consideraÇÕes sobre o artigo 28, da lei antidrogas e seus reflexos na execuÇÃo penal
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legislação, a regulamentação, sobre o assunto procura abarcar e solucionar as demandas surgidas. A denominada Nova Lei Antidrogas surge num contexto onde o usuário é visto como inserido em um meio onde é necessário auxílio para abandonar a dependência. Especificamente o artigo 28, da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006, irá versar sobre a aplicação de penas ou medidas restritivas de liberdade ao indivíduo, bem como a efetividade e outros tópicos relacionados à figura do usuário e sua contextualização diante da conduta, ou ato.TRANSCRIPT
CONSIDERAÇÕES SOBRE O ARTIGO 28, DA LEI
ANTIDROGAS E SEUS REFLEXOS NA EXECUÇÃO PENAL.
INTRODUÇÃO
A utilização de substâncias que alteram a percepção e, ou, o
comportamento do homem, têm sido usual no decorrer da História da sociedade. Os
mais diversos motivos, desde religiosos até medicinais, foram propulsores do
contato entre o ser humano e tais matérias. A regulamentação desse emprego
tornou-se necessária na medida em que o uso, o comércio e a distribuição,
passaram a estar associados a uma diversidade de problemas sociais. Questões
relacionadas à saúde pública, à dependência química e psicológica e à
criminalidade, adquiriram vulto; diante do aspecto crescente de problemas
relacionados a esse tema.
A legislação, a regulamentação, sobre o assunto procura abarcar e
solucionar as demandas surgidas. A denominada Nova Lei Antidrogas surge num
contexto onde o usuário é visto como inserido em um meio onde é necessário auxílio
para abandonar a dependência.
Especificamente o artigo 28, da Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006,
irá versar sobre a aplicação de penas ou medidas restritivas de liberdade ao
indivíduo, bem como a efetividade e outros tópicos relacionados à figura do usuário
e sua contextualização diante da conduta, ou ato.
É pertinente propor-se a reflexão sobre o tema e seus desdobramentos,
bem como avaliar possibilidades alternativas diante da utilização das chamadas
drogas.
“Analisar a legislação pertinente às drogas,
verificando seus objetivos, constatando seus efeitos
jurídicos e delimitando seu alcance prático é uma
providência essencial do operador do direito. Este
profissional deve compreender profundamente os efeitos
da legislação pátria, não somente para defender ou
orientar seus clientes, mas sim, para colaborar com o
desenvolvimento de toda uma política de amenização dos
efeitos negativos, diretos e indiretos, que as condutas
delitivas relacionadas às drogas acarretam.” 1
1. Definição: Drogas.
Torna-se de fundamental importância tentar estabelecer, a título de
elucidação e delimitação do assunto proposto, o que se define como “drogas” e
como tais substâncias inserem-se no contexto da sociedade em que vivemos.
“O termo droga tem origem na palavra drogg,
proveniente do holandês antigo e cujo significado é folha
seca. Esta denominação é devido ao fato de,
antigamente, quase todos os medicamentos utilizarem 1 Santos, Adriano Alves dos. Lei de drogas – Evolução histórica e legislativa no Brasil. (http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=4818)
vegetais em sua composição. Atualmente, porém, o termo
droga, segundo a definição da Organização Mundial de
Saúde – OMS abrange qualquer substância não
produzida pelo organismo que tem a propriedade de atuar
sobre um ou mais de seus sistemas produzindo
alterações em seu funcionamento.” 2
As substâncias químicas que produzem, ou determinam, a alteração dos
sentidos são usualmente chamadas de drogas. “Capazes de gerar necessidades
tóxicas graves e perigosos distúrbios de abstinência, alterações somáticas e
psíquicas profundas e progressivas” 3. Os problemas decorrentes do uso,
comercialização e malefícios à sociedade tem sido uma constante; abrangendo
todas as classes sociais e faixas etárias.
É notória a presença, o consumo e o comércio das drogas em âmbito
mundial. O consumo propaga-se concomitantemente ao aumento da criminalidade,
pois na busca da satisfação imediata do vício, o indivíduo termina por estar inserido
em círculos onde predominam a prática de atos ilegais e/ou criminosos.
A reflexão à cerca dessa questão é de vital importância, seja para: 1)
determinar políticas envolvendo a questão da segurança pública, pois a incidências
de crimes está relacionada diretamente às drogas; 2) soluções de ordem social, pois
existe a conseqüente desestruturação do que compreendemos como família e 3)
avaliar possíveis soluções para gastos públicos junto à Saúde, para tratamento de
usuários.
2 Site Ministério da Justiça, em Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas (http://www.obid.senad.gov.br/portais/OBID).3 Greco Filho, Vicente; Rassi, João Daniel. Lei de drogas anotada: Lei n. 11.343/2006. São Paulo: Saraiva, 2007.
Além da figura do usuário de drogas, não se deve menosprezar o papel
desempenhado por traficantes, que (em outro extremo dessas relações
estabelecidas) agem com sofisticadas redes de produção e distribuição.
Diante das dificuldades notórias no combate ao tráfico e consumo de
drogas, a sociedade termina por mostrar-se reticente de que exista uma solução
rápida e definitiva para essa questão.
Soares (1997, p. 10), opinando sobre a questão da definição de droga e
prevenção, com conseqüente consumo da mesma, declara:
“a droga é uma mercadoria e que o consumo
de drogas deve ser analisado à luz da estrutura e
dinâmicas do modo de produção capitalista, que
conformam os contextos da sociedade contemporânea.
Assim, trata-se de reconhecer que o consumo de drogas
está submetido às possibilidades de reprodução social
dos indivíduos, famílias e classes ou grupos sociais, bem
como reflete as conseqüências das políticas sociais
públicas adotadas pelo Estado. Portanto, a política e os
programas de prevenção ao consumo de drogas deveriam
estar voltados tanto para mudanças em contextos de
socialização e interação dos indivíduos, delimitados e
específicos a sua condição de classe, quanto para
mudanças estruturais mais gerais que melhorem a
distribuição da renda e o acesso aos bens socialmente
produzidos.” 4
1.1 Evoluções históricas e legislativas das drogas no Brasil
4 Soares, C.B. Adolescentes, drogas e AIDS: avaliando a prevenção e levantando necessidades. Tese (Doutorado) - Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo. 1997
“Até o começo do século passado, o Brasil não
tinha adotado nenhuma política sobre as drogas, eram
consumidas geralmente por jovens burgueses que
freqüentavam casas de prostituição da época. A
legislação tratava sobre substancias venenosas.
Em 1911, o Brasil se comprometeu em Haia, a
buscar a fiscalização sobre o consumo da cocaína e do
ópio. Neste momento é iniciada uma tentativa de controle.
Porem seu consumo já ocorria na sombra da sociedade, e
assim sendo, foi proliferando entre os pardos, negros,
imigrantes e pobres, o que começou a incomodar o
governo.
Após 1914, uma onda de tóxicos invadiu o
país, e os dispositivos existentes deixaram de apresentar
suficiência no combate. Por causa disso, foi criado, a
seguir, o Decreto nº 4.294, de 6 de julho de 1921, que
depois foi modificado pelo Decreto nº 15.683, seguindo-se
regulamento aprovado pelo Decreto n. 14.969, de 3 de
setembro de 1921.
A maconha foi proibida a partir de 1930 e em
1933 ocorreram às primeiras prisões no Rio de Janeiro
por uso da droga. A partir daí, as normas penais foram
sendo editadas à medida que o tráfico avançava com uma
velocidade incrível no seio da comunidade brasileira, se
instalando nas cidades tanto de pequeno como médio e
grande porte.
Interessante destacar que na carta magna de
1824, proferida pelo então Imperador Dom Pedro
Primeiro, já previa no seu artigo 8, a suspensão dos
direitos políticos por incapacidade psíquica ou moral. No
decreto 4.294/1921, prevê a pena de internação de três
meses a um ano, para pessoas que se embriagando,
cause perigo a si próprio e aos demais, assim como a
ordem publica, cita ainda a internação em
estabelecimento correcional adequado.
O decreto 4.294, de 06 de julho de 1921,
regulamentada posteriormente pelo decreto 14.969, de 03
de setembro de 1921, previa em seu texto a internação
compulsória de usuários de substancia entorpecentes, no
seu artigo 6º. Criava também estabelecimento especial
para atendimento destes casos. Interessante que já nesta
época já se relacionava o uso de entorpecentes a
situação da ociosidade tratando-se do trabalho...
A questão de drogas esta ligada diretamente
ao direito penal, porem afeta alem de outros ramos do
direito, como direito trabalhista, direito civil, direito
previdenciário, direito internacional publico e outros.
O código civil traz grandes inovações que
podem ser aplicados sobre o tema, podendo tornar o
usuário de drogas incapaz, quando cita no artigo 3, inciso
I a possibilidade de considerar absolutamente incapaz a
pessoa que “mesmo por causa transitória, não puderem
exprimir sua vontade.” O artigo 4º inciso II, ainda
considera relativamente incapaz ‘os ébrios habituais, os
viciados em tóxicos, e os que, por deficiência mental,
tenham o discernimento reduzido. ’
Para Venosa, (VENOSA, 2008), o novo código
civil inovou na redação, ‘cabendo ao juiz avaliar o caso
concreto e com auxilio de pericia médica definir o grau de
limitação mental que autorize a definir a incapacidade
relativa. ’
Para Pereira, (PEREIRA 2005, apud ABREU,
2009), o artigo 3º, inciso III do Código Civil, ‘trata-se de
situação transitória, qualquer que seja a causa
(embriaguez, sono hipnótico, drogas, traumatismo, estado
de coma, transe mediúnico, entre outras), de inaptidão de
exteriorização da vontade. ’
Estaria desta forma o usuário de drogas sujeito
à interdição em decorrência da incapacidade absoluta
descrita pelo código civil e pacificada pela doutrina. ”5
Tal citação, tão somente, visa demonstrar a longa trajetória legislativa e
demonstrar que o problema da utilização de entorpecentes e atividades relacionadas
ao mesmo, adquiriram vulto contínuo. No intuito de alcançar maior eficácia, em
2006, criou-se a Lei 11.343/2006, objetivando a aplicabilidade no que tange ao
tráfico ilícito de entorpecentes no tocante ao tratamento penal relativo aos usuários e
dependentes de droga, com punições mais severas aos demais tipos penais. O
caráter dinâmico das relações humanas faz com que a tarefa do legislador seja
deveras complexa.
Esclarece Vicente Greco Filho que:
“(...) a toxicomania, além da deterioração
pessoal que provoca, projeta-se como problema
eminentemente social, quer como fator criminógeno, quer
como enfraquecedora das forças laborativas do país, quer
como deturpadora da consciência nacional” (Greco Filho
V., Tóxicos: prevenção repressão. Ed. Saraiva. 1972) 6
Estabelecer parâmetros entre à necessária individualidade de cada
cidadão e estabelecer normas, através de proposições jurídicas, é imprescindível;
5 Santos, Adriano Alves dos. LEI DE DROGAS - EVOLUÇAO HISTORICA E LEGISLATIVA NO
BRASIL (http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=4818).
6 Greco Filho, Vicente. Tóxicos: prevenção repressão. Comentário à Lei 5.726. São Paulo, Saraiva, 1972.
hajam visto que os malefícios causados, direta e indiretamente, pelas drogas ilícitas.
Observa-se que buscar soluções legislativas no intuito de adequar, dimensionar e
solucionar as questões, de acordo com sua época e contexto é, e deve permanecer
como tal, uma constante.
1.2 Lei 11.343/2006
Observamos que a criação da chamada Lei Antidrogas, ocorreu por
conseqüências advindas dos problemas e deficiências existentes na antiga
legislação sobre o assunto, a Lei n.6.368/76; no intuito de aprimorá-la, criou-se a Lei
n. 10.409, de 11 de janeiro. Porém, diante de inúmeras deficiências técnicas e
choques com a Constituição Federal, terminou por ser vetada em sua parte penal.
Tendo apenas a sua parte processual aprovada. Gerou-se uma situação inusitada,
pois com o objetivo de substituir-se Lei n. 6.368/76, resultou uma parte penal do ano
de 1976 e a processual de 2002.
“a) No aspecto penal, a Lei n. 6.368/76, de
modo que continuavam vigentes as condutas tipificadas
pelos arts. 12 a 17, bem como a causa de aumento
previsto no art. 18 e a dirimente estabelecida pelo art. 19,
ou seja, todo o Capítulo III dessa Lei;
b) Na parte processual, a Lei n. 10.409/2002,
esta matéria regulada nos seus Capítulos IV (Do
procedimento penal) e V (Da instrução criminal). ”7
7 Capez, Fernando. Nova Lei de Tóxico – Das modificações legais relativas à figura do usuário. (http://www.oabsp.org.br/noticias/2006/12/07/3962/)
de 2006 a Lei entra em vigor, pois se havia estabelecido que tal ocorreria
após 45 dias de sua publicação.
Através do art. 75, a Lei n. 11.343, de 23 de agosto de 2006, revoga as
disposições anteriores. Porém, obedecendo ao art. 74 apenas em 08 de outubro
“TÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1o Esta Lei institui o Sistema Nacional de
Políticas Públicas sobre Drogas - Sisnad; prescreve
medidas para prevenção do uso indevido, atenção e
reinserção social de usuários e dependentes de drogas;
estabelece normas para repressão à produção não
autorizada e ao tráfico ilícito de drogas e define crimes.
Parágrafo único. Para fins desta Lei,
consideram-se como drogas as substâncias ou os
produtos capazes de causar dependência, assim
especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas
periodicamente pelo Poder Executivo da União.
Art. 2o Ficam proibidas, em todo o território
nacional, as drogas, bem como o plantio, a cultura, a
colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais
possam ser extraídas ou produzidas drogas, ressalvada a
hipótese de autorização legal ou regulamentar, bem como
o que estabelece a Convenção de Viena, das Nações
Unidas, sobre Substâncias Psicotrópicas, de 1971, a
respeito de plantas de uso estritamente ritualístico-
religioso.
Parágrafo único. Pode a União autorizar o
plantio, a cultura e a colheita dos vegetais referidos no
caput deste artigo, exclusivamente para fins medicinais ou
científicos, em local e prazo predeterminados, mediante
fiscalização, respeitadas as ressalvas
supramencionadas.” 8
A denominada Nova Lei de Drogas foi objeto de debates, seja no meio
jurídico ou acadêmico. Discussões sobre sua valia e desdobramentos continuam
ocupando espaços na sociedade. Existe grande repercussão, tanto na mídia quanto
nos meios jurídicos e acadêmicos. É notório que o problema das drogas, passou a
ser tratado de maneira totalmente diversa. Existe um caráter realista, em relação à
dificuldade no enfrentamento do problema, um olhar mais apurado sobre a
dificuldade de sua supressão soluções. Através da Legislação, percebe-se que o
tratamento dispensado à figura do usuário mudou. Um novo tratamento jurídico é
dispensado, pois o chamado consumidor final passa a contar com um abrandamento
das sanções relativas à conduta.
“De qualquer forma, a Lei 11.343/06 introduz –
por meio de inédita sistemática – novo tratamento ao
usuário e ao dependente de drogas. As condutas
tipificadas no art. 28 como guardar, ter em depósito, trazer
consigo ou transportar drogas para consumo pessoal,
estão inseridas no Capítulo III, intitulado “dos Crimes e
das Penas”. Porém, o Capítulo III está compreendido no
Título III, responsável pelas ‘atividades de prevenção do
uso indevido, atenção e reinserção social de usuários e
dependentes de drogas’. À semelhança do conteúdo do
antigo Capítulo III da Lei 6.368/76, que tratava dos
8 Portal Brasil, página do Governo Federal (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm)
“Crimes e das Penas” – e inaugurava ali sua política de
repressão – a nova Lei traz em seu bojo o Título IV (“da
repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de
drogas”) que contém o Capítulo II (“dos crimes”). Portanto,
a Lei 11.343/06 nos oferece uma sistemática mais
complexa, consistente na divisão entre Títulos e
respectivos Capítulos.
Assim, enquanto que na antiga Lei de Tóxicos
as medidas repressivas estavam contidas no Capítulo III
(a divisão era feita tão-somente entre Capítulos), agora
essas medidas repressivas têm seu espaço no Capítulo II,
Título IV da Lei atual. ”9
O caráter preventivo adquire nítida conotação, diante da exposição e
análise da Lei.
1.3. O Sistema de prevenção da Lei 11.343/06
Uma inovação da nova Lei de Tóxicos foi a criação e instituição do
Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas – SISNAD.
In verbis da própria Lei:
“Art. 3º O Sisnad tem a finalidade de articular,
integrar, organizar e coordenar as atividades relacionadas
com:
9 ORRUTEA FILHO, Rogério M.; HERNANDEZ, Erika F.T.; Considerações sobre a nova Lei Antidrogas (Lei 11.343/06) (http://www.ambito-juridico.com.br/site/index. php? n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2790)
I – a prevenção do uso indevido, a atenção e a
reinserção social de usuários e dependentes de drogas;
II – a repressão da produção não autorizada e
do tráfico ilícito de drogas.”
Associa-se que seja um Sistema envolvido diretamente com atividades
relacionadas aos diferentes órgãos que produzem e executam ações relacionadas
ao assunto (podemos citar: CONAD, Ministério da Saúde, Ministério da Educação,
Ministério da Justiça etc.) pela colocação em prática do disposto em lei. Isso
inexistia A busca por um método eficaz de prevenção e repressão é um dos pontos
para ser salientado na atual política criminal adotada. A criação do SISNAD visa
garantir a eficácia da Legislação. Diretrizes como as elencadas através da criação
desse Sistema são inéditas, ou seja, deduz-se que a intenção do legislador foi obter
um melhor direcionamento. O Sistema administrativo garantiria o direcionamento
necessário para ações de efetivação das normas legais.
Não devemos deixar de mencionar, aspectos relativos às questões
sociológicas envolvidas. Existe a ocorrência de altas taxas de criminalidade
sediadas em áreas periféricas nas metrópoles. A associação para o narcotráfico tem
proporções gigantescas, em número de pessoas envolvidas e na movimentação
financeira correlacionada. “Há também a crescente vulnerabilidade infligida ao
sujeito viciado em drogas, em razão da proliferação das mesmas, o que redunda,
evidentemente, em uma degenerescência do corpo social” (Erika Fernanda
Tangerino Hernandez). A utilização de entorpecentes pode ser associada a fatores
sociais, e em conseqüência direta observa-se o usuário como produto final de um
meio onde se constata a facilidade do envolvimento e da dependência com
substâncias tóxicas. A disposição para experimentar e a facilidade de acesso,
tornam um grande número de pessoas pré-dispostas ao entorpecente. O aumento
do número de usuários sempre será um incentivador, um atrativo na disseminação e
na proliferação do tráfico. Ocorre a solidificação da constituição de organizações
criminosas. Entretanto, através das próprias diretrizes apontadas pela nova
legislação, deve-se pensar em políticas efetivas de prevenção, sobre o indivíduo
pré-disposto em razão do meio e aqueles que possuem a pré-disposição subjetiva
para a experimentação; bem como a busca por soluções de inserção e tratamento
do usuário dependente químico. Diz Graco Filho que:
“(...) o ser humano criou-se historicamente e se
desenvolveu sob condições objetivas terrestres e
ajustadas à realidade terrestre. A simples procura
individual de ‘realizações subjetivas alienígenas’ é grave
sintoma de distorção mental, uma espécie de pré-psicose
ou psicose potencial” 10
Sobre fatores sociais, salienta o autor:
“(...) nasce a toxicomania de um conflito
psicológico não resolvido de inadaptação social que
podemos enquadrar entre uma das causas básicas já
referidas. Este conflito, chamado de primário, se resolvido
representa a superação do problema e a permanência da
normalidade” 11
10 Greco Filho, Vicente; Rassi, João Daniel. Lei de drogas anotada: Lei n. 11.343/2006. São Paulo: Saraiva, 2007. 11 Idem.
Ressalte-se um ponto do SISNAD “a promoção dos valores éticos,
culturais e de cidadania do povo brasileiro, reconhecendo-os como fatores de
proteção para o uso indevido de drogas e outros comportamentos correlacionados”.
Ou:
“Art. 19 As atividades de prevenção do uso
indevido de drogas devem observar os seguintes
princípios e diretrizes: [...]
V – a adoção de estratégias preventivas
diferenciadas e adequadas às especificidades
socioculturais das diversas populações, bem como das
diferentes drogas utilizadas; [...]
IX – o investimento em alternativas esportivas,
culturais, artísticas, profissionais, entre outras, como
forma de inclusão social e de melhoria de qualidade de
vida;
X – o estabelecimento de políticas de formação
continuada na área de prevenção do uso indevido de
drogas para profissionais de educação nos 3 (três) níveis
de ensino;
XI – a implantação de projetos pedagógicos de
prevenção do uso indevido de drogas, nas instituições de
ensino público e privado, alinhados às Diretrizes
Curriculares Nacionais e aos conhecimentos relacionados
às drogas; [...].”
Do ponto de vista dialético, tomemos como parâmetro o que estabelecia a
Lei n. 6.368, de outubro de 1.976, em seu artigo 1º: “É dever de toda pessoa física
ou jurídica colaborar na prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de
substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica.”
Pessoas jurídicas que não colaborassem nos planos governamentais são
apontadas no artigo 2º:
“É dever de todas as pessoas, físicas ou
jurídicas, nacionais ou estrangeiras com domicílio ou sede
no País, colaborar na prevenção da produção, do tráfico
ou uso indevidos de produtos, substâncias ou drogas
ilícitas que causem dependência física ou psíquica.”
Destaca Isaac Sabbá Guimarães:
“(...) que o legislador
de 2002 fez uma opção mais realista em relação ao que
era disposto no art. 1º, da Lei 6.368/76, quando
determinou o dever de colaboração apenas nas medidas
de prevenção” 12
Com a atual Lei Antidrogas, houve a atenuação da responsabilidade de
pessoas físicas e jurídicas diante da questão. Julgava-se imprescindível a
colaboração para realizarem-se políticas eficazes (Guimarães, 2003, pág. 132).
Não existe mais a figura de responsabilização de entidades estranhas ao
exercício específico de programas de prevenção e repressão do uso e tráfico de
drogas. Podemos observar alguma similaridade, ou aproximação, das normas
citadas anteriormente, é quando diz no Capítulo I, intitulado “Da Prevenção”:
12 GUIMARÃES, Isaac Sabbá. Tóxicos: comentários, jurisprudência e prática. 2º ed. Curitiba: Juruá, 2003
“Art. 19. As
atividades de prevenção do uso indevido de drogas
devem observar os seguintes princípios e diretrizes: [...]
IV – o compartilhamento de responsabilidades
e a colaboração mútua com as instituições do setor
privado e com os diversos segmentos sociais, incluindo
usuários e dependentes de drogas e respectivos
familiares, por meio do estabelecimento de parcerias;
[...].”
Uma norma que pode ser chamada de “exortativa”, pois não possui, em
seu cerne, alguma tipificação de sanção. Salienta Erika Fernanda Tangerino
Hernandez e Rogério Moreira Orrutea Filho:
“(...) toda a organização, articulação,
coordenação, e integração das atividades ditas
preventivas constituem-se em finalidade do SISNAD,
como bem esclarece o art. 3º supracitado, e a execução
de tais atividades é responsabilidade daqueles órgãos
que o compõem – de acordo com Dec. 5.912 de 2006.”
A inclusão de um Sistema cuja criação visa exclusivamente reforçar
políticas preventivas e repressivas, primando por coordenar ações cooperativas para
tal, significou um avanço na maneira de lidar com a questão do indivíduo-usuário.
Sendo assim, torna-se oportuno ressaltar o comentário de Erika Fernanda Tangerino
Hernandez e Rogério Moreira Orrutea Filho:
“Se se leva em conta
as ferramentas oferecidas pela Lei 11.343/06 na sua
política de prevenção/repressão, a tendência parece ser a
superação dos resultados práticos alcançados pelas
antigas legislações.” 13
1.4 Contextualizações do Artigo 28
“CAPÍTULO III
DOS CRIMES E DAS PENAS
...
Art. 28. Quem adquirir guardar, tiver em
depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo
pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar será submetido às
seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a
programa ou curso educativo.
§ 1o Às mesmas medidas submete-se quem,
para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe
plantas destinadas à preparação de pequena quantidade
13Filho, Rogério M. Orrutea; Hernandez, Erika F.T.; Considerações sobre a nova Lei Antidrogas (Lei 11.343/06) (http://www.ambito-juridico.com.br/site/index. php? n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=2790)
de substância ou produto capaz de causar dependência
física ou psíquica.
§ 2o Para determinar se a droga destinava-se a
consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à
quantidade da substância apreendida, ao local e às
condições em que se desenvolveu a ação, às
circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e
aos antecedentes do agente.
§ 3o As penas previstas nos incisos II e III do
caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo de
5 (cinco) meses.
§ 4o Em caso de reincidência, as penas
previstas nos incisos II e III do caput deste artigo serão
aplicadas pelo prazo máximo de 10 (dez) meses.
§ 5o A prestação de serviços à comunidade
será cumprida em programas comunitários, entidades
educacionais ou assistenciais, hospitais,
estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem
fins lucrativos, que se ocupem, preferencialmente, da
prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e
dependentes de drogas.
§ 6o Para garantia do cumprimento das
medidas educativas a que se refere o caput, nos incisos I,
II e III, a que injustificadamente se recuse o agente,
poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a:
I - admoestação verbal;
II - multa.
§ 7o O juiz determinará ao Poder Público que
coloque à disposição do infrator, gratuitamente,
estabelecimento de saúde, preferencialmente
ambulatorial, para tratamento especializado. ”14
1.4.1 Aspectos elencados como negativos
“O art. 16 da Lei 6.368/76 deu lugar ao art. 28
da Lei 11.343/06 e seus parágrafos. Á primeira vista,
nota-se mudança da expressão do art. 16, que era ‘para
uso próprio’, e, no atual art. 28, temos ‘para consumo
pessoal’, que, em nosso entender, não inovou em nada a
conduta típica; bem como a introdução de mais um núcleo
no tipo, que diz: ‘tiver em depósito’, aqui sim uma
mudança significativa, pois, no passado, essa conduta de
ter em depósito era exclusiva da conduta de tráfico, e não
de usuário. A última alteração foi a introdução de mais um
verbo no tipo do art. 28, qual seja, ‘transportar’, que não
existia no art. 16 da antiga lei. O verbo transportar
também era exclusivo da conduta de traficantes.
Como se pode verificar, o legislador, com
essas simples introduções de mais alguns núcleos no tipo
relativos ao usuário, flexibilizou, e muito, as condutas que
eram próprias dos traficantes, sendo agora também
estendidas aos usuários, dificultando, em tese, a
tipificação de condutas que se encontravam limítrofes
entre o traficante e o usuário”.15
Inserido no artigo 28, observamos outra mudança. A descaracterização
da alcunha de “traficante”, ao agente que possuía um vaso com planta capaz de
14 Site JusBrasil –Legislação Brasileira atualizada diariamente (http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/95503/lei-de-toxicos-lei-11343-06)15 Carollo, João Carlos. Sucintos comentários à Lei Antidrogas (http://www.idecrim.com.br/index. php/direito/28-lei-antidrogas)
produzir algum tipo de substância ilícita em sua moradia. Ressalte-se que diz
respeito a aquele que possui uma “pequena quantidade de substância”.
Um ponto debatido e, passível de questionamento, por aqueles que
“aplicam” a Lei, encontra-se no parágrafo 6° do art. 28 da lei 11.343/06:
“(...) verificamos algo bastante peculiar dessa
lei. Podemos perceber que o legislador ficou preocupado
com a brandura das "penas" aplicadas no caput e seus
incisos, providenciando uma garantia para o seu
cumprimento, não obstante, a nosso ver, essa garantia
deveria ser mais penosa, mais dura ao usuário, mas não
é o que parece, se não, vejamos: ao verificarmos as
penas dos incisos I, II e III do art. 28, verificamos que
essas são mais gravosas do que as penas aplicadas pelo
seu não-cumprimento, o que nos leva a crer que todo
usuário irá preferir não cumprir as penas dos incisos do
art. 28 na esperança de sair com uma pena mais branda
como a "admoestação verbal" ou, em outras palavras,
uma bronca do Juiz, ou uma multa, o que, na maioria das
vezes, também não vem causar grandes danos, pois, em
90 % (noventa por cento) dos casos, é sempre o usuário
pobre que responde por esse delito, o que é uma grande
injustiça; já se, por muito azar, o usuário for de família de
classe alta, também não haverá grande problema, uma
vez que ele poderá pagá-la sem grandes danos e, se
também não desejar pagar, não haverá problema algum,
por não se poder transformar, em nenhuma hipótese, a
conversão da multa em prisão, em função do art. 51 do
C.P. Lembramos, também, que, na nova lei, o legislador
dedicou inteiramente o capitulo III (dos crimes e das
penas) ao usuário, mostrando, mais uma vez, a intenção
dessa lei em amparar o usuário, fato que não ocorria na
lei 6.368/76, porque, nesta, o antigo legislador englobava
em um único capítulo tanto o traficante como o usuário.”16
Uma das polêmicas compreendidas na Lei Antidrogas se encontra
justamente nesse aspecto: existe a discussão sobre se haveria ocorrido a
descriminalização da utilização de drogas ilícitas. A aplicabilidade da Lei esbarra no
caráter subjetivo da interpretação que será dada pelo aplicador imediato da lei sobre
o que seria, por exemplo, “pequena quantidade”. Ou como se definiria a figura do
usuário.
1.5 O caráter contemporâneo da Legislação atual
A elaboração da nova Legislação sobre entorpecente, de 23 de agosto de
2006, demonstra claramente a tentativa de lidar com a questão das drogas sob um
prisma que denota amadurecimento. Estabelecendo clara distinção entre o indivíduo
que pode ser chamado de “usuário” e organizações criminosas estabelecidas para
obter lucro com o tráfico de substâncias ilícitas.
É patente a necessidade de adequar a legislação à sociedade que se
serve das normas regulamentadoras da convivência; bem como do bem estar e
sobrevivência digna dos indivíduos que a compõem. O aspecto dinâmico das
relações sociais que se estabelecem, exigem dinamismo e uma visão realista.
A posição defendida por diversos juristas, entre eles Luiz Flávio Gomes, e
que a nova lei de drogas representa uma histórica mudança de pensamento dos
legisladores brasileiros.17
16 Carollo, João Carlos. Sucintos comentários à Lei Antidrogas (http://www.idecrim.com.br/index. php/direito/28-lei-antidrogas)17 Gomes, Luiz F. e outros. Nova Lei de Drogas Comentada, Editora Revista dos Tribunais. São Paulo. 2006
“A mudança seria um grande avanço nas
tradicionais políticas criminais anteriormente adotadas em
relação às drogas no Brasil, apresentando uma tendência
de consonância com a política européia de redução de
danos, defendendo o tratamento e não a prisão como
forma de ação do Estado em relação ao indivíduo que
seja flagrado com drogas para consumo pessoal.
A nova lei de drogas inovou, no ordenamento
jurídico, ao despenalizar a conduta criminal dos usuários
e dependentes de drogas, estabelecendo unicamente
penas restritivas de direitos e não privativas de liberdade
ou pecuniária.” 18
Houve uma cisão, pois se o modelo instituído era o da justiça penal,
punitiva, notoriamente a Lei atual prima por estabelecer parâmetros de caráter
terapêutico nos meandros de nossas normas. “Os princípios e as regras da novatio
legis determinam uma interpretação sistemática em busca do tratamento e
ressocialização social dos usuários e dependentes...” (Batista, Claudinei J. ; Álvares,
Delaine de S.S).
Os direitos fundamentais do indivíduo são assegurados na legislação
através dos diversos dispositivos inseridos nos capítulos I e II, do título III,
“especialmente quanto à sua autonomia e à sua liberdade”. Novas maneiras são
buscadas, onde não há a existência da sanção tradicional; mas, sim, a tentativa de
resgatar esse sujeito e torná-lo indivíduo participante e ativo nas relações sociais
estabelecidas. Tornar possível sua inserção na sociedade.
A punição como resultado final deixa de ser o resultado último. Cedendo
espaço para medidas preventivas e, ou, que possibilitem de fato a reinserção. Diante
18 Batista, Claudinei J. ; Álvares, Delaine de S.S. ARTIGO 28 DA LEI Nº. 11.343/2006DA POSSE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL. ( http://revista.universo.edu.br/)
desse novo olhar diante de uma questão cuja abrangência sabe-se ser ímpar,
ocorrem discussões sobre se, em verdade, não ocorreu a descriminalização do uso
de entorpecentes.
“Num caminho lógico, decorrente da exposição
feita nos capítulos precedentes, a nova lei de tóxicos
dispensa um tratamento diferenciado aos usuários e
dependentes de entorpecentes. Os operadores do direito
devem determinar sua atuação de acordo com os
princípios da nova lei, observando, sempre, o interesse
maior de recuperação e reinserção do usuário ou
dependente o que não deixa de ser, indiretamente, um
combate ao tráfico de drogas.” 19
REFERÊNCIAS
19 Saliba, Marcelo G. e Filho, Vladimir. Usuários e dependentes na Nova Lei de Drogas: descriminalização, transação penal e retroatividade benéfica. (http://www.advogado.adv.br/artigos/2007/marcelogoncalvessaliba/usuarios.htm)
BATISTA, Claudinei J. ; ÁLVARES, Delaine de S.S. ARTIGO 28 DA LEI Nº. 11.343/2006DA POSSE DE DROGAS PARA CONSUMO PESSOAL. ( http://revista.universo.edu.br/)
CAPEZ, Fernando. Nova Lei de Tóxico – Das modificações legais relativas à figura do usuário (http://www.oabsp.org.br/noticias/2006/12/07/3962/)
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GRECO FILHO, Vicente. Tóxicos: prevenção repressão. Comentário à Lei 5.726. São Paulo, Saraiva. 1972
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ROCHA, Osmar de O. Artigo: A Lei nº 11.343/2006 e suas inovações no âmbito penal ao usuário de drogas (http://www.conteudojuridico.com.br/monografia-tcc-tese, a-lei-no-113432006-e-suas-inovacoes-no-ambito-penal-ao-usuario-de-drogas, 22538). SALIBA, Marcelo G. e FILHO, Vladimir. Usuários e dependentes na Nova Lei de Drogas: descriminalização, transação penal e retroatividade benéfica. (http://www.advogado.adv.br/artigos/2007/marcelogoncalvessaliba/usuarios.htm)
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Site JusBrasil –Legislação Brasileira atualizada diariamente (http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/95503/lei-de-toxicos-lei-11343-06)
Site Portal Brasil, página do Governo Federal (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm)
Site Ministério da Justiça, em Observatório Brasileiro de Informações sobre Drogas (http://www.obid.senad.gov.br/portais/OBID).