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COLÉGIO MILITAR DOM PEDRO II DISCIPLINA: QUÍMICA PROFESSOR: RONALDO D S RODRIGUES 8ª Série do Ensino Fundamental TEXTO 1 Texto extraído da obra “O Sonho de Mendeleiev” do filósofo Paul Strathern. Editora Jorge Zahar 1. No COMEÇO Para compreender o problema que Mendeleiev estava tentando resolver é necessário remontar às origens mais remotas do pensamento científico. Esse evento seminal na evolução humana pode ser identifiCado num momento exato e num lugar exato - 2.500 anos atrás na Grécia antiga. A primeira manifestação de pensamento científico genuíno é tradicionalmente atribuída a Tales, que viveu no século VI a.c. na cidade grega de Mileto, na costa da Tônia (hoje sudoeste da Turquia).. Nesse período, uma população de língua grega ocupava as ilhas dispersas e as planícies isoladas ao longo do lit:oral pedregoso de todo o mar Egeu. É essa geografia fragmentada que explica em parte por que o mundo grego havia permanecido um ajuntamento de cidades. e Estados insulares freqüentemente brigões, com uma rede de colônias comerciais que se estendia por toda a região mediterrânea. Durante esse período, como ao longo de todo o período de sua grandeza, os gregos antigos estavam unidos unicamente por sua língua. De maneira reveladora, o território que ocupavam não tinha nenhum nome geral. Foram os romanos que primeiro aplicaram a palavra "Grécia" à terra habitada pelos gregos, que se referiam a si mesmos como helenos (em memória de Helene, chefe de uma obscura tribo antiga da Tessália). Afirmou-se que os gregos antigos não eram sequer uma entidade racial, consistindo de vários tipos diferentes que partilhavam uma língua comum, com uma cultura e uma religião comuns. Por que a humanidade começou a pensar pela primeira vez de uma maneira científica essencialmente racional nessa região particular continua sendo um tanto misterioso. Bem mais de um milênio antes, tanto os babilônios quanto os egípcios antigos haviam desenvolvido civilizações superiores, capazes de um tipo de pensamento extremamente elevado. Postados nos terraços elevados de seus zigurates, os astrólogos babilônios haviam observado o céu noturno, discernindo padrões em meio às estrelas, mapeando seus movimentos através do céu. Depois que as águas das inundações anuais baixavam, deixando o vale do Nilo como um mar de lama, os escribas do Egito recalculavam a área exata do pedaço de terra de cada indivíduo, fazendo malabarismos com unidades tão pequenas quanto 1/300. Esse tipo de observação e mensuração avançadas havia sido o apanágio das castas sacerdotais tanto na Babilônia quanto no Egito. Essas habilidades técnicas, e toda especulação teórica que provocavam, eram parte da prática religiosa.

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COLÉGIO MILITAR DOM PEDRO IIDISCIPLINA: QUÍMICAPROFESSOR: RONALDO D S RODRIGUES8ª Série do Ensino Fundamental

TEXTO 1

Texto extraído da obra “O Sonho de Mendeleiev” do filósofo Paul Strathern. Editora Jorge Zahar

1. No COMEÇO

Para compreender o problema que Mendeleiev estava tentando resolver é necessário remontar às origens mais remotas do pensamento científico. Esse evento seminal na evolução humana pode ser identifiCado num momento exato e num lugar exato - 2.500 anos atrás na Grécia antiga. A primeira manifestação de pensamento científico genuíno é tradicionalmente atribuída a Tales, que viveu no século VI a.c. na cidade grega de Mileto, na costa da Tônia (hoje sudoeste da Turquia)..

Nesse período, uma população de língua grega ocupava as ilhas dispersas e as planícies isoladas ao longo do lit:oral pedregoso de todo o mar Egeu. É essa geografia fragmentada que explica em parte por que o mundo grego havia permanecido um ajuntamento de cidades. e Estados insulares freqüentemente brigões, com uma rede de colônias comerciais que se estendia por toda a região mediterrânea. Durante esse período, como ao longo de todo o período de sua grandeza, os gregos antigos estavam unidos unicamente por sua língua. De maneira reveladora, o território que ocupavam não tinha nenhum nome geral. Foram os romanos que primeiro aplicaram a palavra "Grécia" à terra habitada pelos gregos, que se referiam a si mesmos como helenos (em memória de Helene, chefe de uma obscura tribo antiga da Tessália). Afirmou-se que os gregos antigos não eram sequer uma entidade racial, consistindo de vários tipos diferentes que partilhavam uma língua comum, com uma cultura e uma religião comuns.

Por que a humanidade começou a pensar pela primeira vez de uma maneira científica essencialmente racional nessa região particular continua sendo um tanto misterioso. Bem mais de um milênio antes, tanto os babilônios quanto os egípcios antigos haviam desenvolvido civilizações superiores, capazes de um tipo de pensamento extremamente elevado. Postados nos terraços elevados de seus zigurates, os astrólogos babilônios haviam observado o céu noturno, discernindo padrões em meio às estrelas, mapeando seus movimentos através do céu. Depois que as águas das inundações anuais baixavam, deixando o vale do Nilo como um mar de lama, os escribas do Egito recalculavam a área exata do pedaço de terra de cada indivíduo, fazendo malabarismos com unidades tão pequenas quanto 1/300. Esse tipo de observação e mensuração avançadas havia sido o apanágio das castas sacerdotais tanto na Babilônia quanto no Egito. Essas habilidades técnicas, e toda especulação teórica que provocavam, eram parte da prática religiosa. Sua sutileza se misturara à sutileza da teologia que as acompanhava - resultando em coisas como números mágicos e a idéia de que os movimentos das estrelas espelhavam os destinos terrenos. Superstições como essas persistem até hoje na forma de números "da sorte" e "signos astrológicos pessoais".

Em comparação, a religião grega antiga, com seus deuses desordeiros a fanfarronar e namoricar no Monte Olimpo, era uma piada. Durante o período obscuro que se seguiu ao colapso da civilização micênica, a religião grega permanecera em seu estágio infantil de desenvolvimento; não seria possível vincular nenhum pretenso pensamento científico sério àquelas cabriolas de história em quadrinhos.

Mas esse foi o ponto crucial. Quando o primeiro frêmito de curiosidade cientifica se fez sentir na Grécia antiga, não estava ligado a nenhuma religião. Não teve de se conformar aos

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ditames de alguma teologia fortemente arraigada, nem foi estimulado a se iniciar em algum domínio ilusório da imaginação. Era inteiramente livre - não refreado por coisa alguma senão a razão e a realidade do mundo com que se confrontava.

Segundo a lenda, Tales gostava de caminhar nos morros ao redor de Mileto. Podemos imaginar a cena. Espalhada abaixo dele, ao sol fulgurante, a cidade portuária com suas prístinas colunas de mármore e o padrão regular das ruas, tudo preciso e frágil como uma miniatura em casca de ovo. As baías e cabos do continente asiático estendendo-se para o norte, a ampla vastidão do mar Egeu, ilhas distantes borradas na cerração do calor. Talvez um barco comercial de velas frouxas, detido no golfo pela calmaria em sua viagem de volta de uma das colônias da cidade no delta do Nilo, no mar Negro ou na Sidlia - ou quem sabe de uma viagem até rincões tão distantes quanto as minas de prata espanholas além das Colunas de Hércules (Gibraltar).

Enquanto caminhava pela trilha na encosta, Tales observava algumas pedras que continham fósseis do que eram inequivocamente conchas marinhas. Percebia que aqueles morros haviam sido outrora parte do mar. Isso o levou a conjeturar que, originalmente, o mundo devia ter consistido inteiramente de água. Concluiu que a água era o elemento fundamental de que todas as coisas derivavam. Em conseqüência, Tales de Mileto é geralmente considerado o primeiro filósofo. Foi o primeiro exemplo conhecido de pensamento verdadeiramente científico.

Em Seus primórdios a filosofia abrangia a ciência -: o que veio a ser conhecido como "filosofia natural". O pensamento de Tales era científico porque era capaz de fornecer fatos em favor de suas conclusões. Era filosofia porque usava a razão para chegar a essas conclusões: não havia nenhum apelo aos deuses ou a forças metafísicas misteriosas. O raciocínio era inteiramente conduzido nas esferas deste mundo, em que era possível reunir dados para provar ou refutar suas conclusões.

Pouco sabemos ao certo sobre Tales de Mileto. Diz-se que ele previu um eclipse do Sol que sabemos ter ocorrido em 585 a.c. Essa é a única indicação real que temos sobre a época em que viveu. Segundo uma história, ele despencou de um morro quando estudava o céu: uma imagem emblemática do filósofo até os nossos dias. Mas Tales não era nenhum bobo. Quando lhe perguntaram por quê, se era tão inteligente, continuava pobre, respondeu que enriquecer era fácil. E o provou. Percebendo que a próxima colheita de azeitonas seria boa, alugou todas as prensas de azeitonas do lugar. Durante a colheita excepcionalmente abundante, seu monopólio lhe permitiu cobrar o que desejava.É impossível ter a medida exata do efeito do novo modo filosófico de pensar-atribuído a Tales. O conhecimento da civilização ocidental está baseado nele. Olhando para trás, podemos ver que, desde seus primeiros instantes, esse novo modo de pensar continha certos pressupostos básicos. Estes iriam determinar (e mais de dois milênios e meio mais tarde continuam determinando) tanto a forma quanto o conteúdo de nosso conhecimento. Eram os pressupostos que sustentariam todo o pensamento científico subseqüente. Tales fez a pergunta: "Por que as coisas acontecem como acontecem?" Ao respondê-la, presumiu que a resposta devia ser formulada em termos da matéria básica de que o mundo é feito. Presumiu também que há uma unidade subjacente à diversidade do mundo. Mas, talvez o mais significativo de tudo, presumiu que há uma resposta para essa pergunta. E que essa resposta pode ser dada na forma de uma teoria - palavra que deriva do grego" olhar para, contemplar ou especular" - passível de teste.

Sabemos por indícios anedóticos que Tales chegou à sua teoria depois de encontrar alguns fósseis de conchas marinhas muito acima do nível do oceano na época. Mas suas especulações provavelmente foram ainda mais fundo. Ele deve ter visto a névoa se elevando dos montes anatólios para se transformar em nuvens, e observado a chuva a cair das nuvens em tempestades sobre o mar Egeu: terra se transformando em ar úmido, que por sua vez se transformava em água. Apenas três quilômetros ao norte de Mileto, Um grande rio serpenteia pela vasta planície rumo ao mar. (Tratava-se de fato do antigo rio Meandro, do qual nossa

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palavra deriva). Tales teria observado o rio se assoreando lentamente, a água tornando-se terra barrenta. Teria visitado os mananciais numa encosta viZinha: terra se transformando em água de novo. Hoje não se precisa de muita imaginação para entender como Tales concebeu a idéia de que tudo é água. No entanto, a primeira pessoa a dar um passo no desconhecido com essa idéia deve ter sido um gigante da imaginação.

Curiosamente, esse não foi o único grande passo na evolução do pensamento humano que teve lugar durante o século VI a.c. De maneira completamente independente, em outras partes do globo, a humanidade estava dando vários grandes passos que iriam afetar todo o curso de seu desenvolvimento. A China testemunhou o aparecimento de Confúcio e Lao Tsé (o fundador do taoísmo, o rival do confucionismo), Buda começou a pregar na Índia, e na Pérsia o adorador do fogo Zaratustra fundou o zoroastrismo (que teria grande influência tanto sobre o judaísmo quanto sobre o islamismo). Enquanto isso a região mediterrânea estava testemunhando mais do que o mero advento dos primeiros filósofos na Jônia. No final do século Pitágoras estava vivendo no outro extremo do mundo grego, no sul da Itália, e seus ensinamentos religiosos iriam contribuir significativamente para o elemento não-judaico do cristianismo (várias parábolas do Novo Testamento originam-se de fontes pitagóricas). Da mesma maneira, a influência da religião dos números de Pitágoras pode ser reconhecida na teoria musical e na crença da ciência moderna de que as operações últimas do universo podem ser descritas em termos numéricos. O rumo das civilizações tanto oriental quanto ocidental foi fixado por eventos que tiveram lugar durante o século VI a.c., o mais importante para o mundo ocidental foi, sem dúvida, o desenvolvimento atribuído a Tales de Mileto, o primeiro cientista filósofo. Sua teoria de que o mundo se desenvolvera a partir de um único elemento (água) foi apenas o começo. Essa idéia, uma vez concebida, foi rapidamente desenvolvida pelos discípulos de Tales em Mileto - os filósofos conhecidos como integrantes da escola milésia. Um deles era Anaximenes, que identificou o elo fraco no raciocínio de Tales.' Se tudo fora originalmente água, o que explicava a diversidade atual do mundo? Como havia a água se tornado todas as coisas? Anaxímenes sustentou que o elemento fundamental não era a água, mas o ar. O mundo estava cercado de ar, o qual ficava mais comprimido quanto mais se aproximava do centro. À medida que se comprimia, se transformava em água; quando a água era mais comprimida, se transformava em terra; ainda mais comprimida, se tornava pedra. Tudo era ar, num estado mais ou menos condensado.

Esse foi um desenvolvimento significativo da idéia de Tales. Aqui estava a primeira tentativa de explicar a diversidade do mundo - a primeira tentativa de explicar diferença qualitativa em termos de diferença quantitativa.

Uma nova maneira de pensar fora descoberta. O grande debate filosófico (que permanece não resolvido até hoje) começara. Agora todos podiam participar. Não há registro de como Tales reagiu a tudo isso. Ele pode ter pensado cientificamente; se esperava ser contestado cientificamente é outra questão, mas foi. Ao que parece, Anaxímenes era um homem jovem por ocasião da morte de Tales e foi ele quem transmitiu a história de sua morte. Numa carta a Pitágoras, escreveu: "Tales enfrentou um destino cruel em sua velhice. Como era seu costume, deixou sua casa à noite com.sua criada e foi olhar as estrelas. Enquanto contemplava o céu, porém, esqueceu-se de onde estava e caiu num precipício." Anaxímenes previu um destino ainda pior para si mesmo. Numa carta posterior a Pitágoras, lamenta: "Como posso pensarem estudar as estrelas quando estou diante da perspectiva do massacre ou da escravidão?" Nessa altura as cidades- Estado dispersas do mundo grego estavam sob a ameaça do Império Persa, que se expandira a oeste pela Anatólia e agora estava se aproximando do litoral do mar Egeu. Em 494 a. C. o exército persa devastou Mileto. O destino de Anaxímenes permanece desconhecido e a escola milésia chegou ao fim menos de um século após ter se iniciado. As ruínas de Mileto perduram até hoje, agora mais no interior, a vários quilômetros do estuário

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assoreado do Grande Meandro.Mas a filosofia sobreviveu à queda de Mileto. Por uma combinação de acasos felizes e de

heroísmo legendário, o mundo grego conseguiu resistir aos grandes exércitos invasores da Pérsia e até derrotá -los. Um dos pontos altos dessa resistência foi a batalha de Maratona em 490 a.c., em que uma força grega muito inferior em número pôs todo o exército persa em fuga. (O mensageiro que levava a notícia da vitória desfaleceu e morreu após correr os 41,3 quilômetros de Maratona a Atenas. Esse evento é comemorado na maratona moderna, que é disputada numa distância idêntica.)

Na época da queda de Mileto, a filosofia já se propagara do litoral jônico para as ilhas do mar Egeu e dali para o resto do mundo grego. Éfeso, que era a principal cidade da Tônia, sobreviveu à investida persa mediante o expediente simples de se aliar ao inimigo contra seus rivais comerciais, como Mileto. Seu filósofo mais conhecido, Heráclito, era similarmente problemático. Heráclito, que nasceu por volta de 540a.C., era um homem arrogante e misantropo. Na velhice, ficou tão desgostoso com seus concidadãos efésios que abandonou a cidade por uma vida errante nas montanhas, alimentando-se de capim e ervas. Sua filosofia, por outro lado, era calma, sutil e profunda. Heráclito tinha sua própria idéia sobre o elemento fundamental a partir do qual o mundo se formou. Segundo ele, era o fogo.

Anaxímenes compreendera. a necessidade de explicar a diversidade do mundo. Heráclito viu que Anaxímenes havia respondido a essa questão apenas parcialmente. Que significava dizer que o ar se transformava em água, terra, pedra e assim por diante? Se não continuava sendo ar, essa não podia ser a substância de que o mundo era feito. Aqui estava uma questão complexa e séria. Heráclito reconheceu que ela era irrespondível enquanto o "um" fosse visto como uma substância - como ar, ou mesmo água. Era necessário ver o "um" como imaterial."O mundo foi, é agora e sempre será um Fogo eterno, inflamando-se gradativamente e apagando-se gradativamente." Para Heráclito o mundo estava num contínuo estado de fluxo. É nos seus célebres fragmentos que isso pode ser mais bem compreendido: "Nenhum homem entra duas vezes no mesmo rio" e "O Sol é novo a cada dia". O fogo era concebido como o padrão ou ordem subjacente do cosmo, transformando-se e ainda assim permanecendo o mesmo.

Durante séculos, filósofos de inclinação científica tenderam a rejeitar as concepções de Heráclito como mero misticismo - até o advento da ciência do século xx. Somente então a sutileza de seu pensamento tornou-se clara. O fogo sempre cambiante de Heráclito assemelha -se à idéia de energia na física moderna. Ali estava uma perspectiva filosófica capaz de harmonizar a relatividade e as ambigüidades da física quântica. (Na relatividade a massa é equivalente à energia, segundo a fórmula de Einstein, E = me? Assim a energia pode teoricamente transformar-se em matéria, exatamente como o fluxo ou o fogo de Heráclito.)

Heráclito teria um fim lamentável, que ele mesmo se infligiu. Sua dieta parca de capim e ervas finalmente o obrigou a descer de seu refúgio nas montanhas para retomar a Éfeso. No entanto, longe de estar esquelético, estava agora inchado pela hidropisia, que provoca a retenção de fluido nos tecidos. Exibindo uma arrogância característica, solicitou um tratamento dos médicos locais na forma de um enigma: "São capazes de criar uma estiagem após uma chuva pesada?" Quando os médicos se mostraram desconcertados com esse teste meteorológico, Heráclito decidiu curar-se a si mesmo. Retirando-se para um estábulo, enterrou-se no esterco, aparentemente na esperança de que o fluido mefítico em seu corpo fosse extraído pelo calor de seu revestimento mefítico. Esse método drástico provou-se ineficaz, e ele morreu de uma morte mefítica.o elemento primordial já fora identificado como água, como ar e como fogo. Qual era ele então? Pareci_ haver uma resposta óbvia para essa pergunta. Por que haveria de ser apenas um? Por que não vários? Por que não todos os três - com o acréscimo de um quarto elemento para explicar a solidez do mundo? A resposta óbvia parecia ser que o mundo era feito de fato de quatro elementos fundamentais: terra, ar, fogo e água.

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De um só golpe, essa noção de pluralidade libertou o pensamento científico do grilhão da unidade. Foi a solução de compromisso óbvia - em retrospecto podemos ver que ela apontou o caminho para uma compreensão espetacularmente nova dos elementos. Lamentavelmente, isso só pode ser visto em retrospecto. Essa solução de compromisso "óbvia" - a idéia de quatro elementos básicos - iria se provar um dos maiores erros do pensamento humano e seus efeitos viriam a representar uma catástrofe para nosso desenvolvimento intelectual.

Quando se espalhou pela Jônia e o mundo grego antigo, a filosofia inicial foi como uma súbita iluminação da mente humana. A evolução estava focando as lentes do pensamento humano: o que fora previamente um borrão de superstição emetafísica agora estava se tornando claro. Podíamos ver! Os seres humanos estavam aprendendo como olhar o mundo à sua volta. Inversamente, a noção de que o mundo consistia de quatro elementos foi como uma doença, e iria estropiar o pensamento científico pelos dois milênios seguintes.

Isso não foi em absoluto culpa do engenhoso filósofo que concebeu pela primeira vez essa idéia. A teoria dos quatro elementos foi proposta por Empédocles, que viveu numa colônia grega na Sicília durante o século V a.c. e foi influenciado por Pitágoras, que continua sendo uma das grandes figuras enigmáticas do início da era helênica. Pitágoras se situa entre os mais exímios matemáticos de todos os tempos. Descobriu que 1t era incomensurável e demonstrou o teorema que recebeu seu nome. Seu outro papel como fundador de uma religião baseada numa mistura de puro discernimento espiritual e puro ilusionismo também indica talentos excepcionais. Empédocles iria seguir as pegadas de seu mestre como pensador e como

. charlatão. Sua teoria dos quatro elementos foi um golpe de gênio, mas ele não parou por aí. Ampliou a visão de mundo científica com teorias adicionais da mais alta qualidade. Afirmou que nada no mundo era criado ou destruído - e sustentou que todas as coisas consistiam em diferentes combinações dos quatro elementos. Aqui, pela primeira vez, surge um vago esboço da idéia da química.

Novamente como Pitágoras, Empédocles era uma combinação de um homem à frente de seu tempo e um homem atrás de seu tempo. Essa conjuminância esquizofrênica de duas eras produziu algumas das mentes mais originais na história. (Basta pensar na combinação das mentes medieval e renascentista de Shakespeare e na contraditória devoção de Newton à alquimia e à física matemática.) Empédocles foi uma versão primitiva desse tipo. Embora a maior parte da filosofia grega estivesse a essa altura sendo escrita em prosa, ele optou por retornar a uma era anterior, confinando seu pensamento científico na camisa-de- força da poesia. Sua obra mais primorosa, O mundo físico, era uma epopéia de cinco mil versos, de 'que conhecemos apenas fragmentos. Essa obra-prima consistia, ao que parece,-num estonteante coquetel de idéias originais brilhantes e charlatanice rematada. Entre as primeiras estava a idéia da evolução. Longe de ser um mero vôo de imaginação poética, tratava-se de uma teoria plenamente desenvolvida, elaborada em algum detalhe. Empédocles considerou a evolução em. termos de unidades anatômicas: membros, órgãos, cabeças e assim por diante. Estas se combinavam de diferentes maneiras. Para começar, havia todo tipo de criaturas estranhas combinadas -'- como «com facede homem e progênie de boi" (tal como os centauros e os sátiros da mitologia grega). Somente as criaturas mais bem adaptadas a seu ambiente sobreviviam. Mas uma vez que, em última análise, nada era criado nem destruído -ou, em outras palavras, os ingredientes do mundo permaneciam os mesmos - ele teve condições de afirmar: "Já fui certa vez um menino e uma menina, um arbusto e um pássaro e um peixe saltitante, corredio." Mais de dois mil anos deveriam se passar antes que idéias científicas sobre a evolução de calibre similar reaparecessem na Europa ocidental.

A distinção entre genialidade e disparate é por vezes tênue como uma hóstia - uma barreira facilmente transcendida pelo charlatão verdadeiramente convincente que, de quando

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em quando" consegue convencer até a si mesmo. Empédocles iria morrer ao pular na cratera do monte Etna, numa tentativa de provar para seus seguidores que era imortal. Na época as opiniões ficaram divididas, mas, com o passar dos anos, seu não reaparecimento depôs contra ele.A idéia dos quatro elementos de Empédocles pode ter errado o alvo na teoria, mas, ironicamente, mostrou considerável discernimento do lado prático da química. Terra, água, ar e fogo assumem um aspecto muito mais significativo se considerarmos o que são exatamente. Aterra é um sólido, á água um líquido, o ar um gás e o fogo poderia facilmente ser visto como energia. Aqui está uma divisão eminentemente prática das substâncias em diferentes tipos - uma classificação que se poderia esperar de um químico prático embrionário, não de um filósofo teórico.

No entanto, essa noção prática de classificação dos elementos não é de fato tão surpreendente. A idéia da química não passava nesse estágio de um punhado de intuições vagas, mas a prática inadvertida dela já avançara bastante. Os antigos tinham conhecimento de processos químicos havia muito. Os primeiros químicos reconhecíveis foram mulheres, as fabricantes de perfumes da Babilônia, que usaram os mais antigos alambiques conhecidos para preparar seus produtos. A primeira química individual que a história conheceu foi "Tapputi, a perfumista", mencionada numa tábua de cuneiformes do segundo milênio a.c. na Mesopotâmia.

A prática precedeu de muito a teoria. Na era helênica, o mundo antigo já havia descoberto também mais de meia dúzia de elementos metálicos e um ou dois não metálicos.Os egípcios antigos conheciam ouro e prata, cobre e ferro; todos os quatro são também mencionados no Antigo Testamento. Sabe-se que os fenícios usavam chumbo para tornar mais pesadas suas âncoras de madeira. Numa viagem à Espanha, ao encontrarem mais prata do que podiam transportar, livraram-se então do seu chumbo e, em vez dele, usaram prata para lastrear suas âncoras. Subseqüentemente viajaram para mais longe ainda, até a Grã-Bretanha, onde negociaram com outro elemento metálico das minas da Cornualha - a saber, estanho.

Na verdade, foi o bronze, uma liga de estanho e cobre, que deu nome à era que se iniciou na região do Mediterrâneo por volta de 3000 a.c. Foi na Idade do Bronze, por volta de 1250 a.c., que os micênios tomaram Tróia. O bronze metálico duro é formado quando estanho e cobre são fundidos juntos. Essa liga era usada para ornamentos e baixelas, mas seu uso mais significativo foi em armas e armaduras. Cerca de dois milênios depois o bronze foi suplantado por uma liga mais dura feita de ferro e carbono fundidos, inaugurando a Idade do Ferro.

O outro elemento metálico conhecido pelos antigos era o mercúrio, que é mencionado em textos chineses e hindus antigos e foi encontrado em sepulturas egípcias datadas de 1500 a.c. Graças a seu aspecto e qualidades excepcionais (superfície espelhada, metal líquido, extremamente venenoso) o mercúrio foi encarado com admiração reverente e considerado mágico desde o princípio.

Quanto aos elementos não metálicos, o carbono e o enxofre eram certamente conhecidos desde os tempos mais remotos. O autor romano Plínio refere-se a antigas minas sicilianas de enxofre, cujo produto era usado para fins medicinais e para a fabricação de fósforos de enxofre. O carbono era conhecido pelo homem das cavernas na forma de fuligem e carvão. Em sua forma mais rígida e mais preciosa, o diamante, esse elemento foi mencionado no Antigo Testamento e nos Vedas hindus, em textos datados do segundo milênio a.c.

Tanto os gregos antigos quanto os romanos conheciam uma substância que chamavam de "arsênio". Mas não se tratava do elemento puro - tratava-se do sulfeto; eles o usavam para curtir couros e para envenenar rivais. E é aqui que está a chave. Os antigos sabiam desses elementos, mas não os conheciam como tais, não tendo a menor idéia de que eram elementos. Isso permanecia além de sua concepção. A noção de elemento originou-se com os filósofos, não com os químicos. Em outras palavras, com os pensadores, não com os que praticavam. A

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teoria de Tales segundo a qual a água era o elemento primordial foi o verdadeiro começo: a idéia científica do que é um elemento.

Anaxímenes desenvolveu isso e, pouco tempo depois, uma outra idéia científica espetacularmente original foi concebida e desenvolvida pelos gregos antigos. Foi o filósofo do século V Leucipo que fez a pergunta: "A matéria é discreta ou contínua?" Em outras palavras, é possível avançar dividindo as coisas indefinidamente, ou se chega a um ponto em que elas se tornam indivisíveis? Leucipo considerou evidente por si mesmo que a segunda alternativa era a verdadeira. Isso o levou à idéia do atamos, ou átomo. Em grego essa palavra significa "que não pode ser cortado", isto é, indivisível. Leucipo foi o primeiro a declarar que o mundo era composto de átomos indivisíveis. Surpreendentemente, chegou a essa conclusão apenas um século depois que Tales inaugurara o pensamento científico. Leucipo nasceu provavelmente em Mileto, mas deve ter partido antes da invasão persa. Parece que

. fundou uma escola em Abdera, no norte da Grécia continental. Ali seu discípulo mais renomado foi Demócrito, que desenvolveria a idéia atômica original do mestre. Segundo Demócrito, há uma quantidade infinita de átomos, que existem no espaço em perpétuo movimento; há também inumeráveis tipos variados de átomos, que diferem em forma e tamanho, peso e calor. Toda mudança aparente no mundo, ele afirmou, deve-se a combinações e recombinações desses átomos imutáveis.

Tal como as idéias de elementos e de evolução, as idéias de Demócrito parecem estupendamente modernas - muito, muito além de seu tempo. Essa originalidade permanece inédita no pensamento humano. Uma vez tendo descoberto o pensamento filosófico, parece que os gregos rapidamente o praticaram até quase os seus limites. Ninguém menos que Bertrand Russell afirmou: "Quase todas as hipóteses que dominaram a filosofia moderna foram pensadas pela primeira vez pelos gregos." Mas esse deveria ser um legado ambíguo. Como veremos, quando o pensamento grego tomava um rumo errado desencaminhava o desenvolvimento intelectual por séculos a fio. .

Durante a vida de Demócrito a filosofia grega entrou em sua idade do ouro, em Atenas. Esta havia se tornado a mais rica e poderosa cidade do mundo grego, o ápice da cultura grega. Sua acrópole era coroada pelas colunas sublimemente proporcionais do Partenon, .uma das mais belas realizações arquitetônicas da história. Nos teatros panorâmicos ao ar livre da cidade, acusticamente magníficos, eram encenadas as tragédias de Ésquilo, Sófocles e Eurípides. (Foi ali que, no curso de uma única geração, a tragédia grega se desenvolveu, passando de um ritual religioso primitivo a um drama profundo que se desenrolava num proscênio.) Quando a filosofia ingressou em sua idade do ouro, porém, Atenas havia começado a declinar sob o impacto das longas e desastrosas Guerras do Peloponeso contra Esparta. Ironicamente, essa idade do ouro, que permanece inigualada em toda a história da filosofia, deveria ser em grande parte uma reação contra os feitos de Demócrito, Empédocles, Heráclito e congêneres.

O primeiro grande filósofo ateniense foi Sócrates, que nasceu por volta de 477 a.c. e foi sentenciado à morte em 399 a.c. Sócrates foi um dos personagens extraordinários da filosofia, ao mesmo tempo cativando e enfurecendo. Declarado "o mais sábio entre os homens" pelo oráculo délfico, ele afirmava que nada sabia - e passava então a demonstrar que os outros sabiam ainda menos. Diante de seus jovens discípulos na agora (praça do mercado), usava por vezes esse "método dialético" para criticar os figurões sapientes de Atenas - procedimento que lhe valeu poucos amigos bem colocados e quase certamente teve um papel em seu posterior julgamento e condenação à morte por "corromper os jovens". O método dialético de Sócrates consistia em fingir nada saber e em seguida questionar o conhecimento apresentado. por seu adversário, perguntando seu significado, demolindo os conceitos em que se assentava. Tratava-se de uma forma precursora de análise. (A palavra grega analytika significa" deslindar".)

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A análise é sempre necessária para elucidar o significado - mas, do modo como Sócrates o utilizava, esse método tendia a desmontar o conhecimento em lugar de construí-Io. Uma ciência embrionária, cujos conceitos são vagos e cujo conhecimento é sumamente teórico, pode suportar mal esse tipo de ataque, e parecia fácil para Sócrates encontrar falhas nesse "conhecimento". (Até hoje a ciência exibe inadequações similares; a virtude que a redime é que opera na realidade, não em termos filosóficos.)

Sócrates não estava interessado em átomos ou nos elementos fundamentais que compõem o mundo. Sua filosofia baseava-se antes na introspecção - seu dito favorito era "conhece-te a ti mesmo". Ali estava o único conhecimento verdadeiro. Com conseqüências desastrosas, a filosofia desviou-se do mundo.

Sócrates foi sucedido por seu notável discípulo Platão, que perseverou nessa tradição. Em vez de especulação científica, a filosofia voltou sua atenção para idéias abstratas. Conferia-se um valor muito maior à matemática, à verdade e à beleza que às "meras aparências". As particularidades do mundo à nossa volta não passavam de uma mixórdia acidental de quimeras - somente as idéias eram reais.

Platão nasceu numa família ateniense aristocrática e iria se tornar o fIlósofo supremo da idade clássica. Foi dito que formulou todas as questões importantes da filosofia, e que, desde então, a fIlosofia inteira pouco passou de notas de pé de página a ele. Há alguma verdade nisso, mas está longe de ser toda a verdade. Certamente não se aplica à chamada "fIlosofia natural", isto é, a ciência. Platão nunca poderia ter perguntado "o que é força elétrica?", porque não tinha nenhuma noção do que era eletricidade. Isto pode parecer óbvio, mas é crucial. Embora já não seja considerada parte da filosofia, a ciência certamente tem seu efeito sobre,nossa compreensão do conhecimento e de nós mesmos. Depois de Copérnico, Darwin e Freud, nossa idéia de nós mesmos é fundamentalmente diferente daquela de Platão e seus contemporâneos. Podemos compreender a tragédia grega, e sentir a força ineroxável de suas emoções, mas já não pensamos nem nos comportamos daquela maneira.

Em 387a.C. Platão abriu sua academia num olival nos arredores de Atenas. Esse "olival acadêmico" foi a primeira universidade reconhecível. Acima de sua entrada estava escrito "Que não entre aqui ninguém que não saiba geometria". Raciocínio abstrato, idéias abstratas, geometria abstrata - até o ensinamento político de Platão se concentrava na idéia de uma utopia e não na realidade social. A Academia era soberana em matemática, mas a geometria ali ensinada era limitada a figuras que podiam ser desenhadas com régua e compasso. Somente essas figuras eram ideais (isto é, correspondiam a idéias "reais"); todas as demais pertenciam à mixórdia acidental do mundo concreto (que era simplesmente uma ilusão, "mera aparência"). Este último era desprezado como "mecânico". A geometria ocupava-se unicamente de coisas como o círculo, o triângulo e o polígono regular - nenhuma das quais aparece precisamente na natureza. Demócrito chegara ao conceito do átomo aplicando a matemática à natureza. (Aplique a divisão à natureza até não poder ir mais além.) Platão estava exclusivamente interessado em aplicar a matemática a ela mesma. (Essa atitude perdura na noção de matemática "pura".)

O terceiro do triunvirato grego de grandes fIlósofos foi Aristóteles, que foi discípulo de Platão. Enquanto Sócrates fora "o chato de Atenas" e Platão "o fIlósofo dos filósofos", Aristóteles foi o primeiro gênio universal. Ele viajou por todas as terras da civilização egéia, e em certa altura tornou-se o preceptor do jovem Alexandre o Grande - embora não subsista nenhum registro do que o maior polímata da Antigüidade ensinou (ou procurou ensinar) ao maior megalomaníaco da Antigüidade. Aristóteles daria contribuições capitais em quase todos os campos, exceto a matemática. Estava interessado em tudo, e sua biblioteca refletia isso. Nunca antes uma coleção de rolos semelhante fora acumulada por um cidadão privado. Com Aristóteles a tendência anticientífica chegou ao fim. A essa altura, porém, o estrago já fora feito. Embora Aristóteles tenha sido uma das mais admiráveis mentes científicas de toda a história, suas idéias estavam fatalmente infectadas pelo pensamento platônico. (Coisa que ainda ecoa

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no nosso uso da palavra: não é à toa que caso de amor platônico é aquele em que nada acontece realmente.) As realizações de Aristóteles traçaram minuciosamente o curso do desenvolvimento científico até boa parte da era moderna. Ele deu contribuições de vulto em todos os campos da filosofia natural, da botânica à geologia e da psicologia à zoologia. De fato, foi o primeiro a delinear muitos desses campos científicos. E sua façanha suprema foi a invenção da lógica.

Sendo assim, onde foi que ele errou? Aristóteles virou a filosofia de Platão de cabeça para baixo, acreditando que idéias só podiam existir na substância particular que as corporificava. Apesar disso, seu pensamento permaneceu contaminado pelo modo platônico de ver o mundo. Ele via os objetos como dotados de qualidades - as idéias platônicas que os habitavam - e não de propriedades concretas. Há uma diferença sutil mas fundamental aí. Um mundo que consiste em substância ou objetos pode ter qualidades; um mundo composto de átomos tem propriedades. Não concebemos idéias corporificadas num átomo. Somente desse modo um homem com o brilhantismo de Aristóteles poderia ter aceitado terra, ar, fogo e água como os quatro elementos básicos. Estas eram qualidades.

Quando Aristóteles aplicou o brilhantismo de sua mente científica a esse erro, o erro foi ampliado com resultados desastrosos. Usando a razão e a observação, Aristóteles deduziu que cada um dos quatro elementos tem seu lugar. A terra estava no centro, em seguida vinha a água, acima desta estava o ar e acima do ar vinha o fogo. Todo movimento no mundo era uma tentativa dos elementos de encontrar seu devido lugar. Desse modo as pedras caem para o fundo da água, as bolhas ascendem dela, o fogo se ergue em direção ao ar e assim por diante.

Mas como o Sol, a Lua e as estrelas claramente não se moviam dessa maneira, Aristóteles propôs um quinto elemento. Chamou esse elemento rarefeito de éter. Resquícios desse elemento persistem em nossas palavras etéreo (celestial, aéreo) e quinta-essência. O céu, da Lua para cima, era todo parte desse domínio etéreo. Nada tendo a ver com os outros quatro elementos, os corpos celestes não estavam sujeitos às mesmas leis, o que explicava por que não caíam sobre a Terra. Esse domínio etéreo superior continha esferas de cristal transparentes e concêntricas, arranjadas em torno da Terra central como as camadas de uma cebola. A Lua, o Sol, os planetas e as estrelas estavam todos incrustados nessas esferas, cujas rotações independentes produziam os movimentos dos corpos celestes. À medida que se moviam umas contra as outras, as esferas de cristal transparentes geravam harmonias sublimes inaudíveis ao ouvido humano, a "música das esferas".

A autoridade de Aristóteles e o brilhantismo inigualável de seu pensamento eram tamanhos que tudo isso foi aceito. A Terra foi tomada como o centro do universo, muito embora vários pensadores pré-socráticos tivessem tido uma compreensão diferente. E isso, associado à noção de que o céu consistia de um elemento diferente e obedecia a leis diferentes, deu cabo da astronomia até o advento de Copérnico no século XVI.

Aristóteles, como Empédocles e Shakespeare, foi um gênio com pés em duas eras diferentes. O que melhor ilustra sua posição histórica é talvez sua atitude em relação à política. A utopia impraticável de Platão não era para Aristóteles - esse era um assunto a ser considerado cientificamente. Para descobrir o melhor sistema político, Aristóteles reuniu em sua biblioteca rolos que continham as constituições de todas as cidades-Estado da Grécia. Se alguma cidade-Estado o procurava em busca de conselho constitucional, era capaz de redigir uma constituição que não só se adequava às circunstâncias daquela cidade particular, mas também continha os melhores pontos tomados das constituições de todas as outras cidades-Estado. Se alguma coisa funcionava, essa deveria funcionar. Mas não funcionou, e não podia ter funcionado.

Por quê? Ironicamente, a culpa por isso recaiu sobre o discípulo de Aristóteles, Alexandre o Grande. Foi Alexandre quem conseguiu unir os gregos, façanha que realizou pelo simples expediente de conquistá-Ios. Decidiu então que sua Grécia unida não deveria mais enfrentar a

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ameaça de um império invasor - assim partiu para a conquista dos persas, a leste. Feito isso, decidiu avançar contra todo o mundo conhecido e conquistá-lo. (Deixando de lado a questão da megalomania, pode-se afirmar que a estratégia de Alexandre era equivocada. Naquela altura o Império Persa estava em declínio, ao passo que a oeste a República Romana apenas começava a se expandir. Um século e meio depois da gloriosa campanha de Alexandre, que conquistou tudo a leste, as sobras de seu império começariam a sucumbir ante a invasão vinda do oeste.) Apesar de suas deficiências, Alexandre estabeleceu em pouco tempo o maior império que o mundo já vira. A cidade-Estado (ou pólis) foi substituída pela metrópole (literalmente "cidade mãe"). A era das cidades Estado estava terminada, a era dos impérios se iniciara. A democracia fora substituída pelo imperialismo. A despeito de todo o seu brilhantismo intelectual, o pensamento de Aristóteles sobre a forma de alcançar a melhor constituição política havia se tornado totalmente redundante.

Mas o mesmo não aconteceu com seu pensamento científico elementar. A idéia de que o mundo consistia de terra, ar, fogo e água pertencia ao passado. E nenhuma soma de pensamento brilhante seria capaz de salvar qualquer ciência baseada em tal premissa. A investigação dos elementos passaria agora a ser abordada de um ângulo inteiramente diferente - um ângulo ao mesmo tempo não científico e irracional. A ciência dos elementos penetrou nesse momento num reino mais escuro.

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CORPO DE BOMBEIRO MILITAR DO DISTRITO FEDERALDIRETORIA DE ENSINO E INSTRUÇÃOCENTRO DE ASSISTÊNCIA AO ENSINO

COLÉGIO MILITAR DOM PEDRO IIDISCIPLINA: QUÍMICAPROFESSOR: RONALDO D S RODRIGUES1ª ANO DO ENSINO MÉDIOTEXTO 1 – 3° Bimestre

EVOLUÇÃO DE PENSAMENTOS

De Al-Químicos a Iatroquímicos

    A pedra filosofal nunca deixou de ser procurada pelos alquimistas, mas por voltas de 1500 d.C. aconteceu na Europa uma profunda reforma social causada pela burguesia emergente, progressista, antítese do feudalismo, necessitando para sua perpetuação fomentar a produção de manufaturados e é lógico, o seu comércio. Para tal necessitava de um método mais eficiente de comunicação e de manutenção de seu pensamento, e assim, surgiu a imprensa. O aumento da população nas cidades aumentava as necessidades da população principalmente no ramo da medicina, na época reduzida a um receituário de poções extraídas de vegetais.  .    Nessa sociedade em transformação nascia em Einsiedeln, Suíça, em 1493, Phillipus Theophrastus Bombastus von Hohenheim, mais tarde autodenominado Paracelsus (melhor do que Celcius, um médico romano da antiguidade), que popularizou o “princípio fundamental” da refractabilidade entre os alquimistas, representada pelo “sal”. Paracelsus tinha como princípio que a Pedra Filosofal da alquimia não devia ser tão somente para a procura do ouro e da prata, mas também de medicamentos para melhorar as condições de saúde do corpo humano, e assim, providenciar a forma de alcançar a vida eterna. Em sua filosofia, o homem dividia-se em sal (o corpo), mercúrio (alma) e enxofre (o espírito), e qualquer enfermidade seria o resultado da falta de um desses componentes fundamentais. De fato, tanto o sal quanto o mercúrio e o enxofre, para Paracelsus, tinham um significado muito diferente do que podemos atribuir a tais elementos hoje em dia. Para Paracelsus e sem dúvida para muitos alquimistas da época a palavra enxofre, por exemplo, reunia um sem-número de substâncias capazes de sofrer algum tipo de combustão. Não obstante, o sucesso alcançado pelos tratamentos médicos de Paracelsus em pacientes vindos de toda a Europa medieval baseava-se no princípio que ele mesmo desenvolvera, o do “igual trata igual”, ou seja, se um composto causa uma doença, então doenças relacionadas devem ser tratadas com a administração de pequenas doses do mesmo composto. Esse princípio é o empregado hoje em dia pela farmacologia homeopática, e existem historiadores que consideram Paracelsus como sendo o Pai da Farmacologia. Paracelsus morreu em 1541 aos 48 anos, provavelmente auto-envenenado por uma de suas poções, mas não sem antes formar toda uma escola de seguidores que reformaram a medicina da época, passando a administrar compostos inorgânicos medicinais além dos extratos orgânicos tradicionais. Os seguidores de Paracelsus se autodenominavam iatroquímicos (do grego iatrós = iatros, médico), abandonando o nome de alquimistas.  . 

Alquimia: da grande obra ao grande fiasco

    No campo da mineração e metalurgia teve grande impacto o livro “De Re Metalina” escrito pelo alquimista alemão Giorgio Agrícola (1494- 1555). Naquele livro, Agrícola reuniu todas as técnicas de metalurgia conhecidas, e ainda relatou resultados de suas próprias experiências no campo da extração e purificação de metais, introduzindo conceitos que eram tão avançados que resultaram na renovação de toda a indústria metalúrgica européia da época.     À medida que os químicos se tornavam familiares com muitas novas substâncias, os conceitos sobre a natureza da composição da matéria se tornavam mais e mais insatisfatórios. Pelo final do século XVII as práticas médicas, metalúrgicas e alquímicas estavam muito adiantadas para serem explicadas somente em termos da filosofia aristotélica. Entretanto, havia ainda um outro empecilho para o desenvolvimento das ciências naturais: a filosofia vigente nas escolas da época era a Escolástica de Platão, que afirmava que coisas reais não eram senão representações imperfeitas do ideal e, portanto, para se compreender a “essência” das coisas, o conhecimento experimental não teria valor. Contra essa filosofia asfixiante

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levantava-se o filósofo inglês Sir Francis Bacon (1561-1626), que chamava a atenção à observação direta da natureza. Sir Bacon é hoje reconhecido um dos fundadores do método experimental nas Ciências. Seu livro mais famoso, Novum Organum, acabou por arruinar os métodos e os erros da escolástica, que mesmo assim continuou sendo ministrada em escolas da idade média até meados do século XVIII.      O golpe fatal nos conceitos aristotelianos viria a ser dado por outro inglês, Robert Boyle. Em suas experimentações sobre a natureza e o comportamento dos gases, Boyle ganhou grande fama e reputação, sendo sua a descoberta da relação entre pressão e volume dos gases “PV=constante”, conhecida por Lei de Boyle. Em 1661, Boyle escreve o livro “The Scheptical Chymist”, ou o químico inquisidor (scheptical é uma palavra inglesa empregada em filosofia), onde demoliu todas as concepções alquímicas aristotelianas, tendo, por isso mesmo, abandonado o prefixo “al” da Química. Ele concluiu que os quatro elementos aristotelianos (terra, fogo, ar e água) e os “princípios” comumentemente aceitos na época não poderiam ser elementos químicos reais, desde que eles não podiam ser extraídos das substâncias, nem serem utilizados para compô-las. Entretanto, Boyle não apresentou nenhuma nova teoria, nenhuma nova forma de explicar os fatos químicos que ele próprio estudava. Ele quotizava “Eu agora chamo de Elementos, da mesma forma que outros Químicos que são sinceros o dizem por seus Princípios, certos corpos Primitivos e Simples, ou perfeitamente não misturados; que, não sendo constituídos de nenhum outro corpo são os Ingredientes dos quais aqueles corpos chamados de Corpos perfeitamente mistos são feitos, e nos quais esses corpos podem ser intimamente resolvidos; agora, se existe qualquer um desses corpos que podem ser encontrados em todo e cada um desses chamados corpos Elementados, é o que eu agora questiono.” Portanto, suas partículas elementares não eram elementos como pensamos hoje, desde que ele pensava que existiriam apenas alguns poucos deles, que não poderiam ser isolados, mas que podiam ser combinados para formar substâncias estáveis, tal como o ouro, que passa inalterado através de muitas reações químicas. 

O Oxigênio

    A 13 de maio de 1733 nascia perto de Leeds, na Inglaterra, Joseph Priestley. Priestley tornou-se um pastor anglicano, ensinando latim, francês, grego, italiano, oratória e lei civil na Dissenting Academy em Daventry, e seu espírito científico foi despertado por seu encontro em 1766 com o grande estadista e cientista americano Benjamin Franklin, um estudioso das correntes elétricas, o primeiro a denominar cargas elétricas de (+) e (-) pela sua capacidade de se repelirem ou não, e que ficou encantado com as experiências de Priestley sobre a qualidade do ar. Tão cedo quanto 1771, Priestley notara que a colocação de plantas em redomas em que haviam sido queimadas velas, ou onde ratos haviam sido mortos por asfixia (cujo ar resultante na redoma ele chamou de “ar fixo”), melhorava a qualidade do ar da redoma, a ponto de velas poderem ser novamente acesas, ou onde ratos podiam novamente sobreviver. A esse novo tipo de ar Priestley deu o nome de “ar deflogisticado” (o conceito do flogíston (flogisto) era aceito por todos os grandes cientistas naquela época).      Priestley aceitou ser pastor em Leeds, onde morava perto de uma cervejaria, e portanto passou a ter uma quantidade inesgotável de “ar fixo” (CO2), e notou que esse “ar” tornava a água muito gostosa para ser bebida, e recomendava a beberagem a seus amigos, tendo sido portanto o “inventor” da água com gás!      Seus experimentos sobre a qualidade do ar lhe renderam a medalha de ouro da Royal Society em 1773. Ele notou, em suas experiências, que alguns gases podiam ser coletados em água, mas que outros nela eram miscíveis e requeriam portanto mercúrio para serem contidos. Em um experimento a 1 de agosto de 1774 ele aqueceu cal de mercúrio (óxido vermelho de mercúrio, ou óxido mercúrico) com um vidro aquecido, liberando um gás que foi coletado sob água, e que tinha as propriedades do “ar deflogisticado”.    As experiências de Priestley provaram definitivamente que o ar não era um “elemento aristoteliano”, mas uma mistura de substâncias.       Durante a época em que Priestley estudava os gases do ar, na Rússia Mijail Vasilievich Lomonosov, um ótimo poeta e um extraordinário químico, preocupava-se com o aumento de peso dos metais quando calcinados ao ar. Em suas experiências, Lomonosov tomou o cuidado de pesar o crucíbulo antes e depois de ser aquecido, sem o metal presente, e concluiu que as chamas ou o material utilizado para o aquecimento não surtiam o efeito de aumentar o peso do crucíbulo. Ainda, quando o metal a ser calcinado era contido numa redoma hermética, o peso da redoma mais a cal formada (o óxido do metal) não se alterava. Após um sem número de

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experiências bem controladas, Lomonosov chegou à conclusão de que o peso de todas as substâncias que entram em reação é igual ao peso das substâncias obtidas como produto das mesmas. Estava assentada a base da Lei da Conservação da Matéria, mas inexplicavelmente, o editor de Lomonosov não tornou públicos os seus experimentos a não ser muitos anos mais tarde, e Lomonosov perdeu a chance de ser mundialmente reconhecido. 

    Partindo de experimentos semelhantes, o francês Antoine-Laurent Lavoisier chegou às mesmas conclusões de Lomonosov 18 anos mais tarde, na França. A Lavoisier cabe o mérito de ter rebatido definitivamente a teoria do flogiston: com suas experiências entre 1772 e 1777, demonstrou que as reações de combustão não são reações de decomposição, onde a substância perde flogiston, mas sim uma reação de combinação, onde um metal reage com o oxigênio do ar para formar óxidos. Ao mesmo tempo em que o elusivo flogiston tornava-se desnecessário para explicar relações ponderais entre reagentes e produtos em reações químicas, as próprias concepções básicas da química sofriam uma mudança radical: os metais, que eram tidos como compostos (contendo o metal e flogiston) resultaram ser na verdade elementos, e os seus óxidos, tidos como elementos, mostraram-se ser na verdade, compostos (contendo o metal e o oxigênio).      Invertendo o sistema do flogiston de ponta-cabeça, Lavoisier elaborou as bases para a sistematização da química, sendo por isso devidamente reconhecido como o Pai da Química Moderna.  Em novembro de 1774, Lavoisier começou uma série decisiva de experimentos. Ele aqueceu estanho e ar em um vaso fechado, e o vaso com o estanho não aumentou de peso. Quando o frasco foi aberto, ar entrou sibilando, e o aumento de peso do frasco tornou-se igual ao aumento de peso que o estanho somente havia sofrido. Portanto, concluiu Lavoisier, o aumento do peso do estanho era tão somente devido a uma absorção do ar no qual a calcinação havia ocorrido. Não havia ar no frasco suficiente para “saturar” todo o estanho, mas mesmo assim, ainda sobrava algum ar no frasco. Portanto Lavoisier concluiu que só uma porção do ar podia combinar-se com o metal durante a calcinação. Ele também achou que o aumento de peso do metal era idêntico à diminuição de peso do ar, o que lhe indicava que o ar era constituído de pelo menos dois constituintes, sendo que somente um combinava-se com o metal.

Lavoisier e a descrição elementar do Oxigênio e do Nitrogênio

    Lavoisier continuou seus importantes experimentos com mercúrio. O metal foi confinado em uma retorta com um pescoço em forma de S cuja extremidade era contida dentro de um frasco em forma de sino e que era selado do ambiente externo por uma camada de mercúrio. O ar da retorta ficava em comunicação com o ar do sino. O nível do mercúrio no sino era ajustado e sua posição “muito cuidadosamente marcada com uma fita de papel adesivo”. Num forno a carvão, o mercúrio na retorta era aquecido, até perto do seu ponto de ebulição. Lavoisier escreveu: “Nada ocorreu no primeiro dia. No segundo dia, notei algumas partículas vermelhas flutuando na superfície do mercúrio, e essas partículas aumentaram de volume e de quantidade durante os próximos três ou quatro dias. Elas então pararam e permaneceram na mesma condição. Ao final de doze dias, notando que nada mais iria acontecer, eu apaguei o fogo”. Depois de checar as variações de temperatura e pressão, Lavoisier notou que o volume do ar em contato com o mercúrio estava de 7 a 8 “polegadas cúbicas” menor que no início do experimento: cerca de 1/6 do ar total disponível. Notou que o ar que permanecia na retorta não reagia com o mercúrio a quente, e que extinguia uma vela acesa. Notou ainda que um rato era rapidamente sufocado quando colocado num sino com aquele gás. Lavoisier então chamou aquele gás de “azote”, das palavras gregas á (a = não) e zóê,ês (zot = vida). Em francês, a palavra ainda é azote, embora em português tenha se tornado nitrogênio, algo como "gerador de nitrum", o antigo nome científico latino para o salitre, KNO3, e em alemão stickstoff, que quer dizer “coisa sufocante”.      No final do século XVIII, Lavoisier já considerava o nitrogênio um elemento, embora até 1810 Sir Humphrey Davy, grande cientista inglês, um dos pais da Eletroquímica, duvidava da natureza elementar que Lavoisier havia dado ao nitrogênio, e tentava decompô-lo.    Coletando o pó vermelho de cal de mercúrio, colocando-o em uma retorta apropriada e reaquecendo-o, Lavoisier obteve entre 7 e 8 “polegadas cúbicas” do gás que obviamente havia sido retirado previamente do ar pelo mercúrio quente. Quando uma vela incandescente era imersa nesse gás, a vela queimava “com brilho cegante”, como Lavoisier escreveu. Quando um tição era colocado em presença do gás, entrava em chamas, e, além do mais, o gás não

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sufocava os ratos tal qual o azote. Lavoisier chamou esse gás de “ar vital”, e depois, oxigênio, que é mantido como o nome atual. 

Lavoisier foi o primeiro químico a revelar a natureza elementar do oxigênio de Priestley. Em 1772 o nitrogênio havia sido descrito por Daniel Rutherford, tio de Sir Walter Scott (que escreveu, entre outros, um romance sobre o lendário Ivanhoé), em sua defesa de tese de doutoramento. Rutherford deixava clara a existência de um gás (ar flogisticado), diferente do dióxido de carbono. Entretanto, foi o trabalho de Lavoisier sobre combustão e aumento de peso dos cais dos metais (óxidos), apresentado na primavera de 1775, que deu o golpe final na teoria do flogiston de Stahl.       Em 1783-4, Lavoisier distinguiu entre o hidrogênio e a matéria derivada do carvão, pelos seus diferentes produtos de combustão: água e “acide charbonneux”. Em 1787, ele e outros cientistas da época introduziram no “Méthode de nomenclature chimique” os nomes “carbono” para o elemento carbono, ao invés do utilizado “charbon”, para carvão, e “acide carbonique” para gás carbônico, ao invés do “ar fixo” de Priestley. O trabalho de Lavoisier inaugurou definitivamente a era da química como uma ciência quantitativa. Lavoisier, as suas próprias custas, chegou a calcinar um diamante para recolher o gás formado e comprovar que era gás carbônico, mostrando assim a natureza carbônica da pedra. Ele pesquisou o fósforo em animais e plantas, e ajudou a determinar a natureza elementar de muitos dos elementos conhecidos hoje. É dele a idéia de que um corpo químico pode ser chamado de elemento só quando esgotadas as possibilidades químicas possíveis de decompô-lo em seus elementos constituintes. Tendo sido o destruidor da teoria do flogiston, Lavoisier acreditava que certas coisas imateriais, como calor e luz (duas formas de energia) também tivessem caráter elementar.

O Hidrogênio

    O gás hidrogênio já era conhecido por Paracelsus, que o produzia fazendo ácido sulfúrico escorrer por sobre ferro. Ele escreveu “um ar aparece e se expande rápido como o vento”; Priestley o chamava de “ar inflamável”, mas é geralmente creditado a Mr. Henry Cavendish a descoberta da natureza elementar do gás, em 1766.     Mr. Cavendish era um cientista fantástico (pesquisava eletricidade, astronomia, meteorologia, química e física, sendo muito versado em matemática, mineração, metalurgia e geologia), mas tão tímido que os únicos contatos sociais que fazia eram as reuniões da Royal Society em Londres. Seus amigos mais íntimos afirmavam que a única forma de fazê-lo falar era fazer de conta que conversavam com uma sala vazia. Ele mesmo não se reconhecia o descobridor do hidrogênio, preferindo escrever “...foi notado por outros que...” Cavendish obtinha o hidrogênio passando ácido por metais, e coletando o gás sob mercúrio. Mesmo extremamente tímido, Sir Humphrey Davy escreveu posteriormente que Cavendish “tratava sobre todos os interesses das ciências de uma forma luminosa e profunda, e em discussões era maravilhosamente astuto...ele permanecerá ilustre nos anais da ciência...e será uma honra imortal para essa Casa, para essa época, e para esse país”, referindo-se à importância de Cavendish para a Sociedade Real e à ciência da Inglaterra.      A mãe de Cavendish morreu quando ele tinha apenas dois anos, o que ajuda a explicar sua extrema timidez. Durante a vida de seu pai ele vivia de uma pobre mesada, mas com a morte de seu pai herdou uma fabulosa herança, pois era descendente dos ducados de Devonshire e de Kent. Logo após morreria também sua querida tia, legando-o com mais uma fortuna. Cavendish morreu aos 77 anos tão só quanto viveu: pressentido sua morte, pediu ao serviçal que o atendia que deixasse o quarto e só retornasse após algum tempo. Quando o serviçal retornou encontrou o seu grande mestre morto. Como Cavendish sempre vivera de forma extremamente simples, abnegadamente voltada para o avanço das ciências, na época de sua morte ele era o maior depositante do Banco da Inglaterra. Cavendish foi também considerado o co-descobridor do nitrogênio.      Lavoisier obteve o gás hidrogênio passando vapor d’água sobre ferro incandescente. Ele escreveu “o ferro torna-se um óxido negro absolutamente igual àquele obtido pela sua calcinação ao ar” (nesse experimento o ferro é oxidado pela água, que é reduzida a hidrogênio). A mistura de hidrogênio com o oxigênio reage explosivamente quando inflamada, e “mesmo uma mistura de 1 parte de hidrogênio com 5 partes de ar atmosférico é explosiva nessas condições”. O resultado da combustão é um vapor que se liquefaz a um líquido que tem todas as propriedades da água, por exemplo, sendo incolor, congelando a zero e entrando em ebulição a 100 °C. Lavoisier deu o nome hidrogênio ao gás em 1783, porque nenhum outro lhe

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parecia adequado: o nome é derivado do grego húdór (hydor, água) e gèrus (gennao, eu gero; a palavra atual em alemão para hidrogênio é wasserstoff, algo como “coisa água”). Portanto, pela virada do século XIX já eram práticas comuns a combinação de oxigênio e hidrogênio para a formação da água, e a sua decomposição em hidrogênio e oxigênio por metais, onde o oxigênio permanecia combinado pela formação de óxidos.      Lavoisier sustentava suas próprias pesquisas com uma firma de arrecadação de impostos; Seus estudos quantitativos sobre massas de reagentes e produtos em reações químicas pode ser sumarizado na afirmação conhecida como a Lei da Conservação da Matéria, que Lomonosov já havia sujerido:  “Matéria nunca é perdida ou ganha em uma reação química”.     Um conterrâneo e contemporâneo de Lavoisier foi Joseph-Louis Proust. Proust foi um químico analítico soberbo: a cerca de 1780 foi co-descobridor do manganês; logo após encontrou o mesmo metal em plantas (hoje sabemos que o manganês é um “micro nutriente” essencial em plantas e animais). Seguindo a trilha aberta por Lavoisier, Proust, assim como muitos outros químicos, estudava os aspectos quantitativos da formação de compostos, e um desses estudos envolvia o carbonato de cobre. Proust descobriu de suas cuidadosas análises que, independentemente do método de preparo do composto em laboratório ou de como ele era isolado na natureza, sempre continha 57% de cobre, 36,2% de oxigênio e 5,4% de carbono, em massa. Outras cuidadosas análises levaram Proust a concluir a segunda lei fundamental da química, conhecida como Lei das Proporções Definidas, ou Lei da Composição Constante:  “Em um composto, os elementos constituintes estão sempre presentes em uma proporção em peso definida.”     Contra essa idéia era o Conde Claude Louis Berthollet, que achava que a composição química dum composto dependia tão somente da quantidade das substâncias empregadas na sua confecção. Essa briga entre Proust e Berthollet tomou grandes proporções, tendo durado 7 anos. Entretanto, Proust mostrou, com experimentos cuidadosos, demonstrados perante a Real Academia de Paris, que Berthollet havia feito análises não acuradas e que não havia purificado os seus compostos o suficiente, dois erros indesculpáveis em química. Durante a Revolução Francesa Proust conseguiu salvar-se fugindo para a Espanha, onde trabalhou sob a tutela financeira do rei Charles IV.      Em 1785 Rudolf Erich Raspe mostrou que o mineral schelita continha um metal recentemente descoberto por químicos espanhóis, que estudaram no Seminário de Vergara, Espanha, onde Proust era um dos professores (mais tarde Proust lecionaria no importante Laboratório Real de História Natural, em Madri). Esse metal, o tungstênio (W, wolfrâmio, de wolframita, tungstato manganoso de composição FeMnWO4), teve sua condição de endurecedor de ligas de ferro reconhecida por Raspe já naquela época. Hoje em dia objetos cortantes, que necessitam ser muito duros e abrasivos, contém quantidades variáveis de tungstênio: carbeto de tungstênio é tão duro que é conhecido como “diamante sintético” e empregado na manufatura de brocas de perfuração de petróleo. Outras ligas endurecidas com tungstênio são utilizadas na fabricação de ferramentas, desde chaves de fenda até facas Guinzu. Interessantemente, Raspe, um ótimo químico analista, holandês nascido em Hanover, era brilhante, versátil, mas um tremendo mau caráter. Raspe foi preso após penhorar medalhas de ouro que ele mesmo havia roubado do museu de Cassel, na época capital de um importante condado industrial do que viria a se tornar a Prússia, hoje parte da Alemanha. Fugiu da cadeia na noite em que foi preso e escapou para a Inglaterra, onde passou a lecionar e trabalhar com traduções, até falecer na Irlanda em 1794. De suas aventuras e seu trabalho como tradutor, Raspe teve imaginação suficiente para escrever o livro  “As Aventuras do Barão de Münchausen”, publicada em 1780.      Infelizmente, Charles IV foi deposto por Napoleão, época na qual os laboratórios de Proust em Madri foram destruídos. Desiludido, Proust parou de trabalhar, e finalmente conseguiu retornar para a França, onde passou a viver como aposentado pelo resto de sua vida.

Dalton, a Teoria Atômica, e a Água

    Os trabalhos de Proust tiveram profunda reflexão em um cavalheiro Inglês, um Quaker convicto. Os “Quakers” (eles mesmos não se chamam assim) são religiosos de uma seita Cristã Fundamentalista criada por outro inglês, George Fox, em 1650. Os Quakers cultuam o uso de roupas simples, a vida de maneiras simples, e a adoração a Deus. Se opõe ao serviço militar e a qualquer tipo de juramento. A palavra Quaquer origina-se nos ensinamentos de Fox:

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“Quake at the word of the Lord”, isto é, “trema à palavra de Deus”. Recentemente, o filme “A Pequena Testemunha”, estrelado por Harrison Ford, mostrou detalhes da vida de uma comunidade Amish (Quaquer) na Nova Inglaterra (EUA).      John Dalton ganhou enorme sucesso com seu trabalho: manteve mais de 200.000 anotações de laboratório somente sobre meteorologia. Ajudou a fundar a Academia Britânica para o Avanço das Ciências e fez estudos quantitativos sobre a composição de compostos diferentes, porém formados pelos mesmos elementos. Tais compostos tinham constituição diferente, mas cada um obedecia a Lei da Composição Definida de Proust. Um exemplo desse conceito são os gases monóxido de carbono (venenoso) e dióxido de carbono, um produto da respiração. No monóxido de carbono, carbono e oxigênio combinam-se nas proporções 3 para 4 em massa. No dióxido, os mesmos elementos estão na proporção de 3 para 8 (note que para uma mesma quantidade dos dois gases (3 partes de carbono) a razão dos oxigênios para os dois compostos é de 8 para 4, ou 2 para 1). Após analisar metano e etileno (gases compostos de carbono e hidrogênio) e uma série de óxidos de nitrogênio gasosos, Dalton enunciou em 1803 sua Lei das Proporções Múltiplas:  “Na formação de dois ou mais compostos a partir dos mesmos elementos, os pesos de um elemento que se combinam com um peso fixo do segundo elemento estão em uma razão de números pequenos e inteiros”     O grande sucesso obtido por Dalton veio como conseqüência natural de suas pesquisas: por que a Lei da Conservação da Matéria, de Lavoisier, a Lei das Proporções Definidas, de Proust, e a sua própria Lei das Proporções Múltiplas eram obedecidas pela matéria?      Para racionalizar esses dados, Dalton retornou à hipótese dos tempos da filosofia grega: a matéria seria formada por átomos! os antigos filósofos do Leste - Índia, Grécia, Roma, etc., fizeram muitas especulações interessantes a respeito da constituição da matéria. Dentre essas especulações, uma, ensinada por Kanáda, o fundador da filosofia hindú (muito mais remota que a filosofia grega), foi retomada por Demócrito, Leucipo e Lucrecio (mais ou menos modificadas, tais especulações sobrevivem até hoje na química moderna). Aparentemente, tais filósofos ensinavam que: (1) a matéria é discreta; (2) todas as substâncias são formadas por átomos que estão separados uns dos outros por espaços vazios; (3) os átomos estão em movimento constante; (4) movimento é uma propriedade inerente dos átomos. Tais átomos (de á, a, “não”, e tomê,ês, temno, “eu corto”), eram supostamente muito pequenos para serem percebidos pelos sentidos humanos, e além disso, eram supostamente eternos, indestrutíveis e imutáveis. Eles difeririam entre si em forma, tamanho, e modo de combinação, e a natureza devia suas propriedades aos diferentes átomos, seus arranjos e seus modos de combinação.      Ao longo dos séculos, essa idéia sempre teve seguidores: por exemplo, Sir Isaac Newton (1675) tentava explicar a Lei de Boyle para gases “PV= constante” como sendo resultado dos gases serem constituídos de partículas que se repeliam mutuamente... é portanto impossível dizer quem inventou a teoria atômica, por que a hipótese cresceu com a própria química! Entretanto, não passava de uma doutrina inanimada, até que John Dalton em 1801 a transformou de um dogma morto em uma hipótese viva, e a utilizou para finalmente explicar a difusão dos gases e em 1803, para explicar a composição da matéria e as combinações químicas.      Os postulados de Dalton eram, sumariamente, os seguintes: 1. átomos são partículas discretas, reais, que não podem ser subdivididas por nenhum processo químico conhecido. 2. átomos do mesmo elemento são iguais entre si, e com o mesmo peso. 3. átomos de elementos diferentes possuem propriedades diferentes: peso, afinidade, etc. 4. compostos são formados pela união de átomos de elementos diferentes, em simples proporções numéricas: 1 para 1, 1 para 2, 2 para 1, 2 para 3, etc. 5. o peso de elementos que se combinam representam o peso dos átomos que se combinam.      O único problema na época com a teoria atômica era que Dalton falhou em fixar um padrão para fixar os pesos atômicos relativos de elementos diferentes. Na época, sabia-se que o elemento mais leve era o hidrogênio, e que ele se combinava com o oxigênio para formar água numa proporção em peso de 1 para 8. Então, se fosse fixado o peso do hidrogênio como 1, o peso relativo do oxigênio seria 8. O próprio Dalton acreditava que a água teria como fórmula o símbolo HO, pois acreditava que os elementos deviam combinar-se segundo as proporções mais simples possíveis, numa clara visão Quaker da natureza.  A questão fundamental havia então se tornado a tentativa de descobrir “qual o menor peso de combinação de um elemento em seus compostos”, e era elusiva.      Para os óxidos de carbono, por exemplo, o oxigênio e o carbono estão nas seguintes proporções em peso: monóxido de carbono: oxigênio : carbono = 8 : 6 dióxido de carbono:

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oxigênio : carbono = 8 : 3 qual seria o peso do carbono se o oxigênio fosse 8, 6 ou 3? E se o monóxido de carbono fosse um composto de um oxigênio com dois átomos de carbono, cada carbono com um peso de combinação de apenas 3? O problema poderia ser resolvido se fosse definitivamente conhecida a fórmula do mais trivial dos compostos, a água! a ciência química teria de se armar com todo o seu arsenal experimental para estabelecer tal fato tão fundamental para o seu desenvolvimento. A água, sabia-se, sem sombras de dúvidas, ser formada apenas pelos já bem conhecidos hidrogênio e oxigênio.

Enfim, a Água!

Um eminente químico francês, professor em Sorbonne, Jean Baptiste-André Dumas (1800-1884) veio a determinar, em sua carreira, um grande número de pesos atômicos de diferentes elementos, e publicou seu excelente “Tratado de Química Aplicado às Artes”, um marco na ciência química da época. Dumas era um excelente químico orgânico, e defendia sua opiniões sobre a composição dos mesmos contra a teoria dualista da união de cargas opostas do eletroquímico J. J. Berzelius. Dumas divisou uma experiência definitiva para a determinação da composição da água por peso em 1842. Em seu experimento, hidrogênio era produzido pela ação de ácido sulfúrico pré-destilado sobre zinco metálico, era purificado no caminho, passando por sobre uma quantidade conhecida de óxido de cobre aquecido, reduzindo o óxido ao metal e formando uma quantidade definida de vapor d’água, que era coletada em tubos em “U” contendo hidróxido de potássio e pentóxido de fósforo, potentes materiais higroscópicos. Finalmente, medindo o aumento de peso dos tubos em “U”, a quantidade de água formada podia ser medida com a melhor precisão que se poderia obter na época. A média de 19 experimentos deu a Dumas os valores: óxido de cobre utilizado: 44,22 g; água produzida: 49,22 g; hidrogênio (por diferença, conhecendo-se a composição constante da água): 5,54 g. Assim, para cada 16 partes de oxigênio em massa, 2,004 partes em peso de hidrogênio eram combinadas para formar água (existe um curioso erro no experimento de Dumas, que, não corrigido, faz com que a massa de hidrogênio seja um pouco menor: algum hidrogênio é retido pelo cobre, como é sabido hoje em dia. Experimentos mais cuidadosos utilizando eletricidade para inflamar os gases combinantes em recipientes fechados feitos por Moreley mais tarde em 1895 dá a proporção de 16 : 2,016). Portanto a composição ponderal da água ficou bem estabelecida, e se Dalton estivesse correto em sua formulação do tipo OH, tal relação estaria muitíssimo próxima de 8:1.

O impacto das relações volumétricas

    William Nicholson publicou um importante livro “Primeiros Princípios da Química” em 1796, mas foi em 2 de maio de 1800 que ele notou que uma gota de água quando colocada nos eletrodos de uma cela galvânica iria produzir bolhas de gases nos dois eletrodos.      Ele então colocou os eletrodos em uma tina com água, porém dentro de tubos de ensaio invertidos e cheios de água, podendo assim, por deslocamento, isolar os gases que iam ser formados, e analisa-los. Nicholson notou que um deles queimava com “um brilho vivo”, tal qual o oxigênio, e que o outro queimava com uma chama azul quase imperceptível, tal qual o hidrogênio. Quando os dois gases eram unidos e inflamados, explodiam com a formação de vapor d’água.      O interessante desse tipo de experimento é que uma reação química produz corrente (na cela galvânica), e inversamente, a corrente provoca uma reação química (a decomposição da água).      A importância daquele experimento foi chamar a atenção de Nicholson e colaboradores para que o volume de hidrogênio formado, como mostrado pelo deslocamento da água inicialmente contida no tubo de ensaio invertido, era sempre duas vezes maior que o volume de água deslocado pelo oxigênio produzido no outro tubo de ensaio, após a pressão dos dois tubos terem se igualado. Segundo a fórmula da água proposta por Dalton, HO, onde o peso do hidrogênio seria a unidade e o peso do oxigênio 8, resultados que estavam bem de acordo com os experimentos ponderais de Dumas, o experimento de Nicholson implicaria que o átomo de hidrogênio, de menor peso, seria duas vezes maior (ocuparia o dobro do volume) que o de oxigênio! Relações volumétricas entre os gases formadores da água já haviam sido notados a bastante tempo, mas anteriormente à teoria de Dalton não puderam ser suficientemente elucidativos. Um dos primeiros a notar essas relações volumétricas foi Mr. Cavendish, que em 1781 ouvia uma palestra de Priestley na Royal Society, onde aquele eminente químico

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mostrava como curiosidade a explosão que acontecia entre oxigênio e “ar inflamável” (hidrogênio) quando submetidos a uma fagulha elétrica. Para Priestley era somente “um experimento casual para entreter uns poucos amigos filósofos”, mas Cavendish ficou intrigado com a quantidade de umidade que se formou dentro do tubo de vidro onde ocorreu a explosão. No mesmo ano, Cavendish notou que 2 partes em volume de hidrogênio com uma parte em volume de oxigênio reagiam à fagulha elétrica produzindo uma certa quantidade de água, sem nenhum gás permanecendo no frasco da reação. Cavendish notou imediatamente que a água deveria ser constituída por hidrogênio e oxigênio, e informou Priestley e Lavoisier o seu achado, que foi oficialmente publicado já em 1784.      Foi necessário Dalton ter dirigido os químicos para as relações ponderais dos corpos que se combinam para que, logo após, Louis-Joseph Gay Lussac (1778-1850) estabelecesse uma correspondência parecida, porém entre volumes de gases que reagem entre si. Gay Lussac estava interessado em saber se o ar da Terra tinha composição constante ou se variava de lugar para lugar. Nessa análise, foi auxiliado pelo Barão Alexander von Humboldt, célebre naturalista e explorador, que coletou amostras de ar atmosférico em diferentes partes do planeta. Gay Lussac utilizava o procedimento de Cavendish, queimando hidrogênio com o oxigênio (oriundo das amostras do ar atmosférico) por meio de uma centelha elétrica, e em 1805 concluiu que “100 volumes de oxigênio requerem 199.89 volumes de hidrogênio para completa saturação, para os quais 200 podem ser contados sem erro” (à mesma pressão).      Pesquisas similares da época implicavam que oxigênio combinava-se com hidrogênio numa proporção de 1 : 2,00245 em volume (notável o grau de precisão da medida).      Intrigado por essa relação simples, Gay Lussac fez uma série de novos experimentos, mas com gases diferentes, sempre encontrando relações volumétricas simples após suas combinações. Por exemplo, 1 volume de hidrogênio combina-se com 1 volume de cloro para formar 1 volume de ácido clorídrico, todos no estado gasoso e à mesma pressão. Para a água era sempre encontrado que 2 volumes de hidrogênio sempre se combinavam com 1 volume de oxigênio para formar dois volumes de água. Gay Lussac generalizou seus achados no que é hoje a conhecida Lei de Gay Lussac (assumindo que os reagentes e produtos estejam nas mesmas condições de temperatura e pressão): “Quando gases reagem entre si, eles o fazem em volumes que tem uma relação simples uns com o outros, e ao volume dos produtos gasosos da reação”. 

A dicotomia de Gay-Lussac e Dalton

    Os químicos da época foram levados de uma plataforma empírica aonde os elementos combinavam-se por peso até uma singularidade em que também se combinavam por volume, portanto, era passível de ser pensada uma teoria similar à de Dalton: se (1) os elementos nos estados gasosos se unem em proporções simples por volume, e (2), se os elementos também se combinam em simples proporções por átomos, então “o número de átomos em volumes iguais de gases diferentes devem ter relações simples entre si”. Tal pensamento era contraditório: se 2n átomos de hidrogênio (contidos em 2 volumes) reagem com n átomos de oxigênio (contidos em 1 volume) para formarem 2n “átomos compostos” de vapor d’água (contidos em 2 volumes), então obviamente 2 átomos de hidrogênio combinavam-se com 1 átomo de oxigênio para formar 2 “átomos compostos” de vapor. Mas, nesse caso, cada átomo de oxigênio deveria ter sido partido em dois, para poder formar dois “átomos compostos” de vapor. Isso contrariava a teoria de Dalton do átomo indivisível. 

O conceito de molécula

    O impasse a que se havia chegado só começou a ser desvencilhado por um físico e advogado italiano, Amadeo Carlo Avogadro, Conde de   Quarengua e Di Cerretto (1776-1856), que apontou em 1811 que a pendenga no raciocínio de Gay Lussac poderia ser evitado se os átomos elementares fossem distinguidos claramente das partículas de um gás. Avogadro assumiu que essas partículas eram agregados constituídos de um número definido de átomos, e chamou essas partículas de moléculas, um diminutivo da palavra latina moles, que significa “massa”. Cada molécula de um gás elementar conteria o mesmo número e o mesmo tipo de átomos. Avogadro defendia que tanto as moléculas do gás hidrogênio conteriam dois átomos de hidrogênio, quanto uma molécula de oxigênio conteria dois átomos do elemento oxigênio. Assim sendo, a Lei de Gay Lussac poderia ser redefinida como “volumes iguais de gases

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diferentes contém o mesmo número de moléculas”. Expressa em termos mais atuais, a dicotomia de Gay Lussac poderia ser explicada como:  2 (volumes) H2 + 1 (volume) O2 → 2 (volumes) H2O ou 2 moléculas de hidrogênio + 1 molécula de oxigênio → 2 moléculas de água     Avogadro assumia por simplicidade que a molécula de água deveria conter 3 átomos, pois que a molécula de oxigênio haveria de ter sido quebrada pela metade quando da combinação química. Portanto, Avogadro modificou a hipótese atômica e a adaptou para o caso particular dos gases, e definiu sua “molécula” como sendo “a menor partícula de um elemento ou composto existentes em um gás livre”.     A hipótese de Avogadro provou ser uma das mais sugestivas e bem sucedidas para o desenvolvimento da química. Ela relacionou o que parecia ser antagônico, harmonizou o que parecia ser discordante e confuso, e fez da hipótese de Dalton um teoria clara, inteligível e fértil.     

O Congresso de Karlsruhe

    A sociedade científica da época estava tão dividida a respeito de todos esses temas, que em setembro de 1860 decidiu reunir as mentes mais brilhantes da química em um congresso em Karlsruhe, na Alemanha. O principal tema seria a discussão das inconsistências sobre pesos atômicos relativos dos elementos, ainda porque havia mais de uma discórdia: certas escolas usavam o padrão de Dalton, tendo o hidrogênio como 1, mas o hidrogênio não reagia com todos os elementos conhecidos, o que fazia do oxigênio o melhor “elemento padrão” para uma tabela unificada de pesos atômicos. Para estabelecer o oxigênio como padrão, entretanto, era vital estabelecer sua relação com o hidrogênio, ou seja, rediscutir se a fórmula da água era HO (onde o peso relativo do oxigênio seria 8) ou H2O (com o oxigênio fixado em 16 para o hidrogênio continuar sendo 1, ou mais precisamente, 1,008, de acordo com as experiências eletroquímicas de Dimas, Moseley e seguidores). Havia ainda divergências quanto ao peso do padrão: outras escolas, como a de T. Thompson, assumia o oxigênio = 1 (1825); W. H. Wollaston (1814) 10, J. S. Stas (1860-65) 16 e Berzelius (1830) assumia o oxigênio = 100 como padrão. Lá pelo final da conferência, o eminente cientista italiano, Stanislau Cannizarro (1826-1910), cujo trabalho em muito contribuiu para o posterior desenvolvimento da tabela atual de pesos atômicos, sugeriu aos companheiros que prestassem atenção às antigas idéias de seu compatriota Avogadro sobre moléculas, mas a reunião acabou ainda assim em completo desentendimento: seria a molécula de hidrogênio H ou H2? A de oxigênio O ou O2? A de água HO ou H2O?      Somente muitos anos depois dessa conferência é que as idéias de Avogadro foram finalmente aceitas (de fato, uns 50 anos depois de Avogadro ter apresentado suas idéias: a essa altura, ele já havia falecido à tempos), e a molécula de água passou a ser descrita quimicamente como H2O. 

O método das Densidades Relativas de Cannizarro

    A resposta correta deveu-se à aplicação da hipótese molecular de Avogadro pelo seu defensor Cannizzaro, que raciocinou que nas mesmas condições de 0 °C e 760 mmHg de pressão, um volume de vapor d’água “pesa” 8,95 g se comparado com o mesmo volume ocupado por 1 g de hidrogênio, isto é, a densidade relativa do vapor é quase 9 vezes a do hidrogênio, se os volumes iguais dos dois gases forem comparados à mesma temperatura e pressão. De acordo com Avogadro, em volumes iguais de gases têm-se números iguais de moléculas, portanto, a densidade relativa de um gás é função de sua massa molecular. Se aceita essa dedução, ela nos permite descobrir a massa molecular de um gás, dede que tenhamos um padrão.     Essas importantes deduções foram publicadas em um panfleto por Stanislaw Cannizzaro em 1858, portanto antes da conferência de Karlsruhe. Ele achou, por exemplo, as “relativas densidades” de 32 para o oxigênio, 71 para o cloro, 28 para o nitrogênio, entre muitas outras medidas. Assumindo tais moléculas diatômicas, o “peso relativo” de cada elemento seria: para o hidrogênio = 1, O = 16; Cl = 35,5; N = 14; valores que são aceitos hoje em dia, em quaisquer cálculos em que não se necessita um cálculo muito preciso.      De acordo com Cannizzaro, a “densidade” do vapor d’água era 18, exatamente a soma de 2H (1) + 1O (16). As aplicações da densidade relativa de Cannizzaro a gases foram lentamente sendo implementadas por outros químicos, principalmente por Volfgang Meyer em 1877, que determinou uma série de pesos moleculares de gases e de sólidos que se vaporizam sem decomposição. Os resultados dessas importantes pesquisas vieram finalmente a

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estabelecer a fórmula da água e as bases da tabela de “pesos” atômicos dos elementos.   

Conclusão

    Por muito tempo desde os idos de 1860, o oxigênio foi utilizado como padrão na escala de pesos atômicos após ter sido estabelecida sua relação ponderal com o hidrogênio na água (estamos na realidade falando de massas atômicas). A partir de 1961, uma nova conferência internacional reuniu físicos e químicos para discutir a proposta do uso do padrão Carbono-12, que é o empregado hoje; cálculos atuais de física e química, para serem precisos, requerem que o oxigênio tenha sua massa redefinida. Nessa nova escala, o átomo de hidrogênio é tido como pesando 1/12 do átomo do isótopo de massa 12 do carbono, mais precisamente 1,0079, a variação isotópica do elemento limitando a precisão maior da medida. Ainda nessa escala, o oxigênio fica redefinido à massa de 15,999(4), o último dígito sendo incerto pela possibilidade da separação de isótopos ainda desconhecidos. Aliás, hoje sabemos que Dalton e os gregos estavam errados, isto é, que os átomos de um mesmo elemento não são todos iguais (isótopos possuem massas diferentes), e principalmente, são divisíveis. A descoberta da radioatividade natural por Henry Becquerel (1852-1908) em minérios de urânio e de rádio em 1896, e o isolamento do rádio radiativo e de muitos de seus compostos puros pela sua aluna Marie Curie (1867-1934) mostra claramente que os átomos devem possuir uma certa estrutura interna. Mas essa já é outra história... 

Jubilate coeli, jubilate mundi, Christus Jesus surrexit vere

1° TRABALHO DO 3° BIMESTRE

RESPONDA ÀS QUESTÕES PROPOSTAS E ENTREGUE O TRABALHONA DATA MARCADA PELO PROFESSOR

Questão 1 – Que gás, conhecido por nós hoje em dia, poderia ser caracterizado pelas propriedades descritas por Joseph Priestley que o denominou como “ar deflogiscado”? Justifique sua resposta.Questão 2 – A partir dos acontecimentos descritos no texto, retire pelo menos três experiências que demonstram que o ar não pode ser considerado um elemento. Descreva a maneira como foram realizadas e os cientistas que as protagonizaram.Questão 3 – Aquilo que Lavoisier chamou de azote pode ser considerada como substancia? Explique sua resposta.Questão 4 – Que porcentagem do ar dentro da retorta utilizada por Lavoisier era de oxigênio? Esse dado é compatível com a porcentagem atribuída hoje ao oxigênio? Por quê?Questão 5 – Considerando a proporção citada no texto, verifique se a reação de formação de água a partir de 2 gramas de gás hidrogênio e 16 gramas de gás oxigênio é explosiva. Explique sua resposta. Questão 6 – A partir das informações a respeito das experiências que Proust realizou com o carbonato de cobre, calcule a massa de cobre, oxigênio e carbono em 1 kg desse material. Faça uma pesquisa e descubra por qual motivo a massa dos elementos, calculada anteriormente, não somam juntas 1 kg. Questão 7 – De acordo com as experiências que Dalton realizou com os óxidos de carbono, para obtermos 28g de monóxido de carbono a partir de 24g de carbono necessitaríamos de 32g de oxigênio. Calcule a massa mínima de oxigênio necessária para obtermos o dióxido de carbono a partir da mesma quantidade de carbono citada anteriormente. Justifique sua resposta.Questão 8 – Por qual motivo Dalton não estabeleceu valores de massa para os elementos químicos, próximo dos valores hoje conhecidos (por exemplo, valores de massa encontrados na Tabela Periódica) ? Explique a resposta.Questão 9 – Numa dada experiência, o célebre cientista Cavendish notou que “ (...) 2 partes em volume de hidrogênio com 1 parte em volume de oxigênio reagiam à fagulha elétrica produzindo uma certa quantidade de água (...)”. Faça uma análise desse fenômeno à luz da Química moderna.

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Questão 10 – Após a leitura do texto identifique:a) o problema sobre o qual se debruçaram os estudiosos;b) a metodologia utilizada para resolver o problema;c) a solução encontrada; d) em sua opinião, qual foi a idéia que mais contribui para elucidar o valor de massa dos

elementos? Quem a elaborou? Justifique.Questão 1 – Que gás, conhecido por nós hoje em dia, poderia ser caracterizado pelas propriedades descritas por Joseph Priestley que o denominou como “ar deflogiscado”? Justifique sua resposta.

Gás oxigênio. Este gás é o produzido pelas plantas que melhoraram a qualidade do ar nas redomas em que Priestley havia queimado velas, a ponto destas poderem ser novamente acesas, ou onde ratos podiam novamente sobreviver. Uma outra evidência de que esse gás era o oxigênio, se revela na experiência em que Priestley aquece óxido de mercúrio obtendo o metal (Hg) e o gás.Questão 2 – A partir dos acontecimentos descritos no texto, retire pelo menos três experiências que demonstram que o ar não pode ser considerado um elemento. Descreva a maneira como foram realizadas e os cientistas que as protagonizaram.1ª Experiência: Lavoisier aqueceu estanho e ar em um vaso fechado, e o vaso com o estanho não aumentou de peso. Quando o frasco foi aberto, ar entrou sibilando, e o aumento de peso do frasco tornou-se igual ao aumento de peso que o estanho somente havia sofrido. Portanto, concluiu Lavoisier, o aumento do peso do estanho era tão somente devido a uma absorção do ar no qual a calcinação havia ocorrido. Não havia ar no frasco suficiente para “saturar” todo o estanho, mas mesmo assim, ainda sobrava algum ar no frasco. Portanto Lavoisier concluiu que só uma porção do ar podia combinar-se com o metal durante a calcinação. Ele também achou que o aumento de peso do metal era idêntico à diminuição de peso do ar, o que lhe indicava que o ar era constituído de pelo menos dois constituintes, sendo que somente um combinava-se com o metal.2ª Experiência: Lavoisier aqueceu durante dias, em um sistema fechado, o metal mercúrio a uma temperatura próxima ao seu ponto de ebulição. Lavoisier notou algumas partículas vermelhas flutuando na superfície do mercúrio, e essas partículas aumentaram de volume e de quantidade durante os próximos três ou quatro dias. Elas então pararam e permaneceram na mesma condição. Ao final de doze dias, notando que nada mais iria acontecer, apagou o fogo. Depois de checar as variações de temperatura e pressão, Lavoisier notou que o volume do ar em contato com o mercúrio estava de 7 a 8 “polegadas cúbicas” menor que no início do experimento. Notou que o ar que permanecia na retorta não reagia com o mercúrio a quente, e que extinguia uma vela acesa. Notou ainda que um rato era rapidamente sufocado quando colocado num sino com aquele gás. Lavoisier então chamou aquele gás de “azote”.Questão 3 – Aquilo que Lavoisier chamou de azote pode ser considerada como substancia? Explique sua resposta.Não. O ar que restou, após o aquecimento do mercúrio, é na verdade uma mistura que inclui vários gases, dentre eles, o próprio nitrogênio. Questão 4 – Que porcentagem do ar dentro da retorta utilizada por Lavoisier era de oxigênio? Esse dado é compatível com a porcentagem atribuída hoje ao oxigênio? Por quê?

Considerando que Lavoisier registrou que o volume do ar em contato com o mercúrio havia diminuído cerca de 1/6, podemos estipular que o oxigênio corresponderia a 16,7% desse ar. Hoje em dia sabemos que 20,9% do ar atmosférico, limpo e seco, é formados de oxigênio. Certamente um dos motivos da disparidade existente entre os valores numéricos se deve ao fato de que Lavoisier não trabalhava com ar limpo e seco. Além do mais, verifica-se que no próprio texto os dados são imprecisos (7 a 8 polegadas cúbicas) o que demonstra a limitação, imposta pela época em que fora realizado o experimento, de se fazer medidas de volume com a precisão que temos hoje em dia.Questão 5 – Considerando a proporção citada no texto, verifique se a reação de formação de água a partir de 2 gramas de gás hidrogênio e 16 gramas de gás oxigênio é explosiva. Explique sua resposta. Sim é explosiva. A massa total de Hidrogênio vai ser consumida nessa reação, apesar de não ocorrer o mesmo com o Oxigênio. Questão 6 – A partir das informações a respeito das experiências que Proust realizou com o carbonato de cobre, calcule a massa de cobre, oxigênio e carbono em 1 kg desse material.

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Faça uma pesquisa e descubra por qual motivo a massa dos elementos, calculada anteriormente, não somam juntas 1 kg. Cobre = 570 g; Oxigênio = 362 g; Carbono = 54 g. Ao somarmos as massas dos componentes do carbonato de cobre, podemos verificar que totalizam 986 g, Faltam então, 4 g para completarmos 1 Kg. Mas esses valores foram calculados de acordo com as porcentagens fornecidas por Proust que considerava que o carbonato de cobre era formado apenas por carbono, oxigênio e cobre. Porém, uma pesquisa a respeito dessa substância, nos revela que sua fórmula mínima é CuCO3.Cu(OH)2. Assim, podemos considerar que a diferença nos resultados calculados no início da resposta a essa questão (6) advém, em parte, da ausência da contribuição do elemento químico Hidrogênio. Questão 7 – De acordo com as experiências que Dalton realizou com os óxidos de carbono, para obtermos 28g de monóxido de carbono a partir de 24g de carbono necessitaríamos de 32g de oxigênio. Calcule a massa mínima de oxigênio necessária para obtermos o dióxido de carbono a partir da mesma quantidade de carbono citada anteriormente. Justifique sua resposta.24 g de Carbono vão requerer 64 g de Oxigênio, pois a fórmula do dióxido de carbono é CO2.Questão 8 – Por qual motivo Dalton não estabeleceu valores de massa para os elementos químicos, próximo dos valores hoje conhecidos (por exemplo, valores de massa encontrados na Tabela Periódica) ? Explique a resposta.

Dalton falhou em fixar um padrão para fixar os pesos atômicos relativos de elementos diferentes. Na época, sabia-se que o elemento mais leve era o hidrogênio, e que ele se combinava com o oxigênio para formar água numa proporção em peso de 1 para 8. Então, se fosse fixado o peso do hidrogênio como 1, o peso relativo do oxigênio seria 8. O próprio Dalton acreditava que a água teria como fórmula o símbolo HO.      Para os óxidos de carbono, por exemplo, o oxigênio e o carbono estão nas seguintes proporções em peso: monóxido de carbono: oxigênio : carbono = 8 : 6 dióxido de carbono: oxigênio : carbono = 8 : 3 qual seria o peso do carbono se o oxigênio fosse 8, 6 ou 3? E se o monóxido de carbono fosse um composto de um oxigênio com dois átomos de carbono, cada carbono com um peso de combinação de apenas 3? O problema poderia ser resolvido se fosse definitivamente conhecida a fórmula do mais trivial dos compostos, a água! a ciência química teria de se armar com todo o seu arsenal experimental para estabelecer tal fato tão fundamental para o seu desenvolvimentoQuestão 9 – Numa dada experiência, o célebre cientista Cavendish notou que “ (...) 2 partes em volume de hidrogênio com 1 parte em volume de oxigênio reagiam à fagulha elétrica produzindo uma certa quantidade de água (...)”. Faça uma análise desse fenômeno à luz da Química moderna. Ao analisarmos a equação química que descreve a síntese da água, 2H2 + 1O2 → 2 H2O , notamos que 2 mol do gás Hidrogênio reagem com 1 mol do gás Oxigênio. Se admitirmos que esses dois gases se comportam de acordo com a teoria cinética dos gases ideais, então podemos encontrar uma justificativa para a observação de Cavendis, pois 2 mol de H2 possui o dobro do volume de 1 mol de O2.Questão 10 – Após a leitura do texto identifique:

e) o problema sobre o qual se debruçaram os estudiosos;Após a evidencia de que os elementos aristotélicos na verdade eram compostos, os

estudiosos lançaram-se na busca da “verdadeira” natureza da matéria e suas pesquisas indicavam que a determinação da composição química dos materiais só seria possível quando conhecessem a massa dos átomos (Teoria de Dalton) que os compunham.

f) a metodologia utilizada para resolver o problema;Determinar qual elemento químico poderia ser considerado como o padrão para a massa

dos outros elementos que, a partir daí, teriam massas relativas. O Hidrogênio por ser o elemento químico conhecido de menor massa, havia sido escolhido como o padrão. Mas, como eles poderiam determinar tal massa se não sabiam ao certo qual era a relação entre o hidrogênio e o oxigênio na composição da água? Os diversos experimentos citados no texto demonstram que os resultados obtidos por Dalton, Nicholson, Gay Lussac, etc. pareciam conflitantes.

g) a solução encontrada; Avogadro assumiu que essas partículas eram agregados constituídos de um número

definido de átomos, e chamou essas partículas de moléculas, um diminutivo da palavra latina

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moles, que significa “massa”. Cada molécula de um gás elementar conteria o mesmo número e o mesmo tipo de átomos. Avogadro defendia que tanto as moléculas do gás hidrogênio conteriam dois átomos de hidrogênio, quanto uma molécula de oxigênio conteria dois átomos do elemento oxigênio. Assim sendo, a Lei de Gay Lussac poderia ser redefinida como “volumes iguais de gases diferentes contém o mesmo número de moléculas”. Expressa em termos mais atuais, a dicotomia de Gay Lussac poderia ser explicada como:  2 (volumes) H2 + 1 (volume) O2 → 2 (volumes) H2O ou 2 moléculas de hidrogênio + 1 molécula de oxigênio → 2 moléculas de água     Avogadro assumia por simplicidade que a molécula de água deveria conter 3 átomos, pois que a molécula de oxigênio haveria de ter sido quebrada pela metade quando da combinação química. Portanto, Avogadro modificou a hipótese atômica e a adaptou para o caso particular dos gases, e definiu sua “molécula” como sendo “a menor partícula de um elemento ou composto existente em um gás livre”.     A hipótese de Avogadro provou ser uma das mais sugestivas e bem sucedidas para o desenvolvimento da química. Ela relacionou o que parecia ser antagônico, harmonizou o que parecia ser discordante e confuso, e fez da hipótese de Dalton uma teoria clara, inteligível e fértil.

h) em sua opinião, qual foi a idéia que mais contribui para elucidar o valor de massa dos elementos? Quem a elaborou? Justifique.