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04 - Editorial: Octávio Carmo06 - Foto da semana07 - Citações08 - Nacional14 - Internacional20 - Opinião José Luis Gonçalves22 - Semana de... Carlos Borges24 - Dossier Jubileu da Misericórdia

26 - Entrevista D. Manuel Linda78 - Multimédia80 - Estante82 - Concílio Vaticano II84- Agenda86 - Por estes dias88 - Programação Religiosa89 - Minuto Positivo90 - Liturgia92 - Fundação AIS94 - LusoFonias

Foto da capa: IM.vaFoto da contracapa: DR

AGÊNCIA ECCLESIA Diretor: Paulo Rocha | Chefe de Redação: Octávio CarmoRedação: Henrique Matos, José Carlos Patrício, Lígia Silveira,Luís Filipe Santos, Sónia NevesGrafismo: Manuel Costa | Secretariado: Ana GomesPropriedade: Secretariado Nacional das Comunicações Sociais Diretor: Padre Américo AguiarPessoa Coletiva nº 500966575, NIB: 0018 0000 10124457001 82.Redação e Administração: Quinta do Cabeço, Porta D1885-076 MOSCAVIDE.Tel.: 218855472; Fax: [email protected]; www.agencia.ecclesia.pt;

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Opinião

Portas Santasfechadas,Misericórdiacontinua[ver+]

Em defesa doshomens do Mar[ver+]

Misericordiar decorpo e alma[ver+] D. Manuel Linda | José LuisGonçalves | Octávio Carmo | CarlosBorgesFernando Cassola Marques |Manuel Barbosa | Paulo Aido | TonyNeves

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Com Misericórdia

Octávio Carmo Agência ECCLESIA

O terceiro Ano Santo extraordinário da IgrejaCatólica está a chegar ao fim. Se levarmos emcontar que já há mais de 700 anos de jubileus,percebemos desde logo que foi umaoportunidade histórica. Para lá da mera análise“estatística”, no entanto, percebemos que foi umano central para definir o pontificado deFrancisco em volta da sua palavra-chave:Misericórdia.A própria compreensão do conceito está emconstante aperfeiçoamento, necessariamente. ATeologia tem de estar por dentro da condiçãohumana e ao serviço de cada pessoa,oferecendo respostas às suas buscasexistenciais. A misericórdia é particularmenterelevante para evitar qualquer atitude desuperioridade em relação àquele que pode estara precisar de auxílio ou numa condiçãoconsiderada menos digna, qualquer que seja. Doponto de vista católico, todos, sem exceção,estão necessitados da misericórdia divina.12 meses passados, obviamente, há muito porfazer. As Portas Santas fecham-se e o mundocontinua à espera desta mensagem demisericórdia, concretizada nas mais diversasobras. Uma reserva moral e espiritual nummundo em que a modernidade, tantas vezes, setem revelado anti-humana, promotora de umacultura de morte (como lembrava João Paulo II),da ditadura do relativismo (uma denúnciasistemática de Bento XVI) e da cultura dodescarte (Papa Francisco).Não posso deixar de fazer eco de uma reflexãorecente, ouvida durante um debate sobre

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a figura de G. K. Chesterton: estamodernidade suporta mal a crítica.Não quer ser discutida, quer apenasser absolutizada, divinizada. Quemdiscordar de algum modo podeestar apenas doente, tomado poruma qualquer “fobia”, porque amodernidade (entenda-se tambémaqui o tempo que vivemos) é o maisperfeito do mundo. À Igreja

Católica compete ser “reserva” desabedoria, de valores e, claro está,de misericórdia, mesmo quando àprimeira vista as suas posiçõessejam recusadas.Como dizia o próprio Chesterton,“apenas a Igreja Católica podesalvar o homem da escravidãodestruidora e rebaixante de ser filhoda sua época”.

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Leonard Cohen, 1934-2016

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“Cantando e escrevendo, Cohen pensou,desabafou, rezou, amou. Sempre com aquele jeitocavalheiresco cultuado noutras eras. Porque assimera, um gentleman em palco e fora dele. Honrouassim o nome que celebrizou.” (Padre AlexandrePalma, Diário de Notícias de 12 de novembro) “Peço-vos perdão em nome dos cristãos que nãoleem o Evangelho e não encontram a pobreza nocentro. Peço-vos perdão por todas as vezes quenós, cristãos, diante de uma pessoa pobre ou deuma situação de pobreza olhamos para o outrolado. Desculpai.” (Papa Francisco, no Jubileu dossem-abrigo, dia 11 de novembro) “Eu tinha dito, uns tempos atrás, que havia razõespara esperar uma boa execução orçamental eporventura sinais em matéria de economia. Vamosver é se se mantém até ao fim do ano” (Presidenteda República, sobre o crescimento da economia noterceiro trimestre) “O Eng.º Bruto da Costa foi um homem deprofunda humanidade, um homem de fé e defidelidade à Igreja, um homem de causas,sobretudo as sociais, sempre na atenção a todossem exceção” (Padre Manuel Barbosa, secretárioda Conferência Episcopal Portuguesa, sobre ofalecimento de Alfredo Bruto da Costa) “Sempre pugnou pelo envolvimento de toda asociedade e da Igreja, em particular, naerradicação da pobreza absoluta e de qualquerforma de exclusão social.” Eugénio Fonseca,presidente da Cáritas Portuguesa, sobre ofalecimento de Alfredo Bruto da Costa)

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Portas fechadas,coração aberto para a Misericórdia

As várias dioceses e os santuáriosportugueses encerraram no últimodomingo as Portas Santas doJubileu da Misericórdia. Uma etapae não um ponto final, comosublinharam os seus responsáveis,apelando à continuidade destadinâmica na vida de cada dia.

Como exemplo, a Diocese dePortalegre-Castelo Branco assinalouo encerramento do Jubileu daMisericórdia com a doação à CERCI- Cooperativa de Educação eReabilitação de CriançasInadaptadas – do edifício e doterreno que esta estava a utilizaratualmente. De

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acordo com informaçõesavançadas à Agência ECCLESIA, obispo diocesano, D. Antonino Dias,explicou este gesto com o objetivode concluir o Ano Santo com “umarecordação viva” da misericórdia.Já o cardeal-patriarca de Lisboaafirmou que o Jubileu daMisericórdia, que se conclui a 20 denovembro, deve deixar marcas nadefesa da vida e da dignidadehumana. “Que, em suma, do ventrematerno à sua finalização nestemundo, a existência de cada umseja legalmente protegida esolidariamente amparada, comovalor que é por si só e nuncarelativizada pelos outros ou atépelos próprios”, defendeu D. ManuelClemente.O bispo de Leiria-Fátima encerroueste domingo o Ano Santo daMisericórdia na diocese, numaEucaristia em que sublinhou umevento que “imprimiu umasensibilidade espiritual e um estilopastoral” essenciais para toda aIgreja Católica. D. António Martodestacou a importância desteJubileu, num “mundo tão carecidode perdão, de cura e de paz”, umavivência que “não pode parar” masdeve ser “impulso e pauta deatuação dos cristãos”.

O bispo de Viana do Castelo, porsua vez, frisou que Deus temsempre uma porta aberta para todosos que precisam. “Não existenenhuma situação da nossa vida,por mais miserável que seja, para aqual não se abra uma porta”,salientou D. Anacleto de Oliveira, nasua homilia.Nos Açores, o bispo de Angra querver os frutos do Jubileu daMisericórdia potenciados no anopastoral que está em curso. D. JoãoLavrador classificou o Ano daMisericórdia como uma ocasião “degraça para a Igreja Católica e paraos cristãos”, no sentido de teremsempre presente a proximidade deDeus nas suas vidas. Um ano depois do seu início,sentimos como foi providencial ainiciativa do Papa Francisco, aoconvocar este JubileuExtraordinário da Misericórdia.Percebemos bem como a Igrejaprecisava desta lufada de novamissão que irrompe damisericórdia divina, acolhida etraduzida na vida de todos os dias.E não nos surpreende a almaaberta do mundo que acolheuesta iniciativa do Papa Franciscocom alargada aprovação e atentointeresse.D. António Francisco dos Santos,bispo do Porto

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Beja: Novo bispo já se sentealentejano

D. João Marcos disse à AgênciaECCLESIA que se sentiu “acolhidode forma calorosa” na primeiracelebração, como bispo diocesanode Beja, este domingo, na Sé, quecoincidiu com o encerramento daporta jubilar da misericórdia e com adespedida de D. António Vitalino.Os praticantes no Alentejo “não sãomuitos, mas são calorosos” e são“pessoas provadas” porque o “meioé adverso”, sublinhou D. JoãoMarcos, que assumiu a liderança daDiocese de Beja no último dia 3.O bispo atual sente-se “bemacolhido” naquilo que diz e “nosgestos” que tem, e considera que oscristãos de Beja o “fortalecem” esustentam”. Em relação ao legadodo seu antecessor

D. João Marcos sublinha que D.António Vitalino era “muitoacarinhado” na diocese e, nahomenagem de despedida, estedomingo, “não houve nenhumaparóquia que não quisesseparticipar na prenda oferecida”.“Ele deixa a fasquia muito alta”porque “teve uma dedicação semlimites” e “uma capacidade detrabalho impressionante”, afirmou D.João Marcos. O bispo de Bejatrabalhou, durante dois anos, comocoadjutor de D. António Vitalino econsidera que este período “foi umaescola ótima”. Nascido na região daBeira, D. João Marcos já se “sentealentejano com os alentejanos”porque “as pessoas quando sesentem amadas correspondem”.

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Alfredo Bruto da Costa, os pobrescomo inquietação constanteO cardeal-patriarca presidiu nosábado à Missa exequial de AlfredoBruto da Costa e lembrou a suaconstante “inquietação” pelospobres, num percurso de vida“inteiramente cristão”. “A Boa Novaaos pobres era a sua inquietaçãoconstante”, referiu D. ManuelClemente, acrescentando que a suavida confirma a possibilidade deacontecer em cada tempo o que emCristo "começou a acontecer”.“Nos vários contactos que foi tendocom ele, nas várias instânciaseclesiais, o que sempre mesurpreendeu, também quando o liaou o ouvia, é que nunca saía daqui:o Espírito de Deus está sobre mimporque Ele me ungiu e me enviou aanunciar a Boa Nova aos pobres”,disse o cardeal-patriarca de Lisboa.D. Manuel Clemente sublinhou queAlfredo Bruto da Costa “nuncaesmoreceu neste propósito” einsistiu na “concretização do sonho”da atenção constante aos pobres.“Esta insistência do Alfredo, aolongo de toda a sua vida e de todaa sua obra, fá-lo inteiramentecristão”, acrescentou.O presidente da Comissão

Nacional Justiça e Paz (CNJP),Pedro Vaz Patto, mostrou-se“emocionado” com a morte deAlfredo Bruto da Costa, seuantecessor no cargo.Em entrevista à Agência ECCLESIA,Pedro Vaz Patto enalteceu o“serviço” que Bruto da Costasempre prestou “à sociedadeportuguesa”, ao longo da sua vida.Recordou também uma figura comquem “conviveu durante bastantesanos na CNJP” e que sempre viucomo “modelo de cristãoempenhado nas causas da justiça eda paz”.Alfredo Bruto da Costa faleceu estano dia 11 de novembro, aos 78anos; licenciado em Engenharia ecom um doutoramento emSociologia, exerceu funções noGoverno chefiado por Maria deLurdes Pintassilgo, entre 1979 e1980, foi presidente da ComissãoNacional Justiça e Paz e conselheirode Estado.

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A Agência ECCLESIA escolhe sete acontecimentos que marcaram aatualidade eclesial portuguesa nos últimos dias, sempre atualizadosemwww.agencia.ecclesia.pt

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Fátima: Santuário convida peregrinos a atravessar «pórtico jubilar»

Encerramento do Ano da Misericórdia em Beja

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Vaticano denuncia realidadestrágicas na indústria pesqueira

O Vaticano denunciou a “realidadetrágica” dos pescadores vítimas detráfico humano e de trabalhosforçados, numa mensagem inseridano Dia Mundial da Pesca que estámarcado para 21 de novembro. Nodocumento, enviado à AgênciaECCLESIA, o Conselho Pontifício

para a Pastoral dos Migrantes eItinerantes (CPPMI) realça que estáem causa a vida de “centenas demilhares” de pessoas, sobretudo“migrantes internos outransnacionais” que são submetidosa “situações de exploração e abuso”na indústria pesqueira.De acordo com a Santa Sé, “tudo

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isto é favorecido por uma rede deorganizações criminosas eindivíduos que exploram as pessoasprovenientes de uma situação depobreza e que procuramdesesperadamente um empregoque possa ajudá-los a quebrar essecírculo”.O Dia Mundial da Pesca foiinstituído em 1998 para “enfatizar aimportância de preservar osoceanos e a vida marinha, que dáalimento para milhares de milhõesde pessoas em todo o mundo eoportunidade de trabalho para maisde 50 milhões”.Para o CPPMI, é essencial quetodos os “governos ratifiquem aConvenção sobre o Trabalho naPesca de 2007 (OIT nº 188) ”, quevisa “criar um ambiente seguro abordo dos navios e melhorescondições de bem-estar para ospescadores.”Este organismo do Vaticanoconsidera ainda fundamental que asestruturas católicas, sobretudo osagentes mais ligados ao Apostoladodo Mar, os capelães e voluntários,estejam “vigilantes e intensifiquem asua presença nos portos de pesca,a fim de identificar e ajudar asvítimas de tráfico humano”.“Também é necessário que oApostolado do Mar trabalheestreitamente com os

responsáveis das comunidadespesqueiras para educar e prevenir otráfico de seres humanos,oferecendo alternativas viáveis detrabalho e meios de subsistência”,pode ler-se.A reflexão do Vaticano para o DiaMundial do Mar olha também para ofuturo dos “recursos naturaismarinhos”, atualmente ameaçadospor uma intervenção humana quevaloriza mais o lucro a todo o custodo que o desenvolvimentosustentável.Na sua encíclica ‘Laudato Si’,dedicada à Ecologia, o PapaFrancisco denunciou alguns dosdesafios, desde “a poluição quechega ao mar resultante dodesflorestamento, das monoculturasagrícolas e descargas industriais”aos “métodos de pesca destrutivos,nomeadamente os que utilizamcianeto e dinamite”.Aqui, a Santa Sé realça também aimportância de dar cumprimento auma outra convenção, neste caso “oAcordo sobre Medidas do Estado doPorto para prevenir, impedir eeliminar a pesca ilegal, nãodeclarada e não regulamentada(PSMA)”. Um acordo adotado pelaOrganização das Nações Unidaspara Alimentação e Agricultura(FAO) em 2009, mas que só emjunho deste ano “entrou em vigor”.

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Resposta coletiva responsávelàs alterações climáticas

O Papa enviou uma mensagem aosparticipantes na 22ª Cimeira da ONUsobre Alterações Climáticas(COP22), que decorre na cidademarroquina de Marraquexe,apelando a uma “resposta coletivaresponsável” neste campo. Amissiva foi divulgada hoje pela salade imprensa da Santa Sé e édirigida ao ministro marroquino dosNegócios Estrangeiros, que presideà conferência, em curso até sexta.Francisco alude à “graveresponsabilidade ética e moral” deagir “sem demoras” para travar adegradação ambiental e enfrentaros efeitos das alterações climáticas,evitando “pressões políticas e

económicas” em sentido contrário.A mensagem saúda a entrada emvigor do Acordo de Paris, fruto daCOP21, em 2015, realçando que “aação individual e/ou nacional não ésuficiente” perante temáticas tãocomplexas. O Papa fala num“impacto preocupante” dasmudanças climáticas, em particularnas populações mais pobres e nas“gerações futuras”.Em relação à implementação doacordo, o pontífice argentinodefende que não bastam “soluçõestécnicas”, pelo que pede umcompromisso político para tomar asmedidas necessárias, levando emconsideração “os aspetos éticos esociais”.

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Papa pede fim da violênciaterrível na Síria e IraqueO Papa manifestou a suaconsternação diante da “terrível”violência na Síria e no Iraque,durante uma audiência ao patriarcada Igreja Assíria do Oriente, estaquinta-feira. Perante o ‘catholicos’Mar Gewargis III, Francisco pediu ofim dos conflitos na região,sublinhando que “nenhumamotivação pode justificar oupermitir” esta situação, que afeta emparticular milhares de cristãos emembros minorias religiosas eétnicas, que são forçados a fugirdas suas terras.A intervenção, divulgada pela salade imprensa da Santa Sé, recordouas “centenas de milhares decrianças inocentes, de homens emulheres” que são atingidos pela“violência terrível dos sangrentosconflitos”.Francisco rezou pela paz no MédioOriente, para que se ponha fim a“tanta dor” que afeta a populaçãoda região, antes de deixar umamensagem em favor da “plenacomunhão” entre as várias Igrejascristãs. Além do encontro, emprivado, o Papa e o patriarca daIgreja Assíria do Oriente estiveramem oração na capela ‘RedemptorisMater’ do Palácio Apostólico doVaticano.

O pontífice argentino elogiou oscristãos que percorrem diariamenteuma “Via-Sacra” e mostram aos fiéisde todo o mundo que é preciso“permanecer com o Senhor, emtodas as circunstâncias”.Francisco desafiou os membros daIgreja Católica e da Igreja Assíria doOriente a renovar a “memóriacomum” da atividadeevangelizadora, aprendendo com os“mártires” de todos os séculos e dehoje. “Como o sangue de Cristo,derramado por amor, reconciliou euniu, fazendo germinar a Igreja,assim o sangue dos mártires ésemente de unidade dos cristãos”,declarou.Gewargis Sliwa, 112.º patriarca daIgreja Assíria do Oriente, é naturaldo Iraque, onde nasceu em 1941.

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Papa associa-se a jornada pelos Direitos da Infância e da Adolescência

Jubileu dos sem-abrigo

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Os efeitos das “políticas deidentidade”

José Luís Gonçalves Escola Superior de Educação de Paula Frassinetti

Qual é o elemento político comum que une osresultados que conduziram ao Brexit, aorecrudescimento dos nacionalismos europeus ouà narrativa que fez eleger o novo presidente dosEUA? Tudo foi conduzido em nome de umadivisão: o “nós” contra “eles”. Este recurso aoargumento da “identidade” tem constituído umaarma perniciosa no discurso político de todos osquadrantes, quer das ideologias situadas àesquerda quer das ideologias atribuídas àdireita. À esquerda, defende-se a “diferença” dasminorias étnicas, raciais, culturais ou sexuais; àdireita, alerta-se para os perigos da perda da“identidade” linguística, nacional, territorial oureligiosa. Nos discursos ditos progressistas, acelebração da diferença constitui a razão de serlegitimadora para fazer propostas fraturantes queforçam até ao limite costumes das comunidadeshumanas; nos discursos populistas, o outro-diferente-de-nós constitui um “intruso” e o inimigoa abater, não raras vezes com linguagemdespudoradamente ofensiva. Começam a surgirno espaço público “fantasmas” que julgávamoshá muito desaparecidos…Os políticos que argumentam a partir da“identidade” têm tido sucesso porque conseguemfalar a linguagem dos marginalizados daglobalização, essa grande transformação quealterou estruturas sociais e estatais, afetou ascondições de trabalho e de produção, modificouas relações humanas e, acima de tudo, amaneira

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como cada pessoa se vê a simesma e ao outro. Os perdedoresdesta dinâmica imparávele imprevisível estão cansados deviver na frustração de nãoconseguirem ser bem-sucedidos naestratégia de adaptação àglobalização. Perdidos alguresnesta errância psíquica e geográficapara encontrar o seu “lugar” nomundo – tendo que redefinirpertenças -, a fragilidade dacondição provisória e ambivalentedas “suas” identidades vem ao decima. E se é importante sublinharque as identidades pessoais ecoletivas configuram convençõessocialmente necessárias àconvivência, elas constituem, antesde tudo, um problema euma tarefa quando reclamam porreconhecimento e justiça no espaçopúblico. No entanto, se exploradaspoliticamente, dão lugar aexpressões de fundamentalismos devária ordem: muros que separam os“bons” dos “maus”, postos detrabalho para os de “dentro” e nãopara os de “fora”, entre outrosfenómenos conhecidos.Neste processo inexorável de umaglobalização inacabada,encontramo-nos, pois, numa fasecrítica da vida coletiva. Enfrentá-lacorresponderá

substituir a “política da identidade”pela organização social e política dacorresponsabilidade, traduzidaem algumas iniciativas: recorrer àtradição dialógica do debate públicoque, através da racionalidadecomunicativa, reconhece e acolhe omelhor argumento; articular oespaço público em torno de umagramática renovada do que seentende por bem-comum; sob oconceito de governação complexa,instituir o princípio da cooperaçãocomo poder de decisãocomprometida; fomentar umaaprendizagem social que permitadistinguir entre as normas de umacomunidade concreta e os princípiosuniversalistas que atendam àdignidade humana de nome e rosto.O tempo urge e sem perseverançano aperfeiçoamento da democracianão podemos esperar justiça e pazsocial.

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«Muito mais é o que nos uneque aquilo que nos separa»

Carlos Borges Agência ECCLESIA

Foi uma das frases que ficou da viagem do PapaFrancisco à Suécia pelos 500 anos da reformaprotestante (2017) e foi uma das mais ouvidas noFEJ, o Fórum Ecuménico Jovem que se realizoueste ano em Aveiro. E foi visível, por exemplo,com um momento único (não de primeira vez oununca ter acontecido) na celebração final com apartilha do pão que saiu do altar, e começou aser distribuído por dois bispos, e chegou a todosos jovens como momento de comunhão e união.Apesar do dia de chuva, certamente programadapor São Pedro para a comunhão ser maior emais próxima, a amostra de jovens cristãos dePortugal que se levantou cedo a um sábado fez afesta do ecumenismo.No Seminário de Santa Joana Princesa, a partirdo tema ‘Dai-lhes vós mesmos de comer’ o padreJoão Gonçalves incentivou à caridade. A partilhapara além da vida de cada um sentiu-se à mesada refeição, onde todos contribuíram para oalmoço. E no Ano Nacional Contra o DesperdícioAlimentar sobejou para o lanche, antes dasdespedidas até a nova edição, celebraçõesecuménicas locais ou o Oitavário pela Unidadedos Cristãos, em janeiro.A minha primeira vez no FEJ, com promessas deregressar e viver mais a partilha e a comunhão,foi também a maioridade do encontro organizadopelos departamentos juvenis das Igrejas Católica,Lusitana (Comunhão Anglicana), Metodista ePresbiteriana.

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O título - «Muito mais é o que nosune que aquilo que nos separa» -lembra também a música do RuiVeloso ‘Primeiro Beijo’, comoobservou e bem o melómano chefede redação da Agência Ecclesiaapós a viagem do Papa Francisco àSuécia.Diana Melo, do Secretariado Juvenilda Igreja Lusitana, também

assinalou a frase destacada aolongo do Fórum Ecuménico Jovemnão para referir-se à música maspara o que as cerca de 300 pessoasdisseram “cara a cara” enquantofaziam a festa do ecumenismo, emcomunhão mesmo que para issofaçam longos percursos e tenhamde percorrer o país lés a lés.

O título - «Muito mais é o que nos une que aquilo que nos separa» - lembra também amúsica do Rui Veloso ‘Primeiro Beijo’, como observou e bem o melómano chefe de

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música do Rui Veloso ‘Primeiro Beijo’, como observou e bem o melómano chefe deredação da Agência Ecclesia após a viagem do Papa Francisco à Suécia.Uma responsável do Secretariado Juvenil da Igreja Lusitana, por exemplo, tambémassinalou a frase destacada ao longo do Fórum Ecuménico Jovem não para referir-se àmúsica mas para o que as cerca de 300 pessoas disseram “cara a cara” enquantofaziam a festa do ecumenismo, em comunhão mesmo que para isso façam longospercursos e tenham de percorrer o país lés a lés. BALÕES“É importante porque junta os jovens de várias Igrejas. Ficamos a conhecer melhor asoutras Igrejas, aprendemos mais sobre Deus, temos novas ideias para fazer o bem eaprendemos novos cânticos.” Carolina Lopes, Igreja Presbiteriana“É uma oportunidade de os jovens conviverem com outras realidades e com outrosjovens, de perceberem que é mais aquilo que nos une do que aquilo que nos separa,que as diferenças não são tão significativas e realmente o importante é estarmos unidose o amor ao próximo e a Deus.” Diana Melo, Secretariado Juvenil da IgrejaLusitana“Numa altura que tem sido um desafio ao desenvolvimento do lado humano da nossasociedade, há que ressalvar a ponte e partilha que se sente no Fórum Ecuménico.Vezes sem conta ouvimos sobre a necessidade de pensar “fora da caixa”, de procurardiversos pontos de vista. Mas como realmente o fazer sem ser ouvindo o outro epartilhando com o outro? Posso dizer, em verdade, que o reforçar da consciência danecessidade de comunhão para uma maior compreensão foi o que de principal trouxecomigo.” Inês Montenegro, Grupo de Jovens da Sé – Lamego

O Papa vai presidir entre sábado e domingo às celebraçõesconclusivas do Jubileu da Misericórdia, iniciado em dezembro de2015, que incluem a criação de cardeais e o encerramento da PortaSanta. Este foi o 29.º jubileu na história da Igreja Católica, um AnoSanto extraordinário centrado no tema da Misericórdia.

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O Semanário ECCLESIA apresenta nesta edição um conjunto dedepoimentos e testemunhos centrados nesta celebração e navivência particular das Obras de Misericórdia, corporais eespirituais. A lista segue a proposta feita pelo Papa e inclui o cuidadocom o Ambiente deve como uma “nova obra de misericórdia”, que seune às 14 tradicionais.A Igreja Católica iniciou a tradição do Ano Santo com o Papa BonifácioVIII, em 1300, e a partir de 1475 determinou-se um jubileu ordinário acada 25 anos. Ao longo da história da Igreja, foram vários os anosjubilares, 26 ordinários e tês extraordinários.O jubileu, com raízes no ano sabático dos judeus, consiste numperdão geral, uma indulgência aberta a todos, e na possibilidade derenovar a relação com Deus e o próximo.

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A misericórdia vai modelar a Igreja no terceiro milénio

O Papa Francisco propôs a toda a Igreja a celebração de um Ano SantoExtraordinário sobre o tema da misericórdia. Iniciou no dia 8 de dezembro de2015, dia em que se assinalavam 50 anos do encerramento do ConcílioVaticano II, e termina este domingo, 20 de novembro, solenidade de CristoRei. O objetivo foi aproximar os seguidores do Mestre, do Jesus que “nãoestabeleceu um código, mas a misericórdia”. A afirmação é de D. ManuelLinda, bispo da Diocese das Forças Armadas e das Forças de Segurança,que preside também à Comissão Episcopal Missão e Nova Evangelização.No Vaticano e nas várias conferências episcopais, foi pedido ao setor daNova Evangelização a coordenação e dinamização do Ano Jubilar

Entrevists conduzida por Paulo Rocha

Agência Ecclesia – O Jubileu daMisericórdia foi sobretudo umjubileu do Papa Francisco?D. Manuel Linda - Foi um anoinserido na dinâmica da Igreja, quepensou fundamentalmente nafamília. Não podemos esquecer quevem no seguimento do Sínodosobre a família e, nesse ambiente, oPapa, em união

com a Igreja, estabeleceu ao Ano daMisericórdia como tentativa de verqual o Ser de Deus e a resposta dohomem. Muitas vezesprivilegiávamos o Direito Canónico,o formalismo inerente às leis emdetrimento do ser íntimo que é otípico da Igreja e de Deus.

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AE – O Papa fez muitos gestosconcretos, que aconteceramtambém em toda a Igreja?ML – Aconteceram! Não tiveram é arepercussão dos gestos do Papa.Fundamentalmente aconteceu aformação de uma mentalidade.Claro que não é mensurável e nãopodemos dizer que hoje “toda aIgreja é misericordiosa como o Pai émisericordioso”. Mas a fermentaçãoestá a atuar e vai trazer os seusfrutos.

AE – O que é possível continuar afazer para que gestos como os doPapa tenham repercussão em todoo mundo?ML – A Porta Santa encerra, mas amentalidade que ele criou, amisericórdia, não termina. Ésemente que vai florindo e que vaimodelar a Igreja neste terceiromilénio. É a grande propostalançada neste início do terceiromilénio e que vai dar uma novatonalidade à maneira de ser Igreja ede estar no mundo: pessoas demisericórdia.

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AE – O novo horizonte da Igrejaconvida a substituir a norma pelamisericórdia?ML – O Direito Canónico teve, tem eterá uma importância muito grandeno ordenamento da Igreja, até comocorpo organizado que precisalogicamente de ter o seuenquadramento. Por isso, o DireitoCanónico não é algo que está amais, bem pelo contrário, éfundamental para a Igreja. Mas nãoé a norma fria, enquanto tal, quenos carateriza. Jesus Cristo nãoestabeleceu um código, mas amisericórdia. AE – E que desafio é esse paraquem segue hoje Jesus Cristo?ML – Ser como Ele: misericordioso,compassivo, simpático, acolhedor…

AE – Que relação se deveestabelecer entre o tema da família,que referiu, e o Jubileu daMisericórdia?ML – O Papa não me disse qual arazão pela qual escolheu o temapara um jubileu extraordinário. Mastoda a gente nota que é noseguimento do Sínodo sobre afamília e da exortação apostólicapós-sinodal ‘A Alegria do Amor’. Nóslidamos com uma situação muitodifícil, como é a das famílias, onde há situações que não têm umasolução fácil! Não há outra aberturapossível nesta fase que não seja umacolhimento, uma presença, um nãodeixar desanimar, que habitualmentechamamos misericórdia. Jesus Cristo não estabeleceu umcódigo, mas a misericórdia.

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AE – Refere-se a famílias que nãose configuram na estruturatradicional…ML – O grande desafio é queaqueles que podem viver a partir doponto de vista do que a Igreja prevêpara a família crente o vivam. Mashá situações em que não éhumanamente possível. Mas, porisso, não são rejeitadas, não estãoafastadas, não são “mandadas parao inferno”. Há que acolhê-las, estarpresente, integrá-las dentro dopossível nas estruturas da vida daIgreja e acalentar a esperança. AE – Concretizar as propostas doSínodo da Família, com uma atitudede misericórdia. Foi essa aestratégia do Papa?ML – Também por aí. Mas o jubileué mais do que isso. Toda a vida daIgreja tem de respirar um “oxigénio”de misericórdia, simpatia,acolhimento, presença solidária. AE – Na Bula de Proclamação doJubileu, o Papa afirma que toda aação pastoral da Igreja deve estarenvolvida pela “ternura com que sedirige aos crentes”. Há um novoparadigma para ser Igreja hoje?ML – Há. Estou convencido que, daparte de todos nós, os pastores,houve uma enorme tentativa de

Creio que este ano foiabsolutamenteextraordinário namudança do nossotemperamento nadinâmica pastoral, noacolhimento. modelar o coração por uma maiorproximidade, acolhimento. Não querdizer que posturas de um certoformalismo não possam acontecer.Acontecem! Mas encontramos aatitude de maior abertura eproximidade, particularmente diantede situações difíceis ou mesmofraturante, graças a Deus! Creioque este ano foi absolutamenteextraordinário na mudança do nossotemperamento na dinâmica pastoral,no acolhimento. AE – A referência principal é ahistória de vida de cada pessoa?ML – Não a história de vida, mas apessoa enquanto tal, que não seconcebe de forma abstrata, àmaneira grega. Trata-se de umapessoa concreta, portadora deânsias, carências, sonhos efrustrações. E se a desprezamos,desprezamos a única razão de serda Igreja, que é a pessoa.

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AE – Disse também o Papa, aoconvocar o jubileu, que acredibilidade da Igreja passa pela“estrada do amor misericordioso ecompassivo”. Falar da credibilidadede uma instituição com 2000 anos,colocá-la em causa como o Papa ofez é um desafio a que é impossívelficar indiferente…ML – É evidente! Ou somos hojerepetidores, no tempo que corre,dos gestos e atitudes de JesusCristo, ou estamos a mais e criamosnós um qualquer organismo, pormais venerável que seja. A Igreja émuito

filantrópica, distingue-se por fazercoisas muito bonitas, mas não éessa a sua essência. A sua essênciaé ser misericordiosa, compassiva,amorosa, como Jesus Cristo o foi. Ou somos hojerepetidores, no tempo quecorre, dos gestos eatitudes de Jesus Cristo,ou estamos a mais

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AE – Jesus foi muitas vezes além dalei. Que desafio constitui essaatitude para os dias de hoje?ML – Somos chamados à mesmaatitude pedagógica de Jesus emfunção da pessoa, não da situação.

Nós não canonizamos o mal!Bem pelo contrário. Se é mal, é mal.Mas a pessoa é merecedora damisericórdia e da atenção,independemente do bem ou do malque traga anexa à sua vida.

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Justiça sem misericórdiaserá fria, livresca AE – Misericórdia e justiça. Querelação se deve estabelecer?ML – As duas são componenteshumanas. Mas justiça semmisericórdia será fria, livresca, quenão serve a pessoa na suatotalidade. AE – O que é que a misericórdiaacrescenta à justiça?ML – Centra-se na pessoa, nãoapenas na ação. A ação écontabilizada em função decódigos. E o contexto? E o queestá por trás de uma ação? Podemser agravantes, mas normalmentesão atenuantes. AE – Acredito que de alguma formaa misericórdia desestabiliza quemtem de aplicar a justiça…ML – Não é fácil! Nós gostaríamosde ver tudo automático como oligar de um interruptor. Masestamos a lidar com pessoas e oseu mundo. Mas não tenhamosilusão. Esse é o único caminho aseguir…

AE – Ao proclamar o jubileu, o Paparefere-se também a outras religiões,afirmando que a misericórdiaultrapassa as fronteiras da Igreja. Ojubileu da misericórdia foi também umano de diálogo inter-religioso?ML – Foi e vai sê-lo! Não tivemosnenhum gesto significativo, mas nocontexto do Pentecostes, em maio, asigrejas do COPIC (ConselhoPortuguês das Igrejas Cristãs), que jáestão há muitos anos em diálogo,pretendemos recuperar uma ótimadeclaração sobre a justificação pelafé de 1998, assinada entre as igrejasluteranas da Alemanha e a IgrejaCatólica, que é ainda hoje umdocumento fundante do que deve sera união a nível de doutrina. Vamospegar nesse documento e refleti-lo,em conjunto. Trata-se de um dosfrutos deste Ano da Misericórdia.

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AE – O setor da novaevangelização, que o D. ManuelLinda coordena na ConferênciaEpiscopal Portuguesa, dinamizoueste Jubileu da Misericórdia. Querepercussão tiveram as propostasdo Papa entre nós?ML – No início chegaram muitosdocumentos de Roma e, tambémpor meio de consultas que fizemosao Vaticano, tentamos uniformizarcritérios para abertura do Ano daMisericórdia e a dinâmica no qualdeveria ser vivido. Depois, cadadiocese foi caminhado pelos seusmeios, ao seu ritmo. Após osegundo e terceiro mês não houveuma intervenção de coordenaçãomarcante.Por outro lado, a primeira parte doAno da Misericórdia foi marcada, emmuitas dioceses, pela visita ImagemPeregrina de Nossa Senhora deFátima e, em cada uma, procurou-se associar os dois acontecimentosno tema da misericórdia. AE – O Jubileu da Misericórdia nãose reduziu, no entanto, ao abrir efechar de portas, passado um ano…ML – Não! Realizaram-se muitasações: umas visíveis, mas asgrandes ações são as invisíveis.Todo o Povo de Deus esteveenvolvido com muito êxito. Marcou amaneira de ser Igreja em Portugal eem qualquer parte do mundo.

AE – Não seria desejável quegestos como os que o Papa fez,como ter a Praça de São Pedro comsem-abrigo, acontecessem tambémentre nós?ML – Sim. E aconteceram! O bispodo Porto convidou os sem-abrigo aatravessar a Porta Santa dacatedral; na única prisão que há emPortugal para as Forças Armadas eForças de Segurança, graças aDeus com um número reduzido depresos, celebrei o Jubileu dosreclusos, com a presença daImagem Peregrina. E muitos outrosgestos ocorreram! Não foram é tãovisíveis, porque não têm a dimensãoda universalidade como têm os quese realizam no Vaticano. AE – Também por causa darealização desses gestos, acreditaque o novo paradigma do ser Igrejahoje está em curso…ML – Acredito que é uma porta quenão se pode encerrar e queninguém tem coragem para fechar aporta da misericórdia: um coraçãosensível, uma maneira própria deafirmar a fé no mundo. Realizaram-se muitasações: umas visíveis, masas grandes ações são asinvisíveis .

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Exercitar a misericórdia noquotidianoO padre Manuel Morujão diz que oAno da Misericórdia promovido peloPapa Francisco foi um “treino” quedeu “balanço” aos cristãos para“exercitarem no dia-a-dia amisericórdia” no mundo.Em entrevista ao ProgramaECCLESIA, o sacerdote jesuíta, quefoi um dos “missionários damisericórdia” no âmbito do AnoSanto, salientou a importância daIgreja Católica e das suascomunidades não se deixarem ficarpelas “celebrações, com mais oumenos pompa e circunstância”, quemarcaram o evento.“Isto deve concretizar-se no dia-a-dia das pessoas, das famílias, dasparóquias, das dioceses e daIgreja”, aponta o autor do livro‘Celebrar e Praticar a Misericórdia’,que forneceu propostas para avivência deste Jubileu.Lançado pelo Papa Francisco a 8de dezembro de 2015, como formade tornar mais evidente a missão daIgreja Católica como testemunha epraticante da misericórdia de Deusno mundo, o Jubileu da Misericórdiacongregou as dioceses ecomunidades cristãs de todo omundo numa atenção especial aosmais

marginalizados e excluídos dasociedade.Para o padre Manuel Morujão, esteevento veio numa altura em que omundo vive “uma urgência demisericórdia”.“O mundo era irrespirável se nãohouvesse tolerância, compreensão,

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aceitação, ou seja, se nãovivêssemos a praticar obras demisericórdia, nos mais variadoscampos”; e nesse sentido, com esteAno Santo “procurou-se que esteaspeto exterior passasse para avida das pessoas”, sustenta osacerdote.No início do Jubileu, o PapaFrancisco enviou mais de mil‘missionários da misericórdia’ pelomundo, entre os quais algunssacerdotes portugueses, chamadosa ser expressão do perdão de Deuse convite de conversão a todas aspessoas.“É preciso uma conversão, acho

que todos temos de nos convertersempre mais à misericórdia que vemda fonte de Deus, que é rico emmisericórdia, diria multimilionário demisericórdia, e depois traduzir issoem gestos fraternos”, sustenta opadre Manuel Morujão.O sacerdote elogiou os “sinais” e“gestos” que ao longo do último anopermitiram concretizar apreocupação com a misericórdia,sublinhando, por exemplo, aabertura das Portas Santas,simbolizando a “peregrinação” e a“abertura” do coração.

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Jubileu: Misericórdia é o critério paraa presença da Igreja numa novaépoca

O padre Rui Valério, pároco naIgreja Jubilar da Póvoa de SantoAdrião, em Lisboa, disse à AgênciaECCLESIA que a misericórdia é o“critério para a ação” da Igreja naépoca atual, dando primado à vida.Para o sacerdote, um dos cincomissionários da misericórdia emPortugal, o Papa Francisco afirma emonstra que, mais do que uma“época de mudanças, comoaconteceu há 40, 50 anos”, omundo hoje está numa “novaépoca”.

“Há uma nova vida que está aacontecer, uma nova cultura, tudo énovo. E o Papa Francisco, com aproclamação do Ano daMisericórdia, quis dar à Igreja e aomundo um critério de ação para anova época: a misericórdia”,sublinhou o padre Rui Valério.“A Igreja compreendeu e sentiu-se”,sustenta o sacerdote nomeado peloPapa missionário da misericórdia,que diz nunca ter visto a Igreja a“navegar

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como peixe dentro da água comoseste ano”.Para o sacerdote, religiosomonfortino, a nova época coloca oprimado “do lado da vida”, não do“lado do conceito da teoria”, evaloriza “o gesto, a linguagemsimbólica”.“A Igreja considera tudo o que anossa tradição tem. Mas estamos nafase em que dentro de tudo o quedispomos, há algo que tem umprimado, a vida, a vida nova comoDeus no-la deu na revelação doSeu Filho”, sublinhou.“No entender do Papa, é urgenteresgatar do esquecimento esobretudo das más compreensões aidentidade e missão do próprioDeus”, referiu o padre Rui Valério,acrescentando que “por diversasvezes Francisco tem manifestado ointeresse em

repropor à nossa adoração overdadeiro rosto de Deus”.Para o sacerdote, a misericórdia é overdeiro rosto de um Deus, que“não julga, nem que propõequalquer tipo de violência, nem deexclusão”.Na Paróquia da Póvoa de SantoAdrião, o Jubileu da Misericórdia foipreparado para proporcionar oacolhimento a quem quis atravessara ‘Porta Santa’ da igreja paroquial,‘Igreja Jubilar’ durante este ‘AnoSanto Extraordinário’, e a realizaçãode um ‘Itinerário da Misericórdia’ emoito momentos.Para o pároco, o Jubileu quetermina este domingo, em Roma,motivou uma “grande mobilização”,não deixando “ninguém indiferente”.

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Foi no Refeitório Beata RosáliaRendu, em Lisboa, queencontrámos a irmã Celeste Lopes,das Irmãs de São Vicente de Paulo.É desde maio de 2005 o rosto desteserviço, e sente que a primeira Obrade Misericórdia Corporal “‘dar decomer a quem tem fome’ é estardisponível e aberto a quem chega”.E chegam de muitos lados, são detodas a raças, de todas as cores ereligiões para fazer uma refeição.“Muitas vezes quem chega o quetem é fome mesmo, mas mais doque de alimento, fome de umapalavra, de quem lhe resolva osproblemas… Como dizia SãoVicente (de Paulo) primeiro enche-se o estômago a uma pessoa edepois tenta-se saber asnecessidades que a pessoa tem”,disse a consagrada em declaraçõesà Agência ECCLESIA.Todas as necessidades básicas, aonível de banho, saúde e roupaschegam ali, toda a parte humana épreciso ajudar e a moral é sempre aprioridade de quem ali ajuda.Ao refeitório chegam pessoas detodos os Continentes; vêm daTurquia, Marrocos, Ucrânia, Rússiae depois da Guiné e Síria,Paquistão e Bangladesh.

Também trazem as diferentesreligiões para a mesa da refeição.“Tento estar atenta à alimentação ecostumes deles, nestes últimos anosnão tem havido confusões, mas foium trabalho muito grande, porquehavia conflitos e tinha-me de meterno meio deles e dizer: Meninos, aquisomos todos filhos do mesmo Deus.Deus é pai e misericordioso e estãoaqui todos porque precisam decomer, quem não precisa faz favorde sair e aí eles acalmam-se; eagora tudo está pacificado”.São realidades que se tornamconflituosas neste serviço que alémde dar de comer, tenta restabelecera dignidade humana.“Trata-se da roupa, mesmo dapessoa em si, tendo em conta todaa pessoa, se está doente vai aohospital, tentamos encaminhá-los,praticar as obras de misericórdia noconcreto, a corporal e espiritual”,explica a Irmã Celeste Rodriguesque, naquele refeitório, concretiza asua vocação.“É muito gratificante, quandoconseguimos ajudar: às vezeschegam aqui e nem parecem um serhumano; fazem a barba, lavam-se evestem outras roupas; vão para acasa

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de banho num estado e saem de láa parecer crianças cheirosas”.A irmã Celeste Rodrigues tinha odesejo de ir para as missões equando entrou na comunidade nãoera possível; ir para ali, noRefeitório Beata Rosália Rendu, emLisboa, encontra-se com toda asraças e cores, com toda a gente,“complementa

a minha vocação de vicentina”.Segundo a consagrada “deviaexistir” uma sensibilização “muitogrande” nas escolas, colégios,restauração, e, mesmo nasinstituições do Estado, contra odesperdício e avança a criticar“quem não dá comida a quemprecisa”…

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No fim deste ano jubilar daMisericórdia, convocado pelo PapaFrancisco, a Agência Ecclesia foi aoencontro de quem, no seu dia-a-dia,tenta colocar em prática. A OIKOS,uma associação sem fins lucrativos,com sede em Portugal, reconhecidainternacionalmente comoOrganização Não-Governamentalpara o Desenvolvimento, tem comodiretor executivo João JoséFernandes que

explicou que dar de beber a quemtem sede é muito mais do que darum copo de água.“Um gesto simples de beber umcopo de água em sociedadessedentárias, como a portuguesa,muitas vezes perde-se o sentido doque é esta obra de misericórdia; queparte de uma cultura de povossemitas, que passavam por zonasdesérticas, e, onde os viajantes e osseus animais,

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precisavam de água potável e nemsempre encontravam pelo caminho,a não ser pedindo a quem lá residia.Dar de beber não é só satisfazeruma necessidade básica e vital paraa vida humana, mas um gesto deacolhimento e convivência, umaoutra forma de paz”, explica JoãoJosé Fernandes.O diretor executivo da OIKOSaponta mesmo o recurso hídricocomo uma riqueza e fonte deconflitos pois “há zonas do planetaem que a escassez de água écrescente; e esta sendo um recursonatural escasso é tão importante napacificação ou nos conflitos comoera tradicionalmente o petróleo, oouro ou out tipo de minerais”“Temos de tratar a água olhando-acomo um recurso natural necessáriode preservar no planeta”, alerta.A OIKOS além de tentar satisfazer anecessidade básica, proteger asaúde pública, tenta tambémgarantir a preservação do estadonatural, ou seja, “convivência, namesma região a água potável comexploração agrícola, relação com omar”.João José Fernandes explica aindaque a OIKOS trabalha emMoçambique,

na zona de Nampula, com projetosde prevenção de catástrofes, sendouma zona propensa a ciclones doÍndico, é afetada por ventos fortes echuvadas, e como consequênciasurge a destruição ou contaminaçãode lençóis freáticos e fontanários,pontos de abastecimento de água.“Estas situações criaram naspessoas uma cultura de paradoxal,queremos garantir o acesso deágua potável mas não queremosficar aí pois a água tem de estar nocentro da comunidade, que nãopode deixar degradar os postosabastecimento, e temos de educaras populações par valorizarem aágua no sentido da saúde”. São realidades de escassez deágua que para os portugueses,muitas vezes, podem ser longínquase inimagináveis, mas João JoséFernandes alerta que também porcá é necessária a preocupação nagestão da utilização da água.

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A partir do agasalho procurar o teto e uma vida normalA Comunidade Vida e Paz (CVP),uma instituição católica tuteladapelo Patriarcado de Lisboa, ededica-se há mais de 25 anos aoapoio aos sem-abrigo da cidade, a“vestir” aqueles que se encontramdesprovidos de roupa e de teto, queperderam qualquer tipo de suportesocial, que caíram na pobreza ouem dependências como o álcool e adroga.Todos os dias, aquela organizaçãode cariz social presta apoio a cercade 480 pessoas, um número quesegundo Henrique Joaquim, opresidente da CVP, “não temaumentado” mas também “não temdiminuído significativamente, o queindica que saindo algumas pessoasda rua há outras que estão achegar”.“Infelizmente a CVP continua a fazersentido, digo infelizmente porque onosso sonho é deixarmos de sernecessários, seria sinal de queestas situações não existiam”,realça aquele responsável.Atualmente, “o que mais carateriza achegada das pessoas à rua” sãosobretudo situações de“desestruturação familiar ou social”

que derivam essencialmente do“desemprego” ou de“descompensações” que levam aessa quebra dos “laços sociais”.~“Muitas pessoas que nósencontramos hoje já estão há muitotempo nestas situações, muitocomplexas, que tendencialmenteacumulam muitos problemas como asaúde mental, como as adições”,realça Henrique Joaquim.Neste contexto, a obra demisericórdia “Vestir dos Nus” dizmuito para o trabalho daComunidade Vida e Paz e dos seuscerca de 500 voluntários.Uma missão que se concretiza “emduas dimensões, dar o bemimediato, o agasalho imediato e tiraro frio” mas depois procurar a“reinserção social” dessas pessoas,trabalhar com elas no sentido de“voltarem a ter condições de vidaque são suas por direito, condiçõesde dignidade humana”.“Portanto, a partir do agasalhoprocurar quer o teto quer depois ascondições para que sejam elespróprios a suprir o seu agasalho etodas as condições que fazem partede uma vida dita normal”, frisaHenrique Joaquim.Sobretudo neste período de outono

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e inverno, as mantas - a par dasceias que são distribuídas - sãouma parte essencial da bagagemdas equipas de rua que todos osdias percorrem cerca de 100 locaisde Lisboa em busca dos sem-abrigo.Regularmente, a CVP fazcampanhas públicas de recolha deroupa e de cobertores para poderlevar depois às pessoas maiscarenciadas.“Infelizmente ainda encontramospessoas em lugares completamenteinóspitos e sem o mínimo de abrigo,e às vezes a manta é as duascoisas: é o abrigo imediato daquelapessoa naquela noite de frio e nasoutras noites a seguir, mas étambém o fator de confiança quepermite reforçar ou começar arelação connosco, para a pessoa nofuturo se deixar ajudar noutrospassos mais desafiantes para a vidadela”, conta Henrique Joaquim.O presidente da CVP liga esta obrade misericórdia “Vestir os Nus” àparábola bíblica do BomSamaritano, que continua a fazersentido neste século XXI e nestasociedade tantas vezes dominadapela indiferença perante quem estácaído, ferido, desamparado à beirado caminho.“Há de facto muitas pessoas quepassam ao lado, por razões várias,pelas crenças, por medo, porquenão sabem o que fazer, e portantotambém é importante não julgarmosà partida aquele que não ajuda.Mas felizmente há muitas pessoasque,

dedicadamente, querem sair todosos dias, todas as noites à rua eajudar”, destaca Henrique Joaquim.26 anos da sua criação, num projetoque começou essencialmente pelarua e que hoje já se estende aespaços de aconselhamento,reabilitação e reinserção social, aCVP perspetiva “alargar a suaintervenção geográfica para lá deLisboa”.De acordo com Henrique Joaquim,são cada vez mais as solicitações epedidos de ajuda em zonas maisafastadas da cidade, também devidoao “movimento” dos sem-abrigopara outros territórios do eixolisboeta, como Sintra ou Cascais.Além deste alargamento da missãoda Comunidade Vida e Paz na rua,foi constatada também anecessidade de reforçar setorescomo o acompanhamento ereinserção social dos sem-abrigo,com “mais alojamento” por exemplo.Como acompanhar melhor aspessoas sem-abrigo a seguir à suareabilitação e reinserção social éoutra das grandes preocupações ebrevemente haverá novidades nestecampo.“Vamos oportunamente lançar umprojeto, com voluntários e técnicosnossos, para garantirmos um maioracompanhamento e acima de tudouma relação social, afetiva, comestas pessoas”, revela HenriqueJoaquim.

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Acolher o peregrino«Era estrangeiro e acolhestes-me;estava nu e vestistes-me» (Mt 25,35-36)No nosso tempo é atual como nuncaa obra relativa aos estrangeiros. Acrise económica, os conflitosarmados e as mudanças climáticasimpelem muitas pessoas a emigrar.Contudo, as migrações não são umfenómeno

novo, mas pertencem à história dahumanidade. Consiste em faltade memória histórica pensar queelas sejam próprias apenas danossa época.A Bíblia oferece-nos muitosexemplos concretos de migração. Ésuficiente pensar em Abraão. Achamada de Deus impeliu-o a deixaro seu país e ir para outro: «Deixa atua terra,

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a tua família e a casa de teu pai evai para a terra que eu te mostrar»(Gn 12, 1). E assim aconteceutambém para o povo de Israel, quedo Egito, onde era escravo,caminhou durante quarenta dias nodeserto até alcançar a terraprometida por Deus. A própriaSagrada Família — Maria, José e omenino Jesus — foi obrigada aemigrar para fugir das ameaças deHerodes: «José levantou-se durantea noite, tomou o menino e sua mãee partiu para o Egito. Alipermaneceu até à morte deHerodes» (Mt 2, 14-15). A históriada humanidade é feita demigrações: em cada latitude não hápovo que não tenha conhecido ofenómeno migratório.A propósito, durante os séculosassistimos a grandes expressões desolidariedade, embora não tenhamfaltado também tensões sociais.Hoje, o contexto de crise económicainfelizmente favorece o emergir decomportamentos de fechamento enão acolhimento. Nalgumas partesdo mundo erguem-se muros ebarreiras. Às vezes parece que aobra silenciosa de muitos homens emulheres que, de várias maneiras,se prodigalizam para ajudar eassistir os refugiados e os migrantesseja obscurecida pelo rumor deoutros que dão voz a um

egoísmo instintivo. Contudo ofechamento não é uma solução,pelo contrário, acaba por favoreceros tráficos criminosos. A únicasolução é a solidariedade.Solidariedade com o migrante,solidariedade com o estrangeiro...Hoje o compromisso dos cristãosneste âmbito é urgente assim comoera no passado. Observando só oséculo passado, recordamos aadmirável figura de Santa FranciscaCabrini, que dedicou a sua vidajuntamente com as suascompanheiras aos migrantes rumoaos Estados Unidos da América.Também hoje precisamos destestestemunhos a fim de que amisericórdia possa alcançar muitosnecessitados. É um compromissoque envolve todos, sem exclusão. Asdioceses, as paróquias, os institutosde vida consagrada, as associaçõese os movimentos, assim como cadacristão, todos são chamados aacolher os irmãos e as irmãs quefogem da guerra, da fome, daviolência e das condições de vidadesumanas. Todos juntos somosuma grande força de apoio paraquantos perderam pátria, família,trabalho e dignidade.

Papa Francisco,

26 de outubro de 2016

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A quinta Obra de Misericórdiacorporal convida a visitar osenfermos e foi na Clínica S. João deÁvila, da Ordem Hospitaleira de SãoJoão de Deus, em Lisboa, queestava Georgiana Gama, enfermeirareformada que fez voluntariado todaa vida, e destaca que “a morte nãoé específica dos profissionais desaúde”.“A morte é um problema dasociedade. Temos de ter umasociedade muito mais solidária, équase como uma responsabilidadecívica estarmos perante umasituação estas”, explica à AgênciaECCLESIA.Enfermeira com formação na áreados Cuidados Paliativos, GeorgianaGama assinala que nessasunidades “o tempo custa muito apassar, é terrível”, como oentardecer ou a noite que “é muitocomprida”, por isso, “o estar, apresença”, traz “ganhos” paraambos.“O podermos falar de váriosassuntos é extremamenteimportante e ajuda qualquer um denós porque isto é uma relação, nãoé, propriamente, unilateral”,observa. assinalando que adisponibilidade para o outro “fazparte da vida”.A entrevista destaca que a pessoa“é muito mais para além da doença”,a

sua “integridade, história, vida, umacultura”. “A doença acontece emtoda a vida. A morte, viver onascimento, a doença, sãoacontecimentos banais mascuriosamente singulares porque aforma que cada um enfrenta é quetorna diferente”, desenvolveGeorgiana Gama.Neste contexto, a enfermeira comformação em Cuidados Paliativosrefere que nessa área as situações“obrigam” a refletir sobre a própriapessoas porque todos são“vulneráveis, impotentes”, têmdúvidas e “não há resposta prontapara tudo”.“Obriga-nos a pensar muito sobrenós. Tenho aprendido muito quandoestou perante estas situações”,adianta.Já Adriano Batista começa porexplicar a etimologia da palavravoluntário para manifestar a sua“vontade” em visitar os enfermosnum voluntariado que “é muitoespecial”.“São muitas histórias de vida, sãomuitas partilhas, são muitos gestos.Sobretudo, vejo nas pessoas umadisponibilidade muito grande paranos acolher enquanto voluntáriosporque é como uma intromissão navida das pessoas. Acompanhamos,conversamos, servimos muitas

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vezes de confidentes”, desenvolve.Adriano Batista sublinha que “émuito interessante” e “gratificante”ver que existe “muito a descobrir emcada pessoa, em cada gesto,conversa, sorriso, olhar” porque nãosão necessárias “muitas palavras,uma atitude simples e isso, de facto,enche o coração”.Na Unidade de saúde

especializada em ProgramasIntensivos de Reabilitação Física, daOrdem Hospitaleira de São João deDeus, o entrevistado, com idadepara ser “neto de quase todos” osutentes destaca também asconversas, a partilha de vivências,“recordações da sua terra” que “émuito bonito ver” nessa outra faseda vida de “tanta experiênciaacumulada”.

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O Papa e os presos

O Papa Francisco tem assumido aliderança e o exemplo para a IgrejaCatólica no que se refere à práticada obra de misericórdia corporalque se refere à relação com quemestá preso. Não surpreendeu, porisso, que tenha promovido umJubileu dos Reclusos, presidindomesmo a uma Missa na Basílica deSão Pedro, com presos e antigosdetidos de 12 países, incluindoPortugal.

“Cada vez que entro numa cadeia,pergunto-me: porquê eles e não eu?Todos podemos errar”, sublinhouFrancisco, numa homiliaemocionada. Da consciência de quesó pela Graça de Deus é queestamos a falar de outros e não denós próprios como reclusos, o Papalançou um lamento sobre a “poucaconfiança” que existe na“reabilitação”.“Às vezes, uma certa hipocrisia

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impele a ver em vós apenaspessoas que erraram, para quem aúnica estrada é a prisão”, disse aosdetidos.O Vaticano revelara dias antes queo Papa tem telefonado acondenados à morte em váriospaíses. “Muitas vezes, o PapaFrancisco esteve em contactotelefónico nos últimos meses comcondenados à morte”, revelou o arcebispo Rino Fisichella,presidente do Conselho Pontifíciopara a Nova Evangelização (SantaSé), organismo responsável pelaorganização dos eventos do Jubileuda Misericórdia.Em resposta aos jornalistas, oresponsável precisou que Franciscoesteve em contacto e se

“interessou” por pessoas que foramcondenadas à morte. “Nãoconseguiu salvar um que foicondenado à morte e sofreu apena”, relatou o presidente doConselho Pontifício para a NovaEvangelização - caso que teráacontecido nos EUA.Logo na primeira semana desteJubileu da Misericórdia, o Paparecordou os presos de todo omundo, pedindo a abertura de‘Portas da Misericórdia’ em locaisassociados à marginalização. “Comoexpressão das obras demisericórdia, serão abertas ‘Portasda Misericórdia’ nos lugares desofrimento e marginalização. A esterespeito, saúdo os reclusos dasprisões de todo o mundo”.

Papa apelou no Vaticano a umaamnistia para presos, paraassinalar o fim do Jubileu daMisericórdia. “Coloco àconsideração das competentesautoridades civis de cada país apossibilidade de realizar um ato declemência, neste Ano Santo daMisericórdia, para com os presosque se considerassem idóneos a beneficiar deste procedimento”,declarou.O Papa tinha deixado já um apelo em favor da “melhoria de condiçõesde vida nas prisões, para que seja respeita plenamente a dignidadehumana dos detidos”.

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“Enterrar os mortos”, a sétima eúltima Obra de MisericórdiaCorporal é um serviço que aIrmandade da Misericórdia e de SãoRoque de Lisboa cumpreescrupulosamente acompanhandotodos os que na capital morremsozinhos sem familiares nemamigos.“Chega ao nosso conhecimentoatravés da Santa Casa que alguémfaleceu e não tem ninguém, não seprevê que haja acompanhamento.Naturalmente, não vai descer à terrasem ninguém que o acompanhe,que esteja perto, que tenha umaoração, um ato de generosidade, desentir irmão em Cristo”, disse osegundo vice-provedor daIrmandade da Misericórdia e de SãoRoque de Lisboa.À Agência ECCLESIA, AntónioBalcão Reis explicou que oacompanhamento “é simples” sãoavisados a que horas é o funeral,qual é o cemitério e durante algumtempo “a encomendação era sófeita junto da campa” e “não era osítio mais adequado” porque ascondições meteorológicas,normalmente, não permitiam “areflexão, a intimidade” quedesejariam.A Irmandade da Misericórdia e deSão Roque de Lisboa conseguiuultrapassar essa situação e, agora,o

primeiro ato é “a encomendação nascapelas dos respetivos cemitérios”. “O ato não constitui apenasacompanhamento físico, sem quehaja também uma integração noritual e constitui momento dereflexão. O acompanhamento nãoimplica que o defunto tenha crença,é em Cristo que acompanhamos. Sehouver indicação expressa dodefunto que deseja isto ou aquilo ouque não deseja é escrupulosamenterespeitado”, desenvolve AntónioBalcão Reis assegurando que o“desejo” de não acompanhamentoreligioso “não afasta” a presença dairmandade.O grupo que cumpre a última Obrade Misericórdia Corporal éconstituído por 15 elementos, entreirmãos e voluntários, “alguns sãosimplesmente amigos dairmandade”, que têm vindo aconhecer a disponibilidade para‘enterrar os mortos’ e “manifestaminteresse em participar”. No grupode cerca de 15 elementos tenta-sesempre encontrar alguém que estejadisponível para o esseacompanhamento porque “osfunerais são à hora do trabalho”.“A primeira vez será acompanhadopara ver como é, não tem nada deespecial, e assim funciona semgrandes complicações. Fazemos opossível por haver algumaformação”,

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acrescenta o entrevistado.O segundo vice-provedor daIrmandade da Misericórdia e de SãoRoque de Lisboa assinala que paraeles ‘enterrar os mortos’ “parecenormal” mas admite que,externamente, se diga “o que é queos leva a fazer isto, qual é a razão”.Neste contexto, António Balcão Reisadianta que as motivações são“muito diversas” e se a um faleceu opai e o “corpo não foi encontrado” eesse acompanhar é o que gostariade ter feito e não fez outros “ficaramtocados pelo falecimento de um filhoprecoce”.“No meu caso, por exemplo,simplesmente senti que não épossível, diria que não deviaacontecer ir o carro funerário e nãoir ninguém atrás”, revela oentrevistado para quem foi“suficiente”, aparecer a notícia queo grupo existia e acompanhavaquem ia “sozinho, sem ninguém”para o cemitério.Já o irmão primeiro vice-provedor daIrmandade da Misericórdia e de SãoRoque de Lisboa faz o contextohistórico e recorda que foi em maiode 2006 que uma irmã quetrabalhava na Santa Casa daMisericórdia de Lisboa (SCML), noapoio aos doentes VHI/sida,começou esse serviço.“Estava confrontadapermanentemente e lançou esteprojeto que abraçamos deimediato”, refere.Segundo Mário Pinto Coelho jáacompanharam mais de 1480

funerais, “cerca de 120, 130” porano. Anualmente, a 17 de outubro,Dia da Erradicação da Pobreza e dapessoa sem-abrigo fazem “sempreuma celebração na Basílica dosMártires por todos os queacompanhamos e este ano foram88”.“Todos os que morrem sozinhos nacidade – hospitais, rua, casas, lares,quartos - e ninguém os reclamaporque não há familiar ou porque afamília está zangada e não querparticipar”, sublinha.O custo dos funerais é daresponsabilidade da SCML que tem“a capacidade financeira”. De trêsem três anos abre um concursopúblico para escolher uma agenciafunerária que tem contactopermanente com o Instituto deMedicina Legal.O irmão primeiro vice-provedor daIrmandade da Misericórdia e de SãoRoque de Lisboa explica ainda queo serviço fúnebre não é imediato “oupróximo da morte”, algo que variaconsoante as situações, se apessoa morre no hospital, deacidente, crime, desaparecimento e“mais tarde aparece o cadáver”.“As Obra de Misericórdia são a baseda nossa irmandade, aliás emrelação a isto normalmente juntamosas duas Obras – Orar por vivos edefuntos e enterrar os mortos -fazemos a oração e acompanhamoso baixar à terra”, acrescentou porsua vez o segundo vice-provedorAntónio Balcão Reis.

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As Obras de Misericórdia Espirituaissustentam as corporaisO padre Vasco Pinto de Magalhães,destaca que as Obras deMisericórdia Espirituais estão “atépor dentro e a sustentar as outras”,as Corporais, que “feitas semespírito, sem verdadeiramente amor,sentido de justiça” ficam “bastantevazias”.“As obras sem fé são vazias e, porisso, quer da parte de quem sedirige aos outros, quer danecessidade dos outros, devíamosestar muito atentos às suasnecessidades espirituais”, disse osacerdote da Companhia de Jesus(Jesuítas).À Agência ECCLESIA, nestecontexto, o religioso que nos seusserviços pastorais tem-se dedicadotambém à Pastoral Universitária eao acompanhamento espiritualobserva a necessidade hoje, demaneira “muito especial”, daformação dos outros, “ajudá-los acrescer, a ter uma atitudepedagógica de perdão ecompreensão”.“Hoje parece que há formas quemisturam as duas, por exemplo, estaatenção em dar bolsas de estudo aquem não consegue encontrarformas de estudar é espiritual ecorporal porque não podemosseparar”,

exemplifica o padre Vasco Pinto deMagalhães.Na sociedade atual dos diversosecrãs de telemóvel, tablet,smartphone, computadores etelevisões o sacerdote Jesuíta alertapara a “grande ambiguidade”porque andam todos a comunicaruns com os outros “intensamentemas um bocadinho mascarados pordetrás do ecrã” e perde-se o“contacto, o toque” entre aspessoas.“A presença do olhar pode aparecerporque passamos a vida a mandarfotografias, uns para os outros, masé uma imagem que formato, nãoestou ali com a minha verdade toda,com a minha fraqueza”, desenvolve.Para o sacerdote na fraqueza dosoutros sente-se a própria “fraqueza,a debilidade e a fortaleza” e ointermédio do ecrã pode “disfarçar ecriar falsidade na comunicação”,mesmo que não seja pretendida.O padre Vasco Pinto de Magalhãesexplica que para si outra Obra deMisericórdia Espiritual é “acapacidade e a coragem dadenúncia da corrupção”, do abrir osolhos às pessoas que se calharestão

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a deixar-se corromper, a envolverem ambientes em que “já ninguémsabe quem é quem, onde está obem, onde está o mal”.“Abrir os olhos aos outros acho queé uma grande obra”, sublinha, numaentrevista no contexto do final doJubileu da Misericórdia, que terminaeste domingo quando o PapaFrancisco fechar a Porta Santa daBasílica de São Pedro, no Vaticano.Denúncia, anúncio bem feito emostrar o caminho são para o padrejesuíta Obras de Misericórdia umavez que o seu “paradigma” é o queJesus fez, ou seja, “anunciou ocaminho, mostrou o caminho edenunciou a

corrupção, os falsos caminhos, amentira”.A partir da sexta Obra deMisericórdia Espiritual - Sofrer compaciência as fraquezas do nossopróximo – o padre Vasco Pinto deMagalhães, com experiência aorientar diversos retiros, assinalatambém que “saber estar emsilêncio” também se podiaacrescentar às sete já existentes.“É no silêncio que mastigo astristezas e fraquezas do outro e asminhas. Se tenho medo do silêncio etenho de responder logo paramostrar a minha cultura e eficácia secalhar já estou a fazer curto circuitona comunicação”, acrescenta osacerdote da Companhia de Jesus.

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“Esperança de Ana – Viver na fé ador de não ter um filho.” “Àqueles que não podem ter filhos,lembramos que «o matrimónio nãofoi instituído só em ordem àprocriação (...). E por isso, mesmoque faltem os filhos, tantas vezesardentemente desejados, omatrimónio conserva o seu valor eindissolubilidade, como comunidadee comunhão de toda a vida»”

Papa Francisco na ExortaçãoApostólica Pós-Sinodal ‘Amoris

laetitia’ No culminar deste ano Santo daMisericórdia, e respondendo aoapelo do Papa Francisco de sermosrosto de uma Igreja de amor emisericordiosa, partilhamosconvosco “A Esperança de Ana”, umprojeto pensado em quem perdeuos seus filhos durante a gravidez ouprimeiros dias de vida, ou enfrentauma situação de infertilidade. Este éum projeto que nasce pela mão dehomens e mulheres tocados dealguma forma por estasexperiências de dor, e que propõeaos casais um itinerário pascaldesde o reconhecimento da ferida àdescoberta e aceitação do amor e

misericórdia de Deus que devolve aesperança e renova a nossa vida.Através de uma proposta concretade caminho de cura espiritual epsicológica antes de mais temoscomo obra de misericórdia "consolaros tristes", mas na procura de dartestemunho e ser mensageiros doEspirito Santo, concretizamosaquela que é a primeira obra demisericórdia espiritual: “dar bonsconselhos”.Esta primeira obra de misericórdiaespiritual toma formaessencialmente noacompanhamento aos casais e nasensibilização daqueles que comeles caminham: família, amigos,profissionais de saúde, sacerdotes.Assim, aos casais éproposto: que partilhem a sua dor,vezes demais vivida de formasolitária e envergonhada, com quemestá disponível para os escutar ecom quem vive ou viveu umaexperiência semelhante; queaceitem o desafio de percorrer umacaminhada de Esperança cristãapoiada nas promessas deDeus que “tanto nos momentosbons como nos maus, nos dácoragem

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e orienta o nosso agir”, como nossugere o Papa Bento XVI.Aqueles que acompanham ouvivem com estes casais sãodesafiados a ser facilitadores doprocesso de luto de umamaternidade/paternidade que sofreuum revés na sua concretização e acolaborar com os casais no seuprojeto de fecundidade conjugal,que se estende muito para lá darealidade biológica.Ajudamos a perceber que frasescomo: “Não se preocupem! Vão teroutro filho!” ou “Se calhar fizestemuitos esforços ou nãodescansaste o suficiente…” nãodevem ser empregues na interaçãocom casais que perderem os seusfilhos. A vinda de outro bebé nãodeverá nunca ser vista como umasubstituição, negando anecessidade de fazer o luto. Aomesmo tempo, muitos pais lidamcom um sentimento de culpadevastador por sentirem que nãocuidaram ou não fizeram o suficientepara manter o seu bebé com vida.Por outro lado, a oração com e pelocasal: “Vou rezar por si!” , oreconhecimento do seusofrimento “Lamento a vossa perda.Sei o quanto queriam este bebé.” ea disponibilidade para escutar eestar presente “Estou aqui e quero

ouvir-te.” São algumas dasabordagens dos facilitadores doprocesso de recuperação.Com a humildade e caridade que odar bom conselho exige, a partir doque nós próprios vivemos, jáescutámos, recebemos e damos,procuramos aconselharsensibilizando e despertando outrospara o acolhimento eacompanhamento dos casais quevivem estas situações, de modo quehaja bom senso nas palavras ditas,na compreensão de que a sua dor éreal e justificada, de que nãoignoramos as suas perdas,aprendendo a ter as palavras e osgestos necessários, ou por vezesainda mais simplesmente apresença e a escuta atenta. Parece paternalista e hoje nemsequer os psicólogos e ospsiquiatras querem dar conselhos.Em certo sentido bem porquefazem um atendimento maiscentrado no outro. Acho que àsvezes nos demitimos um bocadinhode apontar caminhos, sem impor,mas propor e hoje faz parte dapedagogia, já não é totalitária.padre Vasco Pinto de Magalhães

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«Ensinar os ignorantes» comatenção ao «cuidado com a cultura»O padre Vasco Pinto Magalhães, daCompanhia de Jesus (Jesuítas), nosseus serviços pastorais tem-sededicado à Pastoral Universitária eao acompanhamento espiritual eexplica a necessidade do “cuidadocom a cultura”, sobre a Obra deMisericórdia ‘Ensinar os ignorantes’.“Perceber que o mundo sem culturaou com cultura desviante ou semnoções de interculturalidade é ummundo muito pobre que se satisfazem saber meia dúzia de coisaspráticas mas sem entendimentoprofundo da realidade e isso é umagrande obra de misericórdiaensinar, educar”, disse à AgênciaECCLESIA.O padre Vasco Pinto Magalhãesassinala que é preciso “transmitiruma dimensão cultural para todos”porque, “às vezes”, existem“grandes elitismos, grandesdificuldades”, no âmbito da segundaObra de Misericórdia Espiritual -‘Ensinar os ignorantes’.Como exemplo, o sacerdote Jesuítaapresentou a “possibilidade dehaver ensino gratuito”, que é “umagrande obra de misericórdia”,bolsas de

estudos, permitindo que hajaqualidade no ensino.O entrevistado destacou também anecessidade de “formar bem osprofessores” para que na Obra deMisericórdia Espiritual ‘Ensinar osignorantes’ os “alunos difíceis” nãosejam desprezados e mandados“para fora sem mais” porque “esseproblema hoje existe”.A sociedade atual com maisinformação não é necessariamentemais culta e o sacerdote daCompanhia de Jesus alerta para orisco de ficar-se “muito nasuperficialidade” de haver evoluçãona informática, de “gerir bem osmeios tecnológicos”, mas “não teruma visão profunda das coisas”.Para o padre Vasco PintoMagalhães, o “problema ecológico”também devia fazer parte das Obrasde Misericórdia: “O cuidado quetenho que ter mas para isso épreciso ter cultura. Não ter fogachosdo aquecimento global sem mais. Oque é que isso é, como é que seaborda, que linguagem.”Neste contexto, observa que

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o número sete “não é fechado” masé simbólico e indica “vejam bem oque em cada ocasião podepromover a pessoa humana nassuas relações consigo, com osoutros, com Deus”.“Abrimos uma atenção centrada napessoa, não simplesmente criarmais um do nosso grupo mas odesenvolvimento pessoal”,acrescenta, tendo referido que a“história da linguagem, a história deuma verdadeira informação não-manipuladora” também podia fazerparte das Obras de Misericórdia.

O sacerdote Jesuíta que nosdiversos serviços pastorais tem-sededicado também PastoralUniversitária e ao acompanhamentoespiritual considera que a sociedadeindividualista, “que com grandetentação” se está a criar”, precisava“de uma denúncia”.“No fundo o paradigma das Obrasde Misericórdia é o que Jesus fez:Anunciou o caminho, mostrou ocaminho e denunciou a corrupção,os falsos caminhos, a mentira”,concluiu o padre Vasco Pinto deMagalhães.

O sacerdote Jesuíta que nos diversos serviços pastorais tem-se dedicado também 63

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O sacerdote Jesuíta que nos diversos serviços pastorais tem-se dedicado tambémPastoral Universitária e ao acompanhamento espiritual considera que a sociedadeindividualista, “que com grande tentação” se está a criar”, precisava “de uma denúncia”.“No fundo o paradigma das Obras de Misericórdia é o que Jesus fez: Anunciou ocaminho, mostrou o caminho e denunciou a corrupção, os falsos caminhos, a mentira”,concluiu o padre Vasco Pinto de Magalhães.

Falando da misericórdia divina,evocamos várias vezes a figura defamília que ama os seus filhos,ajuda-os, cuida deles, os perdoa. Ecomo pai, educa-os e corrige-osquando erram, favorecendo o seucrescimento no bem.É assim que Deus é apresentado noprimeiro capítulo do profeta Isaías,no qual o Senhor, como paiafetuoso mas também atento esevero, se dirige a Israel acusando-o de infidelidade

e corrupção, para o reconduzir aocaminho da justiça. O nosso textocomeça assim: «Ouvi, ó céus, epresta ouvidos, tu, ó terra, / porquefala o Senhor: / “Criei filhos e cuideideles, / mas eles prevaricaramcontra mim. / O boi conhece o seupossuidor, / e o jumento, amanjedoura do seu dono, / masIsrael não tem conhecimento, / omeu povo não entende”» (1, 2-3).Deus, mediante o profeta fala aopovo com a amargura de um pai

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desiludido: fez crescer os seusfilhos, e agora eles revoltaram-secontra Ele. Até os animais são fiéisao seu dono e reconhecem a mãoque os alimenta; ao contrário, opovo já não reconhece Deus,recusa compreender. Mesmo seferido, Deus deixa falar o homem, eapela-se à consciência destes filhosdegenerados para que se corrijam ese deixem amar de novo. Eis o queDeus faz! Vem ao nosso encontropara que nos deixemos amar porEle, pelo nosso Deus.A relação pai-filho, à qual comfrequência os profetas fazemreferência ao falar da relação daaliança entre Deus e o seu povo,desvirtuou-se. A missão educativados pais tem por finalidade fazê-loscrescer na liberdade, torná-losresponsáveis, capazes de realizarobras de bem para si e para osoutros. Ao contrário, por causa dopecado, a liberdade torna-sepretensão de autonomia, pretensãode orgulho, e o orgulho leva àcontraposição e à ilusão deautossuficiência.Eis então que Deus chama o seupovo: «Erraste o caminho».Afetuosa e amargamente diz o«meu» povo. Deus nunca nosrenega; nós somos o seu povo, omais malvado dos homens, a maismaldosa das

Muito importante porque está nadenúncia. Este Papa insiste emsermos inclusivos e não só comaqueles que concordam connoscomas tentar caminho deaproximação, ir às periferias, etentar que entrem. Obra deMisericórdia fundamental.A grande qualidade do amor é serinteligente, é saber aproximar-se,criar condições, não vou cair emcima do outro a oprimi-lo oudenunciá-lo mas antes de dizer-lhe uma coisa tenho de perceberse ele está capaz de a ouvir.padre Vasco Pinto de Magalhães

mulheres, os mais malvados dospovos são seus filhos. E este éDeus: nunca, nunca nos renega! Dizsempre: «Vem, filho». E este á oamor do nosso Pai; esta é amisericórdia de Deus. Ter um paiassim que nos dá esperança, nosdá confiança. Esta pertença deveriaser vivida na confiança e naobediência, com a consciência deque tudo é dom que vem do amordo Pai. E ao contrário, eis avaidade, a estultícia e a idolatria. Papa Francisco

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"Consolar os tristes", ou noutraformulação clássica "consolar osaflitos", lembra-nos um gestoconstante na vida de Jesus,plasmado nos evangelhos. Nãotemos dados sobre uma visita deJesus a prisioneiro algum, nuncalemos um relato de Jesus a vestiralguém indigente, e aquele que"não tinha onde reclinar a cabeça"não parece ter condições para darpousada a estrangeiros (xénos). Poroutro lado, gestos de consolação deJesus a pessoas tristes ou aflitas,temos uma inspiradora colecção: sóno capítulo sete de Lucas, Jesusconsola o Centurião que sentemorrer o seu servo íntimo('éntimos); ao entrar em Naim,consola uma mulher viúva (sempassado) que leva o seu único filhoa sepultar (sem futuro); e à mesa deSimão, um fariseu, consola umamulher em lágrimas, deixando-setocar por ela... lembramos aindatantos leprosos aos gritos pedindocompaixão, e o silêncio gritante damulher desesperada com “um fluxode sangue, havia doze anos”, aquem Jesus atende e ineditamentetrata por “minha filha”, indo já acaminho da casa de Jairo, um paiaflito por ver morrer a sua filhaúnica (Cf. Lc 8,40-56). Recordandoestes e outros

gestos, concluímos como opersonagem Simeão (Lc 2,25-35)que “esperava a consolação deIsrael”: Jesus é o consolador(parákletos).Aqueles que se dispõem a amar osoutros como Jesus nos amou, nãoficam indiferentes ao modo comoJesus consola: sem técnicas, àsvezes comove-se, umas vezespergunta, outras vezes não...simplesmente aproxima-se e deixaque se aproximem, toca e deixa queo toquem. Esta será a forma deconsolar dos discípulos de Jesus:reconhecemos que não temosreceitas, e que as palavras na horada aflição quase nunca servem...Dividimo-nos entre o imperativo dePaulo à comunidade de Tessalónica,confrontada com a morte dos seusqueridos, ainda a desenhar umaescatologia, “consolai-vos uns aosoutros com estas palavras” (1 Tes4,18), e a indignação de Job quechama “consoladores importunos”(Job 16,2) aos amigos convencidosque conseguem consolar a sua dorcom discursos religiosos, meiomoralistas, meio supersticiosos, ecom inquéritos pretensiosos dequem vai descobrir o porquê dosofrimento.A aflição, a desolação, a profundatristeza prendem-se com “mortes”

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e medo de mortes, entendendo“morte” no sentido lato das coisas,circunstâncias, condições, relaçõese pessoas que se perdem, ouameaçam perder-se. Falamos demorte da saúde na chegada de umadoença grave; de morte dasrelações quer com odesaparecimento daqueles queamamos, quer com o corte doslaços... e se falamos de “mortes”, aconsolação acontece no mesmocaminho onde permitimos que ooutro faça o seu luto: chore os seusmedos, as suas perdas, as suas

Ter grande sensibilidade, aquelacoisa da bíblia das entranhas, decomover as entranhas, que é deser próximo, não é umaspalmadinhas nas costas, écompreender, mostrar ao outroque estou próximo, a sentir comele, a fazer caminho porque o queconsola não é dizer deixa lá queisso passa. Consolar é dar aooutro a certeza que estáacompanhado, que nãoabandono, que faço caminho comele.padre Vasco Pinto de Magalhães

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revoltas, as suas angústias eabsurdos.Talvez o mais importante nocaminho da consolação seja oprefixo “com”. Talvez o maisimportante seja a presença, aproximidade, a companhia. Talvez omais importante seja a possibilidadede me sentir acompanhado agoraque a perda, ou a ameaça daperda, me faz sentir mais só. Talvezo mais importante seja sentir quequem está comigo me permite agir ereagir sem censura. E quemexperimentou a aflição conhece osabor ácido das expressões: “nãochores”, “tudo vai ficar bem”, “nãodigas isso”, “Jesus também sofreu”,“Deus ama-te”...

A arte da consolação germina nohúmus da proximidade, regada pelosilêncio. E tal como na linguagem daterra, a consolação tem os seus tempos, os seus ritmos, os seusciclos. Os que se dispõem a serconsoladores admitem que não háreceitas para consolar, aceitam pisaro mesmo chão, calçar os mesmossapatos, vestir a mesma pele dooutro, o mesmo é dizer, recusam aarrogância de se escudarem emfrases feitas, em discursos econceitos mais ou menos teológicos,em soluções pré-fabricadas, emtécnicas de consolação. Os que sedispõem a ser consoladores nãoimpõem direcções para o

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caminho, nem forçam sequer aandar: aprendem a saborear osilêncio e a respeitar o ritmo lentode quem parece que não quer serconsolado e prefere que caia acortina. Escutam o sofrimento,deixam que quem está aflito sugiragestos, tempos, silêncios, palavras,abraços, carícias, distâncias paraque tudo isso possa servir-lhe deconsolação.Nas 14 obras de misericórdia – e emquantas mais se quiserem juntar – abeleza está na verdade de seremfamintos e sedentos a alimentarfamintos e sedentos,desconhecedores a ensinardesconhecedores, estrangeiros aacolher estrangeiros, frágeis quecuidam de frágeis, frágeis queconsolam frágeis. O reconhecimentoda semelhança, de que o outro é apresença de Deus mais perfeita queme é oferecida, o reconhecimentode que o outro – segundo E.Levinas – é esse que irrompe e mesalva da minha mesmidade, é aúnica via geradora de misericórdia,a única via de aproximação ao Deusde Jesus, que se encantou com anossa carne, a ponto de se fazer umde nós.

Se deixar enraizar no coração aexpressão que Mateus no capítulo25 coloca na boca de Jesus: “decada vez que o fizestes a um dosmeus irmãos mais pequeninos, amim o fizestes”, não será tão difícillembrar que quando acolho alguémaflito, angustiado, triste, é o próprioJesus, o meu amante, o meu dono,que estou a consolar.

António Pedro Monteiro(Padre, Capelão no Hospitalde Santa Maria, em Lisboa)

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As Escolas de Perdão eReconciliação (ESPERE) são umaação de transformação pessoal,comunitária e social. Partindo deuma metodologia inovadora, queabrange o pensar, o sentir, o agir eo transcender, as ESPERE dotam osparticipantes de ferramentas etécnicas para poderem trabalhar egerir emoções como a raiva, oressentimento, o rancor e osdesejos de retaliação, permitindo,pelo perdão, sarar e superar asmemórias ingratas do passado.A violência gera violência. Diantedesta irracionalidade, as ESPEREpropõem a irracionalidade doperdão. Perdoar não é fácil! É parafortes! É um exercício de ascensohumano, de passar do cérebroreptiliano, arcaico, dos instintos,para um cérebro mais evoluído - oneocórtex -, marcado pela bondade,pela compaixão. O perdão é um dom, um presenteque se dá a si mesmo e ao outro;uma poderosa ferramenta plasmadano mandato missionários de Jesus:“Ide, perdoai os pecados!”, diz aosapóstolos. O perdão é gerador defuturo, de novas narrativas quepodem levar à reconciliação. “Semperdão não há futuro”, profetizava

Desmond Tutu, que, com Mandela,esteve por detrás de uma das maisbelas narrativas de transformaçãohumana e social da História, aoproporem ao seu país o caminho doPerdão e da Reconciliação,superando raivas e rancoresalimentados pelo apartheid.O perdão não é esquecer, érecordar com um novo olhar, re-significando a ofensa sofrida,tentando que a vitima não setransforme também ela num ofensor,entrando no ciclo vicioso daviolência. Perdoar é optar pelajustiça restaurativa, que passa pelamisericórdia: reparar a vitima erestaurar o ofensor.As ESPERE - presentes em 18países, Portugal incluído, ereconhecidas pela UNESCO, em2006, recebendo um prémio pelapaz -, foram fundadas pelo padrecolombiano Leonel Narváez; em2003, ele que tem sido um dosgrandes mediadores do conflitoentre as FARC e o governocolombiano, em vista da Paz tãodesejada.Os cursos ESPERE, de cerca de 35horas, podem ser adaptados avários horários e focos: Eclesial,escolar,

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juventude, prisional, familiar, bairrossocias, ...Perdoar as injúrias supõe a recusaa alimentar o rancor e oressentimento. Perdoar “setentavezes sete”, ou seja, sempre. É operdão hiperbólico, aqui na suamáxima expressão. “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o quefazem” (Lc 23, 34);Um dia um jovem, ao terminar

um Curso ESPERE, desabafou: naminha paróquia sempre medisseram que devia perdoar, masnunca me ensinaram como deviafazê-lo. E as ESPERE ajudaram-mea fazê-lo.O perdão é a expressão maisevidente da misericórdia; é umimperativo do qual não podemosprescindir. Um cristão que nãoperdoa, não é cristão!

Albino Brás

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É descrito como um “lugar seguro”,para “renovar, reconstruir erecuperar”, em ambiente de apoio,de total confidencialidade, “ondeninguém faz juízos e onde todospodem expressar e encontrarreconciliação para as suasdolorosas vivências pós aborto”. Alise encontram mulheres queoptaram por abortar ou quesofreram um aborto espontâneo;homens que acompanharam assuas mulheres; pais que estiverampresentes na tomada de decisão;técnicos de saúde que nas suasprofissões tiveram de lidar com ainterrupção de uma gravidez.O que a Vinha de Raquel propõe éum caminho para a recuperação daharmonia interior, um tempo parafazer o luto, tão necessário comoigualmente negado a quem tomou aopção de interromper uma gravidez.“O perdão é essencial paraqualquer processo terapêutico e umdos temas essenciais da vida”,indica Maria José Vilaça, psicóloga euma das responsáveis, em Portugal,por esta resposta integrada nodepartamento da pastoral familiardo Patriarcado de Lisboa.

Num encontro a que a organizaçãochama de retiro, e onde é dado oprimeiro passo para a cura, não seapaga o passado mas procura-seum alívio para que, gradualmente,se consiga a partir da vivência de“um mal entendê-lo como um bem”.E isto é um processo, com avançose recuos. Através de técnicas etrabalho em grupo a pessoa iniciaum caminho de reconciliação, emprimeiro lugar consigo própria,levando-o a uma quebra de um ciclovicioso – que não ocasionalmentedura anos – onde a culpa e aagressividade são apaziguadas.“Durante anos vivi em silêncio apensar que Deus não me perdoava,que a minha filha não me perdoava.Católica, afastei-me da Igreja que,pensava, me julgaria, e procurei,consecutivamente no sacramento dareconciliação o perdão queconscientemente não reconhecia”,descreve quem passou pelaexperiência do aborto.“Hoje sei que a minha filha é umdom de Deus”, reconhece olhandopara a sua vida redimida, que nãoesquece o passado porque afragilidade

Num encont72

humana assim o dita mas com acapacidade de encontrar nasdecisões vividas um passaportepara entender que o perdão épurificador.Diz o Papa Francisco que amisericórdia não é uma teoria masum testemunho concreto e queperante a necessidade dos outros édever do cristão olhar, escutar,acolher, cuidar, aliviar.O trabalho que a Vinha de Raqueldesenvolve concretiza a certeza deque “ninguém é irrecuperável paraDeus”. Assumir o perdão ou ajudaroutro a alcançar o perdão são obrasde misericórdia.

É um bocadinho o jogo daverdade e, esta coisa, está namoda da resiliência. É precisoaguentar embates, não ficar logorevoltado, não querer logoresponder, pagar à letra. É muitoimportante ter essa leitura, somosmuito rápidos a julgar numaatitude defensiva. Despojar-me domeu ego de alguma maneira parapoder sintonizar, ter empatia.Hoje há muito counseling[aconselhamento], e essas coisastodas fora da Igreja, queantigamente chamávamos direçãoespiritual. Se com as desgraçasdo outro também perco equilíbrioou com a violência não tenhoarcaboiço para pacificar há muitoimediatismo que estraga arelação.padre Vasco Pinto de Magalhães

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Há também sete obras demisericórdia chamadas«espirituais», relativas a outrasexigências igualmente importantes,sobretudo hoje, porque tocam oíntimo das pessoas e comfrequência fazem sofrer mais.Certamente todos se recordam deuma que entrou na linguagemcomum: «Suportar pacientementeas pessoas inoportunas». E há; hámuitas pessoas inoportunas!Poderia parecer algo semimportância, que nos faz sorrir, mascontém um sentimento de caridadeprofunda; e assim é também para asoutras seis, que é bom recordar:aconselhar os que têm dúvidas,ensinar os ignorantes, advertir ospecadores, consolar os aflitos,perdoar as ofensas, rezar a Deuspelos vivos e pelos mortos. Sãoações diárias! «Sinto-me aflito...» —«Mas Deus ajudar-te-á, não tenhotempo...». Não! Paro, ouço, perco omeu tempo e consolo a pessoa,este é um gesto de misericórdia queé feito não só a ela mas também aJesus!Ao longo dos séculos, muitaspessoas simples as puseram emprática, dando assim testemunhogenuíno da fé. Por outro lado, aIgreja, fiel ao seu Senhor, nutre umamor preferencial pelos

mais débeis. Frequentemente sãoas pessoas mais próximas de nósque precisam da nossa ajuda. Nãodevemos ir em busca de sabe-se láquais feitos a realizar. É melhoriniciar pelas mais simples, que oSenhor nos indica como as maisurgentes. Infelizmente num mundoatingido pelo vírus da indiferença,as obras de misericórdia são omelhor antídoto. De facto, orientama nossa atenção para as exigênciasmais elementares dos nossos«irmãos mais necessitados» (Mt 25,40), nos quais Jesus está presente.Jesus está sempre presente neles.Onde houver uma necessidade,uma pessoa carente, quer materialquer espiritualmente, Jesus está ali.Reconhecer o seu rosto no de quemé carente é um verdadeiro desafiocontra a indiferença. Permite queestejamos sempre vigilantes,evitando que Cristo passe ao nossolado sem que o reconheçamos.

Papa Francisco

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A Oitava Maravilha do MundoUma das grandes novidades que oPapa anunciou no âmbito do Ano daMisericórdia que em breve terminafoi uma oitava Obra deMisericórdia... o cuidar da casacomum.A proposta deste desafio foi lançadano passado 1 de setembro no “DiaMundial de Oração pelo Cuidado daCriação".Em primeiro lugar, por que razão?Alerta o Papa que“nada mais une a Deus do que umato de misericórdia”logo, o que está em jogo não émais, nem menos, do que a nossaunião com Deus. Depois, importaexplicar melhor o que significa fazerdo cuidar da casa comum uma Obrade Misericórdia. Diz que,Como obra de misericórdiaespiritual, o cuidado da casa comumrequer «a grata contemplação domundo», que «nos permitedescobrir qualquer ensinamentoque Deus nos quer transmitiratravés de cada coisa».Como obra de misericórdia corporal,o cuidado da casa comum requeraqueles «simples gestosquotidianos, pelos quais quebramosa lógica da violência, da exploração,do egoísmo» e se manifesta o amor«em

todas as ações que procuramconstruir um mundo melhor».O Papa não propõe algo teórico,mas antes uma teoria enraizada naprática. Por isso, na parte dedicadaa “mudar de rumo”, dá exemplosconcretos sobre atitudes ecomportamentos concretos maisrespeitadores da criação. Sãoesses:- a utilização judiciosa do plástico edo papel,- não desperdiçar água, comida eeletricidade,- diferenciar o lixo,- tratar com desvelo os outros seresvivos,- usar os transportes públicos epartilhar o mesmo veículo comvárias pessoas,- etcHá alguma novidade nestaspropostas? Não. A questão não estáno que fazer, mas antes no sentidocom que o fazemos. Esse sentidoestá associado a uma mudança noestilo de vida. Como diz o PapaFranciscoum estilo de vida profético econtemplativo, capaz de gerarprofunda alegria sem estarobcecado pelo consumo.Se pensarmos bem, a verdadeira

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conversão ecológica não se dá nosgrandes eventos, grandes ações,grandes… mas no que é pequeno,normal, diário. O quotidiano éa chave de uma verdadeiraconversão ecológica e essa começacom gestos simples. Porém, gestosque contemplam uma parteparticular da natureza… os outros.Sim, as outras pessoas.“Aquele que não ama o seu irmão, aquem vê, não pode amar a Deus, aquem não vê” (1 Jo 4, 20).Pequenos atos de amor concretoscom os nossos irmãos são umprimeiro passo para uma conversãoecológica, pois reconhecemos queos outros são natureza também.Podemos dar espaço numa fila detrânsito, lugar a uma pessoa queestá de pé num transporte público,partilhar fruta ou legumes quetemos a mais com o nosso vizinho,dar um sorriso sincero a quem nosatende numa repartição pública, sero primeiro a perder numa discussãopor amor ao outro, zangar-memenos na estrada, ser delicado coma pessoa que está na caixa de umsupermercado. Quantos gestospequenos não podem converter odia chuvoso de alguém, num dia desol resplandecente.

Se, por vezes, não nos damos contadas dores, sofrimentos enecessidades dos outros, com quesensibilidade havemos de percebero que significa cuidar da casacomum? Como afirma o Papa “nummundo, infelizmente, atingido pelovirus da indiferença, as obras demisericórdia são o melhor antídoto”.Por outro lado, a poucasensibilidade provém,frequentemente, do poucoconhecimento que temos dos ritmosdo nosso planeta. Esse é um grandedesafio - na minha opinião -pastoral. Não chega explorar asrazões teológico-espirituaisdo cuidar da casa comum. Comoposso cuidar o que nãocompreendo? Quando formoscapazes de incluir o conhecimentocientífico do mundo na experiênciaespiritual e corporal de uma Obra deMisericórdia, através de um diálogofecundo entre ciência e religião, onosso olhar converter-se-ia emrelação ao que o nosso planetaTerra é, realmente… a oitavamaravilha do mundo.

Miguel Oliveira Panão(Professor Universitário)

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Doenças raras onlinehttp://www.rarissimas.pt/ Decorreu, no Vaticano, entre os dias10 e 12 deste mês a XXXIConferência Internacionalpromovida pelo Conselho Pontifíciopara a Pastoral da Saúde sob olema “Por uma cultura da saúdeacolhedora e solidária ao serviçodas pessoas afetada por doençasraras e descuidadas”. Numamensagem enviada aosparticipantes o Papa Franciscodisse “que os profissionais de saúdetêm de se comprometer com as‘periferias assistenciais do mundo’,tratando as pessoas afetadas pordoenças ‘raras e descuidadas’”.Assim esta semana a minhaproposta passa por uma visita aosítio da associação nacional dedeficiências mentais e raras –Raríssimas. Apesar de já não ser aprimeira vez que trago a esteespaço este sítio, considero queexistem projetos intemporais e queprecisam de ser colocados na linhada frente, este claramente é umdesses.Esta organização existe “para apoiardoentes, famílias, amigos de sempree de agora que convivem de pertocom as doenças raras”. Osprincipais objetivos passam pororganizar congressos e seminários,acções de formação devoluntariado,

pesquisar doenças raras, efetuarestudos epidemiológicos, dar apoiodomiciliário ao portador e à família eainda realiza pareceriasinternacionais.Logo na página inicial, encontramosum espaço carregado de conteúdos,onde estão presentes as notícias,os destaques e as campanhas emfuncionamento, bem como, asligações para a presença destaassociação nas redes sociais(facebook, twitter, linkedin eyoutube).Na opção “quem somos”, ficamos asaber que esta associação foifundada em abril de 2002 e queatualmente em Portugal existemcerca de 800 mil portadores dedoenças raras e várias centenas dedoentes por diagnosticar. É aindapossível sabermos quais são amissão e os valores que estãopresentes nesta organização, qual asua história, os seus projetos, osórgãos sociais e os documentosoficiais. Em conselho científicodescobrimos quem são osprofissionais de saúde quecompõem este importante órgãodesta associação. Por outro lado emconselho consultivo, podemosaceder ao curriculum de todas aspersonalidades que integram esteórgão de reflexão estratégica.No item “faq” encontramos asperguntas mais frequentes que

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certamente podem ser feitas pormuitos de nós.Em média, temos à nossa frentetodos os registos que foram sendonotícia nos meios de comunicação,desde artigos em jornais, revistas eboletins, passando pela mostra deregistos fotográficos de exposições,encontros e outros eventos,terminando num mural de vídeosque de alguma forma estãorelacionados com a raríssimas.Por último em “publicações”,

acedemos a todas as edições darevista “páginas raras” que “é umapublicação bimensal que tem comoobjetivo a divulgação de informaçãosobre doenças raras”.Portugal deve à Raríssimas o factode hoje se falar em doenças raras,por isso memorize este endereçodado que nem todos somos iguais.

Fernando Cassola Marques

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D. Manuel Clemente de A a Z

“Joga-se aqui o essencial – Umolhar sobre o que somos” é o títulodo livro de D. Manuel Clemente,apresentado a 14 de novembro emLisboa num diálogo com Maria JoãoAvillez e a intervenção de noveleitores da sua obra.Jaime Gama, uma daspersonalidades convidadas areferir-se ao percurso de D. ManuelClemente, afirmou que o livro hojeapresentado marca “uma

viragem interessante” na publicaçãoeditorial do cardeal-patriarca deLisboa por acontecer numa“comunicação mais direta com aopinião pública através de um livroque é de leitura fácil”.Publicado pela ‘Assírio & Alvim’, ostextos publicados na obra hojeapresentada na UniversidadeCatólica Portuguesa dizem respeitoa intervenções de D. ManuelClemente

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desde 2013 até ao presente e estãoorganizados por temas, de A a Z,desde ‘Amor’ a ‘Zygmunt Bauman’.Para o antigo presidente daAssembleia da República, opensamento de D. Manuel Clementeestá fundamentado no estudo daHistória em épocas “em que a IgrejaCatólica atravessou momentos dedificuldade, de problematização”.“Alguém que pensa o catolicismo emtempos difíceis está preparado comabertura, atenção e respeito paracompreender a sociedade”, afirmouJaime Gama, acrescentando que D.Manuel Clemente “marcha com opasso certo” e “não precisa deacertar o passo”.Para além de Jaime Gama,Fernando Ulrich, Paula MouraPinheiro, António Lobo Xavier, PedroMexia, José Manuel Pureza, LeonorXavier, Joana Carneiro e ArturSantos Silva comentaram também aobra hoje apresentada e ocontributo de D. Manuel Clementepara o diálogo cultural na sociedadeatual.Durante o diálogo com Maria JoãoAvillez, o cardeal-patriarca deLisboa foi convidado a lembrar arelevância no seu percurso dotempo em que foi bispo do Porto,referiu-se à comemoração dos 300anos da

qualificação patriarcal da Diocesede Lisboa, ao Sínodo Diocesano eao centenário de FátimaD. Manuel Clemente terminou odiálogo de apresentação do livro‘Joga-se aqui o essencial’ referindoque “a esperança é a criação dofuturo”. “Nós criamos futuro porquesabemos que não nos esgotamosno presente, nem tudo aquilo quetemos como projeto nem tudo aquiloque nos amachuca como opção. E émuito alimentada pela esperançados outros, que vão alimentando anossa”, afirmou.“A esperança move-nos no futuro”,concluiu.

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II Concílio do Vaticano: AlfredoBruto da Costa «assinou» o Pactodas Catacumbas

O espírito do «Pacto das Catacumbas» guiou algumasdas melhores iniciativas cristãs das últimas décadas eteve alguma – não tanto como se esperava -repercussão no universo católico. O texto assinadopelos cerca de 40 bispos nas catacumbas de Domitila(Itália-Roma) foi um guião de vida para Alfredo Brutoda Costa, falecido a 11 deste mês com 78 anos.O conteúdo deste documento, redigido e assinado porquarenta padres participantes no II Concílio doVaticano, dia 16 de novembro de 1965, pouco antesda conclusão da assembleia magna, ficou cunhado naobra e na vivência. do antigo ministro.Renovar o compromisso assumido por toda a Igrejapara transformar a vida humana e construir um mundofundado na solidariedade e na justiça, a partir doevangelho dos pobres foi a linha condutora do antigopresidente da Comissão Nacional Justiça e Paz(CNJP), engenheiro Alfredo Bruto da Costa. Para esteestudioso da pobreza, a dignidade humana é a chavedo evangelho.O «Pacto das Catacumbas» pretendia ser um texto eum compromisso concreto que colocava os pobres noaltar e nas prioridades da Igreja. Esse foi o estilo devida do engenheiro Bruto da Costa. Na história, paraalém do seu exemplo de cidadania, fica o combatentecontra a pobreza e a exclusão social. Numa entrevista,concedida a um jornal diário, em 2007, o antigoministro e conselheiro de Estado dizia: “Discordo dafrase «não dês o peixe, dá a cana». Se só deres opeixe, ele só comerá hoje. Se, além do peixe, deres acana, ele comerá

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hoje o resto da vida. Não vale denada dar a cana a alguém que estácom tanta fome que não podesequer levantar-se para chegar aorio para pescar”.Alfredo Bruto da Costa esteveassociado aos maiores avanços naspolíticas sociais das últimasdécadas em Portugal. Para estedoutorado em Sociologia, que faziaparte de um grupo de trabalho quedelineou um roteiro para umaEstratégia Nacional de Erradicaçãoda Pobreza (ENEP), o combate aeste flagelo não pode

ser feito de forma pontual edispersa. Apelava a umcompromisso duradoiro que desseconsistência a uma ação quevisasse “não apenas reduzir osofrimento do pobre, o que écertamente necessário, mas tambémajudá-lo a libertar-se da pobreza”.Alfredo Bruto da Costa não estevenas Catacumbas de Domitila, mas otexto assinado por aqueles padresconciliares, há cerca de cincodécadas, cunhou a vida destecristão nascido em Goa (India).

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novembro 201619 de novembro. Vaticano - Terceiro consistório dopontificado de Francisco. . Fátima - Domus Carmeli - OSecretariado Nacional da EducaçãoCristã promove uma formação paraprofessores de escolas católicascom o tema “A interioridade comoparadigma educativo”. . Fátima - Hotel Cinquentenário -Assembleia geral da CNIS . Leiria - Iniciativa «A Solidariedadebrilha no Mercado Sant´Ana»promovida pela Cáritas Diocesanade Leiria (termina a 20 denovembro) . Lisboa - Igreja de São Domingos -Encontro Diocesano deAdolescentes vai ser um«YOUCATday» . Fátima - Lisboa, 15 nov 2016(Ecclesia) - O conselho geral daCáritas Portuguesa realiza-se, estesábado e domingo, em Fátima, noConsolata Hotel, onde vai serapresentado o Plano Estratégico daCáritas em Portugal 2017/20.(termina a 20 de novembro)

. Lamego - 5º aniversário danomeação de D. António Couto parabispo de Lamego . Fátima - Centro João Paulo II - Encontro das Santas Casas daMisericórdia . Lisboa - Seminário dos Olivais,10h00 - Encontro de formação paraagentes da Pastoral do Batismo. . Santarém - Torres Novas (Casa S.José de Cluny), 15h00 - Conferência sobre «Porqueduvidamos do dever de proteger avida humana» por Luís Silva,presidente da Associação de Defesae Apoio à Vida de Aveiro, epromovida pela Acção Católica Ruralda Diocese de Santarém. . Aveiro, 15h30 - Inauguração dasede regional do Corpo Nacional deEscutas (CNE) presidida por D.António Moiteiro, bispo de Aveiro . Funchal – Sé, 16h00 - Celebração do encerramento do Jubileu daMisericórdia na Diocese do Funchal . Lisboa - Igreja de Santo António doEstoril, 17h00 - Vigília de oração etestemunhos de D. Bashar Warda eda irmã Guadalupe

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. Coimbra – Febres, 21h00 - Festival Jovem Diocesano daCanção . Algarve - Centro Pastoral de Pêra,21h00 - Festival Diocesano Jovemda Canção de Mensagempromovido pelo Sector da PastoralJuvenil da Diocese do Algarve 20 de novembro. Encerramento do Ano daMisericórdia . Leiria – Sé - Encerramento do Anoda Misericórdia com ordenação dediácono. . Setúbal - Almada (Cristo Rei) - Osresultados do projeto deorganização, descrição e difusão doArquivo do Santuário de Cristo Reivão ser apresentados, dia 20 destemês, na reitoria daquele santuário. . Setúbal - XV aniversário do«Notícias de Setúbal» . Santa Sé - Celebração do DiaMundial pelos Direitos da Infância eda Adolescência . Fátima - Encerramento dascelebrações do Centenário dasAparições do Anjo da Paz, emFátima,

com a inauguração de umaescultura da autoria de ClaraMenéres. . Leiria, 10h00 - Caminhadasolidária promovida pela CáritasDiocesana de Leiria . Lamego – Sé, 15h30 - Encerramento do Ano daMisericórdia e ordenações diaconaisna Diocese de Lamego. . Porto – Sé, 16h00 - Encerramento do Jubileu daMisericórdia na Diocese do Porto . Lisboa - Igreja de Santos-o-Velho,16h00 - Concerto solidário depolifonia antiga integrado noFestival «SacroSanctus». . Coimbra - Sé Nova, 16h30 - Encerramento do Ano daMisericórdia com celebraçãopresidida por D. Virgílio Antunes,bispo de Coimbra. . Setúbal - Santuário de Cristo Rei,17h00 - Vigília de oração etestemunhos de D. Bashar Warda eda irmã Guadalupe . Aveiro – Sé, 19h00 - Encerramentodiocesano do Ano da Misericórdiapresidido por D. António Moiteiro,bispo de Aveiro.

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Acontece este sábado no Vaticano oTerceiro consistório do pontificado de Francisco, paraa criação de 17 cardeais - incluindo 13 eleitores (commenos de 80 anos), vindos de 11 países.. Por cá, em Fátima, na casa Domus Carmeli, oSecretariado Nacional da Educação Cristã promove uma formação para professores de escolascatólicas com o tema “A interioridade como paradigmaeducativo”. Durante o dia por Lisboa decorre oEncontro Diocesano de Adolescentes, um«YOUCATday», promovido pelo setor da Catequesedo Patriarcado de Lisboa e destinado aosadolescentes e jovens do 7.º ao 10.º Ano. Já em Coimbra – Febres, pelas 21h00 acontece oFestival Jovem Diocesano da Canção e também noAlgarve - Centro Pastoral de Pêra pelas 21h00,Festival Diocesano Jovem da Canção de Mensagempromovido pelo Sector da Pastoral Juvenil da Diocesedo Algarve. No domingo, na Santa Sé, vai ocorrer a Celebração doDia Mundial pelos Direitos da Infância e daAdolescência, para sublinhar a importância deassegurar o acesso das novas gerações à escola.

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Programação religiosa nos media

Antena 1, 8h00RTP1, 10h00Transmissão damissa dominical

11h00 -Transmissão missa

Domingo: 10h00 - ODia do Senhor; 11h00- Eucaristia; 23h30 -Ventos e Marés;segunda a sexta-feira:6h57 - Sementes dereflexão; 7h55 -Oração daManhã; 12h00 -Angelus; 18h30 -Terço; 23h57-Meditando; sábado:23h30 - TerraPrometida.

RTP2, 13h00Domingo, 20 de novembro- Misericordiar: 15 obraspara continuar o Jubileu Segunda-feira, dia 21, 15h00 - Entrevista a D. Manuel Linda,sbre o Jubileu da Misericórdia Terça-feira, dia 22, 15h00 - Informação e entrevista aMendo Castro Henrique sobreo Congresso "Tomás Moro e o Sonho de um mundomelhor" Quarta-feira, dia 23, 15h00 - Informação e entrevistaao padre Nuno Amador sobre o projeto juvenil "EuAcredito" Quinta-feira, dia 24, 15h00 -Informação e entrevista a Isabel Figueiredo, Jorge Reis-Sá sobre o livro"Advento para Crentes e para não-crentes". Sexta-feira, dia 25, 15h00 - Análise à liturgia dedomingo com o cónego António Rego e o padreArmindo Vaz. Antena 1Domingo, dia 20 de novembro - 06h00 - O perdão Segunda a sexta-feira, dias 21 a 25 denovembro - 22h45 - 300 anos do Patriarcado deLisboa: O Musical; Nectalks; Congresso dasAssociações de Profissionais Católicos; Sínodo: padreRui Pedro Carvalho e Jorge Wemans.

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Ano C – 34.º Domingo do TempoComum O Rosto daMisericórdiareina em nós

Neste último domingo do ano litúrgico, Solenidade deCristo Rei, a Palavra de Deus convida-nos a tomarconsciência da realeza de Jesus, em particular noquadro que Lucas nos apresenta no Evangelho.Aí está a famosa inscrição, que define Jesus como«Rei dos Judeus», plena de ironia: Ele não estásentado num trono, mas pregado numa cruz; nãoaparece rodeado de súbditos fiéis que O incensam eadulam, mas dos chefes dos judeus que O insultam edos soldados que O escarnecem; Ele não exerceautoridade de vida ou de morte sobre milhões dehomens, mas está pregado numa cruz, indefeso,condenado a uma morte infamante… Não há aquiqualquer sinal que identifique Jesus com poder, comautoridade, com realeza terrena.Mas essa inscrição da cruz descreve com exatidão asituação de Jesus na perspetiva de Deus: Ele é o reique preside, da cruz, a um Reino de serviço, de amor,de entrega, de dom da vida. Neste quadro, explica-sea lógica desse Reino de Deus que Jesus veio proporaos homens.O quadro é completado por uma cena bemsignificativa para entender o sentido da realeza deJesus. Ao lado de Jesus estão dois malfeitores,crucificados como Ele. Jesus é insultado por um, arepresentar aqueles que recusam a proposta doReino. O outro pede: «Jesus, lembra-Te de mimquando vieres com a tua realeza». A resposta deJesus a este pedido, «hoje mesmo estarás comigo noparaíso», indica que a salvação definitiva começa atornar-se realidade a partir da cruz. Na cruz manifesta-se plenamente a realeza de Jesus que é perdão,renovação do homem, vida plena; e essa realeza desalvação abarca todos sem exceção, mesmo oscondenados e excluídos.Celebrar a Festa de Cristo Rei do Universo é celebrar

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um Deus misericordioso que serve,que acolhe e que reina noscorações com a força desarmada doamor. A cruz é o trono de um Deusque recusa qualquer poder eescolhe reinar no coração doshomens através do amor e do domda vida.A todos nós, que somos Igreja deJesus, ainda nos falta muita coisapara interiorizar a lógica da realezade Jesus. A Igreja precisa decontínua purificação e conversão,de renovar a atitude de serviço e deacolhimento, sempre nacontemplação do Senhor na cruz,que é contemplação de tantospróximos crucificados na vida.

Termina hoje o Ano Santo daMisericórdia, mas não termina odinamismo da misericórdia quesomos chamados a assumir naplena contemplação de Jesus Cristo,Rosto da Misericórdia. Ele reina nosnossos corações e nas nossascomunidades, em toda a Igreja e nomundo, sempre na plena oblação dacruz. Façamos por isso, parasermos fiéis e felizes ao únicoSenhor das nossas vidas, que nosfecunda com toda a sua ternura emisericórdia.

Manuel Barbosa, scjwww.dehonianos.org

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Em Maroua as Igrejas estão cheias apesar doterrorismo

A força da oraçãoNos Camarões, há uma diocese,na fronteira com a Nigéria, ondeninguém está a salvo. Noentanto, apesar da violênciaislamita, dos atentados quenunca têm hora marcada, oscristãos são um exemplo paratodos nós. O terrorismo do BokoHaram bateu-lhes à porta, éverdade, mas não os venceu Camarões. Fevereiro de 2016, vilade Nguetchéwé, perto de Maroua.Duas jovens com apenas 13 anosfazem-se explodir no meio de umapequena multidão que seencontrava no cemitério local.Ninguém teve dúvidas de que setratou de mais um ataque daresponsabilidade do grupo islamitaBoko Haram que procura instaurarna região o islão mais radical. Oscristãos de Maroua vivem inquietos.Ninguém se sente seguro em lugaralgum. Ceder ao medo, porém, édar a vitória aos terroristas. Porisso, sempre que o Bispo vaicelebrar a missa de domingo, oscristãos dão as mãos uns aosoutros fazendo como que um cordãode segurança para impedir quealguém se infiltre na comunidade,para tentar impedir atentados comoo de Fevereiro, no cemitério.

Não é fácil prevenir o terror. OBispo, D. Bruno Ateba Edo,reconhece que essa é quase umabatalha perdida. “Vivemospermanentemente com medo denovos atentados. Há como que umapsicose colectiva”, explica o preladoà Fundação AIS. No entanto, asmissas continuam a arrastarmultidões, as igrejas continuamcheias de fiéis. O Bispo fala dissocom toda a naturalidade. É a receitada fé contra o terror: “A oração é anossa força e esperança.Necessitamos da oração equeremos rezar. Rezarmos emcomunidade é um sinal deesperança.” A ajuda da AISO Boko Haram tem obrigadomilhares de pessoas a fugir de suascasas. Só na diocese de Maroua-Makolo vivem mais de 80 milpessoas provenientes da Nigéria.Estes oitenta mil refugiados sãoapenas uma gota no imenso oceanode tragédia que o Boko Haramtrouxe para esta região de África.“Nós procuramos apoiá-los dentrodas nossas possibilidades”, explicaD. Bruno Edo. Mas a diocese épobre, muito pobre. O Bispo vivenuma

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pequena habitação sem casa debanho sequer. No entanto, tal comoele, os cristãos estão sempre debraços abertos prontos a acolherquem mais necessita, prontos arepartir o pouco que possuem.Apesar da pobreza da comunidadee da ameaça permanente dosislamitas do Boko Haram, a verdadeé que a diocese de Maroua-Makolonão tem falta de vocações. Nopassado dia 1 de Novembro, 3jovens foram ordenados diáconos emais trinta preparam-se já para osacerdócio. Para o Bispo, é normalque assim seja. “A nossa

esperança está toda em Deus”,explica D. Bruno Ateba Edo. Oterrorismo do Boko Haram bateu-lhes à porta, é verdade, mas nãovenceu estes cristãos que souberampreservar o mais importante detudo: a fé em Jesus. “Confiamos naoração e rezamos porqueprecisamos de paz. Apesar dosatentados, não deixaremos nuncade nos reunirmos para pedirmos aDeus por essa paz. A oração é anossa força…”

Paulo Aidowww.fundacao-ais.pt

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Alfredo Bruto da Costa

Tony Neves Espiritano

Acreditava que é possível um mundo sempobreza e lutou por esta causa até ao fim. Alioucompetência académica e profissional comautoridade ética e moral. Com humor dizia queestudou engenharia e passou a vida no mundoda sociologia (doutorou-se nela!) e economia. Oseu vastíssimo curriculum mostra um percursoque alia competência e cidadania: foi Ministrodos Assuntos Sociais, Presidente do ConselhoEconómico e Social, Conselheiro de Estado.Tudo altos cargos a que ele associou outroscompromissos: foi, por exemplo, o Presidente daComissão Justiça e Paz da Igreja católica emPortugal.Convicto, livre, aberto, frontal, comprometido…eis palavras que fui ouvindo e lendo após asua morte, aos 78 anos, em Lisboa. Lutavacontra um capitalismo ultra-liberal, o tal que oPapa Francisco diz que mata…e mata mesmo!A sua morte ocorre no momento em que o PapaFrancisco pede perdão aos sem abrigo de todo omundo pelos cristãos que vêem a miséria dequem vive na rua, mas passam ao lado! Tambémcoincide com a celebração dos 25 anos da RedeEuropeia anti-Pobreza.O investimento de Bruto da Costa na vertenteacadémica é notável. Foi um dos meus melhoresprofessores no Curso de Comunicação social naCatólica, em Lisboa. São citadas e consideradasas suas investigações sobre a pobreza emPortugal, sempre a apontar portas de combate aeste flagelo que vitima milhares e milhares depessoas por este país acima e abaixo.

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O seu funeral, no Campo Grande(Lisboa) mostrou manifestações deapreço pela vida e missão de ABC.Marcelo Rebelo de Sousaapresentou-o como um lutador pelajustiça, igualdade e solidariedade,um homem que lutou pelos maispobres e excluídos. D. ManuelClemente disse que ele somou odesafio da Fé à intervençãomarcada pela caridade, pela acçãosocial junto dos mais pobres.Recordou ainda que a Boa Novaaos pobres de que fala Cristo era asua inquietação constante.Fui aluno, li muito do que eleescreveu, estive em diversasconferências suas, sempre meconsiderei um admirador. Recordouma conferência nas JornadasMissionárias Nacionais, em Fátima,onde ele começou por mostrar oseu humor habitual: ‘alguns querempolir o meu nome e chamam-me‘Brito’ ou ‘Bruno’. Mas eu sou ‘Bruto’mesmo!!!’.

Nessa mesma intervenção, eleapresentava os cristãoscomo aqueles que amplificam osgritos dos pobres que só podemfalar em surdina. Temos que ser avez e a voz dos sem voz e sem vez.Deixou-nos a 11 de novembro umaherança enorme. Cabe-nos recebê-la de braços e corações abertos e,tal como se faz com os talentos, épreciso pô-la a render. Os pobresvão agradecer.

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Page 49: Com Misericórdia - Agência ECCLESIA · estão necessitados da misericórdia divina. 12 meses passados, obviamente, há muito por fazer. As Portas Santas fecham-se e o mundo continua

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