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Compreendendo Conceitos de Área e Perímetro: um estudo de caso Gabriel Almeida Quevedo 1 GD2 Educação Matemática nos Anos Finais do Ensino Fundamental O objetivo deste artigo é apresentar a pesquisa de mestrado em desenvolvimento junto ao Programa de Pós- Graduação em Ensino de Matemática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Esse trabalho tem por objetivo identificar possíveis dificuldades apresentadas pelos estudantes na compreensão dos conceitos de medida, perímetro e área, analisando para isso algumas resoluções de problemas realizadas por estes discentes. Com esta identificação foi feita uma discussão sobre o porquê de esses alunos estarem cometendo tais erros, a partir da análise de cada caso. Com algumas respostas encontradas, embasado em autores que discutiram esses conceitos, elaboramos atividades que visam melhorar a compreensão dessas ideias pelos estudantes. Esse trabalho foi abordado em uma turma de nono ano do ensino fundamental em escola pública da rede estadual, situada no município de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Outro foco dessa pesquisa foi propor atividades que exigissem dos alunos manipular objetos de medidas, auxiliando nas visualizações geométricas envolvidas. Ao final iremos propor como alternativa de abordagem dos temas, um produto da dissertação, uma sequência didática que terá o objetivo de auxiliar a construção/reconstrução dos conceitos de área e perímetro. Palavras-chave: perímetro, área, ensino-aprendizagem de matemática, educação matemática. 1. Introdução O desempenho do ensino de matemática na escola básica brasileira vem sofrendo nos últimos anos. Para muitos dos critérios de avaliação, nacionais e internacionais, nossos alunos estão apresentando um baixo índice de aproveitamento nessa disciplina, não compreendendo conceitos importantes. Com minha experiência em sala de aula, percebi que a maioria dos estudantes possui dificuldades em visualizar e compreender construções geométricas. Muitos dos professores que convivi, costumam apresentar este assunto com a sequência: definições e exercícios. A maioria fala que aborda as atividades do livro e caderno, que exige no máximo o uso de uma régua de seus alunos. Quando questionados do por que de sempre trabalharem o assunto desta maneira, argumentam que aprenderam assim, e que não teriam sidos preparados em suas graduações para ensinar diferente. Ressaltam, também, o fato de não terem tempo disponível para planejar cuidadosamente uma aula. Muitas foram às vezes que me deparei com alunos errando exercícios por não saberem aplicar corretamente as definições, como por exemplo, não medir o perímetro de uma figura curvilínea por achar que o conceito só se encaixe em figuras com lados. Isso ocorria 1 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e-mail: [email protected], orientador: Marcus Vinicius de Azevedo Basso.

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Compreendendo Conceitos de Área e Perímetro: um estudo de caso

Gabriel Almeida Quevedo1

GD2 – Educação Matemática nos Anos Finais do Ensino Fundamental

O objetivo deste artigo é apresentar a pesquisa de mestrado em desenvolvimento junto ao Programa de Pós-

Graduação em Ensino de Matemática da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Esse trabalho tem por

objetivo identificar possíveis dificuldades apresentadas pelos estudantes na compreensão dos conceitos de

medida, perímetro e área, analisando para isso algumas resoluções de problemas realizadas por estes

discentes. Com esta identificação foi feita uma discussão sobre o porquê de esses alunos estarem cometendo

tais erros, a partir da análise de cada caso. Com algumas respostas encontradas, embasado em autores que

discutiram esses conceitos, elaboramos atividades que visam melhorar a compreensão dessas ideias pelos

estudantes. Esse trabalho foi abordado em uma turma de nono ano do ensino fundamental em escola pública

da rede estadual, situada no município de Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Outro foco dessa pesquisa foi

propor atividades que exigissem dos alunos manipular objetos de medidas, auxiliando nas visualizações

geométricas envolvidas. Ao final iremos propor como alternativa de abordagem dos temas, um produto da

dissertação, uma sequência didática que terá o objetivo de auxiliar a construção/reconstrução dos conceitos

de área e perímetro.

Palavras-chave: perímetro, área, ensino-aprendizagem de matemática, educação matemática.

1. Introdução

O desempenho do ensino de matemática na escola básica brasileira vem sofrendo nos

últimos anos. Para muitos dos critérios de avaliação, nacionais e internacionais, nossos

alunos estão apresentando um baixo índice de aproveitamento nessa disciplina, não

compreendendo conceitos importantes. Com minha experiência em sala de aula, percebi

que a maioria dos estudantes possui dificuldades em visualizar e compreender construções

geométricas. Muitos dos professores que convivi, costumam apresentar este assunto com a

sequência: definições e exercícios. A maioria fala que aborda as atividades do livro e

caderno, que exige no máximo o uso de uma régua de seus alunos. Quando questionados

do por que de sempre trabalharem o assunto desta maneira, argumentam que aprenderam

assim, e que não teriam sidos preparados em suas graduações para ensinar diferente.

Ressaltam, também, o fato de não terem tempo disponível para planejar cuidadosamente

uma aula.

Muitas foram às vezes que me deparei com alunos errando exercícios por não saberem

aplicar corretamente as definições, como por exemplo, não medir o perímetro de uma

figura curvilínea por achar que o conceito só se encaixe em figuras com lados. Isso ocorria

1 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, e-mail: [email protected], orientador: Marcus Vinicius

de Azevedo Basso.

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quando trabalhava na oitava série do ensino fundamental, atual nono ano, e me deixava

apreensivo, pois os estudantes claramente não haviam compreendido o conceito de

perímetro. Simplesmente haviam decorado que perímetro se tratava da soma de todos os

lados de uma figura, o que sabemos ser correto apenas para polígonos. Será que se

propuséssemos um problema que precisasse calcular o contorno de uma figura “reta” e

outra “não reta”, esse aluno, manipulando objeto(s), não descobriria uma alternativa, e

então, construiria ele mesmo o conceito? Lovell (1988) salienta que as crianças não podem

visualizar os resultados das ações mais simples enquanto estas não forem executadas. Essa

foi uma das questões que sempre me chamaram muito a atenção, pois me faziam

questionar o que de fato um aluno compreende quando apresentamos determinado

conceito. Estamos construindo conceitos com nossos alunos, ou apenas apresentando para

eles?

Se pensarmos nos conceitos que serão discutidos neste trabalho, não acredito que um

estudante consiga calcular o perímetro, compreendendo o que de fato está fazendo, sem ter

desenhado, pelo menos uma vez, a figura envolvida. É comum ver estudantes no ensino

médio aplicando fórmulas sem saberem o porquê desta escolha. Por exemplo, mais de uma

vez, presenciei discentes adotando , onde r é o raio de uma circunferência, para o

cálculo da área desta figura, outras vezes se adotou para o cálculo do comprimento.

Parece que neste caso há uma confusão, ou não houve compreensão dos conceitos. Os

alunos podem apenas ter apreendido uma regra. Se você propuser uma questão para que se

calcule a área de determinada figura, a maioria dos alunos fará o cálculo através de uma

fórmula e responderá: possui x metros quadrados. Mas se você fizer alguns

questionamentos do tipo: Por que você usou esta fórmula? Havia outra maneira de

resolver esse problema? Por que essa figura tem esta fórmula, de onde ela vem? Os

alunos, na maioria das vezes, não saberão responder.

Dois anos após a conclusão da minha graduação, fui trabalhar no ensino médio, mais

precisamente com turmas dos segundos e primeiros anos. Mesmo que este novo público

fosse composto por pessoas mais experientes, que teoricamente já deveriam ter passado

por etapas da construção do pensamento geométrico, algumas duvidas continuavam sobre

perímetro e área. Quando, por exemplo, calculavam os lados de um triângulo retângulo

com o auxílio das razões trigonométricas, e para a finalização, o enunciado do exercício

pedia o perímetro do triângulo. Neste caso eram comuns questionamentos do tipo:

“professor, como se calcula o perímetro mesmo?”. Não raramente, “professor, perímetro é

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a soma dos lados de uma figura né?”, ou ainda, “o que é o comprimento da

circunferência?”. Eram as mesmas indagações que os estudantes do ensino fundamental

faziam. Em cima destas jornadas surgiu a ideia para estudo da dissertação de mestrado: por

que não propor atividades que construam/reconstruam os conceitos de área e perímetro,

com estudantes que já foram apresentados aos temas?

2. Questão norteadora da pesquisa

A partir de análise de textos de autores que discutiram o assunto, conversas e registros de

trabalhos dos estudantes, procuramos identificar estratégias utilizadas por eles nas

resoluções de problemas em geometria. Depois da coleta destes dados, e a constatação de

que estudantes utilizaram diferentes estratégias, apresentando dificuldades em trabalhar os

conceitos de área e perímetro, o objetivo foi investigar o porquê da utilização destas

estratégias e destas dificuldades, respondendo a seguinte questão: como auxiliá-los a

compreender os conceitos de área e perímetro?

Outra questão, porém de caráter secundário, mas que está relacionada com a anterior, e que

surgiu com o andamento da pesquisa, nos obrigando, portanto, a respondê-la, é a seguinte:

quais as contribuições dessa sequência didática para ensino e aprendizagem dos conceitos

de área e perímetro no nono ano do ensino fundamental?

3. Fundamentação teórica

Este trabalho propôs aos alunos atividades que envolveram perímetro e área, e tanto um

conceito, quanto o outro, exigem um entendimento sobre medida e grandeza na realização

de seus cálculos. Por isto, iniciaremos nossa fundamentação teórica discutindo as ideias

medidas e perímetro, e depois dissertaremos sobre área.

3.1 Medida e Perímetro

Para Plaza (1988), calcular a medida de uma grandeza é um ato que as crianças não podem

realizar de uma forma fácil e espontânea, e por isto, é quase impossível adquirir a prática

de medir antes que se esteja avançado no ensino elementar. Acreditamos que esta

dificuldade se deve ao fato de que o ato de medir requer experiência na prática de

manipular objetos, fazer aproximações e trabalhar com classificações. Além destes fatores,

também é necessário ter a compreensão da grandeza do que se quer medir. Não é plausível,

por exemplo, querermos que um estudante meça a quantidade de litros de água que cabem

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em um balde, se ele não tiver a compreensão sobre a grandeza volume. Assim como não é

plausível solicitarmos que meçam quantos centímetros de altura têm cada estudante da sala

de aula, se estes não compreendem a grandeza comprimento, ou se nunca usaram uma

trena. É por isto, que Plaza (1988) apresenta quatro estágios que a criança deve superar

para ter conhecimento e manejo de uma grandeza dada. Os estágios são:

1º Estágio: Percepção e reflexão de uma grandeza como uma propriedade que se apresenta

em uma coleção de objetos, independentemente se há outras propriedades que podem

apresentar estes objetos.

2º Estágio: Conservação de uma grandeza, estágio que se considera superado quando o

aluno já tiver adquirido a ideia de que, embora se troque a posição, forma, tamanho, ou

alguma outra propriedade, existe algo que permanece constante. Esse algo é, precisamente,

aquela grandeza com respeito a qual pretendemos que a criança tenha observado e

conservado.

3º Estágio: Ordenação de uma grandeza dada. Somente quando o aluno é capaz de ordenar

objetos levando em conta, unicamente, a grandeza considerada em questão, se poderá dizer

que ele terá superado esta etapa. Fase esta necessária para ter o domínio da grandeza.

4º Estágio: nesta última etapa a criança saberá estabelecer uma relação entre a grandeza e o

número, é neste momento que será capaz de medir e etiquetar o objeto.

O autor não fixa idades para cada um destes estágios, pois entende que o desenvolvimento

não pode ser uniforme para pessoas diferentes. Além disso, para que o aluno ultrapasse

uma etapa, dependerá do que foi conquistado na etapa anterior. Logo, as idades dependerão

do indivíduo e do seu tempo em cada um dos estágios.

Como um dos nossos focos de pesquisa foi o conceito da palavra perímetro, procuramos

definições apresentadas por alguns dicionários. É sabido que estes livros podem ser uma

fonte de pesquisa para encontrar significados de palavras e, muitas vezes, estudantes

tomam tais definições como verdades absolutas. Portanto, é importante que estes livros

apresentem definições sólidas, mostrando não somente a ideia da palavra, mas também a

forma correta dos conceitos. Observe a definição apresentada pelo minidicionário Aurelio

(2008), Perímetro: sm. Geom. Linha fechada que delimita uma figura plana, ou o

comprimento dessa linha. 3. Limite exterior de determinada área ou região.

Ao definir perímetro como a linha fechada que delimita uma área, e dando a opção do

comprimento dessa linha para uma das definições, Aurélio (2008) nos ajuda a concluir que

será necessário entender a grandeza comprimento para calcular o perímetro de uma

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determinada figura. Ao observarmos na versão online do Dicionário de Língua Portuguesa

Michaelis, notaremos que a palavra linha, presente na definição do minidicionário Aurélio,

é trocada por contorno. Aparece, além deste termo, uma definição válida apenas para

polígonos, classificada como sendo a soma de todos os lados de um polígono.

Figura 1: Definição de perímetro apresentada por Michaelis

Fonte – Disponível em http://michaelis.uol.com.br. Acesso em 03 de julho de 2015.

Tanto Aurélio, quanto Michaelis deixam clara a ideia de contorno, independentemente de

como seja a figura. Excluindo, assim, a concepção de que a palavra só se encaixa para

polígonos. Na definição de perímetro para polígonos, de Michaelis, será necessário

compreender o significado de medir comprimentos. Pois tendo sido classificada a

definição, para este tipo de figura geométrica, como a soma de todos os lados da figura,

precisamos, primeiramente, ter que medir esses lados e, após ter encontrado estes valores,

usar a adição para o cálculo final.

Pensando no tema principal da nossa discussão, perímetro, e visto que para executar o seu

cálculo será necessário compreender a grandeza comprimento, procuramos adaptá-la nos

quatro estágios, apresentados anteriormente, que foram propostos por Plaza (1988).

Portanto, para que o aluno conheça e saiba trabalhar com a grandeza comprimento,

consideramos como condição necessária que ele supere os quatro estágios acima. Plaza

(1988) afirma que todos os estágios serão superados pelos estudantes conforme estes forem

adquirindo uma maturidade mental e um desenvolvimento psicológico. Para uma

compreensão e desenvolvimento intelectual do aluno sobre a grandeza comprimento será

indispensável que o estudante tenha experiências que o coloquem a frente de muitas

situações distintas, e principalmente, que sejam executadas por ele. Estas experiências

deverão exigir dele os pré-requisitos necessários para o cumprimento de todas estas etapas

propostas por Plaza (1988). Também será importante que o aluno tenha, nestas atividades,

que resolver e conviver com situações-problemas, além de medir os objetos com suas

próprias mãos.

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3.2 Área

Para conseguir elaborar uma proposta que envolvesse a construção do conhecimento sobre

área, achamos importante, primeiramente, entender o significado da palavra propriamente

dita. Por isto, além de estudar autores que trabalharam com grandezas e medidas de

superfícies, procuramos também, o que os dicionários trazem sobre a definição. Em nossa

pesquisa trabalharemos com maior ênfase as definições referentes ao significado

geométrico da palavra. Se procurarmos no dicionário Houasiss (2010) o que é área,

encontraremos: “Extensão limitada de espaço, terreno ou superfície. A medida de

superfície de uma figura geométrica”. O Autor aborda a ideia de medida da superfície,

classificando área de uma figura plana como o tamanho da superfície. Concepção parecida

traz o dicionário Escolar de Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras (2008):

“Superfície compreendida dentro de determinados limites. Seperfície de uma figura

geométrica. Medida dessas superfícies”. Podemos notar dois autores diferentes abordando

da mesma maneira o conceito que, segundo eles, área é a superfície de determinado objeto.

Inclusive, ambos apresentam, através da palavra medida, a concepção de tamanho da

superfície.

Estas definições presentes nestes dicionários estão de acordo com que Del Omo (1989) e

Lovell (1988) apresentam para o conceito de área. Para Del Omo (1989), há uma

característica presente nos objetos. Essa qualidade, geralmente é nomeada como área ou

superfície. Porém, uma gama de autores designam significados diferentes para estas

palavras. Eles defendem que superfície seria a característica a ser estudada, e ao falarmos

de área estaríamos nos referindo à medida desta qualidade. Consideraremos a definição

adotada por Del Omo (1989). Segundo o autor, para área é preciso dar o mesmo tratamento

que se dá para a grandeza comprimento, entendida por ele como uma característica dos

objetos que se pode medir através das medidas de comprimento. Como por exemplo,

centímetro, metros, quilômetros e assim por diante. Portanto, ao aplicarmos o mesmo

raciocínio para área, poderíamos definir como: área ou superfície é a característica dos

objetos que pode ser medida através de suas unidades de medida.

O conceito que Del Omo (1989) apresenta está de acordo com a maneira que Lovell (1988)

qualifica a palavra área. Para Lovell (1988) área pode ser definida como a quantidade de

superfície. Lovell (1988) explica que ao considerar a área de um tampo de mesa, podemos

espalhar determinada unidade, por exemplo, a capa de um caderno, sobre essa superfície, e

assim indicamos sua extensão. Portanto, tomando a ideia de Lovell (1988), para medir a

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área de qualquer coisa, primeiramente precisamos definir uma unidade de medida com

tamanhos conhecidos, desde que essa unidade escolhida também seja uma superfície. Essa

exigência de que a unidade seja, também, uma superfície, nos remete novamente ao

conceito de grandezas. Exemplificando, podemos dizer que através da unidade litros não se

pode medir a área de determinada figura, pois, na unidade e no objeto referido, existem

grandezas de natureza diferentes.

4. Percurso metodológico

Conforme o planejamento inicial, à prática ocorreu em uma escola pública da rede

estadual, situada no município de Porto Alegre, Rio Grande do Sul.

Nosso plano era trabalhar nove horas-aulas com uma turma do nono ano do ensino

fundamental, e assim ocorreu. No momento de elaboração deste artigo já havíamos

abordado com os estudantes as atividades deste planejamento. Portanto, já tínhamos

coletado os dados e registros dos acontecimentos, porém ainda não tínhamos analisado

esses dados e nem organizado os registros. Assim, o que segue na sequência foi o nosso

planejamento, descrito de maneira ampla como ele ocorreu. Ressalta-se, desta forma, que

alguns detalhes podem não terem sido expostos neste texto. Em uma pesquisa deste tipo,

não podemos prever com certeza quais serão as respostas e reações dos alunos. As

atividades propostas foram embasadas em nossa experiência como docente e em autores

que trabalharam com o assunto.

A proposta teve por finalidade identificar, primeiramente, o que alunos do nono ano do

Ensino Fundamental compreendem sobre os conceitos de área e perímetro. Por meio deste

estudo também nos propomos a verificar quais são as dificuldades apresentadas pelos

alunos ao se depararem com problemas que exijam o cálculo de área e perímetro. A

ferramenta para este estudo foi uma sequência didática, proposta que teve por objetivo,

além de analisar e verificar dificuldades dos alunos, reconstruir/construir conceitos

equivocados.

Optamos por uma abordagem de pesquisa qualitativa, pois esse método busca entender

detalhadamente por que um indivíduo, em um problema, escolhe determinado caminho ou

executa determinada ação.

Na sequência apresentaremos nosso planejamento e a breve descrição de cada encontro

com a turma, justificando as escolhas das atividades que compõem este roteiro.

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O primeiro encontro ocorreu no dia 23 de outubro de 2014, com duração de duas

horas/aula e teve por finalidade verificar o que os alunos entendiam sobre perímetro. Para

tanto, convidamos os estudantes a responderem, por escrito, a seguinte questão: Uma

pessoa precisa calcular o perímetro de um terreno, mas não sabe o que isto significa,

como você ajudaria esta pessoa? Você saberia dizer o que é e como calcular o perímetro?

Em seguida, propomos a resolução do seguinte problema: A diretora da escola precisa

trocar os rodapés da nossa sala de aula, a fim de que não sobre e nem falte madeira, qual

a quantidade de rodapés que ela precisará comprar?

Nesta atividade, não colocamos nenhum objeto para auxiliar nas medidas. A proposta teve

objetivo de avaliar se a concepção de medir é consistente para os estudantes. Dividimos a

turma em trios para apresentarem suas respostas. No planejamento, os estudantes deveriam

usar a unidade que fosse mais conveniente, caso um dos grupos solicitasse alguma

ferramenta, como uma trena, nós iriamos disponibilizar. E foi o que de fato ocorreu. Logo

no início os alunos solicitaram uma trena, e prontamente, colocamos a disposição deles.

Depois desta atividade, compararmos as medidas encontradas por cada grupo. Na

sequência levantamos a seguinte pergunta: A diretora não vai conseguir ir até a loja. Por

telefone, como ela pode explicar o que precisa, e como pediria a quantidade necessária de

rodapés? O objetivo com esta pergunta foi chamar a atenção dos alunos para a importância

de uma palavra que definisse o tamanho do contorno de uma figura plana, além de fazer

com que entendessem a necessidade de haver uma unidade de medida. Todas estas

respostas às perguntas realizadas aos alunos foram respondidas por escrito em folhas para

posterior análise. Para fechar o encontro discutimos com os alunos qual grupo encontrou a

medida mais próxima do tamanho real.

No segundo encontro realizamos uma pesquisa com os discentes utilizando todos os

materiais disponíveis na escola (internet, livros dicionários, etc) a fim de pesquisar o

significado da palavra perímetro. Na sequência, disponibilizamos objetos que auxiliaram

no cálculo do perímetro como: réguas, barbantes, compassos, entre outros. Ao escolher os

objetos, os alunos foram convidados a justificarem o porquê da escolha e explicar como os

usaram. Em seguida, foi realizado um exercício com o objetivo de calcular o perímetro das

figuras apresentadas a seguir e, quando possível, explicar como foi calculado.

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Figura 2: Atividade sobre perímetro para o segundo encontro

Fonte – O autor.

Após estas atividades, todas as respostas para o significado da palavra perímetro de cada

um dos grupos foram comparadas. Além disto, os alunos foram questionados com as

seguintes perguntas: esta definição foi suficiente para o cálculo do perímetro nas figuras

da atividade anterior? Atendeu todas as necessidades? O que você melhoraria nesta

definição? A seguir, discutimos com a turma uma definição para perímetro.

No terceiro encontro, nosso objetivo foi lançar aos grupos problemas que discutissem o

conceito de área. Para verificar o que os estudantes entendiam por área, começamos com a

seguinte questão: Aquela mesma pessoa precisa calcular a área do terreno, mas não sabe

o que isto significa e nem como calculá-lo, como você ajudaria esta pessoa? Em seguida

propomos uma pesquisa com os discentes utilizando todos os materiais disponíveis na

escola (internet, livros dicionários, etc) a fim de pesquisar o significado da palavra área.

Todas estas respostas às perguntas realizadas aos alunos foram descritas em folhas para

posterior análise.

Na sequência deste encontro, apresentamos a ferramenta Geoplano aos alunos para realizar

a seguinte atividade: com o auxílio de elásticos, reproduza as figuras da imagem abaixo no

seu Geoplano. Em seguida, utilizando como unidade de medida um quadradinho formado

por quatro pregos, calcule a área de cada uma destas figuras, explicando como foi

resolvido.

Figura 3: Primeira atividade sobre área para terceiro encontro

Fonte - Fonte – Disponível em http://mdmat.mat.ufrgs.br. Acesso em 15 de novembro de 2015.

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Com esta atividade nosso objetivo foi afazer os alunos notarem que para calcular a área de

algumas figuras, nem sempre precisaremos usar uma fórmula. Através da observação,

podemos concluir as “nossas próprias regras”, se bem compreendido o significado de área.

Novamente, em todos os itens, nas resoluções, explicações e nas justificativas do uso das

ferramentas, solicitamos o registro escrito feito pelos estudantes para nossa análise

posterior.

No quarto encontro, convidamos os estudantes a trabalharem na seguinte atividade: A

diretora precisa trocar o piso da nossa sala de aula, como podemos ajudá-la a fazer o

pedido da quantidade para a loja? Para que não haja desperdício, qual a quantidade de

piso necessária?

Como na discussão de perímetro, não queríamos disponibilizar ferramentas para os

cálculos, a menos que algum aluno solicitasse. A maioria logo de início solicitou as

ferramentas, e então disponibilizamos a eles. Ao final, foram comparados os resultados

encontrados por cada grupo.

Após a realização da primeira parte do encontro, nenhum dos grupos falou sobre unidades

de medida na atividade anterior. Como a maioria solicitou uma trena, e a os demais

seguiram o mesmo caminho, não fizemos a pergunta que estava no planejamento: Não

existe uma maneira mais rápida para realizar este cálculo? Com esta pergunta

pretendíamos mostrar aos estudantes ideias que facilitassem o cálculo da área, deixando o

processo mais rápido. Porém, conseguimos concluir com os estudantes que para responder

este problema da diretora, seria necessário fazer a conversão para alguma unidade

conhecida pelo atendente.

Iniciamos uma discussão sobre a pesquisa da aula anterior a fim de chegar em um

consenso sobre a melhor definição de área. Questionamos se a definição deles, ou a

encontrada na pesquisa, foi suficiente para o cálculo das áreas das figuras do exercício da

aula anterior, e para resolver o problema do piso. Estas definições não foram suficientes

segundo eles, portanto, os grupos criaram e melhoraram estas ideias.

Para o quinto encontro os alunos mediram o tamanho real da área do piso da sala de aula, e

identificou-se qual dos grupos se aproximou mais do resultado “real”. Em seguida,

disponibilizamos aos alunos as mesmas ferramentas da atividade sobre perímetro, para que

escolhessem o que achassem mais conveniente ao trabalharem a seguinte questão:

É possível calcular a área de cada figura abaixo? Quando for possível calcule e

explique como você fez. Por que escolheu este instrumento?

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Fizemos também uma atividade que teve como objetivo construir, com os alunos,

raciocínios que facilitam o cálculo de área, deduzindo fórmulas e processos. Para isto,

contamos com o auxílio do Geoplano e alguns elásticos. Através desta ferramenta

construímos com os alunos algumas ideias além das desenvolvidas na aula anterior.

Depois de cada aula realizamos uma análise e, para os encontros seguintes o planejamento

sofreu modificações até chegar à configuração deste texto. Pois, segundo a proposta desta

pesquisa, a sequência das atividades estava diretamente relacionada com o que os alunos

iam produzindo nos encontros.

5. Considerações Finais

A pesquisa continua em andamento com previsão de término para dezembro de 2015. Os

próximos passos são a descrição detalhada dos encontros ocorridos durante a prática do

trabalho, as análises dos dados e resultados obtidos durante as atividades propostas em

aula. Além disso, com base nas atividades trabalhadas com os alunos, será elaborada uma

sequência didática. Este produto relacionado com a dissertação terá foco em estudantes dos

anos finais do ensino fundamental, e seu objetivo será auxiliá-los na

construção/reconstrução dos conceitos de área e perímetro.

6. Referências

ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS. Dicionário Escolar da Língua Portuguesa. 1ª

edição. São Paulo: Companhia Editora Nacional. 2008.

BACKENDORF, V. R. Uma sequência didática de medidas de comprimento e

superfície no 5° ano do ensino fundamental: um estudo de caso. 2010. 187f. Dissertação

(Mestrado em Educação Matemática) – Instituto de Matemática, UFRGS, Porto Alegre,

2010.

DEL OLMO, M.A. Superficie y volumen ¿algo más que el trabajo con fórmulas?.

Madrid: Editorial Síntesis, 1989.

FERREIRA, A. B. H. Aurélio: Minidicionário da língua portuguesa. 7ª edição. Curitiba:

Editora Positivo. 2008.

HOUAISS, A. Houaiss: Minidicionário da Língua Portuguesa. 4ª edição. Rio de Janeiro:

Objetiva. 2010.

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LOVELL, Kurt. O desenvolvimento dos conceitos matemáticos e científicos na criança.

Tradução de Auriphebo Berrance Simões. Porto Alegre: Artes Médicas, 1988.

PIAGET, Jean; INHELDER, Bärbel. A representação do espaço na criança. Tradução de

Bernardina Machado de Albuquerque. Porto Alegre: Artes Médicas, 1993.

PLAZZA, Mª Del Carmem Chamorro; Gómez, Juan Miguel Belmonte. El problema de la

medida. Didáctica de las magnitudes lineales. Madrid: Editorial Sintesis, 1988.