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CERCEAMENTO TECNOLÓGICO: O CASO DO SISTEMA UNILATERAL DE CONTROLE DE EXPORTAÇÕES DOS EUA E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O BRASIL Lucas Peixoto Pinheiro da Silva 1 Rafael Laginha Nascimento 2 RESUMO Após a redemocratização, o Brasil aderiu aos principais regimes internacionais, principalmente na década de 1990. Entre eles, estão o regime de não proliferação de armas nucleares e o regime de controle de tecnologias de mísseis. Ao assinar esses regimes , o Brasil esperava obter maior credibilidade internacional e acesso mais facilitado a tecnologias que eram cerceadas anteriormente. Apesar disso, o cerceamento tecnológico prossegue sendo uma adversidade na produção de ciência e tecnologia no Brasil, principalmente na área de defesa. A hipótese deste trabalho é que o sistema unilateral de controle de exportações dos Estados Unidos (EUA) é, em grande parte, o principal responsável pelo cerceamento tecnológico sofrido pelo Brasil quando requer importação de materiais e tecnologias sensíveis dos EUA. Isso ocorreria, pois, apesar do cumprimento brasileiro dos principais regimes internacionais de controles de exportação, o país continua a sofrer cerceamento dos EUA, o qual é baseado, majoritariamente, em sua legislação doméstica e em detrimento do Direito Internacional (DI). Por meio da análise de alguns casos de denegação de produtos ao Brasil e da legislação estadunidense que justifica esse procedimento, verifica-se que a abrangência dessa legislação permite que o Departamento de Estado, o Departamento do Comércio e o Departamento do Tesouro dos Estados Unidos tomem decisões discricionárias, ao realizar o controle de exportações. Ao final, após se analisar o sistema legal de controle de bens militares exportáveis dos EUA, buscar-se-á identificar quais fatores afetos à legislação estadunidense podem, de alguma forma, estar se sobrepondo aos termos preceituados nos regimes internacionais, sendo estes, instrumentos oriundos do DI. Palavras-chave: Aquisições de defesa. Cerceamento tecnológico. Estados Unidos. ABSTRACT After the re-democratization process, Brazil adhered to the main international regimes, mainly in the 1990s. Among them are the non-proliferation regime of nuclear weapons and the missile technologies control regime. By adhering to these regimes, Brazil hoped to gain more international credibility and easier access to technologies that had been previously restrained. Despite this, the technological restraint continues to be an adversity in the production of 1 Graduado em Relações Internacionais pela Universidade Federal Fluminense, mestrando em Estudos Estratégicos da Defesa e da Segurança pela Universidade Federal Fluminense, membro do Laboratório Defesa e Política[s] (Inest/UFF) e bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). E-mail: [email protected] 2 Advogado. Mestrando em Estudos Estratégicos da Defesa e da Segurança pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, Rio de Janeiro. Pesquisador bolsista do Laboratório de Simulações e Cenários (LSC) da Escola de Guerra Naval (EGN). E-mail: [email protected].

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CERCEAMENTO TECNOLÓGICO: O CASO DO SISTEMA

UNILATERAL DE CONTROLE DE EXPORTAÇÕES DOS EUA E SUAS

IMPLICAÇÕES PARA O BRASIL

Lucas Peixoto Pinheiro da Silva1

Rafael Laginha Nascimento2

RESUMO

Após a redemocratização, o Brasil aderiu aos principais regimes internacionais,

principalmente na década de 1990. Entre eles, estão o regime de não proliferação de armas

nucleares e o regime de controle de tecnologias de mísseis. Ao assinar esses regimes, o Brasil

esperava obter maior credibilidade internacional e acesso mais facilitado a tecnologias que

eram cerceadas anteriormente. Apesar disso, o cerceamento tecnológico prossegue sendo uma

adversidade na produção de ciência e tecnologia no Brasil, principalmente na área de defesa.

A hipótese deste trabalho é que o sistema unilateral de controle de exportações dos Estados

Unidos (EUA) é, em grande parte, o principal responsável pelo cerceamento tecnológico

sofrido pelo Brasil quando requer importação de materiais e tecnologias sensíveis dos EUA.

Isso ocorreria, pois, apesar do cumprimento brasileiro dos principais regimes internacionais

de controles de exportação, o país continua a sofrer cerceamento dos EUA, o qual é baseado,

majoritariamente, em sua legislação doméstica e em detrimento do Direito Internacional (DI).

Por meio da análise de alguns casos de denegação de produtos ao Brasil e da legislação

estadunidense que justifica esse procedimento, verifica-se que a abrangência dessa legislação

permite que o Departamento de Estado, o Departamento do Comércio e o Departamento do

Tesouro dos Estados Unidos tomem decisões discricionárias, ao realizar o controle de

exportações. Ao final, após se analisar o sistema legal de controle de bens militares

exportáveis dos EUA, buscar-se-á identificar quais fatores afetos à legislação estadunidense

podem, de alguma forma, estar se sobrepondo aos termos preceituados nos regimes

internacionais, sendo estes, instrumentos oriundos do DI.

Palavras-chave: Aquisições de defesa. Cerceamento tecnológico. Estados Unidos.

ABSTRACT

After the re-democratization process, Brazil adhered to the main international regimes, mainly

in the 1990s. Among them are the non-proliferation regime of nuclear weapons and the

missile technologies control regime. By adhering to these regimes, Brazil hoped to gain more

international credibility and easier access to technologies that had been previously restrained.

Despite this, the technological restraint continues to be an adversity in the production of

1 Graduado em Relações Internacionais pela Universidade Federal Fluminense, mestrando em Estudos

Estratégicos da Defesa e da Segurança pela Universidade Federal Fluminense, membro do Laboratório Defesa e

Política[s] (Inest/UFF) e bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).

E-mail: [email protected] 2 Advogado. Mestrando em Estudos Estratégicos da Defesa e da Segurança pela Universidade Federal

Fluminense (UFF), Niterói, Rio de Janeiro. Pesquisador bolsista do Laboratório de Simulações e Cenários (LSC)

da Escola de Guerra Naval (EGN). E-mail: [email protected].

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science and technology in Brazil, especially in the defense area. This paper’s hypothesis is

that the United States’ unilateral export control system is, in large part, the main responsible

for the technological restraint Brazil faces when it requests to import sensitive materials or

technologies from the US. Despite the Brazilian compliance with the main international

regimes of export controls, Brazil continues to suffer recurrent denials to the US export

control agencies, and the reasons are mostly based on the US domestic legislation,

independently from the International Law. Through the analysis of some case studies of those

denials to Brazilian import requests and of the US domestic legislation that justifies this

procedure, it is verified that the scope of this legislation allows the Department of Commerce,

the Department of Commerce and the United States Department of the Treasury to take

discretionary decisions, in the export control system. In the end, after analyzing the legal

system for controlling US exportable military assets, it will be sought to identify which

factors that affect US legislation may, in some way, be overlapping with the terms established

in international regimes from international law.

Keywords: Defense acquisitions. Technological restraint. United States.

INTRODUÇÃO

O Brasil, passado o período político autoritário, findo em 1985, buscou a adesão aos

inúmeros regimes internacionais, notadamente na década de 1990. A política externa

brasileira, ao se balizar com as nações do bloco ocidental, que também aderiram aos

principais regimes, acreditava que poderia obter maior credibilidade internacional, além de ter

maior acesso a tecnologias que até então eram objeto de cerceamento. Apesar disso, o

cerceamento tecnológico perpetrado pelos EUA, sobretudo na área de defesa, continua a ser

um obstáculo para a produção de ciência e tecnologia no Brasil, de forma a ser um dos

entraves para o desenvolvimento de projetos de defesa autóctones.

Com base nas premissas iniciais, a hipótese deste artigo gravita no sentido de que o

sistema unilateral de controle de exportações dos EUA é, em grande parte, o principal

responsável pelo cerceamento tecnológico sofrido pelo Brasil no âmbito da relação comercial

bilateral de aquisição de material ou tecnologias sensíveis de defesa. A ocorrência do

cerceamento tecnológico de forma unilateral pelos EUA dar-se-ia mesmo com o acatamento

do Brasil aos principais regimes de controle de exportação de armas dos quais é signatário.

Para tanto, os EUA baseiam-se, majoritariamente, em sua legislação doméstica em detrimento

dos inúmeros tratados e regimes de que são parte no Direito Internacional.

Mesmo quando os EUA não são responsáveis diretamente pelo cerceamento e pelo

embargo de venda direta de materiais considerados sensíveis do ponto de vista tecnológico, o

governo estadunidense exerce pressão sobre países aliados, que, frequentemente, compõem a

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Aliança Militar do Atlântico Norte (OTAN), no sentido de que tais países não transfiram

tecnologia nem vendam materiais que envolvam tecnologia de uso dual3, principalmente em

programas nucleares e de mísseis passíveis de gerarem spin-off4.

De acordo com Moreira (2013, p. 196), por envolver bens sensíveis, “perscrutar casos

reais de cerceamento tecnológico é algo desafiador. Há resistências [...] ao fornecimento de

dados, por compreensíveis razões, principalmente no setor privado”, sendo, muitas vezes,

mais comum relatos disponíveis em palestras oficiais ou vídeos com comunicações de

representantes de órgãos públicos. Dessa forma, esta pesquisa é contingenciada pelo acesso

limitado à completa base de dados de cerceamento tecnológico. Apenas se obteve acesso a

exemplos publicados em audiências públicas, como nas figuras 2 e 3.

Mesmo no âmbito civil, há dificuldade de coleta de dados estatísticos sobre

cerceamento tecnológico e de casos envolvendo transferência de tecnologia. Em

contrapartida, a Diretoria de Transferência de Tecnologia (DIRTEC) do Instituto Nacional da

Propriedade Industrial (INPI) divulga, periodicamente, uma série de informações estatísticas a

fim de dar às suas políticas e aos interessados uma visão panorâmica do volume de operações

de transferência de tecnologia realizados no Brasil (ASSAFIM, 2013, p. 90). No tema de

“cerceamento tecnológico”, há pouco material desclassificado disponível conforme já

aduzido; mas os dados da DIRTEC são úteis quando se buscam informações sobre os

principais atores no ramo de trade tecnológico e suas práticas comerciais que poderiam ajudar

o pesquisador a tentar compreender os motivos técnicos e estratégicos que levam um país a

cercear os demais.

O cerceamento tecnológico pode ser considerado um instrumento de exercício da

política, ou mesmo um subproduto das relações internacionais e do comércio internacional.

Cabendo destacar que, contraditoriamente, o cerceamento tecnológico pautado em uma

legislação altamente regulamentada e restritiva é exercido, em sua grande maioria, por países

desenvolvidos defensores do livre mercado e da globalização (PEDONE, 2009; ROSSI,

2015). Esse posicionamento de inflexão provavelmente denota a verdadeira intenção dos

Estados, pois tendo em vista que o sistema político internacional é anárquico e conflituoso, a

relação cooperativa é sempre relativizada pela busca incessante por poder, notadamente o

Poder Militar (MEARSHEIMER, 2007; PEDONE, 2009); de forma que o cerceamento

3 A tecnologia poder ser considerada “dual” quando há a possibilidade de ter aplicações militares e civis, atuais

ou potenciais (BRUSTOLIN, 2014, p. 6). 4 Spin-off ou transbordamento tecnológico é o processo em que uma tecnologia desenvolvida inicialmente para

uso militar passa a ter, efetivamente, aplicação no meio civil. (ROSSI, 2015, p. 64).

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restritivo seria uma forma de se reduzir o poderio bélico de potenciais inimigos (ROSSI,

2015, p. 43). Partindo de tais premissas, o presente trabalho justifica-se em razão da

importância de se analisarem alguns casos que demonstram como a legislação doméstica dos

EUA oferece óbices ao desenvolvimento da Base Industrial de Defesa (BID) brasileira,

mesmo sendo o Brasil Estado-parte dos principais regimes internacionais.

1 CERCEAMENTO TECNOLÓGICO

1.1 Conceitos e Fundamentos Metodológicos

Logo após o término da Segunda Guerra Mundial, os EUA perceberam a função

fundamental e determinante que a sua superioridade industrial e tecnológica (inclusive

nuclear) teve para o desfecho do conflito. Em um primeiro momento, a preocupação residiu

no campo de uma eventual difusão dos conhecimentos de uso militar da energia nuclear

produzidos no plano interno durante o esforço de guerra. O primeiro plano de ação foi

implementar o Atomic Energy Act em agosto de 1946. A norma regulamentadora tinha como

objetivo proibir a transferência para outros países de conhecimentos na área nuclear (mesmo

para aplicação industrial civil), o que é um embargo ao conhecimento tecnológico nuclear

produzido nos EUA (SANTOS, 1999, p. 125).

Em 1949, foi criado o Coordinating Committee for Multilateral Export Control

(Cocom), cujo escopo principal era impedir a União Soviética e seus aliados de adquirirem

tecnologia ocidental que pudesse contribuir para o incremento de seu poderia militar. Na

época os países membros do Cocom eram os países da Organização do Atlântico Norte

(SANTOS, 1999, p. 118).

Ainda na esteira do término da Segunda Guerra, os países desenvolvidos que detêm

alto nível de desenvolvimento científico e tecnológico têm buscado cercear o acesso de

nações em desenvolvimento ou desenvolvidas que sejam eventuais concorrentes às

tecnologias e produtos que consideram sensíveis, incluindo as de uso dual (LONGO;

MOREIRA, 2009). William Moreira (2015) conceitua o cerceamento tecnológico como um

conjunto de políticas, normas e medidas levadas a cabo por Estados, organizações

internacionais ou empresas privadas ou estatais com o fito de se restringir, dificultar ou negar

o acesso, a posse ou uso de bens sensíveis e serviços diretamente vinculados, por parte de

estados, instituições, centros de pesquisas ou empresas e terceiros.

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Na visão de Pedone (2009), o cerceamento tecnológico pode ser praticado por uma

miríade de atores, tais como estados, grupos de estados, empresas e/ou consórcios de

empresas, que buscam restringir, bloquear, denegar ou ainda dificultar o acesso a bens e

tecnologias consideradas sensíveis, sobretudo de bens afetos à área de defesa. Em certas

ocasiões, o cerceamento pode ocorrer mesmo quando o país já detém determinada tecnologia,

sendo passível de citação o caso brasileiro envolvendo pedidos de bens e materiais que seriam

destinados ao programa nuclear brasileiro, que foi desenvolvido, inicialmente, com a parceria

do governo da Alemanha e que foi alvo de cerceamento pelos EUA.

Longo e Moreira (2009, p. 74) afirmam que o objetivo do cerceamento é negar

conhecimento e manter supremacia tecnológica em áreas estratégicas, bem como evitar o

acesso de atores não estatais (“novas ameaças”). Esses autores acham difícil rotular como

civil ou como militar a produção de conhecimentos. Entre essas tecnologias, há algumas que

são consideradas sensíveis. Tecnologia sensível é “a que um determinado país (ou grupo de

países) considera que não deva dar acesso, durante certo tempo, hipoteticamente por razões de

segurança” (LONGO; MOREIRA, 2009, p. 74). William Moreira define cerceamento

tecnológico como:

Conjunto de políticas, normas e ações empreendidas por Estados, organizações

internacionais ou empresas no sentido de restringir, dificultar ou negar o acesso, a

posse ou o uso de bens sensíveis e serviços diretamente vinculados, por parte dos

Estados, instituições de pesquisa ou empresas de terceiros (MOREIRA, 2013, p.

304).

Para Longo e Moreira, apesar de os objetivos do cerceamento serem meritórios, esse

procedimento tem sido empregado pelos países desenvolvidos, principalmente a tríade que

lidera o desenvolvimento científico e tecnológico, EUA, União Europeia e Japão, a fim de

manter vantagens estratégicas, não somente militares; mas também comerciais sobre os

demais países (2009, p. 75, 95-96). Esse comportamento pode vir acompanhado ou não por

atos internacionais, os quais, geralmente, são constituídos por incentivos dos países

desenvolvidos e com objetivos que incluem a preservação da sua hegemonia (LONGO;

MOREIRA, 2009, p. 75).

Uma parte importante do trabalho de um cientista social é a elaboração de tipologias e

de modelos de modo a sistematizar os dados coletados, o que faz parte do processo de

simplificação da realidade complexa e da elaboração de teorias que explicam relações causais

entre fenômenos (DUVERGER, 1962, p. 395-401; KING, KEOHANE, VERBA, 1994, p. 47;

LAKATOS, MARCONI, 2003, p. 116; VAN EVERA, 1997, p. 9). William Moreira (2013, p.

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197-202) elaborou uma tipologia composta por seis modelos de cerceamento tecnológico que

é útil a esta análise (Quadro 1).

Modelo Manifestação do cerceamento

I Empresa fornecedora denega por iniciativa própria.

II Agências governamentais não autorizam a operação de compra, venda

ou transferência.

III Intervenção de agências do Estado em processos iniciados.

IV Intervenção com emprego da força bruta.

V Absorção de empresa, drenagem de cérebros ou descontinuidade de

fornecimento.

VI Pressão política, econômica ou social por Estado, OIG ou comunidades

(ONGs, OINGs etc). Quadro 1- Modelos de Cerceamento Tecnológico

Fonte: MOREIRA, 2013, p. 201

1.2. Arcabouço Regulatório Restritivo para o Comércio de Armas no Brasil e nos EUA

Com o fito de se garantir um nível mínimo de autonomia e de desenvolvimento da

BID, os governos dos estados desempenham uma função crucial na regulação e no fomento

industrial de seus parques industriais de defesa. Para tanto, buscam atender suas próprias

necessidades por meio de sua BID, além de exercer o controle sobre as exportações de itens

de defesa (MATHEUS, 2016, p. 142). No Brasil, vigorou entre 1974 a 1991 a Política

Nacional de Exportação de Material de Emprego Militar (PNEMEM). Essa política retrata

uma postura restritiva do governo brasileiro que visava a proteger os interesses nacionais em

um momento em que a indústria de defesa brasileira estava para se consolidar como uma das

dez maiores do mundo no setor (AVILA, 2009, p. 264-265; SANTOS, 1999, p. 119). Em 10

de outubro de 1995, entrou em vigor outra norma com o escopo de regular o setor, tratava-se

da Lei 9.112, que dispõe sobre a exportação de bens sensíveis e serviços diretamente

vinculados. A referida norma é parcialmente regulamentada pelo Decreto 1.861, de 12 de

abril de 1996, que regulamenta a exportação de bens sensíveis e serviços vinculados de

natureza nuclear, além de também ser regulamentada pelo Decreto 4.214, de 30 de abril de

2002, que tem como função estabelecer a competência da Comissão Interministerial de

Controle de Exportação de Bens Sensíveis (MATHEUS, 2010, p. 84).

Em relação ao sistema regulatório dos EUA, a legislação de controle de exportações

dos EUA visa a controlar a exportação de equipamentos, softwares e tecnologias sensíveis

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como meio de promover sua segurança nacional e seus objetivos de política externa (U.S.

GOVERNMENT, 2017). Esse sistema envolve três departamentos: Departament of State

(DoS), o Departament of Commerce (DoC) e o Departament of Defense (DoD) (U.S.

GOVERNMENT, 2017). Tais burocracias foram as responsáveis pela elaboração de

documentos, nomeadamente, o Export Administration Act (EAA) de 1979; o Arms Export

Control Act (AECA); a Commerce Control List (CCL); a United States Munitions List

(USML); o Nuclear Regulatory Commission Controls (NRCC); a Technology Alert List

(TAL). Todo esse aparato legislativo fornece os meios e mecanismos necessários para que o

DoS, o DoC e o DoT trabalhem de forma integrada, visando a tutelar os interesses

estadunidenses, no sentido de controlar o acesso a materiais, serviços e tecnologias sensíveis

na área de defesa (MATHEUS, 2016, p. 142-143). Todo esse arcabouço jurídico retrata o

sistema jurídico regulatório estadunidense que submete ao controle presidencial (sujeito a

revisão pelo Congresso, por meio de lei) a importação e exportação de produtos, sistemas e

tecnologias de defesa (ROSSI, 2015, p. 45).

O Export Administration Act (EAA), de 1979, é uma legislação de controle sobre

artigos com potencial para aplicação militar que entrou em vigor para substituir o Export

Control Act (ECA). O EAA foi, posteriormente, regulado pelo Export Administration Regulations

(EAR), que engloba a Commerce Control List (CCL)5. Já o Arms Export Control Act (AECA),

que surgiu para substituir o Battle Act, de 1954, pode ser considerado a norma positivada mais

importante elaborada para fins de controle específico de exportações de materiais militares. Com

o fim de regulamentar o AECA, entrou em vigor o International Trade in Arms Regulations

(ITAR), que por sua vez contém a USML (MATHEUS, 2010, p. 82).

O ITAR tem o escopo de definir regras complementares sobre o comércio de tecnologias

que o governo estadunidense entende que devem ser controladas (MATHEUS, 2016, p. 154). Esse

conjunto de normas que compõem o ITAR é destinado a controlar, de forma unilateral, a

exportação e a importação de bens e serviços afetos à área de defesa que façam parte da USML.

Tais regras são parte componente do AECA, que, assim como o ITAR, foram introduzidos no

contexto da Guerra Fria, em 1976, e tinham como finalidade principal tentar evitar a exportação

de armas para as nações que faziam parte do Pacto de Varsóvia. Contudo, mesmo após a queda do

Muro de Berlim as atividades do ITAR cresceram, de medida de “contenção” de países alinhados

ao bloco soviético, o ITAR ganhou como objetivo finalístico a função de salvaguardar a

5 A CCL é uma lista restritiva com cerca de 2.400 itens classificados como de aplicação dual e restrição a ser

observada.

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segurança nacional dos EUA, além de também servir de instrumento de consecução aos objetivos

da política externa estadunidense (PEDONE, 2009).

Como um mecanismo regulatório, o ITAR pode ser considerado robusto e de alta

complexidade, pois obriga todos os fabricantes, exportadores e intermediários de bens de defesa a

registrarem-se junto ao DoS. Na prática, o ITAR prevê que organizações e indivíduos que

comercializarem informações e materiais listados na USML sem autorização do DoS poderão ser

punidos severamente. No âmbito das sanções e dos embargos de vendas, é digno de nota o fato de

que, em 2006, o governo estadunidense bloqueou a venda de aeronaves de patrulha marítima C-

295 de fabricação espanhola via empresa EADS-CASA à Venezuela, sob o argumento de que a

aeronave continha aviônica e componentes de motorização de origem estadunidense. O resultado

foi um cancelamento de um contrato de 500 milhões de euros (PEDONE, 2009).

Após o término da guerra fria as grandes potências elaboraram inúmeros tratados e

regimes internacionais com o objetivo de se reduzir o acesso às Armas de Destruição em Massa

(ADM), tal como o START I, de 1991, e START II, de 1993 (BAYLIS, 2016, p. 216-217). Tais

tratados somaram-se ao TNP, de 1968, no esforço da comunidade internacional em limitar a

proliferação das armas de destruição em massa. A despeito da existência desses tratados e

regimes, os EUA criaram mais um instrumento de cerceamento tecnológico, a TAL, com estes

quatro objetivos principais: impedir a proliferação de ADM; limitar o desenvolvimento de

capacitações militares que possam desestabilizar regiões do mundo; prevenir a transferência de

bens sensíveis para Estados que apoiam o terrorismo; e, por fim, manter as vantagens dos EUA

em certas tecnologias militares sensíveis.

O desenvolvimento de tecnologia dual ou multipropósito, muitas vezes com

nascedouro em projetos militares, envolve uma complexa interação da cadeia produtiva e de

instituições de pesquisa, dado que entre a descoberta tecnológica, o uso público e o retorno

financeiro há um extenso processo a ser percorrido. Todo esse processo de transferência de

tecnologia é capaz de produzir toda uma gama de benefícios à BID, tais como: incorporar

tecnologias inovadoras; ampliar investimentos que “transbordam” para outros segmentos;

gerar produtos exportáveis de alto valor agregado; aprimorar a formação de servidores,

técnicos e universitários; gerar milhares de empregos, alguns de nível muito sofisticado

(BRUSTOLIN, 2014, p. 38). Destarte, não é de se estranhar toda a construção de um

arcabouço jurídico regulatório pelos EUA com o fito de se cercear ao máximo a transferência

de tecnologia sensível, mesmo em detrimento de mecanismos já existentes no DI.

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De acordo com Brustolin (2014, p. 38-41), o desenvolvimento e a aquisição de

tecnologia militares no Brasil são complexos. Para ilustrar a complexidade do processo de

importação de tecnologias militares, foi feita uma adaptação do fluxograma de Brustolin

(2014, p. 38), na figura 1, aplicando-o ao caso de pedidos de importação aos EUA. Ele mostra

como, mesmo depois de aderir ao TNP, há muitas margens legais para cerceamento ao Brasil

por parte dos EUA, o maior detentor internacional de tecnologias militares e de uso dual.

Figura 1 - Aquisição de Tecnologias Militares e Cerceamento: exemplo das relações Brasil-EUA

Adaptado de BRUSTOLIN, 2014, p. 39. Fonte: BEZERRIL, 2011; MOREIRA, 2013, p. 209-211; U.S.

GOVERNMENT, 2017.

Após modificações do modelo original de Brustolin (2014, p. 39-41), a figura 1 pode

ser explicada desta forma: 1) o governo prepara uma Proposta de Lei Orçamentária Anual

(PLOA), com base no ano anterior, acrescida de atualizações monetárias e eventuais injeções

de recursos para finalidades previamente debatidas com os ministérios; 2) a PLOA tem sua

tramitação própria, sendo proposta pelo Poder Executivo e pode, ou não, ser aprovada pelo

Legislativo, além de dever estar dentro de um plano orçamentário de quatro anos (Plano

Plurianual); 3) o Congresso Nacional (habitualmente após negociação com o governo) vota a

Proposta; 4) o governo sanciona a aprovação legislativa e publica a Lei Orçamentária Anual

(LOA); 5) o governo repassa o orçamento (LOA) cabível ao Ministério da Defesa; 6) o

Ministério da Defesa recebe o orçamento para a execução; 7) editais/ encomendas de

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tecnologias prontas ou convites para acordos de cooperação e produção conjunta são feitos; 8)

empresas/ indústrias/ governos têm acesso aos editais/ encomendas/ convites; 9) os

interessados concorrem para ganhar o contrato com o governo ou é dispensada a

concorrência, com base na expertise ou na disponibilidade de tecnologia exclusiva. Também

podem ser firmados acordos de cooperação para produção conjunta. Ao mesmo tempo as

empresas precisam preencher formulários de autorização para exportação, que serão

verificadas por burocratas dos Departamentos de Comércio, de Estado e do Tesouro dos EUA,

sob pena de multa, caso as empresas descumpram as normas; 10) O governo estadunidense

verifica o pedido de exportação de acordo com normas domésticas e internacionais; 11) A

autorização é concedida ou negada; 12) se a autorização for concedida, o pagamento é

realizado, ao todo ou em partes, conforme o contrato; 13) tecnologias prontas são

disponibilizadas à Defesa Nacional ou produções em conjunto desencadeiam tecnologias; 14)

eventualmente, de acordo com a aceitação dos entes envolvidos e com as decorrentes

previsões contratuais, ocorre a transferência de conhecimento sobre as tecnologias prontas.

Essa transferência pode ser em vários níveis, conforme o interesse/ disposição/ possibilidade

das partes, bem como, dos valores e políticas em voga. No caso da produção em conjunto, a

práxis é que haja compartilhamento da propriedade intelectual e definição de mercados

específicos para a exploração de cada ente envolvido.

A forte influência oriunda da lógica empresarial, então adaptada às necessidades das

Forças Armadas estadunidenses na Segunda Guerra Mundial, quando, por iniciativa política,

houve o incremento da sinergia nas relações entre cientistas, militares e empresários

(GALISON, 2005), culminou em uma interpretação paradoxal sobre a própria essência da

utilização do avanço tecnológico. Isso deve-se ao fato de que para as empresas a tecnologia é

o motor da competição entre empresas, para os militares a inovação tecnológica, e sua

proteção passou a ser considerado um fato chave para a vantagem do combatente (PROENÇA

JÚNIOR apud ROSSI, 2015, p. 61). Tais fatores, muito provavelmente, tornaram-se fatores

sistêmicos para a criação do robusto e complexo arcabouço regulatório para o comércio de

armas estadunidenses e que, não raro, fica adstrito à condução da política externa daquele

país.

1.3. Estudos de Caso

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Com base nos levantamentos realizados por William Moreira (2013, p. 204-207), foi

elaborado o gráfico 1, o qual demonstra que o tipo mais comum de cerceamento tecnológico é

o tipo II (conforme quadro 1), quando as agências governamentais não autorizam a operação

de compra, venda ou transferência . No gráfico 2, com base nos mesmos dados, verifica-se a

participação de cada país estrangeiro nos processos de cerceamento tecnológico sofridos pelo

Brasil após a adesão ao TNP.

Gráfico 1- Proporção dos Tipos de Cerceamento Tecnológico

Elaboração própria. Baseado nos dados de Moreira (2013 p. 204-207).

I15%

II44%

III10%

IV2%

V10%

VI19%

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Gráfico 2- Proporção de Cerceamento Tecnológico por País ou Instituição

Elaboração própria. Baseado nos dados de Moreira (2013 p. 204-207).

O gráfico 2 demonstra que os EUA têm uma predominância muito significativa nos

casos de cerceamento tecnológico, o que justifica a maior atenção dada neste trabalho ao seu

sistema de controle de exportações. É importante ressaltar que os EUA foram, no mesmo

período, o maior e o segundo maior parceiro comercial do Brasil. Analisando alguns dados

estatísticos da DIRTEC do INPI, pode-se verificar a política restritiva dos EUA para com o

Brasil: a maior parte da tecnologia absorvida pelo Brasil em processos de transferência de

tecnologia é proveniente daquele país, conforme o quadro 2 e o gráfico 3, ao passo que a

maioria dos casos de cerceamento tecnológico também são oriundos daquela nação.

PAÍS Jan/Dez 2000

(A)

Jan/Dez 2001

(B)

% em Relação

ao Total 2001

Variação do

período (B/A)

Alemanha 264 285 14 8,0

Brasil 112 110 5 (1,8)

Canadá 60 45 2 (25,0)

Espanha 70 61 3 (12,9)

Estados

Unidos

513 547 27 6,6

França 108 160 8 48,1

Itália 91 128 6 40, 7

Japão 94 153 8 62,8

Reino Unido 61 90 4 47,5 Quadro 2- Países de origem da tecnologia (2000-2001)

73%

9%

7%

5%2%2%

2%

EUA França AIEA Alemanha Reino Unido Países Baixos Israel

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Fonte: ASSAFIM, Michel. Transferência de Tecnologia no Brasil, 2010, p. 93.

Gráfico 3- Principais Países Fornecedores de Tecnologia

Fonte: ASSAFIM, Michel. Transferência de Tecnologia no Brasil, 2010, p. 93.

As normas que regulam o sistema unilateral de controle de exportações dos EUA são,

em muitos casos, genéricas e dependem muito do interesse político momentâneo do governo,

como pode ser demonstrado no EAA de 1979, seção 3(2)(A) e (B):

[...] restringe a exportação de bens e tecnologias que possam contribuir para um

aumento significativo do potencial militar de qualquer outro país ou conjunto de

países, o que poderia ser prejudicial para a segurança nacional dos Estados Unidos

[...] e a restringir a exportação de bens e tecnologia sempre que necessário à

política externa dos EUA ou para cumprir suas obrigações internacionais (CTMSP,

2011; MOREIRA, 2013, p. 211).

0

100

200

300

400

500

600

Principais Países Fornecedores de Tecnologia

Jan/Dez 2000 (A) Jan/Dez 2001 (B)

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Figura 2- Cerceamento Tecnológico dos EUA no PROSUB I

Fonte: BEZERRIL, C. P. Índice de Nacionalização de Produtos de Defesa, 2011.

A figura 2 mostra a justificativa apresentada pelo Bureau of Industry and Security do

Departamento de Comércio dos EUA, em 2007, à empresa Toho Tenax America, que não

pôde atender ao pedido de importação de fibra de carbono do Depósito Naval no Rio de

Janeiro. As razões da denegação restringem-se aos itens (A) e (B) da seção 3(2) do EAA. De

acordo com o item (A), os EUA devem “restringir a exportação de bens e de tecnologia que

podem contribuir significativamente para o potencial militar de outro país ou de uma

combinação de países que possam provar-se prejudiciais à segurança nacional dos Estados

Unidos”6. Cabe, discricionariamente, às autoridades políticas do DoC (como no exemplo em

tela), estabelecer o que possa ser considerado prejudicial à segurança nacional estadunidense.

A partir de 2001, as preocupações dos EUA de que armas de destruição em massa

pudessem ser usadas por terroristas ou redes de crime organizado transnacional aumentaram

consideravelmente, gerando a intensificação das imposições restritas ao acesso a

conhecimentos, tecnologia e bens sensíveis (LONGO, MOREIRA, 2009, p. 74).

Para o vice-almirante Carlos Passos Bezerril7 (2011), há duas formas possíveis de

cerceamento tecnológico, por negação de transferência de tecnologia e por negação de

fornecimento de insumos. Ele apresentou o caso do pedido de importação de fibra de carbono

6 No original: “to restrict the export of goods and technology that which would make a significant contribution to

the military potential of any other country or combination of countries which would prove detrimental to the

national security of the United States”. 7 Diretor do Centro Tecnológico da Marinha em São Paulo entre 25 de abril de 2005 e 16 de janeiro de 2015.

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e que o Departamento de Comércio dos EUA não autorizou, conforme a figura 3. Em 2010, o

Brasil tentou comprar controladores (CPUs) dos EUA, onde seria economicamente mais

eficiente; mas foi negado. Nesse caso, a negativa veio acompanhada por esta afirmação do

Departamento de Estado dos EUA: “o governo dos EUA não apoia o programa nuclear naval

autóctone do Brasil” 8.

Figura 3- Cerceamento Tecnológico dos EUA no PROSUB II

Fonte: BEZERRIL, C. P. Índice de Nacionalização de Produtos de Defesa, 2011.

No campo aeroespacial, a empreitada encetada em 1984 por Argentina, Egito e Iraque

para o desenvolvimento do míssil Condor provocou preocupação nos EUA e aos países do G-

79. A reação dos países do G-7 foi uma atuação conjunta, como um cartel de exportadores,

para impedir a proliferação de mísseis. De tal atuação, surgiu, em 1987, o Missile Technology

Control Regime (MTCR). Esse regime funciona “informalmente” e os países membros se

comprometem a desenvolver um sistema de exportação que iniba ou elimine a possibilidade

de transferência de itens sensíveis a países que busquem desenvolver mísseis com capacidade

8 No original: “The U.S. Government does not support Brazil’s indigenous naval nuclear program” (BEZERRIL,

2011). 9 Em 1984, o G-7 era composto por Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido

(SANTOS, 1999, p. 119).

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para transportar cargas superiores a 500 quilos e com alcance de mais de 300 quilômetros

(SANTOS, 1999, p. 120).

De acordo com Santos (1999, 121-122), mesmo antes de 1987, ou seja, antes do

advento do MCTR, o Brasil já era alvo de restrições à transferência de tecnologia e a

importações de material afeto à tecnologia de mísseis e à tecnologia nuclear.

Malgrado o Governo Brasileiro tenha aderido ao MTCR, em telegrama enviado, em

janeiro de 2009, pelo Departamento de Estado dos EUA à embaixada estadunidense em

Brasília, e revelado pelo WikiLeaks ao Jornal O Globo, restou clara a advertência inequívoca

de que o embaixador estadunidense deveria dar às autoridades ucranianas, no sentido de que

“Os EUA não se opõem ao estabelecimento de uma plataforma de lançamentos em Alcântara,

contanto que tal atividade não resulte na transferência de tecnologias de foguetes ao Brasil”

(PASSOS, 2011). Posto que o acordo então entabulado não envolvesse os EUA, houve

pressão desse país para que os ucranianos cerceassem a tecnologia de foguetes no âmbito da

parceria então acertada.

Ao se analisar o cerceamento tecnológico perpetrado pelos países desenvolvidos que

dominam o mercado mundial de defesa, é possível inferir que toda a cadeia produtiva

brasileira é impactada por conta da dificuldade de se desenvolver tecnologias consideradas

críticas na área de defesa. Os EUA, como já demonstrado, lidera o ranking das nações que

mais praticam o cerceamento tecnológico. Dagnino (2010) ao discorrer sobre o tema cita um

caso em que o Brasil sofreu com o embargo estadunidense ao tentar, sem sucesso, obter

tecnologia antirradar10:

Como mostram os despachos do DoD, a tecnologia antirradar não está disponível

para o Brasil por razões de “segurança nacional” estadunidense, pois excede o

nível de “capability” para o país. […] As tecnologias sensíveis de antenas espirais

e channel switches que, segundo o DoD, capacitariam o Brasil para a produção de

mísseis antirradiação, também não foram licenciadas. Elas introduziriam um

potencial de combate na América Latina que contraria os interesses da segurança

nacional dos EUA (DAGNINO, 2010, p. 55).

Muito embora os EUA sejam considerados uma democracia liberal, e, a princípio, um

defensor do livre mercado, seu status de líder de cerceamento no mercado mundial de armas

contrasta com seu discurso político e econômico. Sua liderança no mercado de defesa (viés

econômico) lastreada em seu robusto complexo militar-industrial e as decisões tomadas pelo

10 Brustolin (2014, p. 60) aponta que a tecnologia seria utilizada para produção do míssil tático MAR-1 de

fabricação nacional, cuja finalidade é ser utilizado contra sistemas de defesa antiaérea baseados em terra ou

plataformas marítimas.

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DoD (viés estratégico) são os vetores que seriam capazes de explicar os eventuais motivos do

cerceamento tecnológico exposto acima.

Na história recente, com base nos conceitos de cerceamento tecnológico apontados por

William Moreira (2013, p. 201) que vão além da simples denegação de transferência de

tecnologia, pode-se também qualificar como cerceamento tecnológico o embargo

estadunidense da venda ‘de 24 aviões EMB-314 Super Tucano para a Venezuela em 200611 e

a recente negociação visando a venda para a Nigéria de aviões do mesmo modelo12; porém

com algumas “restrições”13. No caso da proibição da venda do Super Tucano à Venezuela

pelos EUA em razão de os aviões possuírem tecnologia de computadores estadunidense

(ROSSI, 2015, p. 63), a Embraer perdeu um negócio praticamente certo, tendo o governo

venezuelano optado por adquirir aviões e outros equipamentos militares da Rússia e da

Bielorrússia (PEDONE, 2009).

O Exército Brasileiro também sofreu cerceamento no início dos anos 80 (oitenta) ao

adquirir e pagar uma empresa estadunidense para receber instrumentos de medição e de

simulação de parâmetros balísticos. O material comprado foi embargado sem qualquer

justificativa do governo dos EUA e os recursos despendidos, devolvidos. Em período mais

recente, foram enviados dois giroscópios da aeronave “Black Hawk” para reparo nos EUA.

Após o reparo, foi exigido que o Brasil assinasse um termo de “end user14”, sendo que o

referido documento já havia sido assinado quando da aquisição do helicóptero junto aos EUA

(BRASIL, 2011).

Brustolin (2014, p. 54-58) dá muitos exemplos de situações em que o Brasil foi

cerceado de forma unilateral pelos EUA em diversas oportunidades, ao tentar, sem sucesso,

obter tecnologias necessárias para o desenvolvimento de programas militares. Dentre tais

tentativas, cabe destaque ao pedido de aquisição de filtros de carbono utilizados em rotores de

centrífugas nucleares realizado, em 2007, e rejeitado sob o argumento “de proteger a

segurança nacional dos EUA perante qualquer outro país ou combinação de países”.

11 Disponível em: <https://www.flightglobal.com/news/articles/venezuela-claims-us-embargo-204098/>. Acesso

em 25 jan. 2018. 12 Disponível em: <http://www.aereo.jor.br/2016/11/14/eua-bloqueiam-venda-de-avioes-a-29-super-tucano-para-

a-nigeria/>. Acesso em 30 jan. 2018. 13 De acordo com a mídia, os Departamentos de Estado (Exterior) e de Defesa dos Estados Unidos acordaram

que os americanos não farão o treinamento das equipes de manutenção dos monomotores, e nem permitirão que

os nigerianos tenham acesso a detalhes da construção dos aviões. 14 End user é um termo utilizado para que o comprador de determinado equipamento militar estadunidense se

comprometa a não utilizar repassá-lo para outros usuários.

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Mesmo quando os EUA encetaram acordos de transferência de tecnologia por meio de

offsets, como no caso do recebimento da tecnologia necessária para a produção e montagem

de estabilizadores verticais e de pilones das aeronaves F-5E, em 1974, uma parceria, então

estudada entre as equipes do Centro Tecnológico da Aeronáutica (CTA), EMBRAER e

Northrop para a produção local da aeronave não conseguiu ser concretizada por motivos

alheios aos interesses brasileiros. As raras práticas de offsets tecnológicos por parte dos EUA

tinham o fito de consolidar sua influência sobre os países do Ocidente, afastando-os de

produtos soviéticos, além criarem certa dependência em razão do controle exercido sobre os

produtos oferecidos (MODESTI, 2004, p. 26-31).

2. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Mesmo após iniciativas multilaterais de controle do comércio de armamentos, tal

como o Arms Trade Treaty (ATT), aprovado em 2013, no âmbito da ONU, e ainda não em

vigor, uma eventual desregulamentação ou pelo menos uma flexibilização no ordenamento

jurídico estadunidense não parece uma possibilidade crível que, em um futuro próximo, os

EUA adotem uma legislação menos restritiva e cerceadora de tecnologia militar ou

multipropósito.

A postura estadunidense deixa uma série de questões a serem esclarecidas quando o

assunto envolve a venda e a transferência de tecnologia, especialmente as de característica

multipropósito, como no caso dos aviões da ALX Super-Tucano, que é produzido pela

EMBRAER. Não raramente, o governo brasileiro deparava-se com restrições oriundas do

governo dos EUA, o que pode ser flexibilizado agora que a empresa goza de uma parceria

com a empresa Sierra-Nevada, localizada no estado da Flórida.

Do mesmo modo, para os defensores da adesão brasileira aos principais regimes

internacionais, segue o raciocínio do argumento de que a assinatura do TNP e de tratados

congêneres trariam ao Brasil uma espécie de garantia de paz regional e de acesso ao mercado

das tecnologias sensíveis, transformando a assinatura do TNP em uma espécie de política

pública canalizadora de fomentos para o desenvolvimento da indústria nacional; o país, pois,

sofreria menos denegação de material de alta complexidade e de alta tecnologia.

Por mais que tanto os EUA quanto o Brasil possuam instrumentos regulatórios na área

de fabricação e exportação de produtos de defesa, a estrutura burocrática protetiva e os

instrumentos legislativos estadunidenses fomentadores do cerceamento tecnológico mostram-

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se bem mais estruturados e complexos. Os EUA, como país detentor do posto de maior

vendedor de armas no mundo, demonstram contradição ao bradar pelo liberalismo econômico

e livre mercado, ao passo que procuram cercear tecnologicamente eventuais concorrentes no

mercado de armas, utilizando mecanismos unilaterais que tem como objetivo mitigar o

desenvolvimento da BID de nações com as quais mantêm boas relações, em sinal claro de

protecionismo econômico e industrial.

Percebe-se que a generalidade dos critérios estabelecidos na legislação doméstica dos

EUA favorece a discricionariedade dos órgãos de controle, estabelecendo o cerceamento

tecnológico que perpassa o viés meramente estratégico-militar e denota ambições e

protecionismos comerciais. Essa opacidade do processo de fiscalização, por sua vez, favorece

um alto nível de politização das decisões. Não bastando, dessa forma, cumprir os regimes

internacionais e suas salvaguardas; é preciso, além disso, manter boas relações políticas com

os EUA, a fim de ter acesso a tecnologias sensíveis.

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