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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA UNICURITIBA FACULDADE DE DIREITO DE CURITIBA KAROLINE APARECIDA BECKER DAS GRAÇAS CANNABIS SATIVA DESCRIMINALIZAÇÃO E LEGALIZAÇÃO NO BRASIL CURITIBA 2019

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CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA – UNICURITIBA

FACULDADE DE DIREITO DE CURITIBA

KAROLINE APARECIDA BECKER DAS GRAÇAS

CANNABIS SATIVA – DESCRIMINALIZAÇÃO E LEGALIZAÇÃO NO BRASIL

CURITIBA 2019

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KAROLINE APARECIDA BECKER DAS GRAÇAS

CANNABIS SATIVA – DESCRIMINALIZAÇÃO E LEGALIZAÇÃO NO BRASIL

Monografia apresentada como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito, do Centro Universitário Curitiba. Orientador: Mário Luiz Ramidoff

CURITIBA 2019

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KAROLINE APARECIDA BECKER DAS GRAÇAS

CANNABIS SATIVA – DESCRIMINALIZAÇÃO E LEGALIZAÇÃO NO

BRASIL

Monografia aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel

em Direito da Faculdade de Direito de Curitiba, pela Banca Examinadora

formada pelos professores:

_________________________________

Orientador: Mário Luiz Ramidoff

_________________________________

Professor (a) Membro da Banca

Curitiba, de de 2019.

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, à minha mãe, pelo apoio incondicional, ao qual serei

eternamente grata.

A todos os meus familiares, que mesmo longe, de alguma forma contribuíram

para conclusão desta etapa.

Ao meu orientador Des. Mário Luiz Ramidoff, pelo exemplo, pelas palavras de

incentivo e profissionalismo, que tornaram possível a conclusão desta

monografia.

Às minhas amigas e amigos que se fizeram presentes nesta jornada, pela

amizade, palavras e gestos de encorajamento. Um agradecimento especial à

minha amiga Juliane Ogiboski, pela paciência, ajuda e por todas as palavras

de incentivo.

À família 13ª Vara Criminal de Curitiba, pelas oportunidades, conversas,

companheirismo e pelos ensinamentos, que só me fizeram amadurecer.

Certamente vocês também fazem parte disso.

Obrigada!

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“Falaram que eu sou a favor da liberação da

maconha! Ora, não sou não! A maconha já está

liberada, na mão do tráfico, vendida em péssima

qualidade e sem orientação! Eu sou a favor da

descriminalização e consequente regulamentação da

produção, da venda e da compra, tudo na lei!”

- Luís Carlos Valois

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RESUMO

O presente trabalho trata da maconha, trazendo elementos de sua história até a efetiva chegada ao Brasil, em meados do ano de 1549, as correntes proibicionistas e influencias internacionais recepcionadas, sendo apresentadas ainda, as falhas do sistema utilizado, tais como ausência de diferenciação entre os tipos de usuários a ausência de critério objetivo para distinguir o usuário do traficante. Para chegar às razões da descriminalização e legalização, foram trazidos casos práticos de países que já legalizaram e hoje colhem bons resultados - Estados Unidos, Canadá, Portugal e Uruguai. São inúmeras as razões para descriminalizar, contudo, foram abordados em especial, a falência do sistema penitenciário, o direcionamento policial e o desrespeito aos direitos fundamentais. A fim de concluir os estudos, também foram feitas contestações aos argumentos contrários à descriminalização e legalização da maconha no país – saúde pública inexistente; aumento de consumo; efeitos no trânsito; e aumento da violência. Conclui-se que mudar as atuais políticas de repressão e encarceramento em massa, é necessário e se apresenta como medida de urgência – a melhor forma de incentivar o abandono do consumo, e através da descriminalização. Palavras-chave: Chegada da Cannabis no Brasil. Saúde pública. Direitos Fundamentais. Proibicionismo. Descriminalização e legalização da maconha.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...................................................................................................7 1 HISTÓRIA DA CANNABIS SATIVA E SUA CHEGADA NO BRASIL .......... 8 1.1 RAÍZES DA PROIBIÇÃO E O ATUAL CENÁRIO ....................................... 9 1.2 PREVISÃO LEGAL .................................................................................... 12 2 A LEGALIZAÇÃO DA MACONHA PELO MUNDO ..................................... 15 2.1 ESTADOS UNIDOS ................................................................................... 15 2.2 CANADÁ .................................................................................................... 17 2.3 PORTUGAL ............................................................................................... 18 2.4 URUGUAI .................................................................................................. 20 3 DESCRIMINALIZAÇÃO E LEGALIZAÇÃO DA MACONHA NO BRASIL .. 23 3.1 O PROIBICIONISMO FOI UM ERRO INTERNACIONAL ......................... 23 3.2 DROGAS E O CONTROLE SOCIAL – DROGAS X ALIMENTOS ............ 25 3.2.1 PADRÕES DE USO................................................................................ 29 3.3 FALÊNCIA DO SISTEMA PENITENCIÁRIO ............................................. 31 3.4 AFRONTA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS ................................. 36 3.4.1 PRINCÍPIO DA ISONOMIA .................................................................... 38 3.4.2 PRINCÍPIO DA PRIVACIDADE .............................................................. 41 3.4.3 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA ................................................................. 42 3.4.4 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE .............................................. 45 3.3 DIRECIONAMENTO POLICIAL ................................................................. 47 4 CONTESTAÇÃO AOS ARGUMENTOS CONTRÁRIOS ............................. 50 4.1 SAÚDE PÚBLICA ...................................................................................... 50 4.2 AUMENTO DO CONSUMO ....................................................................... 51 4.3 EFEITOS NO TRÂNSITO .......................................................................... 52 4.4 AUMENTO DA VIOLÊNCIA ....................................................................... 52 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................ 54 REFERÊNCIAS ............................................................................................... 56

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INTRODUÇÃO

A Cannabis Sativa, popularmente conhecida como maconha, é uma

planta herbácea, amplamente cultivada em diversas partes do mundo, tendo

chegado ao Brasil por volta do ano de 1549 e usada por músicos, boêmios,

caiçaras, agricultores e índios.

O presente estudo abordara as correntes proibicionistas que levaram o

país a seguir a repressão como ideal, a fim de que seja possível compreender

a dinâmica aplicada e as influências internacionais recepcionadas. Nesse

contexto, serão expostas as falhas do sistema atualmente utilizado, tais como

ausência de diferenciação entre os tipos de usuários a ausência de critério

objetivo para distinguir o usuário do traficante.

No capítulo 2, serão expostas as mudanças no cenário internacional,

com a mudança das ideias proibicionistas e a consequente descriminalização

e legalização da maconha nos Estados Unidos, Canadá, Portugal e Uruguai.

Já no capítulo 3, será abordado o assunto principal da presente

monografia, a descriminalização, legalização, esta ultima com a consequente

regulamentação da maconha no Brasil, demonstrando suas diferenças e

consequências.

Primeiramente, serão abordados os aspectos da historia da utilização

da maconha pela humanidade e as semelhanças com substâncias que hoje

possuem dados de dano muito maiores que a maconha, porém, são

socialmente aceitos.

Em seguida, serão demonstrados em subcapítulos, as razões para tal

estudo, levando em consideração temas como falência do sistema

penitenciário e o desrespeito aos direitos fundamentais.

Por fim, serão tratados os argumentos contrários à descriminalização e

legalização da maconha no país, com o intuito de demonstrar que um dos

melhores meio de combater o consumo da maconha, e até mesmo de outras

drogas, é através da descriminalização e legalização.

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1 HISTÓRIA DA CANNABIS SATIVA E SUA CHEGADA NO BRASIL

A Cannabis Sativa, popularmente conhecida como maconha, é uma

planta herbácea, amplamente cultivada em diversas partes do mundo – seu

nome foi outorgado pelo botânico sueco Carl Lineu no ano de 1735 e possui

mais de 25.000 usos catalogados. Conforme vocabulário jurídico:

“Substância entorpecente extraída do cânhamo (cannabis sativa), cuja variante é a cannabis indica, da qual se extrai outro entorpecente, o haxixe. Popularmente é a chamada de maconha de baseado, diamba, erva, fumo de angola e outros.”

1

Seus primeiros registros de uso são na fabricação de tecido e papal

(8.000 anos a.C) na Ásia Central, sendo que suas fibras eram chamadas de

cânhamo. Também há registros do seu uso medicinal, razão pela qual os

nômades levavam sementes da planta para onde se deslocavam, levando a

disseminação da planta, vez que a planta cresce nas condições mais

diversas.

Ainda, a maconha possui espaço no meio religioso, como exemplo a

Mahayana, uma das principais correntes atuais do Budismo. Segundo

informações históricas, Buda, durante um período da vida, teria se alimentado

exclusivamente de sementes de Cannabis, todavia, em alguns livros de outras

tradições budistas, tal informação é alterada substituindo a maconha por

arroz.

Já nos séculos XV e XVI, a planta existia em grande parte do mundo,

havendo livros que relatam que os navios de Cristóvão Colombo

transportavam sementes da planta. Seu plantio foi ordenado pela Coroa

Espanhola e Portuguesa, a fim de garantir o suprimento de tecidos2 para as

velas dos navios durante suas expedições.

No Brasil, teria sido trazida pelos escravos importados de Angola, por

volta do ano de 1549. Durante a colonização sua utilização logo se espalhou,

1 SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. 23

a Ed. Ribeirão Preto/SP: Forense, 2007, p.

871-872. 2 BURGIERMAN, Denis Russo. Maconha. São Paulo, Editora Abril: Coleção para Saber Mais,

2002, p. 22-23.

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sendo usada por músicos, boêmios, caiçaras, agricultores e índios, mas

sempre de uma forma marginal, conforme registros de boletins de ocorrência

da época, a maconha seria ―droga de pobre‖ 3.

1.1 RAÍZES DA PROIBIÇÃO E O ATUAL CENÁRIO

Disseminada a maconha e demais substâncias por todo o globo e as

discussões acerca do uso, foi realizada a primeira ação de combate a fim de

proibir à produção, distribuição e consumo de substâncias psicoativas foi

abordada na Convenção Internacional sobre o Ópio, organizada pela Liga das

Nações, em Haia, no ano de 1912, a qual recomendava aos Estados

signatários que examinassem a possibilidade da criminalização da posse de

morfina, ópio, cocaína e seus derivados – ressalta-se que nesta ocasião, a

maconha não estava na lista de substâncias e a principal substância a ser

combatida na época era o ópio.

A maconha só entrou na lista de substâncias a serem combatidas na II

Conferência Internacional do Ópio realizada na cidade de Genebra, no ano de

1925, após influencias do Dr. Pernambuco4, psiquiatra brasileiro, o qual

alegou que a maconha seria ainda mais perigosa que o ópio, ocasionando

grande influencia a criminalização da planta no Brasil e no mundo. Ato

contínuo, em 1931, foi realizado a Convenção de Genebra, que

regulamentaria as duas convenções internacionais anteriores, ocasião que o

mundo avançava para uma ideologia proibicionista.

As convenções realizadas possuíram cunho meramente mercantil,

longe do caráter humanitário que se esperava, tendo em vista o crescente

consumo do ópio na época – ideal de proibição que foi caminhando para

proibição das demais substâncias. Nesse sentido, afirma Luís Carlos Valois:

“É evidente que as discussões sobre as drogas tinham muito pouco a ver com objetivos humanitários. Os países envolvidos nos

3 BURGIERMAN, Denis Russo. Maconha. São Paulo, Editora Abril: Coleção para Saber Mais,

2002, p. 23-24. 4 Disseminava a ideia da proibição da maconha juntamente com pensamentos racistas e

escravocratas, através da ideia de superioridade de raças.

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primeiros debates e seus respectivos representantes sabiam muito pouco sobre drogas e a tendência norte-americana ao proibicionismo não ajudava, como não ajuda ainda hoje, no esclarecimento necessário para a elaboração de uma legislação coerente sobre o assunto, prevalecendo o ímpeto da defesa dos

interesses comerciais.” 5

No Brasil, país extremamente influenciado por corrente do exterior,

subdesenvolvido e que busca copiar ideias internacionais, após a realização

da primeira Convenção, entrou em vigor o Decreto nº 4294/1921, com o

intuito de punir o comércio de substâncias entorpecentes – aqui, a maconha

não entrou na lista de substâncias ilícitas, e em 1932 entrava em vigor o

Decreto nº 20.930, o qual acrescentou a lista de substâncias tóxicas, a

―canabis indica‖ 6, bem como, passou a penalizar também os usuários das

substâncias.

Aqui, a meu ver, em meio a todo contexto histórico, esta um dos

maiores problemas no proibicionismo, o qual não pensa em nada além da

proibição em massa de toda e qualquer substância considerada tóxica. Veja-

se que neste momento o usuário ocasional, o habitual, bem como o usuário

problemático são tipificados como sendo iguais e, consequentemente,

passaram a ser tratados de uma única forma. Tal problema será tratado de

forma mais aprofundada nos próximos capítulos.

Já no ano de 1938, foi publicado o Decreto-Lei nº 891, o qual constituiu

a toxicomania como doença, passível de internação civil e interdição. No ano

de 1940, entra em vigor o Código Penal, prevendo como crime o tráfico de

entorpecentes em seu artigo 281.

Em 1968, na vigência da ditadura militar, através da alteração do artigo

281 do Código Penal e do Decreto-Lei nº 385, o usuário foi equiparado ao

traficante, condição que perdurou até a publicação da Lei nº 6.368 no ano de

1976, a qual vigorou até meados do ano de 2002, quando foi sancionada a

5 VALOIS, Luís Carlos. O direito penal da guerra às drogas – 2ª Ed. - Belo Horizonte: Editora

D’plácido, 2017, p. 71. 6 BRASIL. Decreto nº 20.930, de 11 de janeiro de 1932. Disponível em:

https://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930-1939/decreto-20930-11-janeiro-1932-498374-publicacaooriginal-81616-pe.html. Acesso em 31/03/2019.

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Lei 10.409/2002. Esta lei sofreu tantos vetos e críticas que é citada como um

fracasso jurídico.7

Aceca da Lei, Renato Marcão disse:

"Estamos diante de uma Lei que, a pretexto de melhorar a antiga sistemática da Lei 6.368/76 não a revogou. Não define crimes; estabelece um procedimento que não se aplica a nenhuma hipótese, a nenhum delito; não trata de inúmeras questões inevitáveis, que permanecem regidas pela Lei 6.368/76, como as pertinentes à semi-imputabilidade e inimputabilidade, tratadas nos arts. 19 e 29 do Diploma que se pretendeu minimizar como superado. Além de não ajudar na prevenção e repressão dos crimes envolvendo produtos, substâncias ou drogas ilícitas que causem dependência física ou psíquica, a Nova Lei só veio tumultuar ainda mais a questão e proporcionar mais impunidade. Em se tratando de um Projeto que tramitou desde 1991, é inaceitável uma Lei tão ruim, péssima sob quase todos os aspectos, e pior que o texto do Projeto sancionado em parte, somente a ausência de

coragem e vocação jurídica de quem não o vetou completamente.” 8

Já em agosto de 2006, foi sancionada a Lei nº 11.343, a qual retirou a

pena de prisão para os usuários e para quem plantar pequena quantidade de

maconha para uso próprio. Desta forma, os usuários são passiveis a medidas

socioeducativas, tais como advertência sobre os efeitos da substância,

prestação de serviços à comunidade e participação em programas ou cursos

educativos.

A lei de tóxicos ainda esta em vigor e permanece omissa, ao passo que

não estipula critérios objetivos para delimitar o que seria a quantidade a ser

considerada para uso (art. 28), do que é tráfico de drogas (art. 33) deixando

tal critério nas mãos de policiais, promotores e juízes que definem tal critério

de acordo com o artigo 28, §2, da lei:

Ҥ 2o Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o

juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às

7 BARROS, André. PERES, Marta. Proibição da maconha no Brasil e suas raízes históricas

escravocratas. Revista Periférica. Volume II, Número II. Disponível em: https://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/periferia/article/viewFile/3953/2742. Acesso em 03/04/2019. 8 MARCÃO, Renato Flávio. Anotações pontuais sobre a lei n° 10.409/2002 (nova lei

antitóxicos). Procedimentos e instrução criminal. Disponível em: www.jus.com.br/artigos/2712, p. 14. Acesso em 04/12/2018.

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circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos

antecedentes do agente.”9

Atualmente, tramita no Superior Tribunal Federal o Recurso

Extraordinário 635.659, o qual foi interposto após sentença condenatória com

fulcro no artigo 28, da Lei 11.343/2006, em face do sentenciado flagrado no

interior de uma unidade prisional do Estado de São Paulo, com 3 gramas de

maconha.

O Recurso foi interposto pela Defensoria Pública, tendo como

fundamento o artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal que torna inviolável

a intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas, a fim de que seja

declarada a inconstitucionalidade da pena aplicada e por consequência, a

inconstitucionalidade do artigo 28, da lei de drogas.

O Ministro Gilmar Mendes é o relator do Recurso Extraordinário e já

apresentou seu voto, além dele os Ministros Luiz Edson Fachin e Luís

Barroso já votaram, todos favoráveis a declaração de inconstitucionalidade do

artigo 28, da Lei 11.343/2006.

O julgamento encontra-se suspenso após o deferimento do pedido de

vistas do então Ministro Teori Zavascki, falecido no ano de 2017.

1.2 PREVISÃO LEGAL

No ano de 1988 a Constituição da República Federativa do Brasil

colocou o delito de tráfico de entorpecentes no rol dos crimes inafiançável e

insuscetível de anistia e graça (cf. artigo 5º, inciso XLIII), a fim de assegurar

uma maior repressão criminal e encarceramento.

O artigo 16, da Lei n.º 6.368/76 previa pena de 06 meses a 02 anos de

prisão para o delito de porte de drogas para uso pessoal. A nova Lei n.º

11.343/2006 modificou o tratamento dado aos usuários e passou a punir de

forma mais severa a prática do tráfico, a fim de despenalizar o consumidor de

9 BRASIL. Lei de Drogas nº 11.343 de 23 de agosto de 2006. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm. Acesso em 31/03/2019.

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drogas, passando a prever sanções alternativas à pena privativa de liberdade

– em seu artigo 28, prevê:

“Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I - advertência sobre os efeitos das drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo. § 1

o Às mesmas medidas submete-se quem, para seu consumo

pessoal, semeia, cultiva ou colhe plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de substância ou produto capaz de causar dependência física ou psíquica. § 2

o Para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o

juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente. § 3

o As penas previstas nos incisos II e III do caput deste artigo

serão aplicadas pelo prazo máximo de 5 (cinco) meses. § 4

o Em caso de reincidência, as penas previstas nos incisos II e III

do caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo de 10 (dez) meses. § 5

o A prestação de serviços à comunidade será cumprida em

programas comunitários, entidades educacionais ou assistenciais, hospitais, estabelecimentos congêneres, públicos ou privados sem fins lucrativos, que se ocupem, preferencialmente, da prevenção do consumo ou da recuperação de usuários e dependentes de drogas. § 6

o Para garantia do cumprimento das medidas educativas a que

se refere o caput, nos incisos I, II e III, a que injustificadamente se recuse o agente, poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a: I - admoestação verbal; II - multa. § 7

o O juiz determinará ao Poder Público que coloque à disposição

do infrator, gratuitamente, estabelecimento de saúde, preferencialmente ambulatorial, para tratamento especializado. Art. 29. Na imposição da medida educativa a que se refere o inciso II do § 6

o do art. 28, o juiz, atendendo à reprovabilidade da conduta,

fixará o número de dias-multa, em quantidade nunca inferior a 40 (quarenta) nem superior a 100 (cem), atribuindo depois a cada um, segundo a capacidade econômica do agente, o valor de um trinta avos até 3 (três) vezes o valor do maior salário mínimo. Parágrafo único. Os valores decorrentes da imposição da multa a que se refere o § 6

o do art. 28 serão creditados à conta do Fundo

Nacional Antidrogas. Art. 30. Prescrevem em 2 (dois) anos a imposição e a execução das penas, observado, no tocante à interrupção do prazo, o disposto

nos arts. 107 e seguintes do Código Penal.”10

10 BRASIL. Lei de Drogas nº 11.343 de 23 de agosto de 2006. Disponível em:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm. Acesso em 31/03/2019.

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A Lei criou o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas

(Sisnad), que “prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e

reinserção social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para

repressão à produção não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá

outras providências.”

Quando de sua aprovação a Lei foi vista como um avanço ao trazer

princípios e diretrizes para a politica de drogas, afastando, em tese, à

finalidade principal de repressão, a partir da criação do Sisnad, para um

paradigma proibicionista moderno e atual, com reconhecimento de estratégias

de redução de danos.

Com a nova lei, foi proibida a aplicação de pena privativa de liberdade

para os usuários de entorpecentes e para o traficante, aquele enquadrado no

artigo 33, da Lei, teve um enrijecimento ainda maior, claramente para uma

ampliação da dita “guerra às drogas”, com o aumento da pena mínima de 03

(três) para 05 (cinco) anos, mantendo o patamar máximo em 15 (quinze) anos

de reclusão, cumulado com aplicação de multa.

Ainda que o tratamento dado aos usuários de drogas ao longo de

tantos anos tenha sido de certa maneira, flexibilizado pela lei em vigência,

Pierpaolo Botinni, esclarece que a lei “mantém o desvalor penal do

comportamento, não retira sua natureza delitiva, nem o caráter estigmatizante

da incidência da norma penal.‖11

Senso assim, permanecendo o entendimento de que a conduta do

usuário é um ilícito penal, Pierpaolo afirma que há uma “intensa reação social

informal sobre os consumidores de entorpecentes, dificultando sua

recuperação e submetendo-os a tratamentos degradantes por parte de

autoridades policiais e pela própria Justiça.”12

11 BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Porte de Drogas para Uso Próprio e o Supremo Tribunal

Federal. 1ª ed. 2015. p.29-30. Disponível em: <http://vivario.org.br/wp-content/uploads/2015/06/Livro_Pierpaolo-Online-11.pdf>. Acesso em: 03.04.2019. 12

Ibid.

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2 A LEGALIZAÇÃO DA MACONHA PELO MUNDO

Antes de adentrarmos nos motivos e esclarecer o porquê a

descriminalização e consequente legalização são necessárias no Brasil, é

oportuno demonstrarmos o atual cenário da legalização pelo mundo.

2.1 ESTADOS UNIDOS

Os Estados Unidos da América são uma república constitucional

federal composta por 50 estados e um distrito federal. Desde o início da

década de 70, os Estados Unidos se utilizaram da repressão às drogas para

traçar objetivos jurídico-político favoráveis ao aumento do país como potência

mundial através de um maior intervencionismo no exterior, em especial na

América Latina.13

A partir do discurso “war on drugs”, o país começou a repressão como

medida de ―proteção do Estado‖ e diante da grande influência mundial, os

países latino-americanos foram praticamente obrigados a adequar-se as

novas diretrizes americanas, sob pena de sanções. “Os países andinos,

principais produtores de coca, foram alvo preferencial de ações norte-

americanas destinadas a reduzir a produção, inclusive com o envolvimento

direto de efetivos militares”14.

Somente no ano de 2012, o país teve suas primeiras experiências com

a legalização, ocasião em que a planta foi liberada para uso recreativo no

Estado do Colorado, através de uma Emenda Constitucional, situação que

gerou novos negócios e empregos envolvendo o cultivo e a venda de

maconha – hoje já são dez Estados que optaram pela legalização.

A primeira loja a comercializar maconha foi oficialmente aberta no dia

1º de janeiro de 2014 e desde então há registros de que já foram vendidos

13 SILVA, Marco Aurélio da Política Pública Carcerária: Uma Institucionalizada Violação

de Direitos Fundamentais Impulsionada pela Criminalização das Drogas. Capítulo 2, p. 239-240. Revista Eletrônica do Curso de Direito da UFSM, v. 09, n. 02, 2014. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/revistadireito/article/view/13018/pdf#.V-. Acesso em 03/04/2019. 14

PROCÓPIO FILHO, Argemiro. VAZ, Alcides Costa. O Brasil no Contexto do Narcotráfico Internacional. Revista Brasileira de Política Internacional. Vol. 40, n. 1, Brasília, 1997, p. 101.

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US$ 6 bilhões em maconha recreativa, dos quais US$ 1,5 bilhão corresponde

ao ano de 2017.15

As atividades econômicas também apresentaram um crescimento

significativo no Estado em comparação aos outros Estados que ainda não

legalizaram a maconha. Ademais, a regulamentação gera milhões em

impostos ao Estado.

Já no ano de 2016, outros oito Estados norte-americanos decidiram

através de plebiscito, pela legalização da maconha para uso medicinal e

recreativo.

Em novembro do mesmo ano, a Califórnia, através de referendo

também legalizou a maconha para o comércio, colocando regras para acesso

a planta, tais como, somente maiores de 21 anos podem comprar, determinou

a quantidade permitida por pessoa, proibiu o consumo durante a direção,

proibiu o consumo em público e a menos de trezentos metros de colégios ou

parques infantis, mesmas regras validas para o tabaco e é proibido sair do

Estado de posse de maconha, ainda que seja em para outro Estado que a

substância seja legalizada.

Em declaração à Agência Efe Kristi Kelly, diretora-executiva do Grupo

da Indústria da Maconha, afirmou que graças à cooperação da indústria com

as autoridades estatais, as forças da ordem e a comunidade, "as coisas

funcionaram bem" – Faz cinco anos desde a legalização.

Contou ainda, que a maconha recreativa comercializada no Estado do

Colorado é submetida a "um sistema altamente regulado, com requisitos de

verificação, empacotamento e etiquetagem, assim como regras de

segurança".16

Hoje, a Califórnia movimenta e é responsável pelo maior mercado de

maconha do mundo e o atual momento é dito pelos defensores da legalização

como um marco sem volta para a descriminalização.

15 EFE. Maconha legal completa 5 anos no Colorado lucrativa, mas questionada. O Estado

de São Paulo. 01.jan.2019. Disponível em: https://internacional.estadao.com.br/noticias/eua,maconha-legal-completa-5-anos-no-colorado-lucrativa-mas-questionada,70002663146. Acesso em 20/03/2019. 16

Idem.

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17

2.2 CANADÁ

A proibição total no Canadá ficou vigente desde o ano de 1923 até sua

relativização no ano de 2001, quando foi autorizado o uso da maconha para

fins medicinais.

No último ano, o primeiro-ministro do Canadá Justin Trudeau cumpriu

uma das suas mais importantes e aguardadas promessas de campanha, a de

legalizar a maconha. O Senado aprovou a legalização da maconha com 52

votos a favor, 29 votos contra e duas abstenções, autorizando a livre

produção e consumo da planta, tendo o chamado ―projeto de lei C-45‖,

entrado em vigor em 17 de outubro de 2018.17

Assim, o Canadá se torna, oficialmente, o primeiro país do G20 – 20

maiores potências mundiais – a liberar o consumo e a produção da maconha.

Um dos grandes motivos para legalização foi o fracasso na política de drogas

e a aproximação das substâncias ao consumo dos jovens, os quais possuíam

livre acesso ao mundo dos ilícitos, fazendo-se necessária a mudança das

medidas. Nesse sentido, o jornal El País, em uma de suas notícias a respeito

da legalização, entrevistou um Colombiano de 43 anos, residente no Canadá

há 08 anos, o qual relata a existência de um preconceito social e a violência

que a falta de legalização acarreta:

“J.C. é colombiano e tem 43 anos de idade, oito deles vivendo no Canadá, onde trabalha numa empresa que faz reformas. Prefere só se identificar com as iniciais. “Ainda há muito estigma social. Algumas pessoas acham que você não é sério se fumar”, comenta. Consome a erva umas três vezes por semana e a adquire por meio de um amigo que conhece um vendedor. “Comprarei a maconha nas lojas legais. É um acerto que as autoridades se encarreguem de regulá-la. Lembro todo esse cenário de

violência e narcotráfico na Colômbia.” [grifo]18

17 ARAUJO, Tarso. Como funciona a legalização da maconha no Canadá?. Blog Super

Interessante. 17.out.2018. Disponível em: https://super.abril.com.br/blog/psicoativo/como-vai-ser-a-legalizacao-da-maconha-no-canada/. Acesso em 14/11/2018. 18

PORRAS FERRAYRA. Jaime. Canadá afina regras e dá início à venda legal de maconha. El País – Montreal. 17.out.2018. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2018/10/16/internacional/1539670424_958219.html. Acesso em 14/11/2018.

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18

A regulamentação da produção tem vigência federal e a lei estipulou

que a maconha seja produzida por empresas autorizadas, tais como as

empresas que já são responsáveis pelo cultivo da Cannabis para fins

medicinais. Na prática, a comercialização é feita para pessoas maiores de 18

anos – a lei autoriza que outros estados e/ou províncias modifiquem esta

idade, a qual pode adquirir até 30 gramas de maconha por vez – o máximo

que se pode portar na rua. As regras também valem para os turistas e o

consumo não pode ser feito em locais onde o fumo de modo geral, também é

restrito.19

O compartilhamento é plenamente livre, porém, deve ser entre adultos

e de forma gratuita, sob pena de multa de até 5 mil dólares. Quem é pego

dirigindo sob efeito da maconha também pega multa, está que é de 750

dólares, na primeira infração; na segunda, a pena é de 30 dias de prisão e,

nas seguintes, de 120 dias de cadeia. Em caso de acidente com vítima, o

motorista pode pegar até prisão perpétua, se comprovado que estava

chapado enquanto dirigia.

Ademais, é permitido o cultivo de até quatro pés de maconha - de até

um metro, para consumo pessoal, desde que as plantas não sejam exibidas

publicamente – províncias e outros estados também são autorizados a banir o

cultivo individual.20

2.3 PORTUGAL

Desde o ano de 2000, o país realiza reformas legislativas, com o intuito

de diferenciar a conduta de tráfico de drogas do consumo. A Lei nº 30 do dia

29 de novembro de 2000 determina que ―o consumo, a aquisição e a

detenção para consumo próprio de plantas, substâncias ou preparações

19 ARAUJO, Tarso. Como funciona a legalização da maconha no Canadá?. Blog Super

Interessante. 17.out.2018. Disponível em: https://super.abril.com.br/blog/psicoativo/como-vai-ser-a-legalizacao-da-maconha-no-canada/. Acesso em 14/11/2018. 20

Idem.

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19

caracterizadas como drogas deixa de ser crime e passa a ser contra-

ordenação (ilícito administrativo)”21.

Por meio da descriminalização, visa à filosofia da redução de danos e

assim, cerca de 90% dos recursos que iam para o combate ao tráfico são

repassados para o tratamento e programas de prevenção ao uso de

entorpecentes. Portugal descriminalizou todos os tipos de droga em 2001 e

desde então, os usuários que são flagrados com substâncias entorpecentes

(ecstasy, heroína, crack, cocaína, maconha, entre outras) são tratados como

doentes.22

Dessa forma, Isaac Sabbá Guimarães define o regime legal de Portugal

quanto ao dependente químico como uma despenalização controlada23.

O sistema de legalização da maconha implantado em Portugal é

considerado como um dos melhores do mundo, vez que considera tratar os

dependentes muito mais importante do que prender os traficantes.24

Frisa-se que no país, ser pego de posse de uma substância

entorpecente acarreta consequências, contudo, tal ato não é visto como um

delito – aqui, trata-se da proposta para o Brasil, tratar os dependentes

problemáticos (não consegue usar de forma habitual ou esporádica, ou seja,

precisa de cuidados e tratamentos para o vício – claro, desde que o mesmo

queira este tratamento) e continuar com o combate ao tráfico. Tema para os

próximos capítulos.

Dito isso, cabe esclarecer que o usuário que for pego pela polícia

portando qualquer tipo de droga é encaminhado a Comissão de Dissuasão da

21 PORTUGAL. Lei nº 30, de 29 de novembro de 2000. Disponível em:

https://dre.pt/pesquisa/-/search/599720/details/maximized. Acesso em 03/04/2019. 22

GERALDO, Nathália. Estes 4 lugares legalizaram uso da maconha; o que mudou após liberação da droga?. Vix. Sem data de publicação. Disponível em: https://www.vix.com/pt/mundo/539839/estes-4-lugares-legalizaram-uso-da-maconha-o-que-mudou-apos-liberacao-da-droga. Acesso em 15/11/2018. 23

GUIMARÃES, Isaac Sabbá. Nova Lei Antidrogas Comentada: Crimes e Regime Processual Penal. 4ª ed. Curitiba: Juruá, 2010. p. 33. 24

MENDES, Oro. 14 anos após descriminalizar todas as drogas, é assim que Portugal está no momento. Awebic. 07.fev.2018. Disponível em: https://awebic.com/democracia/como-portugal-descriminalizou-as-drogas-e-e-um-exemplo-para-o-mundo/. Acesso em 15/11/2018.

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Toxicodependência (IDT), a qual geralmente é composta por três pessoas,

um advogado, um médico e um trabalhador social. A finalidade da Comissão

é recomendar ao usuário um tratamento, apresentar opções para largar oi

vício, se quiser, contudo, o usuário nunca irá ser punido por ser usuário –

ressalta de que no país, enquadra-se como usuário, aquele que porta até dez

doses diárias da droga que consome.25

Quanto aos resultados das medidas que vem sendo adotadas pelo país

desde 2001, são de que 40 mil toxicodependentes estão em tratamento neste

momento e estima que o sistema já tenha atendido a mais de 400 mil pessoas

em catorze anos de existência – dados apresentados no ano de 2015, pela

Organização Mundial da Saúde (OMS), hoje esses dados devem ser ainda

mais expressivos.

Além disso, essa politica de redução de danos se refletiu nos

resultados dos mais diversos setores, como segurança e a saúde. Na

segurança, é possível ver as melhorias em três aspectos: (i) tirou dos policiais

a preocupação de correr atrás de usuários e permitiu que ficassem mais

focados em prender traficantes e produtores; (ii) causou a redução da

quantidade de crimes cometidos para pagar o consumo de drogas; e (iii)

diminuição do número de presidiários.26

2.4 URUGUAI

O Uruguai legalizou a produção e o consumo de maconha no ano de

2013, tal medida foi adotada pelo então Presidente José Mujica, que

sabiamente declarou que as políticas de repressão até então utilizadas no

país haviam falhado e sua proibição já não surgia efeitos positivos.

25 MENDES, Oro. 14 anos após descriminalizar todas as drogas, é assim que Portugal

está no momento. Awebic. 07.fev.2018. Disponível em: https://awebic.com/democracia/como-portugal-descriminalizou-as-drogas-e-e-um-exemplo-para-o-mundo/. Acesso em 15/11/2018. 26

ALEEM. Zeeshan. 14 Years After Descriminalizing All Drugs, Here´s What Portugal Looks Like. Mic. 11.fev.2015. Disponível em: https://mic.com/articles/110344/14-years-after-portugal-decriminalized-all-drugs-here-s-what-s-happening#.1098KvQNY. Acesso em 03/04/2019.

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21

A legalização foi feita através da Lei 19.172, aprovada pelo Senado em

19 de dezembro de 201327, permitindo assim, o acesso à droga para fins

recreativos através de locais determinados pelo governo, o qual detém o

monopólio do mercado da maconha.

Em 2017, iniciou a venda de dois tipos de maconha em 12 farmácias

autorizadas - a indica, que produz mais efeitos de relaxamento corporal, e a

sativa, que tem efeitos mais psicoativos. As plantas vendidas nestes

estabelecimentos são plantadas em terras do estado e produzidas por uma

das duas empresas que venceram uma concorrência pública. Em entrevista, o

Pró Secretário da Presidência do Uruguai declarou:

“Acreditamos que estamos conseguindo ganhar espaço do narcotráfico, evitando que as pessoas tenham que recorrer ao mercado negro, ficando expostas à violência e a consumir qualquer coisa. Esse, me parece, é um dos benefícios mais claros da regulação.”

28

Dessa forma o estado detém de todas as informações da procedência

da maconha, sendo que as mesas possuem padrão de qualidade, tendo em

vista que são vendidas em embalagens lacradas a vácuo, com um sistema

abre-e-fecha para melhor conservação do produto.29

Além disso, as concentrações de canabidiol (CBD) e de

tetraidrocanabinol (THC), as duas mais importantes substâncias químicas

encontradas na planta, são indicadas na embalagem, junto com outras

orientações sobre o produto, advertências e recomendações de uso.

Para poder adquirir a Cannabis, é necessário realizar um cadastro, o

qual é feito em uma agência de correio. Então, na hora da compra, é feito a

comprovação do cadastro e da identidade através da digital, garantindo

assim, o controle do consumo, este que não pode exceder dez gramas por

semana.

27 URUGUAI. Lei nº 19.172 de 19 de dezembro de 2013. Disponível em:

https://legislativo.parlamento.gub.uy/temporales/leytemp448679.htm. Acessada em 03/04/2019. 28

LUBIANDO. Júlio. Maconha no Uruguai: quatro anos após a legalização, muito a fazer. Projeto Colabora. 03.jan.2018. Disponível em: https://projetocolabora.com.br/consumo/maconha-no-uruguai/. Acesso em 03/04/2019. 29

Idem.

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22

Frederico Pagola, 24 anos, fotógrafo, em entrevista ao site Projeto

Colabora, afirmou ser usuário ocasional desde seus 14 anos e relatou que

atualmente, só faz uso do produto oficial. Afirmou ainda: ―É mais barato. No

mercado negro, custa três vezes mais. Além disso, consigo regular melhor o

efeito, porque sei o que contém e qual é a concentração‖.30

30 LUBIANDO. Júlio. Maconha no Uruguai: quatro anos após a legalização, muito a fazer.

Projeto Colabora. 03.jan.2018. Disponível em: https://projetocolabora.com.br/consumo/maconha-no-uruguai/. Acesso em 03/04/2019.

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23

3 DESCRIMINALIZAÇÃO E LEGALIZAÇÃO DA MACONHA NO BRASIL

Antes de dar inicio aos tópicos específicos do presente capítulo, é

necessário fazer a distinção do que seria de fato a descriminalização, bem

como, o que seria a legalização. Barroso, de forma breve e direta, esclarece

que ―descriminalizar significa deixar de tratar como crime. Legalizar significa

que o direito considera um fato normal, insuscetível de qualquer sanção,

mesmo que administrativa.‖31

A legalização acarreta a permissão e regulamentação para compra e

venda, assim como acontece com o álcool, tabaco e medicamentos. Por sua

vez, a legalização não pode ser confundida com a liberalização, pois, apesar

de acessíveis ao consumo da sociedade, a maconha, se liberada, será

através de controles a serem estipulados e fornecida em locais restritos e

credenciados – assim como acontece em países como o Canadá e Uruguai.

Esclarecida tal distinção e após a exposição breve da história da

maconha no mundo até sua chegada ao Brasil, sendo demonstrado o

contexto de sua proibição, bem como relatado como o mundo vem de certa

forma, abolindo a cultura proibicionista, serão tratados os motivos pelos quais,

novas medidas devem ser tomadas também em território nacional.

3.1 O PROIBICIONISMO FOI UM ERRO INTERNACIONAL

O proibicionismo que foi imposto em âmbito mundial, contudo, nos

países latinos, foi influenciado pelos Estados Unidos, os quais por meio de

ameaças, entrada de militares e penas voltadas ao fechamento de mercado,

impôs suas medidas. Contudo, ocorre que até mesmo os Estados Unidos,

precursor do proibicionismo no Brasil já reviu e esta revendo suas politicas no

assunto drogas, justamente por reconhecer o erro cometido há anos atrás, o

qual acarretou em inúmeras mortes e crescente violência.

31 STF. RE nº 635.659/SP – São Paulo – Rel. Min. Gilmar Mendes. Voto. Min. Luís Roberto

Barroso.

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24

―Uma das poucas coisas que se sabe sobre tóxicos é que nenhuma lei

conseguiu bani-los‖, diz o francês Michel Schiray 32.

Independente da opinião da sociedade a respeito da descriminalização

e consequente legalização da maconha no Brasil, todos tem conhecimento de

que a política adotada é ineficaz e vem falhando há muitos anos e nenhuma

medida tomada até o momento foi suficiente para concluir os objetivos

anteriormente estipulados para reprimir o tráfico de drogas ou inibir o uso de

substâncias ditas ilegais – frisa-se que hoje, drogas como o tabaco e o álcool

são comprovadamente mais danosas ao ser humano e matam muito mais do

que a maconha, contudo, mesmo com inúmeros estudos, o consumo de

ambas continua socialmente aceito de forma natural, o inverso, constata-se

uma superlotação dos presídios por ―presos do tráfico‖ e o constante

crescimento do poder do crime organizado.

Em uma análise histórica, verificam-se as raízes da criminalização da

maconha como algo social, diretamente ligada à classe – conforme já

relatado, a planta foi trazida por escravos e frequentemente era tratada em

registros policias como droga de podre – constatando a desigualdade de

classes, ou seja, realmente o problema principal, nunca foi à droga.

O proibicionismo atual vem sendo mascarado em forma de uma falsa

esperança do ideal social, levando a sociedade a acreditar que a segurança

só será plena se trocada pela liberdade. Na verdade, o proibicionismo que

ocasionou a dita “guerra às drogas” nunca teve um fim em si mesmo,

passando apenas por objetivos genéricos e sempre acrescidos de mais

substâncias a serem consideradas ilícitas, com o objetivo de mais repressão

social. Frisa-se que é claro que não se pode declarar guerra contra coisas33,

como afirma sabiamente a Juíza Maria Lucia Karam.

Assim, os conceitos para a criminalização das drogas partem de uma

distinção feita entre substâncias psicoativas, as quais foram tornadas ilícitas,

dentre elas a maconha, heroína e cocaína e outras substâncias de mesma

natureza, porém licitas, dentre elas o álcool, o tabaco e a cafeína.

32 Um dos maiores estudiosos do tráfico de drogas no mundo.

33 KARAM, Maria Lúcia. Proibições, Riscos, Danos e Enganos: as Drogas Tornadas

Ilícitas. Vol. 3. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.

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Tais diferenciações são arbitrarias vez que não possuem o mesmo

condão, qual seja fazer mal ao homem – então, por que somente umas

podem ser legalizadas e outras não? A unida explicação plausível para o

momento é, o comércio.

Conforme se verá adiante, se legalizada a comercialização da

maconha, tal conduta ocasionara uma movimentação do mercado nacional e

mundial, tendo em vista que a planta possui inúmeros benefícios – benefícios

estes, que países que já legalizaram, já usufruem. Segundo Bandeira de

Melo:

“O tratamento diferenciado somente é admissível quando exista uma correlação lógica entre a peculiaridade diferencial acolhida e a desigualdade de tratamento em função dela conferida. Essa peculiaridade diferencial há de estar radicada na diferença que as coisas, pessoas ou situações possuam em si mesmas, não se autorizando a discriminação quando nelas não se encontram fatores desiguais. Há de se notar ainda que não existem duas situações tão iguais que não possam ser distinguidas, da mesma forma que inexistem situações tão distintas que não possuam algum denominador comum em função do qual possam ser equiparadas, por isso não sendo qualquer distinção entre as situações ou as pessoas que estaria a autorizar a discriminação, a eventual existência de alguma diferença havendo de ser efetivamente relevante para o tratamento diferenciado que se quiser introduzir legislativamente.“

34

Sendo assim, o que cabe para este ponto é frisar que o atual

sistema, sendo licito o uso de algumas substâncias, estas que fazem mais

mal que a própria maconha e mantendo uma planta como ilícita, configura

uma distinção contrária a princípios constitucionais.

3.2 DROGAS E O CONTROLE SOCIAL – DROGAS X ALIMENTOS

Conforme retrospecto em epígrafe, as drogas, em especial a Cannabis

Sativa, sempre esteve presente no meio social e somente veio a ser proibida

como um instrumento de controle social, no Brasil e controle econômico,

mundo a fora.

34 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio (1993). O Conteúdo Jurídico do Princípio da

Igualdade. São Paulo: Malheiros, 3ª ed.

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“[...] o uso de drogas era, por definição, uma atividade proscrita, e o próprio fato de a droga mais popular entre os jovens ocidentais, a maconha, ser provavelmente menos prejudicial que o álcool e o tabaco, tornava o fumá-la (tipicamente uma atividade social) não apenas um ato de desafio, mas de superioridade em relação aos que a proibiam. Nas loucas praias dos anos 60 americanos, onde se reuniam os fãs de rock e estudantes radicais, o limite entre ficar drogado e erguer barricadas muitas vezes parecia difuso.”

35

Fato notório é que independente de proibição, o consumo nunca teve

fim, ninguém deixou de fazer uso somente em razão da proibição e da

existência da ―guerra às drogas‖. Nessa esteira:

“Passado mais de um século, e a droga continua fazendo valer a sua importância na economia da libido humana. Alçada à condição de principal mercadoria do mundo, os meios químicos de prazer sofreram um crescimento análogo em seu valor mercantil e em sua influência econômica, social e cultural. Ao mesmo tempo que cresce a demanda pelo prazer químico, também institui-se um sistema proibicionista que apóia-se num discurso médico-jurídico para justificar uma pretensa guerra contra as drogas que, na verdade, desde a Lei Seca de 1919, nos EUA, só tem servido para aumentar o lucro e a violência.”

36

O uso de drogas é um costume milenar e enraizado dentre as

necessidades humanas, portanto, proibir o homem de fazer o uso é o mesmo

que o proibir de seus direitos fundamentais.

Exemplificando o pensamento em questão, se o conceito de droga é

delimitado de acordo com a sua periculosidade e nocividade ao ser humano,

por que não há proibição do tabaco? Do açúcar? Do café? Ou até mesmo do

álcool? Já que estas substâncias de consumo lícito também causam danos à

saúde. Sabe-se que quando ingeridas, causam reações no organismo,

ocasionando alterações físicas, psíquicas e anímicas, sejam de efeito

imediato ou no transcorrer do tempo, assim como relatado por especialistas,

seriam efeitos semelhantes aos da própria Cannabis. Portanto, como os

alimentos, as drogas possuem seu caráter negativo e positivo. Para Carneiro:

“As drogas são produtos da cultura, são necessidades humanas, assim como os alimentos ou as bebidas, podendo ter um bom ou

35 HOBSBAWM, E. J. Era dos extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo:

Companhia das Letras, 1995. p 326. 36

CARNEIRO, Henrique. A fabricação do vício. Inep. 2002-, p.22. Disponível em http://www.neip.info/downloads/t_hen1.pdf. Acesso em 04/04/2019.

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um mau uso, assim como ocorre com os alimentos. A diferença é que um viciado em açúcar não corre o risco de ser preso, mas apenas o de perder a saúde na obesidade ou diabetes.“

37

Assim, o discurso acerca das drogas e das pessoas que a consomem,

os ditos ―drogados‖ não prosperam. Ora, se é fato que o álcool, o açúcar e

tantos outros alimentos também podem ser chamados de “venenos” para a

sociedade, restaria apenas sua proibição imediata, certo?

Se o bem jurídico tutelado fosse mesmo à sociedade e o bem comum,

essa deveria ser a imediata medida a ser tomada, não fossem fatores

externos, como o comércio envolto desses produtos - caso claro na história

da tentativa de proibição do álcool nos Estados Unidos, restando assim, um

discurso sensacionalista da droga, passando este a ser a catástrofe da

humanidade, sem pensar em todos os demais maus da coletividade.

Hoje, à abordagem que se faz ao consumo da maconha é o discurso

“médico-sanitarista”, o qual descreve que o que acarreta o uso de substâncias

pelas pessoas é a existência de uma patologia, ou seja, o usuário é um

doente, assim, deve ser tratado e na impossibilidade, segregado.

Parece-me que este discurso não condiz com a realidade, uma vez que

não se pode analisar o usuário de uma forma generalizada, pelo contrário,

deve-se analisar de uma fora casuística, por diversos fatores, desde os que o

levaram a usar a substância até o meio social em que está inserido, não

sendo suficientemente adequada a restrição de estudos a pareceres médicos,

uma vez que as drogas fazem partes das necessidades humanadas. Com

efeito:

“A primeira questão a se definir é a de que as drogas são necessidades humanas. Seu uso milenar em quase todas as culturas humanas corresponde a necessidades médias, religiosas e gregárias. Não apenas o álcool, como quase todas as drogas são parte indispensável dos ritos da sociabilidade, da cura, da devolução, do consolo e do prazer. Por isso as regras foram divinizadas em inúmeras sociedades.”

38

Ainda segundo Henrique Carneiro:

37 CARNEIRO, Henrique. As necessidades humanas e o proibicionismo das drogas no

século XX. Outubro, n.º 6, São Paulo, Instituto de Estudos Socialistas, 2002. Disponível em http://www.neip.info/downloads/t_hen2.pdf. Acesso em 12/11/2018. 38

Idem.

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“As campanhas contra as drogas, sob o slogan “Vida sim, drogas não”, supõem que possa existir vida sem drogas, o que é uma completa contradição com a história da humanidade, que desde a idade da pedra, passando por todas grandes civilizações, sempre usaram algum tipo de droga. O próprio álcool, para ficarmos em uma droga apenas, faz parte essencial da cultura ocidental, onde vinho tem um lugar primordial, até mesmo na eucarística cristã. Não se duvida que o vinho tem bons usos, não só na eucaristia, como em qualquer boa mesa. Há, obviamente, usos nocivos do vinho, a existência de milhões de álcool-dependentes comprova isso. Mas nem todos que consomem o vinho, ou o álcool em geral, tornam-se dependentes e os que se tornam, como ocorre com muitas mercadorias que a intoxicação publicitária torna fetiches de consumo compulsivo, necessitam tão somente que não lhes impeçam de poder gozar do seu hábito. Hábito esse que é elevado como símbolo da felicidade e da identidade nacional, bastando se recensear os temas das campanhas publicitárias de cerveja. A fusão, aliás, das duas maiores empresas de cerveja do Brasil, na Ambev, dá nascimento à maior empresa privada brasileira como uma multinacional global player da alcoolização planetária, o que se junta ao nosso recorde de primeiro exportador mundial de tabaco. O álcool, que é uma das drogas mais perigosas do mundo, reconhecida oficialmente como a causa de uma boa parte das patologias individuais e sociais, desde a cirrose e a dependência metabólica (calcula-se que cerca de 5% da população mundial é álcooldependente), até a violência urbana e os acidentes de trânsito não só é permitido, como faz parte do imaginário oficial da felicidade e da alegria. Quais as razões históricas para o predomínio do álcool na preferência popular para a obtenção de meios simples e diretos para o consolo físico e espiritual da dor, da fadiga, do tédio e do sofrimento? Porque como remédio para o sofrimento, diante de um cardápio incomensurável de substâncias químicas, se consome acima de todas os diferentes tipos de álcool?”

39

Sendo assim, o que será passado no decorrer do trabalho até a efetiva

conclusão do presente trabalho não é um proibicionismo sem limites e sim a

liberação com ressalvas para um uso saudável e controlado da Cannabis

Sativa, através da descriminalização e legalização da planta. Para Edward

McRae, a política proibicionista:

“Inibe igualmente o desenvolvimento e a transmissão dos controles sociais informais discutidos por Zinberg e propõe um controle formal baseado na proibição e repressão demasiadamente genérico e inflexível para dar conta das sutilezas da questão. Por outro lado proporciona aos traficantes a possibilidade de auferirem lucros

39 CARNEIRO, Henrique. A fabricação do vício. 2002. Disponível em

http://www.neip.info/downloads/t_hen1.pdf. Acesso em 04/04/2019. P. 13-14.

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29

astronômicos que não seriam viáveis em uma atividade econômica oficialmente reconhecida e regulamentada.”

40

Ou seja, na medida em que o Estado deixa de lado as questões da

descriminalização e da legalização, abandona os usuários e os deixa nas

mãos do tráfico de entorpecentes, os quais ficam também, com todos os

lucros que este mercado oferece.

3.2.1 PADRÕES DE USO

Conforme já dito algumas vezes, nem todo usuário é igual e nem todo

usuário é dependente – assim, como, se uma pessoa bebe uma taça de vinho

por dia, isso não faz dela um dependente do álcool, pelo contrário, a

Ministério da Saúde já publicou estudos relatando que tal prática faz bem ao

organismo humano.

A dependência de substâncias consideradas lícitas ou ilícitas possuem

três eixos de origem: o sujeito, com suas características de personalidade e

singularidade biológica; a substância psicoativa (droga), com propriedades

farmacológicas específicas; e o contexto sociocultural (meio ambiente) no

qual se realiza o encontro entre sujeito e droga.41

O sujeito compõem o fenômeno da dependência, podendo ou não

tornar-se dependente, de acordo com a relação que estabelece com a

substância que consome. O estudo analisado afirma que “a maior parte dos

usuários de substâncias, lícitas ou ilícitas, não se torna dependente e que a

relação com a droga será influenciada, diretamente, por diversos fatores:

sociais, biológicos e psicológicos.”42

40 MCRAE, E. A desatenção da legislação de entorpecentes pelas complexidades da

questão. 1996. Disponível em http://www.neip.info/downloads/t_edw1.pdf. Uma versão desse texto foi publicada em: “A Excessiva Simplificação da Questão das Drogas nas Abordagens Legislativas”, in: Drogas Hegemonia do Cinismo. Maurides de Melo Ribeiro e Sérgio Dario Seibel (orgs.). São Paulo, Memorial da América Latina, 1997, 7 páginas. 41

SILVEIRA. Dartiu Xavier da. DOERING-SILVEIRA. Evelyn Borges. Padrões de uso de drogas - Eixo Políticas e Fundamentos. Disponível em: www.aberta.senad.gov.br/medias/original/201704/20170424-094251-001.pdf. Acesso em 04/04/2019. 42

Idem.

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30

Assim, é possível fazer a distinção entre o uso, abuso e a dependência,

tendo em vista o fato de que considerar que todo uso é patológico ou

problemático é um erro - essa constatação é válida para o uso de qualquer

substância psicoativa, seja ela lícita ou ilícita.

O estudo contatou ainda, que “a maior parte dos usuários de

substâncias psicoativas não chega a desenvolver quadro de dependência. A

porcentagem de usuários de drogas que desenvolvem dependência após um

período de dez anos de uso é de: 12 a 13% para o álcool, 15 a 16% para a

cocaína e 8% para a maconha.”43

Para efeitos de diagnóstico, foi realizada uma lista de padrões de uso,

os quais foram colocados da seguinte forma:

“Uso experimental: Refere-se à pessoa que experimenta a droga, geralmente por curiosidade. Os usuários são aqueles que provam a droga uma ou algumas vezes e, em seguida, perdem o interesse em repetir a experiência. Uso ocasional: Utilização de uma ou várias drogas apenas quando disponíveis ou em ambiente favorável, sem rupturas (distúrbios) afetiva, social ou profissional. Uso habitual: Uso frequente da substância, porém, sem que haja ruptura afetiva, social ou profissional, nem perda de controle quanto ao consumo. Uso recreativo: Uso de uma droga, geralmente em circunstâncias sociais, sem que se implique dependência ou outros problemas relacionados. Uso controlado: Refere-se à manutenção de um uso regular, porém não compulsivo e que não interfere no funcionamento habitual do sujeito. Uso social: Refere-se à manutenção de um uso regular, porém não compulsivo e que não interfere no funcionamento habitual do sujeito. Uso em binge: O usuário consome grandes quantidades da substância em um curto período de tempo, ainda que a frequência desse tipo de consumo possa ser esporádica (por exemplo, pessoas que ingerem grandes quantidades de bebidas alcoólicas durante algumas horas, embora isso ocorra apenas uma vez por semana). Escalada: É quando a pessoa passa do uso de drogas consideradas “leves” para as mais “pesadas” ou, quando, com uma mesma droga, passa de consumo ocasional (esporádico) para consumo intenso (frequente).

43 SILVEIRA. Dartiu Xavier da. DOERING-SILVEIRA. Evelyn Borges. Padrões de uso de

drogas - Eixo Políticas e Fundamentos. Disponível em: www.aberta.senad.gov.br/medias/original/201704/20170424-094251-001.pdf. Acesso em 04/04/2019.

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31

Tolerância: Quando o organismo se acostuma com a droga e passa a ter necessidade de doses maiores para alcançar os mesmos efeitos. Poliusuário: Pessoa que utiliza combinação de várias drogas simultaneamente ou dentro de um curto período de tempo, ainda que tenha predileção por determinada droga. Overdose: Dose excessiva de uma droga, com graves implicações físicas e psíquicas, podendo levar à morte, geralmente por parada respiratória ou cardíaca.”

44

Quanto ao último critério, o da overdose, é praticamente impossível

que o usuário de maconha morra de overdose. Através de testes realizados

em cobaias, foram administrados 1,000 mg de THC por quilo e após isso, não

foi constatado nenhum caso de overdose - um homem adulto com o peso

aproximado de 70kg, teria de consumir 70g de THC. Isso equivale a mais de

5000 vezes o necessário para que se tenham os efeitos da planta, ou seja,

para ficar “chapado”.45 Realidade bem diversa dos números relacionados a

drogas lícitas, tais como o álcool e o tabaco.

3.3 FALÊNCIA DO SISTEMA PENITENCIÁRIO

O levantamento Nacional de Informações Penitenciarias (Infopen/2017)

divulgou no dia 08 de dezembro de 2017, dados referentes ao ano de 2016.

Concluiu-se que até junho de 2017, 726.712 pessoas haviam sido presas no

país.

Com esses dados, o Brasil alcançou o 3º lugar, da lista de países que

possui as maiores populações carcerárias, ultrapassando a Rússia (618.490

em 2017), seguido dos Estados Unidos (2,3 milhões) e China (1,7 milhões em

2015). Contudo, na contramão do restante dos países, o Brasil tem visto sua

44 SILVEIRA. Dartiu Xavier da. DOERING-SILVEIRA. Evelyn Borges. Padrões de uso de

drogas - Eixo Políticas e Fundamentos. Disponível em: www.aberta.senad.gov.br/medias/original/201704/20170424-094251-001.pdf. Acesso em 04/04/2019. 45

MULLER. Lucas. Afinal, podemos morrer por overdose de maconha?. 11.nov.2013. Disponível em: https://universoracionalista.org/podemos-morrer-por-overdose-de-maconha/. Acesso em 04/04/2019.

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população carcerária crescer - São Paulo tem o maior número, com 240.061

pessoas presas.46

Já em 08 de agosto de 2018, a Presidente do Conselho Nacional da

Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), Ministra Cármen Lúcia,

apresentou uma nova versão do Banco Nacional de Monitoramento de Presos

(BNMP 2.0). Contudo, o Brasil ainda ocupa o 3ª lugar do ranking mundial –

segundos os dados parciais divulgados, haveria 602.217 presos no país.

Ainda, segundo os dados divulgados, 24% dos presos respondem pelo delito

de tráfico de drogas47 – ou seja, aproximadamente 144.533 pessoas

respondem pelo delito de tráfico de drogas, este que como já foi abordado, é

configurado sem nenhum critério material, ficando nas mãos de policiais,

juízes e promotores, decidirem se é tráfico de entorpecentes ou usuário de

drogas.

Destes mais de 600.000 detentos, 64% são negros e correspondem a

53% da população no País. Além disso, nos últimos anos, o encarceramento

feminino vem crescendo em níveis alarmantes – segundo o relatório

divulgado, pelo Infopen/2015, entre 2000 e 2015 houve um aumento de 567%

no número de mulheres presas – destas, 68% são negras.48

Nesse cenário, a lei de drogas é a responsável pelo aumento massivo

das prisões, justamente por não criar critérios mais técnicos para diferencias

as condutas de tráfico e uso, restando uma avaliação subjetiva de todo o

judiciário – a atual estrutura não traz nenhum ganho social, pelo contrário, só

demonstra o crescente problema em torno da desigualdade, esta que é

cultural e tratada desta forma desumana há séculos, tendo como objetivo

aparente, a punição de jovens negros e pobres, tornando-os presas das

facções criminosas.

46 DADOS INFOPEN/2017. Brasil ocupa 3ª posição em população prisional mundial.

21.dez.2017. Disponível em: www.iddd.org.br/index.php/2017/12/21/brasil-ocupa-3a-posicao-em-populacao-prisional-mundial/. Acesso em 03/04/2019. 47

JUSTIFICANDO. Mentes Inquietas Pensam Direito. CNJ divulga os mais recentes dados sobre a população carcerária no Brasil. 08.ago.2018. Disponível em: www.justificando.com/2018/08/08/cnj-divulga-os-mais-recentes-dados-sobre-a-populacao-carceraria-no-brasil/. Acesso em 03/04/2019. 48

Idem.

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33

Em que pese os inúmeros esforços na criação de novas leis para

criação de novos delitos, a taxa de crimes no Brasil não teve baixas

consideráveis, ou seja, o encarceramento em massa não é e nunca será a

solução para qualquer problema social. Sobre, o tema, o juiz Luís Carlos

Valois relata bem a realidade quando diz que ―a cultura no Brasil é que a

prisão é só segregação. É depósito de seres humanos. Deveríamos fazer as

coisas de maneira racional, de preferência científica. A prisão não é resultado

de nenhum experimento científico. E se foi, foi falho. A prisão não serve para

nada, nada, nada. Sabe como é que nasceu a prisão? Antigamente as

pessoas eram enforcadas, queimadas, guilhotinadas, chicoteadas. Tinha

várias penas que não eram a de prisão. Mas para o cara ser condenado a

uma dessas penas, ele tinha que ficar esperando na prisão. E essas penas

foram acabando por causa da sensibilidade da sociedade industrial, da

Revolução Francesa, elas foram acabando. E os caras foram sendo

esquecidos. A prisão nasceu por acaso. E agora, então, o que vamos fazer?

Vamos decidir que o cara então vai ficar lá [na prisão] cinco anos. Não vamos

poder matar, então ele fica cinco anos, não é nenhum resultado de

pensamento científico. Imagine que pessoas diferentes cometam um crime,

cada uma em um lugar. Aí pega essas pessoas e colocam presas no mesmo

lugar para ficarem conversando. Olha que absurdo!”49

Já em outra entrevista, o juiz afirma a realidade do super

encarceramento, o qual é diretamente ligado com a dita guerra às drogas –

faz isso ao afirmar que:

“O Brasil segue o modelo norte-americano de política criminal, país que tem a maior população carcerária do mundo. A política de drogas é uma das causas desse superencarceramento, pois no sistema penitenciário temos quase metade dos presos por envolvimento com drogas. Presos com quatro, cinco trouxinhas de determinada substância, maconha principalmente, misturados com homicidas, latrocidas, estupradores. Repensar a política criminal deve passar por repensar a política de drogas. A regulamentação do comércio dessas substâncias tidas como ilegais, com a arrecadação de mais impostos e o desmantelamento das organizações

49 ATEU. Valois: Prisão Não Serve Pra Nada. GGN. Youtube. 11.jan.2017. Disponível em:

https://jornalggn.com.br/noticia/valois-prisao-nao-serve-pra-nada/ e https://www.youtube.com/watch?v=MQ2xmA8fnlc. Acesso em 03/04/2019.

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criminosas deve ser pensado com mais seriedade e menos preconceito, pois a proibição nunca foi objeto de um estudo sério.”

50

Com a intensa repressão aos usuários e não aos verdadeiros

traficantes, criou-se um mercado ilegal extremamente organizado, altamente

rentável e fortemente reprimido, acarretando uma sociabilidade violenta nas

favelas e nos bairros periféricos, local onde o comércio organizou suas bases.

Causando ainda, mortes e também fomentando o tráfico de armas. Assim, em

todo o contexto histórico, faz sentido a afirmação dos apoiadores da

descriminalização, bem como é fato incontestável diante dos dados atuais,

que a guerra iniciada não foi somente em face das drogas, mas contra

pessoas, os usuários, os quais têm seus direitos negados, vez que o sistema

não oferece suporte conforme previsão legal.

Maria Lucia Karan ressalta que “a “guerra às drogas” não é e nunca foi

propriamente uma guerra contra as drogas. Não se trata de uma guerra

contra coisas. Dirige-se sim, como quaisquer outras guerras, contra pessoas:

os produtores, comerciantes e consumidores das selecionadas substâncias

psicoativas tornadas ilícitas. Mas, não exatamente todos eles. Os alvos nessa

guerra são os mais vulneráveis dentre os produtores, comerciantes e

consumidores das drogas proibidas; os “inimigos” nessa guerra, são seus

produtores, comerciantes e consumidores pobres, não brancos,

marginalizados, desprovidos de poder51‖. Ou seja:

“O tráfico de drogas, organizado internacionalmente, mas localizado nas suas pontas nos bairros mais pobres das cidades, além de criar centros de conflito sangrento nas vizinhanças pobres, além de corromper as instituições encarregadas de reprimi-lo, também reforçou a tendência a demonizar os usuários de drogas. Isso, por sua vez, facilitou o isolamento social do usuário, aumentou sua dificuldade de conseguir tratamento médico para deixar a dependência da droga ou tratar os efeitos de seu uso indevido.”

52

50 MACEDO, Fausto. SERAPIÃO, Fábio. 'Toda prisão no Brasil é ilegal, afirma Valois.

Estadão. 06.jan.2017. Disponível em: https://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/toda-prisao-no-brasil-e-ilegal-afirma-valois/. Acesso em 04/04/2019. 51

KARAM. Maria Lucia. Proibição às drogas e a violação a direitos fundamentais. Disponível em: https://app.uff.br/slab/uploads/Proibicaoasdrogas_violacao_direitosfundamentais-Piaui-LuciaKaram.pdf. Acesso em 04/04/2019. 52

Cf. ZALUAR, Alba. Integração perversa: pobreza e tráfico de drogas. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2004.

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35

Desta forma, o sistema utilizado para repressão, é claramente ineficaz,

ficando distante, inclusive, da própria lei de execuções penais, a qual prevê

em seu art. 88, que:

“O condenado será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório. Parágrafo único. São requisitos básicos da unidade celular: a) salubridade do ambiente pela concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência humana; b) área mínima de 6,00m2 (seis metros quadrados).”

53

Muito diferente da realidade, onde são corriqueiros os relatos de celas

e presídios superlotados, cotidiano que acabada distorcendo a real intenção

da prisão, que é a de reeducar o preso por meio da pena, para que não volte

a cometer crimes novamente – entendo que não é possível ressocializar o

individuo o tirando da sociedade e o fazendo aprender a viver como bicho,

diante da realidade das celas do país. Contudo, se este é o dito objetivo da

prisão, estamos bem longe de atingi-lo. Nesse sentido, Anselmo Jeronimo

Oliveira54 relata que:

“A incapacidade do Estado em gerir seu sistema penitenciário tem contribuído para o aumento da criminalidade e esse sistema falido está aperfeiçoando o criminoso, fazendo com que pequenos delinquentes, misturados a toda sorte de pequenos infratores, passem por um processo de aperfeiçoamento e saiam da cadeia sedentos por vingança contra a sociedade organizada.”

Em meio a todo o contexto social da politica de drogas como algo bom,

fato é que ela é insuficiente e ineficaz para o problema e, além disso, as

desculpas dadas para o encarceramento em massa respaldadas na proteção

da sociedade e ressocialização dos criminosos se mostra falaciosa, uma vez

que a prisão não protege a sociedade e muito menos ressocializa – evidente

pelo número também crescente de indivíduos reincidentes específicos.

53 BRASIL. Lei de Execuções Penais nº 7.210, de 11 de julho de 1984. Disponível em:

www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L7210.htm. Acessada em 04/04/2019. 54

OLIVEIRA, Anselmo Jeronimo. Drogas – descriminalização: a quem interessa essa bandeira?. Santa Catarina: Ed. Edifurb. 2000. p.36.

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Dito isso, fato é que a guerra fracassou e até mesmo quem impulsionou

o movimento, os Estados Unidos, esta revisando suas politicas de drogas,

descriminalizando o consumo de drogas, conduta que evidencia o

reconhecimento de que a repressão pura não é o caminho e sim a liberação e

controle através de outros mecanismos.

3.4 AFRONTA AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS

Não se sabe exatamente a origem da ideia dos direitos humanos,

contudo, Nuria Belloso Martín defende que há três fases fundamentais para a

compreensão da evolução desses direitos:

“Os direitos humanos pré-revolucionários (pré-história dos direitos humanos), os direitos humanos do Constitucionalismo liberal (os direitos humanos de primeira geração) e, por ultimo, os do Constitucionalismo social (direitos humanos de segunda

geração)”.55

Para entendermos os direitos cerceados com a proibição de Cannabis

Sativa, é preciso entender suas origens e concepções. Porém, mais do que a

preocupação com a fundamentação desses direitos humanos, é necessário

buscar entender sua origem de proteção. Para Norberto Bobbio:

“O problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e, num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos, qual é a sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou relativos, mas sim qual é o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declarações, eles sejam continuamente violados.”

56

Nesse contexto, não há duvida que nossa Constituição traz inúmeros

direitos fundamentais aos cidadãos, todavia, o que vemos é a busca

constante por novos direitos sem que antes se tenha uma policia efetiva para

proteção e garantia dos direitos já existentes; pelo contrario, diariamente nos

55 BELLOSO MARTÍN, Nuria. La fundamentación de los derechos humanos em la doctrita

española actual, p. 129. 56

BOBBIO, Norberto, 1909- A era dos direitos / Norberto Bobbio; tradução Carlos Nelson Coutinho; apresentação de Celso Lafer. — Nova ed. — Rio de Janeiro: Elsevier, 2004.

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deparamos com decisões e jurisprudências que retiram do cidadão esses

direitos com uma declaração do bem coletivo. Ora se para o bem da

coletividade, precisamos retirar direitos do cidadão que faz parte dela, que

proteção é essa? A meu ver, não se pode restringir direitos básicos com

discursos rasos, se assim se manter, com o passar dos anos, de nada

adiantara previsão constitucional – não se pode colocar a restrição como

regra e a proteção como exceção.

Nas primeiras Constituições liberais tínhamos os direitos humanos de

primeira geração, os quais estão ligados à liberdade e dizem respeito aos

direitos humanos individuais – quando de sua previsão constitucional,

passaram ao status de direitos fundamentais. Os direitos humanos ditos de

segunda geração são pautados por valores igualitários, sociais, econômicos e

culturais. Os direitos de terceira geração são ligados, em resumo, ao

desenvolvimento e ao progresso, ao meio ambiente, à autodeterminação dos

povos e ao direito de propriedade sobre o patrimônio comum da humanidade,

ou seja, direitos transindividuais. Por fim, com o passar dos anos e o

surgimento de mais necessidades sociais, surgiram os direitos humanos de

terceira e quarta geração, os quais compreendem os direitos à democracia,

pluralismo e a informação.

Frisa-se que assim como as demais constituições, a atual também é

característica pelo conjunto de leis fundamentais que organizam e regem o

funcionamento da sociedade, sendo considerada a lei máxima, não sendo

possível o cerceamento de direitos nela contidos. Reghelin et. al esclarecem

que:

“É necessário esclarecer que o ordenamento jurídico brasileiro é elaborado como um sistema escalonado de normas, ou seja, as normas constitucionais, enquanto superiores são as diretrizes que devem nortear a inspirar todo o arcabouço jurídico. É o que se chama de princípio da supremacia imanente. É a Constituição que dá o embasamento a todas as demais leis elaboradas sob sua égide, e não o contrário. A não ser assim teríamos de admitir uma Constituição Federal atrelada e subordinada leis hierarquicamente inferiores. Também é em razão desse princípio que as normas infraconstitucionais, para serem válidas, devem estar em

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consonância com aquelas da Carta Federal, sob pena de serem consideradas inconstitucionais.”

57

Dito isso, passamos a esmiuçar de maneira mais direta os direitos

violados com a proibição do consumo da Cannabis Sativa.

3.4.1 PRINCÍPIO DA ISONOMIA

No Brasil, o princípio foi incorporado pela primeira vez na Constituição

Brasileira de 1934, no artigo 113, inciso I: ―Todos são iguais perante a lei. Não

haverá privilégios, nem distinções, por motivo de nascimento, sexo, raça, profissões

próprias ou dos pais, classe social, riqueza, crenças religiosa ou ideias políticas”58.

Diante da importância de tal princípio, se manteve na Constituição da

Republica Federativa do Brasil de 1988 “Art. 5º - Todos são iguais perante a lei,

sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros

residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à

segurança e à propriedade...‖59.

O princípio da isonomia tem como finalidade a busca da equiparação

dos cidadãos, nos aspectos mais diversos, de modo, que todos tenham a

possibilidade de usufruírem os mesmos direitos e deveres.

Por esse ângulo, verifica-se que a proibição de determinadas

substâncias que a “guerra às drogas” impulsionou parte de uma distinção

incompatível com o princípio da isonomia. Ora, conforme já relatado nesse

trabalho, alimentos como o açúcar, o café, o chocolate e o álcool são

substâncias que também causam dependência, bem como causam alterações

no organismo humano, todavia, estas não são proibidas – frisa-se que com

exceção do álcool, nenhum dos alimentos citados possui restrição para

consumo e para aquisição, vez que qualquer pessoa pode adquiri-los em

57 REGHELIN, Elisângela Melo et. al. Lei das drogas: aspectos polêmicos à luz da

dogmática penal e da política criminal. Rio Grande do Sul: Ed. Livraria do Advogado. 2008, p.247. 58

BRASIL. Constituição da Republica dos Estados Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao34.htm. Acessada em 04/04/2019. 59

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acessada em 04/04/2019.

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qualquer lugar que os forneça. Assim, tornar ilícitas algumas substâncias e

manter outras em perfeita legalidade – mesmo que possuam efeitos

semelhantes – configura uma distinção discriminatória e, por conseguinte,

inconstitucional.

O princípio em exame não abre exceções aparentes e se fizesse, seria

uma exceção para aplicação do princípio, uma vez que é fundamental ao

cidadão, exigindo que o mesmo tratamento seja dado e os mesmos direitos

sejam reconhecidos a todos que estejam em igualdade de condições. Para

Fábio Konder Comparato, ―direitos nunca podem ser reconhecidos a alguns

apenas, ou a uns mais do que a outros.‖60

Assim, não se tem nenhum óbice para garantir o proibicionismo para o

uso da Cannabis Sativa, esta que após tantos anos de proibição, jamais

deixou de ser usada. A todo cidadão que quer maconha ou qualquer droga,

basta ir a um beco e irá consegui-la com a maior facilidade. É fato que as

drogas estão ai, quer queiram ou não, agora é necessário um discurso mais

racional para a legalização, pelo prol da sociedade e pelo bem dos usuários.

Além disso, mesmo proibida, comprova-se internacionalmente -

milhares de brasileiros vão para o estrangeiro e lá fazem uso de substâncias

e após isso, não são tratados como doentes ou dependentes, que a planta

com inúmeros benefícios, direta e indiretamente, desde o pequeno usuário

recreativo, do paciente que é tratado com remédios com base de maconha,

bem como a nível comercial, vez que com a descriminalização e legalização

traria verba para economia do país e tiraria da mão do tráfico, o qual detém

do monopólio do comercio. Para Celso Antônio Bandeira de Mello:

“O tratamento diferenciado somente é admissível quando exista uma correlação lógica entre a peculiaridade diferencial acolhida e a desigualdade de tratamento em função dela conferida. Essa peculiaridade diferencial há de estar radicada na diferença que as coisas, pessoas ou situações possuam em si mesmas, não se autorizando a discriminação quando nelas não se encontram fatores desiguais. Há de se notar ainda que não existem duas situações tão iguais que não possam ser distinguidas, da mesma forma que inexistem situações tão distintas que não possuam algum

60 COMPARATO, Fábio Konder. “Igualdade, Desigualdades”. Direito Público – Estudos e

Pareceres. São Paulo: Saraiva. 1996-.

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denominador comum em função do qual possam ser equiparadas, por isso não sendo qualquer distinção entre as situações ou as pessoas que estaria a autorizar a discriminação, a eventual existência de alguma diferença havendo de ser efetivamente relevante para o tratamento diferenciado que se quiser introduzir legislativamente.”

61

Não há qualquer motivo relevante que justifique a proibição de

determinadas substâncias, ditas ilícitas, e a manutenção da liberação de

outras, uma vez que todas de alguma forma causam mal, o consumo de

forma exagerada como tudo que seja ingerido em excesso, é perigoso - o

discurso é único no sentido da saúde pública e na politica de danos

causados, contudo, apenas com a liberação com controle de compra

solucionaria já solucionaria o problema.

Porém, mesmo que descriminalizada e legalizada a maconha, tal

medida não excluiria a desigualdade, vez que não se tem tal controle na

compra de açúcar, tampouco na compra de café, por exemplo, condutas que

só confirmam as origens da proibição, estas que vem de concepções sociais,

longe do discurso de bem social. Claude afirma que “o problema da droga não

existe em si, mas é o resultado do encontro de um produto, uma

personalidade e um modelo sócio-cultural”.62

Para Maria Lucia Karam, a violação a princípios garantidores inscritos

nessas normas fundamentais vai além. As convenções internacionais e leis

nacionais que discriminatoriamente proíbem condutas de produtores,

comerciantes e consumidores das arbitrariamente selecionadas drogas

tornadas ilícitas criam crimes sem vítimas, ao criminalizarem a mera posse

daquelas substâncias e sua negociação entre adultos, assim violando a

exigência de ofensividade da conduta proibida63.

Assim, não havendo objetivos claros para manutenção das proibições

existentes e sim, clara afronta ao direito constitucional, direito fundamental,

61 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. O Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade.

São Paulo: Malheiros, 3ª ed. 1993-. 62

OLIEVENSTEIN, Claude (1984). A droga. São Paulo: Ed. Brasiliense. 1984-. 63

KARAM, Maria Lucia. Proibição Às Drogas E Violação A Direitos Fundamentais. Disponível em: https://app.uff.br/slab/uploads/Proibicaoasdrogas_violacao_direitosfundamentdir-Piaui-LuciaKaram.pdf. Acesso em 04/04/2019.

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não há outra media contrária à discussão da possibilidade de

descriminalização e legalização da Cannabis Sativa.

3.4.2 PRINCÍPIO DA PRIVACIDADE

O direito a privacidade é um princípio constitucional ligado ao direito da

personalidade da pessoa humana, de modo, que a violação deste princípio

afronta as relações pessoais e de intimidade. Para Celso Bastos, a

privacidade é a:

“Faculdade que tem cada indivíduo de obstar a intromissão de estranhos em sua vida privada e familiar, assim como de impedir-lhes o acesso a informações sobre a privacidade de cada um, e também impedir que sejam divulgadas informações sobre esta área da manifestação existencial do ser humano”.

64

Tal direito esta previsto na Constituição Federal, em seu artigo 5º,

inciso X, o qual prevê: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e

a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano

material ou moral decorrente de sua violação”.65

A intimidade e a vida privada são espaços que devem ser imunes da

interferência estatal, bem como demais interferências externas de outros

indivíduos, ou seja, o que o cidadão faz na sua intimidade, não diz respeito a

ninguém, desde que não afete bem jurídico alheio.

Nesse caso, cabe mencionar o exemplo que o Ministro Luís Roberto

Barroso citou em seu resumo de voto para o RE nº 635.659, cujo tema é a

descriminalização do porte de drogas para consumo próprio:

“É preciso não confundir moral com direito. Há coisas que a sociedade pode achar ruins, mas que nem por isso são ilícitas. Se um indivíduo, na solidão das suas noites, bebe até cair desmaiado na cama, isso não parece bom, mas não é ilícito. Se ele fumar meia carteira de cigarros entre o jantar e a hora de ir dormir, tampouco

64 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do

Brasil. vol. 2, São Paulo: Saraiva, 1989, p. 63. 65

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm. Acessada em 04/04/2019.

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parece bom, mas não é ilícito. Pois digo eu: o mesmo vale se, em lugar de beber ou consumir cigarros, ele fumar um baseado. É ruim, mas não é papel do Estado se imiscuir nessa área.”

66

Para que haja criminalização de uma conduta, esta deve ofender a um

bem jurídico alheio, o que não é o caso, vez que o fato de alguém fazer uso

de maconha, não ocasiona nenhum dano ao cidadão que não usa – no

máximo, o cheiro, contudo, este argumento cai por terra na medida em que o

tabaco também possui um cheiro horrível, de modo, que não cabe ao Estado

dizer apenas se é bom ou ruim, se assim fazê-lo, a convivência social seria

inviável.

Por essas razões, seria necessário e justo que fossem realizados

estudos para averiguar como seria viável e como se iniciaria a

descriminalização, legalização e regulamentação da maconha, podendo ter

inicio da mesma forma que o cigarro é tratado - produto lícito, com venda

regulamentada, com restrições de idade, bem como com propagandas que

incentivam o abandono do vício – como já é feito em vários países do mundo.

3.4.3 PRINCÍPIO DA AUTONOMIA

A autonomia faz parte da liberdade do individuo e essencial em uma

sociedade democrática. Mesmo não sendo absoluta, sendo passível de

restrição pela Lei, deve ser como regra, resguardado seu direito. Parte da

doutrina entende que os direitos fundamentais devem ceder ao interesse

público, todavia, esses casos são excepcionalíssimos – exemplo,

interceptação telefônica.

Depreende-se, assim, que os direitos fundamentais não são absolutos

e não podem ser invocados para acobertar atividades contrárias à legislação

vigente e a outros direitos igualmente previstos na Constituição da República,

coexistindo nesta, de maneira harmoniosa, princípios e direitos. Deve o

intérprete, pois, utilizar-se daqueles que melhor se amoldam ao caso

66 STF. RE nº 635.659/SP – São Paulo – Rel. Min. Gilmar Mendes. Voto. Min. Luís Roberto

Barroso.

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concreto, sempre prevalecendo um em relação ao outro, dependendo da

situação em que são aplicados.

Em todo caso, a liberdade possui um núcleo emanado da dignidade da

pessoa humana, qual seja a autonomia da vontade individual, a qual assegura

sua autodeterminação, o direito de fazer escolhas, independentemente de

ideias de que sejam elas boas ou ruins. Assim, cada um pode ser feliz na

medida de suas escolhas e consequências, em todos os casos, trata-se de

suas escolhas – o direito deve garantir ao cidadão a possibilidade de escolher

e não ser pautado por outras frentes, tais como o conservadorismo,

religiosidade ou o proibicionismo extremo.

Assim, a autonomia e o direito de escolha não podem ser regidos e

supridos pelo Estado, por valores sociais, tampouco pela sociedade. Nesse

sentido, Barroso assevera:

“O Estado e a sociedade não podem decidir com quem você vai se casar, qual deve ser a sua religião ou que profissão você vai seguir. As pessoas têm, igualmente, o direito de escolher os seus prazeres legítimos. Há quem faça alpinismo, voe de ultraleve, participe de corridas de automóvel, ande de motocicleta ou faça mergulho submarino. Todas essas são atividades que envolvem riscos. Nem por isso são proibidas.”

67

Obvio, conforme já dito, pode o Estado restringir ações, quando estas

configuram risco ao bem jurídico alheio, como exemplo, a proibição do fumo

em ambientes fechados, tal medida é justa, uma vez que não se pode expor

uma coletividade aos riscos do tabaco, quando apenas uma escolheu correr

esse risco.

No caso da liberação de maconha, qual a diferença? A meu ver,

nenhuma! Se um cidadão decide fazer uso de maconha em casa ou em um

ambiente privado, tal ação não viola qualquer direito de terceiros, de modo,

que o Estado não é legitimo para intervir na escolha do cidadão.

67 STF. RE nº 635.659/SP – São Paulo – Rel. Min. Gilmar Mendes. Voto. Min. Luís Roberto

Barroso.

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Outros discursos proibicionista colocam em debate a saúde pública,

elemento também não convincente. Se este fosse o real objetivo da proibição,

todas as substâncias que causassem alterações sejam físicas ou mentais

deveriam ser proibidas e, por conseguinte, criminalizadas, porém, por razões

históricas, consumeristas, etc., não o faz.

Frisa-se que o objetivo do presente trabalho não é a descriminalização

de foram desenfreada e sem controle, pelo contrário, mostra-se apenas que

os discursos proibicionista não abarcam a manutenção da ilegalidade,

devendo ser revista, o uso da maconha é histórico, assim como a do álcool e

outras substâncias, então não há motivos para que sejam tratados de forma

desigual.

Não é possível ter certeza de que a descriminalização e a legalização

da maconha tenha sucesso, mas fato é que a politica atual não funcionou,

devendo ser atualizada em conformidade com as necessidades sociais.

Além disso, acrescenta-se que a liberação não proíbe o Estado de

combater o uso, assim como faz com o álcool, o qual é responsável pelas

inúmeras campanhas de “se beber, não dirija” e “beba com moderação” e

com o cigarro, o qual causa centenas de doenças – mesmo com todo o

aparato para diminuir o consumo, no caso do álcool há diversas outras

propagandas incentivando o consumo e com a livre concorrência de marcas,

vez que é o usuário quem decide o que e como vai utilizar o álcool. Então,

evidente que a maconha deve ser tratada de maneira uniforme ou pelo menos

como o tabaco. Sobre o tema, para Maria Lucia Karam:

“Em uma democracia, o Estado não está autorizado a intervir em condutas que não envolvem um risco concreto, direto e imediato para terceiros, não estando assim autorizado a criminalizar a posse para uso pessoal de drogas ilícitas, que, equivalente a um mero perigo de autolesão, não afeta qualquer bem jurídico individualizável. Também não está o Estado autorizado a intervir quando o responsável pela conduta age de acordo com a vontade do titular do bem jurídico, não estando assim autorizado a criminalizar a venda ou qualquer outra forma de fornecimento de drogas ilícitas para um adulto que quer adquiri-las, conduta que, tendo o consentimento do suposto ofendido, tampouco tem potencialidade para afetar concretamente qualquer bem jurídico individualizável. Leis que desconsideram o consentimento do titular do bem jurídico e criminalizam a conduta do terceiro que age de acordo com sua vontade ilegitimamente criam um mecanismo destinado a

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indiretamente impedir que aquele titular do bem jurídico exerça seu direito de dele dispor (no caso em foco, dispor de sua própria saúde). A proibição de uma conduta teoricamente lesiva de um direito de um indivíduo não pode servir, ainda que indiretamente, para tolher a liberdade desse mesmo indivíduo que a lei diz querer proteger.”

68

Com o entendimento exposto, conclui-se o óbvio, não pode o Estado

impor suas vontades e/ou decidir o que o cidadão pode ou não usar, pode ou

não consumir. Se assim pudesse, a vida em sociedade seria ainda mais

insana.

3.4.4 PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE

Não há previsão expressa ao princípio da proporcionalidade na

Constituição Federal de 1988, contudo, seu fundamento encontra-se implícito

no texto constitucional. Segundo Luís Afonso Heck:

“O princípio da proporcionalidade seria implícito a qualquer Estado de Direito, pois nesse tipo de Estado há vedação do excesso de poder na condução dos atos estatais, como se vê em vários precedentes do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha.”

69

Para Gilmar Ferreira Mendes:

“A proporcionalidade é fruto do reconhecimento do devido processo legal substancial, implícito no artigo 5º, inciso LIV, CF que exige que todo comportamento do Estado seja devido, legitimo e pautado pela justiça material, funcionando a proporcionalidade como “princípio geral do direito”.”

70

Para Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins:

68 KARAM, Maria Lucia. Proibição Às Drogas E Violação A Direitos Fundamentais.

Disponível em: https://app.uff.br/slab/uploads/Proibicaoasdrogas_violacao_direitosfundamentdir-Piaui-LuciaKaram.pdf. Acesso em 04/04/2019. 69

HECK, Luís Afonso. O tribunal Constitucional Federal e o desenvolvimento dos princípios constitucionais. Porto Alegre; Sérgio Antônio Fabris Editor, 1996, p. 176. 70

MENDES, Gilmar Ferreira; Coelho, Inocêncio Mártires; Branco, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 319.

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“O princípio da proporcionalidade é justificado pelo vínculo de todo o ordenamento jurídico brasileiro à dignidade humana e aos direitos fundamentais (art. 1º, III), o que exige que todo ato dos Poderes do Estado (Executivo, Legislativo e também as decisões judiciais) seja proporcional e atento à justiça material.”

71

E, ainda, segundo Paulo Bonavides:

“A proporcionalidade decorre do princípio da igualdade, pois os atos do Estado Democrático de Direito que sejam excessivos ou insuficientes contra a igualdade material e a justiça que a todos são devidas.”

72

Dito isto, observa-se que os limites do princípio da razoabilidade são

legítimos quando realizados de maneira proporcional e de acordo com a

conduta analisada, levando em conta a lesividade da conduta tipificada.

Assim, a conduta de usuários, ou seja, a de usar maconha, não

configura ofensa à bem jurídico alheio, de modo, que não há que se falar em

lesividade, pelos mesmos motivos já elencados no titulo anterior – o uso de

maconha não extrapola os limites dos direitos individuais, o que deslegitima o

Estado a agir pela criminalização.

O principal bem jurídico lesado pelo consumo de maconha é a própria

saúde individual do usuário, e não um bem jurídico alheio. Nesse sentido,

tem-se que o Estado não pune a autolesão ou a tentativa de suicídio. Nessa

esteira, afirma Zaffaroni e Pierangelli:

“(...) todo direito quer regular a conduta humana em sociedade e comina para que os homens se adaptem a suas regulações. Portanto, também, o direito penal tem uma aspiração ética: aspira evitar o cometimento e repetição de ações que afetam de forma intolerável os bens jurídicos penalmente tutelados. O fim de prover à segurança tutelando bens jurídicos é o que marca um limite racional à aspiração ética do direito penal”.

73

71 DIMOULIS, Dimitri; MARTINS, Leonardo. Teoria geral dos direitos fundamentais. São

Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. P. 193. 72

BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 6ª ed. São Paulo: Medeiros, 1996, p. 395. 73

ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELLI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 10ª. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 95.

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O discurso de que o bem jurídico tutelado é a saúde pública não

prospera, na medida a criminalidade da conduta não ocasionaria o

distanciamento de usuários do sistema de saúde – usuários que fogem do

uso comum, onde o uso de substâncias geraram danos devido ao uso

excessivo ou em conjunto a outras drogas não buscam ajuda por medo de

serem presos e pela descriminalização social que são inseridos.

De acordo com o princípio, pode-se concluir que a criminalização e

desproporcional ao custo que isso traz, sendo certo, que o bem jurídico

tutelado não é e nunca foi à saúde pública. Sobre o tema, Barroso concluiu

em seu voto no RE nº 635.659 que:

“O custo tem sido imenso – em recursos drenados para a repressão, para o sistema penitenciário, nas vidas de jovens que são destruídas no cárcere, no poder do tráfico sobre as comunidades carentes – e os resultados têm sido pífios: aumento constante do consumo. Em suma: por ausência de lesividade a bem jurídico alheio, por inadequação, discutível necessidade e, sobretudo, pelo custo imenso em troca de benefícios irrelevantes, a criminalização não é a forma mais razoável e proporcional de se lidar com o problema.”

74

3.3 DIRECIONAMENTO POLICIAL

A “guerra às drogas” fracassou, o crime organizado esta mais forte do

que nunca e a cada dia que passa mais jovem são aliciados ao mundo do

crime, bilhões são gastos em recursos com atividade policial, bem como com

os custos ocasionados pelo sistema penitenciário. O próprio Secretário de

Segurança do Rio de Janeiro, com a autoridade de quem conduz um conjunto

de políticas bem sucedidas, asseverou:

“Acabar com as drogas é impossível. Parece que os brasileiros não acordam para o desperdício dessa guerra. Não existem vitoriosos. Descriminalizando o uso, um dos efeitos é

74 STF. RE nº 635.659/SP – São Paulo – Rel. Min. Gilmar Mendes. Voto. Min. Luís Roberto

Barroso.

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o alívio na polícia e no Poder Judiciário, que podem se dedicar aos homicídios, aos crimes verdadeiros”.75

Assim, com a descriminalização e legalização da maconha - ao

contrário do que muitos dizem que acarretaria mais consumo e mais violência,

auxiliaria na liberação do enorme contingente policial Estadual e Federal para

repressão de crimes mais graves e a combater o verdadeiro crime de tráfico.

O Cientista Político e Delegado da Polícia Civil Orlando Zaccone afirma que

“para combater a violência é preciso implantar uma nova política de drogas,

que contemple a legalização de todas as substâncias, já que atualmente a

guerra às drogas mata mais do que o consumo delas.”76

Segundo ele, além da desmilitarização das polícias para diminuir o

número de mortes, é fundamental que a “irracionalidade” que envolve a

questão das drogas seja desconstruída.

“Eu sou policial e participo de uma associação internacional formada por policiais a favor da legalização, como marco para reduzir a violência provocada por uma guerra que não protege o que diz que quer proteger, porque se diz que o combate ao comércio dessas substâncias é para proteger a saúde, mas em detrimento disto se produz muito mais letalidade”.

77

Não da pra dizer que a regulamentação das drogas seria uma solução

para o crime, diante das desigualdades sociais do país, tendo em vista que

mesmo após isso, os usuários seriam marginalizados. Contudo, “a polícia,

que fica apenas na operação antidroga, teria mais tempo para investigar

outros crimes. Hoje você é assaltado, vai à delegacia e recebe um BO

[boletim de ocorrência]. Matam um familiar teu, tu vais lá e recebe um BO.

Ninguém investiga mais nada. Por quê? Porque a polícia vai à esquina, pega

o cara com 10 trouxinhas de droga e ela está trabalhando, mas não investiga

mais nada. A polícia fica só fazendo blitz. Essa é a atividade da polícia

75 DE PARIS. Ruth de Aquino. José Mariano Beltrame: "A guerra às drogas é perdida,

irracional". Disponível em: https://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/06/jose-mariano-beltrame-guerra-drogas-e-perdida-irracional.html. Acesso em 04/04/2019. 76

NITAHARA. Akemi. Delegado defende legalização das drogas para combater a violência. EBC. 31.OUT.2014. Disponível em: www.ebc.com.br/cidadania/2014/10/delegado-defende-legalizacao-das-drogas-para-combater-a-violencia. Acesso em 04/04/2019. 77

Idem.

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brasileira atualmente. Eu não gosto nem de falar de descriminalização, gosto

de falar de regulamentação. Porque droga tá tudo liberado aí. Acha que a

polícia não sabe onde estão vendendo as drogas? E o que está havendo com

isso? Mortes e mais mortes. O Estado deveria era ganhar um dinheiro com

isso, ia retirar o financiamento do crime organizado. A única coisa ruim da

droga é a própria droga em si. Eu não vejo nada de ruim na

descriminalização, absolutamente nada. Só vejo coisa boa. Vai sobrar muito

mais dinheiro, investimento e efetivo policial para outros crimes. Vai ter muito

mais dinheiro para tratamento de viciado.”78

78 ATEU. Valois: Prisão Não Serve Pra Nada. GGN. Youtube. 11.jan.2017. Disponível em:

https://jornalggn.com.br/noticia/valois-prisao-nao-serve-pra-nada/ e https://www.youtube.com/watch?v=MQ2xmA8fnlc. Acesso em 03/04/2019.

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4 CONTESTAÇÃO AOS ARGUMENTOS CONTRÁRIOS

Em apenas alguns minutos pesquisando sobre o tema, é possível

encontrar inúmeros sites e entrevistas onde são expostas várias razões para

que a proibição da maconha permaneça igual. Vários já foram claramente

rechaçados no decorrer dos capítulos, vez que claramente não condizem com

a realidade do Brasil, contudo, para melhor combate-los, trouxe os

argumentos mais falados quando se fala em descriminalização, legalização e

consequente regulamentação da maconha.

4.1 SAÚDE PÚBLICA

Conforme relatado no decorrer do trabalho, os argumentos pela

proibição pautada na saúde pública não possuem nenhum valor, tendo em

vista ser evidente que a “guerra às drogas”, nunca foi contra as drogas.

Mostram-se discursos falaciosos e não demonstram a realidade social.

Muito embora alguns estudos apontem que a maconha faz mal se seu

consumo for feito há longo prazo, conforme demonstrado, se o Estado for

intervir em todas as decisões a serem tomadas pelos cidadãos pautados na

saúde individual, não só o convívio social seria inviável, mas todos sofreriam

com a restrição de direitos, tais como o direito à liberdade e

autodeterminação.

Além disso, com a descriminalização, usuários que hoje são

marginalizados e não possuem ajuda, poderiam procurar tratamento com

mais facilidade, a fim de se livrar do vício. Nesse sentido, ao individuo que

apenas queira fazer uso da maconha, correria os mesmos riscos do individuo

que faz uso do álcool, do açúcar em excesso, do cigarro, etc., mas estaria

ciente de todos os maus se propagandas e programas fossem aplicados para

repressão do uso.

Não há como olvidar que a guerra às drogas, ocasiona mais mortes e

violência que as próprias substâncias consideradas ilícitas. Em entrevista

concedida ao Canal Justificando, o juiz Luís Carlos Valois ressalta esse

contrassenso da proibição o sentido de que:

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O sistema penitenciário mata pessoas, pessoas são presas e morrem no sistema penitenciário. A grande incoerência da guerra às drogas é justamente essa, a gente prende uma pessoa que esta vendendo droga, porque o direito diz que é para proteger a saúde pública e coloca em uma penitenciaria imunda, suja, cheia de barata, rato, sujeira. Como é que pode ser saúde pública? Sem contar, que o Estado não pode se dizer preocupado com a saúde pública, se ele tem esses hospitais, essas filas da previdência social. Quer dizer, o Estado dizer que esta prendendo uma pessoa, preocupado com a saúde pública nessa imundice que é o sistema penitenciário, é hipócrita demais. Ainda tem outra coisa que é mais hipócrita ainda, você prende uma pessoa que esta vendendo droga, num lugar que vende droga, olha que absurdo! Toda penitenciaria tem droga.

79

Então, conclui-se pela realidade vivida com o contrassenso social,

onde usuários e traficantes são presos de formas iguais, com tratamentos

iguais, em ambientes insalubres, em prol de uma saúde pública que neste

sentido, nem se quer da para saber do que se trata, tamanha discrepância da

realidade e são colocados em locais onde o tráfico é ainda mais real.

4.2 AUMENTO DO CONSUMO

Os que são contra a descriminalização e legalização, dizem que há

grande chance do uso se tornar compulsivo devido à dependência psicológica

que ela pode causar, todavia, a discussão aqui cai por terra. A maconha

causa menos dependência do que outras drogas como o álcool e o tabaco,

estas que não são proibidas.

Se com a descriminalização poderá haver uso em excesso porque tal

conduta precisa continuar sendo criminalizada para todo usuário? Esse

cidadão fica condicionado a ser confundido com um traficante de drogas e ser

encarcerado, saindo do cárcere formado na “escola do crime”; o certo, se a

política realmente fosse de saúde pública, seria justamente a

descriminalização e legalização para possibilitar o tratamento dos usuários

dependentes.

79 JUSTIFICANDO. 10 anos da Lei de Drogas. Youtube. 21.set.2016. Entrevista com Luís

Carlos Valois. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=vTVEEOovvJA. Acesso em 04/04/2019.

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Além disso, como diz Valois, não há pessoas que estão esperando a

descriminalização para fazer uso da maconha. Pelo contrário, se espera por

isso e desconhece a realidade do país, é muito ingênuo, ou ainda não foi até

a esquina, porque a droga esta lá e o acesso é muito fácil.80

4.3 EFEITOS NO TRÂNSITO

Comum em sites e revistas Acessos por diversas classes e pessoas de

diferentes idades estamparem os motivos da proibição respaldados nos

efeitos do uso da droga. Como exemplo, o individuo que ira fazer uso de

maconha e devido a seus efeitos, ocasionara riscos no trânsito. Ocorre que

tal argumento se encontra isolado e sem respaldo algum com a legislação, na

medida em que há consequências ao individuo que sob efeito de como

exemplo, o álcool, dirige e/ou causa acidentes. Ou seja, trata-se de crime

autônomo, o qual também seria aplicado se a descriminalização acontecesse

– como exemplo, o Canadá, país que possui regras nesse sentido.

4.4 AUMENTO DA VIOLÊNCIA

Comum o argumento de que a descriminalização trará mais violência

social, mais poder ao tráfico de entorpecentes, que permanecerá munido de

armas e etc. Fato incontestável é que mesmo após anos da proibição,

ninguém deixou de usar droga e a atual política de drogas mata mais que as

próprias drogas.

Desse modo, não faz sentido tentar manter esse argumento na medida

em que os números de encarceramento e mortes ligadas ao tráfico de

entorpecentes são muito maiores do que as mortes por overdose, por

exemplo – aqui tratando de todas as drogas.

80 VALOIS. Luís Carlos. Entrevista - Juiz aponta ineficiência da guerra às drogas em tese

de doutorado. TV Unesp. 12.ago.2016. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=9rxnJIkcPww. Acesso em 04/04/2019.

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No caso da maconha, já foi relatado que a chance de uma pessoa

morrer de overdose é quase nula, também não podendo ser este um

argumento para a manutenção da proibição.

Dito isso, com a descriminalização e legalização da maconha, não da

pra dizer que a violência envolta do tráfico irá ser resolvida e acabar, mas

certamente irá diminuir, tendo em vista que usuários não mais precisaram ir

até becos e favelas adquirir a maconha, poderão fazer isso de forma regulada

e na forma da lei.

Como exemplos práticos já foram extraídos dados dos Estados Unidos

– País influenciador do proibicionismo no Brasil, que já revê suas politicas de

legalização e regulamentação da maconha. Um estudo mostrou que a

legalização da planta para fins médicos levou a uma redução de crimes

violentos em estados que fazem fronteira com o México.

A pesquisa foi publicada no periódico The Economic Journal e concluiu

que o número de crimes, como roubos e assassinatos, caíram 12,5% em

condados próximos à divisa após a introdução das novas regras em relação à

maconha. A professora Evelina Gavrilova, uma das autoras do estudo

realizado, afirmou ao jornal britânico The Independent que "as pessoas não

precisam mais comprar maconha ilegal, de modo que as organizações de

tráfico de drogas têm muito menos clientes."81

81 ÉPOCA. Negócios Online. Legalização da maconha nos EUA diminuiu crimes violentos

na fronteira, diz estudo. Globo.com. 16.jan.2018. Disponível em: https://epocanegocios.globo.com/Mundo/noticia/2018/01/legalizacao-da-maconha-nos-eua-diminui-crimes-violentos-na-fronteira-diz-estudo.html. Acesso em 04/04/2019.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

1. No decorrer do presente trabalho, foram expostas as correntes do

proibicionismo até sua chagada ao Brasil, para que assim fosse possível

entender a dinâmica aplicada e as influências internacionais, concluindo-se

que a guerras às drogas possuem como fim, imposição de mercado e

desigualdade de classes, tem a proibição da maconha ligada ao preconceito

contra negros e pobres.

2. São visíveis as imensuráveis falhas em todo o sistema político-

criminal, na medida em que a atual lei de drogas trata todos os tipos de

usuários, bem como os traficantes de forma igual. Além disso, não se tem um

critério objetivo para distinguir as condutas, tanto o art. 28, quanto o art. 33,

ambos da lei de drogas possuem as mesmas condutas como ilícitas, contudo,

grandes diferenças de tratamentos – uma é tida como conduta ínfima no

ordenamento e não prevê pena de prisão, enquanto a outra é crime

gravíssimo, com pena cominada de 05 a 15 anos de reclusão. Não bastasse

tamanha distinção, o julgamento dos presos do tráfico na grande maioria das

vezes, são pautados em apenas dois depoimentos de policiais que

conduziram a ocorrência, ou seja, são eles quem decidem se a conduta deve

ser enquadrada como uso ou tráfico.

3. Após muitos anos de politicas proibicionistas, o mundo passou a

mudar seus ideais e tenta o combate ao tráfico de entorpecentes de outras

formas, vez que evidente que a repressão que vinha sendo importa ocasiona

mais mortes que as drogas até então proibidas. Foram expostos países que já

estão lidando com a descriminalização, legalização e regulamentação da

maconha, os quais já estão vendo grandes mudanças – Exemplos: os

Estados Unidos obteve dados de diminuição da violência nas fronteiras com o

México após descriminalização da maconha; e, o Canadá vê o comercio

melhorando com a abertura do comercio relacionado à maconha e esta entre

os países que mais fatura com a planta.

4. Todas as substâncias consideradas ilícitas, mas aqui, principalmente

a maconha faz parte da história da humanidade e mesmo após a proibição,

jamais deixaram de ser usadas, pelo contrário, são oferecidas a todos que

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assim desejam, só que de forma clandestina e insalubre, diretamente pelas

mãos do tráfico, que hoje detém o monopólio do comércio da maconha no

Brasil – com a regulamentação, o usuário não se colocará em risco para ir até

o traficante para sustentar o vício ou ainda, colocar-se a disposição como

“aviãozinho do tráfico” em troca de porções de maconha.

5. Entrando nas razões pela descriminalização e legalização da

maconha, concluiu-se que considerando a falência do sistema penitenciário

atual, o qual não ressocializa ninguém, não se pode continuar com a

proibição – aproximadamente de 24% das pessoas presas no país, estão

respondendo pelo delito de tráfico de entorpecentes.

6. A proibição afronta princípios constitucionais, tais como princípio da

isonomia, da privacidade, da autonomia e da proporcionalidade, na medida

em que mantem lícitas substâncias mais danosas que a maconha, tais como

álcool e tabaco, impõem escolhas ao cidadão, não o deixando escolher o que

e como vai consumir em prol de uma saúde pública inexistente. O Estado não

pode intervir nas escolhas, se estas não ocasionam dano a ninguém mais que

o próprio usuário.

7. Os argumentos contrários à descriminalização são rasos e

desfavorecidos de dados – ainda que tivessem dados de outros países, não

se pode determinar que o Brasil tivesse o mesmo fim, tendo em vista que

cada país apresenta suas diversidades sociais e culturais, assim apresentam

respostas diferentes às mudanças aplicadas cotidianamente.

8. Conclui-se que mudar as atuais políticas de repressão e

encarceramento em massa, é necessário e se apresenta como medida de

urgência, diante das falhas que o sistema apresenta e levando em

consideração os benefícios que a descriminalização pode trazer ao país –

desencarceramento e melhores condições aos presos por crimes mais

graves, respeito aos princípios constitucionais, direcionamento policial para

tratar do verdadeiro tráfico de entorpecentes, verbas para os cofres públicos

para investir em saúde – poderia tratar os dependentes e adotar mecanismos

parecidos com Portugal, segurança e educação e colocaria na mão do

Estado, o controle e regulamentação da maconha, tirando o monopólio do

tráfico, ainda que primeiramente de uma forma substancial.

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