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1 Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13 th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos), Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X CONCEPÇÃO DE SUBJETIVIDADE EM BUTLER NO JOGO DE TABULEIRO VIOLETAS: CINEMA&AÇÃO NO ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER - AGENCIAMENTOS DE GÊNERO E CIDADANIA Maria Raquel Gomes Maia Pires 1 Resumo: O jogo de tabuleiro Violetas: cinema&ação no enfrentamento da violência contra a mulher é uma tecnologia lúdico-educativa que ambienta de forma inventiva as reflexões sobre as questões de gênero. Num possível diálogo entre a filosofia de Butler e a perspectiva do lúdico, questiono: de que forma a concepção de subjetividade, em Butler, articulada à perspectiva agonista do lúdico, produz discursos subversivos de gênero e de cidadania, no jogo Violetas? Os argumentos são: i-a concepção performativa de subjetividade - entendida como uma construção plural de sentidos, de ações e de afetos delineada provisoriamente por ambíguas formas de expressão de sexo, de gênero e de desejo do ser humano - coaduna-se com o caráter agonista do lúdico, ao produzir subversões de identidades sobre gênero, poder e cidadania; ii- no jogo Violetas, a perspectiva agonista de subjetividade produz discursos sobre as identidades de gênero que agenciam novos sentidos de poder e de cidadania para as mulheres. Objetivos: discutir as características agonistas do lúdico na concepção de subjetividade de Butler; analisar as possibilidades de agenciamentos discursivos sobre gênero, poder e cidadania no jogo. Faz-se uma discussão conceitual da subjetividade presente no Violetas e nos depoimentos das/os jogadoras/es (profissionais das políticas para as mulheres). Nas partidas, os agenciamentos são induzidos por estratégias que possibilitam discursos disruptivos sobre gênero, poder e cidadania. Palavras-chave: Subjetividade, Gênero, Poder, Cidadania, Violência contra a mulher, Tecnologias educativas. Introdução A violência é uma relação social imersa em disputas de poderes com múltiplas faces na sociedade e, no caso das agressões contra a mulher, é uma das formas de expressão da desigualdade entre os gêneros. A perspectiva de gênero, na epistemologia feminista, diz respeito às relações sociais opressivas baseados unicamente nas diferenças visíveis entre os sexos, à revelia das práticas discursivas inscritas nos valores simbólicos, normativos, políticos e nas subjetividades identitárias que as constituem. O gênero é uma relação socialmente construída e uma forma de significar as relações de poderes entre homens e mulheres, na qual o portador da genitália masculina assume uma pretensa primazia, forjada na cultura e numa heteronormatividade compulsória (SCOTT, 1995; BUTTLER, 2015). Numa suposta trajetória pensada para as meninas e mulheres em situação de violência no âmbito das políticas públicas, poderíamos hipoteticamente prever que, caso elas escapem dos pais, 1 Doutora em Política Social (UnB), pós-doutorados em arte, lúdico e tecnologias educativas (UnB) e em sociologia do gênero (ISCT/IUL/PT). Professora adjunta da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB), Brasília-DF, Brasil.

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Seminário Internacional Fazendo Gênero 11 & 13th Women’s Worlds Congress (Anais Eletrônicos),

Florianópolis, 2017, ISSN 2179-510X

CONCEPÇÃO DE SUBJETIVIDADE EM BUTLER NO JOGO DE

TABULEIRO VIOLETAS: CINEMA&AÇÃO NO ENFRENTAMENTO DA

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER - AGENCIAMENTOS DE GÊNERO E

CIDADANIA

Maria Raquel Gomes Maia Pires1

Resumo: O jogo de tabuleiro Violetas: cinema&ação no enfrentamento da violência contra a

mulher é uma tecnologia lúdico-educativa que ambienta de forma inventiva as reflexões sobre as

questões de gênero. Num possível diálogo entre a filosofia de Butler e a perspectiva do lúdico,

questiono: de que forma a concepção de subjetividade, em Butler, articulada à perspectiva agonista

do lúdico, produz discursos subversivos de gênero e de cidadania, no jogo Violetas? Os

argumentos são: i-a concepção performativa de subjetividade - entendida como uma construção

plural de sentidos, de ações e de afetos delineada provisoriamente por ambíguas formas de

expressão de sexo, de gênero e de desejo do ser humano - coaduna-se com o caráter agonista do

lúdico, ao produzir subversões de identidades sobre gênero, poder e cidadania; ii- no jogo Violetas,

a perspectiva agonista de subjetividade produz discursos sobre as identidades de gênero que

agenciam novos sentidos de poder e de cidadania para as mulheres. Objetivos: discutir as

características agonistas do lúdico na concepção de subjetividade de Butler; analisar as

possibilidades de agenciamentos discursivos sobre gênero, poder e cidadania no jogo. Faz-se uma

discussão conceitual da subjetividade presente no Violetas e nos depoimentos das/os jogadoras/es

(profissionais das políticas para as mulheres). Nas partidas, os agenciamentos são induzidos por

estratégias que possibilitam discursos disruptivos sobre gênero, poder e cidadania.

Palavras-chave: Subjetividade, Gênero, Poder, Cidadania, Violência contra a mulher, Tecnologias

educativas.

Introdução

A violência é uma relação social imersa em disputas de poderes com múltiplas faces na

sociedade e, no caso das agressões contra a mulher, é uma das formas de expressão da desigualdade

entre os gêneros. A perspectiva de gênero, na epistemologia feminista, diz respeito às relações

sociais opressivas baseados unicamente nas diferenças visíveis entre os sexos, à revelia das práticas

discursivas inscritas nos valores simbólicos, normativos, políticos e nas subjetividades identitárias

que as constituem. O gênero é uma relação socialmente construída e uma forma de significar as

relações de poderes entre homens e mulheres, na qual o portador da genitália masculina assume

uma pretensa primazia, forjada na cultura e numa heteronormatividade compulsória (SCOTT, 1995;

BUTTLER, 2015).

Numa suposta trajetória pensada para as meninas e mulheres em situação de violência no

âmbito das políticas públicas, poderíamos hipoteticamente prever que, caso elas escapem dos pais,

1 Doutora em Política Social (UnB), pós-doutorados em arte, lúdico e tecnologias educativas (UnB) e em sociologia do

gênero (ISCT/IUL/PT). Professora adjunta da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília (UnB),

Brasília-DF, Brasil.

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dos irmãos ou dos companheiros violentos em seus lares e nas ruas, elas estariam mais seguras e

protegidas nos serviços de políticas para as mulheres. Porém, as chamadas violências invisíveis,

como a simbólica (coerções que se baseiam nos acordos não conscientes entre as estruturas

objetivas e mentais das pessoas) e a institucional (aquela praticada por ação e/ou omissão nas

instituições prestadoras de serviços públicos), desvirtuam este caminho. Acerca disso, diversas

investigações denunciam as práticas de omissão ou de tolerância institucional das/os agentes

públicos, oriundas de julgamentos morais que reforçam os estereótipos de gênero2 sobre as

mulheres, o que resulta em revitimização no âmbito dos serviços de atendimento às vítimas da

violência (BOURDIEU, 2014; BRASIL, 2011; CFEMEA, 2014; DINIZ et al, 2014;

BRAGAGNOLO et al, 2015).

Neste cenário complexo, em que a violência simbólica e institucional se manifestam nas

políticas públicas que deveriam promover os direitos das meninas e mulheres, cabe um retorno à

epistemologia feminista, em sua crítica desconstrutora3 à naturalização da violência de gênero.

Segundo Swain (2016), precisamos ficar atentas aos muitos modos de produção do patriarcado, que

passeia novamente em roupas renovadas do neoliberalismo, muitas vezes com apoio dos próprios

movimento feminista. Como exemplo, ela ressalta a defesa cega de algumas feministas às

‘trabalhadoras do sexo’ que, segundo a autora, esquecem de denunciar o agenciamento patriarcal

que mantém e reproduz as mulheres como mercadorias à disposição dos homens.

Dentre as temáticas discutidas na epistemologia feminista, em sua crítica à exploração das

mulheres em distintos contextos, destacam-se dois temas imbricados: a- o redesenho do político no

questionamento da dicotomia entre o público e o privado; b- a redefinição da noção de sujeito para

o enfrentamento das desigualdades de gênero. Denuncia-se que a legitimidade da opressão dos

homens sobre as mulheres fora realizada sobretudo por discussões filosóficas, doutrinárias e

científicas que privilegiam o predomínio do sujeito da razão universal, masculino, pretensamente

neutro e determinante nas decisões da esfera pública (MIGUEL E BIROLI, 2013).

Em contraponto, a epistemologia feminista influenciada pelo pós-estruturalismo defende

uma perspectiva não fixada de sujeito que se forja a partir de identidades múltiplas. Para Butler

2 Conforme Cook e Cusack (2010), os estereótipos são conceituados como visões fixas ou preconceituosas de atributos

que as pessoas possam ter, ou que a sociedade espera que possuam, independentemente de suas capacidades. Embora

atinjam os homens e as mulheres, a questão de gênero imprime uma discriminação negativa e mais dolosa às mulheres,

portanto merece olhares apurado. 3 O conceito de desconstrução, neste artigo, inscreve-se na filosofia de Derrida. O termo consiste numa operação

linguística denunciadora, num determinado texto, daquilo que é valorizado e em nome de quê para, ao mesmo tempo,

destacar o que foi estruturalmente dissimulado nesse texto. Baseamo-nos em especial nas reflexões de Derrida acerca da

sua resposta à questão se a desconstrução assegura ou permite a justiça. Em sua argumentação, a ‘desconstrução é a

própria justiça’, na medida em que ela permite a experiencia do possível, justo ali onde é impossível (Derrida, 2010).

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(2015), a noção de sujeito é uma construção plural de sentidos, de ações e de afetos, delineada

provisoriamente por ambíguas formas de expressão performativas de sexo, de gênero e de desejo do

ser humano. Ela defende uma subjetividade para o feminismo multifacetada, plural e diversa,

caracterizada por uma incompletude essencial - imersa em relações de poderes e de linguagens que

produzem múltiplos significados contestados. Esta subjetividade seria uma subversão das

identidades binárias de sexo (homem/mulher), de gênero (masculino/feminino) e de desejo

(hegemonia do discurso heterossexual), como ambiência para a produção de sentidos e de

enfrentamentos das desigualdades.

No bojo dessas reflexões, aparece a necessidade de desvelamento de padrões discursivos que

se apresentam como ‘naturais’, pré-requisito da educação crítica que privilegia a cidadania. Diante

da complexidade da violência de gênero que discrimina as mulheres na sociedade, muitas vezes

reproduzida pelas/os próprias/os agentes públicos, urge a necessidade de fortalecer estratégias

pedagógicas que ambientem reflexões desconstrutoras dos estereótipos de gênero no enfrentamento

das violências. O caráter irreverente da educação crítica pode ser motivado, muitas vezes, pela

experiência lúdica, expressa no caráter irreverente, disruptivo, imaginativo e criativo das relações

sociais, inerente às culturas. As manifestações lúdicas ocorrem nas diversas expressões de

convivência humana e não se restringem aos jogos propriamente ditos - mas também nas artes, na

política, nos relacionamentos, nas organizações, ou mesmo na religião, há sempre um tenso e

ambíguo conflito, nem sempre explícito (HUIZINGA, 2008; CALLOIS, 1990).

Neste sentido, como ambiência para as discussões reflexivas de graduandas/os e

profissionais interessados nas questões de gênero, produzimos, com financiamento do Cnpq, o jogo

VIOLETAS: cinema & ação no enfrentamento da violência contra a mulher4, uma tecnologia

lúdico-educativa centrada nas discussões e nas ações de enfrentamento da violência no âmbito das

políticas públicas, no tabuleiro. O desenho do jogo foi orientado pelas seguintes categorias oriundos

da epistemologia feminista: a- subjetividades plurais e em disputa por espaços de cidadania; b-

redes de poder e políticas para conter a opressão sobre o feminino; c- as violências visíveis e

invisíveis como alvo; d- o campo do lúdico e o lúdico no campo (Pires et al, 2017).

No Violetas, cujo campo simbólico, social e lúdico se estabelece em torno de um tabuleiro

em forma de rosa dos ventos, composto por cidades brasileiras com nome de mulheres, a violência

se espalha pelo tabuleiro sempre que as/os jogadoras/es desconhecem as distintas faces da violência.

Por seu turno, a ação em rede, o reconhecimento das situações de violência nas cartas e as múltiplas

4 Doravante, simplesmente Violetas.

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realidades produzidas pelas narrativas fílmicas produzem as saídas estratégicas e imaginativas para

desvelar, combater e vencer a violência, mesmo que de maneira provisória. O jogo aborda as redes

de políticas e de serviços para o enfrentamento da violência contra a mulher, entrecortado por

filmes que destacam as questões de gênero e de cidadania, na esfera pública ou privada das relações

sociais.

Na busca de um possível diálogo entre a concepção de subjetividade de Butler com a

perspectiva do lúdico, a questão central deste artigo é: de que forma a concepção de subjetividade,

em Butler, articulada à perspectiva agonista do lúdico, produz discursos subversivos de gênero e de

cidadania, no jogo Violetas? Para isso, parto dos seguintes argumentos: i-a concepção performativa

de subjetividade - entendida como uma construção plural de sentidos, de ações e de afetos delineada

provisoriamente por ambíguas formas de expressão de sexo, de gênero e de desejo do ser humano -

coaduna-se com o caráter agonista do lúdico, ao produzir subversões de identidades sobre gênero,

poder e cidadania; ii- no jogo Violetas, a perspectiva agonista de subjetividade produz discursos

sobre as identidades de gênero que agenciam novos sentidos de poder e de cidadania para as

mulheres. Os objetivos do trabalho são: discutir as características agonistas do lúdico na concepção

de subjetividade em Butler; analisar as possibilidades de agenciamentos discursivos sobre gênero,

poder e cidadania, no jogo.

Trata-se de um artigo de reflexão teórica, seguida da análise de alguns dos relatos das/dos 12

jogadoras/es (profissionais das áreas de educação, de políticas públicas para as mulheres, dos

movimentos sociais e da justiça) que participaram da oficina de especialistas para validação do

conteúdo do jogo, na primeira etapa da investigação. Os depoimentos são tomados como

exemplaridades vivas dos processos de subjetivações das/os jogadoras/res durante as partidas, como

forma de visualizar as resistências crítica e a manutenção de normatividades discursivas

hegemônicas, agenciada pela dinâmica do jogo. Portanto, o material empírico não se constitui em

evidencia científica, o que contrariaria a própria corrente teórica pós-estruturalista adotada, mas

uma mera ilustração da discussão teórica realizada, cerne do estudo.

Subjetividades performática em Butler e o agonismo lúdico

Para melhor articulação dos conceitos de performatividade e do lúdico, como faces de uma

mesma dimensão agonista da política, sigamos inicialmente a discussão da obra ‘problemas de

gênero’, de Butler (2015). Uma vez discutida a subjetividade no âmbito de sua performatividade,

articularei este conceito ao princípio do agon (termo grego que significa luta, combate, disputa),

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inerente ao universo do jogo como um elemento constitutivo da cultura, no intuito de potencializá-

los como uma teorização pertinente às desconstruções subversivas de gênero, de poder e de

cidadania (MOUFFE, 2013;HUIZINGA, 1998).

A performatividade do gênero, em Butler, é vista como uma fabricação discursiva de

interditos e de normas que conformam e, ao mesmo tempo, são subvertidas pela produção de

subjetividades discursivas. Com isso, a restrita concepção binária de gênero, assente nos

essencialismos e nos interditos de uma heteronormatividade compulsória, é denunciada em sua

falibilidade, a despeito de sua hegemonia nas práticas regulatórias das relações sociais. O gênero

performativamente construído e subvertido está exposto à processos de repetição constitutiva da

própria subjetividade humana. Este conceito revela a forma com que nós lidamos, subvertemos e

reinventamos singularmente as normas, no âmbito da produção discursiva da nossa subjetividade

(BUTLER, 2015).

No capítulo ‘atos corporais subversivos’, do citado livro, a autora analisa a inscrição dos

processos intrapsíquicos na ‘política da superfície do corpo’ como um jogo de ausências e de

presenças que formam o corpo e seu gênero por meio de ‘uma série de exclusões e negações,

ausências significantes’ (Butler, 2003:234). Os atos, gestos e desejos que forjam as identidades de

gênero são imersas ambiguidades de luz e de sombra que sugerem, mas nunca revelam, o que de

fato organiza e conforma as normas que são introjetadas psiquicamente pelos seres humanos. Essa

dissimulação normativa fabricada que se expõe e se esconde perfaz os ‘performativos’, defende a

autora.

O entendimento do ‘corpo gênero’ como uma produção performática de ‘desejos, atos e

gestos’ denuncia a ausência de qualquer status ontológico, uma vez que a realidade é sempre uma

fabricação imersas nas intenções mundanas e temporais humanas, sejam conscientes,

fenomenológicas ou não5. A ilusão de que há um ‘núcleo interno e organizador do gênero’, como

qualquer normatização essencialista que dita o que é ser homem ou ser mulher, mantém uma

regulação heteronomartiva reprodutora. Esta produção performática se ampara numa visão sujeito

‘eu’ que unifica estas regulações políticas, fazendo-as desaparecer sob as identidades fixas de

5 A respeito do significado de ‘intencional’ e de sua relação com a repetição inteligível de atos, numa entrevista em que

Judith Butler conversa sobre psicanálise, ela esclarece: “(...)há dois sentidos de intencional, um deles que significa

deliberado, voluntário, uma escolha, mas o outro vem da fenomenologia, e aí ele, de fato, significa que, se eu digo

algo, a estrutura do meu discurso é intencional, significa que ele se refere a alguma coisa no mundo. (...) Se pensarmos

na performatividade nesse sentido fenomenológico, eu pratico um gênero, mas não pratico num mundo solipsista, estou

sempre, em certo sentido, me referindo a, comentando, habilitando, retrabalhando um conjunto de normas de gênero

que estão em mim e também fora de mim, então isto é intencional no sentido de que está se referindo a um mundo

exterior. Mas não quero dizer que o gênero seja totalmente consciente ou que seja totalmente voluntário, pois acho que

não é” (Kudsen, 2010:169).

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gênero. Trata-se, aqui, de um deslocamento da origem política e discursiva da identidade para um

núcleo psicológico que impede o seu desmascamento (idem).

Ora, o gênero visto sob o enfoque de uma fabricação performativa, portanto imerso em

formas reveladas e veladas de se expressar, remete a ideia de que o ‘gênero verdadeiro é uma

fantasia instituída e inscrita sobre a superfície de corpos, então parece que os gêneros não podem

ser nem verdadeiros nem falsos, mas somente produzidos como efeito de verdade de um discurso

sobre a identidade primária e estável’ (idem, p.236). O gênero, portanto, é uma performance

discursiva produtora e constituída por subjetividades que podem imitar ou mesmo parodiar o que é

real ou aparente; o fixo ou o moldável; o externo ou o interno; o binário ou o plural; o identitário ou

o contingente. A figura da travesti, para a filósofa, representa a ‘paródia’ crítica da rigidez binária

do gênero. Na imitação, a travesti e a ‘drag’ zombam dos modelos fixados de gênero, subvertendo

suas próprias identidades. A performance dos transexuais explicita a falácia da coerência do sexo e

do gênero, explicitando o mimetismo e a contingência dos mesmos. Esses atos dramatizados são

igualmente subversivos da coerência heterossexual e da naturalização estereotipada do binarismo do

sexo e do gênero.

O recurso da paródia, isto é, a ‘uma produção que se coloca como imitação’ (ibidem, p.238),

imprime uma fluidez e uma abertura a novas reconfigurações identitárias. Além disso, a expressão

do ‘riso’, inscrito na paródia, é uma prática discursiva que ironiza o normal, ao mesmo tempo em

que desmascara a sua pretensa uniformidade. O rizível inverte o que é real e o que é imaginário,

produzindo disrupturas nas hegemonias culturais. Porém, nem toda paródia é efetivamente

subversiva ou ‘perturbadora’, uma vez que muitas delas são meras repetições da indústria cultural.

Butler reflete sobre a performance do gênero como um ‘ato’ ou uma ‘construção dramática e

contingente de sentido’. Essas fabricações são também estratégias de sobrevivência em sistemas

culturais compulsórios, em que a performance do gênero pode ter consequências punitivas das

transgressões. Isso porque as proibições dos atos performáticos são forjadas em ‘ficções culturais’

tidas e reproduzidas pela cultura como naturais, reguladas pelas sanções sociais à desobediência

disciplinar dos corpos. Noutras palavras, as normatividades compulsórias na manutenção do gênero

binário são difíceis de identificar, pois os sentidos sobre o gênero se sedimentam nos indivíduos por

meio das ‘performances repetidas’. “Essa repetição é a um só tempo reencenação e nova

experiencia de um conjunto de significados já estabelecidos socialmente; e também uma forma

mundana e ritualizada de sua legitimação (ibidem, p.242)”.

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Nessa discussão sobre a performatividade como uma sequência de atos que ratificam a

heteronormatividade se incluem a noção de subjetividade e da ‘ação’. A ideia de que exista um ‘eu’

ou ‘self’ coerente por detrás da ação, ou de que é preciso consolidar uma identidade social para que

as ações políticas possam advir, é expressamente contestada por Butler. Seu argumento é que não

existe um ‘agente’ atrás do ato, mas que este ‘agente’ é diversamente construído ‘no e através do

ato’. O sujeito não é passivamente determinado pelas regras nas quais é gerado, pelo fato de que o

processo de significação não é ‘um ato fundador’, mas um ‘processo de regulado de repetições que

tanto oculta quanto impõe suas regras’. A ação, nesses termos, é situada justamente como ‘uma

variação dessa repetição’, como uma subversão inscrita na própria normatividade reproduzida.

Como todo ato, as repetições sobre o gênero estão expostas às fissuras, às cisões e às

‘paródias de si mesmo’. É na própria redundância velada das normas, dos discursos e das práticas

que produzem as ficções binárias de gênero e de um sujeito ‘fazedor’ de coisas que se encontram as

possibilidades de rupturas desses mesmos atos, como variações à regra que estão nela contidas. A

tarefa crucial do feminismo, para Butler, consiste propriamente em situar essas estratégias

subversivas e afirmar as possibilidades de resistência crítica.

As noções de performatividade, de paródia e de repetição que produzem identidades e

subversões de gênero dialogam intrinsecamente com a concepção agonista do lúdico, especialmente

com o caráter disruptivo, incerto e imaginativo que lhe é próprio. O jogo transita ao mesmo tempo

entre a regra e a subversão da mesma, entre o real e o ilusório, entre a descontração e a apreensão,

entre a espontaneidade e o disciplinamento das ações humanas. Tais elementos geram e subtraem

imagens, símbolos e interpretações sobre o mundo, as quais ampliam as múltiplas formas da

compreensão humana. A ambiência lúdica se caracteriza, ainda, pela disputa, pelo envolvimento

participativo e pela ambiguidade das emoções vivenciadas, em geral embebidas de sensações

concomitantes de prazer e de dor, que inerente à vida (HUIZINGA, 1990; CALLOIS, 1990;1988).

Nesse sentido, uma subjetividade constituída e produtora de atos performativos de poder,

inscrita em ambiguidades que tanto reproduzem, como subvertem normatividades, pode ser

entendida como uma das manifestações do agon. Os atos repetitivos dessa performance podem se

assemelham à repetição e à subversão das regras, no jogo. O jogo é forjado por regras de repetição

que o produzem, assim como fabricam as/os jogadoras/es que aderem às mesmas. Um jogo pode ser

jogado novamente porque há sempre um final incerto, uma imprevisibilidade intrínseca que mantém

o desejo das/os jogadoras/es em continuarem na partida, em persistir no exercício do combate cujo

final é impreciso, tal qual a vida (HUIZINGA, 1990).

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A tensão entre a sujeição às regras e a renúncia à ação impulsiva como requisito de acesso

ao prazer faz parte do sentido do brinquedo e do jogo na infância, com repercussões sobre a

formação humana. O desenvolvimento psíquico e histórico-cultural das pessoas na maneira de lidar

com o desejo, passando-se da necessidade instintiva de realização imediata para uma unidade de

contrários entre o desejo e o controle, inclui a experiência do brincar na infância e na vida. A regra

como parte inerente do jogo é, ao mesmo tempo, fator de submissão e de subversão do real,

ambiguamente, constituindo-se ele mesmo em objeto de desejo (VIGOTSKY, 1991).

Outra característica explicitamente lúdica na concepção de subjetividade performática é a

possibilidade do riso e da paródia, exemplificada nas performances transexuais, como uma

subversão dos binárismos de gênero. Como se sabe, a imaginação, a mimese e a descontração são

elementos intrinsecamente lúdicos, próprios das artes dramáticas e teatrais, dentre outras formas de

expressão na cultura. O riso propicia a ruptura da situação comunicativa, que se transforma em

máscara, em teatro, em ritual. Ele é a própria expressão da subversão inserida no universo lúdico e

nas formas performativas declaradamente falsas, como ironia do real. (CALLOIS, 1990;

LARROSA, 2016).

Do entrelaçamento disruptivo entre a subjetividade performática e o agonismo lúdico,

possibilita-se a produção subversiva de novos sentidos para o gênero, na esfera do político como

cerne da cidadania. No âmbito da teoria agonista de democracia, a cidadania é um princípio

articulatório que afeta as diferentes posições do sujeito, com espaço para a pluralidade e o respeito

da liberdade individual. Esta noção corresponde à centralidade do político como constitutiva do

antagonismo humano, capaz de forjar convergências conflitivas e de permitir o engajamento de

pessoas diferentes em projetos éticos comuns. Com isso, assume-se a perspectiva de que a

inexistência do sujeito da razão universal, denunciada pela crítica feminista, não significa o fim da

capacidade de agir, do discurso e do debate político, mas uma reinvenção performática das práticas

de poder e da cidadania, imersa em subjetividades contingentes (MOUFFE, 2016; BUTLER, 1998).

Performatividade de desejos, de gestos e de atos no jogo Violetas: disrupturas e continuidades

A concepção performática e agonista de subjetividade discutida no tópico anterior fundamenta

a dinâmica produtora de discursos disruptivos de gênero e cidadania no jogo Violetas, dentre as

outras categorias teóricas relacionadas a esta concepção, mencionadas na introdução. Para tornar

mais clara a forma com que isto aparece no Violetas, neste item analiso alguns depoimentos das

jogadoras como exemplaridades discursivas agenciadas pela dinâmica do jogo. O conceito

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deleuziano de agenciamento6 é utilizado por dialogar intrinsecamente com a noção de

performatividade, em Butler, como produtores de discursos que engendram suas próprias

subversões ou linhas de fuga.

Em sintonia com a concepção de performatividade, organizei os depoimentos em três

blocos: a- desejos de agon; b-gestos disruptivos de gênero e cidadania; c- atos regulatórios de

continuidades normativas. No primeiro, tratarei dos afetos surgidos a partir do jogo, induzidas pela

sua ludicidade. Em seguida, passarei a algumas indicações de rupturas dos estereótipos de gênero e

de potencialidades ao engajamento cidadão, contidas nos depoimentos das participantes. No último

tópico, identifico as continuidades normativas que persistem nos comentários, como forma de

refletir sobre as cristalizações disciplinadoras contidas nos atos de repetição de regras. Passemos a

discussão de cada uma delas, com a respectiva ilustração dos depoimentos, constante no quadro 1.

De início, esclareço que o componente da performance é fortemente reforçada na ludicidade

do Violetas. No jogo, as/os jogadoras/es assumem papeis de personagens de uma rede de

enfrentamento da violência que se espalha pelo tabuleiro, formada pelos integrantes:

educadora/r/pesquisadora/r (EP); cidadã/ão no movimento de mulheres (MM); integrante de política

pública/profissional de saúde (IPP); operadora/r de direito (OP). Elas/es agem em equipe para

vencer a violência que se espalha pelas cidades, sempre que as ‘cartas omissões’ são retiradas ou

quando erram as perguntas ambientadas nos filmes. No Violetas, todas/os jogam juntas contra o

tabuleiro, o que torna a dinâmica diferente do habitual, pelo menos no Brasil. Cada personagem

realiza ações em conjunto, mas possuem habilidades especiais que as diferenciam, que se somam às

demais.

Outras performances induzidas no Violetas são as narrativas fílmicas e suas diversas

situações convidativas à imaginação, como uma aposta na potência lúdica produtora de sentidos.

Além da performatividade contida no Violetas, os elementos gráficos e as metáforas foram

cuidadosamente pensados para seduzir as/os jogadoras ao universo lúdico. Como se observa nos

depoimentos contidos no quadro 1, isso resultou em desejos e curiosidades de jogar, de vencer e de

repetir o jogo, constituindo-se numa estratégia potencialmente ambientadora de experiencias

lúdicas, no sentido da abstração reflexiva do pensar que não se restringe ao universo da técnica

(LARROSA, 2013).

6 “A unidade real mínima não é a palavra, nem a idéia ou o conceito, nem o significante, mas o agenciamento. É

sempre um agenciamento que produz os enunciados. Os enunciados não têm por causa um sujeito que agiria como

sujeito da enunciação, tampouco não se referem a sujeitos como sujeitos de enunciado. O enunciado é o produto de um

agenciamento, sempre coletivo,que põe em jogo, em nós e fora de nós, populações, multiplicidades, territórios, devires,

afetos, acontecimentos.” (Deleuze e Parnet, 1998:65)

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No segundo bloco de temas, gestos disruptivos de gênero e cidadania, ilustram-se alguns

caminhos para a desconstrução dos estereótipos de gênero. A forma com que estas reflexões são

agenciadas no jogo ocorrem tanto pelas perguntas ambientadas nas narrativas fílmicas, como nos

ditados populares e música sexistas presente nas ‘cartas omissões’. Uma vez retirada essa carta, a

violência se espalha impreterivelmente pela cidade em que a/o jogadora/r se encontra, sem chance

de reação. Elas foram cuidadosamente pensadas com dois propósitos: i-aumentar a tensão na partida

pela eminencia de derrota;ii- gerar desconfortos indutores da desnaturalização dos estereótipos de

gênero. Os depoimentos contidos no quadro 1 demonstram a potência dos gestos e das intenções

produzidas nas jogadoras, em seu sentido disruptivo.

Por fim, no último bloco de temas, atos regulatórios de continuidades normativas, verifica-se

a tendência em cristalizações das normas disciplinares da educação, na voz de uma

educadora/pesquisadora (EP). A despeito dela ter gostado do jogo, disse sentir falta de um

‘fechamento’ por parte do professor, para as coisas não ficarem ‘soltas’. Ou seja, presa às normas

tradicionais da educação, ela reivindica o aprisionamento do caráter irreverente do lúdico e de sua

potência libertária, às normas disciplinadoras dos corpos dóceis. Isso exemplifica que a

desconstrução de práticas discursivas arraigadas por atos repetitivos de performances culturais são

processos contra-hegemônicos difíceis de induzir, como todo processo histórico.

Quadro 1- Exemplaridades de depoimentos das jogadoras após as partidas do VIOLETAS nas oficinas com

especialistas para validação do conteúdo do jogo. Brasília, maio, 2015

Tema

Depoimentos das jogadoras especialistas

Des

ejos

de

agon

“Nossa! Que legal! As cidades têm nomes de mulheres!”.(OP-3)

“O jogo é lindo, é lúdico... o visual dele é interessante. Você abre (o jogo) e tem

vontade de jogar, as cores, a diagramação, tudo é bonito” (EP-9).

“A ideia de trazer a violência para o universo do lúdico, porque é uma coisa muito

dura, é talvez uma estratégia que diminua o stress de se abordar a violência, ajuda as

pessoas a terem um distanciamento lúdico da coisa para poder refletir”. (MM-17)

“Uma coisa bem legal é o fato de não ser um jogo competitivo, de ser um jogo

cooperativo, em que é o coletivo que ganha. O jogo na verdade é um jogo divertido

quando você entende a lógica, tanto que o nosso grupo quando perdeu eu falei vamos

jogar de novo agora q a gente entendeu. Eu fiquei com vontade de jogar de novo e

dessa vez acertar como que joga de acordo com as regras” (EP-12)

Ges

tos

dis

rup

tiv

os

de

gên

ero

e d

e

cid

ad

an

ia

“As cartas omissões provocam desconforto. Se era isso que vocês queriam, vocês

conseguiram. Quando a gente lia, é um chavão, é uma coisa tão arraigada... é o

contrário de tudo o que se quer. Eu me senti desconfortável.” (EP-12)

“Eu também achei as cartas omissões fantásticas, porque revela essa coisa da piada..

porque quando a gente fala explicitamente o quanto piada é violência é machismo fica

uma coisa chata, parecendo que a gente é que não tem sendo de humor, alguma coisa

assim. Mas ali quando você ouve uma coisa que é tão comum e que você se omite na

maior parte das vezes que você ouve uma piada ou um jargão e a violência se instaura,

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aquilo assim realmente provoca um mal estar muito interessante”. (OP-3)

“Ao invés de colocar as respostas você continuar com a ideia do jogo, mas não

colocar as respostas, a partir do momento em que surge a questão deixar as pessoas

responderem. A partir daí você levantaria as representações sociais que existem,

naturalizadas como você falou, o primeiro passo para a desconstrução, levantar essas

representações sociais e a partir de então trabalhar com essas representações sociais,

por exemplo, a mulher apanha porque gosta de apanhar. A partir desse levantamento

não dar respostas fechadas, mas deixar as pessoas construírem ” (MM-18).

Ato

s reu

lató

rio

s d

e

con

tin

uid

ad

es

no

rmati

va

s

“O jogo da forma como está constituído não dá para ter as perguntas abertas, a não

ser que tivesse um moderador. Para ter perguntas como você sugere só se tiver um

moderador. (...) Considero também que é superimportante que exista alguém que

possa fazer o fechamento do jogo. Ele é lúdico, ele traz questões importantes, ele bota

a gente para refletir, ele deixa a gente desconforme, mas precisa um fechamento que

eu considero que, por exemplo, o professor que está utilizando o filme, o profissional

da saúde que está conduzindo as oficinas, alguém que se dispõem a fazer esse

fechamento, porque você vai amarrando todas as questões que ficaram solta.

Considero fantástica a forma como está (...), mas acredito que isso seja importante

também.” (EP-8)

Conclusão

A articulação conceitual da subjetividade performática, em Butler, com a concepção agonista

do lúdico é possibilitada principalmente pelo caráter da fabricação repetitiva, da ambiguidade, da

multiplicidade descentrada, da ficção e da disrupção presente em ambos os conceitos. Essas

concepçãos teóricas subsidiaram uma ludicidade produtora de sentidos no jogo Violetas, na

perspectiva desconstrutora dos estereótipos de gênero e indutoras do engajamento em redes cidadãs

de enfrentamento da violência contra a mulher. A partir dessas teorizações, os depoimentos das

jogadoras após as partidas foram analisados em sua potência disruptiva ou reprodutora de

normatividades arraigadas. Identificaram-se agenciamentos reflexivos e subversivos nos blocos de

temas ‘desejos de agon’ e ‘gestos disruptivos de gênero e cidadania’, ao lado de reproduções

performáticas de poder cristalizadas e persistentes, no bloco ‘atos regulatórios de continuidades

normativas’.

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Conception of subjectivity in Butler in the board game Violets: cinema & action in coping with

violence against women: gender and citizenship agency

Abstract

The board game Violets: cinema&action in coping with violence against women is a ludic and

educational technology that inventively sets out the reflections about gender issues. In a possible

dialogue between Butler’s philosophy and the perspective of the ludicity, I question: how does

Butler’s conception of subjectivity, articulated to the agonist conception of the ludic, produce

subversive discourses of gender and citizenship in the Violets? The arguments are: i- the

performative conception of subjectivity – understood as a plural construct of meanings, actions, and

affections provisionally delineated by ambiguous forms of expression of sex, gender, and desire of

the human being – is in line with the agonist character of ludic, by producing subversions of

identities about gender, power and citizenship; ii- in the game of Violets, the agonist perspective of

subjectivity produces discourses about the gender identities that agitate new senses of power and

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citizenship for women. Objectives: to discuss the agonist characteristics of the playful in Butler’s

conception of subjectivity; and analyze the possibilities of discursive agency about gender, power

and citizenship in the game. A conceptual discussion of the subjectivity present in the Violets and in

the testimonies of players (professionals of politics for the women) is conducted. In the games, the

agency are induced by strategies that allow disruptive discourses about gender, power and

citizenship.

Keywords: Subjectivity, Gender, Power, Citizenship, Violence against women, Educational

technologies.