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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE PSICOLOGIA ENSAIOS CLÍNICOS: O AMADOR ENQUANTO POSTURA POSSÍVEL Clarissa Pasqualotto Lajeado, novembro de 2013

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Page 1: Clarissa Pasqualotto - Univates · convocando-nos a perceber o sentido dos acontecimentos indomináveis e sedutores do cotidiano. 1 Mais precisamente, na autobiografia Roland Barthes

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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIVATES CURSO DE PSICOLOGIA

ENSAIOS CLÍNICOS: O AMADOR ENQUANTO POSTURA POSSÍVEL

Clarissa Pasqualotto

Lajeado, novembro de 2013

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Clarissa Pasqualotto

ENSAIOS CLÍNICOS:

O AMADOR ENQUANTO POSTURA POSSÍVEL

Monografia apresentada na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso II, do Curso de Psicologia do Centro Universitário Univates, como avaliação do semestre.

Orientador: Prof. Dr. Cristiano Bedin da Costa

Lajeado, novembro de 2013

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Clarissa Pasqualotto

ENSAIOS CLÍNICOS:

O AMADOR ENQUANTO POSTURA POSSÍVEL

A Banca examinadora abaixo aprova a Monografia apresentada na disciplina de

Trabalho de Conclusão de Curso II, na linha de formação específica em Psicologia,

do Centro Universitário UNIVATES, como parte da exigência para obtenção de grau

de Bacharel em Psicologia.

Prof. Dr. Cristiano Bedin da Costa – orientador

Centro Universitário UNIVATES

Profa. Dra. Rafaela Schneider Brasil

Centro Universitário UNIVATES

Profa. Dra. Angélica Vier Munhoz

Centro Universitário UNIVATES

Lajeado, novembro de 2013

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Dedico esta, bem como todas as minhas demais conquistas,

aos meus pais Joacir e Ivanir, meus exemplos de vida, que

com muito esforço, proporcionaram a mim a oportunidade de

realizar um grande sonho.

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AGRADECIMENTOS

Minha caminhada não seria tão prazerosa e tampouco concluída sem o apoio dos

meus pais Joacir e Ivanir e meu irmão Joniel. Obrigada pelas palavras, incentivo,

abraços e principalmente por acreditarem em mim.

A minha eterna companheira Ilse (em memória), minha avó querida, que sinto todo

dia segurando na minha mão.

Aos meus amigos e colegas, apoiadores e acompanhantes da realização de um

grande sonho.

Ao meu mestre Dr. Cristiano Bedin da Costa, que com muita paciência me orientou,

acreditou no meu potencial, acolheu-me quando necessário e da mesma forma

motivou-me. Essa conquista é nossa!

As professoras Dra. Rafaela Brasil e Dra. Angélica Munhoz, por se disporem a

participar vivamente desde momento.

A todos os professores que acompanharam minha caminhada acadêmica,

potencializando-a em cada passo.

Ao Centro Universitário Univates, por proporcionar um ensino tão qualificado e

problematizador como este.

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“Meu ensinamento diz: viver de tal modo que tenhas de desejar

outra vez (...) Quem encontra no esforço o mais alto

sentimento, que se esforce; quem encontra no repouso o mais

alto sentimento, que repouse; quem encontra em subordinar-

se, seguir, obedecer, o mais alto sentimento, que obedeça.

Mas que tome consciência do que é que lhe dá o mais alto

sentimento, e não receie nenhum meio! Isso vale a eternidade!”

Friedrich Nietzsche

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ARRANJO

I O TATEAR DO ESPAÇO 9

II DO ENCONTRO 11

III O AMADOR E SUAS ENTRELINHAS 15

III.I Amador-Intuitivo 17

III.II Devir-Amador 18

III.III Amador-Curioso-Nômade 21

IV BOBAGENS DO ACONTECIMENTO 24

IV.I Músicas da noite, das janelas, do inverno 24

IV.II Muros Produ(a)tores de/em sentidos 26

IV.III Do Esperar 28

IV.IV Do pensamento que pensa, do pensar do pensamento 28

V AMADOR NA CLÍNICA 31

REFERENCIAL BIBLIOGRÁFICO 33

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I O TATEAR DO ESPAÇO

Esta é uma produção amadora, tal como a noção proposta por Roland

Barthes no decorrer de sua obra1. Por meio de revisões bibliográficas, a partir da

articulação de produções de Gilles Deleuze, Félix Guattari, Roland Barthes, Michel

Foucault, Peter Pál Pelbart, Claudio Ulpiano e outros, buscamos pensar novas

formas de perceber, movimentar a clínica e o cotidiano enquanto produtores de

sentidos.

A noção de amador é citada por Barthes em pequenos trechos de suas obras,

onde o autor tem como propósito pensar sua possível existência e suas interações

com o meio em que vive. Através desta produção desejosa, Barthes busca perceber

a textura, o efeito da escrita, do escrever, do trabalhar, do pensar, do fazer.

Os ensaios aqui dispostos surgem para auxiliar o pensamento da postura do

amador em meio às existências cotidianas, buscando problematizar seus

movimentos através de sua forma, tempo e espaço ocupados. As possibilidades de

pensarmos Barthes – e o amador – em circulação com a clínica nos permitem

articular movimentos, provocando-nos a pensar em um descaminho daquilo que se

conhece, convocando-nos a perceber o sentido dos acontecimentos indomináveis e

sedutores do cotidiano.

1 Mais precisamente, na autobiografia Roland Barthes por Roland Barthes (2003), no texto “Música

prática”, presente em O óbvio e o obtuso (2009), e em algumas passagens de Fragmentos de um discurso amoroso (2007).

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II DO ENCONTRO

O conheci em uma manhã fria de agosto no ano 2012. Aproximou-se

inesperadamente e com cautela, invadiu-me. Movimentador, provocador. Assim o

senti, naquele primeiro momento: “se sente tocado por sua “língua magnífica” e

pelas “finezas” que acompanham sua indisposição contra “qualquer normatividade”

(MOTTA, p.17 2011). Difícil definir a forma que adentra nossos pensamentos, nosso

corpo. Arrepia, emociona, questiona. Em cada encontro, surge mais emoção, mais

gestos, empolgação.

“O sabor de Barthes é sua qualidade de escritor, sua capacidade de introduzir o estranhamento da fórmula artística (surpresa e prazer) no gênero ensaístico que ele pratica e renova: o jogo com os significantes, a polifonia de uma enunciação sutil que trança, em seu texto, várias faixas de onda: inteligência, erudição, ironia, humor, provocação, afeto.” (PERRONE-MOISÉS, 2012 apud Barthes, 2012, p.XVI).

Afastamo-nos por um determinado período, fases da vida, escolhas. Sentia

um espaço inócuo fazendo parte de mim, aquele mesmo que sentia quando alguns

outros se aproximavam e não marcavam. Foi então, que meses depois, nos

reencontramos. Habita-me por completo e me faz apaixonar ainda mais pela leveza

e imensidão que proporciona. Confesso: o momento é delicado, turbilhões de

sentimentos sendo (re)tecidos, (re)conhecidos. Porém, como de costume, sua

aproximação acontece como o sopro do vento junto à brisa, que arrepia, fazendo

perceber-se facilmente, mas não, simplesmente. Tão incerto e impuro quanto o

vento, surpreende ainda, através de sua constância. Percorre as entrelinhas do

cotidiano (in)certo, circulando delicadamente entre acontecimentos banalizados e o

que está em torno destes.

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Acompanha-me do pensamento à prática, da ideia ao ato, da noção à

dimensão, de casa ao bar, da música à dança, da noite ao dia. Sua presença é

inevitavelmente sentida, mesmo porque, as mochilas que carrega não permitem que

passe despercebido. Mochilas transbordando pensamentos, questionamentos,

sentimentos. Uma mochila de alças largas para suportar o peso inexistente devido à

leveza de suas palavras. “Sua sabedoria é o que constitui propriamente sua lição, já

que o sabor do escritor pode ser desfrutado mas nunca ensinado” (PERRONE-

MOISÉS, 2012 apud Barthes, 2012, p.XVI).

Desacomodar. Estranhar. Encontros delineados pela pulsão de vida de

qualquer situação, espaço, coisa, bobagem. Observações, mudanças, tentativas.

Repito: é como o vento: Que perpassa em qualquer espaço, por qualquer momento,

sempre provocando alguma sensação, alguns tropeços, estranhamentos. Na maior

parte do tempo, o vejo circulando, muito mais do que apenas perambulando,

caminhando. Calmamente – mas não estaticamente - ele circula o meio, buscando

singularizar o que observa, observar o singular, e fascinar-se pelo ilegível, pelas

entrelinhas, enlaçando o cotidiano em uma lógica profunda, na tentativa de um olhar

desconhecido frente ao comum.

Convocou-me a mergulhar. Tão imenso quando o mar, tão movimentador

quanto, tão possibilitador. Mergulhei inteira, me deixei inundar por letras em

conjunto, por palavras sensíveis derramadas em páginas de suas obras. Emergi em

um meio inicialmente desconhecido, mas obviamente vivido despercebidamente, até

então.

Inicio o processo de senti-lo em meu meio. Frases soltas, fatos intensos,

imagens comuns, passos incertos, sensações banalizadas, gestos costumeiros. Em

cada sopro, cada encontro, percebo-o ao meu redor, ou ainda, faz-se perceber em

minha volta. Envolve-se em meu corpo, mantendo-me confortavelmente

desacomodada com cada movimento que me provoca. Uma nova postura cria vida

em mim, em um novo espaço, tempo, pensamento, não evitando sentimento.

Ao relatar ele se atravessa, impede, provoca. Meu corpo se debruça à escrita,

minha mão perpassa os espaços destas páginas, assim como deslizou por suas

palavras. Aceitar que o toque aconteça em ambos os meios, nos possibilita a

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entendê-lo como parte de cada atravessamento cotidiano. “Seu lúcido humor, e sua

calma impaciência são, entretanto, maneiras elegantes e táticas eficientes para

atravessar e subverter os discursos cansados de nosso momento cultural.”

(PERRONE-MOISÉS, 2012 apud Barthes, 2012, p.XX).

Roland Barthes ou o Amador? Quem encontrei, quem habita meu corpo?

Ambos, potentes, se fazem presentes em cada toque, cada olhar, cada vivência.

Estão juntos, tocando-se, corpo a corpo, junto ao meu.

“No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas que o vento não conseguiu levar: Um estribilho antigo Um carinho no momento preciso O folhear de um livro de poemas O cheiro que tinha um dia o próprio vento...” Mário Quintana

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2 QUINTANA, Mário, Quintana de bolso. Porto Alegre: L&PM, 1997.

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III O AMADOR E SUAS ENTRELINHAS

Barthes (2003) considerou a palavra “amador” para além do amadorismo, ou

seja, para além do significado corriqueiro. Pensou-a enquanto produção do sujeito

que atua e dedica-se ao fazer por prazer, por amor, desconsiderando qualquer

necessidade de expor ou se publicizar através desta produção.

O amador é aquele que ama o que faz, sentindo os rumores dos

acontecimentos, permitindo-se experimentar o corpo, o próprio saber, o próprio

fazer. Há no amador uma pulsão desejante presente a todo o momento, pois para

amar é imprescindível sentir-se atraído pelo que escuta, enxerga, sente, percebe:

“No entanto, amei ou amarei várias vezes na vida. Será então que o meu desejo,

que é tão especial, se encaixa num tipo? Meu desejo é tão classificável?”

(BARTHES, 2007, p.25). É importante nos deixarmos amar, incorporar um ser

pulsante que se manifesta através das sensações, dos prazeres.

“o discurso amoroso, ordinariamente, é um invólucro liso que adere a imagem, uma luva suave envolvendo o ser amado. É um discurso devoto, bem-pensante. Quando a imagem se altera, o invólucro da devoção se rasga; um temor revira minha própria linguagem” (BARTHES, 2007, p.21).

Para Barthes (2003), o fazer artístico também compreende certa dimensão

amadora. O amador é aquele que constrói, efetiva, por pleno prazer, pelo gozo que

o fazer (enquanto ato) o causa. Quando falamos em gozo, devemos nos reportar ao

gozo do próprio artista, satisfação do autor por si só. No momento em que o trabalho

for publicado, exibido, o artista também gozará felicidade, porém neste caso, a

felicidade não passa de um discurso externo, em que a opinião do Outro se faz

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importante, já o amador, considera indispensável a satisfação plena daquele artista

enquanto amador (BARTHES 2007).

Podemos pensar também na postura de amador enquanto vida inicial de um

determinado trabalho. Nesta “vida inicial”, é perceptível uma grande sensibilidade e

ainda a sobreposição de outros saberes, possibilitando vestir-se da forma que achar

confortável e também despir-se se necessário. Ou seja, o amador enquanto

determinado modo de usar, de habitar o espaço, de praticar determinado saber.

Assim como na vida inicial, o amador é movido pela potência, é a partir dessa força

prazerosa primitiva, que ele acontece.

A dimensão amadora nos provoca, acende o pensamento, o qual ocorre ao

encontro de outro pensamento. Este momento de interação é o que nos oportuna

estranhar, e estes estranhamentos são possibilitadores de encontros com outros

pensamentos. Esta conjunção acontece com um Outro desconhecido, inoportuno,

impensado, e esse encontro se dá enquanto composição. É o estranho que aparece

e nos toca através de seu meio, do entre, de pequenas passagens tecendo novos e

potentes significados em planos conhecidos. É o devir-outro que toma caminho,

mesmo sem forma, entranho e desconhecido, é desta forma que nos afeta,

possibilitando criações múltiplas: “É por debandada que as coisas progridem e os

signos proliferam” (DELEUZE E GUATTARI, 1995, p.91).

Pelbart (2011), em sua obra “Vida Capital”, faz algumas considerações a

respeito do que denomina “vida nua”. Segundo o autor, para falarmos em vida nua,

devemos pensar em uma produção, em variações das formas de vida.

O que ela quer dizer é simples: não que essa vida que parece animal seja bela, mas que ela só é nua em aparência, pois já é sempre composição de relações, amizades intensas, vida viva, natureza naturante, força produtora de formas de vidas, de estratégias, de avaliações (PELBART, 2011, p.66).

Essa possível relação entre “vida nua”, citada por Pelbart, e “vida inicial”

anteriormente apresentada, nos provoca a pensar na construção e movimento do

cotidiano, permeadas pela produção de novos sentidos, possibilitando usufruir das

próprias potencialidades, independentes de qualificações ou aprovações externas e

valorizando as questões internas do sujeito-autor. O amador, acontecendo em uma

forma de vida-inicial-nua, nos remete a outras formas de vidas, das quais, não são

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permeadas por fatos, registros, mas sim, se dá em possibilidades, movimentos,

acontecimentos. Experimentar, arriscar, autorizar. São algumas das formas do fazer

amador, são produções ama-dor-as, são criações inacabadas, que não determinam-

se por saberes técnicos, precisos, mas aqueles que permitem criar, desenvolver

alguma atividade, a partir de uma vida-inicial-nua. Ela própria já nos diz, do quanto o

amador nos refere a um processo possível, ao gozo do escutar a si próprio e

reconduzir seu gozo.

“Então, a vida nua já não se submete a uma soberania que lhe é exterior, e afirma a sua própria. É a imanência pura que nos fala Deleuze a propósito desses momentos extremos em que uma vida cessa de ser pessoalmente qualificada e se recusa a todo desdobramento dialético.” (PERLBART, 2011, p.67)

A vida nos permite escolhas, pensamentos, problematizações para além de

qualquer julgamento, opinião externa, nossas práticas vão além de autorizações,

soberania, poder. É nesta dimensão que a noção de amador acontece: em

pequenos momentos, em fazeres invisíveis, em potências gritantes, nos limites do

desempenho, no amor-amador.

III.I Amador – Intuitivo

Ulpiano (1988), em uma de suas aulas inaugurais sobre “Liberdade e

pensamento”, traz-nos ideias de Espinoza, que já no século XVII anunciava a

tendência de acomodação dos sujeitos, enquanto dominadora de tempo e espaço. A

partir desta ideia, Ulpiano, discorre sobre três gêneros de conhecimento:

- Experiência vaga: a consciência é um efeito, um resultado dos encontros que os

nossos corpos fazem com a natureza, e nessa associação, nossos corpos recebem

marcas, resultados, por isso a consciência não é ativa, mas sim, resultado de forças

que vem de fora, através desse encontro. Sendo assim, tornamo-nos homens da

servidão.

- Razão: é a relação homem-natureza, o princípio do entendimento desse

envolvimento, ou seja, é a capacidade do sujeito de conhecer o que está do lado de

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fora, tomando contato com o que já existe. Ao invés de ser apenas um resultado

desse encontro, o sujeito torna-se capaz de conhecer o que está do lado de fora de

si, buscando a verdade e o melhor (moralmente), mas ainda não é capaz de criar,

movimentar.

- Ciência intuitiva: invés de apenas conhecer o que está fora, ele vai inventar e criar,

compor novas formas de vida, assim como uma nova arte, uma nova música. Ele

não quer buscar o que é moralmente melhor ou verdadeiro para o homem, mas sim,

ultrapassar o que ele é, produzir novos modos de vida, novas formas de

pensamento. Este gênero de conhecimento nos permite o poder da invenção, a

produção de um novo modo de vida, que obtém a liberdade através da força maior

da vida: o pensamento.

A postura de amador é perpassada por diferentes formas de vida. Ao falar

sobre isso, Barthes nos provoca a pensar o fazer e o próprio sentir, nos convoca a

problematizar o querer, o indizível. O autor nos instiga a criar novas formas de viver,

de sentir, de trabalhar, novas formas de vida. “Não é preciso do homem para resistir,

a vida se basta, às vezes é preciso libertar-se do homem, demasiado humano.”

(PELBART, 2011, p.67). Não cabe aqui dizer que devemos nos bloquear para

qualquer saber técnico, mas sim, que saibamos (re)inventá-lo, que utilizemos esta

postura para usufruir dos nossos saberes, poderes, fazeres.

A partir das conversas entre Barthes, Ulpiano e Perlbart, podemos pensar na

possível existência, de um amador-intuitivo. Este, baseando-se no terceiro gênero

proposto por Espinoza e na postura criada por Barthes, encontra-se em diversos

momentos e formas, buscando a invenção, a criação e a problematização de um

cotidiano basicamente invisível.

III.II Devir – Amador

A postura de amador pode ser pensada enquanto produtora em um tempo

elaborador de movimento. Podemos pensar no tempo enquanto produção

movimentadora do nosso cotidiano baseada em duas leituras: tempo Cronos e

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tempo Aion. O tempo Cronos se dá através do prosseguimento de um tempo

contínuo, o qual é numerado a partir de sua sucessão:

“o tempo é, nessa concepção, a soma do passado, do presente e do futuro, e o presente é um limite entre o que já foi e não é mais (o passado) e o que ainda não foi, portanto também não é, mas será (o futuro)” (KOHAN, 2007, p.88).

Já Aion é o tempo da superfície, dos acontecimentos incorporais, dos efeitos,

do finito e ilimitado (PELBART, 2004). É produção, vivência, é o brincar com os

acontecimentos em diversos momentos, possibilitando a invenção de um tempo e a

criação de novas formas de pensar.

Aion, para Deleuze (2011), é o tempo que não deve ser percebido como três

dimensões (passado, presente, futuro), mas sim, em duas visões simultâneas do

tempo: uma delas nos faz percebê-lo inteiramente presente, “vivo nos corpos que

agem e padecem” (p.6), mas também, o tempo inteiro que necessita do passado e

do futuro, para que os resultados aconteçam no presente.

Pelbart (2004), através de Deleuze, apresenta Aion como a essência do

acontecimento, é o momento em que nos deixamos levar pelas sensações e nos

permitimos sentir seus efeitos. Isso não significa que o tempo Aion escape de

qualquer condição temporal, porém, ao contrário de Cronos, que revela o ato, Aion

acontece nas entrelinhas das ações, dos encontros. O autor descreve o tempo Aion

e o tempo Cronos a partir de linhas de pensamentos paradoxais: “O pensamento

através do paradoxo, pensa o Impossível” (p.64). Este impossível é referido quanto

ao paradoxo do tempo e ao paradoxo do sentido.

Pois o paradoxo ao corroer a ideia de sentido, concomitantemente desafia uma certa ideia de tempo da qual o sentido depende, fazendo emergir outros sentidos e uma temporalidade outra: o tempo do pensamento, o tempo do inconsciente, o tempo do acontecimento. (PERBART, 2004, p.64)

O paradoxo se diz de um questionamento, não é desconexo, ou contraditório,

mas sim, provocador. Sua função também é desafiar o senso comum. O paradoxo

movimenta as posturas mais naturalizadas que possuímos, e por isso sua grande

proximidade com a postura de amador. Ambos são provocadores, movimentadores,

produtores de novos saberes.

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A dimensão amadora perpassa o devir, bem como, o devir perpassa a postura

do amador. A partir de suas infinitas formas de sentir, e permitir ser, o devir provoca-

nos a pensar no efeito da postura frente o cotidiano, invertendo os lugares e os

efeitos de qualquer situação. Deleuze (2011) nos traz o devir enquanto invasor de

sentidos, tempos, e espaços, possibilitando assim essa troca de lugares, essa

inversão de efeitos.

Para Deleuze (2011), o acontecimento se dá em um encontro de corpos, no

tempo presente, os quais ao misturarem-se produzem as paixões, as ações. “Só os

corpos existem no espaço e só o presente no tempo. Não há causas e efeitos entre

os corpos: todos os corpos são causas, causas uns com relação aos outros, uns

para os outros” (p.5). Ou seja, não são as qualidades físicas, as coisas, ou o estado

das mesmas, e sim, o entre, movimentos quase que invisíveis, despercebidos, os

acontecimentos.

A partir desse zigzag, podemos pensar na noção de amador tecida pelo

tempo Aion. Esse tempo criador faz nascer o amador enquanto postura. É nele que

o sujeito permite-se experimentar enquanto inventor, produtor de seus atos,

sentimentos e vivências. O amador é pensado a partir do devir, de ser único,

ilimitado, permeado por sentimentos e sensações, os quais o auxiliam nas

construções do seu fazer.

A noção de amador pode ser pensada enquanto espaço a ser explorado e

movimentado. Para articularmos estas ideias, podemos pensar em espaços lisos e

heterogêneos. Deleuze e Guattari (1997) nos falam de espaços lisos enquanto

propulsores de pequenas ações:

“O espaço liso é um campo sem condutos nem canais. Um campo um espaço liso heterogêneo esposa um tipo muito particular de multiplicidades: as multiplicidades não métricas, acentradas, rizomáticas, que ocupam o espaço sem “medi-lo”, e que só se pode explorar “avançando progressivamente” (DELEUZE; GUATTARI, 1997, p.38).

O espaço liso é o território de possível ocupação do amador. É nele que a

possibilidade de existir acontece onde o contato é permitido, é o espaço que se dá

por entrelinhas e que possibilita o movimento das multiplicidades, que autoriza ser

utilizado sem noção de medidas, permite explorar seu meio sem restrições, medos

ou grandes desvios (DELEUZE; GUATTARI, 1997).

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A forma de ser amador/amador-intuitivo, traz consigo formas de ser/acontecer

no limite, na superfície, é pura e simplesmente um resultado de produções

permissíveis em um tempo e um espaço ativo e movimentador, inventor, artista.

É importante movimentar este espaço proposto por Deleuze e Guattari. Este

movimento citado, se diz da forma com que o espaço é ocupado, como é explorado,

podendo ser rápido ou até lento. A velocidade pode ser lenta ou acelerada,

independente da intensidade, será sempre velocidade, havendo movimento ou não.

A velocidade ocupa o espaço liso, em meio a suas imobilidades ela acontece e

permite com que o movimento aconteça mesmo sem o movimento propriamente

dito.

III.III Amador-Curioso-Nômade

O que nos instiga a pensar na possível existência de novas formas de vida?

Foucault (1984) nos diria que o melhor e suficiente motivo é a curiosidade. A

curiosidade, segundo o autor, não é somente a sede de novos saberes por convir

com própria busca, mas sim, aquela “que permite separar-se de si mesmo” (p.13).

Para o autor, a curiosidade não é nada além do que um potencializador do olhar e

da reflexão sobre o próprio saber: “De que valeria a obstinação do saber se ele

assegurasse apenas a aquisição dos conhecimentos e não, de certa maneira, e

tanto quanto possível, o descaminho daquele que conhece?” (p.13).

O amador pode ainda, ser pensado enquanto nômade. Ele movimenta-se de

diferentes formas dentro do território que se encontra. Pode mudar-se de local,

porém, essa mudança não é realizada por trajetos definidos, estriados, e sim por

trajetos lisos em que possibilita o andar aberto e o conhecimento do próprio campo.

O nômade pode sim seguir pistas do seu trajeto, porém, isso não significa que este

trajeto seja fechado, impossibilitando movimentos criadores. Ao contrário, o nômade

permeia esse espaço liso que o pertence, percebendo, olhando seu território de fora.

Mesmo estando imerso àquele território, o nômade possibilita o andar e o

movimentar-se por ele, construindo novas formas de olhar aquele mesmo espaço

(DELEUZE; GUATTARI, 1997). O mover-se do nômade não significa que se move

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quando sai do lugar: este é o migrante. O nômade é “antes aquele que não se move”

(DELEUZE; GUATTARI, 1997, p.52), aquele que faz uso do desafio vibrante, que se

movimenta sim, enquanto provocador, enquanto possibilitador.

A partir disso, podemos pensar na possível existência de um amador-

nômade. Barthes (2003) nos permite pensar que o artista, mesmo em fase de

construção de sua obra, segue ideias, caminhos traçados, porém, permitindo a

criação e o movimento em seu meio, perpassando por vários territórios, mesmo que

permanecendo no mesmo lugar.

Este é o movimento do amador enquanto nômade, diferentemente de ser

migrante. O fato não é para onde exatamente ele vá, mas sim o caminho que o

mesmo percorre para construir movimentos pensantes sobre sua forma de trabalho,

assim, colocando-se em uma postura amadora, observando de “fora” suas

produções, e ao mesmo tempo mergulhando-se nelas incessantemente.

Esse mergulho nos propicia novas formas de sentidos, quereres, prazeres. E

então, uma grande sede desejante surge, envolvendo a problematização da noção

de amador, nos provocando a pensar em sua possível existência, de que forma ela

acontece e o que se envolve nisto. Quando nos permitimos sentir, perceber, querer,

o desejo de tocar o objeto desejado é grandioso, e esse é o nosso objetivo com esta

produção: poder sentir, movimentar, querer, perceber a postura de amador

perpassada em nosso cotidiano a partir de produções em um tempo elaborador de

movimento.

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IV BOBAGENS DO ACONTECIMENTO

Objetos de análise, fragmentos, recortes óbvios, bobagens. Acontecimentos

do cotidiano, questionamentos sobre vivências corriqueiras, percepções, olhares,

desconfianças, incertezas, bobagens. “A tática de Barthes com relação à bobagem,

que ameaçava invadir certas áreas de seu próprio discurso, era a de transformar

essas áreas discursivas em objetos de análise.” (PERRONE-MOISÉS, 2012 apud

Barthes, 2012, p.XVI).

Ao longo de sua obra, Barthes nos fala sobre sua indisposição frente as

normatividades, sobre os questionamentos em relação as bobagens cotidianas do

acontecimento. Algumas destas, a partir de agora, serão levemente discorridas,

sensivelmente questionadas.

“Nada dizer, fechar os olhos, deixar o detalhe alçar-se sozinho à

consciência afetiva” (MOTTA, 2011, p.31).

IV.I Músicas da noite, das janelas, do inverno

Madrugada. Ruas quase que em silêncio absoluto. Calmaria. Em minha janela

esbarra o vento forte em uma noite de altas temperaturas em pleno inverno. Barulho.

Medo. Tranquilidade interrompida pelos efeitos naturais de uma massa de ar quente.

Tentativas. Frustração. Como lidar, como fazer, como encontrar o botão “start”?

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Falta-me a inspiração. Falta-me ainda, a permissão. Não sei o que houve, aliás, não

sei se quero saber. Quero escrever, quero produzir, quero concluir. Fazer despertar

o que adormece calmamente e profundamente há dias. Quando despertar, será o

mesmo? Será este, mantido intacto mesmo com todas as influências externas?

Espero que não. Espero que tenha se afetado, se deixado mudar, se permitido

movimentar. Tintas depositadas sobre o papel, jogadas no fundo de uma gaveta.

Substâncias poderosas essas, ao colorir, deram forma aos meus pensamentos,

significado a todas as palavras embaralhadas que aqui circulam. Por que não mais?

Organizar é difícil. Concluir é difícil. Encerrar ciclos é complicado. Necessidade.

Pressão. Angústia. Bloqueio. Palavras perdidas em pensamentos, em pequenos

gestos, em simples gostos. Acalma-se o ruído causado pelo movimento do vento

próximo à minha janela. Que silêncio é esse? Sem manifestação, som ou aparição.

Trancada, decido explorar o exterior. Abro-me, abro-lhe, afasto qualquer barreira

que possa estar impedindo-me de sentir, arrepiar. O vento leve, a brisa noturna

passando pelo meu corpo, meu espaço, meu cansaço, meus limites. Brisa, será que

levarás contigo qualquer gaiola que algum dia eu tenha cabido? Suma com tudo,

mas deixe algumas coisas.

O vento gosta é de cantar. Quem faz uma letra para a canção do vento? Mário Quintana

3

Preciso lembrar-me do que já tive, preciso sentir para referenciar, transformar,

experimentar. Pálpebras pesadas, sinais se formam em minha testa fazendo-me

recordar o que Cronos não nos deixa esquecer: o tempo. Que loucura esse tal de

tempo. Permite tanto e limita ainda mais. Enjaula-nos em um espaço ilusoriamente

grande e quando tentamos encontrar uma forma de fuga, tranca-nos para

lembrarmos que daqui a pouco, há mais vinte e quatro horas. Que dimensão é essa,

intocável, inalcançável, porém, brevemente finita, rapidamente esquecida. Quanta

facilidade em projetar. Quanta oportunidade de dizer que o Outro é o culpado. Que

mortais somos, que não assumimos os próprios fazeres? Covardes, que também

admitimos tudo o que nos é imposto? Imposição: muitos fazem, tolos obedecem. E

tudo bem, se formos tolos e percebermos isso. E tudo bem, se estivermos

enjaulados, mas enxergarmos as grades que nos cercam. O fato é: fazemo-nos de

3 Poema publicado originalmente no livro Da preguiça como método de trabalho, retirado de Poesia Completa –

Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2005, p. 648

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cegos, surdos e mudos equivalendo a robôs, seres programados a não sentir,

pensar ou manifestar. Centenas de milhares de pessoas, nesse exato momento,

deparam-se com o som do vento forte atravessando as frestas de suas janelas. O

que faremos? Levamos nossas mãos aos ouvidos tão firmemente, que impeça que

qualquer ruído passe por estas, ou sentiremos os sons e os medos, sabendo que

eles podem voltar. Abrir os olhos, liberar os ouvidos, flutuar pelos desejos e parar de

anestesiarmo-nos frente à vida. Qual o problema da dor, qual o problema na cor?

Preto e branco podem ser a composição de lindas obras, cores ou ainda, podem ser

apenas a presença ou falta de brilho. Vamos colorir, vamos libertar...

IV.II Muros Produ(a)tores de/em Sentidos...

Abrir a sala: potência, energia. Raios de sol dando vida a um lugar embaciado

e permeado de obscuridade a olhos nus. Aproximação. Atenção, esperança, “fonte

de esperança” – assim nomeada por eles. Em traços estremecidos e cheios de cor,

surgem criações retratando vidas desconhecidas, sentimentos um tanto confusos e

alguns até, esquecidos. No papel branco, a tinta preta se esparrama sem precisão,

cheia de sentidos, confusão.

Imagens, fotografias. Novas possibilidades, arte. Sujeitos em busca de um

novo sentido para a vida, procurando entender que ambiente é aquele que

habitam/ocupam que condições são aquelas as quais são submetidos a viver.

“Acostumei”, disse o homem cabisbaixo, em baixo tom, frente ao grupo. Acostumar,

em diversos momentos esta forma de viver se faz presente. Amadores-intuitivos

surgem em meio aos destroços que a vida deixa pelo caminho.

Clinicando, em inúmeros e diferentes momentos ocorre, onde podemos nos

sentir acostumados, despercebidos e até mesmo banalizados. Trato aqui de termos

pesados, porém corriqueiros. Banalizamos e banalizam-nos. Facilmente entendível a

percepção e as formas de vidas encontradas e criadas naquele ambiente.

Naturalmente visível o motivo de precisar se acostumar àquele local, àquele clima,

àquele cheiro, àquelas pessoas, naqueles tempos.

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Tempos, te-impôs. Quando não nos sentimos fixados, dominados pelo

tempo? Somos cruelmente e facilmente submetidos, acometidos por um tempo

rígido, passageiro e vagaroso. Lento para algumas pessoas sem o

controle/acompanhamento do mesmo. Controle? O possuímos ou somos possuídos

por ele? Totalmente mergulhados em alguns ambientes, mas ainda com

possibilidade de oxigenação, percebemos o controle, o poder, dominando o tempo e

o espaço e o mais curioso, sendo dominado por ambos.

Espaço desconhecido para muitos, banal para outros. As artes invadem aos

poucos o espaço os momentos. Traços, sons, palavras, versos, imagens, cores,

cortes. Construções nascem também e talvez principalmente, em meio ao caos

cotidiano. E porque não? A arte surge no entre, em estar atento aos detalhes.

Porque não, pensarmos na presença livre, constante e frequente da postura

amadora/amadora-intuitiva naquele espaço? Inevitável não vê-los como

exploradores desta dimensão, descrita por Barthes. Sujeitos produtores,

potencializadores de novas formas de vida em meio a uma realidade turbulenta.

Através do tempo movimentador, de espaços indefinidos, surgem desejos,

sonhos, vidas interrompidas por acontecimentos trágicos e dolorosos. O sofrimento

desenhado em seus rostos, em seus desenhos, em seus olhos. Sofrimento esse,

transformado em arte, em produção desejante, potencializador de vidas-mortas. A

pulsão de vida pertence a eles, por suportarem e lutarem para sobre(viver) naquele

ambiente, os faz questionar “o mundo lá fora”, como chamam o espaço que

ultrapassa os muros e portões que os cercam.

"Que a palavra parede não seja símbolo de obstáculos à liberdade nem de desejos reprimidos nem de proibições na infância etc. (essas coisas que acham os reveladores de arcanos mentais) Não. Parede que me seduz é de tijolo, adobe preposto ao abdômen de uma casa. Eu tenho um gosto rasteiro de ir por reentrâncias baixar em rachaduras de paredes por frinchas, por gretas - com lascívia de hera.

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Sobre o tijolo ser um lábio cego. Tal um verme que iluminasse." Manoel de Barros

4

Contrapondo-se ou somando-se, vemos à pulsão de morte presente no ato

cometido, na causa de estarem (sobre)vivendo naquele lugar. Desprendendo-se de

saberes técnicos (possuindo ou não), todos buscam fazer sentido às suas

produções, aos pensamentos, deste modo, a postura amadora perpassa, desliza, se

faz presente em qualquer centímetro, qualquer ato, qualquer fala daqueles sujeitos,

daquele espaço, daquele tempo.

IV.III Do Esperar

Entre o sol e a lua, entre a calçada e rua. O som aflitivo do relógio incansável,

espera interminável. O início da nua, crua, vida, tua. Meses de espera, para o

nascimento de pequenos amadores natos, nus, crus, cheios, tontos, vitais. Amores

da dor, amores da cor, amores da flor, amadores. Esperam para surgir, esperam

para crescer, esperam para evoluir, esperam para fazer. Pelo que não há espera?

Para amar. Amar o cheiro, a voz, o gesto, o colo, o quadro, o som, o acordeom.

Espera pelo sol, espera pela água, areia, vento, dia, noite... Há algo mais amador do

que uma criança? A espera por tantos dias, quando nascem, torna-se quase

impossível: Espera-banho, espera-fome, espera-necessidade, espera-colo, espera-

balanço, espera-ninando, espera-chorando, espera-vivendo.

Movimento estagnado e intensamente angustiante. A busca incessante por

alguma tarefa que ocupe esse tempo cronológico que acontece na tumultuosa

agitação cotidiana. Incomoda o que/quem está por vir, bem como, quem está no

aguardo. A espera por alguém, por um resultado, uma notícia, uma chegada, uma

partida, um momento. Acelera o coração, ofega a respiração, aperta o peito.

O tempo Entre o sopro E o apagar da vela Paulo Leminski

5

4 Poema publicado no livro “O Guardador das águas” 1989.

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IV.IV Do pensamento que pensa, do pensar do pensamento

O que é o pensamento, o que pode o pensamento, o que pensa o

pensamento, pensamento pensa? Pensar, andar, querer, movimentar, fazer,

raciocinar, refletir, pensar. Difícil, estranho, potente. Pensamento pode, pensamento

pede, pensamento força. Pensamento quer, pensamento fere, pensamento difere.

Pensamento anda, pensamento para, pensamento porta. Pensamento parede,

pensamento potente, pensamento semente.

O que pensa o pensamento? Pensa o pensamento? Pensamento pensa?

Pensamento invade, pensamento novidade, pensamento território.

Pensamento sensível, pensamento possível, pensamento limites. Pensamento

latente, pensamento semente, pensamento valente. Pensamento nasce,

pensamento vidente, pensamento, somente. Pensamento urgente, pensamento

ausente, pensamento grita.

Pensamento voz, pensamento pele, pensamento corpo. Pensamento folha,

pensamento árvore, pensamento terra, pensamento pedra. Pensamento passos,

pensamento com movimento. Pensamento segura, pensamento solta, pensamento

desliza. Acontece, o pensamento, simplesmente.

Pensamento olha, pensamento escuta, pensamento sente. Pensamento cria,

criamos pensamento, pensamento vida, pensamento arte. A arte do pensamento, as

inúmeras vidas de um pensamento e pensamentos sobre inúmeras vidas.

Pensamento abraça, pensamento descobre, pensamento acolhe. Pensamento

quente, pensamento arrepio, pensamento frio. Pensamento desejo, pensamento

posse, pensamento eu, meu, teu.

Pensamento livra, pensamento prende pensamento sofre. Pensamento

5 LEMINSKI, Paulo. Toda poesia. São Paulo: Companhia das Letras, 2013.

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O pensamento é o território mais protegido do mundo, e ao mesmo tempo o mais livre. Só nós sabemos o que se passa por nossa mente. O pensamento não exige ortografia, pronúncia, sensatez. O pensamento não tem fronteiras, lógica, advogado de defesa ou carrasco. O pensamento é zona franca, terra de ninguém, um lugar onde sempre há vaga. O pensamento é o único lugar onde ainda estamos seguros, é onde nossa loucura é permitida e onde todos os nossos atos são inocentes.

Martha Medeiros

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V AMADOR NA CLÍNICA

A postura de amador pode ser percebida em toda e qualquer produção.

Começo a problematizar a partir da prática de um estagiário. Este, cumprindo uma

função curricular e/ou voluntária, normalmente, é provocado a pensar sobre

questões institucionais, pessoas, clínicas e pensar novas formas de abordagens,

intervenções, atendimentos, olhares, escutas.

A partir da prática da psicologia, sigo pensando: será possível

problematizarmos essas pré-disposições? Por que eu não posso estender o

atendimento de algum paciente, se assim, sentir necessidade? Por que não posso

mudar o ambiente de atendimento, se assim, achar importante? Acredito que temos

como premissa o cuidado com o sujeito que estamos atendendo, mas e, se o

cuidado dizer respeito a acompanhá-lo em determinadas funções, desconfigurar o

setting, ou até mesmo, incluir outras pessoas ao atendimento? Em algum

atendimento em grupo, porque não podemos o fazer em algum local diferente do

habitual, sem número mínimo ou máximo de participantes, sem que estes se sintam

no dever de participar e em alguns momentos, não possibilitar a inserção de outras

pessoas? O ato clínico, observado a partir de seus movimentos e seus encontros,

nos provoca a problematizar algumas práticas enrijecidas/enquadradas.

A prática amadora acontece em todos os espaços – clínicos ou não – a partir

do momento em que me permito acontecer, que possibilito que esta postura

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aconteça, invada, perpasse. É a partir desta dimensão, que nos sentimos

convocados a pensar na possibilidade da existência de movimentos, de novos

modos de perceber/praticar questões cotidianas.

Amador-curioso, amador-nômade, devir-amador, amador intuitivo, amador-

bobagens, amador-letra, amador-escrita, escrita amadora. Amador-vida, amador-

potência, amador-essência, amador-chão, amador-dimensão. Amador-poeta,

amador-psicólogo, amador-clínico, amador-artista. Amador-Barthes, Amador-

Leminski, Amador-de Barros, Amador-Medeiros, Amador-Quintana. Amador-amor,

amador-dor. Amador-gesto, amador-meio. Amador-desejo, amador-imperfeito,

amador-tímido, Amador, amador.

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DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol

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FOUCALT, Michel. História da Sexualidade 2: o uso dos prazeres. Rio de Janeiro:

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