cidade e cultura: planejamento do território e a relação urbano-rural em monte alegre de minas
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AGRADECIMENTOS
A MEUS PAIS E FAMÍLIA PELO APOIO INCONDICIONAL; AOS AMIGOS PROFESSORES PELA DEDICAÇÃO EM ENSINAR DENTRO E FORA DAS
SALAS DE AULA; AOS ‚AMIGOS IRMÃOS‛ PELO COMPANHEIRISMO E POR SE TORNAREM UMA SEGUNDA FAMÍLIA; A DEUS POR TUDO.
5
ÍNDICE
INTRODUÇÃO 5
O PLANEJAMENTO DO TERRITÓRIO 8
A URBANIZAÇÃO DO TERRITÓRIO 9
A RELAÇÃO CIDADE-CAMPO E A REVISÃO DO CONCEITO DE RURAL 12
O PAPEL DA PEQUENA CIDADE E UMA LEITURA REGIONAL DO
CENTRO DO BRASIL 20
MONTE ALEGRE DE MINAS E SEU PAPEL NA REDE DE CIDADES 21
A POSSIBILIDADE DE REEQUILIBRIO NA REDE DE CIDADES DA REGIÃO 26
A HISTÓRIA DE MONTE ALEGRE DE MINAS PELA HISTÓRIA DE
SEUS ESPAÇOS 30
EVOLUÇÃO TERRITORIAL DO MUNICÍPIO DE MONTE ALEGRE E ENTORNO 31
ARRAIAL DE SÃO FRANCISCO DAS CHAGAS DE MONTE ALEGRE (FINAL DO
SÉC.XIX) 33
OS PRIMEIROS ANOS DA CIDADE DE MONTE ALEGRE (PRIMEIRA METADE DO
SÉC. XX) 36
MONTE ALEGRE APÓS A INDUSTRIALIZAÇÃO DO BRASIL (SEGUNDA METADE DO
SÉC. XX) 41
MONTE ALEGRE ATUAL (PRIMEIRAS DÉCADAS DO SÉC. XXI) 49
O POVO E SUA CULTURA 56
DO CAIPIRA AO SERTANEJO 57
IDENTIDADE CULTURAL E CIDADANIA 63
QUALIDADE DE VIDA 67
DIRETRIZES E INTERVENÇÕES 72
DIRETRIZES PARA A CIDADE 77
CÓRREGOS MONTE ALEGRE E MARIA ELIAS 79
RODOVIA 83
LARGO DA PRAÇA 85
MIRANTE DA SERRINHA 91
DIRETRIZES PARA O MUNICÍPIO 93
BEXIGUENTO 95
ESCOLAS RURAIS 99
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 119
OUTRAS REFERÊNCIAS 121
6
INTRODUÇÃO
‚A evidência de um processo de urbanização
difusa que avança para áreas cujas
características são muito indefinidas, nem
propriamente urbanas nem tampouco rurais,
aponta para a presença de uma forma de
ocupação do território que vem sendo descrita
como um tipo específico de suburbanização
sem limites. Um grande conjunto de dados e
análises confirma que a partir das duas últimas
décadas do século XX um ciclo iniciado no
século XVIII, de contínua dissolução da
organização específica e dos limites físicos dos
dois universos – o urbano e o rural – chegou a
seu término.1
‛
Regina Meyer
O conceito de oposição entre cidade e campo que dominou
alguns pensamentos modernos a respeito do território já não é
aplicável atualmente. A cidade contemporânea ‚já não depende
desse binômio entre o rural e o urbano‛, ela incorpora vários tipos
de ocupação e sistemas produtivos, ‚onde convivem o rural, o
urbano, o suburbano, mas também o “terrain-vague‛ e as grandes
infraestruturas2
‛.
1 MEYER. Regina. O Urbanismo: entre a cidade e o território. in Cienc. Cult. vol.58 n°1 São Paulo Jan./Mar. 2006
2 Editorial do Jornal dos Arquitectos n°231 – Cidade. Ordem dos Arquitectos. 2008. Portugal.
‚Estaríamos, agora, deixando a fase da mera
urbanização da sociedade, para entrar em
outra, na qual defrontamos a urbanização do
território. A chamada urbanização da sociedade
foi o resultado da difusão, na sociedade, de
variáveis e nexos relativos à modernização do
presente, com reflexos na cidade. A
urbanização do território é a difusão mais ampla
no espaço das variáveis e dos nexos modernos.
Trata-se, na verdade, de metáforas, pois o
urbano também mudou de figura e as
diferenças atuais entre a cidade e o campo são
diversas das que reconhecíamos há alguns
decênios.3
‛
Milton Santos
A partir do momento em que se evidencia essa organização do
espaço, com urbanizações difusas, e que, muita das vezes se
mesclam com o rural, o urbanismo, enquanto disciplina, começa a
estudar o território de forma ampla, pegando o termo da geografia.
O Brasil está repleto de municípios onde há a mescla de
elementos rurais e urbanos, tanto em suas sedes quanto em seus
distritos. Urbanizações difusas se dissolvem no território, ligadas
por uma rede rodoviária, e as cidades menores em população têm
o limite campo-cidade muito tênue.
Em um contexto recente em que a questão urbana e a qualidade
das cidades brasileiras estão sendo tão comentadas, após as
manifestações populares de 2013, faz-se necessário que a
3 SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994.
7
situação dos menores municípios brasileiros em população, que
somados correspondem à maior parte do território nacional,
também seja discutida.
O presente trabalho procura estudar o papel da cidade pequena
no território, sua função na rede de cidades e o perfil sociocultural
de sua população, a fim de entender a cidade de Monte Alegre de
Minas e propor um planejamento amplo que a encare enquanto
parte do território e não como fato isolado. O trabalho se organiza
em cinco capítulos, que discutem: a necessidade de se pensar o
planejamento do território e a questão da revisão das relações
cidade-campo; o papel de Monte Alegre, enquanto cidade
pequena, na região em que se insere; a apresentação do
município de Monte Alegre através da história de seus espaços;
uma leitura sociocultural do município que expõe a identidade
cultural da população e suas carências; e, por fim, as diretrizes e
intervenções projetuais para a cidade e município, como resposta
ao estudo supracitado.
Através de uma leitura territorial, econômica e sociocultural de
Monte Alegre de Minas, propõe-se uma série de intervenções e
diretrizes tanto para o espaço urbano quanto para o espaço rural
do município. Devido à ocupação difusa da população, onde 26%
das pessoas não vivem na cidade sede do município4
, as
diretrizes e propostas buscam criar condições que melhorem a
qualidade de vida em todo o território de Monte Alegre,
principalmente no âmbito educacional, de formação, e no acesso
a serviços de saúde e lazer.
4 IBGE 2010.
8
A cidade de Monte Alegre de Minas, a rodovia que a corta e a área rural que a envolve. Fonte: Imagem do Autor.
10
‚A questão do planejamento envolve também,
para uma hipótese de uma cidade mais virtuosa,
mais fácil de realisar, a exigência de um
planejamento urbano, que pressupõe, para ter
êxito, de um planejamento territorial amplo,
continental.‛5
Paulo Mendes da Rocha
É impossível pensar o planejamento de qualquer cidade como
algo isolado. As cidades são interdependentes entre si e estão
organizadas em uma espécie de rede, onde os centros urbanos
formam um ‚conjunto funcionalmente articulado‛, com suas
dinâmicas territoriais internas e regionais6
. Portanto, o
planejamento deve considerar uma visão holística do território,
atento para as relações da cidade com a região que a circunda e
para a dinâmica do espaço interno de seu município.
Monte Alegre de Minas, objeto deste trabalho, deve ser entendido
como parte da dinâmica territorial de sua região, e, sobretudo,
deve ser abordado enquanto município, tendo em vista a inclusão
da parte rural do território, onde reside 26% de sua população7
.
Entender a relação cidade-campo é fundamental para entender
cidades pequenas como Monte Alegre de Minas.
5 Trecho transcrito de entrevista dada pelo arquiteto ao programa televisivo Roda Viva, TV Cultura, veiculado no dia 10 de junho de 2013. 6 CORRÊA, Roberto Lobato. Estudo sobre a Rede Urbana. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 2004. 7 IBGE – censo 2010 (Monte Alegre de Minas – população total: 19.619 hab./ pop. urbana: 14.506 hab./ pop. rural: 5.113 hab.)
A URBANIZAÇÃO DO TERRITÓRIO
A ocupação do território pelo homem sofreu fortes mudanças ao
longo do século passado, principalmente de 1950 até hoje. A
população mundial ultrapassou nesta última década a marca de
sete bilhões de pessoas, sendo que em 2012 foi registrado que
mais da metade dessa população vive em cidades8
.
Nessa mesma época a América Latina passou por uma transição
urbana, despontando como a região mais urbanizada do mundo,
mesmo sendo uma das menos povoadas em relação ao seu
território, com 80% de sua população vivendo em aglomerados
urbanos9
. O Brasil destaca-se na região com uma população
urbana de 84% do total10
. Essa ‚explosão urbana‛ aconteceu em
um curto intervalo de tempo, o que levou a um crescimento
abrupto e sem planejamento das cidades brasileiras, devido,
principalmente, ao êxodo rural e às migrações oriundas de regiões
mais pobres.
O geógrafo Milton Santos aponta que, nesse rápido crescimento
da população e das cidades brasileiras no século XX, as grandes
8 50,7% da população mundial (3,6 bilhões de pessoas) vivem em cidades, em 2012, segundo Organização das Nações Unidas, in Time to think Urban. ONU-Habitat (2013) 9 Organização das Nações Unidas. Estado de las ciudades de America Latina y el Caribe: rumbo a una nueva transición urbana. ONU-Habitat (2012). 10 IBGE – censo 2010 (Brasil – população total: 190.755.799 hab./ pop. urbana: 160.925.792 hab./ pop. rural: 29.830.007 hab.)
11
cidades receberam alto número de pessoas pobres, que eram
acomodadas muitas vezes em condições sub-humanas. As
cidades intermediárias tornaram-se o ‚lócus do trabalho
intelectual‛, atraindo um fluxo crescente de pessoas da classe
média, e as cidades locais, pequenas e em sua maioria ligadas ao
campo, repeliram os mais pobres e se mecanizaram,
transformadas pelo agronegócio11
.
‚Ao longo do século, mas, sobretudo nos
períodos mais recentes, o processo brasileiro de
urbanização revela uma crescente associação
com o da pobreza, cujo lócus passa a ser, cada
vez mais, a cidade, sobretudo a grande cidade.
O campo brasileiro moderno repele os pobres, e
os trabalhadores da agricultura capitalizada
vivem cada vez mais nos espaços urbanos.12
‛
Milton Santos
Milton Santos deduz também que a separação tradicional entre um
Brasil urbano e um Brasil rural já não é satisfatória, e que há hoje
no país ‚uma verdadeira distinção entre um Brasil urbano
(incluindo áreas agrícolas) e um Brasil agrícola (incluindo áreas
urbanas)‛ 13
. Monte Alegre de Minas é uma cidade local, inserida
11 SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994. 12 Idem. 13 Ibidem.
em uma área agrícola, em uma região voltada para o agronegócio.
Na análise de Milton Santos, cidades locais como Monte Alegre
‚mudaram de conteúdo‛ durante o último século. A cidade que
antes era dos notáveis, onde as personalidades eram ‚o padre, o
tabelião, a professora primária, o juiz, o promotor, o telegrafista‛,
passa a ser uma cidade econômica, ‚lócus da regulação do que
se faz no campo‛, onde é extremamente necessário ‚o agrônomo
(que antes vivia nas capitais), o veterinário, o bancário, o piloto
agrícola, o especialista em adubos, o responsável pelos comércios
especializados‛, ou seja, o consumo produtivo rural não se adapta
às cidades locais, mas pelo contrário, as adapta. Parte dos
trabalhadores do campo, especializados e não especializados,
vivem na área urbana, onde também se concentra os serviços e
produtos para a produção agrícola. Esses fatores fizeram com que
uma cidade local como Monte Alegre de Minas deixasse de ser a
‚cidade no campo‛ para ser a ‚cidade do campo‛ 14
.
14 Ibidem.
12
O centro de Monte Alegre de Minas visto a partir do cerrado, em uma área vazia da cidade. Fonte: Imagem do Autor.
13
A RELAÇÃO CIDADE-CAMPO E A REVISÃO DO
CONCEITO DE RURAL
As cidades pequenas no Brasil, aquelas que possuem até 100.000
habitantes, correspondem a 95% do número total de municípios e
concentram 45,3% da população total do país15
. Cidades com
menos de 20.000 habitantes, como Monte Alegre de Minas, que
possui 19.619 hab., somam 73% do total de municípios
brasileiros16
. Estas cidades são tidas como ‚cidades locais‛
porque são referência para seu próprio território, ou seja, para a
parte rural de seu município17
. Há uma inter-relação entre mundo
rural e mundo urbano. As cidades locais brasileiras são, em sua
maioria, cidades ligadas à agricultura, com uma parcela
significativa da população vivendo na zona rural. Monte Alegre de
Minas possui 26% de sua população (5.113 hab.) vivendo na área
rural do município.
Por ser uma cidade local, o planejamento em Monte Alegre de
Minas deve levar em consideração seu papel e sua dependência
regional, estudando como a cidade se insere na rede de cidades,
e, sobretudo, deve pensar seu território de forma ampla, levando
em consideração a área rural do município e as relações
existentes entre a cidade e o campo.
15 IBGE- censo 2010. 16 Idem. 17 SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994.
O escritor britânico Raymond Williams, em análise do quanto os
termos ‚cidade‛ e ‚campo‛ representam na ‚vivência das
comunidades humanas‛, ressalta que ‚o termo inglês country pode
significar tanto ‘país’ quanto ‘campo’; the country pode ser toda a
sociedade ou só sua parte rural.18
‛ A partir dessa análise
etimológica ele observa a ligação existente entre a terra, fonte de
subsistência, e as realizações humanas das quais a cidade faz
parte, onde, apesar da cidade ser uma ‚forma distinta‛ de
ocupação, ela é indissociável do campo.
‚A dicotomia rural-urbano torna-se uma fonte de
reflexão em torno dos mecanismos de
transformação do território que nos levam hoje a
compreender melhor a natureza distinta destas
realidades e a sua importante e necessária
complementaridade. Cidade e campo passaram
então a ser pensados como sistemas
integrados, parte de um mesmo processo de
transformação.‛19
Pedro Pacheco
18 WILLIAMS, Raymond. O Campo e a Cidade na História e na Literatura. 1ª Ed. São Paulo: Ed. Companhia das Letras, 1989. 19 PACHECO, Pedro. Rural-Urbano in Tema e Programa Turma F, Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, 2011.
14
O conceito de ruralidade e a relação cidade-campo estão sendo
discutidos e revistos em várias partes do mundo a fim de obter-se
um desenvolvimento territorial mais justo e igualitário.
Nos países da União Europeia, onde o território rural acolhe mais
de 56% da população total20
, a ruralidade passa a ser vista como
‚uma construção social‛, em detrimento da ‚imagem de interior do
país‛ tida anteriormente21
. Pensa-se no acesso a serviços,
educação e mobilidade dessa parcela significativa da população e
a importância cultural dessa parte do território é levada em
consideração juntamente com seu peso econômico, visto que,
para além da visão da paisagem como patrimônio, a produção de
vinho, azeite, queijos e outros produtos de relevância econômica e
cultural desses países dependem muito do rural22
. Essa visão de
que o mundo rural extrapola a dimensão agrícola e produtiva e
abarca valores de patrimônio e de paisagem ecológica e cultural,
permite novas abordagens e possibilidades de ‚reequilibrar as
relações entre os grandes núcleos urbanos e os territórios
diversificadamente povoados que os circundam‛ 23
.
20 União Europeia – Política de Desenvolvimento Rural 2007-2013 in http://ec.europa.eu/agriculture/rurdev/index_pt.htm 21 Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 3: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>. 22 Idem. 23 PACHECO, Pedro. Rural-Urbano in Tema e Programa Turma F, Faculdade de Arquitectura da Universidade Técnica de Lisboa, 2011.
Na América Latina e em outras regiões em desenvolvimento como
o sudeste asiático a principal questão é a inclusão social da
parcela da população que vive no campo. A concentração da
maior parte dos habitantes em áreas urbanas e a diminuição da
população rural deixa pouco assistida ou esquecida a parte rural
do território quanto ao direcionamento de políticas públicas. O
rural acaba tornando-se preocupação apenas das políticas
agrárias e não de um conjunto de políticas que disponibilize bens
e serviços básicos. A definição equivocada do que é ruralidade
prejudica o acesso da população rural a esses bens e serviços e
favorece o êxodo rural, o que é prejudicial tanto para o campo
quanto para a cidade. A população que emigra do campo para os
grandes centros urbanos, em parte significativa é pobre e está a
procura de melhores condições de vida, porém, em vários casos
irá se alojar em condições precárias nas cidades grandes e
médias.
Casa na área rural de Monte Alegre. Fonte: Foto do Autor.
15
‚O mundo rural está constituído por um conjunto
de territórios rurais, entendidos como um
continuum rural-urbano integrado e funcional,
que configuram e estruturam um país, uma
região e o mundo. (...) O principal desafio
consiste na inclusão dos territórios rurais e seus
habitantes na dinâmica de crescimento e bem
estar da economia e da sociedade.‛ 24
Byron Miranda Abaunza25
No Brasil, o conceito de ruralidade está sendo discutido no
Congresso Nacional desde 2011, sendo que em março de 2013, o
evento ‚Repensando o conceito de ruralidade no Brasil:
implicações para as políticas públicas‛ 26
reuniu representantes do
governo, acadêmicos e representantes de instituições da
24 Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 2: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>. 25 Gerente do Programa de Agricultura, Territórios e Bem Estar Rural do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). É nicaraguense, doutor em filosofia, especialista em desenvolvimento organizacional e humano, agrônomo e especialista em desenvolvimento rural. 26 Atualmente dois projetos de lei tramitam no Congresso Nacional sobre o assunto. No Senado, o PLS 258/2010 do Senador Antonio C. Valadares, do PSB de Sergipe, e na Câmara o PL 54/2011 do Deputado Assis do Couto, do PT do Paraná. Ambos utilizaram a proposta elaborada pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável, colegiado pertencente a estrutura do Ministério do Desenvolvimento Agrário e composto por representantes de governos e sociedade civil.
sociedade civil para ‚discutir o futuro do rural no país por meio de
uma reconceitualização da área rural‛ 27
.
Os debatedores deste evento chamaram a atenção para o real
tamanho da população residente no campo, que é maior do que
as estatísticas oficiais apontam, e para a importância do
agronegócio na balança comercial brasileira. Foi discutida
também a visão desatualizada que se tem do rural e a deficiência
das políticas públicas para esta parte da população.
Legalmente, a definição (ou a não definição) de rural no Brasil data
do final da década de 1930, pelo decreto-lei 311, de 2 de março
de 1938, que define área rural simplesmente como o que não é
urbano. Define-se o urbano como uma ocupação aglomerada,
dotada de serviços, e o rural é identificado por oposição ou
exclusão às áreas consideradas urbanas. Desse modo, todo
espaço de um município que não corresponder à área urbana e
seus distritos é tida como rural, ou seja, legalmente o espaço rural
é como um resíduo do urbano, ‚aquilo que sobra das cidades,
compreendidas como lócus central das ações do estado‛ 28
.
Porém, a definição contemporânea das áreas rurais leva em
consideração ‚as distintas formas de relacionamento dessas áreas
27 Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 4: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>. 28 Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 3: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>.
16
com os centros urbanos, com os quais mantêm relações
diferenciadas de interdependência e complementaridade‛ 29
.
Considerar urbana toda sede de município e de distrito,
independente de suas características, coloca o Brasil entre os
países com mais alta taxa de urbanização, sendo que a maioria
dos municípios (73% do total30
) apresenta menos de 20 mil
habitantes, e muitos destes possuem características econômicas,
culturais e sociais que giram em torno do rural.
‚De um total de 5.507 sedes de município
existentes em 2000, havia 1.176 com menos de
2 mil habitantes, 3.887 com menos de 10 mil, e
4.642 com menos de 20 mil, todas com estatuto
legal de cidade idêntico ao que é atribuído aos
inconfundíveis núcleos que formam as regiões
metropolitanas, ou que constituem evidentes
centros urbanos regionais. E todas as pessoas
que residem em sedes, inclusive em ínfimas
sedes distritais, são oficialmente contadas como
urbanas, alimentando esse disparate segundo o
qual o grau de urbanização do Brasil teria
atingido 81,2% em 2000.31
‛
José Eli da Veiga
29 Idem. 30 IBGE 2010. 31 VEIGA, José Eli da. Cidades Imaginárias: o Brasil é menos urbano do que se calcula. Autores Associados, Campinas-SP, 2003.
O contestável dado de que o Brasil é majoritariamente urbano
deixou por décadas a maior parte do território sem políticas de
planejamento, o que esta mudando recentemente, com o início do
debate em torno do desenvolvimento rural e territorial. O
coordenador-geral de gestão estratégica do Ministério do
Planejamento, Leandro Freitas Couto, diz que o grande desafio
para desenvolver o país é a ‚inserção do território no
planejamento‛ 32
, aplicando as políticas públicas no território em
sua totalidade, a fim de se ter um desenvolvimento mais igualitário.
A embaixadora do México no Brasil, socióloga Beatriz Paredes,
ressaltou a importância de mudar o paradigma cultural e investir
em educação no campo como forma de conter o êxodo rural e
equilibrar a ocupação do território, levando acesso à educação e
qualidade de vida à população rural. Ela afirma que ‚construir uma
nova ruralidade é indispensável para o mundo, ainda mais para o
Brasil, que continuará sendo um país agrícola. Este estudo vai
reorientar os investimentos públicos no rural‛ 33
.
‚Penso que ser desenvolvido significa viver com
os fatores necessários que te permitam
desenvolver plenamente sua condição humana,
no campo ou na cidade. Porém, tem-se o
preconceito generalizado que compara
desenvolvimento com modernidade urbana e
32 No evento “Repensando o conceito de ruralidade no Brasil: implicações para as políticas públicas” do dia 22 de março de 2013, que aconteceu no Senado Federal. 33 Ibidem 24.
17
que equipara a vida no campo com atraso.
Temos que nos livrar dessas concepções
porque não correspondem nem com a verdade,
nem com o bem-estar. O problema é quando há
pobreza. Quando há pobreza, seja no campo ou
na cidade, o povo não vive bem. É um problema
de pobreza, não de ruralidade ou de
urbanidade. Penso que é necessário estimular
políticas que criem oportunidades de geração
de renda rural e treinamento e formação de
jovens em áreas rurais.34
‛
Beatriz Paredes
34 Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 5: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>.
O consultor do Instituto Interamericano de Cooperação para a
Agricultura, Humberto de Oliveira, diz que o Brasil possui estados
inteiros rurais, e que é necessário repensar o orçamento e as
políticas públicas para auxiliar os 70% dos municípios brasileiros
que tem menos de vinte mil habitantes. Para ele o meio rural não
precisa apenas de políticas agrícolas e agrárias, mas sim, de um
conjunto de investimentos em diversas áreas. Segundo Oliveira,
não se pode ter um sistema de educação que expulse as pessoas
de seu local de origem35
.
‚É necessário rediscutir o conceito de rural,
considerando-o não como setor, mas como
espaço onde estão presentes cidade e campo
de mais de 85% dos municípios e cerca de 30%
da população do país, onde se realizam
atividades econômicas dos setores primário,
secundário e terciário, onde se produzem
alimentos e energia, onde se guarda um imenso
patrimônio cultural, onde ficam as reservas
florestais e a água, onde estão presentes
trabalhadores e empresários da indústria,
agricultura, turismo e comércio. Nesse rural são
demandadas políticas públicas de educação,
saúde, habitação, cidadania, esporte, lazer,
cultura, comunicações, segurança, meio
35 Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 4: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>.
Transporte público rural de Monte Alegre. Fonte: Foto do Autor.
18
ambiente, além de políticas agrícolas e
agrárias.‛ 36
Humberto de Oliveira
A atual classificação do que é população urbana e rural no país,
apresentada pelo IBGE, coloca o Brasil entre os países mais
urbanizados do mundo e gera uma distorção que impacta
negativamente o meio rural e as pequenas cidades brasileiras,
levando à interpretação de que, já que a população nessas áreas
diminui progressivamente, as políticas públicas devem ser
voltadas com prioridade para as regiões metropolitanas e as
médias e grandes cidades. A inexistência de uma política de
desenvolvimento territorial que tenha como premissa uma visão
atualizada do rural, vendo-o como espaço e não como setor, exclui
uma parcela significativa da população brasileira do planejamento
governamental. Os investimentos em planejamento e em políticas
públicas estão concentrados nas áreas mais adensadas, com
população acima de 100 mil habitantes, sendo o rural encarado
apenas como setor econômico primário (agricultura, pecuária,
pesca e extrativismo) e não como espaço rural 37
. Há políticas
sociais voltadas para o campo, como o ‚luz para todos‛ e o
‚programa nacional de habitação rural‛, que são recentes e
acompanham a discussão da qualidade de vida no campo e da
36 Revista eletrônica Fórum DRS. [on line]. Edição 1: Brasília, Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura – IICA, novembro/2012. [citado em julho de 2013]. Disponível na página web <www.iicaforumdrs.org.br>. 37 Idem.
inserção social que toma força nas últimas décadas, mas que
ainda está no início.
A visão do rural como setor, em detrimento do rural enquanto
território habitado é responsável por deixar em segundo plano,
quando não esquecidos, os pequenos municípios brasileiros. A
maioria das ações governamentais voltadas para os municípios
priorizam os que possuem população acima de 50 mil habitantes
‚quando 89% dos municípios do país possuem população igual ou
inferior a esse número‛38
.
A falta de um planejamento territorial que leve em consideração os
pequenos municípios e a população rural do país, aliada à
38 Idem.
Um dos limites do urbano com o rural. Fonte: Foto do Autor.
19
concentração de políticas e equipamentos públicos nos grandes
centros urbanos, favorecem o êxodo rural e a migração de parte
da população para esses grandes centros. Essas migrações, que
são motivadas pela escassez de oportunidades e acesso a
serviços nas pequenas cidades e no campo, não são benéficas
para nenhuma parte do território, pois geram cidades grandes
inviáveis, congestionadas e repletas de ocupações sem
planejamento; cidades médias que repetem os mesmos erros
cometidos nas grandes cidades; e cidades pequenas desoladas e
estagnadas, sem recursos e sem capital humano.
Toda a população, independente de onde viva, deve ter acesso a
todos os serviços públicos e à infraestrutura, o que é garantido
pela Constituição. Uma abordagem adequada para as pequenas
cidades e para o meio rural é a abordagem territorial do espaço,
‚que consiste em prover o território e não obrigatoriamente cada
um dos municípios, tanto de infraestruturas e serviços públicos
necessários e de qualidade como de outros investimentos para o
desenvolvimento do território como um todo, beneficiando toda a
sua população‛ 39
. Para isso o planejamento de um município deve
considerar o papel que ele desempenha no lugar onde está
inserido. Sendo assim, a abordagem da cidade de Monte Alegre
de Minas deve entender o papel que ela desempenha na região,
suas dependências, influências e inter-relações na rede de
cidades.
39 Idem.
Um dos limites do urbano com o rural. Fonte: Foto do Autor.
20
Imagem de satélite da cidade de Monte Alegre de Minas e seu entorno rural imediato. Fonte: Google Earth
22
MONTE ALEGRE DE MINAS E SEU PAPEL NA REDE
DE CIDADES
‚A ideia de que a cidade é uma totalidade
menor, dependente, ao mesmo tempo, de uma
lógica local, de uma lógica nacional e de uma
lógica mundial, foi raramente utilizada com base
em uma metodologia consequente [no
planejamento urbano].‛ 40
Milton Santos
As cidades, cada vez mais, organizam-se em rede. Há uma
relação de interdependência entre elas e uma divisão territorial do
trabalho, onde as cidades se especializam produtivamente e
trocam bens de consumo e capital humano entre si41
.
Para Milton Santos42
, a integração do território, que já ocorria,
evoluiu por meio da revolução técnico-científica, tornando o
espaço mais fluido. A evolução das comunicações e dos meios de
transporte construíram as bases de uma verdadeira fluidez do
território, permitindo que a informação, os fatores de produção, o
trabalho, os produtos, o capital e as pessoas possam ter grande
mobilidade.
40 SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994. 41 CORRÊA, Roberto Lobato. Estudo sobre a Rede Urbana. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 2004. 42 Idem.
Essa fluidez do território acarretou em uma divisão interurbana do
trabalho e na distribuição de funções produtivas entre as cidades,
em que as cidades pequenas estão, em sua maioria, associadas à
produção no campo. Os agentes reguladores da produção
agrícola estão situados nas cidades locais, é nelas que se
encontram o estoque dos meios de consumo, o capital de giro e a
mão de obra da produção no campo. São elas também os polos
de difusão de mensagens e ordens para essa produção, o que faz
com que, hoje, todos os dados da regulação agrícola aconteçam
no urbano.
Monte Alegre de Minas desempenha este papel regulador para a
produção agrícola que acontece no território de seu município.
Além disso, a especialização da produtividade é notada em Monte
Alegre, principalmente na segunda metade do século passado,
quando a cidade era considerada a maior produtora de abacaxi
no Brasil. Para o geógrafo Roberto Lobato Corrêa43
, essa
identidade funcional observada em cidades pequenas afirma o
caráter de lugar. Hoje, Monte Alegre diversificou sua produção
agrícola, não sustentando mais a alcunha de ‚maior produtora
nacional de abacaxi‛, tendo sua produção mais balanceada e
diversificada, com o aumento da pecuária e de outros cultivos,
como o da soja.
O triângulo mineiro, e o centro do Brasil como um todo, é uma
região majoritariamente agrícola. Para Milton Santos, hoje, ‚as
43 Idem 37.
23
regiões agrícolas (e não rurais) contém cidades; as regiões
urbanas contém atividades rurais‛44
, e nesta situação
socioeconômica, as cidades adaptaram-se às demandas
produtivas do mundo rural e das atividades agrícolas. No triângulo
mineiro, nota-se que o conjunto dos pequenos municípios como
Monte Alegre são responsáveis pela maior parte da produção
agrícola e que as cidades maiores, principalmente Uberlândia, são
responsáveis pelo processamento e pela distribuição dessa
produção. Um exemplo são as granjas de suínos ou de aves que
criam animais na área rural de Monte Alegre e em outros
municípios da região, e cujo beneficiamento e distribuição dessa
produção acontece nos grandes frigoríficos localizados em
Uberlândia, como o conglomerado BR Foods. Outro exemplo é a
produção do fertilizante organomineral que foi desenvolvido e
testado pela Faculdade de Agronomia da Universidade Federal de
Uberlândia45
, e é produzido em uma fábrica no município de Monte
Alegre, reutilizando o refugo da produção sucroalcooleira de
usinas da região.
‚A região agrícola tem sua unidade devida à
inter-relação entre o mundo rural e mundo
urbano, representado este por cidades que
abrigam atividades diretamente ligadas às
atividades agrícolas circundantes e que
44 Idem 36. 45 O fertilizante foi testado e aprimorado pela Faculdade de Agronomia da UFU, em pesquisa do Prof. Gaspar Kordörfer.
dependem, segundo graus diversos, dessas
atividades.‛46
Milton Santos
Na rede urbana, a influência que as cidades exercem umas nas
outras ultrapassa os limites estaduais e nacionais. Ao analisar o
Triângulo Mineiro constata-se que a região é influenciada por São
Paulo e Brasília, além de Belo Horizonte. Uberlândia destaca-se
como principal capital regional, fortemente influenciada por São
Paulo (uma metrópole global), enquanto Uberaba assume o papel
de capital regional secundária, sob influência de Belo Horizonte
(uma metrópole nacional). As cidades de Ituiutaba, Frutal, Patos
de Minas, Patrocínio, Araxá e Monte Carmelo desempenham papel
de centros sub-regionais, que influenciam as cidades menores da
região e são influenciadas por Uberlândia, Uberaba, São Paulo e
Belo Horizonte47
.
Monte Alegre de Minas é uma cidade local, situada entre
Uberlândia e Ituiutaba, a capital regional e um centro sub-regional,
respectivamente. Por ser limítrofe com esses dois importantes
polos regionais, Monte Alegre é bastante dependente e
influenciada por essas duas cidades.
O geógrafo Roberto Lobato Corrêa destaca que, com a construção
de rodovias que possibilitam um rápido acesso e circulação entre
46 SANTOS, Milton. A Urbanização Brasileira. Ed. Hucitec, São Paulo. 1994. 47 Instituto Geográfico e Cartográfico (IGC). São Paulo. 2003.
24
os centros urbanos, e com a evolução dos meios de transporte e
das comunicações, houve uma perda de centralidade por parte
das cidades pequenas48
. Estas cidades locais dependem cada
vez mais das cidades maiores e das capitais regionais quanto ao
acesso a bens e a serviços mais específicos. Monte Alegre de
Minas estabelece relações de interdependência e
complementaridade com as cidades próximas e é dependente das
cidades maiores da região, principalmente Uberlândia, Ituiutaba, e
a cidade goiana de Itumbiara, as quais se têm acesso a partir das
rodovias BR-365 e BR-153, importantes vias de integração
nacional. Estas cidades maiores desempenham o papel de polos
regionais, concentrando universidades, complexos hospitalares e
outros serviços e comércio mais específicos.
Parte da população de Monte Alegre e de outras cidades
pequenas da região migra para Uberlândia e outras cidades
maiores a fim de estudar e trabalhar. Boa parte dessa população
migrante que deixa as cidades pequenas é composta por jovens.
Estes jovens migrantes buscam qualificação profissional, melhores
empregos e raramente retornam para suas cidades-natal em idade
economicamente ativa, ou seja, quando estes migrantes retornam
para suas cidades de origem (quando retornam), em sua maioria,
já estão aposentados.
48 CORRÊA, Roberto Lobato. Estudo sobre a Rede Urbana. Bertrand Brasil. Rio de Janeiro. 2004.
25
MAPA DE REGIÕES DE INFLUÊNCIA DAS CIDADES (ÁREA CENTRO-SUL)
Fonte: Caracterização e tendências da rede urbana do Brasil. Brasília: IPEA; Rio de Janeiro: IBGE; Campinas: UNICAMP/IE/NESUR. 2v. (Coleção pesquisas, 3), 1999.
27
A POSSIBILIDADE DE REEQUILIBRIO NA REDE DE
CIDADES DA REGIÃO
Segundo relatório da ONU-Habitat apresentado em 201249
, as
cidades médias e pequenas da América Latina, onde reside a
maior parte da população urbana na região, cresceram em ritmo
mais elevado que as grandes cidades, o que aponta um possível
reequilíbrio das redes de cidades latino-americanas.
O relatório50
cita que houve uma desaceleração no crescimento
demográfico da região e que este crescimento populacional é
estável e permanecerá em torno de menos de 1% ao ano. O êxodo
migratório do campo para a cidade perdeu peso e as migrações
agora acontecem entre as cidades, o que gera um crescimento
populacional nas cidades médias e a conformação de
megarregiões e corredores urbanos.
O crescimento populacional das cidades médias através das
migrações interurbanas constitui um desafio para o poder público
e para o planejamento, pois, sem o apoio técnico e político
adequado, é provável que aconteça a multiplicação de
assentamentos precários nestas cidades, com as mesmas
consequências já vistas nas grandes cidades. Uberlândia, que é a
cidade que mais cresceu e recebeu migrantes no triângulo
49 Organização das Nações Unidas. Estado de las ciudades de America Latina y el Caribe: rumbo a una nueva transición urbana. ONU-Habitat (2012). 50 Idem.
mineiro, recentemente viu surgir o assentamento irregular do
‚Triângulo do Glória‛.
Outro fator observado pelo documento51
é que a mancha urbana
das cidades latino-americanas segue em expansão, apesar da
desaceleração demográfica. Esse crescimento disperso
provocado pela especulação imobiliária produz cidades pouco
densas, com centros subaproveitados e grande segregação física
e social. Esse fator é observado em todas as cidades do triângulo
mineiro, especialmente em Uberlândia, maior cidade da região.
Segundo o relatório, é indispensável promover políticas de coesão
territorial que garantam o desenvolvimento equitativo de todas as
cidades e sua articulação no âmbito regional. Para o Diretor
Executivo da ONU-Habitat, Joan Clos, a América Latina esta a
ponto de viver uma nova transição urbana, em que um salto
qualitativo é possível, porém, há a necessidade de uma profunda
reflexão sobre os modelos de crescimento urbano promovidos até
hoje, que estão marcados por um alto grau de insustentabilidade,
em que, apesar de esforços positivos em algumas cidades, boa
parte delas crescem com urbanizações de baixa qualidade,
centradas em si mesmas, sem um planejamento regional e sem a
criação de espaços de socialização que não estejam totalmente
dedicados ao consumo. A região deve centrar-se em um
planejamento territorial que vise a igualdade de acesso a bens e
serviços por toda a população.
51 Idem.
28
‚Há a necessidade de uma abordagem holística
para o desenvolvimento urbano e de
assentamentos humanos, que preveja habitação
acessível e infraestrutura, e priorize a
atualização e regeneração urbana. É importante
ressaltar o compromisso no sentido de melhorar
a qualidade dos assentamentos humanos,
incluindo a vida e o trabalho, tanto urbano
quanto rural, no contexto da erradicação da
pobreza, de modo que todas as pessoas
tenham acesso a serviços básicos, habitação e
mobilidade.52
‛
Joan Clos
O que se vê mais usualmente no Brasil são loteamentos populares
e comerciais sendo feitos desconexos da malha urbana,
promovendo cidades espraiadas e beneficiando a especulação
imobiliária. Bem como, na maioria das cidades brasileiras, a
mobilidade é ineficiente e a área rural é vista de forma secundária,
o que não garante igualdade de acesso a bens e serviços para a
população como um todo.
52 Idem.
Para um desenvolvimento mais igualitário, o Triângulo Mineiro deve
desenvolver seus municípios encarando o território como um
continuum urbano-rural interdependente que forma a rede urbana.
Os equipamentos públicos devem ser distribuídos de maneira
uniforme e o transporte e mobilidade devem ser facilitados, afim
de que haja uma maior integração entre as cidades e para que os
habitantes das cidades menores possam ter acesso aos serviços
oferecidos nas cidades maiores da região.
Conjunto habitacional do “Minha Casa Minha Vida” no limite da cidade. Ao fundo plantação de eucalipto. Fonte: Foto do Autor.
29
Conjunto habitacional do “Minha Casa Minha Vida” no limite da cidade de Monte Alegre de Minas. Fonte: Foto do Autor.
30
Comemoração do centenário de Monte Alegre de Minas, na Praça Nicanor Parreira, em frente à Igreja Matriz, no ano de 1970. Fonte: Arquivo pessoal de Fabio Antonio Arantes.
35
‚Monte Alegre é um lugarzinho simpático de
aspecto realmente risonho. Terá seus 400 ou
500 habitantes, algumas casas bastante boas,
caiadas e de telhas. A Matriz é sumamente
tosca. Diverti-me em lhe tirar uma vista. Muito
pobrezinha com as suas torres e sua única porta
a que dá acesso uma escadinha. O interior
também de pobreza extrema, está bem de
acordo com o movimento quase nulo do
lugarejo de que é o mais importante edifício e a
que animam as poucas tropas de cargueiros
que por ali transitam. "53
Visconde de Taunay54
O triângulo mineiro começou a ser explorado no século XVII, como
território de passagem entre o litoral de São Paulo e o interior do
Brasil, como acesso às áreas onde hoje se localizam os estados
de Goiás e Mato Grosso. As bandeiras e expedições que
passavam pelo território do atual triângulo mineiro procuravam
primeiramente minérios e posteriormente terras férteis às quais
53 Depoimento de Visconde de Taunay sobre Monte Alegre em decorrência da passagem das tropas brasileiras combatentes na Guerra do Paraguai pelo então Arraial, em 1865. IN Cartas da Campanha de Mato Grosso .Ed. Melhoramentos. 1921. Pág.96
54 Alfredo Maria Adriano d’Escragnolle Taunay, aristocrata carioca de família francesa, tinha o título de Visconde junto ao Império Brasileiro. Foi um nobre, escritor, engenheiro militar, político, historiador e sociólogo brasileiro. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras.
pudessem tomar posse. Por ser rota de passagem para o centro
do Brasil, surgiram pelo caminho, ao longo dessas trilhas, paradas
e pequenas vilas que viriam a formar as primeiras cidades da
região. A cidade de Monte Alegre de Minas é uma das primeiras
cidades a se formar no triângulo mineiro e tem sua ocupação
datada no começo do século XIX.
Entre as décadas de 1810 e 1820, a comitiva de José Antônio
Pereira, proveniente da Vila de Barbacena, na província de Minas
Gerais, parte a procura de terras férteis no interior do Brasil, as
quais pudesse tomar posse. Seu objetivo era chegar a terras da
então província de Mato Grosso. No decorrer do percurso um
integrante da comitiva adoece e o grupo é obrigado a parar. A
expedição para entre os vales de dois córregos e é feita a
promessa de que, se o integrante enfermo fosse curado, erguer-
se-ia uma capela em devoção a São Francisco, santo no qual o
grupo era devoto. A partir de então, a comitiva estabelece morada
nesta área, o integrante doente é curado e a capela em devoção a
São Francisco é erguida. Os córregos dentre os quais a comitiva
se fixou são os córregos Monte Alegre e Maria Elias, e a Capela de
São Francisco das Chagas viria a ser a Igreja Matriz do futuro
Arraial de São Francisco das Chagas de Monte Alegre.
Por estar localizada no meio de uma das rotas que levava ao
interior do país, logo outras famílias se fixaram ao redor da Capela
de São Francisco, formando o Arraial de São Francisco das
Chagas de Monte Alegre, que levou esse nome devido ao santo
36
padroeiro da capela e ao fato de, na parte mais alta da área,
chamada de Serrinha, serem realizadas a maioria das festas,
terços e reuniões comunitárias da época.
Em 1865, em decorrência da Guerra do Paraguai, chega ao Arraial
uma coluna do Exército Brasileiro com o intuito de recrutar homens
para compor reforços à tropa dos chamados Voluntários da Pátria,
em que a província de Minas Gerais apresentou maior contingente.
Alguns homens de São Francisco das Chagas de Monte Alegre
partem com a tropa para lutar na Guerra do Paraguai. Nesse
episódio, o Visconde de Taunay, que acompanhava essa coluna
do Exército Imperial que passou por Monte Alegre, descreve o
lugarejo como um ‚lugarzinho simpático‛ de ‚400 ou 500
habitantes‛, com algumas casas caiadas e com telhas, e com uma
igreja simples.
Após forçosa retirada das tropas brasileiras do território paraguaio,
em que os soldados sofriam com uma epidemia de várias
doenças, fato conhecido como a Retirada de Laguna, chega ao
Arraial de Monte Alegre, por volta de 1867, cerca de seis soldados
brasileiros abatidos pela varíola. Na época, esta doença era
chamada de bexiga por causa das bolhas que apareciam no
corpo dos infectados, e ainda não tinha tratamento e cura55
. Por
ser uma doença infecciosa, os soldados doentes não puderam se
hospedar no Arraial, alojando-se a cerca de cinco quilômetros do
povoado, às margens do córrego Monte Alegre. Neste lugar estes
55 A varíola não tem cura até hoje, porém a doença foi erradicada pela vacinação.
soldados permaneceram até a morte, sendo então, enterrados no
mesmo local, denominado a partir dessa ocasião de Cemitério dos
Bexiguentos, em alusão à doença que os abateu.
Há o desmembramento do município de Monte Alegre em 1870,
elevando o Arraial à categoria de Vila, e em 1872 acontece a
primeira instalação da Câmara Municipal. É também em 1872 que
alguns Voluntários da Pátria retornam a Monte Alegre, vitoriosos na
Guerra do Paraguai, e fixam morada na Vila. Nessa mesma época,
José Antônio Pereira, fundador do Arraial e quem mandou
construir a Capela de São Francisco que originou a Matriz, reúne
sua família e trilha o caminho percorrido pelos soldados, com o
intuito de encontrar terras férteis e desabitadas. A comitiva de
Pereira vai para a província de Mato Grosso e estabelece-se na
Serra do Maracujá, de novo entre dois córregos, fundando outro
arraial. Este novo arraial fundado por José Antonio Pereira tornar-
se-ia Campo Grande, atual capital do estado de Mato Grosso do
Sul.
38
Na primeira metade do século XX, a Vila de Monte Alegre
expandiu-se em torno da Igreja Matriz de São Francisco das
Chagas e consolidou-se enquanto cidade. O traçado urbano das
primeiras vias e quadras seguiram o alinhamento dos Córregos
Maria Elias e Monte Alegre e convergiram para o largo e adro da
Igreja.
São desse período os prédios de arquitetura eclética projetados
pelo arquiteto prático italiano Luiz Bianchi e construídos pelo
construtor português Joaquim Cruz, ambos radicados na cidade.
Dentre as construções destacam-se os prédios públicos do Antigo
Fórum, do Grupo Escolar, da Cadeia e do reservatório público de
água.
O prédio do Antigo Fórum foi construído de frente para o largo da
Igreja, antigo Largo Rui Barbosa, em 1922, e funcionou como paço
municipal até 1936, quando o legislativo e o executivo foram
transferidos para outro prédio. O Grupo Escolar Tancredo Martins
foi inaugurado em 1928 também no Largo Rui Barbosa, entre a
Igreja e o Fórum, e mantém seu funcionamento como escola até a
atualidade. O prédio do antigo reservatório público de água foi
construído entre 1915 e 1916, servindo de reservatório para o
primeiro sistema de abastecimento de água da cidade, tendo esse
uso até 1970. O prédio antigo da Cadeia é da década de 1920 e
atualmente é de propriedade privada.
A Igreja Matriz foi amplamente modificada na primeira metade do
século XX. Em 1900 o pároco contrata os construtores europeus
Fioravante Blarazinni, Francisco Ramella e Eduardo Boroni para
remodelarem a fachada do templo, que adquire características
neogóticas, as quais são preservadas até hoje. A nave da Igreja é
reconstruída e ampliada na década de 1920.
Prédio do antigo Fórum na déc. de 1940. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
39
O espaço público existente em torno da Igreja começou a ser
modificado nessa época. Primeiramente esses espaços livres
eram um largo e o adro que abrigavam viajantes e tropeiros, e não
tinham pavimentação. No início do século XX é construído um
jardim público no adro da Igreja, que posteriormente transformou-
se na Praça Getúlio Vargas, que era dividida ao meio por uma rua,
sendo que em sua parte inferior localizava-se um coreto. O Largo
Rui Barbosa, localizado na lateral da Igreja, permanece como
largo de terra batida tendo ao centro um poste de iluminação
pública. Esses espaços serão modificados posteriormente, na
década de 1960, quando também mudam de nome, com o Largo
Rui Barbosa passando a se chamar Praça Luis Dutra Alvim e a
Praça Getulio Vargas adotando o nome de Praça Nicanor Parreira,
ambos em homenagem a ex-prefeitos da cidade.
O primeiro cemitério localizava-se ao lado do largo lateral da
igreja. No início do século XX um novo cemitério é construído do
outro lado do Córrego Monte Alegre devido à pequena
capacidade do antigo cemitério. Na década de 1930, os corpos
sepultados no antigo cemitério começam a ser transferidos para o
novo a fim de se extinguir os trabalhos no antigo, que foi fechado
posteriormente e teve sua área ocupada com construções.
Prédio do antigo Reservatório de Água na déc. de 1920. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
Reforma da nave da igreja na déc. de 1920. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
40
Após a abolição dos escravos, em 1888, manteve-se a tradição na
cidade de celebrar o dia 13 de maio56
com a festa de congados e
moçambiques, sendo inclusive feriado municipal. No início do
século XX foi construída uma igreja em devoção a Nossa Senhora
do Rosário no final da Rua São Francisco, em um largo do outro
lado do Córrego Maria Elias. A procissão e desfile dos congados
percorriam a Rua São Francisco, entre as duas igrejas. Porém, a
Igreja do Rosário foi demolida na década de 1940, a mando do
pároco Oscar Bitner, de origem alemã. Não se sabe ao certo o
motivo que levou à demolição da Igreja. A festa do congado
56 Em comemoração à assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel, em 13 de maio de 1888.
continua até hoje e uma nova igreja foi construída somente na
década de 1990, em outro local.
O Padre Oscar Bitner foi uma figura emblemática na história da
cidade, sendo lembrado até hoje como uma lenda urbana. Oscar
Bitner fugiu da Alemanha nazista e exilou-se no Brasil, onde fez
seminário em Uberaba, e veio para Monte Alegre como pároco.
Quando o Brasil entrou na II Guerra, em apoio aos Aliados57
e
contra os países do Eixo, aos quais incluía a Alemanha, houve a
57 União Soviética, Reino Unido e Estados Unidos
Praça em frente à Igreja na déc. de 1940. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
Antiga Igreja do Rosário, que foi demolida na déc. de 1940. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
41
possibilidade de alistamento militar dos brasileiros. Para que
houvesse o alistamento militar era necessário um ‚certificado de
batismo‛ fornecido pela Igreja. Em Monte Alegre esse documento
era lavrado pelo pároco Bitner, o qual se recusou a fornecê-lo para
fins militares. Essa situação gerou revolta na população,
principalmente nas famílias mais poderosas e influentes, que eram
as que queriam os documentos para o alistamento. Dessa forma, o
padre que fugiu da Alemanha de Hitler foi acusado de ser um
espião nazista, que possuía rádios de comunicação em sua
residência e que tinha contato com o governo alemão. Oscar
Bitner teve seus bens retidos e suas propriedades revistadas pela
polícia política mineira. A investigação não encontrou nada que o
condenasse, classificando-o inclusive como antinazista por ter
como caseiros em sua fazenda uma família de poloneses judeus.
O padre então deixa a cidade, que tinha em sua classe mais rica
um ambiente hostil para sua permanência. A saída de Oscar Bitner
de Monte Alegre gerou uma lenda urbana na qual se diz que o
pároco rogou uma praga na cidade, onde nada prosperaria, e em
que o local permaneceria estagnado.
A expansão urbana da cidade só aconteceria a partir da década
de 1950, com a construção das rodovias que integraram o país e
com a construção de Brasília, em 1960.
Entrada do primeiro carro na cidade, em 1912. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
Vista aérea de Monte Alegre na déc. de 1940. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
43
‚Sinto-me feliz ao inaugurar o trecho da rodovia
BR-14 e BR-71. Estamos avançando sobre o
Brasil, conquistando o seu território e plantando
no planalto o centro mais enérgico no progresso
do Brasil, com a construção de Brasília. Aos
meus amigos de Monte Alegre, cujo
desenvolvimento se vai acelerar, o abraço de
Juscelino Kubistchek.58
‛
Juscelino Kubistchek
O Brasil começou a sua industrialização com o presidente Getulio
Vargas, porém, o crescimento industrial só ganhou maior
dimensão após a administração de Juscelino Kubistchek, que
adotou medidas para o desenvolvimento na área de energia e de
transporte, permitindo a vinda de indústrias multinacionais e
integrando o território brasileiro.
No governo JK são construídas várias rodovias no Brasil, com o
intuito de integrar as regiões do país e interliga-las com a nova
capital em construção, Brasília. É então que, em 1958, como parte
do plano de metas de seu governo, Juscelino inaugura o trecho
que corta o município de Monte Alegre das rodovias BR-14 e BR-
58 Presidente Juscelino, em carta à população montealegrense, devido à inauguração das rodovias que cortam o município, em 14 de novembro de 1958.
71, antigo nome das atuais BR-153 e BR-365, respectivamente59
.
Com a construção dessas duas rodovias no município, e tendo a
BR-71, atual 365, passando pelo perímetro urbano, Monte Alegre
terá seu primeiro momento de expansão, com a criação de novos
loteamentos.
São criados então, novos bairros que ligam o centro da cidade à
rodovia e surgem outros nas margens da rodovia, do lado oposto
ao centro, caracterizando a primeira expansão urbana da cidade.
A segunda expansão urbana só se daria na década de 1980, com
loteamentos financiados pelo Banco Nacional de Habitação na
parte norte da cidade.
No encontro das atuais BR-365 e BR-153, no município de Monte
Alegre de Minas, surge o Trevão, localidade que, além de ser
referência para os caminhoneiros, por ser um posto de
combustível, loja e restaurante, também possui algumas casas,
tendo inclusive uma escola rural que atende aos moradores da
localidade e aos agricultores da região.
59 O primeiro sistema de numeração de rodovias federais no Brasil foi criado no final dos anos 40 e durou até 1964.
44
Em 1966, o arquiteto João Jorge Coury, residente em Uberlândia,
é convidado para remodelar a Praça Getulio Vargas, em frente à
Igreja Matriz. Assim como em outras praças projetadas por este
arquiteto na região neste mesmo período, a praça, que após a
reforma passou a se chamar Praça Nicanor Parreira, ganha
características do urbanismo moderno. Os bancos coletivos e o
espaço central livre para a população marcaram o projeto. Coury
une as duas partes da praça, fechando a rua que a cortava ao
meio. O coreto é demolido e é prevista a construção de uma
concha acústica, a qual não foi executada. No decorrer dos anos,
a Praça Nicanor Parreira passa por intervenções que a
descaracterizam, como por exemplo, a construção de um
palanque em cima das fundações da concha acústica, que
obstruiu a visão da igreja para a perspectiva da rua que é uma das
entradas da cidade e a colocação de bancos individuais. A praça
de características modernas perdura descaracterizada até 2007,
quando é completamente destruída para a construção de uma
nova praça. O Largo Rui Barbosa, na lateral da Igreja Matriz, é
remodelado na década de 1940, e posteriormente em 1960,
passando a se chamar Praça Luis Dutra Alvim, esta praça passa
por várias reformas, executadas e projetadas por órgãos da
prefeitura, até que é totalmente demolida em 2007, para ser
novamente remodelada.
Praça Nicanor Parreira na década de 1970. Fonte: Arquivo do Departamento de Cultura.
Pça. Nicanor Parreira, em 1970, no dia do centenário da cidade. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
45
Com o centenário da Retirada de Laguna, na Guerra do Paraguai,
e no início do governo militar no Brasil, são construídos inúmeros
memoriais e monumentos aos retirantes e aos voluntários da
pátria. Monte Alegre de Minas, por onde uma coluna do Exército
Imperial se hospedou e onde morreram alguns soldados retirantes
de Laguna, não estava previsto como parte
das honrarias, o que foi reivindicado pelo
historiador e artista montealegrense Alaor
Mendonça. O historiador reivindicou junto
ao governo militar, estadual e federal, a
construção de um monumento no Cemitério
dos Bexiguentos, o que foi atendido e teve
inauguração em 1967. O Monumento aos
Retirantes de Laguna conta com um
cercado de concreto e dois obeliscos em
volta das estacas de aroeira originais do
cemitério; e com planos de concreto que
sustentam um cruzeiro, um mapa com o
trajeto dos soldados, e textos explicando o
fato histórico e prestando homenagens aos
soldados ali enterrados. O Monumento
passou por várias fases, sendo
abandonado, sendo encarado como área
de lazer e como espaço de homenagem.
Foi construída posteriormente, uma represa
a qual se podia usar pedalinhos e canoas,
e uma escola agrícola de tempo integral
para crianças. Mais recentemente a escola está abandonada, a
represa já não é utilizada para lazer e foi construído um museu no
local da antiga casa dos zeladores do monumento. O museu
construído em 2009 encontra-se abandonado e não chegou a ser
inaugurado.
Praça Luis Dutra Alvim na década de 1970. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
46
Durante o ‚milagre econômico‛ da ditadura militar brasileira, Monte
Alegre de Minas passa por mais algumas mudanças. Os prefeitos
da época, ligados ao partido ARENA e apoiados pelos militares,
fizeram algumas obras que iriam reorganizar a cidade. São elas, a
nova sede do Fórum, o Estádio Popular do time local Triângulo
Esporte Clube, o Parque de Exposições e a canalização do
Córrego Monte Alegre.
O novo prédio do Fórum é inaugurado em 1979 em uma praça
localizada onde havia o antigo campo do time local Triangulo
Esporte Clube. A sede do time é então transferida para a entrada
da cidade, próximo à BR-365. O Parque de Exposições é
construído em 1978, próximo também à rodovia. O atual prédio da
Câmara, Prefeitura e Rodoviária são construídos na década de
1970 e a canalização do Córrego Monte Alegre acontece em 1980,
com a implantação da Avenida Tancredo Neves em suas margens.
Com a construção de novos edifícios públicos, alguns prédios
antigos passam por mudanças de uso, chegando a sofrer algumas
descaracterizações. O antigo Fórum, de arquitetura eclética, tem
suas esquadrias originais trocadas por basculantes, que alteraram
a fachada e os vãos do edifício. O prédio é abandonado durante
alguns anos e depois se torna sede de várias secretarias da
prefeitura, sendo agora sede da Secretaria de Educação. A antiga
Monumento aos Retirantes de Laguna na década de 1990. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
Fórum. Fonte: Foto do Autor.
47
Caixa D’água ficou abandonada de 1970 a 1993, quando se torna
sede da banda municipal. Em 1997 o prédio da antiga Caixa
D’água é então reformado para abrigar a Biblioteca Municipal e
atualmente o prédio passou por outra reforma para que seja
instalado o Museu da Musica em seu interior, que irá contar a
história da Banda Municipal e de outros grupos musicais na
cidade.
Com o trafego na rodovia que corta a cidade, parte da população
que vive nas bordas da BR-365 viu a oportunidade de poder
vender produtos para os que por ali passam. Dessa maneira
espalhou-se pela área vendedores em carros e em barracas
improvisadas, o que se via até a pouco tempo, antes da
duplicação da rodovia. Devido ao número de vendedores, foi feito
um conjunto de casas na década de 1970, onde as pessoas
pudessem viver e vender produtos nas margens da pista, a esse
conjunto deu-se o nome de Barracas.
Na década de 1980, foi patrocinada pelo Banco Nacional de
Habitação, a construção de um conjunto habitacional na região
norte da cidade. Esse conjunto foi construído longe da área central
e desconexo com a malha urbana existente, gerando um
loteamento entre o conjunto e a área central, chamado Bairro
Paloma.
Igreja do Rosário. Fonte: Foto de Gláucio Henrique Chaves.
Barracas. Fonte: Foto do Autor.
48
Foram construídas, na década de 1990, a nova Igreja do Rosário,
em local diferente da primeira, e a Capela do Divino Pai Eterno, na
região da Serrinha, que deu nome à cidade. Há relatos de que na
região da Serrinha, onde havia festas populares e religiosas,
existiam sempre capelas feitas com madeira e palha, que serviam
para as celebrações das Festas de Reis e outros eventos
religiosos. Essas capelas tinham caráter efêmero por causa das
festas, e na década de 1990 foi construída uma capela de
alvenaria, com um mirante para a cidade, onde até hoje são
realizadas festas e quermesses.
Prédio do Antigo Fórum em 2010. Fonte: Foto de Elisa Azevedo Ribeiro.
Prédio da Antiga “Caixa D’água” em 2009. Na época, Biblioteca Municipal. Fonte: Foto de Hércules Ramalho.
51
Nas últimas décadas, com as mudanças sociais pelas quais o
Brasil passou e por ações federais como o Programa de
Aceleração do Crescimento e o Minha Casa Minha Vida, Monte
Alegre passa por mais algumas transformações.
As rodovias que cortam o município passam por duplicação, como
parte das medidas do PAC, estando em obras no perímetro
urbano até hoje. Com a duplicação, os acessos à rodovia são
repensados, tendo inclusive a canalização e urbanização do
Córrego Maria Elias, que estava no fundo dos lotes anteriormente.
A nova avenida em construção nas margens do Córrego Maria
Elias, encontrará a avenida marginal do Córrego Monte Alegre60
, e
sairá desse encontro um novo acesso da cidade para a rodovia
BR-365. Outro acesso está sendo construído com a prorrogação
da avenida marginal do Córrego Monte Alegre até a rodovia.
A prefeitura está sendo transferida para um novo prédio, às
margens da BR-365, onde também está acontecendo um novo
loteamento. Novos loteamentos estão surgindo nas margens da
cidade, tendo inclusive, loteamentos sociais promovidos pelo
programa federal Minha Casa Minha Vida. Este crescimento
urbano disperso gera uma cidade pouco densa e com vazios, o
que contribui para a especulação imobiliária e para um mau gasto
dos recursos públicos, que tem que bancar os gastos com
iluminação e saneamento público de áreas vazias.
Com o recente PAC 2, vieram recursos para a construção da
Estação de Tratamento de Água e para a Estação de Tratamento
de Esgoto, ambos em construção. Esses equipamentos
melhorarão a água fornecida à população e pretendem tirar o
despejo de esgoto dos córregos Monte Alegre e Maria Elias.
Outras alterações recentes foram a criação do Museu Municipal,
no Monumento dos Retirantes de Laguna e a remodelação de
algumas praças da cidade.
60 Avenida Tancredo Neves.
Obras da duplicação da BR-365, em Monte Alegre de Minas. Fonte: Foto do Autor.
52
Algumas praças foram remodeladas na primeira década dos anos
2000, dentre elas, as praças em torno da Igreja Matriz, a Praça
Nicanor Parreira e Luis Dutra Alvim. Por ser a Igreja e seu entorno
o marco zero da ocupação do município, essas praças,
carregadas de significado e de importância pelo imaginário
coletivo, sofreram muitas transformações desde que eram o adro e
um largo de terra batida. Porém, no ano de 2007, as duas praças
foram destruídas para a construção de uma nova, que as uniu. A
Praça Nicanor Parreira, projetada por Coury e de caráter moderno
pós-Brasília estava descaracterizada e foi completamente
demolida, não restando nem a vegetação, nem a pavimentação de
mosaico português. O mesmo aconteceu com a Praça Luis Dutra
Alvim. As duas praças foram então, unidas, calçadas com bloco
intertravado de concreto, e foi construído um coreto como o que
existia antes da década de 1960. Com esta reforma, que segundo
a prefeitura, retoma elementos do que a praça foi antigamente, a
praça foi tombada como patrimônio municipal.
Construção da avenida marginal ao Córrego Maria Elias, em 2013. Fonte: Foto do Autor.
Museu do Monumento aos Retirantes de Laguna, em 2013. Fonte: Foto do Autor.
53
O Monumento aos Retirantes de Laguna foi reformado, adotando
as cores da última gestão municipal61
, e foi construído o Museu
Histórico e Artístico onde antes se localizava a casa dos zeladores
do monumento, reaproveitando a alvenaria pré-existente. Os
zeladores foram transferidos para a antiga escola primária
desativada, permanecendo lá até hoje. O Museu, construído em
2009, nunca foi inaugurado e encontra-se abandonado, pois é
inadequado para exposições. O acervo que se pretendia expor no
museu é todo documental e fotográfico, e a área de exposição
feita em vidro e acrílico danificaria os documentos, que ficariam
expostos ao sol.
61 Gestão Dr. Último Bittencourt de Freitas (2005-2012)
Há uma série de planos para novos equipamentos culturais na
cidade, alguns já em construção. Está sendo construído um Centro
de Convenções que será a sede do Departamento de Cultura e
contará com área para exposição e auditório. A antiga Caixa
D’água, que abrigava a Biblioteca Municipal, será o Museu da
Música, que contará a história da Banda Municipal e de outros
grupos na cidade, sendo a Biblioteca transferida para um anexo
nos fundos do edifício. Com a inauguração da nova prefeitura,
será reorganizada a distribuição das Secretarias na cidade, e o
prédio eclético do Antigo Fórum será a Oficina Cultural, onde se
realizará cursos e exposições.
Vista aérea das praças ao redor da Matriz em 2009. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
Prédio onde será o Museu da Música. Biblioteca funciona em anexo, nos fundos. Fonte: Foto do Autor.
54
Desde sempre, as alterações no espaço urbano de Monte Alegre
aconteceram sem que houvesse um planejamento geral. A cidade,
assim como todas as cidades da região, não contou com um
projeto ou planejamento, o que se viu foi um urbanismo vernacular
em que o núcleo urbano se desenvolveu em torno da Igreja,
situada na meia encosta de um vale, e voltada para o curso
d’água62
. O crescimento urbano de Monte Alegre não contou, e
ainda não conta com um planejamento geral. A cidade ainda não
possui Plano Diretor ou Plano de Ordenamento do Território, que
não são obrigatórios para cidades de até 20 mil habitantes, e vê
seu desenvolvimento urbano recente acontecer de forma
desconexa e arbitrária.
62 VALE. Marília Maria Brasileiro Teixeira. In Mesa Redonda: As praças em Uberlândia – processos históricos. No dia 24 de junho de 2013, em evento na Universidade Federal de Uberlândia.
Monumento aos Retirantes de Laguna em 2013. Da esquerda para a direita: Museu, Cemitério e Monumento visto lateralmente. Fonte: Foto do Autor.
Situação atual do Museu no Monumento aos Retirantes de Laguna. Fonte: Foto do Autor.
58
DO CAIPIRA AO SERTANEJO
‚O caipira é um dos tipos do homem rural
brasileiro. Conforme a região do Brasil, o
homem rural típico tem uma designação
diferente. Há a tendência de se chamar
qualquer pessoa de cultura rústica ou qualquer
pessoa do interior de caipira, mas aí já num
sentido meio pejorativo, meio jocoso, de dizer
que a pessoa não tem hábitos civilizados. Não é
nesse sentido que o devemos usar em um
contexto como o nosso.63
‛
Antonio Candido de Mello e Souza
Etimologicamente o termo caipira provém do tupi ka’apira, que
significa ‚cortador de mato‛ e ka’apora, que significa ‚habitante do
mato‛, estes foram os nomes dados pelos índios aos
colonizadores e bandeirantes, brancos e mestiços, no sudeste e
centro do Brasil64
.
O termo é utilizado até hoje, às vezes de forma pejorativa, para se
referir às pessoas rústicas e sem instrução. Porém, caipira é a
denominação dada ao morador do campo, que tem valores
63 SOUZA. Antonio Candido de Mello (2009), “Os Caipiras”. in Intérpretes do Brasil, dirigido por Isa Grinspum Ferraz, em 2009. 64 FERREIRA, A. B. H. Novo dicionário da língua portuguesa. Segunda edição. Rio de Janeiro. Nova Fronteira. 1986.
tradicionais muito marcados e é fruto da evolução histórica do
grupo social radicado na chamada ‚paulistânia‛, área definida
pelo historiador Alfredo Ellis Júnior, e que se refere a São Paulo, e
a grande parte dos estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso,
Mato Grosso do Sul e Paraná, e no qual o Triângulo Mineiro está
inserido. A paulistânia compreende a área que de certa forma
começou a ser povoada pelos bandeirantes provenientes do litoral
de São Paulo65
.
Os bandeirantes encontraram ouro em Minas Gerais e em outros
lugares do centro do país. Com o fim do ciclo do ouro, quando já
não se encontrava mais o metal com a mesma facilidade de antes,
há uma grande diáspora, onde os bandeirantes e colonos ocupam
o restante do território mineiro e do centro do Brasil com uma vida
rural. Isso criou a cultura caipira. O bandeirante que se
sedentarizou, que se estabeleceu em um lugar, tornou-se o
caipira. Houve os que se tornaram grandes fazendeiros e
exportadores, sobretudo nas proximidades das maiores vilas e
cidades, e houve os que se estabeleceram em áreas mais isoladas
do território, no rural, com uma produção de subsistência.
Os bandeirantes inicialmente eram: portugueses, descendentes de
portugueses, caboclos (mestiços de índio com branco) e alguns
índios (escravos e aliados). Boa parte dos bandeirantes era
composta de mestiços, que chegaram a falar durante algum
65 RIBEIRO, Darcy. O Povo Brasileiro: A formação e o sentido de Brasil. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
59
tempo ‚língua geral‛, que era uma mistura das línguas portuguesa
e tupi, o que foi proibido posteriormente por Portugal. Com a vinda
dos escravos da África, há um novo intercâmbio de culturas,
havendo assimilações de influências de ambas as partes. A
cultura caipira, portanto, é uma fusão da cultura portuguesa, das
culturas indígenas locais e da cultura africana, havendo uma
indiferenciação entre a influência de cada uma dessas culturas66
.
O caipira constrói sua casa com técnicas que mesclavam o saber
português e o saber indígena, com os materiais que tinha a
disposição. Sua dieta baseava-se na pesca, na caça e em
plantações, assemelhando-se muito com a dieta indígena,
chegando eles a consumir animais silvestres como tatu e jacaré,
porém, também com muita influência portuguesa e africana, com o
cultivo e consumo de espécies trazidas pelos colonizadores. A
própria língua falada é uma mescla entre palavras indígenas,
termos africanos e a língua portuguesa, por vezes, utilizando
termos lusitanos arcaicos. Quando o caipira usa palavras como
‚pregunta‛, ‚causo‛ e ‚despois‛, ele está usando termos da língua
portuguesa culta falada na região das minas no século XVII.67
A cultura caipira enriquece-se com a cultura africana, pela
presença, entre outras coisas, das congadas, moçambiques e
batuques, que por sua vez, também tem influência portuguesa, por
66 Idem. 67 SOUZA. Antonio Candido de Mello (2009), “Os Caipiras”. in Intérpretes do Brasil, dirigido por Isa Grinspum Ferraz, em 2009.
caracterizarem-se como festas católicas. Em Monte Alegre de
Minas e em muitas cidades da região, as festas de congadas e
moçambiques persistem até a atualidade, festejando Nossa
Senhora do Rosário, e após 1888, a abolição dos escravos.
Um fator importante para a formação da cultura caipira foi o
isolamento. A área controlada pelos bandeirantes era muito
grande, o território era vasto e pouco povoado, e eles eram
nômades. O nomadismo e o isolamento são herdados pelos
caipiras e são características muito próprias do homem caipira do
século XIX68
. O fundador de Monte Alegre de Minas, José Antônio
Pereira, é um exemplo. Mineiro de Barbacena, procurou terras
devolutas para cultivar, estabelecendo-se onde é hoje Monte
Alegre. Com o aumento de sua família e com a chegada de outras
pessoas nas proximidades, parte para nova procura de terras,
povoando a área que posteriormente daria origem a Campo
Grande, no Mato Grosso do Sul. O caipira do século XIX tomava
posse de uma área despovoada, desmatava, construía seu
rancho, fazia sua plantação, permanecia durante um tempo e
partia para fazer a mesma coisa em outro local a fim de aproveitar
de uma área com recursos inexplorados e com o solo virgem. Era
uma cultura extremamente móvel.
68 Idem.
60
O caipira se sedentarizou em parte, porque antes era muito móvel,
e estava fora da economia de mercado também em termos, visto
que ele vendia seus produtos nas feiras das vilas. Ainda não havia
supermercados, havia feiras e vendas, e não tinham produtos
industrializados, e sim, manufaturados e artesanais. A sociedade
pré-industrial era autossuficiente em sua produção e consumo69
.
A industrialização muda fortemente o mundo caipira,
transformando seu modo de produção e a maneira de ser e agir. A
partir do momento em que ele fica mais subordinado ao mercado,
que ele tem que comprar bens de consumo para os quais ele não
tem dinheiro, ‚que a mulher quer uma bacia de lata, que ele quer
um despertador e que a filha quer um relógio‛, por exemplo, seu
tempo acaba. O tempo que antes era gasto com a pescaria, com a
caça, com as festas e celebrações religiosas que comemoravam
os santos populares e a colheita, agora é gasto com o aumento de
sua produção, no intuito de se ganhar mais dinheiro70
.
Alguns caipiras então se veem obrigados a mudar para a cidade
grande a procura de emprego, o que coincide com o crescimento
urbano brasileiro. Na cidade ele acaba marginalizado, trabalhando
como servente de pedreiro, porteiro, soldado; e morando na
periferia ou em favelas.
69 Idem. 70 Idem.
Congado de Monte Alegre de Minas. Fonte: Foto de Fabio Martins.
61
As pequenas cidades, como Monte Alegre, passam por fortes
mudanças. Com a construção de rodovias e a revolução das
comunicações, o território torna-se mais coeso, há a chegada de
hábitos e produtos estrangeiros e a cultura caipira é discriminada,
vista como atrasada. Acontece neste momento o que Milton Santos
define como uma ‚mudança de conteúdo‛ nas cidades pequenas.
A cidade que antes era ‚a cidade no campo‛, onde os notáveis
eram a professora, o padre, o tabelião; passa a ser a ‚cidade do
campo‛, lugar do agrônomo, do veterinário, do bancário e de
todos os envolvidos na produção agrícola que se modernizava e
industrializava.
‚(...) não seria demais lembrar que o acelerado
processo de urbanização do país, nas ultimas
décadas, tem consistido, fundamentalmente, na
transferência das populações rurais para as
cidades. E que as fronteiras entre o rural e o
urbano certamente são mais tênues, do ponto
de vista cultural, que as demarcatórias físicas
entre o campo e a cidade.71
‛
Abram Szajman
71 SZAJMAN. Abram, no Editorial da Exposição: “Caipiras, Capiaus: Pau-a-Pique”, promovida pelo Centro de Lazer SESC Fábrica da Pompéia, em 1984, na cidade de São Paulo.
Sempre houve uma relação entre a cultura caipira e a cultura
urbana. Não há uma divisão drástica entre essas duas culturas, há
um continuum e as influências são mutuas. O caipira influencia o
urbano e vice-versa. A cultura caipira original, pré-industrialização,
esta extinta, mas seu legado e sua influência persistem72
. Seu
folclore, festas religiosas, celebrações, culinária, música e danças
são preservados, sendo alguns inclusive patrimônios tombados, o
que é o caso do queijo minas e da congada. A cultura caipira
72 SOUZA. Antonio Candido de Mello (2009), “Os Caipiras”. in Intérpretes do Brasil, dirigido por Isa Grinspum Ferraz, em 2009.
Folia de Reis em Monte Alegre. Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
62
tradicional esta aos poucos saindo da marginalização e está se
tornando patrimônio, sendo encarada como folclore.
Após a industrialização o Brasil caipira se urbaniza. As migrações,
os transportes e as telecomunicações fizeram com que a cultura
caipira entrasse em contato com outras influencias e se
‚urbanizasse‛. Essa urbanização alterou o estilo de vida do
habitante da paulistânia. Os caipiras entraram na economia de
mercado e tornaram-se consumidores dos produtos
industrializados como eletrodomésticos e automóveis. Viram
também a cultura caipira adquirir influencias do urbano e do
mundo globalizado, gerando um outro tipo cultural. A cultura
caipira toma contato, através dos meios de comunicação, com
influências estrangeiras, como os cowboys estadunidenses, e
passa a assimilar outros temas. A música popular da região, por
exemplo, que antes cantava causos da roça e passagens
religiosas, passou a contar historias de amor, que eram mais
assimiláveis na cidade, e a falar mais recentemente, de mudanças
socioeconômicas e da aquisição de bens de consumo, como os
carros ‚Dodge RAM‛ e ‚Camaro Amarelo‛. As festas de reis e de
santos populares que reuniam as comunidades caipiras ainda
existem, mas são tidas como folclore, e o que se tornou a principal
festa que agrega as pessoas das comunidades do centro do país
foi a festa de exposição agropecuária.
Folia de Reis em Monte Alegre Fonte: Arquivo do Depto. de Cultura.
63
‚Caipira‛, durante um período, podia ser interpretado como um
termo pejorativo, sinônimo de atraso. Seus remanescentes
culturais originaram a cultura sertaneja contemporânea, que
caracteriza boa parte da paulistânia, do Brasil central produtor
agrícola.
Esse sertanejo contemporâneo é preferência de 58% dos ouvintes
de rádio no país, segundo o Ibope73
. A difusão da cultura
fonográfica sertaneja coincidiu com a explosão do agronegócio no
Brasil, e pode ser natural que um setor econômico tão poderoso
tenha seu correlato na indústria cultural. Há inclusive, uma
padronização no consumo cultural de algumas pequenas cidades
do centro do país, como Monte Alegre, onde o sertanejo é
consumido com unanimidade. Fazendo uma analogia com o
agronegócio, a monocultura, que estende plantações de um tipo
vegetal em campos gigantescos, é o que se tem de mais contrário
à ideia de diversidade. Talvez essa característica do agronegócio
reflita em seu correlato da indústria cultural, principalmente nas
cidades menores, onde a cultura sertaneja ás vezes é
monopolizante.
Paralelamente a isso há uma preocupação em se valorizar as
características locais, e atualmente a cultura caipira tradicional
passa por um resgate e revalorização, a fim de fortalecer a
identidade cultural de sua região de origem.
73 Estudo Tribos Musicais, Ibope Media (Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística), 2013.
Inauguração do Parque de Exposições Agropecuária, em 1978. Fonte: Arquivo pessoal de Fabio Antonio Arantes.
64
IDENTIDADE CULTURAL E CIDADANIA
‚Nosso mundo, e nossa vida, vêm sendo
moldados pelas tendências conflitantes da
globalização e da identidade. A revolução da
tecnologia da informação e a reestruturação do
capitalismo introduziram uma nova forma de
sociedade, a sociedade em rede. (...)
Entretanto, isso não é tudo. Juntamente com a
revolução tecnológica, a transformação do
capitalismo e a derrocada do estadismo,
vivenciamos no ultimo quarto de século o
avanço de expressões poderosas de identidade
coletiva que desafiam a globalização e o
cosmopolitismo em função da singularidade
cultural e do controle das pessoas sobre suas
próprias vidas e ambientes. Essas expressões
encerram acepções múltiplas, são altamente
diversificadas e seguem os contornos
pertinentes a cada cultura, bem como às fontes
históricas da formação de cada identidade.74
‛
Manuel Castells
Após a globalização, com os avanços dos meios de comunicação
e dos transportes, as culturas de todo o mundo foram expostas a
uma gama maior de influências e a sociedade global passou a
74 CASTELLS, Manuel. Vol. II: O poder da identidade. São Paulo: Paz e terra, 1999.
organizar-se em rede. Ao mesmo tempo em que o mundo se
globaliza e se torna mais cosmopolita, surgem movimentos que
reforçam as identidades locais, e que asseguram a permanência
de singularidades culturais, a fim de que tradições não se percam.
Isso acontece como uma reafirmação de identidade cultural, com
o intuito de se garantir o sentimento de pertencimento e a
cidadania.
Quanto mais a tradição perde espaço e quanto mais a vida
cotidiana reconstitui-se ‚em termos da interação dialética entre o
local e o global‛, mais os indivíduos são forçados a escolher e
negociar opções de estilos de vida em meio a tantas
possibilidades. Isso pode gerar a construção de uma identidade,
capaz de redefinir a posição do indivíduo na sociedade75
.
A atual revalorização da cultura caipira é um projeto de recriação
de uma identidade. A valorização da história local, de seus bens
culturais materiais e imateriais é peça chave na busca de uma
redefinição da posição de uma comunidade na sociedade, que
pretende reforçar seu sentimento de cidadania.
Em Monte Alegre de Minas, assim como em toda a região, a
cultura caipira está sendo encarada como patrimônio. Algumas de
suas manifestações e bens estão sendo tombados e há uma
preocupação em conservar as tradições, como a produção de
75 Idem.
65
queijo minas e de cachaça, que são tidas como patrimônio
mineiro.
As festas e celebrações tradicionais locais também são
valorizadas, documentadas e tombadas, para que não se percam.
A Festa em louvor a Nossa Senhora do Rosário e São Benedito,
marcada pela presença dos grupos de congado e moçambique,
faz parte do grupo de bens tombados em Monte Alegre. Outras
festas importantes registradas são a Folia de Reis e as festas
religiosas que acontecem nas capelas rurais do município, como
as procissões para capelas dedicadas a Nossa Senhora
Aparecida e a Nossa Senhora da Abadia.
Episódios históricos marcantes, como a morte dos soldados
retirantes de Laguna no município de Monte Alegre, quando
voltavam da Guerra do Paraguai, também são valorizados, visto
que este episódio específico ajuda a contar a história da cidade. O
fato histórico é relembrado com um monumento no lugar dos
túmulos dos soldados e onde recentemente foi construído um
museu. Essa rememoração e revalorização dos fatos históricos às
vezes esbarra na questão de ‚o que preservar‛ e ‚como
preservar‛, além de entrar também em discussão a maneira como
a história será contada. O museu construído recentemente no
Monumento aos Retirantes de Laguna permanece fechado e está
abandonado, ou seja, a vontade de se valorizar o local prevaleceu
sem que se fosse pensado a maneira como o bem seria
preservado e como a história seria contada.
Congado de Monte Alegre de Minas. Fonte: Foto do Autor.
66
No espaço urbano, as construções e espaços também são
valorizados, havendo o tombamento de construções significativas,
tanto histórico, quanto artisticamente, com o intuito de se preservar
a memória local. Porém, essa valorização do que se preservar é
relativa, e pode ocorrer de os responsáveis pela avaliação de bens
culturais a serem protegidos divergirem suas opiniões entre si e
com a comunidade. Tal fato é ilustrado, em Monte Alegre, com o
caso da destruição da praça moderna no entorno da Igreja Matriz
para a construção de outra nova, a qual foi tombada como
patrimônio municipal, fato este, já citado neste trabalho.
A história do Brasil, e mais especificamente das regiões mais
centrais de seu território, é recente. A ocupação de Monte Alegre,
que data do início do século XIX, é recente historicamente, assim
como a história de toda a região. A modernidade acelerou o
processo de transformação na cidade e ainda há remanescentes
da ideia de que o novo é sempre melhor. Juntamente a isso,
somam-se as mudanças de desejo político e a vontade de marcar
gestões administrativas, fatos corriqueiros em nosso sistema
político.
A comunidade local vê com bons olhos a preservação dos bens
culturais que a dão identidade, e inclusive, almejam essa
preservação. A valorização da identidade cultural é um fenômeno
que está em voga em todo o mundo e está fortemente ligada à
construção de cidadania, devendo ser encarada como um projeto
contínuo.
Capela de N.S. da Abadia, na zona rural de Monte Alegre de Minas. Fonte: Acervo do Depto. de Cultura.
Procissão de N.S. da Abadia, na zona rural de Monte Alegre. Fonte: Acervo do Depto. de Cultura.
68
QUALIDADE DE VIDA
Acesso a serviços como educação, saúde e lazer, aliados à
garantia de emprego, são indicadores de qualidade de vida. O
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD)
divulgou em julho de 2013 o índice que mede o desenvolvimento
humano nos municípios brasileiros, o IDHM76
.
O estudo mostra que de 1991 até hoje, uma parcela significativa
dos municípios brasileiros que apresentavam situação de muito
baixo desenvolvimento humano, melhoraram seus índices, porém,
o desenvolvimento humano ainda não é homogêneo em todo o
país. Atualmente 74% dos municípios brasileiros (4.122 deles) se
encontram nas faixas de médio e alto desenvolvimento humano,
enquanto cerca de 25% deles (1.431 municípios) estão nas faixas
de baixo e muito baixo desenvolvimento humano, sendo que ainda
há uma diferenciação entre o desenvolvimento da região centro sul
do país, que é mais desenvolvida, e a região norte e nordeste, que
apresentam piores índices de IDHM. Apenas 0,8% dos municípios
brasileiros (44 deles) possuem Muito Alto Desenvolvimento
Humano, dentre os quais o Distrito Federal faz parte e o restante
esta distribuído no centro-sul do Brasil.
76 Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. In Série Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 2013. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
O Triângulo Mineiro apresenta a maioria de seus municípios com
alto índice de desenvolvimento humano, porém ainda há algumas
cidades com o IDHM mediano, o que é o caso de Monte Alegre de
Minas77
, onde todos os fatores que avaliam o índice de
desenvolvimento humano municipal, que são educação,
longevidade e renda, apresentaram pontuações medianas.
Comparando as pontuações obtidas por Monte Alegre com as de
municípios da região que apresentaram alto índice de
desenvolvimento humano, nota-se que a diferenciação se dá pela
educação. A longevidade e a renda no triângulo mineiro são
homogêneas entre os municípios, porém as taxas de escolaridade
e de percentual da população em idade escolar frequentando as
aulas são baixas em Monte Alegre de Minas e em outros
municípios da região que também apresentaram IDHM medianos.
77 O IDHM, que varia de 0 a 1, é de 0,674 em Monte Alegre de Minas.
Antiga escola agrícola, no Bexiguentos, hoje desativada.. Fonte: Foto do Autor.
69
Entre os dados relativos à educação em Monte Alegre, os fatos
que mais preocupam são os de que apenas 36,13% da população
maior de 18 anos possui ensino fundamental completo, o que
indica baixa escolaridade da população adulta; e somente 33,62%
da população de 18 a 20 anos possui ensino médio completo,
caracterizando jovens mal preparados para o mercado de
trabalho.
Monte Alegre possui onze escolas urbanas, públicas e
particulares, que atendem atualmente a 3.366 alunos da pré-
escola ao ensino médio. Há também quatro escolas rurais,
distribuídas em quatro pontos do município, onde estão
matriculados 393 alunos, as quais três são de ensino fundamental
e uma disponibiliza também o ensino médio78
. Das quinze escolas
do município, apenas duas, localizadas na área urbana,
disponibilizam atividades de tempo integral, como cursos de arte,
música e esportes após o término das aulas. Há um grande índice
de evasão escolar, o que explica o baixo número de jovens que
completam o ensino médio antes dos 20 anos. É disponibilizado
por uma das escolas públicas da cidade, o programa chamado
Educação de Jovens e Adultos, que atende atualmente a 147
alunos79
que querem terminar seus estudos, o ensino fundamental
e médio, em um tempo menor que o sistema regular. Também são
78 Dados fornecidos pela Secretaria de Educação de Monte Alegre de Minas, em 2013. 79 Idem.
Escola Rural no povoado de Garcias. Fonte: Foto do Autor
70
oferecidos pelo Departamento de Cultura, cursos de dança, arte,
teatro, música e capoeira para os que se interessarem, e há
apresentações e mostras culturais esporadicamente80
.
Desse modo, constata-se que apesar de haver vagas nas escolas
e o acesso à cultura estar melhorando, a evasão escolar ainda é
grande, talvez, pela maneira como essas vagas estão distribuídas
no município e como as escolas se apresentam à comunidade,
visto que apenas uma das escolas no município é de tempo
integral e as escolas rurais, em sua maioria, são apenas de ensino
fundamental e de meio período. Outro fator que pode contribuir
com a evasão escolar é a renda da população, tendo em vista que
a renda per capita em Monte Alegre é de 619 reais81
, pouco
menos que um salário mínimo, e que os jovens às vezes precisem
trabalhar para contribuir com a renda familiar.
80 Dados fornecidos pelo Departamento de Cultura de Monte Alegre de Minas, em 2013. 81 Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. In Série Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 2013. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
Cinema na Praça, em 2013. Evento em parceria entre o Departamento de Cultura e a TV Integração. Fonte: Foto do Autor
71
O Bexiguento, área do Monumento aos Retirantes de Laguna, sendo usado de forma recreativa pela população
Fonte: Foto do Autor
74
Tomando por base a análise territorial, econômica e sociocultural
de Monte Alegre de Minas, propõem-se para este trabalho,
diretrizes e propostas de intervenção que melhorem a qualidade
de vida da população, possibilitando maior acesso a educação e
cultura; espaços públicos de qualidade; espaço rural integrado e
com bons equipamentos; mobilidade facilitada no município; bem
como, uma cidade coesa e densa.
Essa resposta projetual e de planejamento que será mostrada a
seguir vem a calhar com o resultado da pesquisa sobre Monte
Alegre, que percebeu um município com poucos espaços públicos
de qualidade, com uma mobilidade municipal pouco facilitada, e,
sobretudo, com um Índice de Desenvolvimento Humano Municipal
mediano, devido aos baixos índices educacionais apresentados
pela população82
.
Como abordado anteriormente e seguindo a afirmação de que ‚a
cidade é um território que organiza territórios83
‛ as intervenções e
diretrizes buscarão prover a cidade de Monte Alegre de espaços
qualificados e equipamentos que atendam toda a população
municipal, urbana e rural. De encontro a isso, também serão
propostos equipamentos locais na zona rural atrelados ao
82 De acordo com: Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. In Série Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 2013. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. 83 MEYER. Regina apud RONCAYOLO. Marcel. O Urbanismo: entre a cidade e o território. in Cienc. Cult. Vol. 58 n°1: São Paulo Já./Mar. 2006.
transporte municipal, para que a população possa estar mais bem
assistida em relação à educação, cultura e lazer.
‚Desenho urbano e desenho de edifícios não
são mais que dois momentos de uma mesma
disciplina: a arquitetura, intervindo em diferentes
momentos e com distintos processos (plano e
projeto), mas com um único instrumento
fundamental: o desenho. E será especificado
por um especialista – o arquiteto – que pode
intervir a diferentes níveis e dimensões
espaciais, mas com um objetivo comum: o
domínio da forma do território e da cidade como
estruturas físicas. Porque é nessas estruturas
físicas que vivem os cidadãos e é a estrutura
física o que resta das cidades na sua evolução
e transformação no tempo.84
‛
José Ressano Garcia Lamas
84 LAMAS. José M. Ressano Garcia. Morfologia Urbana e Desenho da Cidade. Fundação Calouste Gulbenkian – Fundação para a Ciência e a Tecnologia – Ministério da Ciência e do Ensino Superior de Portugal. Lisboa, 2004.
78
DIRETRIZES PARA A CIDADE
As diretrizes para a cidade de Monte Alegre visam o controle de
crescimento de sua área urbana, a proteção de seu patrimônio e a
criação de espaços públicos e equipamentos de educação e
cultura de qualidade.
São elas:
Definição do perímetro urbano, a fim de evitar a
especulação imobiliária na cidade e a criação de
loteamentos desconexos, com o intuito de que a cidade
cresça de forma coesa e densa, evitando inclusive, gastos
desnecessários de dinheiro público com o custeio de áreas
vazias;
Ampliação da proteção ao núcleo histórico da cidade85
,
definindo-o como área onde os edifícios devem obedecer
ao gabarito de até dois pavimentos;
Arborização das margens dos córregos Monte Alegre e
Maria Elias, definindo-os como espaços públicos de
qualidade para a prática de atividades físicas ao ar livre,
pois já são utilizados para estes fins;
Remoção completa do despejo de esgoto nos córregos
Monte Alegre e Maria Elias86
.
85 O núcleo histórico de Monte Alegre já é protegido, porém, a restrição construtiva na área ainda não é clara.
Permitir meios seguros de travessia da rodovia que corta a
cidade, e arborização da área a fim de amenizar os efeitos
da poluição sonora e do ar para a população que vive às
suas margens;
Preservação de edifícios e lugares históricos, utilizando-os
para fins culturais compatíveis com as edificações,
evitando descaracterizações desnecessárias.
86 Tem-se o projeto da construção da Estação de Tratamento de Esgoto, porém, esta obra ainda não foi concluída.
80
CÓRREGOS MONTE ALEGRE E MARIA ELIAS
Os dois córregos urbanos, que têm papel histórico na formação da
cidade ainda recebem boa parte do esgoto doméstico de Monte
Alegre.
O Córrego Monte Alegre foi canalizado no final da década de 1970
e possui vias marginais desde a década de 1940. O Córrego Maria
Elias está sendo urbanizado recentemente, com vias marginais,
pois antes ele se encontrava no fundo de lotes. Ambos os
córregos servem hoje como espaço para a prática de atividades
físicas, como caminhada, corrida e ciclismo, mesmo tendo vias
marginais mal arborizadas, e com a poluição das águas que gera
mau cheiro em tempos de chuva.
Os estudos e diretrizes para as margens dos córregos visam
melhorar a ambiência urbana da área e adequá-la para a prática
de exercícios ao ar livre, que já acontecem no local. Bem como, a
retirada total do despejo de esgoto nos córregos.
O estudo de intervenção para o Córrego Monte Alegre cria
plataformas que avançam para o interior do córrego, criando
nichos com bancos, onde também se podem praticar exercícios.
As calçadas são requalificadas com piso drenante e algumas
vagas de estacionamento são substituídas por canteiros para a
arborização da via.
As espécies que se pretende utilizar na arborização da área são
espécies nativas do cerrado, como o pequizeiro, o ipê e a
quaresmeira. Também será usado o buriti, que é comum em
fundos de vale.
82
O Córrego Maria Elias estava, até a pouco tempo, no fundo de
lotes. Atualmente a área está em obras, com a construção de vias
marginais ao veio d’água. Por ter acabadas apenas as faixas de
rolamento de automóveis e considerando que Monte Alegre ainda
não tem restrições urbanísticas para a área, a intervenção no
Córrego Maria Elias também entra no âmbito de diretrizes legais.
As propostas para a área são:
Afastamento frontal dos lotes lindeiros à via de cinco
metros, com arborização;
Praças e largos no afunilamento das quadras;
Mantenimento da vegetação existente nos lotes e reposição
das mesmas, caso haja cortes, visto que se trata de um
fundo de vale;
Preferência da prefeitura na aquisição dos lotes que fazem
fundos com construções históricas, a fim de se propor
equipamentos públicos que tenham saída para dois lados
da quadra.
84
RODOVIA
As diretrizes para a área da Rodovia têm o intuito de amenizar seu
efeito de barreira na área urbana, criando passagens que
interliguem os dois lados da cidade.
Hoje há apenas uma passagem entre os dois lados da rodovia,
que acontece em um túnel para veículos, sendo que, no restante
da extensão em que a BR-365 corta a área urbana, os pedestres e
ciclistas a atravessam em nível, tendo risco de atropelamento.
A diretriz para esta área é, portanto, a locação de passarelas que
possibilitem a travessia segura para pedestres e ciclistas. Bem
como, a arborização das bordas da rodovia, com o intuito de
amenizar a poluição sonora e do ar para os moradores de suas
bordas.
A BR-365 está passando por obras de duplicação no trecho que
passa pela cidade de Monte Alegre. Há a intenção de se instalar
passarelas para pedestres ao término dessas obras, porém, ainda
não há projeto de locação dessas passarelas, segundo a
Prefeitura Municipal, e as obras de duplicação encontram-se
atrasadas.
86
LARGO DA PRAÇA
Na evolução urbana de Monte Alegre, o antigo Largo Rui Barbosa
deu origem à atual Praça Luis Dutra Alvim. A delimitação desta
praça deixou um espaço amplo em frente a prédios históricos
como a Escola Tancredo Martins, o prédio do antigo Fórum e o
antigo Hotel do Commercio, este espaço é usado como
estacionamento e há uma via de mão única com duas faixas.
Não havendo a necessidade de a via ser tão larga neste local e
tendo em vista os edifícios históricos de seu entorno, propõe-se
para a área um calçamento amplo, como um espaço público
contiguo à praça. Solução esta, similar à adotada pelo arquiteto
Ricardo Pereira na Praça Rui Barbosa, em Uberlândia. Tal solução
visa qualificar o espaço público do local, bem como, valorizar as
construções históricas da área.
Acima: situação atual da área; Abaixo: proposta de criação de calçamento. Praça Rui Barbosa, em Uberlândia.
Fonte: Foto de Ricardo Pereira.
88
Juntamente com a requalificação do espaço, propõe-se a valorização dos edifícios de seu entorno. De acordo com documentação fotográfica, é possível recuperar os vãos originais do prédio do antigo Fórum, onde está prevista a instalação da Oficina Cultural. Essa medida recuperaria o valor artístico original do edifício. O prédio do Hotel do Commercio, que é um edifício comercial, passaria por uma restauração e adequação de programação visual dos estabelecimentos ali sediados, a fim de recuperar a noção de unidade do edifício.
89
O tráfego de veículos não é alterado com o alargamento das
calçadas e os sentidos das ruas permanecem iguais, apenas são
retiradas algumas vagas de estacionamento e uma das faixas de
rodagem, aumentando a área para os pedestres e diminuindo a
área para veículos.
O calçamento do largo é feito com blocos intertravados de
concreto, que é o material utilizado no piso da praça à qual ele fica
em frente, dando a idéia de conjunto e de continuidade do
espaço. É utilizado também no calçamento, faixas de mosaico
português com um padrão de desenho similar ao que havia na
praça em frente à Igreja Matriz, e que foi destruído em 2007.
Antigo calçamento da Praça Nicanor Parreira, em frente à Igreja Matriz. Fonte: Acervo do Depto. de Cultura.
Planta do Largo.
IGREJA MATRIZ
“ANTIGO FÓRUM”
ESCOLA TANCREDO MARTINS
“HOTEL DO COMMERCIO”
92
MIRANTE DA SERRINHA
Na região da Serrinha, área importante para o município, pois foi a
que deu origem ao nome Monte Alegre, há uma capela onde
acontecem festas religiosas populares, e há alguns bancos, sendo
a área um mirante que avista a cidade e o cerrado que a circunda.
A intervenção neste espaço é a simples demarcação de um platô,
através de arrimos de pedra, onde se possa observar a paisagem
com maior comodidade, em uma área plana que acompanha uma
cota mais alta do terreno. O platô encaixa-se no desnível do
terreno através dos arrimos que se elevam.
As preexistências do lugar, como as cruzes de missões, os santos
e inclusive os bancos que ali já existiam, são deixados como
estão, pois fazem parte da memória do lugar.
Planta do Mirante.
CAPELA DO DIVINO PAI
ETERNO
ESTRADA DA SERRINHA
94
DIRETRIZES PARA O MUNICÍPIO
As diretrizes para o município de Monte Alegre são com o intuito
de integrar o território; promover ainda mais a inclusão da
população rural a serviços de educação, saúde, cultura e
cidadania; e valorizar o patrimônio cultural rural.
São elas:
Transporte municipal rural claro e institucionalizado, com
equipamentos e pontos de espera de qualidade;
Escolas rurais como equipamentos comunitários, que
estejam abertas à comunidade com serviços culturais, de
esporte e de saúde, para além da educação;
Acesso ao Monumento aos Retirantes de Laguna por meio
das margens do córrego Monte Alegre87
; requalificação do
monumento e da escola primária agrícola que funcionou no
local e que está desativada;
Maior proteção ao patrimônio rural, como capelas e
casarões de interesse histórico, artístico e cultural, bem
como de sua paisagem cultural circundante.
87 O acesso ao Monumento é feito somente pela rodovia BR-365. Não há uma estrada ou via local que ligue a cidade ao monumento, o que dificulta seu acesso e o torna perigoso para ciclistas e pedestres. O monumento dista 4Km da cidade e é acessado por ciclistas frequentemente.
Na página ao lado: exemplos do patrimônio rural de Monte Alegre. Das capelas e casarões mostrados, apenas a Capela de Nossa Senhora da Abadia tem proteção, com tombamento. Alguns desses bens estão sofrendo descaracterizações recentes, como a Capela de Nossa Senhora Aparecida com a implantação da cobertura metálica lateral.
95
Casarão sede de fazenda. Fonte: Foto do Autor.
Capela rural de Nossa Senhora da Abadia. Fonte: Arquivo do Deptp. de Cultura
Capela rural de Nossa Senhora Aparecida. Fonte: Foto do Autor.
Casarão sede de fazenda. Fonte: Foto de Roselaine Silva.
96
BEXIGUENTO
O Monumento aos Retirantes de Laguna já passou por várias fases
desde a década de 1960, quando foi inaugurado. Antes de 1967
havia no local apenas a marcação das sepulturas dos soldados ali
enterrados, feita com estacas de aroeira, juntamente com um
cruzeiro, também de madeira. Era o chamado Cemitério dos
Bexiguentos.
Com a inauguração do monumento, mantiveram-se as estacas de
aroeira originais e construiu-se em volta um cercado de alvenaria
com dois obeliscos pequenos e três planos de concreto, com uma
cruz, mapas e placas em homenagem aos soldados. Da
construção do monumento até hoje, o lugar já foi encarado como
área de lazer, quando foi construída a represa; como lugar de
homenagens militares; e já ficou abandonado durante alguns anos.
Recentemente foi construído na área, próximo ao Monumento, um
Museu, que reaproveitou as paredes da antiga casa dos zeladores
do lugar. O Museu encontra-se abandonado por causas técnicas,
não sendo possível fazer exposição por conta da incidência do sol
em seu interior, fato já descrito neste trabalho. Outra alteração
freqüente no Monumento é em relação às suas cores, pois toda
administração municipal muda as cores do lugar de acordo com
as cores do mandato.
A maioria dessas alterações buscou, de certa forma, valorizar o
local, visto sua importância histórica para o município e relação
com a história nacional. Porém, em todas as intervenções no local,
não foi levado em conta o valor histórico do lugar enquanto
paisagem onde o fato histórico ocorreu. Os acréscimos e
alterações no lugar só vêm a alterar a paisagem, com intervenções
pesadas e, às vezes, sem funcionalidade.
Tendo em vista o valor do bem enquanto lugar que sediou um fato
histórico, a paisagem circundante deve ser respeitada. O Museu,
tal qual esta definido hoje, deve ser removido, e o monumento
deve ser pintado de branco, como era originalmente, em sua
inauguração.
Há a necessidade de um acesso ao Monumento por uma via local,
visto que o acesso hoje só é realizado pela rodovia, o que é
perigoso para ciclistas.
A escola primária em tempo integral, que atendia jovens da cidade
ensinando-os a plantar e a fazer atividades agrícolas, e que hoje
esta abandonada, deve ser reativada.
97
O acesso ao Monumento é feito somente pela rodovia BR-365. Não há uma estrada ou
via local que ligue a cidade ao monumento, o que dificulta seu acesso e o torna
perigoso para ciclistas e pedestres. O monumento dista 4Km da cidade e é acessado
por ciclistas frequentemente. A nova estrada margearia o Córrego Monte Alegre,
respeitando o afastamento da mata ciliar e chegaria ao monumento pelo traçado da
antiga pista de pouso de aviões de pequeno porte, hoje desativada.
98
O Museu, tal qual está inserido no local hoje, é pesado para o
lugar, descaracterizando a paisagem que serviu de palco para
o fato histórico e deixando em segundo plano o próprio
monumento e cemitério. O Museu foi construído reaproveitando
as paredes da antiga casa dos zeladores e é inapto,
tecnicamente, para exposições, devido à incidência de luz
solar em seu interior.
Um bom exemplo de construção que respeita a paisagem
circundante é o Museu da Luz, no vilarejo de Luz, em Portugal,
dos arquitetos Pedro Pacheco e Marie Clément. O Museu da
Luz foi construído semienterrado para não interferir
bruscamente na paisagem, respeitando seu entorno. Ele está
ao lado de uma igreja do século XV e de um cemitério, não
competindo visualmente com nenhum dos dois.
Museu da Luz, Portugal. Fonte: www.museudaluz.org.pt
Situação atual do Monumento aos Retirantes de Laguna, com Museu à direita da foto. Fonte: Foto do Autor.
99
Durante a década de 1990, funcionou no Bexiguento uma escola
primária de tempo integral que ensinava técnicas de cultivo às
crianças da cidade. Essa escola foi desativada e atualmente esta
abandonada e servindo em parte como casa para os zeladores do
local.
A escola pode ser reativada, tendo em vista o serviço social que
desempenhava e pode ter como exemplo projetos de escolas
chinesas desenvolvidas pelo grupo Rural Urban Framework88
, que
também trabalham ensinando técnicas de cultivo.
88 O Rural Urban Framework é um grupo de pesquisa e design que aborda a transformação rural-urbano da China através de projetos de edifícios, pesquisa, exibições e publicações. Eles trabalham como um grupo sem fins lucrativos em colaboração com o governo chinês e universidades. O trabalho é conduzido com a Faculdade de Arquitetura da Universidade de Hong Kong.
Antiga escola agrícola primária de Monte Alegre, hoje desativada. Fonte: Foto do Autor.
Escola antiga de Qinmo, China. Fonte: www.rufwork.org
Escola Primária de Mulan, China. Fonte: www.rufwork.org
100
ESCOLAS RURAIS
Monte Alegre possui quatro escolas rurais que atendem, em
conjunto, 393 alunos89
. Todas as escolas são de ensino
fundamental, com exceção de uma, localizada no distrito de
Garcias, que também possui ensino médio.
Visto os baixos índices em educação obtidos pelo município de
Monte Alegre na avaliação do IDHM 201390
, já citado neste
trabalho, e os altos índices de evasão escolar, uma alternativa
seria abrir as atuais escolas à comunidade, tornando-as escolas
que também funcionem como equipamentos comunitários de
cultura, esporte e saúde.
Exemplos a serem seguidos são os Complexos Escolares de
Óbidos, em Portugal, e escolas chinesas projetadas pelo grupo
Rural Urban Framework.
As escolas de Óbidos distribuem-se em três complexos, que
atendem à população das vilas, aldeias e pequenas propriedades
rurais que formam o município português. Essas escolas estão
distribuídas pelo território de Óbidos e foram desenvolvidas com a
89 Dado fornecido pela Secretaria de Educação de Monte Alegre de Minas, de acordo com as matrículas do ano letivo de 2013. 90 Índice de Desenvolvimento Humano Municipal. In Série Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil. 2013. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. O IDHM, que varia de 0 a 1, é de 0,674 em Monte Alegre de Minas.
aplicação de conceitos pedagógicos ao espaço, criando novas
centralidades no município. Elas ‚abrem-se e chamam a
participação da comunidade, afirmando-se como fóruns onde
cultura, lazer, desporto e saúde dão uma nova dimensão à noção
de espaço educativo‛91
. Fazem parte do programa dessas
escolas, espaços educativos, culturais e inclusive salas de
atendimento médico que podem ser utilizados pelos habitantes da
região.
As escolas chinesas do grupo Rural Urban Framework
reaproveitam partes das escolas pré-existentes e formam escolas
que também são espaços comunitários e de convívio da
comunidade rural local. Seus trabalhos também visam o ensino de
técnicas agrícolas na escola, que aprimore o trabalho dos
agricultores, para que eles dependam menos do dinheiro
mandado por parentes que trabalham nas fábricas das cidades.
Tanto no exemplo chinês quanto no exemplo português, as
escolas rurais funcionam como centros comunitários cujo uso
extrapola a educação escolar. A aplicação desses conceitos nas
escolas rurais de Monte Alegre melhoraria a educação no
município e permitiria acesso mais facilitado a serviços de cultura,
lazer e saúde à população rural, diminuindo também a evasão
escolar.
91 Texto de Claudio Sat, autor do projeto das escolas, publicado em www.mdc.arq.br
101
Escola Rural José Cabral, em Monte Alegre. Fonte: Foto do Autor
Escola Rural Fernando Vilela, em Monte Alegre. Fonte: Foto de João Edson Arantes
Complexo Escolar do Furadouro, em Óbidos, Portugal Fonte: Câmara Municipal de Óbidos
Escola Nova de Qinmo, China. Fonte: www.rufwork.org
103
O município de Monte Alegre de Minas conta com 14 escolas,
sendo que, dez delas situam-se na cidade e outras quatro
estão espalhadas pelo município.
Das quatro escolas rurais, cada uma delas atende uma parcela
do município, tendo sua área de influência em um dos extremos
do território municipal. A cidade, localizada na parte central,
atende mais facilmente a população rural que vive em sua
proximidade, em um curto raio de distancia, após isso é mais
fácil o aluno se deslocar até uma das escolas rurais. Essas
escolas rurais não atendem apenas pessoas do município de
Monte Alegre, alguns alunos são moradores da zona rural dos
municípios vizinhos.
Alunos do 1° Ano da Escola Rural Fernando Vilela. Fonte: Foto do Autor
104
ESCOLA JOSÉ CABRAL
Fica localizada no povoado de Garcias e é a que tem o maior
número de alunos dentre as escolas rurais, possuindo turmas do
1° ano do ensino fundamental, até o 3° ano do ensino médio.
Boa parte dos alunos desta escola mora no povoado ou em
fazendas da região, das quais os pais são produtores rurais e
proprietários da terra. Por conta disso, a rotatividade de alunos é
menor em comparação com outras escolas rurais, havendo menos
transferência de alunos devido à mudança de emprego dos pais, o
que é frequente nas outras escolas. É também a escola que mais
possui ex-alunos ingressantes em cursos de ensino superior.
Por estar no extremo norte do município, os alunos e a população
do entorno podem ter mais relação com as cidades de Canápolis,
Centralina, Tupaciguara e Itumbiara do que com a cidade de
Monte Alegre, por questões de proximidade e acessibilidade.
Há uma horta que fornece alimentos para a merenda escolar,
porém os alunos não participam de seu cultivo. A refeição é
servida no horário do recreio e o turno de aulas é das 09h às
13:30h.
A maior parte dos professores mora na cidade de Monte Alegre e
se deslocam para o povoado através de uma van. Os alunos da
área rural próxima também se deslocam para a escola através de
vans. O horário das aulas é compatível com o horário do transporte
para que os alunos não tenham que acordar tão cedo.
A escola passou por reforma e ampliação recente. Houve a
cobertura da quadra de esportes, o aumento do número de salas e
a construção de um posto de saúde contiguo à escola. Pode-se
afirmar que esta é uma das escolas em melhores condições dentre
as escolas rurais de Monte Alegre.
106
ESCOLA FERNANDO VILELA
Escola próxima aos municípios de Uberlândia e Tupaciguara,
situada às margens da rodovia BR-365. Atende a parte leste do
município de Monte Alegre e a proximidade rural dos municípios
vizinhos.
Há uma alta taxa de transferência e rotatividade de alunos. Parte
significativa dos pais dos estudantes trabalha em fazendas da
região como empregados, e a mudança de emprego significa a
mudança de escola dos filhos, já que alguns deles vivem nas
fazendas onde trabalham. A inconstância desses trabalhos é
grande devido à sazonalidade das colheitas e ao curto espaço de
tempo de contrato nessas fazendas e empresas.
Alguns estudantes são filhos de migrantes de outros estados,
principalmente vindos do nordeste do país, e há alguns outros
cujos pais são proprietários da fazenda onde moram. Por morarem
próximo à cidade de Uberlândia, muitos deles consomem
produtos e cultura que os estudantes de outras escolas rurais não
têm acesso com tanta facilidade. Essa diversidade na origem das
famílias dos alunos e a proximidade que a região tem com um
centro urbano de grande porte diferenciam esta escola rural das
demais do município.
O turno de aulas é das 11h às 15:20h para que os alunos não
tenham que acordar de madrugada para pegar o transporte, pois
alguns alunos chegam a ficar de duas a três horas dentro das
vans no trajeto casa-escola.
Assim que os alunos chegam à escola acontece o almoço. Depois
disso há dois períodos de aula separados por um intervalo de
recreio. Essa escola também possui horta, porém, os alunos não
participam de seu cultivo.
O espaço físico foi reformado e ampliado recentemente. A quadra
de esportes é coberta e a biblioteca ganhou um espaço para
vídeo.
A escola atual está melhor que antes da reforma, mesmo havendo
alguns problemas de ventilação e iluminação no espaço.
108
ESCOLA EDUARDO MARQUÊS
É a menor entre as quatro escolas rurais do município em relação
ao número de alunos. Foram 55 alunos no ano letivo de 2013,
divididos do 1° ao 5° ano. É também a escola que esta localizada
na parte mais rural, na área sul do município de Monte Alegre.
O turno das aulas é das 10h às 14:30h. Há o horário do almoço
dividido por turma, o intervalo do recreio no meio do turno escolar
e um lanche ao término das aulas. O lanche no final do turno
escolar acontece devido a alguns alunos demorarem a chegar em
casa, cerca de duas a três horas de transporte.
Uma parcela dos alunos são filhos de pequenos produtores rurais,
e boa parte deles são filhos de funcionários de fazendas e de
granjas. Há algumas transferências de alunos, mas não significa
uma alta rotatividade de estudantes, devido, supostamente, à
maior estabilidade de emprego nos tipos de trabalho rural desta
região do município.
Há uma horta cultivada por uma das professoras e por algumas
funcionárias da escola, onde há uma pequena participação dos
alunos.
A escola será reformada no início deste ano de 2014. A quadra
será coberta e as salas de aula receberão forro e mudança de
piso. Esta reforma melhorará o conforto térmico e acústico da
escola, mas não mudará significativamente sua tipologia.
110
ESCOLA NICANOR PARREIRA
Situada às margens da rodovia BR-153, é a segunda maior escola
rural do município, com 110 alunos no ano letivo de 2013, em
turmas do 1° ao 9° ano. Fica próxima ao encontro das rodovias
BR-153 e BR-365, local conhecido como Trevão. A escola atende
as pessoas que moram ali e reúne alunos da área rural próxima,
dos municípios de Monte Alegre, Canápolis, Ituiutaba e Prata.
Os alunos são provenientes de famílias de pequenos produtores
rurais do entorno, sendo alguns filhos de empregados de fazendas
da região, e outros filhos de moradores da área do Trevão, que
são os funcionários do posto de gasolina, restaurante e comércio
ou pessoas desempregadas que moram na localidade.
Por ter acesso facilitado pelas rodovias, o transporte é mais ágil e
as aulas começam às 7h, estendendo-se até as 11:30h. A
merenda escolar é servida na hora do recreio e a escola não
possui horta.
A falta de lazer e/ou ocupação no local favorece a precocidade
dos jovens dali em relação ao sexo e ao uso de drogas ilícitas.
Estes fatores, aliados ao alto movimento gerado pelo trafego nas
duas rodovias e ao baixo nível econômico da população, visto que
alguns deles são desempregados, também favorece o
aparecimento de casos de prostituição e de aliciamento de
menores no local.
Com a duplicação da BR-365 e da BR-153, a rotatória que hoje há
no encontro dessas duas rodovias será substituída por um viaduto,
e a área onde a escola está situada será desapropriada para a
construção da duplicação e das alças de acesso ao pontilhão. A
escola e algumas das casas serão removidas. As casas, que são
de propriedade do posto, ainda não têm plano de realocação e a
escola será realocada para outro terreno nas proximidades, que
ainda está incerto quanto à localização.
Visto a realidade complexa dos moradores deste local e o caso de
realocação da escola, escolheu-se trabalhar com este lugar para a
proposição de uma escola rural, que também exerça um papel
comunitário de equipamento sociocultural para a população do
entorno.
As outras escolas rurais do município passaram ou estão
passando por reformas recentes que mantêm a mesma tipologia
pré-existente. Dessa forma, a escola do Trevo foi escolhida como
área de intervenção por possibilitar o exercício do projeto a partir
do zero, podendo-se criar um modelo de escola que poderá ser
seguido pelas demais.
112
PLANTA ESQUEMÁTICA DA ATUAL
ESCOLA NICANOR PARREIRA [s/ escala]
1 – Entrada
2 – Sala de Aula
3 – Diretoria
4 – Biblioteca
5 – Sala dos Professores
6 – Supervisão
7 – Banheiro dos Alunos
8 – Varanda e Refeitório
9 – Cozinha
10 – Despensa e Serviço
11 – Barzinho
12 - Quadra
Foto tirada em frente à Escola, onde se vê as casas vizinhas com o Posto e Rodovias ao fundo. Fonte: Foto do Autor
N
Casas vizinhas à Escola Fonte: Foto do Autor
115
Com a duplicação das rodovias e a passagem da BR-153 em um
viaduto sobre a BR-365, a Escola será removida para outro lugar,
que ainda é incerto devido às negociações entre o DNIT, a
Prefeitura Municipal, o Posto Trevão e a Construtora.
Dentre os terrenos onde se especula ser o local de realocação da
Escola, escolheu-se para este trabalho, uma gleba ao lado do
Posto, em direção à cidade de Monte Alegre. Este terreno é uma
das possibilidades de implantação da nova escola e foi escolhido
para o projeto neste trabalho por sua facilidade de acesso e
proximidade com o comércio existente no local, visto que a escola
também desempenhará papel de equipamento comunitário de
cultura, saúde e esporte.
‚Na minha opinião (com base na minha
pesquisa sobre o assunto), os centros
comunitários [rurais] permitiriam colocar fim à
decadência da maravilhosa vida campesina e a
restauraria com força total, já que esta nova
organização daria uma vida moderna e cheia de
vitalidade ao campo, de onde muitos fugiram,
atraídos pelas vantagens duvidosas da
cidade.92
‛
Le Corbusier
92 LE CORBUSIER. “El corazon como punto de reunion de las artes”. ROGERS, E.N., SERT, J.L., e TYRWHITT, J. El corazón de La ciudad: para uma vida más humana de La comunidad. Barcelona: Hoelpi, 1955, PP.41-52.
Área escolhida para o projeto
Análise de implantação e insolação em maquete de estudo
116
PROPOSTA PARA NOVA
ESCOLA NICANOR PARREIRA
1 – SAGUÃO DE ENTRADA
2 – SALAS DE AULA
3 – ADMINISTRAÇÃO
4 – MÉDICO/DENTISTA
5 – QUADRA POLIESPORTIVA
6 – HORTA E POMAR
7 – REFEITÓRIO
8 – BIBLIOTECA E SALA MULTIMÍDIA
117
O programa de usos da escola busca vincular o projeto a uma
proposta de ensino condizente com a população atendida, e
proporcionar a essas pessoas um equipamento público que
forneça mais que somente educação, em um ambiente favorável a
isso.
‚Reconheçamos, entretanto, que nenhum outro
elemento é tão fundamental, no complexo da
situação educacional, depois do professor,
quanto o prédio e suas instalações.93
‛
Anísio Teixeira
A escola atualmente já cede espaço para cursos realizados pelo
SENAR (Serviço Nacional de Aprendizagem Rural), de bordado e
pintura. O que se pretende é a ampliação da oferta desses cursos,
com a possibilidade do aprendizado de cultivo e de técnicas
agrícolas em aulas oferecidas tanto para os alunos, quanto para
seus pais. Para isso, o projeto da nova escola conta com área para
horta e pomar, além de uma sala multimídia, que pode abrigar
aulas e palestras.
A possibilidade de se ocorrer esse tipo de formação no ambiente
de uma escola rural vai de encontro com a Lei de Diretrizes94
, que
defende a adequação da escola, tanto em nível curricular quanto
93 TEIXEIRA, Anísio.Um Presságio de Progresso In Revista Habitat n° 4, de 1951. 94 Lei de Diretrizes: Lei n° 9394, de 20 de dezembro de 1996 que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. O texto faz referência ao seu Artigo 28 que trata das adaptações do ensino às peculiaridades da vida rural.
em nível organizacional, às especificidades da vida rural de cada
região. Espaços assim são fomentados por programas federais
como o PRONACAMPO (Programa Nacional de Educação no
Campo), que ‚constitui um conjunto de ações voltadas ao acesso
e à permanência na escola, à aprendizagem e à valorização do
universo cultural das populações do campo95
‛.
A escola conta também com quadra esportiva e área de
atendimento medico que atendem a população do entorno.
‚A valorização social da escola como
agrupamento unitário e ponto focal de uma
comunidade, levando-a a um uso intensivo,
estaria, no mínimo, a duplicar o seu valor de uso
e, na mesma proporção, a reduzir o seu valor de
custo96
‛
Hélio Duarte
95 PRONACAMPO: Decreto n° 7352/2010. 96 DUARTE, Helio. Considerações sobre Arquitetura e Educação In Revista Acrópole n°210, de 1956.
118
A solução projetual dada à escola visa um espaço de qualidade e
de baixo custo construtivo e de manutenção.
Os materiais utilizados foram, basicamente, tijolo cerâmico
‚baiano‛, aparente e com reboco; e arrimos de concreto aparente.
Onde o tijolo cerâmico é aparente há uma seqüência de aberturas
criadas pela paginação das fiadas dos blocos, o que permite a
ventilação.
Os espaços se articulam com o pátio, e este se abre para a área
de cultivo de hortaliças e árvores frutíferas.
119
O conjunto de diretrizes e intervenções proposto neste trabalho
para o município de Monte Alegre de Minas tem o objetivo de
proporcionar espaços públicos de qualidade, bem como, acesso
facilitado à educação e cultura para a população, incluindo
também, sua parcela rural, que por vezes é encarada de forma
secundária.
Espaços públicos de qualidade e acesso à cultura melhoram a
qualidade de vida de qualquer população. Em Monte Alegre de
Minas, onde o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal é
mediano, as medidas aqui propostas trariam melhoras efetivas.
120
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122
OUTRAS REFERÊNCIAS
As transformações ocorridas recentemente nas relações
cidade-campo inspiraram obras de artistas contemporâneos
que ajudam a ilustrar e a refletir sobre o tema. A dupla de
artistas nórdicos Michael Elmgreen e Ingar Dragset fez a
instalação de arte permanente ‚Prada Store‛ nas
proximidades do vilarejo de Marfa, no Texas (E.U.A.). A
instalação de uma loja fictícia da marca de acessórios de
luxo Prada na beira de uma rodovia, no meio do deserto, leva
à reflexão sobre a acelerada transformação da paisagem e à
forte influência da vida urbana no mundo rural, ás vezes
perversa. Já a artista húngara radicada em Nova York, Agnes
Denes, faz uma instalação de arte temporária, em que ela
planta uma lavoura de trigo de dois hectares em uma área
vazia de Manhathan, próxima a Wall Street e onde hoje se
localiza o Battery Park. Nesta instalação, chamada
"Wheatfield - A Confrontation" (Campo de Trigo – Um
Confronto), a artista chama a atenção para ‚os valores e as
prioridades deslocadas‛. Com a ajuda de voluntários, Agnes
limpou um terreno antes poluído e o usou para plantação, em
uma das áreas urbanas mais valorizadas e adensadas do
mundo. Estas obras levam à reflexão, através de várias
interpretações, tanto da influência do urbano no campo,
quanto do rural na cidade.
Instalação de arte temporária “Weatfield – A Confrontation”, de Agnes Denes.