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Cidade dos Nephilins

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Filhos do Pecado

Volume 1

Cidade dos Nephilins

Vanessa Araujo

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Porque os demônios serão chamados de santos quando compara-

dos aos humanos. — Vanessa Araujo

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Introdução

O Novo Mundo

Guerras atormentaram os humanos por séculos, talvez em to-

da a sua existência. Essas batalhas já aconteciam muito antes, guerras

no céu, lutas por poder, por adoração, por soberania. Para o mundo

sobrenatural, eu já existia há muito tempo, desde que um arcanjo

decidiu que assim deveria ser. Para os humanos... Bem, para eles, eu

seria mesmo inesquecível!

Anjos amaram e desejaram as filhas dos homens. Desse amor

surgiu uma nova raça, nunca sequer desejada por Deus, filhos de um

pecado que jamais deveria existir, os nephilins.

Toda criatura feita pelas mãos do Criador tem a Sua essência;

Deus é amor, todos têm amor. Os nephilins não amam, pois são a

anomalia genética dos céus e da Terra, uma raça não programada...

Será que não? O fato é que os alados eram capazes de se reproduzi-

rem; esses filhos nasceram e, por muito tempo, acreditei ser uma des-

sas anormalidades. Sendo apenas o efeito colateral do sexo dos ala-

dos, os nephilins não possuíam a essência de Deus.

Os nephilins não amam.

Os nephilins desejam.

Os nephilins fazem sexo.

Os nephilins odeiam e matam.

Por algum motivo - na verdade, por um motivo específico -,

alguém desejou eliminar tudo o que existia na Terra. Tudo o que e-

xistia e o que não deveria existir. Uma família humana foi poupada,

assim como cada espécie de animais. Os anjos desmaterializaram-se,

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voltaram para a morada sagrada e um dilúvio afligiu a humanidade,

os animais e tudo mais. Apenas uma raça foi totalmente extermina-

da: os nephilins – ou assim pensaram... – Porém, os anjos ainda exis-

tiam, eles tornaram a pecar, as anomalias genéticas voltaram a fazer

parte da vida terrena. O administrador dos céus já não acharia justo

dizimar os humanos novamente para eliminar os filhos do pecado.

Portanto, fez vista grossa para o erro deliberado, ignorando a cons-

trução de uma cidade em um universo paralelo, em um mundo in-

termediário entre os céus e a Terra. Lá, os anjos e arcanjos esconderi-

am sua prole quando essa estivesse em perigo. Assim foi a fundação

da Cidade dos Nephilins, o lugar da minha maior tortura.

Sendo criaturas especiais, os filhos do pecado eram constan-

temente perseguidos por demônios, e até mesmo por anjos e arcanjos

que se mantiveram fiéis à criação original. Dos céus, Miguel era o

maior oponente dos nephilins. No inferno, o atual Rei das Trevas era

quem os perseguia, mas não para matá-los, apenas para serem peças

especiais, fortes soldados, em seu exército. Sabendo do fim iminente,

muitos alados desertaram do céu e abrigaram-se na Cidade dos Ne-

philins, tornando-se instrutores de seus filhos, criando um mundo

novo.

Os humanos travavam suas próprias batalhas, também por

poder, por ganância, por prazer. Destruíram-se até chegarem a um

ponto abominável, provocando chacinas, genocídios, arrasando terri-

tórios inteiros.

Eu nasci quando o mundo humano enfrentava a maior guerra

de todos os tempos. Essa batalha foi causada por motivos religiosos,

levando ao ecumenismo cristão, levantando um novo governo.

Por volta do meu décimo sétimo aniversário, tal contenda se

assentou e o novo clero dominou o poder mundial, trazendo a falsa

paz entre os homens. O novo governo pregava suas crenças com ri-

gor, e todos obedeciam. Entretanto, alguns mantinham vida dupla,

praticando seus antigos rituais e a nova ordem estabelecida pela en-

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tão conhecida como Igreja de Cristo. Quando descobertos, eram leva-

dos a um julgamento simbólico, pois já estavam praticamente conde-

nados, e passavam por uma morte tortuosa como sinal de purificação

da alma. Era a nova inquisição em meio ao mundo tecnológico.

E eu guardava meus segredos, assim como muitos...

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SEMENTES DOS ANJOS

Semente maldita que habita na terra,

Semente de um amor proibido,

Semente forte que se alimenta de vida,

Somente um fruto maldito.

Fruto de duas raças,

Filhos de mães falecidas,

Descendentes de anjos caídos,

Frutos perdidos em vida.

Por seres de sombras perseguidos,

Fugindo e procurando um destino,

Filhos de um amor... Sem amor.

Sementes que enganam,

Frutos que matam,

Folhas caídas no outono,

Que simplesmente não amam.

Somente nascidos,

Largados, perdidos,

Sem amor, sementes de anjos...

Incapazes de amar.

Sementes que nunca vão brotar.

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1 – Fugir

Perdida.

Acabada.

Destruída.

Eu seria uma rainha, fiz uma promessa e fui vítima de meus

próprios erros.

Não nasci de um deus nem de um demônio. Sou filha de um

arcanjo caído, preso nesse mundo entre o céu e o inferno.

Estava sem esperanças, sendo perseguida por destruir vidas,

tirando seu sangue e provocando dor. Muita dor!

Tentei fazer tudo certo. Não foi bem o que aconteceu. Desviei-

me em algum lugar no meio dos sonhos. Mas, um dia, de algum jei-

to, consertaria meus erros. No momento, precisava fugir, alcançar o

lugar que seria meu refúgio, a Cidade dos Nephilins.

Não faltava muito, porém, estava tão destruída que cada pas-

so que dava parecia sem direção, um esforço inútil.

Cheguei a um ponto em que já não sabia se acreditava mais

nas coisas que meu pai dissera. Tudo o que me aconteceu provocou

essa dúvida. Mas eu estava lá... Precisava continuar, por alguém que

amava, eu tinha que seguir. Ele morreu para que eu pudesse nascer.

Sim, eu continuaria, em honra a sua memória, daria um sentido à

minha existência.

Faltava pouco para o sol nascer e já avistava os portões da ci-

dade. Meu pai não mentiu, ela existia! Então, tudo poderia mudar,

tudo poderia ser diferente.

— Alto, Lienne! Pare onde está.

Virei para encará-lo.

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— Pode me dizer o que foi que eu fiz agora? – resmunguei

como criança impaciente.

— Eu disse que não seria fácil – respondeu, abrindo suas

grandes asas negras.

— Mas eu cheguei! – protestei firme.

— Não é disso que estou falando.

Ignorei-o e dei um passo na direção do imenso portão. Rapi-

damente, ele se colocou diante de mim, impedindo minha passagem.

Parei. Não ousaria enfrentá-lo em uma luta, eu estava fraca e ele

sempre foi muito maior em poder.

— O sol já vai nascer, pai. Eu vou morrer, deixe-me passar –

implorei em murmúrio.

— Morrerá de qualquer jeito – meu pai respondeu de maneira

casual.

— Então, por que me mandou para cá?

— Diga-me, Lienne, por que deseja entrar na Cidade dos Ne-

philins? Para fugir de tudo? Para salvar sua vida daqueles que te

perseguem?

— Para salvar minha vida... de certa forma. – A expressão no

rosto de meu pai mostrava que ele não gostara da minha resposta.

Precisei consertar. – Pai, eu sinto falta da vida, das cores do mundo,

da luz do dia. Nem sei como cheguei nessa situação, não sei por que

tenho que viver longe do sol. Cansei da escuridão. Passei por cima de

tudo e, mesmo assim, fui derrotada. Chega de noites em minha vida!

Ele sorriu. Eu o convenci.

— Não será fácil lá dentro – falou, apontando para a cidade. –

Entretanto, aprenderá a lutar, ganhará força, poder. Será como eu

quando sair... Se conseguir sair.

— Mas eu vou ficar bem, não vou? – indaguei, mordendo os

lábios.

— Você é forte. Só que eles são muito mais. Seus instrutores

não facilitarão, mesmo que tenha que levar sua coragem até as últi-

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mas consequências. E quando parecer que é o seu fim, não ouse de-

sistir de lutar, ou morrerá.

— Virá me visitar de vez em quando?

— No momento de encarar a tempestade, quando suas espe-

ranças acabarem, é quando estarei aqui – sibilou, com o esboço de

um sorriso estampado nos lábios, ternura contida nos olhos e os de-

dos hesitantes acariciando meu rosto com toques suaves. – Não perca

a esperança, minha filha.

— Tão ruim assim?

— Demais...

Isso me assustou. E muito! Mas a luta que tinha do lado de fo-

ra daqueles portões eram maiores. Ou assim eu pensava.

— Eles te esperam, Lienne – avisou-me o genitor alado.

Sim, eles me esperavam. Meu pai já os tinha avisado e eu sen-

tia o chamado. Dei mais dois passos em direção a Cidade dos Nephi-

lins.

— Espere, Lienne – ordenou novamente. Virei furiosa e ele

continuou: - Para entrar aí é preciso esquecer. Tem que esquecer-se

de tudo, arrepender-se. Morrer.

— Já morri uma vez – respondi, por entre os dentes, ao lem-

brar-me de como tudo começou.

— Essa é a condição.

— Não fiz nada de que pudesse me arrepender, e posso mor-

rer quantas vezes forem necessárias, jamais esquecerei o que fizeram

comigo! – rebati, com ódio latente, mantendo os punhos cerrados.

— Minha filha, esse teu fogo, esse teu desejo de vingança, po-

de ser o instrumento que vai cavar seu túmulo – vociferou irado. –

Deixe a vingança nas mãos de Deus!

— Deus? – Dei alguns passos e tentei encará-lo, o que foi inú-

til, o alado era muito mais alto que eu. - Onde está seu Deus agora?

Cadê o seu Deus, papai? – indaguei, com os braços abertos e olhando