constitucionalismo e as constituições brasileiras

64
Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras MÓDULO I – CONSTITUCIONALISMO E AS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS Site: Instituto Legislativo Brasileiro ILB Curso: Introdução ao Direito Constitucional Turma 06 Livro: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras Impresso por: Tácito Barbalho Data: domingo, 8 junho 2014, 20:57

Upload: tutumineiro

Post on 27-Dec-2015

24 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Constitucionalismo e asConstituições Brasileiras

MÓDULO I – CONSTITUCIONALISMO E AS CONSTITUIÇÕESBRASILEIRAS

Site: Instituto Legislativo Brasileiro ­ ILBCurso: Introdução ao Direito Constitucional ­ Turma 06Livro: Constitucionalismo e as Constituições BrasileirasImpresso por: Tácito BarbalhoData: domingo, 8 junho 2014, 20:57

Page 2: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

SumárioMÓDULO I – Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Unidade 1 – Conhecendo o Direito Constitucional: definição, origem e evoluçãoPág. 1 ­ Direito Constitucional: definição, origem e evoluçãoPág. 2 ­ Mudanças sociais que refletiram no pensamento jurídicoPág. 3 ­ Direito Constitucional: antes e depoisPág. 4 ­ Direito Constitucional: antes e depoisPág. 5 ­ ExemploPág. 6 ­ Direito Constitucional: antes e depoisPág. 7 ­ Movimentos constitucionaisPág. 8 ­ O ConstitucionalismoPág. 9 ­ ImportânciaPág. 10 ­ Direitos sociaisPág. 11 ­ InfluênciasPág. 12 ­ MarcosPág. 13 ­ Evolução do ConstitucionalismoPág. 14 ­ Exemplos e conclusão da unidade 1

Unidade 2 – A Constituição Imperial de 1824 e a Constituição Republicana de 1891Pág. 1 ­ IntroduçãoPág. 2 ­ Constituições brasileirasPág. 3 ­ Constituição de 1824Pág. 4 ­ Constituição da MandiocaPág. 5 ­ Assembleia Nacional ConstituintePág. 6 ­ ProvínciasPág. 7 ­ Revoltas sociaisPág. 8 ­ O quarto poderPág. 9 ­ Direitos FundamentaisPág. 10 ­ Constituição de 1891Pág. 11 ­ RepúblicaPág. 12 ­ Os três PoderesPág. 13 ­ Direitos FundamentaisPág. 14 ­ Conclusão da unidade 2

Unidade 3 – A Constituição de 1934, a Carta de 1937 e a Constituição Democrática de 1946Pág. 2 ­ Constituição de 1934Pág. 3 ­ EleiçõesPág. 4 ­ Assembleia ConstituintePág. 5 ­ Estado Social de DireitoPág. 6 ­ Justiça EleitoralPág. 7 ­ Constituição de 1937Pág. 8 ­ Carta de 1937Pág. 9 ­ Modificações da Constituição de 1934Pág. 10 ­ Retrocessos e AvançosPág. 11 ­ Constituição de 1946Pág. 12 ­ Nova CartaPág. 13 ­ Nova Capital e conclusão da unidade 3

Unidade 4 – A Constituição do período militar e a redemocratização do país com a Constituição de 1988Pág. 2 ­ Constituição de 1967Pág. 3 ­ Volta do presidencialismoPág. 4 ­ Atos InstitucionaisPág. 5 ­ Texto de 1967Pág. 6 ­ AI­5Pág. 7 ­ Golpe dentro do golpePág. 8 ­ Emenda Constitucional nº. 1, de 17 de outubro de 1969Pág. 9 ­ Governos MilitaresPág. 10 ­ Movimentos sociaisPág. 11 ­ Diretas jáPág.12 ­ Constituição de 1988Pág. 13 ­ RedemocratizaçãoPág. 14 ­ Direitos fundamentais do indivíduoPág. 15 ­ Conclusão do Módulo I

Exercícios de Fixação ­ Módulo I

Page 3: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

MÓDULO I – Constitucionalismo e as ConstituiçõesBrasileiras

Ao final deste módulo, em relação ao Direito Constitucional, o aluno deverá ser capaz de:

Diferenciar a travessia histórica por que passou;

Identificar a origem e a evolução de seu conceito;

Relatar as experiências constitucionais brasileiras.

Page 4: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Unidade 1 – Conhecendo o Direito Constitucional: definição,origem e evolução

Nesta unidade, será estudada a definição de Direito Constitucional e sua evolução notempo. Para isso, será oferecida a definição tradicional da disciplina e sua confrontaçãocom ideias contemporâneas, como a doutrina do neoconstitucionalismo e dotransconstitucionalismo.

Page 5: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 1 ­ Direito Constitucional: definição, origem e evolução

Vamos começar nosso curso a partir da própria definição do tema. Tradicionalmente, costuma­sedizer que o Direito Constitucional é o ramo do direito público que tem por objeto de estudo asnormas da Constituição de um Estado.

Dessa maneira, é a parte do direito que analisa, sistematiza e interpreta as normas fundamentaisde certo país. E a Constituição é o documento que congrega tais normas, estabelecendo osprincípios e as regras que organizam o funcionamento do Estado e delimitam as garantias e osdireitos do cidadão.

Em resumo, o Direito Constitucional é a disciplina que se dedica ao direito fundamental de umasociedade.

Essa definição ainda é satisfatória nos dias atuais? Isto é: podemos dizer que o Direito se divide em dois grandes ramos,público e privado, e que o Direito Constitucional pertence àquele primeiro ramo, isoladamente?

Essa clássica divisão do direito, ora atribuída aos romanos, ora associada ao jurista francês Jean Domat, enxergava umadistinção entre leis civis e leis públicas. Estas cuidavam dos assuntos estatais, enquanto aquelas tratavam de matérias davida privada, como as regras contratuais, a capacidade civil e o direito de família. O Direito Civil era a “ConstituiçãoPrivada”, e regulava a vida do indivíduo sob o ponto de vista de seu patrimônio.

Page 6: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 2 ­ Mudanças sociais que refletiram no pensamentojurídicoNo entanto, recentemente, passamos por mudanças sociais que refletiram diretamente no pensamento jurídico. A crise dochamado “liberalismo de mercado”, nitidamente excludente, fez com que o Estado marcasse maior presença nas questõesindividuais. O Direito Civil, por sua vez, não poderia se importar apenas com o lado patrimonial do indivíduo. Era precisoque ele se mostrasse hábil para realizar os “valores da pessoa humana como titular de interesses existenciais”.

As Constituições “públicas”, outrora dedicadas somente a assuntos estatais, passaram a influenciar a vida cotidiana daspessoas, conformando valores e princípios, como o da dignidade da pessoa humana, que contagiaram o Direito Civil.Vivenciamos a “publicização” do Direito Civil.

Dessa forma, ao mesmo tempo em que houve constitucionalização de direitos, houve também superação da dicotomia“público­privado”, que reinava no século XIX.

Então, como podemos compreender o Direito Constitucional atualmente?

Page 7: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 3 ­ Direito Constitucional: antes e depoisLevando­se em conta esse novo quadro jurídico e social, que será detalhado mais adiante, o Direito Constitucional ocupa,hoje, o centro do ordenamento jurídico, e o influencia por completo, tanto na esfera privada quanto na pública. Ele é filtrode todo o sistema jurídico e tem, no princípio da dignidade da pessoa humana, o seu principal valor.

Alocação do Direito Constitucional

a) VISÃO TRADICIONAL

Page 8: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 4 ­ Direito Constitucional: antes e depois

b) VISÃO CONTEMPORÂNEA

Essa mudança fez nascer a possibilidade de aplicação dos direitos fundamentais constitucionais também nas relaçõesprivadas, paralelamente à já consolidada aplicação na relação vertical Estado­particular.

Page 9: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 5 ­ ExemploPara exemplificar: na relação Estado­particular, o direito fundamental da igualdade ou isonomia nos diz que as regras doconcurso público têm que ser iguais para todos. Mas esse princípio deve ser seguido na relação particular­particular? Porexemplo, uma empresa deve seguir o princípio da igualdade na hora da contratação ou da demissão de um empregado?

O STF vem se posicionando no sentido de haver, sim, a possibilidade de se aplicar os direitos fundamentais nas relaçõesprivadas, sobretudo quando se tratar de matéria com relevância pública. Essa nova visão ficou conhecida como "eficáciahorizontal dos direitos fundamentais", pois envolve duas pessoas que estão, em tese, na mesma hierarquia.

Observe o seguinte exemplo, que ilustra essa nova tendência e mostra a eficácia vertical e horizontal dos DireitosFundamentais:

a) EFICÁCIA VERTICAL

Page 10: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 6 ­ Direito Constitucional: antes e depoisb) EFICÁCIA HORIZONTAL

O STF decidiu ser inconstitucional a “discriminação que se baseia em atributo, qualidade, nota intrínseca ou extrínseca doindivíduo, como o sexo, a raça, a nacionalidade, o credo religioso (...)”. O caso concreto é o da empresa AIR FRANCE,que não aplicava o Estatuto do Pessoal da Empresa, mais vantajoso, a brasileiro empregado da companhia, pelo fato deele não ser francês. O tribunal resolveu a questão dizendo que o princípio da igualdade, estampado no art. 5º da CF/88, éaplicável nas relações entre particulares e assentou que o brasileiro faria jus às mesmas condições dos empregadosfranceses. (RE 161.243­6)

Page 11: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 7 ­ Movimentos constitucionais

Feita essa breve reflexão, cabe indagar: qual a origem do Direito Constitucional? Por queele apareceu e onde?

Essas questões nos levam a pensar, sem dúvida, num fenômeno chamadoconstitucionalismo. E, aqui, é preciso ressaltar que ele não possui um sentido único nemuniversal. Como aponta Gomes Canotilho, é melhor dizer que existiram – e existem –movimentos constitucionais ao longo da história. O que se passou na Inglaterra não sereproduziu nos Estados Unidos da América, nem tampouco na França. Da mesma maneira,o Brasil teve sua própria versão de constitucionalismo.

Todavia, podemos apontar algumas características comuns que, reunidas, nos dão o núcleoda ideia de constitucionalismo. Assim, a busca pela limitação do poder do governante e aluta pela garantia de direitos fundamentais do indivíduo integram o conceito dos movimentos constitucionais.

.

Page 12: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 8 ­ O ConstitucionalismoEm outras palavras: o constitucionalismo é, no plano político e social, a luta da sociedade para regrar a atuação dogovernante, impondo­lhe limites e deveres, e fixar os direitos básicos do homem em face do Estado. Paralelamente, noplano jurídico, traduz­se na necessidade de condensar essas regras numa Constituição escrita. No entanto, esta ideia foimais desenvolvida a partir do século XVIII, com as Revoluções Liberais da Inglaterra e da França.

Para exemplificar: no mundo antigo o constitucionalismo se mostrava na possibilidade de os profetas, entre os hebreus,fiscalizarem os atos governamentais que ultrapassassem os ditames bíblicos. Também nas cidades­Estados gregas vê­seum relevante exemplo com a democracia direta, exercida pelos cidadãos, que determinavam o rumo da política de suacidade.

Na Idade Média, a Carta Magna de 1215, também denominada “Carta do Rei João sem Terra”, foi o grande marco doconstitucionalismo medieval inglês. Outros documentos também tiveram sua importância, como o “Petition of Rights”, de1628; o “Habeas Corpus Act”, de 1679; o “Bill of Rights”, de 1689; e o “Act of Sttlement”, de 1701.

Page 13: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 9 ­ Importância

Esses pactos tinham como fundamento o acordo de vontades entre o monarca e os súditos, no qual se estabeleciamconvenções em relação ao modo de governo e às garantias dos direitos individuais. Nos Estados Unidos, ficaramconhecidos os “contratos de colonização”, de que são exemplos as “Fundamental Orders of Connecticut”; na França, asleis fundamentais do reino impuseram limitações ao próprio rei.

No entanto, foi no constitucionalismo moderno que as constituições ganharam importância central. A constituição passoua ser o local onde se consagrava o triunfo do constitucionalismo. Era a arma ideológica contra o Antigo Regimeabsolutista. Ao mesmo tempo, nela deveriam estar consignados a limitação estatal e os direitos fundamentais, sob penade não existir.

É isso que dispôs a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1789: “toda sociedade na qual não está asseguradaa garantia dos direitos nem determinada a separação dos poderes, não tem Constituição”. As principais CartasConstitucionais foram a dos EUA, de 1789, fruto do movimento de independência do país, e a da França, de 1791, quesintetizou os ideais da Revolução Francesa.

A Constituição da Polônia é anterior à francesa, tendo sidopublicada em 3 de maio de 1791.

Page 14: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 10 ­ Direitos sociaisEsses documentos são marcos históricos da transição da sociedade para a idade contemporânea e foram inspirados pelosvalores do liberalismo clássico. Neles, previa­se que todos eram livres e iguais perante a lei, abandonando­se osprivilégios do absolutismo, e que o Estado não intervinha nas leis do mercado, que se regia livremente. Além disso, odireito de propriedade era garantido, e o governante sofria limitação constitucional.

Nessa época ficaram consagrados os direitos de primeira geração, como o direito à vida, à liberdade, à propriedade, àmanifestação de pensamento e ao voto.

Esse modelo foi colocado em xeque no fim do século XIX e começo do século XX, pois a autorregulação do mercado nãopermitiu o enriquecimento de todos. Na verdade, gerou concentração de renda e grande exclusão social. Direitos básicos,como saúde, trabalho e educação, não faziam parte da vida da maioria das pessoas.

Nessa etapa, o constitucionalismo marchou para o Estado Social de Direito, em que o Estado passou a garantir condiçõesmínimas de existência ao indivíduo. Surgiram os direitos de segunda geração, marcadamente garantidores de direitossociais (trabalho, saúde, educação etc.), econômicos (o Estado passou a intervir no mercado, sobretudo depois da criseda Bolsa de Valores, em 1929) e culturais.

Page 15: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 11 ­ Influências

Fala­se, aqui, que a Constituição começou a ser dirigente, já quepassou a obrigar o governo a elaborar e executar políticas quealcançassem os objetivos programados em seu texto.

As principais constituições sociais foram a Mexicana, de 1917, e aAlemã, de 1919, também conhecida como Constituição deWeimar.

Elas influenciaram, inclusive, a nossa Constituição de 1934, queera claramente uma constituição social.

Mas elas foram realmente efetivas?

Principalmente depois da Segunda Guerra Mundial, esse modelo de Constituição se mostrou ineficaz, pois não passou deum convite à atuação dos governantes. Por estar sujeito às vontades do administrador, diz­se que o texto não possuíaforça normativa para realizar suas promessas. Em alguns casos, como no estado nazista de Hitler e na Itália fascista deMussolini, a Lei Maior serviu para proteger e justificar um estado de barbárie. O Judiciário tinha pouca importância narealização dos direitos fundamentais.

Page 16: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

O pensador aponta três marcos determinantes para isso:

a) marco histórico: o constitucionalismo do pós­guerra, que "redefiniu o lugar da Constituição e a influência do direito

constitucional nas instituições contemporâneas". As principais referências são: a Lei Fundamental de Bonn, de 1949

(Alemanha), e a Constituição da Itália, de 1947. No Brasil, cita­se a Constituição de 1988.

b) marco filosófico: o pós­positivismo. Explicando melhor o que se entende por pós­positivimo, podemos dizer que é a

junção das ideias no jusnaturalismo do século XVIII com as do positivismo do século XIX, criando uma nova forma de

entender o direito. A corrente jusnaturalista fundou­se na crença de que existem princípios de justiça universalmente

válidos para todos os seres humanos. Ela impulsionou as revoluções liberais do século XVIII, mas, por ter sido

considerada "abstrata" ou metafísica, foi substituída pelas ideias do positivismo. Este igualou o Direito à lei, retirando

toda carga valorativa e filosófica da norma. Era a Ciência pura do Direito. Com a crise desse sistema em meados do

século XX, era preciso repensar a filosofia jurídica. Como esclarece Barroso: "o pós­positivismo busca ir além da

legalidade estrita, mas não despreza o direito posto; procura empreender uma leitura moral do Direito, mas sem recorrer

a categorias metafísicas."

c) marco teórico: primeiramente, a constituição passou a ser dotada de força normativa. Isso quer dizer que o texto

constitucional deixa de ser um convite à atuação do governante, uma mera carta política, e reconhece o papel do

Judiciário na concretização de direitos. Em segundo lugar, consequentemente, há uma expansão da jurisdição

constitucional, criando­se Tribunais Constitucionais com o objetivo de efetivar o texto constitucional, na perspectiva da

Supremacia da Constituição. Por fim, em terceiro lugar, houve uma mudança em relação à forma de se interpretar a

norma constitucional. A nova interpretação constitucional passou a ter que lidar com a existência de princípios e

conceitos abertos, a serem concretizados pelo intérprete, a exemplo do princípio da dignidade da pessoa humana. Além

disso, a técnica da ponderação de interesses e a argumentação jurídica se tornam fundamentais para a solução decolisões entre direitos.

Pág. 12 ­ Marcos Nesse passo, o Direito Constitucional entra em mais uma importante fase de sua evolução. Conforme muito bemtratado pelo jurista Luís Roberto Barroso, deu­se início ao "novo direito constitucional" ou "neoconstitucionalismo".

Page 17: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 13 ­ Evolução do ConstitucionalismoESQUEMA GERAL DA EVOLUÇÃO DO CONSTITUCIONALISMO

Histórico do Constitucionalismo Exemplos

Constitucionalismo Antigo Hebreus, gregos e romanos.

Institucionalismo MedievalCarta Magna de 1215, Petition of Rights, Billof Rights, Habeas Corpus Act, FundamentalOrders of Connecticut.

Constitucionalismo ModernoDeclaração Universal dos Direitos do Homemde 1789, Constituição Americana de 1789,Constituição Francesa de 1791.

Constitucionalismo Social (séc.XX)

Constituição Mexicana de 1917 e Constituiçãode Weimar de 1919.

Novo Direito Constitucional –Neoconstitucionalismo

Constituições do pós­guerra. Destaques: LeiFundamental de Bonn de 1949 (Alemanha) ea Constituição da Itália de 1947. No Brasil,Constituição de 1988.

Direito Constitucional Além dasFronteiras –

Transconstitucionalismo

Caso da Princesa de Mônaco, que teve fotosíntimas publicadas na internet. O que deveprevalecer: o direito fundamental daliberdade de imprensa ou o da intimidade?

Portanto, vemos que o Direito Constitucional vem se transformando no decorrer dos tempos. E, nos dias atuais, coloca­seum novo problema a ser enfrentado por essa ciência jurídica: como resolver uma determinada questão que envolve maisde uma esfera constitucional? Ou melhor: o que fazer quando dois órgãos não hierárquicos enfrentam um problema comfundamento constitucional e que ultrapassa os interesses de um país?

Para ilustrar, trazemos a lição do professor Marcelo Neves, que desenvolveu a ideia do “transconstitucionalismo”.Conforme palavras dele: “o transconstitucionalismo é o entrelaçamento de ordens jurídicas diversas, tanto estatais comotransnacionais, internacionais e supranacionais, em torno dos mesmos problemas de natureza constitucional.”

Page 18: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 14 ­ Exemplos e conclusão da unidade 1

Dentre os vários exemplos ofertados na tese de Marcelo Neves, podemos citar o daprincesa Caroline de Mônaco, que teve fotos íntimas publicadas por paparazzi na imprensaalemã. Ela entrou com processo judicial, e a Corte Constitucional Alemã decidiu que, emcasos como o dela, em que a pessoa é socialmente proeminente, não há que se falar emdireito à privacidade. Ela recorreu ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos, que, emdecisão contrária, defendeu haver direito à privacidade, mesmo em se tratando depessoas públicas, como Caroline de Mônaco, não se aplicando, aqui, a liberdade deimprensa.

Qual decisão deve prevalecer? Marcelo Neves defende que não se deve impor uma ou outra decisão, mesmo porqueesses órgãos não possuem grau de hierarquia entre eles. Deve­se buscar a orientação socialmente mais adequada. Épreciso que haja um diálogo entre as Cortes Constitucionais para se definir o caminho a ser tomado.

Para encerrar esta unidade, veja mais alguns exemplos e conheça mais um pouco deste tema assistindo à seguinteentrevista dada pelo professor, que aborda, também, os assuntos da ponderação de princípios e do controle do Judiciário:

Vídeo 1/3

Vídeo 2/3

Page 19: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Vídeo 3/3

Page 20: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Unidade 2 – A Constituição Imperial de 1824 e aConstituição Republicana de 1891

A segunda unidade do Módulo I terá a história como pano de fundo a fim dedemonstrar como, e sob qual paradigma, um determinado diploma constitucional éelaborado. Aqui, as Constituições de 1824 e 1891 serão analisadas e suascaracterísticas mais relevantes destacadas.

Page 21: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 1 ­ IntroduçãoNas próximas duas unidades, falaremos das experiências constitucionais brasileiras. Abordaremos, brevemente, ocontexto histórico de criação de cada Constituição e suas principais características.

Também forneceremos os dados necessários para que o aluno possa compreender o que se passou com cada diplomaconstitucional pátrio. Alertamos que este assunto é extenso e profundo.

Por isso, este curso não esgotará o tema. Na verdade, temos o interesse de despertar a curiosidade do estudante paraque ele possa, posteriormente, buscar mais informações e realizar novas pesquisas.

Introduzido o assunto, sigamos.

Page 22: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 2 ­ Constituições brasileiras

O Brasil teve sete constituições, a saber:Constituição Imperial de 1824 (a primeira do Brasil)Constituição de 1891 (inaugurou a República)Constituição de 1934 (pôs fim à República Velha)Constituição de 1937 (início do Estado Novo, de Getúlio Vargas)Constituição de 1946 (redemocratizou o país)Constituição de 1967 (emendada pela EC nº. 1/69, vigorou na Ditadura Militar)Constituição de 1988 (“Constituição Cidadã”, trouxe de volta o Estado Democrático)

Apesar de alguns juristas considerarem a EC nº. 1/69 como mais uma carta constitucional brasileira, analisaremos seutexto em conjunto com a Constituição de 1967. Reconhecemos o caráter “revolucionário” do diploma e trataremos dessetópico na Unidade 4.

Sendo assim, passemos ao estudo das nossas duas primeiras Constituições.

Page 23: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 3 ­ Constituição de 1824A Constituição de 1824 foi a que por mais tempo vigorou em nosso país:65 anos. Ela é fruto de acontecimentos que se iniciam com a vinda daFamília Real Portuguesa, no ano de 1808. Devido à ocupação das terrasportuguesas pelas tropas napoleônicas, a monarquia teve que se retirar dePortugal, estabelecendo­se no Brasil, ainda colônia.

Pertencendo, agora, ao Reino Unido de Portugal e Algarves, cujo Rei era D.João VI, o Brasil era a sede da metrópole portuguesa, tendo como capital acidade do Rio de Janeiro. Alguns historiadores denominam esse fato de“inversão metropolitana”, pois Portugal era governado a partir da antigacolônia.

Muitas coisas mudaram coma chegada da corte portuguesa. Fundou­se o Banco do Brasil, criaram­se aBiblioteca Real, o Jardim Botânico, a Academia Real Militar e duas escolasde Medicina, uma na Bahia e outra no Rio de Janeiro, dentre outrasinstituições.

Além disso, foi assinado o Decreto de Abertura dos Portos às NaçõesAmigas, em cumprimento ao apoio dado pelos ingleses aos portugueses naviagem até o Brasil. Ele marcou o fim do pacto colonial e trouxe váriosprivilégios aos britânicos, que poderiam negociar diretamente com oBrasil, sem ter que passar pelas alfândegas de Portugal.

Page 24: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 4 ­ Constituição da Mandioca

Com a derrota de Napoleão e o crescente poderio britânico sobre os portugueses, deu­seinício, em 1820, à Revolução do Porto. Esse movimento reivindicava a volta da FamíliaReal para restabelecer a colonização das terras brasileiras e expulsar os ingleses docontrole militar.

Assim, D. João VI retorna a Portugal, mas deixa no Brasil seu filho, D. Pedro de Alcântara,na condição de Príncipe Regente.

Sob pressão dos liberais, D. Pedro, desrespeitando as ordens da corte portuguesa, fica noPaís (Dia do Fico, 9 de janeiro de 1822) e declara a independência em 7 de setembro de1822, tornando­se D. Pedro I, imperador do Brasil.

Convocada uma Assembleia Nacional Constituinte, deu­se início aos trabalhos paraelaborar a primeira Constituição da nação independente. Havia dois partidos queintegravam a Constituinte: o partido Luso e o partido Brasileiro. D. Pedro, obviamente, apoiava o partido Luso, pois nãoqueria perder o poder. O partido brasileiro era liderado pelos “irmãos Andrada” (José Bonifácio de Andrada e Silva,Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva e Martim Francisco Ribeiro de Andrada), que elaboraram o primeiroanteprojeto de constituição, conhecido como Constituição da Mandioca.

Por que Constituição da Mandioca?

Foi em virtude desse projeto que a Assembleia Nacional Constituinte foidissolvida pelo Imperador D. Pedro I. Ele previa o voto indireto e censitário,levando­se em consideração a quantidade de terras cultivadas com mandioca.Paralelamente, para ser eleito, também era necessário ser proprietário degrande quantidade de terras com plantio de mandioca.

Page 25: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 5 ­ Assembleia Nacional ConstituinteUma vez que a maioria dos proprietários de terra era brasileira, os portugueses seriam excluídos do poder, tanto comoeleitores quanto como representantes. Vendo essa jogada jurídica dos liberais, o imperador dissolveu a Assembleia (esseepisódio ficou conhecido como “Noite da Agonia”, que aconteceu do dia 11 para o dia 12 de novembro de 1823) e nomeousomente portugueses para redigir a Constituição, que seria imposta ou outorgada em 25 de março de 1824.

Clique aqui para saber o que foi a "Noite da Agonia"

Com a outorga da Constituição, passamos a ser uma monarquia hereditária, cujo Imperador e Defensor Perpétuo doBrasil era D. Pedro I.

Page 26: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 6 ­ Províncias

As capitanias hereditárias foram transformadas em províncias, as quais eramadministradas por presidentes nomeados pelo Imperador. Elas integravam os EstadosUnidos do Brasil, cuja capital era a cidade do Rio de Janeiro. Foram os embriões dasatuais unidades da Federação.

Nosso Estado detinha a forma unitária, ou seja, o poder era centralizado em um únicoórgão, a Coroa, não havendo autonomia política das províncias. Essa condição só foimodificada com a Constituição de 1891, quando se adotou o federalismo.

Houve uma tentativa de derrubar esse unitarismo, durante a Regência Trina Permanente(1831­1835), período em que D. Pedro I abdica do trono, deixando D. Pedro II, aindamenor, no poder. A Lei nº. 16 de 1834, também chamada de Ato Adicional, modificandonormas da Constituição, criou as Assembleias Legislativas Provinciais, dando a elas certaautonomia.

No entanto, essa tentativa não foi bem sucedida, tendo sido totalmente extirpada com a Lei nº. 105 de 1840, queinterpretou as modificações trazidas pela Lei 16/1834. Aliás, a referida lei ficou conhecida como “Lei de Interpretação”.

Page 27: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 7 ­ Revoltas sociaisMesmo assim, as revoltas sociais eclodiam em várias partes do território nacional, tendo como ponto comum odescontentamento com o poder central. São exemplos: a Cabanagem, no Pará (1835); a Farroupilha, no Rio Grande doSul (1835); a Sabinada, na Bahia (1837); a Balaiada, no Maranhão (1838); e a Revolução Praieira, em Pernambuco(1848).

Outra característica importante de nossa primeira Carta Maior foi o fato de termos uma religião oficial: a CatólicaApostólica Romana. Em virtude disso, todas as outras formas religiosas não podiam ter manifestação pública. Aceitava­se, apenas, seu culto doméstico.

Na nossa primeira experiência constitucional, não adotamos a forma popular e revolucionária de repartição dos poderes.A denominada Tripartição dos Poderes de Montesquieu, em que havia os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, comatribuições complementares, autônomas e independentes, não foi implementada na Carta de 1824.

Page 28: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 8 ­ O quarto poderNa realidade, pelas ideias de Benjamin Constant, a organização dos Poderes do Império abrangia um quarto poder, oPoder Moderador, ao lado daqueles três. Ele era a “chave” de todo o complexo político e assegurava ao Imperador ocontrole dos demais poderes.

Estava regulado nos arts. 98, 99, 100 e 101. Veja o que diz, com a grafia da época, o art. 98:

"O Poder Moderador é a chave de toda a organização Política, e é delegado privativamente aoImperador, como Chefe Supremo da Nação, e seu Primeiro Representante, para que incessantementevele sobre a manutenção da Independência, equilíbrio, e harmonia dos demais Poderes Políticos."

Ao lado desse centralismo político, o Imperador era considerado uma pessoa sagrada e inviolável. Vigia a teoria dairresponsabilidade total do Estado: “o rei não erra” (the king can do no wrong). O art. 99 assim o dizia: “A Pessoa doImperador é inviolável, e Sagrada: Ele não está sujeito a responsabilidade alguma.” Essa ideia marcou o absolutismoeuropeu até o século XVIII e ainda perdurou no Brasil até a proclamação da República, em 1889.

Page 29: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 9 ­ Direitos Fundamentais

No que se refere aos direitos fundamentais, a Constituição de 1824, por influência da Constituição Francesa de 1789,defendia a liberdade, a segurança e a propriedade. Por essa linha de pensamento, assegurou importantes direitos civis epolíticos de primeira dimensão (direitos individuais).

A grande contradição, todavia, foi a permanência da escravidão, que atendia aos interesses de grandes latifundiáriosmonocultores de café e de cana de açúcar. Podemos citar, também, o fato de o voto ser restrito aos homens e sercensitário (conforme a renda).

Por fim, a garantia do habeas corpus não foi constitucionalizada em 1824. Houve sua previsão infraconstitucional noCódigo Criminal de 1830 e no Código de Processo Criminal de Primeira Instância de 1832. Essa importante garantia sóviria a ter status constitucional em 1891, como veremos na sequência.

Page 30: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 10 ­ Constituição de 1891O surgimento de nossa segunda constituição está ligado ao enfraquecimento da monarquia, que pode ser observado desde1831, quando houve a tentativa de descentralizar o poder. Como dissemos anteriormente, a Lei nº. 16 de 1834 concedeualguma autonomia às províncias, ao possibilitar que elas legislassem. Porém, tal lei foi “interpretada” e praticamenterevogada em 1840. O poder continuou centralizado, e essa capacidade de legislar foi retirada das províncias.

No entanto, a partir de 1860, o centralismo político começava a ser um problema para algumas classes. Por exemplo,mesmo sendo vitoriosos na Guerra do Paraguai, em 1870, os militares ficaram extremamente descontentes com o fato deterem seu orçamento e seu efetivo reduzidos pelo imperador D. Pedro II.

Outro fato que demonstra o descontentamento com a monarquia é a publicação do Manifesto do Centro Liberal, em 1869,e do Manifesto Republicano, em 1870. Nesses documentos, reivindicava­se maior legitimidade da representação do País,exigindo o fim da vitaliciedade do mandato no Senado e no Conselho de Estado.

Paralelamente, também a Igreja se mostrava insatisfeita com o regime, especialmente em razão de ser submissa aoEstado Imperial. Um fato que mostra essa contrariedade é a prisão dos bispos de Olinda e Belém, em 1874, ao não tersido aprovada uma bula papal que censurava a maçonaria. Além disso, o Imperador perdeu o apoio dos produtoresrurais, ocasionando a libertação dos escravos em 1888.

Page 31: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 11 ­ RepúblicaDentro desse contexto, a República é proclamada pelo Marechal Deodoro da Fonseca, em 15 de novembro de 1889, pormeio do Decreto nº. 1. Esse decreto foi redigido pelo conhecido jurista Rui Barbosa e previu um Governo Provisório com oobjetivo de consolidar o regime e elaborar a nova Constituição, a qual seria promulgada em 24 de fevereiro de 1891. É aprimeira constituição promulgada da nossa história, marcando o fim do absolutismo monárquico.

Embora o Decreto nº. 1 de 1889 já tivesse reunido as províncias sob a condição de “Estados Unidos do Brasil”, a formafederativa foi constitucionalizada em 1891. A capital era o Distrito Federal, com sede na cidade do Rio de Janeiro. É aquique surge a ideia de se levar a capital do país para o planalto central. O art. 3º assim o dispôs: “Art. 3º ­ Ficapertencendo à União, no planalto central da República, uma zona de 14.400 quilômetros quadrados, que seráoportunamente demarcada para nela estabeIecer­se a futura Capital federal”.

A partir da CF/1891, deixamos de ser um Estado unitário centralizado. Os estados federados passaram a ter autonomiapara legislar e administrar seus territórios. Alguns até adotaram o bicameralismo, como foi o caso de São Paulo e dePernambuco, que possuíam a Câmara dos Deputados Estaduais e o Senado Estadual.

Como se disse, a república era a nova forma de governo, e a monarquia foi afastada do poder e banida do territóriobrasileiro. Com ela se foi também o Poder Moderador e a concepção de Benjamim Constant. Na nossa segundaConstituição, as ideias de Montesquieu prevaleceram, e a tripartição dos Poderes foi adotada.

A Família Real só iria poder retornar ao Brasil em 1920, quandohouve a revogação de seu banimento pelo decreto 4.120 de 3 desetembro de 1920.

Page 32: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 12 ­ Os três Poderes

O Poder Executivo era exercido por um Presidente, eleito diretamente pelo povo. Todavia, somente os homens acima de21 anos votavam.

O Poder Legislativo era comandado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, tendo os parlamentares mandatode 3 e 9 anos, respectivamente. Fixou­se, assim, o bicameralismo federativo, com uma casa iniciadora e outra revisora.

O Poder Judiciário, por sua vez, passou a ter um órgão máximo independente, o Supremo Tribunal Federal (STF).

Outro detalhe importante é que, com a Constituição de 1891, não havia mais religião oficial no Brasil. O País, agora, eralaico, leigo ou não confessional. Em virtude disso, algumas práticas mudaram: era proibido o ensino religioso nas escolaspúblicas; os cemitérios eram administrados pela autoridade municipal e não mais pela Igreja; não existia mais opadroado (direito de o imperador intervir nas nomeações de bispos e de alguns cargos eclesiásticos), bem como orecurso à Coroa para atacar as decisões dos Tribunais Eclesiásticos. Houve, portanto, a separação total entre Igreja eEstado.

Page 33: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 13 ­ Direitos Fundamentais

Sobre os direitos fundamentais, podemos dizer que eles foram aprimorados, extinguindo­se algumas penas cruéis, comoa de galés (trabalhos forçados), a de banimento e a de morte. Esta persistiu apenas na legislação militar em tempo deguerra.

A garantia do habeas corpus foi constitucionalizada pela primeira vez, no art. 72, § 22: “Dar­se­á o habeascorpus sempre que o indivíduo sofrer ou se achar em iminente perigo de sofrer violência ou coação por ilegalidade ouabuso de poder”.

Pela abrangência do dispositivo, criou­se em nosso país a denominada “Teoria brasileira do habeas corpus”, pois esseremédio constitucional não protegia apenas a liberdade de locomoção, mas qualquer direito fundamental.

Em vista disso, em 1926, por meio da Emenda Constitucional nº. 1, o habeas corpus foi restringido apenas à liberdade delocomoção. Veja como ficou, à época, a nova redação do dispositivo: “Dar­se­á o habeas corpus sempre que alguémsofrer ou se achar em iminente perigo de sofrer violência por meio de prisão ou constrangimento ilegal em sua liberdadede locomoção”.

Page 34: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 14 ­ Conclusão da unidade 2A Constituição de 1891 vigorou até 1930, sofrendo apenas uma reforma em 1926, momento em que as faculdades edireitos do governo central perante os estados foram ampliados. Na próxima unidade do nosso curso estudaremos osfatos que determinaram o fim da República Velha, a revogação desse ordenamento jurídico e a promulgação de um novotexto constitucional, o de 1934.

Para encerrar esta unidade, assista aos vídeos do professor Boris Fausto, que faz alguns comentários sobre essemomento histórico no Brasil:

Vídeo 1/3

Vídeo 2/3

Page 35: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Vídeo 3/3

Page 36: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Unidade 3 – A Constituição de 1934, a Carta de 1937 e aConstituição Democrática de 1946

A terceira unidade do Módulo I terá a história como pano de fundo afim de demonstrar como, e sob qual paradigma, um determinadodiploma constitucional é elaborado. Aqui, a Constituição de 1967, coma EC n. 1/69, e a Constituição de 1988 serão analisadas e suascaracterísticas mais relevantes destacadas.

Page 37: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 2 ­ Constituição de 1934As experiências constitucionais brasileiras – A Constituição de 1934, a Carta de 1937 e a ConstituiçãoDemocrática de 1946

Chegou a vez de sabermos um pouco sobre as Constituições de 1934, de 1937 e de 1946. A de 34 marca o fim daPrimeira República ou República Velha e o início de um novo período, que é interrompido pelo golpe de Getúlio Vargas,em 1937. O novo regime instaurado por Getúlio, o “Estado Novo”, de cunho autoritário, se estendeu até 1946, quandohouve a redemocratização do país. Vamos ao estudo.

Constituição de 1934

As principais causas para a extinção da República Velha, que perdurou de 1889 a 1930, podem ser associadas a doisfatores:

1) domínio das oligarquias mineiras e paulistas (o termo “oligarquia” significa “governo de poucos”); e

2) ruptura eleitoral do então presidente Washington Luís, que não respeitou o acordo da “política do café com leite”.

Page 38: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 3 ­ Eleições

Como se sabe, por esse “acordo” os paulistas e os mineiros se alternavam na presidência da República. Porém, naseleições de 1929, ao invés de indicar o candidato mineiro, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada, Washington Luís apoiou ogovernador paulista, Júlio Prestes. Em contrapartida, Antônio Carlos posicionou­se em favor do gaúcho Getúlio Vargas,candidato pela Aliança Liberal, para as eleições de 1930.

Apesar de eleito, Júlio Prestes não tomou posse. A “Revolução de 1930”, liderada pelos militares gaúchos e deflagradadepois do assassinato de João Pessoa, fez com que Getúlio Vargas assumisse o poder, por meio de um governoprovisório.

Nesse período, a Constituição de 1891 foi revogada, e o Congresso Nacional dissolvido. Getúlio Vargas governava pordecretos. Paralelamente, foram nomeados interventores em todos os estados da federação, exceto em Minas Gerais,estado do governador Antônio Carlos, que apoiara Getúlio.

Mesmo com avanços em algumas áreas na época do Governo Provisório, a exemplo do Código Eleitoral, que trouxe osufrágio universal, direto e secreto, englobando o voto feminino, e várias garantias trabalhistas (descanso semanalremunerado, férias remuneradas, licença­maternidade e jornada de trabalho máxima de 8 horas diárias), vivíamos, naprática, sob o domínio de uma só pessoa, e não possuíamos, ainda, uma Constituição.

Page 39: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 4 ­ Assembleia Constituinte

Em virtude disso, um movimento revolucionário reivindicava a convocação de Assembleia Nacional Constituinte com ointuito de elaborar a nova constituição. Ficou conhecido como “Revolução Constitucionalista de São Paulo”. Os conflitosiniciaram­se em 9 de julho de 1932, estendendo­se até outubro desse mesmo ano.

Mesmo tendo massacrado os paulistas, Getúlio Vargas se viu obrigado a convocar a Assembleia Constituinte, pois senãoperderia sua legitimidade. Fala­se que, embora vitorioso na “guerra”, Getúlio fracassou politicamente.

Dessa forma, a Constituição de 1934 é promulgada após intensos movimentosrevolucionários e num contexto mundial de profunda crise do capitalismo. Aquebra da Bolsa de Valores de Nova Iorque evidencia a depressão do modelo

liberal. Ao lado disso, a recente industrialização, surgida com a Primeira GuerraMundial, deixa uma grande classe de operários sem emprego.

Diante desse quadro, a nossa terceira Constituição teve grande ênfase social,sofrendo influências da Constituição Alemã de 1919 (Constituição de Weimar),que também possuía a mesma preocupação. A Carta de 1934 marca umaimportante transição do nosso constitucionalismo, que passa a garantir osdireitos sociais ou direitos de segunda geração, como por exemplo os direitostrabalhistas, o direito à saúde e à educação e o direito de greve. Além, é claro,dos já consagrados direitos de primeira geração (direitos civis e políticos:liberdade, igualdade perante a lei, direito à vida e à propriedade).

Page 40: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 5 ­ Estado Social de Direito

Passamos, assim, do Estado Liberal ou Estado de Direito para o Estado Social de Direito, em que o Estado assume suaresponsabilidade perante a sociedade e deve garantir o mínimo para que as pessoas possam viver uma vida digna.

Outras características podem ser citadas sobre o texto constitucional de 1934:

a) o sufrágio universal, direto e secreto, abrangendo o voto feminino;

b) a forma republicana foi mantida;

c) a capital da República manteve­se no Distrito Federal, com sede no Rio de Janeiro (havia a previsão de transferênciada capital para um ponto central do país).

Continuamos a ser um país laico, sem religião oficial, mas esta característica foi amenizada, visto que a Constituição de1891 havia sido muito severa sobre o tema. Dessa maneira, o casamento religioso voltou a produzir efeitos civis, e oensino religioso em escolas públicas se tornou facultativo.

Page 41: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 6 ­ Justiça EleitoralCriou­se a Justiça Eleitoral, a Justiça do Trabalho e as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), e previu­se, pelaprimeira vez, o Mandado de Segurança e a Ação Popular, importantes mecanismos para garantir direitos fundamentais.

Havia a tripartição de Poderes. No entanto, instalou­se no Poder Legislativo Federal o que muitos chamam de“bicameralismo desigual” ou “unicameralismo imperfeito”, pois ele era exercido pela Câmara dos Deputados com acolaboração do Senado Federal. Assim, o Senado Federal não detinha o mesmo status da Câmara, sendo um merocolaborador.

Apesar de alguns defeitos, o texto de 1934 representou importante avanço nas áreas da educação e da economia, bemcomo no campo social. Assista ao vídeo abaixo, que ilustra esse tema.

Page 42: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 7 ­ Constituição de 1937

Constituição de 1937

Com a eleição de Getúlio Vargas para governar durante o período de 1934 a1938, começou a haver uma forte disputa entre dois movimentos nacionais. Deum lado, o da direita fascista, que defendia um estado autoritário, inspirado nasideias de Mussolini, representado pela Ação Integralista Brasileira (AIB); e, deoutro, a Aliança Nacional Libertadora (ANL), movimento de esquerda que apoiavaideias socialistas e comunistas e pretendia combater o fascismo nacional.

Em 11 de julho de 1935, quatro meses após a criação da ANL, o Governo afechou, sob a alegação de que essa aliança era ilegal em vista da Lei deSegurança Nacional. Paralelamente, para evitar o avanço comunista, GetúlioVargas decretou o estado de sítio, inviabilizando uma insurreição político­militarque objetivava derrubá­lo e instalar o comunismo, a denominada IntentonaComunista.

Porém, o estopim desse quadro histórico foi a descoberta do famoso “PlanoCohen”, que novamente pretendia derrubar Getúlio. Foi descoberto pelo Estado­maior do Exército e veiculado em rádio nacional. Como pretexto para “salvar” oBrasil do comunismo, Getúlio Vargas decreta o golpe de estado e fecha oCongresso Nacional.

.

.

PLANO COHEN ­ A matéria a seguir conta que, na verdade, o Plano Cohen foi uma fraude paratentar manter Getúlio Vargas no poder. Vale a pena lê­lo.

Clique no link para ler o PLANO COHEN

Page 43: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 8 ­ Carta de 1937

Na sequência, Getúlio outorga (impõe) a Carta de 1937, iniciando o que chamou de “Estado Novo”. Essa constituição foielaborada por Francisco Campos e teve o apelido de “Polaca”, em virtude da influência da constituição polonesa fascista eautoritária de 1935.

Apesar de ter estabelecido em seu art. 187 que seria submetida a plebiscito nacional, isso nunca aconteceu. Suacaracterística principal foi o autoritarismo, tendo sido fechado o Parlamento, e o Judiciário passou a ser controlado peloExecutivo.

Para se ter uma ideia, o art. 170 da Carta de 1937 dispôs que “durante o estado de emergência ou o estado de guerra,dos atos praticados em virtude deles não poderão conhecer os Juízes e Tribunais”. Isso equivalia a dizer que por maisatrozes que fossem as condutas de militares, o cidadão não poderia levar isso ao conhecimento de nenhum juiz. Vivíamosnuma tripartição apenas “formal” dos Poderes, pois na prática apenas o Poder Executivo comandava o País.

Igualmente, a federação também sofreu limitações. O Governo nomeou interventores nos estados federados, diminuindosua capacidade de se autogovernar. A forma federativa era apenas “nominal”, não existia de fato.

Page 44: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 9 ­ Modificações da Constituição de 1934Houve retrocesso em algumas criações da Constituição de 1934, como é o caso da Justiça Eleitoral, que foi extinta. Damesma forma, os partidos políticos foram dissolvidos pelo Decreto­lei nº. 37 de 1937. A eleição para Presidente daRepública passou a ser indireta.

No entanto, a área mais afetada foi a dos direitos fundamentais. Veja algumas dessas modificações:

a) retiraram­se do texto constitucional o Mandado de Segurança e a Ação Popular;

b) o princípio da irretroatividade das leis não mereceu muita atenção;

c) estabeleceu­se a censura prévia, restringindo­se o direito à liberdade de manifestação do pensamento, e todos osjornais ficaram obrigados e inserir comunicações do Governo, quando assim fosse necessário;

d) previu­se a pena de morte para crimes políticos e quando se tratasse de homicídio cometido por motivo fútil;

e) a greve era proibida.

Ao arrepio da Constituição, a tortura era utilizada como forma de repressão, a exemplo do que aconteceucom Olga Benário, mulher do comunista Luís Carlos Prestes. O filme “Olga” ilustra bem esse fato. Ela foientregue e, posteriormente, assassinada em um campo de concentração nazista, na Alemanha. Estádisponível o trailer:

Page 45: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 10 ­ Retrocessos e Avanços

Como se vê, esse momento foi muito duro para a história brasileira, sobretudo sob o ponto de vista dos direitosindividuais. Mas em razão da forma populista de governo, podemos dizer que houve avanços nos campos trabalhista eindustrial. É desse tempo a criação de importantes empresas estatais: a Companhia Vale do Rio Doce (1942), aCompanhia Hidroelétrica do São Francisco (1945) e a Companhia Siderúrgica Nacional, que começou a operar em 1946.

O Brasil só viria a ser redemocratizado em 1946, após uma contradição na politica adotada por Vargas, como veremos aseguir.

Page 46: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 11 ­ Constituição de 1946

Constituição de 1946

.

O Estado Novo se prolongou de 1937 a 1946, sendo que Vargas governou, efetivamente, desde o Governo Provisório,instalado em 1930. No total, foram mais de quinze anos de “Era Vargas”. Como se viu, a política interna se baseava emideias da direita fascista e se norteava pelo autoritarismo, configurando­se como uma verdadeira ditadura.

Porém, com o início da 2ª Guerra Mundial, o Brasil declarou guerra aos países do “Eixo” (a Alemanha nazista, a Itáliafascista e o Japão), combatendo, assim, do lado dos “Aliados” (EUA, URSS, China, França e Inglaterra).

Numa clara contradição entre a política interna (ditadura Vargas nazifascista) e a política externa (apoio aos países quequeriam destruir as ditaduras nazifascistas), foi publicado o “Manifesto dos Mineiros”, que evidenciava esse quadrocontroverso.

Tendo perdido apoio e entrado em crise política, Getúlio Vargas se viu obrigado a convocar eleições para a Presidência doBrasil. Por meio da Lei Constitucional nº. 9, de 1945, ele o faz e começa a corrida das eleições.

Page 47: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 12 ­ Nova Carta

Embora tenha surgido o movimento “queremismo”, que, em síntese, significava “queremos Getúlio”, ele não foi eleito.Alguns fatos, como a substituição do chefe de polícia do Distrito Federal pelo seu irmão, fez com que Getúlio Vargas fosseexpulso do poder pelas Forças Armadas, mais especificamente pelos Generais Góis Monteiro e Gaspar Dutra. Pensava­seque ele poderia dar um novo golpe e se perpetuar no poder.

O Executivo passou a ser exercido pelo Presidente do STF, José Linhares, até que o General Gaspar Dutra foi eleito parachefiar o país, a partir de 1946. Antes disso, a Lei Constitucional nº. 13, de 1945, atribuiu poderes constituintes aoParlamento, para que este elaborasse outra constituição.

A nova Carta foi promulgada em 18 de setembro de 1946 e teve o importante papel de redemocratizar o Brasil. Dentre asprincipais mudanças, destaque­se que os direitos fundamentais voltaram a ter a proteção adequada, sendo que oMandado de Segurança e a Ação Popular foram recolocados no diploma constitucional. Vedou­se a pena de morte, salvoem tempo de guerra e de acordo com a legislação militar. Reconheceu­se o direito de greve.

Page 48: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 13 ­ Nova Capital e conclusão da unidade 3

A forma federativa do Estado foi consagrada, afastando­se os interventores dos estados. Acapital da República permaneceu no Rio de Janeiro até sua mudança para Brasília, no governode Juscelino Kubitschek (1956­1961), efetivando o disposto no art. 4º do Ato das DisposiçõesConstitucionais Transitórias da CF/46.Assim dizia o referido dispositivo:“Art. 4º ­ A Capital da União será transferida para o planalto central do Pais.§ 1 º ­ Promulgado este Ato, o Presidente da República, dentro em sessenta dias, nomeará umaComissão de técnicos de reconhecido valor para proceder ao estudo da localização da novaCapital.§ 2 º ­ O estudo previsto no parágrafo antecedente será encaminhado ao Congresso Nacional,que deliberará a respeito, em lei especial, e estabelecerá o prazo para o início da delimitaçãoda área a ser incorporada ao domínio da União.§ 3 º ­ Findos os trabalhos demarcatórios, o Congresso Nacional resolverá sobre a data damudança da Capital.§ 4 º ­ Efetuada a transferência, o atual Distrito Federal passará a constituir o Estado daGuanabara.”

Assim, a Constituição de 1946 deu ao Brasil as bases necessárias para construir um país democrático. Todavia, devido aoconhecido “Golpe de 64”, mergulhamos num dos períodos mais conturbados de nossa história. Como veremos na próximaunidade, a Constituição de 1967, emendada pela EC nº. 1/69, assemelhou­se em muitos pontos à Carta de Vargas,representando um retrocesso político e social para os brasileiros.

Page 49: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Unidade 4 – A Constituição do período militar e aredemocratização do país com a Constituição de 1988

A quarta unidade do módulo I terá a história como pano de fundo afim de demonstrar como, e sob qual paradigma, um determinadodiploma constitucional é elaborado. Aqui, a Constituição de 1967, coma EC n. 1/69, e a Constituição de 1988 serão analisadas e suascaracterísticas mais relevantes.

Page 50: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 2 ­ Constituição de 1967Estudaremos, agora, as duas últimas constituições do Brasil. A de 1967, que sofreu uma importante emenda em 1969 evigorou durante a ditadura militar. E a de 1988, hoje vigente, que simbolizou a volta do Brasil para o Estado Democráticoe, mais do que isso, a evolução de nosso constitucionalismo para a construção de espaço aberto ao debate.

Sendo assim, comecemos pelos fatos que antecederam a criação da CF/1967.

Constituição de 1967 e a Emenda Constitucional nº. 1, de 1969

Com o fim da Segunda Guerra Mundial, o mundo ficou dividido em dois grandes blocos: a parte capitalista, liderada pelosEUA, e a parte socialista, chefiada pela ex­URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas). Essas potências ajudavamna reconstrução dos países destruídos pela guerra e, paralelamente, exerciam sua influência para a garantia de poder ecomando sobre tais territórios.

Nessa época, o Brasil se vinculou ao mundo capitalista, tendo, inclusive, recebido algumas multinacionais para explorar omercado nacional. Aliás, especialmente a partir da década de 50, que desnacionalizou segmentos importantes daeconomia nacional, como a área do petróleo, tal política econômica ficou conhecida como “entreguismo”.

Page 51: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 3 ­ Volta do presidencialismo

Nesse passo, havia no País um espírito de “caça aos comunistas”, devido à ideologia adotada por nosso governo. Todavia,na presidência de Jânio Quadros começa a haver um desemparelhamento com o bloco norte­americano. O governobrasileiro começa a travar relações com a China e com a ex­URSS, expoentes do mundo comunista.

Perdendo apoio tanto da direita quanto do centro, Jânio Quadros renuncia. Em seu lugar, assumiria o vice­presidente JoãoGoulart, que no momento da renúncia estava na China. As Forças Armadas queriam impedir que “Jango”, como ficouapelidado, assumisse a presidência, e tentaram impedir seu retorno ao Brasil.

Para contornar a situação, o Congresso Nacional aprovou um regime parlamentarista, em que João Goulart ficaria comochefe de Estado e Tancredo Neves seria o chefe de Governo. Esse sistema, no entanto, foi rejeitado pela população, que,em plebiscito, escolheu a volta do presidencialismo (6 de janeiro de 1963).

Dessa forma, João Goulart voltou a ocupar a chefia do Poder Executivo, sob o sistema presidencialista, e, por ter um viéspopulista, coordenou as “Reformas de base”. Nessas reformas, o presidente Jango permitiu que os analfabetos votassem,iniciou a reforma agrária, limitou a remessa de capital ao exterior e deu grande incentivo à educação.

Page 52: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 4 ­ Atos Institucionais

Apesar de ter ampla aprovação do operariado, a classe média,assim como a Igreja, não via com bons olhos essa políticapopulista. Nesse contexto, em 31 de março de 1964, acusado deestar a serviço do comunismo internacional, João Goulart éderrubado do poder pelos militares.

Em seguida, é constituído o Supremo Comando da Revoluçãopelos militares vitoriosos – General Costa e Silva, BrigadeiroFrancisco Correa de Melo e Almirante Augusto Rademaker. EsseSupremo Comando, no exercício do Poder Executivo, baixou osfamosos Atos Institucionais (AI), que governariam o país até aimposição da Carta de 1967.

Vejamos a síntese de cada um deles.

O AI­1 permitiu ao Comando decretar o estado de sítio, quando assim se fizesse necessário, alémde conferir o poder de aposentar qualquer civil ou militar. Ainda, por meio desse Ato, os militarespoderiam suspender direitos políticos e cassar mandatos legislativos federais, estaduais oumunicipais.

O AI­2 estabeleceu eleições indiretas para Presidente da República.

O AI­3 fez o mesmo que o 2, porém na esfera estadual.

O AI­4, a seu turno, convocou o Congresso Nacional, que estava fechado, para elaborar a novaCarta Constitucional, que regeria o país a partir de então.

Embora conste que o texto foi promulgado, é bom frisar para o estudante que ele foi impostounilateralmente pelo regime militar. Houve apenas as formalidades de votação, aprovação epromulgação. Na verdade, o Parlamento estava ali para atender aos interesses do “Comando daRevolução”.

Page 53: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 5 ­ Texto de 1967

Em síntese, de 1964, quando houve o golpe de Estado, até 1967, quando a Constituição foi outorgada, o Brasil foi regidopor Atos Institucionais. A Constituição de 1946 existia apenas formalmente. Ela foi revogada, em definitivo, no dia 15 demarço de 1967, data em que passou a viger o novo texto constitucional.

Dentre as características mais marcantes do texto de 1967, podemos destacar o centralismo político, que significou o“fim” do federalismo. Experimentamos, praticamente, um estado unitário, em que os estados federados não possuíammuita autonomia.

A Tripartição dos Poderes também não existiu na prática, pois o Executivo foi extremamente fortalecido, esvaziando acompetência dos demais Poderes. O Presidente governava mediante a edição de Decretos­Lei, fazendo do parlamento ummero coadjuvante. Some­se a isso o fato de que as eleições presidenciais eram indiretas e se davam pelo ColégioEleitoral.

Page 54: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 6 ­ AI­5

Mas foi com o AI­5 que a Ditadura deixou seu maior “legado”, ao restringir, violentamente, os direitos fundamentais doindivíduo. Por ele, o Presidente poderia decretar o recesso do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e dasCâmaras dos Vereadores, sendo que, nesse período, ele assumiria as funções desses órgãos.

O AI­5 também permitia ao Presidente intervir nos Estados e nos Municípios, sem as limitações previstas na Constituição.O chefe do Executivo também poderia decretar o confisco de bens de todos aqueles que tivessem enriquecido de maneirailegal, no exercício de cargo ou função pública, bem como suspender os direitos políticos de quaisquer cidadãos, peloprazo de 10 anos.

Conforme o art. 10 do Ato, a garantia de habeas corpus foi suspensa nos casos de crimes políticos contra a segurançanacional, a ordem econômica e social e a economia popular. E, de forma mais autoritária, excluiu da apreciação judicialos atos praticados em acordo com seus comandos.

Page 55: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 7 ­ Golpe dentro do golpePercebe­se, portanto, que o estado autoritário instalado ofendia os direitosindividuais e gerava descontentamento por parte da sociedade civil. Outrossetores também se mostravam insatisfeitos com o Governo Militar, como foi ocaso do Deputado carioca Moreira Alves, que, em 1968, sustentou não havernada a se comemorar no Dia da Independência, pois vivíamos sob o domínio (edependência) dos militares.

Nesse meio tempo, no fim de agosto de 1969, o presidente Costa e Silvaadoece e sua substituição se faz necessária. No entanto, seu vice, PedroAleixo, que fora contra o AI­5, é descartado pelos militares.

Num golpe dentro do golpe, os militares assumem o poder. Eles editam o AI­12, que permite a uma “Junta de Militares” governar o país enquanto Costa e Silva estivesse afastado por motivos desaúde. Em seguida, editam a EC nº 1/69, acrescentando alguns pontos importantes na CF/67. Vejamos alguns detalhesdessa “Emenda”.

Page 56: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 8 ­ Emenda Constitucional nº. 1, de 17 de outubro de1969Como dissemos no início da Unidade 2, discute­se se esta Emenda não configuraria uma nova Constituição, já que ela éfruto de um poder “revolucionário”, que afasta da presidência quem deveria assumi­la (o vice­presidente Pedro Aleixo), eoutorga um novo diploma constitucional.

Certamente, essa visão pode ser defendida, pois a EC 1/69 constitucionalizou o uso dos Atos Institucionais, que járegulavam o país, além de ter mantido em vigor os Atos já baixados. Aumentou, também, o mandato do Presidente para5 anos. No entanto, ela não revogou expressamente a CF/67, mantendo, inclusive, vários pontos de seu texto.

O estudante precisa ficar atento a essa discussão, sempre lembrando que colocamos o nome “Emenda Constitucional”para respeitar o que se sucedeu na história constitucional brasileira.

E como conseguimos superar o estado autoritário? Como passamos à sociedade que atualmente vivemos, sob osprincípios de um Estado Democrático? É isso que veremos no tópico adiante.

Page 57: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 9 ­ Governos Militares

Durante o regime militar, mais especificamente no governo do General Emílio Médici, experimentamos o“milagre econômico” (período de 1968 a 1973). Houve um crescimento econômico muito grande, mas àcusta do endividamento nacional. E por ter sido a classe média a privilegiada, as classes mais pobres nãoforam beneficiadas com esse “milagre”.

No governo de Ernesto Geisel (1974­1979), asconsequências da política econômica adotada naadministração anterior foram aparecendo epassamos por um período de inflação acelerada ecrise econômica acentuada. Acrescente­se a isso acrise internacional do petróleo, que também atingiu o Brasil.

Mesmo assim, Geisel não modificou seus projetos de desenvolvimento (era preciso mostrar aopovo que o Governo Militar ia bem), deixando o país com uma dívida externa altíssima. Diantedisso, os militares foram perdendo apoio e temiam que alguns movimentos de oposição seinsurgissem contra eles.

É dessa época a edição da famosa “Lei Falcão”, que reduziu a propaganda política, com o intuitode minar as possibilidades da oposição. Houve, também, o conhecido “Pacote de Abril de 1977”,elaborado por Geisel, que, dentre outras coisas, aumentou o mandato do presidente para 6 anos.

Ele pretendia fazer um caminho para a democracia, mas seria “lento e gradual”.

Page 58: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 10 ­ Movimentos sociais

Mesmo tentando se manter no poder, os militares não tinham apoio popular. Vivíamos soba censura, a tortura e sequestros de artistas e intelectuais. Nasceram alguns movimentosque criticavam essa estrutura, como é o caso da Tropicália.

Há um site que traz informações interessantes sobre essemovimento. Há fotos, vídeos, biografias etc. Vale a penavisitá­lo: http://tropicalia.com.br

Em 1978, tentando contornar algumas controvérsias, edita­se o “Pacote de Junho”, que,em resumo, revoga o famigerado AI­5, suspende as decisões que cassaram os direitos políticos de alguns cidadãos eprevê a impossibilidade de o Presidente da República suspender os trabalhos do Congresso Nacional. Era o início daredemocratização do país.

Outros fatos denotam o avanço do Brasil para o caminho democrático. O primeiro deles é a Reforma Partidária de 1979(Lei nº. 6.767/1979), que reinstitui o pluripartidarimo. Antes, havia apenas os partidos ARENA (Aliança RenovadoraNacional, de situação) e MDB (Movimento Democrático Brasileiro, de oposição). Depois da Reforma, a Arena passou a sechamar PDS e o MDB se desmembrou em cinco novos partidos: PMDB, PP, PT, PDT e PTB.

Page 59: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 11 ­ Diretas já

Também como passo rumo à democratização, podemos citar o estabelecimento de eleições diretas para governador dosEstados e o movimento “Diretas Já”, que pretendia tornar diretas as eleições para Presidente da República. A Proposta deEmenda Constitucional nº. 5/83 – “PEC Dante de Oliveira”, como ficou chamada – encabeçou essa tentativa. Todavia,mesmo tendo imenso apoio popular, ela foi rejeitada.

Nas eleições indiretas de 1985, Tancredo Neves é eleito o primeiro civil depois de um longo período de governo só demilitares. Suas promessas eram de estabelecer a “Nova República”, baseada num governo democrático.

Porém, ele adoeceu e faleceu, não chegando a tomar posse como presidente. Em seu lugar, assumiu o vice­presidente,José Sarney, que também era civil. Ele cumpriu a promessa de Tancredo e instituiu uma Comissão de Notáveis (ComissãoAfonso Arinos), para elaborar um anteprojeto de Constituição.

Aliás, a Emenda Constitucional nº. 26 de 1985 determinou que fosse convocada uma Assembleia Nacional Constituintecom o fim de elaborar a nova Constituição do país. O curioso dessa emenda é que ela não pretendia modificar, e simeliminar, a Constituição a que se refere (a CF/67, emendada pela EC n. 1/69). Por essa razão, não é razoável pensarmosque ela configura Emenda Constitucional. Enquadra­se, com maior propriedade, como ato político revolucionário, aosmoldes do que acontecera com a EC nº. 1/69, só que com viés democrático.

Page 60: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág.12 ­ Constituição de 1988

O Presidente, no entanto, rejeitou o texto apresentado pela Comissão, sobretudo em razão deela ter optado pelo regime parlamentarista de governo. Cumprindo o mandamento da EC nº.26, instala­se a Assembleia Constituinte em 1º de fevereiro de 1987, composta por 559Congressistas, sendo que o grupo majoritário era do Centro Democrático, também conhecidocomo “Centrão”, apoiado pelo Executivo e defensor de ideias mais conservadoras.

Após intensas discussões, vários lobbies e brigas políticas, a recém­elaborada constituição foipromulgada, em 5 de outubro de 1988, pelo presidente da Assembleia Constituinte, UlyssesGuimarães. Ele a denominou de “Constituição Cidadã”, pois o povo pode contribuir para suaelaboração, por meio de propostas populares. Além disso, ela inaugurou um novo país,erguido sob o Estado Democrático de Direito e que devia respeito à sua Lei Maior.

A nova Constituição fixou eleições diretas para Presidente da República, cujo mandato ficou estabelecido em 4 anos (porforça da Emenda Constitucional de Revisão n. 5, de 1994, que alterou a previsão constitucional original, com mandato de5 anos para Presidente). Esta regra também ficou sendo obrigatória para Estados­membros, Municípios e DistritoFederal. O primeiro presidente eleito segundo a CF/88 foi Fernando Collor de Melo, que, pressionado por denúncias decorrupção e já aberto contra ele um processo de impeachment, renuncia ao cargo em 29 de dezembro de 1992 envolvidoem escândalos de corrupção.

Page 61: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 13 ­ Redemocratização

Com a CF/88, a forma republicana e o sistema presidencialista de governo foram consolidados. Isso ocorreuespecialmente após o plebiscito (consulta popular) de 21 de abril de 1993, que confirmou a escolha da população poresses mecanismos de administração pública.

Por sua vez, o federalismo foi reestabelecido e os entes da federação voltaram a ter autonomia política, administrativa efinanceira. Foi criado o estado de Tocantins e transformados em estados federados os antigos Territórios Federais deRoraima e Amapá. Ao lado disso, a ilha de Fernando de Noronha deixou de pertencer à União (era território federal, foiextinto) e passou para o domínio do estado de Pernambuco.

No entanto, devemos ressaltar que ainda há muitos resquícios de centralismo político, em que a União detém uma amplagama de competências administrativas e legislativas, como se pode ver pela leitura dos arts. 20 a 23 do atual textoconstitucional.

Clique aqui para abrir a Constituição Federal e confira a íntegra dos arts. 20 a 23.

Continuamos a ser um país laico, sem religião oficial, e ter a capital do país em Brasília. A redemocratização trouxe devolta a tripartição real dos Poderes, que, conforme o art. 2º, são independentes e harmônicos entre si. No âmbito doPoder Judiciário, criou­se o Superior Tribunal de Justiça (STJ), competente para uniformizar o entendimento dosmagistrados no tocante às ações que se fundamentem em lei federal. Dessa forma, O STF passou a cuidar das matériasestritamente constitucionais.

Page 62: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 14 ­ Direitos fundamentais do indivíduo

O Poder Legislativo é exercido pelo Congresso Nacional, formado pelo Senado Federal e pela Câmara dos Deputados,representantes dos Estados­membros e do povo, respectivamente. Estabeleceu­se, enfim, o bicameralismo paritário ouigualitário, em que uma casa legislativa não se sobrepõe à outra.

Enfim, não podemos deixar de anotar que foi com a “Constituição Cidadã” que os direitos fundamentais do indivíduoforam consolidados em nosso ordenamento. Alguns até de forma inédita, como, por exemplo, o fato de o racismo e atortura terem se tornado crimes inafiançáveis; e a possibilidade de impetrar habeas data “para assegurar o conhecimentode informações relativas à pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de entidadesgovernamentais ou de caráter público” ou “para a retificação de dados, quando não se prefira fazê­lo por processosigiloso, judicial ou administrativo” (art. 5, inciso LXXII).

O tema dos direitos fundamentais será analisado com mais detalhes no Módulo 3. Por ora, devemos ter em mente que aCF/88 representou uma quebra de paradigma com o sistema anterior (CF/67), pois alçou os direitos fundamentais comocentro do ordenamento jurídico, tendo a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado brasileiro.

Page 63: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Pág. 15 ­ Conclusão do Módulo I

Ao lado da dignidade da pessoa humana, adotamos como fundamentos, ainda, a soberania (internamente, traduz­sena ideia de que ninguém é superior ao Estado, e, externamente, significa que todos os países são iguais entre si), acidadania (na qual o sujeito possui o direito e o dever de intervir na ordem política em que se insere, tanto elegendoseus representantes como contribuindo para melhorar a sociedade), os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa,e o pluralismo político (rompendo com a ordem anterior, que se baseava no bipartidarismo e no repúdio à diversidadepolítica).

Esta é a redação do art. 1º da CF/88, veja:Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados eMunicípios e do Distrito Federal, constitui­se em Estado Democrático de Direito e temcomo fundamentos:I ­ a soberania;II ­ a cidadania;III ­ a dignidade da pessoa humana;IV ­ os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representanteseleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

Assim, vimos que nossa história constitucional passou por avanços e retrocessos. Conseguimos superar estadosautoritários e progredir na proteção do indivíduo e da coletividade.

É preciso levar em consideração que nossa Carta Maior sempre sofrerá mudanças, pois a realidade social é fluida e está,constantemente, em transformação. À Carta atual já se incluíram dezenas de Emendas Constitucionais. Mesmo assim, énecessário proteger seus fundamentos, pois são eles que norteiam o espírito democrático e sustentam a construção deuma sociedade melhor.

Page 64: Constitucionalismo e as Constituições Brasileiras

Exercícios de Fixação ­ Módulo I

Parabéns! Você chegou ao final do Módulo I de estudo do curso Introdução ao Direito Constitucional.

Como parte do processo de aprendizagem, sugerimos que você faça uma releitura do mesmo e resolva osExercícios de Fixação. O resultado não influenciará na sua nota final, mas servirá como oportunidade de avaliar oseu domínio do conteúdo. Lembramos ainda que a plataforma de ensino faz a correção imediata das suasrespostas!

Para ter acesso aos Exercícios de Fixação, clique aqui.