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COMUNICAÇÃO
I-D-E-N-T-I-D-A-D-E-S e Outros Olhares – Inclusão social de jovens infratores
através das artes plásticas
PORFIRO, André Luiz1
Palavras-Chave: Ensino de arte, Inclusão social e Ressignificação
RESUMO: A comunicação pretende analisar como o ensino de arte está ressignificando a vida deadolescentes infratores. Desde 2000, o CRIAM Nova Iguaçu desenvolve ações pedagógicas em arte,como um dos requisitos para o cumprimento da medida sócio-educativa. A primeira ação,denominada I-D-E-N-T-I-D-A-D-E-S, reúne a cada mês os jovens infratores para a pintura de umpainel coletivo em grande formato (painéis em lona crua), sob orientação de artistas plásticos. Asegunda ação, denominada OUTROS OLHARES, tem a arte brasileira como referência e ametodologia triangular como guia, na relação ensino/aprendizado em arte. Obras de Tarsila doAmaral, Chico Liberato e Carlos Vergara já foram objeto de releituras e ressignificações. Buscando,ainda, a inclusão dos adolescentes infratores, de maneira significativa na sociedade, sãoorganizadas, periodicamente, exposições com os trabalhos realizados.
INTRODUÇÃO
O Centro de Recursos Integrados de Atendimento ao Menor de Nova Iguaçu,
ligado a Secretaria de Estado da Casa Civil é a unidade do DEGASE (Departamento
Geral de Ações Sócio-Educativas) responsável pela aplicação das medidas de
semiliberdade e liberdade assistida para os municípios de Nova Iguaçu, Belford
Roxo, Itaguaí, Paracambi, Seropédica, Queimados e Japeri. De acordo com o
Estatuto da Criança e do Adolescente, a medida sócio-educativa de semiliberdade
está na transição entre o regime fechado e o meio aberto (cap. IV; Art. 120).
Segundo Kropff (2003), “constitui um desafio para a instituição dar significação a
esse processo e as propostas que fazem aos adolescentes são fundamentais nesse
sentido”.
É para os adolescentes cumprindo a medida sócio-educativa de
semiliberdade que o foco das ações em arte desenvolvido no CRIAM de Nova
Iguaçu está direcionado.
1 CRIAM (Centro de Referência e Atendimento ao Menor) Nova Iguaçu
AS AÇÕES EM ARTE NO CRIAM
O trabalho em arte desenvolvido no CRIAM teve seu início no ano de 2000.
Inicialmente buscou-se uma ligação entre as linguagens cênica e plástica, passando
num período seguinte para a livre expressão no campo das artes visuais.
A partir de 2002, a arte como objeto de conhecimento, utilizando a
metodologia triangular como guia, passou a ser o pressuposto conceitual da relação
ensino/aprendizado em arte.
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais em arte (1997:32), “a
manifestação artística tem em comum com o conhecimento científico, técnico ou
filosófico seu caráter de criação e inovação”.
Utilizando a releitura de obras de arte, a partir das imagens impressas em
volumes de uma enciclopédia, o trabalho relacionava obras de artistas brasileiros
com a de artistas estrangeiros. É dessa época a seqüência de releituras do Nu de
Modigliani, recontextualizado com o fundo de Retirantes de Portinari.
A mudança administrativa ocorrida em fins de 2002, com a troca da direção
geral da unidade e, por conseguinte, a mudança da diretriz do atendimento,
possibilitou a busca de parcerias com atores sociais de fora do sistema sócio-
educativo.
O ano de 2003 foi planejado com bases diferentes dos anos anteriores. Foi
calcado num esboço de um projeto político-pedagógico, tendo como ênfase o
trabalho de arte desenvolvido junto aos adolescentes e a abertura do CRIAM de
Nova Iguaçu a parcerias diversas na comunidade e com entidades da sociedade
civil.
Nesse ano foi definido o conceito das ações em arte em andamento
atualmente na unidade, os projetos I-D-E-N-T-I-D-A-D-E-S e OUTROS OLHARES.
O PROJETO I-D-E-N-T-I-D-A-D-E-S
O projeto I-D-E-N-T-I-D-A-D-E-S desenvolve pintura coletiva orientada em
grande formato, tendo como foco um grupo social marcado pelo estigma da
exclusão: os adolescentes em conflito com a lei cumprindo medida sócio-educativa
de semiliberdade no CRIAM (Centro Integrado de Atendimento ao Menor) de Nova
Iguaçu.
Os painéis começaram a ser realizados a partir de setembro de 2003. Os
adolescentes são convidados a participar de uma sessão de pintura coletiva em
suporte de lona (tela), com aproximadamente 160 X 200 cm., utilizando tinta acrílica
profissional. A partir do uso das cores primárias, são instados a traçar formas
elementares e não figurativas.
A cada encontro, para a confecção dos painéis com os adolescentes, um
observador externo é convidado. Antropólogos, pesquisadores em educação,
artistas e pessoas ligadas ao judiciário olham a desenvoltura dos adolescentes na
manipulação de pincéis e tintas. Alguns adolescentes analfabetos ou semi-
analfabetos, na linguagem escrita, preenchem os espaços em branco da tela com os
seus gestos e suas imagens. Instituem um espaço de experimentação de liberdade,
de autonomia e de protagonismo social.
De acordo com Kropff :
“A arte, definida a partir da prática da oficina e de outrasexperiências que pude observar com adolescentes é,fundamentalmente, a objetivação do olhar com a dupla possibilidadede ver o próprio olhar. O garoto olhando o painel e o nome dele namargem, sorri”. (KROPFF, 2003)
O resultado surpreende aos que fazem e aos que observam. Os adolescentes
e os observadores redimensionam e redefinem seus conceitos de expressão
individual e expressão coletiva, interação, limites, liberdade, autonomia, respeito,
inclusão social e principalmente de arte.
Exposições realizadas:
2005
• Paralelos de Liberdade - Exposição e Oficina de Pintura Coletiva –
Apresentada no V Encontro Internacional de Performance, em Belo Horizonte.
Evento organizado pelo Instituto Hemisférico de Performance e Política e pela
UFMG. Em seu texto de apresentação estabelecia como objetivo “uma
reflexão sobre as expressões pictóricas de grupos sociais distintos”.
Estabelecendo entre eles um paralelo “pretendemos colocar de um lado, os
painéis desenvolvidos por adolescentes cumprindo medida sócio-educativa de
semi-liberdade no Rio de Janeiro. E, de outro, criadores e ativistas das
Américas no seu trajeto de liberdade e busca de cooperação. As fricções e
fronteiras entre os conceitos de liberdade, arte e processo de criação são o
foco da reflexão”.
Conservatório da UFMG – de 12 a 14 de março.
• Um Outro Olhar – A Pintura de Jovens em Conflito com a Lei – Exposição
apresentada em seminários que tinham como linha de discussão a questão
do jovem em conflito com a lei.
Espaço Cultural Sylvio Monteiro – Nova Iguaçu – abril e maio
Museu da República – Rio de Janeiro - julho e agosto
UERJ – Baixada (Campus Duque de Caxias) – novembro
2006
• Fórum Mundial de Educação – Nova Iguaçu - Performance e Pintura de
Painéis Coletivos com adolescentes que já tinham cumprido a medida sócio-
educativa e foram convidados a retornarem ao CRIAM para essa atividade.
Houve integração entre os jovens saídos do CRIAM e jovens da comunidade.
Seminário Diocesano Paulo VI – Nova Iguaçu - 25/03/2006
O PROJETO - OUTROS OLHARES
O projeto OUTROS OLHARES - tem a arte brasileira contemporânea como
referência para o aprendizado em artes visuais.
Está dividido em duas partes distintas, porém complementares. A primeira
parte é desenvolvida durante as aulas semanais e regulares que acontecem nas
dependências do CRIAM de Nova Iguaçu. Cada adolescente, independente da sua
escolaridade, participa uma vez por semana, da aula de arte. A aula tem em média
90 minutos caracterizando-se como um processo de aprendizagem em artes visuais.
Através de calendários, catálogos de exposições, cartazes, cartões e outros
objetos visuais um grupo de obras de um artista brasileiro contemporâneo é
colocado à disposição dos adolescentes. A partir da análise dos elementos que
constituem uma obra em arte visual, os adolescentes são instados a praticarem com
pincéis e tintas, seu olhar sobre uma obra desse artista. Concluída a primeira etapa,
parte-se para a justaposição de elementos de uma outra obra, do artista focado,
para complementar o trabalho. Durante essas ações pictóricas os adolescentes
experimentam processos de transformação, ordenação e construção de significados,
elementos característicos do ato criativo.
Na dependência do tempo que o adolescente permanece na instituição outras
formas de construções pictóricas são experimentadas buscando o aprofundamento
de um olhar estético e na autonomia criativa. Segundo Paulo Freire:
“A autonomia, enquanto amadurecimento do ser para si, é processo,é vir a ser. Não ocorre com data marcada. É neste sentido que umapedagogia de autonomia tem de estar centrada em experiênciasestimuladoras da decisão e da responsabilidade, vale dizer, emexperiências respeitosas de liberdade”. (FREIRE, P. 2002, P. 201)
A segunda parte do projeto OUTROS OLHARES compõe-se da exposição
dos trabalhos realizados pelos adolescentes nas aulas de arte. A mostra ocorre
concomitantemente à entrega de certificados de conclusão dos cursos oferecidos
pelo CRIAM de Nova Iguaçu.
Desde 2003 sete exposições, com trabalhos em pintura sobre papel nos
formatos A4 e A3 com tinta acrílica e guache, foram realizadas.
Exposições realizadas:
Tarsiliando – Foi inaugurada no refeitório da instituição em maio do ano de 2003. A
proposta da exposição foi fazer uma “releitura imagética do universo da artista
Tarsila do Amaral” pelos adolescentes.
Imagens Populares – Esta exposição apontava para uma realidade próxima aos
adolescentes: as festas e as brincadeiras populares. Os adolescentes desdobraram
seus olhares e somaram as obras, suas vivências como moradores da Baixada
Fluminense. Trabalhos a partir das obras do artista plástico Rayle Braga.
O Ciclo Chico Liberato - o ciclo Chico Liberato foi composto por duas exposições:
Bichos Soltos (2003/2004) e Outros Bichos (2004/2005).
O ciclo foi inaugurado em dezembro de 2003, com a exposição “Bichos Soltos”, que
permaneceu no refeitório do CRIAM até maio de 2004.
A exposição “Outros Bichos” realizada no ano de 2005, apresentava a influência das
diversas culturas na formação do povo brasileiro. Chico Liberato teve suas obras
apresentadas a partir de um catálogo de exposição enviado especialmente pelo
próprio para o desenvolvimento do trabalho no CRIAM.
O Ciclo Carlos Vergara - A escolha da obra de Carlos Vergara como objeto de
trabalho nos anos de 2006 e 2007, está propiciando aos adolescentes, na sua
passagem pelo CRIAM, o contato com um dos artistas mais vigorosos do país.
Impregnados da visualidade do artista experimentam na atividade pictórica,
camadas e mais camadas de tintas, com manchas e formas que se entrelaçam. Num
trajeto quase alquímico, misturam vários pigmentos tentando uma aproximação com
as cores do artista. O resultado em sala de aula é a abertura de vários caminhos do
olhar. Exposições – (2006) Ver através da Pintura de Vergara e Leituras de Si,
(2007) Texturas Referenciais. Todas realizadas no Espaço de Arte Orlando Rafael
(refeitório do CRIAM).
A arte hoje no CRIAM de Nova Iguaçu é um referencial, tanto para os
adolescentes, quanto para os funcionários e para todas as pessoas que se
relacionam com a unidade. Durante esse processo foi construído um olhar estético
mais apurado e como conseqüência um olhar sensível sobre a vida. Um outro olhar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
BRASIL. Secretaria de educação Fundamental. Parâmetros Curriculares
Nacionais: arte. Brasília: MEC/SEF, 1997.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática
educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
KROPFF, Laura. Crear es ser libre: um comentário sobre el panel del CRIAM.
Buenos Aires, 2003.
PORFIRO, André Luiz. Bichos Soltos. Nova Iguaçu: CRIAM, 2003. Texto de
apresentação de exposição.
_____. Outros Bichos. Nova Iguaçu: CRIAM, 2004. Texto de apresentação de
exposição.
_____. Outros Olhares. Nova Iguaçu: CRIAM, 2005. Texto de apresentação de
exposição.
_____. Tarsiliando: releitura imagética do universo da artista Tarsila do Amaral
por adolescentes. Nova Iguaçu: CRIAM, 2003. Texto de apresentação de
exposição.