comunidades de pequenos mamÍferos em Áreas

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Universidade Federal da Paraíba Centro de Ciências Exatas e da Natureza Departamento de Sistemática e Ecologia Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas Zoologia COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS PERIDOMICILIARES PESTOSAS E ÁREAS SILVESTRES ADJACENTES NO FOCO DA CHAPADA DA BORBOREMA João Pessoa 2017

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Universidade Federal da Paraíba

Centro de Ciências Exatas e da Natureza

Departamento de Sistemática e Ecologia

Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas – Zoologia

COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS PERIDOMICILIARES

PESTOSAS E ÁREAS SILVESTRES ADJACENTES NO FOCO DA CHAPADA DA

BORBOREMA

João Pessoa

2017

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Universidade Federal da Paraíba

Centro de Ciências Exatas e da Natureza

Departamento de Sistemática e Ecologia

Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas – Zoologia

COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS PERIDOMICILIARES

PESTOSAS E ÁREAS SILVESTRES ADJACENTES NO FOCO DA CHAPADA DA

BORBOREMA

João Pessoa

2017

Dissertação de Mestrado apresentada ao

Programa de Pós-Graduação em Ciências

Biológicas – Zoologia como quesito para

obtenção do título de Mestre em Zoologia.

Orientador: Prof. Dr. Pedro Cordeiro Estrela

de Andrade Pinto

Co-orientadora: Profa. Dra. Alzira Maria

Paiva de Almeida

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AGRADECIMENTOS

À minha co-orientadora, profa. Dra. Alzira Maria Paiva de Almeida, por inesgotável disposição

que contagia todos que com ela trabalham, pelo cuidado quase maternal na orientação e

aconselhamento, pelas excelentes conversas com cerveja depois de uma longa jornada de

trabalho, pelas oportunidades concedidas e por ter fé em mim em vários momentos que me

julguei fracassado ou insuficiente. Obrigado pela jornada!

Ao meu orientador, prof. Dr. Pedro Cordeiro-Estrela, por me desafiar a fazer algo tão diferente

e fora do que jamais conceberia, por várias vezes ‘duvidar’ de mim e fazer meu orgulho e

teimosia úteis para a ciência, por me apresentar a tantas figuras notórias da mastozoologia,

pela paciência em ensinar o que parece hoje trivial, pela confiança depositada e pela melhor

caipirinha que um pós-graduando pode querer.

Ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas – Zoologia, e à CAPES, pela bolsa

concedida, pela taxa de bancada e pelas disciplinas ofertadas.

Aos ratinhos, gambás e cuícas, que deram sua vida para eu ser um pouco menos zé-ninguém

no mundo.

À Thais Kubik, Karlla Morganna, Higor Mesquita e todo mundo que me deu uma força nos

campos.

Ao acaso, que me manteve vivo e intacto quando fiz campo sozinho.

À Thais (de novo), Chachá, Ramon, Tiago e Manassés, que aguentaram muita brisa, muita

falação, muito desespero e ainda mais comemorações toda vez que nos reunimos ao redor

de uma Santa Cerveja.

A Saulo Portokalos, for the Deeper Understanding.

À Camila, Viviana, Giovanna, Bruno, Heberson e todos os amigos que conquistei entre uma

pescada e outra nas aulas da pós.

À Dona Conceição, Seu João Carlos, Matheus e todos os que me receberam na Fazenda

Riachão do Progresso.

Ao Lucas, Géssica, Ana Clara, Walkyria, Hellen e todo o pessoal maravilhoso do Campus II

de Areia, que fez o trabalho mais parecido com a festa que a vida é.

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À profa. Dra. Cibele Rodrigues Bonvicino, ao prof. Dr. Paulo Sérgio D’Andrea, ao prof. Dr.

João Alves de Oliveira, à profa. Dra. Leila Maria Pessoa, por vários dias de trabalho e várias

noites de conversa às quais eu devo muito do biólogo que estou vindo a me tornar.

À Caryne, por compartilhar tanto comigo, na biologia e fora dela.

Ao meu pai, Douglas Zeppelini Filho. Por trás do exemplo de cientista há também um ser

humano.

À minha mãe, Rita de Cássia Siriano Mascarenhas, por lições em tempo real na vida.

Ao lúpulo, cevada, trigo, arroz, agave, uva, batata e tudo que é tocado pela graça das

Saccharomyces.

A Alan Turing.

Page 7: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

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RESUMO

Peste é uma zoonose cujo sistema reservatório é composto por comunidades de pequenos

mamíferos em focos independentes no tempo e espaço. A comunidade de pequenos

mamíferos tem papel importante na regulação e mediação das flutuações do ciclo de

transmissão através de sua composição e parâmetros populacionais das espécies. A

compreensão da estrutura e dinâmica da comunidade de pequenos mamíferos de um foco de

peste é uma ferramenta preditora para o risco de eventos epizoóticos. A presente dissertação

analisou o foco de Peste da Chapada da Borborema por uma perspectiva de ecologia de

zoonoses e comunidades, através de seu sistema reservatório visando responder duas

perguntas: há partição da comunidade de pequenos mamíferos entre peridomicílio e

remanescentes nativos? E, qual é o perfil pestoso dos ambientes peridomiciliar e selvático. O

primeiro capítulo demonstra que a Peste pode ser considerada uma entidade ecológica

complexa, com diversos modelos para explicar sua dinâmica, embora ainda incompletos,

dado o viés amostral causado pela rotina de vigilância. O segundo capítulo realiza uma análise

de beta-diversidade no foco; através de coletas em campo em Alagoa Grande e Areia,

municípios circunscritos ao foco, com esforço total de 3640 armadilhas/noite; resgate do

registro histórico das coletas de pequenos mamíferos na região através de fichas de atividade

de vigilância em zoonoses da Regional de Saúde de Garanhuns em 1981, Livros do Tombo

de duas coleções e registros da literatura; obtendo 30 localidades com registro de 29 espécies.

As coletas em campo e as coletas da Regional de Saúde foram suficientes em amostrar a

fauna do local, tendo a riqueza registrada condizente com a projeção do estimador Chao 1.

As análises indicaram alta dissimilaridade composicional entre as localidades (beta-

diversidade > 0.9), com dominância do turnover, mas confirmaram a unidade da

metacomunidade do Planalto da Borborema. Os achados do capítulo resgataram uma

partição da comunidade de pequenos mamíferos entre o ambiente peridomiciliar e os

remanescentes de vegetação nativa, com uma beta-diversidade de 0.517. O foco não é

delimitável à partir apenas do sistema reservatório. Apresenta-se também a noção do

metafoco, locais de atividade pontual e difusa dentro do território total do foco, com regime

controlado por uma combinação de fatores ambientais ótimos, como uma possibilidade teórica

para explicar a atividade do foco. O terceiro capítulo faz um inquérito epidemiológico nos dois

municípios circunscritos ao foco no estado da Paraíba amostrados no capítulo anterior,

capturando 45 indivíduos em campo, dos quais se obteve amostras para análises

bacteriológicas e moleculares (27) e sorologia (7). Com todos os resultados negativos, temos

a reafirmação do período quiescente do ciclo de transmissão, mas alertando que a

quiescência não descarta as medidas de vigilância, dado que os focos podem reemergir, e o

panorama epidemiológico mundial alerta para um período de transição zoonótica.

Palavras chave: Yersinia pestis, roedor, marsupial, Caatinga, metacomunidades, beta-

diversidade, peste.

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ABSTRACT

Plague is a zoonosis whose reservoir system is composed by communities of small mammals

in foci that are independent in time and space. The small mammals’ assemblage of a focus is

one of the factors that regulates the fluctuations on the transmission cycle through composition

variance and population parameters of each species. The comprehension of the structure and

dynamics of the reservoir system of a plague focus can be a predictive tool to foresee risk of

epizootic events. The present dissertation analysed the Borborema Plateau Plague focus

through a zoonosis and community ecology by studying the small mammals that compose the

reservoir system. The first chapter demonstrates through theory that Plague is a complex

ecological entity, with several models created to explain its dynamics, although the current

knowledge has a bias caused by the epidemiological surveillance models. The second chapter

performs an analysis of beta-diversity on the focus, with data from a field survey in Alagoa

Grande and Areia, municipalities within the focus, with 3640 traps/night of sampling effort;

recovery of data from vigilance campaigns from the Health District of Garanhuns in 1981,

Museum registries and literature records; obtaining 30 localities with 29 species registered.

The analysis indicated high compositional dissimilarity between localities (beta-diversity > 0.9),

with dominance of turnover, but confirmed the unity of the small mammal metcommunity in the

Borborema Plateau. The findings in this chapter recovered a partition in the small mammal

community between the peridomestic and sylvatic habitats, with beta-diversity of 0.517. The

analyses weren’t capable of delimitate the focus solely by its reservoir system. The chapter

also introduces the concept of metafocus, areas with geographically restricted activity within

the whole expansion of the focus, controlled by a series of variables, as a theoretical possibility

to explain the focus’ activity pattern. The third chapter reports the epidemiological surveillance

action performed in the two municipalities from within the focus, in the state of Paraíba,

capturing 45 individuals, obtaining 27 samples for PCR and bacteriology, and 7 samples for

serum analysis. With all test results being negative, the quiescence period in the focus is

reaffirmed, but the vigilance measures must go on, as foci might reemerge after long innactive

periods, and the current situation of epidemiologic transition.

Keywords: Yersinia pestis, Caatinga, Metacommunity, rodents, marsupials, beta-diversity,

Plague.

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Sumário

I. Introdução Geral Referências Bibliográficas

1 3

II. Capítulo 1: Zoonoses as Ecological Entities: A Case Study on Plague Resumo Introduction

7 8

A Community Approach: The Reservoir System 9 Environment and Plague 13 Future Insights and Perspectives 14 Conclusion 15 References 16

III. Capítulo 2: Beta-diversidade da comunidade de pequenos mamíferos do foco da Chapada da Borborema

Resumo 18 Introdução 19 Materiais e Métodos 23 Resultados 28 Discussão 35 Conclusão 40 Referências Bibliográficas 40 Bibliografia Consultada 45

IV. Capítulo 3: Prolongado silêncio interepizoótico da peste em dois municípios do Foco da Chapada da Borborema, Paraíba, Brasil.

Resumo 45 Introdução 46 Materiais e Métodos 52 Resultados 53 Discussão 54 Conclusão 55 Referências Bibliográficas 55

V. Conclusão Geral 60 VI. Anexo I 61 VII. Anexo II – Lista de base da identificação dos espécimes da Coleção

de Mamíferos da UFPB 62

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10

Lista de Figuras

Figura 1: The four reservoir models proposed by Poland and Barnes, revisited by Gage and Kosoy.

11

Figura 2: The metapopulation model for Plague reservoir systems. 12 Figura 3. Mapa da região do Planalto da Borborema com os municípios amostrados

27

Figura 4. Resultado da análise de PCR Multiplex 52

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11

Tabelas

Tabela 1. Capturas de campo, discriminadas por município, e subsequentemente por ambiente.

30

Tabela 2. Capturas resgatadas das fichas de campo da Regional de Saúde de Garanhuns.

30

Tabela 3. Número de espécies (Sobs) e o valor do estimador de diversidade Chao 1 para as localidades amostradas pela Regional de Saúde de Garanhuns.

31

Tabela 4. Registros recuperados do Livro do Tombo da Coleção de Mamíferos da UFPB

33

Tabela 5. Registros recuperados da literatura e do Livro do Tombo do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (MZUSP).

34

Tabela 6. Compilação da presença das espécies nas quatro fontes de dados 35 Tabela 7. Beta-diversidade intragrupos, decomposta em turnover e aninhamento para as regiões delimitadas no Planalto da Borborema, e para o planalto como um todo.

36

Anexo I – Lista dos Números de campo 61 Anexo II – Lista de base da identificação dos espécimes da Coleção de Mamíferos da UFPB

62

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1

Introdução

A Peste é uma doença infecciosa causada pelo bacilo Yersinia pestis, originalmente

uma zoonose com ciclo contemplando roedores como hospedeiros principais e suas pulgas

como os vetores (Chain et al., 2006). O homem participa como hospedeiro incidental e não

tem valor para o ciclo natural da doença (Raoult et al., 2013). A dinâmica da Peste é construída

pela relação ecológica entre a bactéria (o patógeno) e seus hospedeiros, assim como as

espécies que interagem com a comunidade de hospedeiros (Laudisoit et al., 2009; Keesing et

al., 2010); e se divide em dois ciclos. O ciclo enzoótico é o ciclo mais simples, onde a

transmissão se dá quase apenas entre os hospedeiros principais e as pulgas vetores, de modo

a manter o bacilo presente em níveis mínimos se valendo da resistência dos hospedeiros. O

ciclo epizoótico é um evento onde o alcance das interações ecológicas entre patógeno e

hospedeiros, quando a infecção se espalha para hospedeiros mais susceptíveis (secundários,

terciários) e para os hospedeiros incidentais (considerados sem importância para o ciclo de

mantenimento, nos quais a infecção tem alta mortalidade) incluindo os humanos (Wimsatt e

Biggins, 2009).

Coutinho et al. (1982) aponta que existem diferenças na contribuição de cada espécie

de hospedeiro para o ciclo pelos diversos níveis de susceptibilidade, sendo a soma dessas

diferentes susceptibilidades e sua distribuição dentro da comunidade que dão a característica

epidemiológica da comunidade. Os fenômenos intrínsecos às comunidades de hospedeiros

envolvidos na passagem do ciclo enzoótico para o epizoótico ainda não são completamente

compreendidos, mas sabe-se que existem relações de estrutura da comunidade que geram

limiares populacionais dentro das comunidades e nos vetores (Reijniers et al., 2012; Reijniers

et al., 2014), e a resposta das comunidades a mudanças das condições climáticas/ecológicas

locais (Saavedra e Dias, 2011; Boire et al., 2013) que dão condições propícias para a

mudança de ciclo. A Peste também pode entrar em períodos de quiescência, onde é possível

inclusive sua não-detecção em inquéritos sorológicos (Haule et al., 2013). O seu

mantenimento indetectável e incapacidade de erradicação fazem necessária a vigilância

epidemiológica constante, sem a qual há risco de saúde pública em caso de re-emergência

(Cavalcanti et al., 2002) e dão maior urgência a estudos ecológicos para compreender e

detectar mecanismos de previsão das passagens de ciclo.

Atualmente, a Peste está distribuída em focos disjuntos na Europa, África, Ásia e

Américas, tendo sido trazida ao Novo Mundo pelos ratos hospedeiros da pulga Xenopsylla

cheopsis (considerada o vetor clássico da Y. pestis) que infestavam os navios (Perry e

Fetherston, 1997; Gage e Kosoy, 2005). Nas novas áreas colonizadas, os ratos introduzidos

(especialmente Rattus rattus) e a comunidade autóctone de roedores e pulgas se tornaram o

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suporte necessário para que a Y. pestis instalasse-se em endemia (Ryan et al., 2003;

Andrianaivoarimanana et al., 2013; Brouat et al., 2013). A Peste ainda é considerada uma

preocupação de saúde pública (Butler, 2013), sendo ainda considerada uma Emergência de

Saúde Pública de Interesse Internacional de acordo com o Regulamento Sanitário

Internacional da OMS (2005), e com registros de milhares de casos todos os anos,

especialmente na África Subsaariana (Vogler et al., 2013; Lotfy, 2015), embora na América

do Norte, a atividade pestosa mereça investigação pelo seu aumento e mudança de

características (Holt et al., 2009).

No Brasil, Yersinia pestis foi introduzida em 1899 (Almeida et al., 1989), constituindo

focos silvestres permanentes de peste no semiárido nordestino (Aragão et al., 2007), o estado

da Paraíba incluso. Os focos hoje presentes no país são independentes entre si em tempo e

espaço (Oliveira et al., 2012) e o mantenimento destes se dá com grande contribuição de

Necromys lasiurus, espécie nativa, como uma das principais espécies envolvidas na Peste

silvestre no nordeste brasileiro (Giles et al., 2011); também sendo conhecida a contribuição

de espécies dos gêneros Calomys, Oligoryzomys, Galea e Thrichomys (Saavedra e Dias,

2011). Os casos de Peste no interior da Paraíba datam de 1912 (Barreto e Castro, 1946;

Soares Jr., 2011). Os últimos casos registrados na Paraíba datam de 1986, o último do Brasil,

em 2005 (Almeida et al., 1989; Ministério Da Saúde, 2008).

A importância de se conhecer a fauna de pequenos mamíferos para as áreas de Peste

é inegável, já que são eles os reservatórios da doença em meio silvestre, e diferentes espécies

apresentam diferentes graus de susceptibilidade e resistência à infecção (e.g. Meyer et al.

(1965), Anderson e Williams (1997)). Diferenças de estrutura paisagística e vegetacional

propiciam comunidades de pequenos mamíferos com abundâncias e diversidades distintas

(Ralaizafisoloarivony et al., 2014), e atividades e usos humanos da paisagem são capazes de

alterar a composição das comunidades (Smith et al., 2010). Atualmente, a noção original de

um sistema reservatório composto apenas pelas espécies comensais (e.g.:

Andrianaivoarimanana et al. (2013)) em ambiente peridomiciliar/periurbano (i.e.: nas áreas

diretas de influência da atividade humana, com ocupação para moradia, cultivos agrícolas e

atividades afins) é, em diversos casos, considerada defasada por não contar a presença de

um sistema reservatório silvestre, com participação de espécies autóctones e ligadas a

ambientes que não o peridomicílio imediato (Moore et al., 2015). Porém, apenas a inclusão

das espécies nativas na equação não consegue explicar o comportamento da Peste ao longo

do tempo e espaço, uma tarefa que demanda compreensão a nível de ecologia de populações

e comunidades para responder às lacunas de conhecimento (Keesing et al., 2010; Johnson

et al., 2015). Embora pouco aplicado no Brasil, os métodos de ecologia de populações e

comunidades trazem avanços significativos no entendimento da dinâmica temporal (e.g.:

Page 14: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

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Schmid et al. (2012); Reijniers et al. (2014); Moore et al. (2015)) e espacial (e.g.: Laudisoit et

al. (2009); Schmid et al. (2012); Wilschut et al. (2013), indicando que uma visão mais

abrangente do que é o sistema reservatório é necessária, incluindo grupos taxonômicos e

comunidades que eram subamostrados ou ignorados, dado o paradigma original de ratos

comensais e ambiente peridomiciliar (Moore et al., 2015; Zeppelini et al., 2016).

A composição da fauna de um sistema reservatório é um fator ecológico proeminente

nas dinâmicas de uma infecção (Brisson et al., 2011; Johnson et al., 2015). As espécies que

compõem a fauna de um foco zoonótico têm diferentes eficiências em manter e amplificar a

infecção; com as espécies do ciclo epizoótico sendo amplificadores da transmissão; e as

espécies que se contaminam, mas que não contribuem para o ciclo, realizam um efeito diluidor

que atenua a taxa total de transmissão (Roche et al., 2013). A combinação de conhecimento

sobre a fauna de pequenos mamíferos, as diferentes susceptibilidades e as relações com

paisagem pode ser a chave para entender o ciclo transmissivo da Peste como uma entidade

ecológica definida, podendo se criar ferramentas preditivas para ações de saúde pública. A

presente dissertação tem como objetivo, através de ferramentas de ecologia de comunidades,

responder sobre as diferenças faunísticas entre ambientes selvagens e peridomiciliares, e os

diferentes perfis pestosos entre ambos. O foco de Peste da Chapada da Borborema foi

escolhido por ser palco do último surto de peste registrado no país (Almeida et al., 1989),

englobar diversos centros urbanos de médio porte, com mais de cem mil habitantes (e.g.:

Garanhuns, Caruaru, Campina Grande), por ser o único foco que não teve coletas recentes

para investigação sobre sua fauna de pequenos mamíferos e o estado atual da Peste na

região (Costa et al., in press) e por apresentar diversos pequenos remanescentes

vegetacionais próximos às áreas de peridomicílio que permitem a comparação entre fauna

peridomiciliar e silvática.

Referências Bibliográficas

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Capítulo I

Zoonoses como Entidades Ecológicas: um caso de estudo com Peste

Como uma zoonose, a Peste é também uma entidade ecológica, um sistema complexo de

interações entre o patógeno, os hospedeiros e as variações espaçotemporais dos

ecossistemas. Cinco modelos de sistema reservatório foram propostos: (i) assembleias de

pequenos mamíferos com diferentes níveis de susceptibilidade e papéis na manutenção e

amplificação do ciclo; (ii) modelos de infecção crônica espécie-específico; (iii) pulgas vetoras

como reservatórios reais; (iv) Peste Telúrica e (v) arranjo metapopulacional para espécies

com espacialização discreta, seguindo dinâmicas fonte-poço de extinção e recolonização com

novos hospedeiros em potencial. A diversidade da comunidade que compõe o sistema

reservatório afeta o ciclo de transmissão por predação, competição e efeito diluidor. A Peste

tem limites ambientais notáveis, dependendo de altitude (500+ metros), clima seco e quente,

e condições para eventos de alta produtividade para expandir o ciclo transmissivo. Impactos

humanos estão alterando a dinâmica da peste pela alteração de paisagem e composição

faunística dos focos e áreas adjacentes, usualmente aumentando a presença e número de

casos humanos e surtos. As mudanças climáticas também afetam a extensão da ocorrência

da Peste. Na atual situação transicional das zoonoses como um todo, a Peste está em risco

de se tornar um risco de saúde pública em países pobres onde a erosão de ecossistema,

invasão antrópica de novas áreas e mudanças climáticas aumentam o contato da população

com os sistemas reservatório, dando mais urgência à pesquisa em ecologia para melhor

detalhar sua manutenção no ambiente, os eventos de surto e como estes se ligam aos casos

humanos.

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Capítulo II

Beta-diversidade da comunidade de pequenos mamíferos do foco da Chapada da

Borborema

Os pequenos mamíferos, como comunidade, são responsáveis por diversos papéis

ecológicos, entre eles, a participação no ciclo de diversas zoonoses, como o sistema

reservatório do patógeno. A composição da fauna de pequenos mamíferos de um local, assim

como as flutuações populacionais das espécies fazem parte do mecanismo de regulação dos

ciclos transmissivos, o que dá poder preditivo para eventos epizoóticos. Através do framework

de metacomunidades, é possível enxergar os processos em diversas escalas da paisagem.

A peste é uma zoonose de alta morbidade que tem os pequenos mamíferos como seu sistema

reservatório, e necessita de mecanismos preditivos para o risco epidemiológico. O presente

capítulo é uma análise de beta-diversidade no foco de peste da Chapada [Planalto] da

Borborema, um foco que engloba diversas áreas urbanas de médio e grande porte, para testar

i) a homogeneidade do foco como um todo, no ponto de vista de metacomunidades e ii) se há

diferença entre as comunidades de pequenos mamíferos do peridomicílio e dos

remanescentes de vegetação nativa. Quatro fontes de dados foram utilizadas: coletas em

campo, nos municípios de Areia e Alagoa Grande (PB), Espécimes da Coleção de Mamíferos

da UFPB e do MZUSP, dados de vigilância em peste da Regional de Saúde de Garanhuns do

ano de 1981, e revisão bibliográfica. As duas regiões delimitadas no Planalto da Borborema

apresentaram alta beta-diversidade interna (> 0.9), dominada por turnover, mas foram

composicionalmente similares entre si. A beta-diversidade entre as comunidades nos

ecotopos de peridomicílio e remanescentes vegetacionais foi moderadamente alta (0.517),

com um papel igual entre o turnover e o aninhamento composicional. Cinco espécies foram

dominantes, compondo aproximadamente metade dos registros recuperados, o que pode ser

efeito do viés amostral das coletas de peste. A hipótese de que a fauna de pequenos

mamíferos do Planalto da Borborema pode ser dividida como um conjunto de

metacomunidades é refutada. A hipótese da distinção entre as comunidades de pequenos

mamíferos encontradas em peridomicílio e remanescentes é validada, com um peridomicílio

mais rico em espécies dada a presença de mais dados disponíveis para o ecotopo de

peridomicílio e a presença de espécies que habitam áreas abertas. É proposta uma hipótese

de metafoco para explicar a não-separação da metacomunidade de pequenos mamíferos

frente à atividade focal e disjunta no foco.

Page 30: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

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Introdução

O termo “pequenos mamíferos” se refere um grupo de tamanho formado pelos

mamíferos não-voadores menores que um quilograma de peso quando adultos e que são

amostrados pelo mesmo conjunto de metodologias, sendo composto no Brasil por espécies

das ordens Rodentia e Didelphimorphia. Eles são o grupo de mamíferos mais especioso: a

ordem Rodentia contém mais de 42% das mais de 5000 espécies de mamíferos conhecidas

(Patton et al., 2015) com 75 gêneros e cerca de 240 espécies no Brasil (com ênfase na

subfamília Sigmodontinae e pela infraordem Caviomorpha) (Reis et al., 2011); a ordem

Didelphimorphia contribui com 95 espécies conhecidas (Gardner, 2007). Os pequenos

mamíferos são considerados componentes proeminentes de ambientes terrestres,

participando com sua considerável biomassa e grandes tamanhos populacionais em diversos

processos ecológicos, incluindo seu potencial como engenheiros de ecossistema (Davidson

e Lightfoot, 2006; Cao et al., 2016). Roedores, principalmente sigmodontineos, são

conhecidos por sua alta densidade e resposta populacional oportunista às condições

ambientais, enquanto outras espécies podem apresentar um padrão onde a resposta tem um

determinado tempo de retardo (Smith et al., 2006; Previtali et al., 2009; Andreazzi et al., 2011)

servindo de presa para diversas espécies (Laudenslayer e Fargo, 2002; Torre e Díaz, 2004;

Fricke et al., 2009; Byrom et al., 2014), predando ninhos terrestres (Fricke et al., 2009),

predam e dispersam sementes (Sunyer et al., 2013), e suas atividades no espaço que habitam

podem afetar a dinâmica e composição da flora herbácea de seu habitat (Root-Bernstein et

al., 2014). Marsupiais apresentam reprodução mais cíclica e sazonal, contrastando com a

reprodução explosiva de muitos roedores (Andreazzi et al., 2011), mas ocupam os mesmos

ambientes e exploram recursos paisagísticos similares, com algum grau de sobreposição

(Stoddart, 1979; Gentile e Fernandez, 1999; Püettker et al., 2006; Cárceres e Machado, 2013;

Galetti et al., 2016) , o que permite o estudo conjunto dos pequenos mamíferos.

Diversas espécies de pequenos mamíferos são ecologicamente resilientes,

conseguindo sobreviver em ambientes antrópicos (Riem et al., 2012; Hurst et al., 2013), desde

que sejam capazes de vencer o filtro ambiental gerado pela atividade humana no espaço

(Gamez-Virues et al., 2015) resultando em uma fauna de pequenos mamíferos mais simples

que a original (Vieira et al., 2009). As espécies capazes de permanecer ou colonizar

ambientes antrópicos muitas vezes passam a explorar recursos que são disponibilizados

pelas atividades humanas (Braga et al., 2015) com grande potencial para se tornarem pragas

(Stenseth et al., 2003).

Grupos faunísticos como pequenos mamíferos podem ser estudados do ponto de vista

da ecologia de comunidades. As comunidades podem aparentar serem estáticas e

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homogêneas localmente, mas podem variar ao longo do tempo e espaço em função da

distribuição das espécies componentes (Hadly e Maurer, 2001). A combinação das diferentes

distribuições e combinações de espécies em cada ‘comunidade local’ formam o que se

compreende por metacomunidade (Leibold et al., 2004; Declerck et al., 2013). A distribuição

das espécies nas diversas subunidades que foram a metacomunidade é regulada por fatores

locais (i.e. da própria subunidade, tanto bióticos quanto abióticos) e regionais (Mouquet et al.,

2005).

Outro fator de interesse às atividades humanas é o papel dos pequenos mamíferos

como hospedeiros no ciclo transmissivo de zoonoses (Pongsiri et al., 2009; Carreira et al.,

2012; Roque e Jansen, 2014). Sabe-se que as flutuações populacionais das espécies

reservatório podem ser responsáveis pela regulação dos ciclos transmissivos, permitindo

inclusive predição de epizootias em sistemas de poucas espécies (Reijniers et al., 2012;

Reijniers et al., 2014), e que as respostas populacionais das espécies reservatório, que afetam

a transmissão, são em certo ponto reguladas pela sazonalidade (Parmenter et al., 1999;

Andrianaivoarimanana et al., 2013). Porém, o conhecimento sobre processos populacionais é

apenas o início do entendimento, dado que a transmissão de patógenos é um fenômeno na

escala de comunidades (Brisson et al., 2011), especialmente para zoonoses com múltiplos

hospedeiros. Através do framework de metacomunidades, é possível entender os processos

de escala local (competição e flutuações populacionais das espécies reservatório) e em

escalas mais amplas (dispersão e colonização, persistência regional) (Suzán et al., 2015).

Para os estudos de zoonoses, a ecologia de comunidades é uma ferramenta para

compreender os sistemas reservatório, a taxocenose de espécies responsáveis por manter a

circulação de um patógeno no meio (Roche et al., 2013). A comunidade a ser estudada pelo

viés da ecologia de comunidades também inclui outros hospedeiros (intermediários, finais),

vetores e as espécies que interagem direta e indiretamente com os agentes do ciclo

transmissivo (Johnson et al., 2015; Zeppelini et al., 2016).

Pequenos mamíferos são um grupo de especial interesse para estudo por serem

reservatório de diversas zoonoses de interesse humano (Stoddart, 1979), incluindo a Peste

(Zeppelini et al., 2016). A Peste é uma zoonose bacteriana causada pelo Yersinia pestis,

transmitida primariamente pela picada de pulgas que passam a ser transmissivas ao se

alimentarem do sangue de hospedeiros contaminados (Perry e Fetherston, 1997). Pulgas e

ratos carregando o agente etiológico chegaram ao Brasil por via marítima em 1899 (Almeida

et al., 1989), com rápida incursão ao interior do país por meio do fluxo de carga, e formação

de 11 focos em áreas de planalto no semiárido do Nordeste Brasileiro, 2 focos no estado de

Minas Gerais e um no do Rio de Janeiro, independentes entre si em tempo e espaço, com a

participação de roedores e pulgas silvestres, expostos pelo contato na interface com

Page 32: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

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ocupações humanas e, consequentemente, dos ratos europeus invasores (principalmente

Rattus rattus) (Aragão et al., 2007; Oliveira et al., 2012; Brouat et al., 2013).

A beta-diversidade, uma função da alfa-diversidade (diversidade local) e da gama-

diversidade (a diversidade total ou regional) (Tuomisto, 2010), é uma métrica do estudo de

dissimilaridade composicional de comunidades com potencial de exploração no estudo de

zoonoses, funcionando como uma medida da heterogeneidade na distribuição das espécies

dentro da metacomunidade, do nível de aninhamento (o quanto há de identidade entre as

localidades) e o turnover (a substituição de espécies ao longo do espaço) (Baselga e Orme,

2012).

Metacomunidades não-neutras são classificadas de acordo com três fatores principais:

heterogeneidade espacial, segregação de nicho e dispersão (Declerck et al., 2013).

Metacomunidades com dinâmica de localidades (patch-dynamics) considera homogeneidade

espacial (localidades são uniformes), as espécies diferem em suas capacidades de

colonização de localidades e de competir por recursos, e a dinâmica de persistência das

espécies é um fenômeno regional com fenômenos locais implícitos, onde a persistência é um

equilíbrio entre as capacidades de competição (competidores fortes suplantando

competidores mais fracos) e dispersão (competidores mais fracos são melhores dispersores).

A Seleção de Espécies (species sorting) considera a heterogeneidade espacial na forma de

um gradiente ambiental, os processos locais levam em conta fatores bióticos e abióticos, e a

dispersão é alta o suficiente para as espécies ocuparem seus nichos, podendo ocorrer i) a

divisão efetiva da metacomunidade (quando diferentes espécies só são capazes de colonizar

habitats exclusivos) ii) arranjos complexos com espécies capazes de habitar uma determinada

variação de ambientes. Os Efeitos de Massa consideram que processos locais e regionais

ocorrem na mesma escala de tempo, pressupõem heterogeneidade espacial e conectividade

de forma que os eventos de dispersão sejam capazes de manter as populações ao longo do

tempo, em uma dinâmica de fonte-poço e as dinâmicas locais interfiram com a estrutura da

comunidade (Leibold et al., 2004; Mouquet et al., 2005). Embora os três paradigmas (assim

como o modelo neutro) tenham sido claramente delimitados e pareçam mutualmente

exclusivos (Leibold et al., 2004), empiricamente é difícil a separação entre modelos, e mais

de um paradigma pode ser necessário para explicar a heterogeneidade encontrada em

estudos experimentais e/ou observacionais (Logue et al., 2011), onde a parte da variação

observada na metacomunidade explicada por variáveis ambientais mais amplas refere aos

modelos não neutros, e a variação explicada por variáveis espaciais de fina-escala

independente das maiores escalas indicam processos neutros dirigidos por autocorrelação

espacial (Yunoki e Velasco, 2016).

Page 33: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

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O foco da Chapada da Borborema (sensu Serviço de Vigilância em Saúde do

Ministério da Saúde) compreende a região geográfica do Planalto da Borborema (Ministério

Da Saúde, 2008), e algumas poucas áreas fora de seu limite que se encontram associadas.

Geograficamente, o Planalto da Borborema constitui um elevado que se estende em

orientação NE-SW, podendo atingir até 1200m de altitude (Morais Neto et al., 2009). O Serviço

de Vigilância em Saúde (SVS) define foco como a conjunção do patógeno, vetor(es) e

hospedeiro(s) coexistindo indefinidamente sob condições naturais, como uma biogeocenose

adaptada ao habitat e local do espaço que ocupa (2008); e dentro desta definição, considera

toda a extensão do Planalto da Borborema como um único foco de peste. Os primeiros casos

documentados de Peste no Planalto da Borborema datam de 1912, na Paraíba (Barreto e

Castro, 1946; Soares Jr., 2011). A região também foi palco do último surto no país, em 1986,

atingindo 41 municípios, com 48 casos humanos positivos (Almeida et al., 1989; Ministério Da

Saúde, 2008). O foco da Chapada da Borborema merece atenção também pela situação

geográfica em que se encontra, próximo da zona litorânea e de portos de grande porte como

o Porto de Suape e o Porto de Cabedelo, e pela presença de manchas urbanas de médio e

grande porte (entre cem e trezentos mil habitantes), como Caruaru, Campina Grande e

Garanhuns.

Uma zoonose de interesse humano como a Peste demanda estudos ecológicos para

compreender sua dinâmica, especialmente pela capacidade da Peste de ficar indetectável

nos períodos de quiescência (Haule et al., 2013). O modelo de vigilância epidemiológica da

peste empregado historicamente focando esforços no ambiente peridomiciliar provavelmente

levou a um viés do conhecimento sobre o ciclo da peste, indicando uma possível lacuna na

representação do sistema reservatório (Zeppelini et al., 2016). A transmissão dentro de um

sistema e nos momentos de surto é diretamente afetada pela composição do sistema

reservatório; onde diferentes espécies têm diferentes níveis de susceptibilidade, espécies de

alta susceptibilidade são potenciais amplificadoras da infecção, e as de baixa podem exercer

um efeito diluidor (Brisson et al., 2011). O presente capítulo é o resultado de uma análise de

metacomunidades dos pequenos mamíferos do Planalto da Borborema. Duas hipóteses são

testadas, i) a região do Planalto da Borborema não é uma única metacomunidade, e sim um

conjunto de metacomunidades no espaço que formam coletivamente o Foco da Chapada da

Borborema, explicando o comportamento assincrônico e difuso do foco nos períodos com

casos registrados ii) a fauna de pequenos mamíferos dos remanescentes de vegetação nativa

é diferente da do peridomicílio, como será testado pelos valores de beta-diversidade entre

ambas.

Page 34: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

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Materiais e Métodos

1 Coleta de dados

1.1 Área de Estudo

O Planalto da Borborema constitui um elevado que se estende em orientação NE-SW,

podendo atingir até 1200m de altitude (Morais Neto et al., 2009). A formação pode ser dividida

em três setores: Encosta Oriental, Encosta Ocidental e Planalto Central, e é cercada pela

Depressão Sertaneja (a oeste), pela Planície Litorânea (a leste) e pelo Planalto Sertanejo a

sudoeste (Projeto RADAMBRASIL, 1981). O Serviço de Vigilância em Saúde, responsável

pela vigilância epidemiológica de peste no país (2008), classifica a área do Planalto da

Borborema como uma das áreas do foco de Peste do Agreste Nordestino, denominando-o

‘foco da Chapada da Borborema’. A classificação climática de Köppen para o Planalto fica

dividida, a grosso modo, em Cwa, Cwb (tropical/subtropical úmido) e BSh (semi-árido)

(Alvares et al., 2013). Para definição espacial do Planalto da Borborema neste estudo, utilizou-

se o shapefile de relevo do Brasil disponível para consulta e descarga no site do Ministério do

Meio Ambiente (http://mapas.mma.gov.br/i3geo/datadownload.htm). Foi preterido o uso de

informação de relevo ao esquema de ecorregiões desenvolvido por Velloso et al. (2002) por

ser a maneira mais simples de delimitar a região, dado que a SVS (2008) não fornece

ferramentas para reproduzir a delimitação.

1.1.1 Coleta ativa de dados

Foram realizadas saídas de campo para amostrar a fauna de pequenos mamíferos em

duas municipalidades do estado da Paraíba inclusas no Planalto da Borborema, selecionadas

à partir dos municípios com casos investigados no surto de Peste de 1986/1987(Almeida et

al., 1989). Para selecionar as áreas, foram levantadas as cidades e localidades onde houve

pesquisa de campo pelos agentes de endemias para i) investigar possíveis casos humanos

ii) realizar vigilância à partir da coleta de pulgas e/ou roedores. Cada inquérito realizado pelos

agentes de endemias gerou uma ficha de registro de ocorrência (ficha padrão CCP-25). A

partir de 324 fichas de campo e registros de 412 pacientes humanos estudados (com acesso

cedido pelo Serviço Nacional de Referência em Peste, FIOCRUZ-PE), foram elencados os 45

municípios e 208 localidades onde os inquéritos foram feitos, à partir das quais foram

selecionados dois municípios para as coletas: Alagoa Grande e Areia. Os municípios

selecionados foram escolhidos pela possibilidade logística de desenvolvimento do trabalho.

Em cada município, foram realizadas duas campanhas somando 13 dias de armadilhagem,

divididas entre os meses de julho, agosto, setembro e outubo, para pequenos mamíferos,

dividindo a coleta igualmente em duas parcelas: uma peridomiciliar, onde as armadilhas foram

Page 35: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

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instaladas em edificações, ao redor das mesmas, em campos de cultivo, pastagens e outras

áreas que pudessem ser claramente identificáveis como locais onde atividades humanas são

continuamente exercidas; e uma silvestre, instalada em fragmentos de vegetação nativa com

o menor grau de alteração antrópica possível. Para garantir independência entre peridomicílio

e área silvestre, as parcelas distavam ao menos 500 metros uma da outra.

Duas expedições de coleta foram realizadas em cada área, dentro da janela de tempo

apresentada. A primeira contou com seis dias de trabalho de campo, onde foram utilizadas

160 armadilhas (80 para peridomicílio, 80 para vegetação nativa), e a segunda contou com

sete dias de campo e 120 armadilhas (60 para cada parcela). As armadilhas foram dispostas

em trilhas georreferenciadas de 20 unidades, com espaços de 10 metros entre armadilhas,

iscadas com isca mista de banana, aveia/farinha de milho, paçoca de amendoim e sardinha

enlatada com óleo comestível. As trilhas de armadilhas foram verificadas diariamente para

reforço da isca e retirada e substituição das armadilhas que capturaram indivíduos.

Armadilhas com captura incidental de taxa não-mamíferos (aves, lagartos, cobras) foram

abertas in situ para liberação do animal aprisionado e rearmadas, exceto no caso da morte do

animal capturado, onde estas foram substituídas para lavagem. Usou-se um conjunto de

armadilhas tipo Sherman (dimensões 7.64 x 9.53 x 30.48 cm), Tomahawk (dimensões 40.64

x 12.70 x 12.70 cm) e armadilhas similares às utilizadas nas campanhas dos agentes de

endemias da Peste. Atividades sob licença SISBIO #8164-1, e aprovação do Conselho de

Ética e Uso Animal da UFPB nº 121/2016.

Na cidade de Alagoa Grande, as coletas foram realizadas na Fazenda Riachão do

Progresso (FRP) (07º06’01’’ S; 35º35’57’’ W), uma propriedade rural com principal fim

comercial a criação de gado bovino e caprino, além da presença de roçados de milho em

alguns pontos. As armadilhas de peridomicílio foram armadas junto à sede da fazenda, por

trás de prédios de armazenamento de veículos, equipamentos e insumos; em área de

pastagem e em uma área de roçado de milho. As armadilhas dos fragmentos de vegetação

foram armadas em fragmentos de caatinga arbustivo-arbórea (floresta seca com dossel a no

máximo 3 metros do solo, serapilheira praticamente ausente e abundância de fragmentos

rochosos no solo), seguindo vestígios de trilhas anteriores ou abrindo novas picadas. Os

fragmentos amostrados encobriam morros baixos; um dos fragmentos circundando o açude

comunitário da região, onde a água serve para usos múltiplos (pesca, abastecimento da

população e gado, recreação e irrigação).

Na cidade de Areia, as coletas foram realizadas no Engenho Bujari, um engenho de

cana de açúcar especializado na produção de rapadura. A reserva legal do engenho,

composta por um fragmento de mata de Brejo de Altitude (enclaves de floresta estacional

Page 36: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

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semidecidual montana estabelecidas na face a barlavento dos planaltos nordestinos, dentro

do domínio Caatinga; situados entre 100 e 600m de altitude nos planaltos (Rodal et al., 2005).

A ocorrência de chuvas de relevo são a causa da alta pluviosidade (>1200 mm/ano) que

propicia as características florestais similares à Floresta Atlântica litorânea, localizados na

face leste do Planalto da Borborema (Pôrto et al., 2004)), se encontra na parte mais alta, à

altura da estrada; enquanto a sede do engenho e o canavial se encontram em uma área mais

baixa, acessível por estrada de terra. O fragmento de mata apresenta sinais de uso humano

no passado, com a presença de caminhos largos por onde trafegavam veículos motorizados,

assim como vestígios do uso humano às margens da estrada de terra que leva ao engenho,

onde é possível encontrar depósitos de lixo. De acordo com o dono do Engenho Bujari, o

acesso de veículos nos caminhos que adentram o fragmento foi proibido há alguns anos, e é

possível observar o crescimento de vegetação nos mesmos que não seria possível caso ainda

houvesse tráfego no local. Com exceção das armadilhas alocadas na sede do engenho,

instaladas dentro das estruturas onde a cana é armazenada e processada, o caldo é

trabalhado e o produto final é estocado e embalado, todas as trilhas seguiram o padrão

descrito.

1.1.2 Levantamento de dados no Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães, FIOCRUZ

Pernambuco.

O Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães, por meio do Serviço Nacional de Referência

em Peste, é parte da pesquisa, controle e combate à peste nos focos do Nordeste Brasileiro,

sendo sede do laboratório de referência em Peste do país desde 2002. O trabalho do

laboratório de referência em Peste centralizou grande parte da informação que está

disponível, incluindo as fichas de campo dos agentes de vigilância de endemias. As fichas

(padrão CCP-12 e CCP-13) compõem os dados diários de campo da coleta de roedores para

realização de testes diagnósticos de Peste, a fim de detectar e monitorar a circulação do

patógeno no meio.

A partir das fichas consultadas nos arquivos do CPqAM, liberadas para consulta pelo

SRP, foi resgatado um ano completo de trabalho de vigilância em campo realizado pela

Regional de Saúde de Garanhuns (PE), localizada dentro do Foco da Chapada da Borborema.

As fichas compõem o registro da atividade das equipes de campo durante todo o ano de 1981,

realizando atividades de captura em diversas localidades de cinco municípios contemplados

pela regional: Correntes, Brejo da Madre de Deus, Bom Conselho, Buíque e São Caitano,

todas no estado de Pernambuco.

As fichas constam de inquéritos de captura diários, com capturas dentro de edificações

e em campos de usos múltiplos dos sítios e fazendas amostrados (plantações, matagal,

Page 37: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

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pastagens, roçados), com o número de armadilhas utilizado em cada parcela (edificação ou

campo), as espécies capturadas no dia, o número de indivíduos e informações pertinentes de

cada indivíduo (sexo, faixa etária, pulgas obtidas de cada indivíduo). As informações de

captura foram resgatadas e tabuladas.

1.1.3 Levantamento de coleção

A Coleção de Mamíferos da Universidade Federal da Paraíba contém

aproximadamente dez mil espécimes tombados. Da Coleção de Mamíferos, foram listados os

pequenos mamíferos tombados com origem em municípios do Planalto da Borborema,

quando necessário corrigindo o critério de definição do mesmo (o uso do Shapefile de relevo

do Brasil) de acordo com informações resgatadas no trabalho de recuperação de dados no

CPqAM, de modo a incluir localidades que seriam excluídas pelos limites definidos pelo

shapefile.

1.1.4 Levantamento de literatura

Esta etapa de levantamento de dados foi feita em parceria com o projeto “Diversidade

filogenética, beta e filobetadiversidade entre comunidades de pequenos mamíferos de

diferentes ecorregiões da Caatinga: Quantificação dos principais processos ecológicos e

evolutivos com enfoque em metacomunidades”, projeto da doutoranda Thais Kubik Martins,

do Laboratório de Mamíferos da UFPB. Foi formado um banco de dados com todos os

registros obtidos da literatura para ocorrências de espécies de pequenos mamíferos no bioma

Caatinga, assim como os registros obtidos da coleção de mamíferos do Museu de Zoologia

da Universidade de São Paulo (MZUSP). Após formação deste acervo, foi feita a filtragem

para as localidades do Planalto da Borborema, como definida na seção 1.1.

1.2 Pré-processamento dos dados

Com a compilação das quatro fontes de dados, foi feita uma varredura para i) excluir

duplicatas e registros redundantes, ii) excluir espécies erroneamente incluídas que não se

enquadram no conceito de pequenos mamíferos, especialmente por não serem amostráveis

pelas metodologias utilizadas, iii) atualização taxonômica das espécies que foram obtidas dos

registros de tombo, fichas de campanha e literatura. Espécimes da Coleção de Mamíferos da

Universidade Federal da Paraíba que estavam identificados até o nível de gênero no caderno

de tombo foram examinados para identificação a nível de espécie. A atualização taxonômica

baseou-se no trabalho de Bonvicino et al. (2015).

2 Avaliação da Representatividade dos Dados

Page 38: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

27

Os dados levantados pelas fichas de campo (ver seção 1.1.2) e das coletas in situ

(1.1.1) foram testados para avaliar a suficiencia amostral. Para tal, foi calculado o estimador

de riqueza Chao 1 (Chao, 1984), utilizando o programa EstimateS (Colwell, 2006).

Figura 4: Mapa da região do Planalto da Borborema com os municípios amostrados de acordo com a seção 1 dos

Materiais e Métodos. A linha intermitente indica os limites geográficos do Planalto da Borborema. Municípios em

verde são todos os municípios com dados utilizados no trabalho. Cruz vermelha indicam os municípios de Alagoa

Grande (mais ao sul), e Areia (mais ao norte), onde as coletas ativas foram realizadas.

3 Análise de dados

3.1 Partição dos dados

Com o intuito de avaliar a heterogeneidade dentro do foco da Chapada da Borborema,

os registros foram divididos espacialmente em dois grupos: Borborema Norte e Borborema

Sul. A divisão foi feita dada a organização espacial dos pontos com dados, formando

nitidamente os dois grupos identificados. Borborema Norte contempla os municípios do estado

da Paraíba, assim como as cidades de São Vicente Ferrer, Macaparana e Vicência

(Pernambuco); enquanto Borborema Sul contempla os demais municípios de Pernambuco. A

região da Borborema Norte é limítrofe com a ecorregião da Depressão Sertaneja Meridional,

enquanto a Borborema Sul se encaixa na Depressão Sertaneja Setentrional (Velloso et al.,

2002).

Page 39: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

28

Dentro da Borborema Norte, foi feita uma partição interna dos dados. Á partir dos

dados de ambiente silvestre das coletas realizadas, dos livros do tombo e da literatura, foi

criada uma unidade amostral única representando-o em oposição aos demais registros de

peridomicílio. Para assegurar a certeza da origem dos dados, dados de tombo e literatura só

foram considerados área silvestre caso houvesse indicativo do mesmo (i.e. unidades de

conservação).

3.2 Beta-Diversidade

Para quantificar a dissimilaridade entre os grupos, e entre a fauna peridomiciliar e

silvestre, foi utilizado o método de Baselga e Orme (2012), que decompõe o valor da beta-

diversidade em turnover (substituição da composição de uma comunidade, medido ao longo

dos pontos amostrais) e aninhamento (o quanto os pontos amostrais são um subgrupo da

diversidade total da região estudada), o que permite identificar a homogeneidade espacial das

comunidades estudadas. Para tal, será utilizado o pacote ‘betapart’ (2012) para o ambiente R

(2016). Os cálculos de beta-diversidade serão feitos utilizando o Índice de Jaccard, dado que

seu cálculo usa o valor absoluto da diversidade regional, em vez da média de espécies em

uma localidade aleatoriamente selecionada do índice de Sørensen, sendo o mais indicado

para análises de larga escala (Jost et al., 2011).

Resultados

1. Capturas em campo.

As expedições de amostragem de pequenos mamíferos nos municípios de Alagoa

Grande e Areia somaram um total de 3640 armadilhas/noite, capturando 45 espécimes (27

marsupiais e 18 roedores) num total de 10 espécies. (Tabela 1.), coletando um indivíduo a

cada 80.8 armadilhas/noite. Áreas de mata tiveram maior riqueza e número de capturas, com

30 indivíduos e 8 espécies, contra 15 indivíduos de 4 espécies no peridomicílio. A espécie

mais abundante de todos os ambientes foi Didelphis albiventris, sendo que dos 12 indivíduos

capturados, 9 foram soltos por serem juvenis. O estimador de riqueza Chao 1 projetou 10 (±

0.91) espécies para as coletas realizadas, 8 (± 1.26) para as matas, e aproximadamente 5 (±

2.04) para peridomicílio, considerando as amostragens das localidades e das matas

suficientes, mas as de peridomicílio, subamostradas.

Apenas Alagoa Grande apresentou espécies compartilhadas pelas áreas

peridomiciliares e silvestres: Monodelphis domestica, capturado em trilhas de pastagem e

roçado de milho em período pós-colheita, e Galea spixii, capturado em trilhas de pastagem.

Importante salientar que Necromys lasiurus, uma espécie comum nas coletas de pequenos

Page 40: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

29

mamíferos, especialmente em meio peridomiciliar, foi representado por apenas um indivíduo,

capturado em canavial.

2. Capturas da Regional de Saúde de Garanhuns, 1981.

O serviço de vigilância em campo da Regional de Saúde de Garanhuns, no ano de

1981, realizou a captura de 2675 indivíduos de 9 espécies (8 roedores, 1 marsupial) (Tabela

2). O esforço total estimado a partir da informação das fichas de campo é de 12936

armadilhas/noite. O número de armadilhas e noites empregados em cada município não foi

uniforme, e o esforço amostral calculado é o somatório de todos os 5 municípios.

A Tabela 3 apresenta o resultado do estimador de riqueza Chao 1 para cada município,

e para os municípios unificados. Com exceção de Buíque (8 ± 2.23), todos os municípios, e o

conjunto de municípios, foram considerados suficientemente amostrados. Vale ressaltar que

o resultado para Brejo da Madre de Deus (3 ± 0.01) embora estatisticamente válido não é

utilizável, dado que a área teve apenas três espécies coletadas, e três dias de coleta.

Apenas três espécies, Cerradomys langguthi, Necromys lasiurus e Rattus rattus foram

comuns a todos os municípios amostrados. Bom Conselho, Buíque e Correntes foram os

municípios onde mais espécies foram registradas, num total de 7 espécies, além de serem os

únicos locais onde foram capturados indivíduos de Galea spixii. Rattus rattus foi capturado

apenas em armadilhas instaladas dentro de edificações, e com a exceção de um indivíduo de

Calomys expulsus, foi a única espécie capturada em edificações.

3. Levantamento de espécies de coleção

Foram listados da Coleção de Mamíferos da Universidade Federal da Paraíba, após

triagem para remover registros em duplicata, 240 espécimes de 18 espécies (14 roedores, 4

marsupiais) coletados em 10 municípios no Planalto da Borborema (Tabela 4). Apenas uma

espécie, Rattus rattus, não é nativa (Reis et al., 2011).

4. Levantamento de espécies de literatura e da Coleção do Museu de Zoologia da USP

Um total de 26 espécies (20 roedores, 6 marsupiais) foram listados de 7 fontes

bibliográficas e da Coleção do Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (MZUSP)

(Tabela 5). O levantamento de literatura foi a etapa de coleta de dados que recuperou mais

espécies, incluindo o único registro da família Sciuridae (Guerlinguetus brasiliensis), além de

contribuir com mais uma espécie para as famílias Caviidae (Kerodon rupestris) e Echimyidae

(Phyllomys lamarum), que contavam com apenas uma espécie cada. A Tabela 6 colige os

dados de presença para todas as espécies encontradas no trabalho, discriminando sua

presença em cada fonte de dados (coletas em campo, coletas de dados do SRP, livro de

Page 41: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

30

tombo e literatura). Apenas duas espécies, Galea spixii e Necromys lasiurus foram

encontradas nas quatro fontes de dados.

Tabela 1. Animais coletados em campo nas expedições realizadas nos municípios de Alagoa Grande e Areia (PB)

entre julho e outubro de 2016, discriminadas por município, e subsequentemente por ambiente.

Tabela 2. Dados de capturas realizadas no ano de 1981 pela Regional de Saúde de Garanhuns, recuperadas dos

registros de campo cedidos pelo SRP. BC = Bom Conselho, BMD = Brejo da Madre de Deus, SC = São Caetano.

Alagoa Grande Areia

Mata Peridomicílio Mata Peridomicílio

Ordem Didelphimorphia Didelphis albiventris 12 Gracilinanus agilis 4 Marmosa demerarae 4 Monodelphis domestica 3 4 Rodentia:Cricetidae Rhipidomys mastacalis 1 Necromys lasiurus 1

Oligoryzomys sp. 3 Rodentia:Caviidae Galea spixii 1 1 Rodentia:Echmyidae Thrichomys laurentius 2 Rodentia:Muridae Rattus rattus 3 6

Total por área 10 8 20 7

Total por localidade 18 27

BC BMD Correntes SC Buique Total espécie

Rodentia:Cricetidae Akodon cursor 11 59 70

Calomys expulsus 102 28 18 148

Cerradomys langguthi 51 10 47 18 45 171

Necromys lasiurus 1007 42 485 106 245 1885

Oligoryzomys nigripes 40 51 10 101

Oxymycterus dasytrichus 23 23

Rodentia:Muridae Rattus rattus 111 14 52 45 49 271

Rodentia:Caviidae Galea spixii 1 1 1 3

Ordem Didelphimorphia Monodelphis domestica 2 1 3

Total área 1323 66 718 199 369 2675

Page 42: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

31

Tabela 3. Número de espécies (Sobs) e o valor do estimador de riqueza Chao 1 para as localidades amostradas

pela Regional de Saúde de Garanhuns em 1981. BC = Bom Conselho, BMD = Brejo da Madre de Deus, SC = São

Caitano.

BC BMD Correntes Buique SC Total

Sobs 7 3 7 7 5 9

Chao 1 7 (± 0.48) 3 (± 0.01) 7 (± 0.48) 8 (± 2.23) 5 (± 0.34) 9 (± 0.31)

5. Análises de beta-diversidade

5.1 Pré Análise

Na Borborema Sul, 2/3 das localidades (n = 10) apresenta registros de menos de 9

espécies, incluindo localidades com apenas uma espécie; enquanto o terço restante (n = 4)

atinge valores de dois dígitos (12, 13, 15 e 20 spp); desigualdade refletida na média dos

valores de riqueza por localidade (6.866 ± 5.91447). A Borborema Norte apresenta um

comportamento de dissimilaridade ainda mais acentuado, onde 11 das 15 localidades tem

entre 1 e 4 espécies registradas apenas, as outras 4 localidades tem 10, 12, 14 e 16 espécies;

a média da riqueza por localidade atingindo 5.066 (± 5.188). No contexto geral da Borborema,

se manteve a proporção encontrada nas sub-unidades (1/3 com maior número de espécies,

2/3 mais pobres), com uma média de 5.966 (±5.5428) espécies por localidade. O desvio-

padrão encontrado indica a discrepância entre os grupos de localidades, onde as localidades

com maior riqueza têm cinco vezes mais espécies do que as mais pobres, com 7 das 30

localidades possuem apenas uma espécie registrada.

Passando a se analisar o comportamento da ocorrência das espécies, a Borborema

Sul não apresenta espécies claramente dominantes (considerando dominância uma fração

pequena das espécies perfazer a mesma percentagem de registros que todas as demais),

embora haja espécies com apenas um registro (n = 4), com uma média de 4.291 (±2.544)

ocorrências por espécie. A Borborema Norte repete o padrão, mas com uma amplitude de

valores menor ([1,7], comparado com [1,9] da Borborema Sul), e apresenta mais espécies

com apenas um registro (n = 6), e um média mais baixa de ocorrências por espécie (3.08 ±

1.869). Das 29 espécies que foram registradas para o Planalto da Borborema, 7 espécies

(24.13%) apresentam mais de 10 ocorrências, e uma proporção similar (6 espécies, ou

20.69%) de espécies com uma única ocorrência, e uma média de 6.17 (±4.48) ocorrências

por espécie. As 7 espécies (Galea spixii, n = 12; Monodelphis domestica, n = 15; Thrichomys

laurentius, n = 10; Cerradomys langguthi, n = 14; Necromys lasiurus, n = 14; Calomys

expulsus, n = 10; Wiedomys pirrhorhinus, n= 12) consideradas dominantes somam 48.6% das

ocorrências registradas nas localidades do Planalto da Borborema. 6 das 7 espécies com

Page 43: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

32

mais registros são espécies frequentemente citadas como parte do sistema reservatório da

Peste no Brasil (Bonvicino et al., 2015).

5.2 beta-diversidade por grupos

A beta-diversidade interna dos grupos Borborema Norte e Borborema Sul, assim como

a Borborema como um todo, medida usando o Índice de Jaccard (função beta.multi Baselga

e Orme (2012)), assim como sua decomposição em turnover e aninhamento composicional é

apresentada na Tabela 7. Os grupos apresentam alta variação composicional entre seus

pontos amostrais, fenômeno quase totalmente fruto do turnover (Borborema Sul: 0.7613293;

Borborema Norte: 0.8327869). É importante ressaltar que o Planalto da Borborema como uma

unidade possúi uma beta-diversidade ainda mais alta (0.9610693), com uma participação

ainda menor do aninhamento (0.08203704).

5.3 beta-diversidade entre grupos

A beta-diversidade entre os grupos Borborema Norte e Borborema Sul (função

beta.pair) medida usando o Índice de Jaccard foi de 0.3103448. Os grupos apresentaram

beta-diversidade menor entre si do que os valores intragrupo, entretanto a dominância do

turnover (0.2857143) se mantém, com uma participação vestigial do aninhamento

composicional (0.02463054). Os grupos podem ser considerados bastante similares entre si,

com sua variação composicional derivando principalmente do turnover.

5.4 diferenças composicionais entre área silvestre e peridomicílio

As matrizes de valores de beta-diversidade, turnover e aninhamento composicional da

análise par-a-par dentro da Borborema Norte confirma a tendência de alta diferença

composicional entre os habitats, com pares atingindo unidade no valor de sua beta-

diversidade. Os valores de aninhamento em sua maioria são zeros ou inferiores a 0.1, com o

processo da beta-diversidade dominado pelo turnover. As áreas silvestres (MATAS,

compostas pelas áreas silvestres amostradas e por registros oriundos da Reserva Estadual

Mata do Pau Ferro (Areia), e Parque Estadual Pedra da Boca (Araruna)) apresentam alta

diferença composicional em comparação com todos os outros pontos amostrais, não atingindo

valores de beta inferiores a 0.65. A média da beta-diversidade foi 0.89651 (± 0.114596), o

turnover 0.735963 (± 0.275639) e o aninhamento 0.160548 (± 0.251079). Uma análise das

matrizes permite encontrar uma única localidade onde a beta-diversidade é principalmente

dada pelo aninhamento, em relação às áreas silvestres: o município de Borborema, que

contém apenas uma espécie registrada (Monodelphis domestica). Vale salientar que este

ponto amostral repete este comportamento com outras localidades.

Page 44: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

33

Tabela 4. Registros recuperados do Livro do Tombo da Coleção de Mamíferos da UFPB. Municípios: Serraria (1),

Natuba (2), Areia (3), Salgado de São Félix (4), Teixeira (5), São Vicente Férrer (6), Macaparana (7), Brejo da

Madre de Deus (8), Borborema (9), São Caitano (10). O. agrestis foi mantido por ser possível encontrar os

espécimes.

Uma nova análise pareada foi feita, coligindo todos os pontos amostrais da Borborema

Norte em uma única matriz de peridomicílio. A tendência de alta beta-diversidade (0.52),

dominada pelo turnover (0.4; aninhamento: 0.12) se repetiu, porém, os valores foram

consideravelmente menores.

Uma última análise comparativa coligiu todos os pontos de mata do Planalto da

Borborema disponíveis (os pontos utilizados na Borborema Norte, adicionados dos registros

do Parque Nacional do Catimbau (Buíque)), e todos os pontos de peridomicílio. Os resultados

para todo o Planalto da Borborema apresentam valor intermediário de beta-diversidade

(0.5172414), mas os processos internos se alteram consideravelmente: turnover (0.2222222)

e aninhamento composicional (0.2950192) passam a ter papéis numericamente muito

próximos, em contraste com os resultados anteriores.

Espécies Municípios

Rodentia:Cricetidae Akodon cursor 1, 2, 3, 4

Calomys expulsus 2, 4

Cerradomys langguthi 2, 3, 4, 5, 6, 7

Euryoryzomys russatus 3

Holochilus sciureus 2, 4

Necromys lasiurus 2, 4

Oligoryzomys agrestis* 2, 7

Oligoryzomys mattogrossae 2

Oligoryzomys nigripes 2, 3, 7

Pseudoryzomys simplex 2, 4

Rhipidomys mastacalis 3, 10

Wiedomys pyrrhorhinus 2, 4, 5

Rodentia:Caviidae Galea spixii 4

Rodentia:Echimyidae Thricomys laurentius 2, 4, 5

Rodentia:Muridae Rattus rattus 3, 5

Ordem Didelphimorphia Marmosa murina 3

Marmosa demerarae 2

Monodelphis americana 8

Monodelphis domestica 2, 3, 7, 4, 9

Page 45: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

34

Tabela 5. Registros de espécies da Chapada da Borborema recuperados da literatura e da Coleção Museu de

Zoologia da Universidade de São Paulo (MZUSP). Apenas dados de ocorrência foram recuperados Referências

completas disponíveis em “Bibliografia Consultada”.

Espécie Fonte

Rodentia:Cricetidae

Akodon cursor Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Calomys expulsus Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Cerradomys langguthi Geise et al. 2010; Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; Percequillo et al. 2008; MZUSP

Euryoryzomys russatus Oliveira e Langguth 2004

Holochilus sciureus Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Necromys lasiurus Geise et al. 2010; Oliveira et al. 2003; Oliveira e Lngguth 2004; MZUSP

Nectomys rattus Oliveira et al. 2003

Oligoryzomys mattogrossae Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004

Oligoryzomys nigripes Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Oligoryzomys stramineus Geise et al. 2010; Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004

Oxymycterus dasytrichus Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Pseudoryzomys simplex Oliveira e Langguth 2004

Rhipidomys mastacalis Geise et al. 2010; Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Wiedomys pyrrhorhinus Geise et al. 2010; Gonçalves et al 2003; Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Rodentia:Caviidae

Galea spixii Geise et al. 2010; Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Kerodon rupestris Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Rodentia:Echimyidae

Thrichomys laurentius Cruz et al., 2005; Geise et al. 2010; Oliveira 2003; Oliveira e Langguth 2004; MZUSP

Rodentia:Muridae

Mus musculus MZUSP

Rodentia:Sciuridae

Guerlinguetus brasiliensis Oliveira e Langguth 2004; tombo MZUSP

Ordem Didelphimorphia

Didelphis albiventris Cruz et al., 2005; Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; tombo MZUSP

Gracilinanus agilis Cruz et al., 2005; Geise et al. 2010; Oliveira e Langguth 2004; tombo MZUSP

Marmosa murina Oliveira e Langguth 2004; tombo MZUSP

Marmosa demerarae Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; Tombo MZUSP

Monodelphis americana Oliveira e Langguth 2004; tombo MZUSP

Monodelphis domestica Cruz et al., 2005; Oliveira et al. 2003; Oliveira e Langguth 2004; tombo MZUSP

Page 46: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

35

Tabela 6. Compilação da presença das espécies no Planalto da Borborma nas quatro fontes de dados. 1.1.1 =

coleta ativa em campo, 1.1.2 = dados da Regional de Garanhuns, 1.1.3 = Coleção (UFPB), 1.1.4 = dados de

literatura. Em vermelho estão ressaltadas as espécies presentes em todas as fontes.

Espécie 1.1.1 1.1.2 1.1.3 1.1.4

Rodentia:Cricetidae Akodon cursor x x x

Calomys expulsus x x x

Cerradomys langguthi x x x

Euryoryzomys russatus x x

Holochilus sciureus x x

Necromys lasiurus x x x x

Nectomys rattus x

Oligoryzomys mattogrossae x x

Oligoryzomys nigripes x x x

Oligoryzomys stramineus x

Oligoryzomys sp. x Oxymycterus dasytrichus x x

Pseudoryzomys simplex x x

Rhipidomys mastacalis x x x

Wiedomys pyrrhorhinus x x

Rodentia:Caviidae Galea spixii x x x x

Kerodon rupestris x

Rodentia:Echimyidae x

Phyllomys lamarum x

Thrichomys laurentius x x x

Rodentia:Muridae Mus musculus x

Rattus rattus x x x Rodentia:Sciuridae Guerlinguetus brasiliensis x

Ordem Didelphimorphia Didelphis albiventris x

Gracilinanus agilis x

Marmosa murina x x

Marmosa demerarae x x

Monodelphis americana x x

Monodelphis domestica x x x

Discussão

Os dados indicam que a região do Planalto da Borborema é uma região com riqueza

de 28 espécies (uma destas identificada apenas a nível de gênero), sendo que um quinto das

espécies tem representatividade igual aos outros quatro-quintos. A dominância no número de

Page 47: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

36

registros coincidir com espécies de importância para a peste representa qual era o papel

percebido de cada espécie de pequeno mamífero em relação ao ciclo de transmissão, como

é perceptível nas capturas durante ações de vigilância (e.g.: Almeida et al. (1987); Almeida et

al. (1989)).

Tabela 7. Beta-diversidade interna das três partições geográficas realizadas para o Planalto da Borborema,

decomposta em turnover e aninhamento.

Borborema Norte Borborema Sul Borborema Total

Turnover 0.832 0.761 0.879

Aninhamento 0.108 0.162 0.082

β(Jaccard) 0.941 0.923 0.961

Os valores de beta-diversidade intragrupo para a Borborema Norte, Borborema Sul, e

para o Planalto da Borborema como um todo, refletem o que é observado ao se analisar a

distribuição das espécies por localidade, e a de ocorrências por espécie: uma

metacomunidade fortemente dissimilar dentre suas sub-unidades, com um turnover alto

causado pelas discrepâncias na riqueza e composição dos pontos amostrais como foi medido

pelo índice de Jaccard, e um aninhamento baixo regido pelas poucas espécies que dominam.

Os valores tão altos de beta-diversidade (um valor restrito ao intervalo [0,1]) são reflexo da

grande quantidade de localidades com riqueza (alfa-diversidade) muito baixa e discrepante

do conjunto total de espécies registradas (gama-diversidade), como é expresso no grande

desvio padrão das médias dos valores para as três partições; fatores que indicam que as

amostragens sistemáticas foram concentradas em alguns poucos pontos, principalmente nos

de interesse para vigilância de Peste.

A beta-diversidade entre a Borborema Norte e a Borborema Sul atinge um valor baixo

(0.31) quando comparado com a beta-diversidade intragrupos, entretanto a dominância do

turnover no valor de beta se manteve. 10 das 29 espécies não são compartilhadas pelos dois

grupos, 6 exclusivas da Borborema Norte (Euryoryzomys russatus, Oligoryzomys sp.,

Wiedomys pirrhorhinus, Holochilus sciureus, Oligoryzomys stramineus), 4 da Borborema Sul

(Nectomys rattus, Oxyycterus dasytrhicus, Mus musculus e Guerlinguetus brasiliensis); a

partição quase simétrica das espécies não compartilhadas pode ser a responsável pelo

domínio do turnover, em vez do aninhamento.

A comparação da Borborema Norte com a Borborema Sul é uma escala mais

macroscópica e menos detalhada que a comparação de um grupo de localidades que forma

uma das duas partições utilizadas. Efetivamente, a comparação dentro de cada partição é a

escala local mais fina proposta, enquanto a comparação entre as duas partições é uma

comparação de escala mais abrangente, onde cada partição assume o papel de uma região.

Page 48: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

37

A discrepância entre os valores da beta-diversidade da escala local para a regional podem

ser sinal da mudança dos fatores responsáveis pela alfa-diversidade; os fatores com ação

mais ampla, de escala regional, passando a ter maior peso do que os fatores que agem em

escala local, embora também haja papel proeminente da subamostragem. Uma possível

explicação para a diferença de beta-diversidade entre escalas pode ser a proposta por Leibold

et al. (2004), onde na escala local, os processos se passam em nível populacional entre as

espécies, onde as espécies interagem com resultados nos parâmetros demográficos umas

das outras; enquanto na escala regional, as espécies são tratadas como metapopulações e

as relações passam a levar em conta a dispersão entre as diversas localidades.

A primeira hipótese testada, a de que o Planalto da Borborema é um conjunto de

metacomunidades, pode ser considerada refutada. As regiões definidas neste capítulo não

são grandemente dissimilares, e sua separação geográfica é possivelmente uma lacuna

amostral, como pode se ver no mapa feito com as localidades. É importante atentar ao fato

de que duas grandes coletas formam uma das regiões definidas cada, com a participação de

outras coletas de menor tamanho. As coletas da SUCAM na regional de Garanhuns (PE), em

1981 formam a parte principal dos dados da Borborema Sul, e as coletas realizadas na

localidade de Pirauá, no município de Natuba (PB), também associadas à pesquisa em Peste,

realizadas ao longo da primeira metade da década de 1980, formam a maior série de dados

da Borborema Norte. Há poucas evidências de que a ausência das espécies exclusivas a uma

região seja por outro motivo além de incompletude amostral, dado que são espécies

relativamente comuns, encontradas tanto em outras áreas circunscritas ao território dos

estados estudados quanto em outras áreas dos biomas que compõem e fazem contato com

o Planalto da Borborema, incluindo uma espécie invasora, comensal e amplamente distribuída

(Mus musculus) (Oliveira e Langguth, 2004).

A segunda hipótese testada, a de que a fauna de pequenos mamíferos dos

remanescentes de vegetação nativa, e o das áreas peridomiciliares são diferentes entre si,

pode ser considerada confirmada. Nas matrizes de valores pareados, a localidade que

representa as áreas de remanescentes de vegetação nativa teve altos valores de beta-

diversidade (0.65 ou maior) em todos os pares, inclusive com diversos pares atingindo

unidade (completa dissimilaridade), ainda com o turnover agindo como fenômeno principal

que rege a beta-diversidade. Quando a beta-diversidade passa a ser calculada para apenas

duas partições (peridomicílio e mata), os resultados ainda indicam alta dissimilaridade (β ≥

0.5). A comparação dos dois ecótopos dentro do Planalto da Borborema como um todo revela

que a dissimilaridade entre peridomicílio e áreas silvestres passa a ter participação mais

equitativa dos processos de turnover e aninhamento, embora agora o aninhamento responda

pela maior parte da variação. Neste caso, a riqueza do peridomicílio é maior (27 espécies,

Page 49: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

38

dados do sumário do teste) que a das áreas silvestres (16 espécies), sendo apenas duas

espécies (Euryoryzomys russatus e Oligoryzomys sp.) exclusivas para as áreas silvestres,

contra 13 espécies registradas apenas em áreas de peridomicílio. Oligoryzomys sp. é

potencialmente uma das outras quatro espécies encontradas no estudo (O. nigripes, O.

mattogrossae, O. stramineus), podendo assim diminuir o número de espécies exclusivas do

peridomicílio, mas invariavelmente diminuindo o número de espécies exclusivas para o

ambiente de mata.

Diversos fatores explicam a maior riqueza registrada nas áreas de peridomicílio além

da disparidade amostral entre peridomicílio, que contou com 29 localidades amostradas, e os

remanescentes, que contaram com 3 localidades (duas na Borborema Norte, uma na

Borborema Sul). As espécies de roedores invasores comensais foram capturadas apenas em

peridomicílio, algo esperado dada a longa história de associação entre ocupação humana e

invasão de roedores comensais, assim como sua notável adaptação ao meio antrópico, e sua

alta capacidade competitiva nestes ambientes (Kosoy et al., 2015); e as amostragens

taxonômicas realizadas nos remanescentes de vegetação nativa da região estudada não

registraram roedores comensais em trechos de mata, apenas nos trechos de cultivo ou

capinzal cercanos (Sousa et al., 2004), o que pode indicar que, de fato, estas espécies não

ocupam áreas de vegetação nativa. Há também a presença notável de espécies que preferem

habitats abertos, como algumas espécies do gênero Oligoryzomys (Patton et al., 2015), que

podem ter sido atraídas pelo novo ambiente, desprovido de uma cobertura vegetal estruturada

de uma Caatinga arbórea ou Brejo de Altitude. Guerlinguetus brasiliensis teve um único

registro em uma única área sobre a qual não há informação disponível sobre a vegetação ou

o uso de terra do local, mas, embora sua presença fosse esperável em fragmentos de

vegetação primária ou secundária, incluindo florestas secas (Alvarenga e Talamoni, 2005;

Mendes e Cândido-Jr, 2014), sua presença em ambientes perturbados ou antropizados ou

em pequenos fragmentos de vegetação cravados dentro de matriz agropecuária é esperada

(Pinto et al., 2009; Ribeiro et al., 2009). Kerodon rupestris provavelmente só foi registrado em

peridomicílio por habitar quase exclusivamente afloramentos rochosos (Lessa et al., 2005),

sendo característico de ambientes abertos. A presença de Calomys expulsus apenas em

ambientes de peridomicílio é algo a ser investigado, uma vez que a espécie, apesar de

pertencer a um gênero onde a preferência por ambientes abertos é comum, é conhecida por

também ocupar áreas de vegetação fechada e mais estruturada (Nascimento et al., 2011).

De uma maneira geral, quaisquer conclusões tomadas a partir dos dados disponíveis

merecem ser revisitadas através de amostragem extensiva dos pequenos mamíferos do

Planalto da Borborema, dadas as discrepâncias e lacunas amostrais. Ainda assim, é evidente

que as assembleias de pequenos mamíferos que formam a metacomunidade do Planalto da

Page 50: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

39

Borborema têm grande variação composicional entre si, com um pequeno grupo de espécies

dominantes e um forte efeito de substituição de espécies ao longo do espaço, refletindo a

variabilidade do ambiente na formação geográfica tanto climática (Alvares et al., 2013), quanto

vegetacional, englobando florestas com características mais úmidas (Brejos de altitude, e.g.:

Pôrto et al. (2004); Rodal et al. (2005); Nascimento e Rodal (2008)), zonas semiáridas com

vegetação típica da Caatinga, tanto áreas com estrutura florestal quanto savana-estépica

(e.g.: Alves (2009); Silva et al. (2014)) e trechos de vegetação considerados como Floresta

Atlântica (e.g.: Cruz Neto et al. (2014)). Também é possível detectar uma separação na fauna

entre os ecotopos do peridomicílio e dos remanescentes florestais, embora os fatores que

levam à diferenciação de biotas entre ambos precisem ser elucidados quanto a i) o papel da

ocupação humana e a transformação do ambiente peridomiciliar/periurbano; ii) possíveis

efeitos da seleção de ocupação do espaço pelo homem, que provavelmente selecionou

ocupar áreas com maior acesso a recursos e melhores condições para desenvolvimento de

atividades agropecuárias; iii) estrutura e distribuição das manchas dos diversos habitats que

compõem o Planalto da Borborema, o que pode determinar a presença/ausência local de

determinados táxons e manter a presença de espécies em uma escala mais ampla através

de mecanismos como a dinâmica de fonte-e-poço (Pulliman, 1988).

Em relação ao foco de Peste da Chapada da Borborema, os dados reforçam a noção

de que a composição faunística de pequenos mamíferos não é capaz de dar resolução e

identificar o foco. É possível propor duas hipóteses que explicam o achado: i) o foco como

está definido engloba os focos de fato, e o restante do território do foco não tem a conjunção

de fatores ecológicos que permitem a atividade pestosa ii) o foco da Chapada da Borborema

não age como uma única entidade, cada localidade é autônoma, e o foco funcionaria como

um metafoco, de maneira análoga às metacomunidades. A primeira hipótese é apoiada pela

mesma série de argumentos que podem explicar a alta variação composicional da

metacomunidade de pequenos mamíferos da região discutidos no parágrafo anterior, além do

fato de que os surtos são, de fato, circunscritos a determinadas áreas, não necessariamente

atingindo o foco como um todo (e.g.: Almeida et al. (1989)). Os locais de estudo a longo prazo

apresentam um padrão similar, se concentrando em locais onde a atividade é detectada

(Oliveira e Franco, 2005), como pode ser visto pelo registro da Coleção de Mamíferos da

UFPB. A localidade que provê a maioria dos registros de pequenos mamíferos coletados no

Planalto da Borborema obtida no Tombo é o “foco de Peste de Pirauá”, já referido no texto, e

datas de captura variando por todo o ano, de 1981 a 1985.

O maior mérito da primeira hipótese, porém, pode ser não refutar a segunda, esta

abrangendo a primeira, dado que ambas as hipóteses são baseadas na noção de que o

ambiente é não-uniforme e organizado em manchas (Mouquet et al., 2005). O metafoco

Page 51: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

40

funcionaria pela variação das condições necessárias para a atividade pestosa: em um

determinado momento no tempo, uma determinada área que conjugava todas as condições

necessárias para a circulação de Yersinia pestis pode deixar de ser adequada para manter o

ciclo; e uma área inativa pode desenvolver condições que permitam a instalação do ciclo

transmissivo através de fonte externa de contaminação (pela dispersão de pequenos

mamíferos infectados de áreas ativas próximas, por exemplo. Uma revisão sobre os modelos

de reservatório, incluindo os possíveis modos de dispersão, pode ser encontrada em Zeppelini

et al. (2016)). As mudanças nas condições necessárias para a atividade pestosa podem ser

de parâmetros populacionais (Reijniers et al., 2012; Reijniers et al., 2014), ou condições

ambientais, como é observado nas mudanças da área de atividade de Peste nos Estados

Unidos (Holt et al., 2009); sejam estas mudanças de origem antrópica ou variação natural.

Vale também ressaltar que um arranjo metapopulacional para focos de Peste não é uma

proposição nova, como é visto no caso dos focos onde o sistema reservatório é formado

principalmente por cães das pradarias (gênero Cynomys, Shoemaker et al. (2014)), e gerbilos

(gênero Rhombomys, Reijniers et al. (2012); Reijniers et al. (2014)), sendo que os casos de

arranjo metapopulacional aqui mencionados se dão pela distribuição espacialmente discreta

das colônias dos cães das pradarias e dos gerbilos, enquanto o modelo de metafoco

funcionaria à partir da heterogeneidade e arranjo em fragmentos do ambiente. A hipótese do

metafoco pode inclusive ser encaixada nos relatos de Barreto e Castro (1946), que descreve

“núcleos” que compõem os focos do Nordeste do Brasil.

Conclusão

A fauna de pequenos mamíferos do Planalto da Borborema se comporta como uma

única metacomunidade com alta variação composicional interna controlada primariamente

pelo turnover, e dominada por cinco espécies cujas frequências de ocorrência perfazem cerca

de metade dos registros obtidos. Foi detectada diferenciação entre a fauna de pequenos

mamíferos entre as áreas classificadas como Peridomiciliares e as áreas de remanescentes

vegetacionais, indicando viés amostral no conhecimento da fauna de roedores e marsupiais

do Planalto da Borborema. Não é viável delimitar o foco da Chapada da Borborema à partir

da variação composicional da fauna de pequenos mamíferos, porém, é possível propor um

modelo baseado em metacomunidades para explicar o que se observou.

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Page 56: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

45

Prolongado silêncio interepizoótico da peste em dois municípios do Foco da Chapada

da Borborema, Paraíba, Brasil.

Peste é uma zoonose causada pela bactéria Yersinia pestis, cujo ciclo transmissivo é baseado

num sistema reservatório composto por pequenos mamíferos. Dada sua alta morbidade, é

necessário manter ações de vigilância nos focos de peste, independentemente de haver

atividade detectada. O presente capítulo é um inquérito de campo no foco de Peste da

Chapada da Borborema, um foco quiescente desde o último surto, em 1986. Pequenos

mamíferos foram coletados em livetraps nos municípios de Alagoa Grande e Areia, no estado

da Paraíba, dos quais foram obtidas amostras para realização de exames bacteriológicos,

sorológicos e PCR-Multiplex para detecção de Y. pestis. Foram capturados 45 indivíduos, dos

quais foram obtidas 27 amostras para bacteriologia e PCR, e 7 amostras para sorologia.

Todas as amostras deram resultado negativo, atestando que não há atividade detectável no

foco na área analisada. Entretanto, a não presença de atividade no foco estudado não permite

que haja relaxamento na vigilância, dado que um foco de Peste pode retornar à atividade após

longos períodos de dormência, especialmente no período de transição epidemiológica que

está ocorrendo em escala global.

Page 57: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

46

Introdução

A peste é uma zoonose causada pela Yersinia pestis, uma bactéria gram-negativa da

família Enterobacteriaceae, transmitida primariamente pela picada de pulgas que se tornam

infectadas após se alimentarem do sangue de pequenos mamíferos reservatórios do bacilo

(Perry e Fetherston, 1997). Humanos são hospedeiros incidentais e os casos de infecção

normalmente ocorrem durante o período epizoótico (Wimsatt e Biggins, 2009). A Peste

apresenta três quadros clínicos humanos principais: Peste Bubônica (a infecção clássica à

partir da picada da pulga vetora), Peste Pneumônica (a única onde é possível a transmissão

direta entre humanos à partir de aerossóis), e Peste Septicêmica (infecção aguda), todas

formas com alta letalidade em curto prazo caso o tratamento adequado não seja aplicado

desde os primeiros sintomas (Perry e Fetherston, 1997; Butler, 2014). Outros quadros menos

comuns da peste incluem a Peste Tonsilar/Faríngea, Peste Endoftálmica e a Peste

Meningítica (Laforce et al., 1971; Isaäcson et al., 1973; Bin Saeed et al., 2005).

Historicamente, a peste é responsável por três grandes eventos pandêmicos com

grandes impactos no curso da civilização humana: A Peste de Justiniano (541 AD), um fator

contribuinte para o fim do Império Romano, a Peste Negra (séculos XIV a XVIII), responsável

por eliminar em torno de 50% da população do continente europeu na época, e a Terceira

Pandemia, ou Peste Contemporânea (1894 – presente), momento no qual a infecção foi

globalizada através de grandes navegações transoceânicas, que carregaram consigo ratos

europeus (especialmente Rattus rattus) infectados e suas pulgas (em especial Xenopsylla

cheopsis) (Ben-Ari, Neerinckx, Agier, et al., 2012; Vogler et al., 2013; Dewitte, 2014; Wagner

et al., 2014).

A peste ainda é considerada uma preocupação mundial de saúde pública (Stenseth et

al., 2008; Butler, 2013), os focos atuais de peste se distribuem nas Américas, África

(especialmente na porção subsaariana), Europa Oriental e Ásia, com alguns focos retornando

de períodos de inatividade e outros alterando consideravelmente sua atividade (Gage e

Kosoy, 2005; Holt et al., 2009; Zeppelini et al., 2016). A OMS considera Peste Pneumônica

uma Emergência de Saúde Pública de Interesse Internacional ou PHEIC (Public Health

Emergency of International Concern), e de acordo com a versão atual do Regulamento

Sanitário Internacional (IHR), os casos devem ser imediatamente reportados à OMS (2005).

No Brasil, a peste chegou por via do Porto de Santos em 1899, com rápida expansão

para outras cidades portuárias (Politzer e Meyer, 1965). Posteriormente, a infecção alcança o

interior do país através de rotas de comércio terrestre, por fim se estabelecendo nas

comunidades de roedores nativos, principalmente na região Nordeste (Tavares et al., 2012).

De acordo com o Serviço de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (2008), atualmente

Page 58: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

47

existem 11 focos de peste no Nordeste Brasileiro, com outros 3 na região Sudeste do país.

Os últimos surtos ocorreram na década de 1980, nos estados do Ceará e Paraíba, e o último

caso humano registrado data de 2005 no Ceará (Aragão et al., 2007; Tavares et al., 2012).

Por ser uma doença de alta mortalidade e morbidade, é imprescindível manter

vigilância constante dos focos, especialmente pela capacidade da infecção passar

despercebida por longos períodos de tempo (fenômeno de quiescência) (Haule et al., 2013).

No Brasil, por várias décadas a vigilância de peste era baseada em inquéritos com captura de

roedores em localidades dos focos, dos quais eram obtidas amostras de tecido para testes

bacteriológicos e/ou sorológicos (embora o uso de testes sorológicos tenha passado a ser

sistemático apenas em 1983), assim como inquéritos sorológicos em humanos suspeitos de

infecção, animais domésticos, e exames de cadáveres (Almeida et al., 1981; Almeida et al.,

1987; Almeida et al., 1995). À partir de 2007, a Nota Técnica 001/2007-

CDTV/CGDT/DEVEP/SVS/MS define agora apenas a vigilância por animais domésticos como

sentinelas (Tavares et al., 2012).

Até o presente não tinham sido realizados novos inquéritos para amostrar diretamente

os pequenos mamíferos dos focos de peste visando coleta de material para análises para

determinar a circulação da bactéria. Os projetos “Estudos taxonômicos e populacionais em

espécies de pequenos mamíferos do nordeste do Brasil envolvidas no ciclo silvestre da peste”

e “Estudo da soroprevalência das doenças transmitidas por roedores na Região Nordeste do

Brasil”, unindo profissionais do Serviço de Referência Nacional em Peste (SRP), Centro de

Pesquisas Aggeu Magalhães (CPqAM/FIOCRUZ-PE), IOC (FIOCRUZ-RJ), Universidade

Federal da Paraíba, Museu Nacional e Instituto Nacional do Câncer, amostrou focos de Peste

na Chapada do Araripe (Exu, Pernambuco), Serra de Baturité (Baturité, Ceará), Planalto da

Diamantina e Piemonte da Diamantina (Bahia), Serra de Triunfo (Triunfo, Pernambuco), e

Chapada do Apodi (Pau dos Ferros, Rio Grande do Norte) (Costa et al., in press). O presente

capítulo tem como objetivo apresentar os resultados da amostragem de pequenos mamíferos

reservatórios para investigação da presença de atividade pestosa em duas municipalidades

do estado da Paraíba, dentro do foco de Peste da Chapada da Borborema.

Materiais e Métodos

1 Coleta de dados

1.1 Área de Estudo

O Planalto da Borborema constitui um elevado que se estende em orientação NE-SW,

podendo atingir até 1200m de altitude (Morais Neto et al., 2009). A formação pode ser dividida

em três setores: Encosta Oriental, Encosta Ocidental e Planalto Central, e é cercada pela

Page 59: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

48

Depressão Sertaneja (a oeste), pela Planície Litorânea (a leste) e pelo Planalto Sertanejo a

sudoeste (Projeto RADAMBRASIL, 1981). O Serviço de Vigilância em Saúde, responsável

pela vigilância epidemiológica de peste no país (2008), classifica a área do Planalto da

Borborema como uma das áreas do foco de Peste do Agreste Nordestino, denominando-o

‘foco da Chapada da Borborema’. A classificação climática de Köppen para o Planalto fica

dividida, a grosso modo, em Cwa, Cwb (tropical/subtropical úmido) e BSh (semi-árido)

(Alvares et al., 2013). Para definição espacial do Planalto da Borborema neste estudo, utilizou-

se o shapefile de relevo do Brasil disponível para consulta e descarga no site do Ministério do

Meio Ambiente (http://mapas.mma.gov.br/i3geo/datadownload.htm). Foi preterido o uso de

informação de relevo ao esquema de ecorregiões desenvolvido por Velloso et al. (2002) por

ser a maneira mais simples de delimitar a região, dado que a SVS (2008) não fornece

ferramentas para reproduzir a delimitação.

1.1.1 Coleta ativa de dados

Foram realizadas saídas de campo para amostrar a fauna de pequenos mamíferos em

duas municipalidades do estado da Paraíba inclusas no Planalto da Borborema, selecionadas

à partir dos municípios com casos investigados no surto de Peste de 1986/1987(Almeida et

al., 1989). Para selecionar as áreas, foram levantadas as cidades e localidades onde houve

pesquisa de campo pelos agentes de endemias para i) investigar possíveis casos humanos

ii) realizar vigilância à partir da coleta de pulgas e/ou roedores. Cada inquérito realizado pelos

agentes de endemias gerou uma ficha de registro de ocorrência (ficha padrão CCP-25). A

partir de 324 fichas de campo e registros de 412 pacientes humanos estudados (com acesso

cedido pelo Serviço Nacional de Referência em Peste, FIOCRUZ-PE), foram elencados os 45

municípios e 208 localidades onde os inquéritos foram feitos, à partir das quais foram

selecionados dois municípios para as coletas: Alagoa Grande e Areia. Os municípios

selecionados foram escolhidos pela possibilidade logística de desenvolvimento do trabalho.

Em cada município, foram realizadas duas campanhas somando 13 dias de armadilhagem,

divididas entre os meses de julho, agosto, setembro e outubo, para pequenos mamíferos,

dividindo a coleta igualmente em duas parcelas: uma peridomiciliar, onde as armadilhas foram

instaladas em edificações, ao redor das mesmas, em campos de cultivo, pastagens e outras

áreas que pudessem ser claramente identificáveis como locais onde atividades humanas são

continuamente exercidas; e uma silvestre, instalada em fragmentos de vegetação nativa com

o menor grau de alteração antrópica possível. Para garantir independência entre peridomicílio

e área silvestre, as parcelas distavam ao menos 500 metros uma da outra.

Duas expedições de coleta foram realizadas em cada área, dentro da janela de tempo

apresentada. A primeira contou com seis dias de trabalho de campo, onde foram utilizadas

Page 60: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

49

160 armadilhas (80 para peridomicílio, 80 para vegetação nativa), e a segunda contou com

sete dias de campo e 120 armadilhas (60 para cada parcela). As armadilhas foram dispostas

em trilhas georreferenciadas de 20 unidades, com espaços de 10 metros entre armadilhas,

iscadas com isca mista de banana, aveia/farinha de milho, paçoca de amendoim e sardinha

enlatada com óleo comestível. As trilhas de armadilhas foram verificadas diariamente para

reforço da isca e retirada e substituição das armadilhas que capturaram indivíduos.

Armadilhas com captura incidental de taxa não-mamíferos (aves, lagartos, cobras) foram

abertas in situ para liberação do animal aprisionado e rearmadas, exceto no caso da morte do

animal capturado, onde estas foram substituídas para lavagem. Usou-se um conjunto de

armadilhas tipo Sherman (dimensões 7.64 x 9.53 x 30.48 cm), Tomahawk (dimensões 40.64

x 12.70 x 12.70 cm) e armadilhas similares às utilizadas nas campanhas dos agentes de

endemias da Peste. Atividades sob licença SISBIO #8164-1, e aprovação do Conselho de

Ética e Uso Animal da UFPB nº 121/2016.

Na cidade de Alagoa Grande, as coletas foram realizadas na Fazenda Riachão do

Progresso (FRP) (07º06’01’’ S; 35º35’57’’ W), uma propriedade rural com principal fim

comercial a criação de gado bovino e caprino, além da presença de roçados de milho em

alguns pontos. As armadilhas de peridomicílio foram armadas junto à sede da fazenda, por

trás de prédios de armazenamento de veículos, equipamentos e insumos; em área de

pastagem e em uma área de roçado de milho. As armadilhas dos fragmentos de vegetação

foram armadas em fragmentos de caatinga arbustivo-arbórea (floresta seca com dossel a no

máximo 3 metros do solo, serapilheira praticamente ausente e abundância de fragmentos

rochosos no solo), seguindo vestígios de trilhas anteriores ou abrindo novas picadas. Os

fragmentos amostrados encobriam morros baixos; um dos fragmentos circundando o açude

comunitário da região, onde a água serve para usos múltiplos (pesca, abastecimento da

população e gado, recreação e irrigação).

Na cidade de Areia, as coletas foram realizadas no Engenho Bujari, um engenho de

cana de açúcar especializado na produção de rapadura. A reserva legal do engenho,

composta por um fragmento de mata de Brejo de Altitude (enclaves de floresta estacional

semidecidual montana estabelecidas na face a barlavento dos planaltos nordestinos, dentro

do domínio Caatinga; situados entre 100 e 600m de altitude nos planaltos (Rodal et al., 2005).

A ocorrência de chuvas de relevo são a causa da alta pluviosidade (>1200 mm/ano) que

propicia as características florestais similares à Floresta Atlântica litorânea, localizados na

face leste do Planalto da Borborema (Pôrto et al., 2004)), se encontra na parte mais alta, à

altura da estrada; enquanto a sede do engenho e o canavial se encontram em uma área mais

baixa, acessível por estrada de terra. O fragmento de mata apresenta sinais de uso humano

no passado, com a presença de caminhos largos por onde trafegavam veículos motorizados,

Page 61: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

50

assim como vestígios do uso humano às margens da estrada de terra que leva ao engenho,

onde é possível encontrar depósitos de lixo. De acordo com o dono do Engenho Bujari, o

acesso de veículos nos caminhos que adentram o fragmento foi proibido há alguns anos, e é

possível observar o crescimento de vegetação nos mesmos que não seria possível caso ainda

houvesse tráfego no local. Com exceção das armadilhas alocadas na sede do engenho,

instaladas dentro das estruturas onde a cana é armazenada e processada, o caldo é

trabalhado e o produto final é estocado e embalado, todas as trilhas seguiram o padrão

descrito.

1.1.2 Coleta de amostras

Os indivíduos capturados foram trazidos para o laboratório de campo, onde foi feita

contenção química seguindo o protocolo anestésico de Cloridrato de Cetamina 10% e

Acepromazina 0.2% (proporção 9:1) para roedores, e Cloridrato de Cetamina 10% e Xilazina

Cloridrato 2% (proporção 1:1) para marsupiais, aplicando dose de 0.1 ml para cada 50g de

peso do indivíduo, ou até efetivamente deixar o indivíduo anestesiado. Após constatar

sedação checando o reflexo orbital, foi realizada punção cardíaca utilizando agulha de 20 x

0.55 e seringa de 3ml, transferindo o sangue obtido para tubos de microcentrífuga

(eppendorf), centrifugados a 5000 RPM por cinco minutos, e o soro reacondicionado em novo

tubo posteriormente selado com Parafilm® e conservado em congelador. Caso o indivíduo não

tenha atingido óbito, aplicou-se eutanásia por deslocamento cervical. Após constatado

falecimento do indivíduo, um acesso para a cavidade peritoneal através de incisão abdominal

foi aberto pelo qual o baço foi extraído e reacondicionado em meio de transporte Cary-Blair

(Zhejiang Gongdong Medical Technology CO. LTD, Taizho, 318020, China).

Todos os indivíduos dos quais foram coletadas amostras foram taxidermizados em

pele cheia, para posterior depósito na Coleção de Mamíferos da Universidade Federal da

Paraíba. Os procedimentos foram feitos sob autorização do Comitê de Ética e Uso Animal da

Universidade Federal da Paraíba, sob protocolo n° 121/2016.

2 Processamento de Amostras

As amostras de soro e tecidos obtidas dos animais coletados foram analisadas por

técnicas sorológicas para pesquisa de anticorpos anti-pestosos, bacteriológicas para

identificação e isolamento da Y. pestis e moleculares para determinação da bactéria através

da detecção de genes prototípicos da Y. pestis. As análises foram realizadas no SRP Serviço

Nacional de Referência em Peste (SRP) do Centro de Pesquisa Aggeu Magalhães

(FIOCRUZ-PE) em Recife, PE

2.1 Análises Sorológicas

Page 62: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

51

As amostras sorológicas foram analisadas pela técnica de hemaglutinação (HA)

controlada pela inibição da hemaglutinação (HI) para pesquisa de anticorpos específicos

contra a proteína capsular F1 (fração 1) da Y. pestis (Chu, 2000). Os soros foram

descongelados e inativados por aquecimento em banho-maria (56ºC, 30 min). Em seguida,

foram adsorvidos pela adição de hemácias de carneiro (GV) na proporção 1:100, misturado

por inversão, e mantidos em temperatura ambiente por 30 minutos. Os tubos foram

centrifugados para separação do soro. Os soros, inativados e adsorvidos, passaram por

diluição seriada em salina contendo 1:250 de soro normal de coelho (SNC) em placas de

microtitulação de poliestireno rígido de 96 poços em “U” (COSTAR 3590, New York, USA). A

prova de inibição da hemaglutinação (HI) foi realizada em paralelo para verificar a

especificidade da reação. Na HI os soros foram diluídos em salina contendo SNC (1:250) e

100 μg/ml de F1. Para finalizar adicionou-se a suspensão do antígeno F1 imobilizado em

hemácias de carneiro previamente fixadas em glutaraldeído e taninizadas (GVF1). As placas

foram mantidas em geladeira overnight e a leitura dos resultados foi realizada após 12 a 18

horas. Os soros com título de HA igual ou menor que 1:16 foram considerados negativos.

2.2 Análises Bacteriológicas

As amostras de baço acondicionadas em meio de conservação e transporte de Cary-

Blair foram trituradas e plaqueadas diretamente em meio base para ágar sangue (Blood agar

base (BAB) HiMedia Laboratories Pvt Ltd 23, Vadhani Industrial Estate, LBS Marg, Ghatkopar

West, Mumbai, Maharashtra 400086, India) para identificação e isolamento de Y. pestis. As

placas foram incubadas a 28°C durante 48 a 72 horas e inspecionadas diariamente para

observação do crescimento de colónias características, as quais foram posteriormente

testadas para lise pelo bacteriófago anti-pestoso (Karimi, 1978).

2.3 Análise Molecular

Alíquotas dos triturados das amostras de baço acondicionadas em meio de

conservação e transporte de Cary-Blair foram submetidas a uma purificação parcial para

eliminação de possíveis impedientes na reação, suspensas em TE (Tris-EDTA) e analisadas

por multiplex-PCR (M-PCR) para amplificação dos genes plasmidiais (pla, lcrV, caf1) e o gene

cromossômico irp2, principais marcadores de virulência da Y. pestis (Leal e Almeida, 1999).

As amplificações foram realizadas em termociclador (Applied Biosystems – PCR

System 9700) programado para 35 ciclos compostos por 1 min. à 94ºC; 1 min. a 55ºC, 1 min.

à 72ºC e uma etapa final de 7 min. à 72ºC. Os produtos das reações foram analisados por

eletroforese em gel de agarose a 1% em tampão TBE (Tris-ácido bórico-EDTA) e os géis

foram corados com SYBR® Safe DNA Gel Stain (Invitrogen) digitalizados em Transluminator

Page 63: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

52

LPIX (Loccus Biotecnologia) para análise. Como controle positivo foi usado DNA purificado

da cepa Y. pestis (CYP 0803 (isolada de um paciente do Sitio Carnaúba, Município de S.

Benedito, CE, 1978 e depositada na coleção Fiocruz CYP) e como controle negativo um tubo

contendo todos os componentes da reação sem DNA. Como marcador de peso molecular foi

usado o marcador 100 bp DNA ladder (Invitrogen).

Resultados

As expedições de amostragem de pequenos mamíferos nos municípios de Alagoa

Grande e Areia somaram um total de 3640 armadilhas/noite, capturando 45 espécimes (27

marsupiais e 18 roedores) num total de 10 espécies. (Tabela 1, capítulo 2). Dos 45 espécimes

capturados, 10 exemplares de Didelphis albiventris foram soltos in situ por serem juvenis, sem

a retirada de amostras. Houve também o escape de um Gracilinanus agilis, um Galea spixii e

dois Rattus rattus durante o transporte para o laboratório. Das espécies amostradas, G. agilis,

M. demerarae não tinham registro de avaliação para presença de Y. pestis.

Figura 4. Produtos da reação de multiplex-PCR (MPCR). L: DNA Ladder 100bp (pares de base); 1-27 amostras

negativas; CP – controle positivo com amplificação dos genes de virulência; CN: controle negativo

Page 64: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

53

27 amostras, 12 de marsupiais e 15 de roedores (CGZ: 15, 17-20, 22-27, 33-39, 45,

47-52, 54, 55), analisadas por cultura tiveram resultado negativo. As 7 amostras analisadas

para detecção dos anticorpos anti-F1 (CGZ: 47, 48, 50, 51, 52, 54, 55) deram resultado

negativo pelas provas de HA/HI.

Os resultados de amplificação por M-PCR das 27 amostras testadas foram negativos. O

controle negativo também não apresentou amplificação, e todos os genes do controle positivo

foram amplificados (Figura 3).

Discussão

A circulação de Y. pestis apresenta ciclos enzoóticos longos onde sua atividade é

discreta (Ben-Ari, Neerinckx, Gage, et al., 2012) podendo inclusive não ser detectada por

longos períodos de tempo, criando a falsa percepção de que o ciclo foi extinto. Entretanto,

sabe-se que após tais períodos de silêncio epidemiológico, há a possibilidade de reemergir

(Stenseth et al., 2008), como recentemente reportado em focos na África (Malek et al., 2014),

a região que concentra cerca de 90% dos casos atuais no mundo (Raoult et al., 2013) e onde

vários países que não apresentam atividade pestosa recente são fortes candidatos à

reemergência (Lotfy, 2015).

Os resultados negativos para a detecção de atividade pestosa na área não fogem ao

esperado, dado que o último surto registrado ocorreu há cerca de 40 anos (Almeida et al.,

1989), e o último caso humano foi notificado há mais de dez anos (Tavares et al., 2012).

Mesmo que resultados positivos fossem previstos, seria esperada uma baixa prevalência. No

Brasil, fora de períodos de surto, a fração de indivíduos positivos assume valores baixos:

Aragão et al. (2002) reporta 0.1% dos roedores testados como positivos, valores similares aos

de Almeida et al. (1995), com 0.29% de positivos para roedores e marsupiais. Almeida et al.

(1987) reporta valores de prevalência oscilando de 0.26% a 4.54% entre os diversos focos de

Peste no território brasileiro, à partir de uma série de dados de cerca de 20 anos. Durante o

último evento epizoótico documentado no País, os valores de prevalência em roedores foram

de 4% para inquéritos sorológicos, e 3.2% para bacteriológicos. Uma possível explicação para

as prevalências dos focos brasileiros pode ser o viés amostral da vigilância em peste no Brasil,

que investiga apenas os roedores sinantrópicos (nativos ou introduzidos), deixando de

amostrar os fragmentos de ambiente nativo inseridos no foco e, assim, negligenciando uma

parte da riqueza dos pequenos mamíferos da região, que podem participar do sistema

reservatório (Zeppelini et al., 2016).

A ausência de resultados positivos em todos os testes realizados para detectar a

presença de Y. pestis nos animais capturados é um indicativo de um período de quiescência,

Page 65: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

54

onde a bactéria pode estar circulando no ambiente, mas sua prevalência é tão baixa que a

detecção não ocorre em inquéritos epidemiológicos (Haule et al., 2013) como o realizado

neste capítulo. Recentemente, Saavedra e Dias (2011) reportaram situação similar como

resultado de um inquérito sorológico e bacteriológico em humanos, roedores e carnívoros

domésticos. Historicamente, durante inquéritos em focos onde não se registrava casos

humanos, as amostras obtidas dos roedores testavam negativo (Almeida et al., 1988).

Atualmente, os estudos em ecologia de zoonoses tem começado a estudar os efeitos

da riqueza, flutuações populacionais e dos padrões de diversidade, incluindo os efeitos de

perturbações nos ciclos e transmissão das zoonoses (e.g.: Davis et al. (2008); Keesing et al.

(2010); Reijniers et al. (2012); Roche et al. (2013); Young et al. (2014); Moore et al. (2015)),

e os efeitos dos ciclos climáticos, assim como as mudanças climáticas, nos mesmos sistemas

(e.g.: Mills et al. (2010); Rohr et al. (2011); Ben-Ari, Neerinckx, Gage, et al. (2012); Altizer et

al. (2013); Estrada-Peña et al. (2014)). Uma conclusão geral do que é reportado nestes

estudos pode ser descrita como o início de um período de transição epidemiológica, onde as

alterações de clima, biodiversidade e a globalização dão margem a surgimento e

reemergência de patógenos (Pongsiri et al., 2009).

A Peste, mesmo tendo diminuído significativamente o número de casos no último

século, ainda é presente, e locais como a África subsaariana estão novamente detectando

atividade em focos quiescentes há décadas (Malek et al., 2014; Lotfy, 2015).O reaparecimento

de casos de Peste humana em focos que eram considerados dormentes há mais de três

décadas levou a OMS a classificar a doença como reemergente (Richgels et al., 2016); os

focos no Brasil também sendo fortes candidatos à reemergência (Zeppelini et al., 2016). Tal

constatação reforça a necessidade de se manter uma vigilância epidemiológica constante nos

focos do País, preferencialmente realizando captura de pequenos mamíferos tanto em áreas

sinantrópicas quanto em remanescentes de vegetação nativa; caso inviável, é necessário ao

menos se manter a vigilância sorológica usando carnívoros silvestres e/ou domésticos como

sentinelas (Bevins et al., 2012), especialmente pela possibilidade destes também serem parte

do sistema reservatório (Salkeld e Stapp, 2006). O uso de carnívoros como sentinelas,

entretanto, tem de ser bem avaliado, pois pode não ser adequado a todos os sistemas

(Brinkerhoff et al., 2009).

Conclusão

O inquérito de campo realizado não detectou nenhum indivíduo infectado por Y. pestis

nos municípios de Alagoa Grande e Areia. Entretanto, a não detecção é apenas sinal de um

Page 66: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

55

período quiescente. É necessário que se mantenha vigilância epidemiológica constante na

região, assim como no foco como um todo, dado o status oficial da Peste como doença

reemergente, e o risco do foco da Chapada da Borborema voltar à atividade no futuro.

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Page 71: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

60

Conclusões Gerais

O presente trabalho detectou real diferenciação entre as faunas de pequenos mamíferos entre

áreas peridomiciliares e remanescentes vegetacionais dentro do foco da Chapada da

Borborema, indicando um claro viés amostral no conhecimento do sistema reservatório

quando apenas a taxocenose que está em contato mais íntimo com a ocupação humana é

investigada. Apenas a composição faunística de pequenos mamíferos não é suficiente para

delimitar focos. Foi proposto o modelo de metafoco, para criar um cenário em teoria que pode

explicar o comportamento não-uniforme do foco de Peste da Chapada da Borborema. A

ausência de positivos para Yersinia pestis nos inquéritos de campo indica um período de

quiescência, mas não descarta a necessidade do mantenimento de vigilância na região.

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ANEXO I – Lista dos Números de Campo dos indivíduos coletados no decorrer do

projeto.

Anexo I – Lista dos números de campo

N. campo Gênero Espécie Data coleta Município Localidade

CGZ 15 Monodelphis domestica 30/07/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 16 Rattus rattus 30/07/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 17 Monodelphis domestica 31/07/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 18 Monodelphis domestica 29/07/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 19 Monodelphis domestica 29/07/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 20 Rattus rattus 31/07/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 21 Galea spixii 31/07/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 22 Rattus rattus 01/08/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 23 Galea spixii 03/08/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 24 Thrichomys laurentius 03/08/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 25 Thrichomys laurentius 03/08/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 26 Monodelphis domestica 03/08/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 27 Monodelphis domestica 03/08/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 29 Didelphis albiventris 13/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 30 Didelphis albiventris 14/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 31 Didelphis albiventris 15/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 32 Didelphis albiventris 15/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 33 Rattus rattus 13/08/2016 Areia Sede do Engenho Bujari

CGZ 34 Rattus rattus 13/08/2016 Areia Sede do Engenho Bujari

CGZ 35 Didelphis albiventris 15/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 36 Didelphis albiventris 15/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 37 Oligoryzomys sp 15/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 38 Oligoryzomys sp 15/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 39 Oligoryzomys sp 15/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 40 Didelphis albiventris 17/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 41 Didelphis albiventris 17/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 42 Didelphis albiventris 17/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 43 Didelphis albiventris 16/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 44 Didelphis albiventris 16/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 45 Marmosa demerarae 17/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 46 Didelphis albiventris 17/08/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 47 Rhipidomys sp 23/09/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 48 Necromys lasiurus 22/09/2016 Areia Sede do Engenho Bujari

CGZ 49 Rattus rattus 22/09/2016 Areia Sede do Engenho Bujari

CGZ 50 Marmosa demerarae 23/09/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 51 Rattus rattus 24/09/2016 Areia Sede do Engenho Bujari

CGZ 52 Marmosa demerarae 25/09/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 53 Rattus rattus 25/09/2016 Areia Sede do Engenho Bujari

CGZ 54 Marmosa demerarae 25/09/2016 Areia Mata do Engenho Bujari

CGZ 55 Rattus rattus 25/09/2016 Areia Sede do Engenho Bujari

CGZ 56 Gracilinanus agilis 02/10/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 57 Gracilinanus agilis 02/10/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 58 Monodelphis domestica 03/10/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 59 Gracilinanus agilis 03/10/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

CGZ 60 Gracilinanus agilis 06/10/2016 Alagoa Grande Fazenda Riachão do Progresso

Page 73: COMUNIDADES DE PEQUENOS MAMÍFEROS EM ÁREAS

62

ANEXO II – Lista de base de identificação dos espécimes na Coleção de Mamíferos da

UFPB.

Anexo II. Lista de base da identificação dos espécimes da Coleção de Mamíferos da UFPB

Referências Consultadas

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PATTON, J. A.; PARDIÑAS, U. F. J.; D'ÉLIA, G. Mammals of South America Volume 2, Rodents. Chicago: The University of Chicago Press, 2015. 1336.

WEKSLER, M.; PERCEQUILLO, A. R.; VOSS, R. S. Ten New Genera of Oryzomyine Rodents (Cricetidae: Sigmodontinae). American Museum Novitates, n. 3537, p. 1-29, 2006.

Espécies Referência

Rodentia:Cricetidae Akodon cursor Bonvicino et al. (2008); Patton et al. (2015)

Calomys expulsus Bonvicino et al. (2008); Patton et al. (2015)

Cerradomys langguthi Weksler et al. (2006); Bonvicino et al. (2008)

Euryoryzomys russatus Weksler et al. (2006); Bonvicino et al. (2008)

Holochilus sciureus Bonvicino et al. (2008); Patton et al. (2015)

Necromys lasiurus Bonvicino et al. (2008)

Oligoryzomys agrestis* N/A

Oligoryzomys mattogrossae Bonvicino et al. (2008); Patton et al. (2015)

Oligoryzomys nigripes Bonvicino et al. (2008); Patton et al. (2015)

Pseudoryzomys simplex Bonvicino et al. (2008); Patton et al. (2015)

Rhipidomys mastacalis Bonvicino et al. (2008); Patton et al. (2015)

Wiedomys pyrrhorhinus Bonvicino et al. (2008); Patton et al. (2015)

Rodentia:Caviidae

Galea spixii Bonvicino et al. (2008)

Rodentia:Echimyidae

Thricomys laurentius Bonvicino et al. (2008); Patton et al. (2015)

Rodentia:Muridae

Rattus rattus Patton et al. (2015)

Ordem Didelphimorphia

Marmosa murina Patton et al. (2015)

Marmosa demerarae Patton et al. (2015)

Monodelphis americana Patton et al. (2015)

Monodelphis domestica Patton et al. (2015)