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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE DA AÇÃO RESCISÓRIA NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL ISAQUE KLOCK DA SILVA DECLARAÇÃO “DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”. ITAJAÍ (SC), 24 de maio de 2011. ___________________________________________ Professor Orientador: MSc. Alexandre Macedo Tavares UNIVALI – Campus Itajaí-SC

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE DA AÇÃO RESCISÓRIA NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

ISAQUE KLOCK DA SILVA

DECLARAÇÃO

“DECLARO QUE A MONOGRAFIA ESTÁ APTA PARA DEFESA EM BANCA PUBLICA EXAMINADORA”.

ITAJAÍ (SC), 24 de maio de 2011.

___________________________________________ Professor Orientador: MSc. Alexandre Macedo Tavares

UNIVALI – Campus Itajaí-SC

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO

CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE DA AÇÃO RESCISÓRIA NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

ISAQUE KLOCK DA SILVA

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito.

Orientador: Professor MSc. Alexandre Macedo Tavares

Itajaí, 2011

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AGRADECIMENTO

Em primeiro lugar a Deus.

Ao professor Alexandre Macedo Tavares, cujas

sugestões e comentários, fruto de seu entusiasmo

pelo estudo do direito tributário, contribuíram

sobremaneira para a presente monografia.

Aos meus pais, Genázio e Salete, pelo exemplo de

vida e estímulo, e pelo incansável esforço dedicado

a minha formação.

As minhas irmãs, que com frequência se tornaram

ouvintes nos temas jurídicos.

Ao grande mestre e estudioso, quem me fez acordar

para a vida, com relação ao estudo do direito, Dr.

Sandro Antonio Schapieski.

Ao professor, amigo, Dr. Thiago Splettstoser

Giavarotti, Delegado da Polícia Federal, quem, com

conselhos e palavras de ânimo sempre me apoiou

nos concursos quais tenho prestado, e, igualmente,

contribuiu para meu aperfeiçoamento em matéria de

direito.

E, por fim, a todos os meus amigos.

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DEDICATÓRIA

Dedico esta monografia aos meus pais, Genázio e Salete, e as minhas irmãs, Bianca e Magli.

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí/SC, 24 de maio de 2011.

Isaque Klock da Silva Graduando

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Isaque Klock da Silva, sob o título

Condições de Admissibilidade da Ação Rescisória no Direito Processual Civil, foi

submetida em 07 de junho de 2011 à banca examinadora composta pelos seguintes

professores: Alexandre Macedo Tavares (orientador e presidente da banca), Diego

Richard Ronconi (membro da banca), Marcio Staffens (membro da banca), e

aprovado com a nota _____ ( ).

Itajaí, 2011

Alexandre Macedo Tavares Orientador e Presidente da Banca

Maria Claudia da Silva Antunes de Souza Coordenação da Monografia

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à compreensão do seu

trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Coisa Julgada

A coisa julgada é entendida hoje “não como um efeito da sentença, mas sim

modo de manifestar-se e produzir-se dos efeitos da própria sentença, algo que a

esses efeitos se ajunta para qualificá-los em sentido bem determinado”1.

Coisa Julgada Formal

Dá-se o nome de coisa julgada formal à imutabilidade da sentença no

processo em que foi proferida. Corresponde à estabilidade da sentença como ato

jurídico-processual, oriunda da perda da faculdade de impugnação do julgado pela

via do recurso (ordinário ou extraordinário) ou do reexame necessário2.

Coisa Julgada Material

Consiste a coisa julgada material (auctoritas res iuditaca) na imutabilidade

extraprocessual da sentença. Trata-se de qualidade do julgado que, ao revesti-lo,

impede nova apreciação da lide (ne bis in idem), atribuindo o status norma concreta

ao decisum exarado, de modo a torná-lo vinculativo para os demais juízos e às

partes em relação ao qual foi proferido 3.

Sentença

Conforme a Lei 11.232/2005, sentença passou a ser definida como o ato do

juiz que implica alguma das situações previstas no art. 267 ou no art. 269 (nova

redação do art. 162, § 1.º). O art. 267 trata da “extinção” do processo sem

1 DINAMARCO, Márcia Conceição Alves. Ação Rescisória. São Paulo: Atlas, 2004, p. 84. 2 MOREIRA, José Carlos Barbosa. A nova definição de sentença. Revista de Processo. São Paulo: RT, v. 136, jun. 2006, p. 269-272. 3 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1997, p. 520.

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vii

julgamento (“resolução”) de mérito. O art. 269 trata das hipóteses de julgamento

(“resolução”) do mérito – sem mais aludir à extinção do processo4.

4 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 498.

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SUMÁRIO

RESUMO............................................................................................ X

INTRODUÇÃO ..................................................................................11

CAPÍTULO 1 .....................................................................................13

ELEMENTOS E CONDIÇÕES DA AÇÃO.........................................13

1.1 CONCEITO DE AÇÃO................................................................................... 13

1.2 ELEMENTOS IDENTIFICADORES DA AÇÃO.............................................. 14

1.3 AS PARTES COMO ELEMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO DA AÇÃO........... 16

1.4 O PEDIDO COMO ELEMENTO IDENTIFICADOR DA AÇÃO ...................... 17

1.5 A CAUSA DE PEDIR COMO ELEMENTO IDENTIFICADOR DA AÇÃO...... 18

1.6 CONDIÇÕES OU REQUISITOS DA AÇÃO................................................... 19

1.7 POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO..................................................... 23

1.8 INTERESSE DE AGIR ................................................................................... 27

1.9 LEGITIMIDADE AD CAUSAM ....................................................................... 32

CAPÍTULO 2 .....................................................................................39

SENTENÇA E COISA JULGADA.....................................................39

2.1 SENTENÇA: CONCEITO............................................................................... 39

2.2 SENTENÇAS PROCESSUAIS TÍPICAS E O ART. 267 DO CPC................. 40

2.3 SENTENÇAS PROCESSUAIS ATÍPICAS E O ART. 267 DO CPC .............. 41 2.3.1 Perempção de Instância ........................................................................... 42 2.3.2 Abandono da Causa por mais de 30 Dias ............................................... 43 2.3.3 Perempção................................................................................................. 44 2.3.4 Convenção Arbitral ................................................................................... 45 2.3.5 Desistência da Ação.................................................................................. 46 2.3.6 Ação Intransmissível................................................................................. 47 2.3.7 Confusão entre Autor e Réu..................................................................... 48

2.4 SENTENÇAS DE MÉRITO ............................................................................ 49 2.4.1 Classificação ............................................................................................. 50 2.4.2 Elementos .................................................................................................. 51 2.4.3 O Art. 269, II, III e V .................................................................................... 52 2.4.4 Prescrição e Decadência .......................................................................... 53

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2.5 COISA JULGADA.......................................................................................... 55 2.5.1 Coisa Julgada Formal e Coisa Julgada Material .................................... 57 2.5.2 Limites Objetivos da Coisa Julgada ........................................................ 60 2.5.3 Limites Subjetivos da Coisa Julgada ...................................................... 61

CAPÍTULO 3 .....................................................................................64

ASPECTOS DESTACADOS DA AÇÃO RESCISÓRIA ....................64

3.1 PANORAMA GERAL DAS HIPÓTESES DE CABIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA....................................................................................................... 64

3.2 SENTENÇAS DE MÉRITO NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL................... 66 3.2.1 Definição de Sentença de Mérito, para fins de Rescindibilidade.......... 66

3.3 TERMO INICIAL DO PRAZO DA AÇÃO RESCISÓRIA................................ 67

3.4 ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA EM AÇÃO RESCISÓRIA...... 69

3.5 LEGITIMIDADE PARA PROPOR AÇÃO RESCISÓRIA ............................... 70

3.6 HIPÓTESES DE CABIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA ............................. 72 3.6.1 Prevaricação, Concussão e Corrupção do Juiz ..................................... 72 3.6.2 Impedimento ou Absoluta Incompetência do Juízo............................... 74 3.6.3 Violação de Literal Disposição de Lei ..................................................... 75 3.6.4 Dolo da Parte Vencedora ou Colusão entre as Partes........................... 76 3.6.5 Ofensa à Coisa Julgada............................................................................ 77 3.6.6 Falsidade da Prova.................................................................................... 79 3.6.7 Documento Novo....................................................................................... 80 3.6.8 Invalidade da Confissão, Desistência ou Transação em que se baseou a Sentença............................................................................................. 80 3.6.9 Erro de Fato ............................................................................................... 82

CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................84

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...........................................87

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RESUMO

Paralelo ao instituto da Coisa Julgada, encontra-se a Ação Rescisória,

capitulada no artigo 485 do Código de Processo Civil, que tem por finalidade

desconstituir o julgado que tenha interpretação incompatível com o texto magno, e

cujos dispositivos violem diretamente normas constitucionais ou que resultem em

situação incompatível com a Lex Mater. Nesse passo, mediante a utilização do

método indutivo, objetivou-se analisar as condições de admissibilidade da ação

rescisória, o seu sentido e alcance, como também a desconstituição dos julgados.

Através da pesquisa, obtiveram-se os seguintes entendimentos: a) só se considera

sentença, para fins de desconstituição, aquelas elencadas no artigo 269 do Código

de Processo Civil; b) a coisa julgada material, quando atribuída do status, vincula os

juízos e às partes em relação ao qual foi proferido; c) as hipóteses de cabimento da

ação rescisória estão expressamente e taxativamente elencadas no artigo 485 do

Código de Processo Civil; d) em havendo qualquer das hipóteses do artigo 485,

CPC, eivados em vícios, será motivo para o pedido de desconstituição do julgado.

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto a investigação das formas e

condições para a desconstituição dos julgados, à luz do Código de Processo Civil.

O estudo do tema é de extrema significância para ordem de rescisão dos

julgados quando eivados em vícios, não somente pela sua importância prática, mas

pela falta de consenso entre a doutrina e a jurisprudência, no que se refere ao seu

alcance e pressupostos de admissibilidade.

Esta pesquisa tem como objetivos: Institucional, produzir monografia para a

obtenção do grau de bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí –

Univali; geral, 1) Demonstrar os elementos e condições da ação; 2) analisar alguns

dos tipos de sentenças processuais e o enfoque da coisa julgada; específicos,

investigar as notas peculiares da ação rescisória e suas condições de

admissibilidade no processo civil brasileiro, nos moldes como retratada pelo art. 485

do Código de Processo Civil.

Para a investigação do objeto e alcance dos objetivos propostos, adotou-se o

método indutivo5, operacionalizado com as técnicas6 do referente7, da categoria8,

dos conceitos operacionais9 e da pesquisa bibliográfica, em conjunto com as

técnicas propostas por Colzani10, dividindo-se o relatório final em três capítulos.

A pesquisa foi desenvolvida tendo como base os seguintes problemas:

1ª Qual tipo de sentença processual forma coisa julgada material?

2ª Quando é cabível a ação rescisória?

3ª Quais as hipóteses de cabimento da ação rescisória?

5 O método indutivo consiste em ‘pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de

modo a ter uma percepção ou conclusão geral’. [Pasold, 2001, p. 87]. 6 “Técnica é um conjunto diferenciado de informações reunidas e acionadas em forma instrumental para realizar operações intelectuais ou físicas, sob o comando de uma ou mais bases lógicas investigatórias”. [Pasold, 2001, p. 88]. 7 Referente “é a explicitação prévia do motivo, objetivo e produto desejado, delimitando o seu alcance temático e de abordagem para uma atividade intelectual, especial-mente para uma pesquisa”. [Pasold, 2001, p. 63]. 8 Categoria “é a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia”. [Pasold, 2001, p. 37]. 9 Conceito Operacional é a “definição para uma palavra e/ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos”. [Pasold, 2001, p. 51]. 10 COLZANI, Valdir Francisco. Guia para elaboração do trabalho científico.

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12

Diretamente relacionadas a cada problema formulado, foram levantadas as

seguintes hipóteses:

a) As sentenças que se encontram elencadas no artigo 269 do Código de

Processo Civil;

b) O cabimento da ação rescisória é possível a partir de encontrados os

elementos que possibilitem sua impetração, tais como vícios na sentença de mérito

transitada em julgado;

c) As hipóteses se encontram no artigo 485 do Código de Processo Civil,

sendo elas: I – verificar prevaricação, concussão ou corrupção do juiz; II – proferida

por juiz impedido ou absolutamente incompetente; III – resultar de dolo da parte

vencedora em detrimento da vencida ou concussão das partes a fim de fraudar a lei;

IV – ofender a coisa julgada; V – violar literal disposição de lei; VI – se fundar em

prova falsa; VII – depois da sentença, o autor obtiver documento novo; VIII – houver

fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação; e ainda, IX – fundada

em erro de fato.

Para uma melhor abordagem das questões que norteiam as Condições de

Admissibilidade da Ação Rescisória, o trabalho foi dividido em três capítulos:

No primeiro capítulo tratar-se-á a respeito dos elementos e condições que

fundam a ação, em suas peculiaridades, sendo: as partes, o pedido, a causa de

pedir, possibilidade jurídica do pedido, interesse de agir e legitimidade ad causam.

No segundo capítulo, discorrer-se-á acerca da sentença e coisa julgada,

modalidades de sentença, e a coisa julgada com seus limites intraprocessuais e

extraprocessuais.

No terceiro capítulo e último capítulo, investigar-se-á as hipóteses de

cabimento da ação rescisória, notadamente a questão de seus pressupostos de

admissibilidade.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as Considerações Finais,

nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados, estabelecendo-se

breve síntese de cada capítulo e demonstração sobre as hipóteses básicas da

pesquisa, verificando se as mesmas restaram ou não confirmadas.

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CAPÍTULO 1

ELEMENTOS E CONDIÇÕES DA AÇÃO

1.1 CONCEITO DE AÇÃO

A ação, como direito de provocar o exercício da jurisdição, significa o direito

de provocar o julgamento do pedido, a decisão da lide11, como define Liebman,

frente às várias teorias que a concebem.

O conceito de ação, de um ponto de vista mais didático e prático, é unânime

no sentido de constituir um direito subjetivo que a pessoa qual veio ter seu bem

jurídico lesionado ou ameaçado, de forma resistida ou ainda quando haja

necessidade da assistência ou da autorização jurisdicional para a legitimidade de

sua pretensão, tem de requerer a tutela jurisdicional do Estado12.

A ação é um direito assegurado a todos constitucionalmente13 (CRFB/88, art.

5º, XXXV) contra investidas do próprio Estado como também de terceiros

(particulares) constituindo também um dever do Estado, como é o caso da ação

penal, onde em regra geral é incondicionada, pesando sobre o Estado a obrigação

da sua propositura.

Portanto, todos têm o direito de propositura de uma ação para resguardar

direitos, desde seu nascimento com vida, sendo que de tal direito é assegurado aos

nascituros, e, na possibilidade de ser ainda absolutamente incapaz, poderá o titular

desse direito ser representado em juízo, e, quando relativamente incapaz, deverá

ser assistido por quem de direito seja seu responsável.

11 LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Bestbook, 2004, p. 97. 12 LEVENHAGEN, Antonio José de Souza. Comentários ao código de processo civil. 4. ed. São Paulo: Editora Atlas, 1996, p. 22-23. 13 Quando o art. 5º, XXXV, da Constituição da República solenemente assegura que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Cf. MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. 9 ed. Campinas – SP: Millennium Editora Ltda., 2003. v. I. p. 227. Desta forma cabe aqui afirmar ser a ação um direito à todos, sem exceção, permitindo que ainda que seja o detentor do direito da tutela jurisdicional uma pessoa impedida de exercer, possa advir por meio de seu representante legal, que ora pode ser constituído (determinada pessoa indicada pelo juiz) ou pré constituído (no caso dos pais da criança).

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14

Marques14 traz o seguinte ensinamento:

Aquele que afirma ter sofrido gravame em relação a determinado

interesse juridicamente protegido, entra em conflito com o autor da

lesão. Esse conflito não pode ser solucionado pelo exercício da

autotutela, pelo que surge o litígio, sempre que a pretensão de

reparação do dano permanecer insatisfeita.

É indispensável que, existente a lide, e não havendo reparação pela parte

causadora do dano, cabe ao que sofreu a lesão invocar à tutela jurisdicional do

Estado, para que seja a situação restabelecida ao status quo ante.

Nessa senda, a ação “é um dos direitos que podem influir da lesão de um

direito; e eis como aquela se apresenta na maioria dos casos: como um direito por

meio do qual, omitida a realização de uma vontade concreta da lei mediante a

prestação do devedor, se obtém a realização daquela vontade por outra via, a saber,

mediante o processo.”15

1.2 ELEMENTOS IDENTIFICADORES DA AÇÃO

O legislador, diante da multiplicidade de casos, e ainda do surgimento de

inúmeras lides, viu-se obrigado a criar elementos identificadores da ação, os quais

pudessem diferenciar caso a caso os interesses das partes, que através da tutela

jurisdicional, buscam uma solução ao conflito16.

Desta forma, é o entendimento de Wambier17:

14 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. 9 ed. Campinas – SP: Millennium Editora Ltda., 2003, p. 227. 15 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. Campinas: Bookseller, 1998, v. I, p.37-38. 16 Extrai-se dos estudos de Luiz Rodrigues Wambier, da obra Curso avançado de processo civil v.1 – teoria geral do processo e processo de conhecimento, onde “ocorre que a multiplicidade de casos (ou de conflitos) determina o surgimento de inúmeras lides (ou, com o mesmo sentido, de inúmeras pretensões ou, ainda, inúmeras afirmações de direito), para as quais deve haver soluções especificas, objetivas, capazes de promover a pacificação caso a caso, interesse por interesse”. Cf. WAMBIER, Luiz Rodrigues; ALMEIDA, Flávio Renato Correia de; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. 9 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 126. Competindo ao legislador pátrio, criar elementos, quais sejam necessários a identificar cada ação, distinguindo-as, em suas particularidades. 17 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. 9 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 127.

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15

Cada ação levada a juízo, portanto, deve ser particularmente

observada, para que dela se extraim elementos identificadores, de

forma que possa ser considerada separadamente e distinguida das

outras ações que também tenham sido propostas ou que possam vir

a ser propostas futuramente.

E se define a identificação das ações como “operação pela qual se

confrontam entre si várias ações, a fim de estabelecer se são idênticas ou

distintas.”18

São eles os componentes materiais da ação, os quais vão diferenciar uma

ação da outra, servem para identificar as ações. São três elementos a serem

considerados: as partes, a causa de pedir e o pedido19.

Assim, como elencados na doutrina e no Código de Processo Civil (Art. 301, §

2º)20, devem os mesmos serem analisados com toda diligência pelo julgador, a ponto

de trazer a lume as peculiaridades de cada caso, tornando-o único em relação aos

demais que advirem ser propostos, naquele mesmo juízo ou em locais diversos.

É preciso, então, identificar ação por ação e, via de conseqüência, cada

processo nascido de cada momento de exercício do direito de ação. O processo

gerado porque A moveu ação de cobrança contra B, sob o fundamento de que este

lhe devia o cumprimento da obrigação de pagar determinada quantia, referente à

compra e venda de um automóvel, não interfere no processo em que o mesmo A,

por força de contrato de compra e venda de um terreno urbano, igualmente move

contra B. Há um elemento distinto nesses dois casos, apesar da identidade de

partes, isto é, apesar de nos dois processos serem autor e réu os mesmo A e B21.

Assim, averba Greco Filho22:

Cada ação distingue-se das demais por certos elementos que a

identificam. Por meio deles é possível distinguir uma da outra e,

18 CALAMANDREI, Piero. Instituições de Direito Processual Civil. 2 ed. Campinas – SP: Bookseller, 2003, p. 235. 19 GAIO JÚNIOR, Antônio Pereira. Direito processual civil: teoria geral do processo, processo de conhecimento e recursos. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 69. 20 Art. 301, § 2º. Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido. BRASIL. Código de processo civil. 21 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. 9 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 127. 22 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: teoria geral do processo a auxiliares da justiça. 19 ed. rev. e atual., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 91.

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16

também, individualizar determinada demanda para compará-la a

outra, verificando-se eventualmente se são idênticas. Tal ocorre

quando todos os elementos identificadores coincidem, tanto que se

pode dizer, com melhor precisão, que estamos diante da repetição

da mesma demanda, em vez da expressão comum “demandas

idênticas”. Como se vê, se todos os elementos coincidem, não há, na

verdade, duas ações idênticas, mas apenas uma ação que se repete.

Deste modo, “a identificação dos elementos da ação é de extrema

importância no âmbito do direito processual visto a sua utilidade na possibilidade de

delimitar a competência do juízo, a conexão e continência das ações, a

litispendência (ações idênticas) e a coisa julgada (evita-se que se conheça de uma

ação já julgada anteriormente).”23

1.3 AS PARTES COMO ELEMENTOS DE IDENTIFICAÇÃO DA AÇÃO

O primeiro exercício que se deve fazer, sempre que se queira identificar uma

ação e o processo que ao seu exercício se seguiu, é verificar quais são as partes,

isto é, quem está atuando como autor, porque exerceu o direito de ação, e quem

está no pólo passivo do processo, isto é, contra quem o autor propôs a ação diante

do Poder Judiciário24.

A diversidade de um só elemento acarreta diferença de ação. Duas ações,

pois, que tenham, sequer, um só elemento diverso, são dois indivíduos diversos

entre si, embora a comunidade de outros elementos os torne afins. É possível haver

entre duas ações, como entre dois indivíduos em geral, mais ou menos afinidade;

mas, quanto a ser ou não ser o mesmo indivíduo, não há graduação possível25.

Nesse sentido, assenta Greco Filho26:

23 GAIO JÚNIOR, Antônio Pereira. Direito processual civil: teoria geral do processo, processo de conhecimento e recursos. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008, p. 69. 24 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. 9 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 127. 25 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1998, p. 429. 26 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: teoria geral do processo a auxiliares da justiça. 19 ed. rev. e atual., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 91.

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Para a identificação das partes não é suficiente a identificação das

pessoas presentes nos autos, porque é preciso verificar a qualidade

com que alguém, de fato, esteja litigando. Assim, por exemplo, uma

mesma pessoa poderá litigar com qualidades diferentes: em nome

próprio, no interesse próprio; em nome próprio, sobre direito alheio,

como substituto processual; por intermédio de outrem, seu

representante. Em cada caso a situação da pessoa é diferente no

plano jurídico, de modo que não existe, nessas hipóteses, identidade

de parte.

O julgador, desta forma, necessita estar muito atento, para não venha passar

despercebido, onde o sujeito que esta figurando no pólo ativo ou no pólo passivo,

seja de fato qualificado para afirmar ou contradizer a ação.

Assim, os sujeitos de ação são (...) a pessoa à qual corresponde o direito de

obter a providência jurisdicional favorável a sua petição, e a pessoa contra a qual a

providência se dirige, isto é, a pessoa em cuja esfera jurídica esta providência está

destinada a operar, ou seja, como se poderia dizer também, as pessoas às quais

corresponde a legitimação ativa e passiva27.

1.4 O PEDIDO COMO ELEMENTO IDENTIFICADOR DA AÇÃO

O pedido, de acordo com a doutrina moderna, é o objeto da ação, isto é, a

matéria sobre a qual incidirá a atuação jurisdicional28.

O objeto da ação pode ser entendido em sentido imediato ou em sentido

mediato; e também aqui um ou outro destes dois sentidos aparecerá como

predominante segundo o modo como a ação se conceba29.

Desse modo, Wambier30 vem trazer a diferenciação desses casos:

Tanto faz parte do pedido o pleito de providência processual [sentido

imediato] por meio do qual a parte pretende ver protegida sua

pretensão, quanto esta mesma, que, em última análise, se constitui 27 CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1999, p. 229. 28 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: teoria geral do processo a auxiliares da justiça. 19 ed. rev. e atual., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 92. 29 CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1999, p. 230. 30 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev. e atual., São Paulo: RT, 2007, p. 128.

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no próprio bem jurídico perseguido pelo autor da ação [sentido

mediato].

O primeiro identifica-se com a natureza da prestação jurisdicional invocada.

Pode-se pedir ao juiz que simplesmente declare a existência ou inexistência de uma

relação jurídica; ou que condene o réu a determinada prestação; ou que constitua ou

desconstitua atos ou situações jurídicas31.

Nesse passo, o objeto imediato do pedido sempre visará a uma sentença

declaratória (que declare direitos ou deveres), condenatória ou constitutiva.

O segundo é o bem jurídico, sobre o qual se requer a tutela jurisdicional. O

bem jurídico que constitui o objeto mediato do pedido pode ser material ou

incorpóreo. Na cobrança de dívida, o bem jurídico é a importância que se pretende.

Na separação judicial, a dissolução da sociedade conjugal de determinado

casamento32.

Assim, o juiz ao pronunciar uma declaração resolutiva do caso, deve deter-se

ao conteúdo do objeto da ação (mediato e imediato), que ficará impedido de declarar

sobre objeto diverso do que foi pedido.

1.5 A CAUSA DE PEDIR COMO ELEMENTO IDENTIFICADOR DA AÇÃO

Conforme ensina Liebman, a causa da ação é o fato jurídico que o autor

coloca como fundamento de sua demanda. É o fato do qual surge o direito que o

autor pretende fazer valer ou a relação jurídica da qual aquele direito deriva, com

todas as circunstâncias e indicações que sejam necessárias para individuar

exatamente a ação que está sendo proposta e que variam segundo as diversas

categorias de direitos e de ações33.

A identificação da causa petendi em seus elementos básicos, fato e

fundamentos jurídicos, tem muita importância no processo, a exemplo do que

acontece para o estabelecimento da competência por conexão (art. 103), para

31 SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil: processo de conhecimento. 12 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 431. 32 SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil: processo de conhecimento. 12 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 432. 33 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: teoria geral do processo a auxiliares da justiça. 19 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, p. 93.

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formação de litisconsórcio (art. 46, II e III), no reconhecimento de litispendência e

coisa julgada (art. 301, § 3º)34.

No dizer de Chiovenda35, a causa petendi resulta de todos estes elementos:

a) A afirmação da existência de uma relação jurídica (propriedade,

compra e venda, mútuo, locação, mandato e semelhantes).

b) A afirmação da existência do fato particular que, no âmbito

daquela relação jurídica, dá origem ao direito particular invocado (por

exemplo: na ação em que pleiteia o pagamento duma prestação de

juros ou de aluguel, o vencimento da prestação; na actio mandati

contraria, determinada operação em execução do mandato, pela qual

se requer reembolso ou compensação; na ação de rescisão por

lesão, o preço inferior à metade do ajustado).

c) A afirmação da existência do fato de que decorre o interesse de

agir (inadimplemento, fato determinante da incerteza na ação

declaratória).

Para configuração da causa de pedir, deve haver afirmação de todos estes

fatos, possibilitando ao juiz externar uma providência jurisdicional favorável

condizente com o pedido formulado pelo autor.

A causa de pedir (causa petendi) ou razão do pedido significa,

resumidamente, o conjunto de fundamento levados pelo autor a juízo, constituído

pelos fatos e pelo fundamento jurídico a eles aplicável. [...] Portanto, a causa de

pedir é o motivo em virtude do qual a parte autora dirige determinado pedido ao

Poder Judiciário36.

1.6 CONDIÇÕES OU REQUISITOS DA AÇÃO

Considera-se como condições ou requisitos da ação as condições

necessárias para que o juiz autue e declare existente o direito material objetivo,

34 SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil: processo de conhecimento. 12 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 428-429. 35 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. Campinas: Bookseller, 1998, p. 434. 36 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 128-129.

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consistindo no direito a um provimento jurisdicional favorável, que para melhor

compreensão, segue abaixo explicitado cada uma delas37.

Conforme salienta Bueno38:

No sistema processual civil brasileiro, há três grandes categorias de

sistematização que, embora inter-relacionadas, não se confundem. A

primeira delas diz respeito à ação (sua existência); a segunda diz

respeito ao processo (sua existência e validade); a terceira diz

respeito a saber quem tem e quem não tem razão sobre o conflito de

interesses levados ao Judiciário para resolução, isto é, sobre se

existe, ou não, o direito que se firma lesionado ou ameaçado. Estas

três categorias correspondem, respectivamente, às condições da

ação, aos pressupostos processuais e ao mérito.

Nas linhas de Gonçalves39, condições da ação: “São aquelas necessárias

para a própria existência da ação. A sua ausência deve ser conhecida pelo juiz de

ofício e a qualquer tempo, implicando a extinção do processo sem resolução de

mérito”.

Nas palavras de Câmara40, de simples afirmação que “as condições da ação,

como visto, são requisitos exigidos para que o processo possa levar a um

provimento final, de mérito. A ausência de qualquer uma delas leva a prolação de

sentença terminativa, ou seja, de sentença que não contém resolução do mérito da

causa, o que acarreta a chamada “extinção anômala do processo””.

A corrente minoritária entende que a chamada “condições” não seria o mais

correto a usar-se, pois não está diante de um evento futuro e incerto que se

subordina a eficácia de um ato jurídico, e sim preferível a designação requisitos do

provimento final.

37 Entendem-se como condições da ação as condições necessárias a que o juiz declare existente e atue a vontade concreta de lei invocada pelo autor, vale dizer, as condições necessárias para obter um pronunciamento favorável. Cf. CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. Campinas: Bookseller, 1998. v. I. p. 89. 38 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 356. 39 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil: teoria geral e processo de conhecimento (1ª parte). 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, v. I, p. 80. 40 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 16 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 128.

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Como se observa na definição exposta, “o pedido do autor, para merecer a

atenção do juiz, deve oferecer alguns requisitos, cuja falta autoriza o juiz a recusar-

lhe o conhecimento.41”

É de ressaltar que este entendimento é apartado dos demais doutrinadores

(corrente majoritária), que julga pelo tradicional “condições da ação”, como assevera

Levenhagen42 (1996, p.24), que estes “são requisitos imprescindíveis para o

ingresso em juízo, tanto se trate de jurisdição contenciosa como voluntária, e devem

ser atendidos tanto por quem pretende ajuizar a ação (autor) como pelos que devam

contestá-la (réus) ou por terceiros, que nela pretendam ingressar como

intervenientes (assistente, opoente), assim como pelos interessados, em se tratando

de jurisdição voluntária”.

Desta forma, seja qual for a parte, deve a ação estar revestida com os

requisitos para sua propositura, impedindo que seja desconstituído do pólo judicial

por falta de uma das condições da ação, designado como “carência de ação”.

O detentor do direito da ação, para que o juiz venha analisar seu pedido, deve

demonstrar quando é que este nasceu, e o julgador deve analisar as circunstâncias

práticas. Colhe-se do ensinamento de Calamandrei43:

Mas qual é o momento em que este direito de ação, que tende a se

extinguir na providência – Condições ou requisitos da ação –

jurisdicional, pode-se considerar nascido? Quais são as

circunstâncias práticas... a fim de que surja em concreto o direito de

ação? Ou seja... quais são as circunstâncias práticas que se devem

verificar a fim da que o juiz pronuncie uma providência jurisdicional

favorável...? Para responder a estas perguntas, a doutrina tem

classificado tais circunstâncias sob a denominação de condições da

ação ou de requisitos da ação que, com maior exatidão ainda, podem

ser denominadas de requisitos constitutivos, para fazer compreender

41 LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o processo civil brasileiro. São Paulo: Bestbook, 2004, p.93. 42 LEVENHAGEN, Antonio José de Souza. Comentários ao código de processo civil. 4. ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 1996, p. 24. 43 CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil: estudos sobre o processo civil. Campinas: Bookseller, 1999, p. 206-207.

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que sem eles o direito de ação (entendido como direito à providência

favorável) não nasce44...

Ao receber a petitio, o julgador deve analisar com cautela estar presentes os

requisitos constitutivos ou ainda os requisitos da ação, que no entender do

doutrinador supra, parece ser esta denominação a mais acertada, a fim de que ao

final do desenrolar processual possa vir a se pronunciar uma providência

jurisdicional, independentemente de ser favorável ou contrário aos interesses da

parte.

Ao desenvolver seu estudo sobre o tema, Wagner Junior45 propõe o seguinte:

Para se atingir a plenitude da prestação jurisdicional, o que se dará

somente com a solução de mérito, é necessário que a lide seja

deduzida em juízo com a observância de alguns requisitos básicos,

sob pena do órgão jurisdicional não enfrentar o litígio, deixando as

partes de receber uma solução que componha definitivamente o

conflito de interesses.

É indispensável à constatação dos requisitos da ação, que sem os quais

(possibilidade jurídica do pedido, legitimidade das partes e interesse processual)

torna impossível a obtenção de uma providência Estatal capaz de dispor de uma

decisão válida e fundada de eficácia.

Segundo Marques46:

Trata-se de condições indeclináveis para a admissibilidade da tutela

jurisdicional e que se ligam intimamente à pretensão deduzida em

juízo. Ausente uma delas, o Estado não prestará essa tutela,

porquanto, em tal hipótese, ainda que exista litígio configurável

juridicamente, o juiz não o poderá solucionar.

44 Para ter-se como base no desenvolver deste trabalho, será adotada aqui a tese de Piero Calamandrei, que trata a “condição da ação” como requisitos da ação, por crer ser o mais acertado, uma vez que não refere-se a uma condição de validade futura, para fazer compreender que sem eles o direito de ação não nasce, sendo nescessário que o órgão se convença de que tal direito existe concretamente, e não está submisso a uma condição futura. 45 WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme da Costa. Processo civil – curso completo. 3 ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 102. 46 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. 9 ed. Campinas – SP: Millennium Editora Ltda., 2003, v. I, p. 241.

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Assim, os requisitos da ação são indispensáveis a qualquer demanda judicial,

seja de jurisdição voluntária ou contenciosa.

1.7 POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO

Esse requisito, de tal sorte, consiste na prévia verificação que incumbe ao juiz

fazer sobre a viabilidade jurídica da pretensão deduzida pela parte em face do direito

positivo em vigor. O exame realiza-se, assim, abstrata e idealmente, diante do

ordenamento jurídico47.

Ao ingressar com um pedido perante o Judiciário, este passa por aferição ao

ponto de ver satisfeito os requisitos da ação, ensejando congruência entre os fatos o

pedido e a causa de pedir, a qual entre elas está a possibilidade jurídica do pedido.

Sobre a possibilidade jurídica do pedido, escreve Grinover48:

Às vezes, determinado pedido não tem a menor condição de ser

apreciado pelo Poder Judiciário, porque já excluído a priori pelo

ordenamento jurídico sem qualquer consideração das peculiaridades

do caso concreto. Nos países em que não há o divórcio, será

juridicamente impossível um pedido de sentença com o efeito de dar

às partes o status de divorciado; essa demanda será desde logo

repelida, sem que o juiz chegue a considerar quaisquer alegações

feitas pelo autor e independentemente mesmo da prova dessas

alegações.

Desta forma, é de extrema importância, para que a ação apresente-se viável,

que o pedido postulado esteja dentro do alcance do direito objetivo (pois consiste na

formulação de uma pretensão existente na ordem jurídica positivada), havendo

cobertura normativa, sem a qual tornará impossível a tutela jurisdicional.

Consoante estudo de Wagner Junior49:

47 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 63. 48 GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria geral do processo. 23 ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 274. 49 WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme da Costa. Processo civil – curso completo. 3 ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 113-114.

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Aquele que ajuíza uma demanda precisa deduzir um pedido que, ao

menos em tese, ou melhor, abstratamente, esteja previsto a admitido

no ordenamento. Raciocínio contrário nos traz a idéia de que o

magistrado está impedido de tutelar providências vedadas em lei.

Trata-se de condição indeclinável, sem a qual o juiz não poderá efetuar a

entrega da prestação jurisdicional se ausente o pressuposto processual, como

preceitua o artigo 295, parágrafo único, inciso III, do Código de Processo Civil

Brasileiro50.

Em conseqüência ao requisito “ninguém pode invocar a tutela jurisdicional

formulando pedido não admitido no direito objetivo51.”

Nesse diapasão leciona Câmara52:

Esse requisito deve ser verificado por um critério negativo, ou seja,

deve-se buscar determinar os casos em que o mesmo está ausente.

Assim é que se deve considerar juridicamente impossível a demanda

quando o pedido ou a causa de pedir sejam vedados pelo

ordenamento jurídico, não podendo o Estado-juiz, ainda que os fatos

narrados na inicial tenham efetivamente ocorrido, prestar a tutela

jurisdicional pretendida.

Inerente ao texto supra citado, é de trazer ainda à baila o seguinte exemplo:

na hipótese de ação para cobrança de dívida de jogo, quando juridicamente inviável,

posto não haver amparo no mundo jurídico para tal possibilidade de cobrança,

ausente o requisito da ação, ao receber o julgador deverá indeferi-la de plano, ante a

inexistência do pressuposto processual53.

50 Art. 295, parágrafo único. III – o pedido for juridicamente impossível. BRASIL. Código de processo civil. 51 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. 9 ed. Campinas – SP: Millennium Editora Ltda., 2003, v. I, p. 244. 52 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 16 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 134. 53 Sobre o tema, importa aqui trazer a lição de José Frederico Marques, nos seguintes termos: “De tal gravidade é a falta dessa condição do ius actionis que o art. 295, parágrafo único, do Código de Processo Civil considera inepta a petição inicial quando “o pedido for juridicamente impossível”. Cf. MARQUES, José Frederico. Manual de Direito Processual Civil. 9 ed. Campinas – SP: Millennium Editora Ltda., 2003. v. I. p. 244.

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A possibilidade jurídica do pedido não leva em consideração o fato de o autor

ter ou não razão naquilo que pede, “mas tão-somente se aquela pretensão, em

abstrato, pode ser conferida pelo Poder Judiciário54.” Pedido possível é aquele que

encontra respaldo no ordenamento jurídico.

Não obstante, o autor, ao ter o pedido indeferido, não está impedido de

ingressar com nova ação, desde que esteja fundado em um fato novo - com provas

que demonstrem a relação jurídica entre as partes - que por sua vez venha estar

prescrito em lei55.

Veja-se nesse sentido extrato da jurisprudência:

A extinção do processo com fundamento em impossibilidade jurídica

do pedido não obsta a que o autor venha posteriormente renova-lo

em juízo, nos moldes preconizados pelo art. 268, do CPC, sendo de

assinalar-se, a titulo de justificativa, que uma determinada pretensão

pode, em certo momento, não encontrar respaldo no ordenamento

jurídico e o mesmo não se verificar após o transcurso de certo

tempo, em virtude de alterações legislativas ou da própria evolução

do entendimento jurisprudencial.(STJ – 4ª T., REsp 25297, Rel. Min.

Sálvio de Figueiredo).

É de se frisar que, independentemente de haver o autor sua pretensão

indeferida, poderá este ingressar novamente em juízo para haver sua obrigação

adimplida. Ensina Wagner Junior56:

Recorda-se que a distinção entre a impossibilidade jurídica do pedido

e a improcedência da ação traz importante reflexo para o futuro do

processo de maneira que, extinto o feito sem julgamento de mérito

(reconhecida à impossibilidade jurídica do pedido) será admissível

repropositura da ação em razão do caso alcançar, apenas, a coisa

54 BARROSO, Darlan. Manual de direito processual civil: teoria geral e processo de conhecimento. 2 ed. ampl. e atual. Barueri – SP: Manole, 2007, p. 94. 55 Nesse ponto, assevera Guiseppe Chiovenda: “Se nega, ao revés, a ação por ausência de uma vontade de lei que assegure um bem, a absolvição do réu é completa e definitiva: é o máximo que se concede ao réu. O autor, neste caso, não poderá mais agir, a não ser que prove que a vontade de lei, antes inexistente, surgiu apoiada num fato novo. Cf. CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. Campinas: Bookseller, 1998. v. I. p. 90. 56 WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme da Costa. Processo civil – curso completo. 3 ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p.114.

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26

julgada formal, ao passo que a declaração de improcedência impede

posterior discussão sobre o mesmo pedido, dada a coisa julgada

material que irá se formar.

Levenhagen57, para melhor fixação quanto à necessidade da presença da

possibilidade jurídica do pedido, prescreve:

(...) a possibilidade jurídica do pedido, isto é, o pedido da tutela

jurisdicional deve ter por objeto uma pretensão, um interesse que

legalmente mereça aquela tutela, porque é assegurado, é previsto

em lei. No caso do divórcio, por exemplo, o cônjuge que o

pretendesse antes de sua admissibilidade na legislação brasileira,

não podia ajuizar a competente ação, embora reunisse as demais

condições que o credenciassem a requerer a tutela jurisdicional,

porque tal pretensão não tinha apoio em lei.

Conforme salienta Calamandrei58, deve haver relação e ou nexo, entre o fato

e a norma, verificando sua real possibilidade de existir, e sua ocorrência perante

uma norma jurídica concreta:

O primeiro requisito, o qual se denomina relação entre fato e a

norma, consiste numa certa situação objetiva – Relação entre fato

específico e normas – de coincidência (ou excepcionalmente, de não

coincidência), que deve se verificar na realidade entre os fatos

concretamente ocorridos e os fatos considerados como possíveis por

uma norma jurídica; numa certa situação objetiva de coincidência,

poderia se dizer também, entre o fato específico real e um fato

específico legal.

Não basta somente a ocorrência do fato causador do dano, requer este estar

regrado no mundo jurídico daquele país, ou local determinado, que por razões

57 LEVENHAGEN, Antonio José de Souza. Comentários ao código de processo civil. 4. ed. São Paulo: Editora Atlas, 1996, p. 23. 58 CALAMANDREI, Piero. Direito processual civil: estudos sobre o processo civil. Campinas: Bookseller, 1999, p. 208.

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jurídicas, poderá ser restaurado ao seu status quo ante através de uma prestação

jurisdicional ou continuará a permanecer da mesma forma, sem a tutela específica.

Constitui a possibilidade jurídica do pedido, segundo Liebman, na

“possibilidade para o juiz, na ordem jurídica à qual pertence, de pronunciar a espécie

de decisão pedida pelo autor.” (LIEBMAN, 2004, p. 93). Ao magistrado deve haver a

possibilidade de exarar uma decisão, incidindo o pedido à norma concreta que está

subordinado.

Já decidiu o Superior Tribunal de Justiça que: “Por possibilidade jurídica do

pedido entende-se a admissibilidade da pretensão perante o ordenamento jurídico,

ou seja, previsão ou ausência da vedação, no direito vigente, do que se postula na

causa.”59

Sobre o assunto, observa Greco Filho60:

Cabe observar que a rejeição da ação por falta de possibilidade

jurídica deve limitar-se às hipóteses claramente vedadas, não sendo

o caso de se impedir a ação quando o fundamento for injurídico, pois,

se o direito não protege determinado interesse, isso significa que a

ação deve ser julgada improcedente e não o autor carecedor de

ação.

Assim, na ocorrência do indeferimento do pedido com base neste requisito,

deve ser claro quanto ser a petitio carecedora da ação, por estar ausente ou vedado

sua admissibilidade perante o ordenamento jurídico pátrio, excluindo o Poder

Judiciário da sua apreciação de mérito.

Desta forma, “indica-se a exigência de que deve existir, abstratamente, dentro

do ordenamento jurídico, um tipo de providência como a que se pede através da

ação.”61

1.8 INTERESSE DE AGIR

59 REsp 1678, 4ª T., Rel. Min. Sálvio de Figueiredo. 60 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: teoria geral do processo a auxiliares da justiça. 20 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 90. 61 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 63.

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28

O interesse de agir, que é real e secundário, surge da necessidade de obter

através do processo a proteção ao interesse substancial violado. Entende-se dessa

maneira que há interesse processual se a parte sofre um prejuízo, não propondo a

demanda, e daí resulta que, para evitar esse prejuízo, necessita exatamente da

intervenção dos órgãos jurisdicionais. Localiza-se assim o interesse processual não

apenas na utilidade, mas também especificamente na necessidade do processo

como remédio apto à aplicação do direito objetivo no caso concreto, pois a tutela

jurisdicional não é jamais outorgada sem uma necessidade, como adverte Allorio62.

O interesse processual, a um só tempo, haverá de traduzir-se numa relação

de necessidade e também numa relação de adequação do provimento postulado,

diante do conflito de direito material trazido à solução judicial63.

Assevera Barroso que: “o interesse de agir compreende a necessidade e

utilidade do provimento jurisdicional pleiteado.64”

Nesse contexto, inerente é ao pedido haver a parte interessada o interesse de

agir perante o órgão jurisdicional, exigindo que este venha assegurar um direito seu

violado, garantido seja por um interesse econômico ou moral, que será verificado o

binômio necessidade e adequação em cada caso concreto.

Nesse ponto, extrai-se dos estudos de Dinamarco e Grinover65:

Essa condição da ação assenta-se na premissa de que, tendo

embora o Estado o interesse no exercício da jurisdição (função

indispensável para manter a paz e a ordem na sociedade), não lhe

convém acionar o aparato judiciário sem que dessa atividade se

possa extrair algum resultado útil. É preciso, pois, sob esse prisma,

que, em cada caso concreto, a prestação jurisdicional solicitada seja

necessária e adequada.

Sob este enfoque, o magistrado, ao debruçar-se sobre a pretensão aludida

pelo autor, necessário se faz à profunda análise de ter ou não a parte a necessidade

62 ALLORIO, Enrico. Problemas de derecho procesal. Buenos Aires: Ediciones Jurídicas Europa-América, 1963, t. II, nº 37, p. 290. 63 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 66. 64 BARROSO, Darlan. Manual de direito processual civil: teoria geral e processo de conhecimento. 2 ed. ampl. e atual. Barueri – SP: Manole, 2007, p. 93. 65 DINAMARCO, Cândido Rangel; GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria geral do processo. 23 ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 275.

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da intervenção estatal com fito de obter a tutela jurisdicional pleiteada; assim, terá

nexo o pedido quando configurado seu direito material, que não pode ser realizado

sem a real intervenção do juiz66.

Gaio Júnior (2008, p. 67), propõe a seguinte definição quanto à necessidade e

adequação:

Quanto à necessidade, significa ela, a exigência de se ter aquela

tutela jurisdicional do Estado para a satisfação de um direito material

tiver sido ameaçado ou efetivamente violado... . A adequação, por

sua vez, está relacionada ao pedido apresentado em juízo, ou seja,

aquilo que se pede deverá estar adequado ao direito necessitado

pelo cidadão, autor da ação...

Todavia, uma vez negada a ação por ausentes os requisitos de necessidade

e adequação, não quer dizer que não possa ser intentada novamente com um novo

fundamento, pois o direito à ação pode vir nascer posteriormente à prolação da

sentença denegatória do pedido, como assentado no art. 267, inciso VI, do Código

de Processo Civil Brasileiro6768.

Desta forma, havendo em qualquer momento a violação de um direito objetivo

material, há nesse feixe o interesse processual, podendo o autor vir a juízo requerer

dos órgãos do judiciário a tutela pretendida, sendo este o único caminho, sua

aplicação em face daquele opositor69.

66 “No que diz respeito ao interesse de agir, este repousa no binômio necessidade+adequação. A parte tem “necessidade” quando seu direito material não pode ser realizado sem a intervenção do juiz. Contudo, além da “necessidade”, exige-se a “adequação”. Se a parte requer providência jurisdicional incapaz de remediar a situação por ela narrada na fundamentação de seu pedido, também falta o interesse de agir”. Cf. MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Manual do processo de conhecimento. 4a ed. São Paulo: RT, 2005. p. 62. 67 Art. 267, VI – quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual. BRASIL. Código de processo civil. 68 Segundo os ensinamentos de Chiovenda: “Se nega a ação por ausência de interesse, não nega que a ação possa vir a surgir relativamente ao próprio direito já deduzido na lide, quer dizer, com fundamento num interesse novo (por exemplo, nova lesão de direito, recusa efetiva de adimplir). Cf. CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de Direito Processual Civil. Campinas: Bookseller, 1998. v. I. p. 89. 69 Segundo Nelson Nery Junior e Rosa Andrade Nery há interesse processual quando a parte necessita ir a juízo para alcançar a tutela pretendida, bem como quando essa tutela jurisdicional pode lhe trazer alguma utilidade do ponto de vista prático. “Verifica-se o interesse processual quando o direito tiver sido ameaçado ou efetivamente violado (e.g., pelo inadimplemento da prestação e resistência do réu à pretensão do autor)”. (in: Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante. 7 ed. São Paulo: RT, 2003. p. 629).

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A partir desta violação é que nasce ao autor o interesse de agir, que, nas

palavras de Wagner Junior70:

Pode ser entendido como a “relação de utilidade entre a afirmada

lesão de um direito e o provimento de tutela jurisdicional solicitado”.

Em outras palavras, poderíamos dizer que é a necessidade de se

socorrer ao judiciário para a proteção de interesse substancial, de

forma a se trabalhar com o binômio necessidade-adequação.

Corroborado o binômio, perfaz-se o autor de todo o direito em haver a entrega

da prestação jurisdicional pleiteada face a situação posta em juízo.

Pode-se “definir o interesse de agir como a “utilidade do provimento

jurisdicional pretendido pelo demandante.”71

Nesse sentido, assinala Levenhagen72:

É preciso, portanto, que haja, realmente, uma violação ou ameaça a

um direito, para que se caracterize o interesse de agir que venha

justificar o ingresso em juízo. Se um credor, por exemplo, não tem,

ainda, o seu título de crédito vencido e se o devedor possui suficiente

patrimônio livre e desembaraçado, esse credor não terá interesse de

agir, para promover a cobrança judicial.

A não observância do direito objetivo implica na real necessidade de

intervenção do poder Estatal, que representa um remédio subsidiário que somente

atua na falta da voluntariedade do sujeito obrigado ao adimplemento da obrigação.

Assim, para fazer surgir em concreto o interesse processual, deve haver a

variação entre o conteúdo do direito substancial (que ficou insatisfeito) e a natureza

da providência jurisdicional (qual ele mesmo espera satisfação).

Calamandrei (1999, p. 217), na construção da sua tese, passa a dispor da

seguinte forma:

70 WAGNER JÚNIOR, Luiz Guilherme da Costa. Processo civil – curso completo. 3 ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Del Rey, 2009, p. 115. 71 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 16 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 26. 72 LEVENHAGEN, Antonio José de Souza. Comentários ao código de processo civil. 4. ed. São Paulo: Editora Atlas S.A., 1996, p. 23.

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O interesse processual surge, quando o bem ao qual o ator aspira já

não pode ser obtido de outra maneira senão por via judicial; a

obtenção deste bem deve se buscar normalmente e poderia se dizer

fisiologicamente, na prestação do obrigado; só em defeito desta

entra, para obter tal consecução, outro meio subsidiário que é a

ação. A fim de que surja o interesse processual, não basta que se

demonstre a existência de um interesse em conseguir um bem,

senão que é necessário, para satisfazer este interesse substancial,

que não se possa fazer uso do meio normal de não cumprimento e

deva se recorrer ao meio sucedâneo da ação.

O interesse processual é de extrema importância (quando há violação de um

direito e requer-se a solução, tornado ao status quo ante), todavia, não mais do que

naqueles casos onde se persegue uma providência jurisdicional pela existência de

um estado objetivo de inobservância do direito, onde se consegue remover somente

com uma providência de declaração (declaratória) ou de natureza constitutiva.

Aponta Liebman que o “interesse de agir existe, quando há para o autor

utilidade e necessidade de conseguir o recebimento do seu pedido, para obter, por

esse meio, a satisfação do interesse (material) que ficou insatisfeito pela atitude de

outra pessoa.”73

D’outro modo, quando não há interesse ameaçado ou o direito à tutela

jurisdicional não existe (não há relação entre fato e norma jurídica), cabe ao juiz

denegar o pedido, com fundamento de ser este inútil, antieconômico e ou ainda

dispersivo74.

Dispõe o artigo 3º do Código de Processo Civil onde: “Para propor ou

contestar ação é necessário ter interesse e legitimidade.”

Aferindo o magistrado não haver os requisitos exigidos por lei, deverá ex

officio indeferir o pleito, sob a égide de ausentes os requisitos da condição da ação.

73 LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o processo civil brasileiro. São Paulo: Bestbook, 2004, p. 94. 74 Incisivo em suas palavras, Liebman discorre que “Se não existe o conflito ou se o pedido do autor não é adequado para resolve-lo, o juiz deve recusar o exame do pedido como inútil, antieconômico e dispersivo.” Cf. LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Bestbook, 2004. p. 94.

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Nesse sentido, tem-se o precedente do Tribunal de Alçada do Rio Grande do

Sul, citado por Tesheiner75:

‘Comprovado que a companhia administradora de imóveis propôs a

ação de despejo em nome de pessoa falecida, correta se revela a

sentença que declara extinto o processo com apoio na regra do art.

267, IV, CPC, condenando o mandatário ao pagamento das custas e

honorários advocatícios’.

Uma vez não demonstrado o interesse processual, é dever tanto do julgador

quanto do interessado na causa, em pedir a extinção do processo, por ausentes os

requisitos da ação.

Em contrapartida, é dever das partes demonstrar o interesse na causa, tendo

a função jurisdicional caráter substituto necessário para restituir o direito violado,

sendo “vedada a “tutela de mão própria”, o “direito pelas próprias mãos”, a

“autotutela””76.

Averba Bueno77:

É o entender necessária a prestação jurisdicional para a proteção

adequada de um determinado bem da vida que alimenta a “ação”

que, como tal, forte nas razões do n.2, supra, dará início ao

processo, isto é, à atuação do Estado-juiz que prestará, ou não, a

tutela jurisdicional diante daquela afirmação.

Por isso, é o entender em que se deve haver fundado com tal veracidade os

requisitos processuais, acarretando em um provimento jurisdicional, da tutela

pretendida, ante a relação jurídica em apreço do judiciário.

1.9 LEGITIMIDADE AD CAUSAM

75 TESHEINER, José Maria Rosa. Pressupostos processuais e nulidade no processo civil. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 38. 76 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 366. 77 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 366.

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A legitimidade ad causam, ou legitimação para agir, constitui ser um título

abstrato que detem o titular da pretensão, sim, tanto autor como réu necessitam

apresentar-se legítimos em juízo78, sendo que, verificando o juiz ser uma das partes

ilegítimas para requerer a tutela jurisdicional, indeferirá o pedido invocando a

condição do artigo 267, inciso VI, do CPC: “quando não concorrer qualquer das

condições da ação ... a legitimidade das partes”.

Segundo Calamandrei79:

A fim de que o juiz possa tomar as providências correspondentes

àquela relação entre um fato específico concreto e a norma jurídica,

a respeito da qual viemos falando, não basta que tal relação exista

objetivamente, senão – Legitimação ativa e passiva – que é

necessário também que a demanda lhe seja apresentada por quem

se encontra diante daquele fato específico, na posição subjetiva que

se chama precisamente legitimação para atuar (ou legitimação ativa);

e que, por outra parte, a demanda seja proposta pelo ator contra um

adversário que se encontre, respeito daquele mesmo fato específico,

na posição subjetiva recíproca que se chama legitimação para

contradizer (ou legitimação passiva).

O pólo ativo quanto o passivo da demanda necessitam ter legitimação para

agir, quando se encontrarem ligados pela mesma causa, pelo mesmo fato específico

jurídico.

No dizer de Greco Filho80:

A legitimação, para ser regular, deve verificar-se no pólo ativo e no

pólo passivo da relação processual. O autor deve estar legitimado

para agir em relação ao objeto da demanda e deve ele propô-la

contra o outro pólo da relação jurídica discutida, ou seja, o réu deve

78 O Código de Processo Civil Brasileiro em seu artigo 6º traz a que “Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei.” ficando subentendido que às partes caberá ter legitimidade para agir em juízo, seja em defesa de direito seu ou de outrem. O legislador pátrio tomou o devido cuidado de acrescentar a possibilidade de haver por parte de terceiro interessado a autorização legal para intervir, como nos casos de menores incapazes ou ainda que de outra maneira impedidos judicialmente. 79 CALAMANDREI, Piero. Direito Processual Civil: estudos sobre o processo civil. Campinas: Bookseller, 1999, p. 210. 80 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil Brasileiro: teoria geral do processo a auxiliares da justiça. 20. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 81.

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ser aquele que, por força da ordem jurídica material, deve,

adequadamente, suportar as conseqüências da demanda.

Assim, aquela pessoa que é declarada idoneamente capaz pela lei é que

nutre o direito e a legitimidade para pleitear a tutela jurisdicional frente ao Estado,

para que sejam tomadas as providências cabíveis: restaurar, no caso concreto, o

direito violado.

Ainda, na definição de Chiovenda, “parte é aquele que demanda em seu

nome próprio (ou em cujo nome é demandada) a atuação de uma vontade da lei, e

aquele em face de quem essa atuação é demandada.”81

Outrossim, “é a relação de pertinência subjetiva entre o conflito trazido a juízo

e a qualidade para litigar a respeito dele, como demandante ou demandado. Tem de

haver uma correspondência lógica entre a causa posta em discussão e a qualidade

para estar em juízo litigando sobre ela.”82

Frente a isto, o julgador não pode contentar-se ao ver somente a relação

jurídica das partes, mas analisar a fundo, se possível, ou de outra maneira, se é de

fato a parte legítima para intentar o feito, especialmente qualificados para afirmar e

contradizer a respeito da matéria.

É a observação de Liebman83:

É a pertinência subjetiva da lide nas pessoas do autor e do réu, isto

é, o reconhecimento do autor e do réu, por parte da ordem jurídica,

como sendo as pessoas facultadas respectivamente a pedir e

contestar a providência que é objeto da demanda. ... Aquele a quem

a lei atribui esse poder e aquele em face de quem o pedido pode ser

feito é que são as pessoas legítimas.

É nesses moldes também o entendimento de Rios Gonçalves ao afirmar que

“a legitimidade deve existir tanto para o autor quanto para o réu, sob pena de

81 BARBI, Celso Agrícola. Comentários ao Código de Processo Civil. 10 ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 82. 82 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil: teoria geral e processo de conhecimento (1ª parte). 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 83. 83 LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o processo civil brasileiro. São Paulo: Bestbook, 2004, p. 95.

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carência da ação, pois ninguém pode ir a juízo, em nome próprio, postular ou

defender direito alheio (CPC, art. 6º).”84

Destarte, ao ajuizar a ação “o autor necessariamente afirma, em sua petição

inicial, a existência de uma relação jurídica, chamada res in iudicium deducta.”85

Assim, por exemplo, aquele que propõe “ação de divórcio” afirma existir, entre

ele e a parte adversa, uma relação matrimonial. Da mesma forma, aquele que

propõe “ação de despejo”, afirma existir entre ele e o réu uma relação de locação.

Por outro lado, o artigo 6º do Código de Processo Civil Brasileiro traz uma

exceção a regra geral, havendo a possibilidade de outrem pleitear direito que não

seja o próprio (legitimação extraordinária), mediante autorização judicial específica

ao caso concreto:

Art. 6º Ninguém poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio,

salvo quando autorizado por lei.

Nesse passo, salvo quando autorizado por lei, poderá o representante legal

propor a ação no nome deste que detem a real legitimidade em agir, mas que por

razões contrárias à sua vontade, está impossibilitado de exercer seu direito de ação.

Aponta a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973, em seu artigo 8º em relação

aos detentores de direito de ação, mas que estão impossibilitados de propô-la:

Art. 8º Os incapazes serão representados ou assistidos por seus

pais, tutores ou curadores, na forma da lei civil.

Quando verificado na relação jurídica, caso como este, a lei poderá autorizar

que seu responsável venha estar em juízo para propor ou contestar a ação,

passando para este a legitimidade ad causam.

Extrai-se dos estudos de Greco Filho86, onde a lei autorizará que outrem

venha demandar direito alheio ao seu:

84 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil: teoria geral e processo de conhecimento (1ª parte). 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 83. 85 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 16 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 129. 86 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: teoria geral do processo a auxiliares da justiça. 20 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 81.

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Há casos, porém, em que texto expresso de lei autorizará alguém

que não seja o sujeito da relação jurídica de direito material a

demandar. Nestes casos, diz-se que a legitimação é extraordinária.

Discorrendo sobre a legitimação extraordinária para a propositura da ação,

assevera Greco Filho que esta poderá ser exclusiva – quando decorrente de lei,

legitimar terceiro – ou concorrente – quando a lei admitir a ação proposta por

terceiro e também pelo legitimado ordinário ou extraordinário87.

Sobre o assunto, dispõe Grinover88:

Assim, em princípio, é titular da ação apenas a própria pessoa que

se diz titular do direito subjetivo material cuja tutela pede

(legitimidade ativa), podendo ser demandado apenas aquele que

seja titular da obrigação correspondente (legitimidade passiva).

Desta forma, em regra geral somente o titular da ação é quem pode

apresentar-se em juízo como o titular da demanda, mas como predispõe a lei, toda

regra à exceção.

Nesse passo, assevera Rios Gonçalves (2010, p. 84), em estudo Teoria Geral

e Processo de Conhecimento, na letra do texto:

Porém, em circunstâncias excepcionais, que decorrem de lei

expressa ou do sistema jurídico, admiti-se que alguém vá a juízo, em

nome próprio, para postular ou defender interesse alheio. Nesse

caso, aquele que figura como parte não é o titular do direito alegado,

e o titular não atua como sujeito processual.

Nestas breves linhas, denota-se então evidenciado o direito de representação

em juízo, e ou “substituição processual”, como denominado por Chiovenda, seja

87 Nesse passo, complementa o insigne processualista Vicente Greco Filho que “a legitimação extraordinária pode ser exclusiva ou concorrente. É exclusiva quando a lei, atribuindo legitimidade a um terceiro, elimina a do sujeito da relação jurídica que seria o legitimado ordinário; é concorrente quando a lei admite a ação proposta pelo terceiro e também pelo legitimado ordinário alternativamente ou ainda por mais de um legitimado, ordinário ou extraordinário. Cf. GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: teoria geral do processo a auxiliares da justiça. 20 ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 82. 88 GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria geral do processo. 23 ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 276.

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para postular ou defender interesses todavia, prevalece à máxima de que somente é

parte legítima aquele que detem de fato o direito para estar pleiteando a tutela

jurisdicional frente ao Estado juiz, sob pena de restar, indeferido o pedido por

carência de ação, ou ser impedido de defender os interesses diversos ao seu.

Observa Bueno89,no tocante a legitimidade das partes, in verbis:

As partes, isto é, o autor e o réu – e isto vale para eventuais terceiros

também, isto é, todos aqueles que não forem autor ou réu -, para

estarem em juízo e, a final, receberem tutela jurisdicional, precisam

estar “legitimadas” em dois planos distintos. No plano do próprio

processo e no plano do direito de ação. Aqui, precisam preencher

uma condição da ação – a chamada “legitimidade para a causa”; lá,

no plano do processo, precisam observar os pressupostos

processuais referentes às partes, muitas vezes amalgamados sob a

denominação “legitimidade processual”.

Nesse norte, necessário é de se fazer presente o requisito da ação

(legitimidade para a causa), para haver deferido uma tutela jurisdicional favorável,

que independe de ser a real parte legítima ou, no entanto, seu substituto processual.

É importante ainda afirmar não ser este vício convalidado no caso do julgador

não observar e deixar passar in albis o prazo para impugnação que, todavia, pode

ser alegada tardiamente. Assevera Bueno90:

Se o vício for relativo ao autor, o processo será declarado nulo; se

relativo ao réu, o processo correrá à sua revelia e, na hipótese de a

falta de pressuposto processual ser relativa ao terceiro, assim

considerado, especificamente, o assistente [...], será ele excluído do

processo.

Assim, tanto o autor quanto o réu devem apresentar-se legítimos para propor

e contradizer a demanda, não ficando impunes de haver o pleito indeferido por

89 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 409. 90 BUENO, Cássio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 409.

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ausência das condições basilares da ação, que a qualquer momento poderá ser

declarada.

Estes são, pois, os requisitos que devem preencher a lide para poder ser

julgada, porque sem eles a ação estará mal proposta e não oferecerá as garantias

de uma solução justa e adequada do conflito de interesses, para cuja eliminação se

invocou a autoridade da lei e a sabedoria do poder judiciário. Recebem o nome de

condições da ação, porque são verdadeiras condições de existência da ação,

requisitos cuja falta produz a carência de ação91.

Nesse passo, vistos os requisitos que deverão se fundar a ação, passa se a

análise das sentenças e da coisa julgada, elemento indispensável para a

desconstituição da coisa julgada.

91 LIEBMAN, Enrico Tullio. Estudos sobre o processo civil brasileiro. São Paulo: Bestbook, 2004, p. 95-96.

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CAPÍTULO 2

SENTENÇA E COISA JULGADA

2.1 SENTENÇA: CONCEITO

Conforme a Lei 11.232/2005, sentença passou a ser definida como o ato do

juiz que implica alguma das situações previstas no art. 267 ou no art. 269 (nova

redação do art. 162, § 1.º). O art. 267 trata da “extinção” do processo sem

julgamento (“resolução”) de mérito. O art. 269 trata das hipóteses de julgamento

(“resolução”) do mérito – sem mais aludir à extinção do processo92.

Assim, antes da reforma, dispunha o § 1º deste artigo que sentença era o ato

pelo qual o juiz punha termo (fim) ao processo, decidindo ou não o mérito da causa.

Após a reforma, passa a dizer que “Sentença é o ato do juiz que implica alguma das

situações previstas nos arts. 267 e 269 desta Lei”93.

Desta forma, referir-se a sentença como ato que põe fim ao processo tornou-

se alvo de críticas de diversos doutrinadores, tanto que, como alude Wambier, é

uma tautologia, ou seja, um raciocínio circular. Acertado é o posicionamento, no

sentido de que a extinção dá-se ao procedimento cognitivo em primeiro grau, e não

ao processo em si, sendo que este continua nas instâncias superiores do judiciário94.

Nos termos da definição contida no art. 162, § 1º, sentença é o ato do juiz que

implica algumas das situações previstas nos arts. 267 e 269. Com essa definição, o

92 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 498. 93 ALVIM, J. E. Carreira. Cumprimento da sentença. 4. ed. Curitiba: Juruá, 2008, p. 13. 94 Wambier, contribuindo com sua parcela de enriquecimento à doutrina jurídica brasileira, ao abordar o conceito de sentença, traz o entendimento de “Dizer-se que a sentença é o ato do juiz que põe fim ao procedimento em primeiro grau de jurisdição é uma tautologia, ou seja, um raciocínio circular.”, onde continua a dizer que “Além disso, havia autores que criticavam, com razão, a técnica redacional dos arts. 267 e 269 (este, na sua redação original, anterior à Lei 11.232/2005), pois que aludem à extinção do processo, quando, na verdade, o que se extingue é o procedimento cognitivo em primeiro grau.” Cf. WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. 9 ed. São Paulo: RT, 2007, p. 496-497., não albergando dúvidas da errônea disposição do artigo 162, §1º, ao citar que a sentença é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo.

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Código optou por conceituar sentença por seu conteúdo, referindo as situações de

extinção do processo sem resolução do mérito e as de resolução do mérito95.

Propõe Santos96 ao discorrer sobre os atos do juiz: “a sentença é o ato

culminante do processo. Proferindo-a, o juiz dá cumprimento à obrigação

jurisdicional do Estado. Por ela se esgota a função do juiz”.

Como ato do juiz, a sentença é o ato que determina o fim do processo, que na

forma estatal é a entrega da prestação jurisdicional pelo Estado, cumprindo com sua

obrigação aos litigantes.

2.2 SENTENÇAS PROCESSUAIS TÍPICAS E O ART. 267 DO CPC

São sentenças processuais típicas as que se referem a pressupostos

processuais e condições da ação (Arts. 47, 265 § 2°, 267 IV; V; e VI do CPC), sendo

todas as demais atípicas.

Toda sentença que tiver por conteúdo um dos itens acima listados será uma

sentença processual típica, sendo todas as outras, porque essencialmente desta

diferentes, sentenças processuais atípicas97.

O inciso I, do art. 267 do CPC, que determina como sentença o ato do juiz

que declara a inépcia da inicial, refere-se ao momento, podendo ser o processo

extinto posteriormente, também sem julgamento de mérito, mas não pelo

indeferimento da inicial.

O inciso I, do art. 295 do CPC, abrange uma condição da ação (art. 267 IV),

pois a inépcia da inicial equivale à impossibilidade jurídica do pedido e a um

pressuposto processual de validade, pois a ausência de pedido implica a inépcia da

inicial.

A situação do inc. V, do art. 295 do CPC e art. 269 (inciso IV) dá causa à

extinção do processo por sentença sem julgamento de mérito. A escolha do rito

processual pela parte, em discordância com o que dispõe o Código de Processo

Civil, é caso de extinção do processo sem julgamento de mérito, pois o rito não é

estabelecido para a comodidade da parte, mas em função da aceleração e 95 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: atos processuais a recursos e processos nos tribunais. 18 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, v. 2, p. 257. 96 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 03. 97 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 499.

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otimização da prestação jurisdicional. A lei expressamente prevê os casos onde se é

possível à modificação, o que na ausência de previsão é vedada.

2.3 SENTENÇAS PROCESSUAIS ATÍPICAS E O ART. 267 DO CPC

As sentenças processuais atípicas do art. 267 do CPC são aquelas que

abordam a perempção da instância (art. 267, II do CPC), o abandono da causa por

mais de trinta dias (art. 267, III do CPC), da perempção (art. 267, V do CPC), da

convenção arbitral (art. 267, VII do CPC), da desistência da ação (art. 267, VIII do

CPC)98.

Em tais casos, a decisão não resolve a lide, logo, é admissível a repetição da

ação desde que se corrija o defeito que levou à extinção99.

Assim, analisando o art. 267 do Código de Processo Civil em cotejo com a

definição de sentenças processuais típicas e atípicas, o que a define ser atípica é

que em nenhum desses casos o fato gerador, ou a definição da causa, é ato do juiz,

e sim provém de ato da parte.

São sentenças em que o juiz “extingue” o processo sem julgamento de

mérito, mas não pela falta de pressupostos processuais ou condições da ação, ou

pela existência de pressupostos processuais negativos100.

As chamadas sentenças processuais atípicas são as que não determinam a

extinção do processo por falta de pressupostos processuais ou carência de ação.

Daí por que, “o juiz se limita a extinguir o processo, sem se pronunciar a

respeito do mérito; o processo terá fim anormal”101.

Nem sempre, portanto, a extinção do processo resulta de julgamento, pois as

próprias partes também podem provocar esse desfecho, subtraindo a solução da

lide ou a mera extinção do processo à intervenção do Estado102.

98 http://jusvi.com/artigos/27190 99 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: atos processuais a recursos e processos nos tribunais. 20. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, v. 2, p. 68. 100 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 502. 101 ARAGÃO, Egas Dirceu Moniz de. Comentários ao código de processo civil (lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973). 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1998, v. 2, p. 374. 102 ARAGÃO, Egas Dirceu Moniz de. Comentários ao código de processo civil (lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973). 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1998, v. 2, p. 378.

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2.3.1 Perempção de Instância

Após a instauração do processo por iniciativa da parte, compete ao juiz dar-

lhe o impulso necessário para que alcance o seu final. Porém, muitos atos

dependem das partes, por determinação do juiz ou imposição legal. Normalmente

parte do autor o desinteresse que trata este inciso, pois normalmente o réu

percebendo o virtual desinteresse do autor silencia103.

Ocorrerá quando o processo ficar parado durante mais de um ano, por

negligência das partes.

O momento inicial desse prazo corresponde à data do último ato realizado,

seja qual for, sendo irrelevante a sua autoria, se das partes ou de qualquer outro

dentre os figurantes do processo104.

Nesse diapasão, colhem-se ensinamentos de Greco Filho105:

O principal interessado em dar andamento ao processo é o autor, o

qual pode negligenciar sua condução sem que com isso o réu se

importe e peça providências. Nesse caso, o desinteresse é bilateral,

devendo o juiz extinguir o processo após mandar intimar

pessoalmente para que supra a falta em 48 horas. [...] Se tal não

ocorrer, deve o juiz decretar a extinção, independentemente dos

motivos que levaram ao abandono.

A negligência resulta, portanto, de ambas as partes tolerarem que nenhum

ato seja praticado ao longo do ano, sem reclamarem o prosseguimento da marcha

do processo106.

Quando o desenvolvimento processual depender de uma das partes, e

deixando esta de dar o devido impulso, ficando parado por mais de um ano,

presumir-se-á negligência das partes, extinguindo o processo em desrespeito ao seu

dever de colaboração com a justiça.

103 FRIEDE, Reis. Comentários ao código de processo civil. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997, v. 3, p. 1.384 - 1.385. 104 ARAGÃO, Egas Dirceu Moniz de. Comentários ao código de processo civil (lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973). 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1998, v. 2, p. 382. 105 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: atos processuais a recursos e processos nos tribunais. 20. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, v. 2, p. 69. 106 ARAGÃO, Egas Dirceu Moniz de. Comentários ao código de processo civil (lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973). 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 1998, v. 2, p. 382.

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2.3.2 Abandono da Causa por mais de 30 Dias

A inércia das partes diante dos deveres e ônus processuais, acarretando a

paralisação do processo, faz presumir desistência da pretensão à tutela jurisdicional.

Equivale ao desaparecimento do interesse, que é condição para o regular exercício

do direito de ação107.

É o entendimento de Wambier108: “ficando o autor inerte, por trinta dias, e

havendo o pedido do réu, o juiz deve intimá-lo a manifestar-se dentro em 48 horas. Não

havendo manifestação, o juiz “extinguirá” o processo sem resolver-lhe o mérito”.

Para que não haja extinção do processo, cabe as partes estar exercendo

seus direitos e deveres inerentes ao processo (atos e diligências), possibilitando ao

julgador prestar uma tutela jurisdicional eficaz.

A extinção, de que ora se cuida, pode dar-se por provocação da parte ou do

Ministério Público, e, ainda, pode ser decretada de ofício pelo juiz109.

Assim, se o juiz, valendo-se de seu poder de instrução (art. 130 do CPC),

determinar a produção de perícia, cujo custeio ficará a cargo do autor (art. 33 do

CPC), marcará prazo para que este deposite os honorários provisórios do perito.

Desatendido o prazo, deverá aguardar o prazo de trinta dias, como exige a lei, para

que se caracterize o abandono do processo, não podendo extingui-lo tão logo o

prazo tenha decorrido110.

O juiz, passado o prazo de trinta dias, intimará o autor para que supra a falta,

que desta feita não havendo obediência à determinação judicial, extinguirá o

processo sem julgamento de mérito.

O abandono é uma forma de desistência tácita, de modo que, se o réu

desejar, pode pedir que o processo continue mesmo com a desistência expressa ou

abandono, até a sentença de mérito111.

Em decorrência ao princípio da economia processual, ante a demora do autor

após transcorridos trinta dias, mesmo havendo o réu já peticionado em favor da 107 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 342. 108 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 503. 109 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 342. 110 BURNIER JÚNIOR, João Penido. Curso de direito processual civil. Campinas – SP: Copola, 2000, p. 574. 111 BURNIER JÚNIOR, João Penido. Curso de direito processual civil. Campinas – SP: Copola, 2000, p. 574.

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extinção da lide, poderá o juiz deixar de decretar a extinção, com o comparecimento

do autor com uma justificativa plausível, podendo conceder assim o juiz prazo

adicional para que se cumpra a diligência112.

Desta forma, tem-se que: “Extingue-se o processo, sem resolução do mérito:

[...] quando, por não promover os atos e diligências que lhe competir, o autor

abandonar a causa por mais de 30 (trinta) dias”113.

2.3.3 Perempção

Perempção é a extinção do direito de petição do autor em relação a

determinada pretensão. Pela perempção, a pretensão continua existindo, mas

deixou de ser invocável em juízo114.

Nesse sentido, colhe-se dos estudos de Wambier115:

Para que haja perempção, é necessário que o processo se “extinga”

sem julgamento de mérito, por três vezes, pelo fato de o autor ter

abandonado o processo por mais de trinta dias, por não ter

promovido as diligências que lhe competiam, para que a mesma

ação não possa ser intentada “de novo”, e não para que não se

possa intentar nova ação com o mesmo objetivo.

O autor, nesse caso, ficará impedido de propor nova demanda idêntica a

anterior, todavia, em havendo modificação na peça processual, do pedido ou da

causa de pedir, e por mais que tenha por fim colimado o mesmo objetivo, não estará

o julgador impedido de pronunciar-se, cabendo emitir a tutela jurisdicional pleiteada.

112 Assevera Burnier Júnior que “decorridos os trinta dias, diante do requerimento do réu o juiz poderá deixar de decretar a extinção se o autor, comparecendo, justificar a demora, admitindo-se, até, a concessão de prazo adicional para que se cumpra a diligência, se houver razão relevante. O princípio da economia impõe que se aproveite o processo se há possibilidade de prosseguir e, em especial, se o autor revelou que não tem a intenção de abandonar.”, desta forma, em razão deste princípio, deverá, se possível, o juiz aproveitar o processo, evitando que haja extinção sem exame do mérito da causa, que propiciará ao autor entrar novamente com o mesmo pedido. Cf. BURNIER JÚNIOR, João Penido. Curso de direito processual civil. Campinas – SP: Copola, 2000, p. 574. 113 BRASIL. Código de processo civil. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 61. 114 BURNIER JÚNIOR, João Penido. Curso de direito processual civil. Campinas – SP: Copola, 2000, p. 492. 115 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 503.

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Desta feita, o fato impeditivo que é a perempção, poderá ser argüida em

qualquer fase que se encontre o processo, e conhecida de ofício pelo juiz. Pelo que

deixando passar in albis, e advindo uma sentença de mérito, será esta convalidada,

todavia, podendo ser rescindida.

A perempção é espécie de penalidade ao autor desidioso. Ela opera

exclusivamente na órbita processual, impedindo que o autor renove o processo com

o mesmo objeto, mas sem importar na perda de capacidade defensiva do direito,

como ocorre com a prescrição, ou na própria extinção do direito, como se dá na

decadência116.

Para Calanzani117:

Perempção significa perecimento, extinção do direito de praticar um

ato processual ou continuar o processo.

Tem semelhança com a prescrição e a decadência, mas com elas

não se confunde. Sempre que o juiz acolher a alegação de

prescrição ou decadência, há decisão com julgamento do mérito.

Havendo acolhimento de perempção, extingue-se o feito sem

julgamento do mérito.

Embora a perempção cause a perda do direito de ação, não impede que a

parte invoque o seu eventual direito material em defesa, quando sobre ele vier a se

abrir processo por iniciativa da outra parte118 [...].

Assim, cabe a parte contrária observar de não ser o autor da causa desidioso,

e não ter infringido por mais de três vezes à extinção do processo, sendo que

poderá alegar a qualquer momento a perempção, antes que o julgador venha emitir

uma decisão favorável, e esta se convalide após o trânsito em julgado.

2.3.4 Convenção Arbitral

Pessoas com capacidade de contratar podem convencionar que as lides,

entre elas, se resolvam mediante convenção de arbitragem (Lei nº 9.307, de 23-9-

116 SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil: processo de conhecimento. 12 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 469. 117 CALANZANI, José João. Sua excelência, o processo. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p. 87. 118 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 344.

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1996, art. 1º). Essa convenção pode ser anterior à propositura da ação ou no curso

do processo desta119.

A cláusula compromissória e o compromisso arbitral são espécies do que a

Lei nº 9.307 denomina “convenção de arbitragem”, a qual o art. 267, nº VII, do CPC,

atribui o efeito de extinguir o processo sem resolução de mérito120.

A cláusula compromissória é negócio jurídico acessório através do qual, em

relação a um determinado contrato, os contratantes se comprometem a instituir a

arbitragem como mecanismo para a solução de eventuais futuros conflitos dele (do

contrato principal) decorrentes121.

A matéria objeto da convenção realizada pelas partes fica subtraída à

apreciação do juiz, uma vez que aquelas têm capacidade para renunciar ou transigir

sobre seus direitos disponíveis122.

O compromisso arbitral permite às partes, em resumo, entregar o julgamento

da demanda a árbitro privado, que, em última análise, decidirá a mesma, ficando o

juiz encarregado de verificar as condições do compromisso (e, estando este em

consonância com a lei, obrigado a homologar o laudo)123.

Desta forma fica o juiz encarregado da não apreciação da matéria, uma vez

que não o compete por haver as partes instituído cláusula compromissória arbitral.

2.3.5 Desistência da Ação

Pela desistência, o autor abre mão do processo, não do direito material que

eventualmente possa ter perante o réu. Daí por que a desistência da ação provoca a

extinção do processo sem julgamento do mérito e não impede que, futuramente, o

autor venha outra vez a propor a mesma ação, uma vez que inexiste, in casu, a

eficácia da coisa julgada124 [...].

119 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2004, v. 2, p. 104. 120 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 346. 121 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 218. 122 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro: atos processuais a recursos e processos nos tribunais. 18 ed. rev., e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, v. 2, p. 73. 123 FRIEDE, Reis. Comentários ao código de processo civil. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997, v. 3, p. 1.387. 124 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 346.

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Nessa senda, é da alçada de Wambier125:

Quando o autor abre mão do processo, está fazendo-o em relação

àquela específica ação – considerada individualmente no espaço e

no tempo –, imaculada ficando a pretensão que a embasava e, por

conseguinte, a fortiori, o direito material que estaria eventualmente

por trás da afirmação feita.

A desistência, antes de decorrido o prazo para resposta, é um ato unilateral,

cabendo ao autor requerer, contudo, após transcorrido o prazo da resposta, para

que haja a desistência, deve o réu anuir com o pedido, tornando-se desta feita um

ato bilateral.

Concordando o réu com o pedido de desistência, caberá ao juiz declarar a

extinção do processo sem resolução do meritum causae, que fica submetido em

qualquer fase da instância processual126.

A desistência da ação (mais tecnicamente, deveria o legislador ter falado em

desistência do processo) acarreta, meramente, a extinção do processo, deixando

intacta a pretensão do autor e o mérito indefinido127.

2.3.6 Ação Intransmissível

A pretensão, que sempre revela a afirmação da existência de um interesse

material em conformidade com o direito, pode ser, por disposição legal,

intransmissível128.

Nessa vertente, observa Burnier Júnior129:

125 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 504. 126 Cumpre trazer a lume o ensinamento de Wambier, onde “A desistência da ação, uma vez aceita pelo réu, produz efeito vinculativo em relação ao juiz, que deve declarar “extinto” o processo sem resolução de mérito, sob este fundamento, em qualquer fase em que se encontre o feito”. Cf. WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 504. 127 BURNIER JÚNIOR, João Penido. Curso de direito processual civil. Campinas – SP: Copola, 2000, p. 581. 128 SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil: processo de conhecimento. 12 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 613. 129 BURNIER JÚNIOR, João Penido. Curso de direito processual civil. Campinas – SP: Copola, 2000, p. 583.

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Como se sabe, as demandas ajuizadas são transmissíveis por

sucessão causa mortis, suspendendo-se o processo, como vimos no

ponto anterior, para que os sucessores se habilitem, na forma da lei.

Todavia, há direitos que são personalíssimos, e que se não

transmitem aos herdeiros, pelo que, com a morte do autor numa

demanda, também se extingue a pretensão à sua definição, devendo

o processo ser extinto, sem exame do mérito, e sem ônus para as

partes.

A ação que se funda em direito personalíssimo, não pode ser transmitida aos

herdeiros sucessores, uma vez que só a este cabe o exercício da aludida pretensão,

havendo raros casos em que poderá ser transmitida.

A intransmissibilidade da ação, como causa impeditiva de prosseguimento da

relação processual, está ligada ao direito material controvertido. É conseqüência de

sua natureza (direitos personalíssimos) ou de expressa vedação legal à transmissão

do direito subjetivo130.

Com o falecimento do titular da ação, morre juntamente sua pretensão à

tutela jurisdicional aludida na petitio, há a extinção do próprio direito, ficando

vinculado o juiz à extinção do processo, ante a perda não do objeto da ação, mas do

detentor do direito, titular da relação jurídica.

2.3.7 Confusão entre Autor e Réu

O processo é relação jurídica entre três pessoas: autor-juiz-réu. Se as duas

partes se confundem, por sucessão, numa só pessoa, deixa de existir um dos

sujeitos da relação processual. Logo, desaparece a própria relação processual131.

É o enunciado do artigo 381 do Código Civil: “extingue-se a obrigação, desde

que na mesma pessoa se confundam as qualidades de credor e devedor”.

A prática oferece freqüentes exemplos: locatário, que adquire o imóvel no

curso do despejo; réu que adquire a propriedade no curso da reivindicação132.

130 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 347. 131 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 348. 132 BURNIER JÚNIOR, João Penido. Curso de direito processual civil. Campinas – SP: Copola, 2000, p. 584.

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Verificado pelo julgador a confusão das partes litigantes, deverá o juiz de

ofício ou mediante requerimento extinguir o processo, por haver dado por resolvido à

obrigação ora em questão.

Dá-se confusão, extinguindo-se a obrigação, por se confundirem as

qualidades de credor e devedor na mesma pessoa (Cód. Civil de 2002, art. 381 –

Cód. Civil de 1916, art. 1.049). Isso ocorrendo, perde a ação o seu objeto, e por isso

se extingue o processo133.

Como bem define Wambier: “se autor e réu passam a ser a mesma pessoa, já

não há processo”134.

Desta forma, a confusão entre autor e réu faz desaparecer a pluralidade de

partes, sempre fundamental no processo135.

2.4 SENTENÇAS DE MÉRITO

A lei considera sentenças de mérito ou definitivas aquelas cujos conteúdos

forem encartáveis nos incisos do art. 269 do CPC136. Ainda, quando presentes os

pressupostos de admissibilidade de exame de mérito, e não configurar nenhuma das

hipóteses previstas no art. 267 do CPC.

Em relação às sentenças de mérito, a alteração visou abandonar o critério

puro da finalidade para adotar o critério do conteúdo. Assim, toda resolução judicial

do mérito, mesmo que não extinga o processo, como no caso de resolução parcial,

passaria a ser sentença, nos termos da nova redação também conferida ao art. 269

do CPC137.

O ato do juiz que venha definir determinada matéria controvertida nos autos,

estaria assim diante de uma sentença de mérito, mesmo que não resolvendo a

causa.

133 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2004, v. 2, p. 105. 134 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 505. 135 SANTOS, Ernane Fidélis dos. Manual de direito processual civil: processo de conhecimento. 12 ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: Saraiva, 2007, p. 613. 136 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 505. 137 ALMEIDA, Gregório Assagra de. Codificação do direito processual coletivo brasileiro – análise crítica das propostas existentes e diretrizes para uma nova proposta de codificação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 24.

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Assim, uma sentença tipicamente de mérito, é aquela onde o juiz acolhe ou

rejeita o pedido, por tratar-se de ato culminante do processo.

As chamadas sentenças definitivas, também ditas sentenças de mérito ou

sentenças de fundo: põem termo ao processo, decidindo do mérito, isto é, acolhendo

ou rejeitando o pedido do autor138.

É por meio dela que o Estado concretiza o pedido exposto na exordial,

fazendo a entrega da tutela jurisdicional pleiteada, pondo fim à lide.

2.4.1 Classificação

Atualmente, de modo geral, as sentenças são classificadas a partir de

critérios de natureza eminentemente processual139.

Assim, o critério utilizado para que se classifique as sentenças é o referente

ao tipo de tutela jurisdicional que é veiculada pelo pedido. Logo, o pedido, no bojo da

ação, é que irá determinar de que tipo de ação se trata, e de que tipo de sentença se

tratará140.

Nessa ordem de idéias, ensina Chiovenda que “se a vontade da lei impõe ao

réu uma prestação passível de execução, a sentença que acolhe o pedido é de

condenação e tem duas funções concomitantes, de declarar o direito e de preparar a

execução; se a sentença realiza um dos direitos potestativos que, para serem

atuados, requerem o concurso do juiz, é constitutiva; se, enfim, se adscreve a

declarar pura e simplesmente a vontade da lei, é de mera declaração”141.

Nesse passo, é de entender que todas as sentenças têm, como se sabe, um

cunho declaratório. A declaração se impõe logicamente, antes de tudo, ao juiz. Na

sentença, o juiz sempre declara a existência ou inexistência de um direito142.

Todavia, adverte Theodoro Júnior143:

138 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 07. 139 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 506. 140 Ibidem idem. 141 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 564. 142 Wambier faz a seguinte observação quando se refere ser a sentença uma forma “genérica de declaração” de existência ou inexistência de vínculo jurídico entre as partes, que trata da seguinte forma: “Todas as sentenças têm, como se sabe, um cunho declaratório. A declaração se impõe logicamente, antes de tudo, ao juiz. Na sentença, o juiz sempre declara a existência ou inexistência de um direito.” Cf. WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 506.

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Assim, de par com a tradicional classificação das sentenças em

condenatórias, declaratórias e constitutivas, existem também as

sentenças homologatórias, que são aquelas de mera verificação de

legitimidade de ato das partes para alcançar a autocomposição do

litígio.

O julgador, deste modo, ao se deparar com o pedido veiculado na petição,

deverá tomar os cuidados de observar qual a vontade da lei se impõe ao caso, a

escolher o tipo de sentença a aplicar, que conforme critérios poderá ser:

condenatória, constitutiva ou declaratória.

2.4.2 Elementos

A palavra que deveria ter sido usada pelo legislador no art. 458 é elemento, e

não requisito. Requisito é “condição necessária para que se chegue a algum

objetivo”. É, portanto, anterior, lógica e cronologicamente, ao seu “objetivo”, não o

integrando144.

Os elementos da sentença são: relatório, fundamentação e decisório.

Prescreve o art. 458 do Código de Processo Civil: “São requisitos essenciais

da sentença:

“I – o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do

pedido e da defesa, bem como o registro das principais

ocorrências havidas no andamento do processo;

“II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de

fato e de direito;

“III – o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões, que as

partes lhe submeterem”.

143 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil – teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 44 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 564. 144 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2007, p. 507.

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Aí estão as condições da sentença, ou seja, os requisitos essenciais para sua

validade ou eficácia145.

2.4.3 O Art. 269, II, III e V

O art. 269 e seus incisos II, III e V146; disciplinam os atos autocompositivos do

litígio, frutos da manifestação de uma ou de ambas as partes. Ainda que, nesses

casos, o juiz não julgue propriamente a lide, o conteúdo da sentença que profere

versa sobre o mérito, diz respeito ao pedido, ainda que não seja judicial a “autoria”

desse conteúdo147.

Quando o réu reconhecer a procedência do pedido: reconhecimento do

pedido consiste na afirmação daquele contra o qual foi formulado de que a sua

procedência lhe é manifesta148.

Quando as partes transigirem: tem seu fundamento no Código Civil de 2002,

art. 840: “É lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante

concessões mútuas” (Cód. Civil de 1916, art. 1.025)149.

A transação é a situação de acordo em que as partes venham estabelecer,

desde que o direito a respeito de que se litiga seja disponível.

Quando o autor renunciar ao direito sobre que se funda a ação: com esse ato

de vontade do autor, renuncia este à sua pretensão, em relação à qual, portanto,

nada há que decidir150.

A renúncia à pretensão, por sua vez, é instituto de que se vale o autor para

dispor do direito material que eventualmente tenha. É o instituto que, de certa forma,

equivale ao reconhecimento jurídico do pedido, por parte do réu151.

145 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 15-16. 146 II - quando o réu reconhecer a procedência do pedido; III - quando as partes transigirem; V - quando o autor renunciar ao direito sobre que se funda a ação. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869compilada.htm> Acesso em: 02/04/2011. 147 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 508. 148 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 2, p. 107. 149 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 2, p. 107. 150 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 2, p. 108.

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Estas são as chamadas sentenças de mérito atípicas, uma vez que ocorre a

resolução do mérito quando o réu reconhece o pedido, não chegando o juiz julgar

propriamente a lide proposta em apreciação.

2.4.4 Prescrição e Decadência

Com o fim de proteger a segurança e a certeza, valores fundamentais do

direito moderno, limitam-se no tempo a exigibilidade e o exercício dos direitos

subjetivos, fixando-se prazos maiores ou menores, conforme a sua respectiva

função152.

Para os direitos subjetivos, a lei fixa prazos mais longos, que podem ser

suspensos e interrompidos, durante os quais se pode exigir o cumprimento desses

direitos, ou melhor, dos respectivos deveres. Já para os direitos potestativos, os

prazos são mais rígidos, isso porque esses direitos devem ser exercidos em

brevíssimo tempo153.

A violação do direito subjetivo cria para o seu titular a pretensão, ou seja, o

poder de fazer valer em juízo, por meio de uma ação (em sentido material), a

prestação devida, o cumprimento da norma legal ou contratual infringida ou a

reparação do mal causado, dentro de um prazo legal (arts. 205 e 206 do CC). Se o

titular deixar escoar tal lapso temporal, sua inércia dará origem a uma sanção, que é

a prescrição. Esta é um pena ao negligente154.

A decadência e a prescrição, grosso modo, são institutos que se ligam à

inércia de alguém, em face do correr do tempo, o que dá origem à perda de um

direito. Têm ambas o escopo de colocar fim a uma situação, cuja subsistência por

tempo indeterminado perturbaria a estabilidade das relações jurídicas155.

Dispõe Friede156 – em relação à historicidade do instituto da prescrição:

“historicamente, a prescrição foi introduzida no sistema pretoriano como uma exceção

151 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 509. 152 AMARAL, Francisco. Direito Civil – Introdução. 3. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 561. 153 AMARAL, Francisco. Direito Civil – Introdução. 3. ed., Rio de Janeiro: Renovar, 2000, p. 561. 154 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, v. 1, p. 391. 155 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 509. 156 FRIEDE, Reis. Comentários ao Código de processo civil. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997, v. 3, p. 1.416.

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oposta ao exercício da ação, e tinha por fim extingüi-la. O direito, porém, podia sobreviver à

extinção da ação.”

A prescrição é a extinção da ação. Esta não foi proposta a tempo de ser

conhecida e, assim, o direito deixou de ser exigível por via de ação157.

No caso de o juiz decretar a prescrição da ação, o autor ainda poderá intentá-

la novamente, por não haver perdido o seu direito, que esta não extingue.

O principal efeito da prescrição é a aquisição ou perda do direito subjetivo158.

D’outro modo, “Decadência é a extinção do direito, diretamente, e com ele a

ação que o protege (CÂMARA LEAL). O direito se extinguiu em razão do tempo”159.

Diniz160, ao discorrer acerca da tese de Leal, assinala:

“Decadência” é um vocábulo de formação vernácula, originário do

verbo latino cadere (cair); do prefixo latino de (de cima de) e do

sufixo entia (ação ou estado); literalmente designa a ação de cair ou

o estado daquilo que caiu.

Simboliza a queda do direito ante a inércia do seu titular, que deixa por escoar

o prazo legal ou contratual, fixado para seu exercício.

Friede161, ao citar Sérvio, afirma que:

Decadência é o fato jurídico que aniquila direito potestativo, em

virtude do fluxo do tempo e da inércia do titular. Direito potestativo é

aquele que a faculdade de agir do titular não corresponde a

prestação de outrem.

Ao escoar o prazo nada mais resta ao detentor do direito da ação – e direito

objetivo – modo que não será mais lícito pôr em atividade.

157 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 2, p. 108. 158 FRIEDE, Reis. Comentários ao Código de processo civil. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997, v. 3, p. 1.418. 159 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 2, p. 108. 160 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, v. 1, p. 413. 161 FRIEDE, Reis. Comentários ao Código de processo civil. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1997, v. 3, p. 1.423.

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A decadência impede que o direito, até então existente em potência, passe a

existir em ato, extinguindo-o antes que se exteriorize ou adquira existência objetiva.

O prazo decadencial corre contra todos162.

Nesse passo, o julgador, ao analisar o pedido, deverá observar não haver o

direito objetivo decaído, sendo que, de modo positivo, extinguirá o processo com

resolução de mérito.

É assente entre os doutrinadores: “[...] Decadência [...] é a extinção do direito

em decorrência de inércia de seu titular para o seu exercício; extingue,

indiretamente, a ação correspondente [...]”163.

2.5 COISA JULGADA

Trata-se de instituto que tem em vista gerar segurança. A segurança, de fato,

é um valor que desde sempre tem desempenhado papel de um dos objetivos do

direito. Por meio do direito, procura-se tanto a segurança no que diz respeito ao

ordenamento jurídico como um todo, quanto no que tange às relações jurídicas

individualizadas. É quanto a esta espécie de segurança que a coisa julgada

desempenha o seu papel164.

A coisa julgada é o fenômeno jurídico que estabelece segurança as relações

jurídicas, onde atuou a vontade da lei no caso concreto, tornando-a imutável,

irrevogável, soberana e com efeito interpartes.

É uma situação jurídica. Enquanto sujeita a recurso a sentença, não se atingiu

ainda a finalidade do processo, que é a composição da lide, pelo julgamento final da

res in iudicium deducta165166.

Conforme texto de Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, artigo 6º, § 3º:

“Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba

recurso”.

162 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, v. 1, p. 414-415. 163 DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: teoria geral do direito civil. 23. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2006, v. 1, p. 415. 164 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9 ed. rev., atual e ampl., São Paulo: RT, 2007, p. 519. 165 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 46. 166 Res in iudicium deducta – questão debatida em juízo. Disponível em: <http://www.loveira.adv.br/dicionario.htm> Acesso em: 02/04/2011.

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A coisa julgada, com a vigência da Constituição de 1988, assumiu contornos

teóricos de instituto jurídico autônomo, perdendo a inerência significativa de mero

atributo, qualidade (como quis Liebman e atualmente Dinamarco) de efeito da

sentença de mérito com autoridade a suscitar ainda, em preliminar, exceção

substancial (art. 301, VI, CPC) extintiva do procedimento instaurado. Daí se impõe a

distinção entre a sentença transitada em julgado como ato jurisdicional afetado pela

preclusão máxima e a coisa julgada, esta agora como garantia constitucional de

existência, exigibilidade e eficácia de provimentos meritais pelo atendimento ao

direito fundamental do devido processo167.

Nessa senda, pela busca do entendimento da coisa julgada, que ora atua

como instituto constitucional de garantia jurídica às sentenças meritórias transitadas

em julgado, dispõe Machado168:

A coisa julgada é, pois, um fenômeno de natureza processual, com

eficácia restrita, portanto, no plano processual, sem elementos de

natureza material na sua configuração, teologicamente destinada à

eliminação da incerteza subjetiva que a pretensão resistida opera na

relação jurídica sobre que versa o conflito de interesses. Como dado

pré-processual de caráter subjetivo, essa incerteza não afeta a

essência da relação jurídica, de caráter objetivo. A ela,

simplesmente, se relaciona, porque nela está o objeto do juízo das

partes. Assim também a coisa julgada que apenas se relaciona à res

in iudicium deducta por constituir esta o objeto da juízo estatal.

Assim, por tratar-se a coisa julgada de um fenômeno de natureza processual

(por atingir somente o processo e as partes a ele inerentes), constitui seu

fundamento na necessidade de estabilidade das relações jurídicas, pondo fim ao

conflito de interesses, que torna imutável a sentença exarada pelo juiz entre as

partes.

167 LEAL, Rosemiro Pereira. Relativização inconstitucional da coisa julgada – temática processual e reflexões jurídicas. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p. 03. 168 MACHADO, Daniel Carneiro. A coisa julgada inconstitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, p. 57.

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2.5.1 Coisa Julgada Formal e Coisa Julgada Material

Dá-se o nome de coisa julgada formal à imutabilidade da sentença no

processo em que foi proferida. Corresponde à estabilidade da sentença como ato

jurídico-processual, oriunda da perda da faculdade de impugnação do julgado pela

via do recurso (ordinário ou extraordinário) ou do reexame necessário169.

Discorre Santos170:

A coisa julgada formal consiste no fenômeno da imutabilidade da

sentença pela preclusão dos prazos para recursos. Dá-se porque a

sentença não poderá ser reformada por meio de recursos, seja

porque dela não caibam mais recursos, seja porque estes não foram

interpostos no prazo, ou porque do recurso se desistiu ou do

interposto se renunciou.

No direito pátrio, a definição de coisa julgada em sentido formal pode ser

encontrada no artigo 6º, parágrafo 3º, da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-

lei n. 4.657/1942), cujo texto assevera: “Chama-se coisa julgada ou caso julgado a

decisão judicial de que já não caiba recurso”.

A coisa julgada formal é a preclusão dos recursos que foram ou poderiam ter

sido interpostos pelas partes para impedir a produção de efeitos da decisão,

posicionamento que muito se aproxima da redação do art. 467 do Código de

Processo Civil, na sua parte final171.

Ocorrendo a preclusão da faculdade de recorrer, seja por seu exaurimento,

por decurso de prazo ou por impossibilidade lógica, obsta-se a substituição do

julgamento no processo em que foi prolatado.

A coisa julgada formal, porém, só é capaz de pôr termo ao processo,

impedindo que se reabra a discussão acerca do objeto do processo no mesmo

feito172.

169 MOREIRA, José Carlos Barbosa. A nova definição de sentença. Revista de Processo. São Paulo: RT, v. 136, jun. 2006, p. 269-272. 170 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 47. 171 LEAL, Rosemiro Pereira. O ciclo teórico da coisa julgada: de Chiovenda a Fazzalari. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 20. 172 CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de direito processual civil. 16. ed. rev. atual., Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2007, v. 1, p. 488.

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Nesse sentido, extrai-se dos estudos de Guimarães173:

Para essa necessária discriminação de conceitos, um primeiro

critério

descritiva é o que assenta em profunda e elucidativa observação

feita por CHIOVENDA. Respondendo a crítica de D’ONOFRIO – que

distinguia entre os casos cuja eficácia é meramente negativa

(preclusão) e os casos cuja eficácia é positiva – admitiu CHIOVENDA

que esta distinção poderia ser feita no campo das situações

processuais constituídas em conseqüência da perda de faculdades

processuais; não, porém, no campo das preclusões, que são sempre

a mesma coisa, isto é, a perda de uma faculdade processual.

A coisa julgada, em ambas as suas modalidades – formal e

substancial – pertence ao campo das situações processuais

conseqüentes à preclusão dos recursos (rectius: conseqüentes ao

trânsito em julgado da decisão). Há, portanto, uma relação lógica de

antecedente – a – conseqüente (não de causa e efeito) entre o

trânsito em julgado e a coisa julgada.

A coisa julgada formal é que marca a prestação jurisdicional entregue pelo

Estado, com o traço de imutabilidade, dentro do processo, como base de sua

irrevogabilidade fora do processo. As demais decisões proferidas ao longo do rito,

por conseguinte, em virtude de sua recorribilidade, não passam de mera proposta de

julgamento final. Tomando como base a antiga fórmula do artigo 463 do Código de

Processo Civil, pode-se afirmar que, com a incidência da coisa julgada formal, o

Poder Judiciário “cumpre e acaba” o ofício que lhe é inerente.

Com o escopo de facilitar a compreensão da coisa julgada formal, conceitua

Marques174: “A coisa julgada formal consiste na preclusão máxima de que fala a doutrina,

visto que impede qualquer reexame da sentença como ato processual, tornando-a imutável

dentro do processo.”

Entendidas como suficientes às considerações feitas até aqui sobre a coisa

julgada formal, passa-se ao estudo da coisa julgada material, instituto que teve forte

influência do processualista Italiano Liebman. 173 GUIMARÃES, Luiz Machado. Estudos de direito processual civil. Rio de Janeiro: Jurídica e Universitária, 1969, p. 14. 174 MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 1960, v. 5, p. 41.

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Segundo Santos175:

A vontade da lei, que se contém no comando emergente da

sentença, e que corresponde à expressão da vontade do Estado de

regular concreta e definitivamente o caso decidido, tornou-se

indiscutível, imutável, no mesmo ou em outro processo. O comando

emergente da sentença, tornado imutável, adquire autoridade de

coisa julgada, a impedir que a relação de direito material decidida,

entre as mesmas partes, seja reexaminada e decidida, no mesmo

processo ou em outro processo, pelo mesmo ou outro juiz ou

tribunal. Assim, fala-se em coisa julgada material, ou substancial,

como autoridade da coisa julgada.

Pode-se ainda afirmar que: “A coisa julgada material caracteriza-se pela

atribuição de um bem da vida ao vencedor da demanda”176.

Consiste a coisa julgada material (auctoritas res iuditaca) na imutabilidade

extraprocessual da sentença. Trata-se de qualidade do julgado que, ao revesti-lo,

impede nova apreciação da lide (ne bis in idem), atribuindo o status norma concreta

ao decisum exarado, de modo a torná-lo vinculativo para os demais juízos e às

partes em relação ao qual foi proferido 177.

Para a completa formação da coisa julgada material, exorta Nery Júnior178

haver presentes os seguintes requisitos:

a) que o processo exista, isto é, que estejam presentes os

pressupostos de constituição do processo (jurisdição, petição inicial e

citação – CPC 267 IV);

b) que a sentença seja de mérito (CPC 269); c) que a sentença de

mérito não mais seja impugnável por recurso ordinário ou

extraordinário ou reexaminada pela remessa necessária. [...]

Exemplos de inexistência de sentença e, portanto, de inexistência de

175 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 48. 176 LEAL, Rosemiro Pereira. O ciclo teórico da coisa julgada: de Chiovenda a Fazzalari. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 20. 177 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1997, p. 520. 178 NERY JÚNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade Nery. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 9 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2006, p. 595.

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coisa julgada materIal: a) sentença extra petita (falta “petição inicial”

– pedido); b) sentença infra petita (falta “sentença de mérito” – o juiz

não julgou parte do pedido); c) sentença dada em processo em que

não houve citação (falta “citação); d) sentença processual de

carência da ação (CPC 267 IV) ou de extinção do processo sob

qualquer dos outros fundamentos do CPC 267 (falta “sentença de

mérito”); e) sentença dada por quem não se encontra investido da

atividade jurisdicional, como a proferida pelo escrivão ou por juiz

aposentado ou exonerado (falta “jurisdição”) etc.

Por fim, é o disposto do art. 467 do Código de Processo Civil: “Denomina-se

coisa julgada material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não

mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”.

2.5.2 Limites Objetivos da Coisa Julgada

A essência da coisa julgada, do ponto de vista objetivo, consiste em não se

admitir que o juiz, num futuro processo, possa, de qualquer maneira, desconhecer

ou diminuir o bem reconhecido no julgado anterior179.

Estabelecer os limites objetivos da coisa julgada significa verificar o que

realmente transita em julgado na sentença, ou seja, quais as partes da sentença

sofrem o efeito da imutabilidade180.

Conforme a doutrina de Savigny, integravam a coisa julgada não todos os

motivos da sentença, mas os fundamentos objetivos, ou elementos objetivos. Por

fundamentos objetivos – dizia o insigne jurista – eu entendo os elementos

constitutivos da relação jurídica. A propriedade do autor e a posse do réu –

elementos constitutivos da relação jurídica decidida e elementos objetivos da

decisão – se integram na coisa julgada. Mas são abrangidos pela coisa julgada tão-

somente os elementos objetivos, assim chamados para se distinguirem dos motivos

subjetivos que levam o juiz à formação de sua convicção181.

179 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1998, p. 493. 180 GIROTTO, Luiz Eduardo de Castilho. Coisa julgada inconstitucional em matéria tributária. Curitiba: Juruá, 2008, p. 17. 181 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21ª ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 67.

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A coisa julgada material tem como limites objetivos a lide e as questões

pertinentes a esta, que foram decididas no processo. A situação litigiosa, que foi

composta, constitui a área em que incidem os efeitos imutáveis do julgamento182.

Os limites objetivos da res iudicata podem ser encontrados nos artigos 468,

469, 470, 471 e 474, do Código de Processo Civil, onde fica estabelecido as partes

da sentença que estarão protegidas pela coisa julgada, ocorrendo a imutabilidade.

Preleciona Dinamarco183:

[...] no tocante aos limites objetivos da coisa julgada o Código (de

processo civil brasileiro) segue rigorosamente o pensamento

liebmaniano para deixar muito claro que somente a parte decisória

da sentença fica resguardada por essa imutabilidade, jamais os seus

motivos.

Assim, os limites objetivos da coisa julgada se dá ao passo da identificação

do pedido e da causa de pedir, e que consiste na parte decisória da sentença de

mérito.

2.5.3 Limites Subjetivos da Coisa Julgada

Os efeitos da coisa julgada atingem, do ponto de vista subjetivo, as partes. A

doutrina predominantemente considera serem atingidos também os assistentes

litisconsorciais184.

No direito romano, estabelecida a litiscontestatio, pela qual as partes se

obrigavam a aceitar aquilo que fosse decidido, e, pois, se obrigavam à decisão,

somente elas eram atingidas pelos efeitos da coisa julgada. Vários textos romanos

consagram essa doutrina, tais o de ULPIANO (D. 44. 2. 1.): cum res inter alios

iudicata nullum aliis praeiudicium facient – a coisa julgada não produz nenhum

prejuízo a terceiros; o de MACER (D. 44. 1. 63): res inter alios iudicata aliis non

praeiudicare – a coisa julgada não prejudica terceiros; o de PAULO (D. 3. 2. 21): non

182 MARQUES, José Frederico. Manual de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1997, v.III, p.277. 183 DINAMARCO, Cândido Rangel. Liebman e a cultura processual brasileira. In: Estudos em homenagem à professora Ada Pellegrini Grinover. Organização: Flavio Luiz Yarshell e Mauricio Zanoide de Moraes. 1 ed. São Paulo: DPJ editora, 2005, p. 492. 184 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo de conhecimento. 9. ed. rev., atual. e ampl., São Paulo: RT, 2007, v. 1, p. 523.

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opportet ex sententia sive iusta sive iniusta, pro alio habita alium pregravari – a

sentença produzida entre as partes, seja justa ou injusta, não deve atingir

terceiros185.

A coisa julgada, como resultado da definição da relação processual, é

obrigatória para os sujeitos desta.

Todos, pois, são obrigados a reconhecer o julgado entre as partes; não

podem, porém, ser prejudicados. Mas por prejuízo não se compreende um prejuízo

de mero fato, e sim um prejuízo jurídico186.

Propõe Chiovenda187 que os terceiros não poderão ser prejudicados ao passo

que são estranhos a lide:

Assim a sentença entre A e B, pela qual A é reconhecido proprietário

dum imóvel, não impede a ninguém exceto a B, reivindicar o imóvel

contra A. A sentença entre A e B, pela qual A é reconhecido titular de

um crédito em relação a C, com exclusão de B, não obsta a D, E, F

de se alegarem titulares daquele crédito em relação a A. Quanto a C,

é obrigado a reconhecer credor a A em vez de B; mas pode sustentar

que nem A é seu credor.

O limite subjetivo da coisa julgada pode ser também encontrado em nosso

Código de Processo Civil Brasileiro, no artigo 472, estabelecendo quem são as

pessoas atingidas pelos efeitos da res iudicata.

Como averba Amaral Santos188:

A regra, já o sabemos, é que somente as partes são alcançadas pela

autoridade da coisa julgada. Terceiros, que não participaram da

relação processual, não tiveram posição no processo e podem

mesmo ignorar a sua existência, estão livres dos efeitos da coisa

julgada.

185 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21ª ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 72-73. 186 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1998, v. 1, p. 500. 187 CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinas: Bookseller, 1998, v. 1, p. 501. 188 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 21ª ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2003, v. 3, p. 72.

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Os terceiros estranhos à lide, neste caso, ficam imunes ao alcançe da coisa

julgada, e consequentemente, a imutabilidade da sentença. Todavia, na real visão

do mundo jurídico, a sentença proferida não deixa de influir mais ou menos

intensamente nas relações jurídicas das partes.

Denomina-se rescisória “a ação por meio da qual se pede a desconstituição

de sentença transitada em julgado, com eventual rejulgamento , a seguir, da matéria

nela julgada”189.

Ao passo disso, é que as partes e terceiros interessados têm o direito de

pedir a desconstituição do julgado, senão vejamos as hipóteses de cabimento da

ação rescisória em todos seus incisos do artigo 485 do Código de Processo Civil.

189 DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados: apresentação Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: LTr, 1998, p. 35.

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CAPÍTULO 3

ASPECTOS DESTACADOS DA AÇÃO RESCISÓRIA

3.1 PANORAMA GERAL DAS HIPÓTESES DE CABIMENTO DA AÇÃO

RESCISÓRIA

As hipóteses de cabimento da ação rescisória estão expressamente e

taxativamente elencadas no artigo 485 do Código de Processo Civil, sendo vedado à

criação de pressupostos que não estes, que dispõe:

Art. 485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser

rescindida quando:

I - se verificar que foi dada por prevaricação, concussão ou

corrupção do juiz;

II - proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente;

III - resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte

vencida, ou de colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;

IV - ofender a coisa julgada;

V - violar literal disposição de lei;

Vl - se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em

processo criminal ou seja provada na própria ação rescisória;

Vll - depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja

existência ignorava, ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só,

de Ihe assegurar pronunciamento favorável;

VIII - houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou

transação, em que se baseou a sentença;

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IX - fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos

da causa;

§ 1o Há erro, quando a sentença admitir um fato inexistente, ou

quando considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido.

§ 2o É indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido

controvérsia, nem pronunciamento judicial sobre o fato.

Somente nestes casos é que poderá ocorrer à rescisão de sentença transita

em julgado, não cabendo ao julgador criar casos de exceção, que incorrerá em uma

anomalia jurídica.

Assim, a possibilidade jurídica revelada de rescisão pelo “enquadramento da

sentença rescindenda em um dos casos previstos na lei processual”, só ocorrerá

nas hipóteses acima apresentadas190.

O STJ tem decidido – majoritariamente – pelo cabimento da ação rescisória

em situações que embora não exista decisão de mérito, a decisão terminativa

inviabiliza o ajuizamento de nova ação.

Veja-se:

Ação rescisória. Apelação não conhecida por deserção. Precedentes

da Corte.

1. Precedentes da Corte considerando admissível a rescisória

quando não conhecido o recurso por intempestividade, autorizam o

mesmo entendimento em caso de não-conhecimento da apelação

por deserção. Ressalva do Relator.

2. Recurso especial conhecido e provido191.

Entendendo cabível o ajuizamento da ação rescisória de decisões

terminativas que acabam por não conhecer do recurso, impedindo que o mérito

venha a ser discutido em outra demanda.

190 COSTA, Coqueijo. Ação Rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 20. 191 STJ, REsp 636.251/SP, 3ª T., Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, ac. 03.02.2005, in DJU 11.04.2005.

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Assim, acaba por abrir uma exceção, ao admitir a rescisória em face de

sentenças terminativas.

3.2 SENTENÇAS DE MÉRITO NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Os pronunciamentos judiciais considerados pela lei como de sentença de

mérito encontram-se enumerados no art. 269 do Código de Processo Civil, sendo

eles:

I - quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido do autor;

II - quando o réu reconhecer a procedência do pedido;

III - quando as partes transigirem;

IV - quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição;

V - quando o autor renunciar ao direito sobre que se funda a ação192.

É a que pode ser rescindida e constitui o objeto do juízo rescindente193.

No CPC de 1939, não havia tal exigência. O anteprojeto do CPC de 1973

reportava-se a “sentença definitiva transitada em julgado”. O novo Código optou pela

“sentença de mérito”, que será a que decidir a relação de direito material194.

Assim sendo, temos que as sentenças de mérito são as que têm por

conteúdo as matérias encartáveis no art. 269 do CPC, tal qual acima exposto195.

3.2.1 Definição de Sentença de Mérito, para fins de Rescindibilidade

No art. 485 do Código de Processo Civil, o legislador fala em sentença de

mérito. Isto pode parecer que apenas as decisões dos juizes de primeiro grau é que

são passíveis de desconstituição.

Tal não se dá. Igualmente os acórdãos dos órgãos colegiados o são,

incluindo-se, nestes, os emanados das Turmas do Supremo Tribunal Federal. Logo,

192 DINAMARCO, Márcia Conceição Alves. Ação rescisória. São Paulo: Atlas, 2004, p. 39. 193 COSTA, Coqueijo. Ação Rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 25. 194 COSTA, Coqueijo. Ação Rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 25. 195 DINAMARCO, Márcia Conceição Alves. Ação rescisória. São Paulo: Atlas, 2004, p. 42.

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na regra do texto supra estão englobadas as sentenças e os acórdãos (art. 162, §§

1º e 2º, do Código de Processo Civil)196.

Dinamarco197 observa que:

Apesar de a letra da lei dispor que caberá a ação rescisória quando

estivermos diante de sentenças de mérito, não podemos nos

esquecer que vige entre nós o princípio do duplo grau de jurisdição,

sendo que um número ínfimo de demandas não chega a ser

apreciado pelos Tribunais [...] Os acórdãos nada mais são do que

pronunciamentos judiciais emanados dos Tribunais (art. 163, CPC),

podendo ter conteúdo de despacho, decisão interlocutória e sentença

(processuais ou de mérito).

Ao ver, não somente diante de sentenças processuais terminativas ou de

mérito é que caberá a rescindibilidade, e sim também quando presentes acórdãos e

decisões que ponham termo ao processo.

3.3 TERMO INICIAL DO PRAZO DA AÇÃO RESCISÓRIA

Muito se discute acerca do prazo para a propositura da ação rescisória. A

problemática não se restringe apenas quanto à sua contagem, envolvendo também

questões relativas ao termo a quo e ao termo ad quem (por se tratar de prazo

decadencial, indaga-se se o termo final, recaindo em dia tido como feriado forense,

prorrogar-se-ia ou não para o 1º dia útil subseqüente)198.

Colhe-se dos alfarrábios de Santos199:

O prazo para a ação rescisória ser acionada é de dois anos,

contados a partir do dia imediato àquele em que a sentença ou o

acórdão que se deseja rescindir transitou em julgado, sem nenhuma

cogitação de que foram executados, já que a sua execução nada tem

a ver com a formação da coisa julgada formal. 196 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 04. 197 DINAMARCO, Márcia Conceição Alves. Ação rescisória. São Paulo: Atlas, 2004, p. 43. 198 DINAMARCO, Márcia Conceição Alves. Ação rescisória. São Paulo: Atlas, 2004, p. 61. 199 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 12.

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Ademais, é pacífico perante a jurisprudência que o prazo bianual somente

começa a correr a partir do primeiro dia útil seguinte ao trânsito em julgado da

sentença ou do acórdão rescindendo (§2º do art. 184 do CPC)200.

Enfatiza Diniz201:

Ampliando o quadro de considerações, deve-se enfatizar que o prazo

decandencial para a propositura da ação rescisória começa a correr

da data do trânsito em julgado da sentença ou do acórdão

rescindendos. Entrementes, a interposição de recurso cabível,

mesmo com efeito meramente devolutivo, como especial,

extraordinário ou agravo de despacho denegatório de especial ou

extraordinário, embora não conhecido, afasta o dies a quo da

decadência, exceto se apresentado inopportuno tempore, ou pó parte

ilegítima. Se apresentado tardiamente ou por parte ilegítima, o

recurso não poderia ter produzido efeito de afastar o trânsito em

julgado da decisão rescindenda. In casu, o prazo da rescisória

começa a correr do trânsito em julgado do acórdão proferido no

recurso, mesmo que seja de não-conhecimento.

Não deixa dúvidas que o prazo inicial para propositura da ação rescisória se

verifica a contar do primeiro dia subseqüente ao trânsito em julgado da sentença ou

acórdão proferido nos autos.

Leciona Negrão202:

O prazo de dois anos conta-se do trânsito em julgado. Tal não se

verifica pendendo recurso, cabível e tempestivamente ofertado. Não

faz retroagir aquele termo a circunstância de haver sido julgado

deserto. O termo a quo coincidirá com o momento em que se exaurir

o prazo para impugnar o provimento que reconhecer a deserção

200 DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados: apresentação Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: LTr, 1998, p. 136. 201 DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados: apresentação Ada Pellegrini Grinover. São Paulo: LTr, 1998, p. 137. 202 NEGRÃO, Theotonio. Código de processo civil e legislação processual em vigor. 27ª. ed., São Paulo: Saraiva, 1996, p. 364.

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(STJ-3ª Turma, REsp 5.722-MG, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, j.

22.10.91, v.u., DJU 25.11.91, p. 17.070, 1º col., em.).

Finalmente, em repetida assertiva, se faz dizer, comumente é o prazo inicial

para propositura da ação rescisória a contar do primeiro dia subseqüente ao trânsito

em julgado da sentença ou acórdão proferido nos autos, ou ainda, após prazo útil

para se impugnar tal decisão que o fez suspender.

3.4 ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA EM AÇÃO RESCISÓRIA

A tutela jurisdicional antecipada, instituída pela Lei nº 8.952, de 13.12.94, foi

uma das nossas maiores conquistas atuais, objetivando minimizar as angústias

geradas pelas longas esperas até o julgamento final de um processo203.

Diferentemente do provimento cautelar, o objeto da antecipação da tutela

prevista no art. 273 do Código de Processo Civil é a própria tutela jurisdicional que a

final será confirmada ou infirmada pela sentença. A medida antecipatória conceder-

lhe-á o exercício do próprio direito afirmado pelo autor204.

O lapso de tempo no julgamento da ação rescisória pode deixar sem solução

os problemas imediatos que derivam da decisão proferida, com execução

instaurada, fazendo nascer ao demandante o direito à tutela antecipatória. Por

conseguinte, demonstrada a relevância da fundamentação invocada, como também

a grave lesão de difícil reparação, impõe-se, ao abrigo da regra do artigo 273 do

Código de Processo Civil, seja conferida suspensividade à descisão rescindenda e à

conseqüente execução em curso205.

Depreendesse dos ensinamentos de Nery Junior206:

Na ação rescisória, em tese, pode ser concedida a antecipação de

tutela. O relator deverá ter a prudência de observar os requisitos

legais para a concessão da medida, atentando também para o art.

203 DINAMARCO, Márcia Conceição Alves. Ação rescisória. São Paulo: Atlas, 2004, p. 117. 204 DINAMARCO, Márcia Conceição Alves. Ação rescisória. São Paulo: Atlas, 2004, p. 118. 205 BORGES, Felipe Dezorzi. Antecipação de tutela na Ação Rescisória e a alteração do art. 489 do CPC pela Lei 11.280/06. Caderno Virtual. Nº. 21, v.1, jan – jun/2010, p. 05-06, Disponível em: <http://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/index.php/cadernovirtual/article/viewFile/384/267> (acesso dia: 02.05.2011). 206 JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa M. Andrade. Código de Processo Civil Comentado. 3ª. ed. RT, p. 548.

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489, que dispõe não haver suspensão dos efeitos da sentença ou do

acórdão rescindendo pelo simples ajuizamento da rescisória.

Vislumbrando o relator que o pedido contido na rescisória é fundado

(CPC, 273, caput), e que o atraso na entrega da prestação

jurisdicional poderá tornar ineficaz o direito do autor (CPC, 273, inc.

I), pode conceder o adiantamento, em nome da efetividade do

processo, que deve ser buscada e implementada pelo magistrado.

Portanto, estando uma vez presentes os requisitos autorizadores (CPC, 273),

poderá o julgador conceder a tutela de urgência para impedir a execução da decisão

rescindenda. Atendendo a necessidade de dar efetividade à prestação da tutela

jurisdicional buscada, sobrestando danos de grave ou difícil reparação207.

3.5 LEGITIMIDADE PARA PROPOR AÇÃO RESCISÓRIA

Além dos requisitos mencionados anteriormente, temos ainda como condição

de admissibilidade da ação rescisória a legitimidade e competência208, que será

objeto de estudo nesta oportunidade209.

Dispõe o art. 487 do Código de Processo Civil, que:

Art. 487. Tem legitimidade para propor a ação: 207 BORGES, Felipe Dezorzi. Antecipação de tutela na Ação Rescisória e a alteração do art. 489 do CPC pela Lei 11.280/06. Caderno Virtual. Nº. 21, v.1, jan – jun/2010, p. 07, Disponível em: <http://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/index.php/cadernovirtual/article/viewFile/384/267> (acesso dia: 02.05.2011). 208 É da redação de Costa: “Para se fixar com precisão a competência é necessário diagnosticar qual a última decisão de mérito proferida na causa, pois esta será, sem dúvida, a decisão rescindenda.” Assim, “é o Tribunal de segundo grau ou o tribunal extraordinário que tem competência para rescindir seus próprios arestos, e os de segundo grau para cortar as sentenças de primeiro grau que tenham produzido coisa julgada material viciada.” COSTA, Coqueijo. Ação Rescisória. São Paulo: LTr, 1981, p. 98. Nos dizeres de Didier Jr. e Cunha: “Proferida uma sentença de mérito, e não havendo recurso de apelação, é a própria sentença que transita em julgado, devendo a ação rescisória ser intentada junto ao tribunal ao qual o juízo está vinculado. Caso haja apelação, mas esta não seja conhecida, não é o acórdão do tribunal que transita em julgado. É que, não conhecido o recurso, não se opera o efeito substitutivo previsto no art. 512 do CPC, restando incólume a sentença de mérito proferida pelo juízo de primeira instância. Nesse caso, é a própria sentença prolatada pelo juízo de primeira instância que transita em julgado. Então, a ação rescisória será intentada perante o tribunal ao qual está vinculado o juízo, objetivando desconstituir a sentença, e não o acórdão. Se diversamente, a apelação for conhecida, há os seguintes resultados possíveis: a) não provida; b) provida, para reformar a sentença; c) provida, para anular a sentença.” DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo José Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. 5. ed. v. 3. Salvador: Jus Podivm, 2008, p. 355-356. 209 DINAMARCO, Márcia Conceição Alves. Ação rescisória. São Paulo: Atlas, 2004, p. 88.

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I - quem foi parte no processo ou o seu sucessor a título universal ou singular;

II - o terceiro juridicamente interessado;

III - o Ministério Público:

a) se não foi ouvido no processo, em que Ihe era obrigatória a intervenção;

b) quando a sentença é o efeito de colusão das partes, a fim de fraudar a lei.

Em primeiro plano, são legítimos, o autor e sucessores, o réu e sucessores,

reconvinte e sucessores, reconvindo e sucessores e o Ministério Público. Também

podem intentá-la e intervir, ao lado do réu, os terceiros, com interesse no

resultado210.

Leia-se em Miranda211:

Tem legitimidade a parte, que haja sido o autor, ou o réu, ou o

reconvinte, ou o reconvindo, ou o litisconsorte ou assistente

equiparado a litisconsorte (art.54), ou quem substituiu a parte (arts.

41-43), o assistente na espécie do art. 52, parágrafo único

(assistente do revel assistido, que passa a ser gestor de negócios),

ou do art. 55, em que se diz que, trânsita em julgado a sentença, na

causa em que interveio o assistente, ele não pode, em processo

posterior discutir a justiça da decisão, salvo se, pelo estado em que

recebera o processo, ou pelas declarações e atos do assistido, fora

impedido de pedir provas suscetíveis de influir na sentença, ou

desconhecia a existência de alegações ou de provas, de que o

assistido, por dolo ou culpa, não se valeu. Temos, pois, que lhe

assiste invocar o art. 485, ou o art. 486, para ação rescisória.

Além das partes, são legitimados os seus sucessores, quer

universais, quer singulares, quer por ato entre vivos ou a causa de

morte.

210 MIRANDA, Pontes de. Tratado da Ação Rescisória. Campinas: Bookseller, 1998, p. 188-189. 211 MIRANDA, Pontes de. Tratado da Ação Rescisória. Campinas: Bookseller, 1998, p. 196-199.

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Quanto ao Ministério Público, pode ele ter sido parte no processo,

como pode ter recorrido, quando em simples função de fiscal da lei

(art. 499, § 2º).

Outrossim, qualquer terceiro que se inclua no que se estabelece no

art. 42, § 2º (na espécie do art. 42, § 1º, se fez parte, em

substituição), ou no art. 42, § 3º (isto é, mesmo se não foi pedido o

ingresso, ou se não assistiu, como adquirente ou cessionário), é

legitimado à ação rescisória.

Nessa via, a legitimidade ad causam está elencada no art. 485 do CPC, que

segundo a acepção legal, tem um sentido restrito que deve ser ampliado para

atender às solicitações da Sociologia Jurídica, cabendo a doutrina e à jurisprudência

corrigir a lei ou adequá-la às necessidades da sociedade212.

3.6 HIPÓTESES DE CABIMENTO DA AÇÃO RESCISÓRIA

3.6.1 Prevaricação, Concussão e Corrupção do Juiz

A teor do artigo 485, caput e inciso I, do Código de Processo Civil, o decisum

pode ser desconstituído por meio de ação rescisória quando se verificar

prevaricação, concussão ou corrupção do magistrado que o proferiu213.

Quanto à prevaricação, redaciona Diniz214:

Para o mestre Pinto Ferreira, prevaricando, “a pessoa visa ao

interesse ou sentimento pessoal. O interesse pessoal é aquele que

importa de qualquer modo à pessoa e tem por objeto um lucro ou

ganho material, ou uma vantagem moral. Já o sentimento é a

afeição, que gera a simpatia, a dedicação, a benevolência, a

parcialidade; o ódio que produz efeitos contrários; a contemplação

que é a condescendência, a conformação com a vontade alheia.

Podem ser importantes ainda o amor, a inveja, a amizade, e a

inimizade, o despeito, a gratidão, o ciúme”. 212 VALLE, Christino Almeida do. Teoria e prática da ação rescisória. 3ª. ed. Rio de Janeiro: AIDE Editora, 1990, p. 101. 213 SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 4ª. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 487. 214 DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados. São Paulo: LTr, 1998, p. 124-125.

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PREVARICAÇÃO – Art. 319 – Retardar ou deixar de praticar, indevidamente,

ato de oficio, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer

interesse ou sentimento pessoal:

Pena – detenção de três meses a um ano, e multa de mil cruzeiros a quatro

mil cruzeiros215.

A prevaricação é a infidelidade ao dever funcional e o desempenho deste com

parcialidade. Na prevaricação, exige-se o dolo específico, a qualidade de funcionário

e o ato de ofício. Entretanto, a prevaricação culposa, se admitida no cível, constituirá

vício, tornando rescindível a sentença. Porém, sendo o Estado detentor do poder-

dever de entregar a prestação jurisdicional, não é lógico pressupor prevaricação no

ato omissivo de sentenciar216.

CONCUSSÃO – Art. 316 – Exigir, para si ou para outrem, direta ou

indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela,

vantagem indevida:

Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa, de quatro mil cruzeiros a

quarenta mil cruzeiros217.

Concussão, a seu turno, é sinônimo de extorsão. Ato do juiz de exigir do

particular o que não é devido, utilizando de artifícios, consubstancia a concussão218.

A exigência de vantagem indevida, em razão da função, mesmo que antes de

assumi-la é o suficiente para que o juiz incorra nessa modalidade de crime,

possibilitando a parte ofendida interpor rescisória do julgado.

CORRUPÇÃO – Art. 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta

ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão

dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:

Pena – reclusão, de um a oito anos, e multa, de seis mil cruzeiros a trinta mil

cruzeiros219.

A corrupção se materializa por qualquer espécie de suborno direto ou indireto

do magistrado220.

215 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 40. 216 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 40-41. 217 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 41. 218 DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados. São Paulo: LTr, 1998, p. 125. 219 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 41. 220 DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados. São Paulo: LTr, 1998, p. 126.

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Pontes de Miranda, ao analisar o assunto, enfatiza que tanto a corrupção

ativa quanto a passiva do juiz desafia a interposição de Ação Rescisória221. Desse

modo, qualquer que seja a modalidade de cometimento do crime, faculta a parte sua

desconstituição.

3.6.2 Impedimento ou Absoluta Incompetência do Juízo

A ação rescisória também pode ser ajuizada contra decisum proferido por

magistrado impedido ou “absolutamente incompetente”. É o que estabelece o artigo

485, caput e inciso II, do Código de Processo Civil. As hipóteses de impedimento

estão previstas nos artigos 134 e 136222.

Assim, passível do juízo rescisório é toda a sentença proferida por juiz que,

direta ou indiretamente, tenha interesse no objeto do pedido da prestação

jurisdicional, ou que nele haja praticado qualquer ato, excetuado, naturalmente,

aquele que culminou na sua declaração de impedimento223.

Exorta dos Santos224:

O impedimento existe, quer se trate de processo de jurisdição

contenciosa, quer graciosa ou voluntária. Basta o seu interesse no

objeto da relação jurídica em discussão para estar presente o

impedimento.

Havendo, portanto, o magistrado interesse no objeto da relação jurídica,

poderá esta ser rescindida, ao passo de ser o impedimento de caráter subjetivo.

O texto cuida também das sentenças proferidas pelo juiz absolutamente

incompetente, em razão da matéria ou da hierarquia (vide arts. 111 e 113 do Código

de Processo Civil). Quer dizer: só estão sujeitos ao juízo rescisório às sentenças

221 DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados. São Paulo: LTr, 1998, p. 126. 222 SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 4ª. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 489. 223 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 37. 224 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 37.

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proferidas pelos magistrados que de nenhum modo podiam julgar a causa, por lhes

faltar competência para decidir a relação jurídica posta em debate225.

No que concerne à incompetência; para ser rescindível, somente se for

absoluta. Já a relativa não permite a rescisão, uma vez que dentro do prazo para a

resposta se ela não for argüida, acarreta prorrogação de incompetência.

Rescindíveis, desse modo, são as sentenças proferidas pelos juizes

absolutamente incompetentes em razão da matéria ou da hierarquia226.

3.6.3 Violação de Literal Disposição de Lei

A lei aqui compreendida é em sentido amplo, podendo ser: federal, estadual,

municipal, lei ordinária, complementar, delegada, decreto, autônomas, material,

processual, etc., bem como acordos e convenções coletivas227.

Sob enfoque de Souza228:

Com efeito, o vocábulo “lei” deve ser interpretado em sentido lato,

alcançando a Constituição, as emendas à Constituição, as leis

federais, as leis estaduais, as leis municipais, as leis ordinárias, as

leis complementares, as leis delegadas, as leis processuais, as leis

materiais, as medidas provisórias, os decretos, os regulamentos, as

resoluções e até mesmo os regimentos internos dos tribunais.

A violação da lei tanto pode ser in procedendo (normas de direito

processuais) quanto in judicando (normas de direito material)229.

Há violação literal de lei quando a sentença, erroneamente, nega vigência ao

dispositivo legal, ou deixa de aplicá-lo230.

225 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 37. 226 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 38. 227 DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados. São Paulo: LTr, 1998, p. 90. 228 SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 4. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 495. 229 Destaca Diniz que “A violação da lei tanto pode ser in procedendo quanto in judicando”. Ao que “Ocorre error in procedendo, ou vício de atividade, quando o juiz encarregado de dirigir o processo infringe qualquer norma procedimental que ponha em risco a rigidez da relação jurídica processual. Ocorre error in judicando, ou vício de juízo, ou erros de fundo, quando o juiz infringe norma de direito substancial, que provocam a injustiça do ato judicial. DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados. São Paulo: LTr, 1998, p. 90. 230 DINIZ, José Janguiê Bezerra. Ação rescisória dos julgados. São Paulo: LTr, 1998, p. 90.

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O vocábulo “literal” inserto no inciso V do artigo 485 revela a exigência de que

a afronta deve ser tamanha que contrarie a lei em sua literalidade. Já quando o texto

legal dá ensejo a mais de uma exegese, não é possível desconstituir o julgado

proferido à luz de qualquer das interpretações plausíveis231.

Nesse sentido, trata a Súmula nº. 343 do Supremo Tribunal Federal: “Não

cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão

rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos

tribunais”.

A despeito disso, é que a ação rescisória somente poderá ser ajuizada

quando flagrante descumprimento legal quer seja por negar vigência ao dispositivo

de lei, ou omissão do julgador em aplicá-lo.

Cabe lembrar que a ilegalidade deve ser da decisão, e não dos motivos, uma

vez que estes não fazem coisa julgada.

3.6.4 Dolo da Parte Vencedora ou Colusão entre as Partes

Citando Liebman, dilucida Barbosa Moreira que ocorre dolo da parte

vencedora quando esta, faltando ao dever de lealdade e boa-fé (art. 14, n. II do

CPC), haja impedido ou dificultado a atuação processual do adversário, ou

influenciado o juízo do magistrado, em ordem a afastá-lo da verdade232.

Vidigal233, citando Chiovenda, estipula que “O Código refere-se ao dolo da

parte vencedora. Esse dispositivo deve ser interpretado extensivamente; abrange,

também, o dolo do representante legal”.

Assim, se a sentença teve como suporte fático o procedimento doloso da

parte vencedora, em prejuízo da vencida, contrariados, foram o direito e a vontade

do Estado, que querem que esse direito seja realizado com justiça234.

Nessa esteira, prossegue Santos: “A lei exige que as partes e seus

procuradores exponham os fatos em juízo conforme a verdade e lhes impõe o dever

de procederem com lealdade e boa fé”.235

231 SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 4. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 495-496. 232 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 48. 233 VIDIGAL, Luís Eulálio de Bueno. Comentários ao Código de Processo Civil. Vol. VI. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1974, p. 83. 234 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 38.

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Concorrentemente, havendo dolo da parte vencedora, ou de seu

representante legal, em prejuízo da vencida, evidente será o direito a

desconstituição do julgado.

Por outro lado, a colusão existe quando o autor e o réu utilizam o processo

como trampolim para a pratica de atos contrários a lei, visando conseguir, com isto,

fim proibido por ela236.

Teixeira Filho237 cita o seguinte exemplo de colusão entre as partes: “A

simulada ruptura do contrato de trabalho pelo empregador, sem justa causa, com o

objetivo de permitir que o empregado saque os valores depositados em sua conta

relativa ao FGTS”.

Desta maneira, a colusão consiste no dolo das partes em fraudar a lei,

visando extrair alguma benesse proibido por ela.

3.6.5 Ofensa à Coisa Julgada

Salientemos, antes de mais nada, que não é somente através da ação

rescisória que o interessado pode se rebelar contra a sentença que ofende a coisa

julgada. Ela pode ser requerida, também, como meio de defesa. Sim, porque na

forma do disposto no inciso IV do art. 301 do Código de Processo Civil, o réu pode

discuti-la por ocasião de contestar a ação contra ele proposta, caso já tenha, em seu

favor, sentença passada em julgado em prol do objeto da discussão na causa238.

Estipula o artigo 467 do Código de Processo Civil: “denomina-se coisa julgada

material a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a

recurso ordinário ou extraordinário”.

Ofende-se a coisa julgada com novo pronunciamento sobre a res in juditio

deducta, já decidida definitivamente pela coisa julgada material. Não importa se o

novo pronunciamento é igual ao primeiro: o rejulgamento é absolutamente

proibido239.

235 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 38. 236 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 38. 237 TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Ação rescisória no processo do trabalho. São Paulo: LTr, 1991, p. 237. 238 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 39. 239 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 55.

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Logicamente, o que precisa saber é se o que foi decidido pela sentença

passou a constituir coisa julgada capaz de legitimar a movimentação do juízo

rescisório. E tal se dá, porque não é sempre que a decisão importa em res

judicata240.

D’outro modo, para a admissibilidade da ação rescisória, não há importância

se esta foi argüida como preliminar em sede de contestação, e mesmo assim não foi

solucionada241.

Com efeito, exemplifica Santos242:

A sentença proferida em Mandado de Segurança, por exemplo, pode

ou não constituir coisa julgada. Esclareçamos: se ela conclui pela

ausência do direito material reclamado pelo impetrante do

mandamus, não há dúvida que passa a constituir coisa julgada,

desde o momento em que deixa de ficar sujeita aos recursos

ordinário e extraordinário.

Se, todavia, o writ foi negado por não ser líquido e certo o direito

substancial nele enfocado, se haverem os juizes se adentrado pelo

merecimento do pedido, obviamente essa sentença não se revestirá

dos parâmetros da coisa julgada, podendo o impetrante voltar a

invocar a prestação jurisdicional para ver o seu direito dirimido no

juízo ordinário.

Posteriormente, averiguado ser a sentença coisa julgada material – e não

formal – caberá o juízo rescisório, tornando nula a segunda sentença.

Igualmente, não produzem coisa julgada, além da decisão incidenter tantum,

os motivos da sentença e a verdade dos fatos estabelecida como fundamento do

decisum243.

240 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 39. 241 Souza argumenta que “Não tem nenhuma importância para a admissibilidade da ação rescisória se a preliminar de coisa julgada foi, ou não, solucionada no decisum rescindendo. Com efeito, ainda que rejeitada a preliminar, é possível em nosso direito ressuscitar a ofensa à coisa julgada em ação rescisória”. SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 4. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 493. 242 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 39-40. 243 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 55.

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Derradeiro, para Alvim, prevalece a primeira decisão, em detrimento da

segunda e a esta o Judiciário deve negar cumprimento, por afronta à Constituição

(art. 153, § 3º.)244.

3.6.6 Falsidade da Prova

A falsidade de que fala o inciso VI do art. 485 do Código de Processo Civil é

ampla e, portanto, inclui a material e a ideológica. O fato dela haver sido levantada

ou não, nos autos do processo de que tenha originado a sentença que se deseja

rescindir, é de importância nenhuma245.

É falso aquilo que, não sendo verdade, se houver por verdade (Paulo).

Juridicamente, a falsidade deve ter por objeto a obtenção de vantagem ilícita246.

Quanto à falsidade material e ideológica, sublinha Souza247:

Sem dúvida, é irrelevante se a falsidade reside na forma ou no fundo,

ou seja, se o vício que contamina a prova é de construção ou de

conteúdo. Também não importa se a prova falsa é documental,

pericial ou testemunhal. Em todas as hipóteses, o julgado

contaminado deve ser rescindido. Porém, se a prova viciada não teve

nenhuma importância para o desate do processo primitivo, a

rescisória não prospera, já que o dispositivo do julgado impugnado

subsiste independentemente da prova considerada falsa.

Destarte, para que haja desconstituição da sentença rescindenda, faz-se

necessário que a prova falsa tenha contribuído para a formação da coisa julgada,

sem a qual, não se chegaria a um resultado diverso.

Destaca-se ainda, que a demonstração da prova falsa pode ser efetuada na

própria ação rescisória, em curso, como também, após ser reconhecida em juízo

criminal condenatório irrecorrível.

244 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 56. 245 SANTOS, Ulderico Pires dos. Teoria e prática da ação rescisória. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 42. 246 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 63. 247 SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 4ª. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 498.

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3.6.7 Documento Novo

O conceito é abrangente no direito brasileiro: documento não é

exclusivamente aquele que for escrito (como no direito alemão). Inclui fotografias,

filmes, fitas magnéticas, quaisquer sinais gráficos, etc., que, à guisa de reproduções

mecânicas, são considerados documentos248.

Nas palavras de Santos249: “Os documentos tomam corpo no papel em que

são escritos, ou ainda, por exceção, na tela, na cera, na pedra, no metal, na madeira

e em coisas semelhantes”.

Efetivamente, se documento posterior ao momento final da produção da

prova e se capaz, por si só, de assegurar melhor pronunciamento em favor do autor

da demanda de invalidade da sentença, apta, pois, a rescisória250.

O documento somente será considerado novo, entretanto, devendo o autor

provar, se este foi ignorado no curso da ação, e tomou conhecimento após a

sentença ou após a fase processual que lhe era cabível.

Consecutivamente, o autor da ação rescisória deve provar a inexistência de

culpa – o documento juntado na inicial não estivesse ao alcance da parte no curso

da instrução da decisão rescindenda251.

In fine, o documento novo deve haver força probante capaz, por si só, de lhe

(a parte) assegurar pronunciamento favorável252.

3.6.8 Invalidade da Confissão, Desistência ou Transação em que se baseou a

Sentença

O vocábulo “confissão” deve ser interpretado em sentido amplo, abrangendo

a confissão propriamente dita, prevista nos artigos 348 e seguintes do Código de

248 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 68. 249 SANTOS, Moacyr Amaral. Comentários ao CPC. Vol. IV, Rio de Janeiro: Forense, 1976, p. 163. 250 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 327. 251 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 328. 252 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 329.

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Processo Civil, bem como o reconhecimento do pedido, tratado no artigo 269, inciso

II, do mesmo diploma253.

Efetivamente, o inciso sob análise não contém a restrição que o caput do

artigo 352 apresenta, haja vista que este limita a revogação da confissão às

hipóteses de erro, dolo ou coação, ao passo que o inciso analisado fala

genericamente em fundamento para invalidar a confissão. Quer isso dizer que pode

a rescisória, com base no inciso em questão, se fundar em outras alegações que

não aquelas expressamente consagradas no artigo 352, II, CPC, como, por

exemplo, quando a confissão foi efetivada por procurador que não dispunha de

poderes para tanto254.

Oportuno, ainda, registrar que não basta que a confissão apresente vício para

que daí resulte a ação rescisória. É necessário que a confissão seja o fundamento

da sentença cuja rescisão se pretenda255.

Quanto à desistência, não utilizou o Código, nesta passagem, o termo técnico

adequado, porque a desistência, que se refere à ação, determina a extinção do

processo sem julgamento de mérito (art. 267, VIII). Ora, a extinção sem julgamento

de mérito não enseja sentença rescindível, daí se dever entender a desistência do

direito, que, na terminologia do Código, é a renúncia (art. 269, V)256.

Já a transação, de sua parte, dá origem à sentença de mérito (art. 269, III,

CPC) apesar da natureza meramente homologatória desta257.

A transação é, a um só tempo, negócio jurídico de direito material e ato

jurídico (Von Thur). O acordo de vontades é regulado pelo direito material mas, sem

a homologação, não teria eficácia no processo (Ugo Rocco)258.

Para bem compreender o artigo 486 e sua convivência com o inciso VIII, do

art. 485, ora examinado, é necessário, de logo, saber que é possível a anulação do

253 SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 4 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 500. 254 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 331-332. 255 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 332. 256 GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1986, v. 2, p. 372. 257 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 333. 258 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 74.

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negócio jurídico ajustado pelas partes, não obstante a existência de sentença

homologatória passada em julgado259.

Diversa, contudo, é a situação em que o vício aparece na própria decisão

homologatória, e não no negócio jurídico, tal como quando a decisão é proferida por

juiz absolutamente incompetente. Diante desse quadro, estando o vício –

exclusivamente – presente na sentença, contra esta tomar-se-á a providencia

adequada para invalidá-la, ou seja, a propositura da devida ação rescisória de

julgado260.

Dessa forma, possível a convivência das normas, eis que, dependendo da

origem do vício, caberá uma ou outra providência, vale dizer, se o vício estiver no

ato das partes, ação anulatória ou rescisória, na medida que ambas induzirão à

invalidade do negócio e da sentença; se, entretanto, estiver no ato jurisdicional, ação

rescisória, quando, então, permanecerá válido o negócio jurídico subjacente261.

3.6.9 Erro de Fato

Quem define erro de fato é o § 1º do art. 485 do CPC: é um fato inexistente,

ou quando se considerar inexistente um fato efetivamente ocorrido. Não se

confunde, pois, com o erro de direito, que é a ignorância da lei ou sua errada

compreensão262.

O vício, aqui, reporta-se à própria sentença, e não ao juiz, a quem não se

requer seja o erro imputável: a sentença é que está objetivamente viciada na sua

formação, sem ter a ver com o processo mental do juiz no momento de sentenciar. O

erro do juiz sobre fatos da causa faz a sentença injusta, que não dá azo à ação

rescisória263.

Assim, quando a lei admite a rescisão por erro de fato, o que, em verdade,

está a admitir é que, acaso o juízo proferira decisão levando em conta fato

259 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 333. 260 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 333-334. 261 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 334. 262 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 79. 263 COSTA, Coqueijo. Ação rescisória. 3ª. ed. rev. e aumentada. São Paulo: LTr, 1984, p. 78.

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inexistente ou quando considere existente fato que não ocorreu, passível é a

rescisão264.

Cumpre destacar que, além das exigências legais já enunciadas,

concorrentemente, devem estar presentes também as seguintes condições: a) o erro

deve ser a causa da conclusão a que chegou a decisão; b) o erro deve ser apurado

pelo simples exame dos autos do processo em que foi prolatada a decisão, cuja

rescisão se pretende; c) inadmissível a produção de prova do erro na demanda

rescisória; d) não tenha havido controvérsia sobre o fato; e e) não tenha havido, por

igual, pronunciamento judicial em torno do fato265.

Derradeiro, o pensamento da lei é que só se justifica a abertura de via para

rescisão quando seja razoável presumir que, se houvesse atentado na prova, o juiz

não teria julgado no sentido em que julgou. Não, porém, quando haja ele julgado em

tal ou qual sentido por ter apreciado mal a prova em que atentou266.

264 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 337. 265 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 338. 266 PORTO, Sérgio Gilberto. Comentários ao código de processo civil: processo de conhecimento, arts. 444 a 495. v. 6. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2000, p. 338.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente trabalho teve como objetivo investigar, à luz da legislação, da

doutrina e da jurisprudência, a Ação Rescisória no Direito Processual Civil Brasileiro.

O interesse pelo tema deu-se em razão de sua diversidade, amplitude e

importância, notadamente pelo fato de ser concebido para beneficiar as partes

contra as chamadas sentenças “injustas”.

Para seu desenvolvimento lógico o trabalho foi dividido em três capítulos. No

primeiro, viram-se os elementos e condições da ação, abrangendo em seus tópicos

com a possibilidade jurídica do pedido, o interesse de agir e a legitimidade para se

propor a ação.

No segundo capítulo, pesquisou-se acerca das modalidades de sentenças

existentes no direito brasileiro, onde foram encontradas as sentenças de mérito,

típicas e atípicas.

Outrossim, no tocante a coisa julgada, estudou-se em suas duas

modalidades: coisa julgada formal e coisa julgada material.

Em incurso nesta, descobriu-se haver dois tipos de limites inerentes: limite

objetivo e limite subjetivo.

No limite objetivo, este se restringe ao dispositivo da sentença processual de

mérito. No limite subjetivo, gera efeitos entre as partes litigantes, não podendo ser

oponível a terceiros.

No terceiro e último capítulo, intensificou-se a pesquisa sobre o bem

delineado, hipóteses de cabimento da Ação Rescisória, partindo da interpretação da

sua regra estruturante, centrada no artigo 485 do Código de Processo Civil

Brasileiro.

Como principais resultados da pesquisa, pode-se ressaltar que as hipóteses

de cabimento da ação rescisória, no presente cenário jurídico nacional, configura um

direito subjetivo da parte, de natureza potestativa, já que pode ser exercitada

unilateralmente pelo sujeito passivo, isto é, independente de prévia autorização da

parte contrária ou até mesmo contra sua vontade.

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Para a configuração do direito a ação rescisória, basta somente estar

presente o requisito formal, sentença de mérito transita em julgado, eivada em vício

que permita sua desconstituição.

Assim, no mais, retomam-se as hipóteses levantadas e que impulsionaram a

presente pesquisa:

a) As sentenças que se encontram elencadas no artigo 269 do Código de

Processo Civil;

b) O cabimento da ação rescisória é possível a partir de encontrados os

elementos que possibilitem sua impetração, tais como vícios na sentença de mérito

transitada em julgado;

c) As hipóteses se encontram no artigo 485 do Código de Processo Civil,

sendo elas: I – verificar prevaricação, concussão ou corrupção do juiz; II – proferida

por juiz impedido ou absolutamente incompetente; III – resultar de dolo da parte

vencedora em detrimento da vencida ou concussão das partes a fim de fraudar a lei;

IV – ofender a coisa julgada; V – violar literal disposição de lei; VI – se fundar em

prova falsa; VII – depois da sentença, o autor obtiver documento novo; VIII – houver

fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação; e ainda, IX – fundada

em erro de fato.

No que toca a primeira hipótese, restou confirmada, pois o Código de

Processo Civil Brasileiro, em seu artigo 485, elenca as possibilidades de rescisão do

julgado, onde verificado em uma delas, que a sentença incorreu, estará o direito do

autor apto para requerer a desconstituição.

A segunda hipótese também restou confirmada, pois, estando a parte frente a

uma decisão de mérito transitada em julgado, conforme mencionada no artigo 269

do Código de Processo Civil, este poderá requerer em juízo a rescisão da sentença.

Quanto à última hipótese, registra-se que igualmente restou confirmada, uma

vez que o art. 485 do CPC elenca as hipóteses de cabimento da ação rescisória,

bastando tão somente estar a sentença processual incompatível com a Constituição

ou naqueles cujos dispositivos afrontem diretamente a Lex Mater.

Assim, no exame do mecanismo rescisório, importa sobremaneira a distinção

da coisa julgada, sabendo-se que tão somente nos casos de coisa julgada material é

que importará a rescisória com fulcro nos dispositivos do artigo 485 do CPC.

Por fim, fica o registro de que o presente trabalho não tem caráter exaustivo,

isto é, com o mesmo não se teve a pretensão de tratar de todas as questões que

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norteiam as hipóteses de rescisão de sentença, razão pela qual deve servir apenas

de ponto de partida para o necessário e contínuo acompanhamento da evolução de

entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca desta tão relevante matéria do

Direito Processual.

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