIND,

2013).

O método de pesquisa foi definido a partir do problema de pesquisa “Quais as

motivações e barreiras de participação em sistemas de consumo colaborativos de moda?”,

dos objetivos “Identificar quais são as motivações e as barreiras de participação em sistemas

de consumo colaborativo de moda (CFC) de guarda-roupa compartilhado” e das variáveis

identificadas a partir da literatura. Considerando o objetivo exploratório da pesquisa e a

revisão da literatura, optou-se pela pesquisa bibliográfica, seguida da pesquisa de campo com

abordagem qualitativa e de natureza aplicada, para que fosse possível gerar conhecimentos

para aplicação prática.

A técnica de coleta de dados utilizada foi entrevista em profundidade realizada

individualmente por telefone, com roteiro semiestruturado. Foram entrevistadas 25 pessoas,

sendo 14 usuárias do sistema de guarda-roupa compartilhado e 11 ex-usuárias do mesmo

sistema. Os resultados foram interpretados a partir de uma análise do conteúdo realizada com

a utilização do software ATLAS TI.

Como parte do processo de preparação desta pesquisa, foram selecionadas as duas

maiores empresas que prestam o serviço de guarda-roupa compartilhado na cidade de São

Paulo e as proprietárias foram entrevistadas sobre as barreiras e motivações identificadas por

elas no dia a dia do negócio. Além disso, a pesquisadora, para se aproximar do objeto de

estudo, assinou e participou do serviço de guarda-roupa compartilhado por 6 meses. A escolha

por essa etapa deu-se principalmente pelo caráter novo do tema entre os pesquisadores

acadêmicos e por não ter sido encontrada nenhuma pesquisa que analisasse esse fenômeno

específico no Brasil. Os recursos metodológicos se encontram resumidos no Quadro 1 abaixo:

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Quadro 1 - Procedimentos Metodológicos

Fonte: Autora, 2019.

1.6 ESTRUTURA

A presente dissertação tem início com uma discussão das perspectivas teóricas dos

aspectos que envolvem o problema de pesquisa na revisão da literatura, no capítulo 2. A

revisão começa com o entendimento do conceito de compartilhamento, no tópico 2.1,

explorando sua origem, exemplos práticos e evolução. No tópico 2.2, é abordado o conceito

de consumo colaborativo e as formas como ele se manifesta. Já no tópico seguinte, 2.3, é

explorado o consumo colaborativo especificamente na moda e o modelo de guarda-roupa

compartilhado. No tópico 2.4, são exploradas as motivações de participação no consumo

colaborativo de moda e no 2.5, as barreiras motivações de participação no consumo

colaborativo de moda. Sumarizando as ideias, no capítulo 2.6, é feita a consolidação das

motivações e barreiras identificadas na literatura.

No capítulo, 3 são explicados os recursos metodológicos. Nos tópicos 3.1 a 3.5, são

discutidos a abordagem, o tipo, a amostra, o instrumento e a técnica de análise de dados da

pesquisa. O objetivo desse capítulo é consolidar e desenhar um percurso metodológico que

responda aos objetivos iniciais da pesquisa. Já no capítulo 4 são consolidados e discutidos os

resultados da pesquisa a partir da análise das entrevistas em profundidade e no capítulo 4.1

são discutidos os achados da pesquisa confrontando-os à teoria existente.

A conclusão, junto com as contribuições teóricas e gerenciais são encontradas no

capítulo 5. No final do trabalho é possível encontrar as referências bibliográficas utilizadas e

os apêndices que dão suporte à esta dissertação, respectivamente.

RECURSOS METODOLÓGICOS

Natureza Aplicada

Abordagem Qualitativa

Tipo Pesquisa exploratória

Amostra

25 entrevistadas, sendo 14 usuárias e 11 ex-usuárias do serviço de guarda-roupa compartilhado

Técnica de coleta de dados

Entrevista em profundidade com roteiro semiestruturado realizada por telefone

Técnica de análise dos dados Análise de conteúdo

Período da coleta de dados Outubro a dezembro de 2018

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2. REFERENCIAL TEÓRICO

O referencial teórico tem como principal objetivo contextualizar os conceitos

explorados neste estudo sobre compartilhamento, consumo colaborativo (CC) e guarda-roupa

compartilhado. Tendo em vista o seu objetivo, esta seção também aborda o consumo

colaborativo especificamente no setor de moda (CFC) e analisa os possíveis fatores

motivacionais e as barreiras, já mapeadas na literatura, que envolvem a participação nesses

sistemas.

Com o objetivo de facilitar o entendimento dos constructos analisados, este capítulo

foi dividido da seguinte maneira:

2.1. O compartilhamento: análise dos fenômenos de compartilhamento ao longo da história;

2.2. Uma nova forma de consumir – o consumo colaborativo (CC): conceituação, princípios do

consumo colaborativo e as diferentes formas de compartilhar;

2.3. O consumo colaborativo de moda (CFC) e o guarda-roupa compartilhado: como esse

conceito já se manifesta no setor e quais as características desse modelo negócio;

2.4. Motivações do consumo colaborativo de moda: identificação das principais motivações

previamente mapeadas na literatura de consumo colaborativo de moda;

2.5. Barreiras do consumo colaborativo de moda: identificação das principais barreiras

previamente mapeadas na literatura de consumo colaborativo de moda.

2.1 O COMPARTILHAMENTO

Durante séculos a humanidade juntou-se para conseguir o que era preciso,

compartilhando acesso a alimentos, terras e outros recursos. Há milhões de anos, os seres

humanos estavam agrupados em tribos, que sobreviviam colhendo plantas e caçando animais

em bandos de maneira cooperativa. Depois de uma matança, a carne era cortada e

compartilhada com todo o acampamento e esforços cooperativos similares a esse

continuaram a existir ao longo da história (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

Apesar do compartilhamento ser uma atividade praticada há muito tempo, as

pesquisas em comportamento de consumo têm dado recentemente atenção a um grupo de

práticas de consumo específicas descritas como “compartilháveis” (BELK, 2010). Esses novos

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negócios estão nascendo graças à economia compartilhada. Os exemplos de negócios são

diversos, Airbnb, Zipcar, Netflix, Wikipedia, Uber, Youtube, Flickr, Facebook, Freecycle, etc. De

uma maneira ampla, a própria internet é uma plataforma gigante de conteúdo compartilhado

que pode ser acessada por qualquer pessoa com uma conexão de internet, um navegador e

um governo que permita o acesso ao conteúdo (BELK, 2014).

Belk (2007) sugere que compartilhar envolve o ato e o processo de distribuir o que é

de uso pessoal e individual para uso coletivo ou de receber ou pegar algo de outras pessoas

para o uso pessoal ou individual. Benkler (2004) acrescenta que compartilhar é um

comportamento pró-social não recíproco. O compartilhamento ocorre por motivos funcionais,

como sobreviver (FINE, 1980) ou como um ato altruísta, como conveniência ou bondade

(BELK, 2014). Normalmente, alguém não negaria falar as horas, indicar os caminhos corretos

ou emprestar um isqueiro. Esses padrões de comportamento esperados viraram normas

culturais, mesmo que ocorram mais facilmente entre amigos próximos e familiares do que

entre estranhos.

As tecnologias de informação e de comunicação, especialmente a internet,

proporcionaram novos horizontes para os sistemas de troca e compartilhamento entre

pessoas, permitindo que formas já existentes ganhassem escala (BELK, 2014). Como definiu

Mark Levine4 “O compartilhamento está para a propriedade, assim como o Ipad está para o

toca fitas, assim como o painel solar está para a mina de carvão. O compartilhamento é limpo,

nítido, urbano e pós-moderno. A propriedade, por sua vez, é enfadonha, egoísta, tímida e

retrógrada”. Anuncia-se o final de uma cultura consumista pura unidirecional baseada na

posse de cada vez mais coisas (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

O compartilhamento é um fenômeno tão antigo quanto a humanidade, enquanto o

consumo colaborativo e a economia compartilhada são fenômenos que nasceram a partir da

era da internet. A velha máxima de que as pessoas são o que consomem pode precisar ser

modificada para considerar formas de posse e de uso que não envolvam propriedade. (BELK,

2014).

O conceito de consumo colaborativo foi descrito pela primeira vez por Algar (2007) e,

posteriormente, ampliado por Botsman e Rogers (2011). Ele pode até parecer uma ideia

4 The New York Times, 2009. Disponível em: <https://www.nytimes.com/2009/03/08/magazine/08Zipcar-t.html> Acesso em: 17 maio.2018.

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inovadora, mas é baseado em um comportamento de uma prática tradicional já empregada

pela humanidade desde as primeiras formas de relacionamento e que foi muito utilizada até

a surgimento do modelo capitalista de produção, centrado na acumulação de riqueza e na

posse de mercadorias.

2.2 UMA NOVA FORMA DE CONSUMIR: O CONSUMO COLABORATIVO

Quanto mais golfinhos no cardume, mais fácil será para pegar mais peixes e maior será o benefício, tanto individual quanto coletivo (BOTSMAN; ROGERS, 2011, p. 58).

Nos últimos anos, muitos pesquisadores têm lidado com novos conceitos de consumo

coletivo, como o consumo colaborativo, por exemplo: Belk (2014); Botsman e Rogers (2011);

Schor e Fitzmaurice (2015), o compartilhamento, por exemplo: Belk (2010); Lamberton e Rose

(2012), e o consumo baseado em acesso, por exemplo: Bardhi e Eckhardt (2012), ou o

consumo conectado, como definem Schor e Fitzmaurice (2015). A ideia principal por trás de

todas essas práticas é promover o usar em detrimento de possuir produtos. Embora esses

conceitos compartilhem muitas características comuns, cada um tem sua própria abordagem.

Este estudo concentra-se principalmente no consumo colaborativo sem negligenciar a

existência de outros conceitos relacionados.

O consumo colaborativo é uma vertente do consumo compartilhado e é considerado

um fenômeno decorrente da internet (BELK, 2014). O conceito de CC descreve a prática de

partilha, empréstimos comerciais, aluguel e trocas, transposta para a realidade do século XXI,

sendo que essa prática pode envolver o compartilhamento de ativos intangíveis como ideias,

valores e tempo (BELK, 2010). O rápido crescimento do CC e seus impactos em vários aspectos

do atual sistema econômico e social estimularam o interesse do crescente público nos últimos

anos (CHENG, 2016).

Diante da dificuldade de encontrar uma definição clara sobre o conceito de consumo

colaborativo e de não existir uma definição única entre os pesquisadores (HAMARI; SJOKLINT;

UKKONEN, 2016), neste estudo, optou-se pela a definição dada por Botsman e Rogers (2011);

por ser uma das mais reconhecidas, por ser ampla o suficiente e por englobar as características

que definem o sistema de guarda-roupa compartilhado, como um modelo de negócio off-line,

com intermediação comercial feita por empresas, cobrança de valor monetário e na qual os

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produtos são propriedade das empresas (AMADOR et al., 2016; ACQUIER; DAUDIGEOS;

PINKSE, 2017).

Um olhar detalhado sobre as terminologias e ângulos de pesquisas diferentes ao redor

dos conceitos de economia compartilhada e consumo colaborativo e suas variações pode ser

encontrado no trabalho de Acquier, Daudigeos, Pinkse (2017). Sob a ótica de Botsman e

Rogers (2011), o consumo colaborativo é uma forma de acomodar necessidades e desejos de

uma forma mais sustentável, valiosa e atraente, com pouco ônus para o indivíduo e muita

vantagem para a comunidade.

O consumo colaborativo começou on-line, com a publicação de comentários e

compartilhamento de arquivos, fotos e vídeos – onde foi possível perceber que cooperação

não precisa ocorrer em detrimento do individualismo e, atualmente, é possível aplicar os

mesmos princípios colaborativos a outras áreas físicas da vida cotidiana (BELK, 2014). Desde

os deslocamentos pela manhã aos espaços de coworking, passando pela forma como

empresta-se dinheiro até a maneira como a moda é desenhada, diferentes áreas estão sendo

criadas e consumidas de maneira colaborativa.

A colaboração pode ser presencial e pessoal ou on-line por meio da internet, usada

para conectar-se, combinar, formar grupos e encontrar algo. De maneira simples, as pessoas

estão compartilhando novamente com sua comunidade (BOTSMAN; ROGERS, 2011). Seja ela

um escritório, um bairro, um edifício de apartamentos, uma escola ou uma rede no Facebook.

Mas a colaboração está acontecendo de maneira, e em uma escala, que nunca tinha sido

possível antes, criando uma cultura e uma economia na qual “o que é meu é seu” (BELK, 2014).

O consumo colaborativo permite que as pessoas percebam os benefícios do acesso a

produtos e serviços em detrimento da propriedade, economizem dinheiro, espaço e tempo,

façam novos amigos e se tornem cidadãos ativos (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018). Redes

sociais e tecnologias em tempo real também estão conseguindo superar modos ultrapassados

de hiperconsumo, criando sistemas inovadores baseados no uso compartilhado, como

acontece com carros ou bicicletas. Esses sistemas fornecem benefícios ambientais

significativos ao aumentar a eficiência do uso, ao reduzir o desperdício, ao incentivar o

desenvolvimento de produtos melhores e ao absorver o excedente criado pelo excesso de

produção e de consumo (YAN et al., 2015).

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Uma das áreas mais claras de atuação de práticas do consumo colaborativo é no

transporte, como é o caso do ZipCar. As marcas de automóveis estão facilitando e encorajando

aluguéis temporários no lugar da aquisição definitiva de um veículo. As pessoas mais jovens

acreditam que a compra, a manutenção e o custo com estacionamento caros e não querem

ter esse incômodo. Desse modo, as companhias de carros enxergam essa nova visão como

uma forma de ainda estarem envolvidas em solucionar necessidades de transporte (BELK,

2014). Muitas outras organizações de consumo colaborativo também têm surgido em diversas

categorias de bens e serviços, como empréstimos de dinheiro P2P, crowd funding, Wi-Fi

compartilhado, reparos de carros, aluguel de roupas, etc (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

A questão está mudando de “por que alugar se você pode comprar?” para “por que

comprar se você pode alugar?”. A medida em que se adota essa nova ideologia, abandona-se

a antiga máxima de “você é o que você possui” pela nova ideia de que “você é o que você

compartilha” (BELK, 1988), pode-se estar entrando em uma economia pós-propriedade. Com

o aluguel tornando- se algo cada vez mais comum, persiste a dúvida se o consumidor possui

ou não o carro, a casa, a bolsa, as joias, os móveis, o telefone ou o vestido que é visto usando

(BELK, 2014).

Essa perspectiva não quer dizer que os consumos colaborativos não tenham

problemas. As indústrias musical e cinematográfica se opuseram ao compartilhamento on-line

de seus produtos e a indústria editorial também trabalha para evitar a replicação de seus e-

books. E o mesmo acontece em outras indústrias, como os hotéis que estão pressionando as

cidades para que sejam criados regulamentos a quem oferece serviços de aluguel de curto

prazo por meio de empresas como Airbnb. Se estas reações são ou não eficazes e se deve-se

resistir à economia compartilhada, é uma questão ainda em aberto (BELK, 2014).

Compartilhar é um ótimo negócio no sentido prático e econômico para o consumidor,

o meio ambiente e a comunidade. Pode também fazer muito sentido para empresas que são

suficientemente flexíveis, inovadoras e com visão de futuro (BELK, 2014). Botsman e Rogers

(2011) sugerem que o consumo colaborativo poderia ser tão importante quanto a Revolução

Industrial quando comparado ao modo como era pensado a propriedade.

De acordo com a literatura, existem duas maneiras de participar do consumo

colaborativo, sendo que cada uma delas tem um apelo diferente para pessoas diferentes. É

possível desempenhar o papel de par provedor, ao fornecer bens para alugar ou compartilhar;

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ou desempenhar o papel de par usuário, ao consumir os produtos e serviços disponíveis. Cada

papel terá motivações diferentes para participar desse modelo de consumo (BECKER-

LEIFHOLD; IRAN, 2018). Neste projeto, analisar-se-á exclusivamente as pessoas que atuam

como parte usuária dessa economia.

De acordo com Botsman e Rogers (2011), o CC é composto por 3 tipos e 4 princípios,

além de 4 forças que justificam sua existência e fortalecimento. Com a intenção de tornar o

conceito mais claro, eles serão explicados nos próximos parágrafos e podem ser visualizados

na Figura .3

Figura 3 - Funcionamento do consumo colaborativo (CC)

Fonte: Adaptado pela autora a partir de Botsman e Rogers (2011).

Sobre as forças, as tecnologias P2P, junto com o crescimento das redes sociais, as

preocupações ambientais urgentes, a consciência de custos e uma nova crença na importância

da comunidade estão aproximando a sociedade de formas de consumo mais agregadoras,

abertas e colaborativas e afastando-as de formas centralizadas, controladas e desequilibradas.

Isso é, com o suporte de tecnologias e redes, o CC é impulsionado e fornece uma solução

alternativa para questões econômicas, sociais e ambientais (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

Ademais dos exemplos de consumo colaborativos variarem em termos de maturidade,

benefício, propósito e escala, existem quatro princípios fundamentais que permitem o seu

funcionamento: massa crítica, capacidade ociosa, crença no bem comum e a confiança entre

estranhos (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

O primeiro considera que o sistema será bem-sucedido se os usuários estiverem

satisfeitos com as escolhas e com a conveniência a sua disposição. Outro ponto importante

PRINCÍPIOS |Fazem

o sistema funcionar

SISTEMAS

Mercados de

Redistribuição

Estilos de Vida

Colaborativos (CL)

Sistemas de

serviços de

produtos (PSS)

Tecnologias P2P

Ressurgimento da

Comunidade

Preocupações

Ambientais

Consciencia de Custo

Massa Crítica

Confiança entre

estranhos

Crença no Bem

Comum

Capacidade Ociosa

FORÇAS | Impulsionam

a Mudança

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em relação à massa crítica, é a necessidade de uma “prova social” para que se cruze a barreira

psicológica que muitas vezes existe em torno de novos comportamentos. É um instinto

primitivo que permite a humanidade tomar decisões baseado em copiar as ações ou os

comportamentos dos outros (BOTSMAN; ROGERS, 2011). Entender se as plataformas CC

podem atingir a massa crítica, depende de conseguir entender qual o seu potencial de

utilização. E, para entender esse potencial, é necessário compreender as motivações e as

barreiras de participação nesses serviços. Esse conhecimento ainda não está completamente

disponível em revistas científicas, reforçando a importância deste projeto (VAN DE GLIND,

2013).

O segundo, trata a capacidade ociosa, e refere-se aos bens com custos significativos

que ficam inativos a maior parte do tempo e que poderiam ser aproveitados em outros lugares

(BOTSMAN; ROGERS, 2011). Os exemplos incluem o carro que custa centenas de dólares, mas

é usado apenas uma hora por dia, o quarto de hóspedes que fica vazio e o vestido de festa

que é usado uma vez por ano. Nos Estados Unidos, 80% das coisas que as pessoas possuem

são usadas menos de uma vez por mês (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

O terceiro ponto diz respeito à crença nos bens comuns. Com o surgimento da internet,

o maior bem comum da história, reconhece-se que, ao fornecer valor para a comunidade,

permite que próprio valor social se expanda (BOTSMAN; ROGERS, 2011). Para exemplificar,

um telefone sozinho não teria utilidade, mas quanto mais pessoas possuírem telefone, mais

valioso será o telefone para cada proprietário, pois o número total de pessoas na rede

aumenta. Todos que aderem ou usam o consumo colaborativo criam valor para outras

pessoas, mesmo que a intenção não tenha sido essa.

O último princípio de funcionamento baseia-se na confiança entre estranhos. A

maioria das formas de consumo colaborativo exige que se confie no outro em diferentes

graus. Em programas de carona como Blablacar é necessário acreditar que a pessoa seja

inofensiva, confiável e saiba dirigir. Em mercados como o e-Bay é necessário confiar que os

itens são originais e estão exatamente como foram anunciados, no aluguel de equipamentos

é necessário confiar que as pessoas devolverão as peças, e assim por diante (BOTSMAN;

ROGERS, 2011).

Além disso, Botsman e Rogers (2011) consideram que as práticas colaborativas podem

ser divididas em sistemas de consumo, que estão reinventando não apenas o que é

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consumido, mas como é consumido: os sistemas de serviços de produtos; os mercados de

redistribuição e os estilos de vida colaborativos.

Os Sistemas de Serviços de Produtos (PSS) são baseados na mudança de uma

mentalidade de propriedade para uma “mentalidade de uso”, na qual se paga pelo benefício

de um produto sem necessidade de possuir esse produto. Os PSS estão afetando setores

tradicionais baseados nos modelos de propriedade privada individual. Esses permitem que

vários produtos de propriedade de uma empresa ou de propriedade privada sejam

compartilhados, por exemplo, apartamentos, carros, roupas e acessórios, livros, etc.

Por um lado, esse sistema maximiza a utilidade do produto, trazendo vantagens

ambientais e, por outro: economiza custos de compra e os encargos da propriedade como

manutenção, conserto, seguro e armazenamento; aumenta as opções para atender uma

mesma necessidade e rentabiliza os bens existentes dos fornecedores, trazendo também

vantagem econômica (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

Há mais dois modelos de consumo colaborativo, que serão explicados abaixo,

entretanto, vale destacar que este projeto analisará apenas uma variação de um SSP de uso.

Alguns setores consideram que o mercado já está maduro para SSP quando esse possui uma

grande capacidade de ociosidade (carros), quando atende a uma necessidade temporária

(carrinhos de bebê), quando os custos iniciais de compra são elevados (placas de energia solar)

ou quando o produto tem uso limitado devido à moda (BOTSMAN; ROGERS, 2011), que é o

caso das roupas e acessórios explorados neste estudo.

Já os Mercados de Redistribuição (RM) permitem a redistribuição de bens de onde eles

não são necessários para qualquer lugar ou pessoa onde os bens são necessários. Os RM são

associados às doações, trocas ou empréstimos de móveis, de livros ou roupas gratuitamente,

por produtos semelhantes ou por mercadorias de valores semelhantes. Exemplos desse

sistema são empresas como Freecycle, Ebay e Craiglist. Esses mercados sempre existiram, mas

as tecnologias estão alimentando esse tipo de CC, que normalmente é realizado entre

desconhecidos. Além disso, esse tipo de mercado estimula a reutilização, trazendo vantagens

ambientais, sociais e econômicas (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

Por fim, existem os Estilos de Vida Colaborativos (CL). Esses sistemas consideram o

compartilhamento e a troca de bens menos tangíveis, como tempo, espaço e habilidades. Nele

estão inclusas formas de colaboração que antes eram locais e estão sendo escalados e

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transcendendo fronteiras graças à internet, como atividades de viagem com

compartilhamento de hospedagem (couchsurfing), financiamentos coletivos (crowdfunding),

ferramentas de aprendizado colaborativo (crowdlearning) e escritórios de trabalho coletivo

(coworking) (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

Consumo colaborativo não é um compartilhamento forçado. Ele coloca em vigor um

sistema em que as pessoas dividem recursos sem perder liberdades pessoais e sem sacrificar

seus estilos de vida. São projetos que apelam para a necessidade de individualidade e

autonomia dos participantes, mas ao mesmo tempo fornecem um senso de pertencimento e

de comunidade. Ele não exige um dogma rígido e pode ter soluções promissoras e mudanças

positivas de longo prazo (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

A ideia de utilizar um serviço que permita derivar um benefício de um produto

compartilhado não é nova. Isso é feito quando se usa um hotel, uma lavanderia, uma loja de

fotocópias ou na locação de cadeiras para uma festa. Os princípios básicos de não possuir

remontam as formas mais antigas de comércio, mas para que os consumidores superem a

veneração culturalmente arraigada da posse e o ato de compartilhar deve ser conveniente,

seguro e mais eficaz em termos de custo do que a propriedade (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

À medida que esses novos sistemas ajudam as pessoas a definir o que são e do que

gostam, a propriedade efetiva passa a ser menos importante do que demonstrar o uso.

Demonstrar status, pertencimento e participação em um grupo sem necessariamente

comprar objetos físicos é uma característica da atualidade (BELK, 2014).

2.3 O CONSUMO COLABORATIVO NA MODA E O GUARDA-ROUPA COMPARTILHADO

Pesquisas sobre conceitos de consumo colaborativo são recentes (GULLSTRAND et al.,

2015). Embora termos como “economia compartilhada” ou “consumo colaborativo” tenham

sido estudados por diferentes pesquisadores (BELK, 2014; SCHOR; FITZMAURICE, 2015;

BOTSMAN; ROGERS, 2011), ainda faltam pesquisas sobre como esse conceito tem sido

aplicado em diversos setores, especialmente na indústria de moda (aqui entendida como

vestuário), onde a ausência de pesquisa é ainda maior (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018;

PEDERSEN; NETTER, 2015).

Diversas iniciativas baseadas em ideias de compartilhamento e comunidade têm

ganhado destaque na moda (PEDERSEN; NETTER, 2015). Essas práticas alternativas de

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consumo assumiram a forma de bazares de trocas entre amigos, guarda-roupas

compartilhados, lojas on-line de revenda de produtos e plataformas virtuais de trocas, nas

quais os consumidores podem consumir os produtos de moda de forma colaborativa.

Exemplos internacionais incluem serviços on-line como o ThredUp, que revende produtos de

moda feminina e infantil; o Swapstyle, que permite às pessoas trocarem suas peças entre elas;

e o Rebelle, que revende artigos usados de luxo. No Brasil, também há diversas empresas de

moda atuando com os princípios do CC, como a Dress and Go, que aluga vestidos de festas; o

Enjoei, plataforma P2P de revenda de produtos de moda usados; e a Blimo e a Roupateca,

serviços de guarda-roupas compartilhados, além dos bazares físicos de trocas de produtos que

já estão presentes no mundo inteiro.

Apesar de pouco explorado, acredita-se que o consumo colaborativo tenha um grande

potencial comercial para a indústria da moda (PEDERSEN; NETTER, 2015). Nos Estados Unidos,

por exemplo, o valor do mercado para roupas infantis usadas ultrapassa US$ 1,3 bilhão e esse

é apenas um pequeno exemplo do seu potencial (BOTSMAN; ROGERS, 2011). Além das

vantagens econômicas, o CC pode ser um meio de reduzir o consumo excessivo, um dos

maiores desafios dessa indústria (ARMSTRONG; LANG, 2013; BARTLETT et al, 2013). Promover

a redistribuição de vestimentas não utilizadas beneficia compradores e vendedores, é

economicamente atraente e colabora para a preservação do meio ambiente (PEDERSEN;

NETTER, 2015).

Uma das maneiras de diminuir o impacto ambiental causado pela indústria da moda é

a criação de produtos mais sustentáveis, mas já se sabe que apenas essa estratégia de

produtos substitutos não é suficiente (PEATTIE, 2009). Novos sistemas de consumo e

comportamentos terão de surgir para que alcance um nível mais alto de sustentabilidade,

visto que até 60% do impacto ambiental causado pelos produtos não vem de sua produção,

mas sim do estágio de consumo, bem como do ciclo de vida do produto, ciclos de limpeza ou

da alta velocidade de substituição (KOEFOED; SKOV, 2010; LOREK; SPANGENBERG, 2014).

Desse modo, o fortalecimento de sistemas de CC no setor de moda poderia ajudar

significativamente nesse desafio (IRAN; SCHRADER, 2017).

Apesar das divergências existentes em relação à definição de CC (BELK, 2014), a

abordagem mais adequada para a aplicação do conceito ao setor da moda é a ideia explorada

por Botsman e Rogers (2011) (IRAN; SCHRADER, 2017) apresentado no capítulo anterior.

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31

Nessa definição, entende-se CC como a redistribuição de produtos em que duas ou mais

pessoas (re)usam o mesmo produto ou uma parcela dele em um período diferente,

independentemente de a propriedade ser transferida ou não e de a taxa monetária ser

cobrada (BOTSMAN; ROGERS, 2011).

A literatura de consumo colaborativo de moda (CFC) é recente e limitada, com poucos

artigos específicos sobre o tema. Os primeiros autores que usaram essa nomenclatura em um

artigo de periódico foram Pedersen e Netter (2015). Alguns anos depois, Iran e Schrader

(2017), por meio de uma revisão da literatura de CC e aplicação desses conceitos mais

abrangentes para a realidade de moda definiram o conceito de CFC:

“O CFC abrange o consumo de moda em que os consumidores, em vez de comprar

novos produtos de moda, têm acesso a vestimentas já existentes seja por meio de

oportunidades alternativas para adquirir a propriedade individual (presente, troca

ou revenda) ou por meio de opções de uso para produtos de moda de propriedade

de terceiros (compartilhamento, empréstimo, locação ou leasing)” (IRAN;

SCHRADER, 2017, p. 7).

Historicamente, a ideia básica de CFC era aplicada em menor escala dentro de uma

família ou entre amigos, mas, com as mudanças comportamentais e novas tecnologias, as

plataformas on-line e off-line têm ajudado a acelerar e ampliar a aplicação do CFC na

sociedade (IRAN; SCHRADER, 2017). Com o intuito de facilitar a compreensão e criar uma base

para o desenvolvimento da pesquisa em CFC, Iran e Schrader (2017) mapearam a estrutura do

CFC, baseada nos critérios e princípios do sistema, isso inclui o tipo de relação provedor-

consumidor (P2P ou B2C), o organizador responsável (pares ou uma empresa), a remuneração

por participação no sistema e pela aquisição do produto (nenhum, não monetário, monetário)

e o subtipo de sistema (presente, compartilhamento, empréstimo, troca, revenda/recompra

e aluguel), como pode ser visto na Figura 4.

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32

Figura 4 - A estrutura do consumo colaborativo de moda (CFC)

Fonte: Adaptado de Iran e Schrader (2017)

Apesar de existirem diversos tipos de CFC, neste estudo analisa-se exclusivamente os

serviços B2C diretos, no qual as empresas oferecem serviços de uso como substitutos para a

propriedade do produto, a fim de tornar dispensável a compra de novos produtos (aluguel),

destacado na figura 2 com a linha pontilhada. Nesse subtipo de CFC, uma compensação

monetária é aplicada para participar do serviço e adquirir o produto de moda, sendo que seu

uso é cobrado (IRAN; SCHRADER, 2017). Dentro desse subtipo será analisado especificamente

o guarda-roupa compartilhado, um modelo recente de negócio, que funciona a partir da

cobrança de uma taxa monetária mensal de assinatura (PEDERSEN; NETTER, 2015).

De acordo com Pedersen e Netter (2015), o guarda-roupa compartilhado é um serviço

baseado na assinatura mensal que permite às pessoas compartilhem roupas e acessórios. É

um serviço aplicado ainda em pequena escala, com cerca de 100 a 300 assinantes por

empresa, onde a oferta de peças disponíveis depende do estilo de cada empresa e que, na

maioria das vezes, usa seus espaços físicos como seu principal canal de relacionamento

comercial com o cliente.

O desafio de escalar o modelo de negócio do guarda-roupa compartilhado é grande

(IRAN; SCHRADER, 2017). Para se ter uma ideia, das quatro empresas que Pedersen e Netter

(2015) analisaram em seu estudo, duas empresas já não atuam mais, Lånegarderoben5 e a

5 Empresa Lånegarderoben. Disponível em: <www.lanegarderoben.se/>. Acesso em: 17 maio.2018.

Tipo Organização Subtipo

Na participação Na aquisição

Dominante em itálico

Presente

Nenhuma Compartilhamento

P2P Pares Nenhuma / Monetária Empréstimo

Não monetária Troca

Monetária Revenda/recompra

Nenhuma Presente

Nenhuma/ Não Não monetária Troca

monetária/ Monetária Revenda/recompra

Aluguel

Aluguel

Nenhuma/ Não

monetária/ Monetária

Revenda/recompra

Compensação

Empresa

Consumo

Colaborativo de

Moda (CFC)

Leasing Monetária EmpresaB2C

Monetária

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Helsinki Fashion Library6. E a terceira, a Dinamarquesa Resecond,7 diversificou seu modelo de

negócio e hoje trabalha com um sistema de assinatura para troca de itens de diversas

categorias, não apenas moda. Exemplos de guarda-roupas compartilhados que se encontram

em funcionamento incluem o Sueco Klädoteket8, a americana Rent the Runaway9, que apesar

de ser, originalmente, uma empresa de aluguel de itens de luxo lançou sua variação de guarda-

roupa compartilhado em 2016, e a brasileira Blimo10.

De acordo com o estudo de Pedersen e Netter (2015), os consumidores dos serviços

de guarda-roupas compartilhados são na sua maioria mulheres, entre 25 e 35 anos, que vivem

relativamente perto das lojas que frequentam. As principais proposições de valor,

apresentada pelos guarda-roupas compartilhados são dar aos membros acesso a uma grande

variedade de peças, possibilitar a experimentação de novos estilos e ter diversão sem os

custos, riscos e encargos totais da propriedade, trazendo uma alternativa aos sistemas de

moda convencionais.

O principal fluxo de receita de um guarda-roupa compartilhado vem das taxas de

filiação cobradas para se tornar um membro. Frequentemente, essas empresas oferecem

mais de uma opção de plano para o usuário, que pode adaptar- se a diferentes estilos de vida

e necessidades (PEDERSEN; NETTER, 2015). No Brasil, as empresas que foram mapeadas

praticam taxas mensais entre R$50,00 e R$500,00.

A literatura existente também fornece alguns insights sobre as contribuições de

sustentabilidade do CFC e consequentemente do guarda-roupa compartilhado (BECKER-

LEIFHOLD; IRAN, 2018). Enquanto alguns pesquisadores afirmam que o CFC tem o potencial

de aumentar o consumo sustentável de moda (BARDHI; ECKHARDT, 2012), outros destacam a

possibilidade de efeito rebote (FRENKEN; SCHOR, 2017). A falta de consenso entre estudiosos

e pesquisadores destaca a oportunidade de explorar essa relação também com os

consumidores (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018).

No próximo capítulo serão exploradas as motivações e as barreiras que envolvem a

participação nesse modelo de CFC. Como foi visto no capítulo anterior, atingir a massa crítica

6 Empresa Helsinki Fashion Library. Disponível em: < www.nopsatravels.com>. Acesso em: 17 maio.2018. 7 Empresa dinamarquesa Resecond. Disponível em: <https://resecond.com/about-us>. Acesso em: 17 maio.2018. 8 Sueco Klädoteket. Disponível em: <http://kladoteket.se/>. Acesso em> 17 maio.2018. 9 Americana Rent the Runaway. Disponível em: <www.renttherunway.com>. Acesso em: 17 maio.2018. 10 Blimo. Disponível em: <https://www.blimonline.com.br/>. Acesso em: 17 maio.2018.

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é um passo essencial para o sucesso e o crescimento desse modelo de negócio (BOTSMAN;

ROGERS, 2011) e entender as motivações e barreiras de participação em um serviço de CFC

pode facilitar e acelerar o desenvolvimento desses novos modelos de negócios (BECKER-

LEIFHOLD; IRAN, 2018), que ainda enfrenta dificuldade de sair de uma atuação de nicho e

passar a ser utilizado pelo público em geral (PEDERSEN; NETTER, 2015).

2.4 MOTIVAÇÕES DE PARTICIPAÇÃO EM SISTEMAS DE CONSUMO COLABORATIVO DE MODA

(CFC)

As atitudes em relação ao consumo têm mudado nos últimos anos, e junto com ela

surgiu uma crescente preocupação em relação aos impactos ecológicos e sociais dos bens

consumidos (BELK, 2014; BOTSMAN; ROGERS, 2011). Isso torna o CC e mais especificamente

o CFC, no caso do setor de moda, alternativas atraentes para os consumidores (HAMARI;

SJOKLINT; UKKONEN, 2016). Apesar do tema parecer promissor, as pesquisas nesse campo

ainda estão apenas no início (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018; GULLSTRAND et al., 2015).

Alguns autores já estudaram aspectos do CFC do ponto de vista de consumo

(VAQUERO; CALLE, 2013; LEISMANN et al., 2013), do modelo de negócio (PEDERSEN; NETTER,

2015), da aplicação em sistemas de serviços de produtos para vestuário (ARMSTRONG; LANG,

2013; ARMSTRONG et al., 2015), de sua definição propriamente dita (IRAN; SCHRADER, 2017)

e do seu impacto ambiental (IRAN; SCHRADER, 2017). No entanto, os fatores motivacionais

que afetam as atitudes e intenções dos consumidores em relação ao CFC são pouco

explorados (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018) e faltam estudos que comparem as motivações e

barreiras de usuários e ex-usuários para participarem desses sistemas (HAMARI; SJOKLINT;

UKKONEN, 2016; VAN DE GLIND, 2013).

Por motivação refere-se ao motivo de fazer algo. De acordo com a Self Determination

Theory (SDT) (DECI; RYAN, 1985), a motivação é formada por componentes intrínsecos e

extrínsecos: a motivação intrínseca origina-se da diversão, interesse ou prazer de alguém

(DECI et al., 1999), é quando uma pessoa se envolve em uma atividade porque está

interessada e aproveitando essa atividade (ECCLES; WIGFIELD, 2002). Já a motivação

extrínseca ocorre com o fornecimento de recompensas as quais podem ser tangíveis, como

dinheiro ou privilégios, ou intangíveis, na forma de elogios (GUAY et al., 2010), como é possível

observar no Quadro 2.

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35

Quadro 2 - Componentes intrínsecos e extrínsecos da motivação

CONCEITO MOTIVAÇÃO

CATEGORIA INTRÍNSECA

EXTRÍNSECA

RECOMPENSAS

TANGÍVEIS

RECOMPENSAS

INTANGÍVEIS

EXEMPLOS Prazer e Interesse Privilégios e dinheiro Elogios

Fonte: Adaptado de Van de Glind (2013)

De acordo com a literatura, as pessoas afastam-se do consumo sustentável ou ético

por razões econômicas e institucionais (BRAY; JOHNS; KILBURN, 2011), o que poderia ser um

dos benefícios do CFC. Sabe-se que o CFC pode fornecer também benefícios econômicos num

âmbito mais individual (poupar dinheiro e facilitar acesso a recursos, por exemplo) mas,

apesar da clareza de algumas vantagens, ainda existe um problema prático em entender como

o CFC pode ganhar escala e alcançar a massa crítica, já que parece existir uma discrepância

entre as motivações e seus efeitos nas atitudes e comportamentos das pessoas (BRAY; JOHNS;

KILBURN, 2011; KOLLMUSS; AGYEMAN, 2002).

Do ponto de vista de CC, dois estudos contribuíram significativamente para o

entendimento da motivação em participar desses sistemas compartilhados, a pesquisa de

Hamari, Sjoklint, Ukkonen (2016) e de Van De Glind (2013). A pesquisa de Hamari, Sjoklint,

Ukkonen (2016), apesar de não tratar especificamente de CFC, foi desenvolvida a partir da

observação de 254 plataformas de CC, que utilizavam como referência, majoritariamente, o

modelo de negócio de acesso ao invés da transferência de propriedade (sendo que o modelo

mais comum era o aluguel, próximo ao modelo de negócio do guarda-roupa compartilhado

analisado nesse projeto) e se baseia na Self Determination Theory. Nessa pesquisa, o autor

testa a relação entre atitude e motivação a partir de quatro grandes razões de participação do

consumo compartilhado: sustentabilidade, o prazer, a reputação e os benefícios econômicos.

A pesquisa de Van De Glind (2013), por sua vez, traz, por meio de Teoria

Fundamentada em Dados, uma análise das motivações de participação dos Holandeses em

sistemas de CC. Nesse estudo, o autor levanta cinco motivações principais: práticas, sociais,

ambientais, financeiras e de curiosidade.

Já Becker-Leifhold e Iran (2018) afunilaram a pesquisa em relação às motivações e

barreiras de participação em CC e consideraram apenas os sistemas de CFC. Por meio de uma

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revisão sistemática recente da literatura de CC no contexto de moda, eles avaliaram o fluxo

de pesquisa sobre CFC e suas diferentes formas, com o objetivo de definir as principais

motivações e barreiras de participação especificamente em sistemas de CFC, tanto do ponto

de vista do consumidor quanto do ponto de vista do negócio.

Sendo assim, a pesquisa prévia de Becker-Leifhold e Iran (2018) foi utilizada como

ponto de partida para a identificação das motivações e barreiras de participação em serviços

de guarda-roupas compartilhados e para suportar a escolha dos recursos metodológicos.

Apesar dos autores identificarem motivações e barreiras tanto do ponto de vista do

consumidor, como do negócio, serão analisadas apenas as motivações e barreiras do ponto

de vista do consumidor, em sinergia com o objetivo desta pesquisa. As motivações serão

analisadas neste capítulo e as barreiras, levantadas pelos mesmos autores, serão analisadas

no próximo capítulo.

Becker-Leifhold e Iran (2018) realizaram uma revisão sistemática da literatura, com o

objetivo de identificar, avaliar e interpretar o corpo de pesquisas existentes sobre o consumo

colaborativo no contexto de moda (CFC). Dos 33 artigos que foram utilizados apenas seis

vieram de periódicos da área de moda, os demais foram publicados em periódicos de áreas

distintas, reforçando o crescente interesse sobre o tema. O estudo de Becker-Leifhold e Iran

(2018) parte do princípio de que as motivações para participar de CFC podem ser divididas

entre necessidades utilitárias e aspectos hedônicos, tratados anteriormente na publicação de

Arnould e Bardhi (2005) e adicionam uma nova categoria: os motivos ambientais.

Motivações hedônicas

As motivações de participação hedônicas mapeadas por Becker-Leifhold e Iran (2018)

incluem a possibilidade de adquirir itens raros, de acessar peças únicas, acessar uma grande

variedade de produtos, o prazer de pechinchar, encontrar produtos que não são produzidos

em larga escala e a busca por interação social (GUIOT; ROUX, 2010; YAN; BAE; XU, 2015).

Além disso, incluem também a busca por diversão, satisfação e por fazer novas combinações

com os produtos, criando nossos estilos (ISLA, 2013; XU et al., 2014) além de ser uma

possibilidade de expressar a sua individualidade (XU et al., 2014; PERRY; CHUNG, 2016). Em

relação à interação social, os guarda-roupas compartilhados já foram avaliados positivamente,

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em pesquisas anteriores, por serem percebidos como um ponto de encontro para jovens

designers e consumidos (PEDERSEN; NETTER, 2015).

Essas possibilidades de reduzir o ritmo de consumo satisfazem a necessidade de

novidades em um guarda-roupa, ao mesmo tempo que diminui os gastos e o sentimento de

culpa, melhorando o sentimento de satisfação com os produtos (ARMSTRONG et al., 2016;

NIINIMÄKI, 2010), como é o caso dos guarda-roupas compartilhados, os quais as pessoas

avaliam positivamente por poderem experimentar novos estilos sem pagar a mais por isso

(ARMSTRONG et al., 2015).

Motivações utilitárias

Em relação às motivações utilitárias, Becker-Leifhold e Iran (2018), mapearam que a

economia financeira é a principal motivação, não só para consumidores com poder financeiro

limitado, mas também para aqueles que querem reduzir os gastos com roupas ou para às

pessoas que gostam de pechinchar, independente dos seus níveis de renda. Preços baixos

parecem exercer uma grande influência na disposição dos consumidores em comprarem itens

usados (CERVELLON et al., 2012; GUIOT; ROUX, 2010; ISLA, 2013; WILLIAMS; WINDEBANK,

2002; WILLIAMS; PADDOCK, 2003).

No caso dos guarda-roupas compartilhados, alguns possuem marcas mais populares e

também marcas de grifes, (PEDERSEN; NETTER, 2015), permitindo, assim, aos consumidores

o acesso a produtos que seriam inacessíveis de outra forma (ARMSTRONG et al., 2016; ISLA,

2013). A satisfação e prazer de conseguir um bom negócio e o melhor valor para a menor

quantidade de dinheiro também são fatores-chave para consumidores envolvidos no CFC

(WAIGHT, 2013).

Motivações ambientais

A última categoria de motivações mapeadas na revisão da literatura de Becker-Leifhold

e Iran (2018) são as motivações ambientais. Dentro disso, os autores consideram que as

pessoas optam por participarem de sistemas de CFC pelos benefícios éticos e ambientais de

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reutilizar peças (GUIOT; ROUX, 2010; WAIGHT, 2013; XU et al., 2014) e questões relacionadas

a evitar o sistema tradicional de vendas (GUIOT; ROUX, 2010).

A vontade de evitar o desperdício também foi mapeado como uma das motivações

possíveis Waight (2013). A relação da sustentabilidade dos sistemas de CFC também diminui

o sentimento de culpa das pessoas com o excesso de consumo (BEARD, 2008) já que essas

novas formas colaborativas de consumo permitem a redução do consumo excessivo por meio

de comportamentos de compra mais inteligentes e torná-los mais conscientes sobre seus

estilos individuais (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018). As categorias de motivações mapeadas por

Becker-Leifhold e Iran (2018), podem ser vistas no Quadro 3.

Quadro 3 - Motivações de participação em sistemas de CFC

Nº MOTIVAÇÃO REFERÊNCIA

HEDÔNICAS Arnould e Bardhi (2005)

1 Disponibilidade de itens raros Guiot e Roux (2010), Yan et al. (2015)

2 Variedade de produtos Guiot e Roux (2010), Armstrong et al. (2016)

3 Artística (Possibilidade de criar diferentes composições) Isla (2013)

4 Diversão Isla (2013)

5 Satisfação Isla (2013)

6 Encontrar achados Guiot e Roux (2010)

7 Prazer nostálgico Guiot e Roux (2010)

8 Necessidade de mudança sem o sentimento de culpa Armstrong et al. (2016), Niinimäki (2010)

9 Experimentar novos estilos Armstrong et al. (2015)

10 Necessidade de ser único Yan et al. (2015)

11

Interação social

Armstrong et al. (2015, 2016), Guiot e Roux (2010), Pedersen e Netter (2015)

12 Satisfação com o produto Armstrong et al. (2015)

UTILITÁRIOS Arnould e Bardhi (2005)

13 Compra inteligente Arnould e Bardhi (2005)

14 Preço justo (Preço como uma gratificação) Guiot e Roux (2010)

15 Frugalidade Arnould e Bardhi (2005)

16 Barganha Guiot e Roux (2010)

17 Evitar investir em algo errado Guiot e Roux (2010)

AMBIENTAIS Becker-Leifhold e Iran (2018)

18 Consumo favorável ao meio ambiente Hiller Connell (2011), Yan et al. (2015)

19 Evitar o descarte desnecessário Hiller Connell (2011), Yan et al. (2015)

20 Distanciamento do sistema Guiot e Roux (2010)

Fonte: Adaptado pela autora a partir de Becker-Leifhold e Iran, 2018.

As motivações mapeadas por Becker-Leifhold e Iran (2018) consideraram apenas

publicações escritas em inglês e incluíram todas as diferentes formas de CFC, como

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presentear, trocas, compra de itens usados, empréstimos, aluguéis e leasing. Apesar de todas

essas práticas estarem incluídas da definição de CFC (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018) cada

uma delas possui particularidades específicas. Neste projeto de pesquisa, os achados de

Becker-Leifhold e Iran (2018) em relação às motivações de participação em sistemas de CFC

serão usados como direcionamento para a categorização da análise de conteúdo das

entrevistas, explorada detalhadamente quando é tratado dos recursos metodológicos

abordados nesta pesquisa (do capítulo 3), com o objetivo de identificar quais as motivações

de participação no CFC específicas do guarda-roupa compartilhado.

2.5 AS BARREIRAS DO CONSUMO COLABORATIVO DE MODA (CFC)

Os autores Becker-Leifhold e Iran (2018) também categorizaram as barreiras de

participação em sistemas de CFC, tanto da perspectiva do consumidor quanto da perspectiva

da empresa. Os autores separaram as barreiras do ponto de vista do consumidor, que serão

utilizadas nessa pesquisa por estarem alinhadas com o objetivo do estudo, em quatro

categorias: preocupação com higiene/saúde, falta de confiança e informação, falta de

propriedade e hábitos de consumo, como pode ser visto no Quadro 4.

Quadro 4 - Barreiras de participação em sistemas CFC

Nº BARREIRA REFERÊNCIA

1

Preocupações com higiene ou saúde

Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Fisher et al. (2008), Hirschl et al. (2003), Rexfelt e Hiort Af Ornäs (2009), Na’amneh e Al Husban (2012), Perry e Chung (2016)

2

Falta de confiança ou informação

Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Fisher et al. (2008), Hirschl et al. (2003), Rexfelt e Hiort Af Ornäs (2009)

3 Falta da propriedade Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Tukker e Tischner (2006)

4 Hábitos de consumo Catulli (2012), Hirschl et al. (2003), Mylan (2015), Tukker e Tischner (2006)

Fonte: Adaptado pela autora a partir de Becker-Leifhold e Iran, 2018.

Preocupações com higiene e saúde

As preocupações dos consumidores em relação à higiene são particularmente

evidentes no caso dos produtos que são utilizados próximos à pele (ARMSTRONG et al., 2015;

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40

CATULLI, 2012). No caso específico das roupas, Armstrong et al. (2016) descobriram que as

preocupações dos participantes dizem respeito aos ácaros, germes e à limpeza geral, além de

dúvidas em relação a se e como o prestador de serviços pode garantir que a limpeza das peças

seja feita e mantida de maneira satisfatória. Sentimentos semelhantes de desconforto foram

relatados nas pesquisas de Roux (2010), Na'amneh e Al Husban (2012) e Perry e Chung (2016),

nas quais os participantes estavam preocupados com bactérias de ex-proprietários,

transmissão de doenças, possibilidades de alergias, odor e sujeira. Esses resultados revelam,

de acordo com o estudo de Fisher et al. (2008), que o estigma associado a roupas usadas é

uma barreira para a adoção do CC.

Falta de confiança e de informação

Os indivíduos não confiam nos fornecedores de sistemas de CFC por causa dos desafios

da percepção de preço e valor (CATULLI, 2012; HIRSCHL et al., 2003; REXFELT; HIORT AF

ORNÄS, 2009). No caso dos eventos de troca de roupas, questões de confiança estão

relacionadas ao tamanho, variabilidade, qualidade e à capacidade de encontrar algo

adequado para ser trocado (ARMSTRONG et al., 2015; REXFELT; HIORT AF ORNÄS, 2009). Além

disso, os clientes são céticos em relação à viabilidade e perpetuação dos modelos de negócios

do CFC (ARMSTRONG et al., 2016) e em relação aos motivos pelos quais as empresas estão

prestando esses serviços (REXFELT; HIORT AF ORNÄS, 2009). Esse último ponto refere-se,

principalmente, às alegações de sustentabilidade das empresas (FISHER et al., 2008).

Em relação à falta de informações, os clientes preocupam-se com a falta de

esclarecimentos sobre garantias oferecidas pelas empresas fornecedoras dos serviços e, em

casos excepcionais, de que modo os danos e as consequentes responsabilidade dos clientes

serão tratados. As pessoas também não sabem de que forma irão lidar com situações no caso

delas se apegarem a um determinado item e não queiram mais devolvê-lo. A falta de exemplos

de CFC dentro da indústria de moda torna especialmente difícil para os clientes imaginarem a

implementação desse tipo de sistema (ARMSTRONG et al., 2015).

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Falta da Propriedade

A remoção da propriedade pessoal é um impedimento notável à participação em

sistemas de CFC (TUKKER; TISCHNER, 2006; CATULLI, 2012). Alguns autores alegam que a

propriedade está associada a um senso de controle e status social (HIRSCHL et al., 2003;

MONT, 2002) enquanto para outros, a propriedade pode não ser adequadamente substituída

por um serviço (ARMSTRONG et al., 2015, 2016). Da mesma forma, Catulli (2012) argumenta

que a desmaterialização por meio do compartilhamento ou aluguel de serviços podem

impactar negativamente a necessidade de auto expressão ou o armazenamento de memória.

Hábitos de consumo

O apego ao consumo frequente de vestuário influencia negativamente a participação

em sistemas de CFC (HIRSCHL et al., 2003). Mylan (2015) argumenta que um novo método de

aquisição e posse de vestuário é particularmente difícil de aceitar, uma vez que reduz a

capacidade dos consumidores de obter a realização emocional das compras por impulso. Além

disso, se um produto não estiver prontamente acessível, os clientes podem perceber isso

como um sacrifício (TUKKER; TISCHNER, 2006; CATULLI, 2012). Outras restrições percebidas

referem-se à facilidade de uso, como a falta de acessibilidade ao produto/local ou às

informações técnicas, e às habilidades e esforços necessários (ARMSTRONG et al., 2015;

CATULLI, 2012; REXFELT; HIORT AF ORNÄS, 2009).

2.6. CONSOLIDAÇÃO DAS MOTIVAÇÕES E BARREIRAS DE PARTICIPAÇÃO EM SISTEMAS DE

CFC

As motivações e barreiras na participação em CFC descritas neste capítulo, a partir da

revisão da literatura, encontram-se resumidas no Quadro 5 o qual foi o ponto de partida para

a parte empírica desta pesquisa, tendo sido utilizado para a construção do roteiro

semiestruturado utilizado nas entrevistas em profundidade e servirá, também, como

referência para a análise dos resultados.

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42

Quadro 5 - Consolidação das motivações e barreiras de participação e CFC

Fonte: Adaptado pela autora a partir de Becker-Leifhold e Iran, 2018.

Nº MOTIVAÇÃO REFERÊNCIA

HEDÔNICAS Arnould e Bardhi (2005)

1 Disponibilidade de itens raros Guiot e Roux (2010), Yan et al. (2015)

2 Variedade de produtos Guiot e Roux (2010), Armstrong et al. (2016)

3 Artística (Possibilidade de criar diferentes composições) Isla (2013)

4 Diversão Isla (2013)

5 Satisfação Isla (2013)

6 Encontrar achados Guiot e Roux (2010)

7 Prazer nostálgico Guiot e Roux (2010)

8 Necessidade de mudança sem o sentimento de culpa Armstrong et al. (2016), Niinimäki (2010)

9 Experimentar novos estilos Armstrong et al. (2015)

10 Necessidade de ser único Yan et al. (2015)

11

Interação social Armstrong et al. (2015, 2016), Guiot e Roux (2010), Pedersen e Netter (2015)

12 Satisfação com o produto Armstrong et al. (2015)

UTILITÁRIOS Arnould e Bardhi (2005)

13 Compra inteligente Arnould e Bardhi (2005)

14 Preço justo (Preço como uma gratificação) Guiot e Roux (2010)

15 Frugalidade Arnould e Bardhi (2005)

16 Barganha Guiot e Roux (2010)

17 Evitar investir em algo errado Guiot e Roux (2010)

AMBIENTAIS Becker-Leifhold e Iran (2018)

19 Consumo favorável ao meio ambiente Hiller Connell (2011), Yan et al. (2015)

20 Evitar o descarte desnecessário Hiller Connell (2011), Yan et al. (2015)

21 Distanciamento do sistema Guiot ae Roux (2010)

Nº BARREIRA REFERÊNCIA

1 Preocupações com higiene ou saúde Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Fisher et al. (2008), Hirschl et al. (2003)

2 Falta de confiança ou informação Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Fisher et al. (2008), Hirschl et al. (2003)

3 Falta da propriedade Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Tukker e Tischner (2006)

4 Hábitos de Consumo Catulli (2012), Hirschl et al. (2003), Mylan (2015), Tukker e Tischner (2006)

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43

3. RECURSOS METODOLÓGICOS

O terceiro capítulo desta dissertação aborda os aspectos metodológicos da pesquisa e

está dividido em cinco partes: abordagem, tipo de pesquisa, amostra e população,

instrumento de pesquisa e análise dos dados.

Como parte do processo de preparação desta pesquisa, foram selecionadas as duas

maiores empresas que prestam o serviço de guarda-roupa compartilhado na cidade de São

Paulo. As proprietárias foram entrevistadas sobre quais eram as barreiras e as motivações

identificadas por elas no dia-a-dia do negócio. Além disso, a pesquisadora, para se aproximar

do objeto de estudo assinou o serviço de guarda-roupa compartilhado por seis meses. A

escolha por essa etapa deu-se principalmente pelo caráter inovador do tema entre os

pesquisadores acadêmicos e por não ter sido encontrada nenhuma pesquisa que analise esse

fenômeno específico no Brasil. Os recursos metodológicos se encontram resumidos no

Quadro 6.

Quadro 6 - Recursos metodológicos

RECURSOS METODOLÓGICOS

Natureza Aplicada

Abordagem Qualitativa

Tipo Pesquisa exploratória

Amostra 25 entrevistadas, sendo 14 usuárias e 11 ex-usuárias do serviço de guarda-roupa compartilhado

Técnica de coleta de dados Entrevista em profundida com roteiro semiestruturado realizada por telefone

Técnica de análise dos dados Análise de conteúdo

Período da coleta de dados Outubro a dezembro de 2018

Fonte: Autora, 2019.

3.1 ABORDAGEM

No contexto do consumo colaborativo, seja no mercado ou na literatura, a razão pela

qual as pessoas veem valor no compartilhamento ainda não está claro (BOCKMANN, 2013;

OZANNE; BALLANTINE, 2010). Como os métodos qualitativos são capazes de capturar

realidades complexas e ajudam a compreender as motivações por trás dos comportamentos

(PATTON, 2001), este estudo possui uma abordagem qualitativa, explorando os dados

relacionados ao fenômeno estudado e buscando preencher essa lacuna de conhecimento.

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A pesquisa qualitativa não se preocupa apenas com representatividade numérica, mas

antes com o aprofundamento da compreensão de um grupo social. Na pesquisa qualitativa, o

objetivo da amostra é de produzir informações aprofundadas e ilustrativas: seja ela pequena

ou grande, o importante é que ela seja capaz de produzir novas informações (PATTON, 2001).

Para Minayo (2001), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de significados, motivos,

aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das

relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização

de variáveis. Neste estudo, portanto, a abordagem qualitativa é utilizada para maior

compreensão da relação entre as motivações e barreiras e a participação em serviços

colaborativos de guarda-roupa compartilhado.

3.2 TIPO

Com base nos objetivos, é possível classificar as pesquisas em três diferentes grupos:

exploratória, descritiva e explicativa (GIL, 2007). Nesta dissertação, optou-se pela pesquisa

exploratória visto que esse tipo de pesquisa tem como objetivo proporcionar maior

familiaridade com o problema. A grande maioria dessas pesquisas envolve: (a) levantamento

bibliográfico; (b) entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o problema

pesquisado; e (c) análise de exemplos que estimulem a compreensão (GIL, 2007), como será

visto nessa dissertação.

Na fase inicial da pesquisa, foi realizado um levantamento bibliográfico sobre o CC e

CFC, suas motivações e barreiras de participação e sobre o serviço específico de guarda-roupa

compartilhado. O primeiro passo em qualquer dissertação deve ser a análise minuciosa de

todas as fontes documentais, que sirvam de suporte à investigação projetada (LAKATOS,

1991). Assim, foi realizado o levantamento de referências teóricas já analisadas e publicadas

por meios escritos e eletrônicos, como livros, artigos científicos e páginas de web sites, de

abrangência nacional e internacional. Os aprendizados dessa fase foram descritos no

referencial teórico (capítulo 2).

O levantamento bibliográfico pode ser classificado como exploratório, pois tiveram

como principal objetivo estabelecer uma maior familiaridade com o tema estudado (GIL,

2007). A razão de sua escolha deveu-se também à possibilidade do mapeamento na literatura

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dos indícios para a construção do roteiro utilizado na etapa qualitativa e para a análise das

entrevistas.

A pesquisa exploratória tem em sua natureza proporcionar uma aproximação com o

problema de pesquisa, visando a identificá-lo e a torná-lo visível e, em sua maioria, envolve o

procedimento de entrevistas com respondentes que vivem experiências com o problema

pesquisado (GIL, 2007). Sendo assim, na segunda etapa, no que se refere à abordagem

qualitativa, foi utilizada também a pesquisa exploratória, uma vez que o objetivo era

entrevistar pessoas que tivessem tido experiências práticas com o serviço de guarda-roupa

compartilhado (GIL, 2007), para que fosse possível identificar quais as motivações e barreiras

de participação nesse serviço.

A operacionalização dessa etapa da pesquisa foi realizada por meio de entrevistas em

profundidade, realizadas por telefone, com utilização de roteiro semiestruturado para que

fosse possível realizar coleta de dados junto as pessoas (FONSECA, 2002) e os aprendizados

dessa fase foram descritos na análise dos resultados (capítulo 4).

3.3 AMOSTRAS E POPULAÇÃO

Entende-se que a definição de amostra deve ter como base os objetivos traçados no

que diz respeito à realização da pesquisa de campo, uma vez que eles permitem estabelecer

os critérios de elegibilidade dos respondentes (MOSCAROLA, 1990). A amostra deste estudo

consistiu-se de 25 pessoas, sendo 14 usuárias e 11 ex-usuárias de serviços de guarda-roupas

compartilhados, moradoras da região metropolitana de São Paulo. O critério de seleção da

amostra foi intencional e de adesão espontânea.

No caso desta investigação, foi realizado um contato inicial com os dois maiores

guarda-roupas compartilhados da cidade de São Paulo, até onde a autora tem conhecimento,

a Blimo e a Roupateca. As empresas concordaram em participar desta pesquisa, com

finalidade acadêmica e o contato inicial com as entrevistadas deu-se por meio da proprietária

de cada uma das empresas, que enviou um e-mail para toda a sua base de usuárias e ex-

usuárias convidando-as a participarem da pesquisa (a pesquisadora não teve acesso a esses

e-mails). As clientes foram informadas que, participando da pesquisa, concorreriam a um mês

de assinatura gratuita de um plano médio do guarda-roupa compartilhado do qual ela é ou

era membro.

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A lista de usuárias e não usuárias que concordaram em participar da pesquisa foi

enviada à pesquisadora por email contendo nome completo e telefone. A pesquisadora fez

contato individualmente com cada pessoa por WhatsApp, com uma breve introdução do

objetivo do trabalho e sugerindo data e horário para a conversa. As entrevistas foram

realizadas entre outubro e dezembro de 2018, por telefone, gravadas - utilizando o gravador

de voz do Windows e o gravador de voz do Iphone.

A decisão para o tamanho da amostra foi baseada no conceito de saturação de

informações de Strauss and Corbin (1998), o ponto no qual não surgem novos temas ou

informações. As participantes eram todas mulheres, entre 23 e 50 anos e moradoras da região

metropolitana de São Paulo. Todos as entrevistadas possuíam emprego, em profissões

diversas e 60% eram casadas enquanto 68% não possuíam filhos. No Quadro 7, as usuárias

estão representadas pelas siglas U1 a U14 e as ex-usuárias pelas siglas U15 a U25, é possível

encontrar os dados demográficos das participantes.

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Quadro 7 - Dados demográficos e duração das entrevistas

Nº IDADE PROFISSÃO ESTADO CIVIL FILHOS MORADIA EMPRESA STATUS DURAÇÃO

U1 42 Jornalista Divorciada Não Santa Cecília Roupateca Usuária 00:26:42

U2 37 Jornalista Casada Não Higienópolis Roupateca Usuária 00:33:02

U3 39 Jornalista Casada Sim Pinheiros Roupateca Usuária 00:34:08

U4 31 Farmacêutica Solteira Não Pompéia Roupateca Usuária 00:35:27

U5 43 Empresária Casada Sim Vila Carrão Roupateca Usuária 00:44:18

U6 48 Empresária Divorciada Sim Higienópolis Roupateca Usuária 00:35:18

U7 40 Arquiteta Casada Sim Perdizes Roupateca Usuária 00:29:23

U8 35 Técnica de Informática Casada Não Osasco Roupateca Usuária 00:33:42

U9 50 Professora Casada Sim Vila Anglo Roupateca Usuária 00:50:03

U10 32 Advogada Casada Sim Perdizes Blimo Usuária 00:26:09

U11 28 Advogada Casada Não Vila Madalena Blimo Usuária 00:20:35

U12 33 Bancária Casada Não Perdizes Blimo Usuária 00:28:49

U13 39 Nutricionista Casada Não Vila Buarque Roupateca Usuária 00:34:27

U14 34 Consultora Solteira Não Jardim Paulista Blimo Usuária 00:31:40

U15 36 Bancária Casada Não Vila Olímpia Roupateca Ex-usuária 00:15:52

U16 47 Advogada Casada Sim Higienópolis Blimo Ex-usuária 00:25:49

U17 30 Analista de Sistemas Solteira Não São Bernardo Blimo Ex-usuária 00:17:38

U18 26 Gestora de Investimentos Solteira Não Pinheiros Blimo Ex-usuária 00:20:30

U19 37 Farmacêutica Solteira Não Vila Mascote Blimo Ex-usuária 00:29:32

U20 34 Consultora de Imagem Solteira Não Moema Roupateca Ex-usuária 00:18:47

U21 23 Marketing Solteira Não Pinheiros Roupateca Ex-usuária 00:16:39

U22 32 Advogada Casada Não Vila Madalena Blimo Ex-usuária 00:15:44

U23 31 Advogada Casada Não Indianópolis Roupateca Ex-usuária 00:18:53

U24 27 Publicitária Solteira Não Vila Madalena Roupateca Ex-usuária 00:39:05

U25 39 Servidora Pública Casada Sim Embú das Artes Roupateca Ex-usuária 00:27:37

Fonte: Autora, 2019.

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3.4 INSTRUMENTO DE PESQUISA

O instrumento de coleta de dados utilizado nessa pesquisa foi a entrevista em

profundidade com roteiro semiestruturado. As entrevistas foram realizadas por telefone, com

um tempo médio de 33 minutos para as usuárias do serviço de guarda-roupa compartilhado

e 22 minutos para as ex-usuárias. As entrevistas foram gravadas utilizando o gravador de voz

do computador com sistema operacional Windows, da marca Lenovo e o gravador de voz do

telefone celular Iphone, da marca Apple. Todas as entrevistas foram transcritas pela própria

pesquisadora, no total de 71 horas de transcrições e 109 páginas de materiais transcritos.

A escolha pelo roteiro semiestruturado deu-se pela possibilidade de o respondente

esclarecer as questões, pela facilidade de obter informações com elevado nível de

profundidade e por oferecer maior garantir de respostas. Autores como Triviños (1987) e

Manzini (1990/1991) têm tentado definir e caracterizar o que vem a ser uma entrevista

semiestruturada. Para Triviños (1987, p. 146) a entrevista semiestruturada tem como

característica questionamentos básicos que são apoiados em teorias e hipóteses que se

relacionam ao tema da pesquisa. Os questionamentos dariam frutos a novas hipóteses

surgidas a partir das respostas dos informantes. O foco principal seria colocado pelo

entrevistador.

O Quadro 8 apresenta dados das entrevistas e transcrições. Está dividido em: usuárias

e ex-usuárias, também explicita informações como: número de participantes, tempo médio e

total das entrevistas e transcrições.

Quadro 8 - Tempo das entrevistas e das transcrições

ENTREVISTAS TRANSCRIÇÕES

QUANTIDADE

TEMPO MÉDIO

TEMPO TOTAL

TEMPO MÉDIO

TEMPO TOTAL

PÁGINAS

USUÁRIAS 14 00:33:07 07:43:43 03:18:44 46:22:16 73

EX-USUÁRIAS 11 00:22:22 04:06:06 02:14:14 24:36:34 36

TODOS 25 00:28:24 11:49:49 02:50:21 70:58:45 109

Fonte: Autora, 2019.

O roteiro semiestruturado utilizado como guia durante as entrevistas em

profundidade foi baseado na literatura de motivações e barreiras em CFC existente e

estruturado em oito partes. A primeira parte contempla os fatores socioeconômicos, com o

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objetivo de entender o perfil dessas usuárias e conseguir mapear possíveis relações entre

idade ou local de moradia e trabalho com a participação no serviço de guarda-roupa

compartilhado. Na segunda parte, as entrevistadas eram inseridas no contexto de moda, com

perguntas que exploravam a relação com o consumo das categorias de vestuários e

acessórios, tema dessa pesquisa. Já na terceira parte, as perguntas tratavam especificamente

do tema de estudo deste projeto, o guarda-roupa compartilhado. As questões tinham o

objetivo de entender o conhecimento prévio das entrevistadas sobre o assunto, a relação com

sistemas similares de consumo, assim como a dinâmica de utilização do guarda-roupa

compartilhado.

Os dois próximos conjuntos de questões, quarta e quinta parte, buscam diretamente

responder aos objetivos dessa pesquisa e exploram as motivações e barreiras de participação

em guarda-roupas compartilhados a partir as categorias já mapeadas na literatura. O sexto

conjunto de perguntas retoma questões em relação ao guarda-roupa compartilhado,

inicialmente exploradas no quarto conjunto. Por fim, o sétimo e oitavo conjunto de questões

exploram o conhecimento prévio e a familiaridade das entrevistadas com os conceitos de

compartilhamento e sustentabilidade. Nos Quadros 9 e 10 é possível encontrar os roteiros

que serviram de guia para as entrevistas com as usuárias e com as ex-usuárias.

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Quadro 9 - Roteiro utilizado como base para as entrevistas com as usuárias

1 FATORES SOCIODEMOGRÁFICOS

1.1 Qual o seu nome e a sua idade?

1.2 Qual a sua profissão?

1.3 Qual o seu estado civil? Você tem filhos?

1.4 Em qual bairro você mora?

1.5 Em qual bairro você trabalha?

2 IMERSÃO NA MODA

2.1 Como você definiria a sua relação com a moda?

2.2 Como você definiria a sua relação com compras de roupas e acessórios?

2.3 Com que frequência você compra uma peça de roupa ou um acessório?

3 O GUARDA-ROUPA COMPARTILHADO

3.1 Como você conheceu o guarda-roupa compartilhado?

3.2 Você já utilizou algum outro serviço de compartilhamento de roupas? Como brechó ou aluguel?

3.3 Há quanto tempo você assina um guarda-roupa compartilhado?

3.4 Qual é o seu plano de assinatura? Com que frequência você visita o guarda-roupa compartilhado?

4 MOTIVAÇÕES

4.1 O que te levou a participar de um guarda-roupa compartilhado?

4.2 O que você mais gosta em participar de um guarda-roupa compartilhado?

Hedônicas

Utilitárias

Ambientais

5 BARREIRAS

5.1 O que você não gosta no guarda-roupa compartilhado?

5.2 Você já teve algum problema com os produtos ou serviço do guarda-roupa compartilhado?

Higiene e Saúde

Falta de confiança e de informação

Falta de propriedade

Hábitos de consumo

6 O GUARDA-ROUPA COMPARTILHADO

6.1 Você se vê usando um guarda-roupa compartilhado nos próximos seis meses?

6.2 Você indicaria o guarda-roupa compartilhado para uma amiga?

6.3 Na sua opinião, como o guarda-roupa compartilhado poderia ser melhor?

6.4 Você já pensou em cancelar a sua assinatura? Por quê?

6.5 Nas suas palavras, como você definiria um guarda-roupa compartilhado para alguém que não o conhece?

7 FAMILIARIDADE COM COMPARTILHAMENTO

7.1 Na sua opinião, o que é economia compartilhada?

7.2 Você utiliza algum outro serviço de compartilhamento de qualquer categoria?

8 FAMILIARIDADE COM SUSTENTABILIDADE

8.1 Na sua opinião, o que é sustentabilidade?

8.2 Qual a sua relação com a sustentabilidade?

Fonte: Autora, 2019.

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Quadro 10 - Roteiro utilizado como base para as entrevistas com as ex-usuárias

1 FATORES SOCIODEMOGRÁFICOS

1.1 Qual o seu nome e a sua idade?

1.2 Qual a sua profissão?

1.3 Qual o seu estado civil? Você tem filhos?

1.4 Em qual bairro você mora?

1.5 Em qual bairro você trabalha?

2 IMERSÃO NA MODA

2.1 Como é a sua relação com a moda?

2.2 Como é a sua relação com compras de roupas e acessórios?

2.3 Com que frequência você compra uma peça de roupa ou acessório?

3 O GUARDA-ROUPA COMPARTILHADO

3.1 Como você conheceu o guarda-roupa compartilhado?

3.2 Você já utilizou algum outro serviço de compartilhamento de roupas? Como brechó ou aluguel?

3.3 Por quanto tempo você assinou o serviço de guarda-roupa compartilhado?

3.4 Qual era o seu plano de assinatura? Com que frequência você visitava o guarda-roupa compartilhado?

4 MOTIVAÇÕES

4.1 Por que você quis participar de um guarda-roupa compartilhado?

4.2 O que você mais gostava em participar de um guarda-roupa compartilhado?

Hedônicas

Utilitárias

Ambientais

5 BARREIRAS

5.1 O que você não gostava no guarda-roupa compartilhado?

5.2 Você já teve algum problema com os produtos ou serviços do guarda-roupa compartilhado?

Higiene e Saúde

Falta de confiança e de informação

Falta de propriedade

Hábitos de consume

6 O GUARDA-ROUPA COMPARTILHADO

6.1 Por que você cancelou a assinatura do guarda-roupa compartilhado?

6.2 Você indicaria o guarda-roupa compartilhado para uma amiga?

6.3 Na sua opinião, como o guarda-roupa compartilhado poderia ser melhor?

6.4 Como você definiria um guarda-roupa compartilhado para alguém que não conhece?

6.5 Você já pensou em voltar a utilizar um serviço de guarda roupa compartilhado?

6.6 O que te faria voltar a ser usuária de um serviço de guarda-roupa compartilhado?

7 FAMILIARIDADE COM COMPARTILHAMENTO

7.1 Na sua opinião, o que é economia compartilhada?

7.2 Você utiliza algum outro serviço de compartilhamento de qualquer categoria?

8 FAMILIARIDADE COM SUSTENTABILIDADE

8.1 Na sua opinião, o que é sustentabilidade?

8.2 Qual a sua relação com a sustentabilidade?

Fonte: Autora, 2019.

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3.5 ANÁLISE DOS DADOS

Para analisar, compreender e interpretar um material qualitativo, faz-se necessário superar a

tendência ingênua a acreditar que a interpretação dos dados será mostrada espontaneamente ao

pesquisador para isso, é preciso penetrar nos significados que os atores sociais compartilham na

vivência de sua realidade (BARDIN, 1979).

Na primeira etapa, o material obtido a partir das entrevistas em profundidade realizadas com

as usuárias e ex-usuárias do serviço de guarda-roupa compartilhado foram analisadas segundo a

técnica de análise de conteúdo temática (BARDIN, 1977). Foi utilizada aqui a análise temática, porque,

além de ser a mais simples, é considerada apropriada para as investigações qualitativas (MINAYO,

2007). A análise temática trabalha com a noção de tema, o qual está ligado a uma afirmação a respeito

de determinado assunto; comporta um feixe de relações e pode ser graficamente representada por

meio de uma palavra, frase ou resumo. Para Minayo (2007, p. 316), “a análise temática consiste em

descobrir os núcleos de sentido que compõem uma comunicação cuja presença ou frequência

signifique alguma coisa para o objetivo analítico visado”.

Ainda para Minayo (2007), a análise de conteúdo temática busca obter, por meio de

procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores que

permitam extrair conhecimentos relativos ao tema pesquisado e pressupõe três momentos: (1) a pré-

análise, com a organização do que será analisado; (2) a exploração do material, que é o momento em

que se codifica o material, fazendo o recorte do texto, escolhendo as regras de contagem; classificando

e agregando os dados por categorias teóricas ou empíricas; (3) e a interpretação dos conteúdos -

quando serão trabalhados os dados brutos e dado destaque as informações obtidas.

As transcrições das entrevistas foram compiladas e organizadas e, como facilitador da

aplicação da categorização, utilizou-se o software ATLAS TI que compreendeu as categorias que serão

detalhadas no próximo capítulo. Trechos das entrevistas são usados para ilustrar cada um dos códigos

que, depois de analisados, foram organizados em uma tabela de resumo que busca organizar as

informações que os participantes revelaram sobre o tema e dar base para o desenvolvidos dos

resultados e das discussões.

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4. RESULTADOS

Este capítulo contém os resultados do estudo após a análise de conteúdo que está

baseada na pesquisa bibliográfica e pesquisa de campo previamente realizada e discutidas nos

capítulos anteriores. Os resultados buscam responder ao problema inicial da pesquisa: quais

as motivações e barreiras de participação em sistemas de consumo colaborativo de moda

(CFC) de guarda-roupa compartilhado?

A proposta inicial desta pesquisa previa a divisão da amostra em dois grupos distintos

(usuárias e ex-usuárias) do serviço de guarda-roupa compartilhado. Essa divisão feita a partir

do perfil das entrevistadas deu-se pelo fato de que o objetivo da pesquisa buscava identificar

os motivos para participação – os quais acreditava-se que estariam mais claros para as

usuárias atuais do serviço de guarda-roupa compartilhado –, e que barreiras foram

enfrentadas na participação do sistema de CC – as quais creia-se que estariam mais claras para

as ex-usuárias do serviço de guarda-roupa compartilhado.

Após a finalização da análise de conteúdo, tanto as motivações, quanto as barreiras

identificadas nos dois grupos da amostra foram as mesmas, seguindo uma proporção similar

de recorrências, principalmente em relação às barreiras, reforçando a assertividade da coleta

de dados. Por esse motivo, optou-se por realizar a análise de resultados dos dois grupos da

amostra das motivações e barreiras de forma agrupada. Especificamente na análise de

algumas motivações, na qual foi possível identificar divergências significativas entre os dois

grupos, serão feitas análises separadas pontuais.

As motivações de participação em guarda-roupas compartilhados

Após a análise de conteúdo e categorização das entrevistas coletadas com usuárias e

ex-usuárias do sistema de guarda-roupa compartilhado, foi possível identificar suas

motivações. Os dados coletados nas duas amostras foram agrupados, conforme explicado

anteriormente e os resultados foram consolidados na Tabela 1. As entrevistas foram

realizadas a partir de roteiro semiestruturado com questões abertas, possibilitando com que

uma mesma entrevistada trouxesse indícios de diversas motivações de participação.

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A quantificação dos resultados na Tabela 1 tem o objetivo de deixar o mais claro

possível as recorrências, possibilitar visualizar as diferenças entre as respostas dos dois grupos

da amostra e viabilizar a identificação de possíveis correlações que podem suportar as

contribuições gerenciais que são exploradas nessa pesquisa. A quantificação não tem como

objetivo hierarquizar a importância das motivações.

Tabela 1 - Recorrência das categorias das motivações entre usuárias e ex-usuárias

USUÁRIAS EX-USUÁRIAS TOTAL

QUANT.

% USUÁRIAS

QUANT. % EX-USUÁRIAS QUANT. % TOTAL

VARIEDADE DE PRODUTOS

8 57% 9 82% 17 68%

DIVERSÃO 6 43% 1 9% 7 28%

NOVIDADE SEM CULPA 12 86% 5 45% 17 68%

EXPERIMENTAR NOVOS ESTILOS

8 57% 4 36% 12 48%

INTERAÇÃO SOCIAL 10 71% 1 9% 11 44%

IMAGEM 8 57% 3 27% 11 44%

CURADORIA 5 36% 2 18% 7 28%

FRUGALIDADE 6 43% 2 18% 8 32%

EVITAR INVESTIMENTOS ERRADOS

7 50% 8 73% 15 60%

FINANCEIRO 8 57% 9 82% 17 68%

CONVENIÊNCIA 9 64% 3 27% 12 48%

CONSUMO FAVORÁVEL AO MEIO AMBIENTE

11 79% 4 36% 15 60%

DISTANCIAMENTO DO SISTEMA

5 36% 1 9% 6 24%

Fonte: Autora, 2019.

Como é possível identificar no Figura 5, mais usuárias atuais do serviço trouxeram nas

entrevistas motivações de participação do que as ex-usuárias. Em algumas das categorias a

quantidade de recorrências de respostas entre os dois grupos foram parecidas, como é o caso

de “experimentar novos estilos”, já em outras categorias a quantidade de recorrências foram

muito diferentes, como é o caso de “interação social” e “consumo favorável ao meio

ambiente”. Cada categoria será analisada separadamente abaixo e os resultados serão

exemplificados a partir dos exemplos retirados diretamente das entrevistas para

contextualização das análises.

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Figura 5 - Recorrência das categorias das motivações entre usuárias e ex-usuárias

Fonte: Autora, 2019.

A primeira categoria identificada é a “Variedade de produtos”, que apareceu no

discurso dos dois grupos da amostra, com uma média de 68% das entrevistadas declarando

ser uma das motivações para participação em guarda-roupa compartilhados. Para algumas

entrevistadas a variedade está associada à possibilidade de utilizar uma peça nova sempre e

a ter acesso a uma grande variedade de peças junto com uma vantagem econômica. A

categoria “Variedade de produtos” teve a maior recorrência de respostas entre todas as

entrevistadas, demonstrando ser um grande ponto de atenção para a perpetuação do guarda-

roupa compartilhado. No Quadro 11, encontram-se listados alguns dos trechos identificados

na entrevista que exemplificam essa motivação nos discursos.

Quadro 11 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Variedade de produtos

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Variedade de produtos

"Acho que a maior vantagem é poder estar sempre com roupas diferentes sem estar consumindo grande quantidade de dinheiro e enchendo meu guarda-roupa de peças." U12 "A maior vantagem é todo final de semana ter uma peça nova." U13 "Eu acho que, por exemplo, lá eu poderia usar vários modelos de roupa sem repetir." U18

Fonte: Autora, 2019.

0%

10%

20%

30%

40%

50%

60%

70%

80%

90%

Motivações

% USUÁRIAS % EX USUÁRIAS % TOTAL

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A próxima categoria identificada foi a “Diversão”. Participar de um guarda-roupa

compartilhado foi apontado por algumas entrevistadas como uma tarefa próxima a um

passatempo, junto com uma busca por se divertir com a moda, e também como um passeio

ou uma programação de final de semana. Apesar de a “Diversão” aparecer como uma das

motivações de participação no serviço tanto no grupo de usuárias quanto não usuárias essa

categoria teve a segunda menor recorrência, com apenas 28% do total das entrevistadas

citando essa motivação. No Quadro 12, é possível encontrar trechos completos retirados das

entrevistas que ilustram essa motivação.

Quadro 12 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Diversão

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Diversão

"Foi essa expectativa de consumir menos e poder usar roupas que eu não compraria, mas com a intenção de diversão assim, de me divertir com a moda" U2 "Eu gosto de ir na Blimo, eu me divirto, sábado eu gosto de ir ali daquela região, eu vou na feira, às vezes eu vou na feira e vou na Blimo. Eu gosto dali de ir no pão, então eu como e depois subo. Então é ótimo." U12

Fonte: Autora, 2019.

Ainda dentro das motivações hedônicas, a próxima categoria identificada foi a busca

por “Novidades sem o sentimento de culpa”. No total das entrevistadas, 86% das usuárias e

45% das ex-usuárias sinalizaram que uma das suas motivações ao participarem desse serviço

é o desejo de usar peças novas sem sentir a culpa que muitas vezes a aquisição de produtos

traz ou já trouxe a essas pessoas no passado. Esse sentimento de culpa pode estar associado

a armazenar e possuir muito mais itens do que o necessário ou à culpa de comprar um item e

não o usar.

A grande recorrência dessa motivação entre as usuárias atuais do serviço pode estar

relacionada a maior predisposição desse grupo a se engajarem com questões ambientais,

como será possível ver na análise das duas categorias relacionadas ao meio ambiente. Isso

porque ao valorizarem iniciativas sustentáveis, o sentimento de culpa durante o processo

tradicional de compra também poderia ser maior. No Quadro 13, é possível encontrar alguns

trechos que ilustram a presença dessa motivação no discurso das entrevistadas.

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Quadro 13- Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Novidade sem culpa

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Novidade sem culpa

"Eu vou acalmar uma coisa que é essa necessidade de ter roupas novas sem precisar atolar o guarda-roupa, sabe? U1 "Tinha peça no meu guarda-roupa que eu tinha comprado antes e que eu usei super pouco, ou roupa que eu nunca tinha usado, então eu não queria gastar dinheiro com roupa nova." U21

Fonte: Autora, 2019.

A categoria “Experimentar novos estilos”, também apareceu nas entrevistas como

uma das possíveis motivações de participação em serviços de guarda-roupa compartilhados.

Algumas entrevistadas declararam que o acervo disponível diversificou a variedade de

produtos que elas usavam, mas não o estilo. Quase metade das entrevistadas declararam que

participam desse serviço pela possibilidade de variar o seu estilo sem o compromisso da

aquisição da peça, pela possibilidade de trocar de estilo com mais velocidade e dinamismo, e

pela opção de experimentar temporariamente um novo estilo sem o compromisso de comprar

um produto. No Quadro 14 é possível encontrar trechos completos retirados das entrevistas

que ilustram essa a motivação.

Quadro 14 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Experimentar novos estilos

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Experimentar novos estilos

"Pra mim a maior vantagem é poder brincar com o estilo sem ter que adquirir, é poder experimentar." U8 "Eu já usei muitas peças muito legais que eu gostei em mim, que eram cores muito coloridas que eu não compraria assim, lá tem essa chance de você experimentar, nossa experimentei vários estilos, várias cores principalmente que talvez não compraria se fosse para comprar a peça." U13 "Trocar de modelos e estilos com facilidade, hoje eu estou com um estilo amanhã com outro. Poder usar uma roupa linda que eu não compraria." U16

Fonte: Autora, 2019.

Entre as motivações hedônicas ainda foi possível identificar a “Interação social” como

uma das motivações para a participação principalmente para a categoria usuárias, já que

apenas uma participante da categoria ex-usuária trouxe essa motivação durante a entrevista.

Apenas uma ex-usuária declarou que gosta de ir até o guarda-roupa compartilhado para ficar

conversando com a vendedora, enquanto que a maioria das usuárias atuais do serviço

trouxeram a “Interação social” com um foco maior na construção de uma comunidade entre

mulheres que possuem os mesmos valores e compartilham objetivos parecidos. No Quadro

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15, é possível encontrar alguns trechos que ilustram a presença dessa motivação no discurso

das entrevistadas.

Quadro 15 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Interação social

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Interação social

"Fora isso, tem um prazer até de estar lá com outras mulheres, é um momento de encontro." U7 "O atendimento da Bia é ótimo! Vale a pena ir só para ficar conversando com ela, ela é muito fofa!" U25

Fonte: Autora, 2019.

Por último, dentro das motivações hedônicas, a “Imagem” apareceu em 44% nos

discursos das entrevistadas, tanto das usuárias como das ex-usuárias. O acesso a um acervo

variado e a possibilidade de experimentar novos estilos parece atrair atenção nos grupos

sociais dessas mulheres, gerando elogios e um aumento da autoestima. O reconhecimento

positivo do grupo em relação a esse novo hábito de consumo também aparece nos discursos.

Do mesmo modo, a busca por ser reconhecida como inovadora por participarem de

um modelo diferente de serviço também parece ser uma motivação, com as entrevistadas

demonstrando orgulho em relação a essa identificação. No Quadro 16, encontram-se listados

alguns dos trechos identificados na entrevista que exemplificam essa motivação nos discursos.

Quadro 16 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Imagem

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Imagem

"Algumas amigas sabem, porque as vezes elas elogiam numa festa e eu digo: “ah, essa não é minha, é do guarda-roupa compartilhado”. Elas acham isso incrível." U1 "Eu sempre falo, toda vez que alguém fala “nossa, como você está bonita”, eu falo “ah isso aqui eu peguei na loja tal, tal”. U12

Fonte: Autora, 2019.

Entre as categorias utilitárias, a primeira categoria identificada é a “Curadoria”. Apesar

de assemelhar-se à busca por conveniência, a curadoria parece estar associada a uma

transferência de responsabilidade e de conhecimento na hora da escolha dos produtos ou

estilo para a empresa responsável pelo guarda-roupa compartilhado. Curadoria foi uma

motivação identificada nos dois grupos de entrevistadas, com uma média de 28% de

recorrência no total de entrevistas.

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A motivação “Curadoria” dos produtos está vinculada a valorização da existência de

uma curadoria prévia pela preguiça de escolher, procurar e comprar, a gostar de ser

surpreendida, e ao suporte na seleção de peças especificas para a usuária, depois da

assinatura do acervo, poupando tempo e trazendo assertividade para a o processo de escolha.

No Quadro 17, é possível encontrar alguns trechos que ilustram a presença dessa motivação

no discurso das entrevistadas.

Quadro 17 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Curadoria

Fonte: Autora, 2019.

A segunda motivação utilitária identificada foi a “Frugalidade”, que diz respeito a busca

por umas formas de consumo mais econômicas, e à construção de uma relação mais prudente

com o dinheiro. A frugalidade nesse caso, apesar de ser similar com a motivação financeira,

não está atrelada ao potencial de economia financeira direta ou a possibilidade de gastos que

a pessoa possui e sim à percepção de valor dessas pessoas em relação ao consumo de itens

de vestuário. Essa motivação foi identificada majoritariamente no grupo das usuárias, com

43% de recorrência entre as entrevistas desse grupo, dando um indício sobre as características

das pessoas que possivelmente enxergam mais valor na utilização de um guarda-roupa

compartilhado.

As entrevistadas demonstraram ter a preocupação por preço justo na assinatura do

serviço, justamente por não concordarem que as práticas tradicionais de consumo possuam

uma boa relação de valor e por não concordarem com a pratica de precificação

tradicionalmente utilizada nesse setor para o consumo do mesmo nível de produtos que elas

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Curadoria

"Eu sou uma pessoa que tem muita preguiça de consumir, de ir até um lugar para comprar, se experimentar e achei fantástico eu não precisar ter que escolher, já tem ali um acervo que tem a ver comigo." U7 "Acho que é mais confortável né, mais prático, eu compro sapato também por sacolinha, eu gosto dessa coisa da sacolinha de vir as coisas e eu gosto de surpresa também sabe, eu passei o meu perfil e gosto e elas escolhem." U15 "Para mim a maior vantagem é poder pegar coisas de pessoas que já escolheram por você." U16 "Uma coisa muito legal deles é que eles ajudam você, por exemplo, eu jamais ia pegar aquela calça pantacourt, entendeu, e elas falam “prova pra você ver, isso aqui fica bom com isso”, o que vai servir elas acertam, entendeu, isso é muito legal, você ter a ajuda delas é bem legal." U19

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buscam. No Quadro 18, encontram-se listados alguns dos trechos identificados na entrevista

que exemplificam essa motivação nos discursos.

Quadro 18 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Frugalidade

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Frugalidade

"Mas sinceramente eu não sou uma pessoa consumista, eu não pago R$ 500,00 em uma calça. Já fiz em um vestido de festa, uma festa de formatura, mas é para uma ocasião só e isso eu tenho desconstruído ao longo do tempo. Lá eu tenho a oportunidade de usar peças diferenciadas, que exigem um cuidado maior, sem eu ter que investir tanto." U8 "Eu passo no shopping nem entro porque é caro, R$250,00 uma blusinha, R$450,00 uma calça jeans, eu acho um absurdo. Então, eu tenho opção de usar roupas boas, que tem preços caros, preços altos que eu não pagaria." U19

Fonte: Autora, 2019.

Entre as motivações, que de alguma forma estão relacionadas com questões

financeiras, foi possível também identificar a busca por “Evitar investimentos errados”, com

uma grande recorrência dessa categoria aparecendo tanto nas entrevistas com usuárias (50%)

quanto com ex-usuárias (73%). As entrevistadas demonstraram o interesse em acessar um

produto ao invés de comprá-lo como manobra para evitar investimentos que não seriam bem

utilizados ou não valeriam a pena no futuro. Entre as variações das respostas é possível

identificar pessoas que querem evitar a depreciação de um item que ficará parado no armário

ou evitar prejuízos financeiros no caso de não gostar de uma peça depois de utilizá-la. O uso

dos CC também aparece como recurso durante fases de incertezas ou mudanças, como no

caso de ganho de peso repentino ou gravidez, ocasiões onde em pouco tempo o produto

comprado poderia se tornar obsoleto.

Nesse aspecto, evidencia-se a grande diferença de recorrências entre os dois grupos

da amostra, sugerindo que possa ser um indício de que: para o grupo das ex-usuárias a

motivação financeira exerce um papel significativo para a participação em um serviço como

esse, em detrimento de outras motivações, e em uma proporção muito diferente das atuais

usuárias do serviço. Essa mesma recorrência e divergência de resposta entre os grupos ocorre

na motivação que será analisa a seguir, que também tem uma base relacionada com finanças.

No Quadro 19, é possível encontrar trechos completos retirados das entrevistas que ilustram

essa motivação.

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Quadro 19 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Evitar investimentos errados

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Evitar investimentos

errados

"Se eu tivesse comprado ela ficaria lá para sempre, encostada. Acho que a principal vantagem é que eu estou entendendo meus padrões de gosto e de uso real." U1 "Eu posso pegar roupa, e se eu não gostar tudo bem, eu não vou sair no prejuízo como se eu tivesse comprado uma roupa e depois me arrependido e não desse pra trocar, porque, sei lá, eu já usei ou uma coisa assim, então eu me sinto mais confortável com esse tipo de arranjo." U3 "Eu achei bem legal, porque foi num momento que eu estava em uma fase de emagrecimento, então eu não precisei ficar comprando roupa nessa transição. Eu usava e aí eu fui mudando de número e me ajudou bastante." U17 "Outra coisa é que eu estava em licença maternidade, em um momento muito instável, meu corpo mudava todos os dias então era muito conveniente para esse momento de transição não ter que comprar nada." U25

Fonte: Autora, 2019.

A motivação financeira, recorrente da literatura sobre as motivações para participação

em CFC, também foi identificada nos dois grupos, com 68% de recorrência do total das

entrevistadas. Apesar de não estarem muito seguras sobre a maneira como estão avaliando o

benefício financeiro da participação nesse serviço, as entrevistadas sinalizam uma economia

de custos recorrente ao utilizarem o guarda-roupa compartilhado e também economias que

ocorrem em ocasiões pontuais, além de uma mudança de hábito de diminuição de frequência

de compra, que tem como consequência economia de custos.

Quando analisadas separadamente, 57% das entrevistadas classificas como usuárias

trouxeram em seus discursos alguma motivação financeira e 82% das ex-usuárias fizeram o

mesmo. Essa diferença parece estar relacionada com a conclusão da motivação anterior,

sinalizando que as ex-usuárias não conseguiram perceber no serviço, a partir de um

determinado momento, uma vantagem financeira significativa. Essa diferença também pode

ser um indício de um perfil de pessoas que estão cancelando o serviço, para as quais a

economia financeira é a principal motivação de participação, enquanto que, para o grupo de

usuárias, a participação no sistema de guarda-roupa compartilhado não parece estar muito

atrelada à economia financeira e sim às questões sociais e ambientais. No Quadro 20,

encontram-se listados alguns dos trechos identificados na entrevista que exemplificam essa

motivação nos discursos.

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Quadro 20 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Financeiro

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Financeiro

"A conta que eu fiz foi uma conta assim meio de doido, sei lá, uma pessoa assim boa de finanças, sei lá, não ia gostar, a conta que eu fiz foi: eu vou ter pelo menos seis peças de roupas diferentes por mês para usar, custa R$250,00. Como o meu padrão de compra, eu não compro coisa Zara, não consigo ter seis peças de roupas novas no meu guarda-roupa por mês por R$250,00." U1 "Eu gastava muito, agora estou gastando menos com a Roupateca, eu acho ótimo. Eu não tenho esse apego de ter que ter a roupa." U3 "Eu fui viajar para a Argentina por exemplo, ai eu peguei uns casacos super pesados que não usaria no Brasil, deu super certo, não gastei com isso. Então acho que é econômico" U17 "Eu sabia que lá na Blimo eu teria pelo menos duas peças novas naquela semana, então eu não comprava, então tipo a quantidade de compras que eu fiz foi assim absurdamente menor." U18

Fonte: Autora, 2019.

A última motivação identificada dentro do grupo de motivações utilitárias foi a

“Conveniência”. Metade das entrevistadas deixam claro em seus discursos que os serviços

adicionais que possibilitem uma maior conveniência na utilização dos guarda-roupas

compartilhados são uma das razões para participação nesse sistema. As motivações variam

entre flexibilidade de horário e o interesse por serviços adicionais que facilitem o uso do

serviço principal como estacionamento e lavagem incluídos. Essa categoria está em sinergia

com grande parte das barreiras que foram encontradas nas entrevistas e que serão descritas

no próximo capítulo. No Quadro 21, é possível encontrar trechos completos retirados das entrevistas

que ilustram essa motivação.

Quadro 21- Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Conveniência

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Conveniência

"Por estacionamento e lavagem. Vai que aumenta R$ 15,00 a mais para eu não ter que lavar peça nenhuma. Sei que elas teriam que viabilizar isso, mas seria bom." U7 "Para mim seria melhor se tivesse um horário de atendimento mais estendido." U12 "Se tivesse a opção on-line eu iria um dia e provaria várias peças, ai eu saberia o que gosto mais, ai eu ia pegando. Iria pessoalmente a cada 2 meses, só para ver o que chegou de novo, para conhece a coleção e pegaria também pela internet sem problemas, se tivesse seria maravilhoso. Ou se estivesse perto da minha casa, eu seria cliente com certeza." U17

Fonte: Autora, 2019.

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O último grupo envolvendo as motivações identificadas é ambiental. Dentro dele a

primeira categoria identificada é o “Consumo favorável ao meio ambiente” e a segunda é a

busca por se “Distanciar do sistema”. A diferença de recorrências dessas categorias entre

usuárias e ex-usuárias é extremamente significativa, sinalizando uma possível identificação

das usuárias atuais com conceitos relacionados a sustentabilidade e compartilhamento, que

são confirmados nas entrevistas, em oposto ao que valorizam as ex-usuárias, mais focadas nos

benefícios financeiros.

O consumo favorável ao meio ambiente aparece nas entrevistas com o objetivo de se

fazer um melhor uso dos recursos do planeta, com a busca por refletir um estilo de vida mais

sustentável e com o desejo de dar suporte a marcas que compactuem com conceitos

sustentáveis. No Quadro 22, é possível encontrar trechos completos retirados das entrevistas que

ilustram essa motivação.

Quadro 22 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação: Consumo Favorável ao meio ambiente

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Consumo favorável ao

meio ambiente

"Ao compartilhar, na verdade você está circulando o mesmo bem entre mais pessoas, então precisa comprar menos, menos consumo, menos produção, tem uma coisa ali de fazer um melhor uso dos recursos do planeta." U1 "Eu gosto dessas coisas de sustentabilidade, eu gosto de coisas compartilhadas, eu já tive um coworking, encaixou perfeitamente com o meu estilo de vida." U1 "Tem essa questão da sustentabilidade de você estar sendo não consumista e reutilizando peças, eu compactuo muito com essa filosofia." U12 "E porque elas usam marcas com essa consciência de sustentabilidade, né?" U13

Fonte: Autora, 2019.

A segunda categoria nesse grupo é o “Distanciamento do sistema”, na qual as

entrevistadas, na sua grande maioria atuais usuárias do serviço, sinalizam buscar alternativas

de consumo e um distanciamento do sistema tradicional de consumo atual. Essa motivação é

perceptível nos discursos que sinalizam uma busca por novos hábitos de consumo e uma

tentativa de mudança de estilo, uma preocupação em não ser reconhecida como colaboradas

da indústria da moda, com a qual elas não compactuam e uma forma de se diferenciar das

pessoas que estão nesse sistema de consumo tradicional.

A proporção de recorrência dessas duas últimas motivações nos discursos das usuárias

em relação ao discurso das ex-usuárias é mais que o dobro, reforçando características

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especificas do primeiro grupo. No Quadro 23, encontram-se listados alguns dos trechos

identificados na entrevista que exemplificam essa motivação nos discursos.

Quadro 23 - Exemplos das entrevistas em relação à motivação Distanciamento do sistema

MOTIVAÇÕES EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Distanciamento do sistema

"Eu tenho uma preocupação grande assim em ir mexendo nos hábitos do dia a dia, gerando menos lixo, ser mais responsável, não comprar coisas chinesas, não comprar coisa que fast fashion, que enfim pode empregar pessoas em situações longe da ideal, é uma coisa que eu sempre olhei pra essa história de como eu consumo e de como isso afeta o entorno, o que está por trás desse consumo." U1 "Não estou alimentando a indústria da moda." U3 "Não fica aquela coisa assim de marca que usa trabalho escravo, aquela produção em larga escala, todo mundo também tem, tudo igual." 13

Fonte: Autora, 2019.

Neste capítulo, foram analisados os resultados das entrevistas relacionados ao

primeiro objetivo dessa pesquisa: identificar as motivações de participação em sistemas de

guarda-roupa compartilhados. No próximo capítulo, serão abordados os resultados relativos

ao segundo objetivo da pesquisa, a identificação das barreiras de participação nesse mesmo

sistema.

As barreiras de participação em guarda-roupas compartilhados

No capítulo Revisão da Literatura, foram estudadas as barreiras de participação em

CFC mapeadas pelos autores Becker-Leifhold e Iran (2018) da perspectiva do consumidor, por

meio da sua recente revisão sistemática da literatura de CFC. Os autores separaram as

barreiras em quatro categorias distintas: preocupação com higiene/saúde, falta de confiança

e informação, falta de propriedade e hábitos de consumo. Após o processo de categorização

e análise de conteúdo, a autora conseguiu mapear quais dessas barreiras são aplicáveis

também aos serviços de guarda-roupas compartilhados e identificar outras barreiras. A Tabela

2 resume as recorrências das categorias que surgiram após a análise de conteúdo e em seguida

os resultados foram interpretados.

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Tabela 2 - Recorrência das categorias das barreiras entre usuárias e ex-usuárias

USUÁRIAS EX-USUÁRIAS TOTAL

QUANT. % QUANT. % QUANT. %

HIGIENE/ SAÚDE 3 21% 1 9% 4 16%

FALTA DE CONFIANÇA NO ACERVO

10 71% 11 100% 21 84%

FALTA DE INFORMAÇÃO 9 64% 5 45% 14 56%

FALTA DE PROPRIEDADE 3 21% 1 9% 4 16%

DIFICULDADE DE ACESSO/USO

13 93% 9 82% 22 88%

FALTA DE CONVENIÊNCIA

7 50% 7 64% 14 56%

FINANCEIRO 5 36% 7 64% 12 48%

Fonte: Autora, 2019.

Inicialmente, a proposta desta pesquisa era contemplar a análise separada dos grupos

de usuárias e ex-usuárias, entretanto, após a consolidação dos resultados de cada grupo, foi

possível identificar que há recorrência nas falas das participantes, como é possível visualizar

no Figura 6. Por esse motivo, optou-se por analisar os resultados de forma agrupada.

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Fonte: Autora, 2019.

Vale ressaltar que as quatro categoriais encontradas na pesquisa de Becker-Leifhold e

Iran (2018) apareceram nos resultados desta pesquisa de diferentes maneiras. A higiene e os

aspectos relacionados com a saúde são a primeira categoria a ser analisada, apesar da

literatura prever que essa é uma das maiores barreiras para a utilização de CFC, ela foi a

barreira com menor presença de recorrência nas entrevistas, com apenas quatro

identificações na análise de conteúdo. Nenhum entrevistado demonstrou preocupação em

adquirir ácaros ou bactérias vindas de peças mal higienizadas, transmissões de doença ou

mesmo em entrar em contato com peças que não estivessem em condições adequadas.

Há um indício nas entrevistas de que as pessoas reconhecem todas as participantes

como seus iguais e com total habilidade para higienizar uma peça com da mesma maneira que

elas mesmas poderiam fazer, além disso, a relação de confiança criada entre a empresa

provedora do serviço e as usuárias parece exercer um papel significativo na diminuição dessa

barreira, com algumas usuárias trazendo a existência de um intermediário no negócio como

uma forma de garantia da higiene das peças.

Mesmo em pequena escala, é possível perceber que algumas pessoas possuem uma

preocupação inicial em relação à garantia da higienização das peças mesmo antes de

0%

20%

40%

60%

80%

100%

120%

Barreiras

% USUÁRIAS % EX USUÁRIAS % TOTAL

Figura 6 - Recorrência das categorias de barreiras entre usuárias e ex-usuárias

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participarem do serviço, em relação à condição geral de limpeza das roupas e também em

relação ao medo de que o provedor do serviço não possa garantir a higiene das peças. A baixa

recorrência dessa categoria nos resultados também pode estar relacionada com a consciência

ambiental demonstrada pelas entrevistadas e pelo alto nível de entendimento de conceitos

como sustentabilidade e compartilhamento, que foram explorados nas entrevistas. No

Quadro 24, encontram-se listados alguns dos trechos identificados na entrevista que

exemplificam essa motivação nos discursos.

Quadro 24 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira Higiene e Preocupações com a saúde

BARREIRAS EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Higiene/ Preocupações em relação à

saúde

"Eu não estava muito motivada porque não sabia se as roupas iam estar em bom estado, não sabia se elas iam ser lavadas, sei lá, me dava um pouco de bode." U23 "Já recebi roupa manchada, roupa rasgada. Quando essas coisas acontecem, no dia que eu recebo, já tiro foto e mando." U11 "A questão da higienização acho que não fica tão clara. Já aconteceu duas vezes comigo. Uma vez eu peguei um suéter e tinha um chiclete grudado, eu mostrei para as meninas e eu fiquei pensando se ninguém tinha visto, se ninguém tinha checado e a outra vez eu peguei uma calça e coloquei a mão no bolso e tinha um papelzinho de cartão de crédito. Então se tinha um papel lá dentro a calça foi usada, mas se o papel ainda estava lá a calça não foi lavada, então esse tipo de coisa é ruim." U8

Fonte: Autora, 2019.

Já a falta de confiança e informações foi a segunda barreira com maior recorrência

entre as entrevistadas. Esse grupo inicialmente foi desdobrado em duas categoriais, de modo

a organizar e facilitar a tomada de decisões práticas a partir dos achados. A primeira delas, e

a mais recorrente nas entrevistas, diz respeito à falta de confiança em relação ao acervo. As

pessoas duvidam e desconfiam de que encontrarão peças com as quais se identifiquem,

possuem receio em relação à variedade de produtos disponíveis, com medo de acabar

utilizando e encontrando sempre as mesmas peças e não estão seguras na capacidade da

empresa de realizar a manutenção dessas peças.

A falta de confiança no acervo foi a categoria que isoladamente teve a segunda maior

recorrência nas entrevistas entre as barreiras, em sinergia com uma grande preocupação em

relação à variedade de peças, conforme foi identificado capítulo anterior, como uma das

principais motivações. No Quadro 25, é possível encontrar trechos completos retirados das

entrevistas que ilustram essa motivação.

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Quadro 25 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Falta de confiança no acervo

BARREIRAS EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Falta de confiança no acervo

"Eu sentia que não tinha tanta variedade, eu acabava pegando roupas que eu já tinha pegado e uma coisa que me incomodou foram as calças, eu uso muito calça social, mas tinha um problema de barra, então não dava, sabe?" U18 "Às vezes eu não gostava do estado que a peça estava então eu não pegava." U20 "Uma coisa que eu acho que vale atenção é se preocupar com um acervo que tenha numeração maior, que seja para todos." U24 "Na Blimo quem escolhe quase todas as peças é a Mari. A Mari é jornalista e pode usar algumas coisas mais flexíveis, que não combinam com meu estilo de vida. Então para arrumar roupa para o trabalho, acaba sendo um esforço." U11

Fonte: Autora, 2019.

A próxima categoria desdobrada foi a falta de informações de maneira geral, também

percebida como uma barreira recorrente. Mais de 56% do total de entrevistadas

apresentaram inseguranças em relação a esse assunto durante as entrevistas. As justificativas

são o fato desse tipo de serviço ser muito recente, ser ainda pouco divulgado e com poucos

concorrentes para que seja possível estabelecer comparações ou expectativas claras em

relação ao que deve ser esperado do serviço um guarda-roupa compartilhado. Essa categoria

engloba a falta de informações sobre o que fazer caso algum produto se danifique e dúvidas

sobre como proceder na manutenção dos itens.

Durante as entrevistas foi possível identificar que há uma relação entre a falta de

informação e o receio de sofrer um prejuízo financeiro e de ter mais trabalho do que o

desejado em relação à manutenção. Esse fator, vai de encontro às motivações financeiras e

em relação à conveniência que foram identificadas no capítulo anterior. No Quadro 26,

encontram-se listados alguns dos trechos identificados na entrevista que exemplificam essa

motivação nos discursos.

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Quadro 26 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Falta de Informações

BARREIRAS EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Falta de Informação

"Para conseguir pegar as peças eu fico dependendo de uma forma muito precária de comunicação que é por WhatsApp, tirando foto e perguntando, mas muitas vezes falta metade da informação. Eu recebo uma foto de uma blusa, mas ela esquece de avisar que é cropped, uma coisa que eu jamais usaria ou às vezes estou falando com ela e peço uma calça, ela não me fala nada da calça e manda 42, mas eu uso 36. Obviamente que não consigo usar. Se fosse um sistema on-line e tivesse todas as peças e todos os tamanhos, que eu conseguisse separar o que quero, sem essa parte humana mesmo, seria muito mais fácil." U11 "Eu estraguei uma peça no mês passado. Fiquei superchateada, que eu não sei o que aconteceu, eu lavei, eu mesma lavei, você acredita? Eu lavei na mão e manchou! Ficou toda manchada, ficou meio desbotada. Não sei se a água estava estranha, não sei o que aconteceu." U10 "Eu não observei e fiquei super preocupada que era eu que tinha danificado, puxou um fio da blusa e eu lembro que eu nem vi o contrato, aquelas coisas né, a gente não lê o contrato todo, nem sabia como era o procedimento, aliás não sei até hoje." U9 "Tem uma peça, por exemplo, de couro sintético, que até eu usei nos meus cinquenta anos, aí, ao devolver, eu falei, como que eu vou fazer com essa peça, como se lava couro?" U9

Fonte: Autora, 2019.

A quarta categoria encontrada como barreira para participação no sistema de guarda-

roupa compartilhado foi a “Falta de propriedade”. Apesar da falta de propriedade ter

aparecido como uma barreira, ela apareceu somente em quatro do total de entrevistas

realizadas. As preocupações ao redor desse tema aparentemente estão associadas à ideia de

que a posse de produtos de vestuário não consegue ser adequadamente substituída na

prestação de serviço. As usuárias e ex-usuárias demonstraram sentir profunda falta dos

produtos aos quais elas em algum momento tiveram acesso, dificuldade em se desvencilhar

da ideia tradicional de consumo atrelada a posse, e inclusive sinalizam efeitos contrários à

diminuição de consumo, que seria o esperado por elas inicialmente, se sentindo estimuladas

a consumir mais pelo de não possuírem as peças que utilizam. No Quadro 27, estão listados

alguns dos trechos identificados na entrevista que exemplificam essa motivação nos discursos.

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Quadro 27 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Falta de propriedade

BARREIRAS EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Falta de

propriedade

"Nossa tem uma peça que eu sinto muita falta, é um kimono na Kimonaria que não existe mais, eu usei no meu aniversário e no aniversário da minha filha, eu daria um rim por ele." U25 "Estou com um shorts molinho que peguei da Blimo, tem uma outra loja que eu gosto muito que é a My Basics, só de roupa básica e tem um shorts similar, eu pensei se queria comprar esse shorts ou não então eu usei o da Blimo bastante no final de semana, gostei e voltei para comprar nessa loja." U11 "Eu voltei a consumir e uma das primeiras compras que fiz foi por causa da Roupateca, inclusive. Teve uma camisa que eu amei e aí quando eu fui devolver eu não queria e as meninas me passaram o e-commerce da marca, em promoção, aí fui lá e comprei não só a camisa como uma calça e outra camisa. Mas ok, mas não foi culpa delas." U2 "E essa possibilidade de ter 10 peças e trabalhar entre elas com o meu guarda-roupa é uma situação nova para mim que eu ainda não consegui adaptar muito bem. Como a gente vem se uma situação de compras e capitalismo totalmente tradicional, as crenças, tem que comprar, propaganda te forçando a consumir" U5

Fonte: Autora, 2019.

O grupo hábitos de consumo previamente identificado na literatura foi desdobrado

em duas categorias a partir das recorrências nos discursos, mas também pela facilidade de

organização dessas ideias para que tomada de decisões práticas a partir dos achados possa

ser mais assertiva. A primeira categoria é a “Dificuldade de uso e acesso aos serviços e

produtos” e a segunda, é a “Falta de conveniência”.

A dificuldade de uso e acesso está relacionada ao fato de as pessoas muitas vezes

perceberem o consumo desses serviços como um sacrifício por não estarem prontamente

disponíveis. É possível identificar essa preocupação de forma recorrente quanto aos horários

de funcionamento dos locais e à distância. Essa categoria inclui também a dificuldade de

acesso em relação à estacionar e acessar o local físico dos guarda-roupas compartilhados.

A dificuldade de uso é a maior barreira identificada, presente em 88% das entrevistas,

sendo que 93% das usuárias atuais trazem essa como a maior dificuldade que elas encontram

hoje na utilização de um guarda-roupa compartilhado e a maior razão para um possível

cancelamento do serviço no futuro. Entre as ex-usuárias, 82% sinalizaram que a dificuldade

de uso foi um dos maiores motivos para o cancelamento do serviço. No Quadro 28, é possível

encontrar trechos completos retirados das entrevistas que ilustram essa motivação.

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Quadro 28 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Dificuldade de uso/acesso

BARREIRAS EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Dificuldade de

acesso/uso

"Como é longe, para mim não dá, mas se estivesse perto da minha casa, eu seria cliente com certeza." U17 "Ficava muito ruim toda semana ter que ir lá, lavar roupa, lavar a peça, pra deixar pronta pro sábado, que era o único dia que a gente podia, eu achei que os horários eram pouco flexíveis, porque, por exemplo, quem trabalha, o ideal é ir depois das seis e meia, sete. E aí elas fechavam às seis. Nunca depois do trabalho a gente conseguia ir, nem antes do trabalho, porque elas abriam às dez." U18 "O motivo pelo qual eu parei é que pra mim é longe, pra ir até lá, provar o que eu quero, testar roupas, fazer trocas mais frequentes ao invés de uma vez por semana, é muito longe, é fora de mão, não tem nada a ver com o trajeto que eu faço todo dia de trabalhar, de ir para casa de minha mãe, totalmente fora de mão." U19 "O ruim é porque em dia de feira e nos outros dias é bem ruim a gente parar, razão pela qual meu marido fica bodiado." U10 "Se fosse ainda um pouquinho maior o espaço pois tem umas peças que ficam lá na prateleira, para ter mais peças a disposição, já que as meninas ficam trocando ali pelo espaço ser apertadinho." U6

Fonte: Autora, 2019.

Já a falta de “Conveniência” é majoritariamente percebida como a dificuldade com a

dinâmica de lavagem das roupas. O processo de lavagem demonstrou ser uma barreira

recorrente em relação à utilização do serviço, não do ponto de vista da higiene, mas do ponto

de vista do tempo gasto, do dinheiro envolvido e principalmente da dificuldade de incluir essa

etapa nova na dinâmica de consumo.

A falta de conveniência foi uma barreira encontrada para 50% das entrevistas

realizadas com as usuárias e para 64% das entrevistas realizadas com as ex-usuárias. Essa

diferença, somada ao conteúdo das entrevistas, é um indício de que as usuárias atuais tem

mais empatia com os processos de lavagem, pois se identificam com um estilo de vida mais

sustentáveis, trazendo em seus discursos frases nas quais é possível perceber que do ponto

de vista delas o processo da lavagem é algo que faz parte da responsabilidade de fazer parte

do sistema e, mais do que isso, que pode ser utilizado para praticar a sustentabilidade em

mais uma etapa da dinâmica de consumo, com lavagens manuais e utilização de produtos

orgânicos e sustentáveis.

Já o grupo de ex-usuárias busca economia de dinheiro e o maior aproveitamento do

sistema de guarda-roupa compartilhado, enxergando o processo de lavagem como um gasto

extra e uma barreira para que o serviço seja utilizado da forma mais rentável possível. No

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Quadro 29, encontram-se listados alguns dos trechos identificados na entrevista que

exemplificam essa motivação nos discursos.

Quadro 29 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Falta de conveniência

BARREIRAS EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Falta de conveniência

"Eu prefiro pagar mais e ter certeza que tem alguém lavando. Sou eu mesma que lavo as peças então dá trabalho e eu uso máquina e não é tudo que você consegue colocar na máquina." U20 "Eu lavo algumas peças na minha casa. Algumas peças são delicadas e demandam. A roupa que é de um guarda-roupa compartilhado é uma roupa que não dá pra você depositar na máquina e lavar com um monte de roupa assim com medo de manchar, de danificar" U9 "A única coisa que eu não gosto é ter que lavar a roupa. Às vezes eu lavei uma roupa e não secou, aí eu falo: não vou conseguir mandar porque não secou” U14 "Uma coisa que não sei se é desvantagem, mas que faz parte, é ter que lavar a peça, às vezes, eu esqueci, eu me programei pra devolver a peça na sexta, mas daí eu não me programei pra lavar, daí eu não quis pagar mais, esse preço já é bem no limite pra mim, pagar, sei lá, R$20,00 por peça, eu não topei, então eu preferi ficar com as mesmas peças no fim de semana, pra lavar e vou hoje lá." U3

Fonte: Autora, 2019.

A última categoria identificada como uma barreira é a insegurança de inserir um custo

recorrente na vida dos entrevistados. Na revisão da literatura essa categoria aparecia de

forma pouco significativa como uma das possíveis faltas de informação em relação às

questões financeiras. Após a análise dos resultados, foi possível identificar que 48% do total

das entrevistadas sinalizaram essa barreira em seus discursos, enquanto 64% das ex-usuárias

trouxeram esse ponto em seus discursos. Como a relevância da barreira financeira se

demonstrou grande e plural foi criada uma categoria para que fosse possível dar a devida

atenção e para que fosse mais simples organizar as contribuições gerenciais.

Nas entrevistas, foi possível identificar que algumas pessoas possuem medo de não

conseguirem arcar com o compromisso dos custos mensais, inseguranças de terem que

desembolsar um valor não planejado, como utilizar o serviço de lavanderia pago em algum

momento ou mesmo receio em relação à falta de confiança no retorno sobre o investimento

mensal que estão realizando. A recorrência dessa categoria entre as entrevistadas,

principalmente entre as ex-usuárias está alinhada com a motivação financeira clara de

participação desse mesmo grupo de participantes que foi analisado no capítulo anterior,

demonstrando que o as questões financeiras são de extrema importância para a perpetuação

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desse modelo de negócio. No Quadro 30, é possível encontrar trechos completos retirados

das entrevistas que ilustram essa motivação.

Quadro 30 - Exemplos das entrevistas em relação à barreira: Financeira

BARREIRAS EXEMPLOS DAS ENTREVISTAS

Financeira

"Pagar a mais para lavarem. Isso gera uma preocupação, uma tenção. Eu sempre lavei em casa porque pagar para alguém lavar já seria uma desvantagem econômica, aí eu já achava que não valia a pena." U16 "Parei no momento em que a minha filha foi morar fora, foi fazer faculdade de medicina em Santos e eu precisei readequar o orçamento e dar uma parada com uma série de coisas inclusive com a Blimo." U16 "Porque financeiramente falando não fez sentido. Vou ser sincera, tá? Eu peguei 5 peças, usei duas, as outras três eu acabei não usando, então eu gastei na época eram R$300,00, e gastar R$ 300,00 por mês, eu não fiz a conta muito bem quando eu fiz a assinatura, aí ficou financeiramente inviável." U21 "Eu tive um problema pessoal e resolvi cancelar pois não tinha certeza se eu ia conseguir pagar a mensalidade, então foi uma questão financeira mesmo." U24 "Então tem desvantagem financeira nesse caso, porque eu tenho que gastar de alguma maneira para ir para lá. Ônibus, estacionamento ou Uber." U4

Fonte: Autora, 2019.

Após a análise dos resultados das 25 entrevistas coletadas foi possível identificar as categorias

de motivações a barreiras das usuárias e ex-usuárias do serviço, já trazendo alguns indícios e relações

possíveis entre essas motivações, barreiras e as características das próprias entrevistadas. No próximo

capítulo os resultados serão discutidos com a teoria, dando clareza à resposta dos objetivos da

pesquisa.

4.1. DISCUSSÃO

Apesar da literatura existente já ter mapeado as motivações e as barreiras ne

participação em consumo colaborativo de forma geral (HAMARI; SJOKLINT; UKKONEN, 2016 e

VAN DE GLIND, 2013) e em relação aos serviços de CFC (BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018), até

onde a autora teve acesso, não existiam, pesquisas sobre as motivações e as barreiras na

participação especificamente em sistemas de guarda-roupa compartilhados.

Os autores Becker-Leifhold e Iran (2018) mapearam as motivações e barreiras de

participação em CFC e, o presente trabalho, após a coleta de dados e análise dos resultados,

identificou que algumas das motivações previstas na literatura também se aplicam ao sistema

de guarda-roupa compartilhado, mas muitas delas provavelmente dizem respeito a outros

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modelos de negócio, pois não foram identificadas nos discursos das participantes. No caso

das barreiras, foi possível identificar todas as categorias previstas pelos autores. Entretanto,

vale ressaltar que nos dois grupos foram incluídas novas categorias, retiradas a partir das

entrevistas em profundidade realizadas com usuárias e ex-usuárias do serviço e

posteriormente cruzadas com a literatura.

Em se tratando das motivações, o modelo original estudado nos capítulos anteriores

previa 11 categorias dentro do grupo motivações hedônicas. Após análise dos resultados e

categorização, foi possível identificar seis categorias dentro desse grupo, sendo que cinco já

haviam sido previstas na literatura de CFC e uma nova foi incluída a partir dos resultados. O

Quadro 31 resume a identificação das motivações hedônicas e a discussão com a teoria

existente.

Quadro 31 - Discussão das motivações hedônicas com a teoria

MOTIVAÇÃO REFERÊNCIA RESULTADO

HEDÔNICAS Arnould e Bardhi (2005)

Disponibilidade de itens raros Guiot e Roux (2010), Yan et al. (2015) Ausente

Variedade de produtos Guiot e Roux (2010), Armstrong et al. (2016) Presente

Artística (Possibilidade de criar diferentes composições) Isla (2013) Ausente

Diversão Isla (2013) Presente

Satisfação Isla (2013) Ausente

Encontrar achados Guiot e Roux (2010) Ausente

Prazer nostálgico Guiot e Roux (2010) Ausente

Necessidade de mudança sem o sentimento de culpa Armstrong et al. (2016), Niinimäki (2010) Presente

Experimentar novos estilos Armstrong et al. (2015) Presente

Necessidade de ser único Yan et al. (2015) Ausente

Interação social Armstrong et al. (2015, 2016), Guiot e Roux (2010), Pedersen e Netter (2015) Presente

Imagem Hamari, Sjoklint e Ukkonen (2016) Incluída

Fonte: Autora, 2019.

A categoria “Variedade de produtos” foi a mais recorrência entre as entrevistas,

resultando ser uma motivação importante para participação não só em sistemas de CFC de

maneira geral (GUIOT; ROUX, 2010; ARMSTRONG et al., 2016), mas também especificamente

em guarda-roupas compartilhados. Enquanto na pesquisa de Guiot e Roux, 2010 a variedade

de produtos aparece como uma motivação, principalmente do ponto da experiência, por meio

da estimulação visual que ocorre pela quantidade de itens disponíveis, nesta pesquisa foi

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possível identificar que a variedade de produtos é uma grande motivação atrelada a um prazer

pessoal de poder utilizar peças diferentes todos os dias e também relacionado a construção

de uma imagem por meio do vestuário evitando, por exemplo, a repetição de roupas.

A segunda motivação presente na literatura e encontrada nos resultados é a busca por

diversão (ISLA, 2013). Nesta pesquisa a diversão aparece como uma maneira de se divertir

com a moda, contraponto com ideia de pressão que a moda pode exercer em algumas pessoas

e como substituição de uma atividade de lazer. A literatura prévia é vaga sobre o conceito e a

definição de diversão e essa categoria esteve presente no discurso de poucas entrevistadas e

em sua grande maioria apenas no discurso das usuárias atuais do serviço. Essa discrepância

pode sinalizar que ter a sensação de diversão ou enxergar a possibilidade de diversão na

utilização do serviço de guarda-roupa compartilhada pode ser decisivo para a manutenção da

assinatura.

A terceira motivação identificada no discurso e suportada pela literatura explorada no

início dessa pesquisa é a necessidade de mudança sem o sentimento de culpa (ARMSTRONG

et al., 2016). A relação de sustentabilidade dos sistemas de CFC também diminui o sentimento

de culpa nas pessoas causado pelo excesso de consumo (BEARD, 2008). As participantes da

pesquisa demonstraram recorrente preocupação em encontrar uma nova forma de consumo,

pela qual elas sejam capazes de satisfazerem suas necessidades de novidade e mudança sem

sentirem o sentimento negativo associado ao consumo tradicional.

Em relação ao guarda-roupa compartilhado, ele está relacionado a conseguir ter

acesso a uma grande variedade de produtos sem precisar consumir e não correr o risco de

deixar os produtos em desuso dentro do guarda-roupa ou ainda a evitar a culpa de comprar

uma peça e jamais utilizá-la, deixando a peça muitas vezes com etiqueta dentro do armário

até ser descartada. Essa motivação foi majoritariamente identificada entre a amostra de

usuárias atuais, com recorrência em quase 90% das entrevistas.

Apesar da literatura já contemplar essa motivação, no caso dos guarda-roupas

compartilhados, possivelmente, esta seja ainda mais forte pelo potencial desse modelo de

negócio de suprir quase toda a necessidade de consumo no setor de vestuário, intensificando

a ausência de compra, diferente de modelos como um brechó ou a troca de produtos onde a

posse permanece e as consequências do consumo podem ser vistas, mesmo que em uma

escala menor. A literatura também sugere que o CFC contribui para a sustentabilidade

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(BECKER-LEIFHOLD; IRAN, 2018). Essa relação, somada às encontrados da pesquisa, trazem

indícios de que o grupo de usuárias do guarda-roupa compartilhado tenha uma relação mais

próxima com sustentabilidade e por isso estejam mais propensas a manter o serviço de

guarda-roupa compartilhado, sinalizando que atualmente esse sistema atende um grupo

seleto, nichado e especifico de usuárias, o que pode ser uma das razões de dificuldade de

escalabilidade do serviço.

Experimentar novos estilos também é uma motivação prevista na literatura e

identificada nas entrevistas especificas sobre o guarda-roupa compartilhado (ARMSTRONG et

al., 2015). Como todos os serviços de CFC permitem a utilização de outros estilos é coerente

que ele se repita nos resultados dessa pesquisa. Porém, é possível identificar indícios de que

a possibilidade de experimentar novos estilos com guarda-roupa compartilhado seja maior do

que em outras possibilidades de CFC já que esse não inclui um custo a mais para que seja

possível provar um novo estilo ou caso a pessoa não tenha gostado do estilo atual do produto

que está utilizando, diferente de serviços que incluam compra, como é o caso do brechó e

também dos serviços de troca, como é o caso dos bazares, já que a devolução ou uma nova

troca não são possibilidades garantidas.

A última motivação hedônica identificada na análise dos resultados e que já estava

prevista na literatura de CFC é a interação social, já identificada por diversos autores

(ARMSTRONG et al., 2015; GUIOT; ROUX, 2010; PEDERSEN; NETTER, 2015). As entrevistadas

foram motivadas a participar desse serviço pela possibilidade de conhecer pessoas novas, de

conversar com os vendedores ou mesmo pela possibilidade de ter contato humano. Essa

motivação apareceu em 71% das entrevistas com usuárias e em apenas 9% das entrevistas

com ex-usuárias. Há um possível indício de que as usuárias que conseguem criar conexões

humanas por meio da utilização do serviço possuem maior probabilidade de permanecerem

com a assinatura, trazendo um direcionamento claro para possíveis contribuições gerenciais

desse projeto, apesar da literatura não ser clara em relação às recomendações de como gerar

esses momentos de sociabilidade.

Uma sexta motivação hedônica foi incluída a partir da análise dos resultados, a

imagem. Imagem apareceu como uma das motivações de participação nesse serviço em quase

metade das entrevistas, tendo maior recorrência entre as usuárias atuais de guarda-roupas

compartilhados. As entrevistadas associaram a participação em serviços de guarda-roupa

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compartilhado ao aumento de elogios que recebem a partir do momento que variam mais de

estilo e passam a utilizar peças diferentes e à percepção positiva que geram em outras pessoas

quando compartilham que são usuárias de um serviço como esse. Apesar da imagem não ser

uma das motivações mapeadas em CFC por meio da revisão teórica realizada por Becker-

Leifhold e Iran (2018), é uma categoria prevista na literatura geral de CC como uma motivação

importante (HAMARI; SJOKLINT; UKKONEN, 2016) e aplicável ao guarda-roupa compartilhado.

Em relação ao segundo grupo de motivações, as motivações utilitárias, o modelo

original estudado nos capítulos anteriores previa cinco categorias. Após análise dos resultados

e categorização, foi possível identificar também cinco categorias de motivações utilitárias na

participação no serviço de guarda-roupa compartilhado, sendo 2 já previstas na literatura de

CFC e três incluídas a partir dos resultados. O Quadro 32 identifica as motivações utilitárias

encontradas, que serão discutidas em seguida.

Quadro 32 - Discussão das motivações utilitárias com a teoria

MOTIVAÇÃO REFERÊNCIA RESULTADO

UTILITÁRIAS Arnould e Bardhi (2005)

Compra inteligente Arnould e Bardhi (2005) Ausente

Preço justo (Preço como uma gratificação) Guiot e Roux (2010) Ausente

Frugalidade Arnould e Bardhi (2005) Presente

Barganha Guiot e Roux (2010) Ausente

Evitar investir em algo errado Guiot e Roux (2010) Presente

Financeiro Belk, 2010 Incluída

Conveniência Botsman e Rogers (2011), Bardhi e Eckhardt, 2012 Incluída

Curadoria Botsman e Rogers (2011), Bardhi e Eckhardt, 2012 Incluída

Fonte: Autora, 2019.

A primeira motivação utilitária identificada foi a frugalidade, já previamente discutida

por Becker-Leifhold e Iran (2018). A frugalidade é busca por poupar, ser prudente ou

econômico no uso dos recursos de consumo, nesse caso de itens de vestuário. As usuárias

atuais do serviço foi o grupo com maior recorrência dessa motivação nos discursos, com 43%

das entrevistadas sinalizando que gostam de participar de um guarda-roupa compartilhado

por enxergarem essa escolha como prudente e responsável em relação ao valor que dão ao

seu dinheiro e aos investimentos que realizam. Essa motivação está próxima a motivação

financeira geral, mas aparentemente reflete o comportamento de um grupo de pessoas que

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não concorda com os preços praticados no setor de vestuário tradicional, sinalizando que esse

grupo de usuária possa ter características especificas em relação ao seu estilo de vida menos

consumista e serem mais adeptas de práticas de consumo consciente ou responsáveis.

Evitar investimentos errados também foi uma das motivações de participação no

guarda-roupa compartilhado identificada a partir da análise das entrevistas e que já havia sido

previamente mapeada na literatura de CFC pelos autores Becker-Leifhold e Iran (2018) e Guiot

e Roux (2010). Entre o total de entrevistadas, foi possível identificar essa motivação em 60%

dos discursos e, quando se considera apenas as ex-usuárias, esse número cresce para 73%. A

tentativa de evitar investimentos errados é uma motivação importante para a participação

nesse serviço e, principalmente, para a permanência. A diferença de recorrência entre os dois

grupos deixa isso mais evidente e é coerente com os dados achados em relação as motivações

financeiras.

Motivações financeiras diversas também foram identificadas a partir dos discursos das

usuárias e ex-usuárias do serviço e incluídas no modelo original. A motivação financeira esteve

presente em 68% das entrevistas totais e 82% das entrevistas com ex-usuárias contra 57% das

entrevistas com usuárias atuais. Essa diferença é um indício de que a motivação financeira

pode não ser tão clara para a adesão ao serviço, mas ela é a principal motivação que uma ex-

usuária para voltar assinar o serviço, sendo então uma das motivações para tomar a decisão

de participar, mas ainda mais fundamental para a permanência no serviço. Isso porque o CFC

é considerado não só ecologicamente bom, mas economicamente também (BELK, 2010;

LAMBERTON; ROSE, 2012). Essa motivação é suportada pela literatura de CC em geral, na qual

é possível identificar que participar do compartilhamento pode ser um comportamento de

maximização de utilidade, em que o consumidor substitui a propriedade exclusiva de bens

com opções de menor custo dentro de um serviço de CFC. Sacks (2011) concorda que os

usuários tendem a se engajar em sistemas de consumo colaborativo por estes permitirem o

acesso aos produtos com custos mais baixos.

De acordo com Hamari, Sjoklint e Ukkonen (2016), os benefícios econômicos são a

principal força de influência na intenção de participar de CC. Bardhi e Eckhardt (2015) afirmam

que, quando as iniciativas são mediadas por empresas – como é o caso do guarda-roupa

compartilhado – os consumidores tendem a ver a dinâmica como econômica e não social,

fortalecendo a importância da motivação financeira. No caso específico do guarda-roupa

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compartilhado, as pessoas que se motivam financeiramente, buscam principalmente reduzir

seus gastos mensais com o consumo de roupas quando comparado com os gastos médios que

possuem comprando itens dessa categoria.

A quarta motivação utilitária mapeada a partir da análise das entrevistas e incluída no

modelo original é a conveniência. Apesar da conveniência não ser uma das motivações

mapeadas em CFC por meio da revisão teórica realizada por Becker-Leifhold e Iran (2018), é

uma categoria prevista na literatura geral de CC como uma motivação na adesão de serviços

colaborativos (VAN DE GLIND, 2013). De acordo com Botsman e Rogers (2011), nos sistemas

de consumo colaborativo, o acesso deve ser tão eficiente e conveniente quanto a propriedade

para que eles possam competir com a economia da posse. Bardhi e Eckhardt (2012) afirmam

que a economia colaborativa está sendo uma alternativa ao consumo tradicional por permitir,

por exemplo, que uma pessoa possa emprestar ou alugar um item que utilizaria somente uma

vez ao invés de comprá-lo, o que é uma solução racional e conveniente (BOCKMANN, 2013).

Além das abordagens já existentes, foi possível identificar que, no caso do guarda-

roupa compartilhado, a conveniência também está relacionada, principalmente, à facilidade

de acesso ao serviço, como localização, horários estendidos de atendimento e a possibilidade

de aderir e utilizar o serviço online e aos serviços secundários disponíveis, como

disponibilidade de estacionamento e lavanderia incluída.

Por último, foi possível também identificar, a partir da análise das entrevistas, a

curadoria como uma motivação importante de participação, mesmo que não tenha sido

possível encontrá-la previamente mapeada na literatura de CFC ou de CC, o que,

possivelmente, pode sinalizar tratar-se de uma motivação aplicável especificamente a esse

modelo de negócio e, por esse motivo, foi adicionada ao modelo inicial estudado. Apesar de

estar próxima da conveniência, a curadoria foi citada por 36% das usuárias atuais do serviço e

está relacionada com a praticidade de terceirizar o processo de escolha e a facilidade de ser

mais assertivo na aquisição de um produto, gastando menos tempo visitando diversas lojas e

provando roupas. As usuárias demonstraram terem ficado satisfeitas com a ideia de que

alguém já tenha feito esse processo de escolha previamente por elas.

Por último, em relação às motivações ambientais, o modelo original estudado nos

capítulos anteriores previa três categorias. Após análise dos resultados e categorização, foi

possível identificar duas dessas categorias de motivações utilitárias na participação no serviço

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de guarda-roupa compartilhado, tendo sido as duas previstas na literatura de CFC. O Quadro

33 identifica as motivações ambientais encontradas, as quais serão discutidas em seguida.

Quadro 33 - Discussão das motivações ambientais com a teoria

MOTIVAÇÃO REFERÊNCIA RESULTADO

AMBIENTAIS Becker-Leifhold e Iran (2018)

Consumo favorável ao meio ambiente Hiller Connell (2011), Yan et al. (2015) Presente

Evitar o descarte desnecessário Hiller Connell (2011), Yan et al. (2015) Ausente

Distanciamento do sistema Guiot ae Roux (2010) Presente

Fonte: Autora, 2019.

A primeira categoria ambiental identificada nas entrevistas, foi a busca por um

consumo favorável ao meio ambiente, presente em 79% dos discursos das usuárias atuais do

serviço e apenas em 36% dos discursos das ex-usuárias. Esses dados estão em sinergia com a

literatura existente, o que sinaliza que as pessoas optam por participarem de sistemas de CFC

pelos benefícios éticos e ambientais de reutilizarem peças (GUIOT; ROUX, 2010; WAIGHT,

2013; XU et al., 2014).

De forma geral, as entrevistadas declararam que compactuam com um estilo de vida

mais sustentável e que enxergam os benefícios em relação ao meio ambiente por estarem

circulando e reutilizando as peças, gerando menos consumo, menos produção de novos itens

e colaborando para o planeta. A grande diferença nos discursos dos dois grupos de

entrevistadas parece sinalizar que o perfil das usuárias atuais é diferente, com pessoas mais

engajadas social e ambientalmente e com um estilo de vida mais sustentável, ainda não tão

propagado e representativo em toda a sociedade.

A mesma diferença foi vista na segunda categoria identificada dentro desse grupo de

motivações, a busca por se distanciar do sistema e evitar modelos tradicionais de venda

(GUIOT; ROUX, 2010). A recorrência dessa motivação nas entrevistas realizadas com as

usuárias foi proporcionalmente três vezes maior do que com as ex-usuárias, confirmando o

indício de que o grupo de usuárias possui um perfil característico, vinculado a hábitos mais

sustentáveis e conscientes.

No caso específico do guarda-roupa compartilhado, as entrevistadas demonstraram

não querer estar associadas a marcas que utilizam trabalho escravo, nem a alimentar a

indústria de moda tradicional. Além disso, foi possível identificar que muitas pessoas

enxergam nesse modelo de negócio uma ferramenta para uma mudança de vida visando

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torna-se uma pessoa melhor e mais consciente, assim como ser uma forma de se distanciar

da população em geral por meio da adesão a um sistema inovador.

No Quadro 34, é possível identificar os três grupos de motivações apresentados

durantes as entrevistas para a participação em sistemas de guarda-roupas compartilhados,

totalizando 13 motivações. Dentro de cada grupo é apresentado as categorias motivacionais,

tanto as previamente mapeadas pela literatura quanto as categoriais incluídas, e os autores

que tratam de cada uma delas.

Quadro 34 - Motivações de participação em sistemas de guarda-roupa compartilhados

MOTIVAÇÃO REFERÊNCIA

HEDÔNICAS Arnould e Bardhi (2005)

Variedade de produtos Guiot e Roux (2010), Armstrong et al. (2016)

Diversão Isla (2013)

Necessidade de mudança sem o sentimento de culpa Armstrong et al. (2016), Niinimäki (2010)

Experimentar novos estilos Armstrong et al. (2015)

Interação social Armstrong et al. (2015, 2016), Guiot e Roux (2010),

Pedersen e Netter (2015)

Imagem Hamari, Sjoklint e Ukkonen (2016)

UTILITÁRIOS Arnould e Bardhi (2005)

Frugalidade Arnould e Bardhi (2005)

Evitar investir em algo errado Guiot e Roux (2010)

Financeiro Belk (2010)

Conveniência Botsman e Rogers (2011), Bardhi e Eckhardt (2012)

Curadoria Botsman e Rogers (2011), Bardhi e Eckhardt (2012)

AMBIENTAIS Becker-Leifhold e Iran (2018)

Consumo favorável ao meio ambiente Hiller Connell (2011), Yan et al. (2015)

Distanciamento do sistema Guiot ae Roux (2010)

Fonte: Autora, 2019.

Em se tratando das barreiras de participação em guarda-roupas compartilhados, o

modelo original estudado nos capítulos anteriores previa quatro categorias. Após análise dos

resultados e categorização, foi possível identificar sete categorias dentro desse grupo, sendo

que duas já haviam sido previstas na literatura de CFC e as demais foram incluídas ao

adaptadas a partir dos resultados. O Quadro 35 resume a identificação das barreiras e a

discussão com a teoria existente.

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Quadro 35 - Barreiras de participação em sistemas de guarda-roupa compartilhados

BARREIRA REFERÊNCIA RESULTADOS

Preocupações com higiene ou saúde

Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Fisher et al. (2008), Hirschl et al. (2003) Presente

Falta de confiança no acervo Armstrong et al. (2015, 2016) Presente/ Adaptada

Falta de informação Armstrong et al. (2015, 2016) Presente/ Adaptada

Falta da propriedade Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Tukker e Tischner (2006) Presente

Dificuldade de acesso/uso Catulli (2012), Hirschl et al. (2003), Tukker e Tischner (2006) Presente/ Adaptada

Falta de conveniência Catulli (2012), Tukker e Tischner (2006) Presente/ Adaptada

Financeiro Hamari, Sjoklint e Ukkonen (2016); Bardhi e Eckhardt (2015) Incluída

Fonte: Autora, 2019.

A preocupação com a higiene ou com a saúde é a primeira barreira encontrada e já

presente na literatura de CFC explorada nos capítulos anteriores. Apesar da literatura prever

que as preocupações dos consumidores com relação à higiene são particularmente evidentes

no caso dos produtos que são utilizados próximos à pele (ARMSTRONG et al., 2015; CATULLI,

2012), no que diz respeito a ácaros, germes e à limpeza geral, transmissão de doenças,

possibilidades de alergias, odor e sujeira, essa foi uma motivação pouco recorrente durante

as entrevistas. No caso do guarda-roupa compartilhado é possível identificar que existe um

senso de comunidade e de igualdade muito grande, criando uma empatia e confiança entre

as usuárias. Além disso, as entrevistadas identificam a empresa como um intermediador

responsável pela garantia da higiene e confiam na empresa, principalmente nas pessoas físicas

por trás desses negócios.

A higiene é uma barreira para participação em guarda-roupas compartilhados, mas

não é muito representativa e aparentemente poderia ser superada caso o processo da

lavagem fosse absorvida pela empresa, já que a maioria das entrevistadas que citaram essa

barreira enxergaram essa preocupação em um outro usuário realizando a lavagem dos

produtos e não à uma desconfiança em relação à empresa.

A segunda barreira mapeada foi parcialmente encontrada na literatura, mas foi

separada e aprofundada em uma nova categoria pela representatividade e importância que

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ela apareceu nos resultados desse estudo. A falta de confiança no acervo foi a segunda

barreira com maior recorrência nas entrevistas, com 84% do total das entrevistadas citando-

a. A literatura já previa que caso dos eventos de troca de roupas, questões de confiança estão

relacionadas ao tamanho, variabilidade, qualidade e à capacidade de encontrar algo

adequado para ser trocado (ARMSTRONG et al., 2015; REXFELT; HIORT AF ORNÄS, 2009). É

possível identificar que a mesma relação acontece no caso do guarda-roupa compartilhado,

destacando a preocupação em relação ao tamanho, à adequação em relação à barras e ajustes

necessários e incluindo ainda uma preocupação em encontrar um produto especifico

disponível, já que no caso desse modelo de negócio o usuário passa a conhecer as peças,

aumentando a expectativa.

A falta de informação também é uma barreira encontrada na análise dos resultados e

previamente mapeada na literatura de maneira parcial. As entrevistadas se preocupam com

a falta de esclarecimentos sobre garantias oferecidas pelos guarda-roupas compartilhados em

relação às peças e sobre consequências e procedimentos em caso de danos (ARMSTRONG et

al., 2015) e também sobre procedimentos de lavagem, já que nesse serviço a usuária é

responsável pela lavagem do produto. Somando aos achados já presentes na literatura foi

possível identificar também uma preocupação em relação às formas precárias de

comunicação pelo WhatsApp, com problemas como recebimento de informações pela

metade, gerando insegurança, a falta de informação nas redes sociais da marca, como peças

novas e horários de funcionamento.

A falta de propriedade foi uma barreira identificada a partir da análise das entrevistas

que já estava previamente mapeada na literatura (TUKKER; TISCHNER, 2006; CATULLI, 2012).

A remoção da propriedade pessoal se confirmou ser um impedimento notável à participação

no sistema especifico de guarda-roupa compartilhado, confirmando que para algumas

pessoas a propriedade ainda pode não ser adequadamente substituída por um serviço

(ARMSTRONG et al., 2015, 2016). Apesar da barreira estar presente, ela foi identificada em

apenas 16% das entrevistas, sinalizando que, junto com a higiene, são barreiras que parecem

fazer muito sentido para outros serviços de CFC, mas não tanto especificamente para o serviço

de guarda-roupa compartilhado. A disponibilidade integral do acervo a todas as usuárias e a

realização de bazares nas trocas de coleções parece ser o suficiente para que as entrevistadas

fiquem confortáveis em relação à disponibilidade das peças, mesmo que não de maneira

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imediata, e enxerguem o guarda-roupa compartilhado como uma extensão dos seus próprios

guarda-roupas, diminuindo a percepção de falta de posse.

A dificuldade de uso e acesso, quinta barreira identificada nas entrevistas, foi

parcialmente encontrada na literatura dentro da categoria hábitos de consumo. As

entrevistadas sinalizam que se os produtos do guarda-roupa compartilhado não estão

prontamente acessíveis, isso é visto como um sacrifício, uma perda e de tempo e um mau uso

do investimento, como já previsto na literatura (ARMSTRONG et al., 2015; CATULLI, 2012;

TUKKER; TISCHNER, 2006). No caso do guarda-roupa compartilhado, a maior preocupação

parece estar relacionada com a dificuldade em acessar o local por uma questão de distância,

localização, falta de estacionamento ou de serviços de entrega adequado, dificuldade por

causa dos horários de funcionamento e um espaço muito pequeno para a exposição de todos

os produtos, sendo difícil acessar a variedade de peças. Essa barreira apareceu em 88% dos

discursos, e foi a maior recorrência entre as entrevistadas, sinalizando o maior ponto de

preocupação e foco para que esse modelo de negócio ganhe escala.

A sexta barreira identificada, a falta de conveniência, também foi parcialmente

encontrada na literatura dentro da categoria hábitos de consumo, já que um novo método de

aquisição e posse de vestuário exige novas dinâmicas e processos do ponto de vista do cliente

e é particularmente difícil de aceitar (MYLAN, 2015). No caso do guarda-roupa compartilhado

a maior barreira parece estar atrelada a inclusão da lavagem como uma etapa do processo de

utilização do serviço, já que ela exige tempo, conhecimento técnico e dificulta a velocidade da

troca das peças. Além disso, uma das motivações em participar do guarda-roupa é usar estilos

novos e peças que talvez as pessoas não comprariam, isso inclui itens diferentes, bordados,

com paetês, de festa e feitos a mão, o que geram maior inconveniência ainda no processo de

lavagem. A falta de serviços de ajustes e a falta de estacionamento também são vistos como

inconvenientes e consequentemente barreiras para a participação em um guarda-roupa

compartilhado.

Por último, foi incluída a barreira financeira, presente em 48% do total das entrevistas.

Apesar da barreira financeira não estar presente de maneira clara na literatura de CFC ela

aparece na literatura prévia de CC em geral (BELK, 2010; LAMBERTON; HAMARI, SJOKLINT ;

UKKONEN, 2016). No caso do guarda-roupa compartilhado, as entrevistas buscam identificar

uma relação financeira positiva quando comparam o que normalmente gastariam

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consumindo peças de vestuário mensalmente com o valor da mensalidade do serviço. Apesar

de algumas entrevistadas considerarem que esse cálculo não deve ser feito diretamente, pois

o serviço possui outras vantagens, muitas estão buscando nesse serviço uma maneira mais

econômica de consumo, diminuindo os gastos com vestuário. Essa barreira esteve presente

majoritariamente no discurso das ex-usuárias, confirmando que, para evitar a perda de

usuárias os guarda-roupas compartilhados terão que encontrar formas mais eficazes de deixar

claro a relação do benefício econômico. Além disso, foram pontuadas pelas usuárias questões

financeiras relacionadas a custos extras, como transporte para chegar ao local,

estacionamento e lavagem.

No Quadro 36, é possível identificar um resumo das motivações e barreiras de

participação em serviços de guarda-roupa compartilhados, respondendo ao problema inicial

dessa pesquisa e aos objetivos específicos. Esse capítulo analisou os resultados e relacionou

os achados das entrevistas com a literatura existente, sinalizando as especificidades das

barreiras e motivações do guarda-roupa compartilhado e não do CFC como um todo e as

possíveis contribuições para a literatura. O próximo capítulo conclui os achados da pesquisa e

traz contribuições gerenciais sugeridas a partir da análise dos resultados.

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Quadro 36 - Resumo das motivações e barreiras de participação em sistemas de guarda-roupas compartilhados

MOTIVAÇÃO REFERÊNCIA RESULTADOS

HEDÔNICAS Arnould e Bardhi (2005)

Variedade de produtos Guiot e Roux (2010), Armstrong et al. (2016) Presente

Diversão Isla (2013) Presente

Necessidade de mudança sem o sentimento de culpa

Armstrong et al. (2016), Niinimäki (2010) Presente

Experimentar novos estilos Armstrong et al. (2015) Presente

Interação social Armstrong et al. (2015, 2016), Guiot e Roux (2010), Pedersen e Netter (2015) Presente

Imagem Hamari, Sjoklint e Ukkonen, (2016) Incluída

UTILITÁRIOS Arnould e Bardhi (2005)

Frugalidade Arnould e Bardhi (2005) Presente

Evitar investir em algo errado Guiot e Roux (2010) Presente

Financeiro Belk, 2010 Incluída

Conveniência Botsman e Rogers (2011), Bardhi e Eckhardt, 2012 Incluída

Curadoria Botsman e Rogers (2011), Bardhi e Eckhardt, 2012 Incluída

AMBIENTAIS Becker-Leifhold e Iran (2018)

Consumo favorável ao meio ambiente Hiller Connell (2011), Yan et al. (2015) Presente

Distanciamento do sistema Guiot e Roux (2010) Presente

BARREIRA REFERÊNCIA RESULTADOS

Preocupações com higiene ou saúde Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Fisher et al. (2008), Hirschl et al. (2003) Presente

Falta de confiança no acervo Armstrong et al. (2015, 2016)

Presente/ Adaptada

Falta de informação Armstrong et al. (2015, 2016)

Presente/ Adaptada

Falta da propriedade Armstrong et al. (2015, 2016), Catulli (2012), Tukker e Tischner (2006) Presente

Dificuldade de acesso/uso Catulli (2012), Hirschl et al. (2003), Tukker e Tischner (2006)

Presente/ Adaptada

Falta de conveniência Catulli (2012), Tukker e Tischner (2006)

Presente/ Adaptada

Financeiro Hamari, Sjoklint, Ukkonen (2016); Bardhi e Eckhardt (2015) Incluída

Fonte: Autora, 2019.

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5. CONCLUSÃO

Esta pesquisa teve como objetivo identificar as motivações e barreiras de participação

em sistemas de consumo colaborativo de guarda-roupa compartilhado com o intuito principal

de dar suporte ao crescimento de iniciativas colaborativas no setor da moda e principalmente

possibilitar o fortalecimento e escalabilidade desse novo modelo de negócio. Após estudo da

literatura de consumo colaborativo de moda existente e de uma pesquisa qualitativa

exploratória com utilização de entrevista em profundidade com 25 pessoas, sendo 14 usuárias

e 11 ex-usuárias desse serviço, foi possível identificar as motivações e barreiras de

participação em guarda-roupas compartilhados, cumprindo os objetivos iniciais desse estudo.

Os achados foram discutidos detalhadamente no capítulo anterior e podem ser encontrados

resumidamente no Quadro 37.

Quadro 37 - Motivações e barreiras de participação em sistemas de consumo colaborativo de guarda-roupa compartilhado

MOTIVAÇÕES

HEDÔNICAS

Variedade de produtos

Diversão

Necessidade de mudança sem o sentimento de culpa

Experimentar novos estilos

Interação social

Imagem

UTILITÁRIAS

Frugalidade

Evitar investir em algo errado

Financeiro

Conveniência

Curadoria

AMBIENTAIS

Consumo favorável ao meio ambiente

Distanciamento do sistema

BARREIRAS

Preocupações com higiene ou saúde

Falta de confiança no acervo

Falta de informação

Falta da propriedade

Dificuldade de acesso/uso

Falta de conveniência

Financeira

Fonte: Autora, 2019.

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A utilização de dois grupos distintos na amostra possibilitou identificar que as

motivações e as barreiras são as mesmas para os dois grupos, mas a recorrência e a

abordagem de cada categoria diferem de maneira significativa entre eles. O grupo de usuárias

participa do guarda-roupa compartilhado por dois motivos principais, identificados pela maior

recorrência nas entrevistas: acessar novidades sem o sentimento de culpa do consumo

tradicional e buscar uma forma de consumo favorável ao meio ambiente.

O fato desse grupo utilizar o guarda-roupa compartilhado como forma de evitar um

sentimento de culpa demonstra uma grande afinidade com questões relacionadas a

sustentabilidade e consciência em relação aos malefícios do sistema tradicional de consumo,

o que está coerente com a segunda maior motivação desse grupo, a busca por uma forma de

consumo favorável ao meio ambiente. Essas duas motivações estão em sinergia com os

resultados encontrados nas entrevistas, nos quais todas as usuárias do serviço demonstraram

profundo conhecimento, muitas vezes utilizando até linguagem técnica, em relação aos

conceitos de sustentabilidade e de compartilhamento e a grande maioria não se considera

consumista.

Em compensação, quando analisamos o grupo de ex-usuárias, as duas maiores

motivações, a partir da recorrência das entrevistas, são as questões financeiras e a variedade

de produtos. Durante as entrevistas e análise dos resultados foi possível identificar que esse

grupo busca no serviço de guarda-roupa compartilhado uma forma mais barata e acessível de

utilizar uma grande e variada quantidade de peças. Esse grupo está majoritariamente

preocupado com o cálculo de custo benefício do investimento pensado puramente na

comparação dos seus gastos tradicionais ou do seu poder aquisitivo com os gastos com a

assinatura do guarda-roupa compartilhado. Por essa razão a prioridade para esse grupo é a

maior variedade de produtos possíveis disponíveis, pelo menor preço.

Motivações tão distintas de participação em um mesmo serviço, com um grupo

permanecendo no serviço e o outro cancelando a assinatura nos mostra que são perfis de

pessoas distintos. Apesar deste trabalho não se propor a identificar especificamente grupos

de consumidores do serviço de guarda-roupas compartilhado, é possível perceber que se trata

de dois grupos com dois estilos de vida e prioridades diferentes. Como contribuição gerencial

é importante a reflexão sobre o objetivo de longo prazo das empresas provedoras desse

serviço.

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Atualmente, o modelo de guarda-roupa compartilhado atende satisfatoriamente no

Brasil um nicho de mulheres especifico engajadas com o conceito de sustentabilidade, que

possuem uma preocupação com o coletivo, interesse por atividades compartilhadas e que

busca formas alternativas de consumo como com o objetivo de satisfação pessoal, conexão,

sociabilização e diversão.

Enquanto isso, o modelo não atende de maneira satisfatória pessoas que buscam

benefícios financeiros, variedade de produto, acesso a bens que não poderiam possuir

normalmente, e que buscam economia de dinheiro. Esse grupo de ex-usuárias, esteve

disposto a utilizar o serviço de guarda-roupas compartilhado, mas cancelaram

majoritariamente por não enxergarem vantagem financeira na participação. Esse perfil não

busca uma forma alternativa de consumo como recurso para favorecer o meio ambiente e sim

como recurso para otimizar seus próprios investimentos gastando o menor valor possível e

recebendo o maior benefício possível em possibilidades de acesso a itens de vestuário.

A questão a ser pensada é que atualmente o modelo de guarda-roupa compartilhado

está servindo a um nicho muito especifico e pequeno da população. De acordo com uma

pesquisa recente do O Globo, 61% da população brasileira não sabe o que é um produto

sustentável, além disso, a literatura de consumo colaborativo é unanime em afirmar que os

serviços de consumo colaborativo são escaláveis e viáveis a partir do momento que a

motivação financeira é a primeira a ser garantida.

Dessa maneira as empresas terão que optar entre permanecerem prestando um

serviço de nicho e focarem os seus esforços para questões relacionadas com sustentabilidade,

novas formas de consumo, apoio a marcas menores, que desenvolvem um trabalho mais

autoral e consciente ou, caso queiram crescer, expandir e serem escaláveis terão que adaptar

seus modelos de negócio de forma a garantir que a relação custo benefício seja percebida

como positiva pelos usuários, garantindo a satisfação da motivação financeira em primeiro

lugar.

De forma prática, a motivação financeira pode ser suprida com serviços de valores

mais baixos, como planos mais simples, ou com o aumento da percepção do benefício, como

um acervo maior, mais variado, presença de produtos mais caros e inacessíveis ao público

geral, inclusão de serviços como lavanderia e estacionamento, que retirem custos extras dos

clientes.

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Já em relação as barreiras, nos dois grupos as maiores recorrências foram relacionadas

a falta de confiança no acervo e a dificuldade de uso e de acesso, mesmo que por razões

distintas. Isso sinaliza que apesar das motivações desenharem dois grupos claros de usuários

distintos existem, as barreiras são inerentes a questões culturais e hábitos de consumo de

todas as pessoas, baseadas em referências do sistema tradicional de consumo e recorrentes

em praticamente todas as demais formas de consumo de moda existentes e principalmente a

todas as formas de CFC, não sendo exclusivas do sistema de guarda-roupa compartilhado.

Como contribuição gerencial, pensando na maior adesão ao serviço e na capacidade

de ganhar massa crítica, em relação a barreira de higiene, é necessária uma maior fiscalização

da qualidade e limpeza dos itens, com a construção de um processo claro e padronizado de

recebimento e checagem dos produtos que são devolvidos. Em um cenário ideal todo o

processo de higienização deveria ser responsabilidade da empresa, resolvendo não só a

barreira de higiene, mas principalmente a falta de conveniência que a dinâmica de limpeza

gera aos usuários. Como forma de minimizar a barreira em relação a falta de confiança no

acervo, sugere-se que a numeração de peças seja ampliada junto com a variedade de estilos

ou que as características do acervo sejam claramente comunicadas na contratação e

disponibilizadas nas plataformas de contato entre a empresa e os usuários.

Além disso, sugere-se que o acervo seja atualizado em uma página online onde seria

possível identificar em tempo real o que está ou não disponível, ou pelo menos que seja

fornecida uma forma de visualização completa do acervo separado por categorias de produto,

seja em uma plataforma online ou por meio das redes sociais. Uma última sugestão em relação

a essa barreira é a renovação periódica do acervo, com datas planejadas e compartilhadas

com as usuárias previamente.

Em relação a falta de informação, sugere-se que todas as peças tenham fotos em

diversos ângulos, assim como informações claras em relação ao tecido, numeração, medidas

em geral e forma correta e segura de lavagem, além de clareza desde o início sobre os

possíveis prejuízos para o cliente em caso de danificação de alguma peça.

Já a falta de propriedade é inerente ao modelo de negócio, mas pode ser minimizada

com a possibilidade de checagem remota ao acervo através da plataforma online, tentando

fortalecer a imagem de que o guarda-roupa estará disponível sempre para a usuária, aumento

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o sentimento de que aquele guarda-roupa é uma extensão do guarda-roupa pessoal da

usuária.

A dificuldade de uso e de acesso, a barreira com maior recorrência entre os discursos

parece ser um dos maiores desafios práticos desse modelo de negócio. Para as empresas que

optarem trabalhar por meio de um espaço físico sugere-se a flexibilização de horários que

sejam compatíveis com o estilo de vida e profissões das usuárias, com extensão

principalmente dos períodos noturnos e do funcionamento durante o final de semana. Além

disso, é recomendado que sejam flexibilizadas ou incluídas formas de entrega a domicílio que

ajudem o processo logístico nas grandes cidades.

Como cenário ideal, apesar das limitações ainda existentes no setor de moda, parece

interessante que os guarda-roupas compartilhados tenham outras opções de acesso, por meio

de plataformas online e redes sociais nos quais seja possível efetuar escolhas, checar estoques

e realizar trocas e pagamento com mais flexibilidade e conveniência, junto com isso, sugere-

se que sejam implementados estacionamentos ou convênios para facilitar o deslocamento e

acesso das clientes e reforça-se a necessidade de repensar a dinâmica de lavagem e

manutenção das peças, diminuindo a percepção de inconveniência de algumas etapas do

serviço.

Por último, em relação às barreiras financeiras, acredita-se que a solução de

inconvenientes relacionados a lavagem e ao acesso junto com a melhoria do acervo já teria

impactos significativos na percepção de preço. Além disso, sugere-se que o acervo sempre

contenha uma grande quantidade de produtos e peças que seriam consideradas inacessíveis

para seu público, construindo uma relação aspiracional de consumo e reforçando as

vantagens econômicas. Um outro caminho possível seria a criação de planos mais baratos,

com limitações de acesso e a flexibilização no número de peças em cada plano.

Espera-se que, com esse estudo, as empresas que atuam no sistema de consumo

colaborativo e mais especificamente com o modelo de guarda-roupa compartilhado consigam

ser mais assertivas em suas estratégias de marketing, comunicação, produto e comercial, por

meio de um entendimento claro das usuárias do serviço e das suas motivações de participação

e das barreiras que atualmente impedem as pessoas de renovarem o serviço e levam ao

cancelamento da assinatura. Entender as barreiras e motivações da participação nesse

serviço, da perspectiva do consumidor (CP), pode facilitar e acelerar o desenvolvimento

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desses modelos de negócios, fornecendo conhecimentos importantes para a difusão dos CFCs

e, principalmente, do guarda-roupa compartilhado.

Academicamente os resultados desse estudo contribuem para a literatura emergente

de consumo colaborativo, para a literatura de sistemas de serviços de produtos (PSS) e para a

literatura de varejo de moda, fornecendo conhecimentos práticos para a indústria e

profissionais do marketing e acadêmicos que busquem modelos alternativos e mais

sustentáveis de consumo de moda e abrindo caminhos para nossas pesquisas.

Este estudo também é inovador por analisar as motivações e barreiras de participação

em sistemas de serviços de produto do setor de moda no Brasil, além de ser um dos poucos

estudos que analisa os usuários e os ex-usuários do consumo colaborativo. Além disso, até

onde a autora tem conhecimento, esse é o primeiro estudo que busca entender as motivações

e barreiras de participação no sistema de consumo colaborativo específico de guarda-roupa

compartilhado.

Como sugestão de pesquisas futuras, seria interessante testar as motivações e

barreiras encontradas neste estudo por meio de uma pesquisa quantitativa para que os

resultados possam ser generalizados e aplicados a outros grupos. Além disso, sugere-se o

entendimento das possíveis motivações e barreiras de participação das pessoas que nunca

usaram o serviço de guarda-roupa compartilhado, ou que não estão familiarizadas nem

mesmo com serviços de consumo colaborativo em geral, já que com essa informação seria

possível otimizar os esforços em comunicação e marketing para gerar mais atratividade e

repercussão para o modelo de negócio do guarda-roupa compartilhado, garantindo maior

aderência e perpetuação do modelo de negócio.

5.1. LIMITAÇÕES

Este estudo, apesar de considerar a existência de diversos sistemas de consumo

colaborativo, está limitado ao entendimento das motivações e barreiras de participação

exclusivamente de um deles, os sistemas de serviços de produto (SSP). Dentro dessa

classificação, o estudo se propõe a estudar de forma específica o modelo de negócio de

guarda-roupa compartilhado dentro do setor de moda.

A segunda limitação envolve os fatores motivacionais e as barreiras. Para esta

investigação, foram utilizados os mapeamentos prévios que se mostraram mais relevantes,

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adequados e recentes para essa pesquisa. Há outras motivações e barreiras relacionadas ao

consumo colaborativo que podem ser pesquisadas, gerando novos modelos.

Por último, é importante ressaltar as características da amostra da pesquisa. A

pesquisa foi limitada a 25 participantes, tendo sido entrevistadas apenas mulheres,

moradoras do estado de São Paulo, foram ouvidas as usuárias e as ex-usuárias de dois guarda-

roupas compartilhados. Dessa forma, há limitações nos resultados apresentados que devem

ser considerados na generalização, interpretação e reprodução desses dados. No entanto,

este estudo é pioneiro ao identificar as motivações e as barreiras de participação em sistemas

de serviços de guarda-roupas compartilhados.

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APÊNDICE

Análises Google Trends utilizadas na justificativa da pesquisa

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Figura 7 - Busca nos Estados Unidos por: What is sharing economy?

Fonte: Google Trends, 2004.

Figura 8 - Busca nos Estados Unidos por: Clothes for Rent

Fonte: Google Trends, 2004.

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Figura 9 - Busca no Brasil por: Sharing Economy

Fonte: Google Trends,2004.

Figura 10 - Busca no Brasil por: O que é economia compartilhada?

Fonte: Google Trends, 2004.

Figura 11 - Busca no Brasil por: Airbnb

Fonte: Google Trends, 2004.

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Figura 12 - Busca no Brasil por: Uber

Fonte: Google Trends, 2004.

Figura 13- Busca no Brasil por: Netflix

Fonte: Google Trends, 2004.

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